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5070 OS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DO ESTADO E SUA ATIVIDADE FINANCEIRA * LOS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DEL ESTADO Y SU ACTIVIDAD FINANCIERA Nelson Souza Neto RESUMO O exercício do poder estatal não pode prescindir da consciência dos pressupostos teóricos que legitimam a formação do Estado e sua atividade financeira. Dessa compreensão depende também o Direito, o qual tem a função de equilibrar as forças conflitantes entre cidadão e Estado, atribuindo a ambos personalidade jurídica própria, bem como direitos e deveres também próprios. O fenômeno tributário, como elemento principal da atividade financeira do Estado, destaca-se. Não pode ele ser compreendido independentemente desses pressupostos ou fora desse equilíbrio. A tributação é um instrumento – um meio, e não um fim em si mesma – para a persecução das finalidades do Estado. PALAVRAS-CHAVES: ESTADO – PODER SOCIAL – DIREITO – ATIVIDADE FINANCEIRA – TRIBUTAÇÃO – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS – FINALIDADES ESTATAIS RESUMEN El ejercicio del poder estatal no puede prescindir de la conciencia de los pressupostos teóricos que legitimam la formación del Estado y su actividad financiera. De esa comprensión depende también el Derecho, el cual tiene la función de equilibrar las fuerzas conflitantes entre ciudadano y Estado, atribuyendo a ambos personalidad jurídica propia, así como derechos y debas también propios. El fenómeno tributario, como elemento principal de la actividad financiera del Estado, se destaca. No puede él ser comprendido independientemente de esos pressupostos o fuera de ese equilibrio. La tributación es un instrumento – un medio, y no un fin en sí misma – para alcanzar las finalidades del Estado. PALAVRAS-CLAVE: ESTADO – PODER SOCIAL – DERECHO – ACTIVIDAD FINANCIERA – TRIBUTACIÓN – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS – FINALIDADES ESTATALES * Trabalho publicado nos Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em São Paulo – SP nos dias 04, 05, 06 e 07 de novembro de 2009.

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OS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DO ESTADO E SUA ATIVIDADE FINANCEIRA*

LOS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DEL ESTADO Y SU ACTIVIDAD FINANCIERA

Nelson Souza Neto

RESUMO

O exercício do poder estatal não pode prescindir da consciência dos pressupostos teóricos que legitimam a formação do Estado e sua atividade financeira. Dessa compreensão depende também o Direito, o qual tem a função de equilibrar as forças conflitantes entre cidadão e Estado, atribuindo a ambos personalidade jurídica própria, bem como direitos e deveres também próprios. O fenômeno tributário, como elemento principal da atividade financeira do Estado, destaca-se. Não pode ele ser compreendido independentemente desses pressupostos ou fora desse equilíbrio. A tributação é um instrumento – um meio, e não um fim em si mesma – para a persecução das finalidades do Estado.

PALAVRAS-CHAVES: ESTADO – PODER SOCIAL – DIREITO – ATIVIDADE FINANCEIRA – TRIBUTAÇÃO – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS – FINALIDADES ESTATAIS

RESUMEN

El ejercicio del poder estatal no puede prescindir de la conciencia de los pressupostos teóricos que legitimam la formación del Estado y su actividad financiera. De esa comprensión depende también el Derecho, el cual tiene la función de equilibrar las fuerzas conflitantes entre ciudadano y Estado, atribuyendo a ambos personalidad jurídica propia, así como derechos y debas también propios. El fenómeno tributario, como elemento principal de la actividad financiera del Estado, se destaca. No puede él ser comprendido independientemente de esos pressupostos o fuera de ese equilibrio. La tributación es un instrumento – un medio, y no un fin en sí misma – para alcanzar las finalidades del Estado.

PALAVRAS-CLAVE: ESTADO – PODER SOCIAL – DERECHO – ACTIVIDAD FINANCIERA – TRIBUTACIÓN – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS – FINALIDADES ESTATALES

* Trabalho publicado nos Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em São Paulo – SP nos dias 04, 05, 06 e 07 de novembro de 2009.

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1. INTRODUÇÃO.

O presente ensaio revisita os pressupostos teóricos do Estado e sua atividade financeira. São elementos filosóficos, históricos e doutrinários que têm sido, por vezes, desprezados tanto no meio acadêmico, nas universidades e nos livros, quando no seio dos poderes legislativo e judiciário. Todavia, saber quais são os pressupostos do Estado e da sua atividade financeira é imprescindível para a boa compreensão e regulação do poder estatal, notadamente o aquele que se ocupa da tributação.

Parte-se da análise da sociedade como substrato da realidade política do Estado. Os pressupostos para a formação do Estado (população, território, organização social, poder social, Direito etc.) indicam quais são as suas finalidades e como serão elas legitimadas pelo Direito. Pela impossibilidade de se dissociar o Estado do exercício da sua atividade financeira, o que se quer demonstrar é que tal exercício não pode olvidar aqueles pressupostos teóricos de formação do Estado, que em última instância lhe legitima. Há, portanto, uma identidade de finalidades.

A relevância do tema se justifica diante da contínua transgressão destes pressupostos no exercício da atividade financeira dos Estados. São deixadas de lado as finalidades e tomada a atividade financeira não como meio, mas como fim em si mesma.

Já se tentou justificar a tributação, instrumento principal da atividade financeira do Estado, por meio de diversas teorias. Mas o que se percebe é que a justificação do tributo é a justificação da própria existência do Estado. Disto também decorre que a legitimidade para o exercício da atividade financeira estará sempre vinculada às finalidades próprias do Estado, insculpidas pelo seu Direito.

2. A ORGANIZAÇÃO DO HOMEM EM SOCIEDADE.

Sabe-se que o homem é o resultado de um processo evolutivo longo e complexo. A partir da teoria evolucionista fundada no princípio da seleção natural, a maioria dos historiadores e biólogos na atualidade reconhece que as transformações humanas, sejam elas fisiológicas, anatômicas ou comportamentais, apareceram em razão de mudanças significativas no meio natural. A necessidade de adequação ao meio ambiente e às hostilidades climáticas, levou a alterações significativas no corpo e na composição genética do homem primitivo, mas, ao mesmo tempo, levou à adoção de novos comportamentos e novas formas de sobrevivência.

A liberdade do ser humano naquele período primitivo só conhecia um limitador: a força da natureza; e, com ela, o desafio de promover a própria subsistência. Mas com o aumento do volume cerebral dos primeiros hominídeos e, conseqüentemente, da sua capacidade de raciocínio, desenvolveram-se as primeiras ferramentas e utensílios domésticos, que, como verdadeiras extensões do seu corpo, facilitavam suas tarefas. A utilização dessas ferramentas e o seu aperfeiçoamento, com o advento da técnica de

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fundição de metais, proporcionou ao homem um maior domínio das forças da natureza e, conseqüentemente, melhores condições de se estabelecer em determinadas regiões.

A história, então, ensina que a evolução dessas técnicas levou o homem a se organizar socialmente ([1]). Passou-se, então, a uma nova conjuntura na história da evolução humana.

Ainda que a natureza e o meio ambiente oferecessem certa resistência ao homem, outra preocupação, ainda maior, passou a lhe perturbar: a ameaça externa de outros seres humanos, que começavam a se organizar em grupos. Assim, por mais desenvolvidas que fossem suas habilidades e por mais robusto que fosse o seu físico, o homem se vê obrigado a se associar a outros semelhantes a fim de manter a sua sobrevivência, somando forças e diminuindo as chances de perecimento. A sobrevivência estava, então, ameaçada não apenas pelas forças da natureza, mas também pela força de outros seres humanos que, pelo mesmo motivo, passaram a se agrupar ([2]).

Impossibilitados, pois, no estado de natureza (para resgatar a expressão utilizada por Hobbes) de proverem a sua própria sobrevivência, os homens ajustam entre si uma forma de associação capaz de defender sua vida, sua produção e os seus bens. E desta associação surgem as primeiras sociedades.

E o convívio em sociedade garantiu ao homem o desenvolvimento de seu intelecto e da sua capacidade de compreender o mundo que o cerca - como, por exemplo, com o surgimento da linguagem, das artes, da espiritualidade, da política, da filosofia, etc. Entretanto, no mesmo compasso, esse convívio gerou uma série de limitações sociais ao homem, de modo que a liberdade individual da qual gozava em seu estado de natureza passa, simultaneamente, a se extinguir.

Há muito tempo, filósofos e pensadores se ocuparam do estudo da origem das sociedades e, principalmente, sobre a indagação dos motivos que realmente levaram o homem a se aproximar de seus semelhantes e com eles criar um modo de vida coletivo. A essência das duas correntes principais que se dedicaram ao estudo deste fenômeno revela-se no seguinte questionamento de Dalmo Dallari: "Haverá, por acaso, uma coação irresistível, que impede a liberdade dos indivíduos e os obriga a viver em sociedade, mesmo contra sua vontade? Ou, diferentemente, será que se pode admitir que é a própria natureza do homem que o leva a aceitar, voluntariamente e como uma necessidade, as limitações impostas pela vida social?" ([3]).

Ou seja, o homem possui um instinto natural de viver em sociedade e, junto a seus semelhantes, criar um sistema político apto a aperfeiçoar seu conhecimento e garantir a sua prosperidade; ou, de outra sorte, tal processo seria o resultado da vontade humana, através da qual o homem, escolhendo viver em sociedade, firmaria um contrato de cooperação e sobrevivência.

