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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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¹ Professora da rede estadual de ensino do Paraná. E-mail: [email protected] ² Professora Doutora do Departamento Acadêmico de Estudos Sociais (DAESO) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). E-mail: [email protected]

O CONTESTADO E SUAS RESSIGNIFICAÇÕES: Uma

experiência em sala de aula

Simoneli Sauer Colet ¹

Prof.ª Dra. Maria José Menezes Lourega Belli ²

RESUMO

O presente artigo proporciona reflexões sobre os caminhos dialógicos estabelecidos entre os alunos da 3ª série do Ensino Médio e a professora/orientadora no processo de implementação do projeto de intervenção pedagógica. A temática acerca do Contestado foi escolhida devido à importância em se compreender como as práticas republicanas de “modernização” impactaram na região, nos costumes e nas tradições da população local, bem como, analisando estas interações que se fazem presente na formação de uma identidade histórica cultural paranaense. Sendo que a eclosão desta pluralidade de acontecimentos se deu em uma região de fronteira com Santa Catarina. A intenção foi provocar nos estudantes inquietações que os levassem a investigar o Contestado não apenas como uma complexidade de acontecimentos passados, mas como experiências geradoras de reflexões sobre o ambiente social em que estão inseridos, já que muitas vezes eles se deparam com vestígios históricos e não possuem determinada clareza para associá-los a sua vivência. O trabalho em sala de aula contou com o apoio da produção didática elaborada com a finalidade de subsidiar o docente, uma vez que a temática do Contestado é abordada de forma sintética pelos livros didáticos. Os encaminhamentos metodológicos foram explorados de forma variada tendo como ponto de partida a investigação dos conhecimentos prévios dos alunos, na sequência os trabalhos se desenvolveram com o apoio de fontes bibliográficas, fontes iconográficas, fontes audiovisuais e aulas de campo. Ao término da implementação e com os resultados obtidos evidencia-se a importância da história local para a formação do conhecimento histórico.

Palavras- chave: Contestado; Cultura; História local; e Ressignificações

INTRODUÇÃO

Os relatos aqui apresentados tiveram como marco inicial relevante o

estabelecimento do compromisso em se desenvolver coletivamente a

intervenção pedagógica, cuja aplicação se deu com alunos da 3ª série do

Ensino Médio do Colégio Estadual Dr. Ovande do Amaral, na cidade de Rio

Negro- PR, tomando como tema central o Contestado e suas ressignificações.

A motivação em desenvolver esta proposta de trabalho objetivou-se

primeiramente em convidar o aluno a participar das aulas de História e se

integrar como membro da turma por meio das relações de ensino-

aprendizagem. No entanto a relevância desta abordagem está em levar o

aluno, morador da região, a compreender o seu próprio ambiente social já que

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este sujeito se depara com os vestígios históricos e muitas vezes não possui

determinada clareza para associá-los e também para compreendê-los.

Nesta perspectiva, as parcerias criadas para desenvolver os projetos

mobilizaram a turma, que por meio de recursos didáticos e metodológicos

produziram conteúdos reveladores de formas de compreensão. O acordo de

trabalho criou condições favoráveis e necessárias para o plano de ensino ser

discutido, efetivado e modificado pelos estudantes. Este processo de

transformar os saberes compartilhados em saberes aprendidos de forma

significativa supera a prática da simples transposição didática do saber erudito

que consta nas ementas.

No espaço escolar ocorreu o envolvimento de grupos de trabalho

integrados em um conjunto de experiências que materializam o saber

acadêmico, o saber prévio que o aluno apresentou e o saber desenvolvido pelo

professor num contínuo processo pedagógico comprometido em promover a

autonomia deste aluno. Por meio deste ambiente de aprendizagem, os sujeitos

participaram propondo e desenvolvendo atividades que os capacitaram em

relacionar as suas memórias individuais com o contexto social, onde ocorre e

se efetiva a memória coletiva. Nestas variadas formas discursivas às

representações sociais foram entendidas e criadas, sedimentando uma

topografia cultural. Deste modo, a construção do conhecimento passou pela

coesão e motivação do grupo que foi estimulado a interagir com várias formas

de narrativas, de modo a gerar um espaço de circulação e criação do

conhecimento.

O desafio foi tornar o ensino de história um espaço de fronteira, um lugar

em que sejam claramente definidos os sujeitos e suas contribuições. Estas

demarcações não tem o sentido de separação professor e aluno, conhecimento

erudito do conhecimento escolar, mas uma definição nas formas de como

ocorreu às participações destas referências de modo a criar um lugar de

encontro e recriação.

