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OS “FILHOS” DO ESTADO ISLÂMICO: UM NOVO CASO PARA O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL? Vanessa Oliveira de Queiroz 1 RESUMO: As ofensivas terroristas vêm sendo reproduzidas em larga escala nos últimos anos. Em particular destacam-se as práticas empreendidas pelo grupo liderado por Abu Bakr al-Baghdadi e conhecido como Estado Islâmico, cujos vídeos veiculados na mídia internacional explicitam a ampliação de suas frentes de combate, incluindo a captura e o aprisionamento de crianças em jaulas e o uso de outras como perpetradoras para a execução sumária de reféns. Este trabalho procura verificar a possibilidade de exercício da jurisdição do Tribunal Penal Internacional no tocante às ações do grupo, especialmente aquelas que envolvem o treinamento e a participação de menores como soldados. PALAVRAS-CHAVE: Estado Islâmico; crianças-soldado; responsabilização penal internacional; Abu Bakr al-Baghdadi. ABSTRACT: Terrorist offensives have been reproduced on a large scale in recent years. In particular, we highlight the practices undertaken by the group led by Abu Bakr al-Baghdadi and known as the Islamic State, which videos broadcasted by the international media show the expansion of their fighting fronts, including the capture and imprisonment of children in cages and the use of others as perpetrators of summary executions of hostages. This work seeks to verify the possibility of exercising jurisdiction of the International Criminal Court on ISIS´s actions, especially those involving the recruitment and participation of children as soldiers. KEYWORDS: Islamic State; child soldiers; international criminal responsibility; Abu Bakr al-Baghdadi. 1 Advogada e Consultora Jurídica. Mestre em Direito Internacional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Bacharel em Direito pela UERJ e em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

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OS “FILHOS” DO ESTADO ISLÂMICO: UM NOVO CASO PARA O

TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL?

Vanessa Oliveira de Queiroz1

RESUMO: As ofensivas terroristas vêm sendo reproduzidas em larga escala nos

últimos anos. Em particular destacam-se as práticas empreendidas pelo grupo liderado

por Abu Bakr al-Baghdadi e conhecido como Estado Islâmico, cujos vídeos veiculados

na mídia internacional explicitam a ampliação de suas frentes de combate, incluindo a

captura e o aprisionamento de crianças em jaulas e o uso de outras como perpetradoras

para a execução sumária de reféns. Este trabalho procura verificar a possibilidade de

exercício da jurisdição do Tribunal Penal Internacional no tocante às ações do grupo,

especialmente aquelas que envolvem o treinamento e a participação de menores como

soldados.

PALAVRAS-CHAVE: Estado Islâmico; crianças-soldado; responsabilização penal

internacional; Abu Bakr al-Baghdadi.

ABSTRACT: Terrorist offensives have been reproduced on a large scale in recent

years. In particular, we highlight the practices undertaken by the group led by Abu Bakr

al-Baghdadi and known as the Islamic State, which videos broadcasted by the

international media show the expansion of their fighting fronts, including the capture

and imprisonment of children in cages and the use of others as perpetrators of summary

executions of hostages. This work seeks to verify the possibility of exercising

jurisdiction of the International Criminal Court on ISIS´s actions, especially those

involving the recruitment and participation of children as soldiers.

KEYWORDS: Islamic State; child soldiers; international criminal responsibility; Abu

Bakr al-Baghdadi.

1 Advogada e Consultora Jurídica. Mestre em Direito Internacional pela Universidade do Estado do Rio

de Janeiro (UERJ). Bacharel em Direito pela UERJ e em Relações Internacionais pela Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Vanessa Oliveira de Queiroz

Revista Eletrônica de Direito Internacional, ISSN 1981-9439, vol.17, jan./jun., 2016, pp.280-305. 281

1. INTRODUÇÃO

Bagdá, janeiro de 2015. Ele tem a pele branca, olhos pretos e puxados, cabelos

negros e compridos até os ombros, com uma leve franja voltada à esquerda, cerca de

1,30m de altura, vestido de pulôver negro, calças marrons e um relógio. O olhar é fixo,

mas sereno. Ele segura uma arma e a aponta para dois homens que estão ajoelhados. Em

seguida, atira na cabeça de cada um deles, por trás. Com aproximadamente dez anos de

idade, o atirador é um menino-soldado.2

Trata-se de mais um episódio que retrata o envolvimento direto de crianças nas

práticas da organização terrorista conhecida como Estado Islâmico (EI) – Islamic State

of Iraq and Al-Sham (ISIS, na sigla em inglês). O grupo atua de forma mais expressiva

no norte da Síria e no Iraque, sob o comando de Abu Bakr al-Baghdadi, e tem como

objetivo precípuo a conquista de territórios e o estabelecimento de um califado sunita.

Para a consecução desse propósito, além de promover o recrutamento de

combatentes estrangeiros – principalmente de Estados vizinhos, mas também de Estados

ocidentais –, um dos instrumentos amplamente adotados pelo grupo jihadista é

justamente a utilização de menores de idade. Esses participam de treinamentos oficiais,

do sequestros de opositores e de execuções sumárias, e realizam o carregamento e a

distribuição de armas, entre outras atividades. Muitos desses atos são transmitidos

online, em tempo real, e propagados para todo o mundo através da mídia internacional e

os menores têm suas imagens expostas de forma abrangente, já que seus rostos não são

cobertos, ao contrário do que ocorre com os membros adultos do EI.3

O fenômeno vem causando preocupação aos integrantes de organizações não-

governamentais (ONGs) e demais aos membros da comunidade internacional,

particularmente em função das consequências advindas do recrutamento de combatentes

2ANSA. Em vídeo do Estado Islâmico, criança aparece atirando em refém. Último Segundo, 13 jan. 2015.

Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2015-01-13/em-video-do-estado-islamico-

crianca-aparece-atirando-em-refem.html>. Acesso em: 22 fev. 2016. 3 MOSENDZ, Polly. ISIS Releases Video Purporting to Show Child Soldier Killing Hostage. Newsweek,

10 mar. 2015. Disponível em: <http://www.newsweek.com/isis-releases-video-purporting-show-child-

soldier-killing-hostage-312816>. Acesso em: 20 fev. 2016. MOSENDZ, Polly. Child Soldier Involved in

Islamic State Mass Beheading. Newsweek, 30 mar. 2015. Disponível em:

<http://www.newsweek.com/child-soldier-involved-islamic-state-mass-beheading-318025>. Acesso em:

20 fev. 2016.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

Revista Eletrônica de Direito Internacional, ISSN 1981-9439, vol.17, jan./jun., 2016, pp.280-305. 282

tão jovens e sua exposição à violência em massa.4 Esse método de atuação do EI, no

entanto, não pode ser considerado como uma nova ameaça em termos de segurança

humana5. O uso de pessoas com menos de dezoito anos para a realização de manobras

militares trata-se, em verdade, de uma prática reiterada, que é reproduzida há vários

séculos e atinge países com realidades sociais muito diferentes, como a República

Democrática do Congo (RDC), o Reino Unido e a Colômbia.

Várias estratégias já vêm sendo implementadas como respostas à problemática,

em especial no âmbito do Direito Internacional (DI), como a assinatura de instrumentos

internacionais que proíbem e criminalizam o emprego das chamadas “crianças-

soldado”. O Tribunal Penal Internacional (TPI), por sua vez, tem desempenhado um

importante papel no tocante à persecução criminal de perpetradores, o que restou

comprovado, por exemplo, com a condenação e o sentenciamento do congolês Thomas

Lubanga Dyilo pelo crime de recrutamento infantil. Indaga-se, então, se essa corte

poderia contribuir para a repressão à conduta dos extremistas do grupo EI no mesmo

sentido.

