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O moderno, o nacional e o popular no teatro oitocentista fluminense Antonio Herculano Lopes Objetivo geral O presente projeto integra um trabalho de longo prazo, que constitui o fulcro de minha atividade de pesquisa nos últimos quatro anos no Setor de História da Fundação Casa de Rui Barbosa. Nesse trabalho, tenho me debruçado sobre a atividade teatral no Rio de Janeiro do século XIX, a partir de sua inserção no movimento geral da cultura naquela sociedade. Formalmente ligado à linha de pesquisa “História do Rio de Janeiro”, o projeto tem no entanto fortes interfaces com as outras linhas do setor, “Cultura afro-brasileira e identidade nacional” e “Intelectuais, imprensa e humor”. Anteriormente, havia estudado o teatro musical ligeiro das duas primeiras décadas do século XX e nele identificado uma importante fonte para um diálogo interclasses e interétnico no âmbito da cultura, fenômeno que contribuiu para a invenção de uma identidade carioca e brasileira (LOPES 2000a). Daí, comecei a buscar no teatro fluminense do século anterior sinais da absorção de elementos da cultura popular de influência africana através, por exemplo, de personagens (o capadócio, a baiana), ritmos (o batuque) e linguagens (oral, musical, corporal). Tais sinais mais adiante seriam determinantes naquela busca identitária, mas na época causavam tensões insolúveis. Como a cultura de um modo geral e o teatro em particular podiam lidar com a questão do popular, do afrobrasileiro e do mestiço no Rio de Janeiro do século XIX, em plena vigência do regime escravista? O objetivo geral do trabalho é realizar uma releitura do teatro oitocentista no Rio de Janeiro, através de uma perspectiva de história cultural, em que mais importante do que a avaliação estética das produções é a compreensão dos processos de construção de representações que viriam a acompanhar a intelectualidade brasileira por longo tempo, em torno dos conceitos de moderno, nacional e popular. Em outras palavras, enquanto historiador da cultura, me proponho menos a uma crítica estética e mais a uma crítica ideológica. Isto não significa ignorar o aspecto estético, mas transformá-lo em um elemento mais na análise da construção simbólica, seguindo às avessas o método de crítica literária proposto por Antonio Candido (1967).

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O moderno, o nacional e o popular no teatro oitocentista fluminense

Antonio Herculano Lopes

Objetivo geral

O presente projeto integra um trabalho de longo prazo, que constitui o fulcro de

minha atividade de pesquisa nos últimos quatro anos no Setor de História da Fundação

Casa de Rui Barbosa. Nesse trabalho, tenho me debruçado sobre a atividade teatral no

Rio de Janeiro do século XIX, a partir de sua inserção no movimento geral da cultura

naquela sociedade. Formalmente ligado à linha de pesquisa “História do Rio de

Janeiro”, o projeto tem no entanto fortes interfaces com as outras linhas do setor,

“Cultura afro-brasileira e identidade nacional” e “Intelectuais, imprensa e humor”.

Anteriormente, havia estudado o teatro musical ligeiro das duas primeiras décadas

do século XX e nele identificado uma importante fonte para um diálogo interclasses e

interétnico no âmbito da cultura, fenômeno que contribuiu para a invenção de uma

identidade carioca e brasileira (LOPES 2000a). Daí, comecei a buscar no teatro

fluminense do século anterior sinais da absorção de elementos da cultura popular de

influência africana através, por exemplo, de personagens (o capadócio, a baiana), ritmos

(o batuque) e linguagens (oral, musical, corporal). Tais sinais mais adiante seriam

determinantes naquela busca identitária, mas na época causavam tensões insolúveis.

Como a cultura de um modo geral e o teatro em particular podiam lidar com a questão

do popular, do afrobrasileiro e do mestiço no Rio de Janeiro do século XIX, em plena

vigência do regime escravista?

O objetivo geral do trabalho é realizar uma releitura do teatro oitocentista no Rio

de Janeiro, através de uma perspectiva de história cultural, em que mais importante do

que a avaliação estética das produções é a compreensão dos processos de construção de

representações que viriam a acompanhar a intelectualidade brasileira por longo tempo,

em torno dos conceitos de moderno, nacional e popular. Em outras palavras, enquanto

historiador da cultura, me proponho menos a uma crítica estética e mais a uma crítica

ideológica. Isto não significa ignorar o aspecto estético, mas transformá-lo em um

elemento mais na análise da construção simbólica, seguindo às avessas o método de

crítica literária proposto por Antonio Candido (1967).

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Quanto aos marcos temporais, 1838 é o ano que a historiografia consensualmente

considera como de nascimento de um “teatro nacional”, com a estreia dos considerados

primeiros drama e comédia nacionais (respectivamente, Antônio José ou o poeta e a

Inquisição, de Gonçalves de Magalhães, e O juiz de paz na roça, de Martins Pena) pela

primeira companhia liderada por um ator brasileiro, João Caetano (Ver SOUSA 1960,

MAGALDI s/d, HESSEL 1979-1986, CACCIAGLIA 1986, AGUIAR 1994 e PRADO

1999). Já 1908 é a morte de Artur Azevedo, último grande dramaturgo vindo do século

XIX, parte das duas gerações intelectuais (românticos e realistas/naturalistas) que ao

longo do período perseguiram o sonho de construção de um teatro nacional com

qualidade literária.

