orientações para cuidadores informais na assistência domiciliar

20
ORIENTAÇÕES PARA CUIDADORES INFORMAIS NA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

Upload: editora-da-unicamp

Post on 10-Mar-2016

221 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Orientações para cuidadores informais na assistência domiciliar

TRANSCRIPT

ORIENTAÇÕES PARA CUIDADORESINFORMAIS NA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

ReitorJOSÉ TADEU JORGE

Coordenador Geral da UniversidadeFERNANDO FERREIRA COSTA

Conselho EditorialPresidente

PAULO FRANCHETTI

ALCIR PÉCORA – ARLEY RAMOS MORENO

JOSÉ A. R. GONTIJO – JOSÉ ROBERTO ZAN

LUIS FERNANDO CERIBELLI MADI – MARCELO KNOBEL

SEDI HIRANO – WILSON CANO

ORGANIZAÇÃO

ERNESTA LOPES FERREIRA DIASJAMIRO DA SILVA WANDERLEYROBERTO TEIXEIRA MENDES

ORIENTAÇÕES PARA CUIDADORESINFORMAIS NA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

2 a ED IÇÃO REV I STA

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA

BI B L I OT E C A C E N T R A L D A U N I C A M P

Orientações para cuidadores informais na assistência domiciliar / orga-nizadores: Ernesta Lopes Ferreira Dias, Jamiro da Silva Wanderley, RobertoTeixeira Mendes. – 2a ed. rev. – Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005.

1. Medicina familiar. 2. Crianças – Cuidado e higiene. 3. Idosos – Cuidado ehigiene. 4. Saúde pública. I. Dias, Ernesta Lopes Ferreira. II. Wanderley, Jamiroda Silva. III. Mendes, Roberto Teixeira. IV. Título.

Or4

ISBN 85-268-0706-4

CDD 616649.1612.67614

Índices para catálogo sistemático:

1. Medicina familiar 6162. Crianças – Cuidado e higiene 649.13. Idosos – Cuidado e higiene 612.674. Saúde pública 614

Copyright © by OrganizadoresCopyright © 2005 by Editora da UNICAMP

1a reimpressão, 2007

Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada, armazenadaem sistema eletrônico, fotocopiada, reproduzida por meios mecânicos

ou outros quaisquer sem autorização prévia do editor.

SUMÁRIO

PREFÁCIO À 2a EDIÇÃO

Ernesta Lopes Ferreira Dias ....................................................................................................... 7

PREFÁCIORoberto Teixeira Mendes .............................................................................................................. 9

INTRODUÇÃOJamiro da Silva Wanderley ....................................................................................................... 11

1 — POR QUE ASSISTÊNCIA DOMICILIARMariângela Ceschini ....................................................................................................... 13

2 — QUEM É O CUIDADOR?Patricia Brant Mourão Teixeira Mendes ................................................................ 19

3 — O CONTATO COM O DOENTEASPECTOS PSICOLÓGICOS

Neury José Botega ........................................................................................................... 34

4 — COMO ADAPTAR O AMBIENTE FAMILIARAOS CUIDADOS NECESSÁRIOSJairo Sergio Szrajer ......................................................................................................... 39

5 — ABORDAGEM FISIOTERÁPICA PARACUIDADORES DOMICILIARES EM PEDIATRIAMaria Angela Gonçalves de Oliveira Ribeiro ..................................................... 46

6 — CUIDADOS BÁSICOS COM A CRIANÇARoberto Teixeira Mendes .............................................................................................. 50

7 — AS MÚLTIPLAS FASES DE UM PACIENTE NO DOMICÍLIOErnesta Lopes Ferreira Dias ..................................................................................... 61

8 — ONCOLOGIACUIDADOS COM OS PACIENTES TERMINAIS NO DOMICÍLIO

Nancy Mineko Koseki .................................................................................................. 74

9 — CUIDADOS COM PACIENTES CRÔNICOSJamiro da Silva Wanderley ...................................................................................... 83