Inicialmente, talvez a resposta a esse questionamento fosse negativa, já que a

Síria e o Iraque – países nos quais há maior atuação daquela organização terrorista – não

são partes do Estatuto do TPI, isto é, não aceitaram submeter-se à jurisdição da referida

corte. Ao mesmo tempo, ONGs como a Human Rights Watch (HRW) e a Anistia

Internacional permanecem denunciando de forma sistemática as ações do EI, exigindo

dos Estados e das instâncias internacionais a adoção de posturas mais concretas quanto

à responsabilização de todos os integrantes do grupo envolvidos na prática de crimes de

guerra, como o alistamento e uso de menores nos combates.6

4 BRANNEN, Kate. Children of the Caliphate, Foreign Policy, 24 out. 2014. Disponível em:

<http://foreignpolicy.com/2014/10/24/children-of-the-caliphate/>. Acesso em: 22 fev. 2016. 5 A concepção de segurança humana surgiu na segunda metade da década de 1990 como uma nova

abordagem da disciplina de segurança internacional no campo de Relações Internacionais. Ganhou espaço

como um paradigma de mudança, cujas premissas poderiam ser utilizadas para a formulação de políticas

práticas voltadas à promoção da segurança dos indivíduos e comunidades diante dos novos desafios da

ordem mundial pós-Guerra Fria. Essa perspectiva de análise reúne preocupações com a vida e a dignidade

dos indivíduos, buscando-se a adoção de medidas voltadas à proteção das pessoas diante de ameaças

violentas e não-violentas. Nesse sentido, propõe a existência de sete categorias de segurança humana:

econômica, alimentar, de saúde, ambiental, pessoal, comunitária e política. Sobre o tema, ver:

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Human Development Report, 1994. Disponível em:

<http://hdr.undp.org/sites/default/files/reports/255/hdr_1994_en_complete_nostats.pdf>. Acesso em: 20

fev. 2016; CANADÁ. Departamento de Assuntos Exteriores e Comércio Internacional. Human Security:

Safety for People in a Changing World, abr. 1999. Disponível em: <http://www.summit-

americas.org/canada/humansecurity-english.htm>. Acesso em: 18 fev. 2016. 6 HUMAN RIGHTS WATCH. Syria: Armed Groups Send Children into Battle. 23 jun. 2014. Disponível

em: <http://www.hrw.org/news/2014/06/22/syria-armed-groups-send-children-battle>. Acesso em: 07

jan. 2016.

Vanessa Oliveira de Queiroz

Revista Eletrônica de Direito Internacional, ISSN 1981-9439, vol.17, jan./jun., 2016, pp.280-305. 283

Por seu turno, órgãos das Nações Unidas já apresentaram diversas declarações

afirmando que, ao treinar e utilizar crianças para funções de combate, o EI viola o

Direito Internacional Humanitário (DIH) e perpetra crimes de guerra em larga escala.7

Logo, deve-se investigar as possibilidades de efetivo exercício da jurisdição

internacional pelo TPI quanto a essa situação, verificando-se, por exemplo, se

indivíduos com papel de liderança no grupo, como Abu Bakr al-Baghdadi, poderiam ser

denunciados e processados por aquela entidade internacional. Adicionalmente, cumpre

esclarecer se existem ou não outras alternativas para o combate à impunidade no tocante

às infrações em questão.

2. OS JOVENS SOLDADOS E A REAÇÃO INTERNACIONAL

Os registros históricos evidenciam que o envolvimento de menores em

hostilidades teve início antes mesmo da década de 1990, a partir da qual se observou um

recrudescimento da prática. Há relatos de que meninos espartanos de apenas sete anos

carregavam armas para os combates e desde cedo treinavam para a guerra, e de que

jovens franceses e alemães participaram da chamada “Cruzada das Crianças”, em 1212.

Divisões do Exército de Napoleão Bonaparte, a Marinha inglesa no século XVIII e as

tropas confederadas que lutaram na guerra civil nos Estados Unidos também reuniram

meninos em suas fileiras.8

A questão foi marcante no âmbito da Guerra do Paraguai (1864-1870), com os

conhecidos niños combatientes, colocados na linha de frente do Exército de Solano

López nos combates contra as tropas brasileiras. Em 16 de agosto de 1869, na batalha

de Acosta Ñu, foram mortas aproximadamente 3.500 crianças com idades entre nove e

quinze anos.9 As forças Aliadas e as do Eixo também empregaram crianças nos embates

7 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Independent International Commission of

Inquiry on the Syrian Arab Republic. 14 nov. 2014, p.11. Disponível em:

<http://www.ohchr.org/Documents/HRBodies/HRCouncil/CoISyria/HRC_CRP_ISIS_14Nov2014.pdf>.

Acesso em: 20 jan. 2016. 8 WEBSTER, Thimoty. Babes with Arms: International Law and Child Soldiers. The George Washington

International Law Review, v. 39, n.2, jan. 2007. MARTEN, James. Soldier Children: Global Human

Rights Issues. In: FASS, Paula S. (Ed). Encyclopedia of Children and Childhood: in History and Society.

New York: Macmillan Reference USA, p.776-778, 2004. 9 PASCAL, Maria Aparecida Macedo. As Mulheres e a Guerra do Paraguai. Revista Eletrônica de Ética e

Cidadania, 2006. Disponível em:

<http://www.mackenzie.com.br/fileadmin/Graduacao/EST/Publicacoes_-_artigos/pascal_11.0.pdf>.

Acesso em: 03 jan. 2016.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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da Segunda Guerra Mundial10

, e nos conflitos armados internos deflagrados nas décadas

de 1980 e 1990 a história se repetiu com o National Resistance Army, em Uganda, e

grupos combatentes no Camboja, em Moçambique, na Libéria, em Mianmar e em Serra

Leoa.11

Em 2013, crianças a partir dos doze anos de idade foram treinadas como

combatentes pelo Sudan People’s Liberation Army (Exército Vermelho) e atuaram em

prol da independência do Sudão do Sul.12

Nota-se, assim, que, ao contrário do que afirmam alguns autores, o fenômeno

sob estudo não é uma exclusividade de cenários africanos13

, pois, na verdade, é

detectado em países de diversas regiões globais e com características distintas.

Pesquisas realizadas por ONGs e organismos intergovernamentais indicam que mais de

quinze Estados continuam recrutando oficialmente menores de dezoito anos para a

composição de forças armadas nacionais, como El Salvador, México, Chade, Costa do

Marfim, Coreia do Norte, RDC, Líbia, Mianmar, Irã, Somália, Sudão do Sul, Sudão,

Reino Unido e Iêmen.14

Nesses locais, outras forças de algum modo subordinadas ao

controle estatal, como polícias e grupos aliados, também realizam o recrutamento

infanto-juvenil, o que também ocorre em países como Eritréia, Afeganistão, República

Centro-Africana (RCA), Iraque, Filipinas, Ruanda e Tailândia.15

A situação é de tamanha gravidade em algumas regiões que as Nações Unidas

resolveram criar a chamada “lista da vergonha”. Essa listagem contém uma relação de

grupos apontados como autores persistentes das condutas de recrutamento e utilização

de crianças como soldados, assim considerados em função de reconhecidamente

cometerem essas práticas de forma reiterada por pelo menos cinco anos, como é o caso

10

JANFELT, Monika. War in the Twentieth Century. In: FASS, Paula S. (Ed). Encyclopedia of Children

and Childhood: in History and Society. New York: Macmillan Reference USA, 2004. 11

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. The State of The World´s Children 1996. Children as

soldiers. Nova Iorque, 1996. Disponível em: <http://www.unicef.org/sowc96/2csoldrs.htm>. Acesso em:

20 fev. 2016. 12

LUFFMAN, Laurinda. Former child soldiers take on new role in South Sudan. SOS Children. 05 abr.

