os desafios da escola pÚblica paranaense na …€¦ · um painel foi confeccionado com os...

20
Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

Upload: others

Post on 03-Nov-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Page 2: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

1

DESPERTANDO O INTERESSE PELA LEITURA ATRAVÉS DA LITERATURA DE CORDEL

Autora: Matilde Aparecida de Cristo Teixeira 1

Orientador: Marcio Matiassi Cantarin 2

Resumo:

O presente artigo explana as atividades desenvolvidas na área de Língua Portuguesa, oportunizado pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná, ao longo do Programa de Desenvolvimento Educacional turma 2014 juntamente com a Universidade Tecnológica Federal do Paraná, cujo objeto de estudo foi a leitura, no qual o objetivo geral do projeto implementado foi despertar o interesse e manter o hábito da leitura dos alunos do primeiro ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Professora Ângela Sandri Teixeira, contribuindo para a formação prazerosa da leitura por meio da literatura de cordel. Especificamente, as intenções da implementação das atividades pedagógicas foram levar os alunos a conhecer a manifestação da literatura de cordel e sua caracterização (leitura, escrita e metrificação dos versos); possibilitar o conhecimento da linguagem cordelista, enfocando a cultura nordestina em favor da valorização das nossas raízes; promover uma aproximação do aluno com a cultura popular nordestina; estimular a produção e a edição de cordel além de promover hábito do contar história para outros alunos. Buscou-se no percurso do artigo explicitar a necessidade de valorizar e respeitar a pluralidade própria do nosso país e os significados e coletividades, experiências comunitárias e o imaginário do folclore, presente na produção do cordel, propiciando ao aluno o contato com a experiência cultural que emana desta literatura e toda sua riqueza expressiva, quanto à articulação de várias linguagens - verbal oral, verbal escrita, musical e visual e quanto aos diversificados temas que o aborda.

Palavras-chave: Literatura de Cordel. Leitura. Conhecimento. Valorização.

1. INTRODUÇÃO

A justificativa para este trabalho parte da frequente e constante repulsa, por

parte dos alunos, pela leitura, que afirmam em tom desafiador em frases como “Eu

não gosto de ler. Tem que ler professora?”, aliada à reclamação unânime dos

professores de que alunos não interpretam por não lerem. Essas atitudes foram

observadas ao longo da minha prática docente no Colégio Estadual Professora

Ângela Sandri Teixeira, no qual atuo como professora de Língua Portuguesa.

E partindo destas afirmações o ler implica, dizer que não foram desenvolvidas

as habilidades necessárias que lhe permitam diminuir o prazer que a leitura

proporciona. Partindo destas primícias, propomos atividades com a literatura de

1 Graduada em Letras.... E-mail: [email protected]

2 Doutor em Letras/Literatura e Vida Social (Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita

Filho/Assis). Mestre em Letras/Estudos Literários (Universidade Estadual de Londrina). Professor Adjunto na graduação em Letras da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR. E-mail:

Page 3: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

2

cordel, que é riquíssima e diversificada, a fim de oferecer um leque de recursos que

os ajudarão a desenvolver e formar o hábito da leitura.

A literatura de cordel também se justifica por estar mais distante do nosso

cotidiano e por não possuir o reconhecimento nem a valorização dentro da nossa

literatura brasileira. Pois, Freire (1988) salienta que: “é necessário que o indivíduo

leia seu próprio mundo para depois decifrar as palavras, pois, as mensagens que lê

só tem significado quando se relacionam com o mundo a sua volta.” A cultura

popular valoriza os fatos, relatando nos versos os acontecimentos políticos, a

religião, os costumes. Dessa forma, pensamos que ela pode auxiliar a despertar o

gosto e a valorização da leitura, permitindo assim um desenvolvimento maior no seu

contexto.

Diante de tais aspectos, acredita-se que a falta de hábito de leitura é uma

questão socioeconômica e de formação familiar, pois a classe de menor poder

aquisitivo vive num ambiente inóspito à leitura e seus familiares tão pouco usam

livros como um dos hábitos do lazer e ainda há a questão social, ambiental somada

a deficiência econômica a escolar, fazendo-se responsáveis pelo agravamento do

problema que leva o aluno a ter deficiência e o pouco interesse em relação à leitura.

