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INÊS CUSTÓDIO ALVES OPERAÇÕES ABUSIVAS NA BANCA ELETRÓNICA A IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PELAS PERDAS RESULTANTES DA MOVIMENTAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE FUNDOS Dissertação com vista à obtenção do grau de Mestre em Direito e Mercados Financeiros Orientador: Professor Doutor Frederico Costa Pinto, Professor da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa Janeiro, 2019

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Page 1: OPERAÇÕES ABUSIVAS NA BANCA ELETRÓNICA · atenções devido à nova Diretiva de Sistemas de Pagamentos, Diretiva (UE) 2015/2366 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro,

INÊS CUSTÓDIO ALVES

OPERAÇÕES ABUSIVAS NA BANCA ELETRÓNICA

A IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PELAS PERDAS RESULTANTES DA

MOVIMENTAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE FUNDOS

Dissertação com vista à obtenção do

grau de Mestre em Direito e

Mercados Financeiros

Orientador:

Professor Doutor Frederico Costa Pinto, Professor da Faculdade de Direito da

Universidade Nova de Lisboa

Janeiro, 2019

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- DECLARAÇÃO DE COMPROMISSO ANTI-PLÁGIO -

Declaro por minha honra que o trabalho que apresento é original e que todas as citações

estão corretamente identificadas. Tenho consciência de que a utilização de elementos

alheios não identificados constitui grave falta ética e disciplinar.

Lisboa, 19 de Janeiro de 2019

(Inês Custódio Alves)

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Ao meu avô, Ricardo Custódio

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- AGRADECIMENTOS -

A elaboração da presente dissertação de mestrado só foi possível com o apoio daqueles

que em muito contribuíram para a sua conclusão.

Antes de mais, expresso o meu agradecimento ao Professor Doutor Frederico Costa

Pinto por me ter acompanhado com disponibilidade, prontidão e rigor ao longo deste

estudo.

À minha família, pais, irmã e avós pela presença, permanente apoio e inspiração que

sempre me concederam.

Ao Pedro, pela motivação, companheirismo e amor.

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- MENÇÕES –

Advertências:

Esta dissertação ocupa um total de 123530 caracteres

Siglas e Abreviaturas:

Art.- artigo

AIS - Account Information Services

Bdp – Banco de Portugal

CC – Código Civil

CE – Comissão Europeia

Cfr.- Conforme

CP- Código Penal

CPP- Código do Processo Penal

DL – Decreto - Lei

DSP 1 – Diretiva dos Serviços de Pagamento 1

DSP 2 - Diretiva dos Serviços de Pagamento 2

LC- Lei do Cibercrime

p.- página

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PIN - Personal Identification Number

PIS - Payment Initiation Services

pp.- páginas

ob. cit.- obra citada

RSP – Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e Moeda Eletrónica

RGICSF - Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras

TPP - Third Party Providers

UE- União Europeia

Vol.- Volume

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- RESUMO –

A difusão das novas tecnologias de informação e comunicação fez recrudescer a prática

de “novos crimes”: os crimes informáticos.

É variada a tipologia de ataques ao ciberespaço, todavia, no presente estudo,

debruçamo-nos com mais detalhe sobre os ataques informáticos perpetrados nos

serviços de homebanking. O phishing e o pharming surgem como as técnicas de fraude

informática mais recorrentes, as quais nem sempre são fáceis de prever e combater,

devido à capacidade de anonimato dos piratas informáticos.

De tais esquemas fraudulentos sobrevêm prejuízos que serão repartidos em

conformidade com as condutas adotadas pelas partes no contrato – utilizador e prestador

de serviço de pagamento. No seio de uma relação negocial complexa, a distribuição

justa dos danos obtidos far-se-á em função do cumprimento de deveres ou falta deles.

Assim, à luz do novo Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e Moeda Eletrónica,

os deveres de conduta das partes na relação contratual são a pedra de toque em sede de

repartição de tais prejuízos.

Serve o presente estudo para apurar a quem caberá a responsabilidade pelos danos

causados em sede de utilização indevida do sistema de homebanking.

Atualmente, as alterações na área dos sistemas de pagamentos têm estado no centro das

atenções devido à nova Diretiva de Sistemas de Pagamentos, Diretiva (UE) 2015/2366

do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro, relativa aos serviços de

pagamento no mercado interno, que tem como foco a segurança, quer das instituições

quer dos consumidores e na proteção de dados do utilizador.

Palavras-Chave: ciberespaço, cibersegurança, homebanking, fraude informática,

phishing, pharming

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- ABSTRACT –

The dissemination of new information and communication technologies has increased

the practice of "new crimes": computer crimes.

The typology of attacks on cyberspace is varied, however, in the present study, we look

in more detail about the cyber attacks perpetrated in the services of homebanking.

Phishing and pharming appear as the most recurring computer fraud techniques, which

are not always easy to predict and combat, due to hackers anonymity.

Such fraudulent schemes result in losses that will be allocated in accordance with the

conduct of the parties in the user agreement. Within a complex negotiating relationship,

the fair distribution of the damages obtained will be done in function of the fulfillment

of duties or lack thereof. Thus, in light of the new Legal Regime of Payment and

Electronic Currency Services, the parties' duties in the contractual relationship are the

touchstone in the allocation of such damages.

The present study is used to determine who will be responsible for damages caused by

improper use of the homebanking system.

Currently, changes in the area of payment systems have been in the spotlight due to the

new Payment Systems Directive, Directive 2015/2366 of the European Parliament and

of the Council of 25 November on payment services in the European Union internal

market, which focuses on the security of both institutions and consumers and on user

data protection.

Keywords: cyberspace, cybersecurity, homebanking, computer fraud, phishing,

pharming

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- INTRODUÇÃO –

As tecnologias de informação e comunicação são, indubitavelmente, um motor de

desenvolvimento económico, facilitando a troca de informações de modo bastante

célere. Estamos, atualmente, ante uma nova realidade, altamente dependente da

tecnologia, que obriga ao armazenamento de grandes quantidades de informação, o que,

por sua vez, incorpora graves riscos, capazes de pôr em causa a segurança e soberania

de um país.

A Internet tem promissoras potencialidades, mas também um leque alargado de

vulnerabilidades. Neste palco de tendência universal que é a Internet, coexistem

fenómenos ilícitos e árduos de combater.

A veloz evolução tecnológica revolucionou, entre tantas outras coisas, as relações

bancárias, assistindo-se atualmente à possibilidade de realizar operações bancárias e de

aceder à distância a todos os serviços prestados pelos bancos por via da Internet.

É deste fenómeno que nos ocuparemos ao longo do presente estudo: o homebanking.

Debruçar-nos-emos, em particular, sobre as práticas ilícitas a ele associadas, onde ganha

papel de destaque a pirataria e fraude informáticas, mormente quando o anonimato

surge como elemento potenciador desse tipo de comportamentos.

Para o efeito, a estrutura do trabalho estará centralizada primeiramente na análise do

homebanking, enquanto contrato-quadro, no qual as partes ficam vinculadas ao

exercício de condutas diligentes.

De seguida, teremos a oportunidade de aprofundar a fraude informática no

homebanking, maxime através do phishing, spyware e do pharming.

Como resultado dos esquemas fraudulentos violadores da segurança na utilização dos

instrumentos de pagamento, impõe-se a questão central do nosso estudo e à qual, a

devido tempo, daremos resposta - quem suporta os prejuízos decorrentes de tal

utilização indevida?

Por fim, concluiremos com a abordagem comunitária sobre este problema, transposta

para o ordenamento jurídico português através do novo Regime Jurídico dos Serviços

de Pagamento e da Moeda Eletrónica (DL n.º 91/2018, de 12 de novembro), fazendo a

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análise dos seus objetivos no seio de um setor sujeito a práticas fraudulentas constantes

em sede de homebanking.

Apresentados o objeto e a estrutura do nosso trabalho, estamos em condições de dar

início ao nosso percurso pelo tema.

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- CAPÍTULO I -

A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL DO SETOR BANCÁRIO

A informatização da sociedade é uma realidade tão coetânea quanto a inovação

tecnológica do setor bancário, assistindo-se a um indubitável aumento das transferências

de fundos através de meios eletrónicos.

A utilização da informática nas operações do quotidiano tornou-se inevitável e o setor

bancário esteve sempre na vanguarda do fenómeno da digitalização financeira.1

Compreende-se facilmente esta progressiva desmaterialização dos meios de pagamento.

Se por um lado o cliente é cada vez mais exigente com os serviços disponibilizados pelo

seu banco, por outro a digitalização desses serviços traz uma redução notória no tempo

de execução das operações bancárias e, bem assim, uma melhoria da qualidade dos

serviços prestados.

O recurso à Internet e aos dispositivos móveis, como meios de viabilização do acervo de

produtos e serviços bancários, tornou-se, pois, um imperativo e marca a modernização

do setor bancário, movido pelo desiderato de um aperfeiçoamento constante e da

satisfação das necessidades dos seus clientes.2

Em rigor, a comercialização de produtos e serviços bancários de homebanking através

da Internet, de dispositivos móveis (smartphones e tablets) e de aplicações móveis

(apps) espelham aquilo que se pode designar hoje como um ecossistema digital. São

estes os canais digitais que permitem ao cliente aceder aos serviços bancários a qualquer

momento, em qualquer lugar e de um modo mais rápido que os canais tradicionais.

1 Tornaram-se vulgares as expressões cashless society ou paperless society, caracterizando o rumo da

evolução da sociedade no que respeita aos meios de pagamento, cfr. GUIMARÃES, MARIA RAQUEL,

As Transferências electrónicas de fundos e os cartões de débito, Almedina, Coimbra, 1999, p.13. 2 Nas palavras de MONTEIRO, VASCO, “Transformação digital do sector bancário. Desenvolvimentos

recentes e futuros no quadro legal e regulatório” in InforBANCA 111, nov’17-fev’18, p. 25, “A

transformação digital representa para o sector bancário: uma necessidade de acompanhar as novas

tendências tecnológicas, demográficas e os hábitos de consumo e de comportamento das novas gerações –

millenials; uma oportunidade para represar os seus processos internos, de forma a tornar-se mais

eficiente, reduzindo custos e aumentando a eficácia; um desafio decorrente da alteração no modelo de

negócio”. No mesmo sentido FERREIRA, ANTÓNIO PEDRO DE AZEVEDO, A relação negocial

bancária – conceito e estrutura, Lisboa, Quid Iuris, 2005, pp.70-73.

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Ora, é este o punctum saliens do homebanking: permitir aos seus clientes realizar as

operações bancárias (tradicionalmente levadas a cabo nos balcões das sucursais), em

qualquer parte e em tempo real, servindo-se para o efeito dos supra especificados canais

digitais.

A segurança dos serviços de homebanking é assegurada através da existência de chaves

e combinações numéricas que são do exclusivo conhecimento do utilizador. Todavia,

paradoxalmente, o principal óbice com que a utilização dos canais digitais se depara é

precisamente a segurança dos clientes, das suas transações e dos seus dados pessoais,

surgindo o phishing, o pharming, o roubo de identidade e o malware como alguns dos

principais riscos de segurança identificados pelas instituições bancárias.3

Em rigor, “A Internet tem vindo a converter-se num novo campo de batalha não

convencional, cujos rostos invisíveis tendem paulatinamente a dominar o ciberespaço,

dotando-se de uma arma que representa uma maior perigosidade e ameaça do que a

nuclear, num cenário virtual dotado de soldados digitais devidamente preparados para

actuar em ambiente de ciberguerra. A arma por excelência no ciberespaço reside na

capacidade de enviar códigos que consigam quebrar todo o tipo de protocolos de

segurança nas mais diversas redes informáticas.”.4

Partindo desta ideia, o ciberespaço, enquanto domínio caracterizado pelo uso de

equipamentos electrónicos e de espectro electromagnético para armazenar, modificar e

trocar dados por via de sistemas em rede5, detém uma série de caraterísticas que fazem

dele uma realidade detentora de um leque de vulnerabilidades.

Convém, pois, antes de mais, densificar o alcance do conceito de ciberataques,

entendidos como “ataques lançados geralmente a partir de um computador, recorrendo

ao método de intrusão e que tem como finalidade adquirir, explorar, perturbar, romper,

negar, degradar ou destruir informação constante em computadores ou em redes de

3 Vide a este propósito o contributo dos resultados do questionário às instituições financeiras, de 2016,

elaborado pelo Banco de Portugal, Comercialização de produtos e serviços bancários nos canais digitais

em Portugal, disponível em www.clientebancario.bportugal.pt. 4 Cfr. MARTINS, MARCO, “Ciberespaço: uma nova realidade para a segurança internacional”, in Nação

e Defesa, 2012, Instituto da Defesa Nacional, p. 133. 5 Cfr. FREIRE, VICENTE, “ Cibersegurança e Ciberdefesa: a inevitabilidade de adoção de uma estratégia

nacional”, in Revista Segurança e Defesa, 21, maio-agosto de 2012, p. 53.

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computadores, com sistemas e equipamentos electrónicos ligados a outros

equipamentos ou sistemas, ou que partilhem a mesma estrutura de energia ou o mesmo

espaço de emissão electromagnética, bem como os próprios computadores, redes de

computadores, sistemas e equipamentos”.6

Ora, o modo como a Internet está arquitetada, a capacidade de ubiquidade do

ciberespaço e o incremento do problema do anonimato são os ingredientes necessários à

prática de intrusões e incidentes7, pelo que o conceito de cibercrime abrange todos os

atos criminosos cometidos por via da utilização de redes de comunicação eletrónicas

contra essas mesmas redes ou sistemas.

Assim, entende-se que a prática de cibercrime não corresponde, naturalmente, a uma

categoria específica de crime, mas, pelo contrário, está geralmente associado a um

grupo de infrações relacionadas com o uso de computadores e de redes eletrónicas.8

E é justamente daquelas que afetam o setor bancário, que nos ocuparemos nos capítulos

subsequentes.

