os agentes sociais e a produção do espaço urbano - o caso de altamira

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Este artigo tem como objetivo identificar os agentes sociais produtores do espaço urbano na Amazônia, assim como identificar a estrutura resultante dessas ações. Observou-se que até a metade do século XX, as estratégias de ocupação do território não implicaram em mudanças socioespaciais significativas e o espaço configurava-se a partir de regras próprias que mesclavam o interesse da elite local ao modo de vida da população. Após este período, o governo federal passou a ser o agente principal na definição de estratégias de intervenção no território amazônico, pautando a produção do espaço urbano na fronteira amazônica pela demanda do capital internacional, materializado pela financeirização da economia.Elegemos como estudo de caso a cidade Altamira, que teve seu espaço urbano modificado em função dos “Grandes Projetos” e que atualmente passa por novas modificações decorrentes das ações do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Com a construção da Hidrelétrica de Belo Monte, observou-se em Altamira um novo ciclo de expansão urbana, com crescente participação do setor privado, seja através da implantação de loteamentos e condomínios, ou de conjuntos habitacionais de baixa renda. Este padrão de expansão transpõe para a cidade a generalização de processos de alto impacto social e ambiental no espaço urbano, e de grande tolerância e passividade diante dos fenômenos de concentração fundiária, transformação intensiva do ambiente natural, urbanização em grande escala, homogeneização da paisagem e esgarçamento do tecido urbano.

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  • OS AGENTES SOCIAIS E A PRODUO DO ESPAO URBANO: O

    CASO DE ALTAMIRA/PA

    Marclia Regina Gama NEGRO

    Doutoranda em Desenvolvimento Sustentvel do Trpico mido, NAEA/UFPA,

    docente da Universidade da Amaznia/UNAMA, [email protected].

    Lucas Souto Cndido

    Graduando em Arquitetura e Urbanismo, FAU/UFPA, bolsista do Laboratrio Cidades

    na Amaznia/LABCAM, [email protected].

    Resumo

    Este artigo tem como objetivo identificar os agentes sociais produtores do

    espao urbano na Amaznia, assim como identificar a estrutura resultante dessas aes.

    Observou-se que at a metade do sculo XX, as estratgias de ocupao do territrio

    no implicaram em mudanas socioespaciais significativas e o espao configurava-se a

    partir de regras prprias que mesclavam o interesse da elite local ao modo de vida da

    populao. Aps este perodo, o governo federal passou a ser o agente principal na

    definio de estratgias de interveno no territrio amaznico, pautando a produo do

    espao urbano na fronteira amaznica pela demanda do capital internacional,

    materializado pela financeirizao da economia.

    Elegemos como estudo de caso a cidade Altamira, que teve seu espao

    urbano modificado em funo dos Grandes Projetos e que atualmente passa por novas

    modificaes decorrentes das aes do Programa de Acelerao do Crescimento PAC.

    Com a construo da Hidreltrica de Belo Monte, observou-se em Altamira um novo

    ciclo de expanso urbana, com crescente participao do setor privado, seja atravs da

    implantao de loteamentos e condomnios, ou de conjuntos habitacionais de baixa

    renda. Este padro de expanso transpe para a cidade a generalizao de processos de

    alto impacto social e ambiental no espao urbano, e de grande tolerncia e passividade

    diante dos fenmenos de concentrao fundiria, transformao intensiva do ambiente

    natural, urbanizao em grande escala, homogeneizao da paisagem e esgaramento do

    tecido urbano.

  • Introduo

    De acordo com Corra (1994), o espao urbano capitalista um produto social,

    resultado de aes acumuladas atravs do tempo, e engendradas por agentes que

    produzem e consomem espao. Nesse contexto, este artigo tem como objetivo

    identificar os agentes sociais produtores do espao urbano na Amaznia, assim como

    identificar a forma resultante dessas aes.

    O artigo foi estruturado em trs partes: a primeira faz uma breve reviso dos

    conceitos relativos produo do espao urbano e o papel dos agentes sociais na

    construo da cidade capitalista. A segunda contextualiza o processo de urbanizao na

    Amaznia com nfase na mudana ocorrida na organizao do espao a partir das

    estratgias do governo federal na segunda metade do sculo XX, o que resultou na

    introduo de novos agentes no territrio e na modificao do espao urbano. Na

    terceira parte apresentamos como estudo de caso a cidade de Altamira que, desde 2011,

    com o incio das obras da Hidreltrica de Belo Monte, vivencia um segundo processo de

    expanso urbana, com processos similares queles vividos por ocasio dos projetos do

    Estado desenvolvimentista.

    Por fim, conclumos que a vinculao da produo do espao urbano na

    Amaznia s escalas de capital global inseriu na regio novos agentes que carregaram

    consigo um ritmo e intensidade de transformaes discordantes da realidade local,

    potencializando problemas sociais e ambientais.

    1. A Produo do Espao Urbano

  • De acordo com Corra (1999, p. 10), a ao dos agentes produtores do espao

    urbano complexa e deriva da dinmica de acumulao do capital, na medida em que a

    produo do espao passou a ser um elemento estratgico, seja pela mercantilizao da

    terra, seja por seu parcelamento, ou como vem ocorrendo mais recentemente, por sua

    crescente incluso nos circuitos de valorizao do capital financeiro (Botelho, 2007).