Talvez quem por primeiro tratou abertamente do assunto foi Aristóteles. E passou a assumir muito claramente sua posição, favorável à primeira das correntes, quando disse que "Fica evidente, portanto, que a cidade participa das coisas da natureza, que o homem é um animal político, por natureza, que deve viver em sociedade, e que aquele que, por instinto e não por inibição de qualquer circunstância, deixa de participar de uma cidade, é um ser vil ou superior ao homem" ([4]). Seus pensamentos, datados do

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século IV a.C., foram corroborados ainda no período pré-cristão (século I a.C.), por Cícero, mas foi no período medieval com São Tomás de Aquino que a filosofia aristotélica sobre a organização natural dos homens em sociedade retomou o brilho. A vida solitária fora da sociedade - exceção ao instinto natural - seria explicável apenas quando se tratasse de um homem excepcionalmente virtuoso em comunhão com a divindade (excellentia naturae), ou, então, por problemas de sanidade mental (corruptio naturae), ou por razões meramente acidentais (mala fortuna) ([5]).

O homem, pois, diferentemente do instinto débil dos seres irracionais, sente necessidade de, em contato direto com seus semelhantes, buscar as finalidades de sua existência. Ainda que fosse capaz de promover o seu próprio sustento, indiferentemente das condições naturais que lhe fossem impostas, ele, ainda assim, continuaria a necessitar do convívio com seus semelhantes ([6]). Essa teoria influenciou inúmeras gerações de autores e, ainda hoje, mostra-se predominante.

Contrapondo-se a ela estão aqueles que vêem a sociedade como uma formação decorrente de um acordo de vontades, isto é, de um contrato. Motivo pelo qual estes autores foram chamados de contratualistas.

Os primeiros contornos da teoria contratualista foram traçados pelo inglês Thomas Hobbes. Antes mesmo da sua publicação mais famosa o "Leviathan", em 1651, o autor já advogava em seu "Do Cidadão" (1642) a teoria de que "No estado de natureza, todos os homens têm desejo e vontade de ferir..." e, portanto, "a origem de todas as grandes e duradouras sociedades não provém da boa vontade recíproca que os homens tivessem uns para com os outros, mas do medo recíproco que uns tinham dos outros" ([7]). Trata-se, pois, a formação da sociedade, de uma escolha feita pelo indivíduo com o escopo de cessar o "estado de guerra" que existe entre os homens fora da sociedade civil. E assim, conclui Hobbes: "Portanto sucede que, devido ao medo que sentimos uns dos outros, entendemos que convém nos livrarmos dessa condição, e conseguirmos alguns associados (fellows) - para que, se tivermos de travar guerra, ela não seja contra todos, nem nos falte algum auxílio" ([8]).

Um dos maiores opositores dessa idéia de perversão natural do homem foi Montesquieu. Para ele a primeira lei natural entre os homens é a da paz, o que o levou a expressamente dizer que: "O desejo que Hobbes atribui aos homens, de subjugarem-se mutuamente, não é razoável. A idéia de prevalência e de dominação é tão complexa, e depende de tantas outras idéias, que jamais poderia ser a primeira idéia que o homem teria"([9]). Assim, em franca oposição à teoria de Hobbes, Montesquieu conclui que o estado de guerra surge precisamente quando o homem se reúne em sociedade, deixando de existir então a igualdade existente entre os seus semelhantes e, conseqüentemente, o sentimento da própria fraqueza ([10]).

A teoria contratualista recebeu outra importante contribuição com Locke. Em suas lições, mais próximas das de Montesquieu, sustenta que: "O único modo legítimo pelo qual alguém abre mão de sua liberdade natural e assume os laços da sociedade civil consiste no acordo com outras pessoas para se juntar e unir-se em comunidade, para viverem com segurança, conforto e paz umas com as outras, com a garantia de gozar de suas posses, e de maior proteção contra quem não faça parte dela" ([11]).

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Contudo, a mais sistematizada obra sobre o contratualismo foi elaborada pelo suíço Jean-Jacques Rousseau em seu famigerado "Do contrato social", em 1762. Resgatando a idéia de Hobbes sobre o "estado de natureza" do homem - porém de forma distinta no que tange as suas paixões, ou seja, não reconhece a maldade e o egoísmo como característicos do homem fora da sociedade -, Rousseau vai fundamentar a formação de um pacto social para a conservação do próprio gênero humano, na segurança das pessoas e dos seus bens e, principalmente, na manutenção da liberdade. Porém não mais uma liberdade natural, mas uma liberdade convencional ([12]).

Portanto, a formação da sociedade advém essencialmente do estabelecimento de uma convenção entre os homens, onde todos sofrem uma limitação de igual intensidade em sua liberdade individual, mas com isso garantem a manutenção de uma liberdade coletiva e igualdade de direitos. É por isso que Rousseau assevera que "cada um dando-se a todos não se dá a ninguém e, não existindo um associado sobre o qual não se adquira o mesmo direito que se lhe cede sobre si mesmo, ganha-se o equivalente de tudo que se perde, e maior força para conservar o que se tem" ([13]). Não obstante as diferenças e as desigualdades existentes entre os homens no estado de natureza, todos se tornam na sociedade civil iguais "por convenção e direito" ([14]).

Seja pelos autores contratualistas, seja pelos que seguiram a orientação aristotélica, são inequívocos os benefícios que o estudo da origem e da formação das sociedades trouxe para o pensamento moderno. Os ideais democráticos, as noções de liberdade e justiça social, necessariamente recaem ou buscam seu fundamento nas lições aqui perpassadas. Esta é uma das razões pela qual se optou por remontar este estudo.

Com efeito, tamanha foi a relevância destas constatações - especialmente em face do contexto histórico da época, no qual se afloravam os movimentos antiabsolutistas - que pode-se dizer que o próprio "constitucionalismo" possui nelas a sua gênese. Mas também hoje estas idéias são de copiosa importância, seja para a afirmação histórica dos direitos humanos, seja para a afirmação e o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito.

Como se disse no início, o homem é o produto de um processo evolutivo complexo e muito demorado. O ser humano, diferentemente dos outros seres vivos, desenvolveu habilidades e capacidade de raciocínio extraordinárias - mesmo nos períodos mais primitivos. Certo é que a linguagem, as artes, a consciência espiritual, a razão, fazem parte da essência humana. Não fosse assim, em nada os homens teriam de diferente em relação aos outros animais. Todavia, estas são habilidades que somente se verificam quando do convívio do homem perante seus semelhantes. No homem solitário não há linguagem. Portanto, entendemos que o homem, sendo-lhe inerente tais características, possui naturalmente uma necessidade de reunir-se a seus semelhantes.

Não há, portanto, como discordar de Aristóteles quando defende que o homem é um animal político. Se não o fosse, o relacionamento para com nossos semelhantes seria puramente artificial. Vale dizer, estaríamos nos relacionando não por uma razão natural, intrínseca, mas em razão de algum interesse puramente egoísta. Entendemos, sim, que o instinto natural de associação do homem não cessa quando este dispõe de todos os meios necessários a sua sobrevivência. Ainda que deles dispusesse, naturalmente buscaria com seus semelhantes relacionar-se e em conjunto conviver.

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Não obstante o homem possuir esse instinto associativo, isto não implica dizer que para a existência das sociedades não concorra a vontade humana. O que leva os homens a se reunirem em sociedade é decorrente de um instinto natural; agora, o que irá garantir a harmonia e a estabilidade desta sociedade é o acordo de vontades elaborado por entre seus membros. O simples instinto associativo é insuficiente para a existência de uma sociedade permanente. A esse propósito é precisa a afirmação de Dallari: "Consciente de que necessita da vida social, o homem a deseja e procura favorecê-la, o que não ocorre com os irracionais, que se agrupam por mero instinto e, em conseqüência, de maneira sempre uniforme, não havendo aperfeiçoamento" ([15]).

Em sua famosa obra sobre a Teoria Geral do Estado (Allgemeine Staatslehre), em tradução feita para o espanhol ([16]), o autor alemão Georg Jellinek, também principia sua exposição lembrando que:

Entre los fenómenos sociales que carecen de una dirección intencionalmente ordenada se encuentran el lenguaje, la costumbre, la actividad científica y artística y la vida económica; y entre las relaciones sociales nacidas por un acto de voluntario de concordancia están la mayor parte de las agrupaciones económicas, espirituales, éticas, religiosas; así, por ejemplo, la familia, empresas financieras, asociaciones de toda índole, Iglesia. El más importante de los fenómenos sociales que descansan en una organización determinada por la voluntad humana es el Estado (...).

Vale registrar também o pensamento de Alfredo Augusto Becker para quem, remontando a doutrina de J. Dabin ([17]), o Estado nasce por relação natural e sobrevive por relação jurídica. Em suas palavras:

O Estado, em sua origem, é sempre uma sociedade natural. A causa originária da sociedade política está na natureza humana racional dos indivíduos que a constituem. Esta causa natural é uma tendência ou inclinação instintiva, porém ainda insuficiente para, por si mesma, coagir os homens a constituírem uma sociedade. É necessário que esta inclinação instintiva atue pela ação e esta - embora instintiva - depende da vontade dos homens, pois estes são animais sociais racionais. A natureza leva os homens a criarem a sociedade política, mas é a vontade dos homens que realiza esta criação ([18]).

Vê-se, então, a vontade humana não na determinação da formação da sociedade, mas na sua conservação, aperfeiçoamento e evolução.