2013. Disponível em: <http://www.soschildrensvillages.org.uk/news/archive/2013/04/former-child-

soldiers-take-on-new-role-in-south-sudan>. Acesso em: 02 jan. 2016. 13

Em sentido oposto, ver: FAÇANHA, Luisa Café Figueiredo. A Construção Social das Crianças-

Soldado: representações e dilemas dentro do marco regulatório da ordem internacional do Pós-Guerra

Fria. 2011. 136f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de Relações

Internacionais. PUC, Rio de Janeiro, 2011. 14

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Informe de la Representante Especial del Secretario

General para la cuestión de los niños y los conflictos armados. 03 ago. 2011. Disponível em:

<http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/N11/443/73/PDF/N1144373.pdf?OpenElement>.

Acesso em: 15 jan. 2016. 15

CHILD SOLDIERS INTERNATIONAL. Louder than words: An agenda for action to end state use of

child soldiers, 2012, p.11. Disponível em: <http://www.child-

soldiers.org/global_report_reader.php?id=562>. Acesso em: 03 jan. 2016.

Vanessa Oliveira de Queiroz

Revista Eletrônica de Direito Internacional, ISSN 1981-9439, vol.17, jan./jun., 2016, pp.280-305. 285

do Ejército de Liberación Nacional e das Fuerzas Armadas Revolucionarias de

Colombia - Ejército del Pueblo (FARC).16

Em resposta, algumas iniciativas de combate estão sendo adotadas, como a

aprovação de legislações domésticas, a promoção de investigações e da persecução

penal de indivíduos através de instâncias nacionais, e a criação de órgãos e instrumentos

de monitoramento, como o Mecanismo de Revisão Periódica Universal do Conselho de

Direitos Humanos das Nações Unidas. Estratégias de prevenção a novas ocorrências e

programas de recuperação de ex-combatentes também têm destaque, como aqueles

voltados ao seu desarmamento, sua desmobilização e sua reintegração (DDR) em

comunidades na Colômbia.17

Diversas organizações da sociedade civil global

promovem campanhas no mesmo sentido, como a Child Rights International Network, o

Comitê Internacional da Cruz Vermelha, a Child Soldiers International, a HRW e a

Coalición contra la Vinculación de Niños, Niñas y Jóvenes al Conflicto Armado en

Colombia.

Somam-se aos esforços sobreditos a celebração de acordos internacionais que

buscam limitar a participação infantil em hostilidades, entre os quais a IV Convenção de

Genebra para a Proteção de Civis em Tempos de Guerra de 1949 (arts. 50 e 51), e os

Protocolos Adicionais I (art. 77, item 2) e II (art. 4º, item 3, alínea “c”) de 1977. A

relação dos documentos abrange, ainda, a Convenção das Nações Unidas sobre os

Direitos da Criança de 1989 (art. 38, itens 2 e 3), seu Protocolo Facultativo II de 2000

(arts. 1º, 2º, 3º, item 1, e 4º, item 1) e a Carta Africana dos Direitos e Bem-Estar da

Criança de 1990 (art. 22).

Em um movimento crescente voltado à repressão sobre aquela prática, a

Convenção sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata

para sua Eliminação de 1999 caracteriza o recrutamento forçado ou obrigatório de

crianças para serem utilizadas em conflitos armados como das piores formas de trabalho

infantil (art. 3º, alínea “a”). Na esfera da responsabilização penal internacional, o

Estatuto do Tribunal Especial para Serra Leoa, adotado em janeiro de 2002, relaciona as

condutas de recrutamento, alistamento e utilização de crianças menores de quinze anos

16

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Secretary-General. 26 abr. 2012. Disponível

em: <http://www.un.org/children/conflict/_documents/A66782.pdf>. Acesso em: 08 jan. 2016. 17

Sobre os programas de DDR, ver: TABAK, Jana. As Vozes de Ex-Crianças Soldado: Reflexões

Críticas sobre o Programa de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração das Nações Unidas. 2009.

169f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de Relações Internacionais. PUC,

Rio de Janeiro, 2009.

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por forças ou grupos armados para participação ativa em hostilidades entre as sérias

violações ao DIH sujeitas à jurisdição da corte (art. 4º, alínea “c”). 18

Para o propósito deste estudo, ressalta-se, em particular, o disposto no Estatuto

do TPI, de 1998, que aborda a questão em dois momentos. O item 2, alínea “b”, inciso

xxvi, do artigo 8º dispõe que:

2. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crimes de

guerra": [...] b) Outras violações graves das leis e costumes aplicáveis

em conflitos armados internacionais no quadro do direito

internacional, a saber, qualquer um dos seguintes atos: [...] xxvi)

Recrutar ou alistar menores de 15 anos nas forças armadas nacionais

ou utilizá-los para participar ativamente nas hostilidades. (grifos

nossos)

Já o item 2, alínea “e”, inciso vii, do artigo 8º estabelece que:

2. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crimes de

guerra": [...] (e) As outras violações graves das leis e costumes

aplicáveis aos conflitos armados que não têm caráter internacional, no

quadro do direito internacional, a saber, qualquer um dos seguintes

atos: [...] vii) Recrutar ou alistar menores de 15 anos nas forças

armadas nacionais ou em grupos, ou utilizá-los para participar

ativamente nas hostilidades. (grifos nossos)

Com base nessas previsões, a Promotoria do TPI já iniciou investigações a

respeito de ocorrências de recrutamento infantil na República Democrática do Congo

(RDC), em Uganda19

, na República Centro-Africana20

, no Mali21

e na Colômbia22

.

18

O Tribunal Especial para Serra Leoa possui casos paradigmas no que tange ao tema, principalmente os

julgamentos de Alex Tamba Brima, Ibrahim Bazzy Kamara e Santigie Borbor Kanu, além de Issa Hassan

Sesay, Morris Kallon, Sam Hinga Norman, Moinina Fofana e Allieu Kondewa. 19

No que se refere à situação ugandense, três indivíduos foram investigados pelo TPI sob a acusação de

promoverem o alistamento forçado de crianças, entre outras práticas criminosas: Joseph Kony, Vincent

Otti e Okot Odhiambo. 20

A investigação sobre as ocorrências nesse Estado foram iniciadas formalmente em setembro de 2014

após terem sido reunidas consideráveis evidências de que grupos que atuam no conflito em curso no país

vêm cometendo crimes contra a humanidade e crimes de guerra, entre os quais o uso de crianças menores

quinze anos em combates desde o ano de 2012. TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL. Statement of

the Prosecutor of the International Criminal Court, Fatou Bensouda, on opening a second investigation in

the Central African Republic. 24 set. 2014. Disponível em: <http://www.icc-

cpi.int/EN_Menus/icc/press%20and%20media/press%20releases/pages/pr1043.aspx>. Acesso em: 03 jan.

2016. 21

No caso do Mali, o próprio Ministro da Justiça do país, Malick Coulibaly, referiu a situação nacional ao

TPI em julho de 2012 e solicitou a sua intervenção, afirmando que graves crimes vinham sendo

cometidos desde janeiro daquele ano no território malinense, como o uso de crianças-soldado para

participação em confrontos armados. TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL. Referral letter by the

Government of Mali. 13 jul. 2012. Disponível em: <http://www.icc-cpi.int/NR/rdonlyres/A245A47F-

BFD1-45B6-891C-3BCB5B173F57/0/ReferralLetterMali130712.pdf>. Acesso em: 29 jan. 2015. 22

A Promotoria do TPI acompanha a situação na Colômbia com vistas a assegurar que o Estado continue

a envidar esforços para processar os responsáveis pela prática de crimes de guerra – entre os quais o

recrutamento infantil – cometidos pelas partes do conflito interno. TRIBUNAL PENAL

Vanessa Oliveira de Queiroz

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O caso da RDC é o mais emblemático até o momento, pois resultou na

primeira condenação imposta pelo tribunal. Em 14 de março de 2012, a Câmara de

Julgamento I considerou o membro do grupo Union des Patriotes Congolais e ex-líder

político e militar congolês Thomas Lubanga Dyilo responsável como co-autor pelos

crimes de recrutamento, alistamento e utilização de crianças menores de quinze anos

como soldados no conflito armado ocorrido na RDC entre os anos de 2002 e 2003. Em

10 de julho de 2012, aquela mesma Câmara sentenciou-o a um período total de quatorze

anos de prisão, decisão essa mantida pela Câmara de Apelação em 2014 por ocasião do

julgamento dos recursos apresentados pelas partes.23

O TPI possui, ainda, outros casos

relativos à situação da RDC envolvendo denúncias contra líderes de guerrilhas, como

Bosco Ntaganda, Germain Katanga e Mathieu Ngudjolo Chui – todos investigados e

processados também pela cooptação e uso de menores de idade em combates.

