os elementos da comunicaÇÃo plena: linguÍstica e linguagens aplicadas À mensagem audiovisual

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1 AVM - FACULDADE A VEZ DO MESTRE LEONARDO MICHEL ROCHA STOPPA OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL Brasília Novembro de 2015

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É vencido o tempo em que o aparato tecnológico servia de justificativa para a imposição da qualidade dos produtos audiovisuais. Derrubado o oligopólio dos canais cine-televisivos, blogueiros e youtubers, derrotam milionários estúdios de televisão, municiados de câmera de celular e iluminação ambiente. Fica claro que ao telespectador, mais importante que o “por de traz” das câmeras, está o emissor e a credibilidade da mensagem. Teorizando sobre os mecanismos das linguagens da comunicação humana, várias correntes de estudos se desenvolveram - tanto no campo verbal, quanto no campo não verbal – buscando desta forma entender como as mensagens são transmitidas e percebidas por emissor e destinatário. A correta utilização do conhecimento em estado da arte acerca da comunicação humana é uma poderosa ferramenta nas mãos do comunicador, e, em se tratando de comunicação em massa, já não é opção, mas requisito básico a todo ator, orador e mesmo diretor de cena.

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Page 1: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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AVM - FACULDADE A VEZ DO MESTRE

LEONARDO MICHEL ROCHA STOPPA

OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

Brasília

Novembro de 2015

Page 2: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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AVM - FACULDADE A VEZ DO MESTRE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

LEONARDO MICHEL ROCHA STOPPA

OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

Leonardo Michel Rocha Stoppa

Trabalho apresentado à Faculdade AVM

Faculdade Integrada, como requisito

parcial para a obtenção do Grau de

Especialista em Língua Portuguesa.

Orientador: Prof. João Francisco Sinott Lopes

Brasília

Novembro de 2015

Page 3: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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TERMO DE COMPROMISSO

O aluno Leonardo Michel Rocha Stoppa, abaixo assinado, do curso de Língua Portuguesa da Faculdade AVM, declara que o conteúdo do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado ‘OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL’, é autêntico, original e de sua autoria exclusiva.

Brasília, 20 de Novembro de 2015

Leonardo Michel Rocha Stoppa

Page 4: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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Dedicatória

Aos meus mestres Helvécio Ratton e Simone Matos.

Page 5: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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AGRADECIMENTOS

Ao casal Suby e Sinnen pelo grande apoio.

Ao amigo Izak Orlando, por suas lições sobre o gerúndio.

Ao amigo Theo Filho por sua contribuição em meu ‘laboratório’ em expressões

faciais e linguagem do corpo.

A minha tia Socorro, por ter elogiado meu texto quando eu era criança.

Page 6: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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RESUMO É vencido o tempo em que o aparato tecnológico servia de justificativa para a

imposição da qualidade dos produtos audiovisuais. Derrubado o oligopólio dos

canais cine-televisivos, blogueiros e youtubers, derrotam milionários estúdios de

televisão, municiados de câmera de celular e iluminação ambiente. Fica claro que ao

telespectador, mais importante que o “por de traz” das câmeras, está o emissor e a

credibilidade da mensagem. Teorizando sobre os mecanismos das linguagens da

comunicação humana, várias correntes de estudos se desenvolveram - tanto no

campo verbal, quanto no campo não verbal – buscando desta forma entender como

as mensagens são transmitidas e percebidas por emissor e destinatário. A correta

utilização do conhecimento em estado da arte acerca da comunicação humana é

uma poderosa ferramenta nas mãos do comunicador, e, em se tratando de

comunicação em massa, já não é opção, mas requisito básico a todo ator, orador e

mesmo diretor de cena.

Palavras-chave: Linguagem do corpo, oratória, audiovisual, Televisão, Cinema.

Page 7: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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ABSTRACT

It was the time when the technological apparatus served as justification for the

imposition of the quality of media products. Brought down the oligopoly of cine-

television channels, bloggers and youtubers defeat millionaire television studios

using cell phone camera and ambient lighting. Clearly, for the viewer - more

important than what happens behind the scenes - is the speaker and the credibility of

the message. Theorizing about the mechanisms of the languages in human

communication, several studies - both verbal field, as nonverbal field – are seeking in

this way to understand how messages are transmitted and perceived by sender and

the audience. The correct use of the actual knowledge about the human

communication is a powerful tool in the hands of who relies on communication, and,

in the case of mass communication, is no longer choice, but basic requirement to

every actor, speaker and the director of scene.

Keywords: body language, speech, media, TV, Movies.

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SUMÁRIO

REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................ ......10 1 - INTRODUÇÃO ......................................................................................................... ......11 2 - EXPERIÊNCIA DE CAMPO E PESQUISA BIBLIOGRÁFICA 2.1 - CAPÍTULO 1: A MOTIVAÇÃO PESSOAL DO AUTOR

2.1.1 - A tendência atual da produção audiovisual............................................... ......13 2.1.2 - A minha experiência de campo................................................................... ......14 2.1.3 - A campanha municipal de Belo Horizonte em 2008.................................. ......16 2.1.4 - A campanha municipal de Belo Horizonte em 2012................................... ......17

2.2 - CAPÍTULO 2: RESUMO HISTÓRICO 2.2.1 - O Estudo da Linguagem Verbal.................................................................... ......19

2.2.1.1 - Retórica e Oratória................................................................................ ......20 2.2.1.2 - A Linguística e a Análise do Discurso................................................. ......20 2.2.1.3 - As teorias das comunicações.............................................................. ......21 2.2.1.4 - As possibilidades sintáticas e sua relação com a credibilidade...... ......22

2.2.2 - O Estudo da Proxémica.................................................................................... ......23 2.2.3 - O Estudo da Cinésica.................................................................................... ......23

2.2.3.1 - Os estudos de Darwin........................................................................... ......24 2.2.3.2 - O corpo fala............................................................................................ ......24 2.2.3.3 - Os estudos de Ekman............................................................................ ......24

2.3 - CAPÍTULO 3: Aplicação 2.3.1 - Limite do escopo........................................................................................... ......25 2.3.2 - Controlando a componente verbal............................................................... ......26

2.3.2.1 - Estruturas frasais a serem evitadas.................................................... ......26 2.3.2.2 - Ritmo, pausas e coerência vocálica..................................................... ......27

2.3.3 - Controlando a componente Proxémica....................................................... ......27 2.3.4 - Controlando a componente cinésica........................................................... ......29

2.3.4.1 - Comportamento Postural...................................................................... ......30 2.3.4.2 - Gesticulação........................................................................................... ......32 2.3.4.3 - Emblemas............................................................................................... ......33

2.3.5 - Recapitulando............................................................................................... ......33 3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... ......34 4 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................... ......36

Page 9: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURAS 1 A indumentária do presidente Lula antes e após Duda Mendonça.................... ........28 2 Os animais Águia, Leão e Boi representando a personalidade humana........... ........30 3 A mensagem emitida pelo abdômen............................................................... ........31 4 A mensagem emitida pelo tórax...................................................................... ........31 5 A mensagem emitida pela cabeça...................................................................... ........32 TABELAS 1 Presidenciáveis na opinião das crianças de 9 a 12 anos................................ ........29

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REFERENCIAL TEÓRICO

Este trabalho parte da experiência profissional do autor no campo do audiovisual,

motivo pelo qual será sobre essa o primeiro capítulo do mesmo. Na sequência, será

feito um breve histórico sobre os estudos relativos à comunicação humana. Será

demonstrado que há muito tem-se estudado acerca da oratória, o dom das palavras,

posteriormente a linguística que abriu as portas à estilística e paralelamente

possibilitou o nascimento das Teorias das Comunicações. Concomitante à evolução

da linguística, iniciaram-se os estudos a respeito da comunicação não verbal de

ordem ambiental, dando significados psíquicos a cores e formas, buscando com isso

prever as mensagens convencionadas por aqueles. A Comunicação verbal, cuja

pesquisa bibliográfica apresentará como a articulação de palavras pode delinear a

intenção discursiva da mensagem, teve como fonte “Frogs into princes” (Richard

Bandler e John Grinder), cujo conteúdo aborda neolinguística e comunicação

assertiva. Citações de exemplo serão feitas à obra “Never be lied to again”, (David