    Corra (1999, p.6) observou que o espao urbano resultante dessa dinmica

    apresenta-se simultaneamente: 1) fragmentado e articulado, cada uma de suas partes

    mantm relaes espaciais com as demais, manifestas no fluxo material (de pessoas e

    cargas) e na circulao e investimentos do capital ainda que com intensidade muito

    varivel; 2) reflexo da ao da sociedade realizada tanto no presente como tambm

    daquelas que se realizaram no passado. O espao da cidade capitalista profundamente

    desigual e por ser reflexo da sociedade o espao urbano tambm mutvel, com ritmos

    e natureza diferenciados e por fim; 3) o espao tambm condicionante da sociedade. O

    condicionamento se d atravs do papel que as obras fixadas pelo homem, as formas

    espaciais, desempenham na reproduo das condies de produo e das relaes de

    produo.

    Para fins de compreenso da dinmica urbana, preciso, antes de tudo, tomar os

    agentes sociais na produo do espao urbano como referncia de anlise, uma vez que

    seus interesses e suas escalas de ao determinam processos que, materializados no

    espao, definem e redefinem a configurao da cidade. Para Corra (1999) os agentes

    produtores do espao urbano so: os proprietrios do meio de produo; os proprietrios

    fundirios; os promotores imobilirios; o Estado e os grupos sociais excludos. De um

    modo geral, Corra (1999) observa que a ao dos agentes se faz dentro de um marco

    jurdico que regula a atuao deles, no entanto, este marco no seria neutro, refletindo o

    interesse dominante de um dos agentes, alm dos interesses em comuns que resulta na

    integrao daqueles que detm o capital. Por fim, as estratgias utilizadas por esses

    agentes variam no tempo e no espao, e esta variabilidade decorre tanto de causas

    externas aos agentes, como de causas internas, vinculadas s contradies inerentes ao

    tipo de capital de cada agente face ao movimento geral de acumulao capitalista e dos

    conflitos de classe.

    Nesse contexto, Bourdieu (1997) observa que no h espao em uma sociedade

    hierarquizada que no exprima as hierarquias e as distncias sociais. Para o autor, a

    posse do capital proporciona poder sobre o espao, sob suas diferentes espcies,

    influenciando diretamente na distribuio de bens e servios e tambm na distribuio

  • de agentes individuais e de grupos fisicamente localizados e dotados de oportunidades

    para a apropriao destes.

    2. O papel dos agentes sociais no processo de urbanizao da Amaznia.

    At a segunda metade do sculo XX as formas de acesso a terra na

    Amaznia no estavam subordinadas a condies fundirias, relaes sociais e regras de

    propriedade historicamente cristalizadas; nesse contexto, predominavam as

    necessidades, objetivos e concepes dos prprios ocupantes. Portanto, a terra no tinha

    sentido de propriedade privada, servindo a produo familiar e coletiva (Musumeci,

    1988).

    Inicialmente, as estratgias de ocupao do territrio no implicaram em

    mudanas socioespaciais significativas (Vicentini,2004), uma vez que o agente

    colonizador, no caso os portugueses, no foi motivado por um impulso povoador, que

    geraria uma sociedade agrcola e sedentria, mas sim de coleta de produtos da floresta e

    preao (Weinstein,1993). Esse sistema desempenhou um importante papel na

    organizao do espao de uma rede proto-urbana em formato dendrtico (Corra, 1997).

    Seguindo o plano urbanstico definido para as colnias portuguesas no

    perodo Pombalino (Daou, 2004), observa-se que as cidades seguiam um padro de

    organizao do centro prximo ao rio, onde se localizavam as construes mais

    expressivas como a prefeitura e a igreja. Na periferia, as ruas e edificaes tornavam-se

    mais simples e dispersas e a cidade normalmente era limitada por cursos dgua

    (Cardoso et al. 2006, p.57).

    Na virada do sculo XX, a explorao de borracha na Amaznia j servia ao

    mercado internacional para a produo de produtos manufaturados, contudo, o

    investimento no setor produtivo limitava-se a abertura dos trechos para explorao,

    compra de ferramentas rudimentares e construo de barraces. Ao contrrio do que

    ocorria com as economias agrcolas do Brasil, a propriedade fundiria no entrava na

    equao, uma vez que, dada a abundncia de terras, no havia preocupao em adquiri-

    la atravs de registros e demarcaes. Nesse perodo, prevaleciam os interesses da elite

    local, representada por: donos de embarcaes, latifundirios, empresrios urbanos,

    grupos inter-relacionados por laos matrimoniais e socioeconmicos (Browderet al.,

    2006, p.80).

  • Naquele perodo, as metrpoles (Manaus e Belm), que detinham status de

    cidade primaz, contaram com um refinamento urbanstico e concentravam a vida

    econmica, poltica e cultural. Por outro lado, as cidades de menor porte ou de segundo

    escalo (Corra, 2011, p.206) no se configuravam como espao de produo, mas de

    troca dos produtos extrados da zona rural e da floresta. Cada cidade, por menor que

    fosse, era um ponto de apoio para uma extenso do territrio rural, no que se refere a

    assuntos administrativos e uma esperana de acesso educao e sade (Cardoso et al.,

    2006, p.58).