Contudo, como se verá a seguir, este acordo, necessário que é para a união dos homens em sociedade, deverá ser garantido por um poder social e estar inserido em uma ordem jurídica estabelecida. Este é precisamente o ponto de partida para se chegar a uma sociedade política - ou Estado.

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3. PODER SOCIAL E ESTADO.

Muitas são as formas de sociedades que o homem pode criar e fazer parte; existem as sociedades familiares, as sociedades de natureza religiosa, a sociedade escolar e universitária, etc. A complexidade das relações entre os seres humanos e os movimentos de diferenciação dos indivíduos - e, conseqüentemente, de seus interesses - fazem nascer outras formas de associação menores e com outros interesses próprios menores ([19]). Todavia, por mais legítimos que sejam esses interesses, é inevitável o surgimento de conflitos ([20]).

É, diante da necessidade de se conciliar esses interesses e dirimir os conflitos - garantindo, assim, a ordem social - que decorre a necessidade de um poder social. Ou seja, o convívio entre os homens em sociedade, bem como o convívio entre essas sociedades menores, somente firmará um equilíbrio quando da formação de um sistema político ([21]).

Vale dizer, nas palavras de Darcy Azambuja: "A autoridade é um elemento essencial da sociedade, que sem ela não poderia subsistir. Porque, poder e autoridade são, em última análise, expressões da ordem, que reina no mundo físico e no mundo moral (...) O objetivo, a causa final do poder é manter a ordem, assegurar a defesa e promover o bem-estar da sociedade; é realizar enfim o bem público" ([22]). Com assento em Hobbes, poderíamos lembrar que "As leis de natureza não bastam para preservar a paz" ([23]).

É essa organização política, fundada num poder social, que confere à sociedade o caráter de sociedade política, ou em uma única palavra, Estado. Entretanto, o poder não exsurge da geração espontânea, de forma inexplicável e inconteste. Como bem nos relata o já citado autor Darcy Azambuja, o poder, assim como todas as relações humanas e fenômenos do universo, advêm de Deus, isto é:

Deriva, portanto, da própria natureza das coisas, e não poderia ter sua causa primária senão na inteligência e na vontade supremas, que é Deus.

Como bem pondera Duguit, colocar em Deus a origem última do poder é a única explicação racional de sua existência, pois nunca será possível demonstrar que um homem ou alguns homens tenham de per si direito de governar os outros homens, que uma vontade humana é superior a outra vontade humana ([24]).

Entretanto, diante da impossibilidade prática de se retroceder à origem de um poder legítimo original, chega-se à conclusão de que o poder decorre tão naturalmente quanto a própria formação das sociedades. Não há como se elaborar uma fórmula exata para a origem do poder, a não ser se utilizar elementos históricos e sociológicos suficientes

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para a elaboração de algumas hipóteses. Negar essa condição é negar a cientificidade da investigação. Pode-se, pois, conjecturar que o poder surgiu com os guerreiros mais audazes que comandavam suas tribos contra ataques externos, perpetuando-se no poder após os tempos de guerra; ou, então, com os anciões feiticeiros nas tribos mais primitivas; ou, da mesma forma, nas sociedades familiares, através da figura do patriarca, estendendo-se a toda a família e, posteriormente, a todo o clã da região ([25]).

Com efeito, pode-se afirmar que a origem do poder - abstraindo-se as questões de ordem religiosa - é decorrente de causas naturais e sociais, assim como a própria origem das sociedades.

O poder social para os contratualistas - que vêem a origem da sociedade ser formada pela vontade de seus membros - deriva, pois, do consentimento destes, ou, simplesmente, deriva do contrato. Para Hobbes, assim como as leis naturais são insuficientes para garantir a paz, o simples consentimento entre os homens também o é. Deve haver uma união, de modo que a vontade de todos os homens seja uma única, a ser dita por um homem ou por um conselho ([26]). Assim, "aquele que submete sua vontade à vontade de outrem transfere a este último o direito sobre sua força e suas faculdades - de tal modo que, quando todos os outros tiverem feito o mesmo, aquele a quem se submeteram terá tanto poder que, pelo terror que suscita, poderá conformar as vontades dos particulares à unidade e à concórdia" ([27]).

Para Rousseau, em combate declarado ao absolutismo, ao se submeterem ao pacto social os homens formam um corpo moral e coletivo, que chamou de corpo político ou de soberano. O poder, por conseguinte, não poderia advir senão da vontade geral - o que não significa, contudo, a soma das vontades individuais. Assevera:

"A fim de que o pacto social não represente, pois, um formulário vão, compreende ele tacitamente este compromisso, o único que poderá dar força aos outros: aquele que recusar obedecer a vontade geral a tanto será constrangido por todo um corpo, o que não significa que o forçarão a ser livre, pois é essa a condição que, entregando cada cidadão à pátria, o garante contra qualquer dependência pessoal. Essa condição constitui o artifício e o jogo de toda a máquina política, e é a única a legitimar os compromissos civis, os quais, sem isso, se tornariam absurdos, tirânicos e sujeitos aos maiores abusos" ([28]).

Pode-se concluir, então, que a origem das sociedades e a origem do poder social não se confundem, porém são fenômenos simultâneos e conseqüências naturais do convívio humano.

Além disso, vistos o processo de formação das sociedades e do poder social, é preciso acrescentar o elemento território para se aproximar de uma definição completa de Estado. Isto é, reunida uma população em uma sociedade, devidamente constituída sobre um determinado território e organizada sob a autoridade de um poder social, estar-se-á diante de uma sociedade política, o que se pode traduzir pelo nome Estado.

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A gênese da terminologia Estado vem das cidades gregas da antiguidade, razão pela qual ainda hoje falamos em cidades-Estado ao referir as comunidades políticas da Grécia. Nas cidades gregas, entretanto, não se levava em conta o elemento territorial da comunidade; o Estado se identificava com os cidadãos e suas relações perante a comunidade. Sobre isso afirma Jellinek: "...por esto precisamente la situación del individuo dentro del derecho público no está condicionada jamás por la pertenencia a un territorio, sino por el hecho de formar parte de una comunidad de ciudadanos o por una relación de protección a éstos" ([29]).

Esta é a mesma estrutura de Estado adotada pelos romanos, porém o termo que referia a comunidade dos cidadãos era civitas ou res publica. Já na Idade Média foram utilizados os termos land e terrae.

Contudo, foi somente no século XVI que foi satisfeita a necessidade de um termo geral que compreendesse a definição completa de sociedade política. Foi na Itália que Maquiavel, em sua famosa obra "O Príncipe", introduziu o termo lo stato na literatura mundial. Em sua passagem original: "Tutti li stati, tutti e' domini che hanno avuto ed hanno império sopra li uomini, sono stati e sono o reppubliche o principati" ([30]). O termo era utilizado para expressar as grandes comunidades de Florença, Veneza, Pisa, e outras.

Ainda que durante a história inúmeras expressões tenham sido utilizadas, como bem nos lembra Dalmo Dallari, "A maioria dos autores, no entanto, admitindo que a sociedade ora denominada Estado é, na sua essência, igual à que existiu anteriormente, embora com nomes diversos, dá essa designação a todas as sociedades políticas que, com autoridade superior, fixaram regras de convivência de seus membros" ([31]).

4. ESTADO E DIREITO.

Como vimos, a doutrina do Estado é uma das mais antigas e foram os gregos os primeiros a se debruçarem com maior profundidade sobre o tema. Entretanto, sua percepção do Estado era por mais das vezes influenciada por questões religiosas, éticas e morais; e é por isso que o viam não só como uma comunidade política, mas também religiosa. Disso resultou que as grandes primeiras indagações sobre o tema não convergiam no sentido de investigar a origem social do Estado, mas sim em refletir sobre como o Estado deve ser e, assim, elaborar um modelo ideal.

Platão e Aristóteles foram os mais eminentes pensadores da corrente que dominou aquele período e que ainda hoje subsiste. O primeiro buscou descrever o Estado que para ele seria ideal; já o segundo procurou investigar qual a melhor forma de Estado, ou seja, qual Estado melhor realiza o seu próprio fim.

Assim, considerava-se o Estado na Antiguidade como um ideal a ser realizado. Faltava, porém, aos gregos uma visão jurídica do Estado. A ciência antiga não tratava o Direito como uma disciplina independente e autônoma, isto é, tratava Estado e Direito como fatos decorrentes da vida humana em comum, sem qualquer relação entre eles.

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Mas a Teoria Geral do Estado deve investigar o seu objeto em sua plenitude, envolvendo todos os aspectos e fenômenos que o compõe. E assim como a convivência do homem em sociedade, o Direito é um fenômeno inerente ao Estado. Portanto, a teoria geral estuda o Estado tanto em sua visão sociológica - como uma construção social - quanto em sua visão jurídica - como instituição jurídica. Sobre essa visão, Jellinek ensina-nos que:

"Toda la ciencia del derecho cae bajo el dominio de las ciencias del Estado en el sentido que hemos dado a esta expresión; es decir, en cuanto el derecho sólo puede ser el producto de una asociación humana organizada. La antigua ciencia del Estado no diferenció suficientemente la doctrina del derecho de la del Estado, por que para ella toda la vida humana en común era un modo de la vida del Estado. La especialización y perfeccionamiento del derecho por los romanos, a quienes se debe la ciencia del derecho, hicieron de éste una disciplina independiente. (...) Por consiguiente, las ciencias del Estado y las del derecho se encuentran en una íntima conexión y hay disciplinas que necesitan ocuparse de ambas. Son éstas, singularmente, aquellas que se ocupan de los caracteres o notas jurídicas del Estado y de las relaciones del mismo; en este caso se hallan dentro del circulo de las doctrinas del derecho público, las del derecho constitucional, administrativo e internacional. Son tanto ciencias del Estado cuanto del derecho" ([32]).