6 Cfr. MOREIRA, JOÃO MANUEL DIAS, “O impacto do ciberespaço como nova dimensão nos

conflitos”, in Boletim Ensino, Investigação n.º 13, 2012, disponível em www.ium.pt. 7 Segundo SANTOS, RITA COELHO, O tratamento jurídico-penal da transferência de fundos

monetários através da manipulação ilícita dos sistemas informáticos, Coimbra, Coimbra Editora, 2005,

p. 239, os ataques informáticos podem ser cometidos por qualquer pessoa, não obstante a sua prática se

encontrar socialmente referenciada a indivíduos com particulares conhecimentos técnicos; De acordo com

GAMEIRO, CARLOS, “O risco da informação em ambiente electrónico”, in AAVV, Estudos de Direito e

Segurança, Coimbra, Almedina, 2007, p. 130, apesar de reconhecer que a figura dos piratas informáticos

traz associada a sua experiência e investimento na área tecnológica, não descura que agressores com

conhecimentos técnicos limitados também possam levar a cabo ataques bem sucedidos, pois “estão

disponibilizadas muitas ferramentas de fácil consulta e execução”. 8 A este propósito, vide com mais detalhe GILMOUR STAN, “Policing crime and terrorism in

cyberspace: ano overview”, 2014, disponível em www.s3.amazonaws.com

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- CAPÍTULO II -

HOMEBANKING

Decorrentes do fenómeno de evolução tecnológica, recrudesceram novas práticas no

setor bancário, nomeadamente associadas à digitalização financeira, fenómeno que

trouxe novos serviços financeiros de retalho caracterizados pela simplicidade e

celeridade na utilização dos serviços de pagamento. Assim, assistimos ao acesso à

distância de operações bancárias, assim como aos inúmeros serviços decorrentes da

utilização de serviços de pagamento, cujo modus operandi decorre por via da Internet.

Surge, assim, o serviço de homebanking que se revela, no plano jurídico, como uma

‘teia’ de contratos, a uma série de relações jurídicas complexas.9

Neste domínio, dedicaremos as próximas reflexões à análise do negócio jurídico através

do qual é possível utilizar um instrumento de pagamento eletrónico.

1.CONTRATO DE UTILIZAÇÃO DE INSTRU MENTOS DE PAGAMENTO

Em consonância com as considerações expendidas no Acórdão do Tribunal da Relação

de Coimbra, de 20 de setembro de 2016, “a emissão/utilização de cartões bancários,

assenta numa relação triangular que tem como vértices um banco ou outra entidade

autorizada (emitente) e o cliente (aderente) através do qual se atribui a este um direito

de acesso ao sistema operativo especial de pagamentos, criado e gerido pela entidade

emitente, constituindo o cartão um instrumento de pagamento que permite ao

respectivo titular a respectiva utilização para a aquisição de bens e serviços, com

pagamento diferido, junto de um terceiro”.10

Para a utilização de um instrumento de pagamento eletrónico, pressupõe-se a prévia

celebração de um contrato, concluído entre o cliente e o prestador de serviços, do qual

resulta não só a emissão do cartão bancário de crédito ou débito, como ainda são

preconizadas as regras de utilização do instrumento de pagamento eletrónico, bem como

os direitos e deveres implícitos às partes no contrato.

9 Vide a este propósito GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, O contrato-quadro no âmbito da utilização de

meios de pagamento electrónicos, Coimbra, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2011, pp.174 – 175; 10

Processo n.º 183554/14.0YIPRT.C1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 03.01.2018;

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Acompanhamos, neste sentido, a posição propugnada por Maria Raquel Guimarães, que

destaca que o contrato de utilização de um cartão de pagamento não surge

“desgarrado”, como facto jurídico isolado, mas antes aparece como um

desenvolvimento de relações jurídicas anteriores (ou contemporâneas) à sua

conclusão.11

No seguimento da génese do contrato de utilização de instrumento de pagamento supra

referida, assente na anterioridade do contrato celebrado entre o utilizador e a instituição

bancária, cumpre relevar a cronologia das subsequentes relações jurídicas provenientes

das sucessivas utilizações do cartão, que fazem deste contrato um contrato-quadro.

Destarte, o contrato de emissão ou de utilização não surge como uma “ilha”, como um

facto jurídico isolado, gerador de uma relação jurídica única entre determinados

sujeitos jurídicos. Antes integra um conjunto mais complexo de relações que se

estabelecem, por um lado, entre os mesmos sujeitos, e, por outro, entre estes e

terceiros.12

Rege-se, assim, o contrato de utilização de instrumento de pagamento, que se afigura

como uma manifestação da revolução tecnológica sentida nas transferências eletrónicas

de fundos, o qual suscita complexos problemas de direito probatório, nomeadamente

quanto à repartição do ónus da prova e distribuição do risco.13

A) CONTRATO-QUADRO

Num momento precedente à celebração de operações de transferência eletrónica de

fundos, decorre a celebração de um contrato - quadro o qual se funda numa “relação de

colaboração estável, duradoura, de conteúdo múltiplo, cuja execução implica

designadamente, a celebração de futuros contratos entre as partes (…)”.14

11

Cfr. GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, O contrato-quadro no âmbito da utilização de meios de

pagamento electrónicos, Coimbra, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2011, p.179. 12

Idem, p.180. 13

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26 de dezembro de 2010, processo n.º

1943/09.1TJLSB.L-7, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 12.01.2018. 14

MONTEIRO, ANTÓNIO PINTO, Contratos de distribuição comercial, Almedina, 2004, p.108.

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Gradualmente, a locução contrato-quadro e a complexidade contratual que sustenta a

estrutura de contratos para utilização de instrumentos de pagamento foi ganhando

reconhecimento e ponderação por parte do legislador nacional, conseguindo, assim,

enquadramento no nosso ordenamento jurídico.

Com o DL n.º 91/2018 de 12 de novembro, que aprova o novo Regime Jurídico dos

Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica, transpondo a Diretiva (UE) 2015/2366,

é clarificada a conceção de contrato-quadro e os elementos basilares sobre os quais

assenta a sua estrutura contratual. Assim, do disposto no artigo 2.º, alínea i) do presente

diploma, consta uma definição clara de contrato-quadro, o qual representa o contrato de

prestação de serviços de pagamento que rege a execução futura de operações de

pagamento individuais e sucessivas e que pode enunciar as obrigações e condições

para a abertura de uma conta de pagamento.

Ao dia de hoje, com a entrada em vigor Diretiva 2015/2366/CE, de 25 de novembro de

2015, relativa aos serviços de pagamento no mercado interno, que revogou a Diretiva

2007/64/CE, verificamos que a definição de contrato-quadro se mantém nos mesmos

termos que a anterior Diretiva. De igual modo, também o âmbito de aplicação e

definição dos diferentes momentos contratuais do contrato-quadro, são expressamente

contemplados à luz da nova Diretiva.

Neste sentido, no plano jurídico, o contrato - quadro enforma-se numa complexidade de

relações jurídicas que se complementam entre si, sustentando uma verdadeira teia de

contratos.15

Da complexidade contratual que o contrato-quadro envolve em relação às sucessivas

operações de transferência eletrónica de fundos ordenadas através da Internet, cumpre

15

Cfr. GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, O contrato-quadro (…), pp. 174 e 175; Refere ainda a autora,

a propósito da utilização de cartões, que “os procedimentos necessários para desencadear uma

transferência electrónica de fundos que satisfaça o credor do titular de um cartão de pagamento, na sua

aparente singeleza, são na realidade sustentados por três feixes de relações jurídicas interligadas entre

si, que se estabelecem entre o titular do cartão e o beneficiário da ordem de pagamento, entre o mesmo

titular e o banco emissor do cartão e entre este último e o beneficiário do pagamento. Isto para não

mencionar uma quarta relação, que se estabelece entre o banco emissor do cartão e o banco beneficiário

do pagamento - uma vez que estes, as mais das vezes, não coincidirão -, na medida em que este último

não assume um papel autónomo na operação de pagamento electrónico, actuando como um auxiliar o

primeiro banco”.

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salientar que sempre que o utilizador de um serviço de banca electrónica emite uma

ordem de pagamento – mandato de pagamento – a favor de um terceiro, é celebrado

um novo contrato de execução ou de aplicação do contrato de base anterior, que se

rege pelo programa contratual definido, num primeiro momento, no contrato-quadro.16

Conforme anteriormente explanado, somos de referir que cada ato de pagamento

configura um ato isolado neste leque de operações agregadas ao contrato-quadro, sendo

que da execução de cada uma individualmente resultam diferentes destinatários,

montantes, circunstâncias temporais, entre outras condições.

Também a doutrina ecoa a ideia supra, referindo que a cada utilização do instrumento

de pagamento decorre uma operação isolada da qual resulta uma declaração de

vontades, existindo, por isso, uma renovação de vontades17

a cada operação de

pagamento, quer da parte do utilizador, quer da parte do prestador de serviços.18

Cumpre, pois, avultar que uma nova emissão de uma ordem de pagamento a favor de

terceiro, decorrente da utilização dos canais digitais colocados à disposição pelo banco,

desencadeia a celebração de um novo contrato de execução do contrato de

homebanking. Assim, o contrato de homebanking é, por sua vez, também um contrato –

quadro relativamente às sucessivas operações de transferência eletrónica de fundos

ordenadas através da internet.19

Destarte, a inserção do contrato de homebanking numa relação contratual complexa,

potencia a celebração de uma panóplia de contratos subsequentes, intrinsecamente

16

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A repartição dos prejuízos decorrentes de operações fraudulentas

de banca eletrónica (home banking): anotação ao Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de

23.10.2012, Proc. 305/09”, in Cadernos de Direito Privado. Braga: CEJUR. Nº 41 (janeiro/março 2013)

p. 59. 17

De acordo com GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, I Congresso de Direito Bancário, Almedina, 2015,

p. 123,“a autorização genérica que possa ser prestada no contrato base de utilização do instrumento de

pagamento (no contrato-quadro), não é suficiente para desencadear a operação. A lei exige uma

renovação da vontade do utilizador do serviço, embora se baste, com a adopção dos comportamentos

fixados no contrato para o efeito: marcação de um código secreto num terminal de um computador

instalado no estabelecimento do beneficiário, assinatura manual, inserção de uma ou mais chaves de

acesso no site do banco, através do teclado do computador do utilizador, no caso do homebanking, etc”.

Do lado do utilizador de serviços, também é referido pela autora que também estará implícita a

manifestação da sua vontade na concretização da ordem de pagamento. Assim, leia-se “o prestador de

serviço de pagamento é chamado a conferir a conformidade da ordem de pagamento recebida e a

manifestar a sua concordância com a mesma”. 18

Idem. 19

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A repartição dos prejuízos (…)”, p. 59.

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18

ligados ao contrato quadro, afigurando-se, assim, como um contrato de contratos, um

contrato que antecipa futuros contratos.20

Conforme exposto no Acórdão de 29 de fevereiro de 2018, o Tribunal da Relação do

Porto considerou que “a utilização do serviço de pagamento através da respetiva conta

de pagamento pressupõe, todavia, a prévia celebração de um contrato quadro – “o) um

contrato de prestação de serviços de pagamento que rege a execução futura de

operações de pagamento individuais e sucessivas e que pode enunciar as obrigações e

condições para a abertura de uma conta de pagamento; ou no caso de operação de

pagamento de caráter isolado a celebração de um contrato de serviço de pagamento de

caráter isolado (cfr. artigos 46º e segs. e 51º e segs. do RJSP).

No caso, pelas operações individuais e sucessivas que ocorreram, necessariamente que

a sua execução estava dependente da celebração de um contrato quadro”.21

Face ao exposto, e em resposta à recorrente utilização eletrónica diária da

multiplicidade de operações de transferências de fundos, com recurso aos diversos

canais digitais disponibilizados pelas instituições financeiras, que permitem a sua

execução e conclusão de uma forma célere, eficaz e simples, cumpre avultar que cada

operação individualmente concluída, não é mais do que um acordo de vontades, não se

cingindo a simples atos de execução de um contrato anterior.22

B) INSERÇÃO NO COMPLEXO CONRATUA L

O enquadramento do homebanking no seio da relação bancária inicia-se com a

celebração do contrato de abertura de conta, entendido como um contrato bancário

matriz, 23

no qual é constituído o quadro geral de regulação de negócio que venha a ser

posteriormente celebrado pelas partes.

Neste sentido, e nas palavras de Maria Raquel Guimarães, a realização de operações de

home banking – transferências electrónicas, pagamentos de serviços, entre outras –

pressupõe um complexo de contratos que permite regular, de antemão, as relações

20

Idem. p.151. 21

Processo n.º 572/17.0T8PRT.P1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 03.04.2018. 22

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, O Contrato-quadro (…), p.133. 23

ANTUNES, JOSÉ ENGRÁCIA, Direito dos Contratos Comerciais. Coimbra: Almedina, 2009, p.484.

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entre o banco prestador do serviço e o seu cliente, utilizador do mesmo, simplificando

os procedimentos a adoptar no momento em que essas operações são concretizadas.24

Entendeu ainda o Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão de 24 de maio de 2012,

processo n.º 192119/11.8YIPRT.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, que “O contrato de

conta bancária - enquanto contrato nuclear instituinte do tronco comum sobre o qual

repousarão todas as relações jurídicas entre banco e cliente, inclusive contratuais,

possui um conteúdo negocial complexo do qual fazem parte, necessária ou usualmente,

outras convenções acessórias embora autónomas: tal o caso do contrato de conta-

corrente bancária e do contrato de depósito.”

Ao abrigo de tal entendimento o contrato de homebanking afigura-se distinto dos

restantes contratos, apesar de conexos entre si. E conexos mas independentes são, por

sua vez, os contratos subsequentes que derivam da convenção “troncal” da relação

banco-cliente.25

Assim, a autonomia do contrato de homebanking resulta do acordo de vontades

autónomas mas convergentes e articuladas, com fim a permitir a movimentação de

fundos na conta pelo cliente através de recurso informático. Deste modo, o contrato de

banca eletrónica não é mais do que um contrato de prestação de serviços reconhecido

eletronicamente e que constitui a faculdade de utilização do serviço pelo cliente,

mediante a adesão ao contrato de banca eletrónica,26

funcionando autónoma mas

intrinsecamente ligado ao contrato de abertura de conta.

Igualmente conexo aos contratos de abertura de conta e de homebanking está o contrato

de depósito bancário. No seio do nexo funcional que complementa a relação jurídica

bancária, o contrato de depósito e o de homebanking afiguram-se complementares uma

vez que, havendo interesse da parte do cliente na movimentação de fundos disponíveis

depositados na conta bancária, poder-se-á recorrer à utilização dos instrumentos de

pagamento eletrónico. Assim, o contrato de homebanking funciona como um contrato

24

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A repartição dos prejuízos (…)”, p. 58. 25

Idem. 26

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 23 de outubro de 2012, processo n.º

305/09.5TBCBT.G1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 23.02.2018.

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acessório e instrumental em relação ao contrato de depósito, fazendo apenas sentido se

existir uma relação negocial subjacente, assente na disponibilização de fundos

disponíveis para movimentação.

Em suma, da complexidade constituída a partir da celebração de um contrato de conta

e da constituição de depósitos de montantes em conta por parte do cliente ou de

abertura de crédito27

, surge o homebanking. Enquadrado numa relação bancária

complexa, a utilização de um instrumento de pagamento eletrónico surge como uma

faculdade concedida ao cliente mediante a adesão ao contrato de banca eletrónica.