    Nesse sistema, o espao amaznico foi organizado a partir da combinao

    de regras prprias que se baseavam na dinmica de produo mercantil existente na

    regio, que por vez era associada ao atraso pelo Estado. A partir da segunda metade do

    sculo XX, o governo federal passou a ser o principal agente na definio de

    instrumentos de planejamentos oficiais produzidos para a gesto das diferenas

    regionais1 que se caracterizaram pela centralizao de decises e aes e

    desconhecimento das circunstncias distintas experimentadas pelas grandes regies do

    pas. O governo federal apostou na introduo de atores e prticas exgenas alinhadas

    com o paradigma do capital, altamente dependentes de capital externo e do

    financiamento privado.

    Em relao produo do espao, Becker (1990, p.17-18) afirma que o

    Estado criou condies2 para a apropriao privada das terras devolutas que foram

    distribudas de duas formas: 1) entre agentes pertencentes s diversas fraes do capital,

    1 No intuito de enfrentar os problemas decorrentes de uma industrializao dependente de capital intensivo,

    do aumento vertiginoso da participao do Estado na economia, da estagnao do setor agrcola e da baixa

    capacidade da absoro de mo-de-obra disponvel, foram lanados o Plano Trienal, o Plano de Ao Econmica do

    Governo (PAEG), o Programa Estratgico de Desenvolvimento, o I e II Plano Nacional de Desenvolvimento

    Econmico e Social (I e II PND), que geraram programas federais tais como o Programa de Integrao Nacional

    (PIN), o Programa de Redistribuio de Terras PROTERRA, o Programa Grande Carajs, entre outros, orientadores

    das aes protagonizadas pelo governo federal na regio Amaznica (abertura de estradas, assentamentos rurais,

    frentes de minerao e produo de energia). Ver FERREIRA E PINTO, (2006).

    2 No final de dcada de 60, a SUDAM elevou de 50% para 100% a iseno de impostos para investimentos

    na regio. Pela primeira vez, o crdito subsidiado foi concedido para aquisio de terras em escala substancial. Os

    generosos termos concedidos aos investidores privados na Amaznia deram origem a um aumento dramtico do

    nmero de projetos pecurios aprovados pela SUDAM, criando precedentes sociais e ambientais (HALL, 1989:26), e

    abriram definitivamente a fronteira aos agentes do desenvolvimentismo, a revelia do que significaria a floresta em p

    (ou a preservao do bioma) e suas populaes tradicionais na perspectiva planetria.

  • dentre estes: a) o capital comercial especulativo que se apropriou de grandes pores do

    territrio, constituindo o grupo dos latifundirios; b) os fazendeiros individuais,

    geralmente pecuaristas por tradio; c) os colonos e pequenos produtores agrcolas

    capitalizados; e 2) pela apropriao direta do Estado, com objetivo de: a) realizar a

    distribuio social da terra; b) criar territrios para sua operacionalizao direta em

    reas de conflito de terra; c) promover a gesto associada empresa privada para a

    explorao econmica do grande capital, que se caracteriza como a forma mais recente

    de atuao na fronteira.

    Alm da distribuio das terras, o surgimento de novas atividades ampliou o

    mercado de trabalho, assim como, criou possibilidades de trabalho autnomo (Castro,

    2009, p.22), resultando em um intenso fluxo migratrio para a regio, conforme

    ilustrado no grfico abaixo.

    Grfico 1 Crescimento populacional regional e nacional

    Fonte: IBGE, vrios anos. Elaborao: autor.

    As consequncias destas estratgias na organizao socioespacial das

    cidades amaznicas so diversas. Becker (1990, p.132) observou que esse processo foi

    associado ao crescimento das foras produtivas, e seria atravs da mediao entre os

    ncleos urbanos que o Estado realizaria a gesto e a produo do espao global.

    Todavia, a nfase dada em atividades agrrias deixou em segundo plano qualquer

    detalhamento de como seria a formao do espao urbano no decorrer desse processo,

    embora no incio dos anos 1970 algumas concepes tenham sido desenvolvidas no

    mbito do INCRA (Camargo, 1973) e do SERFHAU (MINTER/SERFHAU, 1972), sem

    0

    50.000.000

    100.000.000

    150.000.000

    200.000.000

    250.000.000

    1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010

    Brasil

    Regio Norte

  • que tenha havido condies (tempo e recursos) para sua implementao, haja vista a

    ecloso da Crise do Petrleo.