10 — TERAPIA E CUIDADOS NUTRICIONAIS DOMICILIARESLuciane Cristina Rosim Sundfeld Giordano ...................................................... 86

11 — PATOLOGIAS MUSCULOESQUELÉTICASJoão Batista Miranda ............................................................................................... 110

12 — ORIENTAÇÕES AOS CUIDADORES DE PACIENTESCOM DOENÇAS NEUROLÓGICAS CRÔNICASElizabeth M. A. Barasnevicius Quagliato e Maura A. Viana ................ 120

13 — PRINCIPAIS ORIENTAÇÕES AOS PORTADORESDE DOENÇAS VASCULARES PERIFÉRICASJosé Luiz Cataldo ....................................................................................................... 139

7

INTRODUÇÃO

PREFÁCIO À 2a EDIÇÃO

Para o paciente que teve uma patologia grave, chegando a ficarimpossibilitado de trabalhar ou até mesmo totalmente depen-dente do cuidador, conseguir reabilitar-se é uma vitória. O cui-dador, na maioria das vezes, tem papel importante e decisivo nes-sa nova realidade: a reintegração do paciente nas suas atividadesem busca de melhor qualidade de vida.

O idoso, já cansado pelo tempo e pela fragilidade da suaexistência, com as forças esgotadas e a capacidade funcional di-minuída pelas doenças que surgem no processo de envelhe-cimento, irá precisar de cuidados físicos, psicológicos, atençãoe carinho.

Todos nós, seres humanos, independentemente da idade, cor-remos o risco de nos tornar pacientes, podendo necessitar de cuida-dos 24 horas por dia. E, com a nova tendência mundial de desospi-talização, voltamos para casa necessitando de cuidados no do-micílio.

No período em que os pacientes se encontram acamados,necessitam de atenção especial: medicação, cuidados com a ali-mentação, higiene e curativos. Mas também é necessário algomais por parte da família e do cuidador: carinho, afeto, pa-ciência, compreensão, aceitação das limitações, dedicação e amor.O cuidador pode ser uma pessoa mais próxima, um familiar, ouum cuidador informal.

Com o aumento da expectativa de vida, o homem natural-mente fica mais sujeito a dependência de cuidados no futuro.

8

JAMIRO DA SILVA WANDERLEY

Ficamos velhos, doentes e fragilizados, conseqüentementedependentes e com limitações na execução dos afazeres habituais.Isso é muito frustrante. Mas, quando somos assistidos e acolhidospela família, essa realidade se torna mais suportável.

A 2a edição do livro Orientações para cuidadores informais naassistência domiciliar tem como objetivo orientar cuidadores fa-miliares sobre como amenizar essas dificuldades. Este livro foieditado com base nas palestras proferidas no curso de cuidadores,um trabalho da equipe multiprofissional que atua em diferentesespecialidades do Hospital das Clínicas da UNICAMP, e tem comoobjetivo fornecer informações sobre o cuidar no domicílio.

Ernesta Lopes Ferreira Dias

ERNESTA LOPES FERREIRA DIAS

9

INTRODUÇÃO

PREFÁCIO

O conjunto de textos aqui apresentados tem a marca do com-promisso de um grupo de profissionais da saúde — nutricionista,médicos, fisioterapeutas e assistentes sociais — em apoiar o tra-balho e a dedicação de quem cuida “do outro”.

Com a progressiva transformação da rede de proteção social,cada vez mais dependente de pessoas, instituições e recursos ex-ternos ao núcleo familiar, faz-se necessário um trabalho sistemáticode apoio a essas pessoas e instituições, de modo que os compo-nentes éticos, morais e afetivos da relação cuidador–beneficiáriodo cuidado tenham o devido apoio técnico e a necessária capa-citação continuada, à altura da dedicação do cuidador e da neces-sidade do beneficiário.

Esta publicação é uma humilde contribuição dos profissionaisresponsáveis pelos textos para esse objetivo, um primeiro mo-mento de sedimentação do que eles consideram o mais relevante,em suas respectivas áreas de atuação, no que tange à capacitaçãodos cuidadores. Contribuição humilde, mas, como se verá, muitonecessária e útil.

