os efeitos da pratica de exercício fisico na qualidade do sono

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO 1 Os Efeitos da Prática de Exercício Físico na Qualidade do Sono Ana F. Pinheiro, Bruna F. Magalhães, Joana S. Carvalho e Soraia F. Oliveira, Departamento de Educação e Psicologia, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real Correspondência acerca deste artigo para Bruna Magalhães, Departamento de Educação e Psicologia, Utad, Rua Dr. Manuel Cardona, 5000 Vila Real. Contacto: [email protected]

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Page 1: Os efeitos da pratica de exercício fisico na qualidade do sono

OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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Os Efeitos da Prática de Exercício Físico na Qualidade do Sono

Ana F. Pinheiro, Bruna F. Magalhães, Joana S. Carvalho e Soraia F. Oliveira,

Departamento de Educação e Psicologia, Universidade de Trás-os-Montes e Alto

Douro, Vila Real

Correspondência acerca deste artigo para Bruna Magalhães, Departamento de Educação

e Psicologia, Utad, Rua Dr. Manuel Cardona, 5000 Vila Real.

Contacto: [email protected]

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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Resumo

Na nossa sociedade, o stress é um fator que cada vez mais se encontra presente no

dia-a-dia da população, desde a preocupação com o cumprimento dos horários de

trabalho até aos problemas em escala mundial. Este é um dos principais fatores

geradores de problemas relacionados com o sono. Porém, defende-se a teoria de que

técnicas relacionadas com a higiene do sono, onde se inclui a prática regular de

exercício físico, ajudam na melhoria destes problemas. Assim, e com o intuito de

determinar se, de facto, existe relação entre a qualidade de sono e a prática regular de

exercício físico, procedeu-se a esta investigação. A amostra utilizada no presente estudo

foi constituída por 105 estudantes da UTAD, dos cursos de Educação Física e Desporto

Escolar e Educação Básica. O instrumento utilizado foi uma adaptação da Escala de

Sonolência de Epworth, da Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh e de duas

questões acerca do número de vezes que cada indivíduo pratica exercício físico numa

semana. Após a análise dos dados, verificou-se que não existem diferenças

estatisticamente significativas entre a prática de exercício físico e a qualidade de sono,

apesar de parecer uma tendência para tal. Assim, sugere-se a interessados neste assunto,

que seja feita uma replicação deste estudo com uma maior amostra para que seja

possível detetar uma possível relação entre estas variáveis.

Palavras-chave: Exercício físico, sono, insónia, benefícios da atividade física,

tratamentos não farmacológicos, qualidade de sono

Abstract

In our society, stress is a factor that is increasingly present in day-to-day the

population, since the concern with the fulfillment of working hours up to problems on a

global scale. This is a major factor leading to problems with sleep. However, it is

argued that the theory techniques related to sleep hygiene, which includes regular

exercise, help in improving these problems. Thus, in order to determine whether in fact

there is a relationship between quality of sleep and regular exercise, we proceeded with

this investigation. The study involved a sample of 105 UTAD’s students, the courses of

Physical Education and Scholar Sport and Basic Education. The instrument used was an

adaptation of the Epworth Sleepiness Scale, the Sleep Quality Index of Pittsburgh and

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two questions about the number of times that each individual does physical exercise a

week. After analysing the data, it was found that there are no statistically significant

differences between physical activity and quality of sleep, although it seems a tendency

to do so. Thus, it is suggested to parties in this matter, is made a replication of this study

with a lerger sample to be able to detect a possible relationship between these variables.

Keywords: exercise, sleep, insomnia, benefits of psysical activity, non-

pharmacological treatments, quality of sleep

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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Vivem-se tempos de enorme ansiedade, de dicotomia entre o excesso e a

inexistência de trabalho, de quebras de hábitos e de rotinas. O sono e, sobretudo, a sua

qualidade, indispensáveis na manutenção da nossa saúde, saem neste contexto

amplamente prejudicados. Porém, numa igual época de crise económica, a prática

regular de atividade física não implica necessariamente gastos demasiado dispendiosos.

Desta forma, a importância deste estudo perfaz-se no sentido de relacionar a prática de

atividade física com a qualidade do sono, pretendendo-se daqui obter resultados que

possibilitem um acréscimo na qualidade de vida atual aliada a uma diminuição dos

custos de tratamento.

Ao longo da história das civilizações, o estudo do sono tem despertado um

crescente interesse. Na sua génese, este estudo apenas resultava em investigações de

cariz observacional (Souza & Guimarães, 1999, cit por Silva & Lima, s/d), contudo, na

atualidade, o mesmo revela-se mais complexo e completo.

A ampliação de conhecimentos acerca dos registos das ondas cerebrais obtidas

através do electroencefalograma (EEG) permitiu a evolução e a multiplicação dos

conhecimentos sobre o sono, possibilitando a distinção objetiva dos conceitos de vigília

(relaxada) e de sono, bem como os seus estágios (Fernandes, 2006).

Hans Berger (1929, cit por Fernandes, 2006), o primeiro a registar ondas cerebrais

na superfície craniana, demonstrou que, durante o estado de vigília, a atividade cerebral

é mais dessincronizada e de baixa voltagem, enquanto que no decorrer do período de

sono esta é mais lenta e sincronizada (Fernandes, 2006).

O sono, processo cíclico, divide-se em dois padrões fundamentais: sono REM

(Rapid Eye Movement - com movimentos oculares rápidos) e sono Não-REM (ou

NREM – Non Rapid Eye Movement – sem movimentos oculares rápidos). De acordo

com estudos poligráficos sistemáticos de Aserinsky, Kleitman e Dement (1953, cit por

Fernandes, 2006), o segundo padrão referido é alternado a cada 90 minutos pelo

segundo, sendo este ciclo repetido entre 5 a 6 vezes durante o período noturno do sono.

