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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

¹Licenciada em Letras (Português) pela UNICENTRO; Especialista em Ensino de Língua Portuguesa: Teoria e Prática pela mesma instituição; e em Gestão Escolar: Supervisão e Orientação pela UNIVALE; Docente de Língua Portuguesa da Educação Básica nos níveis de Ensino Fundamental II e Ensino Médio; Professora PDE – 2013. E-mail: [email protected] ²Doutora em Linguística pela UNICAMP; Licenciada em Letras (Português e Francês) pela Universidade Federal de Santa Catarina, Mestre em Letras/Linguística pela mesma instituição. Professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa. E-mail: [email protected] Neste artigo, as autoras atuaram, respectivamente como orientanda e orientadora.

UMA CONTRIBUIÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA

ORALIDADE E REFLEXÃO SOBRE O USO DAS VARIEDADES

LINGUÍSTICAS

Eliceia Zatcerconey¹

Letícia Fraga²

Resumo: Entendendo que a oralidade também precisa ser discutida na escola, o presente trabalho descreve resultados de uma pesquisa realizada, com a pretensão de defender a implementação da pedagogia do oral, baseada em algumas teorias que discutem o ensino de língua, considerando as diferenças que se estabelecem entre escrita e oralidade, a questão da variação linguística, a noção de norma culta e não-culta. Considerando que conhecimento sobre a língua pode levar a uma emancipação dos sujeitos e que o desconhecimento sobre ela mantém o assujeitamento destes, o presente estudo interviu, colaborativamente, no ensino e na formação íntegra do educando através dos eixos sustentadores do ensino de língua portuguesa - leitura, escrita e oralidade. Buscaram-se estratégias que: a) conduzissem a formação crítica dos alunos, incentivando a reflexão sobre o uso de variedades cultas e não-cultas da língua, e; b) resultassem em formação crítica desses mesmos alunos, conscientizando-os sobre a importância do exercício da cidadania, o que contribuirá não somente para uma reflexão sobre o uso da língua, mas principalmente para repensar a forma de ensino de língua portuguesa. Os dados foram obtidos através da elaboração de programas de rádio envolvendo diferentes atividades com enfoque ao tema oralidade, desenvolvidas por uma turma de 2º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Santo Antonio de Imbituva/PR. Com base nas informações construídas coletivamente é possível inferir que programas de rádio podem vir a ser, sob o enfoque da oralidade planejada e sistematizada, uma alternativa para o ensino de Língua e as Variedades Linguísticas. Palavras-chave: Oralidade. Ensino de Língua. Variação Linguística. Norma culta e não-culta.

Introdução

Para defender uma pedagogia do oral, baseada em algumas teorias que

discutem o ensino de língua, a partir das diferenças entre escrita e oralidade, da

variação linguística, da noção de norma culta e não-culta, optou-se por um trabalho

de reflexão sobre o uso de variedades orais cultas e não-cultas de Língua

Portuguesa, a partir da produção de um programa de rádio, inicialmente pensado

para alunos de 6º ano do Ensino Fundamental II, porém devido a vários fatores, foi

desenvolvido por alunos de uma turma de 2ª série do Ensino Médio do Colégio

Estadual Santo Antonio, de Imbituva/PR.

Por meio do presente estudo pretendeu-se instaurar uma discussão, mesmo

que polissêmica, com o intuito de contribuir para que pais (através dos filhos e

colaboração nas atividades), educadores (a partir da socialização dos trabalhos) e

os alunos em especial ampliem seus conhecimentos em relação à língua, seu uso e

suas modalidades, em especial a oral.

A necessidade e justificativa de desenvolver o presente trabalho deu-se a

partir da experiência em escola pública, pois lecionando nos anos finais do Ensino

Fundamental foi possível perceber, durante essa trajetória na área da educação,

que a oralidade nem sempre foi valorizada no ambiente escolar, assim como não o

foi a fala que o aluno traz de fora do contexto escolar, da rua, da igreja, da casa...

