oficina laguna teoria 2 b · da teoria à prática: curso de capacitação para conservação e...

29
Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017. MÓDULO 2: CENTRO HISTÓRICO DE LAGUNA E SUAS PATOLOGIAS PROFESSORES: JEAN CARLO DE SOUZA, Mª MATILDE VILLEGAS E VLADIMIR F. STELLO

Upload: vodieu

Post on 15-Sep-2018

213 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

MÓDULO 2: CENTRO HISTÓRICO DE LAGUNA E SUAS PATOLOGIAS

PROFESSORES: JEAN CARLO DE SOUZA, Mª MATILDE VILLEG AS E VLADIMIR F. STELLO

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

1

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

O CENTRO HISTÓRICO DE LAGUNA E SUAS PATOLOGIAS

Jean Carlo de Souza Mª Matilde Villegas J.

Vladimir F. Stello

1. INTRODUÇÃO

O patrimônio arquitetônico é conformado tanto por aquelas construções que herdamos de

nossos antepassados, como pelas mais recentes que possuem valores dignos de serem

preservados. Sua presença nos lembra nossa origem e é a memória material, e muitas vezes

imaterial, de um povo.

Com sua conservação as novas gerações reconhecerão a criatividade de seus antepassados e

verão como, por meio de diferentes soluções construtivas, utilizaram os recursos naturais

disponíveis, bem como retratam os diferentes estágios econômicos e socioculturais da

localidade.

Atualmente, onde a arte de construir se reduziu à utilização dos mesmos materiais para

qualquer lugar, tornando nossas cidades todas iguais, sem uma identidade própria, sem

importar o clima, as distâncias ou as necessidades, é necessário olhar para nosso passado e

receber uma sábia lição. Deste modo pode-se ver construída uma humilde residência com

poucos recursos, mas com muita habilidade e engenho em relação direta com sua localização.

Por isso a importância da preservação do nosso patrimônio, para que tenhamos onde

encontrar essas lições.

São várias as ameaças e riscos, provocados por vários fatores, que nosso patrimônio edificado

sofre:

• Fatores ambientais

• Desastres naturais

• Fatores temporais

• Interferência humana

Para poder realizar uma intervenção é necessário, antes demais nada, saber alguns conceitos

importantes para que todos falem a mesma linguagem. Os conceitos abaixo foram tirados do

Manual de elaboração de projetos de preservação do patrimônio cultural (MinC, 2005)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

2

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

1.1 CONCEITOS E DEFINIÇÕES (p. 13 – 14)

1.1.1 Conservação - conjunto de ações destinadas a prolongar o tempo de vida de

determinado Bem cultural. Engloba um ou mais tipos de intervenções.

1.1.2. Manutenção - conjunto de operações preventivas destinadas a manter em bom

funcionamento e uso, em especial, a edificação. São exemplos: inspeções rotineiras, a limpeza

diária ou periódica, pinturas, imunizações, reposição de telhas danificadas, inspeção nos

sistemas hidro-sanitário, elétrico e outras.

1.1.3. Reparação - conjunto de operações para corrigir danos incipientes e de pequena

repercussão. São exemplos: troca ou recuperação de ferragens, metais e acessórios das

instalações, reposição de elementos de coberturas, recomposições de pequenas partes de

pisos e pavimentações e outras.

1.1.4. Reabilitação - conjunto de operações destinadas a tornar apto o edifício a novos usos,

diferente para o qual foi concebido.

1.1.5. Reconstrução - conjunto de ações destinadas à restaurar uma edificação ou parte dela,

que se encontre destruída ou em risco de destruição, mas ainda não em ruínas. A reconstrução

é aceitável em poucos casos especiais e deve ser baseada em evidências históricas ou

documentação indiscutíveis. São exemplos: as edificações destruídas por incêndios, enchentes,

guerra, ou, ainda, na iminência de serem destruídas, como no caso de construção de

barragens.

1.1.6. Consolidação / Estabilização - conjunto de operações destinadas a manter a integridade

estrutural, em parte ou em toda a edificação.

1.1.7. Restauração ou Restauro - conjunto de operações destinadas a restabelecer a unidade

da edificação, relativa à concepção original ou de intervenções significativas na sua história. O

restauro deve ser baseado em análises e levantamentos inquestionáveis e a execução permitir

a distinção entre o original e a intervenção. A restauração constitui o tipo de conservação que

requer o maior número de ações especializadas.

1.1.8. Revitalização - conjunto de operações desenvolvidas em áreas urbanas degradadas ou

conjuntos de edificações de valor histórico de apoio à “reabilitação” das estruturas sociais,

econômicas e culturais locais, procurando a consequente melhoria da qualidade geral dessas

áreas ou conjuntos urbanos.

1.2 PREMISSAS (p. 15 – 16)

Os projetos deverão ser elaborados respeitando os valores estéticos e culturais do Bem, com o

mínimo de interferência na autenticidade do mesmo, seja autenticidade estética, histórica, dos

materiais, dos processos construtivos, do espaço envolvente ou outras.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

3

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Garantir a autenticidade dos materiais implica na manutenção da maior quantidade possível

de materiais originais, de modo a evitar falsificações de caráter artístico e histórico. Na

impossibilidade da manutenção dos materiais originais, deverão ser utilizados outros

compatíveis com os existentes, em suas características físicas, químicas e mecânicas e

aspectos de cor e textura sem, no entanto, serem confundidos entre si. Assim também, como

a utilização de materiais reversíveis, que possam ser substituídos no futuro e no final de sua

vida útil, sem danos ao Bem.