Este último é ainda composto por 4 estágios de crescente profundidade: I, II, III e IV,

em que há relaxamento muscular quase total em relação à vigília (Fernandes, 2006).

O NREM caracteriza-se pelo relaxamento e progressiva diminuição dos

movimentos corporais, aumento progressivo de ondas lentas (no EEG), inexistência de

movimentos oculares rápidos e respiração e batimento cardíaco normais. Por outro lado,

o sono REM apresenta como principais características hipotonia, emissão de sons,

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movimentos oculares rápidos, baixa voltagem (no EEG), respiração e batimento

cardíaco irregulares e sonhos (Antunes, Andersen, Tufik, & Mello, 2008; Fernandes,

2006; Geib, Neto, Wainberg, & Nunes, 2003).

Sendo, aparentemente, o sono um ato quase involuntário e natural, este não é, de

todo, passivo, verificando-se crucial para a manutenção da saúde e do bem-estar do ser

humano já que reinstala, repara e restaura as condições existentes no início da vigília

anterior (Davenne, 2000, cit por Garcia-Mas, Aguado, Guatero, Calabina, Kiménez, &

Pérez, 2003; Mello, 2002, cit por Zanetti, Lavoura, & Machado, 2007; Reimão, 1996,

cit por Silva & Lima, s/d). Desta forma, o aumento do tempo de vigília e,

consequentemente, a diminuição do tempo disponível para o sono que se verifica cada

vez mais na atual sociedade, comprometem o desempenho cognitivo de cada ser

humano (memória, aprendizagem, raciocínio lógico, cálculos matemáticos, processos

verbais complexos, poder de decisão) (Boscolo, Sacco, Antunes, Mello, & Tufik, s/d;

Martinez, 1999, cit por Silva & Lima, s/d).

Nos dias que correm, a evolução das tecnologias exige uma maior produtividade e

capacidade de concentração por parte do Homem, reflectindo-se este facto num

aumento do seu tempo de vigília (Filho, Carvalho, & Gomes, 2010). Martinez (1999, cit

por Silva & Lima, s/d) e Margolles e Donate (2009) consideram que na sociedade atual

ocidental um adulto com um desenvolvimento dentro dos parâmetros médios da

população varia o seu tempo de sono entre 7 a 8 horas por dia. Porém, Martinez (1999,

cit por Silva & Lima, s/d) considera que a necessidade de sono de um adulto pode ir até

às 12 horas diárias e ressalva que o tempo e a estrutura do sono variam conforme a

idade do indivíduo. Assim, um bebé recém-nascido tem necessidade de dormir mais que

uma criança de 5 anos. Por outro lado, esta criança sentirá necessidade de dormir mais

tempo que um adulto. Porém, este adulto dormirá mais que uma pessoa idosa.

A qualidade e quantidade do tempo de sono será determinada, segundo Souza e

Neto (2010), pelos denominados hábitos de sono, ou seja, pela ocorrência ou não de

fatores e situações despoletantes ocorridas entre o horário de deitar e de acordar e será

percecionada subjetivamente pelo próprio sujeito como qualidade e ou quantidade

normal de sono. A isto e diretamente relacionadas encontram-se as condições

alimentares, afetivas, clínicas e socioeconómicas que o sujeito apresente. Petit, Azad,

Byszewsky, Sarazan e Power (2003, cit por Pinedo, Rodríguez, Saavedra, & Jimeno,

2010) e Filho et al. (2010) referem que os problemas mais frequentes de insónias estão,

de facto, relacionados com a má higiene do sono (conjunto de medidas, hábitos e

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condutas que facilitam o sono, evitando tudo aquilo que o possa prejudicar). Assim, a

ingestão de comidas pesadas, cafeína e outros estimulantes, bem como os problemas

afetivos e/ou sociais da pessoa podem dificultar o surgimento do sono.

Desta forma, para ser possível realizar uma higiene do sono recomendável, não

nos deveremos submeter a temperaturas extremas, mantendo cuidados com a

alimentação (as vitaminas B e o cálcio favorecem o sono, enquanto que o álcool, a

cafeína e a nicotina prejudicam-no), manter um horário de sono regular, utilizar a cama

apenas para dormir e ter relações sexuais, não ver televisão nem ouvir música em

horários próximos ao de deitar e praticar exercício físico (Berlim, Lobato, & Manfro,

2005; Nieman, 2005; Pinedo et al., 2010; Tynjala, 1999, cit por Zanetti et al., 2007).

Porém, existem certos distúrbios relacionados com o sono e que não provêm

diretamente dos hábitos prejudiciais indicados anteriormente. Assim, estima-se que

cerca de um terço de toda a população mundial adulta apresente distúrbios do sono

(Martinez, 1999, cit por Silva & Lima, s/d).

Os transtornos primários do sono dividem-se em dissonias, que são caracterizadas

pela sonolência durante o dia e dificuldade em dormir ou adormecer de noite, e as

parassonias, caracterizadas, por sua vez, pelas condutas anormais relacionadas com o

sono (sonambulismo, sonilóquia, entre outros) (Monti, 2000; Silva & Lima, s/d).