    A organizao territorial anterior, assim como, os interesses dos agentes

    locais, foram sublimadas pela magnitude das intervenes em logstica e produo e

    escala de capital introduzida na regio. Apenas os ncleos que detinham alguma

    centralidade ou proximidade com as intervenes federais receberam investimentos de

    modo a serem articulados ao modal rodovirio. Essa superposio tornou tais ncleos

    palcos de conflitos entre diferentes modos de vida, ritmos de ao e dinmicas

    econmicas (Vicentini, 2004), associados a processos de estagnao econmica e

    fragmentao urbana, quando observados sob a perspectiva desenvolvimentista. Tais

    conflitos tambm expressaram insuficincia de regulao urbanstica na gesto da

    transio de transformaes espaciais responsveis pela rpida alterao da identidade

    local, dada homogeneizao das formas urbanas decorrente da recodificao dos

    hbitos e dos valores locais e adio, sobreposio e metamorfose de tipologias.

    Esse quadro foi agravado na medida em que o espao urbano na fronteira

    amaznica foi progressivamente pautado pela demanda do capital internacional,

    materializado pela financeirizao da economia. Nessa nova roupagem, o capital

    tornou-se ainda menos dependente das estruturas fsicas, problema este que se agua

    com a progressiva desarticulao entre os fluxos e estruturas espaciais necessrios

    conexo das novas manifestaes do capital (ex: enclaves do espao de produo,

    condomnios fechados, fazendas equipadas com equipamento de telecomunicaes de

    ltima gerao).

    3. A estruturao do espao urbano na cidade de Altamira.

    O municpio de Altamira se encontra localizado no Oeste do Estado do Par

    (ver imagem 1), com uma populao estimada em 106.768 habitantes (IBGE, 2014), e

    destaca-se por ser o maior municpio em extenso territorial do Brasil. A sede fica s

    margens do rio Xingu e cortada por trs igaraps: Amb, Panelas e Altamira (ver

    imagem 2).

    Figura 1 Localizao de Altamira

  • Fonte: http://www.altamira.pa.cnm.org.br. Acesso em 06/12/2014.

    Figura 2 Manchas de alagamento

    Fonte: Technum, 2010. Elaborao: autores.

    A cidade de porte mdio, sendo considerada como um importante

    polarizador da regio sul do estado. De acordo com Regic (IBGE, 2007), a cidade

  • enquadra-se como Centro Sub-regional B3 e possui como regio de influncia os

    seguintes municpios: Anap, Brasil Novo, Medicilndia, Pacaj, Porto de Moz,

    Senador Jos Porfrio, Uruar, Vitria do Xingu.

    Em Altamira, a produo do espao urbano, assim como, a influncia de

    seus agentes pode ser compreendida dentro do contexto do processo de urbanizao da

    Amaznia, conforme demonstrado na rgua do tempo abaixo:

    Figura 3 Rgua do tempo

    Fonte: Technum, 2010. Elaborao: autores.

    Nesse contexto, podemos subdividir o processo de produo do espao

    urbano de Altamira em trs perodos:

    3.1 - Do processo de ocupao dcada de 70.

    A origem do municpio de Altamira possui relao com a presena dos

    jesutas que l permaneceram at 1750. Aps vencerem a volta do grande do Xingu, os

    missionrios fundaram uma misso religiosa na margem esquerda do rio Xingu, acima

    da foz do igarap Panelas, com objetivo de catequizar os ndios (Technum, 2010).

    3Centro Sub-regional B: cidades onde se manifestam atividades de gesto menos complexas e nveis

    intermedirios de gesto territorial, de rea de atuao e de relacionamentos externos mais reduzidos (Regic, 2007).

  • Durante este perodo, as dificuldades de locomoo encontradas em virtude

    da floresta densa e das cachoeiras e corredeira presentes no rio Xingu levaram

    construo de uma estrada primitiva, ligando a misso localidade de Cachoeirinha. No

    entanto, com a ascenso ao poder em Portugal do Marqus de Pombal no sculo XVIII,

    as obras anteriormente realizadas na Amaznia pelos jesutas foram irremediavelmente

    perdidas (Technum, 2010).

    A reconstruo da estrada que viabilizaria a penetrao nos rios Iriri e

    Fresco foi retomada em meados do sculo XIX pelos Capuchos da Piedade, realizada

    por escravos e ndios, que ligou o baixo ao mdio Xingu (atual So Flix do Xingu) e

    que propiciou afluentes a montante do rio Xingu, visando a explorao da borracha.

    A abundncia de seringais nativos na regio do Xingu fortaleceu sua funo

    de entreposto comercial (Par, 2013) e consolidou uma ocupao permanente

    inicialmente na foz do igarap Panelas, alicerada no sistema de aviamento, tendo como

    suporte uma rede de ncleos articulados pela circulao fluvial que se manteve at a

    segunda metade do sculo XX. Durante este perodo, a ocupao da rea urbana de

    Altamira desenvolveu-se s margens do rio, onde se localizou um centro poltico,

    religioso e comercial, dando origem ao primeiro bairro (Technum, 2010), atualmente o

    bairro Centro.

    O traado ortogonal fechado, assim como, a localizao da praa e da Igreja

    Matriz remetem s caractersticas urbansticas correspondentes ao Perodo Pombalino.

    O bairro desenvolveu-se durante o ciclo da borracha e nele foram construdos os prdios

    mais imponentes e importantes da elite local da poca e autoridades polticas e

    religiosas.

