padres_mestres_na_paraíba_oitocentista___uma_narrativa_sobre_o_frei_frutuoso_da_soledade_sigismundo.pdf...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA UFPB CENTRO DE CINCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CCHLA
DEPARTAMENTO DE HISTRIA
PADRES MESTRES NA PARABA OITOCENTISTA:
UMA NARRATIVA SOBRE FREI FRUCTUOSO DA SOLIDADE
SIGISMUNDO 1839 - 1871
MICHELE LIMA DA SILVA
JOO PESSOA, ABRIL DE 2013
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PADRES MESTRES NA PARABA OITOCENTISTA:
UMA NARRATIVA SOBRE FREI FRUCTUOSO DA SOLIDADE
SIGISMUNDO (1839 1871)
MICHELE LIMA DA SILVA
Orientadora: Professora Dr. Cludia Engler Cury
Monografia apresentada ao Departamento de Histria, do
Centro de Cincias Humanas Letras e Artes, em
cumprimento s exigncias para obteno do ttulo em
Licenciatura Plena em Histria, na Universidade Federal
da Paraba.
JOO PESSOA PB 2013
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MICHELE LIMA DA SILVA
PADRES MESTRES NA PARABA OITOCENTISTA:
UMA NARRATIVA SOBRE FREI FRUCTUOSO DA SOLIDADE
SIGISMUNDO 1839 - 1871
Avaliado em _____________________com conceito _______________.
Banca examinadora da Monografia
______________________________ Prof Dr Cludia Engler Cury (orientadora)
______________________________ Prof Dr Solange Pereira da Rocha (leitora interna)
______________________________ Prof Dr Mauricia Ananias (leitora externa)
JOO PESSOA PB 2013
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Catalogao da Publicao na Fonte.
Universidade Federal da Paraba.
Biblioteca Setorial do Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes (CCHLA).
Silva, Michele Lima da.
Padres mestres na Paraba oitocentista: uma narrativa sobre Frei
Fructuoso da Solidade Sigismundo (1839 1871) / Michele Lima da Silva. - Joo Pessoa, 2013.
70f.
Monografia (Graduao em Histria) Universidade Federal da Paraba - Centro de Cincias Humanas, Letras e Artes.
Orientadora: Prof Dra.Cludia Engler Cury.
1. Provncia da Paraba do norte. 2. Padres mestres. 3. Sigismundo, Fructuoso da Solidade. I. Ttulo.
BSE-CCHLA CDU
930(813.3):2
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Dedico essa monografia a todas as pessoas que me
incentivaram a entrar na vida acadmica quando todas
as direes apontavam para o contrrio.
Embora ningum possa voltar atrs e fazer um novo comeo, qualquer um pode comear agora e fazer um novo fim.
(Chico Xavier)
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Agradecimentos
Gostaria de agradecer primeiramente a Deus por tudo que aconteceu comigo at agora.
Sem ele nada seria possvel;
A joia mais preciosa, D.Maria, minha me que sempre esteve comigo me apoiando em
todas as decises, e puxando minha orelha quando necessrio;
Ao meu pai, que no habita mais uma pele carnal, pelo simples fato de sempre ter dito
que s em eu ter nascido j era seu maior orgulho;
A Mrcio, meu amor, sem sua ajuda e compreenso em todos os sentidos, essa
monografia no teria passado de um sonho no realizado;
A professora Cludia Cury, mesmo nossa relao tendo se iniciado de uma forma
tmida, a ela que devo meus primeiros passos na pesquisa, e principalmente foi a
pessoa que me ensinou o que ter humildade no meio acadmico;
As pessoas que estiveram comigo nos difceis caminhos que levavam at o Campus da
UEPB em Guarabira, meu primeiro endereo acadmico, de l que tiro minhas
maiores lies, aos caroneiros mais queridos: Marcio, Thiago, Feoli, Danielson,
Lenilson, Rafaela;
Aos professores que me inspiraram quando entrei no curso de Histria da UEPB,
Professor Ramss Nunes, Professora Solange Rocha e ao meu querido Professor
Waldeci F. Chagas;
A Paulinha, com quem dividi muitas caronas, experincias, e a alegria da transferncia
para a UFPB;
Aos amigos e amigas que conheci na UFPB, com os quais desfrutei momentos muito
agradveis, fosse para jogar conversa fora, ou tirar alguma dvida: Suelen, Mara,
Tamires, Thiago, Leandro, Gilmrio, Fabrian, Marcela, Severino, Miguel, Aderlan,
Carol, Perclia, Felipe, Danilo, Crispim, Jonatas, Sheyla, Francinezio, Lucian, Lis,
Cibelly, Rayssa, Alyne, e a todos que fizeram parte da minha trajetria na graduao.
A todos os integrantes do GHENO, que me acolheram sem distines, e com os quais
dividi momentos de aprendizado e aprofundamento na Histria da Educao: Prof.
Antnio, Prof Mauricia, Prof. Jean, Prof Rose, Prof Carla, Mariana, Thiago, Wilson,
Itacyara, em especial a Maday, com quem dividi as angstias e alegrias de ser uma
PIBIC;
As professoras leitoras: Mauricia Ananias e Solange Rocha que prontamente se
dispuseram a fazer a leitura desta monografia;
Aos meus familiares representados por: S. Nelson, Tia Dagmar, Ivonize e Tia Antnia,
E a todos aqueles que torcem pela minha felicidade, muito obrigada, amo todos vocs.
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Quantidade de padres mestres que aparecem na documentao entre os anos
de 1839 e 1871.
Quadro 2: Dificuldades de implantao das cadeiras de Ingls e Francs.
Quadro 3: Artigos da reforma geral da instruo de 1864 criticados pelo Frei Fructuoso
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Resumo
Essa pesquisa de carter monogrfico tem o objetivo de se inserir na crescente
ampliao dos estudos sobre a cultura educacional nos oitocentos. Buscamos apreender
o cotidiano da instruo empreendida pelas mos dos padres mestres, e as relaes que
se deram entre o poder provincial e esses religiosos. O cruzamento entre as fontes
permitiu a efetivao do presente trabalho e destaco as principais: que compem o
Arquivo Histrico Waldemar Duarte e a Coleo de Lei e Regulamentos da Instruo na
Paraba Imperial. Partimos de um plano geral na observao dos padres mestres, sua
atuao e principais instituies na qual estavam inseridos. Para em seguida, centrarmos
nossos esforos, em desvelar as prticas de um padre mestre especfico, Frei Fructuoso
da Solidade Sigismundo, que aos poucos foi se fazendo notar na documentao por ns
pesquisada. A temporalidade abarcada por este trabalho tem incio no ano de 1839
quando o referido religioso provido na cadeira de Ingls do Lyceu Provincial, indo at
o ano de 1871, quando acontece a sua aposentadoria. Pautamos nossas reflexes no
arcabouo terico metodolgico da nova histria cultural. No tivemos a pretenso de
criar uma biografia do frei pesquisado, mas traar conexes entre um sujeito especfico
e o universo educacional na provncia da Paraba.
Palavras chave: Provncia da Paraba do Norte; Padres mestres, Frei Fructuoso da
Solidade Sigismundo.
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Sumrio
Dedicatria Agradecimentos Resumo Sumrio
Primeiro captulo - Insero do leitor nos percursos da pesquisa: fontes e tema............................................................................................................................... 8
Segundo captulo - O cotidiano educacional dos padres mestres na Paraba oitocentista................................................................................................................... 18
2.1 - Os padres mestres e o ensino de primeiras letras....................................... 18
2.2 A rotina de um Padre Mestre: Diretor do Colgio de Educandos e
Artficies............................................................................................................. 24
2.3 - As atividades desenvolvidas pelos padres mestres no Liceu Provincial
Paraibano.............................................................................................................. 28
Terceiro Captulo A difcil jornada de um Frade na instruo pblica na Paraba oitocentista.................................................................................................................. 32
3.1 Fr. Fructuoso da Solidade Sigismundo personagem central de nossa
trama.................................................................................................................. 32
3.2 A disciplina de Ingls nos oitocentos......................................................... 34
3.3 Uma complicada repartio....................................................................... 39
3. 4. Polmicas envolvendo o Frade Fructuoso................................................ 46
Consideraes Finais.................................................................................................. 54
Referncias................................................................................................................. 55
Anexos
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Primeiro Captulo: Insero do leitor nos percursos da pesquisa: fontes e tema.
Nos ltimos anos a historiografia da educao na Paraba tem crescido bastante,
no que tange ao sculo XIX, essa progresso em parte se deve aos trabalhos
desenvolvidos pelo Grupo de Histria da Educao no Nordeste Oitocentista GHENO
- este j conta com quase 10 anos e uma considervel produo, seja de projetos PIBIC1,
monografias, dissertaes, teses, publicaes de livros e organizao de eventos
nacionais. nesse ambiente de construo histrica educacional que inserimos nosso
trabalho, na tentativa de contribuir para a ampliao de temticas que vem sendo
desenvolvidas nos ltimos anos.
O presente trabalho surgiu a partir do desenvolvimento de dois anos de pesquisa
como bolsista PIBIC. O primeiro na vigncia 2010/2011, intitulado: A educao nos
relatrios dos presidentes de provncia e nas mensagens de presidente de estado na
transio da monarquia para a repblica, cuja temporalidade firmou-se entre os anos de
1889 a 1910. Objetivava ampliar as opes de pesquisa do GHENO at os a nos iniciais
do perodo republicano. Dessa forma, buscamos novas abordagens sobre a escrita da
histria educacional paraibana, para alm das leituras das referidas mensagens por meio
do confronto entre as mensagens dos presidentes no recm-criado estado da Paraba e os
jornais do perodo que traziam contedos referentes instruo.
