operac caixa de pandora estudodecaso

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    67ISSN 2178-0013

    Revista Brasileira de Cincias Policiais

    ISSN Eletrnico 2318-6917

    Braslia, v. 6, n. 1, p. 67-85, jan/jun, 2015.Recebido em 03 de junho de 2015.Aceito em 27 de julho de 2015.

    O E P O PF: U E C "O

    C P"A O L

    D P F - B

    RESUMO

    O objetivo desse artigo demonstrar que os efeitos pedaggicos de investigaes criminais decombate corrupo podem ser mensurados em termos dos seus benefcios econmico-financei-ros. relatado estudo de caso relativo a denominada Operao Caixa de Pandora onde se anali-sou o comportamento de cartel atuante em contrataes de rgo da Administrao pblica e amudana do referido comportamento aps a deflagrao da investigao criminal.

    P-:Investigao criminal. Corrupo. Percia Criminal

    1. I

    A avaliao do prejuzo direto Administrao pblica causado pelacorrupo tema de muitos estudos, especialmente em se tratando de obras

    pblicas. Conforme relatado por Lopes (2011) e Mendes (2013) esses preju-zos em algumas ocasies so muito significativos. O foco das investigaes

    para apur-los est, e no poderia ser diferente, alm da identificao da au-

    toria, na quantificao dos danos causados (POLCIA FEDERAL, 2014).A avaliao do sucesso de aes de fiscalizao e investigao crimi-

    nal usualmente mensurado no volume de recursos desviados investigados eprincipalmente no total recuperado. Essa recuperao, que por diversos mo-tivos, notoriamente demorada e por vezes limitada, causa um sentimento deimpunidade e frustao daqueles que se esforam em combater tais desvios.

    Todavia, uma ampliao do enfoque dessa atuao pode mudar a

    perspectiva de sucesso dessas aes. Pois, existe a expectativa dos agentes do

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    poder pblico de que alm dos efeitos diretos de suas intervenes ocorraum efeito pedaggico sobre os indivduos, organizaes e a prpria socieda-de. Moraes (2009), com relao s aes de fiscalizao da Receita Federal,

    afirmou que existe um efeito pedaggico derivado das aes do estado sobreo contribuinte, transcreve-se (negrito nosso):

    Entre as nossas formas de atuao temos a pesquisa e a inestigaodo contribuinte, pessoa fsica ou jurdica, com indcios expressivos deevaso de tributos, para a recuperao do crdito tributrio ou ob-teno do efeito pedaggico. Lembrando noamente a fita aqui re-

    produzida, interessante observar o efeito pedaggico causado pelopapel do Estado junto queles que proporcionavam apoio logsticoquele tipo de criminalidade. O efeito pedaggico atinge todo um

    setor. A posio enrgica de cobrana com relao a um contribuinte,pessoa fsica ou jurdica, tem um efeito pedaggico muito interes-sante e se propaga rapidamente naquele setor. A anlise setorial tambm uma de nossas formas de atuao.

    O aspecto qualitativo do efeito pedaggico muito comentado, po-rm poucos estudos apresentaram estimativas mensurveis em termos eco-nmico-financeiros de aes dessa natureza. No intuito de contribuir para o

    preenchimento dessa lacuna apresentado esse breve relato de anlise peri-cial no mbito do Inqurito Policial n 1430/2010-4-SR/DPF/DF do De-

    partamento de Polcia Federal, onde, dentre outros aspectos, se identificou aocorrncia do citado efeito pedaggico em decorrncia da operao policialdenominada Caixa de Pandora. Onde se estudou o incremento do descontoofertado nos preos praticados em licitaes de obras de engenharia de umrgo da Administrao Pblica, doravante denominado rgo A, aps adeflagrao da referida investigao com a execuo de mandados de priso,de busca e apreenso.

    2. I C C

    Antes de apresentar os dados do estudo, necessrio contextualizaro que caracteriza um cartel. De acordo com Conselho Administrativo deDefesa Econmica - CADE (2008) um cartel definido da seguinte forma:

    Cartel um acordo explcito ou implcito entre concorrentes para,principalmente, fixao de preos ou quotas de produo, diviso declientes e de mercados de atuao. Cartis so considerados a mais

    grave leso concorrncia porque prejudicam seriamente os consu-

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    midores ao aumentar preos e restringir a oferta, tornando os bens eservios mais caros ou indisponveis.

