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OFICINA DA PESQUISA Prof. Msc. Carlos José Giudice dos Santos [email protected] www.oficinadapesquisa.com.br APOSTILA 2 ENGENHARIA E PROFISSÃO Belo Horizonte 2015

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OFICINA DA PESQUISA

Prof. Msc. Carlos José Giudice dos Santos

[email protected]

www.oficinadapesquisa.com.br

APOSTILA 2

ENGENHARIA E PROFISSÃO

Belo Horizonte

2015

O que é engenharia? [1]

Imagine que você está em uma festa de final de ano, eum parente que não lhe vê há muito tempo ficasabendo que você acabou de ingressar em um curso deengenharia. Se ele lhe perguntasse o que é engenharia,qual seria a sua resposta?

Eu sempre imagino esta situação porque algo parecidoaconteceu comigo. O ano era 1983 e eu tinha acabadode ingressar no curso de Engenharia Elétrica daUFMG. No final do ano, na festa de Natal, minha mãeconversava com uma amiga que estava chateadaporque a enceradeira importada dela tinha estragado.De repente, minha mãe me sai com uma pérola: “Ah,fala com meu filho! Ele está fazendo engenhariaelétrica e é muito inteligente. Tenho certeza que elesaberá consertar a sua enceradeira!”.

É desnecessário dizer o “carão” que eu fiquei, masesta situação serviu para mostrar que a grandemaioria das pessoas leigas em assuntos relacionadoscom a tecnologia não fazem a mínima ideia do que éengenharia ou o que faz um engenheiro. A doceinocência da cabeça da minha mãe imaginava que se umeletricista era capaz de consertar aparelhoselétricos, um engenheiro faria isso muito melhor. Tudobem se não havia peças para a enceradeira importada.“Meu filho é um futuro engenheiro eletricista, e eu ...

O que é engenharia? [2]

[...] tenho certeza que ele dará um jeito!”. Eu tivevontade de falar: “Engenheiros não são mágicos, e eunão estou estudando para consertar coisas!”. Contudo,achei mais prudente mostrar o mais amarelo de meussorrisos, e desmentir educadamente a minha mãe: “Eunão sei consertar enceradeiras!”.

Em minha humilde opinião, considero a engenhariacomo a arte de combinar conhecimentos das maisdiversas áreas para resolver, de modo prático, osproblemas tecnológicos que a sociedade enfrenta.

Holtzapple e Reece (2013) afirmam que é oconhecimento prático que distingue os cientistas dosengenheiros, já que ambos fazem uso do conhecimentocientífico. Neste sentido, eles citam um famosoengenheiro americano do século XIX, A. M.Wellington, que define a engenharia como “a arte defazer bem, com um dólar, aquilo que qualquer um podefazer com dois”.

Esta definição já aponta para uma das principaiscaracterísticas da engenharia, que é a preocupação emfazer mais com menos. Os engenheiros chamam issode otimização. Os administradores chamam isso deeficiência. Ambos estão certos, mas eu diria que osengenheiros conseguiram elevar a palavra “técnica” aoseu mais alto grau de expressão.

O que é engenharia? [3]

Para entender a minha afirmação anterior, peço ajudaao autor Galliano (1999), que define método como “amaneira correta de se chegar à verdade”, e a palavratécnica como “a melhor maneira de se chegar àverdade”. Assim, estas duas definições sugerem que ométodo vem antes da técnica.

Parafraseando Galliano, eu diria que método é o modocerto de se fazer alguma coisa, e que técnica, é amelhor maneira de se fazer esta mesma coisa.

Vejamos um exemplo: para se usar um tênis com meia,a pessoa deve colocar primeiro a meia, e depois otênis. Em outras palavras, existe uma sequênciacorreta de se fazer esse processo, e se essasequência não for respeitada, o resultado final (um pécom meia e tênis) não será alcançado. Essa sequênciacorreta é o método. Quando se aperfeiçoa o método,chega-se à técnica. Em minha opinião, aperfeiçoarmétodos (processos) e produtos é o que osengenheiros fazem de melhor.