O segundo projeto que deu origem a presente monografia vigorou entre
2011/2012 e foi denominado: Instituies escolares na capital da provncia da Paraba
do Norte e vilas do interior: 1822-18502 e teve o propsito de se enveredar pelo
universo do cotidiano escolar, problematizando as normatizaes impostas pelo poder
oficial, bem como as formas de resistncias empreendidas pelos sujeitos envolvidos
nesse processo. Este segundo projeto obteve o reconhecimento pblico, recebendo o
prmio Jovem pesquisador, no XX Encontro de Iniciao Cientfica no ano de 2012,
bem como a publicao de um artigo no Livro Histrias da Educao na Paraba:
Rememorar e Comemorar, publicado tambm no mesmo ano. Entre as instituies
1 O Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC) tem o objetivo de apoiar os alunos
da graduao, incentivando a pesquisa por meio de concesso de bolsas. 2 A temporalidade abarcada pela referida pesquisa, foi ampliada at o ano de 1889, tendo em vista que a
documentao referente s instituies escolares at o ano de 1850 era escassa.
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exploradas na documentao temos as escolas de 1as
letras, o Lyceu3 Provincial e o
Colgio de Educandos e Artfices. Encaminhamos tambm, reflexes acerca dos
investimentos na instruo, nas reclamaes de pais de alunos, e professores, e todo tipo
de informao que compunha o universo da instruo na Paraba imperial.
Nosso aporte terico esteve amparado sobre o conjunto de ideias que
caracterizam a nova histria cultural, permitindo entender as esferas macro e micro, e o
cruzamento entre as diversas fontes.
A documentao trabalhada na pesquisa referida anteriormente, bem como na
monografia, foi coletada e sistematizada pelo Grupo de Histria da Educao no
Nordeste Oitocentista GHENO4 a partir do ano de 2004, junto ao Arquivo Histrico
- Waldemar Duarte, localizado no Espao Cultural Jos Lins do Rego. O levantamento
documental no Arquivo esteve sob a superviso dos professores Antonio Carlos Ferreira
Pinheiro e Cludia Engler Cury, que juntamente com alunos voluntrios e bolsistas,
transcreveram os documentos localizados nas caixas sobre instruo no oitocentos.
Alcanada a finalizao dessa primeira fase, tais documentos passaram a ser digitados, e
passou-se ao terceiro momento com a correo dos mesmos que estavam classificados
oficialmente em: Ministrio dos Negcios do Imprio, Pao da Cmara Municipal,
Diretoria da Instruo Pblica, Diretoria do Externato Normal, Assembleia Legislativa
Provincial, Palcio da Presidncia, Secretaria do Governo, relatrios presidenciais,
solicitaes de professores, de pais de alunos. Enfim, uma gama enorme de documentos
escritos.
Alcanada e finalizada a transcrio e digitao do material coletado, foram
iniciadas as correes, o que igualmente nas fases anteriores necessitou de vrias
pessoas. At o fechamento dessa monografia, apenas alguns integrantes5 do grupo esto
se reunindo para os ltimos ajustes de forma que posteriormente esse material seja
publicado em formato digital.
Paralelamente ao desenvolvimento da Pesquisa PIBIC, frequentamos as reunies
do GHENO, para discusso de textos. Esses encontros serviram para adentrarmos
3Optamos por utilizar esta grafia.
4 O GHENO como grupo de pesquisa surgiu no ano de 2004 e tinha a proposta de coleta do material
supracitado. 5 Esse pequeno grupo que est trabalhando na finalizao composto pelos professores Antonio Carlos
Ferreira Pinheiro, e as Professoras Cludia Engler Cury e Mauricia Ananias, bem como por trs bolsistas
PIBIC.
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efetivamente no universo educacional, seja pelas discusses de tericos sobre o tema ou
at mesmo na anlise das obras de intelectuais que viveram no perodo mencionado.
Para compor o nosso arcabouo documental utilizamos o material disponvel no
GHENO como nossa fonte fundamental, pois foi nesse material que encontramos uma
considervel quantidade de documentos falando sobre um s indivduo Frei Fructuoso
da Soledade Sigismundo que decidimos escrever sobre esse personagem da histria da
educao paraibana.
Utilizamos tambm as Leis e Regulamentos da Instruo no Perodo Imperial6
no sentido de colhermos informaes sobre as normatizaes que eram promulgadas
contendo diversos assuntos, inclusive envolvendo o nosso personagem. O
entrecruzamento de informaes foi muito importante para o esclarecimento de algumas
problemticas envolvendo Frei Fructuoso. Completando o corpus documental por ns
utilizado, temos os relatrios dos presidentes de provncia7 e, mais especificamente, os
relatrios dos diretores da instruo publica que vinham anexados aos relatrios dos
presidentes de provncia.
Ao tratar com esse vasto material de cunho oficial tivemos bastante cuidado e,
sempre lembrando as palavras do Professor Antonio Pinheiro8: a lei prescrita muitas
vezes no ocorria na prtica, como poderemos ver no nosso terceiro capitulo.
Para nos auxiliar no trato com esses documentos recorremos a Bacellar (2011, p.
63) que nos fala:
Documento algum neutro, e sempre carrega consigo a opinio da pessoa e/
ou rgo que o escreveu. Um dos pontos cruciais no uso das fontes reside na
necessidade imperiosa de se entender o texto no contexto de sua poca, e isso
diz respeito, tambm ao significado das palavras e das expresses. Sabemos
que os significados mudam com tempo, mas no temos de incio, obrigao
de conhecer tais mudanas. No entanto, boa dose de desconfiana o
princpio bsico a nos orientar nesses momentos, alm de uma leitura muito
atenta dos autores que j trabalham na mesma linha de pesquisa.
Mesmo sabendo que no nosso trabalho esto incutidas as nossas escolhas
terico-metodolgicas e viso de mundo, pretendemos elencar esses atores e situaes,
no contexto da poca, tentando destacar a forma como esses personagens encaravam a
6 Essa obra (2004) foi organizada pelos professores Antnio Carlos Ferreira Pinheiro e Cludia Engler
Cury, e foi publicada, atravs de meio eletrnico pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Ansio Teixeira (INEP) e est disponvel em:
http://www.publicacoes.inep.gov.br/detalhes.asp?pub=3965 7 Esses relatrios dos presidentes de provncia esto sendo compilados de meio eletrnico e digitados pelo
Professor Cristiano Ferronato, para posterior publicao em meio eletrnico. 8 O professor Antonio Carlos Ferreira Pinheiro, membro fundador do GHENO, vinculado a ps-
graduao em educao e desenvolveu sua tese de doutorado na rea de educao.
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sociedade em que estavam inseridos. Dessa forma, tentaremos elaborar o retrato de uma
poca, pois jamais chegaremos a mostr-la tal qual ela foi, e nem nossa pretenso.
Tendo como referncia a clssica obra de Peter Burke O que Histria
Cultural (2005), tomamos como base, a sua concepo de no existncia de uma
unidade cultural, uma vez que trazemos tona o pensamento de um frei, e que mesmo
em sua singularidade se fazia ouvir de alguma forma, e que possivelmente outras
pessoas o acompanharam em seu modo de pensamento e ao. Ainda nos pautando nas
ideias do mesmo autor buscamos entender o nosso tema de pesquisa como parte
integrante das narrativas culturais que buscam na individualidade pistas sobre os
contextos em que surgiram.
com este suporte terico que vamos adentrar no mundo do ensino pblico na
Provncia da Parahyba9 do Norte no sculo XIX.
Ainda no Projeto PIBIC, buscamos entender o que seriam consideradas
instituies educacionais no sculo XIX, dessa forma elencamos a criao das
categorias: escolas e colgios no oitocentos conforme as leituras da documentao
consultada. Entendemos que escolas no sculo XIX, corresponderam s cadeiras de
primeiras letras que eram abertas pelo poder pblico e que por diversas vezes
funcionavam em local alugado, ou at mesmo nas casas dos mestres10
e que poderiam
ser suprimidas a qualquer momento. Entendemos que a categoria dos colgios, se
aplicava para a existncia de uma estrutura fsica destinada exclusivamente para a
instruo como indica o documento de 17 de maro de 182811
.
Manda sua Majestade o Imperador, pela Secretaria do Estado dos Negcios
do Imprio que o Vice-Presidente da Provncia da Parahiba informe pela
mesma Secretaria qual ser o melhor lugar da Vila da dita Provncia para
estabelecimento de um Colegio d Estudos menores; devendo atender-se nesta averiguao assim a algum edifcio, que nela exista, e que possa
aproveitar-se para aquele fim, como a salubridade do lugar, e barateza de
viveres para cmodo dos alunos.12
9 Optamos por utilizar essa grafia.
10 Com a promulgao da Lei N 455 de 1872, os professores pblicos no puderam mais lecionar nas
suas casas, sob pena de perderem a gratificao que recebiam para aluguel de casa. Essa lei no se aplicou
s professoras. 11
Mesmo no se tratando da temporalidade abarcada pela presente pesquisa, faz-se necessrio essa
demonstrao para elencar a diferena entre o que entendemos por escolas e colgios. 12
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1828.
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Inferimos que houve uma preocupao com o espao fsico a ser destinado para
a instruo, mas que permaneceu muito mais no plano das intenes governamentais,
uma vez que poucos foram os espaos construdos exclusivamente para a instruo. A
categoria13
supracitada pode ser confirmada com a instaurao a partir de 1864 do
Colgio de Educandos e Artficies e do Lyceu que constitua um espao destinado
exclusivamente para o ensino secundrio ocupando o primeiro lugar nas preocupaes
dos dirigentes da provncia. Conforme podemos acompanhar no trecho do documento
de 2 de Maro de 1846, que traz o discurso proferido na abertura do ano letivo no Lyceu
por seu diretor, Manrique Victor de Lima:
Entretanto alguns melhoramentos se tem realisado, eu no tenho a pretenso
de as referir a num s, como seu nico autor, no, bem pelo contrrio; alguns
tem partido de vs mesmos, por vs mesmos tem sido propostos, outros tem
emanado espontneamente do governo da provncia possudo, como no tem
cessado de dar-me reflectidos demonstraes do desejo mais constante e mais
solhato de collocar o Lyceo na ponta de ellevao que corresponde a alta
caracterstica de sua misso ao duplo fim de cultivar o esprito, e formar o
corao da mocidade, eu no tenho feito se no solicit-los com aquelle
empenho e diligncia que sero seguramente desenvolvidas para qualquer de
vs em maior grau e com aquelle interesse que deve naturalmente animar a
hum empregado antigo, cuja carreira tem sido toda consagrada e sem
partilha, as funes do magistrio, e que nenhuma outra espcie de glria
mais ambiciosa do que ver solidamente firmada a reputao nascente e
progressiva do Lyceo.14
Para entender as instituies escolares buscamos as contribuies de Chartier
(1990) e Magalhes (2004) nas seguintes direes: o primeiro autor nos auxiliou a
compreender o movimento das instituies escolares no sculo XIX, como algo que no
surge de forma neutra, mas que resultado de estratgias e prticas que tendem a
impor uma autoridade, neste sentido que observamos a constituio dos espaos
escolares no oitocentos; a abertura e fechamento de cadeiras; a administrao do Lyceo
Provincial e dos diversos colgios, ligados aos interesses de uma elite letrada e das
autoridades provinciais. Com o segundo autor, Magalhes (2004) compartilhamos o
seguinte entendimento acerca da Histria das instituies escolares:
A histria do sistema educativo no o somatrio de instituies escolares
justapostas nem, por outro lado, a histria de uma dessas instituies se torna
13
Em nossas observaes para a elaborao das referidas categorias, observamos Pinheiro (2012, p. 119),
que traz um quadro com os nomes das Instituies Educacionais e Escolares existentes na Paraba entre
os anos de 1836 a 1870. 14
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1846.