E para que esse desejo do prazer que a leitura traz seja despertado se faz

necessário: motivar a leitura como fonte de prazer e não simplesmente uma

obrigação curricular; despertar e aguçar a curiosidade pela literatura de cordel;

proporcionar e promover a qualidade para a formação hábito e o prazer que a leitura

oferece através da literatura de cordel.

A partir das questões aqui elencadas, o intuito da construção desse artigo foi:

explicitar as contribuições que as atividades ocorridas entre os anos de 2013 e 2014

no Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE3 acarretaram na vida

profissional da professora participante, relatar as trocas de experiências e diálogos

feitos no Grupo de Trabalho em Rede – GTR4; expor o projeto de implementação da

unidade didática elaborada e como se deu o seu desenvolvimento.

3 GTR é um ambiente virtual que possibilita a formação continuada do professor/gestor PDE.

4 O PDE é uma política pública de Estado que estabelece o diálogo entre os professores do ensino

superior e os da educação básica, através de atividades teórico-práticas orientadas.

Page 4: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

3

2. METODOLOGIA E AVALIAÇÃO

A metodologia utilizada para a implementação do projeto abrangeu 5

módulos, cuja quantidade de aulas para cada um foi distribuída considerando a

necessidade de desenvolvimento das atividades planejadas.

As atividades do Projeto foram avaliadas a partir de vários seguimentos da

Secretaria da Educação - SEED, tais como fichas de acompanhamento próprias do

PDE, analisadas por um membro da SEED e pela equipe pedagógica da escola,

além da complementação avaliativa do Professor orientador Marcio Matiassi

Cantarin da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.

Para a construção deste artigo também pautou-se em alguns autores de

modo a subsidiar teoricamente o trabalho, tais como: Freire (1988), Molina (1992),

Demo (1993), Cagliari (1993) Silva (1993), Bamberger (1994) e Lajolo (1988).

3. OBJETIVOS DO PROJETO

O objetivo geral do projeto foi despertar o interesse e manter o hábito da

leitura, contribuindo para a formação prazerosa da leitura.

Especificamente, as intenções da implementação do Projeto foram: conhecer

a manifestação da nossa literatura de cordel e sua caracterização (leitura, escrita e

metrificação dos versos); possibilitar ao aluno o conhecimento da linguagem

cordelista, enfocando a cultura nordestina em favor da valorização das nossas

raízes; promover uma aproximação do aluno com a cultura popular nordestina e

estimular a produção e a edição de cordel além de promover hábito do contar

história para outros alunos.

4. IMPLEMENTAÇÃO DAS AÇÕES DO PROJETO

Anterior à implementação das atividades planejadas no projeto em sala de

aula no 1º ano do Ensino Médio, foi realizada a apresentação do material aos

professores e equipe pedagógica da escola, a fim de que todos tivessem

conhecimento do trabalho, bem como da importância e valorização da leitura na

formação dos educandos.

Page 5: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

4

Por isso, defende-se que o professor é o instrumento que pode despertar a

curiosidade, o interesse, o amor pela leitura, desde que seja consciente dessa

responsabilidade. O docente em vez de ser explicador, deverá provocar a pesquisa,

a descoberta e a reflexão. Todo o professor, não importa a disciplina que ministre,

deve ser um professor de leitura. As escolhas dos textos muitas vezes não são

atraentes, próprios para a idade e nível intelectual e mental do aluno contribuindo

assim com o fracasso da leitura: “Os textos lidos por obrigação não são

incorporados ao seu mundo, não fazendo parte da sua vida” (MOLINA, 1992).

4.1 MÓDULO I - A importância da literatura de cordel

Este primeiro módulo teve por objetivo mostrar a importância da literatura de

cordel em âmbito nacional, estimulando nos educandos a busca por este tipo de

leitura.