Assim, é seguro afirmar que o Direito é um dos aspectos mais importantes do Estado. Não há, pois, como conceber um Estado sem Direito. A sociedade, o povo e o poder social são elementos que devem estar inseridos em uma ordem jurídica estabelecida e organizada, sem a qual não haverá Estado. Não basta investigarmos o Estado unicamente a partir de uma visão objetiva, vista através de fatos reais e exteriores, devemos atentar também para aquela que considera o Estado como uma realidade psíquica, determinada e condicionada pela vontade humana e por sua atuação ([33]).

Precisamente pela sua essencialidade, não podemos deixar de incluir o Direito no conceito de Estado. É parte integrante e imprescindível, pelo que se pode afirmar que um conceito de Estado somente se fará completo quando presentes seus elementos sociais e jurídicos.

É essa a razão da afirmação de Jellinek para quem: "puesto que el derecho es esencial al Estado, no es posible un conocimiento pleno del mismo sin tener a la vez un conocimiento de su naturaleza jurídica. Ordenado el Estado mediante el derecho y siendo a su vez conservador y transformador de éste, necesita tener un lugar dentro del mismo. En una palabra, es preciso un concepto jurídico del Estado" ([34]).

Várias foram as formas através das quais se estudou o Estado. Algumas doutrinas já o consideraram simplesmente como um fato. Outras viam o Estado enquanto um estado de dominação.

As mais antigas teorias identificavam o Estado com um de seus elementos: o povo. Era visto o povo e seus indivíduos como a fonte da organização do direito público do

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Estado. O equívoco destas teorias verifica-se na medida em que a vontade geral do povo não pode ser confundida com a soma das vontades individuais dos cidadãos. Traz estas teorias uma explicação da vontade geral baseada no conceito de maioria e minoria.

Ainda na antiguidade, teorias se desenvolveram a partir de uma consideração subjetiva do Estado, isto é, tomavam o Estado como um organismo ético-espiritual, como, por exemplo, Platão, o qual concebia o Estado como um homem grande, mas com as mesmas características psicológicas dos cidadãos. Mas esse organismo social somente se pode conceber abstratamente; não é possível estudá-lo na prática.

Dentre os autores contratualistas, Hobbes, pioneiro desta corrente, identificava o Estado com a figura do dominador, da autoridade. Para ele, o Estado nasce com a união do povo por meio de um contrato, submetendo-se, então, o Estado à autoridade do príncipe. Mas esta teoria se mostra frágil ao identificar o soberano com uma pessoa física e real, e não uma abstração jurídica ou uma instituição independente. Tal afirmação leva a questionar sobre a real unidade do povo, uma vez que o poder do Estado recai sobre o soberano. Leva a constatar, ademais, que a vida do Estado está condicionada à vida do soberano.

Verifica-se que os autores encontravam uma dificuldade em determinar como o poder social, ou, pode-se dizer, a vontade do Estado, iria refletir a vontade geral do povo. A solução veio com a evolução da teoria subjetiva do Estado, porém através de uma visão eminentemente jurídica.

O Estado, então, deve ser visto não só como um fenômeno social, exterior e empírico, mas também como um fenômeno jurídico decorrente da vontade humana. Assim, para que se faça cientificamente um conceito completo de Estado, é mister a elaboração de um conceito jurídico.

Muitos foram os autores que procuraram propor um conceito jurídico de Estado. As principais correntes separavam-se entre aquelas que viam o Estado como um objeto do Direito, aquelas que entendiam o Estado como uma relação jurídica e, por fim, aquelas que tomavam o Estado como um sujeito de direito.

O Estado visto como um objeto do Direito remonta as teorias patrimonialistas e absolutistas do Estado, pois se funda numa concepção superior do Direito. Não se pode atribuir ao povo, segundo essa teoria, o caráter de sujeito de direito, pois o povo é um elemento do Estado e este, por sua vez, é visto como objeto do Direito. Por conseguinte, o Direito se apresenta como uma ordem superior, supra-estadista, assim como aquela que afirmava o direito divino dos reis ([35]). Um conceito jurídico de Estado visto sob tal ótica não nos parece ser o mais adequado. Seria capaz de legitimar abusos como já o fez outrora nos Estados absolutistas.

O conceito de Estado como relação jurídica se apresenta com maior simpatia que o primeiro, porém deve sofrer a mesma objeção anterior. Além de não explicar a procedência da vontade diretiva do Estado também não explica a procedência da própria relação jurídica do Estado ([36]). Além disso, a existência desta relação jurídica pressupõe normas que a regulem, mas cuja origem somente pode ser presumida, o que leva, conseqüentemente, a uma ordem jurídica maior, ou como se disse, supra-estadista.

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Chega-se, enfim, à concepção de Estado como sujeito de direito.

Como se viu, o Estado é uma realidade social que se origina a partir da vontade humana; não se trata de um evento natural independente. O Estado, antes de tudo, é uma forma de associação que decorre da vontade dos homens com o fim de conservar e aperfeiçoar o convívio em sociedade; isto se pode verificar empiricamente através dos fenômenos sociais. É justamente esse princípio de unificação das relações de vontade que representa o Estado ([37]). O Estado é, assim, uma unidade de causas, de formas e, principalmente, de finalidades.

Essa unidade teleológica é, assim, elemento determinante do Estado. Ele não pode ser desvirtuado pelos órgãos e instituições públicas integrantes do poder, sob pena de enfraquecer o próprio Estado. Pode-se propor à seguinte relação: quanto maior a unidade teleológica, isto é, o comprometimento daqueles que detém o poder, maior a unidade do Estado. As finalidades perseguidas pelos dirigentes deverão, pois, obrigatoriamente, refletir a unidade teleológica dessa associação humana e jurídica que é o Estado. Essa relação é feita por Jellinek da seguinte forma: "El Estado en su forma concreta, en la variedad de sus manifestaciones históricas, sólo aparece justificado mediante los fines que ejecuta. De aquí que la doctrina de la justificación del Estado tenga necesidad para completarse de la doctrina de los fines" ([38])

No entanto, as ações estatais na busca das suas finalidades deverão ser fixadas e organizadas de modo firme e estável. É precisamente a partir daqui que se insere o conceito jurídico de Estado como sujeito de direito.

É o Direito quem vai prever quais as finalidades que deverão ser perseguidas por aquele Estado e como isso se dará. O Direito vai definir como se formará a vontade dominante e, ainda, vai traçar os limites da vontade individual dos cidadãos.

Ser sujeito de direito é uma abstração jurídica, como a atribuída aos cidadãos. Toda pessoa é uma pessoa física, ou seja, o Direito a investe de personalidade jurídica. Tão real e palpável quanto uma pessoa é, por exemplo, uma sociedade comercial, à qual o Direito igualmente atribui personalidade jurídica (pessoa jurídica).

Inexiste razão, portanto, para que o Direito não possa também criar uma abstração jurídica a essa coletividade humana organizada que forma o Estado e atribuir a ela, uma personalidade jurídica.

Essa visão do Estado como sujeito de direito é capaz de explicar a relação que existe entre a unidade do todo e a independência de seus membros. Assim, tanto o Estado quanto os seus membros, individualmente considerados, são sujeitos de direito e deveres. Como foi dito por Jellinek, essa abstração jurídica "sujeito de direito" significa a relação de uma individualidade particular ou coletiva com o ordenamento jurídico ([39]). Conclui o autor traçando a semelhança do Estado com uma corporação, isto é, "una forma de síntesis jurídica para expresar las relaciones jurídicas de la unidad de la asociación y su enlace con el orden jurídico" ([40]).

Por fim, cumpre elaborar um conceito próprio de Estado, que deve reunir um elemento social - que se liga ao próprio surgimento das sociedades e do poder social - e o elemento jurídico - como soberania e ordem jurídica. Propõe-se, então, que Estado é um

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instrumento, formado por uma sociedade política organizada, com o objetivo proporcionar as condições necessárias à persecução das finalidades de uma população, fixada em um território soberano, e constituído por um poder social estável e limitado por uma ordem jurídica, como sujeito de direito e deveres.

5. A FINALIDADE DO ESTADO

Pode-se dizer assim, seguramente, que as sociedades possuem como elemento característico uma finalidade. Uma vez que, através da sua mútua cooperação, os homens buscam na sociedade uma forma de conservação e de proteção de seus bens, seria, portanto, ilógico pensar que a finalidade social fosse a de prejudicar seus associados ([41]). Com efeito, o propósito da sociedade não pode ser outro que não a busca pelo bem comum.

Nesse jaez assenta o seu entendimento Dalmo Dallari, pois "essa finalidade deverá ser algo, um valor, um bem, que todos considerem como tal, daí a primeira conclusão de que a finalidade social é o bem comum" ([42]). E, oportunamente, coleciona uma definição do que seja bem comum segundo a Encíclica n. II, 58, Pacem in Terris, do Papa João XXIII, segundo a qual: "O bem comum consiste no conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana" ([43]). Essa é a finalidade da sociedade, e, conforme se verá a seguir, a função do Estado é garantir essas condições.