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possvel fora de um todo coerente. nos domnios da representao e da
apropriao que esta autonomizao se revela mais consequentemente,
porque mais relacional e menos autocentrada. Constituindo um todo em si
mesmo, cada instituio escolar ou educativa integra esse todo mais amplo
que o sistema educativo. (MAGALHES 2004, p.114)
Observamos as instituies escolares oitocentistas, como partes integrantes de
uma complexa rede de sociabilidades que pretendiam formar um conjunto escolar
composto por vrias formas ou modelos; ainda que uma ou outra tenha sido vista na sua
poca com maior relevncia, o que estamos querendo dizer que cada uma com as suas
particularidades tm a sua contribuio na histria escolar paraibana.
O que seria considerada instituio escolar no sculo XIX, tendo em vista que
naquele momento tinha-se muito mais o funcionamento de cadeiras isoladas em casas
alugadas, do que em edifcios que estivessem destinados para este fim. Perguntamos-
nos o seguinte: o que definia a constituio de uma instituio escolar: seria a existncia
de um espao fsico exclusivo, e um curso sequencial, como passamos a ter no sculo
XX, com a efetiva constituio dos grupos escolares?
Na direo de tentar responder as questes anteriormente elencadas, buscamos
uma anlise para alm das caractersticas fsicas da estrutura escolar e da organizao
do saber, conforme nos mostra Magalhes (2004, p.121)
Vistas a partir de uma epistemologia especfica, a histria da educao como
histria da escola, constituem um campo aberto e em franca renovao, seja
na acepo da superao de lacunas do conhecimento, seja na de novas
formas de abordagem, como se referiu.
No queremos dizer que a constituio das instituies escolares, teve a mesma
estrutura das que existiram a partir do sculo XX, mas que partindo da hiptese de que
de certa forma as instituies educativas do sculo XIX, ainda que estivessem em um
perodo de transformaes tiveram caractersticas peculiares que as tornavam
instituies escolares. Afirmamos isso com amparo da documentao porque muitas
vezes encontramos meno aos responsveis pela educao da seguinte forma: escolas
de meninas, escolas pblicas, Escola de 1s Letras da Cidade Baixa, Colgio
dEstudos Menores. Compreendemos que o entendimento do funcionamento dessas
instituies se faz importante, uma vez que os padres mestres nosso objeto de estudo -
transitavam em todos esses espaos de variadas formas.
Consideramos necessrio evidenciar alguns pontos acerca do processo histrico
vivenciado no Brasil naquele momento, pois uma nova configurao estava sendo
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formada, uma vez que o pas passava a ter sua independncia poltica. Naquele
contexto, diversos interesses e projetos de construo da nao estavam se processando.
Entre eles temos a disputa entre liberais e conservadores sobre a forma administrativa a
ser adotada, se seria o federalismo, concedendo autonomia para as provncias sem
perder a centralidade poltica ou se o melhor seria a total centralizao poltica. Nesse
contexto, o norte do Brasil, como era conhecida a regio na qual se encontrava a
Provncia da Parahyba, no aparece apenas como um mero repetidor de um centro, pelo
contrrio, deu a sua contribuio para a constituio desse processo. Como nos mostra
Gouveia (2008, p.21).
Os principais setores, na regio Nordeste do pas, desempenharam um papel
crucial em favor do processo de ajustamento poltico em curso no Brasil nas
dcadas de 1820 e 1830. Essa regio tinha um forte papel na economia do
pas graas importncia da exportao do acar ali produzido em um
perodo de alta dos preos desse produto nos mercados internacionais em
razo do colapso da produo Antilhana, no ps independncia do Haiti.
Outro importante elemento era o grande nmero de indivduos qualificados
existente naquela regio em termos da prtica poltica at ento exercida no
Brasil. Esses homens, articulados com o novo grupo de polticos que surgia
na regio Sudeste, conseguiram organizar recursos e estratgias capazes de
promover a estabilizao da monarquia constitucional no pas.
De acordo com a historiografia mais recente sobre o tema a que nos referimos
acima, podemos dizer que tivemos uma efetiva participao da regio norte nas decises
nacionais como pudemos identificar na documentao analisada, bem como a
participao de professores nos assuntos polticos que estavam se colocando, como foi o
caso do professor paraibano de uma cadeira de primeiras letras que adere
independncia, antes da declarao oficial da mesma15
. Pudemos perceber que a
Parahyba do Norte estava inserida em um contexto mais amplo, mas no de uma forma
inerte, e sim atuante, ento no queremos partir para as questes educacionais sem
mostrar que estas estavam atreladas ao emaranhado poltico e que receberam influncias
externas bem como poderia fazer a diferena na tomada das decises de cunho poltico,
social, cultural e econmico.
Em 1839 ano inicial abarcado pela presente pesquisa, a discusso social tambm
aparecia na pauta das principais preocupaes daqueles que estavam empreendendo as
transformaes que tinham promovido independncia poltica, e que povoavam o
imaginrio dos dirigentes. Havia a preocupao com o processo civilizatrio como
forma de se alcanar um nvel mais elevado frente s naes consideradas mais
15
Conforme citado por Pinheiro (2008, p. 18).
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avanadas. Assim, as questes educacionais so evidenciadas, pois essa seria uma das
maneiras de se alcanar esse estgio.
Na pauta dos gestores pblicos paraibanos estava o propsito de levar a
instruo a todas as pessoas livres, mas na prtica o que pudemos perceber na pesquisa
documental foi a constante falta de recursos e reclamaes tanto de professores,
exigindo os pagamentos de seus provimentos, quanto dos pais solicitando a abertura de
cadeiras de primeiras letras. Apesar de termos constatado que havia destinao de
verbas pblicas considerveis para a instruo elementar e secundria, considerando que
estamos tratando de uma provncia com parcos recursos, ainda assim pela permanncia
das queixas e reclamaes ao longo de todo o sculo XIX podemos inferir que as verbas
eram insuficientes para atender s demandas por escolas, principalmente, de primeiras
letras.
Sobre os investimentos na instruo pblica observamos um jogo de interesses,
mas no sabemos ao certo se a instruo foi beneficiada:
2 Directoria da Secretaria de Estado dos Negcios do Imprio
N 6216 Rio de Janeiro, 28 de Outubro de 1880
Illmo
e Exmo.
Snr.
V. Ex o Snr Ministro e Secretario de Estado dos Negcios do Imprio, a
quem foi presente o officio de V.Ex de 14 de setembro findo, ficou inteirado
de que, por haver V. Ex determinado a permanencia no bairro baixo da
capital dessa provncia, da repartio do Conselho Provincial, os negociantes
cujos nomes constam do citado officio offertaram a quantia annual de
500$000 em beneficio das escolas publicas, enquanto no dito bairro se
conservar aquella repartio; e outrossim de haver V. Ex, em nome da
provncia, agradecido to importante donativo.
Deus guarde a V. Ex
Illmo
e Exmo
Snr. Presidente da Provincia da Parahyba
O sub-director
Antonio Augusto da Silva16
Lanando um olhar atento, inferimos que os investimentos na instruo pblica
se davam por vrias vias, como no exemplo acima, o que temos uma troca de favores
entre poder pblico e particular, beneficiando possivelmente as escolas pblicas da
capital, dessa forma temos nitidamente o recurso chegando, ento fica a pergunta,
teriam as escolas da capital recebido tal investimento?
16
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1880.
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Como pudemos perceber, ser um lente17
na Paraba oitocentista, era um grande
desafio, tendo em vista que no havia uma legislao consolidada, ou a formao
especializada para tal cargo, aquele momento era muito mais de tentativas seja de
implantao de leis, de mtodos educacionais, ou at mesmo de escolha dos professores.
Foi nessas circunstncias histricas que tentaremos observar o cotidiano das atividades
dos padres mestres inseridos no ensino secular.
No segundo captulo do presente trabalho monogrfico nos empenhamos em
mostrar a insero dos padres mestres nos principais espaos escolares da provncia,
seja na capital ou no interior, os problemas enfrentados pelos mesmos e os cargos de
confiana que conquistaram junto ao poder provincial, essa abordagem foi feita a partir
das principais instituies escolares existentes na provncia.
No terceiro captulo tratamos mais detidamente de um ator especfico, frei
Fructuoso da Solidade Sigismundo. Primeiramente procuramos refazer o caminho
percorrido por ele na condio de professor na instruo pblica, desde o seu
provimento at a sua aposentadoria. Em seguida, nos dedicamos a entender as
problemticas que envolveram a implantao da matria de ingls em nvel nacional,
bem como na provncia paraibana, tambm analisamos o perodo em que o frei
permaneceu ocupando o cargo de diretor da instruo pblica e identificamos alguns
dos problemas enfrentados por ele, frente da mais importante repartio ligada
instruo. Finalmente analisamos as polmicas nas quais o padre mestre esteve
envolvido utilizando o entrecruzamento de diferentes fontes, no sentido de evitarmos
parcialidade na anlise das tenses que envolveram o frei.