Para tanto, um vídeo do Globo Rural5 foi exibido. Posteriormente, os alunos

fizeram um relatório sobre o conteúdo da reportagem de modo que a sua temática

fosse mais bem compreendida.

Além disso, propôs-se que os alunos escolhessem uma reportagem que

abordasse o seu contexto social para também fazer um relatório, com o intuito de

compreenderem que cada comunidade carrega consigo suas crenças, valores e

vivências, isto é, sua cultura.

Esse relatório possibilitou a análise de como os alunos estão caminhando

referente ao modo de escrita e interpretação. Pode-se verificar que há a

necessidade de assistirem o vídeo mais de uma vez para que pudessem

compreender seu conteúdo de fato. No que condiz à escrita, a maioria dos alunos

apresentou dificuldades em evidenciar no texto o que viram no vídeo. Além disso,

apareceram muitos erros gramaticais e de concordância. Por isso, optou-se por

utilizar o dicionário para que os alunos pudessem sozinhos encontrar as respostas

para as dúvidas que tinham. No que se refere aos erros de concordância, fez-se

uma explicação para lembrar seus usos e àqueles que ainda tinham dúvidas, foram

auxiliados individualmente.

5 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=7DosjK6GSUQ

Page 6: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

5

Após, houve a leitura oral dos relatórios redigidos pelos alunos e fez-se uma

discussão sobre as escritas. Esse momento foi muito enriquecedor para todos, pois

embora uma boa parcela da turma more em regiões próximas uns dos outros,

diferentes olhares apareceram sobre um mesmo tema, tendo em vista que alguns

alunos selecionaram a mesma reportagem para realizar a atividade. Contudo, a

essência cultural não mudava, permanecia a mesma para todos.

Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas

obras para que os alunos pudessem estabelecer uma relação com o gênero literário

e desta forma conhecer e entender suas particularidades. Essa atividade de fato foi

muito importante para os alunos devido a diversos aspectos: primeiro porque os

próprios estudantes construíram o painel e, quando há a intervenção nesse

processo sentem muita satisfação, porque o trabalho é resultado do esforço deles.

Figura 1 - Alunos confeccionando o painel

Além disso, a turma foi dividida em grupos e por meio da análise dos cordéis

apresentados na reportagem anteriormente apresentada, foram trabalhados o tema,

o autor, as estrofes, versos e métrica do texto, escolhido livremente por cada equipe.

Esse momento foi essencial tanto para os alunos, que puderam observar

atentamente as características poéticas de um cordel, quanto para o professor que

pôde analisar o nível de compreensão dos alunos referente ao texto lido que, diga-

se de passagem, foi excelente, pois não ocorreram grandes dificuldades.

Fonte: Arquivo da autora

Page 7: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

6

4.2 MÓDULO II – Histórico da Literatura de Cordel

Nesse momento um breve histórico da literatura de cordel foi apresentada em

Power Point aos alunos, pois defende-se a necessidade de contextualizar

teoricamente o que está sendo trabalhado em sala de aula, uma vez que pode gerar

um maior interesse dos alunos pela temática trabalhada, como é o caso da turma

em que a atividade ocorreu.

Os alunos se envolveram profundamente com a literatura de cordel e

passaram a tomar gosto por apreciá-la no momento em que conheceram sua

história e, mesmo havendo momentos em que pareciam estar cansados de ler,

prosseguiram porque estavam ansiosos por conhecimento.

Nesse sentido, compreende-se que o exercício da leitura é algo que cansa e

causa tensão aos músculos e ossos, mas que são entorpecidos pelo prazer quando

se chega à conclusão daquilo que está lendo. A leitura permite viajar a outros países

ambientes, culturas, ir ao passado e futuro, conhecer a tecnologia, a natureza, o

espaço interno e externo, permite tocar o coração e a razão e conhecer-se e

conhecer melhor as pessoas.