Como a sociedade é educada a valorizar a escrita em detrimento da fala,

muitos apresentam uma visão preconceituosa em relação à fala, classificando-a

como pouco organizada, descontínua, truncada, não planejada etc. Por essa razão,

destacou-se a importância de estudá-la, para que se perceba que essas crenças

não procedem. Daí a necessidade de um planejamento e implementação do projeto

de intervenção priorizando o trabalho com a oralidade, variação e norma linguísticas

a fim de discutir o preconceito linguístico. Optou-se pela elaboração de uma Unidade

Didática, pois a produção enfoca como tema nuclear a oralidade, com

aprofundamento teórico e metodológico, englobando mais de um conteúdo

relacionado à disciplina de Língua Portuguesa, como a discussão, com base em

algumas teorias, sobre o ensino de língua; Diferença entre escrita e oralidade;

Variação linguística; Norma culta e não-culta.

Revisão de Literatura

O objetivo aqui não é teorizar sobre a prática da oralidade, mas incentivá-la,

após leituras, e todas as suas implicações já mencionadas para a reflexão sobre o

uso das variedades, capazes de expandir o olhar, pois o conhecimento avança ou

estagna conforme estabelecemos as relações com o social, analisando o contexto,

pois a aprendizagem e a formação se estabelecem e acontecem na relação e ação

entre as ideias que interagem e dialogam entre si.

Assim, espera-se, através do exercício da oralidade, aferir motivo e

desembaçar a visão de nossos alunos para que percebam necessidade de

mudanças, e não sejam alvos facilmente manipuláveis.

É preciso compreender, investigar e questionar constantemente os temas ou

questões que surgem no contexto, e que se transformam em desafios para a prática

docente.

A oralidade apresenta-se pautada em situações reais de uso da fala e na

produção de discursos, assim possibilita diversos trabalhos em sala de aula em que

o aluno se constitui com sujeito do processo interativo.

Não basta, portanto, que atividades de linguagem oral sejam consideradas apenas como oportunidades de interação oral com o professor e os colegas, elas precisam ser planejadas para o desenvolvimento de habilidades de produção e recepção de textos orais frequentes em situações formais. (SOARES, 1999, p.22)

Entende-se que a oralidade está interligada com a leitura e a escrita, porque é

difícil escrever quando não há prática de leitura eficaz, e não há muito argumento

expresso através da oralidade quando não há informações, que são obtidas através

da leitura, assim “… é preciso empenho para trabalhar com a leitura, a reflexão, a

descoberta, o dizer, a recriação” (SOUZA, 2004, p.76).

É importante repensar a prática e buscar alternativas na expectativa de que

realmente aconteça a aprendizagem e os alunos sintam-se motivados a ler, produzir

e expressar-se.

É preciso ter em mente que herdamos muitas ideias tradicionais e do senso

comum sobre o ensino da língua, tendo a norma padrão como único referencial.

Portanto, para reverter tal quadro e contribuir para os temas práticos que envolvem o

estudo da língua é imprescindível adotar, enquanto professores de língua, uma

postura crítica diante da prática, efetuar um exame de consciência e questionar a

língua como um fenômeno social com todas as implicações éticas, políticas e

ideológicas.

De acordo com Bagno (2004), um dos maiores erros que se podem apontar

explicita-se pelo fato de os gramáticos tradicionalistas estudarem a língua como uma

coisa morta, sem levar em consideração as pessoas vivas que falam a língua.

Não é comum, por exemplo, existir, na escola, a comparação entre normas e variedades do português, algo importantíssimo na relação ensino/aprendizagem de análise linguística... Propõe-se que o ensino da norma padrão deva estar presente na escola, mas não de maneira a silenciar outros usos linguísticos presentes num país tão multifacetado como o Brasil, haja vista que a relação ensino/aprendizagem só tende a ser facilitada com esse trabalho comparativo na sala de aula, realizando-se,

assim, um trabalho de reflexão linguística e não apenas de memorização de regras, nomenclaturas e prescrições linguísticas. (ARAÚJO, 2003, p. 09)

O preconceito linguístico, culturalmente presente e alimentado, não somente

por veículos de comunicação, mas principalmente por instrumentos tradicionais de

ensino da língua, como a gramática normativa e os livros didáticos, deve-se à

confusão que se faz entre língua e gramática normativa, a qual não é “a” língua

como muitos pensam, mas é só uma descrição parcial da língua, a norma padrão.

