obra analisada gÊnero autor dados biogrÁficos · há ainda “menino de engenho” – o filme de...

4
OBRA ANALISADA Menino de Engenho GÊNERO Romance AUTOR José Lins do Rego DADOS BIOGRÁFICOS Nome completo: José Lins do Rego Cavalcanti Nascimento: 03 de junho de 1901, engenho Corredor, no município de Pilar, no interior da Paraíba Morte: 12 de setembro de 1957, Rio de Janeiro BIBLIOGRAFIA Ciclo da cana-de-açúcar: Menino de engenho (1932) Doidinho (1933) Bangüê (1934) O moleque Ricardo (1935) Usina (1936) Fogo morto (1943) - romance, síntese de todo o ciclo da cana- de-açúcar “fogo morto” => caracteriza a total decadência de um engenho Ciclo do misticismo e do cangaço - outros aspectos típicos da vida nordestina Pedra Bonita (1938); Cangaceiros (1953). Fonte temática/oralidade: literatura de cordel Temas diversos - ambientados fora do nordeste Pureza (1937); Riacho doce (1939); Água-mãe (1941) Eurídice (1947). RESENHA Conta-se a história de um menino Carlos de Melo que vai viver no engenho do avô, depois de a mãe (Clarisse, filha de senhor de engenho) ser assassinada pelo pai no quarto de dormir. Sempre estavam brigando, mas matá-la... Desconhece-se o motivo. O menino, apesar de pequeno, sente o impacto da morte da mãe e imensa solidão com sua perda. O pai é preso. Uma nova “vida”, um mundo novo o aguarda. Carlos elabora uma espécie de crônica da existência diária no engenho Santa Rosa. José Lins desejava, “traçar a biografia de seu avô, o velho José Lins, que era para ele o tipo representativo do senhor de engenho, expressão legítima do patriarcalismo rural da região açucareira do Nordeste”. Neste romance aparecem, sob a forma de pequenas cenas e rápidas descrições, o avô Zé Paulino (coronel José Paulino), velho patriarca rural, as tias solteironas, uma fada boa – Tia Maria, os “cabras” que trabalham na plantação, velha Sinhazinha (que tomava conta da casa do avô), as mucamas, os “moleques da bagaceira” e os cangaceiros que, eventualmente encontram guarida no Santa Rosa – Antonio Silvino era um deles. Registros do folclore nordestino: a velha Totonha e suas histórias encantam a todos que ouvem. Em tono do engenho de açúcar giram costumes, crendices, superstições que refletem bem a nossa cultura. Muita magia e mistério. Um interessante relato: a cheia do Paraíba – chega devastando

Upload: phungminh

Post on 25-Jan-2019

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

OBRA ANALISADA Menino de Engenho

GÊNERO Romance

AUTOR José Lins do Rego

DADOS BIOGRÁFICOS

Nome completo: José Lins do Rego Cavalcanti Nascimento: 03 de junho de 1901, engenho Corredor, no município de Pilar, no interior da Paraíba Morte: 12 de setembro de 1957, Rio de Janeiro

BIBLIOGRAFIA Ciclo da cana-de-açúcar: Menino de engenho (1932) Doidinho (1933) Bangüê (1934) O moleque Ricardo (1935) Usina (1936) Fogo morto (1943) - romance, síntese de todo o ciclo da cana-de-açúcar “fogo morto” => caracteriza a total decadência de um engenho Ciclo do misticismo e do cangaço - outros aspectos típicos da vida nordestina Pedra Bonita (1938); Cangaceiros (1953). Fonte temática/oralidade: literatura de cordel Temas diversos - ambientados fora do nordeste Pureza (1937); Riacho doce (1939); Água-mãe (1941) Eurídice (1947).

RESENHA

Conta-se a história de um menino Carlos de Melo que vai viver no engenho do avô, depois de a mãe (Clarisse, filha de senhor de engenho) ser assassinada pelo pai no quarto de dormir. Sempre estavam brigando, mas matá-la... Desconhece-se o motivo. O menino, apesar de pequeno, sente o impacto da morte da mãe e imensa solidão com sua perda. O pai é preso. Uma nova “vida”, um mundo novo o aguarda. Carlos elabora uma espécie de crônica da existência diária no engenho Santa Rosa. José Lins desejava, “traçar a biografia de seu avô, o velho José Lins, que era para ele o tipo representativo do senhor de engenho, expressão legítima do patriarcalismo rural da região açucareira do Nordeste”. Neste romance aparecem, sob a forma de pequenas cenas e rápidas descrições, o avô Zé Paulino (coronel José Paulino), velho patriarca rural, as tias solteironas, uma fada boa – Tia Maria, os “cabras” que trabalham na plantação, velha Sinhazinha (que tomava conta da casa do avô), as mucamas, os “moleques da bagaceira” e os cangaceiros que, eventualmente encontram guarida no Santa Rosa – Antonio Silvino era um deles. Registros do folclore nordestino: a velha Totonha e suas histórias encantam a todos que ouvem. Em tono do engenho de açúcar giram costumes, crendices, superstições que refletem bem a nossa cultura. Muita magia e mistério. Um interessante relato: a cheia do Paraíba – chega devastando

plantações, matando pessoas e animais. O romance, narrado em primeira pessoa, apresenta uma estrutura memorialista, em quarenta capítulos. O tempo flui cronologicamente: o narrador (Carlinhos) tem quatro anos quando a narrativa começa e doze, quando termina o livro. A linguagem: regional – termos e construções da linguagem oral – oralidade dos contadores e cantadores nordestinos.