    Ao artificialmente limitar a concorrncia, os membros de um cartel

    tambm prejudicam a inoao, impedindo que noos produtos eprocessos produtivos surjam no mercado. Cartis resultam em perdade bem-estar do consumidor e, no longo prazo, perda de competitivi-dade da economia como um todo.

    Segundo estimativas da Organizao para a Cooperao e Desen-olimento Econmico (OCDE), os cartis geram um sobrepre-

    o estimado entre 10 e 20% comparado ao preo em um mercadocompetitivo, causando prejuzos de centenas de bilhes de reais aosconsumidores anualmente.

    Diante dessa definio, os peritos realizaram a seleo de dados in-dicativos de comportamento de cartis. Uma das tcnicas utilizadas foi a dacurva ABC, que consiste na aplicao do Princpio de Pareto, no qual a maior

    parte de um determinado fenmeno caracterizada por uma pequena parce-la dos dados amostrados.

    Para rastrear o comportamento do possvel cartel que teria atuadono rgo A foi necessrio analisar as licitaes, com e sem recursos fede-rais, de forma a ampliar os dados da amostragem ao ponto de atingir toda asua populao das licitaes da modalidade concorrncia para obras de en-genharia, ou seja, foi analisada a populao e no uma amostra. Todavia, naanlise de dados, alguns considerados outliers foram retirados para facilitara interpretao dos resultados.

    O CADE (2008) apresenta a descrio das caractersticas dos car-tis. O primeiro aspecto a considerar so as possveis formas de atuao, temade maior interesse no presente estudo, transcritas a seguir (negrito nosso):

    3.2 Os Cartis em Licitaes

    Licitaes so um ambiente propcio atuao dos cartis, que po-dem agir de vrias formas:

    a) Fixao de preos, na qual h um acordo firmado entre con-correntes para aumentar ou fixar preos e impedir que as propostas

    fiquem abaixo de um preo base.

    b) Direcionamento privado da licitao, em que h a definio dequem ir vencer determinado certame ou uma srie de processos licitat-rios, bem como as condies nas quais essas licitaes sero adjudicadas.

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    c)Diviso de mercado, representada pela diviso de um conjuntode licitaes entre membros do cartel, que, assim, deixam de con-correr entre si em cada uma delas. Por exemplo, as empresas A, Be C fazem um acordo pelo qual a empresa A apenas participa de

    licitaes na regio Nordeste, a empresa B na regio Sul e a empresaC na regio Sudeste.

    d) Supresso de propostas, modalidade na qual concorrentes queeram esperados na licitao no comparecem ou, comparecendo, re-tiram a proposta formulada, com intuito de favorecer um determi-nado licitante, previamente escolhido.

    e)Apresentao de propostas pro forma, caracterizada quandoalguns concorrentes formulam propostas com preos muito altos paraserem aceitos ou entregam propostas com vcios reconhecidamente

    desclassificatrios. O objetivo dessa conduta , em regra, direcionara licitao para um concorrente em especial.

    f ) Rodzio, acordo pelo qual os concorrentes alternam-se entre osvencedores de uma licitao especfica. Por exemplo, as empresas A,

    B e C combinam que a primeira licitao ser vencida pela empre-sa A, a segunda pela empresa B, a terceira pela empresa C e assimsucessivamente.

    g) Sub-contratao, pela qual concorrentes no participam daslicitaes ou desistem das suas propostas, a fim de serem sub-contra-

    tados pelos vencedores. O vencedor da licitao a um preo supra--competitivo divide o sobrepreo com o subcontratado.

    Ainda de acordo com CADE (2008) em muitos cartis mais deuma das formas (fixao de preos, direcionamento privado da licitao, di-

    viso de mercado, supresso de propostas, apresentao de propostas proforma, rodzio e subcontratao) podem estar presentes. Assim, a prticado rodzio pode ser combinada com a diviso de mercado (os concorren-tes combinam a alternao dos vencedores em um grupo de licitaes, para

    dar a impresso de efetiva concorrncia), e o direcionamento da licitaopode ser implementado pela apresentao de propostas inviveis e com-plementado por subcontrataes. De qualquer forma, o resultado sempre o aumento dos preos pagos pela Administrao e a conseqente trans-ferncia ilegtima de recursos para os membros do cartel. Outros detalhes

    podem ser observados, inclusive por membros de comisses de licitao,como por exemplo, propostas que apresentem redao semelhante, os mes-mos erros ou mesmas rasuras.