E tal descrição, apenas parcial, não deve, nem pode ser aplicada a todo o

resto da língua. Porém, na realidade não é isso o que acontece: a norma padrão

vem sendo imposta de forma autoritária e até repressiva nas avaliações escolares, o

que acaba regendo uma ideologia geradora e mantenedora do preconceito

linguístico, sendo a escola o órgão reprodutor, veiculador e ainda repressor de tal

ideologia, que impede a manifestação das variedades linguísticas. “É justamente

frente aos fenômenos da variação (por estes envolverem complexas questões

identitárias e de valores socioculturais) que os falantes parecem se mostrar mais

sensíveis, externando, muitas vezes, atitudes e juízos de alta virulência.” (FARACO

apud CORREA, 2007, p. 23).

É importante e essencial, em nossa prática pedagógica, refletir sobre o ensino

da língua e reconhecer a diversidade linguística do Brasil, para que o aluno não se

depare na escola com um português “estrangeiro” (norma padrão), totalmente

avesso à variedade não padrão falada em seu ambiente social, mas que,

ironicamente, atende as necessidades da comunidade que a emprega.

No Brasil, se fala a língua viva com todas as qualidades e peculiaridades

específicas da cultura dos povos, que vivem nas mais diversas regiões brasileiras, e

constituem um tesouro precioso da nossa cultura.

Vale ressaltar que a ortografia deve ser única para toda a língua, mas a fala

(oralidade), leitura e compreensão, não, pois nenhuma língua é falada do mesmo

jeito em todos os lugares e as manifestações orais variam conforme a experiência

de vida, escolaridade e conhecimento dos falantes.

Para Bagno (2001), a injustiça social é geradora de um abismo linguístico

entre a norma padrão e não padrão, de modo que o autor reafirma que tratar da

língua é tratar de um tema político, já que também é tratar de seres humanos.

Assim, para refletir sobre o preconceito, é preciso, primeiramente, reconhecer

a crise no ensino para, enquanto professores, assumirmos uma postura reflexiva

perante o ensino de língua, pautada em atividades de pesquisa e ações

investigativas.

Em vez de REPETIR o professor deveria REFLETIR e estar sempre a par dos avanços das ciências da linguagem e da educação: lendo literatura científica atualizada, assinando revistas especializadas, filiando-se a associações profissionais, frequentando cursos em universidades, aderindo a projetos de pesquisa, participando de congressos, debates, mesas-redondas levando suas dúvidas e inquietações. (BAGNO, 2001, p.134)

Por fim, os brasileiros, como falantes da língua portuguesa, não deveriam

permitir que, por meio da mídia e de algumas pessoas de maior poder aquisitivo, o

ser humano fosse tão desvalorizado em sua principal condição: a de ser HUMANO

Social e Político. Reafirmando Bagno, nós somos a língua que falamos.

[...] uma abordagem antropológica da questão da norma é a constatação de que a língua é um fato social. Sabe-se que a língua serve para comunicar. Ora, a comunicação implica, por definição, a existência de vários falantes. Quanto à definição do ato de comunicação, digamos que ele se apresenta como uma interação entre um emissor e um receptor, sendo o conteúdo desta interação suscetível de tomar as formas mais variadas. (BAGNO, 2001, p.147)

É importante discorrer sobre variação linguística, reflexão sobre as variedades

da língua contrapostas com a língua padrão. Nessa linha, são abordados conceitos

e definições sobre a variação linguística, o preconceito linguístico e o ensino de

língua.

O presente trabalho é fruto do questionamento sobre o ensino de língua

portuguesa tradicional voltado somente ao ensino da gramática e à norma padrão,

sem considerar as demais variedades. Segundo Mollica (2004), as alternâncias de

uso da língua são influenciadas por fatores estruturais e sociais.