Uma das coisas que mais chamou a atenção dos alunos foi o fato de que a

literatura de cordel faz parte do meio popular, principalmente da região nordestina e,

por serem bastante criativos, há cordelistas conhecidos como repentistas que criam

as letras na hora, de acordo com o pedido da plateia que lhes dão o assunto, e os

cantadores obedecem geralmente cantam em dupla, e esses tem revelado os

escândalos sociais e políticos e econômicos que nos últimos anos têm nos

castigados. Os alunos ficaram se imaginando durante uma apresentação de rua e

alguns comentaram sobre temas variáveis que iriam solicitar se tivessem a

possibilidade.

Outro ponto que fez com que os alunos refletissem bastante foi o fato de que

os cantores e escritores de cordel têm sobrevivido à custa de muita luta, uma vez

que há diversos outros estilos literários que tomam espaço na literatura brasileira. E

graças à vontade de fazer algo diferente o cordel tem rompido barreiras que

pareciam intransponíveis, para poder ocupar o lugar que está sendo habitado por

coisas que não são do nosso País, no qual muitas pessoas dão maior relevância a

estas outras culturas, sem ao menos, na maioria das vezes, buscar conhecer a

literatura brasileira.

Page 8: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

7

Também o que os estudantes ficaram admirados foi em relação a forma como

os livros de cordéis que narram os mais diversos assuntos, desde histórias de amor,

as aventuras de cangaceiros e acontecimentos importantes, são vendidos, no qual

os escritores na tentativa de melhor vender sua mercadoria, costuma ler em voz alta

o conteúdo do livro para depois oferecê-lo aos prováveis compradores. Isso chamou

a atenção dos alunos principalmente pela forma irreverente que os vendedores

carregam consigo para elevar o seu produto. E se os vendedores persistem na

propagação desse tipo de texto é porque acarreta benefícios, no qual em meio há

tantas dificuldades sociais, há quem reconheça a devida importância da literatura de

cordel para difundir a cultura nordestina.

Sobre isso, é possível compreender que a escrita e a leitura são importantes

instrumentos para a libertação do povo e para a reconstrução da nossa sociedade.

Sendo um mecanismo de conscientização a leitura se constitui em uma forma de

encontro entre o homem e a realidade sociocultural cujo resultado é um situar-se

constantemente aos dados dessa realidade, expresso e interpretada através da

linguagem. Na perspectiva de Demo (1993, p. 254): “uma sociedade que não

questiona e, sobretudo, não se questiona, jamais muda de elite. Sem mudança de

elite, não há desenvolvimento”.

4.3 MÓDULO III – Música “Pavão misterioso”

Este módulo iniciou com a exibição da música Pavão Misterioso6,

relacionando a mesma com a biografia de Bartolomeu Gusmão e o mito de Ícaro

que, posteriormente foi discutida com a turma.

As atividades desse módulo objetivaram praticar a leitura poética, se atendo à

análise do conteúdo e às formas de organização e distribuição do cordel trabalhado,

ou seja, buscando conhecer e compreender a métrica do texto.

Iniciou-se a leitura em sala de aula do cordel “Romance do Pavão Misterioso”

escrito por José Camelo. Em seguida, propôs-se que os alunos prosseguissem com

a leitura em casa, cujo intuito era de que houvesse a prática de leitura externamente

à escola, bem como a apreciação poética da obra.

6 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=vEqmwTrCNvg

Page 9: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

8

Nesse sentido, há de se considerar que o ato de ler é elemento de referência

primordial para o ingresso e a participação na sociedade, tornando-se assim uma

ferramenta básica de comunicação do homem. É a chave para formar um saber já

adquirido, fazendo com que esse homem se torne um cidadão inserido na civilização

moderna com perfeito domínio dos símbolos da comunicação. Daí surge à

complexidade do ato de ler.

A aquisição da leitura é necessária a todos os indivíduos numa sociedade

letrada, tornando-os cidadãos sociais. Portanto, é um instrumento de acesso à

cultura e à realidade social de grande desenvolvimento do ser humano. O acesso à

informação possibilita a percepção da realidade do individuo, de seus problemas e

conflitos, fazendo com que as pessoas tenham noção dos seus direitos e deveres

podendo exercer a sua cidadania com maior flexibilidade.

