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Revista do Instituto Geológico, São Paulo, 25(1/2), 29-48, 2004. 29 LITOFÁCIES E PROVÁVEIS AMBIENTES DE SEDIMENTAÇÃO DO GRUPO SÃO ROQUE NA REGIÃO DE VOTORANTIM E SALTO DE PIRAPORA, SP Paulo Cesar FERNANDES DA SILVA RESUMO O presente estudo teve como objetivo a descrição e caracterização de fácies sedimentares das rochas proterozóicas pertencentes ao Grupo São Roque, aflorantes na região que compreende as cidades de Votorantim e Salto de Pirapora e arredores (sudeste do Estado de São Paulo). O levantamento foi efetuado na escala 1:50.000, e incluiu uma análise geológico-estrutural que procurou dar suporte ao entendimento da distribuição espacial das fácies sedimentares e do empilhamento estratigráfico. Quatro associações de litofácies foram reconhecidas na área de estudo, que da base para o topo correspondem a: A. associação siliciclástica basal, correspondendo a uma deposi- ção em águas profundas predominantemente associada a uma sucessão turbidítica; B. associação siliciclástica intermediária, correspondendo a uma plataforma rasa de carac- terísticas progradantes; C. associação clasto-química transicional, aqui interpretada como uma transição de ambientes deposicionais de uma plataforma rasa para uma planície de maré mista (intramaré a intermaré); D. associação carbonática impura supe- rior, representando as porções mais proximais e superiores de uma planície de maré (intermaré a supramaré). Estas associações foram informalmente correlacionadas às subdivisões estratigráficas sugeridas para o Grupo São Roque em trabalhos anteriores (particularmente as formações Estrada dos Romeiros, Voturuna e Pirapora). Palavras-chave: rochas metamórficas, associações de litofácies, ambientes de sedi- mentação, Grupo São Roque. ABSTRACT The present study aims at characterizing the sedimentary facies of Proterozoic rocks of the São Roque Group that outcrop in the region including the cities of Votorantim and Salto de Pirapora and neighbourhood (southeast of the state of São Paulo, Brazil). These rocks were mapped at a scale of 1:50.000; included is a structural-geological analysis that supports the understanding of the spatial distribution of sedimentary facies and the stratigraphic units. Four associations of lithofacies and related depositional environments were recognized. They comprise from base to top: A. lower siliciclastic association, probably associated with deep-water sedimentation, mostly related to a turbiditic succession; B. intermediate siliciclastic association, corresponding to a shallow-water platform with prograding characteristics; C. transitional clastic-carbonate association, here interpreted as a transition from shallow platform deposition to a mixed carbonate tidal flat environment (subtidal to intertidal conditions); and D. upper impure carbonate association that may correspond to a tidal flat governed by tidal currents and related oscillatory movements (intertidal to supratidal conditions). These associations were informally correlated with previously proposed stratigraphic subdivisions of the São Roque Group in the region (namely Estrada dos Romeiros, Voturuna and Pirapora formations). Keywords: metamorphic rocks, sedimentation settings, lithofacies associations, Grupo São Roque.

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Revista do Instituto Geológico, São Paulo, 25(1/2), 29-48, 2004.

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LITOFÁCIES E PROVÁVEIS AMBIENTES DE SEDIMENTAÇÃO DO GRUPO SÃO ROQUE NAREGIÃO DE VOTORANTIM E SALTO DE PIRAPORA, SP

Paulo Cesar FERNANDES DA SILVA

RESUMO

O presente estudo teve como objetivo a descrição e caracterização de fáciessedimentares das rochas proterozóicas pertencentes ao Grupo São Roque, aflorantesna região que compreende as cidades de Votorantim e Salto de Pirapora e arredores(sudeste do Estado de São Paulo). O levantamento foi efetuado na escala 1:50.000, eincluiu uma análise geológico-estrutural que procurou dar suporte ao entendimento dadistribuição espacial das fácies sedimentares e do empilhamento estratigráfico. Quatroassociações de litofácies foram reconhecidas na área de estudo, que da base para otopo correspondem a: A. associação siliciclástica basal, correspondendo a uma deposi-ção em águas profundas predominantemente associada a uma sucessão turbidítica; B.associação siliciclástica intermediária, correspondendo a uma plataforma rasa de carac-terísticas progradantes; C. associação clasto-química transicional, aqui interpretadacomo uma transição de ambientes deposicionais de uma plataforma rasa para umaplanície de maré mista (intramaré a intermaré); D. associação carbonática impura supe-rior, representando as porções mais proximais e superiores de uma planície de maré(intermaré a supramaré). Estas associações foram informalmente correlacionadas àssubdivisões estratigráficas sugeridas para o Grupo São Roque em trabalhos anteriores(particularmente as formações Estrada dos Romeiros, Voturuna e Pirapora).

Palavras-chave: rochas metamórficas, associações de litofácies, ambientes de sedi-mentação, Grupo São Roque.

ABSTRACT

The present study aims at characterizing the sedimentary facies of Proterozoicrocks of the São Roque Group that outcrop in the region including the cities of Votorantimand Salto de Pirapora and neighbourhood (southeast of the state of São Paulo, Brazil).These rocks were mapped at a scale of 1:50.000; included is a structural-geologicalanalysis that supports the understanding of the spatial distribution of sedimentaryfacies and the stratigraphic units. Four associations of lithofacies and related depositionalenvironments were recognized. They comprise from base to top: A. lower siliciclasticassociation, probably associated with deep-water sedimentation, mostly related to aturbiditic succession; B. intermediate siliciclastic association, corresponding to ashallow-water platform with prograding characteristics; C. transitional clastic-carbonateassociation, here interpreted as a transition from shallow platform deposition to a mixedcarbonate tidal flat environment (subtidal to intertidal conditions); and D. upper impurecarbonate association that may correspond to a tidal flat governed by tidal currents andrelated oscillatory movements (intertidal to supratidal conditions). These associationswere informally correlated with previously proposed stratigraphic subdivisions of theSão Roque Group in the region (namely Estrada dos Romeiros, Voturuna and Piraporaformations).

Keywords: metamorphic rocks, sedimentation settings, lithofacies associations, GrupoSão Roque.

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1 INTRODUÇÃO

Apesar de serem relativamente numerosos osestudos efetuados em unidades metassedimentaresproterozóicas do Estado de São Paulo, observa-seuma significativa carência de pesquisas cuja abor-dagem principal esteja voltada para a descrição dasestruturas sedimentares ocorrentes e a caracteriza-ção de ambientes deposicionais correspondentes àsreferidas unidades.

Levando em consideração tal fato, o presentetrabalho visou o estudo das fácies sedimentares ebuscou interpretações acerca dos possíveis ambi-entes de sedimentação do Grupo São Roque na re-gião que inclui as cidades de Votorantim e Salto dePirapora e arredores, sudeste do Estado de São Pau-lo (Figura 1).

1.1 Contexto regional

Atendo-se apenas à evolução da designaçãoda unidade como Grupo São Roque pode-se remon-tar ao trabalho de MORAES REGO (1930), que sepa-rou as rochas epimetamórficas do Complexo Crista-lino aflorantes no Estado de São Paulo com a deno-minação de Série São Roque, termo este utilizadopor diversos autores em trabalhos posteriores (e.g.KNECHT 1943; ALMEIDA 1955; FRANCO 1958). Aênfase em aspectos evolutivos de conteúdo geoló-gico-estrutural pode ser observada nos trabalhosde HENNIES et al. (1967) e de HASUI et al. (1969),que reconheceram o controle tectônico sobre asunidades litológicas por meio de falhas, como a Fa-lha de Taxaquara, mencionando a existência de trêsblocos tectônicos. O Bloco São Roque, enfocadono presente estudo, encontra-se entre os blocosJundiaí e Embu, sendo delimitado a norte pela Zonade Cisalhamento Itu-Jundiuvira e a sul pela Zona deCisalhamento Taxaquara.

COUTINHO (1972) propôs a reunião das ro-chas de idade pré-cambriana superior numa mesmaunidade, argumentando a continuidade geográficaexistente entre os grupos São Roque e Açungui. Talproposição foi reforçada por HASUI (1973) ao estu-dar a geologia das folhas São Roque e Pilar do Sul.Posteriormente, HASUI (1975) reviu a conclusãoanterior, reconhecendo a disposição das unidadesem blocos justapostos e diferentes históriasdeformacionais, reconsiderando o Grupo São Ro-que como unidade distinta. HASUI et al. (1976) re-alizaram a primeira tentativa de divisão estratigráficaformal da unidade, propondo duas formações:Boturuna, inferior, de natureza psamo-pelítica e com

rochas vulcânicas intercaladas na base, e Piragibu,superior, composta por filitos rítmicos e quartzitosintercalados. Destacaram os autores que a tectônicatranscorrente foi posterior ao metamorfismo regio-nal, tendo inclusive controlado a intrusão de corposgraníticos.