A autenticidade histórica permeia todos os aspectos associados ao Bem, não sendo permitida

qualquer intervenção que possa alterar ou falsificar os valores históricos contidos nos

materiais, técnicas construtivas, aspectos estéticos e espaciais.

A autenticidade estética corresponde ao respeito às idéias originais que orientaram a

concepção inicial do Bem e das alterações introduzidas em todas as épocas, que agregando

valores, resultaram numa outra ambiência, também reconhecida pelos seus valores estéticos e

históricos.

Tão importante quanto à manutenção dos materiais e dos aspectos estéticos do Bem é a

garantia da preservação da autenticidade dos processos construtivos e suas peculiaridades,

evitando o uso de técnica que seja incompatível e descaracterize o sistema existente.

A preservação da autenticidade do espaço envolvente não implica no entendimento do Bem

isoladamente e sim no contexto no qual está inserido, considerando os aspectos natural,

histórico, quer urbano ou rural. As propostas relativas ao resgate de determinados aspectos

estéticos do Bem devem estar baseadas e fundamentadas em análises e argumentos

inquestionáveis sobre a autenticidade do espaço envolvente.

É fundamental o conhecimento dos documentos internacionais e dos princípios enunciados

nas cartas patrimoniais para elaboração de Projetos de Preservação.

Por fim, é premissa para a preservação de um Bem, usos compatíveis com a vocação do

mesmo.

1.3 PROJETO DE INTERVENÇÃO NO PATRIMÔNIO EDIFICADO (p. 19-35)

Compreende-se por Projeto de Intervenção no Patrimônio Edificado, doravante denominado

Projeto, o conjunto de elementos necessários e suficientes para execução das ações

destinadas a prolongar o tempo de vida de uma determinada edificação ou conjunto de

edificações, englobando os conceitos de restauração, manutenção, estabilização, reabilitação

ou outras. Cada um destes conceitos corresponde a um tipo de intervenção, que depende,

principalmente, do estado de conservação do Bem.

Para que se possa elaborar o Projeto propriamente dito são necessárias atividades

preliminares, referentes à perfeita Identificação e Conhecimento do Bem. A definição de novo

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

4

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

uso ou a avaliação do existente são condições preponderantes para a elaboração do Projeto,

assegurando sua eficácia.

O Projeto de Intervenção no Patrimônio Edificado é constituído pelas seguintes etapas:

1ª Identificação e Conhecimento do Bem;

2ª Diagnóstico;

3ª Proposta de Intervenção, contendo:

• Estudo Preliminar; • Projeto Básico; • Projeto Executivo

1.3.1. Identificação e Conhecimento do Bem

Nesta etapa será analisada a edificação sob os aspectos históricos, formais e técnicos. Objetiva

também conhecer a sua evolução e seus materiais e técnicas construtivas.

a) Pesquisa Histórica

Serão sistematizadas as informações, obtidas por meio de pesquisas arquivísticas,

bibliográficas e de fontes orais, objetivando conhecer e situar a edificação no tempo,

identificando sua origem e o seu percurso histórico.

Também servirá para comprovar a autenticidade dos elementos, identificando alterações,

avaliando qualitativamente a ambiência da edificação, a fim de dar elementos que ajudem nas

decisões do projeto.

b) Levantamento Físico

Serão realizadas atividades de leitura e conhecimento da forma da edificação, obtidos por

meio de levantamentos, representados gráfica e fotograficamente.

Constará de:

• Levantamento Cadastral - Representação gráfica das características físicas e

geométricas da edificação, do terreno e dos demais elementos físicos presentes na

área a ser levantada, indicando: Planta de Situação, Planta de Localização. Plantas

Baixas, Fachadas, Cortes e detalhamentos necessários para a boa compreensão do

monumento.

• Topografia do Terreno - Representando graficamente o levantamento planialtimétrico

do terreno, em escala adequada, contendo ângulos, pontos, distâncias, referências de

níveis, curvas de nível e perfis longitudinal e transversal.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

5

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

• Documentação Fotográfica O registro fotográfico será executado em conjunto com o

levantamento gráfico e complementará a informação não só dos aspectos

morfológicos da construção, mas também do seu estado de conservação.

c) Análise Tipológica, Identificação de Materiais e Sistema Construtivo

Neste item serão analisados a tipologia arquitetônica, os materiais empregados, o sistema

construtivo da edificação e o contexto no qual está inserida. Deverá conter:

• descrição das características arquitetônicas da edificação: partido de composição,

proporções volumétricas, estilo ou influência artística, aparência atual e outras

características;

• avaliação da autenticidade do conjunto e de suas partes, com indicação do grau de

integração ou interferência dos elementos que foram acrescentados ao conjunto

original;

• indicação, em planta e elevações, dos elementos que foram suprimidos ou alterados

e suas características originais básicas;

• caracterização dos acréscimos meramente utilitários cuja inclusão não tenham

obedecido a razões arquitetônicas;