A leitura é compreendida como um ato de decifração e decodificação,

conforme Cagliari (1993, p.150)

O leitor deverá primeiro decifrar a escrita depois entender a linguagem encontrada e em seguida decodificar todas as implicações que um texto tem, e finalmente refletir sobre isso formar o próprio conhecimento e opinião a respeito do que leu. A leitura sem decifrar não funciona adequadamente assim como a decodificação e demais componentes referentes à interpretação se torna estéril e sem grande interesse.

A práxis da leitura, por sua vez, deve envolver constatação, reflexão e

transformação de significados atribuídos, pois esse ato não pode ser desvinculado

do compreender criticamente as ideias evocadas por um documento escrito.

O professor é o grande agente que deve incentivar o hábito e a formação do

hábito pela leitura. Mas, dado a sua condição de oprimido, também é um carente da

leitura, com salários insuficientes que não permitem a compra de livros e o número

excessivo de aulas bloqueia os momentos para a leitura, além dos cursos de

licenciatura que não fornecem na sua maioria uma pedagogia para a leitura (SILVA,

1993).

E ainda como diz Bamberger (1994): “Obedecendo à lei do menor esforço,

ninguém gosta de fazer o que lhe é particularmente difícil. É mais fácil procurar outra

forma de preencher o tempo através de informações, ou de se contentar com a

ociosidade intelectual”.

Page 10: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

9

Devido à literatura de cordel ser composta por muitas rimas, além de um

conteúdo bastante importante, os alunos se interessaram por realizar a leitura em

casa, pois muitos estudantes vinham na outras aula ou até mesmo me encontravam

nos corredores da escola e comentavam sobre o que já haviam lido ou em qual

estrofe estavam. Há alunos que se interessaram também por buscar novos textos da

literatura de cordel para apreciar.

Talvez, o fato de alguns alunos não se mostrarem inicialmente tão

interessados por realizar a leitura fora do ambiente escolar se dê pelo motivo de não

haver o incentivo à leitura em casa como defende Solè (1999, p.51)

Muitos alunos não têm muitas oportunidades, fora da escola, de familiarizar-se com a leitura; talvez não vejam mais adultos lendo; talvez ninguém lhes leia livros com frequência. A escola não pode compensar as desigualdades sociais que nos assolam, mas pode fazer muito para evitar que sejam acirradas em seu interior. Ajudar os alunos a ler. A fazer com que se interessem pela leitura, é dotá-los de um instrumento de aculturação e de tomada de consciência, cuja funcionalidade escapa dos limites da instituição.

Daí a importância da família também no processo de formação do leitor,

pois defende-se que a responsabilidade por formar o aluno leitor não condiz

somente à escola, mas deve haver um despertar à leitura fora do chão da sala de

aula, com um trabalho em conjunto entre família e escola.

4.4 MÓDULO IV – Filme “A Quenga e o delegado”

Nesse módulo foi exibido o filme "A Quenga e o Delegado"7 inspirado no

cordel de Antonio Kelvisson Vianna de Lima, para reforçar o gênero Cordel no

aprendizado de literatura, mostrando a importância da literatura regional através do

filme – estimulando nos educandos a valorização da literatura nacional.

Desta maneira, o aluno teve a possibilidade de ampliar seu conhecimento,

identificando a linguagem de cordel, narrativa, estrutura em versos e rimas e assim

desenvolveu seu interesse sobre a linguagem cordelista. Houve a necessidade da

compreensão crítica do ato de ler que “(...) não se esgota com a decodificação da

palavra escrita ou da linguagem escrita, ela se antecipa e se alonga na inteligência

do mundo”. (FREIRE, 1988, p.11).

7 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=LtX8sy4MKg

Page 11: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

10

Para contextualizar melhor esse conhecimento, foi produzido um painel

enfocando questões de seca, de trabalho, diferenças sociais, crenças, religiosidade,

mito, lendário, críticas sociais e políticas que influenciam a literatura de cordel.

