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Em Angola, já começam a ser dados os primeiros sinais do surgimento desta modalidade de nanciamento, sendo que a mais recente foi lançada por Leonildo Manuel (2017). POR AIROSA DA SILVA Economista e Técnico de Análise Estatística e Financeira No actual contexto macroeconó- mico e nanceiro, muitos países, particularmente africanos, têm experimentado enormes dicul- dades na reanimação das suas eco- nomias e observa-se um aumento expressivo dos indicadores de ris- co de crédito, fruto da elevada pro- babilidade de incumprimento por parte dos agentes económicos. Na maior parte dos casos, por estarem mais expostas ao grau,ritmo,nível de desenvolvi- mento interno das respectivas economias, a maior parte do in- cumprimento dos créditos bancá- rios tem sido geralmente atribuído às Pequenas e Médias Empresas (PME). Este facto tem levado os bancos a aumentarem a sua per- cepção do nível do risco em relação a este segmento de empresas, op- tando pela canalização do crédito para empresas de maior dimensão e naturalmente com percepção de nível de risco mais baixo. Em África, a maior parte das PME e startups tem-se deparado com a falta de alternativas para fi- nanciar as suas iniciativas e pro- jectos, situação que realça a urgên- cia da necessidade de se encontrar outras alternativas ao financia- mento bancário a fim de maximi- zar a contribuição deste importan- te segmento no fortalecimento das economias do continente. Nesta senda, o crowdfunding, en- tendido como um meio alternativo de nanciamento através do qual o seu beneciário se dirige a uma multiplicidade de destinatários através de uma plataforma elec- trónica a m de angariar capital para nanciar a sua actividade, agura-se como uma excelente alternativa. Por outro lado, não obstante existir em África bastan- te potencial para o empreendedo- rismo e muita margem de cresci- mento para esta modalidade de nanciamento, o continente ainda se debate com grandes desaos e barreiras regulatórias que preci- sam ser sucientemente com- preendidas e abordadas. 1. Ausência de regulação – na maior parte dos casos, refere-se à ausência de protecção adequada ao investidor, facto que mina a conança dos pontenciais investi- dores e inibe o nanciamento; 2. Falta de informação sobre o crowdfunding – para muitos países africanos, não obstante a captação de recursos entre as comunidades locais e as famílias estar profunda- mente enraizada nas culturas, a tradução deste processo por via de uma plataforma electrónica ainda constitui novidade, levando a que muitas vezes algumas soluções que envolvam pagamentos por via da internet sejam percepcionadas como fraude ou golpe. 3. Baixo nível de penetração da internet associado ao fraco desen- volvimento dos sistemas de paga- mento electrónico – De acordo com dados divulgados no relatório digital de 2016 da agência “Global - We are Social” até 2015 somente 29% da população do continente utilizava ou tinha acesso à inter- net. Este facto tem-se reectido negativamente tanto no desenvol- vimento da banca electrónica como na exposição das platafor- mas de crowdfunding. No continente africano, não obs- tante os desaos acima retratados, o crowdfunding pode oferecer paraosempreendedorestrêsopor- tunidades distintas (ver quadro). Dados que são reforçados pelas últimas estimativas do Banco Mun- dial (BM), que sugerem que o mer- cado africano de crowdfunding tem o potencial de alcançar cerca de 2,5 mil milhões USD até 2025. Em relação aos montantes anga- riados entre 2014 e 2016, as moda- lidades de crowdfunding de dona- tivos e recompensa são as que mais têm arrecadado nanciamento (35%, 31% e 61,35% respectiva- mente), enquanto as modalidades de empréstimo e de capital foram as que menos arrecadaram (1,89% e 1,45%, respectivamente). Segun- do a Afrikstart (Organização espe- cializada no acompanhamento do crowdfunding em África) este fac- to deve-se fundamentalmente a ausência de protecção legal aos in- vestidores, existente até então na maioria dos países africanos. Quanto a angariação por países, existe uma grande discrepância no número de projectos implementa- dos por cada país. Enquanto a Áfri- ca do Sul, Kenya e Nigéria nancia- ram mais de 100 projectos em seus portais de crowdfunding, os res- tantes países tiveram menos de 25 projectos nanciados. Tal discre- pância, é fundamentalmente ex- plicada pelo facto desses três paí- ses registarem um nível de penetração da internet e de litera- cia nanceira signicativamente superior a dos outros. Em Angola, já começam a ser da- dos os primeiros sinais do surgi- mento desta modalidade de nan- ciamento, sendo que a mais recente foi lançada por Leonildo Manuel (2017), visando o nanciamento do seu livro “O Dever de Informação e a Responsabilidade do Emitente”. Apesar do surgimento de inicia- tivas individuais, o que é louvável, existe também a acentuada neces- sidade de utilizar-se o crowdfun- ding como fonte de nanciamento para as PME do país, à semelhança do que ocorre em outras realida- des, uma vez que muitas das mais de 12 mil PME formalmente cons- tituídas enfrentam sérias di culda- des de acesso ao nanciamento por via do crédito bancário, condicio- nando o seu efectivo arranque. No que concerne à dinamização do crowdfunding, Angola enfrenta basicamente os mesmos desaos que os seus homólogos africanos, nomeadamente (i) ausência de re- gulação; (ii) baixo nível de literacia nanceira; e (iii) baixo nível de pe- netração da internet associado ao fraco desenvolvimento da banca electrónica (dados denitivos do Censo 2014 mostram que somente 10,2% da população angolana tem acesso a internet, valor bastante abaixo dos 29% que representa a média do continente). Para melhorar o actual estágio de desenvolvimento desta modalida- de de nanciamento, em Angola, é imprescindível que sejam removi- dos os constrangimentos aqui re- feridos. Por isso, somos de opinião que, inicialmente, optese pela eli- minação dos constrangimentos relacionados com a baixa penetra- ção da internet e o fraco nível de literacia nanceira, tal como ze- ram os países africanos mais avan- çados neste aspecto. M DR O Crowdfunding em África: Desaos e Oportunidades para Angola ANÁLISE Bolsa O BNA “não espera grandes surpresas” da avaliação em curso a 12 bancos do sistema financeiro, mas admite que “um ou outro” possa vir a ter de reforçar capitais, afirmou na passada quarta-feira o governador da instituição, José de Lima Massano. O governador lembrou os esforços que têm sido feitos para robustecer a banca nacional. BNA Avaliação à banca Em África, a maior parte das PME e estão sem alternativas para nanciar iniciativas e projectos Oportunidades do Crowdfunding 1. Aumento das alternativas de acesso ao capital a custos de intermediação mais baixos - O crowdfunding permite que os empresários recorram directamente aos potenciais investidores sem investigações onerosas sobre a sua credibilidade, histórico de negócios ou renda; 2. Promoção das redes de telecomunicações como veículo para fazer negócios – Em África, embora haja menos familiaridade e/ou conança, o facto de o crowdfunding ser um mecanismo puramente digital de arrecadação de fundos online, pode contribuir para o fomento da banca digital; e 3. Subsídio aos custos de marketing e promoção pelas plataformas de crowdfunding (empreendedores usam gratuitamente as plataformas) – Listar um empreendimento ou projecto numa plataforma de crowdfunding não apenas aumenta a sua exposição aos investidores (presença online) mas também acresce reconhecimento à marca. 36 MERCADO 7.06.19