Autónomo mas interdependente em relação a outros contratos, da celebração do

contrato de homebanking decorre uma complexidade de direitos e deveres que regulam

a relação obrigacional duradoura entre as partes utilizador e prestador de serviços de

pagamento, aspeto com que nos iremos deter seguidamente.

27

BARREIRA, CAROLINA, “Home banking: a repartição dos prejuízos decorrentes de fraude

informática”, in Revista Eletrónica de Direito, n.º 3, outubro de 2015, Faculdade de Direito da

Universidade do Porto, p.8.

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- CAPÍTULO III –

DEVERES ASSOCIADOS À UTILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE

PAGAMENTO

Do contrato de homebanking e da relação obrigacional complexa daí oriunda, emerge

uma variedade de direitos e obrigações que recaem sobre as partes na utilização do

serviço de pagamento.

A alusão ao Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica,

adiante designado por RSP, abordado no prévio desenvolvimento relativo ao contrato de

homebanking, também assumirá, na presente análise, um enquadramento legal

relevante, relativo ao conjunto de direitos subjetivos, direitos potestativos e deveres

principais nas relações jurídicas estabelecidas entre o utilizador e o prestador de

serviços de pagamentos.28

1. DO UTILIZADOR

A entidade bancária confere aos seus clientes a possibilidade de utilização de um

serviço de homebanking para movimentação dos fundos. Trata-se, pois, da prestação

principal do banco que confere aos utilizadores a possibilidade de usufruir de um

serviço que lhes permita a gestão e movimentação dos fundos disponíveis nas suas

contas bancárias.

Assim, a entidade bancária confere a possibilidade de os seus clientes usufruírem de um

serviço que lhes permita a gestão e movimentação dos fundos disponíveis nas suas

contas bancárias.

Não obstante o direito de utilização de tais serviços, à luz do artigo 110.º do DL n.º

91/2018, de 12 de novembro, relativo ao supra referido Regime Jurídico dos Serviços

de Pagamento e da Moeda Eletrónica, e que revogou o anterior artigo 67.º constante do

DL n.º 317/2009, de 30 de outubro, ao utilizador de serviços de pagamento recaem

determinados deveres:

28

MARIA RAQUEL GUIMARÃES, O contrato-quadro (…), p. 279.

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A) Dever de utilização correta do serviço de homebanking

Ao abrigo do artigo 110.º n.º 1 alínea a) do RSP, o cliente utilizador fica sujeito a

deveres de conduta, os quais constituem uma condição sine qua non da correta

utilização do serviço de homebanking.

Do ponto de vista técnico-jurídico, a utilização do serviço de homebanking por parte do

utilizador, não constitui um dever principal, mas sim instrumental de conduta, mediante

o qual o processamento da relação contratual se torna exequível.

Assim, a fim de beneficiar de tal serviço, o utilizador do serviço de homebanking,

deverá cumprir com determinadas exigências de conduta, às quais estão aliados outros

deveres no âmbito obrigacional, nomeadamente o princípio da boa fé, consagrado no

artigo 762.º n.º 2 do Código Civil.

B) Dever de comunicação imediata ao banco de qualquer operação abusiva do

instrumento de pagamento não autorizada ou do extravio dos códigos de acesso e

cartão matriz

Aos deveres acessórios supra referidos, acresce ainda um outro dever na ótica do

utilizador, consagrado nos termos do artigo 110.º n.º 1, alínea b) do RSP, segundo o

qual incumbe ao cliente notificar “sem atrasos injustificados” o banco logo que tenha

conhecimento da perda, roubo, ou apropriação abusiva ou qualquer utilização não

autorizada do instrumento de pagamento.

Com efeito, compete ao cliente o dever de comunicação à instituição bancária caso se

verifique qualquer irregularidade derivada da utilização abusiva do instrumento de

pagamento.

Por outro lado, deverá a instituição bancária disponibilizar a todo o tempo os meios

adequados à realização da correspondente notificação por força do artigo 111.º n.º 1

alínea c) do RSP. Esta notificação assume uma importância decisiva, uma vez que,

estabelece o momento a partir do qual o cliente não suporta as consequências

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financeiras resultantes das operações de pagamento, questão que mais adiante

analisaremos.

C) Dever de confidencialidade dos dados pessoais e chaves de acesso associados

ao homebanking e dever de guarda do cartão matriz

À luz do artigo 110.º n.º 2 do RSP, o cliente do serviço de homebanking deve adotar

medidas que garantam a preservação da eficácia dos respetivos códigos de acesso a este

serviço.

Trata-se, pois, de um dever que se reporta à confidencialidade das senhas de acesso

inscritas no cartão matriz, facultadas pela instituição bancária e que permitem o acesso

ao serviço de homebanking e correspondentes operações disponibilizadas ao utilizador.

Assim, uma vez digitados os códigos de acesso e os três dígitos do cartão matriz, o

sistema reconhece o utilizador do serviço de banca eletrónica como o legítimo portador

de tais dispositivos e, consequentemente, enquanto cliente, poderá usufruir dos serviços

disponibilizados eletronicamente.

Sendo este serviço não presencial e realizado à distância, com recurso a um formato

eletrónico, mediante a introdução dos dados entregues ao cliente, a instituição bancária

valida-os presumindo que está perante o seu verdadeiro portador.29

Ora, sendo as

respetivas operações devidamente autorizadas, mediante a introdução das chaves de

acesso, compete a natural exigência do banco ao cliente de um dever de sigilo, guarda e

de não transmissão a terceiros, ainda que seus mandatários, dos dispositivos de

segurança em causa, sob pena de toda a base de confiança em que assenta este contrato

se desvirtuar.

29

FARIA, JOSÉ MANUEL, “Acesso a contas bancárias por terceiros no âmbito de operações de

pagamento”, in Revista da Banca, Lisboa: Associação Portuguesa de Bancos. N.º 71 (janeiro/junho

2011), p.32.

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2. DO PRESTADOR DE SERVIÇOS

A) Dever de emissão e entrega do cartão matriz e códigos de acesso

Com a utilização do serviço de homebanking, surge o dever de emissão e entrega ao

utilizador do respetivo cartão matriz e correspondentes códigos de acesso (credenciais),

com vista à correta e legítima autenticação.30

Trata-se de um dever acessório ao dever principal constante da alínea a) do n.º 1 do

artigo 111.º do RSP.

Deste modo, cabe ao prestador de serviços o dever de, exclusivamente, entregar ao

utilizador do serviço de homebanking as credenciais necessárias para autenticação,

assegurando a não interceção por parte de terceiros. A manifestação deste dever de

cuidado por parte do prestador de serviço, é feita logo que se proceda ao envio do cartão

e códigos de acesso. Neste sentido, e à luz do disposto no artigo 111.º n.º 2 do RSP,

aquando do envio ao ordenante do instrumento de pagamento ou dos respetivos

dispositivos de segurança personalizados, e se verificados quaisquer riscos associados

ao extravio ou interceção dos dispositivos de segurança personalizados por terceiros

estranhos à relação contratual, tais correrão por conta do prestador do serviço de

pagamento.

O cartão matriz, bem como os códigos de acesso conferidos ao cliente pelo prestador de

serviços, assumem a função de autenticação, sendo que a introdução dos mesmos pelo

cliente, torna possíveis as operações de crédito ou de débito.

O sistema de autenticação é hoje um ponto de fragilidade nos serviços de pagamento

eletrónicos, pelo que a nova Diretiva 2015/2366, de 25 de novembro de 2015, relativa

30

No entendimento plasmado no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15 de junho de 2010,

processo n.º 1408/08.9TBACB.C1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 15.02.2018:“A emissão de

um cartão de débito tem assim como requisito necessário a existência de um contrato de depósito

bancário, contrato este que é, digamos, a sua causa remota. No entanto a causa próxima da emissão de

um cartão de débito é, já não o depósito bancário, mas sim um outro contrato, comummente designado

“contrato de utilização”. Mediante a conclusão de um contrato de utilização, o cliente do banco adquire

um direito obrigacional que lhe permite utilizar um “cartão de plástico” em terminais POS e ATM,

conservando o banco, todavia, o direito de propriedade sobre o mesmo cartão”.

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aos serviços de pagamento no mercado interno, transposta para a ordem jurídica

portuguesa no DL n.º 91/2018, de 12 de novembro, veio implementar exigências

adicionais a nível de autenticação forte na autorização da operação de pagamento, tendo

sido

A autenticação forte pressupõe uma utilização mais rigorosa para o início e

processamento de pagamentos eletrónicos, com vista à redução de risco de fraude para

todos os meios de pagamento, sejam os mais tradicionais ou os mais atuais. A

confidencialidade dos dados financeiros do utilizador, são uma premissa que se pretende

assegurar com as novas exigências comunitárias definidas na nova Diretiva de Serviço

Pagamentos, que adiante se abordará.

B) Dever de garantia de disponibilidade a todo o momento dos meios adequados

que confiram ao utilizador a possibilidade de comunicação de fraude

No seguimento dos deveres de conduta supra referidos, compete ao banco prestador de

serviço de pagamento o dever de garantir a disponibilidade a todo o momento dos meios

adequados para que, em caso de ocorrência de fraude, o utilizador do serviço possa

comunicar ao banco o ocorrido.

Assim, caso se verifique uma situação de operação não autorizada pelo utilizador

incumbe ao banco o dever de disponibilizar, a todo o tempo, os meios adequados à

realização desta notificação por força do artigo 111.º n.º 1, alínea c) do RSP. Tal

notificação assume relevância decisiva, uma vez que estabelece o momento a partir do

qual o cliente não suporta as consequências resultantes de fraude ou operações não

autorizadas.

Além disso, pelo artigo 111.º n.º 1, alínea d) do RSP, e no seguimento do supra

referido, incumbe ao banco o dever de disponibilizar ao utilizador de serviços de

pagamento, os meios necessários para fazer prova de que efetuou tal comunicação,

sendo um dever que deverá ser cumprido a pedido do respetivo utilizador do serviço.

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C) Dever de prestação de um serviço de homebanking eficaz e seguro

A celeridade e eficiência que o serviço de homebanking, tem inerentes riscos próprios

associados ao seu funcionamento. Em virtude dos mesmos, espera-se, quer da parte do

cliente, quer do prestador de serviços de pagamento, condutas diligentes, cabendo em

particular à entidade bancária o dever de assegurar a robustez dos sistemas informáticos

e, bem assim, garantir que não se verificam falhas técnicas durante as operações de

pagamento. Daqui resulta um dever acessório de conduta que assenta na qualidade e

segurança do serviço conferido ao cliente, conforme resulta do artigo 73.º do Regime

Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, doravante “RGICSF”.

Assim, compete ao banco, enquanto prestador do serviço de banca eletrónica, criar um

sistema informático de acesso à conta bancária que seja seguro e no qual o utilizador

tenha a necessária confiança para realizar as suas operações de pagamento.31

Pese embora o supra referido, e não descurando a exigência da prestação de um serviço

seguro, importa notar que o banco deverá, da mesma forma, prestar um serviço eficiente

na sua utilização, conforme se estipula no artigo 111º n.º 1 alíneas b) e e) do RSP.

D) Dever de informação acerca das medidas que o utilizador deve adotar para

preservar a segurança dos códigos de segurança e cartão matriz, como forma de

prevenção antifraude

Da relação de confiança gerada entre o banco e o seu cliente, aquando da abertura de

conta, nasce um dever lateral de conduta da entidade prestadora de serviços, assente na

obrigação de informação das medidas que o utilizador deve adotar para preservar a

segurança dos códigos e cartão matriz.

31

No mesmo sentido, vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de março de 2018, processo

n.º 14202/16.4T8LSB.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 18.05.2018: Os clientes

reconhecem aos bancos um superior conhecimento da sua atividade proveniente da sua

profissionalização e especialização, confiando que estes atuarão, não só de acordo com normais padrões

de diligência e correção ao nível da genérica boa-fé exigida na execução dos contratos (art.º 762.º n.º 2

do CC) ou da sua negociação prévia (art.º 227.º n.º 1 do CC), mas, mais do que isso, esperarão que estes,

tal como expressamente enunciado no RGICSF, pautarão a sua atuação por elevados padrões de

competência técnica (art.º 73.º do RGICSF), os quais se refletirão na “diligência, neutralidade, lealdade,

discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”, que deverão nortear as suas

relações com os clientes (art.º 74.º RGICSF)”.

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Nas palavras de Maria Raquel Guimarães, trata-se de "um dever imposto à entidade

bancária de explicar as situações mais comuns de fraude e os perigos específicos dos

diferentes serviços que fornece, em função do tipo de utilizador envolvido e dos seus

conhecimentos técnicos”.32

Regulado no artigo 84.º do RSP, o dever de informação é fulcral para elucidar o

utilizador das medidas preventivas de deverá adotar para preservação e segurança do

instrumento de pagamento.

Qualificado como uma máquina industrial complexa e perigosa,33

por acarretar um

sistema sofisticado e complexo de onde podem brotar técnicas de fraude eletrónica por

terceiros, cabe à entidade bancária proteger os utilizadores do serviço de homebanking,

acautelando-os dos perigos inerentes à sua utilização.34

Assim, deve a instituição bancária descrever ao utilizador do serviço de homebanking

um conjunto de medidas que o mesmo deve adotar para preservar a segurança dos seus

cartões de acesso e cartão matriz.

Não obstante o artigo 83.º do RSP caracterizar este dever como um dever de informação

pré-contratual, por força da sua remissão para o artigo 84.º, certo é que tal dever

acompanhará o decurso do contrato estabelecido.

Assim, numa ótica de prevenção antifraude, os utilizadores deverão ser notificados das

condições de acesso ao seu portal de banca eletrónica, bem como de todas as

recomendações e regras de segurança, com vista a acautelar eventuais ocorrências

fraudulentas. A título de exemplo, salientamos alertas como os de não abertura de

mensagens de correio eletrónico com remetente desconhecido; proteção do computador

ou dispositivo móvel com antivírus; evitar o acesso à plataforma de correio eletrónico

por links; utilização de rede doméstica no momento do acesso às páginas de

32

Cfr. GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A repartição dos prejuízos (…)”, p. 62. 33

Idem. 34

Neste domínio, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 25 de novembro de 2013,

processo n.º 2869/11.4TBGMR.G1, disponível in http://www.dgsi.pt, consultado em 18.02.2018.

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homebanking, entre outras medidas preventivas que visam impedir possíveis esquemas

de fraude, como as técnicas de phishing e pharming, já comumente conhecidas.

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- CAPÍTULO IV-

ESQUEMAS FRAUDULENTOS NA BANCA ELETRÓNICA

Feito o enquadramento geral da relação obrigacional inerente ao contrato de

homebanking, versemo-nos agora sobre a temática da fraude informática da banca

eletrónica.