Por essa definição, mostra-se evidente a relevância da questão da finalidade na constituição do Estado, "sendo impossível chegar-se a uma idéia completa de Estado sem ter consciência de seus fins. Há mesmo quem entenda, como o faz Marcel de la Bigne de Villeneuve, que a legitimação de todos os atos do Estado depende de sua adequação às finalidades" ([44]).

Mas esse raciocínio deve ser encarado com cautela para não se chegar à falsa conclusão de que o Estado é um fim em si mesmo, ou seja, para não se afirmar que o Estado é o fim do homem, e este apenas o meio através do qual aquele se realizará. Contudo, como já foi visto, diferentemente do que ocorre com o surgimento das sociedades, para o surgimento do Estado há o concurso da vontade humana voltada para a criação de uma organização política, fundada em um poder social organizado e limitado por uma ordem jurídica, precisamente para garantir a preservação da sociedade e realizar o seu bem comum. Portanto, não há que se confundir as finalidades do Estado com a sua própria identidade ([45]). Na precisa frase de Azambuja "o Estado tem fins, não é um fim" ([46]).

Com efeito, o Estado é um meio - um instrumento, como se definiu acima - através do qual se realizarão as necessidades sociais de conservação, segurança e de aperfeiçoamento intelectual, físico, moral e espiritual.

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Sobre isso discorreu amplamente José Carlos Ataliba Nogueira em seu "O Estado é meio e não fim" ([47]) e, nesse particular, é oportuna a diferenciação que o autor faz entre os fins do Estado e a competência do Estado:

Ora, o que varia sem cessar não são os fins do Estado, e sim a espécie de atividade, os meios empregados, os objetivos da ação do Estado para atingir os seus fins. A atividade do Estado no que diz respeito aos assuntos e às pessoas sobre os quais ele exerce o seu poder, é a competência do Estado. O fim do Estado é o objetivo que ele visa atingir quando exerce o poder. Esse objetivo, podemos antecipar, é invariável, é o bem público. A competência do Estado é variável, conforme a época e o lugar ([48]).

Deixar de adotar esta distinção pode levar a outras conclusões equivocadas e a arbitrariedades, como a que considera a finalidade do Estado algo indeterminável em razão da sua mutabilidade no tempo e no espaço ([49]).

Por conseguinte, não obstante várias possam ser as formas de governo ([50]), a finalidade do Estado é sempre a promoção do bem comum através das atividades estatais a serem adotadas de acordo com as circunstâncias ao longo do tempo.

Todavia, assim como foi exposto quando se tratou do contratualismo de Rousseau, segundo o qual a vontade geral não se identifica com a vontade de todos, o bem comum não pode se confundir com o bem individual ou a soma de cada um deles. Para Azambuja, "os homens têm aspirações e necessidades diferentes, e o Estado não poderia realizar a felicidade de cada um, ainda que dispusesse de poderes e recursos infinitos. O bem público, de outro lado, não é a simples soma do bem de todos que formam a sociedade estatal..."([51]). Disso decorre que cada Estado, de acordo com a sua população, seu território, sua cultura e suas peculiaridades, terá a sua própria definição de bem comum. Escolherão, portanto, cada um desses Estados, as melhores atividades e os melhores meios de realizá-lo.

Às teorias que enxergam no bem comum a grande finalidade do Estado, convencionou-se chamar de eudemonistas. Todavia, tais teorias, por si só, são insuficientes para delinear as finalidades de um Estado, visto que a determinação do conceito de bem comum se faz muito difícil e, além disso, falta a essas teorias o elemento jurídico de autolimitação. Chegaram tais teorias, por vezes, a legitimar verdadeiras atrocidades sociais ([52]).

Como se disse, a formação das sociedades, o surgimento da linguagem, das artes e das ciências são conseqüências naturais, independentes de uma atividade estatal. O Estado é incapaz de oferecer ao homem saúde, religiosidade, conhecimento etc; pois são ações humanas inerentes que não podem ser por ele produzidas.

A atividade estatal é, assim, formada por ações humanas extrínsecas que poderão proporcionar as condições mais propícias para o desenvolvimento daquelas intrínsecas.

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Os princípios que conduzem a uma vida humana solidária são determinados pelo ordenamento jurídico do qual o Estado é sujeito. Desse modo, somente podem ser considerados como fins do Estado aqueles que são previstos pelo ordenamento jurídico e se expressam em suas instituições e funções. O Direito é a medida e o limite para a busca e a realização destes fins.

Além disso, o Direito não se destina unicamente a manter a ordem social na qual a sociedade convive, mas também fornecer os meios para a evolução de uma ordem futura ([53]). O Direito possui essa dinâmica, atua no presente com os olhos no futuro.

Além das funções de proteção e conservação da sua comunidade e defesa do seu território, o Estado tem por finalidade também a sua própria conservação. A manutenção do ordenamento jurídico e da sua atividade econômica são inequivocamente finalidades fundamentais. Entretanto não são elas as finalidades mais essenciais, isto porque, um Estado cujas finalidades sejam apenas, externamente, a defesa e a proteção do povo e, internamente, a manutenção do seu poder e do seu ordenamento jurídico, poderia levar às mesmas arbitrariedades daqueles que tudo justificam em defesa do bem comum.

Essas finalidades são intermediárias, pois criam as condições para o atendimento das finalidades mais elevadas do Estado. Deve o Estado criar condições econômicas estáveis, investir na evolução tecnológica, apoiar o desenvolvimento industrial e empresarial, proteger as classes trabalhadoras, incentivar a educação em todos os seus níveis, investir em saúde e higiene, garantir os direitos e deveres dos cidadãos, etc.

Agora o fim último destas ações é propiciar o desenvolvimento solidário progressivo de uma sociedade, seja em relação aos seus membros particulares, à comunidade como um todo, ou seja em relação à própria espécie humana. Esta é uma concepção necessária e que completa àquela das teorias eudemonistas.

6. A ATIVIDADE FINANCEIRA DO ESTADO.

Não obstante qual a forma de governo adotada pelo Estado ou quais características reveste a sua população e a sua cultura, a todo o Estado é exigido exercer uma atividade financeira capaz de gerar os recursos suficientes ao atendimento das necessidades sociais, ou ditas públicas. Essas necessidades públicas são como diz Héctor Villegas "aquellas que nacem de la vida colectiva y se satisfacen madiante la actuación del Estado"([54]).

Vale dizer, seja o Estado intervencionista, liberal ou socialista, deve ele dispor das rendas necessárias à promoção das finalidades que lhe deram origem. E estas rendas, como não poderia ser diferente, o Estado vai buscar na própria sociedade - para, após, favorecê-la.

Há muito já definia Montesquieu que "As rendas do Estado são uma porção que cada cidadão dá de seu bem para fazer jus à segurança da outra porção, ou para que dela

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possa desfrutar agradavelmente" ([55]). Isto porque, a partir do momento em que o homem deixa o seu estado primitivo de isolamento ("estado de natureza") e passa a conviver em sociedade, surgem novas necessidades. Agora não mais necessidades individuais, mas necessidades coletivas, que só pela coletividade podem ser providas ([56]). O Estado deve garantir a defesa da soberania perante os demais Estados, a ordem social interna, a educação e a saúde de sua população, a manutenção da justiça, a previdência, e todas as demais necessidades a uma existência digna.

E, como bem coloca Alberto Deodato, "Tudo isso custa dinheiro. E é a aquisição de dinheiro que constitui, precípuamente, a atividade financeira do Estado, que é, em síntese, um ente que arrecada e que paga. É o maior criador e consumidor de riquezas" ([57]).

Portanto, além da função de órgão político, centralizador do poder social, o Estado assume o caráter de um sistema orgânico de serviços públicos para satisfazer às necessidades gerais da população ([58]). O Estado, como juiz das necessidades coletivas, vai prestar os serviços públicos pertinentes (competência do Estado) com o escopo último de promover o bem comum (finalidade do Estado).

Tais serviços são impostos à coletividade, independente da vontade individual dos cidadãos, vez que, como já se referiu anteriormente, a vontade individual (ou as necessidades individuais) não se confunde com a vontade geral (ou necessidades coletivas). E para o custeio desses serviços públicos, o Estado vai precisar ou exigir uma receita.

Várias podem ser as fontes de receitas do Estado. Em última instância, o Estado possui cinco meios universais de obtenção de receita, quais sejam: a) a extorsão de rendas de outros povos ou o recebimento de doações; b) a aquisição das renda decorrentes do patrimônio estatal e de suas empresas públicas; c) a exigência compulsória de tributos e penalidades; d) os empréstimos; e, por fim, e) a fabricação de dinheiro-moeda ([59]). Como se sabe, nos Estados modernos a tributação é a principal fonte de recursos.

O recolhimento de tributos é, pois, um elemento essencial da atividade financeira do Estado, a qual consiste, na lição de Héctor B. Villegas, em "a) la previsión de gastos e ingresos futuros materializada generalmente en el presupuesto financiero; b) la obtención de los ingresos públicos necessarios para hacer frente a las erogaciones presupuestariamente calculadas; c) la aplicación de esos ingresos a los destinos prefijados, o sea, los gastos públicos" ([60]).