Na visão de Holtzapple e Reece (2013), osengenheiros são pessoas que buscam soluções para osproblemas. Em minha humilde visão, os engenheirossão os “senhores da técnica”. Bem, talvez a minhavisão não seja assim tão humilde.

História da engenharia [1]

Diversos autores concordam com o fato de que ahistória da engenharia confunde-se com a própriahistória da humanidade. O pesquisador espanholCastells (1999) nos mostra que as primeiras aplicaçõesbiotecnológicas remontam a 6000 anos a.C. emanotações babilônicas que ensinam como fazer afermentação. Este registro que mostra o primeiroprocesso de domesticação de um ser vivo, colocando-oa serviço do homem como uma aplicaçãobiotecnológica, talvez possa ser considerados como oprimeiro registro histórico da Engenharia deAlimentos.

De acordo com Holtzapple e Reece (2013), pesquisasarqueológicas também demonstram que diversascivilizações, entre 6000 e 3000 anos a.C. jáconstruíam casas permanentes, cultivavam plantas edomesticavam animais. Os animais eram usados parasubstituir a força humana e puxar arados. Sistemasde irrigação foram construídos para suprir asnecessidades humanas de água em locais onde ela eraescassa. Moinhos movidos pela força do vento ou daságuas foram usados para moer o trigo. Jazidas decobre foram descobertas e usadas, resultando emferramentas de cobre e de bronze. A matemática foidescoberta e utilizada como ferramenta. Todas essasinformações foram descobertas em papiros e em...

História da engenharia [2]

[...] tabletes de argila.

Talvez as origens da engenharia sejam ainda maisantigas, embora não se tenha registros escritos,provavelmente porque a escrita ainda não tinha sidoinventada. Os autores Bazzo e Pereira (2013)consideram que o desejo de criar (inventar, engenharcoisas), mola mestra da engenharia, nasceu com asprimeiras técnicas primitivas que levaram àdescoberta da alavanca, há mais de 12 mil anos.

Existem registros de que um engenheiro egípciochamado Inhotep foi o responsável pela construção daprimeira pirâmide de degraus (Pirâmide de Djoser)com 214 pés de altura - aproximadamente 65 metros,o que é equivalente à altura de um moderno edifício de21 andares. Esta pirâmide foi construída entre os anosde 2930 e 2910 a.C., e o projeto mostra diversastécnicas de engenharia civil, hidráulica e mecânica quesão verdadeiros prodígios para a época em que apirâmide foi construída.

Figura 1: Pirâmide de Djoser, em Saqqarah, Egito. Disponível em: pt.wikipedia.org/wiki/Saqqara

História da engenharia [3]

A construção das pirâmides em Gizeh tiveram inícioprovavelmente no ano 2900 a.C. (HOLTZAPPLE e REECE,2013). A mais alta delas, a do faraó Quéops tem 481pés – aproximadamente 146 metros de altura, o que éequivalente à altura de um moderno edifício de 48andares. Ela é considerada a maior construção depedra feita pelos humanos antigos.

Figura 2: Pirâmide de Quéops, em Gizeh, Egito.. Disponível em: http://www.lmc.ep.usp.br/people/hlinde/estruturas/queops.htm

História da engenharia [4]

A história antiga mostra diversos registros notáveisda engenharia até o nascimento de Cristo. Façomenção aqui daqueles que considero mais relevantes:• 1600 a.C. : Foi criado o primeiro manual de engenheiro, oPapiro Rhind.

• 1000 a.C. : Foi construído o Templo do Rei Salomão emJerusalém.

• 450 a.C. : O Partenon grego foi construído.• 300 a.C. : Appius Claudius construiu a Via Ápia (estrada)

e o Aqueduto Ápia para fornecimento de água para Roma.• 300 a.C. : O farol grego próximo a Alexandria foi

construído. Perdurou por 16 séculos, até cair.• 250 a.C. : O grego Arquimedes projetou máquinas

militares e a bomba-parafuso.• 200 a.C. : A construção da Grande Muralha da China foi

concluída. É a única construção humana que pode servista da órbita da Terra.