Com base em critérios geológico-estruturais,HASUI & SADOWSKI (1976) propuseram a subdi-visão do Grupo Açungui em conjuntos litológicos,que caracterizaram como complexos (Pilar e Embu),assim como a sua separação do contexto do GrupoSão Roque (submetido a apenas duas fases de do-bramento, segundo os autores). O Complexo Pilarseria formado predominantemente por um conjuntode filitos e xistos (submetido a três fases de dobra-mento) e o Complexo Embu, por migmatitos egnaisses migmatizados (contendo feições de dobra-mento invertido). Tal proposição foi adotada noMapa Geológico do Estado de São Paulo (BISTRICHIet al. 1981) e Nota Explicativa (ALMEIDA et al. 1981).No entanto, CARNEIRO (1983) desenvolvendo es-tudos em áreas de afloramento do Grupo São Ro-que, entre o Pico do Jaraguá e a Serra dos Cristais(situada a nordeste da área enfocada no presenteestudo e mais próxima da Cidade de São Paulo), re-conheceu quatro unidades litoestratigráficas, afeta-das generalizadamente por três fases de dobramen-to e submetidas a metamorfismo regional (em geral,no fácies xisto-verde). Reconheceu ainda que emdeterminados locais a foliação não se caracterizacomo plano-axial, mas sim, paralela à estratificaçãoreliquiar, diferentemente do indicado por HASUI &SADOWSKI (1976). Tais conclusões foram corro-boradas por BISTRICHI (1982) e SANTORO (1984).CARNEIRO (op.cit.) assinala também o aparecimen-to de dobras invertidas com provável transporte paraSE, aspecto este observado em trabalhos posterio-res (por ex. CARNEIRO et al. 1985, HACKSPACHERet al. 1991).

STEIN (1984) referiu-se aos metassedimentossituados ao sul da Falha de Taxaquara, nos arredo-res de Pilar do Sul, como Complexo pré-Açungui,distribuindo-os em três faixas que correspondem afilitos, xistos finos e xistos feldspatizados localmen-te migmatizados. Estas faixas exibem contatostransicionais, e teriam sido afetadas por até quatroestágios de metamorfismo regional. Posteriormente,CAMPOS NETO et al. (1990) estudando a geologiada Folha Pilar do Sul, na escala 1:25.000, reconhece-ram uma seqüência de metassedimentos turbidíticosa sudeste da cidade homônima e um domínio consti-tuído por micaxistos e rochas ígneas pré-metamórficas localizado na Serra dos Lopes e

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adjacências, ao sul da Zona de CisalhamentoTaxaquara. Esse conjunto de rochas foicorrelacionado ao Grupo Açungui.

JULIANI et al. (1986) e JULIANI (1993) propu-seram o uso do termo Grupo Serra do Itaberaba paraaquela que seria a porção basal do Grupo São Ro-que, caracterizada por rochas metavulcânicas bási-cas com quimismo toleítico de natureza oceânica.

Retomando a abordagem regional, verifica-seque boa parte dos trabalhos existentes sugere umaevolução a partir de um quadro colisional no iníciodo Neoproterozóico. Em HASUI (1985) e HASUI etal. (1989), a parte basal do Grupo Açungui, incluin-do a porção Ribeira e o Complexo Embu, além doGrupo Serra do Itaberaba, são destacados comoporções mais antigas relacionadas a uma mesmapaleobacia. Essas porções são ou seriam afetadaspor regime colisional do tipo himalaiano, conside-rando as faixas de supracrustais (Açungui Superior,Complexo Pilar do Sul) como prismas de acresção oupreenchimentos de bacias retroarco e antearco, e osgranitóides como vinculados a arcos magmáticosdas etapas pré- a pós-colisional. Para o Grupo SãoRoque e porções superiores restritas do GrupoAçungui, os referidos trabalhos assinalam que nãoé possível estabelecer se faziam parte de uma exten-sa seqüência supracrustal ou de embaciamentos in-dependentes. Estas unidades, que atualmente ocor-rem em faixas limitadas, poderiam representar por-ções remanescentes de pacotes mais extensos e es-pessos. O quadro tectônico regional estaria relacio-nado à articulação de blocos crustais, com desloca-mento do Bloco Vitória de leste para oeste, produ-zindo cavalgamento deste em relação ao Bloco SãoPaulo em rampa oblíqua. Com este cavalgamentooblíquo de baixo ângulo, num primeiro estágio pro-duziu-se desarticulação, imbricação e lenticularizaçãodos corpos rochosos em estado plástico, desenvol-vendo foliação milonítica com baixos mergulhos paraSSE, paralela à sutura entre os blocos, e lineação deestiramento com direção ESE. Num estágio seguin-te, o transporte de leste para oeste foi sendogradativamente impedido, induzindo o surgimentode diversas zonas de cisalhamento dúctil e dúctil-rúptil de alto ângulo com direção ENE-WSW, e cri-ando outra lineação de estiramento. Diferentemen-te, HACKSPACHER et al. (1993) e HACKSPACHER(1994) sugeriram que a crosta transamazônica con-solidada teria sofrido uma distensão há aproximada-mente 1,8 Ga, dando início à deposição da seqüên-cia vulcano-metassedimentar referente aos gruposSerra do Itaberaba e São Roque. Em seguida teriaocorrido a evolução tectono-metamórfica durante o

Ciclo Brasiliano, com o magmatismo atingindo seumáximo entre 0.8 e 0.7 Ga a partir da fusão parcial dacrosta continental inferior, associado a processostranstensivos e alojamento dos maciços granitóidesSorocaba e São Roque. O processo transpressivo-transcorrente teria ocorrido em torno de 0.6 Ga, va-lor este interpretado por TASSINARI et al. (1988)como de resfriamento. Datações K/Ar efetuadas porestes últimos autores apresentaram idades de 1.52Ga para a cristalização e metamorfismo de anfibolitosdo Grupo Serra de Itaberaba e de 1.65 e 1.05 Ga pararochas metabásicas da região de Pirapora do BomJesus.

Trabalhos recentes proporcionaram uma sériede informações geocronológicas acerca do GrupoSão Roque e correlatos. Datações U-Pb em rochasmetavulcânicas (frações zircão e monazita),efetuadas por HACKSPACHER et al. (1999, 2000),indicam que a deposição do Grupo São Roque teriaocorrido entre 0.628 e 0.607 Ga. Especificamente comrelação às rochas aflorantes na área de estudo, re-sultados de datações Sm/Nd apresentados porDANTAS et al. (2000) indicaram idades de 2.44 Ga ede 1.86 Ga para as rochas-fonte, em metarritmitos efilitos do Grupo São Roque. Datações U-Pb emzircões provenientes de metandesitos basais indi-cam idades em torno de 1.4 Ga para o início da depo-sição de pelitos e vulcanismo do Grupo Serra doItaberaba (JULIANI et al. 2000).

Aspectos sobre a sedimentação do Grupo SãoRoque foram destacados por BERGMANN (1988,1992), que efetuou caracterização estratigráfico-es-trutural de seqüência vulcano-sedimentar constitu-ída por três unidades representativas de diferentescondições paleoambientais na região do Sinclinóriode Pirapora, e por IG/SMA (1990), no mapeamentogeológico da Folha Salto de Pirapora (1:50.000). Nes-te último trabalho, as interpretações sugerem que naporção ao sul da Zona de Cisalhamento de Piraporateria ocorrido uma deposição em águas profundaspor meio de fluxos gravitacionais de massa repre-sentados por correntes de turbidez (metarritmitos),às quais se intercalam processos de decantação numcontexto de deposição pelágica ou hemipelágica(metargilitos e filitos). Ao norte da referida zona decisalhamento, foi suposta uma deposição em siste-mas de leques submarinos em posição relativamen-te distal, com maior variação de litofácies.

Para fins de analogia e correlação, foram utili-zadas no presente trabalho, as designações deBERGMANN (1988, 1992) para as rochas do GrupoSão Roque, cujo posicionamento estratigráfico foitentativamente redefinido em HACKSPACHER et al.

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ainda de metarenitos feldspáticos a metarcósios,metassiltitos e filitos variados com passagens gra-duais para metarritmitos e metassiltitos.

ii) Formação Voturuna, compreendendo metassiltitosem contato basal gradativo com as rochas da uni-dade inferior, sobrepostos por quartzitos puros amicáceos, também feldspáticos, em contato abrup-to.

iii) Formação Pirapora (topo), incluindo metabásicase metacalcários, em contato abrupto com a uni-dade subjacente.

(1993) e HACKSPACHER (1994), com base na geo-logia da Folha Cabreúva. Três unidades principaissão descritas por estes autores:

i) Formação Estrada dos Romeiros (base), compre-endendo principalmente metarritmitos constituí-dos por intercalações de metarenitos feldspáticose metapelitos, contendo laminações plano-para-lelas, granodecrescência ascendente, laminaçõesonduladas do tipo “climbing” e canais de preen-chimento na base psamítica. A unidade consiste

FIGURA 1 - Localização aproximada da área de estudo e mapa simplificado enfocando as litofácies identificadas edescritas no presente trabalho. Compartimentação da área em domínios estruturais delimitados por zonas de cisalhamento(ZCTM - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Moreiras, ZCTP - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Pirapora,ZCTT - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Taxaquara). Litotipos associados ao Grupo São Roque: Mrt -metarritmitos; Msl - metassiltitos e metargilitos; Mar - metarenitos quartzosos e feldspáticos; Mcd - metacarbonatosdiversos; Fil - filitos diversos. Letras A, B, C e D acompanhando a nomenclatura dos litotipos e seguidas por numeraçãoindicam as litofácies descritas (Tabela 1 e texto). Outros litotipos associados ao Grupo Açungui e rochas granitóides:Mxa - micaxistos; Gna - gnaisses félsicos passando a migmatitos; So - Maciço Sorocaba; Sf - Maciço São Francisco; Pi- Maciço Piedade; Ps - Maciço Pilar do Sul. A linha tracejada acompanhada por pontos configura o limite aproximado daBacia do Paraná (rochas sedimentares do Subgrupo Itararé). (adaptado de FERNANDES DA SILVA 1997).