Desse modo, identifica-se a existência de um conjunto de iniciativas,

especialmente jurídicas, que está sendo desenvolvido continuamente para a formação de

um regime internacional de combate ao envolvimento de menores em hostilidades,

especialmente a partir da abertura de investigações e processos pelo TPI. Resta saber,

agora, se tal sistema poderá oferecer respostas concretas às condutas do EI.

3. OS MINI-JIHADISTAS DO ESTADO ISLÂMICO

Assim como o grupo Al Shabab e a organização Al Qaeda, o EI é hoje o

responsável pela condução de diversos atos terroristas, como aqueles praticados em

países envolvidos em conflitos armados internos, como é o caso da Síria. Como

mencionado, o grupo age com extremismo e possui o objetivo claro de perseguir os

ideais jihadistas e estabelecer um Califado, implantando um regime totalitário24

.

Para tanto, realiza recrutamentos em massa de nacionais de diversos países,

incluindo crianças a partir dos cinco anos e adolescentes, que são chamados pelo grupo

INTERNACIONAL. Situation in Colombia. Interim Report, p.69. 14 nov. 2012. Disponível em:

<http://www.icc-cpi.int/NR/rdonlyres/3D3055BD-16E2-4C83-BA85-

35BCFD2A7922/285102/OTPCOLOMBIAPublicInterimReportNovember2012.pdf>. Acesso em: 02 jan.

2016. 23

TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL. The Prosecutor v. Thomas Lubanga Dyilo. Disponível em:

<http://www.icc-

cpi.int/en_menus/icc/situations%20and%20cases/situations/situation%20icc%200104/related%20cases/ic

c%200104%200106/Pages/democratic%20republic%20of%20the%20congo.aspx>. Acesso em: 02 fev.

2016. 24

Sobre os exercícios militares do grupo, ver: STERN, Jessica & BERGER, J. M. ISIS: The State of

Terror. 1ª Ed. Ecco, 2015, 416 p.; WEISS, Michael & HASSAN, Hassan. ISIS: Inside the Army of

Terror. 1a ed. Regan Arts, 2015, 288p.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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de “filhotes dos leões do Califado”. Os mesmos são submetidos a treinamentos militares

e estudos religiosos, a partir dos quais a ideologia jihadista é propagada numa espécie

de “lavagem cerebral”, porquanto as crianças se mostram mais vulneráveis e

influenciáveis. Nos campos de treinamento, como Al Raqqa, os menores carregam

escopetas, realizam disparos e rastejam em exercícios de guerrilha. A partir dos quinze

anos as crianças já têm a opção de se tornar combatentes remunerados pelo EI,

conforme aponta a organização não-governamental Observatório Sírio de Direitos

Humanos (OSDH).25

Segundo o relatório da Comissão Independente Internacional de Inquérito para

a Síria (CIIIS), divulgado em maio de 2014, aproximadamente cento e cinquenta

crianças curdas, incluindo meninos com idades entre 13 e 14 anos, foram sequestrados

pelo EI em Minbeij. Após sua abdução, sofreram torturas e passaram a ser doutrinados

com ensinamentos sobre a ideologia do grupo, sendo forçados a assistir vídeos de

execuções. Foram submetidos a inúmeras regras, como a proibição de falar a língua

curda e de falar alto, e a obrigação de rezar em determinados horários e observar o

Ramadã. Quando os meninos violavam quaisquer dessas regras eram reprimidos pelos

guardas com violência, incluindo choques elétricos.26

A Comissão reconheceu que as

crianças têm sido submetidas à educação religiosa em uma aparente tentativa de

doutriná-las à ideologia do EI e dessensibilizá-las quanto às formas de violência

empregues pelo grupo, sendo os menores forçados, por exemplo, a assistir vídeos de

decapitações.27

Conforme registros de março de 2015 apresentados pela OSDH, o número de

crianças recrutadas pelo grupo representa o dobro do número de adultos. Essa aparente

preferência dada à cooptação de menores foi atribuída pelo Alto Comissariado de

Direitos Humanos das Nações Unidas à relação de lealdade em longo prazo que pode

advir da integração de menores ao EI, de acordo com o relatório divulgado em

novembro de 2014 pelo órgão. Criam-se, assim, laços maiores de fidelidade e ampliam-

se as possibilidades de aceitação e absorção dos ideais do grupo pelos meninos-soldado,

25

AFP. Estado Islâmico treina mais de 400 crianças para combater na Síria. G1, 24 mar. 2015. Disponível

em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/03/estado-islamico-treina-mais-de-400-criancas-para-

combater-na-siria.html>. Acesso em: 24 jan. 2016. 26

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Independent…, parágrafo 167. 27

Ibid., parágrafo 207.

Vanessa Oliveira de Queiroz

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que passam a compreender a prática de ações violentas como algo normal, próprio de

seus estilos de vida enquanto combatentes.28

Os pequenos são recrutados perto de escolas, mesquitas e áreas públicas e os

pais também são incentivados pela organização terrorista a enviarem seus filhos aos

campos de treinamento, inclusive através da oferta de dinheiro como contrapartida.29

Ao

recrutamento e à doutrinação das crianças segue-se a exposição midiática de sua

participação nos exercícios militares do EI – principalmente execuções sumárias – e nas

frentes de batalha, em uma clara estratégia de chocar e espalhar o terror.30

De acordo com as Nações Unidas, as crianças têm sido vítimas, perpetradores e

testemunhas das execuções empreendidas pelo EI. Aquelas previamente associadas a

outros grupos armados e capturadas pelo EI são decapitadas ou assassinadas por

disparos à queima roupa. Outras são treinadas e desempenham o papel de executoras.

As informações coletadas pela CIIIS demonstram que a organização terrorista

de fato prioriza o recrutamento infantil como instrumento para assegurar a adesão à sua

ideologia e a formação de combatentes fiéis, sendo a educação utilizada como principal

meio. Os métodos educacionais vêm sendo empregues como ferramenta de doutrinação,

funcionando como um catalisador do surgimento de uma nova geração de apoiadores.

Os currículos escolares têm sido alterados nesse mesmo sentido, passando a incluir

ensinamentos sobre prioridades ideológicas e armamentos. Centros de recrutamento e

campos de treinamentos para menores de dezoito anos têm sido estabelecidos nas

proximidades de instituições de ensino, como a escola de Al-Bouhtri, em Aleppo.

A CIIIS conclui, com isso, que, ao usar, recrutar e alistar crianças para papéis

de combate ativos, o EI perpetra abusos e crimes de guerra de maneira sistemática e

organizada.31

Além disso, no entender do Fundo das Nações Unidas para a Infância, há

evidências concretas e robustas de que todas as partes envolvidas no conflito em curso

no Iraque estão constantemente recrutando menores de idade.32

28

AGENCIA EFE. Estado Islâmico prioriza recrutamento de crianças para a guerra. EFE, 31 mar. 2015.

Disponível em: <https://br.noticias.yahoo.com/ucr%C3%A2nia-registra-24-candidatos-%C3%A0-

elei%C3%A7%C3%A3o-presidencial-maio-091207475.html>. Acesso em: 30 jan. 2016. 29

WESTALL, Sylvia. Islamic State Has Recruited At Least 400 Children In Syria Since January,

Monitoring Group Says. Reuters, 24 mar. 2015. Disponível em:

<http://www.huffingtonpost.com/2015/03/24/islamic-state-children_n_6929534.html>. Acesso em: 08

jan. 2016. 30

STERN, Jessica & BERGER, J. M. ISIS: The State of Terror. 1ª Ed. Ecco, 2015, 416 p. 31

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Independent…, p.10-11. 32

AGENCIA EFE. Estado Islâmico prioriza recrutamento de crianças para a guerra. EFE, 31 mar. 2015.