• 150 a.C. : O grego Héron projeta máquinas militares,guindastes, prensas, a primeira turbina rotatória a vapor,o hodômetro e um extintor de incêndios bombeadomanualmente.

• 140 a.C. : Foi construído o sofisticado Aqueduto Marcia.• 15 a.C. : O romano Marcus Vitruvius Pollio escreveu DeArchitectura, trabalho padrão de referência emengenharia civil e mecânica por mais de 1400 anos.

História da engenharia [5]

A história após o nascimento de Cristo (Ano Zero) atéos dias de hoje mostra tantos registros relevantes daengenharia, que seria praticamente impossível listar atodos em uma única apostila.

O fato relevante e que faz a engenharia serestratégica para a sociedade em qualquer época é odomínio da técnica. A técnica era tão importante quena história antiga, as habilidades técnicas eramconsideradas como presentes dos deuses, privilégiosde poucos e sendo transmitidas apenas aos escolhidospor eles (BAZZO e PEREIRA, 2013). Se este fato fosseverdade, Arquimedes seria, com certeza, umaagraciado dos deuses. Diversos pesquisadoresconsideram Arquimedes como o primeiro engenheiro.

O grande trunfo de Arquimedes, que o aproxima daengenharia moderna, é o fato de usar a experiência ea invenção para se testar uma teoria. Além disso, foiprovavelmente uma das primeiras pessoas a perceberque os fenômenos físicos podem ser descritosmatematicamente.

Desse modo, Arquimedes foi pródigo tanto emrealizações matemáticas quanto em aplicaçõespráticas (SIMMONS, 2002). Muitos de seus livrossobre mecânica foram perdidos. Entretanto, muitos deseus tratados sobre geometria perduraram. Aqueles ...

História da engenharia [6]

[...] que tiveram acesso a estes escritos comentam queArquimedes tinha um estilo lúcido e econômico. Éimportante ressaltar que ele aprendeu geometriaquando foi estudar em Alexandria, uma geração depoisque o grego Euclides estabeleceu lá a sua escola.

Pode-se dizer que a ciência e a genialidade estava no“sangue” de Arquimedes, uma vez que era filho doastrônomo Fidias. Entretanto, temos que lembrar quenão existem provas que os dons relacionados com ainteligência são repassados geneticamente.

Segundo Simmons (2002), Arquimedes apresentouprovas da lei das alavancas e investigou o centro degravidade em sua obra Sobre o Equilíbrio dasSuperfícies Planas. Na obra Sobre a Esfera e oCilindro, descobriu as fórmulas para o volume e asuperfície de uma esfera.

Arquimedes quase inventou uma forma de cálculo, eseus escritos que mostram seus progressos nesta áreachegaram a Newton e Leibniz, no século XVII, que apartir das sementes lançadas por Arquimedes,chegaram ao cálculo integral e diferencial (HAWKING,2004). O famoso Princípio de Arquimedes, base dahidrostática, foi discutido e apresentado na obraSobre os Corpos Flutuantes.

História da engenharia [7]

Arquimedes leva o crédito por uma série de invençõespráticas, sendo a mais famosa delas o parafuso derosca sem fim, usado para retirar água do subsolo eque se tornou a famosa bomba-parafuso.

Arquimedes também criou o primeiro planetáriomecânico, com o objetivo de mostrar o movimento decorpos celestes. Também inventou o medidor dedioptria, um instrumento para medir o diâmetro do sol.

De acordo com Simmons (2002), a história que contamque Arquimedes inventou uma série de espelhos elentes para queimar os navios romanos à distância éfalsa. Entretanto, é verdade que criou inúmerasmáquinas de guerras, que jogavam projéteis balísticos(catapultas) nos navios ou simplesmente deixavam cairenormes pedras em cima destes navios (guindastes)quando estes se aproximavam do porto.