Para atingir o objetivo geral do projeto, e com base na minha formação como

estudioso da performance, considero a atividade teatral de uma perspectiva ampliada,

em que à produção dramática e às performances artísticas, somam-se linguagens

parateatrais, através de festas, danças, ritmos, artes marciais e outros elementos da

cultura urbana fluminense, além da vivência que delas têm autores, atores e produtores

teatrais. Esse procedimento permite identificar sinais de uma história subterrânea (do

corpo, dos gestos, das linguagens), que não se torna imediatamente visível na cena

teatral do momento, mas que a vincula ao cotidiano da cidade e ajuda a entender

processos culturais de longa maturação que só se tornarão mais evidentes muito adiante.

A esse quadro geral, acrescento a análise mais específica dos textos dramáticos e suas

encenações (produção e recepção), assim como as discussões empreendidas no período

sobre a função do teatro.

Apenas mais uma palavra sobre a inserção de minha pesquisa no conjunto da

produção acadêmica, sobretudo diante das demandas que hoje são feitas pelas agências

financiadoras. Sendo a Casa de Rui Barbosa, onde trabalho, uma instituição de pesquisa

sem ensino regular, minha atividade não envolve diretamente a formação de mestres e

doutores. Por outro lado, a FCRB tem desenvolvido nos últimos anos um amplo

programa de bolsas de pesquisa, por mim coordenado, e o meu trabalho tem envolvido

sistematicamente bolsistas de iniciação científica, muitas vezes levando-os a definir

suas monografias a partir seja dos temas, seja das perspectivas teórico-metodológicas

nas quais recebem treinamento.

Na ausência de uma inserção no ensino formal, é no amplo diálogo com a

comunidade acadêmica que meu trabalho acaba por ter um impacto formador, diálogo

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exercido sobretudo através de três instâncias: 1) o Grupo de Pesquisa sobre História

Política, Social e Cultural do Brasil – Monarquia e Primeira República, liderado por

mim, tendo por cerne o grupo de historiadores da FCRB, e que mantém há anos uma

intensa atividade de promoção de reuniões científicas, exposições, publicações e cursos

de extensão; 2) o Grupo de Trabalho Nacional de História Cultural, de que faço parte do

Comitê Científico, e que promove a cada dois anos o Simpósio Nacional de História

Cultural, além de publicar regularmente; e 3) as reuniões nacionais e regionais da

Anpuh, em que nos últimos três anos tenho coordenado simpósios temáticos sobre

história das sensibilidades, envolvendo sempre um grande número de mestrandos e

doutorandos que têm a oportunidade de discutir a evolução de seus trabalhos.

Objetivo específico

Ao começar a desenvolver este projeto, alguns produtos já existiam, frutos de meu

trabalho anterior acima citado – especificamente, análises sobre os papeis de João

Caetano (LOPES 2000a) e de Artur Azevedo (LOPES 2000b) no desenvolvimento de

uma ideia de teatro nacional. A primeira figura que me chamou atenção foi o ator e

dramaturgo Francisco Correia Vasques (1839-1893), justamente porque levou para o

palco algo da cultura das ruas (linguajar, tipos, ritmos), num momento em que isso era

absolutamente incomum, em torno das décadas de 1860 e 70. Apesar de sua origem

popular e de ser mestiço, “o Vasques”, como era conhecido, refletia a dificuldade geral

de artistas e intelectuais da época de lidar com a questão da escravatura. Dois ensaios

deram conta dessa primeira etapa do projeto, um abordando a produção cômica do

Vasques (LOPES 2006a) e outro a dramática (2007b). Como sua veia cômica tinha forte

inspiração em Martins Pena (1815-1848), dediquei uma segunda etapa a este autor,

explorando mais fundo as representações sobre o popular e, em particular, sobre os

afrobrasileiros e a escravidão (LOPES 2007a).

Na terceira etapa, fase ainda em andamento, voltei-me para José Martiniano de

Alencar (1829-1877), em quem o Vasques pôde obter o modelo mais completo para

seus exercícios em “alta comédia” ou “drama”. Comecei por analisar a produção

dramática de Alencar, as encenações que suas peças receberam em vida do autor, o

impacto junto ao público e à crítica e o pano de fundo das questões ideológicas e

estéticas que se debatiam naquele momento – anos 1850, 60 e 70. Animava-me o fato

de que, à diferença de seus contemporâneos, o escritor cearense enfrentara

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corajosamente o problema da escravidão, que está no centro de duas de suas produções:

O demônio familiar, de 1857, e Mãe, de 1860. Surpreendi-me, no entanto, ao identificar

que muito mais do que com a chamada questão servil, Alencar estava preocupado com

as mudanças que afetavam a família patriarcal e, em particular, a situação da mulher. O

primeiro fruto dessa reflexão foi o trabalho que apresentei no IV Simpósio Nacional de

História Cultural, em Goiânia, em outubro de 2008 (LOPES 2008a). O texto completo

deverá integrar a coletânea a ser publicada pelo GT de História Cultural pela Hucitec.