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É interessante notar que nas descrições deBERGMANN (1988) a Formação Estrada dos Romei-ros seria constituída por metassiltitos emetarritmitos, com intercalações de rochasmetabásicas e metacarbonáticas, e a FormaçãoPirapora compreenderia rochas metabásicastoleíticas e metacalcários de natureza algácea.

1.2 Objetivos e escopo do presente trabalho

O presente trabalho teve como objetivos prin-cipais:

a) o estudo de fácies sedimentares, empregandoprincípios e métodos interpretativos da análisede bacias, aqui adaptados a um pacote de ro-chas que foi submetido à deformação emetamorfismo;

b) cartografar a distribuição dos tipos litológicos iden-tificando suas variações e relações espaciais,enfocando aspectos descritivos sobre sedimenta-ção, considerando aspectos da tectônica regionale local e relações com eventos magmáticos;

c) analisar os pacotes rochosos enfatizando o re-conhecimento e interpretação dos episódiosdeposicionais e processos envolvidos e, den-tro do possível, reconstituir relaçõesestratigráficas;

d) reconhecer os eventos deformativos, com o in-tuito de subsidiar possíveis reconstituiçõesestratigráficas.

Considerando que uma fácies é um corpo derochas com características específicas, no presen-te trabalho, o enfoque foi dado às característicasfísicas e químicas da rocha, sendo apropriado ouso do termo litofácies (MIALL 1985). Umalitofácies deve ser idealmente uma rocha com ca-racterísticas distintivas, formada sob certas con-dições de sedimentação, refletindo um processoou ambiente particular. As fácies podem ser sub-divididas em sub-fácies ou agrupadas em assem-bléias ou associações de fácies. As associaçõesde fácies são grupos de fácies que ocorrem juntase são consideradas como geneticamente ouambientalmente relacionadas. Cada grupo defácies pode ser identificado como uma associa-ção distinta. A associação é capaz de prover evi-dências adicionais que tornam a interpretaçãoambiental mais fácil do que tratando cada fáciesisoladamente (READING 1996).

Nesse sentido, a abordagem adotada no pre-sente estudo levou em consideração os seguin-

tes aspectos relativos aos metassedimentos doGrupo São Roque aflorantes na região: (1) deter-minados litotipos repetem-se com maior ou menornúmero de variações (composicionais e/outexturais) ao longo da coluna ou seção vertical;(2) os litotipos analisados referem-se possivel-mente a fácies e sistemas deposicionais contem-porâneos. Tais aspectos reforçaram o uso de as-sociações de litofácies como elemento de análisemais adequado para a investigação dos ambien-tes de sedimentação, incluindo processos e fei-ções decorrentes, suas relações cronológicas, epossíveis conotações com o quadro estratigráficoregional.

2 ASSOCIAÇÕES DE LITOFÁCIES

O presente trabalho enfocou o conjunto demetassedimentos referido como Grupo São Roque,delimitado ao sul pela Zona de Cisalhamento deTaxaquara (ZCTT, Figura 1) e estendendo-se paranorte com uma distribuição razoavelmente contínuaaté as proximidades da cidade de Votorantim. Regis-tra-se ainda a incursão de corpos de rochasgranitóides e de manchas de sedimentos fanerozóicosno trecho mencionado (BISTRICHI et al. 1981, IG/SMA 1990). Segundo FERNANDES DA SILVA (1997),todo o conjunto de metassedimentos atribuídos aoGrupo São Roque teria sido afetado na área de estudopor três fases progressivas de deformação. A primeirafase (Dn), de natureza dúctil, corresponderia a umacinemática de baixo ângulo, responsável por dobra-mentos locais a semi-regionais do acamamentosedimentar (S0), envolvendo o desenvolvimento dafoliação tectono-metamórfica (Sn). As outras duasfases de deformação (Dn+1 e Dn+2), dizem respeitoa uma cinemática de alto ângulo com transição docaráter dúctil para dúctil-rúptil. A fase Dn+1 caracteri-za-se pelo desenvolvimento de dobras (sinformes eantiformes) de estilo bastante variado sobre a foliaçãoanterior (Sn), com desenvolvimento local de foliaçãoplano-axial (Sn+1), geralmente verticalizada, que evo-lui para uma foliação milonítica (Sm) associada aodesenvolvimento de zonas de cisalhamentotranscorrente de característica dúctil-rúptil. A faseDn+2 representa os efeitos transpressivos tardiosassociados ao cisalhamento, caracterizando-se pelaformação de dobras normais, suaves e abertas, quepodem evoluir a dobras apertadas nas proximidadesdas zonas de cisalhamento transcorrente (Figura 2).Estas, por sua vez, constituem feições de dimensõesquilométricas, que delimitam domínios estruturais,blocos ou compartimentos tectônicos (Votorantim,

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Pirapora, Fazendinha-Jurupará e Pilar do Sul, comoilustrado na figura 1), dentro dos quais os conjuntosde rochas foram menos afetados pelo regime detranscorrência. FERNANDES DA SILVA (1998) assi-nala que esse conjunto de metassedimentos teria sidoainda afetado por seis eventos de deformação rúptilde idade possivelmente meso-cenozóica.

No presente trabalho foi possível identificar ecaracterizar quatro associações de litofácies distin-tas, provavelmente representando ambientesdeposicionais diferentes, como sintetizado na tabe-la 1. As associações de litofácies identificadas naárea de estudo foram correlacionadas tentativamenteàs unidades estratigráficas descritas porBERGMANN (1988, 1992) e HACKSPACHER (1994)mencionadas acima.

A relação entre litofácies e associações delitofácies é apresentada em seção vertical esquemáticano item 3 (Figura 12). As espessuras aparentes, quan-do indicadas na seção vertical esquemática, foram esti-madas a partir da distribuição em mapa e de perfis geo-lógicos com integração de dados de poços tubularesprofundos, procurando levar em consideração os efei-tos produzidos pela tectônica. As relações espaciaisentre as litofácies na porção central da área de estudosão ilustradas de forma esquemática no perfil geológi-co apresentado na figura 2. As associações de litofáciescaracterizadas são descritas a seguir.

2.1 Associação de litofácies A - siliciclástica basal

A associação de litofácies A - siliciclástica basal

compreende metassiltitos laminados, metarritmitos,metarenitos feldspáticos a arcosianos e algumas ocor-rências de tipos quartzosos, filitos sericíticos egrafitosos, e eventuais níveis de metargilitos maciços.

A associação de litofácies siliciclástica basalfoi observada em duas porções distintas da área deestudo. Ao norte, próximo a cidade de Votorantim,estendendo-se para SW, onde apresenta relaçõesde contato pouco definidas (devido à cobertura desolos) com a associação de litofácies B sobrejacente,em condição de topo invertido estruturalmente. Naporção centro-sul (Domínio Fazendinha - Jurupará),onde ocupa uma grande extensão, exibe contatosabruptos definidos por zonas de cisalhamentotranscorrente. Neste domínio, o limite norte é dadopela Zona de Cisalhamento de Pirapora (ZCTP, Fi-guras1 e 2) que provoca o truncamento dos trendsfaciológicos, justapondo associações de litofáciesdistintas. No limite sul, ocorre o mesmo tipo de situ-ação envolvendo a Zona de Cisalhamento deTaxaquara (ZCTT, Figura1) e rochas que foram se-paradas do contexto do Grupo São Roque neste eem trabalhos anteriores, associadas provavelmenteao Grupo Açungui, conforme as descrições deHASUI & SADOWSKI (1976), STEIN (1984) e CAM-POS NETO et al. (1990).

Cinco litofácies referentes à associaçãosiliciclástica basal são descritas a seguir (Tabela 1,Figura 12).

• Metassiltitos laminados (Msl-A1, Figura 1). Alitofácies corresponde às ocorrências ao sul e a su-

FIGURA 2 - Perfil geológico esquemático P – P’ cortando a área de estudo no sentido WNW – ESE (aproximadamenteperpendicular ao trend regional) e mostrando a relação espacial das unidades (litofácies aqui descritas e outros litotiposocorrentes) entre as localidades de Salto de Pirapora e Piedade (vide localização na figura 1). Litotipos/litofáciesassociados ao Grupo São Roque: Mar-A2 - metarenitos quartzosos e feldspáticos; Mrt-A3 - metarritmitos; Fil-A4 -filitos sericíticos e grafitosos; Msl-C1 - metassiltitos laminados; Mcd-C2 – metamargas laminadas e bandadas; Mcd-C3– metadolomitos e metacalcarenitos dolomíticos bandados; Mcd-C4 – metacalcilutitos laminados e bandados. Rochasgranitóides e outros litotipos: So - Maciço Sorocaba; Sf - Maciço São Francisco; Pi - Maciço Piedade; Ita – lamitos earenitos do Subgrupo Itararé; Qa – sedimentos aluvionares. ZCTM - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Moreiras;ZCTP - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Pirapora; ZCTT - Zona de Cisalhamento Transcorrente de Taxaquara.Adaptado de FERNANDES DA SILVA (1997).

