os efeitos processuais da declaração de insolvência

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I Jornadas de Direito Processual Civil “Olhares transmontanos” Nadir Afonso Coordenação científica: Dr. José António Alves Esteves Juiz de Direito – Tribunal Judicial de Valpaços Organização: Delegação de Valpaços da Ordem dos Advogados Apoio: Delegação de Chaves da Ordem dos Advogados Valpaços, 5 e 6 de Novembro de 2011 Pavilhão Multiusos de Valpaços

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Os efeitos processuais da declaração de nulidade.

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  • I Jornadas de Direito Processual Civil

    Olhares transmontanos

    Nadir Afonso

    Coordenao cientfica: Dr. Jos Antnio Alves Esteves

    Juiz de Direito Tribunal Judicial de Valpaos

    Organizao:Delegao de Valpaos da Ordem dos Advogados

    Apoio:Delegao de Chaves da Ordem dos Advogados

    Valpaos, 5 e 6 de Novembro de 2011Pavilho Multiusos de Valpaos

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    Ficha Tcnica

    Propriedade e Edio:Cmara Municipal de Valpaos

    Composio e Impresso:Grfica Sinal, Chaves

    Abril de 2012

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    ndicePg.

    Um novo Mundo, uma nova Racionalidade, um novo Processo Civil Juiz de Direito Dr. Jos Esteves . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11Interveno do Exm. Sr. Presidente da Cmara de Valpaos, Eng. Francisco Tavares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29Interveno do Exm. Sr. Vice-Presidente da Assembleia da Repblica, Dr. Guilherme Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33Discurso da Exm. Sr. Ministra da Justia, Dr. Paula Teixeira da Cruz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39Haja nova esperanaJuiz Conselheiro Dr. Jaime Octvio Cardona Ferreira . . . . . . . . . . . . . . . . . 45Reviso do mapa judicirio e suas implicaes prticas Prof. Dr. Antnio Montalvo Machado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63Contencioso: Reduo, Converso e Inverso Mestre Dr. Lucinda Dias da Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71A Aco Executiva Alguns Problemas Prticos Mestre Dr. Armindo Ribeiro Mendes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103A tipicidade legal das formas de processo: fim vista Professora Doutora Maria Jos Capelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121A audincia preliminar Mestre Dr. Paulo Pimenta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135Do contedo da base instrutriaProfessor Doutor Jos Lebre de Freitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151Revisitando o Recurso de Revista Excecional: desta vez, o previsto no Artigo 721.-A do CpcProfessora Doutora Elizabeth Fernandez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157Os Efeitos Processuais da Declarao de Insolvncia Doutoranda Maria do Rosrio Epifnio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175Sobre a projectada reforma da Lei da Insolvncia Professora Doutora Catarina Serra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193O Processo Civil Portugus: diagnstico e cura Professor Doutor Rui Pinto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211A relevncia do papel da Comisso para a Eficcia das Execues no sistema portugus Mestre Paula Meira Loureno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233

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    Os Efeitos Processuais da Declarao de Insolvncia*

    Maria do Rosrio Epifnio

    Sumrio: I. Introduo; II. Os efeitos sobre as aes declarativas; 1. O destino das aes; 2. A substituio processual do insolvente; III. Os efeitos sobre as aes executivas e sobre os processos nos quais tenha sido praticado qualquer ato de apreenso ou deteno de bens compreendidos na massa insolvente; IV. Os efeitos sobre as convenes arbitrais; V. Os efeitos sobre as dvidas da massa insolvente; VI. Os efeitos sobre as aes previstas no art. 82.

    I. Introduo

    O processo de insolvncia um processo universal e concursal1.

    Por ser um processo universal, existe um conjunto de bens, que a lei designa de massa insolvente, cujo destino ser definido exclusivamente no processo de insolvncia com vista satisfao do interesse dos credores. Consequentemente, ficam vedados ao insolvente os atos de disposio e de administrao dos bens que integram a massa insolvente, assim como qualquer ato que possa afetar os respetivos bens (congelamento da massa insolvente).

    Por ser um processo concursal (pois todos os credores so chamados a reclamar os seus crditos no processo), fica vedada aos credores a possibilidade

    * O presente texto, que serviu de apoio minha interveno nas I Jornadas de Direito Processual Civil de Valpaos (novembro de 2011), foi redigido segundo o novo acordo ortogrfico.

    1 A este propsito, veja-se o nosso Manual de Direito da Insolvncia, 3 edio, Almedina, Coimbra, 2011, pp. 12 e ss.

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    de obterem o pagamento dos respetivos crditos por qualquer outra via que no a via do processo de insolvncia nesta matria vigora o princpio da exclusividade da instncia insolvencial.

    Partindo destas duas caractersticas fundamentais, poderemos compreender a razo de ser e o alcance de algumas solues contempladas no Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas a propsito dos efeitos processuais da declarao de insolvncia2.

    A matria est essencialmente regulada no captulo II do Ttulo IV (nos arts. 85.-89.), mas tambm no captulo I do Ttulo IV, no art. 82., n.s 2-5, e no Cdigo de Processo Civil, no art. 870. 2.