Antes de prosseguir com Alencar, devo enfatizar o que já deve ter ficado claro:

meu trabalho de longo prazo sobre o século XIX está organizado em torno da figura do

Vasques, sobre quem tenho concentrado meus maiores esforços de pesquisa nos últimos

anos. Trata-se de um ponto de partida e de chegada de meus estudos sobre a cena

oitocentista. Vasques é chave para a compreensão dos processos em que estou

interessado, em virtude de sua posição liminar no teatro da época, entre os intelectuais

letrados e os artistas populares. Mestiço, de baixa instrução e extração social,

consagrou-se por seu talento histriônico como ator e autor de peças curtas conhecidas

como “cenas cômicas”. Mas produziu igualmente textos de maior fôlego, inclusive dois

“dramas” (tecnicamente, poderiam ser considerados comédias) que refletem as

contradições de sua inserção social e cultural, de sua “sensibilidade excêntrica”, como

chamei alhures (LOPES 2007b). Martins Pena e Alencar foram influências maiores na

sua produção. O último é particularmente importante na forma como Vasques

estruturou suas produções consideradas mais “sérias”, enquanto Pena é fundamental

para se entender as criações mais farsescas. Mas se meu interesse inicial era o de

aprofundar o estudo das construções ideológicas presentes na obra tanto de Pena quanto

de Alencar, para depois retornar a Vasques e entender o grau de sua reelaboração em

questões como as noções de moderno, nacional e popular, o fato é que ao me debruçar

sobre esses outros autores, muitas questões novas foram surgindo, que redirecionaram

tanto a pesquisa, quanto meu entendimento dos impasses e fantasmas da sociedade

fluminense oitocentista. O exemplo mais dramático – com o perdão do involuntário

trocadilho – é o da centralidade da questão feminina. Se minha perspectiva inicial se

concentrava especialmente nas relações interétnicas, nó górdio das questões identitárias

e das dicotomias tradicional-moderno e erudito-popular, a elas agora adicionei as

relações de gênero e as representações sobre o masculino e o feminino.

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Da mesma forma como fiz com Martins Pena no já mencionado ensaio (LOPES

2007a), a pesquisa sobre o significado e impacto cultural da obra dramatúrgica de

Alencar já resultou em análise que se justifica por si própria, independente de meus

outros estudos; mas ao me defrontar com a tríade de autores Pena-Alencar-Vasques,

senti a necessidade de já começar a integrá-los numa montagem panorâmica sobre a

importância do teatro do século XIX na construção das imagens, percepções e valores

com que a sociedade brasileira em geral, e a fluminense em particular, se representou e

viria a se representar ainda por um longo período, século XX adentro. Dois textos

recentes fazem parte do esforço atual da pesquisa. Comecei por pensar a importância do

teatro musical oitocentista em apresentação no seminário “Música e história no longo

século XIX: de Caldas Barbosa a Baiano”, que coorganizei com Monica Pimenta

Velloso (FCRB, História), Martha Abreu (UFF, História) e Martha Ulhôa (Unirio,

Música) em agosto de 2008, na Casa de Rui Barbosa (LOPES 2008b). Agora, o texto

completo sairá em livro publicado pela própria FCRB.

O segundo texto está ligado à etapa atual da pesquisa sobre Alencar, que está

voltada para a questão que me movia no princípio: a escravidão e as relações

interétnicas. Apesar do que afirmei sobre a preocupação primordial do autor com a

família, o fato é que ele fez representar nos palcos a presença dos cativos na vida

familiar de uma maneira ainda não vista pelas plateias fluminenses. E o impacto foi

enorme. A campanha abolicionista ainda não estava nas ruas, mas o significado

abolicionista ou não das peças de Alencar passou a ser motivo de polêmica – aliás se

estendendo até muito recentemente. Décio de Almeida Prado resumiu de forma feliz a

questão: “Alencar (…) gostaria que a escravidão, juntamente com a sua herança negra,

sumisse de repente da vida brasileira, num passe de mágica que o teatro – não a

realidade histórica – mostrava-se capaz de fazer” (PRADO 1999: 85).

Minha intenção é aprofundar a discussão sobre as autorrepresentações daquela

sociedade envolvendo seu calcanhar de Aquiles: o regime escravocrata e as relações

com um verdadeiro “outro” interno, as populações afro-brasileiras. Para tanto, mais uma

vez recorri à perspectiva panorâmica, comparando o tratamento dado à escravidão em

Pena, Vasques e Alencar. Com relação ao último, tenho feito uso não só das polêmicas

surgidas em torno das peças de Alencar e de suas encenações, mas também das posições

políticas e político-literárias assumidas pelo escritor, inclusive a famosa polêmica

mantida com Joaquim Nabuco muitos anos depois dos primeiros impactos de seu teatro.