17
No sculo XIX lente se referia ao professor da instruo secundria ou superior, conforme BUFFA e
PINTO in Bencostta (2005), o termo lente, tem origem na idade mdia, uma vez que ensinar, era ler um
livro, e aquele era o professor, portanto, o lente.
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Segundo Captulo O cotidiano Educacional dos padres mestres na Paraba oitocentista18
Nesse captulo nos deteremos sobre as atividades que envolviam a participao
dos padres mestres na conjuntura oitocentista, relacionando-os com as principais
instituies escolares na Paraba do Norte.
Para termos uma ideia acerca da quantidade de instituies existentes na
provncia da Parahyba do Norte tomamos como referncia um Relatrio do Presidente
da Provncia do ano de 1865, que nos informa que existiam na provncia cerca de 54
escolas pblicas do sexo masculino e 17 do sexo feminino, ao todo 1.922 alunos
frequentavam as escolas da provncia em 1864, total muito pequeno em relao
quantidade de habitantes da provncia19
, mencionava ainda a existncia de trs20
escolas
particulares em funcionamento, licenciadas para funcionarem regularmente. Uma escola
particular na vila de Cajazeiras comandada pelo Padre Incio de Souza Rolim, onde se
aprendiam disciplinas do ensino secundrio, sempre elogiado por sua atuao na aludida
vila, provavelmente por ser a nica escola particular daquela regio.
2.1. Os padres mestres e o ensino de primeiras letras As escolas de 1
as letras funcionavam em casas alugadas pelos professores para
este fim ou at mesmo nas casas dos mesmos, como nos mostra um documento de 1869:
Palacio do Governo da Parahiba, em 20 de abril de 1869.
Approvando o procedimento da Professra da 2 cadeira do ensino primario
do bairro baixo desta capital D. Catharina Emilia Cavalcante Pessa de abrir a respectiva aula em sua casa dita rua das Mercs n 10, em consequencia
da impossibilidades, que encontra, na acquisio de uma casa, em que ali o
faa declaro Vmce
. q. fica marcada a sobredita Professra o praso de
sessenta diaz, contado desta data, para que remova para aquele bairro a mencionada cadeira.
Deos Guarde Vmce
.
18
Esse captulo aborda o cotidiano das principais instituies da provncia paraibana,e traz trechos que fizeram parte do relatrio final enviado ao CNPq, como parte integrante do projeto de pesquisa PIBIC,
vigncia 2011/2012, que estava intitulado Instituies escolares e cultura material escolar (1822 a 1850):
temas e possibilidades de pesquisa, orientado pela professora Cludia Engler Cury. 19
Sobre a quantidade de matriculados temos a informao no Relatrio do ano de 1865, de um Presidente de Provncia que foi exonerado, tal documento traz os nmeros de matrculas, mas no informa os
nmeros totais referentes populao, para efeito de comparao. 20
Mesmo mencionando a existncia de trs escolas particulares, o relatrio s fala o nome de uma delas
que a do Padre Rolim
-
Silvino Euvidio Carneiro da Cunha.
Senro. Director interino da Instruco Publica.
21
Na documentao observamos que os professores tinham que constantemente
provar a assiduidade de suas escolas, por meio de um atestado elaborado por alguma
autoridade provincial, que poderia ser o comissrio da instruo pblica, por exemplo,
para que pudessem receber os seus proventos. Essas solicitaes eram feitas pelos
prprios professores.
Um desses pedidos analisados em nossa pesquisa diz respeito ao professor de
primeiras letras da vila de Patos, Padre Manoel de Carvalho, solicitando sua
aposentadoria, na referida petio este enumera as suas qualidades enquanto professor
atuante da dita vila, tendo sido provido primeiramente como professor das mesmas
aulas na povoao de Serra da Raiz. O que mais nos chamou ateno foi o motivo
alegado para no mais exercer o seu cargo, o mesmo argumentou que sofria de muitas
molstias e que estas tinham sido causadas pelo exerccio sem interrupo do
magistrio, esta petio tambm corrobora com o que vimos em outras peties de que
as cadeiras de primeiras letras eram fechadas a qualquer momento, pois o
remanejamento do dito professor no se deu em virtude de suas molstias, mas com o
encerramento das atividades escolares na povoao supracitada.
Havia uma preocupao, por parte do poder imperial, com os ndios que ainda
no se encontravam civilizados como pudemos perceber em correspondncia de 24 de
setembro de 1861, enviada a provncia da Paraba para que todos os esforos e empenho
fossem feitos inclusive o monetrio para que estes tivessem acesso ao ensino de
primeiras letras, as artes fabris e, principalmente, a obra civilizatria, nos pareceu que
essa foi uma preocupao presente durante todo o sculo XIX, qual seja: o processo
civilizatrio, em nvel nacional e local, no s para os ndios, mas para todos os
habitantes da provncia, como nos mostra Miranda (2012, p. 46).
Civilizar por meio da instruo era, portanto, pensar em desenvolver sujeitos
aptos a corroborarem a moral pblica e crist, seres cultos, sabedores dos
seus direitos e dos seus deveres.
Essa preocupao com a catequizao dos ndios j estava na pauta da assembleia
provincial antes mesmo da correspondncia citada anteriormente, como pudemos
perceber na ata da Sesso do dia 8 de agosto de 1861, na qual verificamos que estava
21
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1869.
-
sendo feito uma espcie de levantamento sobre a quantidade de indgenas da provncia
paraibana.
Em correspondncia de 22 de maio de 1864, encontramos um documento
enviado ao poder provincial pelo Cnego Joo Chrisostomo mencionando a existncia
dos restos de uma antiga igreja na vila da Preguia, nos arredores de Mamanguape. Eis
o documento:
Concordo Igreja da
Preguia
Illmo
e Exmo
Snr
Occupado em meus trabalhos de misso nesta cidade tive de ir hum dia athe a
extinta Villa de Montemor habitada por ndios; aos quaes teem alli os restos
de uma antiga Egreja, para cujo conserto segundo me disse o mui digno sr D
or
Juiz municipado podia-se-lhe applicar os dinheiros provenientes dos
aforamentos de suas terras, existentes no cofre. A meu convite esto
carregando material para o fim indicado. Entretanto digne-se V. Ex. mandar
por a disposio de uma direo estes Dinheiros encarregando-se esta de
dirigir o trabalho afim de que tenho elles a conotao de receberem o
alimento espirituado e huma egreja descente. Alm do exposto, Sr.
Presidente: Os Indios que ali vi talves excedo de trezentos as quais se me
informou no recebem instruo alguma: o que me condoeo. Disso ainda a V.
Ex que lance suas vistas fraternas a favor desta pobre gente, fazendo lhes
melhoras de conhecimento.
Ds G
e a V. Ex por muitos annos. Consistorio da Matris de Mamanguape 22
de Maio de 1864.
Illmo
e Exmo
Sr. Dos
Sinval Odorico de Moura
Presidente desta Provincia
Conego Joo Chrisostomo de Paiva Torres.22
Considerando o processo vivido pelos ndios no perodo colonial, temos uma
quantidade considervel destas pessoas no sculo XIX, vivendo prximos regio
litornea, e que ainda no haviam sido inseridos no processo de aculturao, com o
desenrolar do ofcio entendemos que estas trezentas pessoas acabavam de entrar no
sobredito processo. O mais interessante que rapidamente as solues financeiras foram
encontradas para que se pudesse iniciar o processo de dar instruo e catequizar os
indgenas.
Em ofcio de 25 de julho de 1864 encontramos um ofcio, dando conta sobre a
reforma da supracitada igreja, localizada na vila da Preguia, para que pudessem ser
iniciadas as aulas de 1as
letras e a catequizao dos ndios e do empenho do missionrio
Cnego Joo Chrisostomo.
22
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1864.
-
Acreditamos que havia uma preocupao com a instruo dos indgenas, mas
no apenas no sentido de se ensinar a ler e escrever, e sim com o intuito de se levar a
civilizao a todos os cantos da provncia, dessa forma nada melhor do eu que unir a
instruo com a religio, a questo religiosa se mostra importante no documento a partir
do momento que h uma enorme preocupao com a recuperao da igreja que serviria
para os trabalhos do missionrio.
Nas correspondncias analisadas na presente investigao era constante a
cobrana de salrio por parte dos padres mestres, o que era bastante comum na poca,
tambm com os demais professores, entendemos que na maioria das vezes, havia uma
demora no pagamento dos proventos dos lentes, devido ao comissrio no atest-los,
pois era necessrio tal documento para que o poder provincial pudesse fazer o
pagamento dos salrios, esse atestado comprovava se o professor havia faltado no ms,
bem como, se havia ocorrido alguma intercorrncia em relao a sua atuao, e tambm
trazia o nmero de alunos que frequentavam tais aulas. Eis um desses exemplos:
O Padre Firmino Herculano de Figueiredo, Professr Publico de 1s lettras na
Pov da Cruz do Espto
. S.to
, requer a V. Sa lhe atteste se no p.p. mez de Fev.
do corr.e anno de 1862 cumprio com os deveres do seu Magisterio, tendo
deixado apenas de funccionar no exercicio da m.ma
. Aula do dia 16 do mesmo
mez em diante ______ de ter divulgado a epidemia de cholera no lugar, e
assim houver tido ordem supperior e freqentavam a mesma aula 25
alumnos, Sed.o assim necessita p. poder cobrar do Thesouro provincial os
vencimen.tos
do predito mez: ______
P______ Illo. Senr. Comissrio
da I. P. da Cruz do Esp.to
S.to
assim lhe defira.
Sim. Cruz do Espr.t S.
t
28 de fev. de 1862 -
Jos Fernandes de Carvalho
Comissrio de I. P. de
Cruz do Esp.to
S.to
E. R. M.a
P.e Firmino Herculano de Figr.
do23
Entendemos que ocorreram diversos desentendimentos entre os comissrios da
instruo pblica e professores. No tivemos como saber se algo do tipo ocorreu no
caso mencionado ou de outros padres mestres, mas esse entendimento se tornou
plausvel a partir da troca de acusaes expostas em correspondncias entre
23
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1862.
-
comissrio e professores que no eram padres mestres, acerca do funcionamento das
aulas, por isso levantamos essa possibilidade.