    II. Os efeitos sobre as aes declarativas

    1. O destino das aes

    Por fora do art. 85., n. 1, as aes em que se apreciem questes relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor ou contra terceiro3, mas que possam influenciar o valor da massa insolvente, e as aes exclusivamente patrimoniais intentadas pelo devedor, podero ser apensas ao processo de insolvncia, a pedido do administrador da insolvncia,

    2 Aprovado pelo D.L. n. 53/2004, de 18 de Maro. Doravante, os preceitos desacompanhados da referncia ao respetivo diploma legal pertencem ao CIRE, salvo se do contexto resultar o contrrio.

    3 Segundo o art. 1198., n. 2, do Cdigo de Processo Civil, as aes intentadas contra o insolvente e contra terceiro no eram apensas ao processo de falncia, pois o processo de falncia estava limitado subjetivamente ao falido. Por isso, as aes prosseguiam contra os terceiros apenas e o falido era absolvido da instncia nesse processo, pois no se podia conhecer de responsabilidades do falido fora do processo de falncia (restava ao respetivo credor, reclamar no processo de falncia) - a este propsito, veja-se MACEDO, Pedro de Sousa, Manual de Direito das Falncias, vol. II, Almedina, Coimbra, 1968, p. 112.

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    com fundamento na convenincia para os fins do processo4.

    A apensao uma consequncia do carter universal e concursal do processo de insolvncia: uma vez que so apreendidos e liquidados todos os bens penhorveis do insolvente (universalidade do processo de insolvncia), independentemente da verificao do passivo, todos os credores devem ser chamados ao processo para nele (e s nele exclusividade da instncia5) obterem a satisfao dos seus direitos6.

    Por isso, as aes declarativas intentadas contra o insolvente, pendentes data de declarao de insolvncia, podero seguir um de dois destinos7: so apensas ao processo de insolvncia, so suspensas ou extinguem-se.

    Sero apensas, se o juiz entender que so pertinentes para os fins do processo8. A apensao tem a vantagem do aproveitamento da atividade desenvolvida em aes pendentes, por forma a serem consideradas na verificao do passivo. Se a apensao for solicitada depois de decorrido o prazo para a reclamao dos crditos, Pedro de Sousa Macedo defendia a inadmissibilidade da apensao por perda de utilidade - em consequncia, a ao em curso deveria ser objeto de uma deciso de absolvio da instncia, restando ao credor lanar mo da verificao ulterior de crditos9.

    Se a ao no for apensa ao processo de insolvncia, suscita-se de imediato

    4 No sentido de que esta apensao perde razo de ser nos casos de declarao de insolvncia com carter limitado, se no tiver sido requerido o complemento da sentena, veja-se FERNANDES, Lus A. Carvalho/ LABAREDA, Joo, Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas Anotado, Quid Juris, Lisboa, 2008, p. 355, nota 8.

    5 Pedro de Sousa Macedo fala a este propsito de um efeito aglutinador do processo de insolvncia - todas as responsabilidades do falido so apreciadas pelo procedimento falimentar, no apenso da verificao do passivo: op.cit., vol. II, p. 111.

    6 Por isso, de acordo com o art. 91., n. 1, a declarao de insolvncia importa o vencimento de todas as obrigaes do insolvente no sujeitas a condio suspensiva.

    7 As aes patrimoniais intentadas pelo insolvente podero ser apensas ao processo de insolvncia, nos termos do art. 85., n. 1, ou ento correro o seu curso autonomamente, no parecendo existir fundamento legal para a sua suspenso ou extino.

    8 A apensao vigora apenas na pendncia do processo de insolvncia - encerrado o processo de insolvncia, a ao desapensada do processo e remetida para o tribunal competente (art. 233., n. 4).

    9 Op. cit., vol. II, p. 111.

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    a questo de saber se a declarao de insolvncia de uma entidade importa a extino, por inutilidade superveniente da lide, de uma ao declarativa em que demandada essa mesma entidade, para efeitos de condenao no reconhecimento de um crdito10. O CIRE no contm qualquer preceito regulador desta questo, pelo que a soluo dever resultar da conjugao dos respetivos preceitos com as normas processuais gerais que disciplinam as aes declarativas de condenao: todavia, a coordenao destes normativos no tem sido pacfica no seio da jurisprudncia.

    Se as Relaes tm sido muito divergentes na resposta a esta questo, j o Supremo Tribunal de Justia tem decidido no seguinte sentido: transitada em julgado a sentena que declara a insolvncia da demandada, a ao que visa o reconhecimento de um direito de crdito sobre a insolvente deve ser declarada extinta, por inutilidade superveniente da lide, de harmonia com o disposto no art. 287., al. e) do CPCivil11.

    Em defesa desta tese, o Supremo Tribunal de Justia tem invocado um conjunto de argumentos. Desde logo, em resultado da declarao de insolvncia, e na pendncia do processo de insolvncia, os credores s podero exercer os seus direitos de acordo com o disposto no CIRE (art. 90.). Em consequncia, devero lanar mo da reclamao de crditos (nos termos do art. 128., n. 1), ainda que o respetivo crdito j esteja verificado por deciso definitiva12 (n. 3 do art. 128.), pois o pagamento dos crditos

    10 Acrdo do Supremo Tribunal de Justia, de 20 de Setembro de 2011 (Garcia Calejo).11 Acrdo do Supremo Tribunal de Justia, de 20 de Setembro de 2011 (Garcia Calejo).