A insónia, a mais prevalente entre os distúrbios relacionados com o sono,

encontra-se entre os transtornos de dissonia (Chokroverty, 1994, cit por Silva & Lima,

s/d; Monti, 2000). Esta é uma dificuldade acrescida em iniciar ou manter o sono até ao

início da manhã seguinte, ou queixas constantes de não se ter um sono com efeito

reparador (Berlim et al., 2005). Porém, a insónia pode variar conforme o tipo e a

duração. Assim, em relação ao tipo, uma insónia pode ser inicial (ou de manutenção) ou

terminal. Em relação à duração, pode variar entre crónica e aguda. Desta forma, uma

insónia inicial diz respeito à dificuldade agravada em iniciar o sono e de o manter e,

pelo contrário, a insónia terminal refere-se a despertares muito precoces. Por outro lado,

e em relação à duração, uma insónia crónica é diagnosticada quando o paciente

apresenta os sintomas há, pelo menos, um mês, enquanto a insónia aguda diz respeito às

queixas com uma duração não inferior a três meses e associado a um fator gerador de

stress (Passos, Tufik, Santana, Poyares, & Mello, 2007). Para que se considere uma

insónia clinicamente relevante e com necessidade de tratamento, estes sintomas devem

ocorrer, pelo menos, 3 vezes por semana, num período mínimo de um mês e estarem

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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clinicamente associados a sofrimento por parte do indivíduo afetado, bem como

prejuízo ou défice no seu desempenho cognitivo e/ou social (Berlim et al., 2005).

Os indivíduos que possuem este distúrbio do sono geralmente queixam-se de

fadiga, irritabilidade, distúrbios do humor, diminuição da concentração e da

produtividade no trabalho e sonolência durante o restante dia (Almeida, Siqueira, Lima,

Brasileiro-Santos, & Filho, 2011; Antunes et al., 2008; Walsh, Hartman, & Kowall,

1994, cit por Silva & Lima, s/d; Zanetti et al., 2007). Assim, a insónia acaba por se

tornar num distúrbio de tensão psicofisiológica somatizada que impossibilita o sono e

que resultam numa diminuição das capacidades cognitivas durante a vigília (Walsh et

al., 1994, cit por Silva & Lima, s/d).

Vários autores (Berlim et al., 2005; Boscolo et al., 2004, cit por Souza & Neto,

2010; Buman & King, 2010; Geib et al., 2003; Hayak et al, 1997, cit por Silva & Lima,

s/d; Passos et al., 2007) afirmam que a prática de exercício físico, juntamente com

técnicas psicoterapêuticas de apoio (técnicas de relaxamento, higiene do sono, controlo

de estímulos), diminuem a necessidade de recurso a fármacos no tratamento da insónia.

Geralmente, o tratamento da insónia deve conciliar a utilização de fármacos com outras

medidas não farmacológicas (higiene do sono e terapia cognitiva e de conduta, controlo

de estímulos, técnicas de relaxamento) (Berlim et al., 2005).

Os tratamentos comportamentais como a terapia cognitivo-comportamental, a

intenção paradoxal, o relaxamento progressivo e o controlo de estímulos consideram-se

eficazes no tratamento do sono de má qualidade. Estes tratamentos procuram desativar o

sistema de excitação e reduzir as pistas produtoras de ansiedade (Biazussi, 2008).

Porém, é na higiene do sono que se insere a prática de exercício físico e de atividades

sexuais (que incluem, elas próprias, a prática de exercício físico). As próprias terapias

de conduta, cujo objetivo é diminuir ou modificar os hábitos que interferem com a

manutenção do sono, incluem exercícios como o relaxamento muscular, o ioga e a

meditação (Berlim et al., 2005; Monti, 2000) que relaxam o indivíduo e diminuem a sua

ansiedade. Para reforçar esta ideia, Nieman (1999, cit por Silva & Lima, s/d) refere que

pessoas mais ativas fisicamente adormecem melhor e de forma mais rápida, sentindo-se

menos cansadas durante o seu tempo de vigília. Segundo o mesmo autor, isto acontece

porque o organismo aumenta a quantidade e qualidade do sono profundo de forma a

compensar a energia que foi perdida durante a prática do exercício físico. Apesar desta

evidência, Mello, Boscolo, Esteves e Tufik (2005) referem que a prática de exercício

físico é, ainda, um tratamento não farmacológico pouco recomendado para os distúrbios

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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relacionados com o sono, embora possua diversas vantagens como a inexistência de

contra-indicações ou efeitos secundários e de poder diminuir a utilização de fármacos

(que, por vezes, diminui a qualidade de vida das pessoas ao torná-las dependentes destas

substâncias químicas) (Passos et al., 2007).

Segundo Mello et al. (2005) e Souza e Nunes (2010), existem três teorias que

explicam os benefícios da prática do exercício físico na melhoria da qualidade do sono,

em particular nos indivíduos com insónia: a teoria termorreguladora, a teoria da

conservação da energia e a teoria restauradora. Na primeira, defende-se que o exercício

físico, ao aumentar a temperatura do corpo, facilita o adormecimento já que estimula o

hipotálamo a promover a dissipação de calor e a induzir o sono. Na segunda teoria é

tido em conta que, ao gastar energia na prática do exercício, esta tem que ser

restabelecida durante o sono para que se possa manter um equilíbrio de energias dentro

do próprio organismo do indivíduo. Por outro lado, a terceira teoria defende que a

prática de exercício reduz a energia do sujeito, tendo o indivíduo necessidade de dormir

para repor as suas energias que foram gastas (Buman & King, 2010; Campos, Silva,

Queiroz, Neto, Roizenblatt, Tufik, & Mello, 2008; Mello et al., 2005). Porém, verifica-

se ainda, segundo Mello & Tufik (2004, cit por Biazussi, 2008), que a prática de

exercício físico diminui o tempo de latência para o sono, isto é, o tempo que um dado

indivíduo demora para adormecer. E, noutros aspectos da vida, apresenta efeitos

positivos nos transtornos de humor (Singh, Stavrinos, Scarbek, Galambos, Liber, &

