papa francisco na américa latina - comunidade

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EQUADORDiscurso do Papa Francisco nacerimônia de boas-vindas noEquadorDomingo, 5 de julho de 2015Homilia do Papa Francisco naprimeira Missa no EquadorSegunda-feira, 6 de julho de2015Discurso do Papa Franciscoem visita a Catedral de QuitoSegunda-feira, 6 de Julho de2015Homilia do Papa FranciscoParque Bicentenário, QuitoTerça-feira, 7 de julho de 2015Discurso do Papa Francisco

Pontifícia UniversidadeCatólica, QuitoTerça-feira, 7 de Julho de2015Discurso à sociedade civilQuitoTerça-feira, 07 de julho de2015Discurso do Papa ao clero ereligiosos em QuitoQuarta-feira, 8 de Julho de2015

BOLÍVIAViagem Apostólica do Papa àBolívia Discurso de boasvindas8 de julho de 2015

Discurso ao presidente eautoridades civis La Paz,BolíviaQuarta-feira, 08 de Julho de 2015Homilia do Papa FranciscoPraça do Cristo Redentor,Santa Cruz de La Sierra,BolíviaQuinta-feira, 9 de Julho de2015Discurso Encontro com ossacerdotes, religiosos,religiosas e seminaristasQuinta-feira, 9 de Julho de2015Discurso do Papa durante II

Encontro dos MovimentosPopulares BolíviaQuinta-feira, 9 de julho de2015Discurso do Papa durantevisita ao Centro deReabilitação Palmasola SantaCruz de La Sierra, BolíviaSexta-feira, 10 de julho de2015

PARAGUAIDiscurso Encontro com asautoridades e com o corpodiplomáticoSexta-feira, 10 de julho de2015Visita ao Hospital PediátricoÑinos de Acosta ÑuSábado, 11 de Julho de 2015Homilia Praça do SantuárioMariano de CaacupéSábado, 11 de julho de 2015Discurso do Papa Franciscocom representantes dasociedade civilSábado, 11 de julho de 2015Discurso do Papa Vésperas

com os bispos, sacerdotes,diáconos, religiosos, religiosas,seminaristas e movimentoscatólicosSábado, 11 de julho de 2015Discurso na visita à populaçãode Bañado NorteDomingo, 12 de julho de 2015Homilia Santa Missa emCampo Grande de Ñu Guazú,em Assunção, ParaguaiDomingo, 12 de julho de 2015AngelusDomingo, 12 de julho de 2015Encontro com os jovens naBeira-Rio “Costanera”Domingo, 12 de julho de 2015

EQUADORDiscurso do PapaFrancisco na cerimônia deboas-vindas no Equador

Domingo, 5 de julho de2015Senhor Presidente,

Ilustres Autoridades do governo,

Irmãos no Episcopado,

Senhoras e senhores, amigos todos!

Dou graças a Deus por me ter mepermitido voltar à América Latina eestar aqui, hoje, convosco, nestalinda terra do Equador. Sinto alegriae gratidão ao ver as calorosasboas-vindas que me dão: é maisuma prova do carácter acolhedorque tão bem define as pessoasdesta nobre nação.

Agradeço-lhe, Senhor Presidente,as amáveis palavras que me dirigiu,que retribuo com votos de todo obem para o exercício da suamissão. Saúdo cordialmente asilustres autoridades do governo, os

meus irmãos bispos, os fiéis daIgreja no país e todos aqueles que,hoje, me abrem as portas do seucoração, da sua casa e da suaPátria. A todos vós, o meureconhecimento afetuoso e sincero.

Visitei o Equador em diferentesocasiões por motivos pastorais; etambém hoje venho comotestemunha da misericórdia de Deuse da fé em Jesus Cristo. A mesmafé que, durante séculos, modelou aidentidade deste povo e deu muitosfrutos bons, entre os quais sedestacam figuras insignes como

Santa Mariana de Jesus, o santoirmão Miguel Febres, Santa Narcisade Jesus ou a Beata Mercedes deJesus Molina, beatificada emGuayaquil, trinta anos atrás, durantea visita do Papa São João Paulo II.Eles viveram a fé com intensidade eentusiasmo e, praticando amisericórdia, contribuíram paramelhorar, em diferentes áreas, asociedade equatoriana do seutempo.

Hoje, também nós podemosencontrar, no Evangelho, as chavesque nos permitem enfrentar os

desafios atuais, avaliando asdiferenças, fomentando o diálogo ea participação sem exclusões, paraque as realizações alcançadas noprogresso e desenvolvimentopossam garantir um futuro melhorpara todos, prestando especialatenção aos nossos irmãos maisfrágeis e às minorias maisvulneráveis. Para isso, SenhorPresidente, poderá contar semprecom o empenho e a colaboração daIgreja.

Amigos todos, com entusiasmo eesperança, começo os dias que se

seguem. No Equador, encontra-se oponto mais próximo do espaçoexterior: é o Chimborazo, chamadopor essa razão o lugar «maispróximo do sol», da lua e dasestrelas. Nós, cristãos, vemos JesusCristo como o sol, e a lua como aIgreja, a comunidade; ninguém, àexcepção de Jesus, tem luz própria.Possa, nestes dias, tornar-se maisevidente para todos a proximidade«do Sol que nasce do Alto», sendonós reflexo da sua luz, do seu amor.

Daqui quero abraçar todo oEquador. Desde o cume do

Chimborazo até as costas doPacífico, desde a selva amazônicaaté às Ilhas Galápagos, nuncapercais a capacidade de dar graçasa Deus pelo que Ele fez e faz porvós, a capacidade de proteger ohumilde e o simples, cuidar das suascrianças e idosos, confiar najuventude e maravilhar-se com anobreza do seu povo e a belezasingular do seu país.

O Sagrado Coração de Jesus e oCoração Imaculado de Maria, aquem foi consagrado o Equador,derramem sobre vós a sua graça e

bênção. Muito obrigado!

Homilia do Papa Franciscona primeira Missa noEquador

Segunda-feira, 6 de julhode 2015

A passagem do Evangelho queacabamos de ouvir é o primeiro sinalportentoso que se realiza segundo anarrativa do Evangelho de João. Apreocupação de Maria,transformada em súplica a Jesus:«Não têm vinho!» e a referência à«hora» compreender-se-ão nosrelatos da Paixão.

É bom que assim seja, porquepermite-nos ver a ânsia de Jesuspor ensinar, acompanhar, curar ealegrar, a começar da súplica desua Mãe: «Não têm vinho!»

As bodas de Caná repetem-se emcada geração, em cada família, emcada um de nós e nossas tentativasde fazer com que o nosso coraçãoconsiga apoiar-se em amoresduradouros, fecundos e felizes.Demos um lugar a Maria, «a mãe»,como diz o evangelista. Façamoscom Ela o itinerário de Caná.

Maria está atenta àquelas bodas jáiniciadas, é solícita pelasnecessidades dos esposos. Não Sefecha em Si mesma, não Se encerrano seu mundo; o seu amor fá-La«ser para» os outros. E, por isso,Se dá conta da falta de vinho. Ovinho é sinal de alegria, de amor eabundância. Quantos dos nossosadolescentes e jovens percebemque, em suas casas, há muito quenão existe nenhum! Quantasmulheres, sozinhas e tristes,interrogam-se quando foi embora oamor, quando se diluiu da sua vida!Quantos idosos se sentem deixados

fora da festa das suas famílias,abandonados num canto e já sembeber do amor diário. A falta devinho pode ser efeito também dafalta de trabalho, de doenças esituações problemáticas que asnossas famílias atravessam. Marianão é uma mãe «reclamona», não éuma sogra que espia para seconsolar com as nossasinexperiências, erros ou descuidos.Maria é mãe! Permanece ao nossolado atenta e solícita.

Maria, porém, dirige-se comconfiança a Jesus, Maria reza. Não

vai ao chefe de mesa; apresenta adificuldade dos esposos diretamentea seu Filho. A resposta que recebeparece desalentadora: «Que temisso a ver contigo e comigo? Aindanão chegou a minha hora» (v. 4).Mas, entretanto, já deixou oproblema nas mãos de Deus. A suasolicitude pelas necessidades dosoutros apressa a «hora» de Jesus.Parte dessa hora, desde o presépioaté a cruz – Ela soube «transformarum curral de animais na casa deJesus, com uns pobres paninhos euma montanha de ternura» (EG286), e recebeu-nos como filhos

quando uma espada Lhetrespassava o coração –, Maria nosensina a deixar as nossas famíliasnas mãos de Deus; a rezar,acendendo a esperança que nosindica que as nossas preocupaçõestambém preocupam Deus.

Rezar sempre nos arranca doperímetro das nossaspreocupações, fazendo-nostranscender aquilo que nos magoa,agita ou falta a nós mesmos paranos colocarmos na pele dos outros,calçarmos os seus sapatos. Afamília é uma escola onde a oração

também nos lembra que há um nós,que há um próximo vizinho, parente,que vive sob o mesmo teto,compartilha a vida e estánecessitado.

Maria, finalmente, atua. As palavras«fazei o que Ele vos disser» (v. 5),dirigidas aos serventes, são umconvite dirigido também a nós paranos colocarmos à disposição deJesus, que veio para servir e nãopara ser servido. O serviço é ocritério do verdadeiro amor. E issoaprende-se especialmente nafamília, onde nos tornamos

servidores uns dos outros por amor.Dentro da família, ninguém édescartado; nela, «aprende-se apedir licença sem servilismo, a dizer“obrigado” como expressão dumasentida avaliação das coisas querecebemos, a dominar aagressividade ou a ganância, e apedir desculpa quando fazemos algode mal. Esses pequenos gestos desincera cortesia ajudam a construiruma cultura da vida compartilhada edo respeito pelo que nos rodeia»(LS213). A família é o hospital maispróximo, a primeira escola dascrianças, o grupo de referência

imprescindível para os jovens, omelhor asilo para os idosos. Afamília constitui a grande «riquezasocial», que outras instituições nãopodem substituir, devendo serajudada e reforçada para nãoperder jamais o justo sentido dosserviços que a sociedade presta aoscidadãos. Com efeito, esses nãosão uma espécie de esmola, masuma verdadeira «dívida social» paracom a instituição familiar, que tantocontribui para o bem comum detodos.

A família também forma uma

pequena Igreja, uma «Igrejadoméstica», que, juntamente com avida, canaliza a ternura e amisericórdia divina. Na família, a fémistura-se com o leite materno:experimentando o amor dos pais,sente-se envolvido pelo amor deDeus.

Na família, os milagres fazem-secom o que há, com o que somos,com aquilo que a pessoa tem àmão. Muitas vezes, não é o ideal,não é o que sonhamos nem o que«deveria ser». O vinho novo dasbodas de Caná nasce das talhas de

purificação, isto é, do lugar ondetodos tinham deixado o seu pecado.«Onde abundou o pecado,superabundou a graça» (Rm 5, 20).Na família de cada um de nós e nafamília comum que todos formamos,nada se descarta, nada é inútil.Pouco antes de começar o AnoJubilar da Misericórdia, a Igreja vaicelebrar o Sínodo Ordináriodedicado às famílias, paraamadurecer um verdadeirodiscernimento espiritual e encontrarsoluções concretas para asinúmeras dificuldades e importantesdesafios que a família deve

enfrentar nos nossos dias. Convido-vos a intensificar a vossa oração poressa intenção: para que, mesmoaquilo que nos pareça impuro, nosescandalize ou espante, Deus –fazendo-o passar pela sua «hora» –possa milagrosamente transformá-lo. A família hoje necessita dessemilagre!

Tudo começou porque «não tinham vinho», e tudo se pôde fazer porque uma mulher – a Virgem Maria – esteve atenta, soube pôr nas mãos de Deus as suas preocupações e agiu com sensatez e coragem. Mas,

não é menos significativo o dado final: saborearam o melhor dos vinhos. E esta é a boa nova: o melhor dos vinhos ainda não foi bebido, o mais gracioso, profundo e belo para a família ainda não chegou. Ainda não veio o tempo em que saboreamos o amor diário, onde os nossos filhos redescobrem o espaço que partilhamos, e os maisvelhos estão presentes na alegria decada dia. O melhor dos vinhos ainda não veio para cada pessoa que aposta no amor. A família deve apostar no amor, deve apostar em amar. E ainda não veio, mesmo que

todas as variáveis e estatísticas digam o contrário; o melhor vinho ainda não chegou para aqueles que hoje veem desmoronar-se tudo. Murmurai até acreditá-lo: o melhor vinho ainda não veio; e sussurrai-o aos desesperados ou que desistiram do amor. Tenham paciência e esperança, assim como Maria, porque o melhor vinho está por vir. Deus sempre Se aproxima das periferias de quantos ficaram sem vinho, daqueles que só têm desânimos para beber; Jesus sente-Se inclinado a desperdiçar o melhor dos vinhos com aqueles que, por

uma razão ou outra, sentem que já se lhes romperam todas as talhas.

Como Maria nos convida, façamos«o que Ele nos disser» eagradeçamos por, neste nossotempo e nossa hora, o vinho novo, omelhor, nos fazer recuperar aalegria de ser família.

Discurso do PapaFrancisco em visita a

Catedral de Quito

Segunda-feira, 6 de Julhode 2015

Discurso improvisado:

Concedo a minha bênção a cada umde vós, às vossas famílias, a todasas pessoas queridas e a estegrande e nobre povo equatoriano,para que não haja diferenças, nãohaja exclusão, não haja pessoasdescartadas, todos sejam irmãos,

todos sejam incluídos, e ninguémfique fora desta grande naçãoequatoriana. A cada um de vós, àsvossas famílias, concedo a bênção.

Mas antes recitemos juntos o Ave-Maria.

Discurso preparado pelo SantoPadre

Queridos irmãos!

Venho a Quito como peregrino, parapartilhar convosco a alegria de

evangelizar. Saí do Vaticanosaudando a imagem de SantaMariana de Jesus, que, no exteriorda abside da Basílica de São Pedro,vela pelo caminho que o Papapercorre tantas vezes. A Ela,recomendei também o fruto destaviagem, pedindo-lhe que todos nóspudéssemos aprender com o seuexemplo. O seu sacrifício e a suaheróica virtude são representadospor uma açucena. Mas, na suaimagem em São Pedro, carrega umramo de açucenas, porquejuntamente com a dela apresenta ao

Senhor, no coração da Igreja, asflores que sois todos vós, as floresdo Equador.

Os Santos convidam-nos a imitá-los,a seguir a sua escola, como fizeramSanta Narcisa de Jesus e a BeataMercedes de Jesus Molina, que sesentiram interpeladas pelo exemplode Santa Mariana. Quantosdaqueles que estão aqui hoje sofremou sofreram a orfandade, quantostiveram que tomar a seu cargoirmãos ainda pequenos, quantos seempenham diariamente no cuidado

dos enfermos ou idosos; assim o fezMariana, assim a imitaram Narcisa eMercedes. Não é difícil, se Deusestá connosco. Elas não fizeramgrandes proezas, aos olhos domundo. Simplesmente amarammuito, demonstrando-o no dia-a-diaaté chegarem a tocar a carnesofredora de Cristo no povo (cf.Evangelii gaudium 24). Não ofizeram sozinhas; fizeram-no «juntocom» outros; as pedras, escultura ealvenaria desta catedral foram feitaspor meio da forma própria dospovos nativos: a «minga», um

trabalho de todos a favor dacomunidade, anónimo, sem cartazesnem aplausos. Queira Deus que, talcomo as pedras desta catedral,assim ponhamos aos ombros asnecessidades dos outros, assimajudemos a construir ou reparar avida de tantos irmãos que não têmforças para a construir ou a deixampor terra.

Hoje estou aqui convosco, que medais de presente o júbilo dos vossoscorações: «Que formosos são sobreos montes os pés do mensageiro

(…), que apregoa a boa-nova» (Is52, 7). É a beleza que somoschamados a difundir, como bomperfume de Cristo: a nossa oração,as nossas boas obras, o nossosacrifício pelos mais necessitados.É a alegria de evangelizar e, «umavez que sabeis isto, sereis felizes seo puserdes em prática» (Jo 13, 17).

Que Deus vos abençoe!

Homilia do Papa FranciscoParque Bicentenário,

Quito

Terça-feira, 7 de julho de2015

A palavra de Deus convida-nos aviver a unidade, para que o mundoacredite.

Imagino aquele sussurro de Jesusna Última Ceia como um grito nestaMissa que celebramos no «Parque

Bicentenário». Imaginemos juntos: oBicentenário daquele Grito deIndependência da Hispano-América.Foi um grito, nascido da consciênciada falta de liberdade, de estar a serespremidos, saqueados, «sujeitosàs conveniências dos poderosos deturno» (Evangelii gaudium, 213).

Queria que hoje os dois gritos...queria que hoje os dois gritoscoincidissem sob o belo desafio daevangelização. Não a partir depalavras altissonantes, nem comtermos complicados, mas que nasça

da «alegria do Evangelho», que«enche o coração e a vida inteiradaqueles que se encontram comJesus. Quantos se deixam salvarpor Ele são libertados do pecado,da tristeza, do vazio interior, doisolamento», da consciência isolada(EG 1). Nós todos juntos, aquireunidos à volta da mesa comJesus, somos um grito, um clamornascido da convicção de que a suapresença nos impele para aunidade, «indica um horizonteestupendo, oferece um banqueteapetecível» (EG 14).

«Pai, que sejam um, para que omundo creia»: assim o almejou,levantando os olhos ao céu. A Jesusbrota-Lhe este pedido num contextode envio: Como Tu me enviaste aomundo, Eu também os enviei aomundo. Naquele momento, o Senhorestá a experimentar na sua própriacarne o pior deste mundo que Ele,apesar de tudo, ama loucamente:intrigas, desconfianças, traição, masnão esconde a cabeça, não selamenta. Também nós constatamosno dia-a-dia que vivemos nummundo dilacerado pelas guerras e a

violência. Seria superficial pensarque a divisão e o ódio afectamapenas as tensões entre os paísesou os grupos sociais. Na realidade,são manifestação daquele«generalizado individualismo» quenos separa e coloca uns contra osoutros (cf. EG 99), sãomanifestação da ferida do pecadono coração das pessoas, cujasconsequências fazem sofrer tambéma sociedade e a criação inteira. Éprecisamente a este mundodesafiador, com os seus egoísmos,que Jesus nos envia, e a nossa

resposta não é fazer-nos dedistraídos, argumentar que nãotemos meios ou que a realidade nossupera. A nossa resposta repete oclamor de Jesus e aceita a graça ea tarefa da unidade.

Àquele grito de liberdade, queprorrompeu há pouco mais de200anos, não lhe faltou nem convicçãonem força, mas a história conta-nosque só se tornou contundentequando deixou de lado ospersonalismos, o afã de liderançasúnicas, a falta de compreensão

doutros processos libertadores comcaracterísticas diferentes, mas nãopor isso antagónicas.

Poderá a evangelização ser veículode unidade de aspirações,sensibilidades, esperanças e até decertas utopias? É claro que sim;isso mesmo acreditamos egritamos. «Enquanto no mundo,especialmente nalguns países, sereacendem várias formas deguerras e conflitos, nós, cristãos,queremos insistir na proposta dereconhecer o outro, de curar as

feridas, de construir pontes, deestreitar laços e de nos ajudarmos acarregar as cargas uns dos outros»(EG 67). O anseio de unidade supõea doce e reconfortante alegria deevangelizar, a convicção de quetemos um bem imenso paracomunicar e de que, comunicando-o,ganha raízes; e qualquer pessoaque tenha vivido esta experiênciaadquire maior sensibilidade face àsnecessidades dos outros (cf. EG 9).Daí a necessidade de lutar pelainclusão a todos os níveis – lutarpela inclusão a todos os níveis! –

evitando egoísmos, promovendo acomunicação e o diálogo,encorajando a colaboração. Épreciso confiar o coração aocompanheiro de estrada, sem medonem difidência. «O abrir-se ao outroé algo de artesanal, porque a paz éartesanal» (EG 244); é impensávelque brilhe a unidade, se amundanidade espiritual nos faz estarem guerra entre nós, numa buscaestéril de poder, prestígio, prazer ousegurança económica. E isso àcusta dos mais pobres, dos maisexcluídos, dos mais indefesos,

daqueles que não perdem a suadignidade, mesmo tendo-a golpeadaa cada dia.

Esta unidade já é uma acçãomissionária «para que o mundocreia». A evangelização nãoconsiste em fazer proselitismo – oproselitismo é uma caricatura daevangelização -, mas evangelizarconsiste em atrair os afastados como nosso testemunho, em aproximar-se humildemente daqueles que sesentem longe de Deus na Igreja,aproximar-se daqueles que se

sentem julgados e condenados apriori por aqueles que se sentemperfeitos e puros. Aproximar-nosdaqueles que têm medo ou dosindiferentes, para lhes dizer: «OSenhor também te chama paraseres parte do seu povo, e fá-locom grande respeito e amor» (EG113). Porque o nosso Deus nosrespeita mesmo nas nossasbaixezas e no nosso pecado. Comquanta humildade e com quantorespeito o texto do Apocalipsedescreve esta chamada do Senhor:«Eis que estou à porta, e bato»

Queres abrir? Jesus não força, nãofaz saltar a fechadura, simplesmente“toca a campainha”, batesuavemente e espera. Este é onosso Deus!

A missão da Igreja, enquantosacramento da salvação, condizcom a sua identidade de povo emcaminho, com a vocação deincorporar na sua marcha todas asnações da terra. Quanto maisintensa for a comunhão entre nós,tanto mais sairá favorecida a missão(cf. João Paulo II,Pastores gregis,

22). Colocar a Igreja em estado demissão pede-nos para recriarmos acomunhão, pois já não se trataduma acção voltada só para fora;fazemos missão também paradentro e missão para fora,manifestando-nos como semanifesta uma «mãe que vai aoencontro», como se manifesta «umacasa acolhedora, uma escolapermanente de comunhãomissionária» (Aparecida 370).

Este sonho de Jesus é possível,porque nos consagrou: «Totalmente

Me consagro - diz - para quetambém eles sejam consagradospor meio da Verdade». A vidaespiritual do evangelizador nascedesta verdade tão profunda, quenão se confunde com uns poucosmomentos religiosos queproporcionam algum alívio; umaespiritualidade talvez superficial.Jesus consagra-nos, para suscitarum encontro com Ele, de pessoa àpessoa, um encontro que alimenta oencontro com os outros, ocompromisso no mundo e a paixãoevangelizadora (cf. EG 78).

A intimidade de Deus,incompreensível para nós, é-nosrevelada através de imagens quenos falam de comunhão,comunicação, doação, amor. Porisso a união, que Jesus pede, não éuniformidade, mas a «multiformeharmonia que atrai» (EG 117). Aimensa riqueza da variedade, damultiplicidade que alcança a unidadetodas as vezes que fazemosmemória daquela Quinta-feira Santa,afasta-nos de tentações depropostas unionistas mais próximasde ditaduras, de ideologias ou de

sectarismos. A proposta de Jesus éconcreta, não é de ideia. Éconcreta: “- vai e faz o mesmo”,disse Jesus para aquele homem quelhe perguntara: - Quem é o teupróximo? Depois de ter contado aparábola do bom samaritano, Jesusdisse: “- vai e faz o mesmo”.

A proposta de Jesus também não éum arranjo feito à nossa medida, noqual ditamos as condições,escolhemos alguns membros eexcluímos os outros. Estareligiosidade de elite… Jesus reza

para que façamos parte dumagrande família, na qual Deus énosso Pai, todos nós somos irmãos.Ninguém é excluído e isto não sefundamenta no facto de ter osmesmos gostos, as mesmaspreocupações, os mesmos talentos.Somos irmãos, porque Deus noscriou por amor e, por pura iniciativad’Ele, nos destinou para sermosseus filhos (cf. Ef 1, 5). Somosirmãos, porque «Deus enviou aosnossos corações o Espírito do seuFilho, que clama: “Abbà! – Pai!”» (Gl4, 6). Somos irmãos, porque,

justificados pelo sangue de CristoJesus (cf. Rm 5, 9), passámos damorte à vida, fazendo-nos «co-herdeiros» da promessa (cf. Gl 3,26-29; Rm 8, 17). Esta é a salvaçãoque Deus realiza e a Igrejaalegremente anuncia: fazer partedum «nós» que chega até o «nós»divino.

O nosso grito, neste lugar quelembra aquele primeiro da liberdade,actualiza o grito de São Paulo: «Aide mim, se eu não evangelizar!» (1Cor 9, 16). É tão urgente e

premente como o daqueles desejosde independência. Possui fascíniosemelhante, possui o mesmo fogoque atrai. Irmãos, tende os mesmossentimentos de Jesus: Sede umtestemunho de comunhão fraternaque se torne resplandecente!

E que belo seria se todos pudessemadmirar como nos preocupamos unspelos outros; como mutuamente nosanimamos e fazemos companhia. Éo dom de si que estabelece arelação interpessoal; esta não segera dando «coisas», mas dando-se

a si mesmo. Em qualquer doação, éa própria pessoa que se oferece.«Dar-se» significa deixar actuar emsi mesmo toda a força do amor queé o Espírito de Deus e, assim, darlugar à sua força criadora. E dar-semesmo nos momentos mais difíceis,como naquela Quinta-feira Santa deJesus, quando Ele sabia como seteciam as traições e as intrigas, masdeu-se, deu-se a nós com o seuprojecto de salvação. Dando-se, ohomem volta a encontrar-se a simesmo com a verdadeira identidadede filho de Deus, semelhante ao Pai

e, como Ele, doador de vida, irmãode Jesus, de Quem dá testemunho.Isto é evangelizar, esta é a nossarevolução – porque a nossa fé ésempre revolucionária – este é onosso grito mais profundo econstante.