Essa atividade possibilitou a reflexão dos alunos sobre aspectos sociais que

fazem parte da vivência dos nordestinos e nos quais, na maioria das vezes, são

motivos para a escrita de cordéis. Os alunos se mostraram bastante sensibilizados

com as condições que os brasileiros do nordeste vivem e ressaltaram a importância

de colocar esses sentimentos na escrita de um cordel.

4.5 MÓDULO V – Valorização dos aspectos culturais e sociais nordestinos

O intuito do conjunto de atividades trabalhadas nesse módulo foi conhecer e

divulgar o grande cordelista Patativa do Assaré, valorizando os aspectos culturais e

sociais nordestinos.

Para tanto, apresentou-se primeiramente a biografia do autor em Power Point

para que os alunos conhecessem quem ele foi e o quão importante é a sua obra

para a literatura de cordel.

Para conhecer essa riquíssima obra, os alunos foram levados até o

laboratório de informática para pesquisar versos de Patativa do Assaré que,

posteriormente foram ensaiados levando em consideração a entonação de voz,

fluência, ritmo e dos sentimentos que o texto quer transmitir.

Também em Power Point foram apresentadas as mandalas e xilogravuras dos

versos do autor. Nesse momento, os alunos tiveram a liberdade de escolher o verso

que mais gostaram e ilustrá-lo utilizando mandalas.

Figura 2 – Cordel ilustrado com mandala

Fonte: Arquivo da autora

Page 12: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

11

Figura 3 – Cordel ilustrado com mandala

Além disso, os alunos também escolheram as xilogravuras para imprimi-las e

acrescentar ao trabalho que em seguida seria exposto no sarau de cordel para a

comunidade escolar.

Fonte: Arquivo da autora

Fonte: Arquivo da autora

Figura 4 – Cordel ilustrado com mandala

Page 13: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

12

Figura 5 – Xilogravura dos cordéis escolhidos

Figura 6 - Xilogravura dos cordéis escolhidos

Nessa exposição também foram apresentadas algumas literaturas de cordel

utilizando a música, uma vez que alguns alunos que possuíam aptidão com

instrumentos musicais se interessaram pela possibilidade de apresentar dessa forma

o cordel e de fato o realizaram de maneira brilhante.

Além de todas essas atividades, foi proposta a produção de um cordel em

equipe, utilizando os conceitos trabalhados em aula. Essa atividade final foi

importante para que os alunos se sentissem produtores de escrita, na qual a

Fonte: Arquivo da autora

Fonte: Arquivo da autora

Page 14: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

13

professora pôde perceber as dificuldades e aptidões existentes no trabalho com a

literatura de cordel.

A exposição dos materiais produzidos durante a implementação foi realizada

no sarau de cordel, em sala ambiente que retratou o sertão nordestino, baseado nos

versos de Patativa de Assaré e a contação da poesia de cordel “A vaca estrela e o

boi fubá”, incluindo a culinária nordestina.

Figura 7 - Exposição dos materiais produzidos

Fonte: Arquivo da autora

Figura 8 – Exposição dos materiais produzidos

Fonte: Arquivo da autora

Page 15: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

14

Sobre isso, é preciso ressaltar que não se pode esquecer a importância do

“contar”/ouvir. Toda a literatura vem da maravilhosa mania do ser humano de contar,

e recontar histórias. Contar uma história é representar e, de certa forma, produzir um

novo sentido ao texto. É um trabalho de co-autoria entre contador e autor. Leitores

são pessoas que absorvem mais conhecimento, tornam-se capazes de transformar

sua realidade. Por isso, a necessidade de fazer do aluno um contador da literatura

de cordel nessa atividade.

Figura 9 – Produção dos alunos

Figura 10 - Produção dos alunos

Fonte: Arquivo da autora

Fonte: Arquivo da autora

Page 16: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

15

Figura 11 - Produção dos alunos

As atividades aplicadas ao longo desse módulo foram bastante significativas

para a concretização do conhecimento da cultura nordestina, bem como a leitura e

escrita da literatura de cordel. Os alunos sentiram prazer em confeccionar os painéis

com as atividades e principalmente por terem a possibilidade de produzirem um

cordel e assim como o povo nordestino, expressarem seus sentimentos advindos de

diversos aspectos, entre eles, sociais, econômicos, culturais e políticos.