Lieberman) cujo conteúdo aborda, entre outros, a estruturação sintática e a

articulação textual em relação à credibilidade da mensagem. A comunicação não

verbal ambiental, primeiramente utilizada em fábricas com o intuito de criar climas

favoráveis ao conforto físico durante longas jornadas de produção, atualmente faz

parte dos livros de fotografia, arquitetura e design de interiores. Esta pesquisa fará

uso de várias obras, dentre as quais se destaca como a mais importante por abordar

diretamente a comunicação coerente, a dissertação de mestrado ‘Comunicação não-verbal - A influência da indumentária e da gesticulação na credibilidade do comunicador’, de Maria de Fatima Moura Ribeiro. O tema linguagem do corpo terá

seu embasamento científico partindo de “O corpo fala” (Pierre Wieil) por ser o mais

popularmente conhecido trabalho sobre esse assunto, sendo usado para referenciar

teorias relacionadas às mensagens posturais. A coleção de Paul Ekman, dentre eles

“Emotions revealed” e “Unmasking the faces” será referenciada principalmente nos

assuntos relacionados a emblemas e mensagens emitidas pela musculatura facial.

Por fim, será feita a fusão das informações relativas à aplicação de cada um dos

níveis da comunicação previamente mencionadas, todas juntas objetivando a

coerência da mensagem principal. O termo coerência extrapolará a aplicabilidade

verbal e buscar-se-á estabelecer a necessidade de harmonia entre os três níveis de

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linguagem para o efetivo cumprimento do papel da mensagem. Por tratar-se de um

capítulo de aplicação prática dos conteúdos anteriores, as referências serão as

mesmas, cada uma em sua área de aplicabilidade conforme mencionadas

anteriormente.

1 - INTRODUÇÃO

Este trabalho, cuja motivação advém da vivência profissional do autor, parte da

narrativa testemunhal de 3 campanhas políticas, onde os elementos hora

apresentados puderam ser observados e comparados contra as teorias propostas.

Tomando o resultado dos eventos como o resultado das citadas observações, as

narrativas apresentarão as ações e respectivos desencadeamentos de resultados

que motivaram a percepção da correlação entre a coerência comunicativa junto da

resposta publica para as campanhas narradas. A correlação entre os fatos

observados e os resultados das campanhas, então motivadores das pesquisas aqui

propostas, serão apresentados mas limitando-os à motivação do estudo e não

colocando-os na qualidade de efeitos imediatos destas teorias, já que muitos são os

fatores que influenciam na decisão por parte do eleitorado.

Num segundo momento será feita exposição bibliográfica acerca do ‘estado da arte’

das teorias que envolvem a comunicação humana, expondo primeiramente os

trabalhos gregos a respeito da oratória, passando pelas teorias do discurso político.

No século XIX, a linguística nasce com os estudos de Saussure e um tímido estudo

começa a ser desenvolvido no campo da comunicação não verbal através das

observações de Darwin. Dando sequência aos estudos da linguística, outras teorias

continuam a ser escritas no sentido de entender os mecanismos da comunicação

verbal. Nascem propostas paralelas que abordam desde a existência de um

‘embrião linguístico comum’ à possibilidade da modelagem matemática dos

mecanismos do discurso. Divididas em Linguística, Estilística, Análise do Discurso,

Teorias das Comunicações, Neolinguística entre outras, as formas de estudar a

linguagem verbal evoluíram rapidamente nos últimos séculos e um grande

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arcabouço teórico já permite a sintetização destes estudos para uma finalidade

comum. No campo da comunicação não verbal, a revolução industrial atuou como

impulsionadora de experimentos sobre o controle ambiental. Buscando criar climas

favoráveis à produtividade, estudos foram feitos desde o ajuste da luminosidade à

escolha de cores. Num momento posterior, o conhecimento adquirido foi expandido

no sentido de ativar a mente humana de forma a potencializar os objetivos

pretendidos. Extrapolando as fronteiras das fábricas, iluminação, cores e formas são

utilizadas hoje tanto para a criação de ambientes como para a perpetuação de

estilos. As teorias da comunicação ambiental passam a ser usadas também no

design de produtos, na criação de marcas e principalmente na indústria cine

televisiva. Em outra vertente, mais permeadas por estudos relacionados ao campo

da psicologia, pesquisas começam a delinear de forma mais contextualizada, a

comunicação não verbal advinda da linguagem do corpo. Apesar de ‘O corpo fala’

ser um conhecido trabalho acerca deste assunto dada à sua linguagem popular, a

coleção de Paul Ekman é o mais completo arcabouço científico a respeito da

comunicação não verbal humana. Seu estudo nasceu de um extenso número de

pesquisas que demonstraram principalmente a universalidade das mensagens do

corpo, o que acabou por afirmar a existência de uma linguagem humana comum. A

comprovação de sua tese fundamentou-se no conjunto de experiências realizadas

em comunidades isoladas, derrubando uma possível contradição a respeito do

aprendizado das expressões faciais por meio da mídia ou afins.

Para finalizar, será demonstrada a forma como todas as teorias apresentadas

anteriormente convergem no sentido de proporcionar coerência no enunciado como

um todo. Serão descritas sugestões de potencialização da mensagem, fazendo uso

desde cores, formas, assim como a correta harmonização da mensagem verbal com

a mensagem convencionada pelas linguagens ambientais e a linguagem do corpo.

Sugestões de postura corporal, estruturação sintática e escolha de vestimenta e

componentes ambientais comporão o núcleo deste capítulo que contrastará assim

os resultados de algumas das possíveis combinações.

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2 - EXPERIÊNCIA DE CAMPO E PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

2.1 - A MOTIVAÇÃO PESSOAL DO AUTOR.

O conjunto de estudos relacionados à comunicação humana é, sem dúvidas, um

recurso de extrema aplicabilidade nos campos do audiovisual. Consciente dos níveis

responsáveis pela coerência da mensagem, o emissor, seja esse um ator,

apresentador, palestrante ou mesmo um político, faz com que a comunicação atinja

seu auge, obtendo como resultado a credibilidade da mesma por parte do receptor.

Foi trabalhando como técnico de audiovisual que tive a oportunidade de testemunhar

o sucesso da aplicação da coerência comunicativa, objeto de estudo deste trabalho.

A partir de então, dediquei-me à leitura de muitas obras sobre o tema e fui me

tornando cada vez mais observador das nuances relacionadas ao resultado

comunicativo nos veículos de mídia cine-televisivas. Como este trabalho nasce da

minha experiência pessoal em campo, dedico esta primeira parte a uma pequena

narrativa da mesma. Aqui relato brevemente casos de sucesso e derrotas que,

apesar de não comprovadamente ligados aos motivos aqui descritos, serviram-me

de incentivo para aprofundar estudos sobre o tema.

2.1.1 - A tendência atual da produção audiovisual

Durante muito tempo as produtoras utilizaram as barreiras financeiras como limiar

determinante da qualidade de um produto audiovisual. Como eram limitados os

canais, não se discutia o real alcance de um produto. O mercado entendia como

respeitáveis apenas aqueles produtores que possuíam os mais caros equipamentos.

Hoje, com o advento do Youtube, ‘blogueiros’ alcançam milhões de acessos

gravando com um celular e a luz do próprio quarto, que nesta ocasião se transforma

em estúdio. Um dos primeiros profissionais consagrados de televisão a adotar o

formato livre da ‘jaula financeira’ foi Ana Paula Padrão. Em seu projeto ‘Escola de

Você’ a jornalista transmite de casa, usando webcam e atinge com isso milhões de

acessos em todo mundo. Pergunta-se então: Qual o segredo do sucesso na

comunicação audiovisual? Se não são os milhões antes consumidos em luz, câmera

e ação, onde estaria o ingrediente da comunicação assertiva humana, a

comunicação que não somente faz com que um enunciado se torne crível, mas que

aumenta consigo a credibilidade do próprio enunciador?