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deste de Salto de Pirapora (Domínio Fazendinha-Jurupará), com espessuras relativas aparentes entre250 e 300 metros. Nos trechos citados são observa-das rochas argilo-siltosas com cores de alteração, entrecinza castanho-avermelhado escuro a arroxeado mui-to característico, constituídas por níveis extremamen-te contínuos com espessuras inferiores a 2 mm, confi-gurando laminações plano-paralelas. Em direção aotopo da litofácies há um nítido incremento de níveisde metarenito muito fino (geralmente com espessurasde 1 a 15 mm). Ao sul da cidade de Salto de Pirapora,próximo ao contato com os metarenitos da litofáciessobrejacente (Mar-A2), são observadas laminaçõescruzadas de baixo ângulo do tipo climbing e detruncamento por ondas. São feições com dimensõesdecimétricas a milimétricas (espessura máxima dosforesets inferior a 3 mm) que indicam topos normaispara SE e , por vezes, fluxo combinado (alguns setsindicam a existência de duas direções aparentementea 180º). Nas laminações cruzadas de baixo ângulo (Fi-gura 3) observa-se que os contatos basais das cama-das claras (silto-arenosas) são predominantementebruscos, com a concavidade voltada para cima, exi-bindo truncamento angular das laminações internaspela camada escura subjacente (pelítica). Um poucoacima da referida porção, as camadas silto-arenosaspermanecem com a concavidade para cima, entretan-to, as laminações internas apresentam contatos basaismais tangenciais e gradativos. Embora sejam menosfreqüentes, ainda no mesmo local, observam-se fei-ções com convexidade voltada para cima, do tipolaminação cruzada truncada por ondas (Figura 4).

O padrão aparentemente bimodal observadoem alguns casos nas estruturas sedimentares acimadescritas não necessariamente representariam pro-dutos de fluxos combinados. Por exemplo, as estru-turas poderiam representar laminações cruzadas dotipo climbing, cujo corte em afloramento estaria apro-ximadamente perpendicular à direção da corrente(festões), ou poderiam ainda representardescontinuidades internas de foresets, relacionadasà base de estratificações cruzadas de maior ordem(COLLINSON & THOMPSON 1989), mas que nãopuderam ser identificadas localmente.

• Metarenitos maciços a levemente estratificados(Mar-A2, Figuras 1 e 2). A litofácies está representa-da por “manchas” ou lentes de dimensões variáveise espessuras aparentes estimadas em dezenas a umacentena de metros, aflorantes no trecho entre asZonas de Cisalhamento de Pirapora (ZCTP) e deTaxaquara (ZCTT). Compreendem metarenitos pre-dominantemente maciços com variações

composicionais e granulométricas. Os tiposquartzosos apresentam grã levemente grossa a fina,como na ocorrência ao sul de Salto de Pirapora ante-riormente mencionada, onde os metarenitos apre-sentam-se em termos conglomeráticos finos, con-tendo na base, clastos da litofácies A1 descrita aci-ma (metassiltitos laminados), em granodecrescênciaascendente (Figura 5). Os referidos clastos são an-gulosos a subangulosos, com dimensões inferioresa 5 mm de comprimento, distribuídos de maneira le-vemente orientada subparalelamente ao plano deacamamento. Os tipos feldspáticos são em geral maisgrossos e estratificados, e apresentam-se freqüen-temente deformados e associados à presença dezonas de cisalhamento transcorrente (Figura 2).• Metarritmitos (Mrt-A3, Figuras 1 e 2). Estalitofácies predomina na associação A, assim comonas duas porções de área acima mencionadas (Do-mínios Votorantim e Fazendinha-Jurupará), possi-velmente refletindo a estruturação tectônica regio-nal. As espessuras aparentes estimadas indicampacotes possivelmente superiores a 1000 m. É cons-

FIGURA 4 - Metassiltitos laminados (Msl-A1).Laminações cruzadas truncadas por ondas.

FIGURA 3 - Metassiltitos laminados (Msl-A1).Laminações cruzadas de baixo ângulo.

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tituída pela alternância de níveis psamíticos (cujasespessuras variam desde alguns centímetros até 2metros) contendo metarenitos muito finos a médi-os, de composição predominantemente feldspática,e de níveis de metapelitos (metassiltitos,metargilitos, filitos), com espessura nunca exceden-do 50-60 cm. Os níveis metareníticos apresentamcontatos bruscos na base (onde são geralmentemaciços), com granodecrescência normal ascen-dente em direção às porções pelíticas, marcandoestratificação gradual que passa a plano-paralela.Laminações cruzadas de marcas onduladascavalgantes (climbing), de dimensões milimétricas,ocorrem com pouca freqüência próximas à interfaceentre os níveis pelíticos e psamíticos, aspecto tam-bém reportado em IG/SMA (1990) na área de estu-do e, em HACKSPACHER (1994) para ocorrênciasna Folha Cabreúva. Em localidades situadas a su-deste da área de estudo, essas feições indicam to-pos normais, ora para NW, ora para SE, com pre-dominância desses últimos, provavelmente devidoa dobramentos locais (conjunto de sinformes eantiformes atribuído à fase de deformação Dn+1).Ao norte, no Domínio Votorantim, próximo ao con-tato com os metassiltitos e metargilitossobrejacentes da associação de litofácies B (des-crita a seguir), os metarritmitos exibem finasestratificações onduladas (wavy bedding) indican-do topos invertidos para SE, visto que o acamamentosedimentar original mergulha para NW no local.• Filitos laminados a bandados (Fil-A4, Figuras1 e 2). Esta litofácies tem nos filitos sericíticos seuprincipal constituinte, ocorrendo subordinadamenteníveis ou variações laterais de filitos grafitosos. Adistribuição desta litofácies na área de estudo estáem grande parte associada à deformação provocadapelas zonas de cisalhamento transcorrente. Junto à

Zona de Cisalhamento de Pirapora (ZCTP, Figuras 1e 2), especialmente no seu flanco sul, ocorrem exten-sas faixas de filitos justapostas aos metarritmitos(Mrt-A3), com os quais exibem contatosgradacionais, e também aos metassiltitos (Msl-A1),com os quais apresentam contatos abruptos em al-guns locais. O tectonismo rúptil posterior parece tersido o responsável pela ocorrência desta litofáciestambém no flanco norte da referida zona decisalhamento na localidade de Piraporinha (Figura2), onde está em contato com rochas granitóides ecom associações de litofácies aqui consideradasestratigraficamente superiores (associação clasto-química transicional). Em condições normais, osfilitos incluídos nesta litofácies apresentamestratificação do tipo plano-paralela e representamuma passagem gradual dos níveis pelíticos verifica-dos na litofácies anterior (Mrt-A3) para níveis maisespessos e definidos.• Metargilitos maciços (Msl-A5). A litofácies com-preende níveis de metargilitos maciços, geralmentecaolinizados em afloramento, com ocorrência, dimen-sões e espessuras restritas (provavelmente algumaspoucas dezenas de metros) limitando sua represen-tação em mapa. Os metargilitos estão sobrepostosem contato gradacional aos filitos anteriormentedescritos (Figura 12). As cores de alteração vão decinza esverdeado claro a amarelo esbranquiçado.

2.2 Associação de litofácies B - siliciclástica inter-mediária

A associação de litofácies B - siliciclásticaintermediária tem ocorrência restrita à porção norteda área de estudo (Domínio Votoratim), constituin-do uma faixa contínua de orientação NE-SW, a partirda localidade de Santa Helena (sudeste deVotorantim, Figura 1). Nesta associação foram reco-nhecidas três litofácies, descritas a seguir.• Metassiltitos laminados e maciços (Msl-B1, Fi-gura 1). Esta litofácies inclui extensas camadas demetapelitos finos a muito finos, cuja espessura totalaparente estimada pode superar 500 m. Caracteri-zam-se por contínuos níveis argilosos e siltosos aareno-siltosos exibindo estratificação/ laminaçãoplano-paralela, cujas espessuras médias variam de 5mm a 10 cm. Os níveis pelíticos mais puros possuemcoloração cinza médio a escuro, passando a casta-nho-avermelhado quando intemperizados, enquan-to os níveis silto-arenosos exibem cores mais claras,de cinza claro a amarelado. A litofácies apresentacontatos abruptos e descontínuos com osmetarritmitos (Mrt-A3) da associação de litofácies

FIGURA 5 - Metarenitos maciços a levementeestratificados (Mar-A2). Intraclastos basais egranodecrescência ascendente.

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subjacente, em relação espacial de topo invertidonas proximidades da cidade de Votorantim. Os con-tatos são gradacionais com os metarenitos dalitofácies B3 sobrejacente (descrita a seguir).Notadamente, há um incremento dos níveis silto-arenosos em direção à litofácies B3. Nesse contexto,entre Salto de Pirapora e a localidade de Santa Hele-na, são observadas laminações cruzadas de baixoângulo (amplitudes de 1 a 2 cm), caracterizadas pelaconcavidade dos sets basais e convexidade para cimados sets superiores, que se assemelham a feições dotipo hummocky (HARMS et al. 1975 apud WALKER& JAMES 1992), embora suas dimensões possamser consideradas reduzidas para tal.

Por outro lado, a passagem dos metassiltitosdesta litofácies para os metargilitos maciços dalitofácies Msl-B2 (descrita a seguir) não é nítida em

escala de afloramento, o que inibiu a individualizaçãodestas litofácies no mapa da figura 1. Os contatossão difusos e possivelmente de naturezainterdigitada, sugerindo uma possível variaçãofaciológica vertical e lateral (expressa principalmen-te em termos granulométricos e também pela presen-ça ou ausência de estruturas sedimentares), comorepresentado na seção esquemática da figura 12.Também não são claras as relações de contato entreesta litofácies e os metassiltitos (Msl-C1) da associ-ação de litofácies C sobrejacente, o que é discutidooportunamente na descrição daquela associação.