Apesar de Arquimedes não ter sido o inventor daalavanca, foi o primeiro a elucidar o princípio da poliacomposta, sendo dele a frase proverbial: “Se mederem um ponto de apoio, eu posso mover o mundo”.

Graças a seu gênio inventivo, Arquimedes ajudou a suacidade (Siracusa) a resistir à invasão dos romanos porum longo tempo. O general Marcellus queria capturarArquimedes vivo, mas um soldado o matou sem saberde quem se tratava, quando finalmente os romanos ...

História da engenharia [8]

[...] conseguiram entrar na cidade. Arquimedes estavasentado em uma praça, sozinho, desenhando no chãoalgum novo projeto, e não percebeu que a cidade tinhasido invadida, até que caiu mortalmente ferido(SIMMONS, 2002). Por todos os seus feitos,Arquimedes pode ser considerado como um dosmaiores engenheiros de todos os tempos.

Os engenheiros também fazem projetos, que podemse tornar processos e/ou produtos. Ao longo dahistória, vários foram os projetistas de máquinas,armas, ferramentas e processos. Talvez o maiscriativo e famoso deles tenha sido o italiano LeonardoDa Vinci. Entre seus projetos estão o helicóptero, ocanhão, o tanque de guerra, máquinas voadoras, entreoutros. Um de seus projetos mais fantásticos foi umaroda d’agua horizontal, base das modernas turbinashidráulicas utilizadas em usinas hidrelétricas.

Acredito que uma das maiores frustações que umprojetista pode sentir é elaborar um projeto e ver quea tecnologia disponível em sua época não permitetransformar aquele projeto em realidade. Esse foi ocaso de Leonardo Da Vinci, no século XV, e de outros,como Charles Babbage, no século XIX.

Os autores Holtzapple e Reece (2013) afirmam que apalavra engenheiro foi usada pela primeira vez no anoséculo II, quando Tertuliano, um autor cristão ...

História da engenharia [9]

[...] descreveu um ataque romano à cidade de Catargoem que foi utilizado um aríete, por ele descrito comoingenium, uma invenção engenhosa.

Mais tarde, por volta do século XII., a pessoaresponsável pelo desenvolvimento de engenhosinovadores destinados à arte da guerra era conhecidocomo ingeniator. Aríetes, torres de assalto,trabuquetes, catapultas e pontes flutuantes eramimportantes engenhos de guerra. Surgia assim o nomeque daria origem ao campo de saber e ao profissionalde engenharia.

No Renascimento, entre os séculos XIV e XVI, apalavra engenheiro ganhou uma formulaçãocontemporânea composta por uma série de nomes:Ingeniator, Architectus, Geometricus etCarpentariuns – que significa – o habilidoso construtorde engenhos, construtor de casas, medidor de terrase fazedor de carruagens.

Figura 3: Um aríete da época dos exércitos romanos. Disponível em:

http://www.cloroalclero.com

A engenharia moderna [1]

Na visão de Castells (1999) e de acordo com várioshistoriadores, há duas revoluções industriais. Aprimeira começou nos últimos trinta anos do séculoXVIII, e foi caracterizada por novas tecnologias comoa máquina a vapor e novos processos metalúrgicos. Asegunda, cerca de cem anos depois, destacou-se peloadvento da eletricidade, do motor de combustãointerna, de produtos químicos com base científica e oinício das tecnologias da comunicação (telégrafo etelefone).

Estas revoluções provocaram um aumento repentino einesperado de aplicações tecnológicas, quetransformou os processos de produção e distribuição,criando uma enxurrada de novos produtos e mudando oeixo de poder e riqueza no mundo. Infelizmente, amaioria dos avanços tecnológicos está relacionada aambições imperialistas que acabaram resultando emconflitos.

Qual é a importância da revolução industrial? Pode-seafirmar que, até certo ponto, a mudança da engenhariaantiga para a engenharia moderna teve a revoluçãoindustrial como o seu marco de passagem.

Bazzo e Pereira (2013) que esta passagem não ocorreude uma hora para a outra. Foi um processo gradual. Osmesmos autores afirmam que engenharia moderna éaquela caracterizada por uma forte aplicação de ...