Defendendo o caráter instrumental da atividade financeira do Estado, Achile Donatto Giannini, festejado autor italiano e muito conhecido pela doutrina nacional, em referência feito por Villegas, assevera que "tal actividad se distingue de todas las otras que ejecuta el Estado en que no constituye un fin en sí misma, o sea que no atiende directamente a la satisfacción de una necessidad de la coletividad, sino que cumple una función instrumental de gran importancia, siendo su normal desenvolvimiento condición indispensable para el desarrollo de las otras actividades" ([61]).

Este entendimento, entretanto, não é pacífico na doutrina. Autores como Dino Jarach negam a instrumentalidade da atividade financeira, sob o argumento de que tal característica não se aplica às medidas financeiras extrafiscais, pois, estas, pela simples

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instituição, realizam uma função pública direta; o que não ocorre nas medidas meramente fiscais, onde o Estado arrecada para então direcionar o gasto público ([62]).

Com muita propriedade, de outra sorte, Becker ensina que "O Estado é uma realidade, porém não uma realidade que, uma vez criada, passaria a ter sua existência independente da existência de seus criadores; na verdade o Estado existe nos atos e pelos atos do indivíduos que o estão, continuamente, criando". E completa com simplicidade única: "Por isto o Estado existe no dinamismo da Receita conjugado com o dinamismo da Despesa; o Estado é a realização contínua da Receita e Despesa" ([63]).

Melhor sorte, segundo se entende, cabe àqueles autores que defendem a instrumentalidade da atividade financeira do Estado, cuja principal função é a aquisição de receita, mesmo porque, sem isso, as demais funções de administração e aplicação quedariam iníquas. Ainda que se considerem as medidas financeiras extrafiscais, permanece o seu caráter instrumental, por exemplo na regulação, proteção ou indução em um determinado setor econômico.

Assim, a necessidade do Estado em promover as suas finalidades e manter a ordem jurídica constitui, por si só, o fundamento do direito do Estado ao tributo. Conseqüentemente, a este direito corresponde um dever do cidadão em pagar o tributo. Dever este que José Casalta Nabais chamou de fundamental, em sua famigerada obra "O dever fundamental de pagar impostos" ([64]). Porém, este direito do Estado ou este dever do cidadão somente serão legítimos na medida em que o tributo em si obedecer ao motivo e à finalidade para o qual foi criado. E tal legitimidade poderá ser invocada pelo Estado quando reivindicar o pagamento do tributo, assim como a sua falta de legitimidade poderá ser levantada pelo cidadão ao se negar a recolhê-lo.

Inúmeras foram as teorias que tentaram explicar o fenômeno da atividade financeira do Estado. Hoje, porém, os autores não mais se valem das teorias que consideram o tributo como uma exação arbitrária e odiosa, limitador, portanto, da liberdade e dos direitos individuais. Tais opiniões, segundo o autor italiano Ezio Vanoni, "quando não se ligam a formas concretas de Estado historicamente superadas, decorrem de concepções inexatas do direito do Estado ao tributo" ([65]). A discussão entre liberdade e tributo é das mais relevantes no tocante aos direitos e garantias fundamentais, especialmente em nosso contexto atual. Da liberdade do cidadão em contraste com a atividade financeira do Estado, pode-se sugerir uma liberdade fiscal, como o faz Ricardo Lobo Torres. Para ele:

(...) o tributo nasce no espaço aberto pela autolimitação da liberdade, constitui o preço da liberdade, pois é o instrumento que distancia o homem do Estado, e pode implicar na opressão da liberdade, se o não contiver a legalidade. O relacionamento entre liberdade e tributo é dramático, pois vive sob o signo da bipolaridade: o tributo é garantia da liberdade e, ao mesmo tempo, possui a extraordinária aptidão para destruí-la (...) ([66]).

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Entretanto, esta não é a conclusão a que se pretende chegar, haja vista que a tributação dos cidadãos, através da atividade financeira do Estado, é conseqüência direta da organização do homem em sociedade política. Esse um ponto nodal do presente trabalho. O Estado têm, efetivamente, direito ao tributo, uma vez que se trata de um dos instrumentos essenciais pelo qual irá promover as medidas necessárias à persecução do bem comum. Há muito já defendia Hobbes que "não apenas é legal eles empregarem espias, manterem soldados, construírem fortes e exigirem dinheiro para essas finalidades; mas também que deixar de fazê-lo é contra a lei" ([67]). Com efeito, não há como conceber esse signo de bipolaridade. Na insigne lição de Vanoni, tem-se que:

A atividade financeira, longe de ser uma atividade que limite os direitos e a personalidade do indivíduo, é pressuposto necessário daqueles e desta, porquanto na ausência de tal atividade não haveria Estado, e sem Estado não existiria direito. Por outras palavras, dizer que o tributo limita a personalidade individual equivale a dizer que a própria existência do Estado constitui uma limitação dos direitos do indivíduo. Somente fora do convívio social é possível imaginar o homem liberto da obrigação abstrata de corresponder ao tributo (...) ([68]).

Assiste razão ao professor Ricardo Lobo Torres quando afirma que o Estado Financeiro, ou seja, o Estado Moderno dotado de uma atividade financeira, desenvolveu-se apenas após o desaparecimento do feudalismo. "É inútil procurar o tributo antes do Estado Moderno, eis que surge ele com a paulatina substituição da relação de vassalagem do feudalismo pelos vínculos do Estado Patrimonial, com as suas incipientes formas de receita fiscal protegidas pelas primeiras declarações de direito" ([69]).

Já os autores que reconhecem a essencialidade fenômeno da atividade financeira para Estado - e não a vêem como uma arbitrariedade odiosa - filiaram-se cada qual a uma das diversas teorias e escolas doutrinárias que se desenvolveram a partir do século XVIII. Aliomar Baleeiro ([70]), ilustrativamente, elenca 9 teorias que estudaram o fenômeno financeiro. São elas: a) teoria do consumo; b) teoria da troca; c) teoria da produção; d) teoria da utilidade relativa; e) teoria da produtividade marginal; f) teoria do sistema de preços; g) teoria cooperativista; h) teoria da luta de classes; e i) teoria da repartição dos encargos públicos. A essas teorias é possível somar, ainda, outras duas: a primeira, defendida pelos alemães Stahl, Rau e Helferich, e pelos italianos Santi Romano e Vanni, segundo a qual o tributo atine a uma relação de soberania do Estado; e a segunda, defendida principalmente por Otto Mayer ([71]), vê o tributo como uma decorrência da supremacia de fato do Estado perante seus cidadãos.

Todavia, essas teorias, ambas fundadas na doutrina alemã, reconhecem na atividade financeira do Estado apenas uma relação de poder. Não há, segundo elas, qualquer relação de finalidade entre o tributo recolhido e as finalidades do Estado. Entretanto, foram pela doutrina moderna esquecidas, quando se reconheceu que a imposição tributária é uma relação jurídica e não unicamente de poder.

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Dentre aquelas citadas por Baleeiro, apenas uma manteve-se cediça ao longo do tempo. A teoria da troca (ou teoria do preço) foi a base conceitual de quase todos os autores que versaram sobre tributação desde o fim do século XVIII até meados do século XIX, ainda que com inúmeras variantes ([72]).

Todavia, já entre os gregos se reconhecia na tributação um fenômeno de troca, idêntico à compra e venda, onde o cidadão paga o tributo ao qual corresponderá uma prestação de serviço público pelo Estado ([73]). Tal desiderato foi reclamado, posteriormente, por Hobbes e Montesquieu. Este último considerava que: "As rendas do Estado são uma porção que cada cidadão dá de seu bem para fazer jus à segurança da outra porção, ou para que dela possa desfrutar agradavelmente", e ainda, "Não é pelo que o povo pode dar que se deve calcular as rendas públicas, mas sim pelo que ele deve dar" ([74]). Já Hobbes referiu mais especificamente que:

"Em todo governo devemos supor que a mão que segura a espada é o rei ou conselho supremo, que deve ser sustentado e nutrido pelo cuidado e diligência dos súditos com o mesmo empenho que cada um dedica à sua fortuna privada; e que os impostos e tributos nada mais são do que a paga daqueles que velam armados por nós, para que os trabalhos e esforços dos indivíduos não sejam prejudicados pela agressão de inimigos (...). Ademais, como que os súditos dão para uso público nada mais é que o preço que eles pagam pela paz que compraram, há uma boa razão para que os que têm um igual quinhão de paz tenham, também, partes iguais a pagar, quer contribuam com seu dinheiro, que com seu trabalho, para a república" ([75]).

O tributo seria reduzido, pois, ao preço ou à contraprestação dos serviços públicos prestados pelo Estado. Portanto, somente quando o cidadão goza dos serviços estatais e se favorece com eles é que se justificaria a imposição tributária. A medida do tributo é a medida da utilidade do serviço público para o cidadão.

Tal entendimento, no entanto, não merece guarida diante do que fora exposto até o momento. Há de se lembrar, primeiramente, que a vontade geral das sociedades, e também as necessidades públicas, não se confundem com a vontade individual ou com as necessidades individuais dos cidadãos. Isto porque, a vontade geral e a necessidades públicas não correspondem à soma das vontades e necessidades individuais. Por conseguinte, a imposição tributária centrada na teoria da troca, onde o cidadão paga um tributo (preço) e em contraprestação o Estado lhe presta um serviço, além de ser teoricamente incongruente, seria de impossível aplicação prática.