• análises e considerações da relação da edificação com seu entorno, qualificando as

interferências do espaço externo: edificações vizinhas, iluminação (luminárias, postes,

fiação, etc.), calçamento, mobiliário urbano, tráfego e comunicação visual.

d) Prospecções Arquitetônicas e Estruturais

Serão realizadas algumas prospecções com a finalidade de fornecer informações

complementares à pesquisa histórica e levantamento cadastral, possibilitando análises e

deduções de hipóteses de diagnóstico, alternativas de soluções de projeto. Também tem a

finalidade de Identificar os materiais, o sistema construtivo, estado de conservação e as

alterações do partido arquitetônico. Serão realizadas aberturas de valas, trincheiras ou poços

de inspeção, remoções de revestimentos, pisos, peças de madeira, aterros, entulhos entre

outros.

A definição e a escolha dos pontos de prospecção serão embasadas no conhecimento da

edificação obtido nas pesquisas realizadas, vistorias e hipóteses levantadas sobre possíveis

alterações na mesma.

Estas prospecções serão realizadas tanto nas estruturas afloradas, como nas que se encontram

encobertas.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

6

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

1.3.2. Diagnóstico

A partir dos levantamentos cadastral, fotográfico e topográfico realizados conforme item 1.3.1,

será realizada a avaliação das estruturas existentes, analisando de forma pormenorizada os

problemas da edificação e suas possíveis causas. São atividades componentes desta etapa:

a) Mapeamento de Danos

Representação gráfica do levantamento de todos os danos existentes e identificados na

edificação, relacionando-os aos seus agentes e causas.

São considerados danos todos os tipos de lesões e perdas materiais e estruturais, tais como:

fissuras, degradações por umidade e ataque de xilófagos, abatimentos, deformações,

destacamento de argamassas, corrosão e outros.

b) Análises do Estado de Conservação

De acordo com o levantamento das patologias da edificação, se realizará a análise do estado

de conservação, considerando as informações da etapa de Identificação e Conhecimento do

Bem, identificando os seus problemas e suas possíveis causas.

Em uma primeira fase o mais importante é detectar e registrar as degradações que provocam

riscos graves para a estabilidade, integridade e segurança das mesmas, ou seja, os de tipo

estrutural. Entre eles podemos citar deslocamentos ou queda de alvenarias, os desaprumos,

desagregação, desmontes, fissuras, fendas, deslizamentos.

A análise posterior a informação de campo permite gerar o mapeamento de danos da

edificação, que tem como objetivo estabelecer as prioridades de monitoramento e

intervenção de acordo com o nível de risco que apresentam as estruturas.

• Avaliação do Estado de Conservação dos Materiais - Serão feitas considerações sobre

as patologias dos materiais da edificação, localizando-as nas alvenarias, revestimentos,

pisos, esquadrias e ferragens, pintura e outros detalhes.

• Avaliação do Estado de Conservação do Sistema Estrutural - Será verificado o

comportamento estrutural da edificação, nos seus diversos componentes: fundação,

pilares, vigas, paredes, sistema de contraventamento, vínculos, sistema de cobertura

se tiver e outros.

• Identificação dos Agentes Degradadores – Serão identificados todos os agentes de

degradação, quais sejam: agentes externos – fenômenos físicos, químicos, biológicos e

humanos; agentes inerentes à edificação – decorrentes do projeto e da sua execução;

e os decorrentes do uso e da manutenção.

• Caracterização dos Danos de Fundação e Danos Estruturais - Serão verificados os

danos de fundação e estruturais, observando-se os esforços e cargas a que estão

submetidos, identificando os problemas de estabilidade e suas possíveis causas.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

7

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

1.3.3. Proposta de Intervenção

Compreende o conjunto de ações necessárias para caracterizar a intervenção, determinando

soluções, definindo usos e procedimentos de execução, abordados técnica e conceitualmente.

A etapa Proposta de Intervenção subdivide-se em três partes interdependentes, a saber:

• Estudo Preliminar;

• Projeto Básico;

• Projeto Executivo.

Toda a proposta de intervenção será concluída com a apresentação dos seguintes produtos:

• Memorial Descritivo - Contendo justificativa do partido adotado e sua coerência com o

uso destinado à edificação, soluções técnicas indicadas e justificadas para as

alternativas propostas, elaborado em forma definitiva;

• Peças Gráficas - Representação gráfica da proposta conceitual, destina-se à

compreensão do partido adotado, da viabilidade técnica das propostas e à verificação

da qualidade e do grau das interferências na edificação, por meio de: Plantas gerais,

Cortes e elevações, Perspectivas, Detalhes construtivos, etc..