A engenharia moderna [2]

[...] conhecimentos à solução de problemas. Em outraspalavras, o homem passou a aplicar conhecimentoscientíficos às técnicas.

Na engenharia antiga, os artefatos eram construídoscom base em determinantes estéticos e operacionaisque dependiam da experiência anterior do construtor,ou seja, é uma engenharia baseada principalmente naexperiência. Na engenharia moderna elabora-se umprojeto teórico baseado em conceitos científicos, emteorias formalmente estudadas e testadasempiricamente em laboratórios antes do produto finaltomar forma (BAZZO e PEREIRA, 2013).

Na primeira revolução industrial, o fato central é omotor a vapor, que permite substituir a força humanae a força dos animais com vantagens. Na segundarevolução industrial, a eletricidade é a grandenovidade, pois, pela primeira vez na história, erapossível usar uma energia que podia ser transportada,ou seja, não seria produzida no mesmo local em queseria utilizada. Este fato permitiu uma evolução doprocesso de industrialização, iniciado com a máquina avapor, que foi substituída por motores elétricos. Oprimeiro gerador elétrico experimental foi construídoem 1832 por um fabricante de instrumentos francêschamado Hippolyte Pixii. Entretanto, o primeiro motorelétrico só foi usado na prática em 1871.

A engenharia moderna [3]

De acordo com Bazzo e Pereira (2013) a engenharianasce como profissão a partir do momento em que osconstrutores e inventores passaram a criar técnicascom base em conhecimentos científicos.

É interessante ressaltar que não se trata de utilizartécnicas baseadas em publicações. Temos váriosescritos da área de engenharia anteriores à revoluçãoindustrial. Por exemplo, no ano de 1230, um livro deanotações do francês Wilars de Honecourt descreviaagrimensura, corte de pedras, serras movidas à água euma máquina de movimento perpétuo. No ano de 1500foi publicado aquele que é reconhecido como oprimeiro livro de engenharia, chamado De Re Militari,pelas mãos do italiano Valturius. Em 1556, o italianoGeorgius Agricola publicou o livro De Re Metallica, quedescrevia métodos de mineração, distribuição dejazidas, fabricação de sal, soda, alume, vitríolo,enxofre, betume e vidro (HOLTZAPPLE E REECE, 2013).

A engenharia moderna nasce, não por acaso, na mesmaépoca do Iluminismo, época em que a ciência e afilosofia começam a se distanciar (século XVIII) atéque sofrem uma ruptura mais radical no final do séculoXIX, com o positivismo de Augusto Comte.

Segundo Bazzo e Pereira (2013), a primeira pessoa ausar formalmente o título de engenheiro foi o inglês ...

A engenharia moderna [4]

[...] John Smeaton, que projetou e construiu o farol deEddystone em 1756. Ele teria se autointituladoEngenheiro Civil, e esta designação serviu para definirem muitos países a engenharia que não se ocupava deserviços públicos, do estado ou relacionados à áreamilitar.

As primeiras escolas de engenharia surgiram naFrança do século XVIII, e tinham a finalidade deensinar as aplicações da matemática aos problemas deengenharia.

A primeira escola de engenharia no Brasil foi criadapor D. João VI em 1810, com o nome de Academia RealMilitar. Depois da independência, ela passou a sechamar Academia Imperial Militar, e mais tarde,Academia Militar da Corte. A partir de 1823, elapassou a aceitar estudantes civis, e em 1858, passou ase chamar Escola Central (BAZZO e PEREIRA, 2013).

Os mesmo autores afirmam que em 1946, o Brasil jácontava com 15 instituições de ensino de engenharia.Hoje (2014), temos mais de 200 instituiçõesdedicadas ao ensino da engenharia.

O ensino de engenharia no século XXI [1]

Em 2009, o engenheiro e professor emérito da UFMG,Evandro Mirra, proferiu uma palestra em que sinalizouas tendências da engenharia do século XXI,especialmente no caso do Brasil.