Assim, a pretensão foi motivar o aluno para uma compreensão do espaço,

enquanto paisagem que se modifica através das práticas sociais. Neste

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contexto dinâmico, se enfatizou o longo processo de rivalidades entre as

comunidades locais e as autoridades que desejavam construir a ferrovia e

delimitar fronteiras estaduais. Buscou-se também, compreender os sentidos

que esses acontecimentos tiveram no passado, analisando a existência de

permanências e ou ressignificações das tradições e do projeto republicano na

cultura e na paisagem local.

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

A ressignificação do Contestado é acima de tudo uma releitura das

fontes existentes e daquelas que emergem de pesquisas atuais e novas

problematizações. A importância do estudo do tema está pautada na História

do Paraná, que por sua vez contribui para a identidade histórico-cultural.

Apesar da importância do entendimento da Guerra do Contestado para a os

paranaenses, os materiais didáticos, principalmente do Ensino Médio, abordam

o tema de uma maneira reduzida, passando a impressão de um acontecimento

com pouca importância na História do Paraná e em consequência na História

do Brasil.

A análise e a compreensão deste estudo têm como preocupação

valorizar as experiências dos sujeitos, enquanto geradores de convivências

sociais. Neste sentido, Certeau citado por Silva (2011, p. 123) chama à atenção

sobre:

(...) as transformações ocorridas em determinada sociedade como uma espécie de mutação da cultura, uma adaptação da cultura já existente e a coprodução de uma cultura peculiar e distinta, porém com resquícios da anterior. Uma produção cultural que por sua vez, se do que lhe for conveniente em relação à sociedade e a modo de acordo com suas expectativas e ambições. (SILVA, 2011. p.123)

A partir desse entendimento, Ferreira e Franco (2009, p.58) afirmam que

“os historiadores romperam com a dicotomia das noções de cultura erudita e

popular, valorizando os aspectos de circularidade das culturas, como

elementos que se comunicam e se influenciam mutuamente.”

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Por tanto, precisa valorizar, pesquisar e explorar o patrimônio histórico

no seu sentido mais amplo, assim:

A valorização e o conhecimento de um bem cultural, que testemunha a História ou a vida do país, pode ajudar-nos a compreender quem somos, para onde vamos, o que fazemos, mesmo que muitas vezes pessoalmente não nos identificamos com que esse mesmo bem evoca, ou até não apreciamos sua forma arquitetônica ou seu valor histórico. O importante é que ele faz parte de um acervo cultural que deve ser preservado por toda comunidade, pois é revelador e referencial para a construção de nossa identidade histórico-cultural. (ORIÁ, 2005, p.134. In: Memória e Ensino de História. BITTENCOURT)

Nesse sentido, ocorre à necessidade de refletir sobre os embates

conflituosos na região do Contestado, cujas implicações promoveriam rupturas

na perspectiva dada pela modernidade republicana. Estas tensões provocaram

alterações nas crenças, na política, geografia, migrações e representações

sociais. Sem dúvida alguma, Oriá (2005) nos remete a uma reflexão sobre o

contexto cultural e suas mutações, com ressignificações no decorrer do tempo.

As transformações sociais impactam o espaço de convivência

remodelando e gerando novas paisagens. Nesse intenso contexto de

transformações materiais emerge campos de interesses definidores de

fronteiras que na Questão do Contestado abrangem uma vasta área geográfica

das regiões do Sul e Sudeste paranaense, e do Norte e Oeste catarinense,

sendo os limites de fronteira os rios Negro e Iguaçu ao Norte, os rios Canoas e

Uruguai ao Sul, a Serra Geral ao Leste e divisão entre Brasil e Argentina na

região Oeste.

Nilson Thomé (2002), estudioso do Contestado, define o Contestado

Paranaense quanto ao seu espaço geográfico, onde nos demonstra a Questão

de Limites envolvendo os seguintes territórios:

Envolve os municípios do Estado do Paraná existentes no tempo da Questão de Limites, que cederam territórios para o Estado de Santa Catarina, de Rio Negro, Três Barras, Itaiópolis, Timbó, e Porto União da Vitória (no atual Planalto Norte Catarinense). Congrega também a área Sudeste do Município de Palmas (a Oeste do Rio do Peixe), onde nasceram Cruzeiro, em 1917, Concórdia, em 1934, e demais municípios deles desmembrados, na parte anexada a Santa Catarina. (THOMÉ, 2002. p.20)