O que encontramos foi uma situao na qual os papis estavam invertidos se
comparado ao caso mostrado anteriormente, o que temos uma briga entre um
professor e um comissrio da instruo, tratava-se de um padre que atendia pelo nome
de Francelino Coelho Vianna. De acordo com o documento localizado por ns pudemos
ter uma ideia do que poderia ocorrer no relacionamento entre os comissrios e os lentes.
Acompanhemos alguns trechos da correspondncia:
Ilmo. e Exmo. Snr. ______ Em cumprimento ao preceito de V.Exa ; que pelo
Snr. Commissrio me foi ultimado, venho responder representao que
aprove ao mesmo Sr. Commissario contra mim dirigi... o Snr. Commissario
desta vez esqueceu-se da Justia, e imparcialidade, que deve dominar em
todos os seus atos; esqueceu-se do nobre cargo, que exerce, esqueceu-se
finalmente do venervel carter sacerdotal de que invertido...Diz o Snr.
Commissario, que por mais de uma vez tem levado ao conhecimento dos
meus superiores o meu ______ e minha insuficincia pelo Magisterio, e que
eu por forma alguma me tenho corrigido. ... so estas finalmente as razes
que tenho para dizer que esta denuncia, no passa de um terrvel manejo
Poltico ______. -Felizmente a minha sorte no est dependente do Snr.
Padre Francelino Coelho Vianna...
Araagi, 25 de junho de 1864. O Professor Luiz Paulino de Figueiredo24
Os lentes ficavam em uma situao difcil, uma vez que necessitavam de um
atestado emitido pelo comissrio para o recebimento de seus proventos. Acreditamos
que essa imparcialidade mencionada pelo professor no existia em cargo algum da
provncia, para se defender, o lente cita a posio religiosa da qual o padre estava
investido, o que nos parece que este no estava ligando muito para as suas qualidades
sacerdotais, fez a denncia ao poder provincial de que o professor era insuficiente para
o magistrio, existia uma segunda acusao mas pelo estado do documento no
pudemos identificar. Na mesma correspondncia o professor informa que recebeu um
bilhete do referido comissrio com a seguinte pergunta: Snr. Professor________ que
tal? At onde pudemos entender, tratava-se de um conflito que j se arrastava h algum
tempo, pois ainda na mesma correspondncia temos o professor informando que j
haviam sido feitas outras denncias. Dessa forma, no temos apenas os padres mestres
em posio de vtimas, esses religiosos tambm poderiam se utilizar dos cargos pblicos
para atingir seus objetivos, nesta situao entendemos que o mesmo poderia ter
24
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1864.
-
ambies polticas, no podemos afirmar, pois s temos um lado dessa discusso, a do
professor, no foram encontrados at o momento de finalizao desse trabalho, outros
documentos que pudessem nos indicar o posicionamento do dito comissrio. Tambm
tivemos casos em que os padres recusavam tal cargo, entendemos que possivelmente
este requeria alm de muita responsabilidade, tambm um posicionamentos poltico.
Em documento de 1860, temos a preocupao por parte do presidente da
provncia sobre o estado em que se encontrava a instruo e a pergunta era:
Qual o estado do ensino primario e secundario, com declarao do numero
das respectivas aulas ou escolas, assim publicas como particulares, e dos
alumnos de um e de outro sexo que as freqentaro no corrente anno,
enunciando V. Exa. sua opinio sobre as causas que tenho concorrido para o
progresso ou atraso deste interessante ramo do servio publico lembrando
para o seu melhoramento alguma medida que julgue eficaz, e que por ventura
dependa do Governo Geral.25
Temos a indicao de que havia realmente uma preocupao com o estado da
instruo na provncia paraibana, mas o que encontramos so sempre desculpas de
todo tipo, fosse pela falta de pessoas qualificadas ou de interesse do professorado, ou
at mesmo por causa dos parcos recursos, o que se mostra bastante irnico tendo em
vista as altas somas voltadas para a instruo.
Ainda que tenha existido essa preocupao conforme nos mostra a oficialidade,
nessa mesma dcada ocorreu um numero enorme de nomeaes e diante de tal quadro o
Diretor da Instruo Pblica solicitou urgentemente que cessassem as referidas
nomeaes para professores interinos e que fosse realizado concurso para o provimento
dessa funo, como bem podemos observar em documento de 17 de setembro de 1868:
Considerando que o estado da Instruco Publica na Provncia urge pela
medida de que cessem as nomeaes de Professores interinos para escolas de
instruco primaria, determino que sejo postas em concurso, por partes, as
que constam da relao que acompanhou o officio de Vmce
n 338 de hontem
datado, continuando a ser regidas, como esto sendo, at definitivo
provimento, para que nellas no se interrompa o ensino. Deos Guarde Vm
ce.
Theodoro M. F. Pereira da Silva
Senr. Dr. Director da Instruco Publica26
Entendemos que o aumento na quantidade de professores interinos tenha
aumentado possivelmente a partir da preocupao com a instruo, mas tambm
25
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1860. 26
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1868.
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entendemos que poderiam estar ligadas aos interesses polticos uma vez que no temos
a solicitao do Diretor da Instruo, e mais ainda a partir de 1869 alguns concursos
foram realizados em vrias vilas da provncia paraibana como: Mamanguape, Pillar,
Areia. Para o Lyceu tambm houve concurso, bem como em escolas da capital, pode-se
dizer que naquele ano havia um discurso das autoridades provinciais em relao certa
qualidade no provimento de cadeiras isoladas de primeiras letras e da instruo
secundria.
2.2. A rotina de um Padre Mestre: Diretor do Colgio de Educandos e Artficies.
No mesmo ano 1865, cogitou-se a possibilidade da criao de uma Casa de
Educandos e Artfices, mencionando que o mesmo tipo de instituio vinha obtendo
sucesso em outras provncias e que serviria como um complemento Santa Casa de
Misericrdia, e que possivelmente funcionaria na propriedade Cruz do Peixe.
Ainda durante o processo de construo dessa instituio foi escolhido o seu
diretor, que deveria ser preferencialmente um sacerdote27
, conforme o estatuto do
referido estabelecimento. O religioso escolhido foi um professor que j lecionava em
uma escola de 1as
letras no bairro Alto da capital, o Padre Joaquim Victor Pereira.
Durante a fase de construo do Colgio de Educandos e Artficies, o referido
religioso esteve frente da instituio e em algumas ocasies at mesmo colocou
dinheiro do seu prprio bolso28
para algumas despesas, a documentao mostrou que
posteriormente ele foi ressarcido. Ao longo de nossas anlises percebemos que o
mencionado diretor era o responsvel por executar todos os pagamentos referentes aos
gastos com a construo do prdio que abrigou o Colgio, bem como, acompanhava
pessoalmente passo a passo29
algumas atividades relativas s obras de efetivao do
espao onde deveria funcionar a instituio. O processo de construo levou cerca de
um ano, como aponta Lima (2008, p.44)
Encontrar um local para instalar o Collgio no foi o problema mais difcil,
foi apenas o primeiro. Durante todo o transcorrer das obras de reforma e
construo do novo edifcio (12 de setembro de 1865 a setembro de 1866), o
Diretor enfrentou dificuldades quanto ao fornecimento de material e de
recursos para obteno dos mesmos. No que concerne ao material, s
27
Encontramos essa informao em Lima, 2008, p.49. 28
Tal informao foi extrada de um documento do ano de 1865, e tem o religioso informando os gastos
com a dita construo e solicitando reembolso. 29
Em correspondncia de 20 de janeiro de 1866, o sobredito padre, informa que considera mais
econmico acompanhar algumas atividades da construo do colgio bem de perto.
-
dificuldades se justificavam pelo fato de s haver uma olaria, e uma
serralharia na capital, cujos trabalhos e produo estavam destinados
construo da nova sede do Tesouro da Provncia, o qual exigia toda a
produo destas oficinas, e o que restava era vendido por um preo altssimo,
uma vez que a procura era maior que a oferta.
Observamos que a construo dessa instituio voltada para a instruo dos
desvalidos na provncia teve que enfrentar desafios mesmo antes de iniciar o seu
funcionamento, uma vez que o seu diretor precisou solicitar a compra e entrega de
materiais para que as aulas pudessem ser realizadas, o que acontecia sob muitas
dificuldades. A partir de 1865 iniciou-se o funcionamento do Colgio de Educandos e
Artfices em prdio especfico30
para as suas atividades, conforme mencionamos
anteriormente.
Entre as dificuldades encontradas para o funcionamento deste estabelecimento
encontramos uma questo de ordem interna no que diz respeito ao quadro de
funcionrios. Identificamos a solicitao de contratao de mais uma funcionria para
os cuidados com a limpeza do estabelecimento. Ao mesmo tempo em que enfrentava
diversos percalos para manter-se funcionando, a documentao indicou que a
instituio continuava tentando adquirir materiais, contratar professores como foi o caso
de um mestre de msica que foi nomeado31
para a mesma.
No ms de novembro de 1866 vamos ter a nomeao de um mdico, dessa
forma, entendemos que diferentemente do Lyceo Provincial, que j teve sua
inaugurao marcada sob o signo da importncia, o Colgio de Educandos e Artfices
galgou degraus at que pudesse ter um mnimo de reconhecimento.
Os gestores sabiam que se deveria ter uma instituio voltada para a instruo da
infncia e juventude desvalida - at mesmo porque j se tinha como referncia a criao
de instituies no mesmo formato em outras provncias do imprio, nas quais esse tipo
de educao vinha dando certo, entretanto, no caso paraibano os recursos despendidos
para a sua construo e manuteno se deram de forma bastante lenta.
Quando falamos em grau de importncia bom que se tenha claro que durante o
seu perodo de funcionamento (1865 a 1874), o Colgio de Educandos e Artfices,
jamais chegou a ser visto com a mesma importncia que se dava ao Lyceu, do que
pudemos depreender a hiptese de que o Lyceu destinava-se formao dos filhos das
30
Tal prdio era o local conhecido como Stio Cruz do Peixe; hoje seria nas imediaes do hospital Santa
Isabel, localizado na rea central da capital, Joo Pessoa. 31
O professor foi nomeado em 5 de novembro de 1866 e chamava-se Justiniano Garcia do Amaral.
