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  • PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO

    PUC/SP

    CLAUDIA ROBERTA ZANCHIN

    OS DIVERSOS OLHARES NA CONSTRUO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO

    MUNICPIO DE SO CARLOS/SP

    MESTRADO EM SERVIO SOCIAL

    SO PAULO

    2010

  • PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO

    PUC/SP

    CLAUDIA ROBERTA ZANCHIN

    OS DIVERSOS OLHARES NA CONSTRUO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO

    MUNICPIO DE SO CARLOS/SP

    Dissertao apresentada Banca Examinadora da

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo,

    como exigncia parcial para obteno do ttulo de

    MESTRE em Servio Social, sob a orientao da

    Prof Dr Myrian Veras Baptista.

    SO PAULO

    2010

  • BANCA EXAMINADORA

  • DEDICATRIA

    Aos meus pais Mauro e Clia ,

    pelo amor, pelo carinho e olhar cuidadoso.

    Ao meu irmo Jnior ,

    pela presena e alegria.

    Ao meu marido Wamberto ,

    pelo amor, pela vida compartilhada, voc, todo o meu amor.

    Aos adolescentes do Programa de Medidas,

    a todos o meu carinho e agradecimento.

  • AGRADECIMENTOS

    Deus e seus interlocutores: Dom Bosco e Nossa Senhora Auxiliadora, pela

    companhia.

    Prof Dr Myrian Veras Baptista por ter me orientado e pelas horas de aprendizado

    ao seu lado.

    Ao meu amigo Padre Agnaldo Soares Lima pela presena, aprendizado e apoio, durante todos os anos de trabalho juntos. Aos meus amigos-educadores do Programa de Medidas, Arthur, Aline, Dani, Gl, Mrcia e Cris, parceiros fiis nas alegrias e nas tristezas. Aos amigos-educadores do Programa de Medidas, Fer, Re, Alininha, Sirlenoca, Terissy, Robert e Dri pelo companheirismo e incentivo. A todos os profissionais e estagirios que passaram pelo Programa de Medidas, pelas experincias e aprendizados. Aos professores da banca de defesa, Prof Dr. Maria Lcia Carvalho e Prof Dr Silvia Losacco que contriburam com seus respectivos olhares, fundamentais ao enriquecimento desta dissertao para esta verso final. Equipe do Ncleo de Estudos e Pesquisa sobre a Criana e o Adolescente PUC-SP pelo aprendizado compartilhado e acolhida. Vania M. M. Lima e Katia (ex-secretria do Programa de Servio Social), pela ajuda, esclarecimentos e agilidade com os documentos. Aos Professores da PUC/SP, Prof Dr Carmelita Yasbek, Prof Dr Maria Lcia Martinelli, Prof Dr Maria Lucia Barroco, Prof Dr Maria Lucia Carvalho, Prof Dr Marta Campos e Prof. Dr. Sergio Ozella. Prof Dr Vera Telles USP e Prof Dr Jacqueline Sinhoretto UFSCar. Prof Dr Sueli Itman, Regina Granja, Patrcia Borba, Karine Itman e demais interlocutores que contriburam com minhas reflexes. Maria Denise Pessoa, pela disponibilidade e sensibilidade na traduo deste trabalho. Aos meus amigos, Andr Simes, Douglas Verdi e Mariana Paggiaro, pelo carinho e alegria.

  • minha amiga Silvia Losacco, que, ao insistir em orientar meu olhar, na direo da experincia que tive com o Programa de Medidas, deu-me o impulso e a motivao para continuar. Helena Vanzo e Wamberto Vanzo, pelos cuidados e afetos. rica Vanzo, Dani Vanzo e Vivian Ferreira, pela amizade e carinho. Ao Wamberto, revisor, pelo olhar atento e cuidadoso forma e ao contedo deste trabalho. Aos adolescentes do Programa de Medidas, de modo especial aos que atendi, todo meu carinho.

  • O sonho

    Sonhe com aquilo que voc quer ser, porque voc possui apenas uma vida

    e nela s se tem uma chance de fazer aquilo que quer.

    Tenha felicidade bastante para faz-la doce.

    Dificuldades para faz-la forte. Tristeza para faz-la humana.

    E esperana suficiente para faz-la feliz.

    As pessoas mais felizes no tm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades

    que aparecem em seus caminhos.

    A felicidade aparece para aqueles que choram. Para aqueles que se machucam

    Para aqueles que buscam e tentam sempre. E para aqueles que reconhecem

    a importncia das pessoas que passaram por suas vidas.

    Clarice Lispector

  • RESUMO

    CLAUDIA ROBERTA ZANCHIN

    OS DIVERSOS OLHARES NA CONSTRUO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO MUNICPIO DE SO CARLOS/SP

    O presente trabalho, procura compreender as particularidades presentes no

    processo histrico da implementao e implantao das Medidas Socioeducativas

    do municpio de So Carlos-SP, tomando-se por base a contextualizao de trs

    diferentes espaos o Ncleo de Atendimento Integrado, o Programa de Medidas

    Socioeducativas em Meio Aberto e a Semi-liberdade.

    Buscou-se atravs dos instrumentos pesquisa documental e bibliogrfica,

    observaco de campo e entrevista semi-estruturada responder como incidiu o

    processo de implementao e implantao das medidas socioeducativas no

    municpio e qual a proposta pedaggica para o atendimento do adolescente em

    conflito com a lei?

    O trabalho traz uma reflexo crtica, contributiva para a socializao de aes

    exitosas na operacionalizao das medidas socioeducativas em meio aberto e semi-

    aberto, atravs das teorias que aportam as aes, as atividades desencadeadas, os

    resultados e os impactos atingidos.

    PALAVRAS CHAVE: adolescentes, medidas socioeducativas, programa de medidas,

    proposta pedaggica.

  • ABSTRACT

    CLAUDIA ROBERTA ZANCHIN

    THE MULTIPLE LOOKS IN SETTING UP SOCIAL-EDUCATIVE TREATMENT IN SO CARLOS/SP

    The present study aims at comprehending the specificities in the historical

    process of implementation of the Social-Educative Treatment in So Carlos-SP,

    based on the context of three different sites: Ncleo de Atendimento Integrado,

    Programa de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto and Semi-Liberdade - which

    are all institutions that provide treatment, at different freedom levels, to young

    offenders.

    This study intended to comprehend by means of the following instruments:

    documental and bibliography research, field observation and semi-structured

    interview - the possible effects which resulted from the process of implementation of

    the social-educative procedures in this city and what the pedagogical proposal for the

    young offenders treatment is.

    The study provides critical thinking which contribute to the socialization of

    successful actions of operacionalizing the outdoor and semi-outdoor social-educative

    procedures, based on theories which focus on the actions, activities developed, its

    results and impacts.

    Keywords: adolescents, social-educative procedures, social-educative procedures

    programme, pedagogical proposal.

  • SUMRIO

    Introduo 12

    1. Garantindo Direitos 15

    1.1 O Estatuto da Criana e do Adolescente perspectiva das medidas socioeducativas 16

    1.2 O SINASE Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo 20

    1.3 A Fundao Casa 22

    2. Organizando caminhos 25

    2.1 A cidade de So Carlos 26

    2.1.1 O municpio e as perspectivas da Assistncia Social 27

    2.1.2 A rede de atendimentos 28

    2.2 Adolescncia, adolescentes e as medidas socioeducativas 29

    3. Multiplicando Aes 35

    3.1 O Salesianos So Carlos 35

    3.2 O Sistema preventivo de Dom Bosco 39

    3.2.1 O sistema preventivo como um espao de construo de significados 41

    4. Construindo a histria 43

    4.1 As medidas socioeducativas e o Salesianos So Carlos 44

    4.2 O NAI Ncleo de Atendimento Integrado 46

    4.2.1 Organograma de funcionamento do NAI 48

    4.3 A Semi-liberdade 51

    4.3.1 A Casa de Convivncia Lucas Perroni Jnior 52

    5. Compartilhando Caminhos 55

    5.1 O Programa de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto 56

    5.1.1 A Proposta Pedaggica 57

  • 5.2 O Itinerrio Pedaggico 60

    5.2.1 Os mdulos do itinerrio Pedaggico 61

    5.2.2 Atividades desenvolvidas 65

    5.3 A especificidade de cada medida 66

    5.3.1 Prestao de Servios Comunidade 66

    5.3.2 Liberdade Assistida 69

    5.3.3 O que comum entre as medidas em meio aberto 70

    6. Assumindo Desafios 71

    7. Continuando a caminhada 72

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 74

    ANEXO 79

    GLOSSRIO 80

  • 12

    Introduo

    Se podes olhar, v. E se podes ver, repara.

    Jos Saramago

    Na atuao como orientador de medidas, no Programa de Medidas

    Socioeducativas em meio aberto, vivencia-se diversas histrias... histrias de

    atendimentos, de famlias inteiras, da equipe, de quem chega para conhecer e de

    quem chega para estudar.

    Aps a instalao do NAI em maro de 2001, visitas de diferentes

    cidades, Estados e pases chegavam para conhecer os programas de atendimento

    do municpio. Os momentos de ateno s visitas caracterizavam-se num importante

    espao de troca, permeado por diversas perguntas e afirmaes da importncia e

    destaque que os Programas tinham no cenrio nacional.

    A busca pela frmula mgica era constante... A resposta diante desta

    pergunta era unnime no existe frmula mgica, preciso apenas efetivar as leis

    do ECA, adequando-as a necessidade de cada municpio.

    A partir das inquietaes vivenciadas ao longo dos anos, como orientador

    de medidas, propem-se aqui, desvelar as particularidades do processo histrico

    das medidas, buscando-se responder questo - como incidiu o processo de

    implementao e implantao das medidas socioeducativas no municpio e qual a

    proposta pedaggica para o atendimento do adolescente em conflito com a lei?

    Uma cena reflete a importncia das medidas em meio aberto e traz dentro

    dela o incio da construo do NAI e Semi-liberdade. Em 2003, aps trs anos da

    implantao do NAI e da semi-liberdade, a equipe do Programa de Medidas

    Socioeducativas em Meio Aberto, inscreveu-se para relatar suas experincias -

  • 13

    medidas socioeducativas em meio aberto, semi-liberdade e o NAI - no Frum Social

    Mundial em Porto Alegre.

    Em uma sala da PUC/RS estavam educadores de diferentes Estados do

    Brasil que aguardavam a apresentao dos relatos de experincia da equipe de So

    Carlos e da pesquisa do NCA/PUC-SP. Iniciou-se com o relato da experincia da

    coordenadora do Programa de Medidas Socioeducativas Glaziela C. S. Marques,

    falando da atuao no atendimento das medidas em meio aberto; seguida pela

    apresentao da Profa. Silvia Losacco, membro do NCA.