5. AS VIVÊNCIAS E DISCUSSÕES ADQUIRIDAS NO GRUPO DE TRABALHO EM

REDE – GTR

O Grupo de Trabalho em Rede é um ambiente virtual que possibilita a

formação continuada do professor/gestor PDE, por meio do desenvolvimento do

projeto de implementação com um embasamento teórico, ligado a uma Instituição de

Ensino Superior que, neste caso, foi a Universidade Tecnológica Federal do Paraná

– UTFPR.

Nessa ferramenta virtual, o professor PDE atua como um tutor na modalidade

de Educação a Distância, cuja função se restringe a conduzir e coordenar um grupo

de professores da Rede Estadual de Educação Básica de Ensino do Paraná de

diversas regionais nos encaminhamentos das discussões, troca de experiências,

Fonte: Arquivo da autora

Page 17: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

16

debates, enfim nas atividades propostas no curso sobre o Projeto de implementação

produzido.

O diálogo ocorreu inicialmente a respeito da pertinência do tema para a

realidade das Escolas Públicas do Paraná, por meio da reflexão da relevância da

proposta pedagógica para o contexto escolar, como se depreende da opinião

selecionada:

Sujeito 1: “(...) utilizaria a presente proposta em virtude da sua viabilidade nas

nossas escolas públicas . O Cordel trabalha com a linguagem popular, porém

com uma riqueza cultural muito grande. Os textos são de fácil acesso permitindo

o manuseio por todos os alunos. Ler é „brincar‟. O cordel permite isso. Diante da

diversidade que lidamos na escola esse trabalho será pertinente para uma troca

de culturas e incentivo para inserir os alunos no universo da leitura.”

Uma das atividades que mais chamou a atenção do grupo de professores e

que gerou discussões produtivas foi o uso de reportagem para trabalhar os

conteúdos da Literatura de Cordel, como mostra o relato a seguir:

Sujeito 2: “(...) penso que o uso do vídeo documentário do Globo Rural, como é

um programa voltado para telespectadores em diversos níveis de linguagem,

torna-se atrativo também para o aluno. Inclusive, penso que a atividade de

montar um painel sobre os autores citados na reportagem seria de grande ajuda

para levar o aluno a sistematizar o que assistiu no vídeo, principalmente com

turmas de 6º ano (...)”.

Também, durante algumas atividades do GTR os professores poderiam

apresentar propostas de trabalho para com a Literatura de Cordel que não

continham na Unidade Didática ou adaptar/modificar alguma que acreditasse ser

interessante para a prática pedagógica. Uma das atividades que mais chamou a

atenção do grupo foi a seguinte:

Sujeito 3: “(...) a criação de Literatura de Cordel, buscando as histórias de nossa

comunidade, a realidade do nosso aluno muitas vezes ficam esquecidas na

memória dos mais velhos. Estou lendo Descanse em paz meu amor de Pedro

Bandeira, um grupo de jovens que senta para contar fatos que seus pais ou avós

contavam, imaginei que seria tão interessante se conseguíssemos alguma coisa

parecida, e depois apresentar para a escola, talvez não seja fácil, mas seria bem

produtivo, especialmente para nossa juventude que está acostumada apenas

Page 18: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

17

com que lhe é proposto, e pouco se faz pesquisa para buscar nova histórias em

baús de nossos avós.”

Em alguns relatos do GTR se evidenciaram as dificuldades possíveis que

podem surgir durante a implementação das atividades na escola pelos professores

participantes do curso, levando em consideração o contexto de cada realidade

escolar, mas que pode ser planejado e colocado em prática adaptando as atividades

para que a literatura de cordel não deixe de ser trabalhada em sala de aula, como se

pode constatar na fala abaixo:

Sujeito 4: “(...) além de tantos motivos apresentados aqui que faz com que

nossos alunos não sejam leitores, no contexto do projeto Literatura de Cordel,

talvez encontramos dificuldades, pois não é uma leitura cotidiana, inclusive de

nós professores. As bibliotecas dispõem de muito pouco material desse gênero e

as que tem não utilizam e quanto a aquisição de livros de cordel pelo nossos

alunos torna-se ainda mais difícil. Cabe a nós professores, juntos, descobrirmos

meios prazerosos de trabalhar tal literatura.”