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A área de litígio envolvendo os Estados do Paraná e Santa Catarina

iniciou-se com a criação da Província do Paraná, em 1853, pois suas fronteiras

não tinham uma definição clara, a partir da emancipação da Província de São

Paulo. Santa Catarina, por sua vez, já tinha sido desmembrada de São Paulo

em 1738 e requeria suas fronteiras a partir dos cursos dos rios Saí-Guaçu,

Negro e Iguaçu. Cansado de aguardar uma solução, o governo de Santa

Catarina, recorreu à justiça e assim em 1904, o Supremo Tribunal Federal,

atribuiu ganho de causa ao Estado catarinense. Mas em contra partida o

Paraná não aceitou a decisão, levando adiante a questão de limites e

provocando uma forte tensão nas fronteiras, que duraria ainda longos anos, até

o desfecho da Guerra do Contestado. Esta questão só foi resolvida no dia 20

de outubro de 1916, quando o então presidente da República, Dr.Wenceslau

Braz juntamente com os governadores do Paraná Dr. Afonso Alves de

Camargo e de Santa Catarina Coronel Felipe Schmidt, assinaram o Acordo de

Limites. Foram muitas as negociações o que gerou desmembramentos, dentre

os quais, a partir do município de Rio Negro (PR), foi criado no dia 08 de

setembro de 1917, o município de Mafra (SC).

Toda essa complexa e tensa rede de interesses impactou os moradores

que ali viviam há muito tempo. A população mais antiga na região do

Contestado que se tem registro, é da tribo Kaingang, entre outros nativos como

os Xokleng e os Guarani. Apenas nos séculos XVII e XVIII, passaram a circular

na região, aventureiros e tropeiros. E mais tarde no século XIX, chegaram os

imigrantes europeus, que se diferenciavam culturalmente dos sertanejos.

Segundo Machado (2004, p.133), “a rápida ocupação da região do

planalto norte – catarinense no início do século XX intensificou a exploração

dos ervais devolutos” sendo que a extração da erva-mate garantia a

sobrevivência das famílias caboclas que beneficiavam e vendiam o produto,

pois essa era uma prática que fazia parte da cultura dos sertanejos. Assim

Machado (2004) aponta o seguinte perfil desses sujeitos:

De fato, quase toda a população da região contestada era proveniente, majoritariamente, do Paraná, principalmente de Palmeira, Lapa, e São José dos Pinhais, pertencentes à região dos Campos Gerais – onde tinha sofrido todo tipo de expropriação e

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grilagem -, ou descendia de lavradores que procuram novas terras. Estes habitantes procuravam terras devolutas mais distantes com o intuito de levar a paz, com o mínimo de segurança e conforto. Curiosamente, apesar de sua origem paranaense, a maioria dos lavradores simpatizava com o pleito catarinense sobre a região. Afastar as fronteiras paraenses significava ganhar distância do poder direto dos coroneis (...) (MACHADO, 2004.p. 135)

No entanto, os caboclos matutos que habitavam a região contestada

eram em sua maioria pessoas simples desprovidas de direitos, acuadas pelo

coronelismo e mergulhadas em uma pobreza em todos os sentidos. Buscavam

na fervorosa devoção religiosa orientações, conforto, esperança e apoio, uma

vez que as ações da República recém criada, não atingiam esta população,

como nos elucida Marli Auras (2001):

(...) reinante, a religião é o único apanágio do sertanejo: frente à insegurança e à violência do cotidiano, ela traz a proteção das forças sagradas; frente à impossibilidade de articular respostas coerentes e abrangentes às contradições vividas, ela apresenta um conjunto de certezas fundamentais. Face a um contexto histórico que procurava negar até o estatuto de homem ao sertanejo. (AURAS, 2001. p.48 e 49)

Mas essa religião, não estava vinculada oficialmente a instituição

católica, que por sua vez estava limitada a poucas paróquias com um número

reduzido de padres para atender toda a população em um espaço geográfico

abrangente.

Assim surgiram peregrinos, que eram reconhecidos por esses

sertanejos como curandeiros, benzedores e puxadores de reza, chamados de

monges. Segundo, Delmir José Valentini (2003) em sua obra Da Cidade Santa

à Corte Celeste: Memórias de Sertanejos e a Guerra do Contestado, três

monges influenciaram significativamente o povo da região do Contestado

sendo eles: João Maria de Agostini, João Maria de Jesus e José Maria.