-
famlias abastadas da provncia e que, no caso do Colgio de Educandos Artfices,
tratava-se de uma instituio voltada para os filhos de famlias mais pobres.
Podemos dizer amparados pela pesquisa que para os gestores pblicos, conduzir
uma instituio como a do Colgio de Educandos e Artficies, requeria uma direo que
entendesse ser uma funo de sacerdcio, tendo em vista que a maior parte do que era
requisitado para o Colgio demorava muito para ser atendido. Alm dos atrasos tambm
havia o modo como o diretor terminava suas cartas, utilizando verbos como: rogar, o
que nos mostra que em parte o poder provincial estava aqum das problemticas que
envolviam o Colgio.
O candidato a aluno da instituio deveria comprovar que era pobre e vacinado
porque em virtude dos problemas de falta de recursos e da precria estrutura fsica, nem
todas as pessoas que solicitavam o ingresso de seus filhos tinham a garantia de que
seriam atendidos.
Sobre essas admisses observamos por meio da documentao que em
determinados momentos ocorreu o favorecimento de um ou outro indivduo. Como foi o
caso do documento que localizamos no ano de 1873 com a solicitao de vaga feita por
uma pessoa de reconhecida posio social e poltica na capital paraibana e que foi
prontamente atendida. Entretanto, o mesmo tipo de pedido feito por uma escrava teve o
seguinte desdobramento:
Cumprindo o respeitavel despacho de V. Excia
. de 6 do corrente, lanado na
petio, que restituo, de Lourena escrava, na qual pede para ser admittido
neste Collgio seu filho menor de nome Luiz Antonio, tenho a informar a V.
Excia
. que avaliando em 30 educandos o numero que pode comportar este
Collegio, e sendo 35 os que actualmente existem, encontra j bastantes
dificuldades em sua marcha ordinaria, no s pelas acanhadas propores do
edificio, que poucos comodos offerece para conter um to grande numero de
alumnos, se no tambm pela verba do oramento, que, pelas constantes e
quotidianas necessidades do estabelecimento, se tem tornado bastante
limitada para a sustentao de muitos collegiais, porisso no permitte que
seja admittido o de que trata a dita petio.
Deos Guarde a V. Ex
cia.
Collgio de Educandos Artifices da Parahyba em 12 de Setembro de 1873.
Ilmo
. Exmo
. Senr Dor
. Francisco Teixeira de S. D. Presidente desta Provncia.
O Director32
Antonio de Solza Gova.
33
32
Arquivo Histrico Waldemar Bispo Duarte FUNESC, ano 1873 33
Desde o ano de 1868, o cargo de Diretor do Colgio de Educandos e Artficies, foi ocupado pelo senhor
Antnio de Souza Gouva, que no era padre e permaneceu no cargo at o fechamento do referido
colgio.
-
Tal solicitao no foi atendida sob a alegao de que no existiam vagas
disponveis naquele momento. O que mais nos chamou ateno foi o fato de que a
primeira criana indicada no estava vacinada desobedecendo a uma regra do
Regulamento do Colgio34
que no aceitava jovens que no fossem vacinados. A
situao descrita anteriormente nos leva a pensar que persistem as regras do
favoritismo, dos interesses polticos, dos arranjos de poder local e dos jogos de poder.
O cotidiano dos alunos envolvia as aulas de primeiras letras, e as atividades de
aprendizagem de algum oficio que lhes fosse conveniente, tambm tinham que
frequentar as missas. Como pudemos perceber em documento de 9 de outubro de 1866,
quando se solicitava autorizao ao vigrio capitular35
, por meio do poder provincial,
para que o diretor do Colgio que era um padre pudesse rezar as missas no
estabelecimento, uma vez que os meninos tinham que andar muito para assistir uma
missa na igreja mais prxima. Da leitura de tal documento inferimos que talvez
tivssemos nessa situao uma forma de reconhecimento ou visibilidade empreendida
pelo ento diretor para solidificar as atividades desenvolvidas na instituio e ao mesmo
tempo dar visibilidade aos problemas cotidianos vividos pela mesma.
Ainda sobre o Colgio de Educandos Artfices podemos dizer que a inteno
era a de preparar os alunos para o mundo do trabalho, o que se pretendia era que os
jovens que por ali passassem aprendessem uma profisso e se tornassem aptos a
sobreviver do seu prprio trabalho sem ficar vagando pelas ruas da capital da provncia
na condio de desocupados ou desordeiros.
A sada dessa instituio se dava no momento em que os jovens aprendiam a
profisso que estavam estudando, pois era considerado que os mesmos j poderiam
sobreviver do seu prprio trabalho.
O padre mestre Joaquim Victor Pereira, permaneceu no cargo de Diretor do
Colgio de Educandos e Artficies at o ano de 1868, quando se retirou para tomar
assento na Assembleia Legislativa Provincial.36
34
O fechamento do Colgio de Educandos e Artfices ocorreu no ano de 1874, devido ao alto custo que o
Governo Provincial estava tendo para a sua manuteno, conforme nos informa Lima (2008, p. 86). 35
Entendemos pelo teor do requerimento, que, Vigrio Capitular teria o poder de fazer concesses
religiosas, tal afirmao passvel de verificao. 36
No temos a informao, de que nesse mesmo ano, outros diretores de alguma instituio escolar
tenham tomado assento na Assembleia Legislativa Provincial.
-
2.3 Atividades desenvolvidas pelos padres mestres no Lyceu
Provincial Paraibano. Criado em 1836, o Lyceu Provincial, iniciou suas atividades para atender uma
demanda das elites paraibanas, que necessitavam instruir seus filhos para assumir cargos
polticos, ou para comandar as casas de comrcio existentes na cidade, que seriam
herdadas de seus pais. Indicando o que outros autores37
j afirmaram a respeito do
Lyceu ter sido uma instituio voltada para a formao da elite poltica, econmica e
cultural da provncia. Mesmo se configurando como a mais importante instituio educacional da
Parahyba, o Lyceu enfrentou uma pequena batalha, travada entre o presidente da
provncia e a assembleia legislativa para o reconhecimento do seu Estatuto, o que
entendemos como uma briga poltica, no ano de 1843, uma vez que solicitado da
Assembleia que reconhea o Estatuto daquele estabelecimento educacional, e a mesma
no o faz - em cumprimento a uma Lei de 8 de novembro de 1841, e que era funo da
mesma fazer as devidas modificaes para o bom andamento das instituies. Podemos
inferir que a criao e manuteno do Lyceu traziam imbricado um jogo de interesses
polticos, pois aquela instituio de certa forma conferia status queles que poderiam
dirigir o seu destino.
Os lentes do Lyceu eram pessoas influentes, nesse ambiente que encontramos
alguns padres, e como pudemos perceber estes transitaram por todas as esferas pblicas
da provncia, nas nossas anlises demos nfase aos cargos ligados instruo pblica.
No perodo por ns analisado vamos ter 5 padres mestres no quadro de professores da
dita instituio, e 1 como diretor da mesma, nmero considervel tendo em vista que
no estavam lecionando no ensino religioso, ainda que em algum momento de suas
aulas possivelmente inclussem tais contedos, mas oficialmente se tratava de um
ensino secular. Percebemos que a presena desses religiosos se dava em diversos
mbitos, como at mesmo na elaborao de compndios que foram trabalhados na
referida instituio como no caso da Gramtica de Lngua Nacional produzida pelo
37
Tomamos como principal referncia tese de doutorado defendida no ano de 2012, pelo professor
Cristiano Ferronato intitulado: DAS AULAS AVULSAS AO LYCEU PROVINCIAL: as primeiras
configuraes da instruo secundria na Provncia da Parahyba do Norte (1836-1884).
-
Padre Jos Antnio Lopes da Silveira38
. Por se tratar de um perodo em que no havia
um preparo especfico para os lentes da provncia, o trabalho executado por esses padres
deveria ser de grande importncia para o andamento da instruo, reconhecemos essa
configurao educacional como uma permanncia das prticas coloniais, ainda que em
uma conjuntura diferenciada, tomamos como base o pensamento de Eric Hobsbawm
(1998) de rupturas e permanncias histricas.
A situao dos padres mestres do Lyceu Provincial era at certo ponto, um
pouco mais favorvel do que outros religiosos que exerciam suas atividades em outras
instituies educacionais da provncia, apresentamos tal assertiva a partir do material
analisado neste trabalho. No ano de 1859, a Assembleia legislativa provincial
promulgou uma lei concedendo ao professor de filosofia, o Padre Joo do Rego Moura,
licena com ordenado para frequentar a Faculdade de Direito, para terminar o seu curso,
dessa forma, nos atrevemos a elaborar reflexes sobre essas concesses, insistindo que
possivelmente havia um posicionamento poltico desses padres, entretanto, na
documentao no tivemos acesso acerca da questo das aspiraes polticas dos
mesmos e, portanto, tal afirmao ainda carece de investigao.
Constantemente os lentes do Lyceu se afastavam das atividades educacionais
para ocupar cargos de importncia no governo provincial, fosse na condio de Diretor
da Instruo, ou tomando assento na Assembleia Provincial; tambm desenvolviam a
funo de examinadores de concursos para o provimento das cadeiras de primeiras
letras espalhadas pela provncia e do prprio Lyceu.
Em 1842 vamos ter um padre como Diretor do Lyceu indicando a presena dos
quadros da Igreja Catlica atuando nos assuntos educacionais. Sobre a importncia de a
religio andar de mos dadas com a instruo o intelectual, Jos Liberato Barroso
(1867), discorreu vrias pginas do seu livro A Instruo Publica no sentido de afirmar
a importncia da presena religiosa na instruo pblica, o que no nosso entendimento
seria mais um instrumento de regulao do comportamento das pessoas em uma das
vrias passagens destacamos:
O christianismo, principio da civilisao moderna, fonte da prosperidade das
naes mais poderosas, e fundamento da verdadeira liberdade, offerece no
complexo de suas doutrinas, como as concebeo a sabedoria infinita e a
vontade onipotente do Creador.
38
Temos essa informao a partir de um fragmento de documento, que tem a promulgao de algumas
leis entre elas a de gratificao ao referido padre pela elaborao do compndio supracitado.