    A crise da borracha e a proibio do mercado de peles de animais levou o

    municpio a um processo de estagnao econmica e, por consequncia, do crescimento

    urbano, que s foi retomado na dcada de 70, perodo em que o municpio foi alvo dos

    Grandes Projetos do Governo Militar.

    3.2 - Dos grandes projetos a estagnao econmica.

    Altamira entra no hall dos Grandes Projetos na dcada de 70, com a

    implementao do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PDN), que tinha como

    objetivo a ocupao territorial e a explorao de recursos naturais (Alonso e Castro,

    2006).

  • A estratgia do II PDN pautava-se em projetos como: a) O Plano de

    Integrao Nacional (PIN), que resultou na construo da BR 230; b) Os Projetos

    Integrados de Colonizao4 (PIC`s) ao longo da rodovia Transamaznica, que

    desapropriaram uma parte do territrio para construo de agrovilas, agrpolis,

    rurpolis; c) o Programa de Redistribuio de Terra PROTERRA, com o propsito de

    facilitar a aquisio de terras, melhorar as condies de trabalho e igualmente promover

    a agroindstria no nordeste e na Amaznia; e d) o Polamaznia, que incentivou as

    atividades agropecurias e reorientou o processo de ocupao desse territrio que

    passou a ter a empresa agrcola como centralidade. Com isso, Altamira tornou-se um

    dos 15 polos agropecurios e agrominerais projetados para o Estado do Par (Hall,

    1989).

    Para a criao do polo agropecurio houve a necessidade de liberao de

    terras, o que resultou na expropriao de colonos assentados pelos projetos anteriores,

    contrariando os objetivos da colonizao e proporcionando o deslocamento rural-

    urbano. Na segunda metade da dcada de 1980, localidades como a Ilha Fazenda e

    Ressaca passaram a atrair pessoas para as atividades de garimpo; quando esta atividade

    entrou em declnio, foi a cidade de Altamira que recebeu este contingente populacional.

    Altamira foi se delineando como uma estrutura de servios e enquanto tal, ponto de

    apoio social, poltico e econmico regional (Technum, 2010).

    Em dados gerais, vemos a populao total de Altamira aumentar de 15.345

    habitantes em 1970, para 46.496 habitantes em 1980,passando de 0,70% a 1,36% da

    populao total do estado do Par (ver grfico 2). Alm disso, nota-se um vertiginoso

    crescimento tambm da populao urbana (ver grfico 3) (IBGE, vrios anos).

    Grfico 2 Crescimento populacional municipal e estadual.

    4 As terras destinadas aos colonos foram divididas em lotes de 100 ha tanto na faixa marginal (500 m x

    2.000 m), quanto ao longo das estradas vicinais (400 m x 2.500 m). O projeto previa, tambm, a construo, a cada

    cinco quilmetros, de uma estrada vicinal e de um travesso com duplo objetivo: penetrao no interior do territrio

    para acesso aos lotes mais ao fundo e permitir o escoamento da produo agropecuria. Cerca de 6.300 famlias

    foram assentadas pelo projeto PIC Altamira.

  • Fonte: IBGE, vrios anos. Elaborao: autores.

  • Nos anos 90, por falta de investimentos pblicos a cidade enfrentou um

    perodo de estagnao. Observa-se nesse perodo a consolidao do processo de

    ocupao da populao de baixa renda nas margens do Igarap Altamira e o incio de

    um processo de periferizao que se estende at o ano de 2002, assim como, a ocupao

    do restante da orla, com edificaes de melhor padro (Technum, 2010).

    No perodo entre a dcada de 70 e o ano 2000 a cidade passou a crescer em

    torno dos quatro eixos virios: Rodovia Magalhes Barata, Rodovia Ernesto Acioly,

    sada da cidade no sentido nordeste, para o trevo com a BR-230, constituindo novo

    traado da PA-415 para Vitria do Xingu; a Avenida Perimetral, que encontra a BR-

    230; e a Estrada do Aeroporto (Avenida Tancredo Neves, sequncia da Avenida Djalma

    Dutra).

    Fonte: IBGE, vrios anos. Elaborao: autores.

    Grfico 3 Populao Urbana x Populao Rural

  • A dcada de 1980, ainda marcada pelo incremento do contingente

    populacional de Altamira, em parte pela crescente atividade nos garimpos da regio, em

    outra pela construo da UHE Tucuru, deu continuidade rpida e desigual expanso

    urbana. Enquanto que por um lado o Governo Federal, a fim de melhor aparelhar os

    rgos federais e estaduais instalados na cidade, implantou uma sede do INCRA,

    Quartel do Exrcito, bancos diversos, alm de infraestrutura por meio de obras de

    drenagem e pavimentao de ruas, a construo do cais na orla do Rio Xingu e novos

    terminais aero e rodovirios (Technum, 2010), por outro lado esbarrava nas posses de

    terra dos grandes latifundirios para prover assentamentos para a populao migrante,

    que em 1971 se computava (...) em mdia de 250 pessoas por dia, entre colonos,

    funcionrios das firmas que se instalaram na regio, trabalhadores aventureiros,

    comerciantes e curiosos (Technum, 2010, p.99).