Roberto Teixeira Mendes

10

JAMIRO DA SILVA WANDERLEY

11

INTRODUÇÃO

INTRODUÇÃO

Inesperadamente, passamos da simples condição de filho, pai,mãe, vizinho ou parente distante à de cuidador informal.

Doenças e acidentes podem acontecer de forma fortuita, masalguns desses incidentes podem ter muito boa evolução, de modoque em poucos dias ou meses retomamos nossa forma de viver enos relacionar. Há, porém, os que deixam seqüelas e limitações per-manentes. E existem ainda as doenças de caráter progressivo, quevão limitando a vida cada vez mais.

Como lidar com essas limitações? Estamos preparados parasuportar a perda de um dos nossos órgãos dos sentidos (visão,tato, paladar, audição, olfato), de nossa locomoção ou de nossacapacidade de memória ou raciocínio?

E se esse acometimento ocorrer a um ente querido? Absor-vidos que somos pelas rotinas diárias, como nos adaptar à novacondição de cuidador?

Foi pensando nisso que convidamos pessoas com vasta expe-riência para elaborar este livro, cujo objetivo é mostrar que tantoo paciente como as pessoas de sua convivência devem passar porum período de profundas mudanças e adaptações.

Teremos, assim, temas bem amplos, como o perfil do cuida-dor, as adaptações do ambiente familiar, cuidados com movi-mento, alimentação e higiene, a necessidade de apoio emocional,não só ao paciente, mas também à sua família, além de algumasnoções de doenças crônicas, tais como acidente vascular cerebral(AVC), Parkinson, câncer e outras doenças degenerativas.

Todos esses temas são tratados com uma linguagem simples eirão ajudar muito nas horas difíceis, quando nos sentimos sozinhos

12

JAMIRO DA SILVA WANDERLEY

e nos questionamos sobre os motivos de isso ter acontecido conoscoou neste momento de nossa vida. Lembramos uma frase que muitopoderá ajudar: Os fatos e as pessoas são como são e não como nós gos-taríamos que fossem.

Outra característica deste livro é a forma como foi elaborado.As pessoas envolvidas nele colocam em suas atividades o coração;portanto, o resultado não poderia ter sido diferente. O amor é umaconstante nos textos, que lembram sempre a parte humana, comsuas limitações e suas superações.

Esperamos que o livro possa ser útil nos momentos maisdifíceis de adaptação e que também sirva para que as pessoassaibam que não estão sozinhas — em inúmeras famílias ocorremproblemas similares e as experiências compartilhadas muitoengrandecem a todos de uma forma mais rápida e gratificante.

Este livro tem como objetivo trazer pontos importantes paraos familiares e pessoas que lidam com pacientes com graus va-riados de dependência física e mental. Foi realizado com a par-ticipação de vários profissionais, com enfoques e abordagens queajudam o leitor a ter melhor compreensão, tanto emocional comode apoio à pessoa que auxilia outra com maior dificuldade de ad-ministrar seus movimentos e sua vida.

Anualmente se realiza na UNICAMP um curso de orientação aoscuidadores informais,* que motivou essa equipe a escrever estetrabalho. Esse curso se originou do serviço de medicina e reabi-litação do HC–USP, coordenado pela professora-doutora Lina-mara Rizzo Battistella.

Nos capítulos subseqüentes veremos a tônica do amor, da com-preensão, do conhecimento e da solidariedade, fatores indispen-sáveis no atendimento ao próximo.

Jamiro da Silva Wanderley

* Comissão organizadora do curso para cuidadores informais no atendimentodomiciliar: Ernesta Lopes Ferreira Dias, Jamiro da Silva Wanderley, MariaElena Guariento, Maria Virgínia R. F. Camilo, Mariângela Ceschini e SandraRegina de Angelis M. Terra.