Fiatarone, 2005, cit por Buman & King, 2010) defendem uma melhoria significativa na

qualidade do sono em doentes depressivos com um treino de exercício físico de duração

10 semanas), no crescimento, no desenvolvimento e na longevidade (em particular nos

adolescentes). Por outro lado, o exercício físico regular tem-se mostrado capaz de

melhorar a capacidade funcional, ajudar no controlo do peso, melhorar a qualidade de

vida relacionada com a saúde, reduzir o uso de medicação que possa interferir com o

sono (por exemplo, sedativos, diuréticos, antidepressivos), e que essencialmente são

conhecidas por afectar um grande número de doenças crónicas que podem ter um

impacto negativo na qualidade do sono (Biazussi, 2008).

Todavia, e segundo Mello, Esteves, Comparoni, Benedita-Silva e Tufik (2002), a

própria compreensão da necessidade de manter uma boa higiene do sono e, como tal,

alcançar um período de sono descansado e restaurador é essencial para dormir bem. Esta

correlação é explicada pela afirmação de que qualquer processo restaurador, quer seja

físico ou cognitivo, é acionado e executado com maior intensidade e eficácia durante o

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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sono, visto que durante o sono REM os seres humanos são alvo de uma restauração

cognitiva e melhoram aspectos como a memória, aprendizagem, entre outros e durante o

sono profundo e/ou estágios III e IV do sono é acentuada a restauração tecidual

periférica e do sistema músculo-esquelético.

Conclui-se, assim, que é fundamental que se mantenha uma avaliação minuciosa e

continuada do padrão e queixas relativas ao sono não só para melhorar a qualidade do

sono em si, mas também para que este processo seja favorável a uma melhoria das

capacidades físicas e cognitivas bem como à fase de restauração e implementação das

mesmas, que ocorre durante a fase REM do sono (Mello et al., 2002).

Para o tratamento dos distúrbios do sono Martinez (1999, cit. por Souza & Neto,

2010) refere que, seja qual for o método de diagnóstico dos mesmos e contando com a

disponibilização dos avanços na tecnologia, a perceção do conjunto dos sintomas destes

tipos de problemas pelo paciente continua a ser o indicativo mais importante para o

diagnóstico correto de distúrbios do sono, quer seja obtido através da anamnese clínica

e/ou com a utilização de questionários validados.

Na população de adolescentes e jovens adultos e, mais especificamente, entre os

universitários, é importante que estes mantenham uma boa qualidade de sono, bem

como perceber se sofrem de sonolência diurna, já que o ingresso e frequência num curso

superior é passível de ocasionar alterações de hábitos de sono. Nos estudantes, e no caso

de se verificar que sofram de sonolência diurna, as queixas de sono e as irregularidades

no ciclo vigília-sono podem facilmente representar um decréscimo nas suas capacidades

de concentração, alerta e desenvolvimento normal das suas responsabilidades

académicas (Almeida et al., 2011).

O problema com os universitários, tal como Nércio refere (2010, cit. por Almeida,

et al., 2011) é que nem sempre o número de horas que dormem representa aquilo de que

necessitam mas, sim, aquilo que é possível dormirem tendo em conta o estilo de vida

que apresentam e as responsabilidades académicas a que estão sujeitos. Os mesmos

autores no seu estudo concluem que, tendo em conta o papel que o sono tem na vida de

qualquer indivíduo e dos efeitos que a sua falta provoca, também os profissionais da

área devem encontrar-se mais atentos à existência de distúrbios de sono na população

universitária para que esses mesmos efeitos não comprometam diretamente as

atividades académicas a que estão sujeitos e, consequentemente, a sua qualidade de

vida.

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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Um estudo conduzido por Boscolo et al. (s/d) em adolescentes demonstrou que o

horário das aulas (manhã ou tarde) influi nos resultados que estes obterão nas suas

classificações. Ou seja, alunos que apenas tinham aulas da parte da tarde demonstraram

um maior nível de concentração e de resultados no teste de memorização, admitindo que

não se sentiam tão cansados e não demonstravam um nível tão alto de sonolência. Pelo

contrário, os alunos matutinos afirmaram que era mais difícil de se concentrarem e,

frequentemente, sentiam sonolência durante as aulas (Boscolo et al., s/d).

Porém, não é só nos adolescentes e adultos que se verificam os benefícios da

prática regular de exercício físico. Sherril, Kotchou e Quan (1998, cit. por Guimarães,

Lima, & Souza, 2007) enunciam que existem diversos estudos que reforçam a ideia de

que a prática regular de exercício físico influencia positivamente a qualidade e

quantidade de sono em pessoas idosas. Num estudo levado a cabo por Guimarães et al.

(2007), foram selecionadas idosas sedentárias que não apresentassem sintomas de

insónia ou de qualquer outro transtorno do sono a quem foi prescrito um conjunto de

treinos físicos. Após o término das sessões planeadas inicialmente, verificou-se que, em

média, as horas de sono dos idosos aumentou, tendo passado a dormir mais 1 hora e 12

minutos. Guimarães et al. (2007) concluem que um bom estilo de vida social para os

idosos se repercute, posteriormente, na sua qualidade de sono. Contudo, os mesmos

autores ressalvam ainda a importância da atividade física em grupo que foi praticada

neste estudo. Assim, mostram que o facto de ter sido realizado coletivamente, melhorou

os resultados, pois puderam interagir com pessoas na mesma situação, aumentando o

seu convívio e interação social.