    Na plateia, alm dos educadores havia um jovem1 que, ao saber que os

    educadores do Programa de Medidas participariam do Frum, prontificou-se a

    acompanh-los pelas ruas gachas e, naquela ocasio, aceitou assistir a

    apresentao.

    Logo nos primeiros minutos da apresentao do NCA, que mostrou cenas

    da rebelio da Febem - Unidade Imigrantes, percebeu-se que os sentimentos da

    plateia estavam flor da pele... o jovem, logo na apario das primeiras cenas,

    mostrou-se assustado, e os educadores com olhos atentos, aguardavam a primeira

    oportunidade para comentar sobre a exposio.

    Finalizado o filme, iniciou-se a apresentao da professora, para

    posteriormente abrir a fala aos educadores que ali estavam. As falas eram

    recheadas de experincias diversas; de educadores contra o sistema de internao

    postulado e de outros mostrando-se satisfeitos com o modelo correcional-repressivo.

    Em uma das falas, o coordenador de uma unidade de internao do

    Estado do Paran, relatou sua satisfao com o modelo. Sua crena de que

    estavam no caminho correto e que as falas, tanto da coordenadora, quanto da

    professora, eram equivocadas, somente para explorar a comoo das pessoas que

    ali estavam.

    1 O jovem que mencionado esteve internado na Unidade Imigrantes/FEBEM em 1999. Aps progresso de medida, foi atendido pelo Programa de Medidas Socioeducativas para o cumprimento de Liberdade Assistida. Na ocasio do Frum Social, o jovem, j maior de idade, residia na cidade de Porto Alegre/RS com a av paterna.

  • 14

    O jovem que at ento estava quieto e assustado, levantou-se e pediu

    para falar. Aps o consentimento, iniciou suas palavras: Me desculpe, mas acredito

    que o senhor esteja equivocado com suas palavras. As falas da Gla e da professora

    so verdadeiras. To verdadeiras que eu estou aqui hoje assistindo a esse debate,

    porque no dia em que aconteceu a rebelio em So Paulo, eu estava l. Sim, eu era

    um dos internos, nesse mesmo dia o Padre e o Dr. Joo apareceram l. Quando

    voltei para So Carlos, fui cumprir LA, quem me atendeu foi o Alex, foi a LA que me

    ajudou.

    O coordenador da Unidade levanta-se e diz: Mas voc no tem nenhuma

    marca, no d para crer que passou por tudo isso. O jovem responde: Sim, no

    tenho nenhuma marca fsica, as minhas marcas esto na alma, essas o senhor no

    pode ver.

    Com a recordao desse momento, apresenta-se aqui um caminho para

    compreenso da construo da histria das medidas socioeducativas de prestao

    de servios comunidade PSC, liberdade assistida LA e de semi-liberdade,

    executada pelo Programa de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto e Semi-

    Aberto do Salesianos So Carlos, do municpio de So Carlos, alm da implantao

    do NAI.

    Como apoio referencial para o conhecimento e anlise da implantao

    das medidas socioeducativas de prestao de servios comunidade, liberdade

    assistida e semi-liberdade no municpio, ser feito um levantamento de seu sentido,

    expresso na legislao (ECA), em documentos que sistematizam sua execuo em

    nvel nacional (SINASE), estadual (Fundao CASA) e local-institucional (Itinerrio

    pedaggico dos salesianos de So Carlos).

    Propondo-se desvelar e compreender a diversidade e multiplicidade de

    olhares e de significaes que caracterizam a subjetividade interpretativa da

    implantao, implementao e operao das medidas socioeducativas atravs dos

    atores sociais que compem este cenrio.

  • 15

    1. Garantindo Direitos

    A partir da promulgao da Constituio de 1988, a doutrina da proteo

    integral foi introduzida no Brasil. Assim, ao adot-la, em seu artigo 227, a Carta

    Magna rompeu definitivamente com a doutrina da situao irregular, que havia sido

    adotada pelo Cdigo de Menores de 1979.

    A doutrina da proteo integral defendida em diferentes documentos

    organizados pela ONU: o documento adotado em Assemblia Geral na Conveno

    das Naes Unidas sobre os Direitos da Criana, de novembro de 1989; as Regras

    Mnimas das Naes Unidas para Administrao da Justia da Infncia e da

    Juventude Regras de Beijing, de novembro de 1985; as Regras Mnimas das

    Naes Unidas para Proteo dos Jovens Privados de Liberdade, de dezembro de

    1988; e as Diretrizes das Naes Unidas para a Preveno da Delinqncia Juvenil -

    Diretrizes de Riad, de maro de 1990.

    A proteo integral de que tratam esses documentos baseada nos

    direitos prprios e especiais de crianas e adolescentes que, na condio peculiar

    de pessoas em desenvolvimento, necessitam de proteo especial. Ela constituda

    a partir do entendimento de que crianas e adolescentes so sujeitos de direitos e

    no simples objeto de interveno do mundo adulto.

    A grande revoluo trazida pelas novas normas legais brasileira foi a

    substituio da doutrina da situao irregular (Lei 6697/79) por um novo paradigma:

    a doutrina da proteo integral. Foi em 13 de julho de 1990, por meio da Lei n

    8.069, que nasceu o Estatuto da Criana e do Adolescente. Essa lei mudou a

    perspectiva sob a qual eram vistas as crianas e adolescentes, definindo-os como

    cidados de direitos, sujeitos proteo diferenciada, especializada e integral.

    Em outras palavras, o ECA, descentraliza e municipaliza as aes

    administrativas, desburocratizando as polticas pblicas voltadas para a criana e

    para o adolescente no Brasil. Promove o controle social, fiscaliza suas prprias

    implementaes nos municpios atravs de representantes locais e envolve a

    sociedade na gesto dos recursos pblicos.

  • 16

    O ECA resultado de um movimento social que ganhou fora contra o

    sistema punitivo do Cdigo de Menores, substituindo o castigo pela educao e

    pelos direitos humanos.

    1.1 O Estatuto da Criana e do Adolescente perspe ctiva das medidas socioeducativas

    ...Eu acho que tenho certeza daquilo que eu quero agora

    daquilo que mando embora daquilo que me demora

    eu acho que tenho certeza daquilo que me conforma daquilo que quero entender

    e no acomodar com o que incomoda...

    O Teatro Mgico

    O Estatuto da Criana e do Adolescente prev medidas socioeducativas a

    serem atribudas a adolescentes que tenham cometido atos considerados

    infracionais. Estas medidas esto dispostas no artigo 112, incisos I a VI: advertncia;

    obrigao de reparar o dano; prestao de servios comunidade; liberdade

    assistida; insero em regime de semi-liberdade; e internao em estabelecimento

    educacional. Alm destas medidas, em funo do art.112, inciso VII, do ECA

    podero ser aplicadas a esses adolescentes as medidas protetivas previstas no

    artigo 101, nos incisos de I a VI.

    As medidas previstas sero atribudas aos adolescentes, pela autoridade

    competente, aps verificada a prtica de ato infracional. Assim, o ECA aponta e

    descreve as seis medidas socioeducativas a serem aplicadas aos adolescentes

    autores de ato infracional, a saber:

    Advertncia artigo 115 A advertncia consistir em admoestao verbal, que ser reduzida a termo e assinada.

  • 17

    Reparao do dano artigo 116 Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poder determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma compense o prejuzo da vtima. Pargrafo nico: Havendo manifesta impossibilidade, a medida poder ser substituda por outra adequada. Prestao de Servios Comunidade artigo 117 A prestao de servios comunitrios consiste na realizao de tarefas gratuitas de interesse geral, por perodo no excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congneres, bem como em programas comunitrios ou governamentais. Pargrafo nico: As tarefas sero atribudas conforme as aptides do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada mxima de oito horas semanais, aos sbados, domingos e feriados ou em dias teis, de modo a no prejudicar a freqncia escola ou jornada normal de trabalho. Liberdade Assistida artigo 118 A liberdade assistida ser adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. 1 A autoridade designar pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poder ser recomendada por entidade ou programa de atendimento. 2 A liberdade assistida ser fixada pelo prazo mnimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituda por outra medida, ouvido o orientador, o Ministrio Pblico e o defensor. Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a superviso da autoridade competente, a realizao dos seguintes encargos, entre outros: I - promover socialmente o adolescente e sua famlia, fornecendo-lhes orientao e inserindo-os, se necessrio, em programa oficial ou comunitrio de auxlio e assistncia social; II - supervisionar a freqncia e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrcula; III - diligenciar no sentido da profissionalizao do adolescente e de sua insero no mercado de trabalho; IV - apresentar relatrio do caso. Semi-liberdade artigo 120 O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o incio ou como forma de transio para o meio aberto, possibilitada a realizao de atividades externas, independentemente de autorizao judicial. 1 So obrigatrias a escolarizao e a profissionalizao, devendo, sempre que possvel, ser utilizados os recursos existentes na comunidade. 2 A medida

  • 18

    no comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposies relativas internao. Internao artigo 121 - A internao constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princpios de brevidade, excepcionalidade e respeito condio peculiar de pessoa em desenvolvimento. 1 Ser permitida a realizao de atividades externas, a critrio da equipe tcnica da entidade, salvo expressa determinao judicial em contrrio. 2 A medida no comporta prazo determinado, devendo sua manuteno ser reavaliada, mediante deciso fundamentada, no mximo a cada seis meses. 3 Em nenhuma hiptese o perodo mximo de internao exceder a trs anos. 4 Atingido o limite estabelecido no pargrafo anterior, o adolescente dever ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida. 5 A liberao ser compulsria aos vinte e um anos de idade. 6 Em qualquer hiptese a desinternao ser precedida de autorizao judicial, ouvido o Ministrio Pblico.

    As medidas socioeducativas so aplicveis a adolescentes, menores de

    dezoito anos. Nessa faixa etria eles so penalmente inimputveis, ou seja, no

    podem ser responsabilizados penalmente, ainda que, depois do devido processo,

    tenha sido considerado responsvel pelo cometimento de um ato infracional1.

    Tais medidas so aplicadas de acordo com as caractersticas da infrao

    cometida e a capacidade do adolescente em cumpri-las, as circunstncias scio-

    familiares e a disponibilidade de servios existentes. O Poder Judicirio aplica a

    medida socioeducativa a partir de sua viso. Algumas vezes o julgamento baseado

    pela tica da infrao cometida, desconsiderando nesse caso o contexto do

    adolescente, seus valores, seus desejos.

    Ao prever medidas socioeducativas aos adolescentes a quem se atribui

    autoria de ato infracional, o ECA os responsabiliza pelos seus atos por meio da

    execuo de aes sociopedaggicas. A razo que justifica tais aes o

    1 Ato infracional toda conduta praticada por criana ou adolescente, definida como crime ou contraveno pelo Cdigo Penal

    Brasileiro. Para a configurao do ato infracional necessria a presena de indcios suficientes da autoria e materialidade do fato. Esta a nica relao existente entre o Direito da Criana e do Adolescente e o Direito Penal. O Direito Penal apenas nos d os tipos penais que so considerados crimes ou contravenes, pois a forma de responsabilizao pela prtica do ato

    infracional exclusiva das normativas previstas no Estatuto da Criana e do Adolescente (Veronse, 1(1): 29-46, 2009).