    O problema da oferta de lotes urbanos somente enfrentou uma tentativa de

    soluo com a compra de terras, em parte pela Prefeitura de Altamira, em outra pelas

    imobilirias locais inserindo neste contexto o capital imobilirio - para a criao de

    loteamentos, atualmente os bairros Braslia, Liberdade, Jardim Iracema, So Sebastio,

    Jardim Altamira, Cooperfron I e II, Colinas, Esplanada do Xingu, Jardim Primavera e o

    Jardim dos Estados. Alm desses loteamentos, foram criados em terras pertencentes

    Fonte: Technum, 2010. Elaborao: autores.

    Figura 4 Principais eixos virios

  • Prelazia do Xingu, os Loteamentos Aparecida I, II e III (LOTAP), materializando a ao

    da Igreja como produtora do espao (Technum, 2010). Os bairros do SUDAM I e II

    surgiram como tentativa de sanar o dficit habitacional das famlias de funcionrios

    pblicos que chegavam continuamente, sendo o primeiro para uso habitacional e o

    segundo para o futuro distrito industrial (ibid 2010).

    Entretanto, mesmo com o boom econmico que a cidade enfrentou durante

    grande parte da dcada de 80 e os esforos pontuais do governo em estruturar a rede de

    servios e solucionar o problema habitacional, o fluxo migratrio do perodo

    representou uma demanda excessiva para uma estrutura urbana incapaz de se ampliar na

    mesma proporo, contribuindo para a estruturao precria da malha urbana.

    Quando do fim do regime militar e o rpido declnio das atividades nos

    garimpos da regio em meados da dcada de 1980, Altamira ainda contava com uma

    rede urbana muito deficiente e dependente de centros urbanos de maior escala. Assim,

    enfrentou durante as prximas dcadas a ausncia de grandes investimentos pblicos e

    fluxos migratrios considerveis, consolidando sua malha urbana de forma mais

    gradual, porm ratificando o traado desestruturado.

    Figura 5 Bairros de Altamira

    Fonte: Technum, 2010.

  • 3.3 - Os novos grandes projetos e o capital imobilirio intensivo.

    Quase meio sculo depois, novos projetos voltados para o desenvolvimento

    nacional, ainda sob a gide da explorao de recursos naturais, trouxeram baila

    fenmenos semelhantes queles vivenciados na ocasio dos grandes projetos militares,

    acirrando processos de segregao scio espacial e de degradao ambiental no espao

    urbano amaznico.

    Juntamente a este fenmeno, ocorre a insero tardia da Amaznia no

    circuito de valorizao do capital, inserindo na regio um modelo extrnseco e

    divergente de estruturao das dinmicas do espao urbano que se sobrepe a um

    modelo de ordenao ainda remanescente do perodo extrativista e das dinmicas de

    base rural, desenhado atravs de uma politica de desenvolvimento regional nacional que

    pretere as regies menos desenvolvidas em funo das mais avanadas.

    Em outras palavras, a velocidade e intensidade desses fenmenos abriu

    portas para que a operao do grande capital favorecesse o valor de troca desse novo

    urbano, sobrepondo este valor ao valor de uso na dimenso da cidade que realiza o

    circuito superior ou a fronteira corporativa, ao ponto de restringir acessos a espaos

    pblicos, servios e condies de infraestrutura aos atores sociais que no puderem

    consumi-los.

    Dentro deste contexto se insere o PAC que, dentre suas diretrizes, apresenta

    a gerao de energia como um de seus principais esforos, sendo assim, a construo da

    UHE Belo Monte uma das principais obras do programa. Trata-se de um projeto com

    origem em 1975, quando se iniciaram os estudos para o aproveitamento energtico da

    bacia do Xingu, mas que devido s diversas questes burocrticas se arrastou at os dias

    atuais, com o incio das construes em fevereiro de 2011. Quando finalizada, ser a

    maior usina hidreltrica inteiramente brasileira, com capacidade de gerao de

    11.233,1KW, 5,5% da energia que o Brasil necessita atualmente, e com investimentos

    pblicos na ordem dos R$28,9 bi, em grande parte financiados pelo BNDES (Norte

    Energia, 2014). Entretanto, os altos custos da obra para gerar tamanha capacidade

    energtica somente em pocas de cheias do rio, assim como os inmeros impactos

    ambientais, polemizam as discusses acerca da real necessidade de Belo Monte.

  • a) Impactos de Belo Monte sobre Altamira.

    Como j dito anteriormente, Altamira se constitui como a maior cidade da

    regio e, em funo disto, ser a mais atingida pelos impactos de construo da usina. A

    construo da barragem principal de Belo Monte se localizar a 40 km rio abaixo da

    cidade, sendo 134 km no Reservatrio dos Canais e 382 km no Reservatrio do Xingu,

    que ir se localizar as margens da cidade e, por isto, Altamira localizar 51,9% do total

    de reas inundadas. Do restante, 48% sero no municpio de Vitria do Xingu e apenas

    0,01% em Brasil Novo (Brasil, 2009).