No entanto, verifica-se que a prática de exercício físico pode ter o efeito contrário

àquele que inicialmente se deseja para um indivíduo que possua problemas de sono se a

duração, a frequência ou a intensidade não forem indicadas para o problema e para a

pessoa em questão (Marqueze, Silva, & Moreno, 2009; Mello, 2002, cit por Zanetti et

al., 2007; Mello et al., 2005). Assim, e para que a prática de exercício físico surta efeitos

positivos na qualidade do sono de indivíduos possuidores de insónia, a intensidade do

exercício físico deverá ser leve a moderada (American Sleep Disorders Association,

1991 cit por Zanetti et al., 2007; Vuori, Urponem, Hasan, & Partinen, 1988, cit por

Marqueze et al., 2009) e realizada ao anoitecer ou na parte da manhã (Fundação

Nacional do Sono, 1998, cit por Nieman, 2005). Por outro lado, como cada modalidade

de desporto tem a sua própria singularidade, as suas próprias características e

limitações, torna-se importante escolher adequadamente cada modalidade tendo sempre

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em conta os gostos e desejos do paciente (Zanetti et al., 2007). Porém, é ainda

importante ressalvar que a prática de exercício físico seja realizada de forma orientada

através de programas estruturados e acompanhada por profissionais especializados para

que o objetivo com que a mesma é prescrita seja alcançado.

Para além da melhoria da qualidade do sono (se seguindo os parâmetros de

duração, intensidade e frequência aconselhados para o problema e para a pessoa) a

prática de exercício físico está associada a inúmeros outros benefícios (Sardinha,

Levitan, Lopes, Perna, Esquivel, Griez, & Nardi, 2009; Biazussi, 2008). Sardinha et al.

(2009) referem que esta prática diminui certas causas de morbidade e mortalidade,

como a obesidade, a hipertensão, diabetes, doenças cardíacas e até alguns tipos de

cancro. Pelo contrário, ao sedentarismo associa-se, para além dos problemas agora

referidos, certas patologias de foro psiquiátrico, como a depressão, transtornos de

pânico ou de ansiedade patológica.

A prática de exercício físico tem um impacto positivo no crescimento e

desenvolvimento do adolescente, possibilitando aspectos positivos como promover a

socialização, a motricidade, a flexibilidade e o conhecimento do próprio corpo, bem

como a melhoria da auto-estima e a prevenção de doenças associadas à obesidade

(Biazussi, 2008). Porém, o objectivo do treino físico é trabalhar simultaneamente a

força, a resistência, a velocidade, a flexibilidade, a coordenação, para que o sujeito se

concentre “num só”.

Assim, o presente estudo tem como objetivo estabelecer a relação entre a prática

de exercício físico e a melhoria da qualidade do sono.

Metodologia

O presente estudo pretende avaliar as seguintes variáveis: a prática de exercício

físico regular e a qualidade de sono.

Participantes

A amostra deste estudo é constituída por 109 estudantes da Universidade de Trás-

os-Montes e Alto Douro divididos aleatoriamente pelos cursos de Educação Física e

Desporto Escolar (54 elementos – 33 rapazes e 21 raparigas) e Educação Básica (55

elementos – 7 rapazes e 48 raparigas), entre os 18 e os 25 anos. O grupo constituído

pelos alunos de Educação Física e Desporto Escolar representa o grupo experimental,

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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sendo o grupo de controlo composto pelos alunos de Educação Básica, já que se

pretende que o primeiro represente o conjunto amostral fisicamente ativo e o segundo o

sedentário.

O processo de amostragem contém fatores de exclusão. Assim, são rejeitados os

questionários se se verificar que os indivíduos não estão dentro do limite de idade. Por

outro lado, aos elementos pertencentes ao grupo de controlo que pratiquem desporto

regular são inseridos no grupo experimental e, pela mesma forma, os alunos

pertencentes ao curso de Educação Básica serão inseridos no grupo de controlo

(praticantes de exercício físico).

Material e Procedimento

Os instrumentos utilizados como base são dois (Índice de Qualidade do Sono de

Pittsburgh e a Escala de Sonolência de Epworth – ESS-BR) e permitem estimar a

qualidade do sono.

O Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh avalia a qualidade do sono no último

mês dos pacientes. Assim, foi desenvolvido com o objetivo de fornecer uma medida da

qualidade de sono padronizada, de fácil e rápida resposta e interpretação e que

permitisse classificar os elementos da amostra com má ou boa qualidade de sono. As

primeiras quatro questões (de resposta aberta) deste Índice fazem referência ao horário

de deitar, acordar, tempo que demora a adormecer e horas de sono por noite.

Posteriormente, as dez questões seguintes possuem opções de resposta e inquerem os

indivíduos acerca do número de vezes que, no último mês, demoraram mais de 30

minutos a adormecer, acordaram a meio da noite, levantaram-se durante a noite para ir

ao quarto de banho, não conseguiam respirar confortavelmente, tossiram ou roncaram,

tiveram frio, tiveram calor, tiveram pesadelos e dores. As opções de resposta para estas

questões são: Nenhuma vez, Menos de uma vez por semana, Uma ou duas vezes por

semana ou Três ou mais vezes por semana. A questão seguinte inquere os elementos em

relação à forma como classificariam a sua qualidade de sono (muito boa, boa, má ou

muito má). As duas questões seguintes fazem referência ao número de vezes que

tiveram que tomar medicação para conseguir adormecer ou teve dificuldade em

conseguir manter-se acordado enquanto realizava tarefas de cariz social (nenhuma vez,

menos de uma vez por semana, uma ou duas vezes por semana, três ou mais vezes por

semana). Na última questão, pergunta-se se houve uma dificuldade acrescida em manter

as mesmas tarefas de antes e com o mesmo entusiasmo. Nestas questões as opções são:

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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nenhuma dificuldade, um problema leve, um problema razoável e um problema muito

grande.