13

POR QUE ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

1

POR QUE ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

Mariângela Ceschini*

Há mais de 40 anos, o doente era cuidado em casa, mas, coma especialização e evolução da medicina e dos recursos de saúde, afamília foi perdendo esse espaço. A própria condição e as carac-terísticas das famílias foram-se alterando com as mudanças da so-ciedade. Antigamente as famílias eram numerosas, agrupavamvárias gerações, as relações intergeracionais e de ajuda mútuaocorriam mais facilmente. Atualmente predominam as famíliasde estrutura nuclear, formadas por pais e filhos ou até menores.Entendendo que família é um conjunto de pessoas unidas porlaços de parentesco, que juntas satisfazem necessidades físicas,emocionais, sociais e econômicas, e que as relações familiares sebaseiam em afeto, reciprocidade e obrigação, pode-se observarque algumas das características e funções da família também sealteraram. Uma das funções da família é cuidar — cuidado quea princípio os pais têm com os filhos pequenos e, posteriormente,os filhos adultos têm com os pais idosos. É importante, portanto,que todos sejam preparados para virem a ser futuros cuidadores.

Outro aspecto da sociedade mundial que está sendo modificadoé o envelhecimento populacional. Com o avanço da medicina e odesenvolvimento da infra-estrutura (água tratada, esgoto etc.),a população passou a ter mais qualidade de vida, de modo que otempo de vida foi prolongado e há um número maior de idosos.

* Assistente social do Hospital das Clínicas, UNICAMP.

14

MARIÂNGELA CESCHINI

Todos os campos da sociedade sentem a necessidade de uma aten-ção mais voltada às características, e mesmo exigências, dessapopulação. O idoso necessita de áreas de lazer apropriadas, tu-rismo que atenda às suas expectativas, condições para a práticade atividades físicas compatíveis com suas limitações, arquiteturae planejamento urbano com adaptações para suas possíveis de-ficiências, atendimento à saúde geriátrica, cuidadores para o au-xiliarem etc. Nos idosos são muito mais presentes as doenças crô-nicas, degenerativas e debilidades cognitivas.

Todas essas questões citadas, peculiares a uma populaçãoenvelhecida, não podem ser desprezadas, pois há no Brasil apro-ximadamente 5 milhões de pessoas com 70 anos ou mais e, se-gundo dados do IBGE (1996), até o ano 2020 o número de pessoasacima de 60 anos é estimado em 27 milhões. Surgem, porém, al-gumas ações pró-idosos na Constituição Federal de 1988, no ar-tigo 229: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhosmenores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar ospais na velhice, carência ou enfermidade”. Em 4 de janeiro de1994, surge a lei no 8.842, que estabelece a Política Nacional doIdoso, coordenada pela Secretaria do Estado de Assistência Socialdo Ministério da Previdência e Assistência Social.

Ao pensarmos no aspecto de atenção à saúde do idoso em ter-mos mundiais, existem vários segmentos empenhados em otimi-zar recursos para a prestação da assistência necessária. Na Ingla-terra, os idosos são 16% da população e ocupam 50% dos leitoshospitalares, com média de permanência três vezes maior queoutros grupos. Nos Estados Unidos, a partir da década de 80, osidosos passaram a ser desospitalizados, complementando seustratamentos e recuperação no próprio domicílio.

No Brasil, outras ações governamentais foram implementa-das. Por exemplo, em 1998, a Secretaria de Assistência Social doEstado de São Paulo reuniu instituições públicas, privadas e reli-giosas que atuam nas áreas de geriatria e gerontologia para mon-tar cursos para profissionais — médicos, enfermeiros, terapeutasocupacionais, fisioterapeutas, assistentes sociais, pedagogos, psi-cólogos e professores de educação física —, a fim de que eles se-

15

POR QUE ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

jam agentes multiplicadores na capacitação de familiares paraserem cuidadores de idosos, no que se refere à sua saúde e aten-dimento psicossocial. Por fim, em 7 de abril de 1999, a portariano 5.153, no artigo 1o, institui o Programa Nacional de Cuida-dores de Idosos, através do Ministério da Previdência e Assistên-cia Social e da Saúde.