    Em Altamira, as principais reas atingidas se constituem como de ocupao

    historicamente irregular, com populao de baixa renda que, atrada pela localizao

    central e excluda das reas de melhor infraestrutura devido aos preos da terra, se

    instalou nos leitos dos igaraps Altamira e Amb, assim como na rea ribeirinha da orla

    da cidade e em reas prximas ao igarap Panelas (ver tabela 1) (Brasil, 2009). Trata-se

    de reas ambientalmente vulnerveis, que j sofrem com as cheias peridicas do Xingu,

    e se caracterizam pelos pssimos nveis sanitrios.

    Tabela 1 Populao diretamente atingida pela usina

    Fonte: Technum, 2010. Elaborao: autores.

    J na rea rural diretamente atingida, com terras pertencentes aos trs

    municpios do empreendimento (Altamira, Vitria do Xingu e Brasil Novo), sero

    afetadas 2.822 pessoas que habitam 1.241 imveis, tendo 40% destes at um quarto de

    suas reas atingidas (Brasil, 2009). Trata-se de uma regio onde 78% dos imveis rurais

    apresentam algum tipo de produo rural (com destaque para a agricultura e cultura

    bovina) e onde 95% das terras so ocupadas por imveis de pequeno porte (ibid, 2009),

  • dando fortes indcios de uma possvel migrao rural-urbana, podendo agravar o dficit

    urbano de Altamira.

    Alm dos impactos sociais, o alagamento do Reservatrio do Xingu ir

    afetar diretamente o desenho urbano de Altamira, pois a rea atingida do igarap

    Altamira ir se constituir como uma barreira fsica, separando da regio central os

    bairros de Aparecida e Boa Esperana; j o bairro Alberto Soares ficar separado de

    todos os demais (Brasil, 2009). Alm disso, ocorrer a interrupo da Rodovia

    Transamaznica no cruzamento desta com o igarap Amb.

    Outro impacto decorrente do represamento do rio a transformao de reas

    de rios em lagos nos trechos dos reservatrios, o que causar perdas irreversveis na

    paisagem. Algumas praias utilizadas somente nos perodos de seca sero alagadas,

    causando no somente a perda de reas de lazer, mas tambm colocando em risco a

    situao das famlias que dependem das atividades tursticas sazonais. Ademais, cerca

    de 100 km de extenso do rio Xingu ter sua vazo de gua reduzida, impactando

    diretamente fauna e flora amaznicas, alm das dinmicas das comunidades indgenas

    da regio (ibid, 2009).

    Em termos do crescimento populacional, esperado um acrscimo de 96

    mil pessoas na regio durante os perodos de obra, sendo cerca de 18.700 funcionrios

    envolvidos na construo da usina, alm da criao de 23 mil empregos indiretos

    (Brasil, 2009). Ao final das obras, estes nmeros devem cair para 3.400 empregos,

    sendo 700 diretos e 2.700 indiretos, com previso de aumento populacional de 32 mil

    pessoas ao fim do empreendimento (ibid 2009), a maioria se instalando em Altamira.

    Na tentativa de amenizar os impactos, a responsvel pela construo da

    usina, a Norte Energia S.A, prev a construo de 500 moradias em Altamira, alm de

    outras 2.500 habitaes em Vitria do Xingu para acomodao de seus funcionrios.

    Afora isto, tambm est planejada a construo de cinco novos bairros (Jatob, So

    Joaquim, gua Azul, Laranjeiras e Casa Nova) (ver imagem 7) para o reassentamento

    das populaes atingidas pela criao do lago da represa. Estas aes fazem parte do

    Programa de Interveno de Altamira, que visa melhorar a qualidade de moradia das

    populaes que residem ao longo dos igaraps (BRASIL, 2009).

  • Figura 7 Localizao dos RUCs em Altamira.

    Fonte: Norte Energia S.A. Disponvel em: http://jornalggn.com.br/

    Em 2013, o primeiro destes bairros, o Residencial Jatob, foi concludo (ver

    figura 7 e 8), abrigando famlias reassentadas das reas alagveis, alm do escritrio da

    Norte Energia (Norte Energia, 2014). Entretanto, assim como outros empreendimentos

    relacionados ao programa Minha Casa Minha Vida, a localizao isolada dificulta o

    acesso, alm de causar srios danos ambientais derivados da construo (ver figura 9 e

    10). Estes so pontos recorrentes na regio e se agravam pela falta de resposta do setor

    pblico s demandas socioambientais, e pela falta de referncia a respeito de qualidade

    ambiental e urbanidade da populao.

  • reboque do aquecimento imobilirio promovido pelo PMCMV, vem

    ocorrendo o investimento dependente de capital intensivo a partir da entrada de grandes

    grupos de empresas, movimentando o mercado privado de moradias, especialmente

    voltadas para o segmento econmico de alto padro, refletindo diretamente na

    valorizao dos imveis, alta do preos e especulao imobiliria (ver figura 11).

    Processo este que, inclusive, se beneficiou do aumento do permetro urbano ocorrido

    em 2010 atravs da reviso do Plano Diretor Municipal, permitindo maior flexibilizao

    da legislao urbanstica de acordo com as necessidades do capital, promovendo a

    expanso precria da malha urbana.