A Escala de Sonolência de Epworth – ESS-BR, diz respeito a uma escala que

permite avaliar o nível de sonolência dos indivíduos enquanto desempenham tarefas do

quotidiano. Assim, é constituída por uma escala tipo Likert em que as opções de

resposta são: 0 – nunca adormeceria; 1 – pequena probabilidade de adormecer; 2 –

probabilidade média de adormecer e 3 – grande probabilidade de adormecer. Assim,

as questões que constam desta escala são: estar sentado a ler, assistir televisão, estar

sentado e quieto num local público, andar de carro uma hora sem parar, estar sentado à

tarde para descansar, estar sentado a conversar com alguém, estar sentado quieto após o

almoço e estar parado no trânsito durante uns minutos. Assim, a pontuação total varia

entre 0 e 24 pontos.

Estes instrumentos são traduzidos e adaptados de forma a constituírem um só.

Para podermos comparar a qualidade do sono com a prática do exercício físico, ao

questionário que resultou dos processos anteriormente descritos, adicionamos questões

que permitissem estimar o número de sessões semanais de exercício físico praticado

pelos estudantes. Inicialmente, estes instrumentos são entregues a todos os alunos do 1.º

de Educação Física e Desporto Escolar e a uma turma do 1.º ano e outra do 2.º do curso

de Educação Básica. Posteriormente, são numerados por ordem de entrega e excluídos

aqueles em que se aplique o critério de exclusão. Assim, foram excluídos 4 alunos do

curso de Educação Básica, sendo a base de dados constituída, portanto, por 105

elementos (54 de Educação Física e Desporto Escolar e 51 de Educação Básica).

Os dados recolhidos através dos instrumentos são inseridos no SPSS (Statistical

Package for the Social Sciences) onde se recorre ao teste T-Student para a análise das

variáveis em estudo. Na primeira parte do instrumento, onde se inquere o aluno em

relação ao número de horas semanais de prática de exercício físico, as possibilidades de

resposta foram utilizadas com o fim de categorizar a amostra em praticantes ou não

praticantes, sendo que os alunos que responderam entre “0 a 2 dias” semanais eram

considerados não praticantes e os anos que responderam entre “3 e 7 dias” eram tidos

como praticantes de exercício físico. Na segunda parte do instrumento, acerca da

qualidade do sono dos estudantes, as opções de resposta foram, assim como na parte

anterior, categorizadas. Assim, a opção nenhuma vez era cotada com 0 pontos, menos de

uma vez por semana com 1 ponto, uma ou duas vezes por semana com 2 pontos e três

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

14

vezes por semana ou mais com 3 pontos. Na questão número 6 desta segunda parte,

quem considerasse a sua qualidade de sono muito boa tinha a cotação de 0 pontos, boa

com 1 pontos, má com 2 pontos e muito má com 3 pontos. Assim, nesta parte, a

pontuação mínima era 0 pontos, sendo a máxima 33 pontos. Posteriormente, atendemos

aos percentis para incluir cada estudante numa determinada qualidade de sono (boa,

normal, má). Desta forma, os alunos que se incluíssem no percentil 25 eram tidos com

uma qualidade de sono boa, da mesma forma, entre os percentis 25 e 75 eram

considerados com uma qualidade de sono normal. Então, os alunos incluídos no

percentil 75 possuíam uma qualidade de sono má.

Resultados

A amostra desta investigação foi constituída por 65,7% de indivíduos do sexo

feminino e 34,3% do sexo masculino. A média de idades foi de 19,27 anos (19,2 para os

estudantes de Educação Básica e 19,4 para os estudantes de Educação Física e Desporto

Escolar, sendo a média de toda a amostra de 19,4). Quanto à profissão, toda a amostra

era constituída por estudantes. Do total da amostra, 59% (62 elementos) praticam

atividade física e 41% (43 sujeitos) não praticam. Verificou-se, também, que a média do

número de dias semanais em que praticam atividade física de todos os estudantes foi de

aproximadamente 3 dias (M=3,03), sendo que a média dos estudantes de E.F.D.E. foi de

aproximadamente 5 (M=4,7) e de Ed. Básica foi de aproximadamente 1 (M=1,2). O

número total de estudantes que responderam 7 dias ao número de dias semanais em que

praticavam exercício físico foi de 7 (6,7%), todos eles pertencentes ao curso de E.F.D.E.

Pelo contrário, o número de estudantes que afirmaram não praticar exercício nenhuma

vez por semana foi de 20 (19%). Assim, o número de dias com maior percentagem foi

0, seguido de 5 (19 elementos, 18,1%), depois 4 e 1 com igual percentagem (cada um

com 16 elementos, 15,2%), posteriormente 3 dias por semana (13 elementos, 13,4%) e,

por fim, 2, 6 e 7 dias com a mesma frequência (7 elementos cada um, 6,7%).

Em relação ao número de vezes que, no último mês, os estudantes demoraram

mais de 30 minutos a adormecer verificou-se que a média foi menos de uma vez por

semana (nenhuma vez – 31,4%; menos de uma vez por semana – 24,8%; uma ou duas

vezes por semana – 30,5%; três vezes por semana ou mais – 13,3%).