    No mesmo sentido, veja-se o Acrdo de 25 de Maro de 2010 (Pinto Hespanhol), o Acrdo de 13 de Janeiro de 2011 (Pereira da Silva), e o Acrdo de 20 de Setembro de 2011 (Garcia Calejo).

    12 Segundo o Acrdo do Tribunal da Relao de 30 de Junho de 2010 (Duro Mateus Cardoso), visando o processo de insolvncia a colocao de todos os credores em posio de igualdade jurdica perante o patrimnio da insolvente mediante o concurso universal de credores, a afirmao e reconhecimento de direitos de crdito sobre a insolvente atravs de aces declarativas de condenao em que apenas um dos vrios credores parte, abriria o caminho a situaes de conluio e favorecimento entre alguns dos vrios credores ou de falsos credores, por um lado, e a empresa beira da insolvncia ou j insolvente, por outro, atravs de simples expedientes como a no contestao das aces, omisso de apresentao de prova, confisso dos factos ou do pedido, etc., tudo com prejuzo manifesto dos restantes credores no intervenientes na aco declarativa.

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    sobre a insolvncia apenas contempla os que estiverem verificados por sentena transitada em julgado (art. 173.). Por isso, declarada a insolvncia, aberto o incidente de qualificao da insolvncia com carter pleno e fixado o prazo da reclamao de crditos, se as aes declarativas pendentes contra o devedor insolvente (em que se discutem direitos patrimoniais) prosseguirem, estar-se- a desrespeitar o comando dos preceitos legais [], com particular relevo para o art. 90., porquanto aqueles credores da insolvncia estariam, na pendncia desta, a exercer os seus direitos por meios processuais alheios ao CIRE de nada servindo a sentena proferida na ao instaurada contra o devedor13.

    Em sentido contrrio a esta tese do Supremo, podem ser apontados alguns Acrdos das Relaes14, que tm defendido que a declarao de insolvncia no determina, s por si, a inutilidade das aes declarativas que tm como objecto o reconhecimento judicial de um crdito sobre a insolvente [] Tal inutilidade apenas ocorrer a partir do momento em que, no processo de insolvncia, proferida sentena de verificao de crditos, j que, a partir desse momento, essa sentena que reconhece e define os direitos dos credores15.

    Penso que, apesar de a ao no ser apensa e o credor no reclamar o seu crdito no processo de insolvncia, a ao declarativa condenatria conserva a sua utilidade e, por isso, dever ser apenas suspensa e no extinta por inutilidade superveniente da lide16. S no caso de o credor ter reclamado

    13 Acrdo do Supremo Tribunal de Justia, de 20 de Setembro de 2011 (Garcia Calejo).14 Designadamente, os Acrdos do Tribunal da Relao do Porto, de 17 de Dezembro de

    2008 (Maria Catarina), de 22 de Setembro de 2009 (Ana Lucinda Cabral), de 2 de Maro de 2010 (Marques de Castilho) e de 1 de Junho de 2010 (Guerra Banha); e os Acrdos do Tribunal da Relao de Lisboa, de 30 de Junho de 2010 (Paula S Fernandes) e de 15 de Fevereiro de 2011 (Manuel Marques). No sentido da tese defendida pelo STJ, vejam-se, por exemplo, os Acrdos do Tribunal da Relao de Coimbra, de 22 de Maro de 2011 (Artur Dias), e de Lisboa, de 3 de Junho de 2009 (Seara Paixo), de 30 de Junho de 2010 (Duro Mateus Cardoso) e de 16 de Maro de 2011 (Natalino Bolas).

    15 Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 17 de Dezembro de 2008 (Maria Catarina). No mesmo sentido, veja-se o voto de vencido de Jorge Arcanjo, in Acrdo do Tribunal da Relao de Coimbra de 22 de Maro de 2011 (Artur Dias).

    16 A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide d-se quando, por facto ocorrido na pendncia da instncia, a pretenso do autor no se pode manter, por virtude do

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    o seu crdito e de este ter sido objeto de sentena de verificao e graduao de crditos poder a instncia extinguir-se por inutilidade superveniente da lide (art. 287., al. e)): na verdade, a sentena de verificao e graduao dos crditos proferida no processo de insolvncia, depois de encerrado o processo, constitui para o efeito ttulo executivo (art. 233., n. 1, al. c)).

    Em consequncia, o momento processual em que esta extino (a ocorrer) dever operar no coincide com a reclamao do crdito, mas sim com o momento da prolao da sentena de verificao e graduao dos crditos. De facto, a reclamao do crdito no importa necessariamente a prolao de uma sentena de verificao e graduao dos crditos. Desde logo, na hiptese de encerramento do processo por insuficincia da massa, extingue-se a instncia da verificao e graduao dos crditos, exceto se j tiver sido proferida sentena de verificao e graduao dos crditos (art. 233., n. 2, al. b))17. Depois, tambm na hiptese de o processo encerrar a pedido do devedor (nos termos do art. 230., n. 1, al. c)), pode o processo de insolvncia terminar sem que o credor a obtenha ttulo comprovativo do seu direito contra o insolvente (art. 232., n. 2, al. b)).