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Page 1: os e Oportunidades para Angola PublicaesFicheiros... · fundos online, pode contribuir para o fomento da banca digital; e 3. Subsídio aos custos de marketing e promoção pelas plataformas

Em Angola, já começam a ser dados os primeiros

sinais do surgimento desta modalidade de financiamento, sendo que a mais recente foi lançada por Leonildo

Manuel (2017).

P O R A I R O S A D A S I L V A E c o n o m i s t a e T é c n i c o d e A n á l i s e

E s t a t í s t i c a e F i n a n c e i r a

No actual contexto macroeconó-mico e financeiro, muitos países, particularmente africanos, têm experimentado enormes dificul-dades na reanimação das suas eco-nomias e observa-se um aumento expressivo dos indicadores de ris-co de crédito, fruto da elevada pro-babilidade de incumprimento por parte dos agentes económicos.

Na maior parte dos casos, por estarem mais expostas ao grau,ritmo,nível de desenvolvi-mento interno das respectivas economias, a maior parte do in-cumprimento dos créditos bancá-rios tem sido geralmente atribuído às Pequenas e Médias Empresas (PME). Este facto tem levado os

bancos a aumentarem a sua per-cepção do nível do risco em relação a este segmento de empresas, op-tando pela canalização do crédito para empresas de maior dimensão e naturalmente com percepção de nível de risco mais baixo.

Em África, a maior parte das PME e startups tem-se deparado com a falta de alternativas para fi-nanciar as suas iniciativas e pro-jectos, situação que realça a urgên-cia da necessidade de se encontrar outras alternativas ao financia-mento bancário a fim de maximi-zar a contribuição deste importan-te segmento no fortalecimento das economias do continente. Nesta senda, o crowdfunding, en-tendido como um meio alternativo de financiamento através do qual o seu beneficiário se dirige a uma multiplicidade de destinatários através de uma plataforma elec-trónica a fim de angariar capital para financiar a sua actividade, afigura-se como uma excelente alternativa. Por outro lado, não obstante existir em África bastan-te potencial para o empreendedo-rismo e muita margem de cresci-mento para esta modalidade de financiamento, o continente ainda

se debate com grandes desafios e barreiras regulatórias que preci-sam ser suficientemente com-preendidas e abordadas.

1. Ausência de regulação – na maior parte dos casos, refere-se à ausência de protecção adequada ao investidor, facto que mina a confiança dos pontenciais investi-dores e inibe o financiamento;

2. Falta de informação sobre o crowdfunding – para muitos países africanos, não obstante a captação de recursos entre as comunidades locais e as famílias estar profunda-mente enraizada nas culturas, a tradução deste processo por via de uma plataforma electrónica ainda constitui novidade, levando a que muitas vezes algumas soluções que envolvam pagamentos por via da internet sejam percepcionadas como fraude ou golpe.