Disponível em: <https://br.noticias.yahoo.com/ucr%C3%A2nia-registra-24-candidatos-%C3%A0-

elei%C3%A7%C3%A3o-presidencial-maio-091207475.html>. Acesso em: 12 fev. 2016.

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Realmente, o envolvimento dos menores se mostra muito atrativo ao EI, que os

utiliza para a composição de postos de controle e como espiões ou informantes em

ações de inteligência, sendo deslocados para coletar dados principalmente nas zonas não

controladas pelo grupo, onde passam despercebidas. A situação se mostra ainda mais

grave quando são colocadas à frente de atos de violência, como assassinatos de

prisioneiros e atentados suicidas, o que vem chamando a atenção da comunidade

internacional e, em especial, motivando clamores pela abertura de investigações e

procedimentos penais pelo TPI.

4. PRIMEIROS PASSOS PARA O INÍCIO DA REPRESSÃO PENAL

O artigo 25 do Estatuto do TPI determina que uma pessoa pode ser

individualmente responsabilizada e punida caso cometa quaisquer dos crimes relativos à

jurisdição da Corte – crimes de guerra, contra a humanidade, de agressão e genocídio

(cf. arts. 6º a 8bis). Por isso, qualquer sancionamento aos membros do EI no âmbito da

Corte exigiria, precipuamente, a identificação da contribuição de eventual denunciado

para a ocorrência de crimes daquela natureza no contexto de conflitos armados

internacionais e não-internacionais nos quais o grupo atue.

No caso das condutas relativas à utilização das crianças-soldado, deve ser

demonstrada a culpabilidade dos acusados, provando-se, por exemplo, a ciência de

comandantes militares sobre as campanhas de recrutamento e treinamento de menores

empreendidas por seus subordinados ou a sua participação direta nas referidas

campanhas. A consciência dos investigados sobre a menoridade dos recrutados também

pode vir a ser objeto de análise pela Promotoria do TPI e, posteriormente, pelos juízes

da corte com o fito de verificarem o enquadramento ou não de suas condutas nos tipos

penais constantes dos dispositivos do Estatuto (item 2, alínea “b”, inciso xxvi, e item 2,

alínea “e”, inciso vii do artigo 8º).

Várias organizações internacionais já vêm conclamando o Conselho de

Segurança das Nações Unidas (CSNU) a submeter as ações do EI ao TPI e, assim,

requerer a abertura de investigações. Em diversas denúncias são apontadas evidências

de que o grupo teria empreendido atos de genocídio na tentativa de eliminar a minoria

Yazidi no Iraque, já que seus membros são vistos pelos extremistas como pagãos.33

33

NEBEHAY, Stephanie. ICC should prosecute Islamic State for Iraq Genocide, war crimes: UN.

Reuters, 19 mar. 2015. Disponível em: <http://www.reuters.com/article/2015/03/19/us-mideast-crisis-

iraq-un-idUSKBN0MF0TX20150319>. Acesso em: 12 fev. 2016.

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Adicionalmente, a Promotoria do TPI está recebendo constantes relatórios de Estados-

membros a respeito do envolvimento de indivíduos em crimes de guerra e crimes contra

a humanidade supostamente perpetrados pelo EI, especialmente em desfavor de

crianças. Em resposta, a Promotora Fatou Bensouda afirmou que seu Escritório estaria

estudando a possibilidade de formular acusações contra os combatentes.34

No que tange às possibilidades concretas de responsabilização dos integrantes

do EI pelo TPI, parece não haver dúvidas de que as provas dos atos de violência

perpetrados atualmente nos territórios do Iraque e da Síria fundamentam, no mínimo, a

caracterização de uma situação suficientemente grave para justificar a intervenção

daquela corte. Esse reconhecimento é um dos requisitos processuais de admissibilidade

dos casos submetidos à jurisdição do TPI, conforme previsto no artigo 17, item 1, alínea

“d” do Estatuto de Roma.

No mesmo sentido, qualifica-se como um reforço ao cabimento da intervenção

judicial a total ausência de esforços internos no tocante àquela responsabilização –

inclusive porque não há condições estruturais adequadas para países como a Síria

adotarem medidas com tal intuito nesse momento, devido à continuação e ao

recrudescimento das hostilidades em seus territórios.

Mesmo após vários anos de reprodução reiterada de atos criminosos

internacionais pelo EI, ainda se aguarda a instauração de uma fase de exame preliminar

no âmbito do TPI para tratar da situação. Esse procedimento está previsto no artigo 15

do Estatuto de Roma e abrange investigações realizadas pela Promotoria a partir do

material enviado por denunciantes com o fito de verificar se há base material para a

identificação de crimes. Constatando-se a seriedade das informações recebidas, a

Promotora pode determinar a coleta de dados complementares junto a Estados, órgãos

das Nações Unidas, outras organizações internacionais e ONGs, entre outras fontes

confiáveis.

Diante da documentação reunida, se entender que há fundamento suficiente em

conformidade com o que dispõe o artigo 53 do Estatuto (critérios de jurisdição,

admissibilidade e interesse de Justiça), pode a Promotora decidir pela abertura de um

inquérito, apresentando um pedido nesse sentido aos juízes do Tribunal. Então, se o

chamado juízo de instrução por parte da Câmara de Pré-Julgamento for positivo, o

34

SNYDER, Peter. ICC Prosecutor contemplating war crimes charges against Islamic State fighters:

report. Jurist, 20 nov. 2014. Disponível em: <http://jurist.org/paperchase/2014/11/icc-prosecutor-

contemplating-war-crimes-charges-against-islamic-state-fighters-report.php>. Acesso em: 12 fev. 2016.

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Tribunal autorizará a abertura de um inquérito e, assim, a Promotoria dará

prosseguimento à reunião de provas para a persecução penal.

Quanto aos atos dos integrantes do EI, para aparelhar eventual pedido de

abertura de inquérito a ser submetido ao juízo de instrução do TPI, uma importante

estratégia seria a apresentação de apontamentos sobre a participação de menores nas

suas atividades, com a juntada dos materiais divulgados pelos próprios integrantes do

grupo. Uma vez autorizada a abertura do inquérito, os depoimentos de vítimas e

testemunhas também poderiam contribuir para a instrução processual, incluindo aqueles

coletados pelo Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas – órgão esse que,

aliás, já apresentou pedido formal ao CSNU para que a situação seja submetida ao TPI

visando a responsabilização de perpetradores.35

Com efeito, as evidências de que já dispõem diversos organismos

governamentais e não governamentais, além da própria Promotoria da corte, podem ser

consideradas suficientes para aparelhar a abertura formal de investigações sobre a

sistemática geral de atuação do EI. Já no que toca à inauguração de processos judiciais

individuais, deve-se aprofundar a análise para verificar se há integrantes do grupo que

possam ser formalmente denunciados pelos crimes que envolvem as crianças-soldado.

5. DE “SHEIK INVISÍVEL” A RÉU

O relatório divulgado em fevereiro de 2015 pela CIIIS traz conclusões

expressas de seus membros no sentido de que a aplicação de sanções aos criminosos é

uma das medidas imprescindíveis para a cessação das hostilidades na Síria, seja através

da persecução doméstica ou pelo exercício da jurisdição internacional. A utilização de

armas químicas em ataques (e.g. gás de cloro), as punições cruéis (e.g. apedrejamento e

mutilação), os assassinatos, as torturas e os sequestros de membros de minorias étnicas

e religiosas somam-se aos estupros, às práticas de escravidão sexual e ao recrutamento e

uso de menores como soldados na longa lista de crimes pelos quais os membros do EI

estão sendo acusados e que são abrangidos pela jurisdição do TPI, já que cometidos em

um contexto de conflito armado.36

De forma mais específica, a CIIIS aponta que os papéis são desempenhados na

estrutura do EI com base em uma lógica de comando responsável, dentro de uma

35

NEBEHAY, op. cit., nota 64. 36

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Independent…, parágrafos 96, 102, 132,

139, 146.