Na cidade de Rio Negro, a primeira evidência do monge que se tem

registro, data do ano de 1851, relatada por José Fraga Fachel (1995):

Depois de sua estada na Lapa, o monge João Maria esteve em Rio Negro – PR e Mafra – SC, às margens do Rio Negro, que divide os Estados do Paraná e Santa Catarina. Em Mafra, o Monge – assim

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como tinha feito em outros lugares - edificou cruzes, uma das quais resistiu à erosão do tempo, e hoje é conservada e preservada das intempéries num tipo de capelinha, localizada na atual praça Hercílio Luz. (FACHEL, 1995.p. 33)

Entretanto a República recém instaurada no país, precisava se fazer

presente em nome de uma “modernização”, de uma superação em relação às

formas tradicionais de convivência que datam desde o período colonial. Nesse

contexto, surge um empreendedor norte-americano Percival Farquhar, que já

tinha concessões em outros países da América, e encontra no Brasil, um local

promissor para seus negócios financeiros. Assim em 1906, Percival Farquhar,

por meio da companhia Brazil Railway Company conseguiu a concessão para

construir a Estrada de Ferro, ligando São Paulo ao Rio Grande do Sul.

Conquistou também a possessão das terras, sobre as faixas marginais a

ferrovia, de onde passou a extrair a madeira através de sua outra empresa a

Southern Brazil Lumber Company. Um projeto que se impôs perversamente

pela desarticulação, exploração e exclusão pela força dos setores tradicionais e

isto fica evidenciado pela analise Bruno César Deschamps Meirinho (2012):

As iniciativas se apresentaram na forma de um projeto de desenvolvimento que prometia viabilizar o exercício de atividades mais dinâmicas no interior do país. Ficariam para trás os tempos do limitado comércio dos tropeiros, lentos e vulneráveis. Além disso, a política avançava: no começo do século XX, o Brasil já tinha abolido o trabalho escravo e era uma República. No entanto olhando com mais atenção é possível observar que o projeto de modernização se revelou uma promessa não cumprida na qual a população deu a sua parte, mas não encontrou nenhum retorno. (MEIRINHO 2012. p.40. In: Contestado, a modernização incompleta. FRAGA)

Os caboclos abandonados e desacreditados do então projeto promissor

republicano buscam amparo no monge, que pregava a volta da Monarquia

como saída para muitos males. Esses fieis seguidores do então messias

ficaram conhecidos como fanáticos. Assim, na esperança de uma vida digna,

passaram a acompanhar o monge José Maria. Inicialmente em Taquaruçu, de

onde foram rapidamente expulsos seguindo então para Irani, território que fazia

parte do Paraná. Sendo este o local, onde ocorreu em 22 de outubro de 1912,

o primeiro combate dos caboclos, contra as tropas paranaenses, chefiadas

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pelo comandante do Regimento de Segurança do Paraná João Gualberto de

Sá Filho que foi executado no combate. Mesmo com a morte do monge nesse

enfrentamento, os sertanejos continuaram se reunindo em seu nome e através

das visões de pessoas que afirmavam receber mensagens póstumas do

monge como as virgens e os meninos – deuses.

No decorrer da guerra e mesmo após este confronto, os caboclos,

unidos pelo sentimento de pertencimento a uma vida comunitária, seguiam dos

ensinamentos do monge se organizaram em irmandades e fundaram os

redutos, também chamados de cidade santa, onde conviviam e sobreviviam de

forma solidária, Paulo Pinheiro Machado (2004), relata que:

A grande mobilidade dos redutos sobre uma extensa região, como uma necessidade de guerra, dificultou o desenvolvimento de uma atividade de subsistência mais estável. O sentimento anticapitalista dos sertanejos não os impediu de desenvolver intensas e regulares transações comerciais externas, com casas comerciais das vilas do planalto e até das capitais dos estados. Normalmente, trocavam couro e erva- mate por alguns mantimentos, sal, armas e munições. (MACHADO, 2004.p. 207)

Sendo que os redutos se difundiram por todo o planalto serrano

catarinense e entre os principais estavam: Taquaruçu, Caraguatá, São Pedro,

Papudo, Aleixo, Santa Maria, Pedra Branca, Bom Sossego, Tavares e Campina

dos Buenos. No decorrer dos combates e destruição dos redutos, lideranças

que surgiram no campo de batalha acabaram também assumindo o comando

das cidades santas, com destaque para Chiquinho Alonso, Vanuto Baiano e

Adeodato.

Embora as tensões tivessem eclodido em vários pontos da região em

litígio, a cidade de Rio Negro não foi um reduto dos caboclos do Contestado e

também não foi palco de embates entre os sertanejos e as tropas militares.

Porém em documentos escritos, em fotos e em relatos constam evidências do

conflito na cidade. Que culminou com a questão de limites, pois Rio Negro fez

parte do território contestado entre Paraná e Santa Catarina.