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Um primeiro resultado dessa análise comparativa foi apresentado no seminário

internacional “O século XIX e as novas fronteiras da escravidão e da liberdade”,

realizado no Rio de Janeiro e em Vassouras, em agosto de 2009 (LOPES 2009a). Ainda

neste ano, apresentarei uma investigação específica sobre Alencar como pensador social

no GT sobre Pensamento social no Brasil, da Anpocs, em outubro, em que a relação do

autor e político com a escravidão é questão central.

Ao longo da primeira metade de 2010, a pesquisa sobre Alencar continuará sendo

o foco principal das minhas atenções, uma vez que estou explorando seu arquivo

privado, guardado na FCRB, que reúne material precioso. Trata-se de volume de

documentos relativamente pequeno (cerca de dez pastas), misturado com coisas de seu

filho, Mário de Alencar, além de conter vários papeis aparentemente pouco relevantes.

Por outro lado, contém uma quantidade razoável de esboços, fragmentos e escritos

nunca publicados, tanto de cunho literário como ensaístico, que constituem pequena joia

para o historiador interessado nas ideias e na sensibilidade de Alencar. Mas junto com o

foco específico no autor, prosseguirei o esforço de amarrar o estudo dos três

comediógrafos, com o objetivo de produzir uma história cultural do teatro fluminense

no século XIX.

Na etapa a ser começada no segundo semestre de 2010, pretendo desenvolver dois

temas. O primeiro prossegue no exame de autores, incluindo o nome óbvio que falta

para completar o quadro organizado em torno de Vasques: Artur Azevedo, dramaturgo

que ao chegar ao Rio já encontrou uma cena dominada pelos musicais ligeiros, em que

Vasques tinha papel de destaque tanto como ator quanto como autor. Azevedo

consagrou as revistas de ano, além de produzir burletas que ficaram como o que de

melhor o período produziu. Além disso, foi homem de teatro, envolvido com as

produções e com os atores, escrevendo, com frequência tendo em mente um ator

específico. O segundo tema é a assim chamada “vida teatral”, envolvendo a vivência

dos habitantes da cidade com as atividades e as práticas desenvolvidas a partir do

processo de produção e exibição de peças. Mais ligado a uma história do cotidiano

urbano, esse tema permitirá analisar melhor as conexões entre as instâncias estéticas,

comerciais, políticas e dos usos e costumes da cidade.

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Justificativa

Artur Azevedo vem sendo foco de maior atenção ao menos desde que, a partir do

início dos anos 1980, Antônio Martins começou seu notável esforço para publicar a

obra teatral do maranhense através do extinto Instituto Nacional do Teatro (AZEVEDO

1983-1995). Pouco tempo depois, veio a lume sua tese de doutorado, em que examina a

comicidade nas peças de Azevedo (MARTINS, A. 1988). Nessa mesma época, Flora

Süssekind (1986) publicou uma sofisticada análise sobre a relação visceral das revistas

de ano do autor com o surgimento de uma determinada ideia de Rio de Janeiro. De lá

para cá, outros aspectos da produção textual vêm sendo explorados, como seus contos e

crônicas. Meu interesse, sempre centrado no teatro, tem duas direções: por um lado o

diálogo mantido por suas peças com as questões que venho levantando nos demais

autores – os conceitos de moderno, nacional e popular; as relações de gênero e

interétnicas – e por outro seu papel como “homem de teatro”, sua teia de relações com

os profissionais da área, sua liderança e sua função de animador da cena fluminense.

A historiografia teatral no Brasil, aliás, desde sempre lidou tanto com os aspectos

estéticos quanto com os sociológicos da produção teatral. Apesar de ela

tradicionalmente concentrar-se no texto, não faltou sensibilidade aos grandes críticos

tanto para a importância e a autonomia da linguagem cênica e da performance artística

quanto para a inserção dessas e da produção dramatúrgica no movimento mais amplo da

sociedade. Mas uma atividade crítica regular e especializada demorou a se estabelecer

entre nós. A crítica e a historiografia teatral tornaram-se mais sistemáticas e

profissionais a partir da hegemonia intelectual e artística do Modernismo, na esteira do

qual se formaram os mencionados Décio de Almeida Prado e Sábato Magaldi. Ao

primeiro, devemos a análise mais completa da personalidade artística de João Caetano

(PRADO 1972, 1984). Ao segundo, a primeira ampla visão panorâmica da história de

nosso teatro dentro de uma perspectiva crítica moderna (MAGALDI s.d.). Ambos os

críticos ajudaram a consagrar a encenação de Vestido de noiva, de Nélson Rodrigues,

dirigida por Zbigniew Ziembinski, em 1943, como o marco inaugural do teatro moderno

brasileiro.

Quando Procópio Ferreira propôs-se a escrever, em 1938, uma biografia de

Vasques (FERREIRA, P. 1979), o que o moveu foi na verdade um esforço de

resistência contra a voga intelectual dominante, que considerava passadista o estilo de

atuar de Procópio e clamava por uma renovação da arte cênica, o nascimento de um

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teatro moderno. Na contramão daquele processo que dava seus primeiros passos, no

mesmo ano de 1938, com a criação do Teatro do Estudante por Pascoal Carlos Magno,

Procópio defendia uma tradição cômica brasileira, autenticamente popular e

significativamente encarnada num ator, o Vasques, de quem seria o mais legítimo

seguidor. Procópio perdeu a guerra em seu tempo, mas passados quase 70 anos a

“tradição cômica” volta a ganhar prestígio crítico e o Vasques retorna ao centro do

palco, ao menos na pesquisa acadêmica (SOUZA, S. 2002, LOPES 2006b, 2007a,

MARZANO 2008). Esse resgate vincula-se a esforços de releitura das dinâmicas entre o

que se convencionou chamar de cultura popular e erudita e entre tradição e

modernidade.