A banca eletrónica (frequentemente designada por homebanking, e-banking, bancos

virtuais ou bancos online) corresponde à prestação de serviços bancários com recurso a

meios tecnológicos, através da Internet.

Partilhamos, pois, do entendimento de António Menezes Cordeiro, a respeito da

simplicidade que os meios informatizados apresentam na prática dos mais variados atos

bancários.35

Por ser elucidativo, transcreve-se ainda o que sobre o assunto refere o Supremo Tribunal

de Justiça, no Acórdão de 18 de dezembro de 2013, a propósito do conceito de

homebanking que se concretiza “pela possibilidade conferida pela entidade bancária

aos seus clientes, mediante a aceitação de determinados condicionalismos, a utilizar

toda a panóplia de operações bancárias, online, relativamente às contas de que sejam

titulares, utilizando para o efeito os canais telemáticos que conjugam os meios

informáticos com os meios de comunicação à distância, por meio de uma página segura

do banco, o que se reveste de grande utilidade, especialmente para utilizar os serviços

do banco fora do horário de atendimento ou de qualquer lugar onde haja acesso à

Internet”.36

35

Cfr. CORDEIRO, MENEZES ANTÓNIO, Manual de Direito Bancário, 3.ª edição, Coimbra,

Almedina, 2006, pp. 147-150. Em consonância com o entendimento defendido pelo autor, refere

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “ As transferências eletrónicas (…)”, pp. 43-44, que, “em todos os

sistemas de homebanking o utilizador tem a possibilidade de realizar operações bancárias em tempo

real, na medida em que tem acesso direto ao computador do seu banco, que imediatamente debita ou

credita a conta do seu cliente, consoante o sentido das ordens emitidas por este (…) A segurança destes

serviços é normalmente garantida através da existência de várias combinações numéricas de

conhecimento exclusivo do utilizador, que funcionam como códigos secretos de acesso ao sistema, e que

terão que ser marcados no teclado do equipamento utilizado para comunicar com a instituição bancária

respetiva (…) No entanto, estes dispositivos de segurança revelam-se por vezes insuficientes,

principalmente quando é utilizada uma rede de telecomunicações, na medida em que não é possível a um

terceiro intercetar uma comunicação deste tipo e decifrar códigos marcados para posteriormente aceder

ao sistema.” 36

Processo n.º 6479/09.8TBBRG.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 21.02.2018.

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Através desta forma de relacionamento entre o banco e o cliente, o banco deve reforçar

o compromisso com os seus clientes com vista ao aperfeiçoamento e desenvolvimento

da atividade bancária, designadamente pela capacidade de resposta rápida e eficiente,

sem descurar, naturalmente, os deveres de informação, lealdade, diligência e

transparência inerentes à confiança recíproca entre as partes, tal como se encontra

vertido nos artigos 74.º e 77.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades

Financeiras (Decreto-Lei n.º 298/92, de 31/12, com as alterações introduzidas pela Lei

n.º 71/2018, de 31/12).

Do anonimato, simplicidade e celeridade nas transações que a Internet facvorece, nasce

um palco propício a atuações ilícitas por parte de terceiros.

Como já referido supra, é particularmente dramático quando as transferências bancárias

pela Internet são feitas à revelia dos titulares das contas.

As modalidades de fraude informática mais recorrentes são o phishing, o spyware e o

pharming.

1. O PHISHING

O phishing traduz-se numa técnica fraudulenta que se concretiza através do envio em

massa de mensagens de correio eletrónico com vista à obtenção de dados para o acesso

às contas bancárias de terceiros, desenvolvendo-se em duas etapas: primeiramente são

enviadas, em massa, mensagens de correio eletrónico não solicitadas, vulgo, spam37

, as

quais incluem uma ligação para uma página na web, com vista a ludibriar a vítima,

fazendo-a crer que está a receber um e-mail cujo remetente é o seu banco. Clicando na

hiperligação, a vítima é automaticamente reencaminhada para uma página, em tudo

semelhante à da entidade bancária, mas que, todavia, não corresponde ao seu site

oficial.

37

Atento o seu envio maciço, criam não apenas incómodos ao utilizador, como podem, inclusive,

bloquear o sistema de receção de mensagens por saturação.

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31

A vítima depara-se, portanto, com uma página web que é uma réplica da página oficial

do banco38

, onde lhe será solicitada a identificação, informação pessoal e confidencial

(tais como o número da conta ou o número de contribuinte) e a aposição das palavras-

passe relativas à sua conta bancária, passando os piratas informáticos a conhecer os

códigos secretos e a aceder à conta da vítima, sem o seu consentimento.39

A página web replicada cria no destinatário uma falsa representação da realidade,

induzindo-o em erro, gerando a crença de que existe um fundado motivo para agir,

razão que leva a vítima a fornecer os seus dados.

Chegados aqui, cumpre aprofundar o elenco de ilícitos criminais contidos no phishing.

São eles: a falsidade informática, o dano informático, o acesso ilegítimo, a interceção

ilegítima e a burla informática, os quais iremos, seguidamente, detalhar.

A) Falsidade informática (artigo 3.º da Lei do Cibercrime)

O crime de falsidade informática, previsto no artigo 3.º da Lei do Cibercrime (Lei n.º

109/2009, de 15/09, doravante “LC”) consiste na falsificação de programas ou dados

informáticos, consumado pela produção de dados ou documentos não genuínos.

Os elementos objetivos tipificadores deste crime são “(…) introduzir, modificar, apagar

ou suprimir dados informáticos ou, por qualquer outra forma, interferir num tratamento

informático de dados, produzindo dados ou documentos não genuínos (…)”.

Por sua vez, são elementos subjetivos específicos deste crime “ a intenção de provocar

engano nas relações judiciais” e a intenção de que os documentos não genuínos

produzidos “sejam considerados ou utilizados para finalidades juridicamente relevantes

como se o fossem”.

38

Os websites fraudulentos para os quais a vítima é redirecionada, ao serem réplicas da imagem,

linguagem e marca identificativas da entidade fidedigna, reconduzem-nos a outro tipo de ilícito criminal:

o crime de contrafação, imitação e uso ilegal de marca, plasmado no artigo 320.º do Código da

Propriedade Industrial (DL n.º 110/2018, de 10 de dezembro).

Esta contrafação é, no entanto, entendida como um mero ato de execução do crime informático

consubstanciado no phishing, não sendo, pois, autonomizável. 39

Cfr. VERDELHO, PEDRO, “Phishing e outras formas de defraudação nas redes de comunicação”, in

Direito da Sociedade de Informação, vol. III, Coimbra Editora, 2009, p. 42.; A técnica do phishing é

ainda descortinada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de dezembro de 2013, processo n.º

6479/09.8TBBRG.G1.S1 e no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07 de outubro de 2014,

processo n.º 747/12.9TJPRT.P1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, consultados em 21.02.2018.

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32

Por força da relevância do bem jurídico aqui em causa (segurança das relações

jurídicas), este ilícito criminal tem uma natureza pública.

A previsão deste crime visa proteger a segurança das relações jurídicas enquanto

interesse público essencial que ao próprio Estado de Direito compete assegurar, e não a

confidencialidade, integridade e disponibilidade de sistemas informáticos, de redes e de

dados informáticos.40

B) Dano informático, acesso ilegítimo e interceção ilegítima (artigos 4.º, 6.º e 7.º

da LC)

A atividade de phishing é prosseguida através de malware, usado tanto para espiar o

computador da vítima, como para redirecionar o seu browser para URL´s falsos.41

Ora, a utilização desse malware origina a consumação dos três tipos de ilícitos criminais

em epígrafe. Vejamos:

i) A instalação de malware no computador ou no browser para alterar ou

afetar a sua capacidade de acesso à Internet configura um crime de dano relativo a

programas informáticos, tal como se encontra vertido no artigo 4.º, n.º 1 da LC;42

ii) A utilização de malware, consubstanciando o modus operandi do pirata

informático com vista à monitorização do computador da vítima, configura um crime de

acesso ilegítimo, tal como previsto no artigo 6.º da LC, cujos elementos tipificadores se

encontram nos n.ºs 1 e 2 do referido artigo.43 Por se mostrar elucidativo, transcreve-se o

40

Nas considerações expendidas pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de abril de 2013,

processo n.º 585/11.6PAOVR.P1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 21.02.2018, “O bem

jurídico tutelado pelo crime de falsidade informática p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 3 da Lei n° 109/2009,

de 15.09, não é o património, mas antes a “integridade dos sistemas de informação” através do qual se

“pretende impedir os actos praticados contra a confidencialidade, integridade e disponibilidade de

sistemas informáticos, de redes e dados informáticos, bem como a utilização fraudulenta desses sistemas,

redes e dados”.

No mesmo sentido, vide acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21 de novembro de 2012, processo

n.º 1001/11.9JAPRT.P1 e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de junho de 2011, processo

n.º 189/09.3JASTB.L1-5, disponíveis em www.dgsi.pt, consultados em 21.02.2018. 41

Cfr. GERALDES, ANA VAZ, “Phishing: fraude online”, in Revista da Faculdade de Direito da

Universidade de Lisboa, 2013, Coimbra Editora, p. 93. 42

“Quem, sem permissão legal ou sem para tanto estar autorizado pelo proprietário, por outro titular do

direito do sistema ou de parte dele, apagar, alterar, destruir, no todo ou em parte, danificar, suprimir ou

tornar não utilizáveis ou não acessíveis programas ou outros dados informáticos alheios ou por qualquer

forma lhes afectar a capacidade de uso, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa”. 43

“1 - Quem, sem permissão legal ou sem para tanto estar autorizado pelo proprietário, por outro titular

do direito do sistema ou de parte dele, de qualquer modo aceder a um sistema informático, é punido com

pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.

2 - Na mesma pena incorre quem ilegitimamente produzir, vender, distribuir ou por qualquer outra forma

disseminar ou introduzir num ou mais sistemas informáticos dispositivos, programas, um conjunto

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entendimento no Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdão de 17 de fevereiro de

2016, processo n.º 2119/11.TALRA.C2, disponível em www.dgsi.pt: “Comete o crime

de acesso ilegítimo (Artigo 6º, nºs 1 e 4, al a, da Lei nº 109/2009), o inspetor tributário

que, por motivos estritamente pessoais, acede ao sistema informático da Autoridade

Tributária, consultando declarações de IRS de outrem. O tipo subjetivo daquele ilícito

penal não exige qualquer intenção específica (como seja o prejuízo ou a obtenção de

benefício ilegítimo), ficando preenchido com o dolo genérico de intenção de aceder a

sistema)”.

O bem jurídico protegido nesta sede é a segurança dos sistemas informáticos, como

esclareceu o Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão, de 08 de janeiro 2014, processo

n.º 1170/09.8JAPRT.P2, disponível em www.dgsi.pt, ao entender que “O crime de

acesso ilegítimo, previsto no Artigo 6º da Lei do Cibercrime (Lei nº 109/2009)

incrimina exatamente a mesma factualidade que era incriminada pelo crime

correspondente (Artigo 7º da Lei nº 109/91). Todavia, na lei nova, não se exige

qualquer intenção específica (por exemplo, a de causar prejuízo ou a de obter qualquer

benefício ilegítimo), apenas se exigindo dolo genérico. O bem jurídico protegido é a

segurança dos sistemas informáticos.”

iii) Por fim, a utilização de malware pode ainda ser visto como a

concretização de um crime de interceção ilegítima, ao abrigo do artigo 7.º, n.º 1 da LC.

Trata-se de “intercetar transmissões de dados informáticos que se processam no interior

de um sistema informático, a ele destinadas ou dele provenientes”, “sem permissão legal

ou sem para tanto estar autorizado pelo proprietário, por outro titular do direito do

sistema ou de parte dele”, especificando-se ainda no n.º 2 que constitui crime de

interceção ilegítima “disseminar ou introduzir num ou mais sistemas informáticos,

dispositivos, programas ou outros dados informáticos destinados a produzir as ações

não autorizadas”, descritas no n.º 1.44

executável de instruções, um código ou outros dados informáticos destinados a produzir as acções não

autorizadas descritas no número anterior.” 44

Cfr. GERALDES, ANA VAZ, “Phishing: fraude online”, in Revista da Faculdade de Direito da

Universidade de Lisboa, 2013, Coimbra Editora, p. 94.

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Para efeitos do artigo 2.º, alínea e) da LC, a interceção é “o ato destinado a captar

informações contidas num sistema informático através de dispositivos eletromagnéticos,

acústicos, mecânicos ou outros”.

Nesta sede, somos de salientar engenharias enganosas, que se afiguram como variantes

do phishing, tais como o Smishing e Vishing, mecanismos ilícitos de captação de

informação pessoal do cliente, através de mensagens de texto (SMS) e sistema de voz

automático, enviadas para o telefone do usuário, criando uma sensação de urgência para

facultar de imediato as suas informações pessoais, nomeadamente dados bancários.

Face a tais riscos, torna-se imperativa a proteção do bem jurídico segurança e

privacidade das comunicações eletrónicas.

C) Burla informática (art. 221.º do Código Penal)

O crime de burla surgiu para penalizar as formas de captação do alheio por via de meios

ardilosos. Com a crescente utilização dos computadores e da Internet, o legislador sentiu

a necessidade de introduzir um novo tipo de crime: a burla informática (art. 221.º do

Código Penal).45 46

A dimensão típica do crime de burla informática remete para a realização de actos e

operações específicas de intromissão e interferência em programas ou utilização de

45

Com precisão, CORREIA, PEDRO RIBEIRO e JESUS, INÊS ANDRADE, “Combate às transferências

bancárias ilegítimas pela Internet no direito português: entre as experiências domésticas e políticas

globais concertadas”, in Revista Direito GV, maio-agosto 2016, p. 545, assinalam a conveniência em se

encontrar previsto o crime de burla informática, evidenciando a insuficiência do crime de burla, vertido

no art. 217.º do CP, para as manipulações dos sistemas e dados informáticos: “Atentando nos casos em

que os burlões enviam um e-mail a pedir os dados bancários do titular da conta e, depois de saberem o

código de acesso à conta bancária através da Internet, transferem uma quantia monetária sem a sua

autorização, verifica-se que o elemento típico consistente na prática, pelo burlado, de atos causadores de

prejuízo patrimonial não está preenchido. Na verdade, o e-mail enviado sob a capa do banco pode ser

considerado como um facto provocado astuciosamente. Além disso, o titular da conta é efetivamente

induzido em erro por esse e-mail. No entanto, não é a cedência do código de acesso pelo titular, mas antes

a transferência pelo burlão que provoca o prejuízo patrimonial. Logo, o crime de burla não se mostra

completo. Pode ainda afirmar-se que os computadores não são suscetíveis de erro ou engano, uma vez

que essa é uma característica especificamente humana.” 46

A burla informática prevista no n.º 1 do art. 221.º do CP é um crime semipúblico. Por conseguinte, o

procedimento criminal depende da apresentação de queixa por parte do ofendido ou de outra pessoa a

quem a lei confira esse direito, ao abrigo dos artigos conjugados 113.º e 116.º do CP e artigo 49.º do CPP.

