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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

INTERPRETANDO O AMOR ATRAVÉS DO GÊNERO CANÇÃO

Mercedes, Teresa Cristina1.

Raupp, Eliane Santos2

RESUMO

Diante das dificuldades percebidas em sala de aula, com relação à interpretação e produção de texto o projeto Interpretando o amor através do gênero canção trabalhará com gêneros textuais no ensino da Língua Portuguesa, buscando possibilitar a análise integradamente de produção, compreensão, gramática e de outros aspectos também centrais para a aprendizagem. Levando os alunos a interpretarem e produzirem textos através da música, considerando sua situação real e não apenas como um mero exercício de escrita e leitura para avaliação. Promovendo valorização da atividade de interpretação de texto enquanto processo dinâmico, social, cognitivo e linguístico; compreendendo a leitura e a interpretação de texto de uma forma mais prazerosa, fazendo com que o aluno reflita situações de seu cotidiano através de suas produções. Palavras-chave: Interpretação. Música. Produção. Texto.

1 Introdução

Analisando os trabalhos desenvolvidos em sala de aula sobre interpretação

de texto, o professor, muitas vezes, se vê frustrado diante dos resultados e

questiona-se sobre o quê fazer para que seus alunos consigam interpretar de modo

competente os textos que lhes são apresentados.

Pois, os alunos possuem muitas dificuldades tanto na interpretação quanto

na produção de textos, devido à falta de hábito e inabilidade na leitura, pois, a

maioria deles não tem acesso à leitura e à escrita senão por meio da escola.

Sendo assim, cabe aos educadores a função de ensinar tais habilidades,

porém, não de forma tradicional, como geralmente se tem feito, desvinculada das

interações e da realidade social e do aluno, de forma automática, mas sim,

utilizando-se de novas estratégias pedagógicas, criando condições para que o aluno

viva novas condições comunicativas através de um universo textual conhecido e

significativo para ele. Para facilitar o conhecimento a respeito da leitura e da escrita,

1 1Autora, Professora PDE – 2013. Professora de Língua no Colégio Est. Altair Mongruel – E. F. M. e Normal, Ortigueira, Paraná. 2Professora, Orientadora, UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa. PDE 2013.

buscou-se com a inserção da música nas atividades em sala de aula, trazer para o

espaço escolar um gênero textual diferente do qual os alunos costumam trabalhar.

A música além de estar mais próxima dos alunos, traz uma variante mais

acessível da língua e da cultura, mais atraente e sedutora, num primeiro momento.

Buscando conciliar o processo de ensino/aprendizagem com a necessidade

de promover a valorização da atividade de interpretação de texto enquanto processo

dinâmico, social, cognitivo e linguístico; desenvolveu-se um trabalho junto aos

alunos do 7º ano do Colégio Estadual Altair Mongruel– Ensino Fundamental e

Médio, com objetivo de levar os alunos a interpretarem e produzirem textos por meio

do gênero música, considerando sua situação real e cotidiana e não apenas como

um mero exercício de escrita e leitura para avaliação.

Na Intervenção Pedagógica realizada durante o primeiro semestre do ano de

2014 foram efetivados encontros presenciais, com os alunos, para discussão,

análise, interpretação e produção, pelos alunos, a partir de músicas de Paulo

Vanzolini, Zezé de Camargo, Roberto Frejat, Pixinguinha, Rick e Renner, Fábio Jr,

Aline Barros, Gonzaguinha, Jorge Aragão e Milton Nascimento, levando-os a refletir

situações de seu cotidiano através de suas produções.

2 Fundamentação Teórica

2.1 Interpretação e Produção de Texto na Escola

O tempo todo nós usamos a língua portuguesa, ou seja, o tempo todo

falamos, ouvimos, lemos e escrevemos, e, quando praticamos essas ações,

estamos, na verdade, interpretando e produzindo textos.

De acordo com Chiachiri (2013)

Cada vez mais, em várias ocasiões na vida, produzimos textos direcionados para diferentes interlocutores, com finalidades distintas, organizados nos mais variados gêneros, que circularão em espaços sociais diversos. Por isso, podemos dizer que tanto a leitura como a produção de textos escritos são práticas de linguagem e, sendo assim, práticas sociais. (CHIACHIRI, 2013, p.67)

Porém, a dificuldade de interpretação e produção de textos pelos alunos é

um problema que exige a constante busca de soluções. Sanar esse problema é um

desafio a ser enfrentado pelos educadores, não apenas da disciplina de Língua

Portuguesa, mas por qualquer outro profissional envolvido no processo educacional.