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Segundo relato das pesquisadoras locais Divinamir de Oliveira Pinto,

Maria da Glória Foohs e Marli Uhlmann Portes (2007), episódios marcaram o

medo da população rionegrense, em 1914, com a guerra do Contestado, um foi

o fechamento temporário do Colégio São José, sendo que na ocasião as irmãs

que gerenciavam o colégio dispensaram os alunos e mandaram pertences de

valor para Curitiba tendo receio de pilhagem por parte dos revoltosos do

Contestado.

O outro episódio citado no livro de Raul D’ Almeida (1976) a instituição

de ensino Escola Brasil Cívico (Nova Krótona), instalada em Rio Negro no

corrente ano, teve uma breve história no município devido aos rumores que um

bando de “fanáticos” liderados por “Alemãozinho” ameaçava ocupar a cidade.

De fato Alemãozinho esteve na cidade, porém na margem esquerda do rio

Negro, atual cidade de Mafra, como consta no livro de Napoleão Dequech

(1967), a presença de “Alemãozinho” com aproximadamente 300 homens, foi

um episódio que marcou a presença dos “fanáticos”, nesta localidade, sendo

que na ocasião, um morador local o Sr. José Pauli foi morto após enfrentar o

líder jagunço. Dequech relata ainda que, muitas famílias rionegrenses foram se

refugiar na cidade da Lapa e que na ocasião a polícia de Rio Negro, trancou a

ponte com arame farpado para impedir a passagem de Alemãozinho e sua

tropa para a outra margem do rio. Mas ainda necessitando de reforço militar, foi

solicitada a presença da polícia de Curitiba, que chegou apenas no outro dia,

quando Alemãozinho e sua tropa já tinham rumado para a cidade de Itaiópolis,

cuja perseguição ao bando ficou a cargo dos vaqueanos civis, comandados

pelo Coronel Bley Netto.

Dentre as imagens existentes na cidade uma chama mais a atenção,

pois a data é de 1915, e mostra um grupo de sertanejos do Contestado de

forma pacífica, sendo alojados temporariamente no Colégio Barão de Antonina

em Rio Negro, não sendo possível ter mais informações sobre esta fonte.

Assim, a cidade de Rio Negro se insere na Guerra do Contestado como

um dos muitos espaços em que ocorreram situações isoladas, mas que

deixaram marcas históricas do conflito. Pois as tensões se espalharam nessa

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região de fronteira provocando um sentimento de insegurança, pela violência

usada no esforço de destruir as formas de resistência empregadas pelos

revoltosos. Os impactos deste conflito ainda se fazem presente, agora

redesenhados por outras representações.

Inicialmente as forças repressoras aos caboclos, não estavam

preparadas para combatê-los, ignoraram sua capacidade de organização e

persistência. Foi ao longo dos quatro anos de combates, com a intervenção do

Governo Federal e milhares de soldados dispondo de muito aparato militar, que

os sertanejos foram gradativamente sendo derrotados. A dizimação também

ocorreu em decorrência da fome e de doenças como o tifo. Estima-se que vinte

mil pessoas perderam suas vidas no Contestado.

Mas o genocídio ocorrido no Contestado, não desenraizou por completo

as tradições caboclas, que por sua vez são ressignificadas na

contemporaneidade, como por exemplo, rituais de fé em torno do monge. Essa

dinamicidade que envolve as reapropriações de fé e do espaço motiva

questionamentos sobre a relação da história local de Rio Negro e a Guerra do

Contestado na mudança de paisagens e na circularidade cultural.

APLICAÇÃO DO PROJETO E RESULTADOS OBTIDOS

Inicialmente os 40 alunos da 3ª série do Ensino Médio foram convidados

a participar da pesquisa diagnóstica respondendo um questionário com

quatorze perguntas sobre o Contestado. Sendo que as respostas eram

objetivas contendo a alternativa sim ou não respectivamente e um espaço para

possíveis considerações a fim de investigar as ideias históricas que os

discentes tinham acerca do tema.