As variedades, além de importantes, são ricas e muito preciosas, para

estarem em segundo plano e à mercê do preconceito, porém o padrão sempre será

exigido e recai sobre a escola a função de ensinar o padrão, pois não podemos ser

ingênuos e fugir desse conceito, já que nossa sociedade é dividida em classes e

quem tem monopólio e domínio da norma culta é respeitado. Assim, a língua é

importante para a conquista de status, destacando-se como fator determinante de

ascensão social.

Portanto, temos que ensinar a norma-culta, mas é fundamental termos

consciência de que,

Uma das tarefas do ensino de língua na escola seria, então, discutir os valores sociais atribuídos a cada variante linguística, enfatizando a carga de discriminação que pesa sobre determinados usos da língua, de modo a conscientizar o aluno de que sua produção linguística, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação social, positiva ou negativa. (BAGNO, 2002, p. 73)

É evidentemente inegável a presença da variação linguística, não somente na

vida em sociedade, mas na particularidade de cada indivíduo. A sua importância

torna-se um estímulo necessário a uma revisão da concepção metodológica de

ensino. “A língua é como um rio, e como se sabe, conforme o pensamento de

Heráclito de Éfeso “o homem não pode banhar-se duas vezes no mesmo rio”, pois o

rio está em constante atividade, ele não para, mas a água movimenta-se o tempo

todo, sendo assim, pode-se caminhar para a ideia de que a língua está em

constante mudança. (BAGNO, 2001, p. 9)

É por essa razão que não se pode continuar, após inúmeras modificações

sociais, a usar os mesmos critérios de ensino, segundo os quais a norma padrão e a

gramática ditam o que é “certo” e “errado”. Bagno (2004) cita o círculo vicioso:

gramática tradicional, métodos tradicionais de ensino e os livros didáticos,

denominando-os de “Santíssima Trindade” do preconceito linguístico.

O que se externaliza comumente é que a sociedade atual abomina o

preconceito, assim causa espanto que uma das formas desse mal tão praticada e

divulgada na atualidade seja a forma linguística.

Equivocadamente, a gramática normativa é eleita e assim considerada como

se fosse a própria língua portuguesa em si e, na maioria das vezes, imposta nas

escolas como “padrão”, única forma aceitável da língua, abrindo caminhos para o

preconceito linguístico.

Considerando que a sociedade é composta por vários falantes, dividida em

vários grupos sociais diferentes entre si, cada falante pertence a uma realidade

distinta que, ao fazer uso diferenciados da língua, concretiza as variedades que

representam cada realidade.

Não há em língua um padrão absoluto de correção (válido para todas as circunstâncias), mas apenas padrões relativos às diferentes circunstâncias (…) as descrições dos linguistas mostram que os falantes variam sistemática (e não aleatoriamente) sua expressão e tomam como baliza não um padrão absoluto de correção, mas critérios de adequação às circunstâncias. (FARACO, apud CORREA, 2007, p. 25)

Deve-se considerar o conhecimento linguístico que o aluno traz para a escola

sem tentar impor a norma padrão como única, verdadeira, absoluta, mas explorando

as variedades e refletindo sobre a língua e seu uso, ou seja, deve-se considerar sua

adequabilidade e aceitabilidade conforme o contexto, promovendo-se assim a

formação do indivíduo global que saiba articular os conhecimentos linguísticos em

sua vida cotidiana conforme a especificidade da situação e de seus interlocutores.

Nas palavras de Humboldt (2008) a língua além de organismo vivo é uma

manifestação do espírito humano.

A língua possui um caráter social porque pertence a um conjunto de pessoas

que podem agir sobre ela. Assim, os membros da comunidade podem optar pelas

formas de expressão que usarão.

As diferenças em relação aos usos da língua devem-se a diversos fatores:

regionais (geográficos) que correspondem à região em que o falante vive durante

um certo tempo, o que explica as diferenças de sotaques; socioculturais,

contextuais, profissionais, de gênero e faixa etária.