Sabemos que tais dificuldades vividas pelos alunos são reflexos de situações, que

apesar de serem vividas na escola, vão além dela.

De acordo com Colello (2012, p. 50) as dificuldades com a leitura e escrita,

genericamente constatadas na população configuram-se também como uma

problemática já evidente no âmbito escolar. As avaliações nacionais e internacionais

realizadas com milhões de estudantes brasileiros comprovam a defasagem dessa

aprendizagem ao longo dos anos escolares, o que permite afirmar que não se pode

garantir a efetiva aprendizagem da língua escrita mesmo para aqueles que

conseguem permanecer na escola.

Saber ler e escrever significa mais do que a capacidade de assinar o nome,

desenhar letras, copiar palavras e decodificar o que foi impresso no papel. Significa

poder usar a escrita como instrumento de comunicação e expressão, como forma de

aumentar contatos, de se fazer presente no mundo ou de compreendê-lo, enfim, a

possibilidade de estabelecer outras formas de interlocução, inserindo-se ativa e

criticamente em práticas da sociedade letrada. Nas palavras de Leite (2001)

Atualmente, pode-se afirmar que as concepções de escrita, subjacentes às modernas propostas, implicam dois aspectos fundamentais: de uma lado, enfatizar-se o caráter simbólico da escrita, entendendo-a como um sistema de signos cuja essência reside no significado subjacente a ela, o qual é determinado histórica e culturalmente; assim, uma palavra escrita é relevante pelo seu significado compartilhado pelos membros da comunidade. Por outro lado, enfatizam-se os usos sociais da escrita, ou seja, as diversas formas pelas quais uma determinada sociedade utiliza-se efetivamente dela; fala-se em escrita verdadeira, em contrapartida à escrita escolar (aquela que não corresponde aos seus usos sociais, tão comum no modelo tradicional).(LEITE, 2001, p. 24-25)

Para Chiachiri (2013) O que os estudiosos propõem é que os alunos não

deveriam produzir "redações", que são produtos escolares, escritos na escola e

unicamente para a escola, mas textos diversos que se aproximem dos usos

extraescolares, com função específica e situada dentro de uma prática social

escolar.

Segundo Kleiman (2007), a compreensão da leitura está relacionada com o

conhecimento adquirido ao longo da vida, seja conhecimento linguístico, textual ou

de mundo, todos estão relacionados ao conhecimento prévio, ou seja, relacionados

com o contexto e com a linguagem, habituais e comuns ao leitor.

Essa ligação entre texto e leitor proporcionará a interação necessária para

a aquisição de novos conhecimentos acerca do assunto discutido na leitura,

culminando no entendimento e inclusão do tema no contexto do leitor e,

consequentemente, na construção de significados para a leitura. Nesse sentido,

Freire conclui:

Desde o começo, na prática democrática e crítica, a leitura do mundo e a leitura da palavra estão dinamicamente juntas. O comando da leitura e da escrita se dá a partir de palavras e de temas significativos à experiência comum dos alfabetizandos e não de palavras e de temas apenas ligados à experiência do educador.(FREIRE, 2006,p.9)

Em uma abordagem mais ampla, torna-se clara a necessidade de severos

pressupostos utilizados como forma e modelo para o letramento. A situação atual do

ensino no Brasil traz uma concepção educativa utilitária e racionalista, formada por

princípios etnocêntricos e autoritários que, no âmbito da escrita comprometem a

compreensão à respeito da língua (natureza e processo de aquisição), fazendo

persistir o enfoque técnico e estritamente funcional.

De acordo com Chiachiri (2013) as aulas de produção de texto não podem

estar dissociadas de leituras com ênfase na compreensão ativa e responsiva que

aponta, inclusive, para uma análise linguística dos textos que se debruce sobre

aspectos discursivos configurados em um dado gênero.

2.2 A questão do gênero textual

A preocupação em classificar os textos de acordo com uma tipologia

específica vem desde a Grécia Antiga, atribuindo-se a Aristóteles a distinção entre

as três formas genéricas fundamentais: o lírico, o épico e o dramático, cuja divisão

se fundamenta na representação da realidade.

Apesar de o tema ser antigo, é somente a partir de Bakhtin, no século XX,

que os gêneros textuais ganham importância para os estudos linguísticos.