-
E a moral evanglica o cdigo da sublime philosophia, que deve dirigir a
educao das geraes modernas, as quaes foro pela Providendcia
destinadas para a grande obra da regenerao moral. (BARROSO, 1867,
p.XXV)
Dessa forma compreendemos que para que houvesse uma efetiva manuteno da
ordem, religio e preceitos morais deveriam estar vinculados, o que de certa forma se
concretizava atravs do padroado que predominavam nas terra lusitanas desde o sculo
XVI, ento nada melhor do que colocar padres mestres na instituio que
reconhecidamente era um modelo a ser seguido. Durante todo o perodo imperial vamos
encontrar os padres compondo os quadros do ensino primrio. Historiograficamente na
Paraba tal temtica ainda carece de um estudo mais aprofundado. A seguir elaboramos
um quadro com os dados que identificamos na documentao a respeito da presena dos
padres mestres na instruo secundria da provncia da Parahyba do Norte:
Quadro 1: Quantidade de padres mestres que aparecem na documentao entre os
anos de 1839 e 1871
Este quadro foi elaborado com base nas fontes documentais coletadas pelo GHENO, no Arquivo histrico
Waldemar Bispo Duarte, s tem nomes que apareceram entre os anos de 1839 e 1871, perodo que a
presente pesquisa abrange.
Neste quadro pudemos perceber a presena de religiosos de vrios segmentos da
igreja, bem como a insero destes em todas as fases da instruo. Ao longo da nossa
pesquisa, apreendemos que os padres que circulavam nas instituies escolares de maior
destaque, poderiam ocupar cargos polticos, inferimos que possivelmente estavam
ligados aos principais partidos existentes no perodo. Esses lentes tambm se
envolveram em polmicas que poderiam lhes custar o cargo ou uma possvel
Padre Mestre Funo Frei Fructuoso da Soledade Sigismundo Professor do Liceu (ingls) e Diretor da instruo
Publica
Padre Domingo Alvares Vieira Professor de Filosofia racional e moral
Padre Antnio da Trindade Antunes Meira Diretor do Liceu (1842)
Padre Jos Antnio Lopes da Silveira Professor do Liceu
Padre Manoel Carvalho e Silva Professor e 1as
letras (Patos)
Padre Joo do Rego Moura Professor do Liceu (filosofia) e Diretor da
Instruo pblica
Padre Joaquim Vitor Pereira Professor de 1 as
letras (Bairro alto da capital)
Padre Firmino Herculano de Figueiredo Professor de 1 as
letras (Cruz do Esprito Santo)
Vigrio Francisco Antnio de Souza e Silva Comissrio da Instruo Pblica
Vigrio Manoel Jacome Bezerra Cavalcanti Professor Jubilado
Padre Augusto Cirilo dOliveira e Mello Professor do Ensino Primrio (Lucena)
Cnego Joo Chrisostomo de Paiva Torre Missionrio
Padre Antnio Fernandes Teixeira Professor da Instruo primria
Padre Lindolfo Jos Correia das Neves Professor de Filosofia (Liceu)
Padre Francisco Pinto Pessoa Diretor da Instruo Pblica
Padre Ricardo J. Brasiliense Professor de Primeiras Letras (Serra da Raiz)
-
gratificao, como veremos a seguir com o nosso principal personagem, Frei Fructuoso
da Solidade Sigismundo.
-
Terceiro Captulo A difcil jornada de um Frade na instruo pblica na Paraba oitocentista.
[...] se a documentao nos oferece a
oportunidade de reconstruir no s
as massas indistintas como tambm
personalidades individuais, seria
absurdo descartar estas ltimas.
(Ginzburg, 2006, p. 20)
Neste terceiro captulo nossas discusses centram-se em um ator especfico que
como mencionado anteriormente, medida que avanvamos em nossas leituras, foi se
fazendo presente e despertando a nossa curiosidade especialmente nas questes relativas
a sua atuao no cenrio educacional paraibano no sculo XIX. Dessa forma, optamos
por organizar a narrativa desse ltimo captulo de nossa monografia traando
inicialmente um esboo do seu itinerrio na educao, enquanto professor da cadeira de
ingls do Lyceu Provincial e como Diretor Interino da instruo pblica para em
seguida tratarmos das polmicas nas quais Frei Fructuoso Solidade Sigismundo esteve
envolvido.
Para evidenciarmos a sua presena podemos dizer que nossas principais fontes
foram: a documentao coletada nos arquivo da FUNESC e j catalogada pelo GHENO,
e os relatrios dos diretores da Instruo Pblica, em paralelo recorremos
documentao referida nos captulos anteriores, uma vez que o nosso objeto foi sendo
construdo a partir de nossas leituras e interpretaes da documentao consultada.
3.1 Fr. Fructuoso da Solidade Sigismundo personagem central de nossa trama.
Durante a nossa investigao sobre as principais instituies na Paraba
oitocentista nos deparamos com um nome que aparecia constantemente, o de um
professor de ingls do Lyceu Provincial chamado Fructuoso da Solidade Sigismundo.
Sobre sua vida pessoal no conseguimos obter muitas informaes, apenas que foi um
religioso mendicante da ordem de So Francisco, conforme consta em um dos
documentos pesquisados e que se tratava de um Frei, pois sempre frente do seu nome
-
vinha sigla Fr.. At a finalizao do texto de nossa monografia, no conseguimos
fontes que nos dessem informaes consistentes sobre a sua formao religiosa e em
qual parquia desenvolvia sua atividades, sabemos que foi provido vitaliciamente na
cadeira de ingls do Lyceu Provincial em 1839, permaneceu no cargo at 1842 quando
foi aposentado. Em 1849 foi provido interinamente na referida cadeira na qual seguiu
por seis meses, no mesmo ano tambm ministrou as aulas de retrica, potica,
geografia, cronologia e histria onde permaneceu at maro de 1850, quando foi
reintegrado na cadeira de ingls e permaneceu at o ano de 1871 quando foi jubilado.
Ao longo de sua trajetria na instruo tambm foi, por dois anos - 1865 e 1866,
Diretor Interino da Instruo Publica, substituindo o Dr. Joo Leite Ferreira.39 Esse
personagem no chamou nossa ateno apenas porque seu nome aparecia vrias vezes,
mas em virtude das situaes que o envolviam e, desta forma, foi conquistando o nosso
interesse e a nossa vontade de olh-lo mais atentamente, pois alm de ser um dos
lentes40 do Liceu tambm ocupou um cargo de confiana no estado provincial.
Ao longo do XIX como j foi afirmado por vrios autores41, a instruo
paraibana teve uma configurao bastante diversificada, no que tange aos mtodos
aplicados, s punies aos alunos, formao dos professores e at mesmo no que seria
considerada uma instituio escolar. Neste ambiente temos a insero dos padres
mestres nos vrios nveis educacionais e nas mais diversas funes como j discutido no
captulo dois dessa monografia. E foram nesses espaos que encontramos o nosso padre
mestre, que mesmo com todas as dificuldades enfrentadas pelos lentes no sculo XIX de
alguma forma tentaram se fazer ouvir enquanto sujeitos participantes da elaborao do
recente estado nacional, mesmo que no fosse um desejo intencional. Conforme
indicado por Teixeira (2009 p. 30), referindo-se aos salrios dos professores do
oitocentos na Paraba:
Quando o assunto so os salrios atrasados encontramos 27 documentos,
sendo quatro deles referentes aos padres-professores. Em sua maioria eles so
39
O Dr. Joo Leite Ferreira se retirou do cargo de Diretor da Instruo Pblica na data de 4 de maio de
1865, para ocupar a vaga de representante da provncia da Paraba nas cmaras temporrias no Rio de
Janeiro. 40
No sculo XIX lente se referia ao professor da instruo secundria ou superior. 41
Sobre essa diversificao educacional nos oitocentos podemos citar os trabalhos de Itacyara Viana
Miranda (2009) que na sua monografia de final de curso, mostra os mtodos punitivos empregados na
Paraba do Norte. Acerca da formao de professores vamos ter a monografia de final de curso de
Mariana Marques Teixeira (2009), que aborda o processo inicial da formao dos docentes que se dava
em um ambiente de muita dificuldade. A respeito das instituies escolares vamos ter um artigo
produzido por Cury e Silva em (2011), no qual se tem uma tentativa de definir instituies educacionais
no XIX.
-
solicitaes dos prprios lentes da dcada de 1860. Nesses os docentes
pedem que a fiscalizao acontea para que seus servios possam ser
atestados e eles possam enfim receber seus salrios. A ausncia de
fiscalizao costumava acarretar os atrasos de um, dois e s vezes at trs
meses nos ordenados dos docentes.
Mesmo com poucas informaes sobre o personagem principal da nossa trama,
alguns questionamentos animaram a nossa pesquisa, destacamos as seguintes: por que
um frade da ordem mendicante resolveu partir para a vida educacional? Quais
motivaes o levaram por essas vias? Descobrimos que ele o nico que recebeu a
referncia de frade dentre os vrios religiosos que so denominados na documentao
como padres. Conforme a leitura que fizemos dos documentos percebemos que o nosso
frade envolveu-se em algumas polmicas como discutiremos mais adiante no texto e a
nos perguntamos: Teria o referido frade algum envolvimento poltico direto com algum
partido imperial?
Antes de iniciarmos nossas discusses a respeito das problemticas envolvendo
o nosso religioso, tentaremos esboar o que era a disciplina de ingls no perodo
imperial.
3.2 A disciplina de Ingls nos oitocentos Estudar ingls no sculo XIX tinha um carter bem diferenciado do que temos
atualmente, foi uma disciplina introduzida no ensino brasileiro aps a chegada da
Famlia Real ao Brasil em 1808, e tinha o objetivo de instruir os filhos das casas
abastadas que iriam dirigir os negcios de famlia.
A cadeira de ingls passou a ser ofertada a partir do estreitamento comercial
entre Brasil e Inglaterra, e ao longo de todo o sculo XIX, juntamente com a cadeira de
francs, que era a cadeira mais procurada, compuseram o universo das chamadas
lnguas vivas42. Na Paraba verificamos uma diferena considervel entre o nmero de
matriculados na cadeira de ingls em relao aos matriculados na de francs que teve
nmeros bem mais altos, como podemos conferir logo abaixo na movimentao do
Lyceu provincial da Paraba no ano de 1865.