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hierarquia que abrange um nível político-decisório.37

Nesse particular, destaca-se a

função exercida por Abu Bakr al-Baghdadi na estrutura organizacional do grupo,

porquanto esse indivíduo ocupa um proeminente posto de liderança militar e política,

além de participar da coordenação e condução das atividades. Pode-se presumir, assim,

sua ciência e anuência no tocante às ações desenvolvidas pelos extremistas quanto à

promoção de treinamentos e ao efetivo uso de crianças e adolescentes em práticas

militares, como as execuções veiculadas na mídia pelo próprio grupo.

Conhecido como “Sheik invisível”, al-Baghdadi costuma proferir sermões em

mesquitas e se dirige aos seus comandados usando uma máscara, para preservar sua

identidade, apesar de já existirem registros fotográficos que o identificam. Ao contrário

de seus antecessores, como Abu Musab Al-Zarqawi, o comandante rechaça a exposição,

principalmente com vistas a evitar a descoberta de sua localização.

De acordo com alguns relatos, ele teria nascido na cidade de Samarra, no norte

de Bagdá, no ano de 1971, e depois se tornado um clérigo, atuando em uma mesquita

próxima àquela cidade, inclusive durante a invasão norte-americana em 2003. Há

indícios de que agia como militante jihadista no regime de Saddam Hussein e outros no

sentido de que apenas teria se radicalizado durante os quatro anos em que foi mantido

como prisioneiro no campo Bucca, uma unidade norte-americana localizada no sul do

Iraque onde muitos comandantes da Al Qaeda foram detidos. Posteriormente, al-

Baghdadi tornou-se o líder da unidade da Al Qaeda no Iraque – unidade essa que

tempos depois se uniu a outros grupos para finalmente formar ao EI, em 2010.38

O comandante é comumente descrito pelos analistas como sendo um

estrategista, já que desenvolve táticas voltadas à manutenção de campos de batalha

altamente organizados e implacáveis, e sua reputação é considerada muito atrativa aos

jovens jihadistas.39

Há, portanto, fortes indícios de que, considerando a liderança de al-

Baghdadi quanto à organização do EI, o planejamento estratégico e o controle que

exerce sobre as ações da entidade, as práticas desenvolvidas pelos extremistas são de

seu pleno conhecimento. De sua parte, a ausência de medidas concretas voltadas à

cessação de condutas perpetradas pelos comandados quanto ao alistamento e a

37

Ibid., parágrafos 74 e 76. 38

BBC NEWS. Profile: Abu Bakr al-Baghdadi. Disponível em: <http://www.bbc.com/news/world-

middle-east-27801676>. Acesso em: 02 fev. 2016. 39

Ibid.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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utilização de crianças-soldado também pode ser considerada para fins de

responsabilização por omissão.

Há, com isso, um liame capaz de fundamentar a apresentação de denúncias à

Promotoria do TPI, para que, em seguida, seja autorizada a abertura de uma

investigação a respeito das práticas empreendidas por aquele grupo e, mais

especificamente, para que seja analisada a conduta de Abu Bakr al-Baghdadi no tocante

à admissão de pessoas menores de quinze anos como participantes dos exercícios

militares. Aliás, a CIIIS já se manifestou no sentido de que os comandantes do EI

devem ser individualmente responsabilizados pelos crimes em questão, atraindo-se a

competência do TPI e de outros mecanismos de responsabilização internacional.40

Para isso, a Promotoria deve atuar no sentido de reunir informações que

evidenciem a materialidade e a autoria das condutas criminosas, de maneira que seja

possível identificar perpetradores. Feito isso, futuramente o Tribunal poderá expedir

contra os mesmos mandados de prisão e, uma vez capturados, seus testemunhos serão

capazes de esclarecer a cadeia de comando interna, inclusive para demonstrar a ciência

de al-Baghdadi e de outros líderes sobre as táticas empregues, como a utilização de

crianças e adolescentes como soldados.

Contudo, é necessário reconhecer que, conquanto o TPI tenha historicamente

abraçado em sua jurisprudência a estratégia de persecução baseada na prestação de

contas por parte dos principais comandantes dos grupos armados, à Promotoria ainda

incumbe o ônus de provar a culpabilidade dos acusados, demonstrando o nexo de

causalidade específico entre suas condutas e as infrações cometidas. É que,

tradicionalmente, os líderes têm sido considerados como sendo aqueles que possuem as

maiores responsabilidades pelos mais sérios crimes praticados em contextos de conflito,

motivo pelo qual são alvos dos principais casos julgados no âmbito daquela corte. Por

outro lado, a Promotoria vem se esforçando no sentido de alterar a estratégia de

persecução para alcançar perpetradores de níveis hierárquicos inferiores, de modo a

reunir dados robustos para guarnecer processos futuros contra os mais graduados.41

Assim, antes de al-Baghdadi tornar-se o foco das investigações, podem as ações de

outros integrantes do EI vir a ser objeto de inquéritos penais.

40

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Independent…, parágrafos 78 e 82. 41

TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL. Office of the Prosecutor. Strategic Plan – June 2012-2015.

11 out. 2013, p.14, parágrafo 22. Disponível em: <http://www.icc-

cpi.int/en_menus/icc/structure%20of%20the%20court/office%20of%20the%20prosecutor/policies%20an

d%20strategies/Documents/OTP-Strategic-Plan-2012-2015.pdf>. Acesso em: 05 jan. 2016.

Vanessa Oliveira de Queiroz

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6. ALGUNS DESAFIOS AO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO PENAL

INTERNACIONAL

A competência do TPI para processar e julgar indivíduos não pode ser exercida

sobre qualquer caso hipoteticamente enquadrável nos tipos penais afetos à sua

jurisdição. Particularmente, em relação às infrações supostamente cometidas por

componentes do EI, o CSNU deve, o quanto antes, referir a situação do Iraque e da Síria

ao TPI.

Isso porque, como já mencionado, os países em questão, nos quais são

praticados a maioria dos atos criminosos pelo grupo, não são partes do Tratado de Roma

– o que exige, como alternativa, a submissão pelo CSNU. Tal referência só não será

necessária caso sejam identificados perpetradores nacionais de Estados Partes ou, ainda,

se a Síria ou o Iraque aceitarem o exercício da jurisdição do TPI de forma ad hoc (cf.

arts. 12 e 13 do Estatuto). Cabe ressaltar, quanto a isso, que investigadores do Conselho

de Direitos Humanos das Nações Unidas vêm conclamando o Iraque a aderir ao Tratado

de Roma42

, diante do que os crimes cometidos no território do país poderiam ser

amplamente investigados e os autores processados internacionalmente, sem a

necessidade de atuação prévia do CSNU.

De acordo com a sistemática prevista do Estatuto, a situação eventualmente

instaurada para investigação pela Promotoria não poderá abranger as ações do EI de

forma exclusiva, pois já restou expresso na jurisprudência do TPI que, para preservar a

objetividade das investigações e dos processos penais da Corte, é preciso definir

parâmetros gerais, sob aspectos temporais, territoriais e pessoais, quando cabível.43

Assim, as condutas de outros grupos armados estatais e não estatais envolvidos nos

conflitos em curso naqueles dois países poderão ser alvos de futuras acusações.