Constatando o evoluir da sociedade, novas formas de trabalhoe atendimento de saúde têm sido desenvolvidas e até mesmo res-gatadas a fim de dar apoio e resolutividade à população que delanecessitar. A assistência domiciliar surge nesse panorama comouma das alternativas para otimizar a utilização dos recursos desaúde e vem-se tornando uma tendência mundial.

A assistência domiciliar é conhecida também como home care,cuidado domiciliar ou atenção gerenciada. Trata-se, portanto,do cuidado que as pessoas doentes recebem em seus domicílios,seja ele executado por cuidadores informais (parentes, vizinhos,amigos, voluntários etc.) ou por profissionais da saúde (médicos,enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupa-cionais, assistentes sociais psicólogos etc.). A assistência domici-liar pode-se apresentar de três formas: a terapêutica, que trata o pa-ciente até receber alta médica; a paliativa, que trata e cuida dopaciente visando oferecer-lhe melhor qualidade de vida, emborasem perspectiva de cura; e, por fim, a assistência domiciliar preven-tiva, que seria a ideal, pois busca evitar o adoecimento ou o agrava-mento de doenças preexistentes. Todas essas formas de assistênciadomiciliar podem ser realizadas com pacientes portadores dedoenças, síndromes ou traumas.

Além dessas possibilidades de assistência domiciliar, existemtambém as internações domiciliares, situação em que se montaum verdadeiro quarto hospitalar, com todos os equipamentosnecessários, na residência do paciente. Nesses casos, a presençado profissional de saúde se faz mais necessária. A assistência do-miciliar teve início em países mais desenvolvidos, como Suécia(1967), Holanda, Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, Espanhae Portugal. Nos Estados Unidos 2,5% da população recebe as-sistência domiciliar à saúde.

16

MARIÂNGELA CESCHINI

No Brasil, o pioneiro em assistência domiciliar foi o Hospitaldo Servidor Público do Estado de São Paulo, que iniciou esse tra-balho em 1968, motivado por uma preocupação com as vítimasde acidentes vasculares e outras patologias neurológicas, que,após a alta hospitalar, demandam cuidados em seu domicílio. Naúltima década nosso país tem apresentado grande avanço na assis-tência domiciliar e alta qualidade de trabalho, tanto no setor pú-blico quanto no setor privado, vindo a confirmar a tendênciamundial.

Mas, afinal, qual a importância da assistência domiciliar?A demanda de leitos hospitalares cresce proporcionalmente

ao aumento populacional e, conseqüentemente, de idosos. Aconstrução de hospitais, a aquisição e manutenção de equipa-mentos e a contratação de pessoal especializado trabalhando 24horas tornam-se muito onerosas e sugerem ações de otimização douso dos recursos disponíveis. Buscar a redução de custos é umadas funções dos administradores hospitalares, mas esse aspecto setorna secundário, ou mesmo uma conseqüência da implantaçãoda assistência domiciliar, diante dos benefícios que a desospi-talização traz ao paciente.

O paciente que vai para casa continuar seu tratamento tem aoportunidade de retomar mais brevemente suas atividades cotidia-nas, pois tudo à sua volta o estimula; ao ter controle de seu ambien-te, o estresse diminui, o que lhe proporciona maior possibilidadede recuperação. A qualidade de vida do paciente na própria casaé muito melhor, uma vez que lá ele tem as coisas de que gosta,maior oportunidade de gozar de privacidade e maior facilidadepara a independência funcional, o que facilita a retomada da ro-tina diária. O paciente em sua casa sofre menor risco de adquiririnfecções e a assistência domiciliar evita o agravamento da doençae as reinternações. Muitos são os benefícios ao paciente, do pontode vista de saúde e humano, e vários trabalhos de pesquisas brasi-leiros têm reforçado a idéia de que essa forma de atenção à saúdeseja implantada, implementada e ampliada e que se busque semprea eficácia e a eficiência.