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    E ainda, a identificao de quando certos fornecedores desistem,inesperadamente, de participar da licitao, pois h empresas que, apesar dequalificadas para a licitao, no costumam apresentar propostas a um deter-

    minado rgo, embora o faam para outro com objetos semelhantes.

    Nesse ponto o CADE (2008) chama a ateno para a necessidadede anlises amplas que podem ser de mais de um rgo ou esfera de poder.Como rotina, a ateno maior deve estar na identificao de um padro cla-ro de rodzio entre os vencedores das licitaes, quando existe uma margemde preo estranha e pouco racional entre a proposta vencedora e as outras

    propostas. Onde alguns licitantes apresentam preos muito diferentes nas di-versas licitaes que participam, apesar do objeto e das caractersticas desses

    certames serem parecidos.

    As vezes a discrepncia identificada significa que o valor das propos-tas se reduz significativamente quando um novo concorrente entra no pro-cesso (provavelmente no integrante do cartel).

    A concentrao tambm pode ser um indicativo de atuao de cartel,onde um determinado concorrente vence muitas licitaes que possuem a mes-ma caracterstica ou se referem a um tipo especial de contratao num rgo em

    rodzio com outros em rgos equivalentes (por exemplo, prefeituras vizinhas).

    Existem ainda queles casos onde licitantes vencedores subcontra-tam concorrentes que participaram do certame ou quando licitantes queteriam condies de participar isoladamente do certame apresentam pro-

    postas em consrcio.

    Assim, da anlise das informaes do CADE (2008) percebe-se que possvel rastrear certas condutas que so indcios da ao de cartis. Para

    realizar esse tipo de anlise so necessrios dados dos resultados financeirosde diversos certames ou compras.

    3. E C "O C "

    O evento desencadeador do efeito pedaggico estudado ocorreu nodia 27 de novembro de 2009, quando, com o objetivo de reprimir fraudes emlicitaes no governo do Distrito Federal, foram cumpridos 29 (vinte e nove)mandados de busca e apreenso em Braslia, Goinia e Belo Horizonte, ex-

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    pedidos pelo Ministro Fernando Gonalves, do Superior Tribunal de Justia,Presidente do Inqurito Judicial, baseados em representao da Polcia Federal,corroborada pelo Ministrio Pblico Federal (POLCIA FEDERAL, 2009).

    O objetivo principal da anlise era verificar eventuais indcios deatuao de cartis de empresas de construo civil nas licitaes do rgoA. Todavia, alm da identificao de comportamento de cartel nas licitaesfoi identificado um aumento da competitividade nas licitaes do rgo Ano ano seguinte ao da deflagrao da Operao Caixa de Pandora.

    Foram analisados todos os resultados de licitaes de obras e serviosde engenharia de um rgo da Administrao Pblica, doravante denomina-

    do rgo A, no perodo de 2007 a 2011 (LOPES e NONATO FILHO,2011). A escolha foi baseada no fato desse perodo ser correspondente ao dagesto administrativa que estava sendo investigada pela referida investigao

    policial, onde teriam ocorridos os danos.

    Maggi (2010) classificou o dano causado pelos cartis como o resul-tado do sobrepreo, que por sua vez resulta do pagamento de preo acima do

    valor normal de mercado pelos compradores. Esse prejuzo, segundo Maggi(2010), um dano material emergente, pois a diferena de valor pago a mais

    pelo cliente e corresponde sua perda econmica efetiva (Figura 1).

    Figura 1: uadro esquemtico de classificao dos prejuzos causados por cartis. Fonte: MAGGI(2010).

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    O perodo de atuao do Cartel uma tarefa de extrema importnciae, ao mesmo tempo, difcil. O seu conhecimento permite a realizao de umaanlise do tipo antes e depois, o que possibilita a estimativa do dano causado

    durante a atuao do cartel, ou no presente estudo, a estimativa dos danosevitados com o encerramento da atuao do cartel ou com o arrefecimentoda sua atuao.

    Aps a realizao do estudo de antes e depois do evento crtico dareferida operao policial se identificou uma mudana do patamar do preode mercado das licitaes do rgo A. Nessa anlise foi avaliada a compe-titividade dos certames com a medio do tamanho dos descontos ofertados

    pelos licitantes em relao ao valor de referncia dos editais. Onde maiores

    descontos so indicativos de competitividade, e menores ou inexistentes des-contos so indicativos de pouca competitividade e de conluio nos certames.

    O efeito didtico observado foi que aps a ao policial os licitantesaumentaram os seus descontos nas licitaes, ampliando a competitividadedos certames e com isso gerando maior economia para o errio, mesmo semserem diretamente investigados ou processados.