Retornaram 29 questionários, dos quais se constatou que 88% dos

alunos já ouviram a palavra Contestado, porém apenas 1 aluno respondeu que

sabia do que se tratava. Quando perguntado sobre informações que eles

poderiam ter apenas 3% registraram alguns elementos relacionado à Guerra do

Contestado. As questões com o cunho religioso, mais especificamente sobre o

monge João Maria, foram às questões que os alunos demonstraram mais

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conhecimento, aproximadamente 60% tinham conhecimentos prévios. Quando

questionados sobre se esse movimento possuia algum significado para a vida

contemporânea aproximadamente 90% não souberam opinar. No

questionamento sobre a história local e a relação com o Contestado 80% dos

alunos não souberam responder. Quando perguntado se eles já tinham

estudado o Contestado em algum período escolar 45% responderam que já

tinham estudado 52% não recordavam e 3% nunca estudaram o tema. E para

finalizar o diagnóstico, foi solicitado que os alunos registrassem contribuições,

dúvidas e curiosidades, 28% responderam a questão fazendo apontamentos

pedindo aprofundamento sobre o Contestado.

O segundo passo foi o de integrar todos os 40 alunos a proposta de

trabalho, desta vez instigando-os com imagens do Contestado presentes no

cotidiano da cidade de Rio Negro e de Mafra. Todos os alunos participaram e

fizeram comentários relatando que já viram a cruz do monge na praça, que

passaram pelo monumento na saída da ponte, que na casa da avó tem foto do

monge João Maria, que acham curioso a cidade de Rio Negro e Mafra serem

separadas apenas por uma ponte. Estas impressões foram importantes para

criar oportunidades de investigação, porém as narrativas não demonstram

clareza na compreensão histórica do tema e em relação à história local.

A partir do diagnóstico foi iniciado o trabalho com a aplicação da unidade

didática que contemplou o Contestado em cinco temáticas sendo elas: o

território, os moradores da região do Contestado, a religiosidade, a República

Velha e a guerra. Sendo que em cada recorte temático foi sugerido variados

instrumentos de avaliação.

O estudo sobre o Contestado partiu de problematizações sobre o

território auxiliado pelas fontes bibliográficas, mapa da região contestada e

pesquisa no site do IBGH. Os estudantes pesquisaram municípios como: Rio

Negro, Mafra, Palmas, União da Vitória, Canoinhas, Três Barras, Curitibanos,

Irani, Porto União, Lebon Régis, Caçador e Matos Costa enfatizando o IDH de

cada cidade bem como o histórico com a Guerra do Contestado. Na finalização

deste momento ocorreu um debate muito interessante com a questão do

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pertencimento, onde os alunos contaram como é cotidiano deles nessa região

fronteiriça entre o Paraná e Santa Catarina. Os relatos demonstraram que os

estudantes se consideram paranaenses por residirem em Rio Negro, porém

possuem muitos vínculos com a cidade de Mafra como: a utilização de serviços

de saúde e do comércio, a apreciação da emissora de rádio e da imprensa

escrita , participação em cursos de aperfeiçoamento e em momentos de lazer.

Na abordagem sobre os moradores da região do Contestado além das

fontes bibliográficas utilizou-se também o recurso audiovisual, que por sua vez

teve ótima aceitação entre os estudantes. O documentário apresentado com

ênfase nos sujeitos protagonizados foi problematizado e discutido em equipes

e posteriormente no grande grupo, com a unânime opinião sobre o abandono

por parte das autoridades dos remanescentes do Contestado, intitulados como

“os meninos do Contestado”.

A religiosidade possibilitou grande abrangência nos trabalhos, foram

estudas fontes bibliográficas, fontes iconográficas, pesquisas na web e aula de

campo em Rio Negro e Mafra nos locais de peregrinação religiosa com menção

ao monge João Maria e também com significados e memória a Guerra do

Contestado. Com o desfecho dos trabalhos, os alunos concluíram que a

religiosidade é um aspecto do Contestado que possui muita ligação com a vida

contemporânea deles e de seus familiares com ênfase na fé ao monge João

Maria e suas profecias que povoam o imaginário, com a peregrinação aos

locais com as cruzes do monge para fazer pedidos e agradecimentos e a

procura por benzedeiras para amenizar os sofrimentos.

Sobre as problematizações acerca da República Velha, os alunos foram

instigados com imagens do fotógrafo contemporâneo do Contestado Claro

Gustavo Jansson (1877-1954) e posteriormente com fontes bibliográficas, onde

conseguiram entender que a República e a democracia da época excluíam

grande parte da população brasileira, entre estes os caboclos do Contestado,

provocando profundas mazelas na contemporaneidade. Como finalização os

alunos produziram paineis iconográficos demonstrando suas conclusões, o

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qual foi utilizado na mostra de conhecimentos do colégio, com a finalidade de

socialização e explanação dos trabalhos junto à comunidade escolar.