17

POR QUE ASSISTÊNCIA DOMICILIAR

Para a assistência domiciliar ser viável, alguns pré-requisitosdevem ser preenchidos ou apresentados. A princípio é necessárioque a condição de saúde do paciente esteja dentro de padrões quepermitam a indicação da equipe multidisciplinar para a conti-nuidade da assistência à saúde no domicílio. Outros itens demuita relevância são, por exemplo, a existência de condições mí-nimas de higiene e conforto na habitação, a localização da mo-radia dentro da área de atendimento, a aceitação da família e dopaciente, e a existência de ao menos um cuidador informal. Éde fundamental importância que ocorra uma interação entre afamília e a equipe profissional. Isso significa que a família deveser aberta, responsável e colaboradora e a equipe, treinada paraentrar na casa do paciente de acordo com uma postura profis-sional apropriada.

Até o momento, foi dada maior ênfase na assistência domi-ciliar voltada ao adulto, e em especial à geriatria, mas não se podedeixar de mencionar a assistência domiciliar pediátrica. Em pe-diatria, pode-se encontrar maior insegurança da família e daequipe profissional em manter a criança em assistência domici-liar, mas esse é um campo que se tem expandido muito e os be-nefícios para a criança são tão ou mais importantes que os bene-fícios para os adultos. Na área pediátrica a assistência domiciliarpreventiva tem sido de grande relevância, pois as famílias rece-bem várias orientações quanto ao aleitamento e cuidados com acriança, evitando o surgimento ou o agravamento de doenças.Uma pesquisa realizada em Salvador (Bahia) apontou que 80% dasinternações hospitalares de crianças e adolescentes eram pneu-mológicas e gastroenterológicas, e a maioria dos casos seria ele-gível para a internação domiciliar; além disso, 83% dos pediatrasconsideram a assistência domiciliar benéfica para o tratamento ea melhora do aspecto psicológico da criança.

A assistência domiciliar é uma forma de atenção à saúde quetem avançado muito, tanto na área pública quanto na privada. Co-mo já foi colocado, o pioneiro no Brasil foi o Hospital dos Servido-res Públicos do Estado de São Paulo e vários outros hospitais têmimplantado esse trabalho. Ainda na área pública, observam-se as

18

MARIÂNGELA CESCHINI

prefeituras atuando nesse espaço, dividindo as cidades em regiõese elegendo os tipos de atendimento que oferecem à população,dos quais os principais são a assistência domiciliar para idosos,para portadores de HIV, para acamados. Muitos dos recursosutilizados são vinculados aos postos de saúde.

Já a assistência domiciliar privada é um filão que tem avan-çado de forma galopante. É encontrada na maior parte das ci-dades grandes do país e apresenta elevado nível de satisfação; tor-nou-se muito viável devido à miniaturização de equipamentos,que podem ser instalados na casa dos pacientes. No Brasil, omodelo usado é o americano e tem havido enorme concorrênciade grupos estrangeiros e nacionais pela conquista de mercado, oque proporciona a seus usuários uma melhora na qualidade dosserviços oferecidos. O crescimento dessas empresas é impulsio-nado pela melhora da qualidade de vida do paciente, somada àredução de custos (o serviço tem sido de 30% a 60% mais bara-to). É também oferecida assistência domiciliar para a realizaçãode exames, como, por exemplo, o Home Care Radiológico.

Podemos concluir que novas ações de saúde têm sido desen-volvidas no sentido de manter os pacientes o mais longe possíveldos leitos hospitalares. Prova disso também são o retorno domédico de família, a formação de agentes comunitários de saúdee a sofisticação da telemedicina, permitindo que um paciente sejaexaminado simultaneamente por uma equipe médica da regiãoem que mora e, via computador, por outra equipe de um centromais desenvolvido.

A assistência domiciliar é importante, pois proporciona aopaciente a possibilidade de interação com seu meio da forma maisequilibrada e saudável possível.

Conforme Leonardo Boff, em seu livro Saber cuidar, essainteração pode ser norteada pelo Feng Shui, filosofia chinesa docuidado, que busca a correta distribuição da energia vital (chi)em nosso ambiente inteiro, gerando, conseqüentemente, melhorrecuperação.

19

QUEM É O CUIDADOR?