• Planilha Orçamentária - contendo o orçamento analítico detalhado de todos os

serviços e materiais, além das composições unitárias de custos;

• Cronograma Físico-Financeiro – contendo todas as etapas e seus custos relativos,

distribuídos ao longo do tempo previsto para a execução da obra;

• Projetos Complementares – contendo todas as especificações necessárias para a

execução da obra: Fundações e Estruturas, Instalações Hidráulicas e Sanitárias,

Instalações Elétricas e Eletrônicas, Instalações de Ar Condicionado, Instalações

Mecânicas e Instalações de Prevenção e Combate a Incêndio.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

8

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

2. O Processo de Preservação de Laguna

Em Laguna, a proteção do centro histórico iniciou-se com o tombamento, pelo IPHAN, da Casa

de Câmara e Cadeia em 19541 (figura 01), posteriormente com leis municipais, a partir de 1978

que protegeu as fachadas das edificações do entorno da Praça da República Juliana e outras

edificações2 e finalmente com o tombamento do Centro Histórico de Laguna pelo IPHAN em

19853, o primeiro conjunto urbano tombado em nível federal no estado de Santa. Apresenta

aproximadamente 600 edificações e abrange uma área de 1,2 Km², com uma população

estimada em 3.000 habitantes. A área tombada é definida por meio de uma poligonal, que

inclui as encostas dos morros que circundam o sítio histórico e parte da lagoa de Santo

Antônio. O espaço urbano reflete a diversidade arquitetônica advinda dos diferentes tempos

históricos, culturais e econômicos. Com isto, este sítio urbano apresenta novos desafios na

gestão do patrimônio tombado em relação aos centros históricos de características

homogêneas (VILLEGAS J., 2016).

Figura 01: Casa de Câmara e Cadeia, atual Museu Anita Garibaldi (ETec Laguna IPHAN/SC, 1910)

1 Processo de Tombamento IPHAN nº 0492-T-53 Livro do Tombo Histórico - inscrição 301; Vol. 1; fls. 050; Data: 05/03/1954. 2 Decreto nº 17/78: Casa Pinto D´Ulysséa; Palacete Polidoro Santiago (que se encontra fora da área da Poligonal Federal); Casa nº 10 da rua Rio Branco; Casa de Anita da rua Fernando Machado; as fachadas das edificações localizadas na Praça República Juliana e Largo do Rosário; Casa nº 2 da travessa Manoel Pinho (Casa Candemil); Hotel Rio Branco; Ruínas do Camacho; Casa nº 420 da Rua Voluntario Benevides. Decreto nº 26/81: Casa nº 11, 13 e 185 da rua Raulino Horn e o Prédio da Sociedade Recreativa União Operária na Rua Santo Antônio. Decreto nº28/82: Casa nº 208 da rua Raulino Horn e Ruínas Forte Garibaldi na Ponta da Barra. Decreto nº 34/88: A Ponte de Ferro da Cabeçuda. 3 Processo de Tombamento IPHAN nº 1122-T-84 / 1. Livro do Tombo Artístico e Paisagístico – Inscrição 89, fls. 39; 2. Livro do Tombo Histórico – Inscrição 500, fls. 89

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

9

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

O parecer elaborado pelo arquiteto Luiz Fernando Franco apresenta uma análise detalhada da

importância do Centro Histórico de Laguna de forma clara e contundente, além de assinalar

que a sua importância está no conjunto, semelhanças e diferenças que foram se formando

durante os diferentes períodos pelos quais passou a cidade. Também mostra que seu valor não

é só pela arquitetura, mas pelo conjunto formado pelas edificações, logradouros públicos e a

natureza envolvente, dos morros e da lagoa de Santo Antônio (figuras 02 e 03).

Recomenda-se, assim, o tombamento do centro histórico de Laguna em seu acervo paisagístico constituído pelo sistema natural que o envolve, pelo conjunto de logradouros em seu traçado e dimensão, pelo cais junto à Lagoa de Santo Antônio e pelo conjunto de edificações em sua volumetria, em sua ocupação do solo e em suas características arquitetônicas, que expressam a continuidade da evolução histórica do núcleo urbano original, (...). (FRANCO, 1984, p. 13)

Figura 02: Centro Histórico de Laguna com localização da poligonal de Tombamento Federal – IPHAN, 1985 (adaptado de Google Earth, 2018)

Figura 03: Vista do Centro Histórico de Laguna a partir da Lagoa de Santo Antônio (Marco Bocão, 2005 - ETec Laguna IPHAN/SC)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

10

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

3. Características Arquitetônicas

O Centro Histórico de Laguna possui um conjunto com características singulares construídas a

partir do século XVII, formado por residências térreas, sobrados, edificações de grande

volumetria, em diversas linguagens arquitetônicas como luso brasileira, eclética, art déco,

manifestações do modernismo e do contemporâneo. Também deve-se considerar o

patrimônio paisagístico, constituído pelo sistema natural que envolve o tecido urbano do

Centro Histórico e o cais junto à Lagoa de Santo Antônio.

3.1 Arquitetura luso-brasileira

Edificações austeras, sem decoração, marcadas pelas cimalhas no beiral. Paredes com

aproximadamente 50cm de espessura, construídas com materiais da região. As casas térreas

eram de piso em chão batido, com uma porta e janela ou duas janelas (figuras 04 a 06).

Figura 04: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Luso Brasileira (VILLEGAS J, 2016)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

11

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 05: Exemplar da arquitetura Luso Brasileira com cimalha, abertura em guilhotina, porta

ao nível da rua e telhado visível (ETec Laguna – IPHAN/SC - 2008)

Figura 06: Fachadas da arquitetura Luso Brasileira, marcadas por grossos cunhais - (ETec

Laguna – IPHAN/SC - 2008)

As casas faziam um corredor contínuo, seguindo a formação das ruas (figura 07). Os limites

laterais colados um nos outros deixavam os quartos sem iluminação (chamados de alcovas).