Entretanto, não se pode deixar de lado a preocupação manifestada por alguns

analistas quanto à viabilidade jurídica do TPI voltar-se às ações do EI, autorizando a

abertura de um exame preliminar e posteriormente conduzindo investigações e a

persecução penal. Para Carsten Stahn, por exemplo, a intervenção do Tribunal poderá

ser um obstáculo no caminho dos esforços internacionais de combate ao grupo, ao invés

de parte da solução para o problema da segurança humana nas regiões alcançadas pelos

42

NEBEHAY, op. cit., nota 64. 43

TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL. Decision on the applications for participation in the

proceedings of VPRS 1, VPRS 2, VPRS 3, VPRS 4, VPRS 5 and VPRS 6. 17 jan. 2006, p. 17, parágrafo

65. Disponível em: <http://www.icc-cpi.int/iccdocs/doc/doc183441.PDF>. Acesso em: 09 jan. 2016.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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atos terroristas.44

Ademais, alguns críticos preocupam-se com a possibilidade de o

indiciamento de líderes do grupo vir a ser identificado como uma tentativa forçada de

criminalização do EI – uma espécie de condenação simbólica –, o que prejudicaria a

credibilidade da Promotoria e poderia abastecer ainda mais as tensões entre os grupos

combatentes.45

De acordo com essa abordagem, haveria uma clara dificuldade de identificação

dos indivíduos diretamente responsáveis, o que forçaria uma estratégia inadequada de

persecução penal, a saber, a denúncia genérica de líderes, sem a especificação de suas

respectivas contribuições para as práticas criminosas.46

Logo, seria preciso cautela ao se

utilizar da persecução penal como estratégia de gerenciamento dos conflitos armados

em curso, até mesmo porque, segundo Carsten, o alcance da paz possuiria pouca

conexão com esforços de responsabilização penal individual. O exercício da jurisdição

do TPI só seria viável, para o autor, caso se mostrasse possível empreender uma

investigação independente, efetiva e objetiva sobre os crimes, o que dependeria, em

grande medida, de uma postura colaborativa dos governos sírio e iraquiano.47

De fato, o enfrentamento ao grupo terrorista EI depende de uma ampla

estratégia de prestação de contas, podendo incluir esforços internos de

responsabilização através de estruturas judiciais locais ou, ainda, o estabelecimento de

câmaras mistas de julgamento, integradas por especialistas nacionais e internacionais,

em formato análogo àquele adotado pelo Tribunal Especial para Serra Leoa. Contudo, a

possibilidade de exercício da jurisdição subsidiária do TPI não deve ser descartada

apenas com base em cálculos políticos.

Isso porque é preciso respeitar a neutralidade e imparcialidade da Promotoria

da Corte, que deve poder analisar com objetividade todas as informações que lhe são

submetidas. Nesse caso, não se mostra coerente exigir da Promotoria que oriente suas

44

Sobre a interseção entre os esforços de paz e o exercício da jurisdição penal internacional, ver

ROBINSON, Darryl. The International Criminal Court. In MCRAE, Robert Grant III; HIBERT, Don.

Human Security and the New Diplomacy: Protecting People, Promoting Peace. Montreal: McGill-

Queen´s University Press, 2001, p.170-177; e LAUREN, Paul G. From Impunity to Accountability:

Forces of Transformation and the Changing International Human Rights Context. In: MALCONTENT,

Peter; THAKUR, Ramesh (Org.). From Sovereign Impunity to International Accountability: The Search

for Justice in a World of States. Tóquio: United Nations University Press, 2004, pp. 15-41. 45

STAHN, Carsten. Why the ICC should be cautious to use the Islamic State to get out of Africa: part 1.

Ejil Talk, 03 dez. 2014. Disponível em: <http://www.ejiltalk.org/why-the-icc-should-be-cautious-to-use-

the-islamic-state-to-get-out-of-africa-part-1/>. Acesso em: 25 jan. 2016. 46

STAHN, Carsten. Why the ICC should be cautious to use the Islamic State to get out of Africa: part 2.

Ejil Talk, 04 dez. 2014. Disponível em: <http://www.ejiltalk.org/why-the-icc-should-be-cautious-to-use-

the-islamic-state-to-get-out-of-africa-part-2/>. Acesso em: 25 jan. 2016. 47

STAHN, op.cit., nota 76.

Vanessa Oliveira de Queiroz

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decisões no que tange à abertura ou não de inquéritos por considerações alheias àquelas

relativas ao exame dos critérios de admissibilidade previstos no Estatuto do Tribunal.

De qualquer modo, como prevê o primeiro dos chamados Princípios de

Chicago de Justiça Pós-Conflito, os Estados possuem o dever de processar todos os

indivíduos envolvidos na prática de violações ao DIH. Tal obrigação pode ser cumprida

no escopo das instituições domésticas ou, ainda, através da criação de tribunais penais

internacionais e tribunais mistos (nacionais e internacionais).48

As vítimas daquelas

infrações não podem se tornar reféns de estratégias políticas, sendo forçadas a

concordar com medidas voltadas a acelerar processos de paz com base no afastamento

da responsabilização penal individual, como é o caso das anistias gerais e irrestritas.

Aliás, admitir a impunidade dos perpetradores sob a justificativa de que sua persecução

poderia desacelerar processos de paz e ocasionar novas tensões não seria coadunar com

mais um ato de terrorismo?

Por isso, em que pese o acerto dos argumentos supracitados no sentido de que a

responsabilização penal internacional dependerá da individualização das condutas, a

atuação do TPI não pode ser completamente rechaçada antes mesmo de iniciado um

exame preliminar e a abertura oficial de um inquérito. Através desses procedimentos,

será dada ampla publicidade e conhecimento à comunidade internacional sobre o

material coletado. Essa ação contribuirá, ademais, para a mobilização de novas

estratégias de combate àquele grupo terrorista e a todos os Estados e organismos que de

alguma maneira financiam os atos de violência.

Ao mesmo tempo, pode-se pensar em alternativas à atuação do TPI. É que,

diante de eventuais dificuldades para a apresentação de indivíduos denunciados perante

a corte – considerando ser o comparecimento dos acusados condição imprescindível

para o início dos julgamentos –, seja em virtude de seu paradeiro ou por ausência de

cooperação dos Estados para a sua entrega, o recurso à promoção de iniciativas

nacionais de prestação de contas surge como importante ferramenta para se evitar a

impunidade.

Quanto a isso, deve-se incentivar a adoção de esforços judiciais baseados nas

estruturas institucionais já existentes ou por meio da criação de câmaras ad hoc para

julgamentos especiais. Nesse caso, eventuais investigações e processos seriam

48

BASSIOUNI, M. Cherif. The Chicago Principles on post-conflict justice. Chicago: International

Human Rights Law Institute (IRLHI), 2008, p.3, 29-30.

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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fundamentados com base nas legislações domésticas vigentes e nas leis humanitárias e

penais internacionais pelas quais se obrigaram os Estados – no caso a Síria e o Iraque.

Além disso, há a possibilidade de adoção de estratégias não judiciais, como acordos de

anistia individuais.

Em caráter subsidiário, diante de uma possível exaustão de remédios locais ou

negligência das autoridades nacionais em adotá-los, o exercício da chamada jurisdição

universal também se apresenta como meio para a responsabilização. Esse instrumento

jurídico envolve a persecução penal por tribunais de outros Estados que não aqueles

onde ocorrem os crimes ou dos quais os autores sejam nacionais, sempre diante de

perpetradores de infrações consideradas de maior gravidade pela comunidade

internacional, como aqueles responsáveis por atos de genocídio. Trata-se de claro

incentivo à ampliação do acesso à justiça internacional.

O reconhecimento dos indivíduos como sujeitos do Direito Internacional

implica a necessidade de lhes conferir mecanismos para fazer valer seus direitos,

particularmente quando figuram como vítimas de violações a regras materiais daquele

ordenamento jurídico. O meio mais fundamental nesse sentido é o chamado direito de

ação ou petição (jus standi in judicio), que permite não apenas o acesso de indivíduos às

cortes internacionais, como as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos –

ainda que por instituições intermediárias, como a Comissão Interamericana de Direitos

Humanos49

–, como também a cortes de outros países que não aqueles dos quais são

nacionais. Nessa última hipótese, o conhecimento de demandas propostas por cidadãos

estrangeiros pode constituir-se como mais um instrumento de combate a situações de

desrespeito às obrigações internacionais relativas à proteção aos direitos humanos e as

de caráter humanitário, em especial as chamadas jus cogens (normas imperativas ou

peremptórias de DI).