  • 19

    entendimento, pelo conjunto da sociedade, de que esses jovens so pessoas que

    esto em um momento especial de suas vidas: esto em processo de

    desenvolvimento (Passamani & Rosa, 2009).

    Essas medidas socioeducativas se dividem em dois grupos diferenciados.

    No primeiro grupo, incluem-se aquelas no-privativas de liberdade (advertncia,

    reparao de dano, prestao de servios comunidade e liberdade assistida). Num

    segundo grupo, esto aquelas cuja execuo se faz com a submisso do

    adolescente autor de ato infracional, privao de liberdade (semi-liberdade e

    internao)2.

    Losacco (2004) ao analisar medida como categoria histrica, assim se

    expressa:

    Como processo scio-histrico da humanidade, a medida o

    eixo principal contido nas regras, nas normas, e nas leis.

    Manifestadas por meio de discursos e teorias, so

    concretizadas nas mltiplas e diversificadas atitudes relacionais

    vividas no processo de socializao. Conseqentemente, as

    formas de comportamento esto diretamente relacionadas

    inter-ao social, e esta, por sua vez, qualidade de

    absoro dos valores sociais que iro compor estas regras,

    normas e leis.

    Volpi (1997) analisa que as medidas socioeducativas comportam

    aspectos de natureza punitiva, j que so coercitivas, no cabendo aos infratores

    aceit-las ou no. Comportam tambm aspectos socioeducativos, na perspectiva da

    proteo integral, devendo oportunizar o acesso formao e informao. Alm

    disso, os regimes socioeducativos devem criar condies que garantam o acesso do

    adolescente s oportunidades de superao de sua condio de excluso. Devem

    tambm garantir-lhe o acesso formao de valores positivos de participao na

    vida social.

    2 Joo Batista Costa Saraiva Juiz da Infncia e Juventude/RS e Professor de Direito da Criana e Adolescente na Escola Superior da Magistratura/RS.

  • 20

    A operacionalizao das medidas socioeducativas deve prever

    obrigatoriamente o envolvimento familiar e comunitrio, mesmo no caso da privao

    de liberdade. Deve ainda avaliar a possibilidade de aproveitamento de condies

    favorveis que possibilitem ao adolescente infrator a realizao de atividades

    externas instituio3.

    Em face dos princpios norteadores do Estatuto da Criana e do

    Adolescente (ECA) e da Constituio Federal (CF), dever dos rgos

    competentes, zelar para que seja assegurado ao adolescente em conflito com a lei o

    direito convivncia familiar e comunitria.

    A Constituio Federal estabelece que a famlia base da sociedade

    (Art. 226) e que, portanto, compete a ela, juntamente com o Estado, a sociedade em

    geral e as comunidades, assegurar criana e ao adolescente o exerccio de seus

    direitos fundamentais.

    Nesse destaque, como primeira aproximao, analisa-se a nfase dada

    pelas Leis, por considerar que importante compreend-las, procurando apreender

    o sentido, o modo como esto organizadas para investigar a operao em termos

    objetivos de socioeducao.

    1.2 O SINASE Sistema Nacional de Atendimento Soci oeducativo

    Quando nada parece dar certo, vou ver o cortador de pedras

    martelando sua rocha talvez 100 vezes, sem que uma nica

    rachadura aparea. Mas na centsima primeira martelada a pedra se

    abre em duas, e eu sei que no foi aquela que conseguiu isso, mas

    todas as que vieram antes.

    Jacob Riis

    No ano de 2004, a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), o

    Conselho Nacional de Direitos da Criana e do Adolescente (CONANDA), com o

    apoio do Fundo das Naes Unidas para a Infncia (UNICEF) sistematizaram e

    apresentaram a proposta de um Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

    3 Trecho referente ao artigo: Para no ser bandido: adolescentes em conflito com a lei e trabalho de Olga Maria Pimentel Jacobina e Liana Fortunato Costa.

  • 21

    SINASE. Um documento que visa promover uma ao educativa no atendimento ao

    adolescente que cumpre medida socioeducativa, sejam aquelas em meio aberto ou

    as restritivas de liberdade4.

    O fortalecimento do ECA deu-se a partir do SINASE - ao determinar

    diretrizes claras e especficas para a execuo das medidas socioeducativas por

    parte das instituies e dos profissionais que atuam nessa rea. Tais determinaes

    evitam interpretaes equivocadas de artigos do Estatuto que trazem informaes,

    s vezes, pouco aprofundadas sobre a operacionalizao dessas medidas.

    Fruto de uma construo coletiva, o SINASE envolveu diversos

    seguimentos do governo, representantes de entidades de atendimento, especialistas

    na rea e membros da sociedade civil. Estas pessoas e instituies promoveram

    intensos debates com a finalidade de construrem parmetros mais objetivos para o

    atendimento do adolescente autor de ato infracional. Trata-se de uma poltica

    pblica que verdadeiramente procura atender aos preceitos pedaggicos das

    medidas socioeducativas conforme dispe o Estatuto da Criana e do Adolescente.

    O Sinase visa a tornar mais explcitas algumas lacunas do

    ECA, especialmente na rea de medidas socioeducativas. A

    opinio pblica, mobilizada pela cultura do medo, nem sempre

    favorece que os gestores pblicos adotem as medidas mais

    adequadas5.

    O sistema que organiza as competncias e responsabilidades da Unio,

    dos Estados e dos municpios, prioriza as medidas em meio aberto - de prestao

    de servios comunidade e de liberdade assistida e afirma a necessidade de

    maior investimento nelas. Essas medidas, que devem ser aplicadas pelas

    4 Estas instituies, em novembro de 2004 promoveram um amplo dilogo nacional com aproximadamente 160 atores do

    Sistema de Garantia de Direitos, que durante trs dias discutiram, aprofundaram e contriburam de forma imperativa na

    construo deste documento (SINASE), que se constituir em um guia na implementao das medidas scio-educativas

    (Veronse, 1(1): 29-46, 2009 )

    5 Avalia a sub-secretria de Promoo dos Direitos da Criana e do Adolescente da SEDH, Carmen de Oliveira - www.cedecainter.org.br/portal/news

  • 22

    prefeituras, apresentam melhores resultados, como a diminuio da reincidncia,

    permitindo que o jovem continue convivendo com a famlia e a comunidade, alm de

    apresentarem custos bem menores que os de internao.

    Os estudos apontam que os melhores resultados da aplicao das

    medidas socioeducativas esto nas medidas em meio aberto. Alm do menor custo

    e da diminuio da reincidncia, o adolescente pode continuar convivendo com a

    famlia e a comunidade, o que contribui para redirecionar sua sociabilidade.

    As medidas socioeducativas devem ser consideradas, na perspectiva de

    uma ao pedaggica, privilgios na descoberta de novas potencialidades,

    direcionando construtivamente o futuro do adolescente, dando importncia e

    fortalecendo as medidas operadas em meio aberto, em detrimento das medidas

    privativas de liberdade.

    1.3 A Fundao Casa

    O sonho dos que hoje negam prtica educativa qualquer relao com sonhos e utopias, como o sonho da autonomia do ser, que implica a assuno de sua responsabilidade social e poltica, o sonho da reinveno constante do mundo, o sonho da libertao, portanto o sonho de uma sociedade menos feia, menos malvada, o sonho da adaptao silenciosa dos seres humanos a uma realidade considerada intocvel.

    (Paulo Freire)

    A Fundao CASA6 responsvel pela operao das medidas

    socioeducativas de privao de liberdade (internao) e semi-liberdade a

    adolescentes em todo o Estado de So Paulo. Estas medidas so aplicadas pelo

    Poder Judicirio, de acordo com o ato infracional cometido. Tendo assumido como

    6 A Fundao Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) uma instituio ligada Secretaria de Estado da Justia e da Defesa da Cidadania. Tem como misso primordial aplicar em todo o Estado as diretrizes e as normas dispostas no Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA) e no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), promovendo estudos e planejando solues direcionadas ao atendimento de adolescentes autores de atos infracionais, na faixa de 12 a 21 anos. www.casa.sp.org.br

  • 23

    diretriz operacional a descentralizao, a Fundao CASA quer no apenas

    melhorar o atendimento aos adolescentes, como desativar gradualmente os grandes

    complexos de internao que marcaram a poltica da antiga FEBEM.

    A descentralizao, feita pelo Estado nas unidades da Fundao Casa,

    vem organizando unidades menores e mais prximas das famlias, porm, a cultura

    correcional, que persiste no tratamento do adolescente em conflito com a lei, ainda

    no conseguiu ser superada.

    Toda a situao de violncia se perpetua em razo da prpria interpretao do Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA). Os prprios operadores do sistema fazem uma leitura equivocada de que o estatuto no adequado para tratar dos adolescentes infratores. A lei no bem recebida pelos operadores7

    A regionalizao do atendimento ao adolescente em conflito com a lei, a

    priorizao das medidas em meio aberto com implementao do SINASE, a

    capacitao continuada dos operadores do Sistema de Garantia de Direitos e a

    criao de Varas Especializadas na Infncia e Juventude em cada Comarca e

    respectivas Defensorias Pblicas e Promotorias de Justia, no so mais

    recomendaes. So deliberaes, conforme afirma Carmen de Oliveira,

    subsecretria de Promoo dos Direitos da Criana e do Adolescente da Secretaria

    Especial dos Direitos Humanos.

    Os especialistas so unnimes em dizer que os adolescentes tendem a

    apresentar menos problemas de violncia quando em unidades menores, devido

    infraestrutura bem cuidada e individualidade respeitada. Na avaliao da advogada

    Marcela Vieira, da Conectas Direitos Humanos, houve mudanas - o nmero de

    agresses e de mortes diminuiu. H quatro anos era cerca de uma morte por ms na

    7 Karyna Sposato advogada e consultora da Unicef, o trecho citado parte integrante da matria de Justia da infncia e da juventude - Fonte: O Estado de So Paulo, 21/01/2010.

  • 24

    ento FEBEM-SP. No ano passado, segundo levantamento com base em notcias

    de jornais, foram cinco mortes nas unidades8.

    O que se constata que a Fundao Casa, (ex-FEBEM), executora da

    medida socioeducativa de internao no Estado de So Paulo, tem-se mostrado, no

    decorrer dos anos, incapaz de promover o desenvolvimento educacional dos

    adolescentes nela confinados. Esta incapacidade no se d de forma gratuita, mas

    permeada por dois fatores significativos: 1) deficincia na estrutura funcional que,

    mesmo descentralizada, ainda tem um quadro de pessoal-gerencial tecnicamente

    desqualificado para executar as polticas e os planos de ao pedaggica e 2)

    prticas institucionais caracterizadas pela conteno, opresso e punio.