A proposta de Bakhtin, considera como gênero do discurso os enunciados

que atendam a um propósito comunicativo, em outras palavras, qualquer texto que

apresente uma função sócio comunicativa. Assim o autor (BAKTHIN, 1997, p. 265)

define: “Todo enunciado tomado isoladamente, bem entendido, é individual, mas

cada esfera social de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis

de enunciados, e é a estes que chamamos de gêneros do discurso”.

De acordo com o Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa

(Brasil, 1998, p. 21) esses três elementos constituem os enunciados :

Conteúdo temático: o que é ou pode tornar-se dizível por meio do

gênero.

Construção composicional: estrutura particular dos textos (narrativo,

argumentativo, descritivo, explicativo ou conversacional) pertencentes

ao gênero.

Estilo: configurações específicas das unidades de linguagem

derivadas, sobretudo, da posição enunciativa do locutor; conjuntos

particulares de sequências que compõem o texto etc.

Um enunciado considerado isoladamente é individual, mas cada esfera de

utilização da língua, ou seja, cada esfera de atividade das pessoas elabora seus

tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que Bakhtin (1997, p. 279)

denomina de "gêneros do discurso".

Para Bakhtin (1997), a escolha de um gênero é determinada em função da

especificidade da esfera de produção em que ocorre a comunicação verbal, pelas

necessidades de uma temática e do conjunto constituído pelos participantes. Não

podendo esquecer que a apreciação valorativa do locutor sobre a temática (o que

pode ser dizível) e sobre os interlocutores vai determinar muito dos aspectos

temáticos, composicionais e estilísticos do texto/ enunciado em determinado gênero.

Negando a teoria estruturalista de Saussure que concebe a língua como um

sistema, Bakhtin defende a natureza social e ideológica da linguagem. Para ele, a

linguagem é atividade interativa, dialógica que, permeando toda a vida social, exerce

papel central nos sistemas ideológicos.

Seus estudos têm grande importância para esta pesquisa, pois quando se

faz uma análise mais profunda do texto, buscando descobrir sua intencionalidade, é

preciso ter em mente qual objetivo está por trás das ações.

Bakhtin ( apud Bonini, 2004) conceitua os gêneros (do discurso) como "tipos

relativamente estáveis de enunciados". Ele reconhece a diversidade de gêneros e,

por isso, considera a estabilidade e a variabilidade como características dos gêneros

discursivos. A prática social faz surgir novos gêneros que, embora tenham por base

um gênero já existente, dele se diferencia pela linguagem, pela finalidade e pelos

meios.

As Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (2006) consideram a

definição de gênero de Bakhtin apropriada, pois, "compreendendo a mobilidade,

dinâmica, a fluidez, a imprecisão da linguagem, não aprisiona os textos em

determinadas propriedades formais".

Além disso, é preciso considerar que os demais autores que se ocuparam do

estudo dos gêneros textuais tiveram como ponto de partida a teoria de Bakhtin, não

negando sua perspectiva dialógica.

Assim, seguindo as premissas básicas de Bakhtin, Bronckart (apud Bonini,

2004), entende o texto como uma "organização cognitiva, determinada por um meio

social específico", concordando com Bakhtin também a respeito da importância da

existência dos gêneros para a comunicação verbal.

Por reconhecerem a importância da existência dos gêneros e da sua

apropriação, enquanto mecanismo de socialização, as teorias de Bakhtin e

Bronckart se apresentam essenciais na fundamentação de um modelo didático de

gênero quando se propõe tornar o aluno apto diante das exigências comunicativas

do mundo contemporâneo.

Com base em Bakhtin (1997), pode-se concluir que os gêneros são formas

de enunciados produzidas historicamente, que se encontram disponíveis na nossa

cultura. Entre uma grande variedade deles, podemos encontrar a notícia, a

reportagem, o artigo de opinião, o artigo científico, o romance, o conto (literário,

popular, maravilhoso, de fadas, de aventuras), a fábula, a crônica, o anúncio, a

receita culinária, a receita médica, a tese, a monografia, o cordel, o poema, o

repente, o relatório, o seminário, assim como a palestra, a conferência, o verbete, a

parlenda, a adivinha, a cantiga, o panfleto, o sermão e a canção, entre outros.

2.3 O gênero canção

Tanto os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa – PCN-

LP (BRASIL, 1998) quanto as Diretrizes Curriculares Estaduais do Ensino da Língua

Portuguesa – DCE – (PARANÁ, 2008), orientam para que o ensino de língua seja

trabalhado via gêneros textuais /discursivos. Com base nisso, compreendemos que

um gênero deve ser observado levando-se em conta as particularidades de sua

esfera de atuação, pois reflete a cosmovisão dessa esfera discursiva.