Palavras improvisadas ao final damissa no Parque Bicentenário:

Queridos irmãos,

Agradeço-vos por estaconcelebração, por ter-nos reunidos

junto do Altar do Senhor, que nospede que sejamos um, que sejamosverdadeiramente irmão, que a Igrejaseja uma casa de irmãos. Que Deusvos abençoe e peço-vos que nãovos esqueçais de rezar por mim.

Discurso do PapaFrancisco Pontifícia

Universidade Católica,Quito

Terça-feira, 7 de Julho de2015

Senhor Reitor,

Distintas Autoridades,

Queridos professores e alunos,

Amigos e amigas!

Sinto uma grande alegria por estarconvosco, nesta tarde, na PontifíciaUniversidade do Equador, que,desde há quase 70 anos, cumpre eatualiza a fecunda missão educativada Igreja ao serviço dos homens emulheres desta nação. Agradeço asamáveis palavras com que mereceberam e transmitiram aspreocupações e as esperanças quevos surgem ao enfrentar o desafio,pessoal e social, da educação.

No Evangelho, acabamos de ouvircomo Jesus, o Mestre, ensinava amultidão e o pequeno grupo dos

discípulos, adaptando-se à suacapacidade de compreensão. Fazia-o com parábolas, como a dosemeador (Lc 8, 4-15), de formaque todos pudessem entender.Jesus não procura «doutorear»;pelo contrário, quer chegar aocoração do homem, à suainteligência, à sua vida, para queesta dê fruto.

A parábola do semeador fala-nos decultivar. Mostra-nos os tipos deterra, os tipos de semente, os tiposde fruto e a relação que se geraentre eles. Já desde o Gênesis,

Deus sussurra ao homem esteconvite: cultivar e cuidar.

Não se limita a conceder-lhe a vida;dá-lhe a terra, a criação. Não só lhedá uma companheira e infinitaspossibilidades; mas faz-lhe tambémum convite, dá-lhe uma missão.Convida-o a participar na sua obracriadora, dizendo: cultiva! Dou-te assementes, a terra, a água, o sol;dou-te as tuas mãos e as dos teusirmãos. Aqui o tens; também é teu.É um presente, um dom, uma oferta.Não é algo de adquirido, comprado;mas antecede-nos e ficará depois

de nós.

É um presente dado por Deus para,juntamente com Ele, podermos fazê-lo nosso. Deus não quer umacriação para Si, para Se ver a Simesmo. Muito pelo contrário! Acriação é um dom para serpartilhado. É o espaço que Deusnos dá, para construir conosco, paraconstruir um nós. O mundo, ahistória, o tempo é o lugar ondevamos construindo o nós com Deus,o nós com os outros, o nós com aterra. A nossa vida encerra sempreeste convite, um convite mais ou

menos consciente que semprepermanece.

Mas notemos uma peculiaridade. Nanarração do Génesis, ao lado dapalavra cultivar, apareceimediatamente outra: cuidar. Umaexplica-se a partir da outra. Andamde mãos dadas. Não cultiva quemnão cuida, e não cuida quem nãocultiva.

Somos convidados não só aparticipar na obra criadoracultivando-a, fazendo-a crescer,desenvolvendo-a, mas também a

cuidá-la, protegê-la, guardá-la. Hoje,este convite impõe-se-nosforçosamente. Já não como umamera recomendação, mas comouma necessidade devido ao «malque provocamos [à terra] por causado uso irresponsável e do abuso dosbens que Deus nela colocou.Crescemos a pensar que éramosseus proprietários e dominadores,autorizados a saqueá-la. (…) Porisso, entre os pobres maisabandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida edevastada» (LS 2).

Existe uma relação entre a nossavida e a da nossa mãe terra; entre anossa existência e o dom que Deusnos deu. «O ambiente humano e oambiente natural degradam-se emconjunto; e não podemos enfrentaradequadamente a degradaçãoambiental, se não prestarmosatenção às causas que têm a vercom a degradação humana e social»(LS 48). Ora, tal como dizemos que«se degradam», assim tambémpodemos dizer que «se apoiam epodem transfigurar». É uma relaçãoque encerra uma possibilidade tantode abertura, transformação e vida,

como de destruição e morte.

Uma coisa é clara! Não podemoscontinuar a desinteressar-nos danossa realidade, dos nossos irmãos,da nossa mãe terra. Não nos é lícitoignorar o que está a acontecer aonosso redor, como se determinadassituações não existissem ou nãotivessem nada a ver com a nossarealidade.

Não cessa de ecoar, com força,esta pergunta de Deus a Caim:«Onde está o teu irmão?» Eu meinterrogo se a nossa resposta

continuará a ser: «Sou, porventura,guarda de meu irmão?» (Gn 4, 9).

Eu vivo em Roma e no inverno fazfrio. Aconteceu muito próximo aoVaticano, um idoso que morreu defrio. Isso não foi noticias nos jornaisdiários: um pobre que morre defome e frio. Contudo se todas asbolsas econômicas caem um ou dostrês pontos é um desastre mundial.Pergunto: onde está seu irmão?Peço a todos que façam essapergunta, onde está seu irmão?

Neste contexto universitário, seria

bom interrogarmo-nos sobre anossa educação a respeito destaterra que clama ao céu.

Os nossos centros educativos sãouma sementeira, uma possibilidade,terra fértil que devemos cuidar,estimular e proteger. Terra fértil,sedenta de vida.

Convosco, educadores, eu meinterrogo: Velais pelos vossosalunos, ajudando-os a desenvolverum espírito crítico, um espírito livre,capaz de cuidar do mundo atual?Um espírito que seja capaz de

procurar novas respostas para osmúltiplos desafios que a sociedadenos coloca? Sois capazes de osestimular para não sedesinteressarem da realidade queos rodeia? Como entra, noscurrículos universitários ou nasdiferentes áreas do trabalhoeducativo, a vida que nos rodeiacom as suas perguntas,interpelações, controvérsias? Comogeramos e acompanhamos o debateconstrutivo que nasce do diálogo emprol de um mundo mais humano?

Há uma reflexão que nos envolve a

todos, famílias, centros educativos,professores: Como ajudamos osnossos jovens a não olhar um grauuniversitário como sinônimo de maiorposição, dinheiro, prestígio social?Ajudamos a ver esta preparaçãocomo sinal de maiorresponsabilidade perante osproblemas de hoje, perante ocuidado do mais pobre, perante ocuidado do meio ambiente?

E convosco, queridos jovens,presente e futuro do Equador,semente de transformação destasociedade, gostaria de me

interrogar: Sabeis que este tempode estudo não é só um direito, masum privilégio que tendes? Quantosamigos, conhecidos oudesconhecidos, queriam ter um lugarnesta casa, mas, por váriascircunstâncias, não conseguiram?Em que medida o nosso estudo nosajuda a ser solidários com eles.

As comunidades educativas têm umpapel fundamental, essencial naconstrução da cidadania e dacultura. Não basta realizar análises,descrições da realidade; énecessário gerar as áreas, espaços

de verdadeira pesquisa, debatesque gerem alternativas para asproblemáticas especialmente dehoje.

Perante a globalização doparadigma tecnocrático que tende a«crer que toda a aquisição de poderseja simplesmente progresso,aumento de segurança, de utilidade,de bem-estar, de força vital, deplenitude de valores, como se arealidade, o bem e a verdadedesabrochassem espontaneamentedo próprio poder da tecnologia e daeconomia» (LS 105), é-nos pedido,

com urgência, que nos animemos apensar, a debater sobre a nossasituação atual, sobre o tipo decultura que queremos oupretendemos não só para nós, mastambém para os nossos filhos, paraos nossos netos. Esta terra,recebemo-la como herança, comoum dom, como um presente. Far-nos-á bem interrogarmo-nos: Comoqueremos deixá-la? Qual é aorientação, o sentido que queremosdar à existência? Com que finalidadepassamos por este mundo? Paraque lutamos e trabalhamos? (LS160).

As iniciativas individuais são sempreboas e fundamentais, mas é-nospedido para dar um passo mais:animar-nos a olhar a realidadeorganicamente e não de formafragmentária; a fazer perguntas quenos envolvam a todos, uma vez que«tudo está interligado» (LS 138).

Como Universidade, como centroseducativos, como professores eestudantes, a vida desafia-vos aresponder a esta pergunta: Paraque precisa de nós esta terra?Onde está o teu irmão?

Que o Espírito Santo nos inspire eacompanhe, pois foi Ele que nosconvocou, convidou, deu aoportunidade e, por sua vez, aresponsabilidade de dar o melhor denós mesmos. Oferece-nos a força ea luz de que precisamos. É omesmo Espírito que, no primeiro diada criação, pairava sobre as águascom a vontade de transformar, dedar vida. É o mesmo Espírito quedeu aos discípulos a força doPentecostes. É o mesmo Espíritoque não nos abandona, fazendo-seum conosco para encontrarmoscaminhos de vida nova. Seja Ele o

nosso companheiro e nosso mestrede viagem! Muito obrigado.

Discurso à sociedade civilQuito

Terça-feira, 07 de julhode 2015

Queridos amigos!

Boa tarde. Peço que me perdoeispor colocar-me de costas, masnecessito da luz sobre o papel; nãovejo bem…Rejubilo por estarconvosco, homens e mulheres querepresentais e dinamizais a vidasocial, política e econômica do país.

Mesmo antes de entrar na igreja, oSenhor Prefeito entregou-me aschaves da cidade. Deste modo,posso dizer que aqui, em SanFrancisco de Quito, sou de casa. Avossa prova de confiança e carinho,ao abrir-me as portas, permite-meapresentar-vos algumas chaves daconvivência cívica a começar da vidafamiliar.

A nossa sociedade ganha, quandocada pessoa, cada grupo social sesente verdadeiramente de casa.Numa família, os pais, os avós, osfilhos são de casa; ninguém fica

excluído. Se alguém tem umadificuldade, mesmo grave, ainda queseja por culpa dele, os outroscorrem em sua ajuda, apoiam-no; asua dor é de todos. Não deveria serassim também na sociedade? E, noentanto, as nossas relações sociaisou o jogo político baseiam-se muitasvezes na luta, no descarte. A minhaposição, a minha ideia, o meuprojeto consolidam-se, se for capazde vencer o outro, de me impor. Istoé ser família? Nas famílias, todoscontribuem para o projeto comum,todos trabalham para o bemcomum, mas sem anular o indivíduo;

pelo contrário, sustentam-no,promovem-no. As alegrias e aspenas de cada um são assumidaspor todos. Isto é ser família! Oh sepudéssemos ver o adversáriopolítico, o vizinho de casa com osmesmos olhos com que vemos osfilhos, esposas ou maridos, pais oumães. Amamos a nossa sociedade?Amamos o nosso país, acomunidade que estamos tentandoconstruir? Amamo-la nos conceitosproclamados, no mundo das ideias?Amemo-la mais com as obras doque com as palavras! Em cadapessoa, em sua situação concreta,

na vida que compartilhamos. O amortende sempre à comunicação; nuncaao isolamento.

A partir deste afeto, surgirão gestossimples que fortalecem os vínculospessoais. Já em várias ocasiões,me referi à importância da famíliacomo célula da sociedade. Noâmbito familiar, as pessoasrecebem os valores fundamentais doamor, da fraternidade e do respeitomútuo, que se traduzem em valoressociais fundamentais: a gratuidade,a solidariedade e a subsidiariedade.

Para os pais, todos os filhos,embora cada um tenha a sua índoleprópria, são igualmente adoráveis.Mas, quando a criança se nega apartilhar o que recebe gratuitamentedeles, quebra esta relação. O amordos pais ajuda-o a sair do seuegoísmo, para que aprenda a vivercom os demais, a ceder para seabrir ao outro. No âmbito social, istosupõe assumir que a gratuidade nãoé complementar, mas requisitonecessário da justiça. O que somose temos foi-nos confiado para ocolocarmos ao serviço dos outros; anossa tarefa é fazer com que

frutifique em boas obras. Os bensestão destinados a todos e, emborauma pessoa ostente o seu título depropriedade, sobre eles pesa umahipoteca social. Assim o conceitoeconômico de justiça, baseado noprincípio de compra-venda, ésuperado pelo conceito de justiçasocial, que defende o direitofundamental da pessoa a uma vidadigna. A exploração dos recursosnaturais, tão abundantes noEquador, não deve apostar nobenefício imediato. Seradministradores desta riqueza que

recebemos compromete-nos com asociedade no seu conjunto e com asgerações futuras, às quais nãopoderemos legar este patrimôniosem o devido cuidado do meioambiente, sem uma consciência degratuidade que brota dacontemplação do mundo criado.Hoje estão aqui connosco irmãosdos povos indígenas da AmazôniaEquatoriana; esta área é das «maisricas em variedade de espécies, emespécies endêmicas, raras ou commenor grau de efetiva proteção. (…)Requerem um cuidado particularpela sua enorme importância para o

ecossistema mundial [pois têm] umabiodiversidade de enormecomplexidade, quase impossível deconhecer completamente, masquando estas florestas sãoqueimadas ou derrubadas paradesenvolver cultivos, em poucosanos perdem-se inúmeras espécies,ou tais áreas transformam-se emáridos desertos» (cf. LS 37-38). Láo Equador – juntamente com osoutros países detentores de franjasamazônicas – tem uma oportunidadepara exercer a pedagogia dumaecologia integral. Recebemos omundo como herança dos nossos

pais, mas também comoempréstimo das gerações futuras, aquem o temos de devolver.

Da fraternidade vivida na família,nasce a solidariedade na sociedade,que não consiste apenas em dar aonecessitado, mas em sermosresponsáveis uns dos outros. Sevirmos no outro um irmão, ninguémpode ficar excluído, marginalizado.

O Equador, como muitos povoslatino-americanos, passa hoje porprofundas mudanças sociais eculturais, novos desafios que

requerem a participação de todosos atores sociais. A emigração, aconcentração urbana, oconsumismo, a crise da família, afalta de trabalho, as bolsas depobreza produzem incerteza etensões que constituem umaameaça para a convivência social.As normas e as leis, bem como osprojetos da comunidade civil, devemprocurar a inclusão, abrir espaçosde diálogo, de encontro e, assim,deixar como uma triste recordaçãoqualquer tipo de repressão, decontrole excessivo e a perda deliberdade. A esperança dum futuro

melhor passa por ofereceroportunidades reais aos cidadãos,especialmente aos jovens, criandoemprego, com um crescimentoeconômico que chegue a todos enão se fique pelas estatísticasmacroeconômicas, com umdesenvolvimento sustentável quegere um tecido social firme e bemcoeso.

Por fim, o respeito pelo outro que seaprende na família traduz-se, naesfera social, em subsidiariedade.Assumir que a nossa opção não énecessariamente a única legítima é

um sadio exercício de humildade. Aoreconhecer a parte boa que há nosoutros, mesmo com as suaslimitações, vemos a riqueza queencerra a diversidade e o valor dacomplementaridade. Os homens, osgrupos têm direito de percorrer oseu caminho, ainda que isso àsvezes suponha cometer erros. Norespeito da liberdade, a sociedadecivil é chamada a promover cadapessoa e agente social, para quepossa assumir o seu papel econtribuir, a partir da suaespecificidade, para o bem comum.O diálogo é necessário, fundamental

para chegar à verdade, que nãopode ser imposta, mas procuradacom sinceridade e espírito crítico.Numa democracia participativa,cada uma das forças sociais, osgrupos indígenas, os afro-equatorianos, as mulheres, osgrupos de cidadãos e quantostrabalham para a comunidade nosserviços públicos são protagonistasimprescindíveis neste diálogo. No-lodizem com a maior eloquência asparedes, pátios e claustros destelugar: baseada sobre elementos dacultura Inca e Caranqui, a belezadas suas proporções e formas, o

arrojo dos seus diferentes estiloscombinados de modo notável, asobras de arte designadas pelo nomede «escola quitenha», condensamum longo diálogo, com sucessos efracassos, da história equatoriana.O hoje está cheio de beleza, e se éverdade que no passado houveerros e abusos – como negá-lo? –podemos afirmar que a amálgamairradia tanta exuberância que nospermite olhar o futuro com muitaesperança.

Também a Igreja quer colaborar nabusca do bem comum, com as suas

atividades sociais e educativas,promovendo os valores éticos eespirituais, sendo um sinal proféticoque leve um raio de luz e esperançaa todos, especialmente aos maisnecessitados.

Muito obrigado por estarem aqui,por me ouvirem. Peço-vos, porfavor, que levem as minhas palavrasde encorajamento aos grupos querepresentais nas distintas esferassociais. O Senhor conceda, àsociedade civil que representais, seresse campo propício onde se vivamestes valores.

Discurso do Papa ao cleroe religiosos em Quito

Quarta-feira, 8 de Julhode 2015

Bom dia, irmãos e irmãs

Nestes dois dias, 48 horas, que tivecontacto convosco, notei que haviaalgo estranho – perdão – algoestranho no povo equatoriano. Ondequer que vá, a recepção é semprealegre, feliz, amigável, religiosa,piedosa, em todos os lugares. Mas

no que se refere à piedade, nomodo, por exemplo, de pedir abênção do mais idoso ao wawa, aprimeira coisa que que se aprende éfazer este gesto [de unir as mãos].Havia algo diferente, e eu tambémtive a tentação, como o bispo deSucumbíos, de perguntar: Qual é areceita deste povo? Qual é? E fiqueidando voltas na minha cabeça erezava; Perguntei a Jesus váriasvezes na oração: O que tem estepovo de diferente? E esta manhã,orando, lembrei-me da consagraçãoao Sagrado Coração.

Eu acho que devo transmiti-lo comouma mensagem de Jesus: Todaessa riqueza que tendes, riquezaespiritual, piedade, profundidade,vem de ter tido a coragem – porqueeram tempos muito, muito difíceis –,a coragem de consagrar a nação aoCoração de Cristo, esse coraçãodivino e humano que nos ama tanto.E noto-vos um pouco com isso:divinos e humanos. Claro que soispecadores, eu também... mas oSenhor perdoa tudo. Protegei estarealidade! E então, alguns anosdepois, veio a consagração ao

Coração de Maria. Não vosesqueçais: essa consagração é ummarco na história do povo doEquador e percebo como que essagraça que tendes, essa piedade,essa realidade que vos tornadiferentes, vem dessa consagração.

Hoje eu tenho que falar aossacerdotes, seminaristas, religiosos,religiosas e dizer-vos alguma coisa.Tenho um discurso preparado, masnão quero lê-lo. Portanto, eu oentrego ao Presidente daConferência dos Religiosos para

torná-lo público mais tarde.

E eu pensava na Virgem, pensavaem Maria. Há duas palavras deMaria – agora a memória estáfalhando-me –, não sei se ela disseoutra palavra: «Faça-se em mim».Bem, de facto, Ela pediu umaexplicação ao anjo sobre por que atinham escolhido. Mas, mesmoassim, Ela diz: «Faça-se em mim».E outra palavra: «Fazei o que Elevos disser». Maria não protagonizoucoisa alguma. Ele discipuleou a vidainteira. A primeira discípula de seu

Filho. E Ela tinha consciência de quetudo o que possuía era puro dom deDeus. A consciência da gratuidade.Por isso, «Faça-se» e «fazei», quese manifeste a gratuidade de Deus.Religiosas, religiosos, sacerdotes,seminaristas, todos os dias, voltai,fazei este caminho de volta para agratuidade com que Deus vosescolheu. Vós não pagastes aentrada para entrar no seminário,para entrar na vida religiosa. Vósnão o merecestes. Se algumreligioso, sacerdote ou seminaristaou uma freira que está aqui acredita

que o merecia, que levante a mão.Tudo é gratuito. E a vida inteira deum religioso, de uma religiosa, deum sacerdote e de um seminaristatem de ir por este caminho – e, jáque estamos aqui, digamos também–, a vida dos bispos têm de ir poreste caminho da gratuidade, voltartodos os dias: «Senhor, hoje eu fizisso; aquilo deu certo; tive estadificuldade; todas essas coisas eufiz, mas ... tudo vem de Ti, tudo é degraça». Essa gratuidade. Somosobjecto da gratuidade de Deus. Seesquecermos disso, pouco a pouco,

vamos nos considerandoimportantes para nós. E assim«Veja só o fulano, quantas obrasestá fazendo» ou «Veja só, fizerama este outro bispo… como éimportante, este aqui, fizeram-nomonsenhor, ou a este tal…». Eassim lentamente vamo-nosafastando daquilo que é a base,daquilo que Maria nunca se afastou:a gratuidade de Deus. Um conselhode irmão: todos os dias, à noitequando poderia ser melhor, antes deir dormir, olhes para Jesus e diz-lhe:«Deste-me tudo de graça», e volta a

situar-te. Assim, quando memudarem de destino, ou quandohouver uma dificuldade, nãoreclamo, porque tudo é gratuito, eunão mereço nada. Isso foi o que fezMaria.

São João Paulo II, na RedemptorisMater – que recomendo que leiais;sim, tende-la em mãos, lede-la. Éverdade, o Papa São João Paulo IItinha um estilo de pensamentocircular, de professor, mas era umhomem de Deus; então é preciso lê-la várias vezes para poder obter

todo o suco que está contido nela –e ele diz que Maria – não me lembrobem a frase, estou a citar, mas oque eu quero é mencionar o facto –no momento da cruz da suafidelidade poderia ter querido dizer:«E falaram-me que Ele [Jesus] iriasalvar Israel! Enganaram-me!». Elanão o disse. Nem se permitiu pensarnisso, porque era a mulher quesabia que tinha recebido tudogratuitamente. Um conselho deirmão e de pai: todas as noites paivoltai a situar-vos na gratuidade. Edizei: «Faça-se. Obrigado por tudo

que Tu me deste».

A segunda coisa que eu queria dizeré que cuideis da saúde, mas acimade tudo, que cuideis para não cairnuma doença, uma doença que émeio perigosa, ou melhor, que éinteiramente perigosa para nós,aqueles que o Senhor chamougratuitamente para O seguir ouservir. Não caiais no Alzheimerespiritual; não percais a memória,especialmente a memória de ondeeu fui tirado. Pensemos na cena dequando o profeta Samuel foi enviado

para ungir o rei de Israel: vai aBelém, até à casa de um senhorchamado Jessé, que tem de 7 ou 8filhos -não sei bem –, e Deus lhe dizque entre estes filhos estará o rei.E, claro, ele os vê e diz: «Deve sereste», porque o mais velho era alto,grande, bonito, bem presentado,parecia valente... E Deus o diz:«Não, não é este». O olhar de Deusé diferente daquele dos homens. Eassim fez passar todos os filhos deJessé e Deus o diz: «Não, não é». Eo profeta se encontra sem saber oque fazer; e em seguida, pergunta a

Jessé: «Então, não tens outrofilho?». E ele responde: "Sim, há omenor que está a cuidar das cabrase das ovelhas». «Mande-o chamar»e eis que vem o rapazinho, quedevia ter entre 17 e 18 anos – nãosei bem – e Deus o diz: «É este».Tiraram-no do cuidado do rebanho.E outro profeta, quando Deus lhe dizpara fazer certas coisas como umprofeta, contesta: «Mas quem soueu, se fui tirado do cuidado dorebanho». Não vos esqueçais deonde fostes tirados. Não renegueisas raízes.

Vê-se que São Paulo intuía esteperigo de perder a memória e aoseu filho mais querido, o bispoTimóteo, a quem ordenara, lhe dáconselhos pastorais, entre os quaishá um que toca o coração: «Não teesqueças da fé que tinham a tua avóe tua mãe», o que significa dizer:«Não te esqueças de onde tetiraram, não te esqueças das tuasraízes, não te sintas promovido». Agratuidade é uma graça que nãopode conviver com a promoção e,quando um sacerdote, umseminarista, um religioso, uma

religiosa entra na carreira – não odigo por mal, na carreira humana –começa a ficar doente de Alzheimerespiritual e começa a perdermemória de onde foi tirado.

Dois princípios para vós sacerdotes,consagrados e consagradas: todosos dias renovai o sentimento de quetudo é gratuito, o sentimento degratuidade na eleição de cada umde vós – ninguém entre nós amerece – e peçais a graça de nãoperder a memória, de não sentir-semais importante. É muito triste

quando alguém vê um sacerdote ouum consagrado, consagrada, que nasua casa falava o dialecto ou falavaoutra língua, uma dessas nobreslínguas antigas que os povos têm –o Equador possui muitas – e é muitotriste quando essa pessoa esquecea língua; é muito triste quando essapessoa não quer falar nessa língua.Isso significa que se esqueceram deonde foram tirados. Não vosesqueçais disso, pedi a graça damemória, são estes os doisprincípios que eu queria destacar.

E estes dois princípios, se os viveis– mas todos os dias, trata-se de umtrabalho diário, todas as noiteslembrai destes dois princípios e pedia graça – se viveis estes doisprincípios, os vivereis por meio deduas atitudes.

Em primeiro lugar, o serviço. Deusme escolheu, me tirou de algumlugar. Para quê? Para servir. Eservir num serviço que me épeculiar. «Mas eu devo ter o meutempo… devo fazer essa coisa…não posso…, que eu já estou por

fechar a secretaria… sim é verdadeque eu tinha que ir abençoar ascasas mas… não posso, estoucansado…» ou – aqui falo com asfreirinhas: «hoje se transmite umabela telenovela na televisão…».Serviço, servir, servir, e não fazeroutra coisa, e servir quandoestamos exaustos e servir quandoas pessoas nos cansam.