    8 Matria do jornal O Estado de So Paulo (SP), Julia Duailibi 21/01/2010, texto extrado do site www.promenino.org.br

  • 25

    2. Organizando caminhos

    ...Disse a flor para o pequeno prncipe: preciso que eu suporte

    duas ou trs larvas se quiser conhecer as borboletas....

    Antoine de Saint-Exupry.

    Adolescente no Projeto Expressarte

    Como as boas experincias so pouco relatadas, h a necessidade de

    debates diversificados e de socializao de aes exitosas. Esta Dissertao de

  • 26

    Mestrado est voltada para esse debate e essa socializao no que diz respeito

    operacionalizao das medidas socioeducativas em meio aberto e semi-liberdade.

    Algumas instituies tm conseguido operar as medidas socioeducativas

    em meio aberto na gide da garantia de direitos. Este o caso da experincia de

    trabalho desenvolvida pelos Salesianos So Carlos, junto ao programa de Medidas

    Socioeducativas e de sua interferncia e apoio na elaborao e na implantao do

    NAI Ncleo de Atendimento Integrado. Estas aes foram, no perodo de 1999 a

    2009, referncia nacional.

    2.1 A cidade de So Carlos

    Em 2000, o municpio de So Carlos contava com uma populao de

    192.923 habitantes sendo que, na rea urbana, haviam 183.469 habitantes e 9.453

    na rea rural. Entretanto, essa populao, que teve seus dados atualizados pela

    Prefeitura Municipal com base nas instalaes de luz e projees da composio

    mdia familiar, passou a ser considerada de, aproximadamente, 220.425 habitantes.

    Por sustentar um amplo desenvolvimento, a cidade apresenta um elevado ndice de

    migrao de trabalhadores e estudantes. Vinte mil destes so moradores

    temporrios advindos de outras cidades, estados e pases.

    A taxa de crescimento demogrfico de 2,4% ao ano, com base no

    SEADE, IDH 0,841 Pnud 2000. A populao infanto-juvenil tem um crescimento

    em torno de 33%9.

    A cidade de So Carlos um importante centro regional com a economia

    fundamentada em atividades industriais e agropecurias. marcada pela presena

    de dois campi, um da Universidade de So Paulo (USP) e outro da Universidade

    Federal de So Carlos (UFSCar), alm de outras duas instituies de ensino

    superior particulares, o Centro Universitrio Central Paulista (UNICEP) e as

    Faculdades Integradas de So Carlos (FADISC) que tornam intensas as atividades 9 Dados obtidos no site da Prefeitura Municipal de So Carlos www.saocarlos.sp.gov.br.

  • 27

    universitrias no municpio. No campo de pesquisas, alm das universidades, esto

    presentes dois centros de desenvolvimento tcnico da Embrapa.

    Servida pelos sistemas, rodovirio e ferrovirio, So Carlos conta com

    unidades de produo de algumas empresas multinacionais e outras de empresas

    nacionais, fazendo da cidade um importante plo tecnolgico, educacional e

    cientfico.

    2.1.1 O municpio e as perspectivas da Assistncia Social

    A Secretaria Municipal de Cidadania e Assistncia Social implementou a

    poltica de cidadania e assistncia social do municpio voltada ao atendimento dos

    interesses sociais e aspiraes da populao em situao de risco social, visando o

    combate pobreza, a garantia dos mnimos sociais, o provimento de condies para

    atender contingncias e a universalizao dos direitos sociais.

    Em 2005, a partir de orientaes fornecidas pelo Sistema nico de

    Assistncia Social (SUAS), deu-se o incio implantao de quatro CRAS (Centro

    de Referncia de Assistncia Social) no municpio de So Carlos, processo esse

    facilitado pelas aes que a Secretaria Municipal de Cidadania e Assistncia Social

    h tempo desenvolvia.

    Hoje, a Poltica Municipal de Assistncia Social est descentralizada em

    cinco regies, acompanhando a delimitao territorial da Secretaria Municipal de

    Sade. Os Centros Comunitrios existentes em cada regio passaram a ser

    unidades de apoio de cada unidade do CRAS.

    Atualmente, as diversas aes desenvolvidas nos CRAS e nos Centros

    Comunitrios atendem por ms cerca de cinco mil pessoas em diversas aes:

    culturais, capacitao profissional e insero produtiva, atendimento integral

    famlia, programas de transferncia de renda, de esporte, de lazer e de sade.

  • 28

    O Programa de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto

    supervisionado10 pelo CREAS conforme a proposta de municipalizao das medidas

    socioeducativas norteada pelo Sinase. O processo de trabalho integrado e

    articulao buscam, com esses servios, a manuteno dos adolescentes em seu

    territrio e o cuidado nos servios de ateno bsica.

    2.1.2 A rede de atendimentos

    No municpio de So Carlos a rede de atendimentos da criana e do

    adolescente formada por todos os rgos pblicos e privados que se dedicam a

    essa rea.

    Esta rede composta pelas secretarias de cidadania e assistncia social,

    educao e cultura, esporte e lazer, sade e pela secretaria especial de infncia e

    juventude, alm das creches municipais e conveniadas, entidades de

    complementao escolar e profissionalizante, conselhos municipais (Tutelar e

    CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente), Vara da

    Infncia e Juventude, Ministrio Pblico - com a Promotoria da Infncia e Juventude

    - e a Segurana Pblica (Polcias Militar e Civil).

    Aps a implantao da Recriad11 Rede de Atendimento da Criana e do

    Adolescente, a rede tornou-se fortalecida. Organizou canais de comunicao,

    10

    Trecho do documento: Informativo Tcnico Medidas Socioeducativas em Meio Aberto Secretaria de Assistncia e

    Desenvolvimento Social. No ano de 2006 norteada pelo SINASE, a Fundao CASA desencadeou um processo de

    aprofundamento, entendimento e apropriao dos ditames desse sistema, para implantar e implementar no Estado de So

    Paulo, a municipalizao das Medidas em Meio Aberto. Dando continuidade ao processo de municipalizao nos anos de

    2007/2008, outras Prefeituras foram assumindo a gesto das medidas socioeducativas em meio aberto, culminando com as

    discusses do SUAS, que se desenvolviam nos municpios, ficando pactuado de acordo com cada realidade, execues de

    forma direta ou indireta. Em cumprimento ao estabelecido na Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS), que preceitua as

    Medidas Socioeducativas em Meio Aberto PSC/LA, como servios de Proteo Social Especial de Mdia Complexidade, a

    serem desenvolvidos no mbito dos municpios, preferencialmente pelos CREAS. www.mp.sp.gov.br/boletim

    11 um sistema de interligao de todos os Programas e Projetos de Ateno e de Proteo criana e ao adolescente e seus rgos gestores, visando a garantia dos direitos da infncia e juventude no Municpio de So Carlos.

  • 29

    participao e aproximou parceiros para o conhecimento mtuo atravs de

    formaes, seminrios e palestras.

    2.2 Adolescncia, adolescentes e as medidas socioed ucativas

    ...Hoje no quero estudar, vou fugir para algum lugar, vou andar sem saber pra onde, vou deixar o vento me levar, esquecer um pouco dos meu pais, me sinto to sozinho, ningum me compreende...

    B5 - Retratos da Adolescncia

    A palavra adolescncia tem sua origem etimolgica no Latim ad para +

    olescere - crescer. Portanto, crescer o que espera para algo que vem adolescer,

    passando por um processo de desenvolvimento onde o adolescente enfrenta uma

    etapa marcada pelas diversas mudanas, esperando o que est por vir12.

    Para falar de adolescncia, nos baseamos nas determinaes legais

    estabelecidas pelo ECA. Define como adolescente o sujeito entre 12 e 18 anos; e a

    Organizao Mundial da Sade (OMS)13 que compreende a adolescncia do ponto

    de vista cronolgico, como:

    Faixa etria entre 10 e 19 anos, definida como sendo o perodo da vida em que: o indivduo passa do aparecimento das caractersticas sexuais secundrias maturidade sexual; os padres psicolgicos e a identificao do indivduo evoluem da fase infantil para a fase adulta; ocorre a transio do estado de total dependncia socioeconmica para o de relativa independncia.

    A adolescncia, na perspectiva do critrio fsico, abrange as modificaes

    anatmicas e fisiolgicas que transformam a infncia - perodo de crescimento e

    12 PEREIRA, E. D. - Adolescncia: um jeito de fazer - Revista da UFG, Vol. 6, No. 1, jun 2004 13 O Segundo sua constituio, a OMS tem por objetivo desenvolver ao mximo possvel o nvel de sade de todos os povos. A sade sendo definida nesse mesmo documento como um estado de completo bem-estar fsico, mental e social e no consistindo somente da ausncia de uma doena ou enfermidade. O Brasil tem participao fundamental na histria da Organizao Mundial da Sade, criada pela ONU para elevar os padres mundiais de sade. A proposta de criao da OMS foi de autoria dos delegados do Brasil, que propuseram o estabelecimento de um "organismo internacional de sade pblica de alcance mundial. Desde ento, Brasil e a OMS desenvolvem intensa cooperao. Fonte: http://pt.wikipedia.org

  • 30

    desenvolvimento do ser humano, que vai do nascimento at a adolescncia.

    Portanto, a adolescncia uma conseqncia natural do desenvolvimento humano,

    um evento fsico com limites de incio e trmino definidos.

    Essa transio de criana para adolescente se d a partir do hipotlamo,

    uma pequena regio do crebro, que comea a produzir substncias que ativam a

    glndula pituitria que, por sua vez, envia hormnios estimulantes aos ovrios da

    mulher e aos testculos do homem, iniciando a produo e liberao dos vulos e

    espermatozides.

    tambm poca da vida onde as mudanas hormonais podem contribuir

    para comportamentos mais agressivos, contestadores, tanto fsicos quanto

    emocionais, uma busca de si mesmo e de sua identidade.

    Segundo o ponto de vista psicolgico, a adolescncia tem relao com o

    tempo vivido em sua dimenso social - descobertas, ensaios, expectativas e anseios

    prprios deste momento, levam a inquietaes, buscas e atitudes bastante

    interessantes e, inmeras vezes, surpreendentes. Neste processo, o adolescente

    depara-se com muitas definies e escolhas a serem feitas e que dependem de

    princpios e valores familiares enraizados e compreendidos por ele para que possa

    optar de forma consciente e segura. O adolescente passa por um processo de

    construo de sua auto-imagem, que vai se fortalecer e modificar ao longo da vida

    adulta.