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2.1.2 - A minha experiência de campo

Durante aproximadamente seis anos fui técnico do cineasta Helvécio Ratton,

exercendo dentre outras, a função de editor de vídeo. Cheguei à Quimera Filmes no

momento em que a produtora encerrava o documentário intitulado ‘Vila Viva’, cujo

cliente era a Prefeitura de Belo Horizonte. Naquele trabalho, minha função resumia-

se em efetuar, orientado pelo diretor, os cortes das entrevistas que fariam a linha

narrativa do produto.

Vistas tecnicamente, todas as falas de um documentário são apenas trechos de

mídia a serem organizadas pelo editor a fim de dar uma certa coerência à história

narrada, porém, se analisadas um pouco mais a fundo, são produtos completamente

diferentes da comunicação humana. Para gravar uma entrevista daquele

documentário, versando sobre moradores que acabavam de deixar o status de ‘sem-

teto’, bastava ao entrevistador iniciar uma pergunta e os depoimentos nasceriam

fruto de extrema verdade, assim como qualquer tentativa de manipular a verdadeira

emoção vivida resultaria em um depoimento inferior. Ao prefeito porém, cabia a

função de proferir um pronunciamento advindo de um texto prescrito, lendo um ‘tele-

prompter’ posicionado em frente à câmera, e mesmo assim, transmitir verdade

naquilo que estava sendo dito.

Quando a emissão de uma mensagem deixa seu caráter espontâneo, a figura do

diretor de cena emerge como filtro de conteúdo no sentido de evitar que o dito se

deixe prejudicar por aquilo que não deveria ser dito. Na comunicação humana, um

simples mexer de sobrancelhas, que naquele caso poderia ser fruto de uma

dificuldade de leitura do texto exibido durante a gravação, poderia ser

inconscientemente interpretado pelo receptor como uma dúvida, uma tentativa de

manipulação ou mesmo, uma mentira.

Apesar de conhecido por obras como ‘Menino Maluquinho’, ‘Batismo de Sangue’,

entre outras, Helvécio é muito requisitado como diretor de campanhas políticas,

função na qual o mesmo acumula um grande número de vitórias. Dirigindo a

gravação do depoimento de Fernando Pimentel para o documentário Vila Viva,

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Helvécio solicitou repetidas tomadas que naquele momento, ao meu ver, continham

o mesmo conteúdo, já que não apresentavam erros perceptíveis ao meu nível de

compreensão (vale ponderar que Fernando Pimentel nunca erra os textos em seus

depoimentos!). Quando com ele em ilha de edição, tive que confessar que, apesar

de terem várias tomadas, eu não me via capaz de escolher dentre elas qual era a

melhor. Sem conferir o material, Helvécio solicitou que fosse escolhida a última.

Apesar de um pouco retardada, minha conclusão acabou vindo naquele mesmo dia:

Ele não havia gravado várias tomadas para escolher a melhor, ele gravou várias

tomadas até que um determinado problema, que eu era incapaz de perceber, fosse

sanado.

A partir de então, despendi várias horas de almoço em frente ao monitor de

televisão. Enquanto eu consumia um bom miojo, aquelas tomadas do Pimentel me

consumiam. Confesso que naquele momento eu não conseguia perceber nada, nem

eu, tampouco a Ana, que foi a quem pedi a primeira ajuda naquele sentido. Lembro-

me de sua resposta quando solicitei que me mostrasse onde estava diferença entre

as tomadas e o que fazia o Helvécio escolher a última. “Eu não sei onde está a

diferença, mas sei que o Helvécio observa também a linguagem do corpo.” Apesar

de não ter esclarecido de imediato minha dúvida, aquelas palavras funcionaram

como chave para o início de minhas pesquisas e aquilo que eu considero como meu

amadurecimento na comunicação audiovisual.

‘O Corpo Fala’ foi a minha primeira leitura sobre o assunto, e é sem duvidas a que

recomendo como início para todos que se interessem pelo tema. Na sequência,

assisti às três temporadas do seriado ‘Lie to me’, cujo fundamento baseia-se na obra

de Paul Ekman, que tive a oportunidade de ler posteriormente. Com um pouco de

teoria em mente, passei a acompanhar as gravações e edições com um olhar que

percebia um pouco mais que a mensagem verbal. Confesso jamais ter perguntado

Helvécio sobre a aplicação dos conhecimentos da linguagem não verbal em seus

trabalhos de direção, mas, seja por preparação técnica, seja por uma capacidade

inata, a medida que aprofundava meus estudos e me treinava acerca do tema, mais

a minha escolha dos cortes sintonizava com as do Helvécio e cada vez mais eu

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conseguia perceber as pequenas nuances que condenavam uma tomada durante

uma gravação.

Essa experiência como editor de vídeo me possibilitou acesso a várias gravações

efetuadas para políticos, comerciais, documentários e dramas, assim como estive

presente no momento em que o mesmo decidia por essa ou aquela tomada, e o

motivo que mais decidia a qualidade de uma gravação (ou uma mensagem)

naquelas circunstâncias era o conjunto verbal e não verbal da mensagem emitidos

pelo emissor. Por verbal, entende-se a mensagem previamente composta em

conjunto com a forma com que o pronunciamento é emitido. Neste raciocínio, a

mudança de entonação é suficiente para modificar completamente o conteúdo da

mensagem, ainda que mantidas as mesmas palavras. Por conteúdo não verbal da

comunicação corporal, entende-se os movimentos do corpo, principalmente o

conjunto de músculos da face, e por comunicação não verbal ambiental, entende-se

a escolha do lugar, o cenário, o figurino, etc.

2.1.3 - A campanha municipal de Belo Horizonte em 2008

Em 2008 a campanha para prefeito municipal de Belo Horizonte foi uma disputa

acirrada e de difícil predição. Leonardo Quintão iniciava a campanha em uma das

últimas posições enquanto Márcio Lacerda, candidato apoiado pelo ex-prefeito e

pelo governador do estado, era favorito com possibilidade de vitória em primeiro

turno. Iniciam-se as campanhas televisivas e o candidato Leonardo Quintão

aparece interpretando um ‘homem popular quase caipira’. Um candidato que

oferecia amor no lugar de administração conseguiu fazer crescer sua campanha a

ponto de levar a decisão para o segundo turno. Ao fenômeno, eu atribuiria o ‘azar-

sorte’ do partido não ter acreditado no potencial do candidato, e por isso, ter

providenciado verba que foi capaz de contratar apenas uma produtora menos

cobiçada. O nome da produtora é ‘Sala-2’, e os garotos usaram o ingrediente

inteligência para combater a verba gorda dos adversários. Menciono sorte-azar

porque se o partido imaginasse a possibilidade de vitória, certamente teria investido

em produtoras consagradas do mercado, que, uma vez mecanizadas, jamais teriam

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lançado mão à inovação de criar o personagem que fez de Leonardo Quintão quase,

quase prefeito (porque ainda estamos no segundo turno.)

No segundo turno da campanha, Helvécio Ratton foi contratado para direção das

gravações de Márcio Lacerda. A campanha que vinha em constante declínio frente

ao crescimento da campanha do Quintão começa a reerguer. O personagem de

Leonardo é desmascarado através de sabatinas, perguntas em debates e mesmo

virais cômicos na internet. A queda do candidato amoroso, dada a incapacidade de

sustentação do personagem em eventos ao vivo, fez estagnar a campanha de

Leonardo Quintão, mas, ao mesmo tempo, fato merecedor de destaque e passível

de verificação ainda hoje no Youtube é o conteúdo audiovisual dos programas de

Márcio Lacerda. Enquanto no primeiro turno suas aparições contemplam

incoerências advindas da linguagem do corpo, o segundo turno suprimiu totalmente

esse detalhe. Não menciono o candidato ter aprendido a falar sem se contradizer

com o corpo, mas se o fez, o público não o viu pois isso não foi ao ar.