O movimento do Lyceo foi o seguinte:
Matricularam-se nas cadeiras:
De Latim .......................................... 04 alumnos
42
Os estudiosos do sculo XIX utilizam esse termo em contraposio ao latim.
-
De Francez ...................................... 43 alumnos
De Inglez .......................................... 10 alumnos
De Geometria ................................... 07 alumnos
De Geographia ................................. 05 alumnos
De Rhetorica .................................... 03 alumos
TOTAL............................................. 136 alumnos
(Relatrio incompleto do presidente de provincia, Paraba do
Norte, 1865.43
)44
Tal afluxo pode ser explicado pela influncia da misso artstica francesa45 que
veio para o Brasil atendendo o convite do governo de D. Joo VI. Mesmo com toda essa
influncia da referida misso, a disciplina de francs, bem como a de ingls tiveram
dificuldade para serem implantadas como cadeiras mantidas pelo poder estatal. Como
podemos perceber a seguir.
As Aulas Menores de Ingls de ambos os Cursos Jurdicos teve um problema
para estabelecer-se; a falta de Professores, algo que tambm ocorria com as
Cadeiras de Francs criadas nas provncias, como sugere o j referido decreto
de n. 16, de 26 de junho de 1833, que ao criar no Piau uma Cadeira de
Francs e Geografia, mandava abrir concurso na Corte do Rio de Janeiro,
visto que na Provncia, no h absolutamente quem a ella se oponha
(CLIB46
1907,apud OLIVEIRA,2006,p. 128)
interessante que essa questo no ocorreu apenas no perodo inicial da criao
das duas cadeiras, mais que se estendeu pelos anos seguintes, os poucos mestres que se
habilitavam a ministrar uma das disciplinas terminavam sendo aproveitados para
ministrar as duas cadeiras, tendo em vista que poucos se aventuravam pelos caminhos
das aulas no ensino pblico.
Anteriormente quando afirmamos que poucos se aventuravam para ministrar
aulas no ensino Publico podemos inferir que essas pessoas especializadas j atuavam
como professores de lnguas. Maria Celi Chaves Vasconcelos (2005) em seu estudo
pioneiro sobre a instruo domstica detalha e confirma tais informaes. A referida
autora nos mostra que ao longo de todo o sculo XIX, as pessoas especializadas nas
chamadas lnguas vivas estavam o tempo todo oferecendo seus servios atravs de
anncios nos jornais. O estudo nos mostra que para essas pessoas era muito mais
rentvel ministrar aulas no espao domstico no sculo XIX, por diversas vezes
43
Esse Relatrio incompleto originalmente encontra-se sem data, mas chegamos a concluso da data de
1865, porque foi o ano em que o frei por ns pesquisado, passou a ocupar a Direo Interina da Instruo,
e tal fato mencionado no referido documento. 44
Relatrio do Diretor da Instruo Pblica do ano de 1860 45
A misso artstica francesa chegou ao Brasil no ano de 1816 e foi responsvel por influenciar as artes e
por consequncia o modo de agir e pensar dos brasileiros durante todo o sculo XIX tinha como
principais nomes Nicolas-Antonine Taunay e Jean-Baptiste Debret. 46
A sigla CLIB, significa Colees de Leis do Brasil e refere-se fonte pesquisada pelo autor da citao.
-
confundindo o universo pblico e o privado. Para exemplificar como o ensino
domstico era muito mais requisitado pelos professores, Vasconcelos (2008, p.56)
aponta:
Nos anncios em que a denominao era genrica, as caractersticas que
descreviam o fim para o qual se destinava o pedido de emprego de uma senhora ou um senhor. Geralmente, informando possuir excelente conduta, meia-idade, independncia de famlia, ser solteiro ou solteira,
ensinar pelo mtodo mais fcil, estes indivduos se candidatam a administrar uma casa nobre. Eles se encarregavam da educao dos filhos da famlia, de ensinar a ler e a tomar conta da casa, de educar os filhos de um
senhor vivo. Desejavam achar discpulos para aperfeioar a educao,
ensinar primeira letras e demais matrias.
Nos casos citados, em 1839, foram registrados 11 anncios, 5 colocados por
estrangeiros: 2 de portugueses, 1 de ingls, 2 de franceses. Entre esses, 3
colocados por homens, 5 por mulheres e pedindo 1 homem. Dois no
mencionavam o sexo do candidato.
Optamos por trabalhar com o exemplo de 1839 por se tratar da primeira dcada
da implantao das cadeiras de ingls e francs aqui na Paraba, e que podemos
comparar com a crise enfrentada pelas autoridades do Municpio da Corte no sentido da
consolidao das mesmas cadeiras e que evidenciado por Oliveira (2006).
Na citao acima retirada do estudo de Vasconcelos (2005), podemos notar que
a oferta maior que a procura no que diz respeito instruo domstica, ou seja, muitos
estrangeiros vinham para o Brasil e chegando aqui ofereciam seus servios como
professores ou professoras nas casas das famlias abastadas. No caso do estudo de
Oliveira (2006), o autor ressalta que para as aulas pblicas de cadeiras de lnguas
estrangeiras h escassez de oferta, o que pode nos levar a pensar que pessoas
qualificadas e habilitadas existiam, mas no queriam se encaminhar para o ensino
pblico.
A partir das leituras referenciadas acima ficamos nos perguntando se na Paraba
a instituio da disciplina de ingls no teria enfrentado dificuldades quando da sua
implantao? Ao nos deparamos com os relatrios e falas dos presidentes de provncia,
percebemos que, no caso paraibano, as autoridades provinciais encontravam-se no
mesmo patamar de dificuldades enfrentadas por outras localidades com relao a
situao das aulas pblicas, j que para a instruo domstica no temos dados
suficientes para interpretaes mais consistentes.
Para que nos faamos entender, os acontecimentos foram colocados sob uma
cronologia para que se possa ter uma compreenso de como se chegou a efetiva
implantao da cadeira de ingls no Lyceu Provincial, tendo em vista que era a
-
disciplina que pertencia ao frei Frutuoso da Solidade Sigismundo, foco de nosso
estudo.
Quadro 2: Dificuldades de implantao das cadeiras de Ingls e Francs
Quadro elaborado a partir de informaes que constavam nos relatrios dos presidentes de provncia entre
os anos de 1836 a 1848.
O quadro acima nos deu um panorama da irregularidade no que tange ao ensino
das chamadas lnguas vivas no Lyceu Provincial.
Em um documento de 1842 localizamos a aposentadoria de Frutuoso da
Solidade Sigismundo como professor da cadeira de ingls do Lyceu Provincial. Ficamos
nos perguntando o que teria acontecido entre o ano de aposentadoria do frei em 1842 e
1847 quando a cadeira provida novamente. Essa resposta pode ser encontrada no
mesmo ano de 1842 quando o presidente da provncia informa que diminuiu algumas
matrias que faziam parte das aulas do Liceu, acreditamos que essa aula tenha sido
suprimida pela falta de um professor habilitado bem como pelo baixo nmero de alunos
como pudemos perceber em tabelas de anos posteriores47, quando a referida cadeira foi
restituda.
No ano de 1845 vamos ter o Presidente da Provncia Tenente Coronel Frederico
Carneiro de Campos, falando sobre a necessidade da implantao na provncia da
cadeira de ingls como j houve e ainda acrescenta A summa difficuldade de que se
47
As tabelas as quais estamos nos referindo encontram-se ao final de cada ano nos relatrios dos
presidentes de provncias, esse material foi coletado e digitado por Cristiano de Jesus Ferronato, para
posterior publicao em uma coleo organizada pelo GHENO (Grupo de Histria da Educao no
Nordeste Oitocentista) atravs de meios digitais.
Dificuldade para a implantao das cadeiras de ingls e francs no Lyceu Provincial, nos
anos iniciais de seu funcionamento.
Ano Cadeira de Francs Cadeira de Ingls
1836 a 1839 Funcionou regularmente No existia
1839 a 1842 Vaga no ano de 1842 Funcionou regularmente
1843 a 1847 Funcionando Deixa de existir, no ano de 1847
restituda, mas permanece
vaga.
1848 Funcionamento regular Funcionamento regular
-
h de encontrar pessoas, que tenho a requerida aptido para o ensino do Ingls e do
Francez, exige distinco de Professores, e deve ser objecto de duas Cadeiras. Em
tabela de 1846 a cadeira de francs j estava vaga o que podemos inferir que mesmo se
tratando da cadeira mais procurada era difcil mant-la funcionando, da inferimos a
dificuldade da restituio das aulas de ingls no caso de aposentadoria do professor
como foi o caso do frei Fructuoso.
Com a chegada do ano de 1847 acreditamos que medidas mais enrgicas foram
tomadas na tentativa de colocar as ditas aulas em funcionamento novamente, pois o
mesmo presidente de provncia que havia mencionado a necessidade das aulas de ingls
inicia o seu relatrio apresentado Assembleia Legislativa Provincial da seguinte
forma:
O Lyco da Parahyba prossegue com a necessria regularidade: para que elle
toque aquelle gro de desenvolvimento que fitastes na lei 5 de 28 de Maio
do anno findo, pretendo em breve, ou apenas haja pessa competentemente
habilitada, prover a Cadeira de lngua Ingleza.48
No ano de 1847 no mapa anexado ao mesmo relatrio do Presidente de
Provncia, no quadro referente aos professores do Liceu, vamos ter a presena da
cadeira de ingls, sinal de que a Assembleia atendeu ao pedido do presidente, mas ainda
assim a cadeira permaneceu vaga provavelmente porque no havia pessoas habilitadas
para ocup-la. As pessoas que possivelmente poderiam ter tal qualificao estariam
mais interessadas em oferecer seus servios para o ensino domstico49. Nos dois anos
seguintes encontramos o relato de que o lente da cadeira de ingls estava de licena e
que em seu lugar estaria um professor substituto de nome Herculano Marinho Falco.
Com o avano da nossa pesquisa em direo ao ano de 1850 tivemos uma
surpresa porque encontramos a seguinte afirmao do Presidente da Provncia:
Tambem est provida em outro com manifesta inju