O n.º 3 do art. 221.º do CP consagra a punibilidade da burla informática na forma tentada e o n.º 5 do

mesmo preceito prevê a burla informática qualificada, a qual assume a natureza pública, o que significa

que é o Ministério Público que promove o procedimento criminal, conforme dispõe o art. 48.º do CPP.

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dados nos quais está presente e aos quais está subjacente algum modo de engano, de

fraude ou de artifício que tenha a finalidade, e através da qual se realiza a específica

intenção de obter enriquecimento ilícito, causando a outra pessoa prejuízo

patrimonial.47

A clareza deste entendimento proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça permite

descortinar os elementos objetivos e subjetivo do ilícito criminal de burla informática.

Assim, são elementos objetivos a interferência no resultado de tratamento de dados, a

estruturação incorreta de programa informático e a utilização ou intervenção não

autorizada, por qualquer outro modo, no processamento.48 49

Para a técnica do phishing, aqui sob esmiúça, tem relevância o elemento objetivo que se

configura na utilização de dados sem autorização.

Por outro lado, emerge como elemento subjetivo a intenção de o agente obter, para si ou

para terceiro, um locupletamento ilegítimo, o que reflete, indubitavelmente, o dolo na

sua ação, porquanto tem plena consciência de que a sua conduta viola a lei, causando

prejuízo a terceiro.

Nos termos conjugados do art. 13.º e do art. 221.º do CP, a burla informática é um crime

doloso, não admitindo punição a título de negligência. Além disso, é um crime

intencional, que exige a verificação de uma intenção específica de enriquecimento

ilegítimo.

Em consonância com o referido, evidenciou o Tribunal da Relação do Porto, em

acórdão, de 03 de fevereiro de 2016, processo n.º 482/10.2SJPRT.P1, disponível em

www.dgsi.pt, que “A burla informática consiste num erro consciente provocado por

intermédio da manipulação de um sistema de dados ou de tratamento informático. Não

47

Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/09/2006, processo n.º 06P1942, disponível em

www.dgsi.pt, consultado em 22.02.2018. 48

Neste sentido, vide GERALDES, ANA VAZ, ob. cit., p. 95. 49

Evidencia GERALDES, ANA VAZ, ob. cit., p. 96, que existe um concurso aparente entre a burla

informática e demais crimes relacionados com o acesso ilegítimo e sabotagem informáticos, uma vez que

todos eles têm como finalidade um enriquecimento ilegítimo, servindo estes últimos de meros atos de

execução, e ainda por respeito ao princípio ne bis in idem, segundo o qual ninguém pode ser duplamente

punido pelo mesmo ilícito criminal (art. 29.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa).

Além disso, considerou ainda o Tribunal da Relação do Porto, em Acórdão de 30 de agosto de 2009,

processo n.º 15273/02.6TDLSB.P1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 25.02.2018, que a burla

informática consubstancia um crime de resultado: “Na burla informática a lesão do património produz-se

através da intromissão nos sistemas e da utilização em certos termos de meios informáticos - é um crime

de resultado, exigindo-se que seja produzido o prejuízo patrimonial de alguém.”.

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se exige um qualquer engano ou artifício por parte do agente, mas sim a introdução e

utilização abusiva de dados no sistema informático.”.

Deslindados os elementos tipificadores da burla informática, cumpre precisar qual é o

bem jurídico aqui protegido.

A generalidade da doutrina portuguesa apologiza que o bem jurídico protegido é o

património, com fundamento, essencialmente, na localização sistemática que o crime

ocupa no Código Penal.50

Porém, há vozes na doutrina e jurisprudência que entendem que este tipo criminal visa

também tutelar um interesse coletivo: o regular funcionamento dos sistemas e das redes

informáticas.51

2. O SPYWARE

Proveniente do malware, o spyware afigura-se um programa malicioso, instalado no

computador ou tablet do cliente, sem que este se aperceba. Uma vez instalado, deteta se

o cliente está a aceder a uma página de internet protegida e regista os dados inseridos

pelo utilizador.52

À semelhança do que acontece com o keylogger, programa de vigilância que procede à

recolha e armazenamento de toda a informação digitalizada, tais como endereços

pessoais de correios eletrónicos, dados e informações bancárias, nomeadamente

números de cartão bancário e senhas, o spyware vem recolher a informação de um

sistema de computação sem o consentimento do seu titular. Posteriormente, a recolha

dos dados será enviada para destinos alheios.

50

De igual modo entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 24/01/2007, processo n.º

5990/2006-3 e o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 05/11/2008, processo n.º 08P2817,

disponíveis em www.dgsi.pt, consultados em 25.02.2018, considerando que a burla informática é um

crime de dano, uma vez que pressupõe uma efetiva lesão do património, e um crime material ou de

resultado, exigindo a verificação de um prejuízo patrimonial. 51

Assim, SANTOS, RITA, O tratamento jurídico-penal da transferência de fundos monetários através

da manipulação ilícita dos sistemas informáticos, Coimbra, Coimbra Editora, 2005, p. 217, ao assinalar

que “existem normas relativamente às quais, não obstante a sua localização sistemática, se reconhece

protegerem bens jurídicos diversos daqueles que identificam a sua concreta integração no Código Penal”.

Ao nível da jurisprudência, acompanham o mesmo entendimento o Supremo Tribunal de Justiça, em

acórdão de 14/07/2004, processo n.º 04P3287 e em acórdão de 06/10/2005, processo n.º 05P2253, bem

como o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 03/5/2007, processo n.º 10042/06-5, disponíveis

em http://www.dgsi.pt, consultados em 25.02.2018. 52

Cfr. Notícia do Banco de Portugal, disponível em https://clientebancario.bportugal.pt/pt-

pt/noticias/proteja-se-contra-fraude-na-internet-banco-de-portugal-divulga-boas-praticas-nas-operacoes

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Este programa pode ser instalado de forma inofensiva pelo próprio usuário, aquando da

realização de um simples download aparentemente normal.

Alerta-se, pois, para os riscos inerentes às práticas do quotidiano realizadas no seio do

ecossistema digital cada vez mais revolucionário, mas igualmente potenciador de

práticas fraudulentas na banca eletrónica.

3. O PHARMING

O pharming é outra recorrente técnica fraudulenta, mas mais sofisticada e perigosa que

o phishing.

À semelhança do phishing, faz os utilizadores crerem que estão a aceder a um site

legítimo, quando não estão.

Inversamente ao que sucede no phishing, a difusão de ficheiros via spam é feita de

forma oculta, os quais, também de modo encoberto se autoinstalam nos computadores

dos utilizadores.

“Estes ficheiros ocultos são programas que captam os códigos de pulsação do teclado,

key loggers, e permitem que, sempre que o utilizador digita o endereço de determino

site, o sistema, por via das mencionadas alterações, redirija-o para uma outra página,

para além de registarem tudo o que é digitado no teclado do utilizador”.53

Ou seja, o utilizador, mesmo que digite o site oficial do seu banco, é involuntariamente

redirecionado para um outro site (falso), através do qual são recolhidas as informações e

códigos da vítima.

Este tipo de disseminação oculta de software malicioso é extremamente eficaz para os

criminosos, porquanto, contrariamente ao que acontece no phishing onde os criminosos

tentam ardilosamente enganar os utilizadores com o envio de mensagens de correio

eletrónico, admitindo uma suficiente margem de falibilidade uma vez que nem todos

caem no engano do esquema fraudulento, no pharming, o utilizador é enganado sem se

53

Conforme elucidativamente refere BARREIRA, CAROLINA, ob. cit., p. 27.

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aperceber, uma vez que o software malicioso ultrapassou de forma oculta a barreira de

proteção do computador.54

Quanto a este tópico, é muito claro o Tribunal da Relação do Porto, no acórdão de 07 de

dezembro de 2014, processo n.º 747/12.9TJPRT.P1, disponível em http://www.dgsi.pt,

quando considera que o pharming “(…) opera pelo mesmo princípio do phishing, ou

seja, fazendo os internautas pensarem que estão a aceder a um site legítimo, quando na

verdade não estão. Mas ao contrario do phishing, o qual uma pessoa mais atenta pode

evitar simplesmente não respondendo ao e-mail fraudulento, o pharming é

praticamente impossível de ser detectado por um utilizador comum da internet, que não

tenha maiores conhecimentos técnicos. Nesse novo tipo de fraude, os agentes

criminosos valem-se da disseminação de softwares maliciosos que alteram o

funcionamento do programa de navegação (browser) da vítima. Quando esta tenta

aceder a um site de um banco, por exemplo, o navegador infectado redireciona-a para

o spoof site (o site falso com as mesmas características gráficas do site verdadeiro). No

site falseado, então, ocorre a recolha das informações privadas e sensíveis da vítima,

tais como números de cartões de crédito, contas bancárias e senhas.”

54

No entendimento de VERDELHO PEDRO, ob. cit., p. 415, o pharming é muito difícil de se deslindar,

mesmo para utilizadores experientes e alertados, fazendo dele uma técnica muito mais perigosa para os

utilizadores dos serviços de homebanking.

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- CAPÍTULO V -

DISTRIBUIÇÃO DE PREJUÍZOS E IMPUTAÇAO DE

RESPONSABILIDADES RESULTANTES DAS OPERAÇÕES NÃO

AUTORIZADAS NO CONTRATO DE HOMEBANKING

No seio do ecossistema digital, o homebanking confere ao seu utilizador a

comercialização de produtos e a prática de diversos atos bancários de uma forma célere,

cómoda e prática. Todavia, de tal serviço emergem vicissitudes na segurança pelo que,

aos dias de hoje, a segurança das contas bancárias torna-se imperativa.

As ameaças cada vez mais recorrentes à segurança colocam em perigo as contas

bancárias dos clientes, que são alvo de intromissões não autorizadas acompanhadas da

movimentação do saldo dos depósitos bancários.

Neste domínio, Maria Raquel Guimarães denota que os prejuízos causados por este tipo

de actuação são tendencialmente elevados, podendo decorrer um espaço de tempo

considerável entre o momento em que a intromissão tem lugar e a sua detecção.55

Ora, perante tais ilícitos, sendo debitados montantes das contas dos clientes sem o seu

consentimento através do uso eletrónico do Instrumento de Pagamento, urge questionar

quem suporta os prejuízos decorrentes da utilização indevida dos serviços de

pagamento, questão com que nos ocuparemos.

A segurança do sistema de banca eletrónica está dependente da atuação diligente de

todos os seus utilizadores. Assim, para efeitos de repartição dos prejuízos entre as

partes, deverá ser apurada a atuação dos seus intervenientes, confirmando se foram

cumpridos os deveres que lhes estão adstritos pelo contrato celebrado. A repartição de

tais danos assentará numa ideia de distribuição equitativa dos prejuízos causados, na

medida do incumprimento dos deveres contratuais que sobre cada um impende,

decorrentes do princípio geral da boa fé.56

55

Idem. 56

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04 de julho de 2013, processo n.º

103841/11.3YIPRT.L1-2, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 03.03.2018.

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Nestes termos, dispõe o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 23 de

dezembro de 2012, disponível em http://www.dgsi.pt, que “I- A complexidade dos

sistemas bancários homebanking, concebidos e controlados pelos Bancos, assim como

a grande exigência dos mecanismos relacionados com a segurança das operações

bancárias através deles realizadas, a par da propriedade do banco sobre os valores

depositados pelos seus clientes, em ambiente contratual, justificam o funcionamento da

regra da presunção de culpa prevista pelo art.º 799º, nº 1, do Código Civil, que recai

sobre a entidade bancária na responsabilidade pela utilização fraudulenta daqueles

meios.

II- Em todo o caso, o banco pode elidir aquela presunção, afastando a sua culpa ou

demonstrando mesmo a culpa do cliente pela deficiente utilização daqueles meios

expeditos, designadamente, alegando e demonstrando que o cliente beneficiário violou

o contrato, divulgando na internet dados pessoais, secretos e intransmissíveis relativos

ao seu acesso, em benefício de hackers.

III- No primeiro caso, o Banco pode ainda ser responsabilizado pelo risco, enquanto na

segunda hipótese a responsabilidade é do cliente.” 57

1. Imputação de responsabilidade ao utilizador

Em sede de repartição de riscos provenientes da utilização indevida do serviço de banca

eletrónica, regula o artigo 113.º, n.º 1 do RSP 58

que, caso um utilizador de serviços de

pagamento negue ter autorizado uma operação de pagamento executada ou alegue que a

operação não foi corretamente efetuada, incumbe ao respetivo prestador do serviço de

pagamento o ónus de provar que a operação de pagamento foi autenticada, devidamente

registada e contabilizada e que não foi afetada por avaria técnica ou qualquer outra

deficiência do serviço prestado pelo prestador de serviços de pagamento.

Porém, para efeitos de prova, não é suficiente alegar apenas que foram cumpridos os

deveres que lhe estão implícitos, pelo que o prestador de serviços, vulgo banco, deverá

igualmente fazer prova de que o utilizador do serviço de homebanking agiu

57

Acórdão com o número de processo 305/09.5TBCBT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado

em 06.03.2018. 58

Anexo ao DL nº 91/2018 de 2 de novembro, que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE)

2015/2366 do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de novembro de 2015, relativa aos serviços de

pagamento no mercado interno (segunda Diretiva de Serviços de Pagamento), que procedeu a uma

revisão do enquadramento jurídico europeu em matéria de serviços de pagamento.

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negligentemente, incumprindo com os seus deveres de diligência a que está sujeito por

força do presente diploma.