3. Baixo nível de penetração da internet associado ao fraco desen-volvimento dos sistemas de paga-mento electrónico – De acordo com dados divulgados no relatório digital de 2016 da agência “Global - We are Social” até 2015 somente 29% da população do continente utilizava ou tinha acesso à inter-net. Este facto tem-se reflectido negativamente tanto no desenvol-vimento da banca electrónica como na exposição das platafor-mas de crowdfunding.

No continente africano, não obs-tante os desafios acima retratados, o crowdfunding pode oferecer para os empreendedores três opor-tunidades distintas (ver quadro).

Dados que são reforçados pelas últimas estimativas do Banco Mun-dial (BM), que sugerem que o mer-cado africano de crowdfunding tem o potencial de alcançar cerca de 2,5 mil milhões USD até 2025.

Em relação aos montantes anga-riados entre 2014 e 2016, as moda-lidades de crowdfunding de dona-tivos e recompensa são as que mais têm arrecadado financiamento (35%, 31% e 61,35% respectiva-mente), enquanto as modalidades de empréstimo e de capital foram as que menos arrecadaram (1,89% e 1,45%, respectivamente). Segun-do a Afrikstart (Organização espe-cializada no acompanhamento do crowdfunding em África) este fac-to deve-se fundamentalmente a ausência de protecção legal aos in-

vestidores, existente até então na maioria dos países africanos.

Quanto a angariação por países, existe uma grande discrepância no número de projectos implementa-dos por cada país. Enquanto a Áfri-ca do Sul, Kenya e Nigéria financia-ram mais de 100 projectos em seus portais de crowdfunding, os res-tantes países tiveram menos de 25 projectos financiados. Tal discre-pância, é fundamentalmente ex-plicada pelo facto desses três paí-ses registarem um nível de penetração da internet e de litera-cia financeira significativamente superior a dos outros.

Em Angola, já começam a ser da-dos os primeiros sinais do surgi-mento desta modalidade de finan-ciamento, sendo que a mais recente foi lançada por Leonildo Manuel (2017), visando o financiamento do seu livro “O Dever de Informação e a Responsabilidade do Emitente”.

Apesar do surgimento de inicia-tivas individuais, o que é louvável, existe também a acentuada neces-

sidade de utilizar-se o crowdfun-ding como fonte de financiamento para as PME do país, à semelhança do que ocorre em outras realida-des, uma vez que muitas das mais de 12 mil PME formalmente cons-tituídas enfrentam sérias dificulda-des de acesso ao financiamento por via do crédito bancário, condicio-nando o seu efectivo arranque.

No que concerne à dinamização do crowdfunding, Angola enfrenta basicamente os mesmos desafios que os seus homólogos africanos, nomeadamente (i) ausência de re-gulação; (ii) baixo nível de literacia financeira; e (iii) baixo nível de pe-netração da internet associado ao fraco desenvolvimento da banca electrónica (dados definitivos do Censo 2014 mostram que somente 10,2% da população angolana tem acesso a internet, valor bastante abaixo dos 29% que representa a média do continente).

Para melhorar o actual estágio de desenvolvimento desta modalida-de de financiamento, em Angola, é imprescindível que sejam removi-dos os constrangimentos aqui re-feridos. Por isso, somos de opinião que, inicialmente, optese pela eli-minação dos constrangimentos relacionados com a baixa penetra-ção da internet e o fraco nível de literacia financeira, tal como fize-ram os países africanos mais avan-çados neste aspecto. M

DR

O Crowdfunding em África: Desafios e Oportunidades para Angola

A N Á L I S E

BolsaO BNA “não espera grandes surpresas” da avaliação em curso a 12 bancos do sistema financeiro, mas admite que “um ou outro” possa vir a ter de reforçar capitais, afirmou na passada quarta-feira o governador da instituição, José de Lima Massano. O governador lembrou os esforços que têm sido feitos para robustecer a banca nacional.

BNAAvaliação à banca

Em África, a maior parte das PME e estão sem

alternativas para financiar iniciativas e

projectos

Oportunidades do Crowdfunding

1. Aumento das alternativas de acesso ao capital a custos de intermediação mais baixos - O crowdfunding permite que os empresários recorram directamente aos potenciais investidores sem investigações onerosas sobre a sua credibilidade, histórico de negócios ou renda; 2. Promoção das redes de telecomunicações como veículo para fazer negócios – Em África, embora haja menos familiaridade e/ou confiança, o facto de o crowdfunding ser um mecanismo puramente digital de arrecadação de fundos online, pode contribuir para o fomento da banca digital; e 3. Subsídio aos custos de marketing e promoção pelas plataformas de crowdfunding (empreendedores usam gratuitamente as plataformas) – Listar um empreendimento ou projecto numa plataforma de crowdfunding não apenas aumenta a sua exposição aos investidores (presença online) mas também acresce reconhecimento à marca.

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