ESTILO DE ÉPOCA Modernismo – segunda fase – prosa - 1930/1945

- Romance regionalista => realismo crítico => problemas brasileiros em geral e específicos de determinadas regiões => denúncia da questão social. - traz a reflexão para os problemas sociais marcantes do momento - incessante busca do homem brasileiro => homem do sertão, com toda a sua força de homem da terra. - relações do personagem com o meio natural e social. - passagem de um nordeste medieval para uma nova realidade capitalista e imperialista Alguns temas abordados: - nas regiões de cana, bangüês e engenhos sendo devorados pelas modernas usinas (ponto fundamental dos romances de José Lins do Rego) - o poder político nas mãos de interventores => predomínio da situação dos proletários rurais, isto é, os dominados por um rude esquema de trabalho sob o mando opressor dos grandes proprietários de terra. => grandes latifundiários – oprimem lavradores => senhores de engenho => mantêm cangaceiros a seu serviço. => grandes fazendas de cacau => homem do campo em estado miserável. - constantes secas acirrando as desigualdades sociais, mão-de-obra baratíssima, intenso movimento migratório, miséria, fome... - linguagem típica da região = vocabulário próprio de cada região. ALERTA! É preciso registrar que essa época não se caracteriza só por romances regionalistas que se dedicam a esquadrinhar o campo. Há também o romance de caráter citadino, que se debruça sobre partes do imenso Brasil. Tragédia Burguesa, de Octávio de Faria Fronteira, de Cornélio Pena O Amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos A Estrela Sobe, de Marques Rebelo.

INTERTEXTUALIDADE

Menino de Engenho intertextualiza com as demais obras do ciclo da cana-de-açúcar, especialmente a trilogia – Menino de Engenho, Doidinho e Bangüê. Há ainda “Menino de Engenho” – o filme de Walter Lima Jr. 1920, na Paraíba. Após a morte da mãe, o menino Carlinhos é enviado para o engenho Santa Rosa para ser criado pelo avô e pelos tios. Lá ele testemunha a chegada de um novo tempo, com o advento das modernas usinas de açúcar e as transformações econômicas e sociais pelas quais passa a produção canavieira, mudanças que irão afetar a vida de todos. Quando ele cresce e vai para o colégio, já não é mais o garoto ingênuo e inocente que chegou no engenho.

Música “O Doce e o Amargo”, de João Ricardo & Paulinho Mendonça Dentre as obras de arte: Jean Baptiste Debret, Miró e Rugendas – engenho/usina - "Engenho Manual que faz caldo de cana", Debret, Rio de Janeiro, 1822 As moendas, acionadas pelo trabalho dos escravos ou a partir da utilização de animais de tração (como bois ou cavalos) eram parte constitutiva das etapas de produção do açúcar. Desse trabalho era obtida a garapa (suco da cana), que posteriormente passaria por outras fases em que seria transformado em açúcar mascavo ou marrom. (ilustração de Jean-Baptiste Debret) As grandes fazendas onde se produzia o açúcar eram mantidas a partir do trabalho escravo, produziam grandes quantidades de açúcar mascavo que eram exportadas e refinadas na Europa de onde eram revendidas para os consumidores finais.

A atividade açucareira foi durante muito tempo o pilar sobre o qual a economia colonial se sustentou. Foi desenvolvida principalmente na Zona da Mata, no litoral nordestino, que oferecia condições naturais favoráveis ao cultivo da cana-de-açúcar, produto que obtinha grande aceitação no mercado europeu e que garantia alta lucratividade. Para o seu cultivo, adotou-se o sistema de plantations, caracterizado pelo uso de latifúndios destinados ao cultivo de uma só cultura (monocultura). A extração da cana necessitava de um grande contingente de mão-de-obra e foi a partir dessa necessidade que uma grande quantidade de escravos africanos passou a trabalhar nos engenhos, propriedades destinadas à cultura e produção de açúcar. Rugendas – Os efeitos do álcool Menino e Canavial – Cândido Portinari (1959) A série RETIRANTES – também de Portinari: – Menino morto (1944) – artista retrata a dor de personagens esquálidos, famintos e sedentos. Ironicamente, dos olhos das figuras que sofrem pela sede saem lágrimas aos borbotões. Joan Miró. The Farm. 1921/22. óleo sobre tela Quadro comum: retirante, andando a pé com suas familiares, em busca de abrigo e de comida: A BAGACEIRA, de José Américo de Almeida (1928) O QUINZE, de Raquel de Queirós – grande seca de 1915 (1930) contrastando com a grande cheia de 75 (MENINO DE ENGENHO) VIDAS SECAS, de Graciliano Ramos – luta pela sobrevivência.

VISÃO CRÍTICA

Livro de estréia do mestre paraibano José Lins do Rego. Traz-nos a saga da infância de Zé Lins, menino de engenho ele próprio, assim como seu personagem criado no Engenho Corredor - Carlos de Melo, sob a tutela amorosa do avô e dos tios. A força do romancista, filho do sertão paraibano e

impregnado de espírito nordestino, era refletir no seu enorme mural um problema social tipicamente nosso: a agonia de uma casta, o fim do patriarcado rural, o desmoronamento de um mundo. Assim como Balzac e Proust, o nosso sertanejo do Pilar, filho desse patriarcado rústico, vinha refletir nos painéis do seu grande mural a morte dos bangüês, a agonia dos engenhos, o domínio crescente das usinas, em suma a desumanização da economia pela mecanização da lavoura e, com isso, a ruína do patriarcado e a dispersão de um povo, descendente dos escravos de outrora, e ainda não fixado no trabalho livre.