Torna-se, pois, imperativo concretizar que a utilização indevida do serviço de

pagamento eletrónico correu por conta do seu utilizador que agiu de forma fraudulenta,

ou que não cumpriu, com dolo ou negligência grosseira, uma ou mais obrigações

previstas no artigo 110.º do RSP.59

Nesta sede, veja-se o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que

concretiza que, numa ótica de responsabilização pelos riscos decorrentes de esquemas

fraudulentos, “no contrato de homebanking, o prestador de serviços de pagamento

(normalmente um Banco), tem a obrigação de assegurar que os dispositivos de

segurança personalizados do instrumento de pagamento só sejam acessíveis ao

utilizador de serviços de pagamento que tenha direito a utilizar o referido instrumento,

sendo seu o risco do envio ao utilizador de um instrumento de pagamento ou dos

respetivos dispositivos de segurança personalizados. O utilizador de serviços de

pagamento responde pelas perdas resultantes de operações de pagamento não

autorizadas se tiver agido fraudulentamente ou com incumprimento deliberado de uma

ou mais das suas obrigações. Pode ainda responder por aquelas perdas se tiver atuado

com negligência grave, conceito que se pode definir como “negligência grosseira, erro

imperdoável, desatenção inexplicável, incúria indesculpável, vistos em confronto com o

comportamento do comum das pessoas, mesmo daquelas que são pouco diligentes”.60

Importa ter em consideração a regra da presunção de culpa estabelecida no artigo 799.º

n.º 1 do Código Civil, nos termos da qual recai sobre o banco depositário o ónus da

prova de que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação,

nomeadamente deficiências técnicas que possam potenciar eventuais utilizações

fraudulentas, não procedem por culpa sua.

Sustenta o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 25 de junho de 2015

que, “em todo o caso, avultando neste tipo de contratos de home banking a obrigação

de utilização correcta do serviço por parte do utente, o qual assenta em boa parte na

59

Com remissão para o Artigo 113.º, n.ºs 3 e 4 do RSP. 60

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de dezembro de 2014, processo n.º

1910/12.8TBVCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 15.05.2018.

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não divulgação dos seus elementos de segurança e códigos de acesso, o Banco pode

elidir aquela presunção, afastando a sua culpa ou demonstrando mesmo a culpa do

cliente pela deficiente utilização daqueles meios expeditos, designadamente, alegando e

provando que o cliente beneficiário violou o contrato, divulgando na internet dados

pessoais, secretos e intransmissíveis relativos ao seu acesso, em benefício de hackers.”

61

Chegados a este ponto, urge questionar a aceção das expressões dolo e negligência

grosseira do utilizador, constantes do artigo 113.º do RSP, para que possamos apurar

nos mais variados casos, se houve quebra dos deveres e consequente imputação de

responsabilidades.

Apreciados os comportamentos do utilizador, deverá ser verificado se o mesmo

incumpriu de forma dolosa e deliberada os seus deveres previstos no artigo 110.º do

RSP ou se facilitou a execução desta operação de pagamento movido por intuitos

fraudulentos, não cumprindo as regras de conduta diligente que lhe é vedado pela lei.

Ademais, tal disposição legal refere ainda que, havendo negligência grosseira por parte

do utilizador, isto é, um erro imperdoável, desatenção inexplicável, incúria

indesculpável, vistos em confronto com o comportamento do comum das pessoas,

mesmo daquelas que são pouco diligentes62

, a responsabilidade incidirá por conta do

ordenador.

Consubstanciam situações de negligência grave não só aquelas em que o cliente

forneceu os códigos de acesso e credenciais disponíveis no cartão matriz, como também

nos casos em que, pese embora o correto funcionamento dos serviços do banco e do

cumprimento do dever de informação ao cliente com a disponibilização de alertas de

segurança na página de homebanking perfeitamente claros e elucidativos na detetação

de interações fraudulentas, o mesmo procede com descuido e desatenção, conduta vista,

aos olhos da jurisprudência, como censurável, com a qual concordamos.

61

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo n.º 3052/11.4TBSTR.E1, disponível em

http://www.dgsi.pt, consultado em 18.06.2018. 62

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 17 de Dezembro de 2014, processo n.º

1910/12.8TBVCT.G1, abordado supra.

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Ainda assim, cumpre referir que tais condutas pouco cautelosas em muito decorrem da

iliteracia tecnológica que abrange muitos clientes. A falta de domínio de tecnologia no

acesso a meios informáticos é uma realidade comum num segmento de clientes,

nomeadamente idosos ou aqueles que apresentem um fraco domínio de tais ferramentas

para a realização de operações financeiras online.

Assim, deverá a entidade prestadora de serviços acautelar os clientes que,

aparentemente, demonstrem pouco domínio de tal ferramenta, recomendando o recurso

aos serviços tradicionais.

Ainda assim, de acordo com estudos efetuados em sede de segurança no homebanking,

mostram que as vítimas de fraudes não são necessariamente pessoas com baixa

educação, ingénuas ou idosos, pelo que em qualquer dos casos, sempre que haja uma

conduta negligente com incumprimento de tais obrigações, será o utilizador de tal

serviço a responsabilizar-se pelos prejuízos causados. 63

A título exemplificativo, somos de salientar situações constantes na nossa

jurisprudência, nomeadamente nos Acórdãos da Relação de Lisboa, de 12 de dezembro

de 2013 64

; de 15 de março de 2016 65

e ainda o Acórdão datado de 12 de outubro de

2017 66

, nas quais o Banco fica isento de quaisquer responsabilidades.

Atento o exposto, à luz do artigo 115.º n.º4 do anexo ao DL n.º 91/2018, de 12 de

novembro, havendo negligência grosseira por parte do ordenante, e tendo a entidade

63

De acordo com a notícia publicada no Jornal Expresso a 31 de agosto de 2009, disponível em

www.expresso.pt 64

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 164/11.8TBSRT.L1-6, disponível em

http://www.dgsi.pt, consultado em 18.06.2018, que refere que “Provando a Ré que a Autora fez uma

utilização imprudente, negligente e descuidada desse serviço, revelando a terceiros, na internet, os seus

códigos pessoais de acesso ao serviço, bem como dos elementos necessários para a

confirmação/validação da operação bancária, não lhe é exigível o pagamento das quantias por eles

indevidamente movimentadas”. 65

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo n.º 1063/12.1TVLSB.L1-1, disponível em

http://www.dgsi.pt, consultado em 18.06.2018, que decidiu que, “7.1-O Banco não será, em caso algum,

responsável pelos prejuízos derivados de erros de transmissão, deficiências técnicas, interferências ou

desconexões ocorridas por via e no âmbito dos sistemas de comunicação utilizados para a prestação do

Serviço. 7.2-O Cliente e os Utilizadores assumem inteira responsabilidade pela utilização negligente, indevida ou

fraudulenta das Chaves de Acesso e Cartão de Coordenadas. 7.3-O Cliente é responsável e suportará todos os prejuízos resultantes de uma utilização abusiva do

Serviço por intermédio de pessoas diferentes dos Utilizadores, quer estes sejam membros do órgão de

administração ou colaboradores do Cliente ou outras pessoas.” 66

Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de Dezembro de 2014, processo n.º

1910/12.8TBVCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 18.06.2018.

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prestadora de serviços provado que o utilizador incumpriu com as obrigações a que está

adstrito pelo artigo 110.º do mesmo diploma, será o utilizador do serviço responsável

pelos prejuízos causados pela utilização indevida dos serviços de banca eletrónica,

ficando sujeito a um pagamento superior ao limite definido pelo n.º 1 do mesmo artigo,

de € 50,00 (cinquenta euros),67

montante máximo para situações de negligência leve

pelo utilizador.

Por fim, não sendo possível ao banco provar que no decurso da operação fraudulenta

foram disponibilizado aos clientes informações acerca daquela fraude em concreto, ou

sendo um utilizador que não dispõe dos conhecimentos eletrónicos suficientes, ou ainda

quando se prove que logo que teve conhecimento comunicou imediatamente à entidade

prestadora de serviço o sucedido, a jurisprudência entende que ainda que seja um

comportamento passível de censura, o mesmo responsabilizar-se-á pelos prejuízos

resultantes de operações de pagamento não autorizadas a título de negligência leve,

conforme dispõe o artigo 115.º n.º1 do RSP. 68

2. Imputação de responsabilidade ao prestador de serviços de pagamento

Uma temática correlacionada com a fraude no homebanking, que se perscrutará

seguidamente, é a eventual responsabilidade da instituição bancária pelos danos sofridos

pelos seus clientes, fruto da pirataria informática.

Existe um amplo consenso na jurisprudência no que concerne à responsabilidade por

parte da entidade bancária. Vejamos:

Numa ótica, sobretudo, de defesa do consumidor, não havendo culpa nem negligência

grave do cliente na movimentação fraudulenta da conta, recairá sobre o banco a

responsabilidade, o qual terá que suportar as consequências da fraude, as quais

67

O montante de € 50,00 (cinquenta euros), definido no artigo 115.º n.º1 do presente diploma, constitui

uma alteração introduzida pela transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva (UE) 2015/2366 de

25 de novembro de 2015. 68

Assim, “O cliente do banco vê a sua posição agravada conforme vai aumentando o grau de censura

sobre a sua conduta. Na medida em que seja, ele próprio, o autor da fraude, então já o banco não

assumirá qualquer prejuízo pelas operações realizadas”, cfr. GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A

repartição dos prejuízos decorrentes de operações fraudulentas de banca eletrónica (home banking):

anotação ao Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23.10.2012, Proc. 305/09”, Cadernos de

Direito Privado, Braga: CEJUR. Nº 41 (janeiro/março 2013), p. 66.

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conseguiram pôr em causa a confiança que ele próprio se comprometeu a garantir

perante o cliente.69

Nas considerações expendidas pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão de 26 de

outubro de 2010, processo n.º 1943/09.1TJLSB.L1-7, disponível em www.dgsi.pt,“(…)

na sociedade de informação em que vivemos, só o banco tem hipótese de controlar os

riscos que para ele são mínimos e que poderão ser desastrosos para a A.. Por isso,

numa ótica de defesa do consumidor, não tendo o banco demonstrado culpa da A. na

movimentação fraudulenta da conta, o mesmo terá de suportar as consequências da

fraude no circuito cuja fiabilidade, de resto, ele próprio se comprometeu

contratualmente a garantir”.

Existe, aliás, uma presunção de culpa que recai sobre a entidade bancária, aquando das

transferências fraudulentas nas contas dos seus clientes, cabendo-lhe ilidir essa

presunção.70

69

Havendo negligência grave por parte do titular da conta bancária, por permitir ao criminoso o acesso às

suas credenciais, não restam dúvidas de que a responsabilidade deixará de correr por conta do banco,

passando a sê-lo por parte da vítima. Vide a este propósito o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de

15/03/2016, processo n.º 1063/12.1TVLSB.L1-1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 03.03.2018,

quando explica que “ Apenas há responsabilidade da vítima, se se determinar que ela, com negligência

grave, permitiu ao defraudador o acesso às credenciais de acesso. Negligência grave (ou grosseira)

corresponde à falta grave e indesculpável, consistente na omissão dos deveres a que se está adstrito, que

só uma pessoa especialmente desleixada, descuidada e incauta deixaria de observar. Não se provando

como o agente do crime obteve as credenciais, não pode qualificar-se a atuação da vítima como

gravemente negligente.”

Sufraga também o mesmo entendimento o Tribunal da Relação de Guimarães em acórdão de 17/12/2014,

processo n.º 1910/12.8TBVCT.G1, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 03.03.2018, quando

evidencia que “ Num contrato de home banking, o Banco tem a obrigação de assegurar que os

dispositivos de segurança personalizados do instrumento de pagamento só sejam acessíveis ao utilizador

de serviços de pagamento que tenha direito a utilizar o referido instrumento. O utilizador de serviços de

pagamento responde pelas perdas resultantes de operações de pagamento não autorizadas se tiver agido

com incumprimento deliberado de uma ou mais das suas obrigações. Pode ainda responder por aquelas

perdas se tiver atuado com negligência grave, conceito que se pode definir como “negligência grosseira,

erro imperdoável, desatenção inexplicável, incúria indesculpável, vistos em confronto com o

comportamento do comum das pessoas, mesmo daquelas que são pouco diligentes”. 70

Assim entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 21/05/2015, processo n.º

337/14.1YXLSB.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, consultado em 04.03.2018: “(…) para ilidir a

presunção de culpa que a onera, em caso de transferência fraudulenta, nos quadros de serviços de internet

banking, não basta à instituição de crédito a alegação e prova dos procedimentos de segurança adotados,

relativos à emissão do cartão respetivo e códigos de acesso, e às advertências e recomendações

publicitadas e transmitidas ao utilizador, quando, não se demonstrando a culpa de banda daquele, tão

pouco se tenha sequer comprovado qual o tipo de intromissão fraudulenta concretamente verificado. Para

além disso, em relação a uma operação de pagamento não autorizada, presume-se a culpa do prestador de

serviços de pagamento do ordenante, que não proceda ao imediato reembolso deste do montante da dita

operação”.

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Assim, sempre que o prestador de serviços de pagamento não consiga fazer prova do

incumprimento deliberado pelo utilizador do serviço, recairá sobre ele o reembolso

imediato do montante da operação de pagamento não autorizada.71

Deste modo, sendo-lhe imputados os prejuízos pelos débitos indevidos, ao abrigo do

novo Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica, fica o

prestador de serviços responsável por um reembolso imediato ao ordenante, após ter

tomado conhecimento da operação ou após lhe ter sido comunicada, sendo que o atraso

no cumprimento dessa obrigação acarretará o pagamento de juros moratórios. 72

73

Além disso, cumpre referir que o incumprimento do dever de reembolso é considerado

uma infração especialmente grave, punível com uma coima de € 10.000,00 (dez mil

euros) a € 5.000.000,00 (cinco milhões de euros), conforme artigo 151.º, alínea dd) do

DL n.º 91/2018 de 12 de novembro.

Ora, havendo quebras de segurança e de eficácia dos serviços prestados na banca

eletrónica, bem como o incumprimento dos deveres que competem ao prestador de

serviço de pagamento, contantes no artigo 111.º do RSP, deverá a instituição bancária

assumir tais responsabilidades decorrentes dos débitos indevidos nas contas dos seus

clientes.

Das decisões judiciais analisadas, e ainda que definidas ao abrigo do anterior Regime

dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica, DL n.º 157/2014, de 24 de outubro,

verificamos que a maioria dos tribunais tem condenado a entidade prestadora de

serviços de pagamento pela totalidade dos prejuízos decorrentes dos mais variados

esquemas fraudulentos assistidos nos serviços de homebanking.74

Neste sentido, em matéria de cumprimento dos deveres que à entidade prestadora de

serviços compete, veja-se o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de

5 de novembro de 201375

, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de

71

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, I Congresso de Direito Bancário, Almedina, 2015, p. 139. 72

Cfr. Artigo 114.º n.º 1 do RSP. 73

Cfr. Artigo 114.º n.º 10 RSP. 74

Vide Capítulo IV do presente estudo. 75

O Acórdão, com o n.º de processo 9821/11.8T2SNT.L1-1, esclarece que “O home banking é um s

erviço prestado ao cliente pelo Banco, sendo este que tem de diligenciar para que seja seguro e nele

possa o cliente confiar, devendo este utilizar esse serviço seguindo as regras de segurança que lhe

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dezembro de 201376

e no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado em 17

de dezembro de 2014,77

que entenderam ser responsável a instituição de crédito por tais

prejuízos.