Dizia-me um velho padre, que portoda a sua vida foi professor emcolégios e na universidade,leccionava literatura, letras, era um

génio… Quando se aposentou,pediu ao provincial de envia-lo paraum bairro pobre, um desses bairrosformados de pessoas que vêm, quemigram à procura de trabalho,pessoas muito simples. E estereligioso, uma vez por semana, iapara a sua comunidade religiosa econversava; ele era muitointeligente. E a comunidade era umacomunidade de faculdade deteologia; Ele falava com os outrossacerdotes da teologia no mesmonível, mas um dia ele disse a umdeles: «Vós que sois

[professores]... Quem aqui dá aulassobre o tratado da Igreja? Oprofessor levanta a mão: «Sou eu».«Faltam duas teses no teu tratado».«Quais?». «Que o santo Povo fielde Deus é essencialmente olímpico,ou seja, faz o que quer, eontologicamente cansativo». E issotem muita sabedoria, porque quemvai pelo caminho do serviço devedeixar-se cansar sem perder apaciência, porque está ao serviço,nenhum momento lhe pertence.Devo estar para servir, servir naquiloque devo fazer, servir diante do

sacrário, pedindo pelo meu povo,pedindo pelo meu trabalho, pelaspessoas que Deus me confiou.

Serviço, misture-o com a gratuidadee então... [se viverá] aquilo queJesus disse: «O que de graçarecebestes, de graça deveis dar».Por favor, por favor, não cobrem agraça; por favor, que a nossapastoral seja gratuita. É muito feioquando alguém vai perdendo essesentido de gratuidade... Sim, fazcoisas boas, mas perdeu essesentido.

E a segunda atitude que se nota emum consagrado, uma consagrada,um sacerdote que vive estagratuidade e esta memória – estesdois princípios dos quais falei aoinício, memória e gratuidade – é ojúbilo e a alegria. E isso é um domde Jesus, e é um dom que Ele dá,que Ele nos dá se o pedimos e senão nos esqueçamos daquelas duascolunas da nossa vida sacerdotal oureligiosa, que são o sentido dagratuidade, renovado todos os dias,e não percamos a memória de ondenos tiraram.

Desejo-vos isso. «Sim, Padre, tunos falaste que a receita do nossopovo talvez fosse... que somosassim por causa da consagração aoSagrado Coração». Sim, isso éverdade, mas eu vos proponho outrareceita, que está na mesma linha, namesma linha do Coração de Jesus:um sentido de gratuidade. Ele fez-senada, abaixou-se, humilhou-se, fez-se pobre para nos enriquecer com asua pobreza. Pura gratuidade. Esentido de memória... e fazemosmemória das maravilhas que oSenhor fez na nossa vida.

Que o Senhor vos conceda estagraça a todos, nos conceda a todosnós que estamos aqui, e quecontinue – estava por dizer “apremiar” – que continue a abençoareste povo equatoriano a quemtendes que servir e sois chamados aservir. Que Deus continue aabençoá-lo com essa peculiaridadetão especial que eu notei desde oinício, ao chegar aqui. Que Jesusvos abençoe e a Virgem Maria voscuide.

Rezemos juntos ao Pai, que nos deu

tudo gratuitamente, que nos mantéma memória de Jesus connosco. [PaiNosso ...] Que o Deus Todo-Poderoso vos abençoe, Pai, Filho eEspírito Santo. E, por favor, porfavor, peço-vos que rezeis por mim,porque eu também sinto muitasvezes a tentação de me esquecerda gratuidade com a qual Deus meescolheu e de esquecer-me de ondeme tiraram. Pedi por mim.

Discurso preparado pelo SantoPadre:

Queridos irmãos e irmãs!

Trago aos pés de Nossa Senhorade Quinche o que vivi nestes dias daminha visita; quero deixar no seuCoração os idosos e doentes comquem acabo de partilhar algunsmomentos na casa das Irmãs daCaridade, bem como todos osoutros encontros anteriores. Deixo-os no Coração de Maria, mastambém os deposito no vossocoração: sacerdotes, religiosos ereligiosas, seminaristas, para que,chamados a trabalhar na vinha do

Senhor, sejais guardiões de tudo oque este povo do Equador vive porentre lágrimas e alegrias.

A D. Lazzari, ao Padre Mina e àIrmã Sandoval agradeço as suaspalavras, que me dão motivo parapartilhar com todos vós algumascoisas relativas à nossa solicitudecomum pelo Povo de Deus.

No Evangelho, o Senhor convida-nosa aceitar a missão, sem pôrcondições. É uma mensagemimportante, que convém não

esquecer, ressoando, com umacento especial, neste Santuáriodedicado à Virgem daApresentação. Maria é exemplo dediscípula para nós, que, como Ela,recebemos uma vocação. A suaresposta confiante – «faça-se emmim segundo a tua palavra» –lembra-nos as suas palavras nasbodas de Caná: «Fazei o que Elevos disser» (Jo 2, 5). O seuexemplo é um convite a servir comoEla.

Na Apresentação da Virgem,

podemos encontrar algumassugestões para a nossa própriachamada. A Virgem Menina foi umpresente de Deus para os seus paise para todo o povo, que esperava alibertação. É um facto que se repetefrequentemente na Escritura: Deusresponde ao clamor do seu povo,enviando uma criança, frágil,destinada a trazer a salvação e que,ao mesmo tempo, restaura aesperança de uns pais idosos. Apalavra de Deus diz-nos que, nahistória de Israel, os juízes, osprofetas, os reis são um presente

do Senhor para fazer chegar a suaternura e misericórdia ao seu povo.São sinal de gratuidade de Deus: foiEle quem os elegeu, escolheu edestinou. Isto afasta-nos da auto-referencialidade, faz-noscompreender que já não nospertencemos, que a nossa vocaçãorequer que nos afastemos de todo oegoísmo, de toda a busca de lucromaterial ou compensação afectiva,como nos disse o Evangelho. Nãosomos mercenários, masservidores; viemos, não para serservidos, mas para servir, fazendo-o

com desprendimento total, sembastão nem bolsa.

Algumas tradições sobre ainvocação de Nossa Senhora deQuinche dizem-nos que Diego deRobles fez a imagem porencomenda dos índios Lumbicí.Diego não a fez por devoção, fê-lapara tirar proveito económico. Comonão lhe puderam pagar, levou-a aOyacachi e trocou-a por tábuas decedro. Mas Diego negou-se aatender o pedido daquele povo paraque lhes fizesse também um altar

para a imagem, até que, caindo docavalo, encontrou-se em perigo esentiu a protecção da Virgem.Voltou à aldeia e fez o pedestal daimagem. Todos nós também jáfizemos a experiência de um Deusque Se nos atravessa diante e que,na nossa realidade de caídos,derrubados, nos chama. Que avanglória e o mundanismo não nosfaçam esquecer onde Deus nosresgatou! Que a Virgem Maria deQuinche nos faça descer dos postosde ambições, interesses egoístas,cuidados excessivos de nós

mesmos!

A «autoridade», que os apóstolosrecebem de Jesus, não é para seupróprio benefício: os nossos donssão para renovar e construir aIgreja. Não vos negueis a partilhar,não resistais a dar, não vos fecheisna comodidade; sede mananciaisque transbordam e refrescam,especialmente a bem dos oprimidospelo pecado, a desilusão, o rancor(cf. EG 272).

O segundo traço que me evoca a

Apresentação da Virgem é aperseverança. Na sugestivaiconografia mariana desta festa, aVirgem Menina afasta-se de seuspais subindo a escadaria do Templo.Maria não olha para trás e, numaclara referência à advertênciaevangélica, caminha decididamentepara diante. Nós, como osdiscípulos do Evangelho, tambémnos pusemos a caminho para levar acada povo e lugar a boa nova deJesus. A perseverança na missãoimplica não mudar de casa paracasa, buscando onde nos tratem

melhor, onde haja mais recursos ecomodidades. Supõe unir a nossasorte à de Jesus até ao fim. Algunsrelatos das aparições da Virgem deQuinche dizem que uma «senhoracom um menino nos braços» visitouvárias tardes seguidas os indígenasde Oyacachi, quando estavamrefugiados por causa do assédiodos ursos. Várias vezes veio Mariaao encontro dos seus filhos; elesnão acreditaram nela, desconfiavamdaquela senhora, mas admiravam asua perseverança de voltar cadatarde ao pôr-do-sol. Saibamos

perseverar, mesmo que nosrejeitem, ainda que se faça noite ecresçam a confusão e os perigos.Perseverar neste esforço, sabendoque não estamos sozinhos, que é oPovo Santo de Deus que caminha.

De certo modo podemos ver, naimagem da Virgem Menina subindoao Templo, a Igreja que acompanhao discípulo missionário. Ao ladod’Ela, estão os seus pais, que Lhetransmitiram a memória da fé eagora, generosamente, A oferecemao Senhor para que possa seguir o

seu caminho; está a suacomunidade, representada no«séquito das virgens, suascompanheiras», com as lâmpadasacesas (cf. Sal 44, 15), nas quais osPadres da Igreja viram uma profeciade todos os que, imitando Maria,procuram sinceramente ser amigosde Deus, e estão os sacerdotes queesperam para A receber e que noslembram que, na Igreja, os pastorestêm a responsabilidade de acolhercom ternura e ajudar a discernircada espírito e cada chamada.

Caminhemos juntos, sustentando-nos uns aos outros e peçamos, comhumildade, o dom da perseverançaao serviço deles.

Nossa Senhora de Quinche foiocasião de encontro, de comunhão,para este lugar que, desde ostempos dos Incas, se tornara umapovoação multi-étnica. Como é beloquando a Igreja persevera no seuesforço por ser casa e escola decomunhão, quando geramos aquilo aque me apraz chamar a cultura doencontro!

A imagem da Apresentação diz-nosque a Virgem Menina, depois deabençoada pelos sacerdotes,sentou-se nos degraus do altar edançou a seus pés. Penso naalegria que se expressa nasimagens do banquete das núpcias,dos amigos do noivo, da noivaadornada com as suas jóias. É aalegria de quem descobriu umtesouro e vendeu tudo para oadquirir. Encontrar o Senhor, viverna sua casa, participar da suaintimidade compromete a anunciar oReino e levar a salvação a todos.

Cruzar os umbrais do Templo exigetornar-nos, como Maria, templos doSenhor e pôr-nos a caminho para Olevarmos aos irmãos. A Virgem,como primeira discípula missionária,depois do anúncio do Anjo, partiusem demora para uma cidade deJudá, a fim de compartilhar estaalegria imensa, a mesma que fezSão João Batista saltar no seio dasua mãe. Quem ouve a sua voz«salta de alegria» e torna-se, porsua vez, um pregoeiro da alegria. Aalegria de evangelizar move a Igreja,fá-la sair como Maria.

Embora sejam múltiplas as razõesque se invocam para a transferênciado santuário de Oyacachi para estelugar, limito-me a uma: «aqui é etem sido mais acessível, mais fácilpara estar perto de todos». Assim oentendeu o arcebispo de Quito, FreiLuis Lopez de Solís, quando mandouedificar um Santuário capaz de atraire acolher a todos. Uma Igreja emsaída é uma Igreja que se aproxima,que desce para não estar distante,que sai da sua comodidade e ousachegar a todas as periferias queprecisam da luz do Evangelho (EG

20).

Agora vamos regressar às nossastarefas, solicitadas pelo Santo Povoque nos foi confiado. Entre elas, nãoesqueçamos de cuidar, animar eeducar a devoção popular queexperimentamos neste santuário etão generalizada em muitos paíseslatino-americanos. O povo fiel soubeexpressar a fé com a sua próprialinguagem, manifestar os seussentimentos mais profundos de dor,dúvida, alegria, fracasso, gratidãocom várias formas de piedade:

procissões, velas, flores, cânticosque se transformam numa belaexpressão de confiança no Senhor ede amor à sua Mãe, que é tambéma nossa.

Em Quinche, a história dos homense a história de Deus convergem nahistória duma mulher, Maria, e numacasa, a nossa casa, a irmã mãeterra. As tradições desta invocaçãofalam dos cedros, dos ursos, dafenda na rocha que foi aqui aprimeira casa da Mãe de Deus.Falam-nos no ontem de aves que

rodearam o lugar e no hoje de floresque enfeitam os arredores. Asorigens desta devoção levam-nospara tempos onde era mais simples«a harmonia serena com a criação(…), contemplar o Criador, que viveentre nós e naquilo que nos rodeia ecuja presença não precisa de sercriada» (Laudato si', 225) e que Senos manifesta no mundo criado, emseu amado Filho, na Eucaristia quepermite aos cristãos sentirem-semembros vivos da Igreja eparticiparem activamente na suamissão (cf. Aparecida, 264), em

Nossa Senhora de Quinche, que, apartir daqui, acompanhou os alvoresdo primeiro anúncio da fé aos povosindígenas. A Ela recomendamos anossa vocação; que Ela faça de nósum presente para o nosso povo, queEla nos dê a perseverança naentrega e a alegria de sair paralevar o Evangelho de seu FilhoJesus – unidos aos nossos pastores– até aos confins, até às periferiasdo nosso querido Equador.

BOLÍVIA

Viagem Apostólica doPapa à Bolívia Discurso de

boas vindas

8 de julho de 2015

Senhor Presidente,

Ilustres Autoridades,

Irmãos no Episcopado,

Queridos irmãos e irmãs!

No início desta visita pastoral,desejo dirigir a minha saudação atodos os homens e mulheres daBolívia, com cordiais votos de paz eprosperidade. Agradeço ao SenhorPresidente do Estado Plurinacionalda Bolívia a calorosa recepção queme deu e as suas amáveis palavrasde boas-vindas. O meuagradecimento estende-se tambémaos Senhores Ministros eAutoridades do Estado, das ForçasArmadas e da Polícia Nacional, quetiveram a bondade de me viremreceber. Aos meus Irmãos no

Episcopado, aos sacerdotes,religiosos, religiosas e fiéis cristãos,a toda a Igreja que peregrina naBolívia, quero expressar-lhes osmeus sentimentos de comunhãofraterna no Senhor. Reservo umlugar especial no coração para osfilhos desta terra que, por váriasrazões, tiveram de procurar «outraterra» para os abrigar, outro lugaronde esta mãe os torne fecundos epossibilite a vida.

Sinto grande alegria por estar nestepaís de beleza singular, abençoadopor Deus nas suas distintas áreas: o

planalto, os vales, as terrasamazônicas, os desertos, os lagosincomparáveis. É deste modopoético que o assinala o preâmbuloda vossa Constituição: «Em temposimemoriais, ergueram-semontanhas, deslocaram-se rios,formaram-se lagos. A nossaAmazônia, o nosso pântano, o nossoplanalto e as nossas planícies evales cobriram-se de verdura eflores». Isto faz-me lembrar que «omundo é algo mais do que umproblema a resolver; é um mistériogozoso que contemplamos naalegria e no louvor» (LS 12 ). Mas,

acima de tudo, é uma terraabençoada nas suas gentes, com asua diversificada realidade cultural eétnica, que constitui uma granderiqueza e um apelo permanente aorespeito mútuo e ao diálogo: povosnativos milenários e povos nativoscontemporâneos. Quanta alegrianos dá saber que a línguacastelhana, trazida para estasterras, convive agora com 36idiomas nativos, amalgamando-se –como fazem o vermelho e oamarelo, nas flores nacionais dekantuta e patujú – para conferirbeleza e unidade ao que é diverso.

Nesta terra e neste povo, radicou-sefortemente o anúncio do Evangelho,que, ao longo dos anos, foiiluminando a sociedade, contribuindopara o desenvolvimento do povo epromovendo a cultura.

Venho, como hóspede e peregrino,para confirmar a fé dos crentes emCristo ressuscitado, a fim de quetodos nós que acreditamos n’Ele,enquanto peregrinamos nesta vida,sejamos testemunhas do seu amor,fermento de um mundo melhor ecolaboremos na construção dumasociedade mais justa e solidária.

Nestes dias, gostaria de animar avocação dos discípulos de Cristoque é comunicar a alegria doEvangelho, ser sal da terra e luz domundo. A voz dos Pastores, quetem de ser profética, fala àsociedade em nome da Igreja Mãe,partindo da sua opção evangélicapreferencial pelos últimos. Acaridade fraterna, viva expressão domandamento novo de Jesus, traduz-se em programas, obras einstituições que buscam a promoçãointegral da pessoa bem como ocuidado e a proteção dos maisvulneráveis. Não se pode crer em

Deus Pai sem ver um irmão emcada pessoa, e não se pode seguirJesus sem dar a vida por quem Elemorreu na cruz.

Numa época em que se tendefrequentemente a esquecer oudistorcer os valores fundamentais, afamília merece uma atençãoespecial dos responsáveis pelo bemcomum, porque é a célula básica dasociedade, que fornece sólidosvínculos de união sobre os quais sebaseia a convivência humana e, coma geração e educação dos filhos,garante a renovação da sociedade.

A Igreja sente também umapreocupação especial pelos jovensque, comprometidos com a sua fé ecom grandes ideais, são umapromessa de futuro, «vigias queanunciam a luz da alvorada e a novaprimavera do Evangelho» (JoãoPaulo II, Mensagem para a XVIIIJornada Mundial da Juventude, 6).Cuidar das crianças e fazer com quea juventude se comprometa emideais nobres é garantia de futuropara uma sociedade. Umasociedade encontra a suaestabilidade quando valoriza, admirae salvaguarda os seus maiores;

quando opta por gerar uma «culturada memória» que garanta aosidosos não só a qualidade de vidanos seus últimos anos, mas tambémo carinho, como bem se exprime avossa Constituição.

Senhor Presidente, queridosamigos, obrigado por estarem aqui!Estes dias permitir-nos-ão váriosmomentos de encontro, diálogo ecelebração da fé. Faço-o comalegria, por estar nesta pátria quede si própria diz ser pacifista, quepromove a cultura da paz e o direitoà paz.

Coloco esta visita sob o amparo daSantíssima Virgem de Copacabana,Rainha da Bolívia, pedindo-Lhe queproteja todos os seus filhos. Muitoobrigado e que o Senhor vosabençoe. Jallalla Bolívia!

Discurso ao presidente eautoridades civis La Paz,

Bolívia

Quarta-feira, 08 de Julho de 2015

Irmão Presidente,

Irmãos e irmãs,

Estou contente por este encontroconvosco, autoridades políticas ecivis da Bolívia, membros do CorpoDiplomático e pessoas relevantes do

mundo da cultura e do voluntariado.Agradeço ao meu irmão EdmundoAbastoflor, Arcebispo desta Igrejade La Paz, a sua amável recepção.Peço vénia para poder cooperar,com algumas palavras de incentivo,na tarefa de cada um de vós, a quejá realizais. E agradeço-vos pelacooperação que vós, com o vossotestemunho de recepção calorosa,me dais para que eu possa seguiradiante. Muito obrigado.

Todos nós aqui presentes, cada umà sua maneira, compartilhamos a

vocação de trabalhar pelo bemcomum. Há 50 anos, o ConcílioVaticano II definiu o bem comumcomo «o conjunto das condições davida social que permitem, tanto aosgrupos como a cada membro,alcançar mais plena e facilmente aprópria perfeição» (Gaudium etspes, 26). Obrigado a vós pordesejardes, cada qual a partir dopróprio papel e missão, que aspessoas e a sociedade sedesenvolvam, alcancem a suaperfeição. Tenho a certeza de que,no vosso afã pelo bem comum,

buscais o belo, o verdadeiro e obom. Que este esforço sempreajude a crescer no respeito pelapessoa humana, enquanto tal, comdireitos fundamentais e inalienáveisorientados para o seudesenvolvimento integral, a pazsocial, isto é, a estabilidade e asegurança duma certa ordem, quenão se realiza sem uma particularatenção à justiça distributiva (cf. LS157). Que se distribua a riqueza,dito em modo simples.

No trajecto para a catedral, desde o

aeroporto, pude admirar os cumesdo Hayna Potosí e do Illimani,daquele «morro jovem» e do outroque indica «o lugar por onde sai osol». Vi também como muitas casase bairros, de forma artesanal, seconfundiam com as encostas, efiquei maravilhado com algumasobras da sua arquitectura. Oambiente natural e o ambientesocial, político e económico estãointimamente relacionados. Istoimpõe-nos estabelecer as basesduma ecologia integral – é umproblema de saúde – uma ecologia

integral que incorpore claramentetodas as dimensões humanas nasolução das graves questões sócio-ambientais dos nossos dias; casocontrário, os glaciares dessesmesmos montes continuarão areduzir-se e a lógica da recepção, aconsciência do mundo quequeremos deixar aos que vieremdepois de nós, a sua orientaçãogeral, o seu sentido, os seus valoresderreter-se-ão também comoaqueles gelos (cf. LS 159-160). E épreciso conscientizar-se disto.Ecologia integral - arrisco-me –

supõe a ecologia da mãe terra,cuidar da mãe terra; a ecologiahumana supõe cuidarmo-nosmutuamente; e ecologia social,forçando a palavra.

Dado que tudo está relacionado,precisamos uns dos outros. Se apolítica se deixa dominar pelaespeculação financeira, ou aeconomia se deixa reger apenaspelo paradigma tecnocrático eutilitarista da produção máxima, nãopoderão sequer compreender – emuito menos resolver – os grandes

problemas que afectam ahumanidade. Há necessidadetambém da cultura; dela faz partenão só o desenvolvimento dacapacidade intelectual do serhumano nas ciências e dacapacidade de gerar beleza nasartes, mas também as tradiçõespopulares locais - isso também écultura - com a sua sensibilidadeparticular pelo meio onde surgiram edo qual saíram e do meio que lhesdá sentido. Requer-se igualmenteuma educação ética e moral, quecultive atitudes de solidariedade e

co-responsabilidade entre aspessoas. Devemos reconhecer opapel específico das religiões nodesenvolvimento da cultura e osbenefícios que possam trazer àsociedade. Nomeadamente oscristãos, como discípulos da BoaNova, somos portadores dumamensagem de salvação que tem emsi mesma a capacidade deenobrecer as pessoas, inspirar altosideais capazes de incentivar linhasde acção que vão além dosinteresses individuais, possibilitandoa capacidade de renúncia a favor

dos outros, a sobriedade e asoutras virtudes que ajudam adominar-nos e que nos unem. Estasvirtudes que na vossa cultura seexpressam de uma forma tãosimples nestes três mandamentos:não mentir, não roubar e não serpreguiçoso.

Mas devemos estar atentos, poistão facilmente habituamo-nos aoambiente de desigualdade que nosrodeia, que ficamos insensíveis àsmanifestações do mesmo. E assim,sem nos dar conta, confundimos o

«bem comum» com o «bem-estar»,e com isso vai-se, pouco a pouco,escorregando, o ideal do bemcomum vai se perdendo e terminano bem-estar, sobretudo quandosomos nós que o desfrutamos e nãoos outros. O bem-estar, que fazreferência apenas à abundânciamaterial, tende a ser egoísta, tendea defender interesses parciais, anão pensar nos outros e a deixar-selevar pela tentação do consumismo.Assim entendido, o bem-estar, emvez de ajudar, incuba possíveisconflitos e desintegração social;

instalando-se como perspectivadominante, gera o mal da corrupçãoque faz desanimar imensamente ecausa tanto dano. Pelo contrário, obem comum é algo mais do que asoma de interesses individuais; épassar do que «é melhor para mim»àquilo que «é melhor para todos», einclui tudo o que dá coesão a umpovo: metas comuns, valorescompartilhados, ideais que ajudam alevantar os olhos para além doshorizontes particulares.

Os distintos actores sociais têm a

responsabilidade de contribuir paraa construção da unidade e odesenvolvimento da sociedade. Aliberdade é sempre o campo melhorpara que os pensadores, asassociações de cidadãos, os meiosde comunicação desempenhem asua função, com paixão ecriatividade, ao serviço do bemcomum. Também os cristãos,chamados a ser fermento no povo,trazem a sua própria mensagem àsociedade. A luz do Evangelho deCristo não é propriedade da Igreja;esta é sua serva: a Igreja deve

servir o Evangelho de Cristo paraque chegue até aos confins domundo. A fé é uma luz que nãoencandeia; as ideologiasencandeiam, a fé não encandeia, afé é uma luz que não perturba, masilumina e orienta no respeito pelaconsciência e a história de cadapessoa e de cada sociedadehumana. Respeito. O cristianismoteve um papel importante naformação da identidade do povoboliviano. A liberdade religiosa – talcomo é entendida habitualmente naágora civil – lembra também que a

fé não se pode reduzir à esferapuramente subjectiva. Não é umasubcultura. O nosso desafio há-deser incentivar e favorecer agerminação da espiritualidade e docompromisso da fé, o compromissocristão nas obras sociais, emsuperar o bem comum através dasobras sociais.

Entre os vários actores sociais,gostaria de salientar a família,ameaçada em toda a parte, portantos factores, pela violênciadoméstica, o alcoolismo, o

machismo, a droga, a falta detrabalho, a insegurança social, oabandono dos idosos, os meninosde rua e recebendo pseudo-soluções a partir de perspectivasque não são saudáveis para afamília mas, ao contrário, provêemclaramente de colonizaçõesideológicas. Os problemas sociais,que a família resolve, e os resolveem silêncio, são tantos, que nãopromover a família é deixardesamparados os maisdesprotegidos.

Uma nação, que procura o bemcomum, não pode fechar-se em simesma; as redes de relaçõesabonam a sociedade. Assim no-lodemonstra o problema daemigração nos nossos dias. Hoje éindispensável o desenvolvimento dadiplomacia com os países vizinhos,que evite os conflitos entre povosirmãos e contribua para um diálogofranco e aberto dos problemas. Eestou a pensar agora sobre aquestão do mar: o diálogo éindispensável. Construir pontes, emvez de erguer muros. Todos os

temas, por mais espinhosos quesejam, têm soluçõescompartilháveis, têm soluçõesrazoáveis, equitativas e duradouras.E, em todo o caso, nunca devem sermotivo de agressividade, rancor ouinimizade, que agravam mais asituação e tornam mais difícil a suasolução.