A oralidade é um ato individual característico de cada indivíduo para a

manifestação da fala. Este pode “escolher”, na utilização oral da língua, os

elementos linguísticos que lhe convierem, ou conforme necessidade contextual, sua

personalidade, seu interlocutor, o ambiente sociocultural, entre outros, causando

uma diversificação nos mais variados níveis da fala instaurando, assim, o diálogo.

Ensinar língua oral deve significar para a escola possibilitar acesso a usos da linguagem mais formalizados e convencionais, que exijam controle mais consciente e voluntário da enunciação, tendo em vista a importância que o domínio da palavra pública tem no exercício da cidadania. Ensinar língua oral não significa trabalhar a capacidade de falar em geral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apoiam a aprendizagem escolar da língua portuguesa e de outras áreas (exposição, relatório de experiência, entrevista, debate, etc.) e, também, os gêneros da vida pública no sentido mais amplo do termo (debate, teatro, palestra, entrevista, etc.) (BRASIL, 1998: 67-68)

Dessa forma, o ensino da oralidade não deve ocorrer sem que haja

planejamento prévio, para ser entendido como uma forma de capacitar o aluno para

atuar em seu meio social como cidadão.

Metodologia

Assim sendo, o projeto ora proposto foi implementado no Colégio Estadual

Santo Antônio – Ensino Fundamental e Médio, numa 2ª série do Ensino Médio no

turno matutino, município de Imbituva, Paraná, localizado na área urbana. Este

recebe alunos tanto da área urbana, quanto rural. A sobrevivência da área rural se

dá basicamente por meio do plantio de feijão, milho, fumo. Já na área urbana, há

muitas madeireiras que geram empregos; a cidade também é conhecida como

cidade das malhas pelo número de malharias (aproximadamente trinta) e produção

local de roupas de tricô.

A população da cidade é composta por descendentes de italianos, em sua

grande maioria, mas também há descendentes de alemães, poloneses, ucranianos,

de modo que, hoje, o imbituvense é resultado de uma grande miscigenação e,

consequentemente, palco de uma grande variedade linguística.

A oralidade apresenta-se pautada em situações específicas de uso da fala e

na produção de discursos, por isso possibilita diversos trabalhos em sala de aula em

que o aluno se constitui como sujeito do processo interativo.

Não basta, portanto, que atividades de linguagem oral sejam consideradas apenas como oportunidades de interação oral com o professor e os colegas, elas precisam ser planejadas para o desenvolvimento de habilidades de produção e recepção de textos orais frequentes em situações formais. (SOARES, 1999, p.22)

Os alunos produziram, em grupos, programas de rádio. Os conteúdos foram

definidos durante a elaboração de oficinas para a produção de programas de rádio,

nas quais se definiu o formato dos programas, que incluiu entrevistas, momento do

ouvinte, recadinhos do coração, entretenimento, culinária, músicas, paródias,

esportes, notícias locais, regionais, globais, enfim a caracterização e análise da

realidade local através da exploração da oralidade usando o rádio como respaldo,

pois entende-se que o rádio é um potencializador de situações que promovem a

comunicação e a construção do conhecimento. E a exploração do rádio no processo

educativo oportuniza uma significativa atividade social.

Aqui, trata-se da mídia rádio como um importante recurso tecnológico

auxiliador no desenvolvimento do processo de aprendizagem da linguagem. É

através dela que os homens interagem nos espaços sociais e a escola constitui não

somente um espaço privilegiado, mas contribui determinantemente tanto para o

desenvolvimento da oralidade e a valorização das variedades linguísticas quanto

para a acentuação do preconceito linguístico, pois a língua não é meramente

diversa, ela também atua na compreensão da diversidade linguístico cultural, ou

seja, “a língua é o suporte de uma dinâmica social”. (PRETTI, 1974, p. 7)