Fora da área do teatro, mas de fundamental importância para ela, Antonio

Candido (1959), a partir do seu seminal Formação da literatura brasileira – que

explicitamente excluiu a literatura dramática –, deu o tom da historiografia das

produções artísticas que combina as perspectivas social e estética. Em estudos

posteriores, como o brilhante ensaio “Dialética da malandragem” (CANDIDO 1970),

demonstrou a fertilidade de seu método, que não separa o universo simbólico do social,

nem reduz um ao outro, permitindo uma leitura sutil da construção de significados do

“nacional” e do “popular” na própria estrutura da obra (no caso, as Memórias de um

sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida).

Mas o pensamento modernista foi profundamente engajado no projeto de

construção do nacional (nesse sentido, aliás, dando continuidade à tradição intelectual

que vinha desde os românticos) e, portanto, incapaz de fazer a sua crítica ideológica. Na

verdade, os intelectuais que desenvolveram sua obra entre as décadas de 1930 e 60

lograram finalmente reunir os três mitos vindos do Oitocentos num projeto integrado de

sociedade – o moderno, o nacional e o popular – e neles acreditaram. Não possuíam os

instrumentos nem o distanciamento para deslindar a sua própria inserção na luta de

poder no campo simbólico pela hegemonia dos conceitos.

Moderno, nacional e popular são os três eixos em torno do qual se organizaram

todos os projetos de construção de uma ideia de nação brasileira e de sua cultura. Com

frequência, o moderno apareceu em oposição ao popular, enquanto o nacional oscilou

entre uma forma específica de pertencimento à cultura ocidental cristã e uma fidelidade

maior às raízes profundas do povo. Na visão dos modernistas, o Romantismo tivera o

nacional como eixo privilegiado, o moderno como derivação natural dos tempos e o

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popular como metáfora, pela impossibilidade de se lidar com ele numa sociedade

escravocrata. Para o Realismo/Naturalismo, o moderno, representado pela razão e pela

ciência era o foco, o nacional viria como consequência e o popular deveria ser resgatado

da sarjeta a que estava condenado, através da abolição da escravatura, da educação e da

elevação moral. Veio a abolição, mas não se fizeram as outras reformas necessárias à

sociedade, e a belle époque, com seu cosmopolitismo “vazio”, representou, na visão

modernista, um momento de estagnação cultural. O Rio de Janeiro de Pereira Passos

representou a imagem mais acabada desse momento: o moderno destituído de povo e de

nação.

Contra esse estado de coisas é que veio o furacão modernista, primeiro de forma

iconoclasta, com uma violência ultramoderna, o nacional ressignificado na antropofagia

e o popular namorado ainda à distância com um encantamento idealizante. Nos anos 30

e 40, deu-se finalmente o encontro do nacional-popular com o moderno. Getúlio Vargas

e Luís Carlos Prestes na política, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque e Caio Prado nas

ciências sociais, Graciliano Ramos e o primeiro Rosa na ficção, Drummond e depois

Cabral na poesia, Di Cavalcanti e Portinari nas artes plásticas, Villa-Lobos na música

erudita, Noel Rosa e Ari Barroso no campo da canção popular, com o samba já

absorvido pela classe média – tais eram os ícones do Brasil moderno. No teatro, o

mencionado encontro de Nélson Rodrigues com Ziembinski e a moderna companhia de

atores Os Comediantes consolidou o processo de modernização da cultura.

O paradigma marxista, que aos poucos tornou-se dominante ao longo dos anos 50

e 60, ofereceu uma possibilidade de compreensão das vinculações ideológicas dos

conceitos com interesses de grupos e classes. Era no entanto um paradigma que

privilegiava o econômico, tornando o ideológico praticamente uma derivação daquele.

Foi sobretudo a partir da década de 70, ganhando ímpeto nos anos 80 e 90, que se

iniciaram processos de desconstrução de discursos, inclusive historiográficos, em que

temas como o da identidade nacional deixaram de ser uma missão do intelectual e

passaram a ser vistos como um problema na interpretação e análise das sociedades que

os constituíram. Ver, a respeito, o trabalho pioneiro de Dante Moreira Leite (1969) e, na

década de 70, Carlos Guilherme Mota (1977) e Roberto Schwarz (1977); já nos anos

80, ver Renato Ortiz (1980, 1985.)