Ele começa a sua fala diferenciando previsão deprospecção. Assim, ele afirma que não se devem fazerprevisões sobre o futuro, porque a única certeza queteremos é que as chances de erros são muito maioresque as chances de acerto. Ele ressalta que devemosfazer uma prospecção, definida como um esforçocoletivo, trabalhoso e baseado em evidências queresultam de diversas correntes de pensamento.

Continuando o seu raciocínio, ele demonstra que aprospecção resulta de uma análise das variáveis quepermitem estabelecer a situação em que nosencontramos hoje e como a evolução dessas variáveispode afetar o nosso futuro. A prospecção é umaleitura do presente que permite analisar os fatos quepodem ser portadores do futuro. Resulta, então, que aprospecção é um dos processos para construção dofuturo. Uma das entidades que se preocupa com aprospecção do futuro da engenharia no Brasil é aAssociação Brasileira de Ensino da Engenharia -ABENGE, que desenhou o perfil do engenheiro doséculo XXI a partir de discussões na academia, nasempresas e no poder. Este perfil considera que as ...

O ensino de engenharia no século XXI [2]

[...] seguintes características que devem fazer partedas habilidades e competências do engenheiro:

• Ser facilmente treinável no ambiente daempresa: Significa que as empresas não esperamque as escolas de engenharia sejam capazes defornecer uma formação completa para seusengenheiros, mesmo porque cada empresa possuiuma maneira de trabalhar diferente, desenvolvemseus próprios métodos e técnicas. As empresasesperam que as escolas preparem o engenheiroiniciante para que ele tenha uma postura de seapropriar rapidamente da cultura tecnológicaproduzida pelas diversas empresas do setor.

• Bons conhecimentos teóricos especializados:Significa que não basta as escolas forneceremapenas as ferramentas (os conhecimentos básicos),mas que em alguns casos, algumas ferramentasmatemáticas e físicas mais sofisticadas sãonecessárias para que o engenheiro desenvolva suaprópria expertise em determinadas áreas. Este é ocaso, por exemplo, de teorias como as equações deMaxwell e as transformadas de Laplace e deFourier para o campo de estudo da EngenhariaElétrica.

O ensino de engenharia no século XXI [3]

• Treinamento em pesquisa: Significa que asempresas esperam que os engenheiros iniciantestivessem a oportunidade de serem treinados empesquisa em seu período de formação – a ciênciaprocesso – e não apenas a ciência disciplina.

• Capacidade para trabalhar em grupos: Esta é umahabilidade essencial, forjada no âmbito dasrelações interpessoais. A sinergia só acontece apartir do momento em que as pessoas aprendem aconviver e produzir conhecimento em grupo, o queexige paciência, tolerância, disponibilidade, entreoutras características desejáveis.

• Deve ter resistência a frustrações e capacidadede conviver com as situações de crise: Significaque as empresas esperam que os engenheirosiniciantes sejam capazes de trabalhar em umambiente onde eles estarão sujeitos à pressões.Neste contexto, a possibilidade de fracassos érotineira e o engenheiro tem que saber lidar comisso de forma objetiva, ou seja, não perder tempolamentando e enfrentar com coragem os próximosdesafios.

• Competência em informática como umaferramenta rotineira: Significa que a informáticana engenharia deixou de ser uma ferramenta etornou-se a ferramenta.

O ensino de engenharia no século XXI [4]

• Boa comunicação oral e escrita: Significa que asempresas esperam que os engenheiros tenhamdesenvoltura para se comunicar adequadamentecom pessoas dos mais diversos níveis deescolaridade, além de capacidade para ler eproduzir material técnico sem percalçoslinguísticos.

• Sólida formação cultural: Significa que oengenheiro não é uma pessoa a quem só interessaconhecimentos técnicos. O engenheiro deve sabernavegar bem por todas as áreas do conhecimento.Na construção desta formação, é essencial que oengenheiro seja fluente em inglês, no mínimo.