O segundo turno, que começou praticamente empatado, encerra com Márcio

Lacerda vencendo com 59,12% dos votos válidos contra 40,88% de Leonardo

Quintão.

2.1.4 - A campanha municipal de Belo Horizonte em 2012

Além de relatar minha experiência de campo como assistente de Helvécio Ratton, é

válido comentar sobre outra campanha de grande porte que tive oportunidade de

participar e notar os mesmos detalhes sendo ignorados: Durante a campanha de

Patrús Ananias ao cargo de prefeito da cidade de Belo Horizonte, o diretor focou

esforços na qualidade visual do trabalho. Grandes verbas foram gastas em cenário,

iluminação e equipe de TV. A direção do candidato foi ignorada e a campanha,

mesmo protagonizada por um ex-prefeito que tinha apoio do então atual presidente

da república, sequer conseguiu segundo turno.

A produtora contratada na ocasião foi a Malagueta filmes, que, apesar de

condecorada pela relação política do publicitário Duda Mendonça, enviou como

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responsável pelos programas de TV o diretor Gilberto Lima. Não é de se espantar a

afirmação que o brasileiro não escolhe profissional por adequação, mas por

indicação. Uma campanha política rende fortuna e, sendo a Malagueta uma sucursal

da produtora oficial do PT, essa deveria auferir pelo menos uma campanha de

grande porte, e a de Belo Horizonte ficou escolhida para tal.

As preparações exibiam fortunas sendo gastas com cenários, estúdios, caminhões

de equipamentos para cine-fotografia, geradores para iluminação em praças e muito

mais. Em menos de duas semanas um galpão se transformou em estúdio de

televisão com piso em madeira laminada de alto brilho. Nas adjacências, salas para

gravação dos programas de rádio, local para concentração da equipe de imprensa,

camarim para prefeito, em fim, tudo que o dinheiro podia comprar, e, chega-se o dia,

iniciam-se as gravações.

Gilberto, cujo estilo era mais voltado a propaganda televisiva de produtos, focava

esforços no embelezamento do set, na qualidade fotográfica e num incontável

número de efeitos visuais. O diretor se empenhava coordenando câmera e edição e

avaliava o pronunciamento do candidato pela qualidade da imagem. Uma silhueta

que lembrava filme hollywoodiano, um por do sol que mostrava o esplendor de uma

cidade que silenciava aquele quem deveria protagonizar. Naquele sentido, a direção

de Gilberto investiu grande esforço na embalagem, como se estivesse vendendo um

produto desconhecido, porém, as aparições não dirigidas do político revelavam um

produto que carecia de mais atenção.

Apurado o resultado das urnas, Patrús Ananias foi derrotado em primeiro turno por

Márcio Lacerda. Apesar de especialistas apontarem o favoritismo de Márcio Lacerda

desde o início da campanha, devemos ponderar que, da mesma forma, a primeira

aplicação de técnicas de marketing político no Brasil, também na cidade de Belo

Horizonte, modificou o favoritismo quando Amintas de Barros, candidato do, naquele

ano falecido, Getúlio Vargas, foi derrotado por Celso Azevedo, após elaborada

técnica de comunicação.

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19

2.2 - RESUMO HISTÓRICO

A preocupação humana para com a comunicação data milênios, mas é somente a

pouco que se intensificaram os estudos acerca dos diversos elementos da

comunicação e sua influência no resultado da mensagem. Extrapolando o limite das

palavras, o estudo atual da eficiência comunicativa preocupa-se com gestos,

emblemas, cores, formas e muito mais. Conforme observa Ribeiro (2011, p. 5) “A

comunicação não se baseia apenas nas palavras ditas entre as pessoas. Todo e

qualquer comportamento também transmite uma mensagem.” Para fins de

contextualização temporal, será apresentado na sequência um resumo das etapas

que nortearam o estudo da comunicação, assim como uma breve explicação sobre o

escopo de cada proposta. Não se pretende explicar cada teoria mas delinear as

etapas que culminaram na convergência atual.

2.2.1 – O Estudo da Linguagem Verbal

Os primeiros movimentos no sentido de teorizar a comunicação aconteceram na

Grécia com o foco voltado à eloquência e o discurso. Posteriormente, observa-se

uma nova atenção ao discurso político. Recentemente, a comunicação ganha status

científico com as teorias propostas por Saussure, que abrindo as portas para o

estudo da linguística, impulsiona vários autores que criam várias subdivisões das

ciências da comunicação. Hoje, com teorias que vão desde a existência genética da

linguagem à possibilidade da análise computacional do discurso, o estudo da

comunicação verbal se divide em Linguística, Análise do Discurso, Neuro-linguística,

Teoria das Comunicações e outras. Por compartilharem tanto teóricos quanto

campos de atuação, é pecar por ineficácia tentar resumir as pesquisas em apenas

uma delas, motivo pelo qual este trabalho aprecia todas e em igual grau de

importância. No que tange à comunicação verbal, são apresentadas na sequência

as evoluções teóricas mais significativas ao escopo deste trabalho.

Page 20: OS ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO PLENA: LINGUÍSTICA E LINGUAGENS APLICADAS À MENSAGEM AUDIOVISUAL

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2.2.1.1 - Retórica e Oratória.

Os primeiros esforços no sentido de controlar a comunicação teriam nascido no

século V a.C., conforme o artigo sob o título ‘Retórica’ no Wikipedia1 (2015) “A

retórica teria nascido no século V a.C., na Sicília, e foi introduzida em Atenas pelo

sofista Górgias”. A técnica consistia na busca da persuasão por meio das palavras e

dentro daquele contexto, uma de suas manifestações era a oratória que era o estado

da arte acerca da performance humana durante um discurso político ou filosófico.

Dentre seus expoentes, podemos citar Aristóteles com a obra ‘A Arte da Retórica.’

2.2.1.2 - A Linguística e a Análise do Discurso

O estudo da comunicação verbal adquire status universal de ciência com as teorias

apresentadas por Ferdinand de Saussure (1857-1913). De imediato, suas propostas

estabelecem uma abordagem social da língua, anteriormente estudada como uma

norma a ser seguida. Uma vez abordado em seu aspecto funcional, o estudo

estruturalista da língua passa a buscar também o resultado de sua aplicação social.

Em termos científicos o estudo da língua se erradica no século XIX, como observa

Paiva1 (s.d.) “na década de 1870 o movimento neogramático confere à disciplina um

caráter mais científico e preciso”. A publicação das ideias de Saussure acontecem

em 1916 através dos seus discípulos Charles Bally e Alvert Séchehaye (Paiva1,

s.d.).

No século XX a linguística tem crescimento exponencial e se divide em várias

correntes, dentre as quais se destacam o Estruturalismo Europeu, Estruturalismo

Americano, a Gramática gerativo-transformacional e culmina na psicolinguística e

sociolinguística. Sobre a realidade atual da ciência, Eduardo Guimarães, citado em

Paiva1 (s.d.) apresenta o estudo dividido em quatro tendências: a. um cognitivismo naturalista que o pensamento chomskyano reintroduziu e que localiza a linguística no interior da biologia (enquanto ciência psicológica), ou seja, das ciências naturais;

b. posições derivadas do estruturalismo, como os estudos enunciativos, para os quais o funcionamento da língua se dá porque a língua está marcada por formas próprias para o seu funcionamento, no acontecimento enunciativo, posições então que mantêm a questão da autonomia do linguístico proposta por Saussure;

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21

c. posições que procuram estabelecer diálogos entre as diversas disciplinas das ciências humanas que levam a pensar o linguístico como definido por uma correlação com o que está fora do linguístico: o antropológico, o social, o psicológico, etc;

d. posições como a da análise do discurso que põem em cena a questão de que não se pode reduzir o linguístico nem ao social (antropológico) nem ao psicológico, pois a linguagem é, ao lado de integralmente linguística – num certo sentido saussuriano – também integralmente histórica.