    Por isso, a reclamao do crdito no importa necessariamente a inutilidade superveniente da lide de natureza declarativa intentada contra o insolvente: a inutilidade superveniente s ocorrer a partir do momento em que, no processo de insolvncia, proferida sentena de verificao de crditos, j que a partir desse momento, essa sentena que reconhece e define os direitos dos credores18.

    desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra a satisfao fora do esquema da providncia pretendida ( ) a soluo do litgio deixa de interessar - alm, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele j ter sido atingido por outro meio - assim, FREITAS, Jos Lebre/REDINHA, Joo/PINTO, Rui, Cdigo de Processo Civil Anotado, vol. 1., Coimbra Editora, 1999, p. 512.

    17 No caso de a insuficincia ser constatada na prpria sentena declarativa de insolvncia, e uma vez que a sentena s contm as referncias das alneas a) e b) do art. 36., no podem ser aplicados os arts. 85.-89.. Neste sentido tambm o Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 5 de Maio de 2009 (Maria Eir), A medida constante do referido preceito legal [art. 88., n. 1, do CIRE] no faz sentido em relao aos casos em que apenas se declarou a insolvncia restrita, em que no h, para alm do mais, lugar fase da reclamao de crditos.

    18 Assim, Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 17 de Dezembro de 2008 (Maria Catarina).

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    2. A substituio processual do insolvente

    Em consequncia da privao do poder de disposio e de administrao dos bens que integram a massa insolvente, o devedor perde correspetivamente a sua legitimidade processual19. Por isso, em todas as aes patrimoniais pendentes em que o insolvente seja autor ou ru, o administrador da insolvncia substitui (por fora da lei) o insolvente, independentemente da apensao do processo e do acordo da parte contrria - esta substituio automtica, sem necessidade de qualquer habilitao20.

    A extenso desta substituio deve ser aferida em funo do alcance da prpria privao do poder de disposio e de administrao (prevista no art. 81.). Assim, devero ficar fora da sua rbita as aes que respeitem a direitos de natureza pessoal, tais como as aes de divrcio, de investigao de paternidade, bem como as aes penais21.

    A substituio processual d-se quando admitido como parte no

    19 A legitimidade uma certa posio [das partes] em face da relao material litigada. Ela corresponde grosso modo, ao conceito civilista de poder de disposio: assim, ANDRADE, Manuel A. Domingues, Noes Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1979, p. 84.

    20 Sousa de Macedo falava aqui de habilitao universal, por mero efeito da declarao de insolvncia, ou seja, uma vez decretada, em todo e qualquer negcio, em toda e qualquer aco, ipso facto deixa o falido de ter legitimidade para esta caber ao administrador op. cit., vol. II, p. 117. A confirmar esta desnecessidade de habilitao, o art. 234., n. 4, dispe que, com o encerramento do processo, o devedor passa a ter legitimidade exclusiva para a causa, independentemente de habilitao.

    21 Segundo o Acrdo do Tribunal da Relao de Lisboa de 13 de Setembro de 2011 (Paulo Barreto), I A constituio de arguido e o termo de identidade e residncia constituem actos processuais com carcter prprio e pessoal to acentuado - porque deles emergem direitos e deveres - que a sua aceitao, em representao da insolvente/arguida, exorbita a natureza exclusivamente patrimonial das funes do administrador de insolvncia. II. Assim, no cabe no mbito das funes do administrador de insolvncia, aceitar a constituio como arguido e assinar o termo de identidade e residncia, em representao de pessoa colectiva insolvente, em processo cuja responsabilidade criminal resulta de factos anteriores ao processo de insolvncia.

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    processo quem no sujeito da relao jurdica deduzida em juzo22. O substituto atua no processo em seu nome (e no em nome de outrem, como sucede com o representante) e no seu prprio interesse, mas litiga sobre direito alheio23.

    Na hiptese de o insolvente continuar a intervir no processo como parte, e assim, sem legitimidade processual para tal (ilegitimidade superveniente), a sentena que venha a ser proferida inoponvel massa insolvente. Se o insolvente for substitudo, os atos que tenha praticado em violao da ilegitimidade sero nulos e devero ser repetidos24.

    Com o encerramento do processo de insolvncia, o devedor recupera a sua legitimidade exclusiva para a causa (salvo estipulao em contrrio prevista no plano de insolvncia), independentemente de habilitao ou do acordo da contraparte (art. 233., n. 4).

    III. Os efeitos sobre as aes executivas e sobre os processos nos quais tenha sido praticado qualquer ato de apreenso ou deteno de bens compreendidos na massa insolvente

    1. Por fora do art. 88., em combinao com o art. 85., n. 3, as aes executivas e as diligncias executivas ou providncias, respetivamente propostas e requeridas pelos credores da insolvncia contra o insolvente,

    22 CASTRO, Artur Anselmo, Direito Processual Civil Declaratrio, vol. III, Almedina, Coimbra, 1982, p. 391.

    23 VARELA, Antunes/BEZERRA, J. Miguel/NORA, Sampaio e, Manual de Processo Civil, 2 edio, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pp. 732-733.