A Bolívia passa por um momentohistórico: a política, o mundo dacultura, as religiões fazem partedeste estupendo desafio daunidade. Nesta terra, onde a

exploração, a ganância e variadosegoísmos e perspectivas sectáriasensombraram a sua história, hojepode ser o tempo da integração. Eé preciso caminhar por estaestrada. Hoje a Bolívia pode criar, écapaz de criar com a sua riquezanovas sínteses culturais. Como sãoestupendos os países que,superando a desconfiança doentia,integram os diferentes e que fazemdesta integração um novo factor dedesenvolvimento! Como são belasas nações quando estão cheias deespaços que unem, relacionam,

favorecem o reconhecimento dooutro (cf. EG 210)! A Bolívia, na suabusca de integração e unidade, échamada a ser uma «multiformeharmonia que atrai» (EG 117) e queatrai no caminho para aconsolidação da pátria grande.

Muito obrigado pela vossa atenção!Peço ao Senhor que a Bolívia, «estaterra inocente e bonita», continue aprogredir cada vez mais para seraquela «pátria feliz, onde o homemvive o bem da felicidade e da paz».A Virgem Santa cuide de vós e o

Senhor vos abençoe comabundância. E por favor, peço-vosque por favor não vos esqueçais derezar por mim. Muito obrigado.

Homilia do Papa FranciscoPraça do Cristo Redentor,Santa Cruz de La Sierra,

Bolívia

Quinta-feira, 9 de Julhode 2015

Viemos de lugares, regiões,povoados distintos, para celebrar apresença viva de Deus entre nós. Háhoras que saímos de nossas casase comunidades, para podermosestar juntos como Povo Santo de

Deus. A cruz e a imagem da missãotrazem-nos à memória todas ascomunidades que nasceram sob onome de Jesus nestas terras e dasquais somos herdeiros.

No Evangelho que acabámos deouvir, descrevia-se uma situaçãomuito semelhante à que estamos aviver agora. Como aquelas quatromil pessoas, também nós estamosdesejosos de ouvir a Palavra deJesus e receber a sua vida. Elesontem e nós hoje, ao pé do Mestre,Pão de vida.

Comovo-me ao ver muitas mães quecarregavam seus filhos às costas,como aliás muitas de vós o fazemaqui. Carregando sobre si a vida e ofuturo do seu povo. Carregando osmotivos da sua alegria, as suasesperanças. Carregando a bênçãoda terra nos frutos. Carregando otrabalho feito com as suas mãos.Mãos, que moldaram o presente etecerão os sonhos do amanhã. Mascarregando também sobre os seusombros decepções, tristezas eamarguras, a injustiça que parecenão ter fim e as cicatrizes duma

justiça não realizada. Carregandosobre si mesmas a alegria e a dorduma terra. Carregais sobre vós amemória do vosso povo. Porque ospovos têm memória, uma memóriaque passa de geração em geração,os povos têm uma memória emcaminho.

E não são poucas as vezes queexperimentamos o cansaço destecaminho. Não são poucas as vezesque nos faltam as forças paramanter viva a esperança. Quantasvezes vivemos situações que

pretendem anestesiar-nos amemória e, deste modo, debilita-sea esperança e, pouco a pouco,perdem-se os motivos de alegria. Ecomeça a apoderar-se de nós umatristeza que nos torna individualistas,que nos faz perder a memória depovo amado, de povo escolhido. Eesta perda desagrega-nos, faz comque nos fechemos aos outros,especialmente aos mais pobres.

Pode suceder a nós o mesmo queaos discípulos de ontem, quandoviram essa quantidade de pessoas

que estava lá. Pedem a Jesus que amande embora – «Manda-lhes devolta à casa» –, já que é impossívelalimentar tanta gente. Perantemuitas situações de fome no mundo,podemos dizer: «Perdão, mas osnúmeros não batem certo; nãopodemos resolver a conta». Éimpossível enfrentar estassituações; então o desespero acabapor apoderar-se do coração.

Num coração desesperado, é muitofácil ganhar espaço a lógica quepretende impor-se no mundo, em

todo o mundo, nos nossos dias.Uma lógica que procura transformartudo em objecto de troca, tudo emobjecto de consumo: vê tudonegociável. Uma lógica que pretendedeixar espaço para muito poucos,descartando todos aqueles que não«produzem», que não sãoconsiderados aptos ou dignosporque, aparentemente, «osnúmeros não batem certo». E Jesusretoma a palavra para nos dizer:«Não, não é necessário excluí-los,não é necessário irem embora; dai-lhes vós mesmos de comer».

É um convite que hoje ressoafortemente para nós: «Não énecessário excluir a ninguém. Não énecessário mandar ninguémembora, basta de descartes; dai-lhes vós mesmos de comer». Jesuscontinua a dizer-nos nesta praça:Sim, basta de descartes; dai-lhesvós mesmos de comer. O olhar deJesus não aceita uma lógica, umaperspectiva que sempre «corta ofio» pelo ponto mais frágil, maisnecessitado. Tomando «o pedaço»,Ele mesmo nos dá o exemplo, nosmostra o caminho. Uma atitude em

três palavras: toma um pouco depão e alguns peixes, bendiz a Deuspor eles, divide-os e entrega paraque os discípulos os partilhem comos outros. E este é o caminho domilagre. Por certo, não é magia nemidolatria. Por meio destas trêsacções, Jesus conseguetransformar a lógica do descartenuma lógica de comunhão, numalógica de comunidade. Gostaria dedestacar brevemente cada umadestas acções.

Toma. O ponto de partida é tomar

muito a sério a vida dos seus. Fixa-os nos olhos e, nestes, conhece asua vida, os seus sentimentos. Vê,naquele olhar, o que pulsa e o quedeixou de pulsar na memória e nocoração do seu povo. Considera-o evaloriza-o. Valoriza todo o bem quepossam oferecer, todo o bem apartir do qual se possa construir.Mas não fala dos objectos, dosbens culturais ou das ideias; faladas pessoas. A riqueza maior dumasociedade mede-se na vida do seupovo, mede-se nos seus idosos queconseguem transmitir aos mais

novos a sua sabedoria e a memóriado seu povo. Jesus nunca ignora adignidade de pessoa alguma, pormaior que seja a aparência de nãoter nada para oferecer ou partilhar.Tomo tudo assim como lhe chega.

Bendiz. Jesus toma em suas mãos odom, e bendiz o Pai que está noscéus. Sabe que estes dons são umpresente de Deus. Por isso, não ostrata como «uma coisa qualquer»,dado que toda a vida, toda esta vidaé fruto do amor misericordioso. Elereconhece-o. Vai além da simples

aparência e, neste gesto debendizer e louvar, pede a seu Pai odom do Espírito Santo. Aquele actode bendizer tem esta duplaperspectiva: por um lado, agradecere, por outro, transformar. Éreconhecer que a vida é sempre umdom, um presente que, colocadonas mãos de Deus, adquire umaforça de multiplicação. O nosso Painão nos tira nada, multiplica tudo.

Entrega. Em Jesus, não existe umtomar que não seja bênção, nemuma bênção que não seja uma

entrega. A bênção é sempremissão, tem um destino: repartir,partilhar o que se recebeu, uma vezque só na entrega, no com-partilharé que as pessoas encontram a fonteda alegria e a experiência desalvação. Uma entrega que querreconstruir a memória de povosanto, de povo convidado a ser e alevar a alegria da salvação. Asmãos, que Jesus ergue parabendizer o Deus do céu, são asmesmas que distribuem o pão àmultidão que tem fome. E podemosimaginar agora como os pães e os

peixes iam passando de mão emmão até chegar aos mais afastados.Jesus consegue gerar uma correnteentre os seus: todos estavamcompartilhando o seu,transformando-o em dom para osoutros, e foi assim que comeram atéficarem saciados. E, incrivelmente,sobrou: recolheram sete cestos desobras. Uma memória tomada, umamemória abençoada, uma memóriaentregue sempre sacia o povo.

A Eucaristia é o «Pão repartido paraa vida do mundo», como diz o lema

do V Congresso Eucarístico quehoje inauguramos e vai realizar-seem Tarija. É sacramento decomunhão, que nos faz sair doindividualismo para vivermos juntos oseguimento de Jesus e nos dá acerteza de que aquilo que temos esomos, se tomado, abençoado eentregue, pelo poder de Deus, pelopoder do seu amor, transforma-seem pão de vida para os outros.

E a Igreja celebra a Eucaristia,celebra a memória do Senhor, osacrifício do Senhor. Porque a Igreja

é uma comunidade memoriosa. Porisso, fiel ao mandato do Senhor,repete incansavelmente: «Fazei istoem memória de Mim» (Lc 22, 19).Geração após geração actualiza,torna real, nos distintos cantos danossa terra, o mistério do Pão daVida. No-lo faz presente e entrega.Jesus quer que participemos destasua vida e, por nosso intermédio, sevá multiplicando na nossasociedade. Não somos pessoasisoladas, separadas, mas somos oPovo da memória actualizada esempre entregue.

Uma vida memoriosa precisa dosoutros, do intercâmbio, do encontro,duma solidariedade real que sejacapaz de entrar na lógica do tomar,bendizer e entregar; na lógica doamor.

Maria, igual a muitas de vós,carregou sobre si a memória do seupovo, a vida do seu Filho, eexperimentou em Si própria agrandeza de Deus, proclamandocom alegria que Ele «encheu debens os famintos» ( Lc 1, 53), queEla seja hoje o nosso exemplo para

confiarmos na bondade do Senhor,que faz obras grandes com poucacoisa, com a humildade dos seusservos. Que assim seja.

Discurso Encontro com ossacerdotes, religiosos,

religiosas e seminaristas

Quinta-feira, 9 de Julhode 2015

Queridos irmãos e irmãs, boa tarde!

Estou contente com este encontroconvosco para partilhar a alegriaque enche o coração e a vida inteirados discípulos missionários deJesus. Assim o manifestaram as

palavras de saudação de D.Roberto Bordi e os testemunhos doPadre Miguel, da Irmã Gabriela e doseminarista Damián. Muito obrigadopor terem partilhado a própriaexperiência vocacional.

E no relato do Evangelho deMarcos, ouvimos também aexperiência de outro discípulo,Bartimeu, que se juntou ao grupodos seguidores de Jesus. Foi umdiscípulo da última hora. Era aúltima viagem que Senhor fazia deJericó a Jerusalém; aqui Ele seria

entregue. Cego e mendigo, Bartimeuestava na beira do caminho – maisexclusão que isso, impossível! -,marginalizado; quando, porém,soube que era Jesus que passava,começou a gritar, fez-se sentir,como esta irmãzinha que com abateria se fazia escutar e dizia“estou aqui”. Felicito-te, tocas bem.

Ao redor de Jesus, caminhavam osapóstolos, os discípulos, asmulheres que habitualmente Oseguiam, com quem percorreudurante a sua vida pública os

caminhos da Palestina para anunciaro Reino de Deus. E uma grandemultidão. Se traduzimos isto,forçando a linguagem, em torno aJesus iam os bispos, os padres, asfreiras, os seminaristas, os leigoscomprometidos, todos os queseguiam-no, escutando a Jesus,junto com o povo fiel de Deus.

Aparecem aqui duas realidades, quese nos impõem com força. Por umlado, o grito, o grito do mendigo e,por outro, as diferentes reacçõesdos discípulos. Pensemos nas

diferentes reacções dos bispos,padres, freiras, seminaristas aosgritos que vamos escutando ou nãoescutando. Quase parece que oEvangelista nos queria mostrar quetipo de eco encontra o grito deBartimeu na vida das pessoas, navida dos seguidores de Jesus;mostrar como reagem perante osofrimento de quem está na beira daestrada, com quem ninguém seimporta – no máximo dão umaesmola - da pessoa que estásentada na sua dor, que não entraneste círculo de pessoas que está

seguindo o Senhor.

São três as respostas aos gritos docego e hoje também estas trêsrespostas têm actualidade.Poderíamos exprimi-las com aspalavras do próprio Evangelho:‘Passar”; “Cala-te”; “Coragem,levanta-te”.

1. Passar. Passar ao largo; alguns,porque não ouvem. Estavam comJesus, olhavam a Jesus, queriamouvir Jesus. Não escutavam. Nestepassar, temos o eco da indiferença,

do passar ao lado dos problemas,procurando que estes não nostoquem. “Não é meu problema”. Nãoos ouvimos, não os reconhecemos.Faz-se ouvidos surdos. É a tentaçãode ver como coisa natural a dor, atentação de habituar-se à injustiça.Sim, há gente assim: eu estou aquicom Deus, com a minha vidaconsagrada, escolhido por Jesuspara o ministério e, sim, é naturalque existam doentes, que existampobres, que existam pessoas quesofrem; e como já é tão natural, nãochama-me atenção um grito, um

pedido de auxílio. Acostumar-se. Edizemos cá para nós: é normal,sempre foi assim, com tal que nãome toque – mas isto entreparêntesis. É o eco que aparecenum coração blindado, num coraçãofechado, que perdeu a capacidadede admiração e, portanto, apossibilidade de mudança. Quantosseguidores de Jesus corremos operigo de perder a nossacapacidade de admiração, inclusivecom o Senhor? Este estupor doprimeiro encontro vai como que sedegradando, e isso pode passar

com qualquer um, passou com oprimeiro Papa: «Para onde iremosSenhor, só tu tens palavras de vidaeterna?”. E depois o trai; nega-o, aadmiração se degradou. É tudo umprocesso de acostumar-se. Umcoração blindado. Trata-se de umcoração que se habituou a passarsem se deixar tocar; uma existênciaque, andando por aqui e por ali, nãoconsegue radicar-se na vida do seupovo, simplesmente porque fazparte desta elite que segue aoSenhor.

Poderíamos chamá-la aespiritualidade do zapping. Passa evolta a passar, mas não fica nada.São aqueles que correm atrás daúltima novidade, do último«bestseller», mas não conseguementrar em contacto, não conseguemrelacionar-se, envolver-se inclusivecom o Senhor a quem estãoseguindo, porque a surdez progride.

Podereis dizer-me: «É que essaspessoas estavam seguindo oMestre, estavam atentas àspalavras do Mestre; estavam a ouvi-

Lo». Julgo que isto é o maiordesafio da espiritualidade cristã.Como nos lembra o evangelistaJoão: «aquele que não ama o seuirmão, a quem vê, não pode amar aDeus, a quem não vê» (1 Jo 4, 20b).Eles acreditavam que escutavam oMestre, mas também traduziam, eas palavras do Mestre passavampelo alambique dos seus coraçõesblindados. Dividir esta unidade –entre escutar a Deus e escutar oirmão - é uma das grandestentações que nos acompanham aolongo de todo o caminho daqueles

que seguimos Jesus. E temos deestar cientes disto. Tal comoescutamos o nosso Pai, assimescutamos o Povo fiel de Deus. Senão o fazemos com os própriosouvidos, com a mesma capacidadede escutar, com o mesmo coração,alguma coisa se quebrou.

Passar, sem escutar a dor do nossopovo, sem nos radicarmos nas suasvidas, na sua terra, é como ouvir aPalavra de Deus sem deixar quelance raízes dentro de nós e sejafecunda. Uma planta, uma história

sem raízes é uma vida seca.

2. Segunda palavra: “Cala-te”. Estaé a segunda atitude perante o gritode Bartimeu. Cala-te, não chateies,não perturbes, que estamos fazendoa oração comunitária, que estamosnum momento de espiritualidade deprofunda elevação. “Não chateies,não perturbes”. Ao contrário daatitude anterior, esta escuta, estareconhece, toma contacto com ogrito de outro. Sabe que está ali ereage duma forma muito simples:repreendendo. São os bispos, os

padres, os monges, os Papas dodedo assim [em riste, em sinalameaçador]. Na Argentina, dizemosdas professoras do dedo assim [emriste]: “Esta é como a professora dotempo de Yrigoyen, daquelas queestudavam a disciplina muito rígida”.E o pobre Povo fiel de Deus,quantas vezes é reprendido, pelomau humor ou pela situação pessoaldum seguidor ou duma seguidora deJesus. É a atitude de quem, à frentedo povo de Deus, continuamente oestá repreendendo, resmungando,mandando-o calar. Dê-lhe uma

carícia, por favor, escuta-o, diz-lheque Jesus o ama. “Não, isto não sepode fazer”. “Senhora, tire o bebéda igreja, pois ele está chorando eeu estou pregando”. Como se ochoro de um bebé não fosse umasublime pregação.

É o drama da consciência isolada,daqueles discípulos e discípulas quepensam que a vida de Jesus éapenas para aqueles queconsideram aptos. No fundo, há umprofundo desprezo pelo Povo fiel deDeus: «mas este cego, quem é ele

para meter-se, que fique ondeestá!». A seus olhos parece lícitoque encontrem espaço apenas os«autorizados», uma «casta depessoas diferentes» que pouco apouco se separa, diferenciando-sedo seu Povo. Fizeram da identidadeuma questão de superioridade. Estaidentidade, que significa pertença,faz sentir-se superior, já não comopastores, mas como capatazes: «Eucheguei até aqui, tu, coloca-te noteu lugar» Ouvem, mas nãoescutam, vêem, mas não olham.Permito-me contar uma história que

vivi, era ao redor do ano 75,[dirigindo-se a um bispo presente]na tua diocese, na tua arquidiocese.Eu tinha feito uma promessa aoSenhor dos Milagres de ir todos osanos a Salta, em peregrinação, paraEl Milagro se Ele mandasse 40noviços. Mandou 41. Bom, depoisde uma concelebração – neste local,como em todo o grande santuário,há uma missa depois da outra,confissões e não ficas parado; eusaía falando com um sacerdote queme acompanhava, que estavacomigo, tinha vindo comigo, e eis

que se aproxima uma senhora, já desaída, com uns santinhos, umasenhora muito simples, não sei,seria de Salta ou teria vindo não seide onde –às vezes demoram diaspara chegar na capital para a festado El Milagro. «Padre, abençoa-me», pede ela ao sacerdote que meacompanhava; «Senhora, tuestiveste na missa». «Sim, padre».«Pois bem, lá a bênção de Deus, apresença de Deus abençoa tudo,tudo…». «Sim, padre, sim, padre».«E depois, a bênção final abençoatudo». «Sim padre, sim padre».

Neste momento sai outro sacerdoteamigo daquele primeiro, mas quenão se tinham visto. Então: «Oh, tuque estás ai». Gira-se e a senhora,que não sei como se chamava -digamos a senhora do “sim, padre”– olha-me e me pede: «Padre,abençoe-me o senhor». Aqueles quesempre colocam barreiras ao Povode Deus, separam-no. Ouvem masnão escutam; deitam em cima umsermão, vêem, mas não fixam oolhar. A necessidade de sediferenciar bloqueou-lhes o coração.A necessidade, consciente ou

inconsciente, de dizer «eu não soucomo ele, não sou como eles»afastou-os não só do grito do seupovo e do seu pranto, mas tambéme particularmente dos motivos dealegria. Rir com aqueles que riem,chorar com os que choram: estáaqui parte do mistério do coraçãosacerdotal e do coraçãoconsagrado. Às vezes existemcastas que nós vamos criando comeste comportamento e assim nosseparamos. No Equador, tomei aliberdade de dizer aos sacerdotes –as freiras também estavam

presentes – que, por favor,pedissem todos os dias a graça damemória, de não esquecer-se deonde o tiraram. Tiraram-te de juntodo rebanho. Nunca te esqueças, nãote assoberbes, não negues as tuasraízes, não negues essa cultura queaprendeste da tua gente porqueagora tens uma cultura maissofisticada, mais importante.Existem sacerdotes que sentemvergonha de falar a sua línguaoriginária e então se esquecem doseu quíchua, do seu aimara, do seuguarani: «Porque não, agora falo de

modo elegante». A graça de nãoperder a memória de Povo fiel. Éuma graça. No livro doDeuteronómio, quantas vezes Deusfala ao seu Povo: «Não teesqueças, não te esqueças, não teesqueças». E Paulo admoesta aoseu discípulo predilecto, que elemesmo consagrara como Bispo,Timóteo: «Lembra-te da tua mãe eda tua avó».

3. A terceira palavra: “Coragem,levanta-te”. É este é o terceiro eco.Um eco que não nasce directamente

do grito de Bartimeu, mas dareacção das pessoas que vêemcomo Jesus se comportou perante ogrito do cego mendicante. Ou seja,aqueles que não davam lugar àssuas súplica, aqueles que não lheabriam um lugar, ou alguém quefazia-lhe calar-se… Mas, claro,quando vê que Jesus reage assim,muda: “Coragem, levanta-te”.

É um grito que se transforma emPalavra, em convite, em mudança,em proposta de novidade frente àsnossas formas de reagir ao Santo

Povo fiel de Deus.

Ao contrário dos outros quepassavam, diz o Evangelho queJesus Se deteve e perguntou: «Oque está a acontecer? Quem “tocaa bateria”?». Deteve-se perante oclamor duma pessoa. Sai doanonimato da multidão para oidentificar, comprometendo-se assimcom ele. Radica-se na sua vida. E,longe de o mandar calar, pergunta:«Que posso fazer por ti?» Nãoprecisa de diferenciar-se, nãoprecisa separar-se, não lhe faz um

sermão, não catalogá-lo e perguntapara ver se está autorizado ou não afalar. Limita-se a fazer umapergunta, a identificá-lo pretendendoser parte da vida daquele homem,querendo assumir a sua própriasorte. Deste modo restitui-lhegradualmente a dignidade que tinhaperdido, à margem do caminho ecego. Faz a sua inclusão. E longe deolhá-lo de fora, esforça-se por seidentificar com os problemas e,assim, manifestar a forçatransformadora da misericórdia. Nãohá compaixão - compaixão e não

lástima – não existe compaixão quenão se detenha. Se não te deténs,se não “padeces com”, tu não tens acompaixão divina. Não existe umacompaixão que não escute. Nãoexiste uma compaixão que não sesolidarize com o outro. A compaixãonão é zapping, não é silenciar a dor;pelo contrário, é a lógica própria doamor, o “padecer com”. É a lógicaque não está centrada no medo,mas na liberdade que nasce deamar e coloca o bem do outro acimade todas as coisas. É a lógica quenasce de não ter medo de se

aproximar da dor do nosso povo.Embora muitas vezes se reduza aestar ao seu lado e fazer dessemomento uma oportunidade deoração.

E esta é a lógica do discipulado.Isto é o que faz o Espírito Santoconnosco e em nós. Disto somostestemunhas. Um dia Jesus viu-nosà beira da estrada, sentados nasnossas dores, nas nossas misérias,nas nossas indiferenças. Cada umconhece a sua história antiga. Nãosilenciou os nossos gritos; antes,

deteve-Se, aproximou-Se eperguntou que podia fazer por nós.E, graças a tantas testemunhas quenos disseram «coragem, levanta-te», gradualmente fomos tocandoaquele amor misericordioso, aqueleamor transformador que nospermitiu ver a luz. Não somostestemunhas de uma ideologia, nãosomos testemunhas de uma receita,uma forma de fazer teologia. Nãosomos testemunhas disso. Somostestemunhas do amor sanador emisericordioso de Jesus. Somostestemunhas da sua intervenção na

vida das nossas comunidades.

E esta é a pedagogia do Mestre;esta é a pedagogia de Deus com oseu Povo. Passar da indiferença dozapping a «coragem, levanta-te que[o Mestre] chama-te» (Mc 10, 49).E não porque somos especiais, nãoporque somos melhores, nemporque somos os funcionários deDeus, mas apenas porque somostestemunhas agradecidas damisericórdia que nos transforma. Equando se vive assim, há júbilo ealegria, e podemos nos unir ao

testemunho da irmã, que assumiu nasua vida o conselho de SantoAgostinho: «Canta e caminha». Estaalegria que vem do testemunho damisericórdia que transforma.

Não estamos sozinhos, nestecaminho. Ajudamo-nos uns aosoutros com o exemplo e a oração.Estamos circundados por umanuvem de testemunhas (cf. Heb 12,1). Lembremos a Beata NazáriaIgnacia de Santa Teresa de Jesús,que dedicou a sua vida ao anúnciodo Reino de Deus cuidando dos

idosos, com a «panela do pobre»para aqueles que não tinham nadapara comer, abrindo orfanatos paracrianças sem ninguém, hospitaispara feridos da guerra, e atécriando um sindicato feminino para apromoção da mulher. Lembremostambém a Venerável Virgínia BlancoTardío, devotada totalmente àevangelização e ao cuidado daspessoas pobres e doentes. Elas emuitos outros anónimos, tantos,daqueles que seguimos Jesus,servem de estímulo no nossocaminho. Esta nuvem de

testemunhas! Vamos para diantecom a ajuda de Deus e acooperação de todos. O Senhorserve-Se de nós para que a sua luzchegue a todos os cantos da terra.E seguir adiante, canta e caminha. Eenquanto cantais e caminhais, rezaipor mim, que necessito. Obrigado.

Discurso do Papa duranteII Encontro dos

Movimentos PopularesBolívia

Quinta-feira, 9 de julhode 2015

Irmãos e irmãs, boa tarde!

Há alguns meses, reunimo-nos emRoma e não esqueço aquele nossoprimeiro encontro. Durante estetempo, trouxe-vos no meu coração e

nas minhas orações. E alegra-mevê-vos de novo aqui, debatendo osmelhores caminhos para superar asgraves situações de injustiça quepadecem os excluídos em todo omundo. Obrigado Senhor PresidenteEvo Morales, por sustentar tãodecididamente este Encontro.

Então, em Roma, senti algo muitobelo: fraternidade, paixão, entrega,sede de justiça. Hoje, em SantaCruz de la Sierra, volto a sentir omesmo. Obrigado! Soube também,pelo Pontifício Conselho «Justiça e

Paz» presidido pelo CardealTurkson, que são muitos na Igrejaaqueles que se sentem maispróximos dos movimentospopulares. Muito me alegro por isso!Ver a Igreja com as portas abertasa todos vós, que se envolve,acompanha e consegue sistematizarem cada diocese, em cadacomissão «Justiça e Paz», umacolaboração real, permanente ecomprometida com os movimentospopulares. Convido-vos a todos,bispos, sacerdotes e leigos,juntamente com as organizações

sociais das periferias urbanas erurais a aprofundar este encontro.