    Maria Lcia Miranda Afonso14, em sua tese de doutoramento A

    polmica sobre adolescncia e sexualidade, aponta que o adolescente recorre

    busca de uniformidade, seguindo regras e comportamentos de grupo construo

    da identidade. O grupo constitui um meio para que efetue a transio do mundo

    infantil para o mundo adulto, facilitando assim, a vivncia de diferentes cenas e

    personagens, que o jovem experimenta ao ter de elaborar a perda do corpo e dos

    papis infantis e construir nova imagem de si na vivncia de papis adultos.

    14 Maria Lcia Miranda Afonso psicloga e doutora em Educao pela Universidade Federal de Minas Gerais.

  • 31

    Padre Agnaldo Soares Lima, afirma que o adolescente que no teve uma

    base familiar que lhe oferea uma presena afetiva forte, com estabelecimento de

    limites e regras de boa convivncia;

    Muitas vezes encontra-se abandonado pela famlia ou descuidado pelos pais (independente de classe social) que se mostram despreparados para cuidar da formao dos filhos e que, por ignorncia ou por razes de acmulo de trabalho, no conseguem oferecer afeto (abrao, beijo, dilogo, motivao, acompanhamento escolar, tempo para lazer e diverso juntos...) e nem estabelecer regras e limites (no vai, no tem, no pode, no precisa...). Neste contexto a transmisso de valores morais e religiosos tambm termina por acontecer de forma tmida, muito tnue.

    Hrran (1997) nos faz uma pergunta bastante instigadora: A quem nos

    referimos quando falamos de adolescncia, falamos todos da mesma coisa?.

    Segundo o autor, h uma coincidncia na maioria dos outros autores quando

    determinam que vrios elementos explicam o comportamento adolescente.

    Para Losacco (2004a), o adolescente um viajante que deixou um lugar e

    ainda no chegou ao lugar seguinte. Vive um intervalo entre liberdades anteriores e

    novas liberdades e responsabilidades/compromissos anteriores e subseqentes,

    vive uma ltima hesitao antes dos srios compromissos da fase adulta. Perodo

    de contradio, confuso, ambivalente e muitas vezes doloroso. s vezes, refugiam-

    se em seu mundo interno e, atravs do jogo da vivncia das situaes fantasiosas,

    preparam-se para a realidade.15

    Procura-se compreender a adolescncia como uma fase de

    transformao em que o ser criana vai lentamente dando espao para o ser

    adolescente. Uma fase do desenvolvimento, que deve refletir as expectativas da

    sociedade sobre as caractersticas deste grupo. A adolescncia, portanto, um

    papel social. E esse papel social de adolescente, acompanha o processo da

    adolescncia. Segundo Ozella:

    15 Silvia Losacco: Tese de doutoramento: Mtrons e Medidas - caminhos para o enfrentamento das questes da infrao do adolescente

  • 32

    entender a adolescncia como constituda socialmente a partir

    de necessidades sociais e econmicas dos grupos sociais e

    olhar e compreender suas caractersticas que vo se

    constituindo no processo (2003: 20).

    Hrran (1997a) traz ainda uma contribuio importante para a

    compreenso da adolescncia quando diz que a imagem do adolescente definida

    por suas relaes sociais16.

    Portanto, o adolescente, definido por suas relaes sociais, aquele que

    vincula pessoas a outras, O equilbrio dessas interaes vai determinar a qualidade

    das relaes sociais e afetivas do adolescente com os pontos de sua rede (famlia,

    escola, amigos, trabalho, dentre outros).

    A experincia na direo das medidas socioeducativas em meio aberto e

    semi-aberto possibilitou, ao Padre Agnaldo, estudar os fenmenos e relacionar o

    adolescente em conflito com a lei ao consumismo, escola, sociedade e ao

    mundo do crime.

    As perspectivas de uma melhora econmica ou de acmulo de coisas materiais, to cobiadas e to exaltadas pela sociedade de consumo, parece algo inatingvel. A condio de aluno numa escola sem nenhum atrativo faz com que a desmotivao se associe com brincadeiras e outras formas de perturbao da ordem. Isto o torna indesejvel para a escola, que ao invs de envolv-lo e tir-lo da ignorncia passa a buscar formas de afast-lo e exclu-lo.

    H ainda o preconceito presente de um modo geral na sociedade, que fecha inmeras portas ao jovem, sobremaneira a do trabalho: a cor, o modo de vestir-se, o bairro onde mora, a tatuagem. Se esta a condio do jovem na nossa dita sociedade do bem, muito diferente a forma como se d a sua aproximao com a sociedade do crime. Se a famlia no oferece o cuidado e a ateno necessrios, a escola exclui, a sociedade discrimina e no oferece oportunidades, a referncia de valores no construda e ao jovem resta um sentimento de

    16 Trecho extrado do texto: Aportaciones VII Congreso INFAD: Adolescencia Tercera ponencia Adolescencia: Dimension Afectivo-emocional Cunado hablamos de adolescncia, hablamos todos de lo mismo? de Jos Ignacio Moraza Hrran.

  • 33

    infelicidade, baixa auto-estima, fracasso, humilhao e derrota. A est assentado o campo ideal para o seu envolvimento com as drogas e, consequentemente, para o envolvimento com o mundo da criminalidade. No mundo do crime o jovem encontra: reconhecimento (aps entregar a droga ele o cara); valorizao (ele bem acolhido e bem tratado); sucesso (se ele fracassou na escola ele pode ter xito na prtica do delito); espao de poder (com uma arma na mo ele se sente poderoso e temido); respeito (quanto mais delitos praticados, mais ser respeitado), status (mesmo dentro de um Instituto de Internao ou de uma penitenciria o jovem ter o status e o tratamento diferenciado pela sua trajetria criminal).

    Nessa perspectiva, Zaluar aponta, ao integrarem-se ao mundo do crime

    atravs do trfico de drogas e armas, os jovens tornam-se;

    ...As principais vtimas dos crimes violentos, principalmente os

    pobres, por causa da cadeia de vinganas pessoais de que so

    prisioneiros, especialmente cruel entre os traficantes de

    drogas... (Zaluar, 2004, p. 34).

    Afinal, quem so os adolescentes em conflito com a lei? So diferentes

    dos outros adolescentes?

    So os adolescentes da cidade, so os meninos que esto por a... no tem nada que os diferencie, mesmo se o olharmos em um grupo com outros adolescentes, no h marcas, no h diferenas. Temos apenas que tomar cuidado para no colocarmos a marca. So adolescentes que tm histrias, que tm vnculos na escola e na famlia, tm participaes na comunidade, mas que teve um rompimento com esses vnculos, ocasionando a infrao17.

    Padre Agnaldo traz uma contribuio importante que fundamenta a

    importncia do trabalho socioeducativo em meio aberto e o semi-aberto:

    O adolescente autor de ato infracional tratado nas condies oferecidas aos criminosos adultos - num ambiente policial e de cadeia - tende naturalmente a assumir o comportamento de "bandido". Tratado ao invs por educadores e num ambiente

    17 Trecho da entrevista com a coordenadora do Programa de Medidas Glaziela C. S. Marques.

  • 34

    educativo (limpo, espaoso, digno) mostra com muito mais facilidade o seu lado adolescente: bom, de medo, de insegurana. Por isso, permite maior facilidade para um trabalho de orientao e acompanhamento.

    A experincia na relao orientador-adolescente permite afirmar que os

    adolescentes em conflito com a lei so adolescentes como os outros, que tm

    medos, inseguranas, problemas na escola, que namoram, que brigam, que s

    vezes so chatos e pegajosos... mas que, por um motivo muito particular,

    transgrediram18, gerando o conflito com a lei. uma concepo simples, porm, o

    reflexo da vivncia com esse adolescente, da relao constituda entre educador e

    educando... da relao da presena em sua vida durante o cumprimento da medida.

    interessante trazer aqui a relao educador-educando, pois, mesmo

    sendo estabelecida durante o cumprimento da medida, torna-se referncia para

    muitos por anos e anos. H casos em que ex-orientandos trazem lbum de fotos de

    seus filhos, informam sobre o seu primeiro emprego e, at mesmo, sobre o

    recebimento do primeiro salrio. Essa relao uma referncia que ficar para a

    sua vida inteira!

    Independente de uma posio formal a respeito da adolescncia, a

    vivncia do cotidiano ensina o tempo todo. Isso at clich! Mas o aprendizado no

    igual a todos. Mesmo quando dois adolescentes vivem uma mesma situao, o

    aprendizado para cada um diferente, pois suas vivncias so diferentes. Tais

    vivncias so diferentes porque so pessoas com personalidades e estruturas

    psquicas particulares e experincias de vida diversas. O contexto em que cada um

    se encontra tambm deve ser considerado, pois sua rede de relaes pode estar

    mais, ou menos aberta, mais, ou menos fragilizada, mais, ou menos ativa.

    18 Silvia Losacco, em sua tese de doutoramento: Mtrons e Medidas - caminhos para o enfrentamento das questes da

    infrao do adolescente, refere: A transgresso a maneira mais utilizada de fazer valer e experimentar novas formas de

    pensar e estabelecer um novo modo de agir. Prprias desta faixa etria, requerem daqueles que so responsveis por eles

    (famlia, instituies, organizaes e Estado), por um lado, um olhar que conjugue o todo e o particular e, por outro, aes que

    sejam continentes para os contedos advindos das inquietaes e das necessidades deste sujeito no contexto contemporneo

    (Losacco: 2004:18).

  • 35

    3. Multiplicando Aes

    Dana de roda

    3.1 O Salesianos So Carlos

    Basta que sejais jovens para que eu vos ame.

    Dom Bosco

    Em 15 de agosto de 1946, reuniu-se um grupo de pessoas de So Carlos

    com a finalidade de tratar sobre a fundao de um orfanato, sob orientao catlica

    da Diocese de So Carlos, que na poca tinha sua frente o bispo diocesano D.

    Ruy Serra.

    Chamada inicialmente de "Associao de Amigos de Vila Nery", a obra

    tinha como finalidade prestar assistncia ao menor carente, do sexo masculino,

    desde recm-nascido at os 18 anos. A nova obra foi inaugurada solenemente, no

    dia 16 de outubro de 1949, recebendo os 20 primeiros meninos. Posteriormente, j

    denominada Salesianos So Carlos, a instituio foi oferecida para a Congregao

    Salesiana. No dia 2 de agosto de 1977, chegava o padre Manoel Leonardo, o

    primeiro salesiano a assumir sua gesto19.

    A instituio Salesianos So Carlos tem por finalidade a educao e a

    assistncia social por meio da promoo da infncia, da adolescncia, da juventude

    19 Informaes obtidas atravs do site dos Salesianos So Carlos www.salesianossc.org.br

  • 36

    e de adultos, em consonncia com a Lei Orgnica da Assistncia Social (LOAS) e

    do Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA).