2

QUEM É O CUIDADOR?*

Patricia Brant Mourão Teixeira Mendes**

Introdução

O Núcleo de Epidemiologia do Cuidador na PUC–SP vemdesenvolvendo pesquisas voltadas para o cuidador desde 1990.

O primeiro projeto do núcleo foi uma pesquisa internacionalaplicada em países em desenvolvimento, intitulada Estudo do su-porte domiciliar aos adultos com perda de independência e o per-fil do cuidador principal, da qual apresentaremos aqui alguns da-dos analisados. Ela foi realizada no município de São Paulo, en-tre 1992 e 1995, com uma amostra de 102 casos, triados em setehospitais da rede pública. Os casos selecionados eram de adul-tos com mais de 60 anos, que ficaram dependentes de cuidadosapós o primeiro acidente vascular cerebral. Foi um estudo lon-gitudinal, no qual se acompanhou durante um ano o cotidianofamiliar desses adultos, através de três entrevistas domiciliarescom seus respectivos cuidadores.

Quando iniciamos a primeira pesquisa, no Brasil pratica-mente não existia literatura sobre cuidadores domiciliares, poiseles eram personagens quase desconhecidos, tanto no cenário pú-blico quanto no acadêmico.

Nossa pesquisa teórica inicial foi na literatura internacional,buscando nos autores Barer e Johnson (1990), Stone, Cafferata e

* Artigo da palestra apresentada no IV Curso para Cuidadores na AssistênciaDomiciliar, UNICAMP, junho, 2000.

** Mestre em serviço social, especialista em gerontologia social, doutoranda emsaúde ambiental.

20

PATRICIA BRANT MOURÃO TEIXEIRA MENDES

Sangl (1987) e Weiss (1975), citado em Sinclair (1990, p. 89), entreoutros, as definições sobre cuidadores, bem como sobre os tiposde cuidados operados no espaço domiciliar. Segundo esses autores,a distinção entre cuidador principal e secundário depende do graude envolvimento experimentado por cada um nos cuidados pres-tados ao idoso dependente. O cuidador principal é aquele que tema total ou a maior responsabilidade pelos cuidados prestados aoidoso dependente no domicílio. Os cuidadores secundários seriamos familiares, voluntários e profissionais que prestam atividadescomplementares. As denominações utilizadas são cuidador formal(principal ou secundário), profissional contratado (atendente deenfermagem, acompanhante, empregada doméstica etc.) e cui-dador informal, essa última usualmente caracterizando os fami-liares, amigos e voluntários da comunidade.1 Os autores assinalamtambém que essas várias definições levam a supor que tanto os pes-quisadores como os profissionais da prática ainda não têm clarezasobre como se dá o processo de cuidar de um idoso dependenteno domicílio, assim como não fica claro qual dinâmica vai definiro cuidador principal.

Nesse levantamento teórico foi possível verificar duas tendên-cias: a primeira, de que os conceitos sobre o cuidador eram cons-truídos com base em classificações, o que, necessariamente, im-plicava respostas padronizadas; e a segunda, de que as atividadesdos cuidados no domicílio eram vistas pelos pesquisadores comotarefas estabelecidas e definidas, e não como atividades que sãoconstruídas, de forma singularizada e diferenciada, pelo cuidadorno seu cotidiano. Cada cuidador vivencia essas atividades deforma diferente, dependendo de uma série de fatores: dinâmicafamiliar, valores culturais, condições econômicas etc.

1 Na literatura européia e americana a palavra “comunidade” é comum. IanSinclair (1990, p. 87) chama a atenção para dois pontos: um, que o conceitoé vago e abrangente demais, e outro, que a palavra geralmente aparece aco-plada a outra, principalmente no campo das políticas sociais, como communitycare. Nesse sentido, ressalta que a concepção de community care carrega em sia idéia de “responsabilidade coletiva”, por parte de pessoas e grupos não-profis-sionais, em relação a necessidades e cuidados que são dados em determinadaárea territorial (vizinhança, trabalho voluntário etc.).