A Guerra do Contestado foi à última temática a ser trabalhada com os

alunos, neste momento os alunos participaram de aula expositiva e contaram

com a fundamentação teórica do livro “Sangue, Suor e Lágrimas no Chão

Contestado” do historiador Nilson Thomé. Foram analisadas fotos da época

sobre o Contestado em Rio Negro e Mafra, do acervo particular de Maria da

Glória Foohs. Realizou-se mais uma aula de campo na cidade de Três Barras –

SC, com a finalidade de visitar o museu municipal que conta com grande

acervo histórico sobre o Contestado e da antiga madeireira Lumber que estava

instalada na cidade. Na ocasião foi feita também uma visita nas antigas

instalações da madeireira Lumber na mesma cidade, sendo que atualmente

esse local é de posse do Exército, denominado Campo de Instrução Marechal

Hermes. Os alunos concluíram esta etapa produzindo narrativas históricas

sobre a Guerra do Contestado e relatórios da aula de campo. Neste momento

não foi possível realizar a dramatização sobre a guerra, devido ajustes no

calendário escolar deste ano de 2014.

Como finalização da proposta de intervenção pedagógica foi realizada a

autoavaliação por parte dos alunos tanto escrita como socializada para o

grande grupo. Os registros e apontamentos apresentam um excelente

resultado, pois todos os alunos elogiaram a forma como o projeto foi

conduzido, com uma metodologia diferenciada, saindo das aulas tradicionais

apenas com textos dos manuais didáticos, questionários e provas. Apreciaram

muito as aulas de campo, que eles avaliaram como sendo a melhor parte do

projeto, gostaram de como ocorreu à avaliação sempre associada com as

problematizações. Concluíram que o Contestado possui ligação direta com a

história local, porém na cidade paranaense de Rio Negro existem poucos

espaços voltados à preservação e divulgação da memória destes

acontecimentos. Já na cidade catarinense de Mafra o Contestado esta mais

presente no cotidiano urbano dos moradores, mas embora sejam identificadas

essas diferenças, tanto em uma cidade quanto na outra, se faz necessário

desenvolver políticas públicas compromissadas em constituir um debate

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gerador de uma memória provocadora de reflexões sobre os sentidos que

patrimônio histórico se insere na vida da população local.

No período que o projeto estava sendo desenvolvido na escola junto aos

alunos, iniciou o GTR – Grupo de Trabalho em Rede, que contou com a

inscrição de 17 professores da rede estadual de ensino dos quais 15

concluíram sua participação. As atividades foram divididas em três temáticas,

sendo primeiramente analisada a pertinência do projeto elaborado como parte

integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE turma 2013,

nesta etapa do trabalho ocorreu à socialização com os colegas do GTR e foi de

suma importância. Os participantes foram convidados a analisar o projeto de

intervenção pedagógica e a resposta foi muito positiva, devido à pertinência do

tema para os alunos, pois a história local abre caminho para a compreensão

das formas de interação que se estabelecem entre as regiões e a política

republicana. As parcerias que se estabeleceram neste processo representaram

uma generosa rede de cooperação, já que é na troca de experiências que

redimensionamos o espaço da escola. Neste sentido, resgato a seguinte

contribuição do participante 1: “Colegas deste GTR após a leitura da proposta

de intervenção pedagógica da professora concluí pela assertiva em participar

deste grupo de discussão. Em primeiro lugar pela pertinência da

problemática em relação às Diretrizes Curriculares, pois estas valorizam a

História local considerando que a partir da história local é mais fácil para os

discentes construírem sua noção de pertencimento e de se perceberem na

história, facilitando o processo de ampliação de sua consciência histórica. Em

segundo lugar porque valoriza o ensino e a pesquisa de um evento histórico

que merece maior destaque na história não só do nosso Estado, mas de todo o

País.”

Na segunda temática foi apresentado o material didático elaborado para

o trabalho em sala de aula com os alunos envolvidos no projeto, a unidade

didática foi elogiada pelos professores, pois iniciou com um diagnóstico para

avaliar o conhecimento prévio dos alunos sobre o tema, e após apresentou

diferentes encaminhamentos metodológicos e variedade de fontes para se

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problematizar o Contestado, como observou o participante 2: “É completo e