Figura 07: Procissão na rua Santo Antônio, no início do século XX. Casarões Luso-brasileiros

(ETec Laguna – IPHAN/SC)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

12

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

3.2 Arquitetura Eclética

As casas começaram a ter entradas laterais, com portões de ferro, possibilitando a ventilação

dos quartos. Em algumas o afastamento com o vizinho é maior e aparecem os jardins e as

varandas (figuras 08 a 10).

Figura 08: Exemplar da arquitetura Eclética com Platibanda, Porão Alto, Balcão Entalado e

Revestimento com Massa decorativa (ETec Laguna – IPHAN/SC, 2008)

Figura 09: Exemplar da arquitetura Eclética com Torreão marcando a esquina (ETec Laguna –

IPHAN/SC, 2008)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

13

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 10: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Eclética (VILLEGAS J,

2016)

3.3 Arquitetura Art Déco

Formas simplificadas, predomínio de linhas sóbrias e geométricas. Como no luso-brasileiro,

mantém o alinhamento com a rua. As platibandas: formas retas sem elementos decorativos.

As fachadas são marcadas por linhas geométricas em alto relevo (figuras 11 e 12).

Figura 11: Cine-teatro Mussi e Mercado Público, exemplares da arquitetura Art Déco (VILLEGAS

J, 2016)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

14

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 12: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Art Déco (VILLEGAS J,

2016)

3.4 Arquitetura Neocolonial

Reutilização de elementos característicos das construções do período colonial brasileiro e

contribuiu para a difusão e valorização dos preceitos da arquitetura luso-brasileira.

Caracteriza-se pelo emprego, em geral, de volumes recortados, corpos salientes, balcões,

telhas cerâmicas tipo capa-canal e amplos beirais. Introduziu frontões e colunatas sinuosos,

aplicações de elementos decorativos de inspiração colonial executados em concreto, azulejos

decorados, tijolinhos e pedras aparentes nas partes externas (KESSEL, 2008). Mesclou as

vergas retas com vergas em arco pleno e abatido (figuras 13 a 15).

Figura 13: Exemplares da arquitetura Neocolonial (VILLEGAS J, 2016)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

15

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 14: Exemplares da arquitetura Neocolonial (VILLEGAS J, 2016)

Figura 15: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Neocolonial (VILLEGAS

J, 2016)

3.5 Arquitetura modernista

A arquitetura modernista se caracterizou pela estrita coerência entre as formas das fachadas e

a organização espacial interna. Adotou a chamada construção funcional, que permitia

vislumbrar vigas e estruturas de ferro ou concreto, combinadas com vidro, linhas geométricas

e abstratas, planta livre, grandes vãos envidraçados e interligação harmoniosa com a natureza

por meio de jardins, externos ou internos. Pode-se encontrar o uso de brises, cobogós e

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

16

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

emolduramento de esquadrias, platibanda escondendo o telhado, ausência de decoração,

revestimento de pedras naturais, recuos, entre outros (figuras 16 e 17).

Figura 16: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Modernista (VILLEGAS

J, 2016)

Figura 17: Exemplares da arquitetura Modernista (VILLEGAS J, 2016)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

17

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

3.6 Arquitetura contemporânea

Inclui-se neste item a arquitetura produzida nas últimas décadas do século XX, posterior ao

movimento modernista. Dentre as várias vertentes que se seguem a este estilo sobressaem o

tardo-modernismo, o pós-moderno e o neo-modernismo com seus diversos movimentos

(CASTELNOU, 2010). Em Laguna não se poderia falar especificamente de algum destes

movimentos, mas pode-se encontrar algumas edificações com características que remetem a

este período.

Sobressai uma vertente sem proposta conceitual definida onde é possível ser percebido

somente um excesso de funcionalidade, construiu-se, simplesmente pela necessidade de se

conseguir um local para a moradia ou para o trabalho (figuras 18 e 19).

Figura 18: Quadro com localização de alguns exemplares da arquitetura Contemporânea

(VILLEGAS J, 2016)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

18

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 19: Exemplares da arquitetura Contemporânea (VILLEGAS J, 2016)

4. PATOLOGIAS

Para o caso de edifícios que apresentam problemas patológicos, o procedimento de atuação

consiste em:

• levantamento do maior número possível de subsídios para o entendimento do

problema através de vistoria do local, do histórico do edifício e do resultado de

exames complementares

• diagnóstico da situação, ou seja, entendimento completo dos fenômenos ocorridos

• definição da conduta a partir da escolha da alternativa de intervenção mais

conveniente.

Um dos aspectos essenciais é o conhecimento dos fatores que podem levar as edificações à

degradação e à ruína, bem como o entendimento dos mecanismos que fazem parte deste

processo e os danos já causados. Com isso é possível planejar as ações a serem desenvolvidas.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

19

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

A ação apenas sobre o efeito de um mecanismo de degradação e não sobre sua causa, não

tem efeito duradouro e pode maximizar o problema já existente. Um exemplo disso é a

realização de pinturas em uma parede que apresenta problemas de eflorescência, sem a

devida preparação do substrato.