Considerando que o rádio, embora relativamente antigo, comparado aos

meios de comunicação mais recentes, como a televisão, a internet, o celular etc.,

não tem sido devidamente explorado e difundido na rede de Educação Básica,

mesmo representando um instrumento rico em possibilidades pedagógicas e de

considerável abrangência, atingindo todas as camadas populacionais, o propósito

foi, através de uma abordagem didático-pedagógica, em questão a Unidade

Didática, oportunizar o aprendizado por meio da elaboração de um programa de

rádio como elemento integrado ao cotidiano escolar e a outras mídias, como no caso

em questão, o celular, o computador e também a internet, compreendendo não só o

papel que desempenham na educação, mas também como meio de expressão e de

reflexão sobre a função social.

O rádio é um dos meios de comunicação mais populares no Brasil e

consegue atingir públicos de diferentes classes sociais, níveis de escolaridades

variados e condições econômicas diversas, podendo chegar a lugares distantes, de

difícil acesso (JUNG, 2005).

Socialmente circulam diversos gêneros textuais, seja através de meios orais

ou escritos. E com isso, os indivíduos têm acesso a várias linguagens cotidianas.

Apesar da infinidade de informações oferecidas pela mídia, o rádio ainda é preferido

por muitos, especialmente durante o trabalho, pois é possível ouvir o rádio sem

perder a concentração. Além disso, é um objeto de fácil transporte e funcionamento,

seja em construções, trabalhos domésticos, viagens etc. “[...] alcança 96% do

território nacional, a maior cobertura entre todos os meios de comunicação com

público aproximado de noventa milhões de ouvintes” (JUNG, 2005).

Nas últimas décadas, o desenvolvimento das tecnologias de informação e

comunicação assumiu um ritmo acelerado, determinando novos rumos para a

sociedade, não somente em termos tecnológicos, mas também socioeconômico-

culturais.

Atualmente as tecnologias tornaram-se fundamentais e causaram mudanças

até no comportamento das pessoas. Fala-se inclusive em doenças digitais, pois há

adolescentes que quase não conversam mais entre si e com a família, pois o vício e

o uso exagerado da internet causou uma espécie de “solidão digital” que não é

aprovada e nem acompanhada pela maioria dos pais. Porém, em controvérsia,

temos uma grande parte da camada populacional que nem acesso às tecnologias

possui e seu maior meio de informação, distração, diversão e até paixão continua

sendo o rádio e suas programações, seja o jornal com informações e notícias locais,

a música preferida, o programa de todos os dias, enfim é a realidade de muitos de

nossos alunos e pais de alunos da escola pública.

A intenção é usar a linguagem radiofônica integrada a outras linguagens,

propiciando o protagonismo do educador e do estudante, em igualdade de

condições, fortalecida por uma prática democratizadora das relações e materializada

pelo exercício da prática comunicativa. Assim, o rádio continua sendo uma excelente

opção quando se quer pensar numa educação revigorada e mais próxima da

realidade dos nossos educandos.

Obviamente que, na era da informação, uma experiência educacional

diversificada que conduza a um processo de aprendizagem mais prática, e não

apenas teórica, que visa a um conteúdo em si, será uma importante aliada à

exploração de diferentes possibilidades através dos meios tecnológicos.

A oralidade e a leitura são importantes práticas discursivas e contribuem para

a socialização do conhecimento de forma democrática e produtiva. Além disso,

também contribuem para determinar o contexto de produção. Ensinar língua oral

deve significar para a escola possibilitar acesso a usos da linguagem mais

formalizados e convencionais, que exijam controle mais consciente e voluntário da

enunciação, tendo em vista a importância que o domínio da palavra pública tem no

exercício da cidadania.

Ensinar língua oral não significa trabalhar a capacidade de falar em geral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apoiam a aprendizagem escolar da língua portuguesa e de outras áreas (exposição, relatório de

experiência, entrevista, debate, etc.) e, também, os gêneros da vida pública no sentido mais amplo do termo (debate, teatro, palestra, entrevista, etc.) (BRASIL, 1998: p. 67-68).