Ademais, e conforme referido, não sendo possível provar este incumprimento ou

imputar a operação ao titular do instrumento de pagamento, recairá sobre a entidade o

risco de autorizar operações de pagamento realizadas com um instrumento de

pagamento. 78

Veja-se, neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, com

data em 3 de março de 2015 79

e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de

fevereiro de 2016,80

nos quais, uma vez mais, a entidade prestadora de serviços de

pagamento fica adstrita a suportar os danos causados.

tenham sido comunicadas pelo Banco”, processo disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em

25.07.2018. 76

Deste Acórdão, com o n.º de processo 164/11.8TBSRT.L1-6, consta que “1. Sendo o “homebanking”

um serviço prestado ao cliente pelo Banco, a este compete diligenciar pela sua segurança de modo a que

o seu utilizador não fique privado dos valores nele depositados pelo abusivo acesso a terceiros, sem a

sua autorização ou consentimento, ou seja, o cliente tem de poder confiar nesse sistema de acesso à sua

conta bancária e respectiva movimentação. 2. Sobre o Banco impende a obrigação de prestar um serviço eficaz e seguro (…)”, disponível em

http://www.dgsi.pt, consultado em 25.07.2018. 77

Refere o acórdão, com o n.º de processo 1910/12.8TBVCT.G1, que “IV – Num contrato de

homebanking, o prestador de serviços de pagamento (normalmente um Banco), tem a obrigação de

assegurar que os dispositivos de segurança personalizados do instrumento de pagamento só sejam

acessíveis ao utilizador de serviços de pagamento que tenha direito a utilizar o referido instrumento,

sendo seu o risco do envio ao utilizador de um instrumento de pagamento ou dos respectivos dispositivos

de segurança personalizado”, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em 25.06.2018. 78

GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, “A fraude no comércio eletrónico: o problema da repartição do

risco por pagamentos fraudulentos” in Infrações Económicas e Financeiras: Estudos de Criminologia e

Direito (J. Cruz, C. Cardoso, A. L. Leite, R. Faria, coordenação). Coimbra Editora, 2013, p. 593. 79

O Acórdão, com o nº de processo 1727/13.2TJLSB.L1-1, refere que “Não se tendo apurado ter o

cliente permitido o acesso de terceiros às suas credenciais, não se pode concluir ser imputável ao mesmo

a quebra da confidencialidade dos dispositivos de segurança”, disponível em http://www.dgsi.pt,

consultado em 25.06.2018. 80

O Acórdão, cujo n.º de processo é o 902/13.4TBCNT.C1, concretiza que “Não se tendo provado que o

cliente forneceu a terceiros (ao aceder a página ilícita) as chaves de acesso ao serviço de home banking

nem que, ao navegar na internet, permitiu que outrem tenha capturado as credenciais de acesso e

validação, recai sobre o banco a responsabilidade pela movimentação fraudulenta da sua conta

bancária, através da internet (Serviços Homebanking)”, disponível em http://www.dgsi.pt, consultado em

25.06.2018.

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- CAPÍTULO VI -

SOLUÇÕES DECORRENTES DA LEGISLAÇÃ COMUNITÁRIA -

DIRETIVA (UE) 2015/2366 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO

CONSELHO RELATIVA AOS SERVIÇOS DE PAGAMENTO NO

MERCADO INTERNO

O fenómeno da digitalização financeira tem ganho cada vez mais visibilidade e impacto

numa sociedade cada vez mais dependente da Internet e dos produtos por ela

disponibilizados.

Com efeito, a utilização da informática nas operações do quotidiano tornou-se inevitável

e o setor bancário sentiu a necessidade de acompanhar as exigências e expectativas dos

seus clientes, desmaterializando os serviços de pagamento e acompanhando a atual era

digital.81

82

Fruto das alterações dos hábitos dos clientes e face à necessidade de concorrerem em

igualdade de circunstâncias com os bancos da União Europeia, o sector bancário vem

apostar na tecnologia como modelo de negócio, adotando a sua estratégia digital,

potenciando a eficiência e redução de custos operacionais, alargando-a a mais processos

de negócio e aproximando-se mais das necessidades e expetativas dos clientes.83

Todavia, a capitalização da experiência digital dos bancos acarreta, de igual modo, um

impacto negativo na segurança dos serviços disponibilizados, conforme temos vindo a

analisar, razão que tem preocupado as instituições bancárias.

81

Ideia reforçada por GUIMARÃES, MARIA RAQUEL, As Transferências electrónicas de fundos e os

cartões de débito, Almedina, Coimbra, 1999, pp.42 e 43: “o homebanking veio revolucionar a concepção

clássica do modo de funcionamento das instituições bancarias, permitindo aos seus clientes realizar as

operações tradicionalmente levadas a cabo nos balcões das sucursais nos seus próprios domicílios”. 82

Da evolução tecnológica têm surgido propostas inovadoras e cada vez mais atuais, cfr. notícia

divulgada pelo Jornal Diário de Notícias, a 26 de junho de 2017, disponível em www.dn.pt e notícia

publicada no Jornal Expresso a 06 de Junho de 2018, disponível em www.expresso.pt. 83

Cfr. Artigo publicado no Jornal Económico “Banco de Portugal aprova abertura de contas bancárias

através de canais digitais” de 02 de agosto de 2017, disponível em www.jornaleconomico.sapo.pt.

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O risco é assim algo evidente para as instituições que trabalham afincadamente no

sentido de proteger os seus sistemas, ao mesmo tempo que modernizam infra-estruturas

e abraçam definitivamente o conceito de transformação digital. 84

As instituições de crédito estão sujeitas ao risco operacional, isto é, ao risco das perdas

resultantes da inadequação ou falhas dos processos internos, pessoas, sistemas ou de

eventos externos, que acarretam exposição das instituições bancárias ao pagamento

coercitivo de verbas, fruto de ações judiciais e regulatórias, propostas como

consequência de falhas operacionais.

Neste sentido, no seio dos serviços bancários digitais e dos mais variados esquemas

fraudulentos a que tal serviço está sujeito, torna-se imperativa a criação de mecanismos

de sensibilização para as nefastas consequências trazidas a ambas as partes (utilizador e

prestador de serviços), bem como adoção de medidas preventivas e de proteção dos

intervenientes.

Tais preocupações ocuparam a União Europeia naquela que tem sido uma realidade

bastante evolutiva em torno do regime dos serviços de pagamentos eletrónicos.

Assim, com a consciência da importância de tais realidades, e no seguimento do Livro

Verde lançado pela Comissão Europeia em 2012, o legislador comunitário aprovou em

2013 uma proposta de uma nova Diretiva de Serviços de Pagamentos, adiante designada

por “DSP 2”, isto é, a Diretiva 2015/2366 do Parlamento Europeu e do Conselho de 25

de Novembro, relativa aos serviços de pagamentos eletrónicos, que vem alterar as

Diretivas 2002/65/CE, 2013/36/CE e 2009/110/CE e revogar a Diretiva 2007/64/CE.

Nas palavras de Vasco Monteiro, “o foco das preocupações com esta diretiva tem

estado na segurança, quer das instituições quer dos consumidores, e na proteção de

dados, em resultado do acesso, por terceiros, às contas dos clientes bancários, tanto

84

Artigo publicado no Jornal de Negócios de 05 de julho de 2017, disponível em

www.jornaldenegocios.pt.

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para efeitos de serviços de informação sobre contas como para serviços de iniciação de

pagamentos.” 85

A DSP 2 veio, assim, ampliar aquele que era o âmbito da DSP 1, 2007/64/CE,

entretanto revogada.

Para além da criação de um mercado de pagamentos mais integrado e eficiente, que

dispõe de novas entidades que disponibilizam aos consumidores serviços de pagamento

inovadores, conforme dispõe o artigo n.º 19 e ss., a DSP 2 vem ainda realçar a

importância da segurança nos sistemas de pagamento, de forma a proteger os seus

consumidores.

Neste sentido, a nova diretiva de Sistemas de Serviços de Pagamentos vem introduzir

medidas de segurança melhoradas, dirigidas a todos os fornecedores de serviços de

pagamento, instituições bancárias entre outros agentes de mercado, designadamente aos

Third Party Providers, adiante designados por TPP, que beneficiam do mercado único

digital.86

85

Cfr. MONTEIRO, VASCO “Transformação digital do sector bancário. Desenvolvimentos recentes e

futuros no quadro legal e regulatório” in InforBANCA 111, nov’17-fev’18, p.27. 86

Desde a adoção da PSD1, surgiram novos serviços na área de pagamentos na Internet, onde os

chamados intermediários de pagamentos third party providers (TPP) oferecem soluções ou serviços de

pagamento específicos aos clientes. Ou seja, existem serviços que compilam e consolidam informações

sobre as diferentes contas bancárias de um consumidor em um único lugar "serviços de informações de

conta (AIS - Account Information Services)". Esses serviços normalmente permitirão que os

consumidores tenham uma visão global sobre sua situação financeira e analisem seus padrões de gastos,

despesas, necessidades financeiras de maneira amigável. Outros intermediários de pagamentos third party

providers (TPPs) tentam facilitar o uso de serviços bancários on-line para fazer pagamentos pela Internet

(os chamados "serviços de iniciação de pagamento (PIS - Payment Initiation Services"). Estes ajudam a

iniciar um pagamento da conta do cliente para a conta comercial criando uma "ponte" de software entre

essas contas, preenchendo as informações necessárias para uma transferência (quantidade da transação,

número da conta, mensagem) e informam o comerciante quando a transação é iniciada.

Até agora, entrar no mercado de pagamentos era complicado para estes fornecedores de serviços (TPPs),

já que muitas barreiras os impediam de oferecer as suas soluções em larga escala e em diferentes Estados

Membros. Com estas barreiras removidas, espera-se uma maior concorrência com novas entidades que

entram em novos mercados e oferecem soluções mais baratas para pagamentos a mais e mais

consumidores em toda a Europa. Os fornecedores de serviços de: pagamentos, TPPs, terão de seguir as

mesmas regras que os prestadores tradicionais de serviços de pagamento registo, licenciamento e

supervisão pelas autoridades competentes. Além disso, os novos requisitos de segurança incluídos no

texto da PSD2 obrigarão todos os fornecedores de serviços de pagamento a aumentar a segurança em

torno dos pagamentos online.

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O alto nível de segurança que a nova diretiva de serviços de pagamento vem introduzir,

exige a todos os fornecedores de serviços de pagamento prova de que os seus sistemas

possuem medidas apropriadas e preventivas de eventuais riscos operacionais no seio das

transações eletrónicas efetuadas.

Para tornar os pagamentos de serviços mais seguros, a DSP 2 introduz requisitos de

segurança rigorosos para o processamento de pagamentos eletrónicos, dirigidos a todos

os prestadores de serviços de pagamento, inclusive os recentemente regulamentados,

como forma de prevenção de operações fraudulentas dos pagamentos online para todos

os meios, bem como para proteger a confidencialidade dos dados financeiros do

utilizador.

Assim, os prestadores de serviços de pagamento serão obrigados a aplicar a chamada

autenticação forte, regulada no artigo 30.º n.º 4 da DSP 2, quando se proceda à iniciação

de uma transação de pagamento eletrónico.

Entende-se por autenticação forte do cliente, um processo que valida a identidade do

utilizador de um serviço de pagamento e a transação de pagamento por ele realizada, ou

seja, um processo que apura se o uso de um instrumento de pagamento está

efetivamente autorizado.

À luz do disposto no artigo 2.º alínea d) do DL n.º 91/2018 de 2 de novembro, que

transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2015/2366 do Parlamento

Europeu e do Conselho de 25 de novembro, a autenticação forte do cliente baseia-se no

uso de elementos tais como, o conhecimento, posse e inerência do utilizador, elementos

de validação da identidade do utilizador e da sua transação, afigurando-se como

essenciais num sistema de segurança projetado a proteger a confidencialidade dos dados

de autenticação.

A ideia supra materializada assenta no conhecimento do utilizador das senhas de acesso

ou PIN associados; que o mesmo possua o cartão ou um dispositivo gerador de código

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de autenticação; e que a identidade do mesmo seja reconhecida pelo uso de uma

impressão digital ou reconhecimento de voz para validar a identidade ou a transação.87

Face ao exposto, sendo a resolução de litígios a questão nuclear da nova Diretiva de

Serviços de Pagamento, salientamos aquele que é o punctum saliens da nosso estudo – a

segurança na banca eletrónica.

Assim, a autenticação forte nos sistemas de pagamento introduzida pela DSP 2, e, aos

dias de hoje, acolhida na ordem jurídica portuguesa no DL n.º 91/2018 de 12 de

novembro, “afigura-se como um aspeto fundamental para assegurar a proteção dos

utilizadores e a promoção adequada do desenvolvimento do comércio eletrónico em

condições concorrenciais”88

. Numa realidade coetânea marcada pela dinâmica dos

serviços de pagamento eletrónicos, sufragamos tais iniciativas. Acreditamos, pois, que

os mecanismos trazidos acautelarão a exposição ao risco operacional proveniente de

eventuais esquemas fraudulentos cada vez mais comuns.

Face ao exposto, e em sede de distribuição de prejuízos resultantes dos esquemas

fraudulentos na banca eletrónica, salientamos a importância dos mecanismos trazidos

pela DSP 2, capazes de fazer face aos condicionalismos tão comuns em matéria de

fraude no homebanking.

Assim, com as melhorias de segurança trazidas com a nova diretiva comunitária,

nomeadamente em torno da autenticação forte no acesso aos serviços de pagamento

online, reforça-se a proteção do consumidor e, consequentemente, da instituição

bancária que, em sede de repartição dos riscos, suporta a maior parte dos prejuízos

provenientes dos esquemas fraudulentos na banca eletrónica, conforme referido ao

longo do presente estudo.

87

Cumpre referir que nem todos os pagamentos eletrónicos estão sujeitos a autenticação forte do cliente,

ficando isentas todas as situações cuja necessidade e conveniência de segurança não se justifique. Assim,

dever-se-á atender ao risco que cada meio acarreta, bem como o valor das transações e os canais digitais

para o pagamento. Neste sentido, leia-se a informação do BdP, disponível em www.bportugal.pt. 88

Cfr. preâmbulo do DL 91/2018 de 12 de novembro.

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Em nosso entendimento, tais iniciativas pretendem acautelar e tornar robusta a

segurança nos pagamentos, tentando, assim, mitigar a exposição a riscos quer da

entidade prestadora de serviços, quer do utilizador.