Para esse movimento foram fundamentais a revisão interna do marxismo, a partir

da Escola de Frankfurt, do desenvolvimento dos estudos gramscianos e do pensamento

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de Pierre Bourdieu; a crítica do pós-estruturalismo francês aos discursos totalizantes,

especialmente através de Michel Foucault e Jacques Derrida; a grande influência da

antropologia, com seu conceito ampliado de cultura e seu voltar-se em direção às

chamadas sociedades complexas; os novos rumos da história, que ampliou seus objetos,

suas fontes e seus métodos, através do que se consagrou como “nova história cultural”;

e, fora do âmbito acadêmico, mas com enorme impacto nele, os movimentos sociais que

chamaram atenção para outras identidades que não as nacionais e para outras questões

como a do meio ambiente. O estudo que se tornou clássico na discussão da questão da

identidade nacional, Imagined communities, de Benedict Anderson, data de 1983.

Na historiografia do teatro, essas novas preocupações ainda estão começando a

render frutos, mas já há algum tempo existem bons trabalhos sobre a presença do negro,

em particular os pioneiros estudos de Flora Süssekind (1982) e Miriam Garcia Mendes

(1982) – e mais recentemente Leda Martins (1995) e Orlando de Barros (2005). A

presença da mulher foi estudada por Elza Cunha de Vincenzo (1992) e Maria Cristina

de Souza (2001). Na área dos conceitos, Beti Rabetti lidera um grande trabalho em

andamento sobre o cômico (1997), preocupação inicialmente retomada por Vilma Arêas

(1987, 1990). A revalorização do político no teatro tem sido explorada por Rosangela

Patriota (1999, 2008). Promove-se a revisão de movimentos, como o teatro realista

(FARIA 1993, SOUZA, S. 2002) e, no escorregadio terreno do “popular”, resgatam-se

gêneros considerados menores, sobretudo o teatro de revista (SÜSSEKIND 1986, RUIZ

1988, PAIVA 1991, VENEZIANO 1991, 1996, MENCARELLI 1999, LOPES 2000a,

2000b, 2005, 2006b, 2008c, 2009b, GOMES 2004 e BARROS 2005).

A partir de meu interesse pela performance, incluo nesta lista também os muitos

novos estudos sobre manifestações parateatrais e performáticas, como o carnaval

(SOIHET 1998, CUNHA, M. 2001, 2002, GONÇALVES 2007, PEREIRA 2004 e

FERREIRA, F. 2005), as festas populares (REIS 1991, PRIORE 1994, ABREU 1999,

JANCSÓ 2001, SOUZA, MM 2002, SANTOS 2005), a capoeira (SOARES 2001), o

samba (VIANNA 1995, CUNHA, F. 2004), os ritos religiosos (LIGIÉRO 2004), além

de campos limítrofes, como os estudos de Monica Pimenta Velloso sobre a

intelectualidade boêmia (1996, 2000b), a cultura das ruas (2004), e mais recentemente o

maxixe (2007). Claro que toda essa bibliografia está longe de ser exaustiva e apenas

ilustra um amplo campo da cultura que tem atraído cada vez maior atenção dos

historiadores.

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Meu trabalho se insere nesse esforço de atualização da historiografia em geral e

da historiografia teatral em particular, em face das tendências mais contemporâneas das

ciências humanas e investe numa área que me parece bastante carente, a de uma crítica

das representações e imagens criadas pelo teatro e sua relação com os movimentos

sociais e culturais nos quais está inserido. Em especial me interessa desmontar o

quebra-cabeças das construções ideológicas que se realizaram em torno destes três

conceitos-mitos – o moderno, o nacional e o popular – tanto de forma consciente e

formalizada, enquanto projeto da intelectualidade, quanto como parte de processos mais

ou menos inconscientes ou difusos, em que memórias corporais e rítmicas, sonhos e

fantasmas presentes no imaginário social e vivências cotidianas se mesclaram com

demandas concretas de consumo e as necessidades de uma indústria do entretenimento

nos complexos processos da criação e fruição teatral.

Como assinalei mais atrás, meu ponto de partida para o projeto maior foi Vasques,

ator e autor popularíssimo à sua época, atuante nos principais palcos da cidade, com

“um pé na cozinha” e outro nos salões letrados, participante da vida política e

frequentador dos mais diversos ambientes de diversões públicas. Minha guinada para

Alencar, um dos mais prestigiados homens de letras do período, se deveu, por um lado,

à sua importância no estabelecimento de um modelo para a “alta comédia” na nascente

dramaturgia nacional, modelo que tanto na forma quanto nos conteúdos e valores

influenciaria Vasques em seu esforço de ascender de comediante a comediógrafo, um

enorme salto social e cultural. Mas por outro se justificou em si mesmo, pela

importância intelectual de Alencar, pelo seu impacto no meio cultural da época e pelas

construções imagéticas e ideológicas que legou à cultura brasileira. Em particular,

atraiu minha atenção a dimensão nesse autor da presença do negro em cena. Se Martins

Pena, muito mais interessado e simpático às classes populares, só representa o negro

muito marginal ou indiretamente, Alencar o faz com uma explicitude inédita até então.

Em O demônio familiar e em Mãe, personagens negros tornam-se centrais e a

escravidão é tematizada com uma abertura que valeu elogios e admoestações ao autor.