    24 MACEDO, Pedro de Sousa, op. cit., vol. II, Almedina, Coimbra, 1968, pp. 117-118.

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    ficam suspensas25, de modo automtico26, podendo a suspenso ser pedida por qualquer credor no processo executivo, com fundamento no requerimento da declarao de insolvncia (art. 870. do Cdigo de Processo Civil)27.

    Os credores da insolvncia tambm ficam impedidos de intentar ao executiva contra o insolvente depois da declarao de insolvncia. Se, contrariando o disposto no art. 88., n. 1, for intentada uma ao executiva contra o insolvente, a mesma dever ser objeto de deciso de indeferimento, por impossibilidade legal28.

    Se j tiver havido algum ato de apreenso ou deteno dos bens que integram a massa insolvente, o juiz ordena a sua apensao ao processo de insolvncia (art. 85., n. 2). Se houver outros executados, o processo corre por apenso apenas contra esses executados, ficando suspenso quanto ao insolvente (art. 88., n. 1, 2 parte).

    Se no tiver havido qualquer ato de apreenso ou deteno, no parece haver motivo para a apensao ao processo de insolvncia (art. 85., n. 2, a contrario). Nesse caso, por fora da lei, o processo fica suspenso, e, se houver

    25 Segundo o Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 13 de Novembro de 2006 (Sousa Lameira): A declarao de insolvncia, com carcter limitado - artigos 191 e 39 CIRE - na qual no foi requerido o complemento da sentena, no determina a declarao de extino da instncia por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 88, n 1 daquele Cdigo e 287 alnea e) do Cdigo de Processo Civil do processo de execuo que corre contra o insolvente. No mesmo sentido o Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 5 de Maio de 2009 (Maria Eir): I - O disposto no art 88, n. 1, do CIRE, invocado no despacho recorrido, no se aplica situao de insolvncia restrita. II - A medida constante do referido preceito legal no faz sentido em relao aos casos em que apenas se declarou a insolvncia restrita, em que no h, para alm do mais, lugar fase da reclamao de crditos.

    26 No sentido de que esta suspenso independente do registo da sentena, por fora do carter urgente e da letra da lei, veja-se Oliveira, Artur Dionsio, Os Efeitos Externos da Insolvncia. As Aces Pendentes Contra o Insolvente, in: Julgar, n. 9, 2009, p. 177.

    27 No sentido de que nula a venda em processo executivo, depois da declarao de insolvncia, cfr. o Acrdo do Tribunal da Relao de Guimares, de 5 de Junho de 2008 (Manso Rainho).

    28 Quanto ao problema das custas judiciais, veja-se Oliveira, Artur Dionsio, Os Efeitos Externos da Insolvncia. As Aces Pendentes Contra o Insolvente, in: Julgar, n. 9, 2009, p. 176.

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    outros executados, prossegue contra eles29, sendo apenas extrado traslado do processado respeitante ao insolvente (art. 88., n. 2).

    2. Apesar de a letra da lei prescrever a suspenso do processo ou das diligncias executivas, tem sido suscitada a questo da possibilidade de a instncia se extinguir por inutilidade superveniente da lide executiva (nos termos do art. 287., al. e), do Cdigo de Processo Civil).

    No sentido de que a instncia no se extingue, vai a doutrina30 e a jurisprudncia: veja-se, designadamente, o Acrdo do Tribunal da Relao de Lisboa, de 21 de Setembro de 2006 (Caetano Duarte), segundo o qual o art. 88., n. 1 () deve ser interpretado no sentido de que a execuo deve ser sustada quanto ao insolvente mas no deve ser declarada finda, uma vez que os credores podero, depois de o processo encerrar, e na hiptese de no obterem a a integral satisfao dos seus direitos, prosseguir as execues suspensas, aproveitando toda a atividade processual entretanto realizada at prolao da sentena declarativa de insolvncia31.

    3. O Anteprojeto de diploma que altera o CIRE, de 24 de novembro de 2011, acrescenta ao art. 88. dois nmeros.

    De acordo com o n. 3, As aes executivas suspensas nos termos do n. 1 extinguem-se, quanto ao executado insolvente, logo que ocorra uma das seguintes situaes:

    29 Neste sentido, veja-se o Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 3 de Novembro de 2011 (Guerra Banha).

    30 Na doutrina, defendendo a suspenso enquanto o processo durar, LEITO, Lus Manuel Teles de Menezes, Cdigo da Insolvncia e da Recuperao de Empresas - Anotado, 5 edio, Almedina, Coimbra, 2009, p. 129.

    31 No mesmo sentido, veja-se tambm, entre muitos outros, o Acrdo do Tribunal da Relao de Guimares, de 15 de Setembro de 2011 (Amlcar Andrade); os Acrdos do Tribunal da Relao do Porto, de 3 de Novembro de 2011 (Guerra Banha), de 21 de Junho de 2010 (Anabela Luna de Carvalho); o Acrdo do Tribunal da Relao de Coimbra, de 3 de Novembro de 2009 (Teresa Pardal).