    Figura 7

    Fonte: arquivo pessoal.

    Figura 8

    Fonte: arquivo pessoal.

    Fonte: arquivo pessoal.

    Figura 9

    Fonte: arquivo pessoal.

    Figura 10

    Fonte: arquivo pessoal.

  • Atualmente Altamira conta com a construo de quatro condomnios

    horizontais de alto padro, que juntos totalizam mais de 10 mil novos lotes para a

    cidade. Eles se localizam em reas mais deslocadas das centralidades, ao longo do eixo

    da Rod. Transamaznica e da Rod. Ernesto Acioli,onde h oferta de grandes glebas que

    viabilizam estes tipos de projetos (ver figura 12), e que permitem o rpido acesso ao

    centro urbano. Observa-se tambm a proposta da Norte Energia (2011) que compreende

    um novo traado para a Rodovia Transamaznica (ver figura 4), externo malha

    urbana, que ampliar o banco de terras urbanas da cidade. A chegada desse padro de

    urbanizao seletiva Altamira se comporta como um enclave ao crescimento sadio da

    cidade, visto que impossibilita a formao de uma malha urbana contnua.

    Figura 11 Exemplo de propagao da especulao imobiliria

    Fonte: Levantamento de campo do autor.

    Fonte: Arquivo pessoal.

    Figura 12 Exemplo de loteamento de alto padro.

  • Por fim, alm da reestruturao na malha urbana, a mquina estatal dos

    municpios atingidos pela construo de Belo Monte tambm sofrer grandes alteraes.

    Isso porque municpios que tm reas inundadas por empreendimentos hidreltricos

    com potencia instalada maior que 30 MW recebem como medida compensatria a

    chamada Compensao Financeira pela Utilizao dos Recursos Hdricos para Fins de

    Gerao de Energia Eltrica, presente na Constituio Federal de 1988, pago

    anualmente (Brasil, 2009). Por esse motivo, o municpio de Altamira ir receber 35

    milhes de reais de indenizao todos os anos, Vitria do Xingu ter sua renda

    acrescida em quatro vezes a receita anual atual e Brasil Novo, por ser o menos atingido,

    ir receber apenas 61 mil reais como compensao (ibid, 2009). Contudo, h de se

    aprofundar os estudos sobre a capacidade de gesto destes municpios, o que, contudo,

    foge ao escopo deste trabalho.

    4. Concluso

    O presente trabalho buscou investigar a ao dos agentes sociais para

    formao do espao urbano na Amaznia, adotando como estudo de caso o espao

    urbano de Altamira.

    Inicialmente, a ao dos agentes no resultou em grandes modificaes

    socioespaciais, pois a produo do espao baseava-se em regras prprias que

    mesclavam os interesses da elite e os modos de vida local. A partir da segunda metade

    do sculo XX, observou-se que a operao do capital avanou com grande inrcia

    quanto a possveis correes de curso, negligenciando costumes e modos de vida

    tradicionais da regio. As diferentes linhas de ao dos grandes projetos foram definidas

    de forma desarticulada, os projetos de natureza agrria foram pensados na escala

    regional, e desconsideraram a escala municipal seja sob o ponto de vista da gesto

    territorial, ou da perspectiva socioambiental.

    A crena do governo de que atores externos introduziriam prticas

    economicamente bem sucedidas, levou a dcadas de favorecimento da grande empresa

    capitalista, e emergncia da pecuria e dos latifndios como estruturadores da

    ocupao desse territrio, com controle externo regio.

    Dcadas depois, o cenrio se repete com a construo da Hidreltrica de

    Belo Monte, que vinculou a produo do espao urbano s escalas de capital global,

  • inserindo na regio novas frentes de trabalho, que carregam consigo um ritmo e

    intensidade de transformaes discordantes da realidade local, potencializando

    problemas sociais, a insuficincia e ineficincia de servios bsicos de sade e

    educao, de proviso de moradia, transporte pblico e infraestrutura, alm do aumento

    da criminalidade e prostituio.

    Alm disso, soma-se a esse contexto a ao intensiva do capital imobilirio,

    seja por meio de aes pblicas via o PMCMV, seja por conta dos loteamentos de alto

    padro que atualmente tomam conta da realidade das mdias cidades do interior do

    estado, e o resultado a consolidao da malha urbana fragmentada e desestruturada,

    com a rpida urbanizao de reas rurais que, por meio da flexibilizao da legislao

    brasileira, intensifica o processo de degradao do meio ambiente.

    Por fim, ao passo que o estudo de Altamira corrobora a teoria de Bourdieu

    (1997), em que o planejamento do Estado cria espaos hierarquizados, ele ressalta a

    necessidade de se rever teorias e, principalmente, pesar sobre a insero de modelos

    urbansticos extrnsecos realidade amaznica.

    Agradecimento

    Este artigo produto da pesquisa Urbis Amaznia - Qual a Natureza do

    Urbano na Amaznia Contempornea? financiada pelo ITV-DS-Instituto Tecnolgico

    Vale-Desenvolvimento Sustentvel e pela Fundao Vale.

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