No que diz respeito à forma como cada sujeito classificava a sua qualidade de

sono durante o último mês, verificou-se que 71,4% (75 elementos) referiram possuir

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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uma boa qualidade de sono, sendo que 19% (20 elementos) a classificaram como sendo

má, 6,7% (7 elementos) como muito boa e apenas 2,9% (3 elementos) como muito má.

Assim, para ambos os cursos, a média da classificação que cada sujeito atribuiu à sua

qualidade de sono foi boa.

Ao comparar as médias entre a prática de exercício físico dos dois cursos nos

quais a amostra foi recolhida (Educação Básica e Educação Física e Desporto Escolar) e

qualidade de sono, não se verificou a existência de diferenças estatisticamente

significativas, como é possível constatar no quadro 1. Porém, é possível ver, através do

mesmo quadro, que a média da qualidade de sono foi superior aos praticantes. Ou seja,

os não praticantes de exercício físico apresentaram, em média, uma qualidade de sono

inferior aos praticantes. De ressalvar que, quanto maior for a média, pior é a qualidade

de sono (0 pontos diz respeito a muito boa qualidade de sono, pelo que 3 pontos refere-

se a muito má).

Quadro 1: Análise Comparativa entre a qualidade de sono dos dois cursos em análise

Ed. Básica

(M±DP)

E.F.D.E

(M±DP) t p

Qualidade de Sono 1,65±0,48 1,54±0,50 1,14 0,26

Comparando a média da qualidade de sono entre os géneros, verificou-se não

haver, também neste caso, diferenças estatisticamente significativas, tal como se pode

verificar no quadro 2. Mesmo assim, foi possível detetar que os elementos do sexo

feminino apresentaram, em média, uma qualidade de sono inferior aos elementos do

sexo masculino, sendo esta diferença superior àquela que se verificou entre a qualidade

de sono entre praticantes e não praticantes. Também aqui se verifica que, quanto maior

a média, pior é a qualidade de sono (quanto maior for a média, mais próximo está de

representar a qualidade de sono muito má).

Quadro 2: Análise Comparativa entre a qualidade de sono e o género

Feminino Masculino t p

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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(M±DP) (M±DP)

Qualidade de Sono 1,64±0,48 1,50±0,51 1,34 0,18

Comparando, por fim, as médias entre a qualidade de sono e a prática de exercício

físico, relação que representa o objetivo principal em estudo, foi possível verificar que

não existem diferenças estatisticamente significativas entre esses aspetos, tal como se

pode verificar no quadro 3, porém, verifica-se que, em média, os estudantes praticantes

de exercício físico apresentaram uma qualidade de sono superior (que é representada

pela média inferior, ou seja, mais próxima de 0 – qualidade de sono muito boa) à dos

estudantes não praticantes. Assim, e embora não se apresente diferenças

estatisticamente significativas entre estes valores, poderá haver uma tendência para a

prática regular de exercício físico melhorar a qualidade do sono.

Quadro 3: Análise Comparativa entre a prática de exercício físico e a qualidade de

sono

Praticante

(M±DP)

Não Praticante

(M±DP) t p

Qualidade de Sono 1,55±0,51 1,65±0,48 -1,05 0,30

Relativamente à hipótese inicial da existência de uma correlação entre as variáveis

Qualidade de Sono e Prática de Exercício Físico pôde-se verificar que, ao

correlacionarmos os valores totais das duas variáveis apresentadas, não se verifica a

existência de uma influência positiva ou negativa da prática de exercício físico na

qualidade de sono, como se pode verificar no quadro 4. Desta forma, não se verificaram

diferenças estatisticamente significativas entre as variáveis Qualidade de sono e Prática

de exercício físico.

Quadro 4: Correlações entre Prática de Exercício Físico e Qualidade de Sono

r p

Qualidade de sono 0,10 0,30

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

17

Ao comparar as médias obtidas a partir dos valores totais dos fatores prática de

exercício físico e nível de sonolência foi possível, mais uma vez, concluir que também

neste fator que poderia apresentar-se influenciado pela prática de exercício físico, não se

verifica a existência de diferenças estatisticamente significativas, tal como se pode

verificar no quadro 5. Assim, também neste fator parece haver uma tendência para a

prática de exercício físico melhorar os níveis de sonolência já que os praticantes

apresentaram uma média de sonolência inferior à dos não praticantes (quanto maior for

a média, maior o nível de sonolência).

Quadro 5: Análise Comparativa entre a prática de exercício físico e a sonolência

Praticante

(M±DP)

Não Praticante

(M±DP) t p

Sonolência 9,08±3,65 9,23±3,60 -1,05 0,30

Discussão

Após a análise dos dados, verificou-se que, do total da amostra, 59% (62

elementos) praticam atividade física e 41% (43 estudantes) não praticam. Apesar de se

notar uma crescente preocupação com a imagem corporal e a ideia que os outros terão

de nós, bem como a preocupação de evitar doenças relacionadas com a alimentação,

levar a um crescente recurso à prática de exercício físico, muitos são os jovens que

ainda não adotaram esta prática no seu dia-a-dia. Estes dados eram esperados, na

medida em que é visível que cada vez mais os jovens se preocupam por manter, não só

um estilo de vida saudável associado à prática de exercício físico, mas também uma

imagem corporal que lhes agrade. Por outro lado, também se verifica que existe uma

percentagem elevada de indivíduos que não consideram esta prática tão vantajosa, pelo

que adotam o sedentarismo como o seu desporto de eleição, preferindo dedicar-se

apenas aos desportos praticados através e pela televisão ou das consolas de jogos.