Deus permitiu que nos voltássemosa ver hoje. A Bíblia lembra-nos queDeus escuta o clamor do seu povo etambém eu quero voltar a unir aminha voz à vossa: os famosos três“T”: terra, tecto e trabalho paratodos os nossos irmãos e irmãs.Disse-o e repito: são direitossagrados. Vale a pena, vale a penalutar por eles. Que o clamor dosexcluídos seja escutado na AméricaLatina e em toda a terra.

1. Em primeiro lugar, comecemospor reconhecer que precisamosduma mudança. Quero esclarecer,para que não haja mal-entendidos,que falo dos problemas comuns detodos os latino-americanos e, emgeral, também de toda ahumanidade. Problemas, que têmuma matriz global e que actualmentenenhum Estado pode resolver por simesmo. Feito este esclarecimento,proponho que nos coloquemos estasperguntas:

– Reconhecemos nós, de verdade,

que as coisas não andam bem nummundo onde há tantos camponesessem terra, tantas famílias semtecto, tantos trabalhadores semdireitos, tantas pessoas feridas nasua dignidade?

– Reconhecemos nós que as coisasnão andam bem, quando explodemtantas guerras sem sentido e aviolência fratricida se apodera atédos nossos bairros? Reconhecemosnós que as coisas não andam bem,quando o solo, a água, o ar e todosos seres da criação estão sob

ameaça constante?

Então, se reconhecemos isto,digamo-lo sem medo: Precisamos equeremos uma mudança.

Nas vossas cartas e nos nossosencontros, relataram-me asmúltiplas exclusões e injustiças quesofrem em cada actividade laboral,em cada bairro, em cada território.São tantas e tão variadas comomuitas e diferentes são as formaspróprias de as enfrentar. Mas há umelo invisível que une cada uma das

exclusões. Não se encontramisoladas, estão unidas, por um fioinvisível. Conseguimos nósreconhecê-lo? É que não se trata dequestões isoladas. Pergunto-me sesomos capazes de reconhecer queestas realidades destrutivascorrespondem a um sistema que setornou global. Reconhecemos nósque este sistema impôs a lógica dolucro a todo o custo, sem pensar naexclusão social nem na destruiçãoda natureza?

Se isso é assim – insisto – digamo-

lo sem medo: Queremos umamudança, uma mudança real, umamudança de estruturas. Estesistema é insuportável: não osuportam os camponeses, não osuportam os trabalhadores, não osuportam as comunidades, não osuportam os povos.... E nem sequero suporta a Terra, a irmã MãeTerra, como dizia São Francisco.

Queremos uma mudança nasnossas vidas, nos nossos bairros,no vilarejo, na nossa realidade maispróxima; mas uma mudança que

toque também o mundo inteiro,porque hoje a interdependênciaglobal requer respostas globais paraos problemas locais. A globalizaçãoda esperança, que nasce dos povose cresce entre os pobres, devesubstituir esta globalização daexclusão e da indiferença.

Hoje quero reflectir convosco sobrea mudança que queremos eprecisamos. Como sabeis,recentemente escrevi sobre osproblemas da mudança climática.Mas, desta vez, quero falar duma

mudança noutro sentido. Umamudança positiva, uma mudança quenos faça bem, uma mudança –poderíamos dizer – redentora.Porque é dela que precisamos. Seique buscais uma mudança e nãoapenas vós: nos diferentesencontros, nas várias viagens,verifiquei que há uma expectativa,uma busca forte, um anseio demudança em todos os povos domundo. Mesmo dentro da minoriacada vez mais reduzida que pensasair beneficiada deste sistema, reinaa insatisfação e sobretudo a

tristeza. Muitos esperam umamudança que os liberte destatristeza individualista que escraviza.

O tempo, irmãos e irmãs, o tempoparece exaurir-se; já não noscontentamos com lutar entre nós,mas chegamos até a assanhar-noscontra a nossa casa. Hoje, acomunidade científica aceita aquiloque os pobres já há muitodenunciam: estão a produzir-sedanos talvez irreversíveis noecossistema. Está-se a castigar aterra, os povos e as pessoas de

forma quase selvagem. E por trásde tanto sofrimento, tanta morte edestruição, sente-se o cheiro daquiloque Basílio de Cesareia – um dosprimeiros teólogos da Igreja –chamava «o esterco do diabo»:reina a ambição desenfreada dedinheiro. É este o esterco do diabo.O serviço ao bem comum fica emsegundo plano. Quando o capital setorna um ídolo e dirige as opçõesdos seres humanos, quando aavidez do dinheiro domina todo osistema socioecónomico, arruína asociedade, condena o homem,

transforma-o em escravo, destrói afraternidade inter-humana, faz lutarpovo contra povo e até, comovemos, põe em risco esta nossacasa comum, a irmã e mãe terra.

Não quero alongar-me na descriçãodos efeitos malignos desta ditadurasubtil: vós conhecei-los! Mastambém não basta assinalar ascausas estruturais do drama social eambiental contemporâneo. Sofremosde um certo excesso de diagnóstico,que às vezes nos leva a umpessimismo charlatão ou a rejubilar

com o negativo. Ao ver a crónicanegra de cada dia, pensamos quenão haja nada que se possa fazerpara além de cuidar de nós mesmose do pequeno círculo da família edos amigos.

Que posso fazer eu, recolhedor depapelão, catador de lixo, limpador,reciclador, frente a tantosproblemas, se mal ganho paracomer? Que posso fazer eu,artesão, vendedor ambulante,carregador, trabalhador irregular, senão tenho sequer direitos laborais?

Que posso fazer eu, camponesa,indígena, pescador que dificilmenteconsigo resistir à propagação dasgrandes corporações? Que possofazer eu, a partir da minhacomunidade, do meu barraco, daminha povoação, da minha favela,quando sou diariamentediscriminado e marginalizado? Quepode fazer aquele estudante, aquelejovem, aquele militante, aquelemissionário que atravessa as favelase os paradeiros com o coraçãocheio de sonhos, mas quase semnenhuma solução para os seus

problemas? Podem fazer muito.Vós, os mais humildes, osexplorados, os pobres e excluídos,podeis e fazeis muito. Atrevo-me adizer que o futuro da humanidadeestá, em grande medida, nasvossas mãos, na vossa capacidadede vos organizar e promoveralternativas criativas na busca diáriados três “T” – entendido? –(trabalho, tecto, terra), e também navossa participação comoprotagonistas nos grandesprocessos de mudança, mudançasnacionais, mudanças regionais e

mudanças mundiais. Não seacanhem!

2. Segundo. Vós sois semeadoresde mudança. Aqui, na Bolívia, ouviuma frase de que gosto muito:«processo de mudança». Amudança concebida, não como algoque um dia chegará porque seimpôs esta ou aquela opção políticaou porque se estabeleceu esta ouaquela estrutura social. Sabemos,amargamente, que uma mudança deestruturas, que não sejaacompanhada por uma conversão

sincera das atitudes e do coração,acaba a longo ou curto prazo porburocratizar-se, corromper-se esucumbir. É preciso mudar ocoração. Por isso gosto tanto daimagem do processo, onde a paixãopor semear, por regar serenamenteo que outros verão florescer,substitui a ansiedade de ocupartodos os espaços de poderdisponíveis e de ver resultadosimediatos. A opção é a de gerarprocessos e não a de ocuparespaços. Cada um de nós é apenasuma parte de um todo complexo e

diversificado interagindo no tempo:povos que lutam por uma afirmação,por um destino, por viver comdignidade, por «viver bem»,dignamente, nesse sentido.

Vós, a partir dos movimentospopulares, assumis as tarefascomuns motivados pelo amorfraterno, que se rebela contra ainjustiça social. Quando olhamos orosto dos que sofrem, o rosto docamponês ameaçado, dotrabalhador excluído, do indígenaoprimido, da família sem tecto, do

imigrante perseguido, do jovemdesempregado, da criançaexplorada, da mãe que perdeu o seufilho num tiroteio porque o bairro foitomado pelo narcotráfico, do pai queperdeu a sua filha porque foi sujeitaà escravidão; quando recordamosestes «rostos e estes nomes»estremecem-nos as entranhasdiante de tanto sofrimento ecomovemo-nos, todos noscomovemos…. Porque «vimos eouvimos», não a fria estatística, masas feridas da humanidade dolorida,as nossas feridas, a nossa carne.

Isto é muito diferente da teorizaçãoabstracta ou da indignaçãoelegante. Isto comove-nos, move-nos e procuramos o outro para nosmovermos juntos. Esta emoção feitaacção comunitária é incompreensívelapenas com a razão: tem um plusde sentido que só os povosentendem e que confere a suamística particular aos verdadeirosmovimentos populares.

Vós viveis, cada dia, imersos nacrueza da tormenta humana.Falastes-me das vossas causas,

partilhastes comigo as vossas lutas,já desde Buenos Aires. E agradeço-vos. Queridos irmãos, muitas vezestrabalhais no insignificante, no queaparece ao vosso alcance, narealidade injusta que vos foi impostae a que não vos resignais opondouma resistência activa ao sistemaidólatra que exclui, degrada e mata.Vi-vos trabalhar incansavelmentepela terra e a agriculturacamponesa, pelos vossos territóriose comunidades, pela dignificação daeconomia popular, pela integraçãourbana das vossas favelas e

agrupamentos, pela auto-construçãode moradias e o desenvolvimentodas infra-estruturas do bairro e emmuitas actividades comunitárias quetendem à reafirmação de algo tãoelementar e inegavelmentenecessário como o direito aos “3 T”:terra, tecto e trabalho.

Este apego ao bairro, à terra, àprofissão, à corporação, estereconhecer-se no rosto do outro,esta proximidade no dia-a-dia, comas suas misérias, porque elasexistem, temo-las nós mesmos, e os

seus heroísmos quotidianos, é o quepermite realizar o mandamento doamor, não a partir de ideias ouconceitos, mas a partir do genuínoencontro entre pessoas, precisamosinstaurar esta cultura do encontro,porque não se amam os conceitosnem as ideias, ninguém ama umconceito, ninguém ama uma ideia;amam-se as pessoas. A entrega, averdadeira entrega nasce do amorpelos homens e mulheres, criançase idosos, vilarejos e comunidades...Rostos e nomes que enchem ocoração. A partir destas sementes

de esperança semeadaspacientemente nas periferiasesquecidas do planeta, destesrebentos de ternura que lutam porsubsistir na escuridão da exclusão,crescerão grandes árvores, surgirãobosques densos de esperança paraoxigenar este mundo.

Vejo, com alegria, que trabalhais noque aparece ao vosso alcance,cuidando dos rebentos; mas, aomesmo tempo, com umaperspectiva mais ampla, protegendoo arvoredo. Trabalhais numa

perspectiva que não só aborda arealidade sectorial que cada um devós representa e na qual felizmenteestá enraizada, mas procuraistambém resolver, na sua raiz, osproblemas gerais de pobreza,desigualdade e exclusão.

Felicito-vos por isso. Éimprescindível que, a par dareivindicação dos seus legítimosdireitos, os povos e as organizaçõessociais construam uma alternativahumana à globalização exclusiva.Vós sois semeadores de mudança.

Que Deus vos dê coragem, vos dêalegria, vos dê perseverança epaixão para continuar a semear.Podeis ter a certeza de que, maiscedo ou mais tarde, vamos ver osfrutos. Peço aos dirigentes: sedecriativos e nunca percais o apego àscoisas próximas, porque o pai damentira sabe usurpar palavrasnobres, promover modas intelectuaise adoptar posições ideológicas, masse construirdes sobre bases sólidas,sobre as necessidades reais e aexperiência viva dos vossos irmãos,dos camponeses e indígenas, dos

trabalhadores excluídos e famíliasmarginalizadas, de certeza não vosequivocareis.

A Igreja não pode nem deve ficaralheia a este processo no anúnciodo Evangelho. Muitos sacerdotes eagentes pastorais realizam umatarefa imensa acompanhando epromovendo os excluídos de todo omundo, ao lado de cooperativas,dando impulso a empreendimentos,construindo casas, trabalhandoabnegadamente nas áreas dasaúde, desporto e educação. Estou

convencido de que a cooperaçãoamistosa com os movimentospopulares pode robustecer estesesforços e fortalecer os processosde mudança.

No coração, tenhamos sempre aVirgem Maria, uma jovem humildeduma pequena aldeia perdida naperiferia dum grande império, umamãe sem tecto que soubetransformar um curral de animais nacasa de Jesus com uns pobrespaninhos e uma montanha deternura. Maria é sinal de esperança

para os povos que sofrem dores departo até que brote a justiça. Rezo àVirgem Maria, tão venerada pelopovo boliviano, para que permita queeste nosso Encontro seja fermentode mudança.

3. Por último, gostaria quereflectíssemos, juntos, sobrealgumas tarefas importantes nestemomento histórico, pois queremosuma mudança positiva em benefíciode todos os nossos irmãos e irmãs.Disto estamos certos! Queremosuma mudança que se enriqueça com

o trabalho conjunto de governos,movimentos populares e outrasforças sociais. Sabemos istotambém! Mas não é tão fácil definiro conteúdo da mudança, ou seja, oprograma social que reflicta esteprojecto de fraternidade e justiçaque esperamos, não é fácil defini-lo.Neste sentido, não esperem umareceita deste Papa. Nem o Papanem a Igreja têm o monopólio dainterpretação da realidade social eda proposta de soluções paraproblemas contemporâneos.Atrever-me-ia a dizer que não existe

uma receita. A história é construídapelas gerações que se vãosucedendo no horizonte de povosque avançam individuando o própriocaminho e respeitando os valoresque Deus colocou no coração.

Gostaria, no entanto, de vos proportrês grandes tarefas que requerema decisiva contribuição do conjuntodos movimentos populares:

3.1 A primeira tarefa é pôr aeconomia ao serviço dos povos.

Os seres humanos e a natureza nãodevem estar ao serviço do dinheiro.Digamos NÃO a uma economia deexclusão e desigualdade, onde odinheiro reina em vez de servir. Estaeconomia mata. Esta economiaexclui. Esta economia destrói a MãeTerra.

A economia não deveria ser ummecanismo de acumulação, mas acondigna administração da casacomum. Isto implica cuidarzelosamente da casa e distribuiradequadamente os bens entre

todos. A sua finalidade não éunicamente garantir o alimento ouum «decoroso sustento». Não ésequer, embora fosse já um grandepasso, garantir o acesso aos “3 T”pelos quais combateis. Umaeconomia verdadeiramentecomunitária – poder-se-ia dizer, umaeconomia de inspiração cristã –deve garantir aos povos dignidade,«prosperidade e civilização em seusmúltiplos aspectos».[1] Esta últimafrase foi pronunciada pelo PapaJoão XXIII há cinquenta anos. Jesusfala no Evangelho que aquele que

espontaneamente dê um copo-d’água a quem tem sede, isso lheserá tido em conta no Reino dosCéus. Isto envolve os “3 T” mastambém acesso à educação, àsaúde, à inovação, àsmanifestações artísticas e culturais,à comunicação, ao desporto e àrecreação. Uma economia justadeve criar as condições para quecada pessoa possa gozar dumainfância sem privações, desenvolveros seus talentos durante ajuventude, trabalhar com plenosdireitos durante os anos de

actividade e ter acesso a uma dignaaposentação na velhice. É umaeconomia onde o ser humano, emharmonia com a natureza, estruturatodo o sistema de produção edistribuição de tal modo que ascapacidades e necessidades decada um encontrem um apoioadequado no ser social. Vós – eoutros povos também – resumiseste anseio duma maneira simples ebela: «viver bem», que não é amesma coisa que «aproveitar».

Esta economia é não apenas

desejável e necessária, mastambém é possível. Não é umautopia, nem uma fantasia. É umaperspectiva extremamente realista.Podemos consegui-la. Os recursosdisponíveis no mundo, fruto dotrabalho intergeneracional dos povose dos dons da criação, são maisque suficientes para odesenvolvimento integral de «todosos homens e do homem todo».[2]Mas o problema é outro. Existe umsistema com outros objectivos. Umsistema que, além de acelerarirresponsavelmente os ritmos da

produção, além de implementarmétodos na indústria e naagricultura que sacrificam a MãeTerra na ara da «produtividade»,continua a negar a milhares demilhões de irmãos os maiselementares direitos económicos,sociais e culturais. Este sistemaatenta contra o projecto de Jesus,contra a Boa Nova que Jesustrouxe.

A justa distribuição dos frutos daterra e do trabalho humano não émera filantropia. É um dever moral.

Para os cristãos, o encargo é aindamais forte: é um mandamento.Trata-se de devolver aos pobres eàs pessoas o que lhes pertence. Odestino universal dos bens não é umadorno retórico da doutrina social daIgreja. É uma realidade anterior àpropriedade privada. A propriedade,sobretudo quando afecta osrecursos naturais, deve estarsempre em função dasnecessidades das pessoas. E estasnecessidades não se limitam aoconsumo. Não basta deixar cairalgumas gotas, quando os pobres

agitam este copo que, por si só,nunca derrama. Os planos deassistência que acodem a certasemergências deveriam ser pensadosapenas como respostas transitórias,conjunturais. Nunca poderiamsubstituir a verdadeira inclusão: ainclusão que dá o trabalho digno,livre, criativo, participativo esolidário.

E neste caminho, os movimentospopulares têm um papel essencial,não apenas exigindo e reclamando,mas fundamentalmente criando. Vós

sois poetas sociais: criadores detrabalho, construtores de casas,produtores de alimentos, sobretudopara os descartados pelo mercadoglobal.

Conheci de perto váriasexperiências, onde ostrabalhadores, unidos emcooperativas e outras formas deorganização comunitária,conseguiram criar trabalho onde sóhavia sobras da economia idólatra.E vi que alguns estão aqui. Asempresas recuperadas, as feiras

francas e as cooperativas decatadores de papelão são exemplosdesta economia popular que surgeda exclusão e que pouco a pouco,com esforço e paciência, adoptaformas solidárias que a dignificam. Equão diferente é isto do facto de osdescartados pelo mercado formalserem explorados como escravos!

Os governos que assumem comoprópria a tarefa de colocar aeconomia ao serviço das pessoasdevem promover o fortalecimento,melhoria, coordenação e expansão

destas formas de economia populare produção comunitária. Isto implicamelhorar os processos de trabalho,prover de adequadas infra-estruturas e garantir plenos direitosaos trabalhadores deste sectoralternativo. Quando Estado eorganizações sociais assumem,juntos, a missão dos “3 T”, activam-se os princípios de solidariedade esubsidiariedade que permitemconstruir o bem comum numademocracia plena e participativa.

3.2 A segunda tarefa é unir os

nossos povos no caminho da paz eda justiça.

Os povos do mundo querem serartífices do seu próprio destino.Querem caminhar em paz para ajustiça. Não querem tutelas neminterferências, onde o mais fortesubordina o mais fraco. Querem quea sua cultura, o seu idioma, os seusprocessos sociais e tradiçõesreligiosas sejam respeitados.Nenhum poder efectivamenteconstituído tem direito de privar ospaíses pobres do pleno exercício da

sua soberania e, quando o fazem,vemos novas formas de colonialismoque afectam seriamente aspossibilidades de paz e justiça,porque «a paz funda-se não só norespeito pelos direitos do homem,mas também no respeito pelo direitodos povos, sobretudo o direito àindependência».[3]

Os povos da América Latinaalcançaram, com um parto doloroso,a sua independência política e,desde então, viveram já quase doisséculos duma história dramática e

cheia de contradições procurandoconquistar uma independência plena.

Nos últimos anos, depois de tantosmal-entendidos, muitos paíseslatino-americanos viram crescer afraternidade entre os seus povos.Os governos da região juntaramseus esforços para fazer respeitar asua soberania, a de cada país e ada região como um todo que, deforma muito bela como faziam osnossos antepassados, chamam a«Pátria Grande». Peço-vos, irmãose irmãs dos movimentos populares,

que cuidem e façam crescer estaunidade. É necessário manter aunidade contra toda a tentativa dedivisão, para que a região cresçaem paz e justiça.

Apesar destes avanços, aindasubsistem factores que atentamcontra este desenvolvimento humanoequitativo e coarctam a soberaniados países da «Pátria Grande» edoutras latitudes do Planeta. O novocolonialismo assume variadasfisionomias. Às vezes, é o poderanónimo do ídolo dinheiro:

corporações, credores, algunstratados denominados «de livrecomércio» e a imposição demedidas de «austeridade» quesempre apertam o cinto dostrabalhadores e dos pobres. Osbispos latino-americanos odenunciamos muito claramente, nodocumento de Aparecida, quando seafirma que «as instituiçõesfinanceiras e as empresastransnacionais se fortalecem aoponto de subordinar as economiaslocais, sobretudo debilitando osEstados, que aparecem cada vez

mais impotentes para levar adianteprojetos de desenvolvimento aserviço de suas populações».[4]Noutras ocasiões, sob o nobredisfarce da luta contra a corrupção,o narcotráfico ou o terrorismo –graves males dos nossos temposque requerem uma acçãointernacional coordenada – vemosque se impõem aos Estadosmedidas que pouco têm a ver com aresolução de tais problemáticas emuitas vezes tornam as coisaspiores.

Da mesma forma, a concentraçãomonopolista dos meios decomunicação social que pretendeimpor padrões alienantes deconsumo e certa uniformidadecultural é outra das formas queadopta o novo colonialismo. É ocolonialismo ideológico. Como dizemos bispos da África, muitas vezespretende-se converter os paísespobres em «peças de ummecanismo, partes de umaengrenagem gigante».[5]

Temos de reconhecer que nenhum

dos graves problemas dahumanidade pode ser resolvido sema interacção dos Estados e dospovos a nível internacional. Qualqueracto de envergadura realizado numaparte do Planeta repercute-se notodo em termos económicos,ecológicos, sociais e culturais. Até ocrime e a violência se globalizaram.Por isso, nenhum governo podeactuar à margem dumaresponsabilidade comum. Sequeremos realmente uma mudançapositiva, temos de assumirhumildemente a nossa

interdependência, ou seja, nossa sãinterdependência. Mas interacçãonão é sinónimo de imposição, não ésubordinação de uns em função dosinteresses dos outros. Ocolonialismo, novo e velho, quereduz os países pobres a merosfornecedores de matérias-primas emão de obra barata, gera violência,miséria, emigrações forçadas etodos os males que vêm juntos...precisamente porque, ao pôr aperiferia em função do centro, nega-lhes o direito a um desenvolvimentointegral. E isto, irmãos, é

desigualdade, e a desigualdadegera violência que nenhum recursopolicial, militar ou dos serviçossecretos será capaz de deter.

Digamos assim NÃO às velhas enovas formas de colonialismo.Digamos SIM ao encontro entrepovos e culturas. Bem-aventuradosos que trabalham pela paz.

E aqui quero deter-me num temaimportante. É que alguém poderá,com direito, dizer: «Quando o Papafala de colonialismo, esquece-se de

certas acções da Igreja». Compesar, vo-lo digo: Cometeram-semuitos e graves pecados contra ospovos nativos da América, em nomede Deus. Reconheceram-no osmeus antecessores, afirmou-o oCELAM, o Conselho EpiscopalLatino-americano, e quero reafirmá-lo eu também. Como São JoãoPaulo II, peço que a Igreja – e cito oque ele disse – «se ajoelhe diantede Deus e implore o perdão para ospecados passados e presentes dosseus filhos».[6] E eu quero dizer-vos, quero ser muito claro, como foi

São João Paulo II: Peçohumildemente perdão, não só paraas ofensas da própria Igreja, mastambém para os crimes contra ospovos nativos durante a chamadaconquista da América. E junto comeste pedido de perdão e para serjustos, também quero quelembremos a milhares desacerdotes, bispos, que fizeramoposição à lógica da espada com aforça da Cruz. Houve pecado, epecado abundante, mas nãopedimos perdão no passado. Porisso agora pedimos perdão, e peço

perdão; mas também lá, onde houvepecado, onde abundou o pecado,superabundou a graça atravésdestes homens que defenderam ajustiça dos povos originários.

Peço-vos também a todos, crentese não crentes, que se recordem detantos bispos, sacerdotes e leigosque pregaram e pregam a boa novade Jesus com coragem e mansidão,respeito e em paz – falei dosbispos, sacerdotes e leigos, masnão quero esquecer-me dasfreirinhas que caminham

anonimamente nos vossos bairrospobres levando uma mensagem depaz e de bem –; que, na suapassagem por esta vida, deixaramimpressionantes obras de promoçãohumana e de amor, pondo-se muitasvezes ao lado dos povos indígenasou acompanhando os própriosmovimentos populares mesmo atéao martírio. A Igreja, os seus filhose filhas, fazem parte da identidadedos povos na América Latina.Identidade que alguns poderes,tanto aqui como noutros países, seempenham por apagar, talvez

porque a nossa fé é revolucionária,porque a nossa fé desafia a tiraniado ídolo dinheiro. Hoje vemos, comhorror, como no Médio Oriente enoutros lugares do mundo sepersegue, tortura, assassina amuitos irmãos nossos pela sua féem Jesus. Isto também devemosdenunciá-lo: dentro desta terceiraguerra mundial em parcelas quevivemos, há uma espécie de – forçoum pouco a expressão – genocídioem curso que deve cessar.

Aos irmãos e irmãs do movimento

indígena latino-americano, deixem-me expressar a minha maisprofunda estima e felicitá-los porprocurarem a conjugação dos seuspovos e culturas segundo uma formade convivência, a que eu gosto dechamar poliédrica, onde as partesconservam a sua identidadeconstruindo, juntas, uma pluralidadeque não atenta contra a unidade,mas fortalece-a. A sua procuradesta interculturalidade que conjugaa reafirmação dos direitos dospovos nativos com o respeito àintegridade territorial dos Estados

enriquece-nos e fortalece-nos atodos.