Para além disso, os novos procedimentos de segurança incluídos na DSP 2 são

extensíveis às novas entidades fornecedoras de serviços de pagamento, TPP,

construindo, deste modo, um mercado de pagamentos europeu mais integrado,

competitivo, eficiente e seguro em torno dos pagamentos online.

Cremos por isso que, num setor onde a exposição ao risco operacional é tão recorrente,

a introdução de benefícios económicos, de proteção do consumidor e segurança nos

pagamentos conferem robustez ao sector bancário, principalmente em matéria

antifraude, pelo que a entrada da nova Diretiva de Serviços de Pagamento se afigura

uma boa via para o mercado de sistemas de pagamento e moeda eletrónica.

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- CONCLUSÃO –

O recurso à Internet e aos dispositivos móveis, como meios de viabilização do acervo de

produtos e serviços bancários, afigura-se um marco na modernização do setor bancário,

movido pelo aperfeiçoamento constante e da satisfação dos serviços disponibilizados,

com vista à satisfação das necessidades dos seus clientes.

Neste sentido, face às exigências de uma sociedade digital globalizada, e numa ótica de

simplificação e de redução dos custos de transação, assiste-se à diversificação de canais

utilizados para a contratação de serviços bancários, surgindo assim o sistema de

homebanking.

O homebanking permite aos seus clientes realizar as operações bancárias,

tradicionalmente levadas a cabo nos balcões das sucursais, em qualquer parte e em

tempo real, servindo-se para o efeito dos canais digitais.

Este fenómeno de desmaterialização foi alcançado pelos progressos que a Internet

trouxe, sendo um traço inequívoco da nossa era. Todavia não podemos descurar o que,

no seu âmago, é palavra de ordem: segurança.

Este é a principal preocupação na utilização dos canais digitais.

Ora, ainda que os acessos aos serviços de pagamento eletrónicos sejam feitos através de

chaves e combinações numéricas que são do exclusivo conhecimento do utilizador, a

infalibilidade de tais serviços tem vindo a perder robustez com os esquemas

fraudulentos cada vez mais frequentes na banca eletrónica. O phishing, o pharming, o

roubo de identidade e o malware são realidades cada vez mais frequentes no nosso

quotidiano.

Assim, perante tais ilícitos, sendo debitados montantes das contas dos clientes sem o seu

consentimento através do uso eletrónico do Instrumento de Pagamento, mostra-se

essencial saber quem suporta os prejuízos decorrentes da utilização indevida dos

serviços de pagamento.

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Das decisões judiciais analisadas no presente estudo, concluímos que a regulação é

maioritariamente protetora do cliente, que se limita a aderir ao contrato de utilização,

libertando-o do ónus da prova, consagrando um princípio de limitação dos prejuízos a

assumir pelo titular, caso não atue com culpa, recaindo o remanescente sobre a entidade

prestadora do serviço, sendo reembolsado imediatamente pelas operações não

autorizadas.

Assim, numa ótica de proteção e prevenção de fraude, consideramos imperativo dar

resposta às vicissitudes que a digitalização no setor bancário apresenta. A necessidade

de salvaguardar a segurança e a eficiência de tais mecanismos obrigaram a União

Europeia a avançar com serviços melhorados, capazes de dar resposta às necessidades

dos utilizadores, assim como indicar os procedimentos de autenticação que permitam

verificar a identidade de um utilizador de serviços de pagamento e, bem assim, acautelar

eventuais infrações na segurança dos mesmos.

Do ponto de vista da imputação de responsabilidades decorrentes da fraude na banca

eletrónica, cremos que a implementação de novos mecanismos com a DSP 2 veio não só

proteger a identidade do utilizador, mas também minimizar os prejuízos para as partes,

nomeadamente na condenação que, em sede judicial, tendencialmente recai sobre a

entidade prestadora de serviços.

Face ao exposto, concluímos que, em regra, compete à instituição bancária arcar com os

prejuízos decorrentes dos esquemas fraudulentos no homebanking. Nesta sede, torna-se,

assim, imperativa a necessidade de atenuar a responsabilidade que aos bancos compete,

através de políticas e procedimentos de autenticação forte no exercício eficiente de tal

serviço, que carece da introdução de credenciais de segurança personalizada do

utilizador.

Além disso, tal mecanismo vem introduzir nas páginas oficiais avisos de detetação de

indícios de fraude, servindo de meio preventivo e, igualmente, de exigência do

cumprimento do dever de confidencialidade dos códigos de acesso do cartão matriz por

parte do utilizador.

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Assim, sempre que sejam incumpridos os deveres que ao utilizador estão adstritos, seja

por indiferença aos avisos cautelosos e de alerta da entidade prestadora de serviços, seja

por comportamentos dolosos, imputam-se ao cliente tais responsabilidades.

Feita a análise dos comportamentos das partes, para apurar como se e fará a repartição

dos prejuízos decorrentes dos ilícitos no serviço homebanking, entendemos que,

havendo um comportamento doloso ou negligente e censurável do utilizador, o

prestador de serviços ficará liberado de qualquer responsabilidade.

Tal entendimento é acompanhado pelo novo Regime Jurídico dos Serviços de

Pagamento e da Moeda Eletrónica (DL n.º 91/2018, de 12 de novembro), bem como

pela DSP 2.

A responsabilidade em matéria de fraude no homebanking em muito difere do ponto de

vista penal e civilístico. Assim, em termos criminais, o pirata informático não poderá

ser senão punido pela prática dos crimes. Por outro lado, em termos civilísticos,

concluiu-se que recai uma presunção de culpa sobre a entidade bancária,

essencialmente, numa ótica de defesa do consumidor (neste caso, defesa do cliente

titular da conta bancária), com exceção dos casos em que o próprio cliente, atuando com

dolo ou negligência grosseira, permitiu a perpetração de movimentações fraudulentas na

sua conta bancária.

É este o critério adotado pelo Regime Jurídico de Serviços de Pagamento e da Moeda

Eletrónica, e também pela DSP 2, regulamentação que traz ainda consigo novos e

importantes vetores em sede de segurança e proteção dos intervenientes, nomeadamente

a introdução da autenticação forte aos utilizadores no momento da iniciação de uma

transação de pagamento eletrónico.

Pretende-se, assim, proteger o cliente consumidor de eventuais condutas capazes de pôr

em causa a segurança do cliente e do banco.

Recentemente transposta para o ordenamento jurídico pelo DL n.º 91/2018 de 12 de

novembro, espera-se que esta nova Diretiva de Serviços de Pagamentos confira uma

maior robustez na segurança dos pagamentos eletrónicos, de forma a proteger os

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consumidores e a prevenir os riscos operacionais das instituições bancárias,

minimizando a imputação das responsabilidades que sobre as partes recaem.

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Análise do regime introduzido pelo Anexo I do Decreto-lei nº 317/2009, de 30 de

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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24 de janeiro de 2007, processo n.º

5990/2006-3;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03 de maio de 2007, processo n.º

10042/06-5;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de outubro de 2010, processo n.º

1943/09.1TJLSB.L1-7;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de junho de 2011, processo n.º

189/09.3JASTB.L1-5;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24 de maio de 2012, processo n.º

192119/11.8YIPRT.L1-2;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 04 de julho de 2013, processo n.º

103841/11.3YIPRT.L1-2;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5 de novembro de 2013, processo n.º

9821/11.8T2SNT.L1-1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de dezembro de 2013, processo n.º

164/11.8TBSRT.L1-6;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 3 de março de 2015, processo n.º

1727/13.2TJLSB.L1-1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de maio de 2015, processo n.º

337/14.1YXLSB.L1-2;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de março de 2016, processo n.º

1063/12.1TVLSB.L1-1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de outubro de 2017, processo n.º

4761/15.4T8VNG-2;

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de março de 2018, processo n.º

14202/16.4T8LSB.L1-2.

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62

Tribunal da Relação de Coimbra:

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15 de junho de 2010, processo n.º

1408/08.9TBACB.C1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de fevereiro de 2016, processo n.º

902/13.4TBCNT.C1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdão de 17 de fevereiro de

2016, processo n.º 2119/11.TALRA.C2;

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 20 de setembro de 2016 processo

n.º 183554/14.0YIPRT.C1.

Tribunal da Relação do Porto:

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 30 de agosto de 2009, processo n.º

15273/02.6TDLSB.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21 de novembro de 2012, processo n.º

1001/11.9JAPRT.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de abril de 2013, processo n.º

585/11.6PAOVR.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08 de janeiro 2014, processo n.º

1170/09.8JAPRT.P2;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07 de outubro de 2014, processo n.º

747/12.9TJPRT.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 03 de fevereiro de 2016, processo n.º

482/10.2SJPRT.P1;

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de fevereiro de 2018, processo n.º

572/17.0T8PRT.P1.

Tribunal da Relação de Guimarães:

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 23 de Outubro de 2012, processo

n.º 305/09;

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Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 23 de dezembro de 2012,

processo n.º 305/09.5TBCBT.G1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 25 de novembro de 2013,

processo n.º 2869/11.4TBGMR.G1;

Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de Dezembro de 2014,

processo n.º 1910/12.8TBVCT.G1.

Tribunal da Relação de Évora:

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 25 de junho de 2015 processo

n.º 3052/11.4TBSTR.E1;

Supremo Tribunal de Justiça:

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de julho de 2004, processo n.º

04P3287;

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de junho de 2005, processo n.º

05P2253;

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de setembro de 2006, processo n.º

06P1942;

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de novembro de 2008, processo n.º

08P2817;

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de dezembro de 2013, processo n.º

6479/09.8TBBRG.G1.S1.

OUTRAS FONTES:

Sites consultados:

www.dgsi.pt

www.clientebancario.bportugal.pt

www.bportugal.pt

www.jornaldenegocios.pt

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- ÍNDICE -

Declaração de Compromisso Anti-plágio……………………….……………………….2

Agradecimentos…………………………………………………….……………………4

Menções………………………………………………………………………….………5

Resumo…………………………………………………………………………..………7

Abstract…………………………………………………………………………………..8

Introdução………………………………………………………………………………..9

CAPÍTULO I

A transformação digital do setor bancário…………………………..………………11

CAPÍTULO II

Homebanking…………………………………………………………………………..14

1. Contrato de utilização de instrumentos de pagamento………………………...…….14

A) Contrato-quadro…………………………………………………...…...…….…..15

B) Inserção no complexo contratual…………………………...………………....…18

CAPÍTULO III

Deveres associados à utilização de serviços de pagamento……………………...….21

1. Do utilizador…………………………………………………………...………...…..21

A) Dever de utilização correta do serviço de homebanking……………….…..……22

B) Dever de comunicação imediata ao banco de qualquer operação abusiva do

instrumento de pagamento não autorizada ou do extravio dos códigos de acesso e cartão

matriz……………………………………………………………………………...……22

C) Dever de confidencialidade dos dados pessoais e chaves de acesso associados ao

homebanking e dever de guarda do cartão matriz……………………………….......…23

2. Do prestador de serviços……………………………………………………......……24

A) Dever de emissão e entrega do cartão matriz e códigos de acesso……….…...…24

B) Dever de garantia de disponibilidade a todo o momento dos meios adequados que

confiram ao utilizador a possibilidade de comunicação de fraude…………..………....25

C) Dever de prestação de um serviço de homebanking eficaz e seguro………...…..26

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D) Dever de informação acerca das medidas que o utilizador deve adotar para

preservar a segurança dos códigos de segurança e cartão matriz, como forma de

prevenção antifraude……………………………………………………………………26

CAPÍTULO IV

Esquemas fraudulentos na banca eletrónica……………………...…………………29

1. O Phishing………………………………………………………………...……...….30

A) Falsidade informática…………………………………………………........…….31

B) Dano informático, acesso ilegítimo e interceção ilegítima………………........…32

C) Burla informática…………………………………………………….……….….34

2. O Spyware……………………………………………………………….……...……36

3. O Pharming……………………………………………………………….……...….37

CAPÍTULO V

Distribuição de prejuízos e imputação de responsabilidades resultantes das

operações não autorizadas no contrato de homebanking………………...…………39

1. Imputação de responsabilidade ao utilizador…………………………………….…..40

2. Imputação de responsabilidade ao prestador de serviços de pagamento…...………..44

CAPÍTULO VI

Soluções decorrentes da legislação comunitária – Diretiva (EU) 2015/2366 do

Parlamento Europeu e do Conselho, relativa aos serviços de pagamento no

mercado interno.............................................................................................................48

Conclusão…………………………………………………………...………………….54

Bibliografia……………………………………………………………………...……...58

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- ERRATA –

Errata referente à dissertação de Mestrado de Direito e Mercados Financeiros intitulada

"Operações Abusivas na Banca Eletrónica - A Imputação de Responsabilidades pelas

Perdas Resultantes da Movimentação Não Autorizada de Fundos", realizada por Inês

Custódio Alves.

Página Linha Onde se lê

Deve ler-se

21 15

“Assim, a entidade bancária

confere a possibilidade de os seus

clientes usufruírem de um serviço

que lhes permita a gestão e

movimentação dos fundos

disponíveis nas suas contas

bancárias.”

Trata-se de uma repetição, pelo que

este parágrafo não deveria constar.

24 12 “Neste sentido, e à luz do disposto

no artigo 111.º n.º 2 do RSP (…)”

“Neste sentido, e à luz do disposto no

artigo 111.º n.º 3 do RSP (…)”

25 3

“ (…) veio implementar

exigências adicionais a nível de

autenticação forte na autorização

da operação de pagamento, tendo

sido (…)”

“ (…) veio implementar exigências

adicionais a nível de autenticação

forte na autorização da operação de

pagamento.”

25 8

“ A confidencialidade dos dados

financeiros do utilizador, são uma

premissa que se pretende

assegurar com as novas

exigências comunitárias definidas

na nova Diretiva de Serviço

Pagamentos, que adiante se

abordará.”

“ A confidencialidade dos dados

financeiros do utilizador, são uma

premissa que se pretende assegurar

com as novas exigências

comunitárias definidas na nova

Diretiva dos Serviços de

Pagamentos, que adiante se

abordará.”

27 6

“(…) para elucidar o utilizador

das medidas preventivas de

deverá adotar para preservação e

segurança do instrumento de

pagamento.”

“(…) para elucidar o utilizador das

medidas preventivas que deverá

adotar para preservação e segurança

do instrumento de pagamento.”

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Março de 2019

30 9

“Do anonimato, simplicidade e

celeridade nas transações que a

Internet facvorece, nasce um

palco propício a atuações ilícitas

por parte de terceiros.”

“Do anonimato, simplicidade e

celeridade nas transações que a

Internet oferece, nasce um palco

propício a atuações ilícitas por parte

de terceiros.”

50

Nota

rodapé

85,

linha 4

“(…) contas bancárias de um

consumidor em um único lugar”

“(…) contas bancárias de um

consumidor num único lugar”