Uma das principais características da engenharia doséculo XXI é a inovação. De acordo com Mirra (2009),não existe engenharia de qualidade sem inovação.Inovação vem de pessoas. A inovação não pode maisser vista hoje como resultado solitário do insight deum inventor genial. Inovação é um processo coletivoque resulta de um esforço conduzido pela sociedade.Não vem só das empresas. Começa na academia,precisa do suporte do estado, das instituiçõesfinanceiras, de aparato legal, etc. A inovação pode serum serviço, um processo ou uma nova maneira depensar e agir que produza resultados consistentes nasociedade.

O ensino de engenharia no século XXI [5]

Na visão de Mirra (2009), no processo de inovação, asempresas e as indústrias são protagonistas, ou seja,possuem um papel hegemônico. Entretanto, não operamsozinhas. Toda inovação é científica, tecnológica esocial. Isto significa que a inovação implica emmudanças de hábitos.

O ritmo de inovação tecnológica nos últimos 30 anostem dois momentos: de 1980 a 1994, e de 1995 até2010. O que se verifica no primeiro momento é quepaíses tradicionalmente inovadores, especialmente oEstados Unidos e alguns países da Europa, continuamna vanguarda, mas não estão mais acelerando emrelação ao resto do mundo. Neste segundo momento,observa-se que há um crescimento da inovação empaíses como o Brasil e especialmente, nos paísesasiáticos.

O mesmo autor revela que a inovação pode ser medidaem várias dimensões, a saber:

• Número de pessoas envolvidas em processos deinovação

• Quantidade de artigos científicos publicados

• Quantidade de patentes registradas

• Quantidade de produtos tecnológicos colocados nomercado

O ensino de engenharia no século XXI [6]

Em 2009, o grupo de pesquisa sobre economia dainovação de Harvard mapeou os principais atoresmundiais do processo de inovação. Este ranking émostrado a seguir:1. Estados Unidos 2. Finlândia 3. Israel 4. Reino Unido

5. Singapura 6. Japão 7. Coréia do Sul 8. Canadá

9. Irlanda 10. Austrália 11. Dinamarca 12. Brasil

13. Nova Zelândia 14. França 15. Holanda 16. Suécia

17. China 18. Alemanha 19. Rússia 20. Chile

Dados da PINTEC (Pesquisa de Inovação Tecnológica)de 2008, realizado pelo IBGE mostrou que o Brasilteve 4800 empresas inovadoras que realizarampesquisa e desenvolvimento de novos produtos,processos e serviços. Deste total de empresas, 267foram líderes em inovação dentro de sua área deatuação no mercado mundial. Este é um feito notável,tendo em vista que o Brasil demorou a acordar echegou tarde para disputar o jogo da competitividademundial.

Existem áreas em que o Brasil detém liderança globalem termos de inovação: Alimentos, Petróleo e gás,Combustíveis da biomassa, Metal-mecânica,Equipamentos de transportes, Produtos químicos –petroquímicos – polímeros, Produtos florestais - papele celulose.

Especialidades da Engenharia e área afins [1]

Várias são as engenharias hoje, e este número tende acrescer. Os historiadores concordam que todas asengenharias evoluíram da engenharia civil.

Engenharia Civil: É considerada a mais antiga uma vezque existem registros de 4500 anos, da época daspirâmides do Egito. Os engenheiros civis sãoresponsáveis pelo projeto e construção em largaescala (edifícios, pontes, viadutos, túneis, aeroportos,portos, sistemas de abastecimento de água, etc).

Engenharia Mecânica: É considerada quase tão antigaquanto a engenharia civil, uma vez que muitas máquinaseram necessárias à execução de grandes projetos deengenharia. A partir da primeira revolução industrial,a engenharia mecânica se separou definitivamente daengenharia civil como uma especialidade e cresceu.

Engenharia Elétrica: Ela nasceu a partir do momentoem que os cientistas passaram a compreender anatureza da eletricidade e descobriram aplicaçõespráticas. A base é a geração, transmissão e utilizaçãoda energia. A engenharia elétrica é considerada amaior especialidade das engenharias, uma vez quecongrega 25% de todas os engenheiros em suasdiversas especialidades: elétrica (de potência),eletrônica, automação, telecomunicações, computação,software, biomédica e mecatrônica (com aparticipação de outras engenharias), etc.