3.3 E a terceira tarefa, e talvez amais importante que devemosassumir hoje, é defender a MãeTerra.

A casa comum de todos nós está aser saqueada, devastada, vexadaimpunemente. A covardia emdefendê-la é um pecado grave.Vemos, com crescente decepção,sucederem-se uma após outra ascimeiras internacionais sem qualquer

resultado importante. Existe umclaro, definitivo e inadiávelimperativo ético de actuar que nãoestá a ser cumprido. Não se podepermitir que certos interesses – quesão globais, mas não universais – seimponham, submetendo Estados eorganismos internacionais, econtinuem a destruir a criação. Ospovos e os seus movimentos sãochamados a clamar, mobilizar-se,exigir – pacífica mas tenazmente – aadopção urgente de medidasapropriadas. Peço-vos, em nome deDeus, que defendais a Mãe Terra.

Sobre este assunto, expressei-medevidamente na carta encíclicaLaudato si’, que creio que vos seráentregue na conclusão.

4. Para concluir, quero dizer-lhesnovamente: O futuro da humanidadenão está unicamente nas mãos dosgrandes dirigentes, das grandespotências e das elites. Estáfundamentalmente nas mãos dospovos; na sua capacidade de seorganizarem e também nas suasmãos que regem, com humildade econvicção, este processo de

mudança. Estou convosco. E cadaum, repitamos a nós mesmos dofundo do coração: nenhuma famíliasem tecto, nenhum camponês semterra, nenhum trabalhador semdireitos, nenhum povo semsoberania, nenhuma pessoa semdignidade, nenhuma criança seminfância, nenhum jovem sempossibilidades, nenhum idoso semuma veneranda velhice. Continuaicom a vossa luta e, por favor, cuidaibem da Mãe Terra. Acreditai emmim, e sou sincero, de coração vosdigo: Rezo por vós, rezo convosco e

quero pedir a nosso Pai Deus quevos acompanhe e abençoe, que voscumule do seu amor e defenda nocaminho concedendo-vos, emabundância, aquela força que nosmantém de pé: esta força é aesperança, a esperança que nãodecepciona. E peço-vos, por favor,que rezeis por mim. E se algum devós não pode rezar, com todo orespeito, peço-te que me tenha emteus pensamentos e mande-me umaboa “onda”. Obrigado!

[1]João XXIII, Carta enc. Mater et

Magistra (15 de Maio de 1961), 3:AAS 53 (1961), 402.

[2]Paulo VI, Carta enc. Populorumprogressio, 14.

[3]Pontifício Conselho «Justiça epaz», Compêndio da Doutrina Socialda Igreja, 157.

[4]V Conferência Geral doEpiscopado Latino-Americano e doCaribe (2007), Documento deAparecida, 66.

Discurso do Papa durantevisita ao Centro de

Reabilitação PalmasolaSanta Cruz de La Sierra,

Bolívia

Sexta-feira, 10 de julhode 2015

Queridos irmãos e irmãs!

Não podia deixar a Bolívia sem virver-vos, sem deixar de partilhar a fée a esperança que nascem do amor

entregue na cruz.

Obrigado por me receberem. Seique se prepararam e rezaram pormim. Muito obrigado!

Nas palavras de D. Jesús Juárez eno testemunho dos irmãos quefalaram, pude comprovar que a dornão é capaz de apagar a esperançano mais fundo do coração e que avida continua a jorrar com força emcircunstâncias adversas.

Quem está diante de vós? Poderiam

perguntar-se. Gostaria deresponder-lhes à pergunta com umacerteza da minha vida, com umacerteza que me marcou parasempre. Aquele que está diante devós é um homem perdoado. Umhomem que foi e está salvo de seusmuitos pecados. E é assim comome apresento. Não tenho muito maispara lhes dar ou oferecer, mas oque tenho e amo quero dar-vo-lo,quero partilhá-lo: É Jesus, JesusCristo, a misericórdia do Pai.

Ele veio para nos mostrar, fazer

visível o amor que Deus tem pornós. Por vós, por ti, por mim. Umamor activo, real. Um amor quelevou a sério a realidade dos seus.Um amor que cura, perdoa, levanta,cuida. Um amor que se aproxima edevolve a dignidade. Uma dignidade,que podemos perder de muitasmaneiras e formas. Mas, nisto,Jesus é um obstinado: deu a suavida por isto, para nos devolver aidentidade perdida, para nos revestircom toda a sua força de dignidade.

Lembro-me duma experiência que

nos pode ajudar. Pedro e Paulo,discípulos de Jesus, tambémestiveram encarcerados; tambémforam privados da liberdade. Nessacircunstância, houve algo que ossustentou, algo que não os deixoucair no desespero, que não osdeixou cair na escuridão que podebrotar da falta de sentido: foi aoração. Foi orar. Oração pessoal ecomunitária. Eles rezaram, e poreles se rezava. Dois movimentos,duas acções que geram entre siuma rede que sustenta a vida e aesperança. Sustenta-nos contra o

desespero e incentiva-nos aprosseguir o caminho. Uma rede quevai sustentando a vida, a vossa e adas vossas famílias. Tu falavas datua mãe [dirigindo-se à pessoa quedeu o seu testemunho no começo].A oração das mães, a oração dasesposas, a oração dos filhos, avossa oração: isto é uma rede, quevai levando a vida para adiante.

Porque uma pessoa, quando Jesusentra na sua vida, não fica detida noseu passado, mas começa a olhar opresente de outra forma, com outra

esperança. A pessoa começa a vercom outros olhos a si mesma, a suaprópria realidade. Não ficaenclausurado no que aconteceu,mas é capaz de chorar e encontrarnisso a força para voltar a começar.E, se em determinados momentosnos sentimos tristes, estamos mal,abatidos, convido-vos a fixar o rostode Jesus crucificado. No seu olhar,todos podemos encontrar espaço.Todos podemos colocar junto d’Eleas nossas feridas, as nossas dorese também os nossos erros, nossospecados, tantas coisas em que

podemos ter errado. Nas chagas deJesus, encontram lugar as nossaschagas. Porque todos estamoschagados, de uma ou outra maneira.E então levar as nossas chagas atéàs chagas de Jesus. Para que?Para serem curadas, lavadas,transformadas, ressuscitadas. Elemorreu por ti, por mim, para nos dara mão e levantar-nos. Conversaicom os sacerdotes que aqui vêm,conversai. Conversai com todos osque vêm para falar-vos de Jesus.Jesus sempre vos quer levantar.

Esta certeza move-nos a trabalharpela nossa dignidade. Reclusão nãoé o mesmo que exclusão – que fiqueclaro -, porque a reclusão faz partedum processo de reinserção nasociedade. Há muitos elementos –bem o sei – que jogam contra estelugar, e tu [dirigindo-se novamente àpessoa que deu o seu testemunhono começo] mencionaste algunsdestes elementos com muitaclareza: a superlotação, amorosidade da justiça, a falta deterapias ocupacionais e de políticasde reabilitação, a violência, a

carência de facilidades de estudosuniversitários. Tudo isso tornanecessário uma pronta e eficazaliança interinstitucional para seencontrar respostas.

Mas, enquanto se luta por isso, nãopodemos dar tudo por perdido. Hojehá coisas que podemos fazer.

Aqui, neste Centro de Reabilitação,a convivência depende em parte devós. O sofrimento e a privaçãopodem tornar o nosso coraçãoegoísta e levar a confrontos, mas

também temos a capacidade de ostransformar em ocasião de autênticafraternidade. Ajudai-vosmutuamente. Não tenhais medo devos ajudar entre vós. O diaboprocura a briga, procura arivalidade, a divisão, os bandos. Nãolhe deis ouvido. Lutai para sairdesvencedores contra ele, unidos.

Gostaria também de vos pedir queleveis a minha saudação às vossasfamílias. Algumas estão aqui. É tãoimportante a presença e a ajuda dafamília! Os avós, o pai, a mãe, os

irmãos, o cônjuge, os filhos.Lembram-nos que vale a pena vivere lutar por um mundo melhor.

Finalmente, uma palavra deencorajamento a todos os quetrabalham neste Centro: aos seusdirigentes, aos agentes da PolíciaCarcerária, a todo o pessoal. Vósrealizais um serviço públicofundamental. Desempenhais umatarefa importante neste processo dereinserção; tarefa de levantar e nãorebaixar, de dignificar e nãohumilhar, de animar e não

acabrunhar. Este processo requerdeixar a lógica de bons e maus parapassar a uma lógica centrada naajuda à pessoa. E esta lógica deajudar a pessoa vos salvará a vósde todo o tipo de corrupção emelhorará as condições para todos,porque um processo assim vividodignifica-nos, anima-nos e levanta-nos a todos.

Antes de vos dar a bênção, gostariaque rezássemos uns momentos emsilêncio, em silêncio cada um desdeo seu coração. Cada um faça-o

como sabe.

Por favor, peço-vos que continueis arezar por mim, porque eu tambémtenho os meus erros e devo fazerpenitência. Muito Obrigado!

[silêncio]

E que Deus nosso Pai olhe o nossocoração; e que Deus nosso Pai, quenos ama, nos dê a sua força, suapaciência, sua ternura de Pai e nosabençoe. Em nome do Pai, e doFilho e do Espírito Santo. E não vos

esqueçais de rezar por mim.Obrigado.

PARAGUAI

Discurso Encontro com asautoridades e com ocorpo diplomático

Sexta-feira, 10 de julhode 2015

Senhor Presidente,

Autoridades da República,

Membros do Corpo Diplomático,

Senhoras e Senhores!

Saúdo cordialmente VossaExcelência, Senhor Presidente daRepública, e agradeço-lhe asdeferentes palavras de boas-vindase estima que me dirigiu, em nomepróprio e ainda do governo, dosaltos cargos do Estado e do queridopovo paraguaio. Saúdo também osilustres membros do CorpoDiplomático e, através deles, façochegar os meus sentimentos derespeito e apreço aos respectivospaíses.

Um sentido «obrigado» a todas aspessoas e instituições quecolaboraram, com esforço ededicação, na preparação destaviagem para que me sentisse emcasa. Não é difícil sentir-se emcasa, nesta terra tão acolhedora. OParaguai é conhecido como ocoração da América, não só pelasua posição geográfica mastambém pelo calor da hospitalidadee proximidade do seu povo.

Desde os seus primeiros passoscomo nação independente até diasainda recentes, a história do

Paraguai conheceu o sofrimentoterrível da guerra, do confrontofratricida, da falta de liberdade e daviolação dos direitos humanos.Tanta dor e tanta morte! Mas éadmirável a tenacidade e o espíritode superação do povo paraguaiopara se refazer perante tantaadversidade e prosseguir nos seusesforços por construir uma naçãopróspera e em paz. Aqui, no jardimdeste palácio – que foi testemunhada história do Paraguai, desdequando era apenas margem do rio eera usado pelos Guaranis até aosúltimos acontecimentos

contemporâneos – quero prestarhomenagem aos milhares deparaguaios simples, cujos nomesnão aparecerão escritos nos livrosde história mas que foram econtinuam a ser verdadeirosprotagonistas da vida do seu povo.E quero reconhecer, com emoção eadmiração, o papel desempenhadopela mulher paraguaia nestesmomentos dramáticos da história.Sobre os seus ombros de mães,esposas e viúvas carregaram opeso maior, souberam levar pordiante as suas famílias e o seu país,infundindo nas novas gerações a

esperança num amanhã melhor.

Um povo que esquece o seupassado, a sua história, as suasraízes, não tem futuro. A memória,firmemente apoiada na justiça e livrede sentimentos de vingança e ódio,transforma o passado numa fontede inspiração para construir umfuturo de convivência e harmonia,tornando-nos cientes da tragédia einsensatez que é a guerra. Nuncamais guerras entre irmãos!Construamos sempre a paz! Umapaz também do dia a dia, uma pazda vida quotidiana na qual todos

participamos evitando gestosarrogantes, palavras ofensivas,atitudes prepotentes e,positivamente, fomentando acompreensão, o diálogo e acolaboração.

Desde há vários anos que oParaguai está empenhado naconstrução dum projeto democráticosólido e estável. É justo reconhecer,com satisfação, quanto progressose fez neste caminho, graças aosesforços de todos, mesmo no meiode grandes dificuldades eincertezas. Encorajo-vos a continuar

trabalhando com todas as vossasforças para consolidar as estruturase instituições democráticas quedeem resposta às justas aspiraçõesdos cidadãos. A forma de governoadotada na Constituição – uma«democracia representativa,participativa e pluralista» –, baseadana promoção e respeito dos direitoshumanos, afasta a tentação dademocracia puramente formal,definida no documento de Aparecidacomo aquela que se contenta comestar «fundada em procedimentoseleitorais honestos» (cf. Aparecida74).

Em todas as áreas da sociedade,mas especialmente na atividadepública, deve-se promover o diálogocomo meio privilegiado parafavorecer o bem comum, baseadona cultura do encontro, do respeito edo reconhecimento das legítimasdiferenças e opiniões dos outros.Não se deve deter no conflito; umexercício interessante é decantar,no amor à pátria e ao povo, toda aperspectiva que nasce dasconvicções duma opção partidáriaou ideológica. E o mesmo amordeve ser o motor para crescerdiariamente em gestões

transparentes que lutam com ímpetocontra a corrupção.

Queridos amigos, nesta vontade deserviço e trabalho pelo bem comum,devem ocupar um lugar prioritário ospobres e necessitados. Muitosesforços estão a ser feitos para queo Paraguai avance no caminho docrescimento econômico. Deram-sepassos importantes no campo daeducação e da saúde. Que oesforço de todos os agentes sociaisnão cesse até que deixe de havercrianças sem acesso à educação,famílias sem teto, operários sem

trabalho digno, camponeses semterras para cultivar e pessoasobrigadas a emigrar para um futuroincerto; deixe de haver vítimas daviolência, da corrupção ou donarcotráfico. Um desenvolvimentoeconômico que não tem em conta osmais fracos e desfavorecidos não éverdadeiro desenvolvimento. Amedida do modelo econômico deveser a dignidade integral do serhumano, especialmente dos maisvulneráveis e indefesos.

Senhor Presidente, queridosamigos! Desejo, em nome também

dos meus irmãos bispos doParaguai, assegurar-lhes o empenhoe a colaboração da Igreja Católicano esforço comum por construir umasociedade justa e inclusiva, onde sepossa viver em paz e harmonia.Porque todos nós, incluindo ospastores da Igreja, somoschamados a preocupar-nos com aconstrução dum mundo melhor (cf.Evangelii gaudium, 183). A isso nosmove a certeza da nossa fé emDeus, que quis fazer-Se homem e,vivendo entre nós, compartilhar onosso destino. Cristo abre-nos ocaminho da misericórdia, que se

baseia na justiça mas vai mais longee ilumina a caridade, de modo queninguém fique à margem destagrande família que é o Paraguai, aoqual amais e quereis servir.

Com imensa alegria por meencontrar nesta terra consagrada àVirgem de Caacupé, imploro abênção do Senhor sobre todos vós,sobre as vossas famílias e sobretodo o querido povo paraguaio. Queo Paraguai seja fecundo como oindica a flor da passiflora no mantoda Virgem e, como essa faixa comas cores do Paraguai que cinge a

imagem, assim a nação se abrace àMãe de Caacupé. Muito obrigado!

Visita ao HospitalPediátrico Ñinos de Acosta

Ñu

Sábado, 11 de Julho de2015

Senhor Director,

Queridas crianças, Membros dopessoal,

Amigos todos!

Obrigado pela recepção tão

calorosa que me fizeram! Obrigadopor este tempo que me concedeispassar convosco!

Queridas crianças, quero fazer-vosuma pergunta, para ver se meajudais. Disseram-me que sois muitointeligentes, pelo que me animei afazê-la: Jesus zangou-se algumavez? Lembrais-vos quando foi? Eusei que é uma pergunta difícil, dou-vos uma ajuda. Foi quando nãodeixaram aproximar-se d’Ele ascrianças. É a única vez, em todo oEvangelho de Marcos, que se usa

esta palavra (Mc 10, 13-15).Significa quase o mesmo que anossa expressão: encheu-se de ira.Já alguma vez vos zangastes? Poisbem! Foi assim que ficou Jesus,quando não deixaram vir para juntod’Ele as crianças, crianças comovós. Ele ficou muito zangado. Ascrianças contam-se entre ospredilectos de Jesus. Não significaque não gostava dos mais velhos,mas que Se sentia feliz quandopodia estar com elas. Fazia-Lhemuito bem a amizade e companhiadelas. E não só queria tê-las perto;

mais do que isso: deu-as comoexemplo. Disse aos discípulos: «Senão voltardes a ser como ascriancinhas, não podereis entrar noReino do Céu» (Mt 18, 3).

As crianças estavam longe, os maisvelhos não as deixavam aproximar-se, mas Jesus chamou-as, abraçou-as e pô-las no meio para que todosaprendêssemos a ser como elas.Hoje Ele diria o mesmo a nós. Fixa-nos e diz: Aprendei delas.

Devemos aprender de vós, da vossa

confiança, alegria, ternura; da vossacapacidade de luta, da vossafortaleza; da vossa capacidadeincomparável de resistir. Sois unslutadores. E, quando alguém temtais «guerreiros» à sua frente,sente-se orgulhoso. Não é verdade,ó mães? Não é verdade, ó pais eavós? Ver-vos dá-nos força, dá-noscoragem para ter confiança, paraavançar.

Mães, pais, avós, sei que não énada fácil estar aqui. Há momentosde muita dor, incerteza. Há

momentos de forte angústia queoprime o coração, e há momentosde grande alegria. Os doissentimentos coexistem, estão emnós. Mas não há melhor remédioque a vossa ternura, a vossaproximidade. E alegra-me saberque, entre vós famílias, vos ajudais,animais, dais um «empurrãozinho»para prosseguir e atravessar estemomento.

Contais com o apoio dos médicos,dos enfermeiros e de todo o pessoaldesta casa. Obrigado por esta

vocação de serviço, que ajuda nãosó a curar, mas também aacompanhar a dor dos vossosirmãos.

Não nos esqueçamos disto: Jesusestá perto dos vossos filhos; estámuito perto: no coração. Nãohesiteis em suplicar-Lhe, nãohesiteis em falar com Ele, emcompartilhar as vossas dúvidas, asvossas dores. Ele está sempre aovosso lado; mas sempre, e não vosdeixará cair.

E, duma coisa, temos a certeza emais uma vez o confirmo. Ondeestiver um filho, está a mãe. Ondeestiver Jesus, está Maria, a Virgemde Caacupé. Peçamos-Lhe que vosproteja com o seu manto, queinterceda por vós e pelas vossasfamílias.

E não vos esqueçais de rezar pormim. Tenho a certeza de que asvossas orações chegam ao céu.

Homilia Praça doSantuário Mariano de

Caacupé

Sábado, 11 de julho de2015

Estar aqui com vocês é me sentirem casa, aos pés da nossa Mãe, aVirgem dos Milagres de Caacupé.Num santuário, nós, filhos, nosencontramo com a nossa Mãe e noslembramos de que somos irmãosuns dos outros. É um lugar de festa,de encontro, de família. Vimos

apresentar as nossas necessidades,vimos agradecer, pedir perdão erecomeçar. Muitos batismos, muitasvocações sacerdotais e religiosas,muitos namoros e matrimôniosnasceram aos pés da nossa Mãe.Muitas lágrimas e despedidas.Vimos sempre com a nossa vida,porque aqui estamos em casa e omelhor de tudo é saber que háalguém que nos espera.

Como tantas outras vezes, viemosporque queremos renovar a paixãode viver a alegria do Evangelho.

Como não reconhecer que esteSantuário é parte vital do povoparaguaio, de vocês. Assim o sentis,assim o rezais, assim o cantais: ‘Noteu Éden de Caacupé, é o teu povo,Virgem pura, que Te dá o seu amore fé’. E estamos hoje, como Povode Deus, aos pés da nossa Mãepara Lhe dar o nosso amor e fé.

No Evangelho, acabamos de ouvir oanúncio do Anjo a Maria com estaspalavras: Alegra-Te, ó cheia degraça, o Senhor está contigo.Alegra-Te, Maria; alegra-Te!Perante essa saudação, Ela ficou

perplexa e Se interrogava sobre oseu significado. Não entende grandecoisa do que estava acontecendo;mas soube que vinha de Deus edisse: Sim.

Um sim que não foi nada fácil deviver, como sabemos. Um sim, quenão a cumulou de privilégios nemdistinções; antes, como Lhe diráSimeão na sua profecia, ‘umaespada [Lhe] trespassará a alma’(Lc 2, 35). E sabemos que atrespassou… Por isso A amamostanto, encontrando n’Ela umaverdadeira Mãe que nos ajuda a

manter viva a fé e a esperança nomeio das situações maiscomplicadas. Seguindo a profeciade Simeão, nos fará bem reverbrevemente três momentos difíceisna vida de Maria.

1. O nascimento de Jesus. Nãohavia lugar para eles. Não tinhamuma casa, uma morada parareceber o seu filho. Não havia lugar,onde pudesse dar à luz. Nem famíliapor perto, estavam sozinhos. Oúnico lugar disponível era um curralde animais. E, na sua memória,ecoavam certamente as palavras do

Anjo: Alegra-Te, Maria, o Senhorestá contigo. E poderia ter Seperguntado: Onde está Ele agora?

2. A fuga para o Egito. Tiveram departir, Se exilar. Em Belém, não sónão havia lugar nem família, mas atémesmo as suas vidas corriamperigo. Tiveram que sair, partindopara uma terra estrangeira. Foramemigrantes pela cobiça e a ganânciado Rei Herodes. E lá poderia ter Seperguntado: Onde está aquilo que oAnjo me disse?

3. A morte na cruz. Não deve haver

situação mais difícil para uma mãedo que acompanhar a morte de umfilho. São momentos lancinantes. Lá,ao pé da cruz, vemos Maria, comoqualquer mãe, firme, semabandonar, mas acompanhando seufilho até ao momento extremo damorte e morte de cruz. E, emseguida, contendo e sustentando osdiscípulos.

Vemos a sua vida e nos sentimoscompreendidos, entendidos.Podemos nos sentar, rezar e usaruma linguagem comum a tantassituações que vivemos diariamente.

Podemos nos identificar com muitassituações da sua vida. Contar-Lheas nossas coisas, porque Ela asentende.

Ela é a mulher de fé, é a Mãe daIgreja, Ela acreditou. A sua vida étestemunha de que Deus nãodecepciona, não abandona o seuPovo, embora existam momentos ousituações onde parece que Ele nãoestá. Ela foi a primeira discípula queacompanhou seu Filho e sustentou aesperança dos apóstolos nosmomentos difíceis. Foi a mulher queesteve atenta e soube dizer –

quando parecia ser o fim da festa eda alegria: ‘Não têm vinho!’ (Jo 2,3). Foi a mulher que soube ir e ficarcom a sua prima Isabel ‘cerca detrês meses’ (Lc 1, 56), para essanão estar sozinha no parto. Essa énossa Mãe, boa e generosa.

Sabemos tudo isso pelo Evangelho;mas também sabemos que, nestaterra, é a Mãe que esteve ao nossolado em muitas situações difíceis.Este Santuário guarda como umtesouro a memória de um Povo quesabe que Maria é Mãe, que estevee está ao lado dos seus filhos.

Esteve e está nos nossos hospitais,nas nossas escolas, nas nossascasas. Esteve e está nos nossostrabalhos e nos nossos caminhos.Esteve e está à mesa de cada lar.Esteve e está na formação daPátria, fazendo-nos uma Nação.Sempre com uma presença discretae silenciosa. Quando olhamos umaimagem, santinho ou medalha, osinal de um terço, sabemos que nãoandamos sozinhos, que Ela nosacompanha. Por que motivo?Porque Maria quis estar no meio deseu Povo, com os seus filhos, com asua família. Seguindo sempre Jesus,

no meio da multidão. Não quis,como boa mãe, abandonar os seus;antes pelo contrário, sempreapareceu onde um filho podia ternecessidade d’Ela. E isso, sóporque é Mãe.

Uma Mãe que aprendeu a ouvir e aviver, no meio de tantasdificuldades, aquele ‘não temas, oSenhor está contigo’. Uma Mãe quecontinua a nos dizer: ‘Fazei o queEle vos disser’. Esse é o seu conviteconstante e contínuo: ‘Fazei o queEle vos disser’. Não tem umprograma próprio, não vem nos

dizer nada de novo. Apenas a sua féacompanha a nossa fé.

Vocês sabem disso,experimentaram o que estamospartilhando convosco. Todos vocês,todos os paraguaios têm a memóriaviva de um Povo que encarnouessas palavras do Evangelho. Equero me referir de modo especial avocês, mulheres e mães paraguaias,que, com grande coragem ededicação, souberam levantar umpaís derrotado, afundado, submersopela guerra. Vocês têm a memória,o DNA daquelas que reconstruíram

a vida, a fé, a dignidade do seupovo. Como Maria, viveramsituações muito, muito difíceis, que,vistas sob uma lógica comum,poriam em causa toda a fé. Pelocontrário vocês, como Maria,impelidas e sustentadas pelo seuexemplo, continuaram crentes,inclusive ‘com uma esperança paraalém do que se podia esperar’ (Rm4, 18). Quando tudo parecia sedesmoronar, diziam juntamente comMaria: Não temamos! O Senhorestá conosco, está com o nossopovo, com as nossas famílias;façamos o que Ele nos disser. E,

assim, encontraram ontem eencontram hoje força para nãodeixar que esta terra caia no caos.Deus abençoe essa tenacidade,Deus abençoe e anime a fé devocês, Deus abençoe a mulherparaguaia, a mais gloriosa daAmérica.