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    a) O processo de insolvncia seja encerrado por insuficincia de bens da massa insolvente;

    b) Seja deliberada em assembleia de credores a liquidao da massa insolvente.

    Por fora do novo n. 4, Compete ao administrador da insolvncia comunicar por escrito e, preferencialmente, por meios eletrnicos, ao agente de execuo nomeado nas execues afetadas pela declarao de insolvncia, que sejam do seu conhecimento, a ocorrncia dos factos descritos no nmero anterior.

    A extino das aes executivas suspensas, de acordo com este Anteprojecto, pode fundar-se, desde logo, no encerramento do processo por insuficincia de bens da massa insolvente. Parece tratar-se apenas da hiptese legal prevista no art. 232., e, por isso, dos casos em que, aps a prolao da sentena declarativa de insolvncia, o administrador da insolvncia se apercebe de que a massa insolvente insuficiente para a satisfao das custas do processo e das dvidas da massa insolvente, dando disso conhecimento ao juiz32. Temos dvidas quanto extino das aes executivas nesta hiptese: se o patrimnio insuficiente para a satisfao das dvidas da massa e das custas do processo de insolvncia, pode no o ser para a satisfao do crdito exequendo. Por que no deixar atuar as regras gerais de extino da instncia executiva, previstas no art. 919., mais concretamente nos arts. 832., n. 3, 833.-B, n. 6 e 875., n. 6, todos do CPCivil?

    A extino das aes executivas suspensas, ainda de acordo com o Anteprojeto, pode tambm fundamentar-se na deliberao da assembleia de credores de liquidao da massa insolvente (art. 88., n. 3, al. b)). Esta deliberao, que poder ser tomada pela assembleia de credores de apreciao do relatrio (prevista e regulada no art. 156.), ou at pela assembleia de

    32 Parece, assim, estar excluda a hiptese do art. 39.: o juiz, antes da prolao da sentena declarativa da insolvncia, conclui que o patrimnio do devedor no presumivelmente suficiente para o pagamento das custas processuais e das dvidas da massa insolvente. Neste caso, nem chegam a produzir-se os efeitos (substantivos ou processuais) associados declarao de insolvncia, designadamente a suspenso das aes executivas (art. 39., n. 7, al. a)).

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    discusso e votao da proposta de plano de insolvncia (arts. 209. e ss.), , s por si, suficiente para a extino da ao executiva (no parecendo necessrio o encerramento do processo de insolvncia)33. Em consequncia da alterao legal, as aes executivas passam a conhecer duas fases na pendncia da ao de insolvncia: numa primeira fase, ficam suspensas quanto ao executado insolvente; numa segunda fase, quando se preencha a alnea b) do n. 3, as aes extinguem-se quanto ao executado insolvente.

    4. A suspenso da ao executiva dever perdurar at ao encerramento do processo, momento em que, em regra, os efeitos da declarao de insolvncia cessam (art. 233.). Em consequncia deste encerramento, o destino das execues suspensas depender de vrias condicionantes, designadamente do sujeito passivo da declarao de insolvncia e do regime jurdico do encerramento do processo34.

    Sendo o insolvente uma pessoa singular, se o processo de insolvncia tiver sido encerrado com fundamento no art. 230., n. 1, al. a) (aps o rateio final) e o credor tiver obtido a satisfao integral do seu crdito no processo de insolvncia, a instncia executiva dever ser julgada extinta por inutilidade superveniente da lide; se o credor no obteve essa satisfao integral, a execuo retomar os seus termos. Todavia, se tiver sido apresentado pedido de exonerao do passivo restante e tiver sido proferido o despacho inicial de cesso do rendimento disponvel, no obstante o encerramento do processo, e durante o perodo da cesso, no so permitidas quaisquer execues sobre os bens do devedor, destinadas satisfao dos crditos sobre a insolvncia (art. 242., n. 1).

    Na hiptese de o insolvente ser uma sociedade comercial, com o

    33 A expresso legal logo que ocorra uma das seguintes situaes parece significar que a extino da instncia automtica.

    34 Seguiremos de perto a anlise de Artur Dionsio de Oliveira no seu estudo Os Efeitos Externos da Insolvncia. As Aces Pendentes Contra o Insolvente, in: Julgar , n. 9, 2009, pp. 179 e ss.

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    encerramento do processo aps o rateio final a execuo deve extinguir-se, pois, por fora do art. 234., n. 3, a sociedade extingue-se aps o encerramento do processo.

    Se o processo de insolvncia encerrar antes do rateio final, com fundamento na al. c), nada parece obstar ao prosseguimento da ao executiva, trate-se de um insolvente pessoa singular ou pessoa coletiva (art. 233., n. 1, al. c)).

    Se o processo encerrar aps a aprovao de um plano de insolvncia, de acordo com o art. 230., n. 1, al. b), o destino das execues em curso depender do contedo do prprio plano de insolvncia (art. 233., n. 4).

    Se o processo encerrar na sequncia da aprovao de um plano de pagamentos (art. 259., n. 4), a sentena declarativa de insolvncia s contm as referncias das alneas a) e b) do art. 36.- por isso, no so desencadeados os efeitos processuais contemplados no Cdigo. Neste caso, os efeitos processuais, podero, eventualmente, ser desencadeados pelo prprio plano de pagamentos (arts. 233., n. 1, al. c) e 252., n. 2).