• Metargilitos maciços (Msl-B2, Figura 1). Comoacima mencionado, esta litofácies possivelmente re-presenta variação vertical e lateral da litofácies ante-riormente descrita, tendo uma distribuição restrita àlocalidade de Santa Helena, situada a sudeste de

TABELA 1 - Associações de litofácies e prováveis ambientes de sedimentação.

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Votorantim. Caracteriza-se como uma rocha de colo-ração cinza claro de tonalidade castanho-amarelada,com textura maciça, no entanto, exibindo localmentefoliação tectono-metamórfica (pouco desenvolvida)e pequenas manchas sub-elipsoidais constituídasde mineral opaco geralmente oxidado.

• Metarenitos quartzosos (Mar-B3, Figura 1). Nalocalidade de Santa Helena, a sudeste de Votorantim,ocorre um corpo de forma alongada e lenticular, comespessura aparente estimada variando entre 100 e150 m, constituído por metarenitos cujo conteúdoem quartzo é superior a 95%. A rocha é predominan-temente maciça, passando a estratificada em direçãoaos contatos, que são parcialmente afetados pelocisalhamento transcorrente, especialmente em de-terminados trechos na interface com metadolomitospertencentes a associação de litofácies D,sobrejacente.

Os contatos com litofácies subjacentes(metassiltitos e metargilitos, Msl-B1 e Msl-B2 res-pectivamente) são gradacionais e aparentementeinterdigitados, exibindo ao longo dos mesmosacamamentos ondulados e lenticulares (wavy elenticular bedding) (Figura 6) que, por sua vez, con-têm estruturas sedimentares internas tais comolaminações de migração de marcas onduladas (rippledrift cross lamination). Nesses locais, a atitude ge-ral do acamamento sedimentar é N16W/ 88NE, des-tacando-se níveis mais ou menos contínuos, comespessuras entre 5 e 15 cm, contendo areia fina amédia de coloração avermelhada, adjacentes e alter-nados com níveis mais abundantes e mais espes-

sos, de coloração mais clara (creme a amarelado)contendo material de granulometria mais fina (silto-arenoso) (Figura 6). As formas do acamamento vari-am de plano-paralelo a ondulado e lenticular, indi-cando topo normal para ENE. Os foresets delaminações cruzadas têm espessuras inferiores a 1cm, concavidade voltada para cima, com contatosinferiores tendendo a tangenciais e superiores trun-cados, apresentando caráter unidirecional de feiçõessubparalelas à paleocorrente. A atitude média dosplanos de foresets é N63E/60o SE, indicando direçãode paleocorrente para WSW (Az 250-240 aproxima-damente), como mostra o diagrama de roseta da fi-gura 11-A.

2.3 Associação de litofácies C - clasto-químicatransicional

A associação de litofácies C - clasto-químicatransicional ocorre na porção centro-norte da áreade estudo (Domínio Votorantim, Figura 1), particu-larmente nos arredores da cidade de Salto de Pirapora.A associação inclui metassiltitos maciços elaminados, metamargas, metadolomitos emetacalcilutitos bandados, metacalcarenitosdolomíticos, metacalcários laminados e bandados, ebiotita-clorita filitos bandados, descritos a seguir.

Apesar da continuidade física e ausência decontatos bem demarcados com a associação delitofácies B, assim como similaridades com a associ-ação de litofácies D devido à presença comum derochas clasto-químicas, existem diferençasfaciológicas que justificam a individualização destaassociação. A leste de sua área de ocorrência, aszonas de cisalhamento de Pirapora e de Moreira pro-vocaram a justaposição das rochas da associaçãode litofácies C e os filitos sericíticos e grafitosos(Fil-A4) da associação de litofácies A (Figuras 1 e 2).No entanto, em direção ao norte, as relações de con-tato com a associação de litofácies B são pouco de-finidas e sugerem um caráter gradacional. A análisegeológico-estrutural, incluindo os indicadores detopo e base das camadas, indica uma posiçãosobrejacente das rochas metacarbonáticas e filitosbandados da associação de litofácies C em relaçãoaos metassiltitos (Msl-B1) pertencentes à associa-ção de litofácies B. Por outro lado, a associação delitofácies C não exibe contato vertical ou continui-dade físico-geográfica com a associação de litofáciesD, estando ambas diretamente assentadas em posi-ção sobrejacente à associação de litofácies B. Noentanto, a interpretação faciológica sugere umposicionamento que parece refletir a justaposição

FIGURA 6 - Metarenitos quartzosos (Mar-B3).Acamamento ondulado e lenticular.

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lateral de ambientes ou de porções distintas de ummesmo sistema deposicional, como foitentativamente representado na seção verticalesquemática da figura 12 e como será discutido pos-teriormente no item 3.

• Metassiltitos maciços e laminados (Msl-C1, Fi-guras 1 e 2). Esta litofácies compreende as ocorrên-cias de metassiltitos próximas à cidade de Salto dePirapora, cujas características e cores de alteraçãoobservadas em afloramento assemelham-se àquelasda litofácies B1, entretanto, apresentando sensíveisdiferenças. Os perfis geológicos integrados aos da-dos de poços tubulares profundos não permitiramestimar a espessura aparente para esta litofácies. Asrochas aqui incluídas apresentam localmente textu-ras maciças que evoluem para laminações plano-pa-ralelas em direção às litofácies sobrejacentes, comas quais exibem contatos gradacionais e incluem pos-síveis variações laterais (contatos com as litofáciesC2, C3 e C4 descritas a seguir). A estratificação, quan-do observada, expressa-se por níveis contínuos dematerial silto-argiloso com espessuras nunca exce-dendo 5 ou 6 mm.• Metamargas laminadas a bandadas (Mcd-C2,Figuras1 e 2). Esta litofácies refere-se às ocorrênciasde rochas metacarbonáticas impuras, de formaalongada e/ou lenticular descontínuas, distribuídasde maneira esparsa. A espessura provavelmente va-ria no sentido lateral em decorrência da formalenticularizada, tendo sido estimados valores máxi-mos entre 150 e 200 m. Os contatos com as demaislitofácies são gradacionais e também indicam varia-ções laterais e interdigitamentos. As rochas que cons-tituem esta litofácies caracterizam-se pela alternânciade níveis estratificados de material silto-argiloso,cujas espessuras variam de 1 a 2 mm nos tiposlaminados e de 5 a 10 mm nos tipos bandados, exi-bindo coloração cinza médio a escuro com tonalida-de verde a castanho-avermelhada. A análisepetrográfica revelou que o acamamento sedimentarem arranjo plano-paralelo consiste de níveis claros,onde predominam grãos angulosos de quartzo esericita, que se alternam com níveis compostos porcarbonatos e opacos e níveis contendo clorita eopacos, responsáveis pelas tonalidadesavermelhadas e esverdeadas respectivamente. Lo-calmente as espessuras dos níveis variam bastanteressaltando-se a granodecrescência ascendente dosníveis quartzosos em direção aos níveiscarbonáticos. Este aspecto, observado em nível mi-croscópico, parece refletir as condições ambientaise o arranjo das litofácies em escala meso e

macroscópica. Mais restritamente, foram observa-das em afloramento, na interface entre níveis claros(predominantemente quartzosos) e níveis de colora-ção cinza (carbonáticos) em metamargas do tipobandado, marcas onduladas levemente assimétricas,com amplitudes inferiores a 5 mm e cristas arredon-dadas. Essas feições foram observadas numa únicaseção aproximadamente perpendicular aoacamamento, indicando topo para a direção WNW(Figura 11-B).• Metadolomitos, metacalcilutitos emetacalcarenitos dolomíticos bandados (Mcd-C3,Figuras1 e 2). Na ocorrência da Mina de Salto (su-deste de Salto de Pirapora, contígüa à Zona deCisalhamento de Moreiras, ZCTM), esta litofáciesconsiste de um arranjo plano-paralelo no qual pre-dominam camadas de coloração cinza claro, com es-pessuras variando de 1-2 mm até 8-10 cm, que sealternam com camadas de cor cinza escuro, com es-pessuras inferiores a 2 cm. Os níveis mais clarosgeralmente apresentam uma textura mais granular(microesparítica), sendo constituídos predominan-temente por carbonatos e quartzo, enquanto os ní-veis escuros exibem textura criptocristalina (micrítica),onde os minerais opacos são os constituintes prin-cipais.