Observe as concepções de linguagem e de língua, expressas no PCN-LP/ 3º

e 4º ciclos (Brasil, 1998):

Linguagem aqui se entende, no fundamental, como ação interindividual orientada por uma finalidade específica, um processo de interlocução que se realiza nas práticas sociais existentes nos diferentes grupos de uma sociedade, nos distintos momentos de sua história. Os homens e as mulheres interagem pela linguagem tanto numa conversa informal, entre amigos, ou na redação de uma carta pessoal, quanto na produção de uma crônica, uma novela, um poema, um relatório profissional. [...] Nesta perspectiva, língua é um sistema de signos específico, histórico e social, que possibilita a homens e mulheres significar o mundo e a sociedade (BRASIL, 1998, p. 20).

É notório que a música faz parte da vida de todo ser humano e que as

canções podem trazer em seus textos as estruturas linguísticas de uma sociedade.

Elemento inerente à vida humana desde os mais remotos tempos, a música nunca

foi tão amplamente acessível, divulgada, por isso há a hipótese de que alguns

professores acreditam que canções podem auxiliar no ensino dessas estruturas.

Tatit (1987) argumenta que é inevitável entender que “quem ouve uma

canção, ouve alguém dizendo alguma coisa de uma certa maneira” (TATIT, 1987, p.

06).

De acordo com Subtil (2006)

Na relação dos sujeitos com a música, vislumbra-se uma via de mão dupla. Os signos musicais combinados podem evocar emoções e afetos da mais diversas ordens. Ao longo dos séculos, são inúmeros os exemplos do uso de hinos e canções patrióticas, para agregação cívica; as músicas fúnebres provocam comoção e alimentam a tristeza; as músicas rítmicas e marcadas produzem movimento e assim por diante. Por outro lado os estados afetivos tristeza, saudade, amor, alegria, desejo, revolta e anseios políticos buscam correspondentes musicais disponíveis, uma vez que a indústria cultural coloca produtos para todas as circunstancias e para todas as preferencias. (SUBTIL, 2009, p. 18-19)

O gênero música, por nos remeter a contextos culturais de determinadas

comunidades (sertaneja, moderna, rural, sertanejo romântico, universitário,

pancadão, gaúcha, ktachak, forró, pagode, axé, etc.), coloca-nos diante de

tendências musicais que os brasileiros vêm assimilando. Isso nos leva a concluir que

a forma canção, pertencente originalmente à esfera artístico - musical, pode dialogar

com outras esferas, servindo de modelo para outros gêneros como canções de

amor.

Segundo Zampronha (2007)

Privilegiamos na educação o sentir e o pensar como premissas do conhecimento, atentando simultaneamente para o fato que somos um ser integrado e que vivemos imerso em um universo cultural que compreende múltiplos valores e diferentes visões do ser humano. Privilegiamos também pedagogias que se incorporam a estratégias cognitivas, artísticas e musicais, tendo em conta que a prática da música não só fornece condições para a compreensão e expressão de um fluxo de ideias e emoções como permite que os educandos operem semióticas que resultem em sentido para suas vidas. (ZAMPRONHA, 2007, p. 127-128)

Pela importância do gênero música e sua influência no comportamento

humano, determinando modos de falar, de agir e de pensar, entendemos que um

estudo sistematicamente organizado desse gênero trará contribuições para os

trabalhos escolares, auxiliando a entender a língua portuguesa numa perspectiva

transformadora.

A democratização da música na sala de aula é algo que vem se

popularizando. De acordo com Zampronha (2007)

Tendo em conta que as limitações do trabalho pedagógico decorrem da complexidade da psique humana e dos obstáculos próprios ao processo de amadurecimento, e considerando que no processo de seu desenvolvimento o educando se apropria dos resultados de milhares de anos de evolução cultural, cabe viabilizar na educação as múltiplas possibilidades oferecidas pela música.(ZAMPRONHA, 2007, p. 88)

Partindo desse pressuposto, acredita-se que a escolha do gênero canção

possa ser um instrumento do qual o professor possa dispor nas aulas de leitura e

produção textual, pois não é difícil atrair o aluno para este gênero devido a sua

popularidade, diferindo dos textos criados exclusivamente para exemplificação de

estrutura da língua.

De acordo com Chiarini (2013) o contexto de produção do texto importa

tanto quanto a obra. O contexto completa, modifica e justifica a análise dos textos.