    IV. Os efeitos sobre as convenes arbitrais

    Inovadoramente, o Cdigo, no art. 87., e replicando a norma equivalente do direito concursal espanhol (art. 52 Ley Concursal35), regula os efeitos da declarao de insolvncia sobre a subsistncia das convenes de arbitragem, quando um dos contraentes declarado insolvente.

    Desde logo, determina a suspenso da eficcia das convenes arbitrais

    35 Artculo 52. Procedimientos Arbitrales 1. Los convnios arbitrales en que sea parte el deudor quedarn sin valor ni efecto durante la tramitacin del concurso, sin perjuicio de lo dispuesto en los tratados internacionales. 2. Los procedimientos arbitrales en tramitacin al momento de la declaracin de concurso se continuarn hasta la firmeza del laudo, siendo de aplicacin las normas contendias en los apartados 2 y 3 del artculo anterior.

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    em que o insolvente seja parte, contanto que digam respeito a litgios cujo valor possa influenciar o valor da massa insolvente (n. 1 do art. 87.)36. Trata-se de uma soluo que, perante o silncio da lei (quer do Cdigo dos Processos Especiais de Recuperao da Empresa e de Falncia37, quer do Cdigo de Processo Civil), j vinha sendo defendida pela doutrina38 e pela jurisprudncia39.

    Todavia, este regime de suspenso sofre duas restries, pois no valer se se verificar alguma das seguintes hipteses: prevalncia dos tratados internacionais aplicveis (art. 87., n. 1, in fine); pendncia data de declarao de insolvncia de um processo arbitral (art. 87., n. 2).

    Se, data da declarao de insolvncia, j estiver pendente algum processo, por remisso expressa para o art. 85., n. 3, o insolvente substitudo pelo administrador da insolvncia40. No obstante a pendncia do processo arbitral, o credor no fica dispensado de reclamar o respetivo direito nos termos gerais do art. 128., n. 3 (art. 87., n. 2, parte final).

    36 Poder a conveno arbitral no respeitar a litgios de natureza patrimonial que possa influenciar o valor da massa, como por exemplo em certas hipteses em que esteja em causa a apreciao de prevalncia de um contrato de arrendamento intransmissvel - assim, FERNANDES, Lus A. Carvalho/ LABAREDA, Joo, op. cit., p. 360, nota 2.

    37 Muito embora o Cdigo dos Processos Especiais de Recuperao da Empresa e de Falncia j previsse a possibilidade de o liquidatrio judicial celebrar convenes de arbitragem, nos termos previstos no seu art. 144.. A este propsito, veja-se MENDES, Armindo Ribeiro/MENDES, Sofia Ribeiro, Crnica de Jurisprudncia Portuguesa em 2009, in: Revista Internacional de Arbitragem e Conciliao, Ano III, Maio 2010, p. 270.

    38 Assim, MACEDO, Pedro de Sousa, op. cit., vol. II, p. 112, que j defendia que o princpio da universalidade de procedimento prevalece sobre a competncia convencional, o compromisso arbitral e a clusula compromissria.

    39 Neste sentido, o Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 21 de Abril de 2005 (Pinto dos Santos), fundamentando-se a deciso de no vinculao da insolvente clusula compromissria no instituto da resoluo com fundamento na alterao anormal das circunstncias (de acordo com o art. 437., n. 1, do Cdigo Civil), ou seja, a supervenincia do estado de falncia e a consequente impossibilidade de suportar os custos do processo arbitral.

    40 No sentido de que no h lugar apensao do processo arbitral ao processo de insolvncia, LEITO, Lus Manuel Teles de Menezes, Cdigo , op.cit., p. 97, nota 2; Lus FERNANDES, Lus A. Carvalho/ LABAREDA, Joo, op. cit., p. 361, nota 4.

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    V. Os efeitos sobre as dvidas da massa insolvente

    O art. 89. regula os efeitos da declarao de insolvncia sobre as aes respeitantes a dvidas da massa insolvente trata-se de dvidas que se encontram elencadas essencialmente no art. 51. (alm de outras como tal qualificadas no Cdigo) e que so pagas precipuamente em relao aos crditos sobre a insolvncia (art. 172., n. 1), na data do seu vencimento, qualquer que seja o momento processual41.

    As aes, declarativas ou executivas42 (com exceo das execues por dvidas tributrias43), respeitantes s dvidas da massa insolvente correm por apenso ao processo de insolvncia - em consequncia, o tribunal onde corre o processo de insolvncia tem uma competncia por conexo e obrigatria 44, pois o autor no tem qualquer faculdade de opo.