Artur Azevedo já representa uma etapa à frente. Tendo começado sua carreira de

comediógrafo ainda durante a vigência da escravidão, viveu intensamente o processo

abolicionista e ainda produziu ao longo de quase duas décadas, dentro de um quadro

cultural radicalmente novo, em que algumas das principais instituições que davam

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suporte ao imaginário da nacionalidade haviam sido eliminados. O “povo”, de então em

diante, não poderia deixar de incluir seu forte componente de origem africana.

Compreender o teatro de Azevedo e sua inserção nos debates de ideias e valores

da época me parece crucial para uma história cultural da virada do Império para a

República, momento em que se necessita, a nível institucional e simbólico, reinventar a

nação. É crucial também para uma história do teatro no Brasil, as formas que adquiriu, a

fortuna de longo prazo do gênero musicais ligeiros, tudo isso costurado à história das

representações que a sociedade fez sobre si mesma e seus diversos “outros”.

Azevedo conviveu e trabalhou intensamente com Vasques, que, ao longo daqueles

anos, estava reelaborando aquelas formas, representações, ideias e valores com sua

verve e com sua sensibilidade partida entre elite e povo, entre Europa e África. O

escritor maranhense, ao contrário do carioca, era um intelectual do establishment,

membro fundador da Academia Brasileira de Letras, tendo que justificar

constantemente junto a seus pares sua adesão a uma dramaturgia mais popular, com

“concessões” ao gosto da plateia. Mas se por vezes se defende com base no argumento

econômico, com mais frequencia defende suas opções pela própria perspectiva estética

e demonstra uma sensibilidade tão partida quanto a de seu colega, apenas em direção

contrária – vindo do “erudito” para o “popular”. Daí que sua inserção e atuação na vida

teatral e seu relacionamento com o que se costuma chamar hoje de “classe teatral”

poderão nos fornecer importantes elementos para a análise de como os cidadãos da

Corte/Capital Federal vivenciaram aqueles turbulentos momentos da virada do século.

Questões teórico-metodológicas

O estudo a que me proponho se filia ao que se convencionou chamar de “nova

história cultural” ou simplesmente história cultural. Como o termo acaba sendo usado

para uma variedade grande de trabalhos, com perspectivas bastante variadas, importa

ressaltar que me identifico com as definições e práticas de Roger Chartier, que destaca

tanto os objetos dessa história (linguagens, práticas e representações) quanto a

perspectiva do olhar, que parte de uma redefinição das relações entre as formas

simbólicas e o mundo social (CHARTIER 2006: 29).

Acompanho ainda a posição do historiador francês em sua polêmica com o crítico

literário norte-americano Hayden White, ao não aceitar o que no limite seria uma

equiparação da narrativa histórica à literária (WHITE 1994; CHARTIER 2004). Mas o

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fato é que White levantou questões importantes para a escritura da história. Entendo que

ao procurar estudar uma realidade passada, o historiador só pode se aproximar dela

através das representações (textuais, imagéticas ou de outra ordem) que ficaram daquele

momento e que, por sua vez, construirá novas representações através do discurso

histórico.

Assim, sem abrir mão de um esforço de objetividade, o historiador deve ter

consciência de seus limites subjetivos, do mundo da linguagem em que navega e do

exercício interpretativo a que estará fadado.A consequência é que as formas simbólicas

se tornam uma entrada importantíssima, senão inevitável, para quem se dedica a uma

história da cultura, invertendo-se o caminho tradicional que procurava explicar o

surgimento das formas simbólicas pela análise do mundo social. A história cultural

procura iluminar o mundo social e suas relações concretas através da forma como os

atores sociais o representaram.

Um segundo ponto destacado por Chartier diz respeito ao que chamou de novas

alianças da história, destacando a antropologia e a crítica literária (CHARTIER 2006:

29). De fato, é sobretudo a partir do conceito antropológico de cultura, como definido

por Clifford Geertz (1978) e do uso de categorias teatrais e do conceito de performance

por Victor Turner (1982) que vejo a possibilidade de estabelecer relações mutuamente

esclarecedoras entre os processos sociais e o mundo do teatro. Os historiadores estão

hoje sensíveis às questões do corpo e da expressão dramática na vida cotidiana. Nas

palavras de Sandra Pesavento, “a história se expressa e pode ser buscada na

gestualidade e teatralidade do corpo, na encenação dos gestos que se justapõem à fala e

ao som” (PESAVENTO 2003: 8). No meu caso, e com mais razão, tratando

propriamente do teatro, esse diálogo metodológico com a antropologia tornou-se ponto

fulcral de procedimento.

Os estudos de performance, área acadêmica nascida nos EUA e em que realizei

meu doutoramento, se caracterizam pela interdisciplinaridade, tendo se originado de um

diálogo entre a antropologia (TURNER 1982) e o teatro (SCHECHNER 1977, 1985),

desde logo ampliando seu escopo para abarcar as artes plásticas contemporâneas, a

dança, os ritos, os jogos, as diversões públicas e a teatralização do cotidiano. Ao longo

do tempo, foram incorporando perspectivas psicanalíticas, linguísticas, feministas, de

estudos culturais,do folclore e do cotidiano, de estudos de gênero e sexualidade e

preocupações multiculturalistas. Como diz o nome, o conceito central, que dá unidade

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ao campo, é o da performance, entendida como toda relação presencial em que um ou

mais performadores (performers) atuam para um determinado público na apresentação /

representação de certos conteúdos simbólicos. Essa definição, ao se referir à presença,

coloca desafios para uma história da performance, que analisei em outro texto (LOPES

1994) e que procurei resolver tomando boa dose de inspiração nas sugestões de Walter

Benjamin em suas “Teses sobre a filosofia da história” (1969).