Entendida pelos cientistas como um ‘campo de estudo irmão’ ao contrário de uma

evolução, a Análise do Discurso, ou simplesmente AD, aborda também os fatores

históricos e contextuais que permeiam a mensagem. Neste sentido, não somente o

conteúdo verbal do enunciado, mas a realidade sociocultural tanto do enunciador

quanto do enunciatário são estudadas para se concluir a verdadeira intenção

daquele corpo discursivo. A proposta nasceu em 1969 através da tese apresentada

por Michel Pêcheux intitulada ‘Analyse Automatique du Discours’ (Paiva2, s.d.). Além

de Pêcheux, outro pesquisador de destaque tanto na AD como em outras áreas é

Michel Foucault que, dada a sua preparação multidisciplinar conseguiu conciliar ao

estudo da comunicação, importantes elementos que vão desde a história à psique

humana (Paiva2, s.d.). Vale ressaltar que em concomitante aos trabalhos realizados

no eixo capitalista ocidental, importantes pesquisas eram desenvolvidas na Rússia,

porém tinham sua divulgação restrita dados os interesses políticos da época. É o

caso de Mikhail Bakhtin, cuja obra foi embargada por anos e somente começou a

chegar no Ocidente depois de 1963 (Paiva2, s.d)

2.2.1.3 - As teorias das comunicações.

Menos analíticas e com um campo mais voltado ao resultado comunicativo, as

teorias que abordam as comunicações foram surgindo com foco inteiramente voltado

ao aspecto persuasivo da mensagem. Nascendo da hipótese estatística conhecida

como ‘Teoria Hipodérmica’, a ciência que ironicamente falhou em seu início por

tratar o ser humano como uma máquina programável, logrou êxito mais tarde

decidindo, através do controle e da repetição dos temas, sobre o quê a sociedade

deveria pensar. Seu primeiro modelo foi proposto em 1930 por Claude Shannon e

postulava que o resultado da mensagem seria proporcional ao tempo e quantidade

de exposição. Posteriormente, a teoria mecanicista de Lasswell propunha a

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22

importância dos elementos comunicativos na credibilidade da mensagem, o que

poderia ser resumido nas perguntas “Quem? Diz o Quê? Em Que Veículo? A

Quem? Com Que Efeito?” (NOGUEIRA JR., s.d). Em 1940, estudando os

resultados dos efeitos da propaganda em campanha política, Lazarsfeld conclui a

existência de uma predisposição à mensagem por parte do receptor, o que tende a

resultar num efeito limitado do enunciado, a experiência buscou auferir a

predisposição partidária dos eleitores antes e depois da propaganda política

veiculada, e como observa Nogueira Jr. (s.d.) “O público filtrou a informação e,

sobretudo, mostrou que não era passivo diante da informação.”.

A partir do trabalho de Lazarsfeld as próximas teorias se complementam e passam a

coexistir de acordo com a circunstância comunicativa. Propostas como

‘Comunicação em Dois Níveis’, ‘Agenda Setting’ e ‘Espiral do Silêncio’ se mostraram

eficientes e são as ‘receita de bolo’ utilizadas pelos veículos de imprensa desde

então. Observamos suas aplicações em mensagens dirigidas aos formadores de

opinião, a repetição demasiada de um mesmo assunto por parte da mídia e a

supressão de temas através de jargões repressivos como “teoria da conspiração”.

2.2.1.4 - As possibilidades sintáticas e sua relação com a credibilidade.

No século XX, as ‘técnicas de detecção de mentiras’ se tornam best-sellers em todo

mundo. Com seu público variando desde empresas a órgãos governamentais, os

trabalhos oferecem uma compilação dos elementos científicos até então estudados,

combinados com técnicas de ‘força bruta’ no sentido de desencadear confissões por

parte de criminosos ou mesmo ‘leakages’ de pistas de mentiras durante entrevista

de empregos. Como a comunicação audiovisual restringe a interação, somente

interessa a este trabalho a parte dos estudos relativas ao que pode ser controlado

durante a gravação. ‘Telling Lies’ (1992), de Paul Ekman, nasce de seus estudos

preliminares a respeito do comportamento humano e foi a obra que popularizou este

tipo de técnica e aborda entre outros, os vários modos de se dizer a mesma frase.

‘Never be lied to again’ (1999), de David Lieberman, apresenta uma compilação de

combinações e articulações sintáticas que estatisticamente tendem denotar o

discurso mentiroso.

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23

2.2 - O Estudo da Proxémica Os estudos voltados ao controle do ambiente para fins comunicativos intensificam-se

na revolução industrial, quando os engenheiros buscavam formas de aumentar a

produtividade comunicando mensagens com cores e com a intensidade luminosa,

mas foi somente em 1952 que Hall (citado em Ribeiro, 2011) batiza por Proxémica a

área que estuda o uso dos espaços para fins comunicativos. Em estado da arte, este

tipo de comunicação aborda desde a construção de prédios ao design de produtos.

Reduzida ao escopo deste trabalho, a Proxémica será estudada no âmbito da

comunicação discursiva fazendo uso da dissertação de Ribeiro cujo foco é a

indumentária na credibilidade do comunicador.

2.2.3 – A Cinésica.

A linguagem do corpo recebeu as primeiras observações científicas através dos

estudos de Darwin em 1872, porém sua tipologia data-se do século XX, conforme

observa Ribeiro (2011, p. 6) “Birdwhishtell (1952) introduziu a cinésica, área que

estuda os movimentos corporais e os gestos”. Entendida como uma ‘externalização’

das emoções humanas, a cinésica vem sendo foco de atenção de psicólogos e

comunicadores que, baseados em experimentos, tem provado que em termos de

credibilidade da mensagem, sua influência é na maioria das vezes mais

determinante que o próprio conteúdo verbal. Ekman (2003), ao explicar a

importância das mensagens não verbais para a própria sobrevivência do indivíduo -

uma vez que transmite aos outros seu estado emocional - postula inclusive sobre a

existência de uma parte do cérebro especialmente dedicada a intepretação deste

tipo de linguagem.

A sequência de estudos abaixo é um resumo das teorias alcançadas acerca do

resultado da cinésica e são as fontes bibliográficas que delimitam as

recomendações da comunicação coerente assertiva, objeto de estudo deste

trabalho.

2.2.3.1 - Os estudos de Darwin.

Pioneiro neste campo de estudo, Darwin lançou em 1867 o livro ‘A expressão das

emoções no homem e nos animais’. Naquela época seu estudo já relacionava

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algumas expressões com respectivos sentimentos usando uma relação direta de

causa e efeito, assim como buscava dividir as expressões em inatas e adquiridas.

Conforme um dos exemplos retirados de Wikipédia3 (2015), seu questionário

abordava perguntas do tipo “Exprime-se a surpresa pelo arregalar dos olhos e da

boca e pela elevação das sobrancelhas?”. Como resultado de seus estudos, conclui-

se haver a relação direta entre sentimentos e expressões faciais. Recebeu trinta e seis respostas donde concluiu, a partir das informações

adquiridas, que um mesmo estado de espírito exprime-se ao redor do

mundo com impressionante uniformidade e assinala ainda que esse achado

evidencia a grande similaridade da estrutura corporal e da conformação

mental de todas as raças humanas. (WIKIPÉDIA3, 2015)

2.2.3.2 - O corpo fala.