    A obra salesiana, baseada nos ensinamentos de Dom Bosco e do ECA,

    implantou programas socioeducativos para atender crianas, adolescentes e jovens.

    A seguir os programas de atendimento:

    Programa de complementao escolar: PROVIM e

    PROVIM Dom Luciano Mendes, que atende anualmente

    cerca de 500 crianas e adolescentes entre 06 a 14 anos,

    no perodo alternativo escola.

    Atuao do Provim:

    - Aes complementares escola;

    - Atendimento a crianas e adolescentes em situao de

    vulnerabilidade social;

    - Oferta de atividades culturais, esportivas, ldicas, recreativas

    e formativas;

    - Complementao a educao alimentar;

    - Orientao e formao para os cuidados da sade;

    - Preveno violncia domstica;

    - Preveno ao uso de substncias qumicas, lcitas e ilcitas.

    Lar Juvenil So Domingo Svio Araraquara:

    extenso da Obra de So Carlos na vizinha cidade de

    Araraquara, o Lar Juvenil atende 100 crianas e

    adolescentes.

    Projeto Nosso Amigo: atende cerca de 200

    crianas e adolescentes em situao de vulnerabilidade

    social - acolhendo, orientando e incentivando o resgate de

    suas histrias de vida, identidade e cidadania.

    Pr Jovem: atende jovens de 15 a 17 anos, das

    famlias beneficirias do Programa Bolsa Famlia e jovens

    vinculados ou egressos de Programas e de Servios de

    Proteo Social Especial.

  • 37

    Centro Profissional Dom Bosco CPDB: atende

    adolescentes de 12 a 18 anos que freqentam a escola,

    recebem cursos de iniciao profissional, de marcenaria,

    de instalaes eltricas, de panificao, de confeitaria e

    de informtica. Adultos (a partir dos 18 anos), frequentam,

    alm do curso de panificao e confeitaria, os cursos de

    costura e cabeleireiro. Uma oficina de Costura Industrial

    funciona em esquema de cooperativa, tendo a

    participao de 20 senhoras.

    Escolinha de Futebol Chuteira de Ouro: um

    programa de esporte que oferece horrios para

    treinamentos variados durante a semana, divididos por

    faixas etrias.

    Programa de Medidas Socioeducativas de

    Prestao de Servios Comunidade e Liberdade

    Assistida que o programa de atendimento ao

    adolescente em conflito com a lei. Complementam esse

    programa, os projetos: Digitrampo, Informtica, Ateli de

    Artes e Academia Forma Jovem, Preveno na Medida e

    Projeto Brincar.

    Programa de Liberdade Assistida Araraquara/SP20

    que o programa de atendimento ao adolescente em

    conflito com a lei realizado pelo Salesianos So Carlos na

    cidade de Araraquara.

    Programa de Semi-liberdade21 Casa de

    Convivncia Lucas Perroni Jnior que o programa de

    20 O Programa de LA de Araraquara iniciou suas atividades em 2002 e encerrou seus atendimentos aps no renovao do convnio com a Prefeitura Municipal.

    21 O Programa de Semi-liberdade foi executado pelo Salesianos So Carlos de 2000 2009, encerrando suas atividades em

    novembro 2009. O convnio entre Salesianos e Fundao Casa terminou aps um longo debate entre as instituies.

  • 38

    atendimento ao adolescente em conflito com a lei na

    medida de semi-liberdade.

    Outros trabalhos complementam as aes do Salesianos So Carlos

    como o Amor Exigente - que trabalha com usurios de drogas e seus familiares e o

    EJA Educao de Jovens e Adultos que trabalha com a suplncia escolar e

    alfabetizao.

    O Salesianos So Carlos a maior obra social do municpio. Atende

    cerca de 800 crianas e adolescentes diariamente em seus diferentes programas de

    atendimento.

    Alm dos atendimentos, o Salesianos articula-se com a rede de

    atendimentos da criana e o adolescente do municpio de So Carlos (RECRIAD). A

    rede composta por diversos seguimentos como: Secretarias municipais, Conselho

    tutelar, CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente,

    Poder Judicirio Vara da Infncia e Juventude, Ministrio Pblico, NAI,

    organizaes no governamentais e outros programas na rea de esportes, lazer,

    iniciao profissional.

  • 39

    3.2 O Sistema preventivo de Dom Bosco

    "A msica dos jovens se escuta com o corao, no com os ouvidos"

    Dom Bosco22.

    Diante da situao dos jovens do seu tempo, Dom Bosco faz a opo da

    educao: um tipo de educao que previne o mal por meio da confiana no bem

    que existe no corao de todo jovem, desenvolve suas potencialidades com

    perseverana e pacincia, constri a identidade pessoal de cada um23.

    Trata-se de uma educao que forma pessoas solidrias, cidados ativos

    e responsveis, pessoas abertas aos valores da vida e da f, homens e mulheres

    capazes de viver com sentido, alegria, responsabilidade e competncia. Este modo

    de educar torna-se verdadeira experincia de presena na vida para o adolescente

    que o vivencia.

    Petitclerc, padre salesiano, afirma: sem confiana no h educao.

    Este o princpio que est na base do sistema educativo de Dom Bosco. S se

    pode fundamentar o conceito de autoridade atravs de uma relao de confiana

    entre o educando e o educador.

    Padre Agnaldo Soares Lima diz que:

    Quando falamos de pedagogia estamos falando de educao. Educar transmitir conhecimento, levar ao aprendizado. O que se quer ao trabalhar com o adolescente envolvido na prtica de ato infracional, no lev-lo a conhecer a violncia e as regras do crime, que ele domina muito melhor que seus educadores. Ao contrrio, busca-se faz-lo descobrir e experimentar tudo o que faltou antes e que fez com que o

    22 Dom Bosco nasceu em 16 de agosto de 1815 numa pequena cidade chamada Castelnuovo DAsti, no Piemonte (Itlia).

    Ainda criana, a morte do pai fez com que experimentasse a dor de tantos pobres rfos. Em mame margarida, porm, teve

    um exemplo de vida crist que marcou profundamente o seu esprito. 23 Trecho retirado do texto: Os valores mais significativos do sistema preventivo J. M. Petitclerc

  • 40

    jovem passasse a trilhar o mundo da criminalidade. Isto somente ser possvel num ambiente educativo, acolhedor, capaz de faz-lo sentir-se melhor consigo mesmo e com os outros.

    Dom Bosco v a realidade social, percebe o seu significado e tira suas

    concluses. Dessa experincia nasce nele uma imensa compaixo pelos jovens

    marginalizados; cresce em seu corao uma opo pessoal de vida: consagra-se

    ao bem da juventude. Sua opo est fundamentada numa profunda f na

    paternidade misericordiosa de Deus e em sua Providncia; ela se fundamenta

    tambm na convico de que o jovem, mesmo o mais rebelde, possui um ponto

    acessvel ao bem e que, quando estimulado e apoiado, ele capaz de no se deixar

    levar pelo mal e escolher o caminho da vida e do bem24.

    O Padre Agnaldo, lembra o filme Diamante de Sangue, que teve como

    ator Leonardo de Caprio, no qual encontrou uma cena magistral que ajuda a

    compreender o sentido do resgate da prpria identidade. No filme, um pai de Serra

    Leoa, frica, tem seu filho, de aproximadamente 12 anos, levado pelos guerrilheiros.

    Tendo passado pela lavagem cerebral prpria das guerrilhas, em determinado

    momento do filme o pequeno adolescente vai manter uma arma apontada para seu

    pai, ignorando por completo sua relao filial e demonstrando estar pronto para

    disparar, se necessrio. Neste instante, segue-se uma cena que parece ser a forma

    como algumas tribos africanas lidam com aqueles que erram ou cometem um crime.

    O pai, ao invs de invocar sua autoridade paterna para se fazer respeitar e chamar a

    ateno do filho ou amea-lo, comea a recordar ao filho quem ele era e vai

    dizendo pausadamente: Dia, o que est fazendo? Dia... da orgulhosa tribo Mende,

    voc um bom menino, que ama o futebol e a escola; a sua me ama muito voc;

    ela est esperando voc perto do fogo, fazendo as bananas cozidas com sua irm

    Nianda e o novo bebe; a vaca espera voc... e Babu, o co selvagem que voc sabe

    que s obedece a voc; (o filho comea a chorar) eu sei que foraram voc a fazer

    coisas ruins, mas voc no um menino ruim; eu sou o seu pai e amo voc, e voc

    vai voltar para casa comigo e vai ser meu filho de novo.

    24 Trecho extrado da revista: Sistema Preventivo e Direitos Humanos, Coleo Protagonista, p.14. ano 2009.

  • 41

    Com esta histria, na qual reflete Padre Agnaldo, pode-se fazer uma

    analogia com a de adolescentes que praticaram atos infracionais, que se deixaram

    envolver pelo crime, perdendo suas referncias, muitas vezes distanciando-se da

    famlia, dos bons amigos, e afastando-se (ou sendo forado a se afastar) dos meios

    sociais que frequentava em momentos anteriores: escola, igreja, parentes, vizinhos,

    trabalho. Esses adolescentes, por vezes calam seus sentimentos, para poder dar

    espao a uma atitude mais fria, mais compatvel com as aes propostas pelo crime.

    Nesta perspectiva, buscar distanciar o adolescente do caminho

    transgressor que ele vinha percorrendo pressupe ajud-lo a resgatar, de dentro de

    si o humanismo, a criana ou o pr-adolescente que ficou para trs, no momento em

    que se deixou encantar pelas sedues do crime.

    3.2.1 O sistema preventivo como um espao de constr uo de significados

    Smolka (2004, p. 35) ao falar sobre sentido25 e significado26, diz ser

    impossvel ao homem no significar, j que a significao faz parte da atividade

    humana. As crianas nascem em um mundo cheio de significados e significaes e,

    no desenrolar de suas vidas, cada coisa a cada dia, faz sentido.

    O adolescente busca sentido, atribui sentidos, sempre. Ao crescer,

    vivencia diversos contatos empricos e subjetivos - ao receber e perceber cuidados,

    carinhos, afetos, distanciamentos, ausncias, negligncias, contradies - que vo

    constituindo sua identidade. E, ao apreenderem esses contatos passam a signific-

    los.

    Quando o jovem consegue encontrar-se novamente consigo mesmo, do

    modo como era antes de comear a seguir a vida do crime, ele termina por ver

    25 Sentido, de acordo com o pensamento de Vigotski, o confronto entre o significado social e a vivncia pessoal (Conceito estudado em aula de Srgio Ozella no NCA/PUCSP em 2008). 26 Os significados, de acordo com o pensamento de Vigotski, so produes histricas e culturais que permitem a comunicao, a socializao das experincias. Se referem tanto aos contedos institudos, compartilhados e apropriados pelos sujeitos, como configurados pela sua subjetividade. (Conceito estudado em aula de Srgio Ozella no NCA/PUCSP em 2008).