    4. V C - D O L

    Foi adotada como varivel critrio do estudo de antes e depois opercentual de desconto obtidos (D) nas licitaes do rgo A, nos anos de2007, 2008, 2009 e 2010. De forma, que a comparao do desconto obtidofoi realizada entre os conjuntos de dados dos anos de 2007, 2008 e 2009 emrelao aos do ano de 2010.

    O desconto nas licitaes um dos indicadores de competitividadeno certame e pode ser sensivelmente afetado pela ao de cartis. Nesse sen-tido, estudo realizado no mbito do comit das Naes Unidas afirma quesituaes de restrio artificial competio na indstria em geral do causaa preos entre 10% e 20% acima daqueles que ocorreriam em situao desaudvel competitividade (OCDE, 2002apudOCDE, 2009).

    A tese de que um ambiente de efetiva competitividade entre forne-

    cedores gera diminuio do preo ofertado tambm j foi objeto de estudos

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    envolvendo licitaes de obras pblicas no Brasil. Os estudos de referncia(Pereira, 2002 e Lima, 2009), ilustrados nas Figuras 2 e 3, apontam para umatendncia de descontos relevantes (de 15% a 30%) em relao ao preo de

    referncia do rgo contratante quando o nmero de empresas habilitadasna licitao superior a 5 (cinco).

    Esse fenmeno ocorre at mesmo quando os preos do rgo contra-tante so baseados nos sistemas de referncia oficiais (por exemplo, o Siste-ma Nacional de Pesquisa de Custos e ndices da Construo Civil, mantido

    pela Caixa Econmica Federal SINAPI e o Sistema de Custos Rodovirios,mantido pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - SI-CRO). Uma possvel causa para isso que esses sistemas no consideram, por

    exemplo, o efeito barganha, ou seja, a minorao dos preos dos materiaisdevido ao porte das obras (economia de escala nas compras em atacado e noem varejo).

    Figura 2: Comportamento do IPCC em funo do nmero de participantes classificados (PEREIRA,2002).

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    Figura 3: Grfico do ndice Preo Custo do Contrato IPCC em funo do nmero de participanteshabilitados para concorrncias do DNIT (LIMA, 2010).

    Nesse sentido o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Pblicas -IBRAOP, que uma sociedade civil de direito privado sem fins econmicos,de mbito nacional, constitudo por profissionais de Engenharia, Arquite-tura e Agronomia, de nvel superior e que exercem atividades relacionadas auditoria de obras pblicas tambm chamou a ateno para a existncia docitado efeito barganha, conforme registrado na sua Orientao Tcnica n5/2012 que versa sobre a apurao do sobrepreo e superfaturamento em

    obras pblicas (IBRAOP, 2012), inspirado em estudo de Maciel, Silva Filhoe Lima (2010), que mensurou a magnitude do efeito barganha.

    Essa falha sistmica dos modelos de oramentao no Brasil podepermitir a ocorrncia de sobrepreo e por esse motivo o Ministrio PblicoFederal (MPF) elaborou uma recomendao, por meio da sua 5 Cmara deReviso e Controle da Procuradoria Geral da Repblica, onde se orienta aosrgos pblicos de como proceder para adotar novos modelos de oramenta-o que minimizem os citados riscos (MPF, 2011).

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    A citada recomendao do MPF acabou por contribuir para o apri-moramento dos mtodos de fiscalizao de outros rgos, como o Tribunalde Contas da Unio (TCU), conforme se verifica na edio do Acrdo n

    2622/2013 TCU Plenrio, de 25/9/2013, que tratou da definio dataxa de BDI, Acrdo n 2984/2013 TCU Plenrio, de 06/11/2013,que tratou de aspectos relacionados ao Efeito Barganha e o Acrdo n1011/2015 TCU - Plenrio, de 29/04/2015, que versou sobre a possibili-dade de uso do 1 quartil do SINAPI o denominado Efeito Cotao.

    5. A V D L

    Utilizando metodologia semelhante a adotada por Pereira (2002)e Lima (2010) procedeu-se a anlise das licitaes de obras da modalidadeconcorrncia do rgo A, no perodo 2007 e 2010 (Figuras 4 a 7).