Fortemente difundido entre artistas, apresentadores e outros profissionais de

comunicação, a obra foi lançada no Brasil em 1980 pela editora Vozes (Wikipédia2,

2015) e nasce da experiência do psicólogo e educador francês Pierre Weil. A fácil

assimilação conciliada com o linguajar popular fez do livro uma referência no

assunto ‘linguagem do corpo, uma vez que as obras paralelas, por focarem demais

na abordagem científica, acabam por restringir o seu público. A proposta do livro

divide o corpo humano em consciência, emoção e desejos, no estudo representados

pelos ícones águia, leão e boi. O autor propõe, através da posição dos respectivos

membros do corpo em relação ao assunto em diálogo, a existência de concordância

ou discordância entre os elementos comunicativos. Vale salientar que os mesmos

aspectos abordados por Weil são repetidos por Ekman em 1992, estando também

presentes na obra de Lieberman (1999).

2.2.3.3 - Os estudos de Ekman.

Psicólogo e pesquisador doutorado em 1958, Ekman teve seus estudos

popularizados pelo seriado de televisão ‘Lie to me’, uma obra de ficção fortemente

baseada nas teorias levantadas pelo mesmo. Sua maior contribuição na

comunicação não verbal é a relação entre emoções e as micro-expressões faciais,

cuja primeira descoberta se deu durante a análise das gravações realizadas durante

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o tratamento clínico de uma vítima de suicídio. Mary, depressiva e internada há 5

meses por apresentar fortes tendências suicidas consegue convencer seu terapeuta

que estaria em condições de passar o final de semana com a família e se mostra

aparentemente livre dos sintomas depressivos. De alta, Mary suicida posteriormente.

(Ekman, 1992) Revendo os vídeos das entrevistas que antecederam as altas,

Ekman observou que numa fração de segundo anterior às expressões faciais que

convenceram o terapeuta, um ‘vazamento’ de expressão depressiva podia ser

notado, o que ele denominou micro-expressões. Na sequência, Ekman expande

seus estudos e, observando populações em diversos locais do mundo, consegue

provar que as expressões humanas convencionam mensagens universais. Seu

estudo, antes de se transformar obra de ficção, serviu de orientação para desde

treinamento de serviços de inteligência, investigadores e diplomatas à aplicação em

comunicação política.

Neste trabalho serão abordados principalmente os estudos relacionados à

percepção da mentira realizados por Ekman numa amostra composta por

estudantes do curso de Enfermagem. Dada a forte carga científica dos trabalhos

anteriores, Ekman decidiu por compilar uma versão mais acessível de suas

experiências na obra ‘Telling Lies’. No livro são introduzidos os elementos não

verbais da comunicação e a relação que os mesmos convencionam em termos de

percepção da verdade, assim como a metodologia e os resultados das experiências

que motivaram as suas conclusões.

2.3 – APLICAÇÃO

2.3.1 – Limite do escopo.

Nesta parte do trabalho serão compilados alguns dos elementos comunicativos

anteriores, porém em aplicação prática no audiovisual. Será dada atenção aos

elementos de uso imediato nos contextos verbais e não verbais, assim como serão

apresentadas pesquisas que demonstram a efetividade dos temas propostos. Como

este trabalho não pretende esgotar o assunto, é sugerido o aperfeiçoamento

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26

fazendo uso das referências bibliográficas, uma vez que este tema é extenso e

impossível de ser compilado em um único artigo.

2.3.2 – Controlando a componente verbal

No início de uma campanha política, o discurso tende suprir um anseio popular por

resposta a problemas que na maioria das vezes são manipulados pelos veículos de

imprensa. Os já mencionados efeitos resultantes da teoria do agendamento e a

Espiral do Silêncio, tendem ditar aos candidatos o que falar durante suas

campanhas e por mais envoltos de futilidade que estejam, são esses os temas que

acabam por ficar em pauta. Entre exemplos podemos citar a primeira campanha da

então presidente Dilma Rousseff, quando todo o assunto administrativo cedeu lugar

ao tema aborto. Assim como a última campanha presidencial, quase convertida em

guerra religiosa através das obscuras manipulações por parte de formadores de

opinião das camadas desprovidas de Inteligência.

Como conteúdo a ser abordado, este trabalho entende que tentar fugir do tema em

pauta, por mais tecnicamente insignificante que o mesmo seja, é o mesmo que

desviar da pergunta feita pela população. Serão recomendados porém os cuidados a

serem tomados quando da composição e avaliação do componente verbal da

mensagem, e não o seu assunto propriamente dito.

2.3.2.1 - Estruturas frasais a serem evitadas.

Segundo Liberman, (1999) A forma como a frase é construída é suficiente para

denunciar uma comunicação natural ou manipulada. O autor de “Never be Lied to

Again” defende que, na tentativa de dar credibilidade a fatos que o próprio emissor

não acredita, são adicionados componentes incomuns ao conteúdo verbal da

mensagem.

Como as características linguísticas regionais tendem ditar a forma de comunicação

do candidato, ao diretor cabe analisar até que ponto aquelas se compatibilizam com

o cargo pretendido. Um exemplo deste caso, citado em Daniel, (s.d.) foi o resultado

da pesquisa Vox Populi sobre presidenciáveis em 2002, quando alguns

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27

entrevistados apontaram o candidato Antony Garotinho como o autêntico ‘malandro

carioca’.

Aconselha-se primeiramente estudar a forma sintática aceita como verdadeira

naquela realidade e evitar construções que possam ser percebidas como

manipulação ou mentira. Dentre exemplos de uso global, Lieberman (1999) sugere

como possíveis mentiras o iniciar de frases com textos como “Pra falar a verdade”,

ou “Você não vai acreditar no que vou dizer”. O gerúndio, construção cada vez mais

antipatizada, deve também ser evitado.

2.3.2.2 – Ritmo, pausas e coerência vocálica.

Em pesquisa, Ekman (1992) auferiu que dentre as mensagens não verbais emitidas

durante um diálogo, a que mais denuncia incoerência é o tom de voz. Percebe-se

claramente quando uma pessoa tenta ‘maquiar’ uma decepção com um sorriso falso,

agitação corporal controlada, porém não logra êxito em controlar seu tom de voz.

Outro aspecto capaz de denunciar uma tentativa de manipulação é um ritmo

incomum, recheado de muitas pausas. As pausas são geralmente percebidas como

um “tempo para criar” e certamente diminuirão a credibilidade da mensagem.

Recomenda-se não somente a inspeção do conteúdo gravado acerca do ritmo e da

coerência vocálica, como também o treinamento do político, visando atingir uma

correta interpretação de tons e pausas de modo a compatibilizar com o significado

aceito pela audiência.

2.3.3 – Controlando a componente Proxémica

O conjunto de elementos dispostos em tela sem dúvidas influencia a mensagem a

ser transmitida, assim como influenciam em sua coerência. A correta escolha de

elementos de cena, locais para gravação assim como as cores nos cenários está

diretamente ligada ao universo cultural do público a ser comunicado, trazendo

diferentes possibilidades interpretativas, motivo pelo qual merecem sempre uma

pesquisa preliminar e não uma ‘receita de bolo’. Sobre a indumentária porém, tem

sido provado que, ao contrário do que já se imaginou, tentar se compatibilizar com o

público alvo tem menos resultado do que se compatibilizar com o cargo pretendido.

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28

Esta foi a conclusão que levou Duda Mendonça - publicitário do ex-presidente Lula

em sua primeira vitória - a modificar sua indumentária durante a campanha

presidencial. Em entrevista à Revista Propaganda, Mendonça (citado em Daniel, s.d.

p. 44) explica: “ele estava vestido de político, candidato a presidente da República.