    41 A este propsito, veja-se o nosso Manual de Direito da Insolvncia, 3 edio, Almedina, Coimbra, 2011, pp. 202 e ss.

    42 Segundo o Acrdo do Tribunal da Relao de Coimbra, de 17 de Abril de 2008 (Lus Miguel de Azevedo Mendes), O Tribunal do Trabalho incompetente, em razo da matria, para conhecer de aco para apreciao de despedimento ocorrido em data posterior a uma declarao de insolvncia duma sociedade e de crditos laborais emergentes do contrato de trabalho mantido e daquela cessao. In http://www.colectaneadejurisprudencia.com

    43 Segundo o Acrdo do Supremo Tribunal Administrativo, de 7 de Setembro de 2011 (Isabel Marques da Silva), A instaurao da execuo fiscal por crditos vencidos posteriormente declarao de falncia, como so os crditos exequendos, encontra expresso apoio legal no disposto no n. 6 do artigo 180. do CPPT, preceito que h-de ser, contudo, interpretado razoavelmente, atenta a unidade do sistema jurdico, no sentido de que s ser vivel o prosseguimento dos processos de execuo fiscal por crditos vencidos aps a declarao de falncia se forem penhorados bens no apreendidos naquele processo.

    44 Acrdo do Tribunal da Relao do Porto, de 3 de Maio de 2011 (Ana Lucinda Cabral), segundo o qual, apesar de esta aco de despejo revestir a natureza de uma ao autnoma, por fora da declarao de insolvncia passa a integrar um incidente (em sentido lato) do respectivo processo, sendo chamada para a sua esfera como efeito processual da declarao, passando a integrar de forma dependente os trmites do prprio processo de insolvncia, perdendo autonomia e integrando os procedimentos integrados para liquidao do patrimnio do insolvente e pagamento das suas dvidas.

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    Com vista estabilizao da massa insolvente, o art. 89., n. 1 estabelece um perodo de carncia45 para a propositura de execues de dvidas da massa insolvente trs meses seguintes declarao de insolvncia.

    VI. Os efeitos sobre as aes previstas no art. 82.

    Com uma insero sistemtica duvidosa, o CIRE tambm contm uma disciplina processual especial para as aes previstas no art. 82., n. 2-4.

    Desde logo, trata-se de aes em que atribuda ao administrador da insolvncia legitimidade exclusiva, na pendncia do processo de insolvncia46, para propor e/ou fazer seguir as aes elencadas nos n.s 2 e 3 do art. 82., por um lado, e, por outro lado, imposta por lei a sua tramitao por apenso (art. 82., n. 5).

    A concentrao na instncia insolvencial da apreciao das atuaes dos administradores societrios, perante a sociedade insolvente (art. 82., n. 2, al. a)), o corolrio da perda de poder de disposio e de administrao pelo insolvente (art. 81., n. 1) e, perante os credores sociais47, a consequncia direta da exclusividade da instncia insolvencial para a reclamao dos crditos (art. 82., n. 2, al. b)48 e c)).

    45 Assim, FERNANDES, Lus A. Carvalho/ LABAREDA, Joo, op. cit., p. 363, nota 3.46 Crticos em relao restrio temporal deste efeito pendncia da ao (por estatuio

    expressa do promio do n. 2), vejam-se FERNANDES, Lus A. Carvalho/ LABAREDA, Joo, op. cit., p. 346, nota 7.

    47 Para Manuel A. Carneiro da Frada, as aes contempladas no art. 82., n. 2, so susceptveis de aproveitar, reflexa ou indirectamente, generalidade desses mesmos credores. Estes interesses dos credores so individuais, mas homogneos. Por isso, o Autor conclui que as aces destinadas a satisfazer interesses meramente singulares (no comuns) de reparao de danos por parte dos credores da sociedade insolvente contra os seus administradores so autnomas. Do mesmo modo, as aces dos scios contra esses mesmos administradores - A Responsabilidade dos Administradores na Insolvncia, in: Revista da Ordem dos Advogados, Ano 66, II, Lisboa, Setembro 2006, p. 673.

    48 Segundo Maria Elisabete Ramos, para alm de outras, o art. 82., n. 2, al. b)

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    Na pendncia do processo de insolvncia, quem tem legitimidade ao abrigo do direito societrio para propor as aes previstas no art. 82., n. 2, sociedade, scios e credores da sociedade, encontra-se privado de legitimidade activa para propor ou fazer [seguir] aco social de responsabilidade contra os administradores de facto ou de direito49. Alis, esta substituio, nem depende de prvia deliberao social (art. 82., n. 2, al. a), in fine), afastando-se, deste modo, a aplicao do art. 75., n. 1, do Cdigo das Sociedades Comerciais, segundo o qual a ao de responsabilidade proposta pela sociedade depende de deliberao dos scios, tomada por simples maioria () .

    Porto, 11 de dezembro de 2011

    Maria do Rosrio Epifnio

    contempla as aces destinadas a reclamar a indemnizao devida pelos administradores da sociedade aos credores desta sempre que, pela violao culposa das disposies legais ou contratuais destinadas proteco daqueles, o patrimnio social se torne insuficiente para a satisfao dos respectivos crditos (art. 78., n. 1, do CSC) - A Insolvncia da Sociedade e a Responsabilizao dos Administradores no Ordenamento Jurdico Portugus, in: Prima Facie, Revista de Ps-Graduao em Cincias Jurdicas, n. 7, 2005, p. 17, consultada no site http://www.ccj.ufpb.br/prima/artigos/n7/insolvencia.pdf.

    49 RAMOS, Maria Elisabete, op. cit., p. 15.