    O mtodo utilizado foi o clculo de todos os descontos ofertadospelos licitantes nas licitaes do rgo A. Onde a existncia de grandesdescontos, como tambm de maior variabilidade dos descontos so indica-tivos de licitaes competitivas e a ocorrncia do inverso, ou seja, pequenos

    descontos com pouco variabilidade so indicativos de certames com poucacompetitividade. Onde tambm se ponderou a concentrao de licitantescomo vencedores ou participantes dos certames.

    Os dados foram tabulados, sob orientao dos peritos criminais fe-derais do Instituto Nacional de Criminalstica (INC), por equipe do prpriorgo A e encaminhados para exame pericial em 12 de maio de 2011.

    Para refinar a anlise foram desconsiderados dentre os dados do anode 2007 os relativos a licitaes para manuteno de reas verdes, de projetosexecutivos de ciclovias, de construo de 300 abrigos de nibus, todos ora-dos em R$ 2.463.085,50 (dois milhes, quatrocentos e sessenta e trs mil,oitenta e cinco reais e cinquenta centavos) de um total de R$ 450.377.313,15(quatrocentos e cinquenta milhes, trezentos e setenta e sete mil, trezentos etreze reais e quinze centavos). E ainda, desconsiderados dos dados do ano de2009 uma licitao para corte e podas de rvores.

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    Em seguida foram plotados os descontos obtidos em cada certame ese analisou a existncia de uma pequena tendncia de incremento de descon-to com o aumento do nmero de licitantes, conforme previsto pelos citados

    estudos referenciais. Porm, o resultado demonstrou grande resilincia na di-minuio dos descontos, mesmo com o incremento do nmero de licitantes.O que no representa o comportamento esperado em certames competitivosconforme demonstrado por Pereira (2002) e Lima (2010).

    Figura 4: Licitaes do rgo A do ano de 2007. Fonte: LOPES e NONATO FILHO, 2011.

    Figura 5: Licitaes do rgo A do ano de 2008. Destaque para licitaes acima da referncia doprprio rgo. Fonte: LOPES e NONATO FILHO, 2011.

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    Figura 6: Licitaes do rgo A do ano de 2009. Fonte: LOPES e NONATO FILHO, 2011.

    Figura 7: Licitaes do rgo A do ano de 2010. Fonte: LOPES e NONATO FILHO, 2011.

    Por outro lado, da anlise dos grficos das Figuras 4 a 6, anos de 2007a 2009, inferiu-se que existiu uma tendncia de desconto de 2% em relao aodesconto mdio, calculado em relao ao oramento de referncia dos editaisde licitao do rgo A e uma concentrao certames com a participaode 1 a 3 licitantes (em aproximadamente 70% dos certames), o que confirma

    o esperado por Pereira (2002) e Lima (2010), de que poucos concorrentes,levam a pouca competitividade e a pequenos descontos. A moda do ndicePreo Custo do Contrato (IPCC) mtrica do desconto obtido - foi calcu-lada em 0,98 arredondamento para duas casas decimais.

    Analisando a distribuio dos descontos observados na populao,tambm se percebe a concentrao de resultados em torno do desconto de2%, nos anos de 2007 a 2009 (Figura 8).

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    Figura 8: Grfico da distribuio dos percentuais de descontos das licitaes do rgo A nos anos de2007, 2008 e 2009 (LOPES e NONATO FILHO, 2011).

    Todavia, um detalhe chamou a ateno no exame pericial, mesmo

    com o aumento do nmero de concorrentes no h um incremento signifi-cativo do desconto, uma caracterstica da fixao de preos (CADE, 2008),demonstrando que nesses casos o aumento do nmero de participantes noaumentou a competitividade, fato que pode ser verificado tanto pela mdiade desconto obtido nas licitaes quanto pelo baixo coeficiente de determi-nao (R2), prximo do valor zero, das retas traadas nos grficos das Figuras4 a 7. Esse fenmeno um forte indcio da existncia da ao de cartis naslicitaes do rgo A no perodo analisado 2007 a 2009.

    Porm, no ano de 2010, apesar do coeficiente de determinao (R2)ainda indicar a falta de correlao entre o nmero de concorrentes e o des-conto mdio obtido, o mercado apresentou um comportamento diferente do

    padro dos 3 anos anteriores. O desconto mdio foi da ordem de 10% comuma visvel amplitude dos resultados das frequncias de desconto obtidas re-lao condio dos anos anteriores (Figura 9).

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    Figura 9: Grfico da distribuio dos percentuais de descontos das licitaes do rgo A no ano de2010. Detalhe do deslocamento da concentrao nos descontos do patamar entre 2% a 2,5% para superi-

    ores a 10% (LOPES e NONATO FILHO, 2011).