As finalidades do Estado não se esgotam na manutenção ordem, da soberania, no incentivo à produção, etc., mas visa também o desenvolvimento da cultura, da educação e, inclusive, do desenvolvimento espiritual dos cidadãos. E essa multiplicidade deve, obrigatoriamente, refletir na atividade financeira do Estado ([76]). O ensino público, por exemplo, deve ser igualmente custeado por aqueles indivíduos que estudam em escola particular, pois o que se está promovendo é o bem comum e não os seus interesses individuais ou de seu grupo. Este indivíduo não está pagando um preço por um serviço prestado a ele, mas está colaborando com a finalidade própria pela qual o fez viver em

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sociedade, que é o bem comum. E aqui cabe a advertência de Vanoni, segundo a qual "A ação do particular, no sentido de obter do Estado uma determinada utilidade, somente é admissível quando êsse particular se encontre nas condições previstas em lei para obter do Estado uma prestação concreta em seu favor (...)" ([77]). E vai adiante:

A cargo de todos quantos pertençam ao grupo estatal, e que portanto tenham interêsse na atividade dêste, surge um dever moral, antes mesmo que jurídico, de concorrer para fazer frente aos encargos públicos. O legislador, com base nos princípios políticos, econômicos, éticos, que prevalecem ao tempo, disciplinará de maneira concreta a repartição do montante necessário entre os obrigados, mas o dever do indivíduo de suportar o tributo, e o direito do Estado de exigi-lo, já se terão afirmado em abstrato no próprio momento em que o Estado, organizando-se, tenha começado a exercer uma atividade orientada para finalidades de natureza pública ([78]).

Essa uma das conclusões que se quer apresentar no presente estudo. O direito do Estado ao tributo nasce no momento da sua própria constituição. Se há Estado, há o dever moral - antes mesmo que jurídico, como asseverou Vanoni - de os cidadãos colaborarem com a sua mantença; e, portanto, há tributo ([79]). Como bem lembrou Becker o Estado não é uma realidade que depois de criada passa a ter existência própria e independente dos seus criadores. Por isso, tão natural quanto o instinto associativo do homem, é o seu dever de pagar tributo ao Estado. Isto porque, o homem passa a viver em sociedade por um instinto associativo natural, não sendo concebível uma vida em completo isolamento, mas, ao transformá-la em sociedade política (Estado) através da sua vontade, visando com isso o bem comum, passa a ser responsável por toda a coletividade. E isto se faz, dentre outras formas, através do cumprimento de suas obrigações tributárias.

Disto tudo decorre, emprestando a expressão utilizada por Nabais, um dever fundamental de pagar tributo.

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[1] VICENTINO, Cláudio. "História Geral", 5a ed., São Paulo: Scipione, 1994, p. 11-12, onde ainda se destaca que: "Com a sedentarização humana, multiplicaram-se as aldeias, as quais garantiam a seus habitantes maior segurança contra as ameaças externas. Com o progresso das técnicas agrícolas, as colheitas tornaram-se mais abundantes, o que favoreceu o aumento populacional. Assim, formaram-se grupos familiares maiores - ou tribos - que constituíram o primeiro passo para a organização do Estado, já no final do período [neolítico]".

[2] Oportuna a lição de Darcy Ribeiro sobre o processo civilizatório, na qual: "A história das sociedades humanas nos últimos dez milênios pode ser explicada em termos de uma sucessão de revoluções tecnológicas e de processos civilizatórios através dos quais a maioria dos homens passa de uma condição generalizada de caçadores e coletores para diversos modos, mais uniformes do que diferenciados, de prover a subsistência, de organizar a vida social e de explicar suas próprias experiências" ("Processo Civilizatório", São Paulo: Círculo do Livro, 1978, p. 34).

[3] "Elementos de Teoria Geral do Estado", 17ª ed., São Paulo: Saraiva, 1993, p. 7.

[4] "A Política", São Paulo: Martin Claret, 2003, p. 14-15, onde ainda se lê "Ora, o que não consegue viver em sociedade, ou que não necessita de nada porque se basta a si mesmo, não participa do Estado; é um bruto ou uma divindade. A natureza faz assim com que todos os homens se associem".

[5] "Summa Theológica, I, XCVI, 4 apud DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., p. 8.

[6] DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., p. 9.

[7] "Do Cidadão", São Paulo: Martins Fontes, 1992, p. 32-33.

[8] Op. cit., p. 39.

[9] "Do espírito das leis", São Paulo: Martin Claret, 2002, p. 20.

[10] Op. cit., p. 20-21. Onde ainda se lê: "Os indivíduos, em cada sociedade, começam também a sentir sua força; procuram trazer para si as principais vantagens dessa sociedade; e esse fato cria entre eles um estado de guerra".

[11] "Segundo tratado sobre o governo", São Paulo: Martin Claret, 2003, p. 76. Mais adiante lemos que: "Quando certo número de homens constitui uma comunidade através do consentimento individual de todos, fez com isso, dessa comunidade, um corpo com o poder de agir como um corpo, o que apenas ocorre pela vontade e resolução da maioria" (...) "E assim o indivíduo, concordando com outros em formar um corpo político sob um governo, assume a obrigação para com os demais membros dessa sociedade de submeter-se à resolução que a maioria decidir. Se assim não fosse, o pacto inicial que o liga aos outros e o incorpora a uma sociedade nada significaria, e nem mesmo seria pacto se aquele indivíduo ficasse livre e sem nenhum outro vínculo, diferente do estado de natureza" (p. 76-77).

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[12] "Do Contrato Social", coleção Os Pensadores, 2ª ed., São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 32 (Livro I, Capítulo VI).

[13] Op. cit., p. 33.

[14] Op. cit., p. 39.

[15] DALLARI. Op. cit., p. 9.

[16] "Teoría general del Estado", tradução do original Allgemeine Staatslehre por Fernando de los Rios, México, D. F.:Fondo de Cultura Económica, 2000, p. 54-55. As citações que se farão desta obra serão mantidas em espanhol, a fim de se evitar possíveis imprecisões que por vezes se verificam ao traduzir uma obra já traduzida.

[17] "L' Etat ou le politique", Paris, 1957, ns. 102-108.

[18] "Teoria Geral do Direito Tributário", 3ª ed., São Paulo: Lejus, 1998, p. 155.

[19] "Sabemos que uma cidade é como uma associação, e que qualquer associação é formada tendo em vista algum bem. As sociedades, todas elas, portanto, propõem-se algum lucro - especialmente a mais importante de todas, visto que pretende um bem mais elevado, que envolve as demais: a cidade ou a sociedade política" (Aristóteles, op. cit., p. 11).

[20] Nas precisas lições de Darcy Azambuja, "De fato, os indivíduos entregues aos próprios sentimentos e instintos, subtraídos a qualquer autoridade, não poderiam jamais perseverar na ordem, nem se defender de agressões exteriores, nem viver felizes, pois os seus próprios instintos e sentimentos os atirariam uns contra os outros. Suposto mesmo uma sociedade tão civilizada como ainda não existe, onde a Moral e a razão guiassem sem atrito as multiformes atividades da maioria, sempre existiria uma fração maior ou menos de inadaptados, criminosos, loucos ou perversos, que seria preciso submeter pela força ou pela ameaça da força, e para isto teria de haver uma autoridade.

"Mesmo no exercício de atividades lícitas e de direitos inegáveis, os homens, pelo fato de viverem em comum, tem de obedecer normas legais, que devem ser defendidas e aplicadas por um poder permanente. Construir uma habitação, andar de automóvel são atos perfeitamente lícitos; mas, se o poder público não fiscalizasse uns e outros, as casas e os automóveis seria antes coisas nocivas do que úteis. Longe de diminuir, o progresso da civilização aumenta a necessidade do poder organizado, porque as atividades dos indivíduos e das associações se multiplicam, multiplicando os pontos de atrito e os motivos de choque" (op. cit., p. 95).

[21] Insta-nos aqui a anotação a respeito das teorias que negam a necessidade do poder social: os chamados anarquistas. Baseados em diferentes fundamentos e premissas, advogam que o homem deveria ser comandado apenas pelas leis naturais, vivendo de acordo com a natureza, sem a necessidade de obedecer a um falso poder. Todas as formas de organização social, fundadas na autoridade de um homem, ou de um determinado grupo, sobre os outros, são ilegítimas. Sobre a evolução histórica do anarquismo, vide DALLARRI, op. cit., pp. 29-35.

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[22] AZAMBUJA. Op. cit., p. 88 e 95. Em passagem posterior, ao tratar das finalidades e das competências do Estado, este autor assevera que "O Estado não cria a Arte, a Ciência, a Moral, o Direito, que são criações da alma humana, e ele não tem poder direto sobre ela. Seu domínio é temporal, o equilíbrio e a harmonização da atividade do homem, para que a liberdade de um não prejudique a igual liberdade dos outros" (p. 127).

[23] Op. cit., p. 103 (título do item 1, capítulo 5).

[24] Op. cit., p. 88.

[25] "Todas as sociedades humanas, as civilizadas, as bárbaras e as selvagens, as mais adiantadas e as mais atrasadas, apresentam-se já organizadas, com um poder político permanente, ainda que rudimentar. Por muito que se recue na história, até onde alcançam os mais antigos documentos e monumentos, encontra-se sempre o homem vivendo em sociedade e com uma autoridade dirigindo a atividade do grupo" (AZAMBUJA, op. cit., p. 91).

[26] "Essa submissão das vontades de todos à de um homem ou conselho se produz quando cada um deles se obriga, por contrato, ante cada um dos demais, a não resistir à vontade do indivíduo (ou conselho) a quem se submeteu; isto é, a não lhe recusar o uso de sua riqueza e força contra quaisquer outros (pois supõe-se que ainda conserve um direito a defender-se contra a violência); e isso se chama união" (op. cit., p. 108).