bem estruturado, parte do que os alunos já sabem ou não, contextualiza o

conflito mostrando os vários lados e nuances, ressaltando o lado dos

oprimidos, dos caboclos. Oportuniza sair da escola e ir à campo em visitas na

própria cidade de Rio Negro, Mafra e Três Barras. Não podendo deixar de

ressaltar também, a riqueza áudio visual, que sem dúvida atrairá a atenção dos

alunos e despertará sentimentos e apatias. Esse trabalho é denso, talvez não

dê para implementá-lo em sua totalidade neste ano, mas é um material

riquíssimo que não se perderá, pois poderá ser utilizado como recortes,

ressaltando esse ou aquele ponto para um aprofundamento maior. Me

emocionou o documentário “ Os meninos do Contestado”, aquelas pessoas de

mais de 100 anos, seus rostos,suas vozes, suas memórias ainda vivas,

histórias de atrocidades.... insistem em não morrer, talvez sejam encarnações

do monge...as várias cruzes ainda veneradas, cultuadas, peregrinadas

simbolizam a cultura popular que resiste em sua simplicidade através dos

causos com muito fundo de verdade.” Sendo que o maior questionamento foi

sobre a grande quantidade de atividades apresentadas para um número

reduzido de aulas, porém o material foi pensado como algo para o professor

selecionar, recortar e adaptar de acordo com sua realidade escolar, como foi

argumentado durante o fórum e o diário no estudo do GTR.

Na terceira temática, os professores acompanharam a práxis e parte dos

resultados da implementação do projeto na escola, como observar o

cronograma e opinar sobre a realização das atividades. Também socializaram

experiências com seus alunos no fórum vivenciando a prática, o qual foi um

momento de muita importância entre os participantes do GTR como relata a

participante 3: “ Uma das atividades que desenvolvi com a turma foi a visita a

alguns pontos históricos da cidade, em parceria com a Secretaria da Cultura do

Município. A ideia de visitar in loco alguns lugares que eles tinham visto nas

fotografias foi bem recebida por todos. A igrejinha construída na década de 50

e a Estrada Boiadeira, carregada de simbologia na construção da identidade

local, fizeram, entre outros sítios históricos, parte deste roteiro. A proposta era

que os alunos pudessem desenvolver um olhar histórico sobre lugares até

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então despercebidos no seu cotidiano. Ao voltarem, muitos alunos

comentavam como foi interessante conhecer a história de lugares que eles

nunca tinham observado, inclusive, aspectos históricos do bairro onde alguns

residiam. Esse olhar, essa percepção dos lugares de memória foi

possivelmente uma das grandes contribuições que o projeto trouxe para a

ampliação da consciência histórica dos jovens alunos.”

Com o término das atividades do GTR foi possível fazer uma avaliação

positiva sobre a tutoria do grupo de estudo, pois o contato com os professores

comprometidos com a educação e com a área de história ampliaram o olhar

sobre a temática e auxiliaram contribuindo com suas vivências no momento da

realização do projeto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ensinar e aprender a história exige dos atores a prontidão em

percorrer a produção historiográfica com uma postura indagadora a fim de

buscar problematizar e identificar os significados que emergem nesta

aproximação dialógica. Compreendendo que o ensino de história é um lugar de

fronteiras conectadas no próprio processo de formação da memória coletiva.

Deste modo, vivenciar estas experiências possibilitou vitalizar o

passado, suscitar indagações sobre o que foi dito e seus múltiplos sentidos, o

quê pode ou não ser dito e sobre a presença do silêncio como gerador do

esquecimento. Transitar por estas preocupações espaçou a possibilidade em

se demarcar caminhos de investigação e interpretação. Fazendo da produção

em sala uma contribuição que agregou ativamente na ação continuada em

tecer uma complexa rede de conhecimentos reveladores de formas culturais

onde memória e história se completaram.

Assim, na análise sobre o Contestado, resgatou-se a criatividade, a

pluralidade, as contradições, as visões de mundo em um ambiente de

circularidade dado pelas relações sociais. Fazendo do aluno, um sujeito que

construiu um saber e se reposicionou com maior clareza no espaço de

convivência social. Destacando que o professor teve o importante papel de

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instigar o seu aluno a compreensão de sua própria história já que este

estudante possui uma memória histórica de seu ambiente social.

Portanto, nesta rede de convivências, estudantes, professor e

comunidade promoveram a circularidade do conhecimento gerando outras

problematizações através da continuidade das pesquisas, que foram

desenvolvidas em sala de aula. Deste modo as atividades integraram esses

sujeitos em um projeto comum de trabalho que estimulou a criação de vários

enfoques, a pluralidade de ideias tornando todos participantes nas ações de

aprendizagem.

Concluindo, acredita-se que as reflexões realizadas neste trabalho

contribuíram para ressignificar as temáticas acerca do Contestado, não

esgotando as problematizações existentes e sim possibilitando caminhos,

olhares e debates para a construção do conhecimento histórico que se revela

para os sujeitos protagonistas da história local.

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