O gênero canção cuja temática seja o amor possui a vantagem de pertencer

a um universo conhecido que propiciará a condução didático pedagógica na linha da

aprendizagem significativa. Serão utilizadas canções de músicas de Paulo Vanzolini,

Zezé de Camargo, Roberto Frejat, Pixinguinha, Rick e Renner, Fábio Jr, Aline

Barros, Gonzaguinha, Jorge Aragão e Milton Nascimento.

Segundo Bakhtin (1986), toda prática executada pelo falante não se traduz

em meras palavras, mas vêm carregada de significados que podem ser verdades ou

mentiras, algo bom ou mau, produtivos ou triviais, agradáveis ou desagradáveis.

Assim, a leitura se constrói de forma relacional: autor, texto e leitor numa

viva, profícua e gratificante experiência, pois, o que vale de estratégia para a

interpretação e produção do texto é a colocação do ponto de vista pessoal: o

posicionamento claro e coerente de cada leitor.

O papel do professor de leitura, nessa situação, é o papel de mediador

desse mergulho na época, na linguagem, no contexto de produção da obra, para

que a experiência individual e única da leitura possa se tornar uma experiência

interpessoal e dialógica, como diz Bakhtin (1997, p. 290), entre autor, texto e leitor.

É importante se sentir à vontade para dialogar com o texto. Segundo Neto

(1996, p. 67), “no espaço das salas de aula, no acontecimento das palavras não

deve prevalecer o discurso pré-concebido e sim apoiar-se num discurso próprio: a

história de cada um e suas impressões pessoais interagindo diante do texto”.

A partir do exposto entende-se que a música, estando mais próxima dos

alunos, traz uma variante mais acessível da língua e da cultura, mais atraente e

sedutora, num primeiro momento, nesse sentido, surgiu a partir do desejo de trazer

para o espaço escolar um gênero textual diferente do qual os alunos costumam

trabalhar e com objetivo de facilitar o conhecimento a respeito da leitura e da escrita.

3 Metodologia

O trabalho proposto se constitui num estudo teórico através de da pesquisa

qualitativa e bibliográfica onde se procurou ampliar os conhecimentos à respeito da

inserção da música em sala de aula com objetivo de facilitar o conhecimento a

respeito da leitura e da escrita.

Utilizou-se da análise documental e da investigação-ação desenvolvida no 7º

ano do Colégio Estadual Altair Mongruel– Ensino Fundamental Médio, município de

Ortigueira, Paraná.

Vale-se frisar, assim como Machado (2004,), que “o método não substitui a

inteligência de uma pessoa, não pode ser visto como uma fórmula, uma receita

pronta e acabada [...] seu sucesso depende de quem o utiliza e de como o utiliza.”

4 Aplicação da proposta na escola e no grupo de trabalho em rede

Esta proposta de trabalho foi aplicada no primeiro semestre do ano de 2014,

para dois segmentos diferentes, da área de educação:

Primeiro segmento: aos alunos do 7º ano do Ensino Fundamental – Anos

finais do Colégio Est. Altair Mongruel, situado no município de Ortigueira, através da

Unidade Didática: Interpretando o amor através do gênero canção.

Segundo segmento: aos professores da área de Língua Portuguesa da Rede

Pública Estadual de Ensino, através do Grupo de Trabalho em Rede – GTR 2014.

Com os alunos o projeto implementado em dez encontros perfazendo um

total de 32 horas, em contra-turno. Durante os encontros foram desenvolvidas

atividades focadas na leitura e escrita onde os alunos interpretaram e produziram

textos por meio do gênero música, considerando sua situação real e cotidiana

através das seguintes ações.

1º Encontro: Apresentação do Projeto de Intervenção para a Comunidade

Escolar: Equipe pedagógica, Direção e Professores.

2º Encontro: Apresentação do projeto de intervenção pedagógica:

Interpretando o amor através do gênero canção e unidade didática aos alunos e pais

de alunos.

3º Encontro: Trabalhou-se a presença da música em nossas vidas; através

de questionário investigativo sobre o perfil da turma; e as diversas formas de

manifestação do amor.

4º Encontro: A música e seus diversos estilos. Música “Por você” (Barão

Vermelho); compreensão e interpretação do texto; produção de texto : resposta da

mulher amada ao autor do texto.

5º Encontro: Música “Carinhoso” (Pixinguinha); o Choro, música popular e

instrumental brasileira; Compreensão e interpretação do texto; história do Chorinho.