[27] Op. cit., p. 109.

[28] Op. cit., p. 36.

[29] Op. cit., p. 153.

[30] Mais detalhes sobre a origem do termo Estado vide JELLINEK, op. cit., p. 155-158.

[31] Op. cit., p. 43 (grifos no original).

[32] Op. cit., p. 57.

[33] Sobre essa ótica, temos em Jellinek que: "Pero un modo tal de considerar al Estado, exclusivamente desde su aspecto exterior, esto es, objetivo, como le habremos de llamar, ofrece solamente una imagen pobre, e insuficiente científicamente, del mismo. Los hechos sociales pueden comprenderse tan sólo con la condición de conocer los actos psíquicos que los determinan y acompañan; porque todos los hechos exteriores de la sociedad, del mismo modo que todos los cambios que tienen lugar en la vida de los hombres, van condicionados por la voluntad, cuya dirección y contenido están dados por la plenitud del ser psicológico y por la actuación del hombre. Esta consideración subjetiva del Estado no se opone en modo alguno a la objetiva, sino que sirve para completarla y aclararla". (op. cit., p. 159).

[34] Op. cit., p. 179.

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[35] Georg Jellinek. Op. cit., p. 183.

[36] Georg Jellinek. Op. cit., p. 184.

[37] Georg Jellinek. Op. cit., pp. 190-191.

[38] Op. cit., p. 233.

[39] Op. cit., p. 196.

[40] Op. cit., p. 196.

[41] Esse mesmo argumento foi utilizado por Rousseau para afirmar o poder do "soberano", ou "corpo político", e para, posteriormente, sustentar que "a vontade geral é sempre certa e tende sempre à utilidade pública". É o que se extrai da seguinte passagem: "Desde o momento em que essa multidão se encontra assim reunida em um corpo, não se pode ofender um dos membros sem atacar o corpo, nem, ainda menos, ofender o corpo sem que os membros se ressintam. Eis como o dever e o interesse obrigam igualmente as suas partes contratantes a se auxiliarem mutuamente, e os mesmos homens devem procurar reunir, nessa dupla relação, todas as vantagens que dela provêm. Ora, o soberano, sendo formado tão-só pelos particulares que o compõe, não visa nem pode visar a interesse contrário ao deles, e, conseqüentemente, o poder soberano não necessita de qualquer garantia em face de seus súditos, por ser impossível ao corpo desejar prejudicar a todos os seus membros, e veremos, logo a seguir, não pode também prejudicar a nenhum deles em particular. O soberano, somente por sê-lo, é sempre aquilo que deve ser" ( op. cit., p. 35).

[42] Op. cit., p. 19. Mais do que a garantia do bem comum, Locke defende também a proteção à propriedade privada de cada membro da sociedade. Verbis: "Todavia, quando os homens constituem sociedade abandonando a igualdade, a liberdade e o poder executivo do estado de natureza aos cuidados da comunidade para que disponha deles por meio do poder legislativo de acordo com a necessidade do bem dela mesma, fazem-no cada um com a intenção de melhor preservar a si próprio, à sua liberdade e propriedade. E como não podemos supor que um ser racional troque a sua condição para pior, o poder da sociedade ou o legislativo constituído não é tampouco de se supor que estenda para além do bem comum, ficando na obrigação de garantir a propriedade de cada membro..." (op. cit., p. 94).

[43] Op. cit., p. 19.

[44] DALLARI, Dalmo. Op cit., p. 87.

[45] Até mesmo porque segundo Dalllari "é preciso reconhecer que há circunstâncias em que o Estado é compelido a ceder a outros fins que não os seus", porém "é facilmente verificável que há, de fato, uma estreita relação entre os fins do Estado e as funções que ele desempenha" (op. cit., p. 87). A propósito da classificação das finalidades estatais, cuja contribuição maior tenha sido dada por Jellinek, Dallari as divide em fins objetivos e fins subjetivos, em fins expansivos, limitados e relativos, e, ainda, em fins exclusivos e concorrentes (op. cit., p. 88-91).

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[46] AZAMBUJA, Darcy. Op. cit., p. 121-122.

[47] São Paulo: Revista dos Tribunais, 1940.

[48] AZAMBUJA, Darcy. Op. cit., p. 122-123.

[49] Para Kelsen a figura da finalidade do Estado não se insere na Teoria Geral do Estado, pois não se trata de uma figura jurídica propriamente dita. Existem outros autores ainda, como Mortati, que asseveram que a finalidade do Estado é algo profundamente genérico e, portanto, não há interesse em seu estudo.

[50] Quanto às formas de governo que um Estado pode assumir, deixarão elas de ser analisadas vez que não guardam pertinência imediata com o estudo.

[51] Op. cit., p. 124. Análogamente, Aliomar Baleeiro ao tratar das necessidades públicas nos ensina que: "Distinguem-se, entretanto, das necessidades, em geral, para constituir o grupo das chamadas 'necessidades públicas', necessidades que, por sua natureza, só encontram satisfação eficaz pela ação coordenada do grupo, quer seja voluntária, quer seja coativa a participação dos indivíduos que o formam" (op. cit., p. 2).

[52] Nesse ponto, Jellinek faz a seguinte crítica: "Pero no sólo se ha inspirado en las teorías eudemonistas el absolutismo monárquico, sino también el absolutismo democrático, pues los jacobinos han declarado oficialmente el bien común como el fin supremo del Estado, lo cual significa, prácticamente, sancionar el poderío ilimitado de las mayorías. (...) Todo progreso, toda mejora de lo existente, todo sacrificio de lo actual en aras de un futuro lejano, puede ser rechazado desde el punto de vista del bien. Este bien común está determinado por las concepciones especiales de partido y por apreciaciones subjetivas de los que circunstancialmente detentan el poder" (Op. cit., pp. 244-245)

[53] Georg Jellinek. Op. cit., p. 254.

[54] VILLEGAS, Héctor B. "Curso de finanzas, derecho financiero y tributario", 2ª ed., Buenos Aires: Depalma, 1977, p. 3.

[55] Op. cit., p. 221.

[56] Sobre a essência política do fenômeno financeiro Baleeiro ilustra que "O indivíduo nas sociedades primitivas, isolado, pode caçar, pescar ou colher frutos e raízes alimentícias, mas a repulsa ao ataque de outra tribo, a luta contra animais ferozes de grande porte, a abertura das primeiras sendas na floresta deveriam ter exigido a conjunção de esforços na ação coletiva. Para esta, os recalcitrantes provavelmente foram convencidos à força, como até hoje certo grau de coação física e moral é empregado para a conscrição militar ou para outros sacrifícios de caráter coletivo" (op. cit., p. 3).

[57] "Manual de Ciência das Finanças", 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 1961, p. 9.

[58] BALEEIRO, Aliomar. Op. cit., p. 1.

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[59] Cfr. BALEEIRO, Aliomar, op. cit., p. 125.

[60] Op. cit., p. 11.

[61] Op. cit., p. 10 (grifos no original).

[62] "El Hecho Imponible", Buenos Aires: Depalma, 1943, p. 27.

[63] Op. cit., p. 246.

[64] Lisboa: Almedina, 1999.

[65] "Natura ed interpretazione delle leggi tributarie", consultada em sua versão traduzida por Rubens Gomes de Souza "Natureza e interpretação das leis tributárias", Rio de Janeiro: Financeiras, 1932, p. 51.

[66] "A Idéia de Liberdade no Estado Patrimonial e no Estado Fiscal", Rio de Janeiro: Renovar, 1991, p. 2-3.

[67] Op. cit., p. 225-26.

[68] Op. cit., p. 141.

[69] Op. cit., p. 1-2. Sobre a história geral da tributação vide capítulo I da obra de Ezio Vanoni, op. cti., bem como sobre a história da tributação no Brasil o estudo do professor Alcides Jorge Costa "A história da tributação no Brasil", em obra coletiva coord. por Roberto Ferraz, "Princípios e limites da tributação", São Paulo: Quartier Latin, 2005.

[70] Op. cit., p. 19-20.

[71] Segungo Vanoni "Mayer interpreta portanto o poder financeiro do Estado como um poder paralelo ao poder de polícia, que utiliza os mesmo meios que este, e do qual se diferencia unicamente em razão de seus fins: o poder de polícia visa a boa ordem da comunidade, e o poder financeiro visa obter para o Estado os meios econômicos que lhe são necessários" (op. cit., p. 93-94).

[72] VANONI, Ezio. Op. cit., p. 54.

[73] VANONI, Ezio. Op. cit., p. 52.

[74] Op. cit., p. 221.

[75] Op. cit., p. 213 e 228.

[76] Em crítica às teorias que não vêem na atividade financeira do Estado um fenômeno complexo, Aliomar Baleeiro anota que: "aqueles pensadores do século passado raciocinavam como economistas, perdendo de vista a natureza compósita do fenômenos financeiro, que não está limitado ao quadro da Economia, mas é

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condicionado visceralmente às estruturas institucionais (jurídica, política, etc.). Há, até, que lhe atribua elementos morais e religiosos" (op. cit., p. 20).

[77] Op. cit., p. 118.

[78] Op. cit., p. 125.

[79] Ainda que não seja exigido sob a forma de prestação pecuniária compulsória como se conhece hoje.