  • 42

    ressignificar dentro de si aqueles sentimentos e emoes que foram abandonados

    num espao de tempo atrs.

  • 43

    4. Construindo a histria

    Adolescente participando da Oficina de Grafitti

  • 44

    4.1 As medidas socioeducativas e o Salesianos So C arlos

    Quem vivenciou a rebelio da FEBEM em outubro de 1999, no

    esquecer to facilmente aquela experincia27.

    As medidas socioeducativas de liberdade assistida e de prestao de

    servios comunidade no municpio de So Carlos foram iniciadas na dcada de

    1990, por um grupo formado por educadores da sociedade civil e entidades

    preocupadas com a questo, dentre as quais se inclua o Salesianos.

    Posteriormente estas aes passaram a ser realizadas pelos tcnicos da FEBEM,

    em condies bastante limitadas.

    A partir de 1999 esse tipo de atendimento foi municipalizado e assumido

    pelo Salesianos So Carlos. Para tanto, foi firmando um convnio com o Estado, o

    que lhes possibilitou a contratao direta de orientadores que passaram a operar as

    medidas socioeducativas, bem como a organizar a proposta pedaggica que iria

    nortear a ao. No incio eram atendidos 35 adolescentes. Com a organizao de

    uma infraestrutura bsica de salas e telefones para atendimentos, alm de

    computador, TV, Vdeo e uma pequena cozinha, foi possvel ampliar a mdia de

    atendimento de 35 para 85 adolescentes. Tudo isto com qualidade na interveno e

    alcance de resultados (Lima e Galhardo, 2007).

    O ano de 1999 tambm foi marcado pelas sucessivas rebelies nas

    unidades de internao da FEBEM28. Dentre as inmeras crises da instituio,

    juntamente com um quadro de prticas autoritrias e de denncias de maus-tratos

    aos adolescentes internados, o que mais chamava a ateno era a constante

    27 Padre Agnaldo relatando sobre o momento em que se deparou com a rebelio no Complexo Imigrantes FEBEM em outubro de 1999. 28 Segundo o Jornal Folha de So Paulo, no ano de 1999, ocorreram mais de 20 motins, nos quais houve a fuga de 2.252 internos. Quatro unidades foram foco de problemas: Imigrantes, Tatuap, Raposo Tavares e Franco da Rocha.Vrias medidas foram tomadas pelo governo para estancar o processo de fugas e revoltas, mas boa parte destas mostraram-se infrutferas, entre elas, a troca de diretor, o afastamento de chefes de unidades, a demisso de funcionrios e a colocao da PM para ocupar as unidades e impedir novas fugas. Mas os internos continuaram fugindo e se rebelando. Outra deciso do governo foi a transferncia de 80 internos considerados de alta periculosidade para o Centro de Orientao Criminolgica, no Carandiru. Uma semana mais tarde, a medida foi considerada ilegal e os internos foram levados de volta Febem. Com a unidade Tatuap destruda, centenas de internos foram levados para a Febem Imigrantes. Com a superlotao a unidade criou condies para mais revoltas e fugas. www.folha.uol.com.br.

  • 45

    transferncia de responsabilidades entre as vrias instncias envolvidas na crise,

    seja no plano poltico, seja no educacional, no judicirio ou no administrativo. O que

    se percebia era que as instncias no assumiam o problema como constitutivo de

    suas responsabilidades e o que acabava transparecendo era uma verdadeira

    ciranda em que cada parte ficava culpando a outra. O fato que a crise, que

    estava instalada h muito tempo, explodiu mais de uma vez, chegando a nveis

    intolerveis, com conseqncias desastrosas para os internos, para os familiares e,

    tambm, para os funcionrios.

    A implementao do NAI e da medida socioeducativa de semi-liberdade,

    em maro de 2000, no municpio de So Carlos, deu-se em meio e em razo da

    crise do Complexo Imigrantes em So Paulo, conforme Padre Agnaldo apresenta:

    Para apresentarmos uma proposta de semi-liberdade para So Carlos foi marcada uma reunio com o Presidente da FEBEM para o perodo da tarde. Fiz um convite para o Juiz da Infncia para que, no perodo da manh, fosse comigo at a UAP29 porque eu gostaria de faz-lo conhecer a FEBEM da Imigrantes. Antes mesmo de chegarmos entrada do complexo pudemos perceber a situao que os jornais j noticiavam, mas que no tivemos tempo de tomar conhecimento. Felizmente! T-lo sabido antes nos teria desestimulado de realizarmos tal empreitada, o que quase j ia ocorrendo diante do campo de batalha e clima de guerra que se apresentou aos nossos olhos. Recuar teria sido talvez a atitude mais sensata, no fosse a conscincia nos advertir que dentro daquele inferno estavam alguns dos adolescentes da nossa cidade. Ao menos aqueles eram responsabilidade nossa. De fato, ali permanecemos at que, j ao anoitecer, conseguimos retirar todos os nossos30.

    A partir da iniciativa do Padre Agnaldo Soares Lima, da entidade religiosa

    Salesianos, e do Juiz da Infncia e Juventude de So Carlos poca, o Dr. Joo

    Baptista Galhardo Jr, o projeto de municipalizao da semi-liberdade e da criao de

    um Ncleo de Atendimento Integrado nos moldes do artigo 88, inciso V do ECA -

    agregaram valores s medidas de liberdade assistida e prestao de servios

    comunidade j existentes no municpio.

    29 Unidade de Atendimento Provisrio, que era unidade de recepo na FEBEM Imigrantes. 30 Texto extrado da Cartilha: Implementando o Ncleo de Atendimento Integrado: Apontamentos e orientaes de um caminho percorrido, p. ano 2007.

  • 46

    importante lembrar que, durante o processo de desenvolvimento dos

    Programas o governo municipal esteve sempre presente, principalmente na figura do

    ex- prefeito Prof. Newton Lima31, apoiando as aes voltadas aos adolescentes do

    municpio. Esse apoio considerado como processo em continuidade, j

    demonstrado pelo interesse e responsabilidade da atual gesto na execuo das

    polticas pblicas de juventude. Compreende-se que a execuo das medidas

    socioeducativas, compe um panorama de ateno aos adolescentes e juventude,

    articulado s polticas pblicas de ateno primria e secundria.

    4.2 O NAI Ncleo de Atendimento Integrado

    H momentos na vida em que dizemos que estamos no lugar errado, na hora errada. Pode ser tambm que, em determinadas ocasies, tenhamos que dizer que estamos no lugar errado, na hora certa32.

    O NAI a porta de entrada de um processo de atendimento, como ser

    visto adiante. fundamental, para que possa atingir seus objetivos, que tenha

    tambm as necessrias portas de sada. A maioria dos adolescentes que passam

    pelo NAI dever ser inserida em medidas socioeducativas. Para tanto, necessrio

    que estas estejam funcionando no municpio e atuem de modo eficaz.

    A partir da instalao do NAI verificou-se uma agilidade nos

    procedimentos de acompanhamento dos adolescentes e de suas famlias. Esses

    procedimentos tiveram como resultado a reduo do ndice de reincidncia33 e da

    31 Prof. Newton Lima Neto foi prefeito de So Carlos /SP por dois mandatos consecutivos (2001-2004) e (20052008). Lima Neto tambm foi reitor da Universidade Federal de So Carlos (1992/1996). 32 Padre Agnaldo Soares Lima e Dr. Joo Baptista Galhardo Jnior, referindo-se ao momento em que se depararam com a rebelio na Febem em outubro de 1999. 33 Desde a inaugurao do NAI em 2001 e a implementao das medidas de liberdade assistida, prestao de servios comunidade e semi-liberdade em nvel municipal, os ndices de reincidncia baixaram vertiginosamente, sendo atualmente de apenas 4% a mdia de reincidncia do Estado de So Paulo gira em torno dos 30% - www.promenino.org.br

  • 47

    gravidade das infraes cometidas, resultando tambm na diminuio do ndice de

    vulnerabilidade violncia juvenil34.

    Segundo o Padre Agnaldo Lima, a ideia central de todo o trabalho do NAI

    a de que a vida de um adolescente algo muito mais amplo do que um ato

    infracional olhado isoladamente, fora do contexto maior da sua existncia. Em outras

    palavras, o furto, o roubo, ou qualquer outro delito cometido pelo adolescente tem

    um "antes", um "durante" e um "depois". No se trata simplesmente de julgar a

    transgresso cometida, mas, principalmente, de conhecer o adolescente e o

    significado do delito na sua histria de vida.

    Partindo desse pressuposto, a proposta inicial procurar conhecer o

    adolescente, to logo chegue ao NAI35, encaminhado pela polcia. Nesse momento,

    uma assistente social o entrevista assim como aos seus responsveis. Com as

    informaes obtidas e as observaes realizadas, elabora um relatrio bio-psico-

    social, que encaminhado juntamente com o Boletim de Ocorrncia, ao Ministrio

    Pblico e ao Juiz da Infncia e Juventude, tornando-se parte integrante do processo.

    Este relatrio traz elementos que subsidiam a avaliao do judicirio sobre qual a

    medida mais adequada para ser aplicada ao adolescente.

    O NAI no somente contribuiu para a agilizao dos processos. Os casos so resolvidos em, no mximo, 15 dias. Outra vantagem que o adolescente no visto somente pelo lado do ato infracional cometido, mas existe uma preocupao em saber quem esse adolescente, de onde ele vem. Todo esse contexto avaliado previamente por uma profissional do servio social que far uma avaliao psicossocial antes do Juiz avaliar o caso36.

    34 Segundo a pesquisa realizada pelo Ministrio da Justia em parceria com o Frum Brasileiro de Segurana Pblica, So Carlos o municpio com o menor ndice de Vulnerabilidade Juvenil Violncia do pas. O ndice foi medido para subsidiar o Projeto Juventude e Preveno da Violncia, desenvolvido pelo governo federal, com dados de diversos rgos federais, como o IBGE, e estaduais, como a Fundao Seade. (Ministrio da Justia)

    35 www.linkway.com.br/nai 36 Relato do Juiz da Vara da Infncia e Juventude de So Carlos Dr. Joo Baptista Galhardo jnior.www.linkway.com.br/nai/

  • 48

    Se o adolescente for inserido em liberdade assistida, prestao de

    servios comunidade ou semi-liberdade, o seu acompanhamento ser feito pelos

    orientadores responsveis por aquelas medidas.

    4.2.1 Organograma de funcionamento do NAI

    Padre Agnaldo ao destacar que a processualidade estabelecida pelo NAI,

    deu maior agilidade37 ao do Estado em casos de infrao de adolescentes,

    comenta que, em outros espaos, esta ao chega a demorar de seis meses a dois

    anos, dentro do NAI, nos casos mais simples, acontece no perodo mximo de uma

    semana e, em casos mais graves, bem antes dos 45 dias propostos pelo ECA. Ele

    ainda explica como est organizada a rotina de trabalho do NAI. O organograma,

    exposto abaixo permite que se compreenda melhor a tramitao do adolescente,

    desde a sua apreenso at o momento de receber uma das medidas

    socioeducativas contidas no art. 112 do ECA.