6º Encontro: Pesquisa com registro de nascimento; construção da árvore

genealógica; Música “Família” (Aline Barros); famílias antigas e famílias modernas;

texto sobre a infância e envolvimento com a família.

7º Encontro: Música “Pai” (Fábio Jr.); compreensão e interpretação do texto;

análise de figuras representando famílias e suas estruturas.

8º Encontro: Música “Mãe” (Cristina Mel); o carinho materno; produção de

texto narrativo.

9º Encontro: Música “Velha Infância” (Tribalistas) e “Canção da América”

(Milton Nascimento); Interpretação e compreensão dos textos; interpretação de

imagem.

10º Encontro: Música “O que é o que é” (Gonzaguinha); o amor a vida;

criação de cartazes sobre as diversas manifestações do amor.

Quanto ao Grupo de Trabalho em Rede, foi desenvolvido através do portal

Dia a dia da educação, área dos educadores, onde professores da rede pública de

todo o estado do Paraná puderam se inscrever, de acordo com os temas de seu

interesse.

A turma era composta de 17 ( dezessete) professores, que durante o

período do grupo de trabalho puderam analisar o projeto e a unidade didática,

comentá-los, fazerem discussões sobre o assunto apresentado, trocarem

experiências nos fóruns, fazerem seus relatos nos diários e aplicarem o projeto em

suas turmas, de acordo com sua realidade, de acordo com o módulo aplicado.

Entre as postagens realizadas tem-se relatos como:

“O trabalho está muito bem elaborado, apresenta assuntos muito interessantes que serão trabalhados através de uma metodologia agradável aos alunos e a nós, professores, também, que é a música”. (PROFESSOR “A”, GTR, 2014)

Houve também relatos com relação à forma como o conteúdo foi

apresentado:

Trabalhando com o gênero música em vários estilos envolvendo amor ,alegria , ordem e disciplina com certeza os alunos irão se apropriar melhor dos conteúdos de uma forma agradável e o resultado também será satisfatório. (PROFESSOR “B”, GTR 2014) Compreendo que sua proposta pedagógica - interpretando o amor através de canções - nos possibilitará e nos dará meios a desenvolver outras

atividades com o gênero canção, bem como utilizando outras temáticas. (PROFESSOR “C”, GTR 2014)

Ao final da aplicação do Projeto junto aos Alunos e aos Professores do GTR,

pode-se perceber que o projeto alcançou seus objetivos, os resultados obtidos foram

satisfatórios e que as estratégias pedagógicas aplicadas, trouxeram resultados

positivos, criando condições para que o aluno viva novas formas comunicativas

através de um universo textual conhecido e significativo para ele de uma maneira

mais prazerosa.

5 Considerações finais

Ao final deste trabalho pode-se concluir que diante de todas as dificuldades

encontradas em sala de aula, principalmente com relação à leitura e interpretação

de textos se faz necessário que o professor crie em sua sala de aula condições que

leve os alunos a gostarem daquilo que estão fazendo, ou seja, é fundamental criar

condições e meios motivadores para despertar seu interesse e assim, desenvolver

um processo de ensino/aprendizagem que traga resultados positivos.

Sendo assim, cabe ao educador buscar constantemente alternativas viáveis

para organização do trabalho pedagógico no cotidiano escolar visando melhor

atender os alunos, suas expectativas, dificuldades, através de uma educação de

qualidade. Segundo Freire (1996) o trabalho de ensinar, exige - entre outros

aspectos - rigorosidade metódica, pesquisa, criticidade, respeito aos saberes dos

educandos e querer bem os alunos.

Que o trabalho desenvolvido através um gênero textual diferente, no caso, a

música, contribuiu para facilitar o conhecimento a respeito da leitura e da escrita de

uma maneira mais atraente e sedutora, possibilitando analisar integradamente

questões de natureza discursiva, de produção, compreensão, gramática e de outros

aspectos também centrais para a aprendizagem.

E que o PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, apesar de

apresentar diversas „dificuldades‟ oportuniza momentos de aprendizagem e reflexão

aos professor da Rede Estadual de Ensino, que no decorrer de sua carreira acabam

sendo deixados de lado, por motivos diversos, como desestímulo, falta de tempo,

entre outros, porém, é uma proposta que realmente viabiliza a melhoria da qualidade

da educação e nos possibilita contribuir para a melhoria do trabalho docente na

escola.

Referências

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1996. PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa para a Educação Básica , 2006.

SUBTIL, M. J. D. Música midiática &o gosto musical das crianças. Ponta Grossa:

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