Em meados dos anos 90, ao passar a dedicar-me a estudos históricos do teatro

dentro dessa perspectiva ampliada oferecida pelo conceito de performance, encontrei na

história cultural, então em pleno desenvolvimento no Brasil, o instrumental adequado,

em virtude das claras áreas de convergência. O ponto principal talvez seja o interesse

pelo simbólico, não como mera superestrutura da realidade socioeconômica, nem como

campo autônomo, mas como parte integrante do devir histórico, ao mesmo tempo

moldando e sendo moldado pelas relações concretas estabelecidas pelos indivíduos em

sociedade. Outro pontos são o interesse pelo cotidiano e pela vida urbana, a linguagem

corporal como produtora de significados, as relações entre arte e vida e a relação

complexa entre cultura popular e erudita, termos de difícil conceituação, mas ainda

inevitáveis. A tudo isso, juntei uma preocupação, que já me acompanhava desde a

dissertação de mestrado (LOPES 1979), com a análise de discurso e a crítica ideológica,

que aliás não são estranhas ao escopo da história cultural.

O método que utilizei no estudo sobre o teatro musical ligeiro carioca de 1900 a

1920 (LOPES 2000a) indica o caminho que agora venho trilhando em relação ao século

XIX. O ponto de partida é um foco fechado na análise de um fenômeno circunscrito (a

produção e a representação cênica das peças de Artur Azevedo), sua descrição cerrada e

análise por pontos de vista múltiplos – formal, psicológico, moral, social, político e

filosófico. Isso pressupõe a análise dos textos-base: a começar das próprias peças, as

críticas surgidas na imprensa e as respostas publicadas por Azevedo. Mas também se

enriquece com a história de vida, a performance profissional do literato e a cívica do

cidadão e político, e por fim o pano de fundo social e cultural da cidade do Rio de

Janeiro de então.

Como a questão da escravidão, do negro e da mestiçagem são centrais neste

estudo, ele se realiza em diálogo com a literatura, aliás vasta, que vem sendo produzida

nas duas últimas décadas sobre os temas. Para ficar apenas no doméstico, uma vez que

“Cultura afro-brasileira e identidade nacional” é uma linha de pesquisa do Setor de

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História da Casa de Rui Barbosa, meu trabalho mantém uma interface e se beneficia dos

desenvolvimentos dos de Ivana Stolze Lima (2003) e Eduardo Silva (2003, s/d). Não

posso deixar de mencionar estudos como os de João José Reis (1986, 1992), Mary

Karasch (2000), Hebe Mattos (2000) e Carlos Eugênio Líbano Soares (2001). No plano

teórico, minha discussão da mestiçagem se beneficia do trabalho de Serge Gruzinski

(2001).

Por lidar com o gênero cômico, também mantenho diálogo com a produção do

Setor sobre o humor, sua poderosa capacidade de comunicação e seu particular modo de

significação, em especial, através das obras de Isabel Lustosa (1989, 1993), Luiz

Guilherme Sodré Teixeira (2001, 2005) e Monica Pimenta Velloso (1996, 2000a). Na

área da comicidade, não posso deixar de referenciar também a produção de Beti Rabetti

(1997) e Elias Thomé Saliba (1998). As estratégias textuais e corporais utilizadas na

produção das peças para conquistar seu público, inclusive através do humor, constituem

elementos fundamentais para a leitura dos conteúdos explícitos e implícitos que

povoavam o imaginário daquela sociedade e os projetos de seus intelectuais.

Finalmente, em se tratando de personalidade com as múltiplas dimensões de um

Artur Azevedo, é igualmente necessário manter um diálogo com a também ampla

historiografia social e política do período – em especial do advento da República e das

mudanças que isso provocou –, dentro da qual pinço aqui alguns analistas emblemáticos

como José Murilo de Carvalho (1987, 1990) e Sidney Chalhoub (1986), além das

discussões que vêm sendo promovidas por Ângela de Castro Gomes e Martha Abreu

sobre o que chamaram de “a nova ‘Velha’ República”, em parte reunidas num dossiê

temático da revista Tempo (CASTRO GOMES, ABREU 2009).

Como mencionei ao começo, as pesquisas sobre Martins Pena, José de Alencar e

Artur Azevedo são objetivos específicos de etapas do meu projeto, articuladas à figura

de Francisco Correia Vasques, mas o objetivo mais amplo é o entendimento do papel do

teatro oitocentista do Rio de Janeiro na formação dos conceitos de moderno, nacional e

popular e na criação de imagens que ajudariam seus cidadãos a traduzir sua própria

experiência histórica de pertencimento a uma comunidade imaginada.

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