    37 O sistema desenvolvido pelo NAI de So Carlos ganhou as pginas de vrias publicaes importantes do pas. A revista poca Negcios mostrou o Plano Municipal de Segurana Pblica de So Carlos do qual o NAI faz parte. A Revista Frum mostrou que existem alternativas e abordou o modelo que So Carlos vem adotando no cuidado com adolescentes em conflito com a lei, que alm de mais barato, contribui para a reduo no nmero de infraes. A Revista Radis, da Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz), trouxe como matria de capa o xito do NAI, sob o ttulo Projeto em So Carlos trata jovem infrator como cidado e tem alto ndice de recuperao. A Rede Globo apresentou no Jornal Nacional, e a Rede TV mostrou no Rede TV News duas matrias que trazem a experincia inovadora e exitosa de So Carlos.

  • 49

    a) o adolescente pego em flagrante mas que no fica custodiado por no

    ser ato infracional grave:

    Encaminha o auto de apreensop/ Cartrio da Inf. e Juventude

    Nos horrios de PlantoAgentes do NAI acionam o Tcnico pelo Bip

    Encaminhar p/ a UAI*- Ofcio de Encaminhamento / - Cpia do auto

    de apreenso.

    Entregue o adolescente e aps arevista os policiais sero liberados

    Pede-se que entrem com a viatura no NAI.Em caso de necessidade aciona-se IML

    Encaminha o RBPS + cpia do BOp/ o Cartrio da Inf. e Juv(em no mximo 24 horas)

    PRESTAAO DE SERVIO COMUNIDADEAdolescente liberado no Forum

    LIBERDADE ASSISTIDAAdolescente liberado no Forum

    SEMILIBERDADESer encaminhado pelos agentes da UAI

    INTERNAO NA FEBEMEncaminhamento pela Vara da Inf.

    e Polcia Militar

    JUIZProcesso normal pelo Forum

    Aplicao da Medida Scio-Educativa

    PROMOTOROuve o adolescente / Requer peas

    Oferece representaoPode solicitar Internao Provisria

    CARTRIOAutua

    abre vista ao Promotor

    TCNICO DO NAIAtendimento inicial - elabora o RBPSLibera o responsvel pelo adolescente

    AGENTES DA UAIAcionam tcnico do NAI

    Fazem identificao e preenchem relatrios

    POLCIAEncaminha o Adolesc. p/ a UAI

    (Unidade de Atend. Inicial no NAI)

    DELEGADOLavra auto de apreensoem flagrante (art. 173)

    POLCIA(Militar ou Civil)

    Apres. Adol.+resp.p/o Delegado (art.172 ECA)

  • 50

    b) o adolescente pego em flagrante, que fica custodiado por se tratar de

    ato infracional grave:

    Encaminha o B. Op/ Cartrio da Inf. e Juventude

    Nos horrios de PlantoAgentes do NAI

    acionam o Tcnico pelo Bip

    Encaminhar p/ o Nai*- Ofcio de Encaminhamento / - Cpia do BOPolcia liberada c/comprov. de recebim.

    Adolescente liberado p/ famla- assinam termo de compromiss

    recebem agendamento c/ o MP (art.174)

    Encaminha o RBPS + cpia do BOp/ o Cartrio da Inf. e Juv(em no mximo 24 horas)

    Em caso de representaoProcesso segue na Vara da Inf.

    Rito normal

    CARTRIO DA INF. E JUVENTUDEretorna o processo p/execuo de medida

    NAIauxilia na execuo da medida

    JUIZaplica med.scio-educ.

    encaminha p.Entid. de Atend.

    PROMOTOROuve o adolescente

    Aplica a medida abertaEncaminha p/ o Juiz

    CARTRIOAutua

    abre vista ao Promotor

    TCNICO DO NAIAtendimento inicialelabora o RBPS**

    POLCIAapresenta Adol. + Fam.

    p/ Tcnico do NAI

    DELEGADOLavra B.O.

    circunstanciado

    POLCIA(Militar ou Civil)

    Apres. Adol.+resp.p/o Delegado (art.172 ECA)

  • 51

    4.3 A Semi-liberdade

    Enquanto eu tiver perguntas e no houver respostas... continuarei a escrever.

    Clarice Lispector

    A semi-liberdade, art. 120 do ECA o regime que antecede privao da

    liberdade em termos de cerceamento do direito de ir e vir do educando. Ele pode ser

    aplicado como uma medida inicial - como forma de evitar o confinamento total do

    educando em uma instituio - ou como progresso de regime - para aqueles que j se

    encontravam privados de liberdade.

    A medida de semi-liberdade possibilita (e acompanha) ao adolescente

    sua participao na vida comunitria e em programas que respeitem as diferenas

    individuais, preservando os vnculos familiares e comunitrios. Como prev o ECA,

    no cumprimento dessa medida, so obrigatrias a escolarizao e a

    profissionalizao. A partir de uma agenda personalizada, previamente organizada,

    o adolescente poder realizar cursos, atividades culturais, esportivas e de lazer,

    utilizando os recursos da sua comunidade durante o dia, devendo pernoitar na

    unidade de origem.

    A ideia e o empenho da sociedade de So Carlos em evitar, ao mximo, o

    envio de adolescentes para a Fundao Casa (ex-FEBEM) desencadeou a

    necessidade de implementar formas mais efetivas de atendimento aos adolescentes

    autores de ato infracional. A assim chamada Comisso de L. A. comeou, ento, a

    debater o Projeto da Semi-liberdade.

    O sonho de ter um projeto do gnero, funcionando em um local

    adequado, acalentado desde 1993, quando, alguns dos que agora faziam parte da

    comisso, j, ento, participando de um grupo de reflexo, tinham esboado a

    proposta.

    Com relao medida de semi-liberdade pode-se dizer que So Carlos

    tambm teve atuao pioneira. Nessa ocasio, tal medida, mesmo contemplada no

  • 52

    ECA, funcionava em rarssimas unidades no Estado de So Paulo. At a

    implantao38 do Projeto de So Carlos, apenas cinco ou seis programas eram

    executados na Capital e interior. Foi o primeiro convnio39 firmado com uma

    entidade particular no ligada ao Governo do Estado ou Prefeitura Municipal local.

    O local encontrado para seu funcionamento foi uma chcara, cedida por

    um empresrio da cidade. A partir disso, o Salesianos assumiu a administrao de

    um programa novo e desafiante.

    4.3.1 A Casa de Convivncia Lucas Perroni Jnior 40

    Uma chcara com muitas rvores e uma casa, foi o local escolhido para a

    realizao do projeto de semi-liberdade. Localizada num espao amplo, com o nome

    de Casa de Convivncia Lucas Perroni Jnior, a chcara, como era conhecida,

    ganhou reconhecimento pela sua proposta de atuao com adolescentes em conflito

    com a lei.

    Conforme constam nos documentos referentes semi-liberdade os

    princpios norteadores da ao pedaggica so:

    38 So Carlos inovou nesta proposta. Buscou-se implantar no Municpio a primeira semi-liberdade conveniada pela FEBEM com uma Entidade particular. As unidades que a operacionalizavam eram sempre administradas pela FEBEM. 39 Mais uma vez a entidade Salesianos ficou encarregada de administrar todo o projeto de implementao e execuo da medida, que tinha a capacidade de atendimento de 20 adolescentes. O local de funcionamento uma chcara cedida gratuitamente por um empresrio so-carlense, reafirmando-se a importncia da parceria com a sociedade civil, denominada "Casa de Convivncia Lucas Perroni Jr.". A entidade recebia um valor mensal da FEBEM por adolescente atendido para o pagamento das despesas e tambm inovou ao instituir um sistema aberto, sem a conteno dos jovens l inseridos. Neste espao era desenvolvido o trabalho pedaggico formativo, como atendimentos individuais, em grupo, dinmicas e outras atividades como cultivo de horta, viveiro de mudas, artesanato. O restante das atividades eram realizadas fora deste espao. Texto extrado do site: www.promenino.org.br 40 A Casa de Convivncia funcionava em uma chcara localizada no Bairro Recreio So Judas Tadeu, localizada prxima ao centro da cidade. A propriedade com uma rea de 5000 m,possui uma construo de aproximados 170 m, como sala, copa, cozinha, 03 escritrios, 02 banheiros, rea externa coberta que servia para o trabalho da Equipe Tcnica e, tendo em anexo, uma segunda casa de aproximados 180 m, com mais trs quartos, sala de TV, sala de atividades e mini biblioteca, cozinha e conjunto de banheiros e chuveiros, que serve para os adolescentes em medida. H ainda uma rea construda com 64 m, destinada para atividades culturais, artsticas e fsicas, tais como jud e capoeira. A rea externa da casa possui uma parte de pomar bastante variada e uma rea livre para plantio. Alm do cuidado com o pomar os adolescentes se ocupavam tambm da rea de plantio, e de um viveiro para o cultivo de mudas de plantas nativas. O projeto de instalao dos viveiros funcionou em parceria com pelo menos duas grandes empresas da regio, que tinham interesse em adquirir as referidas mudas. (fonte: www.linkway.com.br/nai)

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    Tem o objetivo de como medida inicial ou como

    forma de transio para o meio aberto, conscientizar o

    adolescente dos limites impostos sua liberdade,

    oferecendo-lhe subsdios para a compreenso da medida

    determinada.

    Estabelecer com o adolescente um relacionamento

    fundamentado na confiana e auto-responsabilidade.

    Buscar na famlia elementos que sirvam de apoio

    organizao e orientao do trabalho.

    Manter, sempre que possvel, o ambiente familiar

    como referencia primeira da vida do adolescente, fazendo

    do espao da semi-liberdade seu referencial para o

    cumprimento da medida socioeducativa no que se refere

    restrio de liberdade (pernoite, permanncia em finais

    de semana) e local de orientao, encaminhamentos,

    desenvolvimento de atividades educativas, etc. No que

    tange a este ltimo aspecto, poder haver tambm um

    servio integrado com as medidas socioeducativas de

    L.A. e P.S.C.

    Destacam-se algumas atividades que fazem parte do projeto

    pedaggico da semi-liberdade:

    - acolhida; estudos de caso; elaborao e acompanhamento de Plano Personalizado de atendimento; reunies sistemticas; dirio do adolescente (agenda onde o adolescente registra situaes e impresses do cotidiano); atividades educativas; auto cuidado e promoo de sade; reforo escolar; preparao para o mundo do trabalho; reunies institucionais; trabalho com a famlia; preparao para o desliga