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho elencado ao longo desse artigo possibilitou ao aluno o

conhecimento da literatura de cordel que talvez jamais pudesse ter contato em ao

longo da sua trajetória escolar ou até na vida pessoal. Além disso, por meio das

atividades propostas os estudantes sentiram se mais motivados para o criar ou

prosseguir com o hábito de leitura, uma vez que demonstraram o gosto pela forma

poética que compõe a literatura de cordel, bem como os conteúdos que esta

explicita.

Como observado ao longo do trabalho, constata-se que os alunos

perceberam o grau de importância da literatura de cordel não somente para o povo

nordestino, mas para o povo brasileiro em geral, pois em seus versos a linguagem e

a realidade se relacionam. E por meio da leitura crítica do cordel é que se chega à

compreensão da leitura, isto é, do aspecto que aquele determinado texto quer

exprimir no leitor.

Page 19: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

18

Por isso, acredita-se que cabe aos educadores comprometidos com o ensino-

aprendizagem e com a realidade social, política e econômica proporcionar e facilitar

este saber crítico e a melhor maneira é através da leitura.

Sabe-se que a escola é a entidade que recebe a incumbência de ensinar a

ler, para tanto deve estar preparada, a fim de dar oportunidade e assim promover à

assiduidade a literatura, cumprir seu papel de modo global, transformando indivíduo

habituado à leitura em um leitor e não um mero decodificador de símbolos.

(LAJOLO, 1988). Cabe ao professor monitorar e orientar essas vivências,

despertando assim o interesse para a leitura que o professor deseja.

Oferecendo ao aluno um elenco de alternativas válidas para que ele escolha

aquele livro que mais lhe interessa assim o professor estará atingindo os objetivos

educacionais relacionados à leitura e a literatura.

Em suma, acredita-se que os alunos participantes das atividades, bem como

a comunidade escolar, prestigiaram o trabalho realizado e se anteriormente não

reconheciam o valor da cultura popular nordestina, agora o reconhecem por terem a

oportunidade de conhecer e se relacionarem com a mesma, por meio da leitura e

interpretação dos conteúdos que os cordéis carregam em seus versos.

Para concluir, gostaria de explicitar a relevância do PDE para minha formação

e ação docente, suscitando extrema relevância ao meu trabalho como professora de

Língua Portuguesa na Rede Estadual de Educação Pública do Paraná. Isso se deve

principalmente pela relação estabelecida com docentes do Ensino Superior, troca de

experiências e diálogo com professores de diversos núcleos da educação

paranaense, através do GTR e pelo estudo teórico realizado para a construção do

trabalho.

7. REFERÊNCIAS

ABAURRE, Maria Luiza M. PONTARA, Marcela. Leitura Brasileira, Tempos Leitores e Leituras. Volume único. São Paulo, editora Moderna, 2005.

BAMBERGER, Richard. Como incentivar o Hábito da Leitura. 3ª ed. Ática. São Paulo,1994).

DEMO, Pedro. Desafios Modernos da Educação. 14ª ed. editora Vozes, 1993.

Page 20: OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · Um painel foi confeccionado com os escritores do cordel e suas respectivas obras para que os alunos pudessem estabelecer uma

19

FREIRE, Paulo. Dificuldade na aprendizagem da leitura. São Paulo, ed. Cortez, 1990.

LAJOLO, Marisa. FIRBERMAN, Regina. A formação da leitura no Brasil, São Paulo, Ática 1996.

SILVA, Ezequiel Teodoro da, Leitura & Realidade Brasileira 3ª ed. Porto Alegre, Mercado Aberto,1993.

ZILBERMAN, R; Silva. E. T. (orgs.) Leituras Perspectivas interdisciplinares. São Paulo. Ática, 2002.