Assim, aqueles que praticam atividade física e que conseguem ver os seus benefícios,

optam por pratica-la com elevada regularidade (até sete dias por semana). Desta forma,

aqueles que não o fazem tão regularmente (1 dia por semana, por exemplo), e por não

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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sentirem tanto os seus benefícios, facilmente desistem, adotando outro género de

atividades. Atividades essas que podem prejudicar a sua qualidade do sono. Verificou-

se que, em média, os jovens envolvidos neste estudo apresentavam uma qualidade de

sono boa. Este fator pode ser explicado pela agitação do dia-a-dia de um estudante

universitário, pelo cansaço que um dia lhe provoca e pela necessidade que uma noite de

sono restaurador lhes provocam. Assim, e tendo em conta estes fatores, os jovens

conseguem esse equilíbrio entre a agitação do dia e a calma da noite através do sono.

Apesar disso, e contrariamente àquilo que seria esperado no nosso estudo, não se

verificaram diferenças estatisticamente significativas entre a prática de exercício físico e

a qualidade do sono, apesar de ser constatável uma tendência para tal. Este fator pode

ter sido influenciado pelo limitado número de participantes da amostra (105 elementos)

e pelo facto de estes participantes, em média, possuírem uma qualidade de sono boa ou

normal. Isto é, no fundo, apenas se avaliou a influência da prática de exercício físico em

indivíduos com qualidade de sono boa ou qualidade de sono normal. Em relação à

diferença entre os sexos na qualidade do sono, apesar de não haverem diferenças

estatisticamente significativas, houve uma tendência para que a qualidade de sono dos

indivíduos do sexo masculino fosse melhor. Assim, poder-se-á explicar este dado pela

descontração dos homens/rapazes em relação aos problemas do dia-a-dia e que se reflete

num maior e melhor descanso durante a noite. Apesar de esta diferença da descontração

entre os géneros não estar cientificamente comprovada, no quotidiano parece verificar-

se essa diferença, pelo que poderá ser uma explicação plausível para o dado da

investigação. Por fim, refere-se que, apesar de mais uma vez não se terem obtido

diferenças estatisticamente significativas, parece haver uma tendência para que a prática

de exercício físico regular melhore os níveis de sonolência em tarefas do quotidiano.

Explica-se este facto referindo que a prática de exercício físico aumenta o desgaste e

cansaço físico, pelo que o sono noturno tende a ser mais restaurador e equilibrado.

Assim, diminui a sonolência diurna, já que o sono noturno foi suficiente para repor a

homeostasia. Por outro lado, nem sempre sono é sinónimo de equilíbrio de energias,

pelo que uma noite de pesadelos não é, de todo, restauradora. Assim se explica a

inexistência de diferenças estatisticamente significativas.

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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Conclusão

Após a análise inicial, pôde-se verificar que a principal hipótese não foi

totalmente comprovada. A comparação entre ambos os grupos permitiu verificar que

não houve relação, ou seja, não houve diferenças estatisticamente significativas entre as

variáveis ligadas à prática de exercício físico e a qualidade do sono (obtiveram- se para

as correlações e as significâncias entre os fatores qualidade de sono e exercício físico,

valores para a qualidade de sono: r= 0,10, p= 0,30), apesar de se verificar uma tendência

para tal. Assim, e caso a amostra fosse superior (número de elementos superior) a

probabilidade de existência de diferenças estatisticamente significativas seria maior.

Desta forma, o número de elementos desta investigação é uma das suas principais

limitações. Sendo o seu número algo limitado, as suas conclusões são, também,

limitadas. Assim, devido ao seu reduzido número de elementos, a probabilidade desta

amostra representar a população é menor do que seria caso fosse maior. Acerca deste

facto deixa-se a sugestão de que este estudo possa ser replicado e a temática que levou à

realização do estudo seja mais amplamente estudada utilizando uma amostra com maior

número de elementos e maior homogeneidade para que se possam recolher mais

conclusões acerca da relação entre exercício físico e qualidade de sono.

Por outro lado, os resultados obtidos podem ter sido influenciados pelo facto da

amostra utilizada ter, no geral, uma qualidade de sono boa ou normal, isto é, dentro da

amostra e após a categorização da qualidade do sono em boa, normal ou má, nenhum

dos estudantes foi classificado como tendo uma qualidade de sono má. Tendo surgido

essa dificuldade, apenas se comparam os resultados entre estudantes com boa e normal

qualidade de sono. Também este fator poderia ter sido minimizado caso a amostra fosse

maior, já que maior seria a probabilidade da existência de indivíduos com uma má

qualidade de sono.

De igual forma, na distribuição por género da amostra utilizada não se verifica

homogeneidade, sendo o número total de indivíduos do sexo feminino superior ao

número de indivíduos do sexo masculino, o que pode implicar que os resultados obtidos

não apresentem diferenças estatisticamente significativas da qualidade de sono em

relação à prática de exercício físico entre os sexos. Logo, o número limitado dos

elementos constituintes da amostra poderia ter sido menosprezado caso o número total

de participantes fosse superior.

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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O facto dos questionários utilizados não se encontrarem validados para a

população portuguesa e de ter sido realizada apenas uma adaptação dos mesmos sem

que se tenha estudado em que medida estaria adequada à nossa amostra, pode ter

influenciado os resultados. Desta forma, esperamos que os resultados obtidos neste

estudo e a possibilidade de obter novos dados sobre a temática em questão, desperte o

interesse para a validação do Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh e da Escala de

Sonolência de Epworth para a população portuguesa.

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OS EFEITOS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIO FÍSICO NA QUALIDADE DO SONO

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