4.1 FATORES DE DEGRADAÇÃO

Alguns fatores fazem com que a edificação seja mais ou menos durável. Dentre esses fatores

destacam-se:

OS MATERIAIS, considerando a perspectiva de durabilidade dos mesmos, em função do

ambiente a que serão expostos;

A QUALIDADE DO PROJETO, que envolve desde a escolha do tipo de implantação até questões

mais específicas como o detalhe dos componentes;

AS CONDIÇÕES DE USO;

A FREQUÊNCIA DA MANUTENÇÃO, toda edificação, nova ou histórica, deve ser cuidada para

que não se deteriorem.

4.2 OS AGENTES E MECANISMOS DE DEGRADAÇÃO

Os agentes de degradação são elementos que por sua presença podem determinar o

surgimento da degradação. Ex: ÁGUA, HOMEM.

Mecanismos de degradação são sequências de mudanças químicas e/ou físicas que levam a

perdas em uma ou mais propriedades de um componente ou material de construção, quando

potencializado por um fator e exposto a um agente. Um exemplo de fenômeno químico é a

ação dos sais e um exemplo de fenômeno físico diz respeito às dilatações e contrações

relacionadas às variações de temperatura. Outro tipo de mecanismo de degradação diz

respeito aos ataques de agentes biológicos que geram fenômenos bioquímicos.

4.2.1 Presença de Umidade nas Edificações

Água: é um dos principais agentes responsáveis pelo aparecimento de patologias em todos os

tipos de edificações.

A capilaridade ocorre através de vazios (interstícios) microscópicos existentes nos materiais. O

avanço da água por capilaridade é muito comum nas alvenarias, quando as mesmas estão em

contato com zonas úmidas (figura 20).

As águas contidas no solo, provenientes das chuvas ou lençóis freáticos, exercem pressão

ascendente sob os alicerces. A falta de impermeabilização das fundações permite o fluxo

d’água através dos vazios existentes entre as partículas dos materiais, provocando o

aparecimento de manchas úmidas nas paredes.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

20

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

• umidade ascendente proveniente do solo;

• absorção e penetração da água da chuva (pode ser impulsionada pelo vento e

presença de fissuras);

• umidade de condensação;

• umidade incorporada durante o processo de construção;

• umidade acidental.

Figura 20: Umidade ascendente em uma edificação

A infiltração também é um dos principais problemas que ocorrem nas soluções construtivas de

coberturas (figura 21). A ação da umidade sobre as peças de madeira provoca seu

apodrecimento, o aparecimento de fungos e principalmente cupins. As principais causas de

infiltrações em coberturas podem ser:

GOTEIRAS: devido ao deslocamento, quebra das telhas ou recobrimento inadequado;

RETORNO DAS ÁGUAS: devido à pouca declividade do telhado e das calhas ou mau

dimensionamento destas, ou ainda obstrução, tanto das calhas como das descidas de água

(condutores);

INFILTRAÇÃO PELAS PAREDES: devido à inexistência ou má execução da impermeabilização

das paredes e platibandas.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

21

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 21: Corte de uma estrutura de telhado com platibanda, possibilidades de Umidade

descendente em uma edificação

4.2.2 Agentes Biológicos

Biodeterioração são mudanças indesejáveis produzidas por atividades normais de organismos

vivos sobre as propriedades dos materiais. Os estudos relacionados a biodeterioração

procuram auxiliar na compreensão dos fenômenos químicos e bioquímicos que levam a

degradação dos materiais das edificações.

Microorganismos: são as bactérias, os fungos, as algas e os liquens.

As bactérias e os fungos se alimentam da matéria orgânica. Sendo assim, a madeira é um dos

principais pontos de ataque desses elementos.

Os fungos se reproduzem por esporos, que são levados pelo ar, ou seja, a partir de um esporo

pode germinar um novo fungo.

Os diferentes tipos de fungo atuam diferentemente na madeira. Alguns apenas geram

manchas permanentes, outros constituem um elemento desorganizador que retira o carbono

do tecido lenhoso alterando sua estrutura e deixando-a quebradiça e outros atuam na

decomposição da celulose ou da lignina, o que é conhecido pelo nome de podridão parda ou

podridão branca respectivamente (figura 22).

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

22

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

Figura 22: Exemplo de colônia de fungos junto ao rodapé

4.2.3 Vegetação:

A vegetação se desenvolve onde encontra um substrato adequado ao seu crescimento. Um

exemplo de vegetação não intencional que age diretamente sobre a edificação é aquela que

cresce devido ao acúmulo de pó e matéria orgânica em reentrâncias da edificação, causando

danos estruturais, desagregação no revestimento e fissuras que constituirão um caminho

direto para a umidade (figura 23).

Figura 23: Exemplo de vegetação crescendo junto à uma parede de edificação (VILLEGAS,

2011)

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

23

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

A vegetação do entorno também pode trazer diferentes tipos de danos, conforme o porte,

como o sombreamento de áreas de fachada determinando uma maior concentração de

umidade e diferentes regimes de expansão, relacionado à vegetação de médio e grande

portes.

A vegetação de grande porte pode interferir no desempenho estrutural da edificação, através

de suas raízes e também no entupimento de calhas e outros condutores de águas pluviais

através da perda de folhas.