Resultados e Discussão

Na elaboração do programa de rádio foi explorada a oralidade em situações

reais de usos da fala, ora formais (uso de variedades cultas), ora informais (uso de

variedades não-cultas), através de diferentes caminhos, como: entrevistas, “fala

político”, cantinho do ouvinte (procura-se, vende-se, aluga-se, compra-se etc.),

leitura de cartas, recadinhos do coração, músicas ao vivo, participação de ouvintes,

culinária. Este exercício envolveu primeiramente a escrita e a troca de produções

entre alunos de turmas diferentes, ou seja, carta de leitor que engloba produções e

respostas às produções, também recados, elogios, explicação, troca de opiniões,

debates, contação de histórias, declamação de poemas, propagandas, notícias

policiais, depoimentos sobre situações significativas vivenciadas pelo aluno ou por

pessoas de seu convívio; momento do apaixonado com relatos de experiências e

opiniões do crítico opinista ou conciliador.

A partir de então, foi possível observar a argumentação do aluno, como ele

defende seu ponto de vista. Além disso, foi possível orientar a adequação da

linguagem ao contexto, trabalhar com os turnos de fala, com a interação entre os

participantes etc., possibilitando acesso ao conhecimento através da descoberta e

consequente aprendizagem exercitando constantemente a comunicação. E,

também, possibilitou uma maior aproximação dos envolvidos com a leitura e

produção oral.

Na produção didático-pedagógica, apresentei atividades, as quais foram

aplicadas em sala de aula e contribuíram para a aceitação da existência e

necessidade destas variedades, e consequente uso das funções da língua e suas

variedades com adequação ao contexto dos falantes e de seus interlocutores.

Creio ter contribuído para a prática da oralidade e da comunicação através da

produção de programas de rádio, pois os alunos divulgaram as produções e

apreciaram as apresentações dos colegas dando sugestões e fazendo diversos

apontamentos.

E no que tange o uso da língua foi possível Incentivar a reflexão sobre as

formas de preconceito linguístico através do exercício sobre a necessidade de

pensar sobre o uso adequado de variedades cultas e não-cultas orais, além de

refletir sobre a realidade linguística local através de um levantamento das principais

gírias usadas no contexto escolar e na região, principais expressões, regionalismos,

etc., refletindo sobre as diferenças entre as variedades cultas e não – cultas,

observando a interferência da oralidade na produção escrita através do apontamento

das marcas da oralidade na escrita. O trabalho foi relevante para o incentivo e

desenvolvimento da oralidade, além do mais foi importante pela abrangência de

questões relacionadas à língua.

Considerações Finais

A experiência possibilitou a compreensão de que a oralidade é uma

habilidade fundamental para o desempenho linguístico dos falantes e fator

contribuinte no processo de inserção social, despertando nos alunos a percepção da

importância da expressão oral para suas vidas, já que é determinante em muitas

situações de comunicação. Possibilitou a análise do desempenho linguístico oral e

reflexão sobre o uso adequado do idioma.

É necessário maior qualificação aos profissionais responsáveis pela

organização do processo de ensino e conhecimento, especialmente na área de

Língua Portuguesa para clareza de que ensinar a língua na modalidade oral não

representa trabalhar a capacidade de falar em geral, mas significa contribuir para o

desenvolvimento do domínio dos gêneros que subsidiam a aprendizagem escolar de

Língua Portuguesa e também de outras áreas, contemplando também a variação

linguística do aluno, pois é fundamental conhecer o modo de falar do aluno, sem

preconceito mas como ponto de partida para abordar os diferentes usos da

linguagem através do conhecimento e análise das diferentes situações

comunicativas, oportunizando a prática de situações de interação.

Destaca-se a importância do trabalho, análise, discussão e reflexão sobre

oralidade no ensino de Língua Materna como um contribuinte para a obtenção de

melhores índices de desempenho por parte dos alunos falantes em geral.

O trabalho com ensino da oralidade permitiu entender a dimensão

comunicativa da linguagem oral e sua finalidade como instrumento de interação

social.

Referências Bibliográficas

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