Todos têm que se vestir daquele jeito. Se você tiver um candidato de jeans, de

camiseta, você vota nele?”. Para efeito de reflexão, podemos observar as fotografias

abaixo e decidir sobre qual versão do “Lula” estaria mais preparada para ocupar o

cargo de Presidente. Figura 1 - A indumentária do candidato Lula antes e após Duda Mendonça

Fonte:

http://www2.uol.com.br/debate/1552/fotos/antiga02.jpg Fonte: http://www.galizacig.gal/avantar/files/

images/20071227_brasilia_lula_da_silva_590.jpg

Na bibliografia científica, a dissertação de mestrado de Ribeiro (2011) manipulou 4

amostras no sentido de observar a influência da indumentária e a gesticulação na

credibilidade do comunicador e concluiu, através dos 4 experimentos, que uma

vestimenta formal tende sempre a um resultado mais positivo que um traje informal,

ainda que mantidos os mesmos elementos da mensagem. Sobre o resultado dessas

pesquisas, Ribeiro (2011, p. 100) sintetiza: O diferencial semântico relativo à Imagem transmitida pela indumentária também indicou atitudes bastante favoráveis, (...) É de destacar o valor extremo para a Credibilidade (2.6) seguido de uma imagem Cuidada, Profissional e Madura com médias de 2.5 e 2.3 respectivamente. Assim, os dados apurados permitem-nos reconhecer que a indumentária formal é um grande indicador de Seriedade, Respeitabilidade, Profissionalismo, e consequentemente de credibilidade.

Concordando pois com os resultados empíricos e científicos, este trabalho

recomenda a todo candidato a utilização da indumentária formal, o que o

aproximaria do cargo pretendido, uma vez que a tentativa de se aproximar do

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29

público tem sido vista como ineficiente, tanto pelo Marketing Político quanto pela

aferição acadêmico-científica.

2.3.4 - Controlando a componente cinésica.

Em 2002, durante a campanha presidencial, o instituto Vox Populi realizou várias

experiências que visavam auferir o nível de importância do conteúdo não verbal nos

pronunciamentos dos candidatos. Primeiramente eram projetadas imagens

silenciosas de debates, nas quais era possível notar apenas componentes não

verbais. Num segundo momento as mesmas gravações eram apresentadas

completas, exibindo imagem e som. Conforme observa Daniel (s.d. p. 40) “Não

houve praticamente nenhuma diferença entre a avaliação com som e o julgamento

sem som. Em resumo: a forma prevaleceu sobre o conteúdo.” Posteriormente,

crianças entre 9 e 12 anos foram convidadas para participar da mesma pesquisa. O

motivo era tentar desvincular do resultado qualquer tipo de antipatia anterior e com

isso evitar vícios. Observe na tabela abaixo, adaptada de Daniel (s.d.), o resultado

da opinião das crianças a respeito dos candidatos Ciro, Serra, Lula e Garotinho.

Tabela 1: Presidenciáveis na opinião das crianças de 9 a 12 anos.

AS CRIANÇAS E OS POLÍTICOS Eles acham que Lula...

...é o mais rico �...é elegante �...é o mais chato Se fosse um professor, seria o de matemática. Não deixaria que os alunos fizessem bagunça.

Eles acham que Serra... �...é elegante� ...cansativo como um professor ...é a cara de São Paulo Se fosse um professor, seria o de ciências. Explica tudo detalhadamente.

Eles acham que Ciro... �...é elegante� ...tem uma casa bonita e organizada ...tem um cabelo esquisito Se fosse um professor, seria o de português. Faz questão de falar bonito.

Eles acham que Garotinho... �...é o mais legal� ...gosta de brincar com crianças ...é alegre e descontraído Se professor, seria o de educação artística. Deixaria a bagunça correr solta na classe.

Fonte: Adaptado de Daniel (s.d. p.42)

O motivo do exemplo anterior é alertar para um fato atualmente conhecido pelo

Marketing Político, mas muitas vezes ignorado por vários diretores:

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Quando vão a um debate, candidatos se armam de estatísticas, preparam perguntas capciosas, esmiúçam a biografia dos adversários. Tudo isso, no entanto, não é tão efetivo quanto parece. Para uma parte significativa da audiência, o que conta é o grau de segurança que os presidenciáveis passam, a veemência de seus gestos, a simpatia pessoal. Numa palavra, a imagem que conseguem transmitir. (DANIEL, s.d. p. 40)

A compreensão do conjunto de mensagens emitidas pelo corpo atinge tamanha

complexidade a ponto de exigir anos de treino e muitas milhares de páginas de

leitura, no entanto, se preparar para notar pequenas nuances de incoerência é o

primeiro passo no sentido de se aperfeiçoar como diretor. Esta parte do trabalho não

esgota o assunto mas apresenta alguns dos ‘leakages’ comuns em pronunciamentos

políticos, escolhidos exatamente por serem aqueles de maior percepção por parte

do telespectador comum.

2.3.4.1 - Comportamento Postural

Alguém à sua frente cruza ou descruza os braços, muda a posição do pé esquerdo ou vira as palmas das mãos para cima. Tudo isso são gestos inconscientes e que, por isso mesmo, se relacionam com o que se passa no íntimo das pessoas. (WEIL, TOMPAKOW p. 5)

Em “O Corpo fala” - obra de Pierre Weil e Roland Tompakow, publicada no Brasil em

1980 pela editora Vozes - o ser humano é representado por uma esfinge que o

divide em 3 partes, sendo essas as responsáveis pelas mensagens vegetativas,

emocionais e racionais. O texto originalmente publicado possui tamanha clareza e

atualidade que merece citação direta em sua íntegra: (...) existe uma tradição muito antiga* segundo a qual cada uma destas partes representa uma parte do físico do homem e também a sua correspondência psicológica! Estas correspondências psicológicas não mudaram muito, até na Psicologia moderna. Eis o esquema desta tradição:

Figura 2 – Os animais Águia, Leão e Boi representando a personalidade humana.

Fonte: O Corpo Fala (WEIL, TOMPAKOW, 1980) Boi Abdômen Vida Instintiva e Vegetativa Leão Tórax Vida Emocional

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O Boi, quando colocado em evidência na nossa expressão corporal, tende a se traduzir por uma acentuação do abdômen. A pessoa avança o abdômen; isto se encontra em gente que gosta de boas refeições, que se senta à vontade diante de uma farta mesa de jantar.

No plano sexual temos o famoso requebrar das mulheres brasileiras e havaianas; é uma provocação para os homens. Estes, por sua vez, engancham os polegares no cinto, com os outros dedos apontados para os órgãos genitais; é uma maneira de se oferecer...

Figura 3 – A mensagem emitida pelo abdômen.

Fonte: O Corpo Fala (WEIL, TOMPAKOW, 1980)

O Leão se evidencia pelo tórax onde reside o coração; é o centro da emoção. Os especialistas em expressão corporal, sobretudo os coreógrafos, o consideram como o centro do EU.

1. Assim, quando há uma postura de preponderância do tórax, estamos em presença de uma preponderância do EU. São pessoas vaidosas, egocêntricas e extremamente narcisistas; ou que naquele momento querem se impor.

2. Ao contrário, quando o tórax está encolhido, estamos em presença de uma pessoa cujo EU está diminuído; são pessoas tímidas, submissas, retraídas ou que naquele momento se sentem dominadas pela situação.

3. Um tórax em postura normal significa um EU equilibrado.

Figura 4 – A mensagem emitida pelo tórax.

Fonte: O Corpo Fala (WEIL, TOMPAKOW, 1980)

Águia Cabeça Vida Mental (Intelectual e Espiritual) Homem Conjunto Consciência e domínio dos três inconscientes

anteriores.

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A Águia, representada pela cabeça, nos indica o estado de controle do corpo pela mente. 1. Cabeça erguida significa hipertrofia do controle mental. 2. Ao contrário, cabeça baixa significa que o indivíduo é controlado pelos estímulos externos. 3. Cabeça em posição normal indica um controle normal da mente.

Figura 5 – A mensagem emitida pela cabeça.