Especialidades da Engenharia e área afins [2]

Engenharia Química: A partir do final do século XIX,a indústria química começou a evoluir muito em funçãodo desenvolvimento científico. Esta indústriacontratava dois tipos de funcionários técnicos: osquímicos e os engenheiros mecânicos. O engenheiroquímico nasceu da junção destas duas especialidades.

Engenharia Industrial: São responsáveis em projetar,desenvolver, instalar e operar plantas industriais.Além disso, são mestres na área da otimização emtodas as áreas de atuação humanas. Ela surge de umdesdobramento da engenharia mecânica, química emetalúrgica, mas hoje o profissional recebecontribuições de outras engenharias. A Engenharia deProdução é a denominação mais atual da engenhariaindustrial.

Engenharia de Materiais: Ela se dedica a obter osmateriais que vão atender as demandas da sociedade.Assim, surgiram diversas especialidades, tais como aengenharia de minas, a metalúrgica, a do petróleo, ade cerâmica e a de ciência dos materiais, entreoutras.

Outras áreas: Agronomia, Arquitetura, EngenhariaNuclear, Engenharia de Alimentos, EngenhariaAeroespacial, Engenharia Biomédica e Tecnólogos daEngenharia.

Registro Profissional do Engenheiro [1]

O órgão responsável pelo registro profissional doengenheiro e profissões relacionadas é o ConselhoFederal de Engenharia e Agronomia – CONFEA.

Recentemente a Arquitetura se retirou do CONFEA ecriou o seu próprio conselho. O CONFEA surgiu noBrasil em 1933 a partir da regulamentação daprofissão de engenheiro pelo então presidente,Getúlio Vargas.

Atualmente o CONFEA é regido pela Lei 5.194 de1966, e representa todas as engenharias, além dosgeógrafos, geólogos, meteorologistas e os diversostecnólogos, o que compreende algumas centenas detítulos profissionais.

O CONFEA é representado nos estados pelosConselhos Regionais de Engenharia - CREA’s. Hoje osistema CONFEA/CREA tem registros de cerca de ummilhão de profissionais que respondem por cerca de70% do PIB do Brasil.

O Conselho Federal é considerada a instância máximaa qual um profissional pode recorrer para qualquerassunto relacionado ao exercício da profissão.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADABAZZO, Walter Antonio; PEREIRA, Luiz Teixeira do Vale. Introdução à

engenharia: conceitos, ferramentas e comportamentos. 4. ed.

Florianópolis: UFSC, 2013.

BROCKMAN, John; MATSON, Eric (Orgs.). As coisas são assim:

pequeno repertório científico do mundo que nos cerca. São Paulo: Cia.

das Letras, 2000.

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e

Terra, 1999.

CONFEA – Conselho Federal de Engenharia e Agronomia.

Disponível em: <www. confea.org.br>. Acesso em: 07 set. 2014.

FREIRE-MAIA, Newton. A ciência por dentro. Petrópolis: Vozes,

1998.

GALLIANO, Guilherme. O método científico. São Paulo: Harbra,

1999.

HOLTZAPPLE, M. T.; REECE, W. D. Introdução à engenharia. Rio de

Janeiro: LTC, 2013.

HAWKING, Stephen W. Os gênios da ciência: sobre os ombros dos

gigantes. Rio de Janeiro: Campus, 2004.

RUSSELL, Bertrand. História do pensamento ocidental: a aventura

do pensamento dos pré-socráticos a Wittegenstein. Rio de Janeiro:

Ediouro, 2001.

SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios: a ciência

vista como uma vela no escuro. São Paulo: Cia. das Letras, 2000.

SIMMONS, John. Os 100 maiores cientistas da história: uma

classificação dos cientistas mais influentes do passado e do presente.

Rio de Janeiro: DIFEL, 2002.