4.2.4 Insetos

Os insetos que mais causam danos às edificações são as formigas e os insetos xilófagos como

carunchos e cupins.

AS FORMIGAS formam uma rede de túneis subterrâneos, que poderão determinar recalques

nas fundações ou afundamento nos pisos. Também incidem em outros elementos da

edificação, como as regiões próximas a marcos e pisos, podendo provocar a degradação das

argamassas.

OS INSETOS XILÓFAGOS em um determinado período do seu desenvolvimento, enquanto

larvas, se alimentam da madeira, consumindo grande parte de seu tecido lenhoso (figura 24).

Um dos principais problemas do ataque desse tipo de inseto é que ele muitas vezes não fica

evidente. Constantemente as peças de madeira já estão irreversivelmente comprometidas,

com perigo de gerar um dano estrutural, quando se descobre o problema.

Figura 24: Exemplo de vegetação crescendo junto à uma parede de edificação

Nas cidades de clima tropical, como é o caso de Laguna, estamos afugentando os predadores

dos cupins para bem longe. Então os cupins se proliferam à vontade. Além de atacar os móveis

de madeira, os cupins atacam também a construção.

Nas edificações históricas, além de observar os elementos visíveis de madeira, como

estruturas e esquadrias, deve-se observar a estrutura dos estuques, pois é comum que o

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

24

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

ataque de cupim leve ao colapso esse tipo de elemento pelo ataque aos montantes de

madeira.

4.2.5 Animais de pequeno porte:

Os principais animais de pequeno porte que colaboram com a degradação das edificações são

os ratos e outros roedores, os morcegos e aves (pombos, etc) (figura 25).

Figura 25: Exemplo de pequenos animais que podem causar danos à edificação

4.2.6 Ação do uso pelo Homem

Podemos classificar os danos causados pelo homem em cinco categorias:

• desgaste ao uso;

• falta de conservação preventiva;

• intervenções indevidas;

• desenvolvimento urbano;

• vandalismo.

Em relação ao vandalismo destacam-se a pichação, a raspagem das superfícies e os incêndios

provocados.

Os principais mecanismos de degradação deflagrados pelo desenvolvimento urbanos são:

• a movimentação do solo do entorno;

• as mudanças de declividade no solo do entorno;

• a impermeabilização, que modifica as características hidrológicas da área;

• as cargas vibratórias originadas pelo incremento do tráfego do trânsito de veículos.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

25

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

4.3 DEGRADAÇÕES

4.3.1 Trincas, Fissuras, Rachaduras

As TRINCAS, em geral, são ocorrências muito comuns nas casas e prédios. Surgem em função

de muitas causas diferentes e são conhecidas também como FISSURAS ou RACHADURAS, como

se fossem a mesma coisa. Entretanto, existe uma diferença conceitual entre Fissura, Trinca e

Rachadura (figura 25). Quais são as diferenças?

• FISSURA: Estado em que um determinado objeto ou parte dele apresenta aberturas

finas e alongadas na sua superfície. As fissuras são, geralmente, superficiais e não

implicam, necessariamente, em diminuição da segurança de componentes estruturais.

• TRINCA: Estado em que um determinado objeto ou parte dele se apresenta partido,

separado em partes. As trincas, por representar a ruptura dos elementos, podem

diminuir a segurança de componentes estruturais de um edifício, de modo que mesmo

que seja quase imperceptível deve ter as causas minuciosamente pesquisadas. Em

muitas situações a trinca é tão fina que é necessário o emprego de aparelho ou

instrumento para visualizá-la.

• RACHADURA: Estado em que um determinado objeto ou parte dele apresenta uma

abertura de tal tamanho que ocasiona interferências indesejáveis. As rachaduras, por

proporcionar a manifestação de diversos tipos de interferências, devem ser analisadas

caso a caso e serem tratadas antes do seu fechamento. São muito comuns, mas isto

não significa que são normais. Portanto não devem ser aceitas passivamente. Muitas

vezes são bem pequenas, quase invisíveis, mas podem ser sintomas de algo muito

grave que está acontecendo com a estrutura do seu prédio.

Figura 25: Esquema de fissuras, trincas e rachaduras em uma edificação.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

26

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

1 - Trinca horizontal próxima ao teto pode ocorrer devido ao adensamento da argamassa de

assentamento dos tijolos ou falta de amarração da parede com a viga superior.

2 - Fissuras nas paredes em direções aleatórias pode ser devido à falta de aderência da

pintura, retração da argamassa de revestimento, retração da alvenaria ou falta de aderência

da argamassa à parede.

3 - Trincas no piso podem ser produzidas por vibrações de motores, excesso de peso sobre o

piso ou fraqueza da laje. Verificar se há trincas na parte de baixo (ver ítem 4) se houver é

grave.

4 - Trincas no teto podem ser causadas pelo recalque da laje, falta de resistência da laje ou

excesso de peso sobre a laje. Pode ser grave.

5 - Trincas inclinadas nas paredes é sintoma de recalques. Um dos lados da fundação não

aguentou ou não está aguentando o peso e afundou ou está afundando. Geralmente é grave.