Mesoscopicamente, o contato entre os níveisé bem marcado pelo contraste textural e, em seçãodelgada, pela passagem abrupta. Todavia, os conta-tos com as litofácies subjacente (Mcd-C2) esobrejacente (Fclx-C5), no local, não refletem essacaracterística, prevalecendo o caráter gradacional.Nas ocorrências da localidade de Ponte Alta (áreade mineração desativada, a leste-nordeste de Saltode Pirapora, Figura 2) a litofácies caracteriza-se pelapresença mais freqüente de termos psamíticos, apre-sentando contatos gradacionais a levemente abrup-tos (onde há maior contraste textural) com aslitofácies adjacentes (C1, C2 e C4). Nesse último lo-cal a rocha exibe estratificação plano-paralela, cons-tituída pela alternância de níveis mais espessos (de3 mm a 6 cm) de material silto-arenoso muito fino afino de coloração cinza claro a amarelado, constitu-ído por carbonatos e quartzo, e de níveis menos es-pessos (inferior a 1 mm a 15 mm), por vezes,descontínuos, de coloração cinza esbranquiçado,contendo material mais fino (carbonatos). Ocorremgranodecrescência ascendente e variação verticalda espessura dos níveis. Observa-se a presença dediferentes tipos de estruturas sedimentares, impor-tantes para interpretação paleoambiental. Na basedesta litofácies os níveis são mais finos e aproxima-

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damente equidimensionais (laminações plano-para-lelas), passando a espessuras maiores onde predo-minam gradativamente os níveis silto-arenosos, atin-gindo texturas mais maciças a uniformementeestratificadas no topo, onde são observadosintraclastos de metarenito muito fino (Figura 7), dis-postos paralelamente ao acamamento sedimentar,segundo direções de maior comprimento cujas di-mensões variam de 2 a 7 cm. Na porção intermediá-ria, onde a alternância entre os níveis é mais caracte-rística, observam-se diversas estruturassedimentares internas ao acamamento. Sãolaminações de migração de marcas onduladas (rippledrift cross lamination), como mostrado nas figuras8 e 9, de baixo ângulo, cujo comportamento pareceacompanhar as variações verticais acima descritas,observando-se uma tendência à assimetria de for-mas, e característica estrutural por vezes dissimilardos sets adjacentes na direção do topo (DE RAAFet al. 1977 apud READING 1996). Localmente, regis-tra-se a ocorrência de laminações cruzadas debaixíssimo ângulo que tendem a paralelizar-se ao pla-no de estratificação na parte inferior, passando alaminações cruzadas de ângulos maiores, prevale-cendo foresets unidirecionais mas também em dire-ções opostas. Os foresets têm espessuras entre 2 e 3mm podendo chegar a 1 cm, com mergulhos varian-do de 5 a 15o para NNE indicando topos normais dascamadas para WNW e direção de paleocorrente paraSSW (Figura 11-B). As laminações cruzadas apre-sentam, em geral, base côncava com limitestangenciais dos foresets; na parte superior, predo-minam os limites erosivos, por vezes, com feições detruncamento angular e superfícies de reativação e,menos freqüentemente, recobrimentos por materialmais fino (mud drapes) ssemelhantes a estruturasdo tipo tidal bundles (WALKER & JAMES 1992),como o exemplo apresentado na figura 9. As espes-suras aparentes estimadas para esta litofácies nãodevem exceder os 200 m.

• Metacalcários (metacalcilutitos predominan-temente laminados e bandados) (Mcd- C4, Figu-ras 1 e 2). As ocorrências referentes a esta litofáciescorrespondem a corpos alongados e/ou lenticularessituados a leste e nordeste de Salto de Pirapora.Em geral, correspondem a tipos bandados que secaracterizam por faixas claras, com espessuras en-tre 3 mm e 4 cm, constituídas de carbonato e quart-zo (texturas esparíticas), alternadas a filmes e finosníveis escuros a esverdeados, com espessuras demenos de 1 mm a 1 cm, compostos por mineraisopacos e carbonatos associados a epídoto e quart-

zo. Possíveis estruturas de contração foram obser-vadas nos níveis escuros, em escala meso e mi-croscópica, definidas por vênulas aciculares pre-enchidas por material carbonático, com disposição

FIGURA 7 - Metadolomitos, metacalcilutitos emetacalcarenitos dolomíticos bandados (Mcd-C3).Intraclastos.

FIGURA 9 - Metadolomitos, metacalcilutitos emetacalcarenitos dolomíticos bandados (Mcd-C3).Laminações cruzadas de migração de marcas onduladas emud drapes.

FIGURA 8 - Metadolomitos, metacalcilutitos emetacalcarenitos dolomíticos bandados (Mcd-C3).Laminações de migração de marcas onduladas.

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sub-perpendicular ao acamamento e confinadas aesses níveis. Essas feições indicaram topo normalpara NW. O contato com a litofácies Mcd-C3, des-crita anteriormente, varia de gradacional a levemen-te abrupto devido a contrastes texturais. Na ocor-rência de Ponte Alta (leste-nordeste de Salto dePirapora) (Figura 2), os metacalcários são maislaminados, e passam gradacionalmente nos conta-tos inferior e superior para os metacalcilutitos emetacalcarenitos dolomíticos da litofácies C3, res-pectivamente.• Biotita-clorita filitos bandados (Fcl-C5) (Fi-gura 2). A única ocorrência desta litofácies regis-tra-se na localidade de Piraporinha, estendendo-se da Mina de Salto à lavra da Minercal, ondepassa vertical e lateralmente às metamargas dalitofácies C2 e a metadolomitos e metacalcilutitosda litofácies C3 (Figura 12). Corresponde a umaestreita faixa aflorante com espessura aparenteestimada inferior a 80-100 m, apresentando rela-ções de contato difusas (gradacionais a levemen-te abruptas) e posições estratigráficas variadasem relação às demais litofácies (C1, C2 e C3), po-dendo representar interdigitamentos. As rochassão constituídas por uma alternância de caráterrítmico entre níveis claros (branco leitoso a cinzamuito claro), contendo predominantemente quart-zo, e níveis escuros (cinza escuro a esverdeado),contendo principalmente biotita, clorita e epidoto.A espessura dos níveis é bastante variável, desde1-2 mm até superior a 1 m nos níveis claros.

Algumas feições centimétricas, observadas nainterface de contato entre os níveis, insinuam mar-cas onduladas levemente assimétricas, indicandotopo normal para SSE.

2.4. Associação de litofácies D - carbonática impu-ra superior

A associação de litofácies D - carbonáticaimpura superior compreende metadolomitos emetacalcilutitos predominantemente laminados abandados, metacalcários maciços, e porção bastan-te restrita e localizada de quartzo-filitos e filitoslaminados. O trecho de ocorrência desta associaçãoestá limitado à localidade de Santa Helena (Figura 2,Domínio Votorantim, nordeste da área de estudo),onde estão situadas as instalações da fábrica de ci-mento Votoran I e respectivas áreas de explotaçãomineral. As relações de contato conjugadas à análi-se geológico-estrutural, incluindo as indicações detopo e base das camadas, mostram que a associaçãode litofácies D ocupa posição estratigráfica direta-

mente sobreposta aos metassiltitos e metargilitos(Msl-B1 e Msl-B2 respectivamente) e metarenitos(Mar-B3) da associação de litofácies B. Os contatossão predominantemente gradacionais destacando-se trechos em que este contato foi afetado pelocisalhamento transcorrente. Como mencionado an-teriormente no item 2.3, não existem relações de con-tato vertical ou continuidade física entre as associa-ções de litofácies C e D, que, no entanto, apresen-tam similaridades litofaciológicas, cujas relações decontato (gradacional) com a associação de litofáciesB subjacente sugerem a justaposição lateral de am-bientes, que poderiam ser partes integrantes de ummesmo sistema deposicional. As litofácies da asso-ciação D – carbonática impura superior são descri-tas a seguir.

• Metadolomitos e metacalcilutitos dolomíticosbandados, laminados e maciços. (Mcd- D1) (Figura1). A presente litofácies diz respeito às ocorrênciasda Mina Baltar e do Pastinho, onde ocorrem corposalongados e/ou lenticulares com espessura aparen-te estimada em 200-400 m. Apresenta sensíveis vari-ações texturais traduzidas pelos tipos mencionadosacima, que aparentemente refletem flutuações nascondições de deposição.

Os tipos laminados e bandados são predo-minantes, caracterizando-se pela alternância de ní-veis de coloração cinza médio a escuro, de texturapredominantemente micrítica, e de níveis de colo-ração cinza claro, onde as texturas predominantessão esparíticas. A espessura de cada nível é bas-tante variável (de 1-2 mm até 50-60 cm) ao longodos afloramentos, prevalecendo os níveis degranulometria mais fina. Os contatos entre os ní-veis são eminentemente gradacionais, assim comoem relação à litofácies sobrejacente (D2), compos-ta por metacalcários, onde observa-segranodecrescência ascendente e aumento progres-sivo da quantidade e da continuidade das lentesde metacalcário em direção ao topo. Na Mina doBaltar, os contatos entre os metadolomitos e aslentes de metacalcário apresentam tênues edescontínuas ondulações centimétricas, marcadaspela concentração de material fino de coloraçãoescura, similares a feições do tipo flaser (REINECK& SINGH 1980, COLLINSON & THOMPSON1989). Eventualmente, os metadolomitos emetacalcilutitos apresentam textura maciça e, emalguns locais, exibem aspecto brechóide, comvênulas aciculares preenchidas por materialcarbonático, similares às feições descritas na

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litofácies C4, que poderiam corresponder a estru-turas de contração.

Na porção inferior da Mina Baltar (entrecotas altimétricas de 510 e 495 m), foram observa-das laminações de migração de marcas onduladas(ripple drift cross lamination), cujas amplitudesvariam entre 3 e 4 mm. As observações foramefetuadas em seção vertical aproximadamente lon-gitudinal ao plano do acamamento que, no local,apresenta atitude média N58E/48NW. Aslaminações indicaram topo normal para a direçãoNNW, com foresets submilimétricos tendo atitudemédia N25E/38NW. Na mesma localidade, tambémforam observadas laminações cruzadas de baixoângulo, indicando truncamento por ondas. A am-plitude da referida estrutura é de cerca de 15 mm,e o acamamento sedimentar tem atitude N87E/77NE.