    Dessa constatao da mudana de patamar do preo de mercado no anode 2010 nas licitaes da modalidade concorrncia do rgo A surgiu a iden-tificao de um dos efeitos pedaggicos da Operao Caixa de Pandora. Pois,uma explicao verossmil para a causa do fenmeno observado, seria a associadas prises realizadas quando do denominado estouro da operao, ocorridas nofinal do ano de 2009. Com isso pode-se inferir que a ao da Polcia Judiciriada Unio, e dos demais atores da persecuo penal, afetou o comportamento domercado, modificando os preos praticados, mesmo que temporariamente.

    Por fim, foi calculada a diferena percentual entre o desconto mdio

    nos anos de 2007 a 2009, em aproximadamente 2%, e o desconto mdio noano de 2010, em aproximadamente 10%, o que resultou em uma diferenapercentual de 8,3%. Considerando essa diferena sobre o total dos oramen-tos das licitaes da modalidade de concorrncia do ano de 2010, da ordemde R$ 198.314.309,21 (cento e noventa e oito milhes, trezentos e quatorzemil, trezentos e nove reais e vinte e um centavos); constatou-se com esse m-todo que ocorreu uma economia financeira para o rgo A nas referidaslicitaes da ordem de R$ 16.415.601,10 (dezesseis milhes, quatrocentos equinze mil, seiscentos e um reais e dez centavos). Essa economia foi decorren-

    te da mudana de comportamento do mercado.

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    Observou-se ainda, que tomando o mercado do ano de 2010 comoparadigma, possvel utilizar o resultado das licitaes do ano de 2010, comomais um indcio de que as licitaes do rgo A nos anos de 2007, 2008 e

    2009 foram vencidas sem que os oramentos das licitantes vencedoras incor-porassem a economia potencial dos efeitos cotao e barganha. O fato dodesconto identificado no ser completamente compatvel com o previsto naliteratura pode ser um indicativo de uma atuao residual do cartel.

    6. C

    O Inqurito Policial n 1430/2010-4-SR/DPF/DF do Departa-

    mento de Polcia Federal, que apurou a ocorrncia de atuao de cartel nodenominado rgo A, foi relatado com o indiciamento de 15 pessoas comoos responsveis envolvidos. Todavia, o Ministrio Pblico Federal (Arquiva-mento n 099/2014 MPF/PRDF/8 Ofcio Criminal/MB), concluiu queo referido inqurito deveria ser arquivado, pois o risco potencial de prescri-o seria elevado demais, ponderando eventuais dificuldades processuais, oque foi acatado pela Justia Federal em 19/05/2014 (JUSTIA FEDERAL,2014).

    O arquivamento do inqurito, aps vrios esforos investigativos,poderia levar a um entendimento da ineficcia dos resultados da atuao daPolcia Judiciria da Unio. Todavia, em uma anlise mais ampla, possvel

    perceber que, mesmo nesse caso onde a ao penal no pde sequer ser ini-ciada, houve um resultado efetivo e mensurvel em favor da AdministraoPblica e consequentemente de toda a sociedade brasileira.

    Por fim, espera-se com a apresentao desse estudo que os envolvi-

    dos na persecuo penal possam ampliar o entendimento do alcance de suasaes e assim encontrar maior motivao para a exerccio de suas atribuies.

    A O L

    P E C U B - UNB (1997). M T

    U B - UB (2014). A PC F P F 2002

    D T U B

    E-: .@..

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    Braslia, v. 6, n. 1, p. 67-85, jan/jun 2015.

    T P E P FO

    BSTRACT

    The aim of this article is to demonstrate the educational effects of criminal investigations againstcorruption can be measured in terms of its economical and financial benefits. Its reported acase study about "Pandora's Box Operation" which analyzed the active cartel behavior in a publicinstitution procurements and the change of that behavior after the outbreak of the criminalinvestigation.

    K: Criminal investigation. Corruption. Forensic

    E E P OP F: U E C"O C P"

    ESUMEN

    El objetivo de este artculo es demostrar que los efectos educativos de las investigaciones penalescontra la corrupcin se pueden medir en trminos de sus beneficios econmicos y financieros.Se describe un estudio de caso sobre la llamada " Operacin Caja de Pandora" en la que se analizel comportamiento de crtel activo en la contratacin de rganos de la administracin pblica yel cambio de comportamiento despus del brote de la investigacin penal.

    P C: Investigacin criminal. Corrupcion. Forense

    R

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