Como povo, viemos à nossa casa, àcasa da Pátria paraguaia, para ouvirmais uma vez estas palavras quenos fazem muito bem: ‘Alegra-te, oSenhor está contigo’. São um apeloa não perder a memória, as raízes,os inúmeros testemunhos que

receberam de povo crente,comprovado pelas suas lutas. Umafé que se fez vida, uma vida que sefez esperança e uma esperança quevos leva a ‘primeirear’ na caridade.Sim, como Jesus, ‘primeireou’ noamor. Sejam vocês os portadoresdesta fé, desta vida, destaesperança. Sejam vocês,paraguaios, os forjadores deste hojee do amanhã.

Voltando o olhar para a imagem deMaria, convido vocês a dizer juntos:‘No teu Éden de Caacupé, é o teupovo, Virgem pura, que Te dá o seu

amor e fé’. Todos juntos: ‘No teuÉden de Caacupé, é o teu povo,Virgem pura, que Te dá o seu amore fé’. Rogai por nós, Santa Mãe deDeus, para que sejamos dignos dealcançar as promessas e graças denosso Senhor Jesus Cristo. Amém

Discurso do PapaFrancisco com

representantes dasociedade civil

Sábado, 11 de julho de2015

Boa tarde!Eu escrevi isto com base nasperguntas que me chegaram, quenão são todas as que vocês fizeram,assim que, aquilo que faltar, ireicompletando na medida que vou

falando. de tal maneira que namedida que eu possa, quero darminha opinião sobre as reflexões devocês.Sinto-me feliz em estar convosco,representantes da sociedade civil,para partilhar esses sonhos eesperanças num futuro melhor eproblemas. Agradeço a D. AdalbertoMartínez Flores, Secretário daConferência Episcopal do Paraguai,essas palavras de boas-vindas queme dirigiu em nome de todos. Eagradeço às seis pessoas que

falaram, cada uma delasrepresentando um aspecto de suareflexão.Ver-vos a todos, um vindo de umsetor, duma organização destasociedade paraguaia, com as suasalegrias, preocupações, lutas emotivações, leva-me a dar graças aDeus. Ou seja, parece que oParaguai não está morto, graças aDeus. Porque um povo que vive, umpovo que não mantém vivas as suaspreocupações, um povo que vive nainércia duma aceitação passiva é um

povo morto. Pelo contrário, em vós,vejo a seiva duma vida que não parae quer germinar. Isto, Deus sempreo abençoa. Deus está sempre afavor de tudo o que ajuda a levantare melhorar a vida dos seus filhos. Éverdade que há coisas que estãomal; há situações injustas. Mas ofato de vos ver e ouvir ajuda-me arenovar a esperança no Senhor, quecontinua a atuar no meio do seupovo. Vocês vem de diferentespanoramas, situações e causas;todos juntos formais a cultura

paraguaia. Todos sois necessáriosna busca do bem comum. «Nascondições atuais da sociedademundial, onde há tantasdesigualdades e são cada vez maisnumerosas as pessoasdescartadas» (LS 158), ver-vostodos aqui é uma dádiva. É umpresente porque nas pessoas quefalaram, vi a vontade pelo bem dapátria.1. Relativamente à primeira questão,gostei de ouvir da boca dum jovem apreocupação de fazer com que a

sociedade seja um espaço defraternidade, justiça, paz e dignidadepara todos. A juventude é um tempode grandes ideais. Muitas vezes mevem de dizer, que me dá tristeza verum jovem aposentado. Como éimportante que vocês, jovens,comecem a intuir que a verdadeirafelicidade passa através da luta deum país mais fraterno! E é bom quevocês, jovens, vejam que felicidadee prazer não são sinônimos. Umacoisa é a felicidade e o gozo quevem e outra é um prazer

passageiro. A felicidade constrói, ésólida, edifica. A felicidade exigecompromisso e entrega. Vocês sãodemasiado valiosos, e por isto ocompromisso, a entrega, são muitovaliosos e não como que para andarpela vida como que anestesiados! OParaguai possui uma populaçãojovem abundante, o que constituiuma grande riqueza. Por isso, pensoque a primeira coisa a fazer é evitarque essa força se apague, esta luzque tendes em vossos coraçõesdesapareça, contrastando a

mentalidade crescente queconsidera inútil e absurdo aspirar acoisas que valham a pena. “Não quenão te intrometas, não, isto não seajeita mais” – essa mentalidade quepretende ir mais além é consideradaabsurda. (...). Mas jogá-la por algo,jogá-la por alguém. Esta é avocação da juventude e não tenhaismedo de deixar tudo para trás.Joguem limpo, joguem com todos.Não tenhais medo de dar o vossomelhor. Não busquem o conchavoprévio para evitar o cansaço, a luta.

Não corrompam.Isto sim, esta luta, não a façamsozinhos. Procurai dialogar,aproveitai para escutar a vida, asvicissitudes, as histórias dos vossosmais velhos e dos vossos avós, quetem sabedoria alí. Perdei muitotempo a ouvir todo o bem que têmpara vos ensinar. Eles são osguardiões desse patrimónioespiritual de fé e de valores quedefinem um povo e iluminam ocaminho. Encontrem confortotambém na força da oração, em

Jesus. Na sua presença diária econstante. Ele não decepciona.Jesus convida através da memóriado seu povo, é o segredo para ovosso coração se manter semprealegre na busca de fraternidade,justiça, paz e dignidade para todos.Que isto pode ser um perigo – “Sim,sim, eu quero fraternidade, justiça,paz, dignidade” – porém podeconverter-se em um nominalismos.Pura palavra! Não! A fraternidade, ajustiça, a paz e a dignidade devemser concretas, senão, não servem.

São de todos os dias! Devem serpraticadas todos os dias! Então, eupergunto a vocês, jovens, comotrabalhas com estes ideais no dia-a-dia, no concreto? Ainda que teequivocas, te corrijas e torne aandar. Porém, no concreto. Euconfesso para vocês que às vezesme dá um pouco de alergia, ou paranão dizer em termos tão finos, umpouco de ‘mormo’, ao escutardiscursos grandiloquentes comtodas estas palavras e quando seconhece a pessoa que fala, diz:

“Que mentiroso que és”. Por isto,somente palavras não servem. Sevocês dizem uma palavra,comprometam-se com esta palavra,trabalhem-na no dia-a-dia, dia-a-dia.Se sacrifiquem por isto! Secomprometam!Gostei da poesia de Carlos Miguel Giménez, que D. Adalberto Martínez citou. Acho que resume muito bem o que eu vos quis dizer: «[Sonho] um paraíso sem guerra entre irmãos, rico em homens saudáveis de alma e coração (…) e um Deus que

abençoa a sua nova ascensão». Sim, é um sonho. E tem duas garantias: que o sonho se desperte e seja realidade de todos os dias, e que Deus seja reconhecido como a garantia da dignidade nossa como homens.2. A segunda referiu-se ao diálogocomo meio para forjar um projeto deNação que inclua a todos. O diálogonão é fácil. Também existe odiálogo-teatro, por assim dizer,representamos dialogar, jogamoscom o diálogo e depois falamos

entre nós dois, entre nós dois. Odiálogo está sobre a mesa. Sevocês, no diálogo, não dizemrealmente o que sentem, o quepensam, e não te comprometes emescutar o outro, em ir ajustando oque vais pensando e conversando, odiálogo não serve, é uma pintura.Agora, também é verdade que odiálogo não é fácil, tem que superarmuitas dificuldades e às vezesparece que nos obstinamos emtornar as coisas ainda mais difíceis.Para que haja diálogo, é necessário

uma base fundamental, umaidentidade. Certo, por exemplo, eupenso no diálogo nosso, no diálogointer-religioso, onde representantesdas diversas religiões conversam.Nos reunimos, às vezes, para falar...os pontos de vista..., porém cadaum fala de sua identidade: “Eu soubudista, eu sou evangélico, eu souortodoxo, eu sou católico”. Cada umfala, porém, de sua identidade. Nãonegocia sua identidade. Ou seja,para que haja diálogo, é necessárioesta base fundamental. E qual é a

identidade em um país? - estamosfalando do diálogo social aqui – oamor à Pátria. A Pátria primeiro,depois meu negócio. A Pátriaprimeiro! E essa é a identidade.Então eu, a partir desta identidade,vou dialogar. Se vou dialogar semesta identidade, o diálogo nãoserve. Ademais, o diálogopressupõe e exige de nós buscaresta cultura do encontro; umencontro que sabe reconhecer que adiversidade não só é boa, masnecessária. A uniformidade nos

anula, nos faz autômatos. A riquezada vida está na diversidade. Peloque o ponto de partida não podeser: “Vou dialogar porém aqueleestá equivocado”. Não, não, nãopodemos presumir que o outro estáequivocado. Eu vou com o meu evou escutar o que diz o outro, emque me enriquece o outro, em que ooutro me faz perceber que eu estouequivocado e que coisas posso eudar ao outro. É um ida e volta, ida evolta, porém com o coração aberto.Com presunções de que o outro

está equivocado, o melhor é ir paracasa e não tentar um diálogo, não émesmo? O diálogo é para o bemcomum e o bem comum se busca, apartir das nossas diferenças,possibilitando sempre novasalternativas. Por outras palavras,busca algo de novo. Sempre,quando existe o verdadeiro diálogo,se termina em um ... - me permitama palavra, porém a digo comnobreza – em um acordo novo, ondetodos chegamos a um acordo sobrealgo. Existem diferenças? Que

fiquem de lado, na reserva. Porémneste ponto em que chegamos a umacordo ou nestes pontos em quechegamos a um acordo, noscomprometemos e os defendemos.É um passo em frente. Esta é acultura do encontro. Dialogar não énegociar. Negociar é procurar tirar aprópria fatia. Ver como tiro o meu.Não, não dialogues, não percatempo. Se vais com esta intenção,não percas tempo, pois dialogar ébuscar o bem comum para todos.Discutir juntos, pensar uma melhor

solução para todos. Muitas vezesesta cultura do encontro vê-seenvolvida no conflito. É comodizer.... recém vimos um baléprecioso. Tudo estava coordenado.Tudo estava perfeito. Tudo ia bem.Porém, no diálogo, nem sempre éassim, nem tudo é um balé perfeitoou uma orquestra coordenada. Nodiálogo se dá o conflito. É lógico eprevisível. Pois se eu penso de umamaneira e você de outra e vamosandando, se cria um conflito. Nãodevemos temer isto! Não temos que

ignorar o conflito. Pelo contrário,somos convidados a assumir oconflito. Se não assumimos oconflito – “Não, é uma dor decabeça, que vá com suas ideiaspara sua casa e eu fico com aminha” – não podemos dialogarnunca. Isto significa «aceitarsuportar o conflito, resolvê-lo etransformá-lo no elo de ligação deum novo processo» (EG 227).Vamos dialogar, tem conflito, oassumo, o resolvo e é um elo de umnovo processo. É um princípio que

pode nos ajudar muito. A «unidade ésuperior ao conflito» (EG 228). Oconflito existe: tem que assumi-lo,tem que tentar resolvê-lo até ondese consegue, porém com o objetivode chegar a uma unidade que não éuniformidade, mas sim uma unidadena diversidade. Uma unidade quenão cancela as diferenças, masvive-as em comunhão por meio dasolidariedade e da compreensão. Aotentar compreender as razões dooutro, ao tentar ouvir a suaexperiência, os seus anseios,

podemos ver que são, em grandeparte, aspirações comuns. E esta éa base do encontro: todos somosirmãos, filhos de um mesmo Pai, deum Pai celestial, e cada um, com asua cultura, a sua língua, as suastradições, tem muito para dar àcomunidade. Agora, eu estoudisposto a receber isto? Se estoudisposto a receber e dialogar comisto, então me sento para dialogar;se não estou disposto, melhor nemperder tempo. As verdadeirasculturas nunca estão fechadas em si

mesmas, morrem – se se fechamem si mesmas morrem - mas sãochamadas a encontrar-se comoutras culturas e criar novasrealidades. Quando estudamoshistória encontramos culturasmilenares que já não existem mais.Desapareceram. Por muitas razões.Porém, uma delas, é terem-sefechado em si mesmas. Sem estepressuposto essencial, sem estabase de fraternidade, será muitodifícil que se chegue ao diálogo. Sealguém considera que há pessoas,

culturas, situações de segunda,terceira ou quarta categoria, decerteza que algo acabará mal,simplesmente porque carece domínimo, que é o o reconhecimentoda dignidade do outro. Que nãoexiste uma pessoa de primeira, desegunda, de terceira, de quarta: sãotodas da mesma linha.3. E isto dá-me ocasião pararesponder à preocupação expressana terceira pergunta: acolher oclamor dos pobres, para construiruma sociedade mais inclusiva. É

curioso: o egoísta se exclui. Nósqueremos incluir. Recordem-se daParábola de Filho Pródigo, este filhoque pediu a herança do pai, levoutodo o dinheiro, o gastou com a boavida, e ao final de um longo tempo,após ter perdido tudo, pois lhe doíao estômago de fome, se lembrou deseu pai. E seu pai o esperava. É afigura de deus, que sempre nosespera. E quando o vê retornar, oabraça e faz festa. Por outro lado, ooutro filho, aquele que permaneceuem casa, se enoja e se auto exclui:

“eu não me junto com estaspessoas, eu me comportei bem, eutenho uma grande cultura, estudeiem tal ou tal universidade, tenhouma família e esta estirpe. De modoque não me misturo com estes”.Não excluir ninguém, porém não seauto excluir, porque todosnecessitamos de todos. Tambémum aspecto fundamental napromoção dos pobres é o modocomo os vemos. Não serve umavisão ideológica, que acaba usandoos pobres ao serviço de outros

interesses políticos e pessoais (EG199). As ideologias terminam mal,não servem. As ideologias tem umarelação ou incompleta ou doente ouruim com o povo. As ideologias nãoassumem o povo. Por isto, olhempara o século passado. Em queterminaram as ideologias? Emditaduras, sempre, sempre. Pensampelo povo, não deixam ao povopensar. Ou, como dizia aquelecrítico da ideologia, quando lhedisseram, "sim, porém estaspessoas têm boa vontade e querem

fazer alguma coisa pelo povo" -"sim, sim, sim, tudo pelo povo,porém nada com o povo". Estas sãoas ideologias. Para se buscarefetivamente o seu bem, a primeiracoisa é ter uma preocupaçãogenuína pela sua pessoa – estoufalando dos pobres - valorizá-los nasua própria bondade. Mas umaavaliação real exige estar dispostosa aprender dos pobres, aprenderdeles. Os pobres têm muito paranos ensinar em humanidade,bondade, sacrifício, em

solidariedade. Nós, cristãos, alémdisto, temos outro motivo, e maior,para amar e servir os pobres,porque neles, vemos o rosto, vemoso rosto e a carne de Cristo, que Sefez pobre para nos enriquecer coma sua pobreza» (cf. 2 Cor 8, 9). Ospobres são a carne de Cristo. Eugostaria de perguntar a alguém,quando confesso pessoas – agoranão tenho tantas oportunidades paraconfessar como tinha na minhadiocese anterior -, porém, gosto deperguntar-lhes: “Você ajuda as

pessoas?” – “sim, sim, dou esmola”– “ah, diga-me, quando dá aesmola, tocas a mão a quem dás aescola ou atira a moeda e fazassim?”. São atitudes. “Quandovocê dá esta esmola, olha em seusolhos ou olha para o outro lado?”.Isto é depreciar o pobre. São ospobres. Pensemos bem. É alguémcomo eu e, se está passando porum mal momento por mil razões –econômicas, políticas, sociais oupessoais – eu poderia estar nestelugar e poderia estar desejando que

alguém me ajudasse. E além dedesejar que alguém me ajude, seestou neste lugar, tenho o direito deser respeitado. Respeitar o pobre.Não usá-lo como objeto para lavarminhas culpas. Aprender dospobres, como o que diz, com ascoisas que tem, com os valores quetem. E os cristãos têm este motivo,que são a carne de Jesus.Num país, é certamente muitonecessário o crescimentoeconómico e a criação de riqueza eque esta chegue a todos os

cidadãos, sem ninguém ficarexcluído. E isto é necessário. Acriação desta riqueza deve estarsempre em função do bem comum,de todos, e não de poucos. Nisto,devemos ser muito claros. «Aadoração do antigo bezerro de ouro(cf. Ex 32, 1-35) encontrou umanova e cruel versão no fetichismo dodinheiro e na ditadura dumaeconomia sem rosto» (EG 55). Aspessoas, cuja vocação é contribuirpara o desenvolvimento econômico,têm a obrigação de velar por que

este tenha sempre rosto humano. Odesenvolvimento econômico tem queter um rosto humano. Não àeconomia sem rosto! Nas suasmãos, está a possibilidade deoferecer emprego a muitas pessoase, deste modo, dar esperança amuitas famílias. Trazer o pão paracasa, oferecer aos filhos um teto,oferecer saúde e educação sãoaspectos essenciais da dignidadehumana, e os empresários, ospolíticos, os economistas devemdeixar-se interpelar por isso. Peço-

vos que não cedais a um modeloeconómico idólatra que exigesacrificar vidas humanas no altar dodinheiro e do lucro. Na economia, naempresa, na política, vem emprimeiro lugar a pessoa e o habitatonde vive.Em todo o mundo, o Paraguai éconhecido, justamente, como a terraonde tiveram início as Reduções,uma das experiências deevangelização e organização socialmais interessantes da história.Nelas, o Evangelho foi alma e vida

de comunidades onde não haviafome, não havia desemprego,analfabetismo, nem opressão. Estaexperiência histórica ensina-nos queuma sociedade mais humanatambém é possível hoje. Vocês aviveram em suas raízes aqui. Épossível. Quando há amor aohomem e vontade de o servir, épossível criar as condições para quetodos tenham acesso aos bensnecessários, sem que ninguém sejadescartado. Buscar em cada casoas soluções para o diálogo. Eu

estou por terminar aquilo que haviaescrito, porém não quero que fiquenada comigo daquilo que meperguntaram.Na quarta pergunta, respondi comisto de.... uma economia toda emfunção da pessoa e não em funçãodo dinheiro, não? E falavam dapouca efetividade. A senhora, aempresária, falava a poucaefetividade de certos caminhos. Emencionava alguém que eu haviamencionado na Evangelii Gaudium,que é o populismo irresponsável,

não estou certo? E parece que nãodão efeito, não?, que... e tem tantasteorias, não? Como fazê-lo? Creioque com isto que digo de umaeconomia com rosto humano, está ainspiração para responder a estapergunta.Na quinta, (...) cultura, creio que teria (...) a resposta está dada ao longo do que disse quando falei das culturas. Ou seja, tem uma cultura ilustrada, que é a cultura e é boa e tem que respeitá-la, certo? Hoje, por exemplo, em uma parte do balé,

foi tocada uma música de uma cultura ilustrada e boa, porém tem outra cultura que tem o mesmo valor, que é a cultura dos povos, dos povos originários, das diversas etnias. Uma cultura que me atreveria chamá-la, porém no bom sentido, uma cultura popular. Os povos tem sua cultura e fazem sua cultura. É importante este trabalho pela cultura no sentido mais amplo da palavra. Não é cultura somente ter estudado ou poder usufruir de um concerto, ouler um livro interessante, mas

também é cultura mil coisas. Falavam do tecido de Ñandutí. Por exemplo, isto é cultura. E é cultura nascida do povo. Para fazer um exemplo, certo? E tem duas coisas que, antes de terminar, eu queria me referir. E nisto, como tem políticos aqui presentes, incluído o Presidente da República, o digo fraternalmente, não? Alguém me disse, “olhe, fulano de tal foi sequestrado pelo exército, faça algo, não?”. Eu não digo sim, é verdade, não é verdade, se é justo,

se não é justo, porém um dos métodos que tinham as ideologias ditatoriais do século passado, aquelas que me referi há pouco, era separar as pessoas, ou com o exílio, ou com a prisão, ou, no caso dos campos de extermínio, nazistas ou estalinistas, as separavam com a morte, não? Para que haja uma verdadeira cultura em um povo, uma cultura política e do bem comum, rápidos julgamentos claros, julgamentos transparentes. E não serve outro tipo de estratagema. A

justiça transparente, clara. Isto vai nos ajudar a todos. Eu não sei se aqui existe isto ou não, o digo com todo o respeito. Me disseram quando eu entrava. Me disseram aqui. E que pediram não sei por quem. Não ouvi bem o nome. E depois outra coisa que vos queria dizer por honestidade: um método que não dá liberdade às pessoas para assumir responsavelmente sua tarefa de reconstrução da sociedade. É a chantagem. A chantagem sempre é corrupção: -

“se tu fazes isto, vamos fazer isto, com o que te destruímos” -. A corrupção é a traça, é a gangrena de um povo. Por exemplo, nenhum político pode cumprir seu rol, seu trabalho, se está sendo chantageado por atitudes de corrupção – “me dá isto, me dá este poder, me dá isto ou..., senão...., vou te fazer isto e aquilo”. Isto que ocorre em todos os povos do mundo, porque isto acontece. Se um povo quer manter sua dignidade, tem que desterrar isto. Estou

falando de algo universal.E termino. Para mim é uma alegriaver a grande quantidade e variedadede associações que estãocomprometidas na construção deum Paraguai cada vez melhor epróspero, porém, se não dialogam,não serve para nada. Sechantageiam, não serve para nada.Esta multidão de pessoas são comouma sinfonia, cada um com a suapeculiaridade e a sua riquezaprópria, mas procurando a harmoniafinal, a harmonia e isto é o que

conta. E não tenham medo doconflito, porém falem dele ebusquem caminhos de solução.Amem a vossa Pátria, os vossosconcidadãos e sobretudo amai osmais pobres. Deste modo sereis umtestemunho perante o mundo de queé possível outro modelo dedesenvolvimento. Estou convencido,pela própria história de vocês, deque tendes a força maior que existe:a vossa humanidade, a vossa fé, ovosso amor. Este ser do povoparaguaio, que o distingue tão

ricamente entre as nações domundo.Peço à Virgem de Caacupé, nossaMãe, que cuide de vós, vos protejae anime nos vossos esforços. QueDeus vos abençoe e rezem por mim!Obrigado.Um conselho como despedida, antesda benção. O pior que podeacontecer a cada um de vocês ésaírem daqui pensando: “Que bom oque disse o papa a fulano, beltranoe aquele outro”. Se alguém de vocêsaceita pensar assim, pois vem o

pensamento, e a mim também mevem às vezes, deves rechaçá-lo, -“O Papa, a quem disse isto? Paramim”. Cada um, quem seja – “Amim”. E os convido a rezar ao nossoPai comum, todos juntos, cada umna sua língua.....

Discurso do Papa Vésperascom os bispos,

sacerdotes, diáconos,religiosos, religiosas,

seminaristas emovimentos católicos

Sábado, 11 de julho de 20Como é belo rezarmos as Vésperastodos juntos! Como não sonhar comuma Igreja que espelhe e repita, navida quotidiana, a harmonia dasvozes e do canto! Fazemo-lo nesta

catedral que tantas vezes teve deser começada de novo; estacatedral é sinal da Igreja e de cadaum de nós: às vezes, astempestades de fora e de dentroobrigam-nos a pôr de lado o que seconstruiu e começar de novo.Sempre, porém, com a esperançaem Deus; e, se olharmos para esteedifício, sem dúvida Ele nãodecepcionou os paraguaios. PorqueDeus nunca desilude! E por isso Olouvamos agradecidos.

A oração litúrgica, com a suaestrutura e ritmo pausado, quer dar

voz à Igreja inteira, esposa deCristo, que procura configurar-secom o seu Senhor. Na oração, cadaum de nós quer tornar-se cada vezmais parecido com Jesus.

A oração traz à superfície aquilo quevivemos ou deveríamos viver naexistência diária; pelo menos umaoração que não queira ser alienanteou apenas preciosista. A oração dá-nos impulso para pôr em acção ouexaminar-nos sobre o que rezamosnos Salmos: nós somos as mãos de«Deus, que levanta o pobre damiséria» e somos quem trabalha

para que esterilidade com a suatristeza se transforme em campofértil. Cantando que «muito vale aosolhos do Senhor a vida dos seusfiéis», somos os que lutam, pelejam,defendem o valor de toda a vidahumana, desde o nascimento até osanos serem muitos e poucas asforças. A oração é reflexo do amorque sentimos por Deus, pelosoutros, pelo mundo criado; omandamento do amor é a melhorconfiguração do discípulomissionário com Jesus. Estaragarrados a Jesus dá profundidadeà vocação cristã, que – interessada

no «agir» de Jesus, que englobamuito mais do que as actividades –procura assemelhar-se a Ele emtudo o que realiza. A beleza dacomunidade eclesial nasce daadesão de cada um dos seusmembros à pessoa de Jesus,formando um «conjunto vocacional»na riqueza da diversidadeharmónica.

As antífonas dos CânticosEvangélicos deste domingorecordam-nos o envio dos Doze porJesus. É sempre bom crescer nestaconsciência de trabalho apostólico

em comunhão! É belo ver-vos acolaborar pastoralmente, partindosempre da natureza e funçãoeclesial de cada uma das vocaçõese carismas. Quero exortar-vos atodos – sacerdotes, religiosos ereligiosas, leigos e seminaristas – aque vos empenheis nestacolaboração eclesial, especialmentea partir dos planos de pastoral dasdioceses e da Missão Continental,cooperando com toda adisponibilidade possível para o bemcomum. Se a divisão entre nósprovoca a esterilidade (cf. Evangeliigaudium, 98-101), não há dúvida

que, da comunhão e da harmonia,surge a fecundidade, porque estãoem profunda consonância com oEspírito Santo.

Todos temos limitações; ninguémpode reproduzir totalmente JesusCristo. E, embora cada vocação seconforme de maneira mais salientecom este ou aquele traço da vida eobra de Jesus, há alguns elementoscomuns e indispensáveis a todas.Ainda agora louvámos o Senhorporque «não fez alarde da suacondição divina», sendo isto umacaracterística de toda a vocação

cristã: quem foi chamado por Deusnão se pavoneia, nem corre atrás dereconhecimentos ou aplausosefémeros; não sente ter subido decategoria nem trata os outros comose estivesse num degrau superior.