Fonte: O Corpo Fala (WEIL, TOMPAKOW, 1980)

Conforme mencionado no início deste capítulo, a coerência da mensagem precisa

levar em conta a postura corporal, afinando o que se pretende dizer com o que

realmente está sendo dito. Cabe ao diretor então fazer uso deste arcabouço

científico no sentido de atingir a coerência desejada. Comparando a percepção de

mensagens corporais com a música, Weil e Tompakow (1980, p. 26 e 28) observa:

“O homem está psicofisiologicamente ‘afinado’ para sentir isso na música; por que

não na linguagem do corpo? (…) o ser humano está fisiologicamente "afinado" para

distinguir entre harmonia e desarmonia.“

2.3.4.2 – Gesticulação

Segundo Ekman (1992) A gesticulação natural é aquela que acompanha ou

antecede a mensagem verbal. Em contraste, quando a gesticulação acontece num

momento posterior à mensagem verbal, essa foi produzida conscientemente e pode

ser percebida como mentira. Sobre a intensidade da gesticulação, Ribeiro (2011)

observou em experimento de campo que a mensagem verbal acompanhada de

gesticulações bruscas tende a menor credibilidade que a mesma mensagem

acompanhada de gesticulação moderada.

Este trabalho sintoniza-se com as observações de Ekman e Ribeiro e sugerem ao

diretor intervenção no sentido de evitar tanto gesticulações tardias quanto as

gesticulações bruscas.

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33

2.3.4.3 – Emblemas

‘Os emblemas’ é um conjunto de mensagens não verbais com sentido de direta ou

quase direta compreensão. São emitidas pelo corpo do emissor durante conversa ou

pronunciamento. Além de serem inconscientemente percebidos, podem ser alvos de

utilização póstuma por adversários. Entre exemplos temos o ‘dedo do meio’, que

ocasionou a prisão de um piloto americano durante o procedimento de imigração em

aeroporto brasileiro. Ao ser solicitada a estampa biométrica do americano em

reciprocidade diplomática da mesma exigência acontecendo nos Estados Unidos, o

mesmo teria desrespeitado as autoridades com gestos obscenos. Em depoimento à

polícia o piloto declarou não ter agido de forma intencional.

O caso exemplo serve para demonstrar que, embora não percebamos, muitas vezes

emitimos mensagens que sequer temos consciência pois imaginamos estar

escondendo os sentimentos internos apenas com o maquiar da face. Além do

exemplo dado, outros emblemas conhecidos que merecem atenção por parte do

diretor são: O mexer dos ombros, fechar a mão demonstrando fúria, colocar a mão

direita no pescoço durante momentos de embaraço e coçar orelhas ou nariz quando

respondendo perguntas.

2.3.5 – Recapitulando Os elementos não verbais caracterizantes da fuga e desconforto merecem treino e

preparo e não somente controle durante gravações. Por serem inconscientemente

percebidos pela audiência, podem destruir o trabalho de toda a campanha como o

exemplo apresentado no capítulo 1, vivido na campanha de Leonardo Quintão.

Eventos ao vivo como entrevistas, sabatinas e debates são onde acontecem a

maioria dos ‘leakages’. Coagidos por perguntas desconfortáveis, os candidatos

tentem retirar a cabeça, cruzar os braços ou mesmo se afastar do assunto. Este tipo

de mensagem é perceptível e deve ser evitada e o efeito oposto pode ser muito

positivo já que se aproximar de um assunto popularmente entendido como um

ataque pode ser interpretado com segurança e intensão de solucionar o problema.

Especial atenção deve ser dada no sentido de não ‘robotizar’ o candidato. Assim

como negativos durante determinados momentos, alguns emblemas são

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imprescindíveis quando usados de forma coerente. Não cruzar os braços durante a

recepção de uma ‘proposta claramente indecorosa’ pode ser interpretado como

conivência, assim como se aproximar de algo negativo pode ser entendido como

uma vontade de se agregar ao elemento subjugado.

3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Este trabalho buscou atentar sobre a importância da coerência comunicativa nas

mensagens audiovisuais. Primeiramente, foi apresentada uma breve narração sobre

a experiência de campo do autor, elemento motivador para a escolha do tema deste

trabalho. Dentre as experiências vividas, foram exemplificadas vitórias e derrotas

que serviram para levantar suspeita sobre a efetividade dos mecanismos

posteriormente expostos. A campanha para prefeito de Belo Horizonte em 2008

serviu como exemplo de aplicação de elaboradas técnicas de comunicação, essas

em ambos os lados apresentados, assim como a campanha para prefeito da mesma

cidade em 2012 incitou como ignorar a importância da coerência geral da

mensagem pode diminuir a efetividade da mesma.

No segundo capítulo, foi feita exposição bibliográfica do ‘estado da arte’ das teorias

que envolvem a comunicação humana, abordando de forma ordenada os

acontecimentos paralelos que geraram o conhecimento acumulado até os dias de

hoje. Foi feita uma breve exposição a respeito da linguística, nascida das pesquisas

de Ferdinand de Saussure e um tímido mas importante trabalho acerca da

linguagem corporal desenvolvido por Darwin. Dando sequência aos estudos da

linguística, outras teorias foram expostas, dentre elas, várias tendências da Análise

do Discurso e as mais importantes Teorias das Comunicações. Posteriormente

foram apresentadas as teorias no campo da comunicação não verbal, expondo as

pesquisas sobre o controle ambiental, com especial enfoque à indumentária,

partindo para a linguagem do corpo, momento em que foram apresentados autores

como Weil e Ekman, cujas obras tem sido amplamente utilizadas em várias áreas

das humanidades.

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Finalmente, foi demonstrada a forma como todas as teorias apresentadas

anteriormente convergem no sentido de proporcionar coerência no enunciado como

um todo. Os assuntos até então apresentados tiveram enfoque direcionado à

aplicação audiovisual e exemplos práticos serviram para ilustrar a importância da

aplicação dos conteúdos até então estudados. A ilustração sobre a importância da

indumentária formal se valeu das fotografias do ex-presidente Lula, principalmente

devido à sua resistência em mudar de estilo. A pesquisa da Vox Populi, realizada

com os presidenciáveis em 2002, serviu para ilustrar a percepção pública de cada

estilo de comunicação, assim como foi exposta uma parte da pesquisa, realizada

com crianças, buscando apresentar uma avaliação livre de vícios anteriores. Por fim,

fazendo uso da obra de Weil, foi apresentado um pequeno glossário de mensagens

corporais, assim como foram feitas algumas sugestões acerca de posturas,

gesticulações e emblemas, terminando em uma breve recapitulação acerca da

importância da coerência comunicativa.

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4 – REFERÊNCIAS

DANIEL, Silvana Cristina de Souza. Marketing Político. Brasília-DF: Unileya, 2015. 85 p. EKMAN, Paul. Telling lies: Clues to deceit in the marketplace, politics, and marriage. Nova York: Norton & Company, 1991. 368 p. EKMAN, Paul. Emotions Revealed. Nova York: Times Books, 2003. 285 p. EKMAN, Paul; FRIESEN, Wallace V.. Unmasking The Face. Cambridge: Marlon Books, 2003. 214 p. LIEBERMAN, David J.. Never Be Lied To Again. Nova York: St. Martin's Griffin, 1999. 144 p. NOGUEIRA JUNIOR, Dario Azevedo. Teorias da Comunicação. Brasília-DF: Unileya, 20 p. PAIVA1, Marcelo Whately. Análise do discurso. Brasília-DF: Unileya, 80 p. PAIVA2, Marcelo Whately. ANÁLISE DE TEXTO. Brasília-DF: Unileya, 55 p. PAIVA3, Marcelo Whately. Linguistica. Brasília-DF: Unileya, 2015. 62 p. RIBEIRO, Maria de Fátima Moura. Comunicação não-verbal. Vila Real: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 2011. 170 p. WEIL e TOMPAKOW, Pierre e Roland. O Corpo Fala. Vozes: 1980. 154 p. WIKIPEDIA1. Retórica. 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Retórica>. Acesso em: 16 set. 2015. WIKIPEDIA2. Pierre Weil. 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_Weil>. Acesso em: 16 set. 2015. WIKIPEDIA3. Charles Darwin. 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Darwin>. Acesso em: 16 set. 2015.