Não obstante ainda depender de desenvolvimentos jurisprudenciais e

legislativos internacionais50

e nacionais para sua incidência ser considerada legítima e

49

A intermediação pela Comissão está prevista no artigo 61 da Convenção Americana sobre Direitos

Humanos. Apesar disso, os indivíduos podem apresentar queixas e denúncias diretamente ao órgão ou

através de representantes, como ONGs, e, ainda, participar de todo o processo eventualmente instaurado

na corte, endereçando à mesma argumentos e provas de forma autônoma, de acordo com a permissão

outorgada pelo Regulamento do Tribunal, em seu artigo 25. 50

Sobre isso, cumpre informar que a Corte Internacional de Justiça (CIJ) e a CEDH possuem precedentes

no sentido de que o princípio do par in parem non habet imperium (isonomia interestatal) não pode ser

excepcionado para permitir o exercício da jurisdição doméstica contra autoridades de outros Estados em

relação a causas cíveis, ainda que estas estejam relacionadas a atos de tortura, prevalecendo o princípio da

imunidade de jurisdição estatal. Nesse sentido, destacam-se os casos Al-Adsani v. The United Kingdom

(CEDH) e “Imunidades do Estado, Alemanha v. Itália, Grécia intervindo” (CIJ).

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legal, a jurisdição universal pode ser mais um instrumento utilizado para a repreensão a

graves situações de desrespeito a leis humanitárias internacionais – seja no campo penal

ou no cível –, inclusive no tocante às violações objeto do presente estudo, das quais os

extremistas do EI são protagonistas. Assim, caso a jurisdição do TPI não seja exercida

em determinado caso, em virtude da não entrega de um indivíduo investigado, por

exemplo, ou mesmo pelo reconhecimento da insuficiência de provas pela Promotoria da

corte para seu indiciamento, o Estado em que o mesmo se encontre poderia lançar mão

de sua estrutura doméstica de responsabilização para processá-lo e julgá-lo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em territórios sírios e iraquianos, a organização terrorista EI vem executando

inúmeros atos massivos de violência, muitos dos quais constituem infrações tipificadas

como crimes no Estatuto do TPI. O grupo, sob o comando do líder religioso Abu Bakr

al-Baghdadi, assume a autoria de inúmeros sequestros e assassinatos de civis, além de

buscar a disseminação do terror através da transmissão de vídeos que retratam

explicitamente os atos criminosos.

Suas ações chocam a comunidade internacional também em função do uso

sistemático de pessoas menores de dezoito anos como soldados. Crianças e adolescentes

são recrutados, alistados, participam de treinamentos militares e são envolvidos

diretamente nas atividades violentas do grupo, como execuções sumárias. O EI forma,

assim, um novo exército de combatentes jovens, capazes de reproduzir os ideais da

entidade de forma indiscriminada, considerando a facilidade com que são doutrinados.

Como visto, seja no âmbito de um conflito armado internacional ou em

cenários de guerras internas, o recrutamento, o alistamento e o uso de pessoas menores

de idade para participação ativa em hostilidades são condutas classificadas como crimes

de guerra pelo Estatuto do TPI, em seu artigo 8º. Logo, as práticas empreendidas por

integrantes do EI nesse sentido se enquadram na competência material daquela corte,

motivo pelo qual, em tese, seria possível o exercício de sua jurisdição sobre os fatos em

questão.

Ainda assim, a instauração de um exame preliminar pela Procuradoria do TPI

dependeria do reconhecimento da competência territorial do órgão ou, ainda, de sua

competência em razão da nacionalidade dos perpetradores. A princípio, isso só seria

Os “filhos” do Estado Islâmico: um novo caso para o Tribunal Penal Internacional?

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possível em relação a violações ocorridas em regiões de Estados Partes do Tratado de

Roma ou quanto àquelas praticadas por cidadãos nacionais desses Estados.

Não obstante isso, os dois principais países em cujos territórios o EI concentra

suas atividades – a Síria e o Iraque – são Estados não-Partes. Desse modo, pelos fatos

aqui narrados, o início das investigações sobre a situação daqueles países demandaria

uma referência pelo CSNU ou a aceitação ad hoc da jurisdição da Corte pelos

respectivos governos. Nessa última hipótese, o tribunal poderia exercer sua competência

até mesmo em relação aos crimes cometidos antes da entrada em vigor do Estatuto

relativamente àqueles países, o que também poderia ocorrer caso decidam aderir ao

Tratado de Roma e se tornarem Partes, conforme o que estabelece os artigos 11 e 12

daquele diploma, desde que houvesse uma declaração expressa de consentimento nesse

tocante.

Há uma grande expectativa, portanto, no sentido de que em breve a Promotoria

possa efetivamente instaurar um exame preliminar sobre os fatos supracitados, seja por

iniciativa própria ou a partir de denúncias por Estados Partes e pelo CSNU, uma vez

preenchidos os requisitos mencionados no parágrafo anterior. Iniciada a investigação, os

vídeos e demais postagens de autoria daquele grupo terrorista poderiam ser reunidos

para compor o conjunto fático-probatório a ser carreado aos autos de futuros processos

penais a serem conduzidos no âmbito do TPI.

Em consequência, tornar-se-ia possível a expedição de mandados de prisão e a

entrega de cidadãos como al-Baghdadi, para que permaneçam à disposição da Justiça

internacional em caso de eventual persecução. A detenção e a transferência de

extremistas para a custódia do TPI contribuiriam, ademais, para a desarticulação

daquela organização e até mesmo para a prevenção de novas práticas criminosas.

Algumas dificuldades podem ser enfrentadas pela Promotoria para a

identificação dos perpetradores e para a coleta de evidências que atestem o nexo de

causalidade entre as suas condutas e o recrutamento, o alistamento e a participação dos

menores nas hostilidades. No entanto, com a colaboração dos governos sírio e iraquiano

– além de outros Estados, em particular os vizinhos – e a participação de vítimas,

comunidades, organizações internacionais e ONGs, os obstáculos poderiam ser

transpostos para a montagem do acervo probatório, de modo que, no decorrer da

persecutio criminis in judicitio, as teses acusatórias ganhassem força no sentido de

demonstrar a responsabilidade penal individual dos réus.

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Como foi demonstrado, as recentes notícias veiculadas pela mídia internacional

a respeito do envolvimento de menores nos atos terroristas do EI são apenas mais um

grave capítulo do fenômeno das crianças-soldado. O TPI tem atuado efetivamente no

tocante à luta contra a impunidade relativa a esse fenômeno e expandido suas frentes de

atuação. A confirmação da condenação de Lubanga Dyilo pela Câmara de Apelação em

2014, o deslocamento recente de juízes que acompanham o caso de Ntaganda até as

regiões onde os crimes foram supostamente cometidos, e a entrada em vigor do Estatuto

de Roma para a Palestina são exemplos recentes da potencialidade do alcance da

jurisdição da corte como instrumento de promoção da justiça internacional.

Reconhece-se, por conseguinte, que o Direito Penal Internacional avança

paulatinamente para tentar evitar uma reprodução ainda maior de práticas criminosas

caracterizadas como crimes internacionais, não apenas através de estratégias de

proibição normativa, como por meio de esforços de responsabilização, afastando a

impunidade dos perpetradores. A instauração de um exame preliminar, seguida da

abertura de um inquérito e, por fim, a persecução criminal a al-Baghdadi e a outros

integrantes do EI por crimes de guerra envolvendo o recrutamento infantil seria mais

um passo considerável no mesmo sentido.

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