6 - Abaulamento do piso pode ser causado por recalque das estruturas, por expansão do sub-

solo ou colapso do revestimento. Quando causados por recalques, são acompanhados por

trincas inclinadas nas paredes. Os solos muito compressíveis, com a presença da água, se

expandem e empurram o piso para cima.

7 - Trincas horizontais próximas do piso podem ser causadas pelo recalque do baldrame ou

mesmo pela subida da umidade pelas paredes, por causa do colapso ou falta de

impermeabilização do baldrame.

8 - Trinca vertical na parede é causada, geralmente, pela falta de amarração da parede com

algum elemento estrutural como pilar ou outra parede que nasce naquele ponto.

AS CAUSAS QUE PROVOCAM O APARECIMENTO DE TRINCAS

a) RETRAÇÃO: A argamassa de revestimento, a tinta e outros materiais que são aplicados

úmidos, diminuem de tamanho (retraem) ao secar.

b) ADERÊNCIA: As pinturas e os revestimentos que precisam ficar bem "grudados" na

parede, por algum motivo, apresentam aderência e começam a descascar. Veja um

caso de pastilha

c) DILATAÇÃO: Os materiais aumentam e diminuem de tamanho em função da variação

da temperatura do meio ambiente. Os materiais também aumentam e diminuem de

tamanho em função da variação da umidade do meio ambiente

d) MUITO CIMENTO: A argamassa de revestimento, quando tiver muito cimento sofre

uma grande retração.

e) AMARRAÇÃO: As paredes devem ficar bem "amarradas" na estrutura do prédio.

f) TREPIDAÇÃO: Elevadores, compressores e mesmo os veículos que trafegam na rua,

produzem vibrações que afetam as partes do prédio.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

27

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

g) RECALQUE: O excesso de peso, a acomodação do prédio, a fraqueza do material ou do

terreno fazem com que a peça se deforme ou afunde.

h) CAPACIDADE: Por erro de cálculo ou por deficiência na hora da confecção, as peças

podem ficar fracas.

i) MUDANÇA DO USO: Um prédio que foi projetado para uso residencial, está sendo

usado como comércio. Um caso de carga excessiva.

j) COLAPSO DE MATERIAIS: Os materiais precisam receber proteção e manutenção.

k) INFILTRAÇÃO: Água e outros elementos podem se infiltrar causando danos.

REFERÊNCIAS

FONTES (Documentos administrativos)

ARQUIVO NORONHA SANTOS. Processo de Tombamento Casa de Câmara e Cadeia, Rio de Janeiro, 1954.

_________. Processo de Tombamento do Centro Histórico de Laguna, Rio de Janeiro, 1984.

ESCRITORIO TECNICO DE LAGUNA/IPHAN. Documentos arquivados. Laguna 1985-2015

FRANCO, Luís Fernando. P. Informação nº 107/84, Arquivo Noronha Santos/IPHAN, Rio de Janeiro, 1984.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CASTELNOU, Antônio. Arquitetura & Cidade Contemporâneas. Curitiba: Apostila, Universidade Federal do Paraná, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Curitiba, 2010.

KESSEL, Carlos. Arquitetura neocolonial no Brasil: entre o pastiche e a modernidade. Rio de Janeiro: Jauá Editora, 2008.

Manual de Conservação Preventiva para Edificações - coordenação e elaboração Griselda

Pinheiro Klüppel e Mariely Cabral de Santana. Brasilia: Minc/IPHAN/Monumenta, s/d.

Manual de Elaboração de projetos de preservação do patrimônio cultural. Cadernos Técnicos

1. Brasília: MINC/Programa Monumenta, 2005.

VILLEGAS J., Maria Matilde. Entre os Morros e a Lagoa: Laguna Cidade – Documento / Dissertação (Mestrado) – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Mestrado Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural, Rio de Janeiro, 2016.

Da teoria à prática: Curso de capacitação para conservação e restauração

de bens imóveis no Centro Histórico de Laguna-SC

28

Projeto realizado com o apoio do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte, Fundação Catarinense de Cultura, FUNCULTURAL e Edital Elisabete Anderle / 2017.

REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES

ALBERNAZ e LIMA, 2000 Dicionário Ilustrado de Arquitetura. São Paulo: Pró-Editores, 2000.

ALMEIDA, Frederico Faria Neves. Conservação de cantarias: manual. Brasília: IPHAN, 2005

DURÁN ROCCA, Luisa. Patrimônio Edificado – Orientações para sua preservação. 2ª ed. Governo do Estado do Rio Grande do Sul: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado – IPHAE. Porto Alegre: Corag, 2009.

LA PASTINA FILHO, José. Conservação de telhados: manual. Brasília: IPHAN, 2005

Madeira: Uso e Conservação. Cadernos Técnicos 6. Brasília: MINC/Programa Monumenta,

2005.

Manual de Conservação e Intervenção em Argamassas e Revestimentos à Base de Cal.

Cadernos Técnicos8. Brasília: MINC/Programa Monumenta, 2005.

Manual de obras em edificações preservadas. Rio de janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes, Departamento Geral de Patrimônio Cultural, 1991.

OLIVEIRA, Mário Mendonça de. Tecnologia da conservação e da restauração – materiais e estruturas: um roteiro de estudos. 4º ed. rev. e ampl. Salvador: EDUFBA: PPGAU, 2011.