• Metacalcários maciços (Mcd- D2) (Figura 1).Esta litofácies corresponde essencialmente às ro-chas de coloração escura (preta) e composição pre-dominantemente calcítica, com textura maciça(micrítica), aflorantes nas Minas Baltar, da Placa edo Pastinho (sudeste de Votorantim), cuja espessu-ra aparente estimada não deve exceder os 100 m. Sãorochas extremamente homogêneas, não sendo ob-servadas estruturas sedimentares. Os contatos sãogradacionais com os metadolomitos da litofáciessubjacente (D1) e com os filitos da litofáciessobrejacente (D3) descritos a seguir.• Filitos laminados e quartzo filitos. (Fil- D3) (Fi-gura 1). Na ocorrência da Mina da Placa, afloramfilitos de textura microcristalina de cor escura (pre-to), que apresentam laminações plano-paralelas comextrema uniformidade de espessuras (de 2 a 3 cm).Entre os níveis pelíticos alternam-se níveis maisquartzosos de textura ligeiramente mais grossa,

onde sobre o plano de acamamento sedimentar sãoobservadas marcas onduladas de tipos distintos.Marcas onduladas assimétricas de cristas arredon-dadas ocorrem com padrão mais ou menos contí-nuo e sinuoso, fora de fase em plano, com amplitu-des máximas não ultrapassando 1 cm e comprimen-tos de onda da ordem de 4 a 5 cm (Figura 10); taisfeições indicam inversão do topo da camada paraNW, e sentido da paleocorrente, inferido a partirdo caimento da linha hipotética transversal à dire-ção das cristas e da direção dos flancos montan-

FIGURA 10 - Filitos laminados e e quartzo filitos (Fil-D3). Marcas onduladas assimétricas.

FIGURA 11 - Diagramas de rosetas indicando as direçõesde paleocorrentes observadas na área de estudo. A -associação de litofácies B, B - associação de litofácies C, C- associação de litofácies D.

FIGURA 12 - Seção vertical esquemática mostrando asrelações entre as diferentes litofácies e associações delitofácies identificadas nas rochas do Grupo São Roque,sudeste do Estado de São Paulo. Indicação das estruturassedimentares ocorrentes e de algumas espessuras aparentesestimadas a partir de perfis geológicos conjugados a dadosde poços tubulares profundos.

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interpretadas como parte da associação de litofáciesA – siliciclástica basal dada à sua contigüidade físi-co-geográfica e aparente ausência dedescontinuidade estratigráfica em relação àslitofácies A3 e A4, com as quais estão em contato.De forma especulativa, poder-se-ia dizer que as fei-ções observadas são indicativas de que osmetassiltitos (Msl-A1) representariam uma suces-são de plataforma rasa (lamas plataformais), possi-velmente num sistema influenciado por ondas e tem-pestades. Nesse contexto, a presença de corpos demetarenitos quartzosos e feldspáticos (Mar-A2), lo-calmente exibindo termos conglomeráticos eintraclastos basais, poderia ser interpretada comodepósitos de canal, não sendo possível precisar, noentanto, se tais depósitos estariam associados a umperfil regressivo, de descida relativa do nível do mar.

As feições características da associação delitofácies B - siliciclástica intermediária indicamcondições de deposição de uma plataforma rasa decaráter progradante, possivelmente dominada porondas e com influência de tempestades. Osmetassiltitos da litofácies B1 (Msl-B1), nos quaispredominam laminações plano-paralelas, mas con-tendo laminações cruzadas truncadas por ondas si-milares a hummockys, apesar de suas reduzidas di-mensões, poderiam constituir lamas plataformais si-tuadas próximas ou pouco acima do nível de basedas ondas. Os metarenitos da litofácies B3 emetargilitos maciços da litofácies B2 podem repre-sentar os depósitos de uma antepraia (shoreface)com indícios de progradação sobre a associação delitofácies D, onde há transição para um ambiente noqual a influência de fluxos gerados por marés torna-se progressivamente relevante, ainda assim, comaspectos indicativos de progradação, como menci-onado a seguir. A presença de acamamentos ondu-lados a lenticulares contendo laminações internasna interface entre a litofácies B1 e B3 indica umazona de transição entre os sedimentos plataformaise sedimentos depositados em ambiente sujeito à in-fluência de marés. Os trechos em que a litofácies B2gradaciona ou interdigita-se diretamente com os se-dimentos carbonáticos da litofácies D1 podem re-presentar a progradação da shoreface sobre os am-bientes vinculados àquela associação.

As informações coletadas, abrangendo asvariadas litofácies que compõem a associação delitofácies C - clasto-química transicional, indicam,como a própria denominação adotada sugere, con-dições de deposição que vão de uma plataforma rasa,com aporte de material carbonático, dominada porondas e de características progradantes, para um

tes, para SW (Az 220 aproximadamente). Tambémsão observadas marcas onduladas de perfil simé-trico apresentando cristas arredondadas e maiscontínuas, com padrão retilíneo em planta. As am-plitudes são inferiores a 5 mm e os comprimentosde onda situam-se entre 7 e 8 cm.

Parte dos quartzo-filitos (ou mesmo, filitosmiloníticos) aflora nas adjacências da Zona deCisalhamento de Moreiras (ZCTM, Figura1) apre-sentando-se em afloramento e em seção delgadaintensamente afetados por esta, correspondendo aporções milonitizadas desta litofácies.

3 DISCUSSÃO

As descrições efetuadas acima, integradas àsanálises petrográficas e aos resultados obtidos pelaanálise estrutural e tectônica, conduzem a interpre-tações distintas para cada uma das associações delitofácies caracterizadas no presente trabalho.

Características sedimentares, geometria e re-lações de contato entre as diferentes litofácies su-gerem que a porção superior da associação delitofácies A - siliciclástica basal corresponde a umcontexto deposicional de águas profundas, no quala sucessão compreendida pelas litofácies A3, A4 eA5 corresponderia a uma sucessão turbidítica. Osmetarritmitos (Mrt-A3) que incluem intercalaçõescíclicas de metarenitos com granodecrescência as-cendente na base, seguidos de estratificações elaminações plano-paralelas e laminações cruzadasdo tipo climbing na interface com camadas pelíticas,representariam fluxos gravitacionais de massa repre-sentados por correntes de turbidez de alta densida-de em condições possivelmente distais. Em direçãoao topo, correspondendo aos filitos e metargilitosmaciços (litofácies A4 e A5, respectivamente), a su-cessão passaria a turbiditos de baixa densidade, oupoderia ainda representar a intercalação de proces-sos de decantação num contexto de deposiçãopelágica ou hemipelágica. Tal contexto é bastantesimilar àquele sugerido por IG/SMA (1990), signifi-cando portanto condições de aprofundamentobatimétrico e subida relativa do nível do mar.

No entanto, as litofácies A1 e A2, posicionadasna porção inferior da associação, compreendendoos metassiltitos com laminações cruzadas de baixoângulo e de truncamento de ondas no topo, sucedi-dos em contato abrupto por metarenitos comintraclastos basais e granodecrescência ascenden-te, aparentemente integram um contexto deposicionalde águas mais rasas. Essas litofacies foram aqui

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ambiente de sedimentação onde prevaleceram osprocessos associados a fluxos determinados pormarés (intramaré passando a intermaré). As litofáciesaqui incluídas (em especial, C2, C3, C4 e C5),notadamente, apresentam geometrias lenticulares,além de variações laterais e verticais entre si, quepodem estar associadas a variações batimétricas e àquantidade de aporte sedimentar. Nesse contexto,os metassiltitos da litofácies C1 e as metamargascorrespondentes à litofácies C2, constituiriam de-pósitos plataformais propriamente ditos. Parte des-ta última litofácies (C2), associada à litofácies C5(biotita-clorita filitos bandados), onde são observa-das granodecrescências ascendentes, marcas ondu-ladas e feições do tipo flaser, podem representar apassagem do contexto de plataforma rasa para ambi-entes de sedimentação associados a sistemascarbonáticos perimaré ou de planícies de maré(READING 1996, WALKER & JAMES 1992).

As constituições granulométricas e estrutu-ras sedimentares observadas nas litofácies C3 e C4evidenciam ambientes de sedimentação dominadospor ondas e marés com características intermaré,correspondendo a uma transição de porções inferi-ores para porções superiores de uma planície de maré(sand flats para mixed flats). Segundo WALKER &JAMES (1992), sand flats ocupam a porção distal damaioria das planícies de maré, onde a velocidade dacorrente é menor, exibindo laminações cruzadas, en-quanto as camadas de lama tornam-se mais abun-dantes em direção ao continente, na medida em quese afastam dos canais de maré, configurando mixedflats. Ainda que sejam tênues evidências, as possí-veis estruturas de contração verificadas na litofáciesC4, situada no topo desta associação, teriam origemsubaquosa, corroborando a hipótese de lâminasd’água menores. COLLINSON & THOMPSON(1989) assinalam a presença de gretas de sinérese(shrinkage cracks) em sedimentos argilosos ricosem carbonatos, principalmente onde as camadas sãopouco espessas, como é o caso dos metacalcárioslaminados e bandados da litofácies C4.

As estruturas sedimentares observadas,conjugadas à geometria e relações de contato entreas litofácies (espessuras menores, formaslenticulares, contatos gradacionais com feições ca-racterísticas), indicam que a deposição da associa-ção de litofácies D - carbonática impura superiorprocessou-se num ambiente de águas muito rasasdominado por correntes e oscilações de maré, compossibilidade de períodos de exposição subaérea dasporções superiores. O referido contexto correspondeprovavelmente a uma planície de maré, abrangendo

a porção intermaré e alcançando restritamente a zonasupramaré. Dessa forma, as litofácies D1 e D2, cons-tituídas respectivamente por metadolomitos emetacalcilutitos dolomíticos predominantementebandados e laminados e por metacalcários maciços,correspondem em parte a ambientes de sedimenta-ção do tipo mixed flats e, principalmente, ambientesdo tipo mud flats. A presença de feições similares ahummockys na base da litofácies D1 pode significara incursão de ondas de tempestade sobre a planíciede maré, associada à característica progradante dosdepósitos plataformais e de shoreface (referentes àassociação de litofácies B) como mencionado aci-ma. A litofácies D3, contendo marcas onduladasassimétricas e simétricas de oscilações na superfíciedo acamamento, configura possivelmente as porçõesde topo do ambiente intermaré (mud flat) passandoa supramaré.