A supremacia de Cristo aparececlaramente descrita na liturgia daCarta aos Hebreus; acabámos deler quase o final dessa carta: Deus«nos faça perfeitos como o grandePastor das ovelhas», e isto supõeque todo o consagrado estejaconfigurado com Aquele que, na suavida terrena, «por entre orações e

súplicas, com grande clamor elágrimas» alcançou a perfeiçãoquando aprendeu, sofrendo, o quesignificava obedecer. E isto tambémé parte da nossa vocação.

E agora acabemos de rezar asnossas Vésperas; o campanil destacatedral foi reconstruído váriasvezes; o som dos sinos antecede eacompanha vários momentos danossa oração litúrgica. Sempre querezamos, somos feitos de novo porDeus, firmes como um campanil,felizes por divulgar as maravilhas deDeus. Partilhemos o Magnificat e

deixemos o Senhor fazer, através danossa vida consagrada, grandescoisas no Paraguai.

Discurso na visita àpopulação de Bañado

Norte

Domingo, 12 de julho de2015

Queridos amigos!

Com grande alegria, vejo cumprir-seesta manhã o meu desejo de visitar-vos. Não poderia visitar o Paraguai,sem estar convosco, sem estar navossa terra.

Encontramo-nos aqui na paróquia

denominada Sagrada Família econfesso-vos que, ao longo docaminho, tudo me fazia recordar aSagrada Família. Ver os vossosrostos, os vossos filhos, os vossosavós. Ouvir as vossas histórias etudo o que fizestes para estar aqui,a luta que travais para ter uma vidadigna, um teto. Tudo o que fazeispara superar a inclemência dotempo, as inundações destasúltimas semanas, faz-me recordar afamília humilde de Belém. Uma lutaque não vos roubou o sorriso, aalegria, a esperança. Uma pelejaque não vos impediu a

solidariedade, antes, pelo contrário,estimulou-a e fê-la crescer.

Quero me deter na presença deJosé e Maria em Belém. Elestiveram de deixar a sua terra, osseus parentes, os seus amigos.Tiveram de deixar o que lhespertencia e deslocar-se a outraterra; uma terra onde nãoconheciam ninguém, onde nãotinham casa, nem família. Foi entãoque aquele jovem casal teve Jesus;em tal contexto, aquele jovem casaldeu-nos de presente Jesus.Estavam sozinhos, numa terra

estranha, os três. De repente,começaram a aparecer pastores;pessoas como eles, que tiveram dedeixar o que possuíam a fim deobter melhores oportunidadesfamiliares. Viviam sujeitos ainclemências de vários tipo,nomeadamente as do tempo.

Quando ouviram falar do nascimentode Jesus, saíram ao seu encontro,fizeram-se próximos, vizinhos. Derepente, tornaram-se a família deMaria e José, a família de Jesus.

Acontece o mesmo, quando Jesus

aparece na nossa vida. É isto quedesperta a fé. A fé faz-nospróximos, aproxima-nos da vida dosoutros. A fé desperta o nossocompromisso, a nossasolidariedade. O nascimento deJesus desperta a nossa vida. A fé,que não se faz solidariedade, é umafé morta. É uma fé sem Cristo, umafé sem Deus, uma fé sem irmãos. Oprimeiro a ser solidário foi o Senhor,que escolheu viver entre nós,escolheu viver no nosso meio. Euvenho como aqueles pastores deBelém. Quero fazer-me próximo.Quero abençoar a vossa fé,

abençoar as vossas mãos,abençoar a vossa comunidade. Vimdar graças convosco, porque a fé sefez esperança, e esperança queestimula o amor. A fé que Jesusdesperta é uma fé com capacidadede sonhar o futuro e de lutar por eleno presente. Por isso mesmo, queroencorajar-vos a continuar a sermissionários, a contagiar com a féestas ruas, estas vielas. Fazendo-vos próximos especialmente dosmais jovens e dos idosos; fazendo-vos apoio das famílias jovens e dequantos estão a atravessarmomentos difíceis.

Quero confiar as vossas famílias àSagrada Família, para que o seuexemplo, o seu testemunho continuea ser luz no caminho, estímulo nosmomentos difíceis e sempre nos dêde presente «pastores» capazes deacompanhar, apoiar e incentivar avida das vossas famílias.

Convido-vos a rezar-Lhe juntos epeço-vos que não vos esqueçais derezar por mim.

Homilia Santa Missa emCampo Grande de ÑuGuazú, em Assunção,

Paraguai

Domingo, 12 de julho de2015

«O Senhor dar-nos-á chuva e daráfruto a nossa terra»: assim diz oSalmo. Com isto, somos convidadosa celebrar a misteriosa comunhãoentre Deus e o seu Povo, entreDeus e nós. A chuva é sinal da suapresença, na terra trabalhada pelas

nossas mãos. Uma comunhão quesempre dá fruto, que sempre dávida. Esta confiança brota da fé, desaber que contamos com a suagraça que sempre transformará eregará a nossa terra.

Uma confiança que se aprende, quese educa. Uma confiança que se vaigerando no seio duma comunidade,na vida duma família. Uma confiançaque se transforma em testemunhono rosto de tantos que nosencorajam a seguir Jesus, a serdiscípulos d’Aquele que nuncadesilude. O discípulo sente-se

convidado a confiar, sente-seconvidado por Jesus a ser amigo, acompartilhar a sua sorte, a partilhara sua vida. «A vós, não vos chamoservos, chamo-vos amigos, porquevos dei a conhecer tudo o que sabiado meu Pai». Os discípulos sãoaqueles que aprendem a viver naconfiança da amizade.

O Evangelho fala-nos destediscipulado. Apresenta-nos a cédulade identidade do cristão; a sua cartade apresentação, a sua credencial.

Jesus chama os seus discípulos e

envia-os, dando-lhes regras claras eprecisas. Desafia-os a um conjuntode atitudes, comportamentos quedevem ter. Sucede, e não rarasvezes, que nos poderão pareceratitudes exageradas ou absurdas;seria mais fácil lê-las simbolica ou«espiritualmente». Mas Jesus émuito preciso, muito claro. Não lhesdiz: fazei de conta, ou fazei o quepuderdes.

Recordemo-las juntos: «Não leveisnada para o caminho, a não ser umcajado; nem pão, nem alforje, nemdinheiro (…) Permanecei na casa

onde vos derem alojamento».Parece uma coisa impossível.

Poderíamos concentrar-nos empalavras como «pão», «dinheiro»,«alforje», «cajado», sandálias»,«túnica». E seria lícito. Mas parece-me que há aqui uma palavra-chave,que poderia passar despercebida.Uma palavra central naespiritualidade cristã, na experiênciado discipulado: hospitalidade. Comobom mestre, Jesus envia-os a vivera hospitalidade. Diz-lhes:«Permanecei na casa onde vosderem alojamento». Envia-os a

aprender uma das característicasfundamentais da comunidade crente.Poderíamos dizer que é cristãoaquele que aprendeu a hospedar, aalojar.

Jesus não os envia comopoderosos, como proprietários,chefes, carregados de leis, normas.Ao contrário, mostra-lhes que ocaminho do cristão é transformar ocoração. Aprender a viver de formadiferente, com outra lei, sob outranorma. É passar da lógica doegoísmo, do fechamento, da luta, dadivisão, da superioridade para a

lógica da vida, da gratuidade, doamor. Passar da lógica do dominar,esmagar, manipular para a lógica doacolher, receber, cuidar.

São duas as lógicas que estão emjogo, duas maneiras de enfrentar avida, a missão.

Quantas vezes concebemos amissão com base em projetos ouprogramas. Quantas vezesidealizamos a evangelização, pondode pé milhares de estratégias,táticas, manobras, truques,procurando que as pessoas se

convertam com base nos nossosargumentos. Hoje o Senhor diz-nosmuito claramente: na lógica doEvangelho, não se convence com osargumentos, as estratégias, astáticas, mas aprendendo a alojar, ahospedar.

A Igreja é uma mãe de coraçãoaberto que sabe acolher, receber,especialmente a quem precisa demaior cuidado, que está em maiordificuldade. A Igreja é a casa dahospitalidade. Quanto bem se podefazer, se nos animarmos a aprendera linguagem da hospitalidade, do

acolher! Quantas feridas, quantodesespero se pode curar numa casaonde alguém se sente bem-vindo!Para isso é necessário que a portaesteja aberta, também a porta docoração.

Praticar hospitalidade com ofaminto, o sedento, o forasteiro, onu, o enfermo, o encarcerado (cf.Mt 25, 34-37), com o leproso, oparalítico. Hospitalidade com aqueleque não pensa como nós, com apessoa que não têm fé ou a perdeu.Hospitalidade com o perseguido, odesempregado. Hospitalidade com

as culturas diferentes, de que estaterra é tão rica. Hospitalidade com opecador.

Muitas vezes esquecemo-nos deque há um mal que precede osnossos pecados. Há uma raiz quecausa muito, muito dano, que destróisilenciosamente tantas vidas. Há ummal que, pouco a pouco, vai fazendoninho no nosso coração e«corroendo» a nossa vitalidade: asolidão. Solidão que pode ter muitascausas, muitos motivos. Comodestrói a vida e nos faz tão mal! Vai-nos afastando dos outros, de Deus,

da comunidade. Vai-nos encerrandoem nós mesmos. Por isso, o que épróprio da Igreja, desta mãe, não éprincipalmente gerir coisas, projetos,mas aprender a viver a fraternidadecom os outros. A fraternidadeacolhedora é o melhor testemunhode que Deus é Pai, porque «é poristo que todos conhecerão que soismeus discípulos: se vos amardesuns aos outros» (Jo 13, 35).

Desta maneira, Jesus abre-nos auma lógica nova; a um horizontecheio de vida, beleza, verdade,plenitude.

Deus nunca fecha os horizontes,Deus nunca é passivo face à vida eao sofrimento dos seus filhos. Deusnunca Se deixa vencer emgenerosidade. Foi para isto que nosenviou seu Filho, no-Lo oferece,entrega, compartilha: paraaprendermos o caminho dafraternidade, do dom. Em definitivo,é um novo horizonte, uma novaPalavra para tantas situações deexclusão, desagregação,confinamento, isolamento. É umaPalavra que quebra o silêncio dasolidão.

E quando estivermos cansados ouse tornar pesada a evangelização, ébom recordar que a vida propostapor Jesus corresponde àsnecessidades mais profundas daspessoas, porque todos fomoscriados para a amizade com Jesus eo amor fraterno (EG 265).

Uma coisa é certa: não podemosobrigar ninguém a receber-nos, ahospedar-nos; isto é certo e fazparte da nossa pobreza e da nossaliberdade. Mas é certo também queninguém nos pode obrigar a nãosermos acolhedores, hospedeiros

da vida do nosso Povo. Ninguém nospode pedir que não recebamos eabracemos a vida dos nossosirmãos, especialmente dos queperderam a esperança e o gostopela vida. Como é belo imaginar asnossas paróquias, comunidades,capelas, lugares onde estão oscristãos como verdadeiros centrosde encontro tanto entre nós comocom Deus.

A Igreja é mãe, como Maria. N’Ela,temos um modelo. Alojar comoMaria, que não dominou nem Seapoderou da Palavra de Deus; pelo

contrário, hospedou-A, gerou-A eentregou-A.

Alojar como a terra que não dominaa semente, mas que a recebe, nutree faz germinar.

Assim queremos ser nós, oscristãos, assim queremos viver a féneste solo paraguaio: como Maria,alojando a vida de Deus em nossosirmãos com a confiança, com acerteza de que «o Senhor nos daráchuva e dará fruto a nossa terra».

Angelus

Domingo, 12 de julho de2015

Na reflexão que precede à oração, oSanto Padre destacou que a fé dosparaguaios que, segundo ele, estáimpregnada de amor à VirgemMaria. “Acodem confiadamente àsua Mãe, abrem-Lhe o seu coraçãoe confiam-Lhe as suas alegrias epenas, as suas esperanças esofrimentos. A Virgem consola-os e,com a ternura do seu amor, acendeneles a esperança”.

Veja, na íntegra, o que disse oPontífice:

Agradeço ao Arcebispo deAssunção, Dom Edmundo PonzianoValenzuela Mellid, as suas amáveispalavras.

No final desta celebração, voltamoscom confiança o nosso olhar para aVirgem Maria, Mãe de Deus e nossaMãe. Ela é o presente de Jesus aoseu povo. Deu-no-La como mãe nahora da cruz e do sofrimento. É frutoda entrega de Cristo por nós. E,

desde então, sempre esteve eestará com seus filhos,especialmente os mais humildes enecessitados.

Nossa Senhora entrou no tecido dahistória dos nossos povos com assuas gentes. Como em muitosoutros países da América Latina, afé dos paraguaios está impregnadade amor à Virgem. Acodemconfiadamente à sua Mãe, abrem-Lhe o seu coração e confiam-Lhe assuas alegrias e penas, as suasesperanças e sofrimentos. A Virgemconsola-os e, com a ternura do seu

amor, acende neles a esperança.Não deixeis de invocar e confiar emMaria, Mãe de misericórdia paratodos os seus filhos sem distinção.

À Virgem, que perseverou em oração com os Apóstolos à espera do Espírito Santo (cf. Act 1, 13-14), peco-Lhe também que vele pela Igreja e fortaleça os vínculos fraternos entre todos os seus membros. Possa a Igreja, com a ajuda de Maria, ser casa de todos, uma casa que saiba hospedar, uma mãe para todos os povos. Queridos irmãos, peço-vos, por favor, que

rezeis também por mim. Sei bem quanto amais o Papa no Paraguai. Também eu vos levo no coração e rezo por vós e pelo vosso país.

Rezemos, juntos, a oração doAngelus.

Benção Final

Que o Senhor te abençoe eguarde, e faça resplandecer oseu rosto sobre ti e dar-lhe suamisericórdia. Ele pode olharpara você e lhe conceda a paz.Que a bênção de Deus Todo-

Poderoso, Pai, Filho, e EspíritoSanto que descerá sobre vós epermaneça para sempre.

Encontro com os jovensna Beira-Rio “Costanera”

Domingo, 12 de julho de2015

Discurso pronunciado

Francisco preferiu “responder com ocoração”, deixando de lado odiscurso preparado anteriormente.“Preparei o discurso, mas os

discursos são entediantes”, disse oPapa.

O Bispo de Roma destacou trêspalavras-chave fundamentais paraque os jovens consigam viver aalegria de ser filhos de Deus:coração livre, solidariedade eesperança.

Coração livre

O jovem Orlando, escolhido paraproclamar o Evangelho, aocumprimentar o Pontífice, lhe pediuque lhe desse uma bênção e

rezasse para que ele e toda ajuventude vivessem a verdadeiraliberdade.

O Papa aproveitou a solicitação einiciou o seu discurso pedindo aosjovens que rezassem para que todosos presentes tivessem um coraçãolivre. “A liberdade é um presenteque Deus nos dá; contudo é precisosaber recebê-la. Nós sabemos queo mundo coloca muitas amarras emnosso coração, como a exploração,a falta de meios para sobreviver, adependência de drogas, a tristeza,tudo isso nos tira a liberdade”,

explicou.

Solidariedade

Ao refletir sobre o testemunho dajovem Liz, de 25 anos, o SantoPadre apresentou uma grande liçãode solidariedade aos jovens.

“Liz nos ensina com sua vida quenão podemos ser como Pilatos, elapoderia lavar as mãos, colocar suamãe e sua avó no asilo, e viver felizsua vida, mas ela se transformouem serva de sua mãe e sua avó. Eladisse que mudou os papéis, que ela

era mãe da sua mãe, que temAlzheimer. Liz nos seus 25 anosserve sua mãe e sua vó”. Eenfatizou que, ao fazer isso, a jovemvive o quarto mandamento: “honrarpai e mãe”. “Liz vive a vida para suamãe, isso é um grande ato desolidariedade e de amor”, falou oSanto Padre.

Esperança

Ao abordar a história de Manuel, oPapa Francisco afirmou que essejovem não nasceu em berço de ouroe que ele foi impactado com as

palavras duras ditas por ele. “’Fuiexplorado e maltratado, tanto quecaí em uma vida de drogas e nãotinha por que ir adiante”. E enfatizouque o encontro com Deus lhe trouxea esperança.

“Liberdade de coração nos ensinaOrlando. Serviço e solidariedadenos ensina Liz. Esperança, lutar eseguir a vida nos ensina Manuel. Éisso de que precisamos: jovens comesperança! Queremos jovens quenão se cansem rápido, queremosjovens fortes, com esperança efortaleza”, ressaltou Francisco.

O Papa exortou os jovens a ir contra a correnteza e a viver a bem-aventurança, encontrada no Evangelho de São Mateus. E lembrou: “Na outra vez que havia pedido a vocês para fazerem barulho, um sacerdote me disse: ‘Você disse aos jovens para fazer barulho, mas depois as consequências somos nós quem devemos suportar’. Assim vos digo hoje: façam barulho e o organizem bem”.

O Pontífice encerrou sua mensagemcom um breve momento de oração.

“Senhor Jesus, Te dou graças porestar aqui. Fica conosco, Jesus.Jesus, eu Te peço pelos meninos emeninas que não sabem que oSenhor é a fortaleza. Jesus, ensine-os a sonhar. Sonhar coisas grandes,coisas lindas. Senhor Jesus, dá-nosfortaleza, dá-nos um coração livre”.

Discurso preparado

Queridos jovens!Enche-me de alegria poderencontrar-me convosco, neste climade festa. Poder ouvir os vossostestemunhos e partilhar o vossoentusiasmo e amor a Jesus.

Obrigado, D. Ricardo Valenzuela,responsável da pastoral juvenil,pelas suas palavras! Obrigado,Manuel e Liz, pela coragem departilhardes as vossas vidas,oferecendo o vosso testemunhoneste encontro. Não é fácil falar dasnossas coisas pessoais, e menosainda diante de tantas pessoas. Evós partilhastes o tesouro maior quetendes: as vossas vicissitudes, asvossas vidas e como Jesus, pouco apouco, entrou nelas.Para responder às vossasperguntas, gostaria de realçaralgumas das coisas quepartilhastes.

Manuel, falaste mais ou menosassim: «Hoje tenho desejos, desobra, de servir os outros; tenhovontade de me vencer». Passastepor momentos muito difíceis,situações muito dolorosas, mas hojetens grande desejo de servir, desair, de partilhar a tua vida com osoutros.Liz não é nada fácil ser mãe dospróprios pais, sobretudo quando seé jovem, mas que grande sabedoriae maturidade encerram as tuaspalavras, quando nos dizias: «Hojejogo com ela, mudo-lhe as fraldas…Coisas todas, que hoje ofereço aDeus; e estou apenas compensando

o que mãe fez por mim».Vós, jovens paraguaios, soiscorajosos de verdade.Partilhastes também comoconseguistes continuar; ondeencontrastes forças. Na paróquia –dissestes ambos –, nos amigos daparóquia e nos retiros espirituaisque lá se organizavam. Duas chavesmuito importantes: os amigos e osretiros espirituais.Os amigos. A amizade é um dospresentes maiores que uma pessoa,um jovem pode ter e pode oferecer.É verdade! Como é difícil viver semamigos. Vede se esta não é umadas coisas mais belas que Jesus

disse: «Chamei-vos amigos, porquevos dei a conhecer tudo o que ouviao meu Pai» (Jo 15, 15). Um dosmaiores segredos do cristão radica-se no facto de ser amigo, amigo deJesus. Quando uma pessoa amaalguém, permanece ao seu lado,cuida dele, ajuda-o, diz-lhe o quepensa, mas sem o deixar caído porterra. Assim faz Jesus connosco,nunca nos deixa caídos por terra.Os amigos apoiam-se, fazem-secompanhia, protegem-se. Assimprocede o Senhor connosco. Serve-nos de apoio.Os retiros espirituais. Santo Ináciotem uma meditação famosa,

chamada das duas bandeiras.Descreve, por um lado, a bandeirado demónio e, por outro, a bandeirade Cristo. Seria como as camisasde duas equipes; e pergunta-nos,em qual delas gostaríamos de jogar.Com aquela meditação, leva-nos aimaginar como seria pertencer auma ou a outra equipe. Seria comoperguntar: Com quem queres jogarna vida?E Santo Inácio diz que o demónio,para recrutar jogadores, prometeàqueles que jogam com ele riqueza,honras, glória e poder. Serãofamosos. Serão endeusados portodos.

No lado oposto, apresenta-nos ojogo de Jesus. Não como algofantástico. Jesus não nos apresentauma vida de “estrelas”, famosos;pelo contrário, jogar com Ele é umconvite à humildade, ao amor, aoserviço aos outros. Jesus não nosmente. Toma-nos a sério.Na Bíblia, o demónio é chamado opai da mentira. Ele prometia ou,melhor, fazia-te crer que, sefizesses certas coisas, serias feliz;mas depois dás-te conta de que nãoés nada feliz; foste atrás de algoque, longe de te dar a felicidade,fez-te sentir mais vazio, mais triste.Amigos, o diabo, é um «vende

fumaça». Promete-te, promete-te,mas não te dá nada, nunca cumprenada do que diz. É um maupagador. Faz-te desejar coisas quenão depende dele que tu asobtenhas ou não. Faz-te depositar aesperança em algo, que nunca tefará feliz. Este é o seu jogo, esta éa sua estratégia: falar muito,oferecer muito e não fazer nada. Éum grande «vende fumaça», porquetudo o que nos propõe é fruto dadivisão, de nos compararmos comos outros, de pisar a cabeça aosoutros para conseguirmos as nossascoisas. É um «vende fumaça»,porque o único caminho para

alcançar tudo isto é pôr de lado osteus amigos, não dar apoio aninguém. Porque tudo se baseia naaparência. Faz-te crer que o teuvalor depende de quanto possuis.Do lado contrário, temos Jesus quenos oferece o seu jogo. Não nosvende fumaça; não nos promete,aparentemente, grandes coisas.Não nos diz que a felicidade está nariqueza, no poder, no orgulho. Antespelo contrário, mostra-nos que ocaminho é outro. Este Treinador dizaos seus jogadores: bem-aventurados, felizes os pobres emespírito, os que choram, os mansos,os que têm fome e sede de justiça,

os misericordiosos, os puros decoração, os que trabalham pela paz,os perseguidos por causa da justiça.E conclui dizendo: Alegrai-vos comtudo isto.Por que motivo? Porque Jesus nãonos mente. Mostra-nos um caminhoque é vida, que é verdade. Elemesmo é a grande prova disso. É oseu estilo, a sua maneira de viver aexistência, a amizade, a relaçãocom o seu Pai. E a isto nos convida:a sentirmo-nos filhos, filhos amados.Jesus não te vende fumaça. Porquesabe que a felicidade verdadeira, afelicidade que enche o coração nãoestá nos trapos que vestimos, nos

sapatos que calçamos, na etiquetade determinada marca. Ele sabeque a verdadeira felicidadeencontra-se em sermos sensíveis,em aprender a chorar com os quechoram, em aproximar-se de quemestá triste, em deixar chorar sobre opróprio ombro, dar um abraço.Quem não sabe chorar, não sabe rire, consequentemente, não sabeviver. Jesus sabe que, neste mundode tanta concorrência, inveja eagressividade, a verdadeirafelicidade passa por aprender a serpacientes, a respeitar os outros, anão condenar nem julgar ninguém.Quem se irrita já perdeu: diz o

ditado. Não abandoneis o vossocoração à ira, ao rancor. Felizes osque têm misericórdia. Felizes os quesabem colocar-se no lugar de outro,os que têm a capacidade deabraçar, de perdoar. Todosexperimentámos isto alguma vez.Todos, em determinados momentos,nos sentimos perdoados: como ébom! É como reaver a vida, ter umanova oportunidade. Não há nadamais belo do que ter novaoportunidade. É como se a vidavoltasse a começar. Por isso, felizesaqueles que são portadores de novavida, de novas oportunidades.Felizes quantos trabalham para isso,

aqueles que lutam para isso. Erros,todos cometemos; as equivocações,não têm conta. Por isso, felizesaqueles que são capazes de ajudaros outros a sair dos seus erros, dassuas equivocações. São verdadeirosamigos e não deixam ninguém caídopor terra. Estes são os puros decoração, aqueles que, conseguindover mais além da simples nódoa,superam as dificuldades. Felizesaqueles que se fixam especialmentena parte boa dos outros.Liz, tu nomeaste Chikitunga, umaServa de Deus paraguaia. Dissesteque era como tua irmã, tua amiga,teu modelo. Ela, como muitos

outros, mostra-nos que o caminhodas Bem-aventuranças é umcaminho de plenitude, um caminhopossível, real; que enche o coração.Os Santos são nossos amigos emodelos que já deixaram de jogarneste campo, mas transformaram-se naqueles jogadoresindispensáveis para quem semprese olha a fim de darmos o melhor denós mesmos. Eles são a prova deque Jesus não é um «vendefumaça», mas que a sua proposta émesmo de plenitude. Acima de tudo,é uma proposta de amizade:amizade verdadeira, amizade de quetodos precisamos. Amigos, segundo

o estilo de Jesus. Não para ficarmosentre nós, mas sair pelo campo, irfazer mais amigos. Para contagiarcom a amizade de Jesus toda agente, onde quer que esteja, notrabalho, no estudo, na noitada, porwhastapp, no facebook ou notwitter. Quando saem para dançar,ou estão a tomar um bom tereré. Napraça ou jogando uma partida nocampo do bairro. É aí que estão osamigos de Jesus. Não vendendofumaça, mas dando apoio; o apoiode saber que somos felizes, porquetemos um Pai que está no Céu

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