Na figura 12, as associações de litofácies C e Dsão representadas como sucessões verticais delitofácies dispostas paralelamente em seçãoestratigráfica esquemática. Tal disposição procurarefletir uma possível justaposição lateral de ambien-tes ou de porções distintas de um mesmo sistemadeposicional. Note-se que as relações de campo in-dicam que, apesar de não haver contigüidade físico-geográfica entre as associações C e D, ambas sãosobrejacentes à associação de litofácies B, num con-texto em que as transições entre as sucessões delitofácies não apresentam grandes descontinuidades,ou seja, predominam contatos gradacionais verti-cais e laterais, como por exemplo, a passagem lateraldos metassiltitos e argilitos das litofácies B1 e B2,respectivamente, para os metassiltitos da litofáciesC1.

Em três associações de litofácies foi possí-vel reconhecer feições indicativas da direção e dosentido das paleocorrentes. Embora a ocorrênciadessas feições tenha sido pontual e esparsa, restritaa alguns poucos afloramentos, elas contribuíram paraa descrição e interpretação acerca dos ambientes desedimentação. Para o contexto da área de estudocomo um todo, as indicações são de que aspaleocorrentes direcionavam-se predominantemen-te para o sul-sudoeste (Figura 11), já computadas aspossíveis inversões de topo das camadas. No en-tanto, os efeitos do cisalhamento transcorrente e apossibilidade de rotação de blocos tectônicos de-vem ser considerados, o que significa que tais inter-pretações devem ser tomadas com ressalvas. Na as-sociação de litofácies B, os indicadores apontam osentido da paleocorrente para WSW (Figura 11-A),enquanto que, na associação de litofácies C, o sen-

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tido indicado é SSW (Figura 11-B) e, na associaçãode litofácies D varia de SW a SSW (Figura 11-C). Poroutro lado, a relativa consistência das direções depaleocorrentes para o quadrante SW dentro de cadaassociação de litofácies e entre as mesmas, acres-centada ao fato de que as associações de litofáciesB, C e D, onde foram efetuadas as medidas, encon-tram-se todas situadas dentro de um mesmo blocotectônico (Domínio Votorantim, ao norte da Zona deCisalhamento de Pirapora, ZCTP, Figura 1) é um as-pecto favorável à confiabilidade das interpretaçõesaqui efetuadas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O levantamento efetuado visando à caracteri-zação de fácies sedimentares permitiu o reconheci-mento de quatro associações de litofácies distintasna parte ocidental do Grupo São Roque, aflorantesno sudeste do Estado de São Paulo. As associaçõescaracterizadas correspondem a ambientes de sedi-mentação que variam de marinho profundo, passan-do a marinho raso e marinho restrito ou marinho-lagunar.

As litofácies A1 e A2, situadas na porção infe-rior da associação de litofácies A - siliciclástica basal,apresentam características de uma deposição inici-almente em águas mais rasas, que poderiacorresponder a uma sucessão regressiva, sem evi-dências conclusivas para tal. Já as litofácies A3, A4e A5 sobrejacentes, corresponderiam a depósitosde águas profundas associados a uma aparente su-bida do nível relativo do mar.

As características faciológicas observadasnas associações de litofácies B, C e D refletem apredominância de um contexto progradacional, de-senvolvido em condições de nível do mar constan-te (possivelmente alto) e significativo aportesedimentar. A interpretação dos dados e a seçãoesquemática da figura 12 sugerem uma superfíciemáxima de inundação (GALLOWAY 1989) entre asassociações de litofácies A e B. Especulativamente,pode ser interpretado que o nível relativo do marpoderia ter se mantido alto após a aparente subidaregistrada na sucessão turbidítica (litofácies A3,A4, e A5) da associação de litófacies A, com pro-gressiva diminuição da batimetria em função dopreenchimento do espaço por sedimentaçãoprogradante (associação de litofácies B), culminan-do com o estabelecimento de planícies de maré mis-tas representadas pelas associações de litofáciesC e D. De forma restrita, estas duas associações

poderiam ser consideradas como co-genéticas, poraparentemente representarem porções distintas deum mesmo sistema deposicional, que apresentamcaracterísticas diferenciadas em termos de proces-sos sedimentares e de paleogeografia, razão pelaqual foram interpretadas no presente trabalho (erepresentadas graficamente na seção esquemáticada figura 12) como justaposição lateral de ambien-tes. Dessa forma, parte da associação de litofáciesC representaria as porções intramaré e intermaré deuma planície de maré, enquanto a associação delitofácies D corresponderia às porções inter asupramaré.

As descrições e interpretações efetuadas aci-ma, integradas ao empilhamento estratigráfico pro-posto para a área de estudo (Figura12), permitem oestabelecimento de correlações informais entre asassociações de litofácies caracterizadas e as desig-nações utilizadas por BERGMANN (1988, 1992) eHACKSPACHER (1994) para as possíveis unidadeslitoestratigráficas do Grupo São Roque em áreas ad-jacentes, com pequenas variações e algumas ressal-vas. Dentro desse contexto, podem ser feitas as se-guintes observações:

• a associação de litofácies A - siliciclástica basalcorresponderia à Formação Estrada dos Romeiros;

• a associação de litofácies B - siliciclástica interme-diária corresponderia, em parte, à FormaçãoVoturuna, ressalvando-se, no entanto, a possibili-dade de variações laterais e verticais que implicampossíveis intervalos estratigráficos de transição;

• a associação de litofácies C - clasto-químicatransicional, representa provavelmente as referidasvariações, que podem estar relacionadas a aspec-tos tais como variações batimétricas e possíveisdeslocamentos das fácies sedimentares, como in-dicam as estruturas sedimentares observadas e dis-tribuição espacial das litofácies. Desse modo, a as-sociação de litofácies C poderia representar umatransição da porção superior da Formação Voturunapara a porção mais inferior da Formação Pirapora;

• a associação de litofácies D - carbonática impurasuperior corresponderia, com ressalvas, à For-mação Pirapora. No caso, o contexto deposicionalaqui mencionado difere a princípio daquele ob-servado por BERGMANN (1988) na região dePirapora do Bom Jesus, marcado pela ausênciade rochas metavulcânicas associadas ametacalcários de origem algácea.

Alguns aspectos envolvendo a tectônica daárea também merecem ser destacados:

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• dobramentos observados em escala métrica adecamétrica, associados à primeira fase de de-formação dúctil (Dn), são responsáveis por in-versões estratigráficas locais, que, no entanto,podem refletir um comportamento regional. Talpossibilidade é corroborada pela ocorrência dalitofácies Mrt-A3 (metarritmitos) em porçõesopostas e distintas da área de estudo; na extre-midade norte no Domínio Votorantim, em situa-ção de topo invertido em relação à associaçãode litofácies B, e ao sul no Domínio Fazendinha-Jurupará (Figura 1). Note-se ainda que as se-qüências de rochas turbidíticas e micaxistosidentificadas por CAMPOS NETO et al. (1990)na Folha Pilar do Sul, correlacionáveis ao Gru-po Açungui ao sul, poderiam representar a con-tinuidade dos ambientes deposicionais deáguas mais profundas representados pela as-sociação de litofácies A - siliciclástica basal,caracterizada no presente trabalho e aflorantena porção imediatamente ao norte da Zona deCisalhamento de Taxaquara;

• os trends faciológicos foram significativamenteafetados pela tectônica transcorrente, como é ocaso de Piraporinha (porção centro-oeste da áreade estudo, próximo à cidade de Salto de Pirapora,Figuras 1 e 2), onde a Zona de Cisalhamento dePirapora justapõe porções das associações delitofácies A e C. Na mesma localidade observam-se ainda deslocamentos dos contatos litológicose, por conseguinte, dos limites de algumaslitofácies, provocados por conjugados de falhasassociados a regime compressional de orientaçãoNW-SE (FERNANDES DA SILVA 1997, 1998).Deslocamentos nos contatos litológicos entremetarritmitos (Mrt-A3), filitos (Fil-A4) e granitos(Sf) foram também atribuídos a este evento rúptilem localidades situadas na extremidade leste daárea estudada, no Domínio Fazendinha-Jurupará.

5 AGRADECIMENTOS

O autor gostaria de expressar seus agradeci-mentos ao Prof. Dr. Claudio Riccomini pela orienta-ção dos trabalhos, críticas e sugestões; ao InstitutoGeológico (IG/SMA) pelo apoio financeiro einfraestrutura; à Cristina M. Nunes pelo apoio emdiversas etapas do trabalho, incluindo digitação detextos, tabelas e tabulação dos dados estruturais; àCAPES pela concessão de bolsa de estudos, e aosrelatores da Revista do Instituto Geológico pela lei-tura crítica do presente artigo.

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Paulo Cesar Fernandes da Silva - Instituto Geológico, Secretaria do Meio Ambiente, Av. Miguel Stéfano3900, CEP 04301-903, São Paulo, SP. Email: [email protected].