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FABIANA PARPINELLI GONÇALVES FERNANDES O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL DE SOCIALIZAÇÃO ORKUT Dissertação apresentada à Universidade de Franca como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Linguística. Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina Momesso. FRANCA 2009

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FABIANA PARPINELLI GONÇALVES FERNANDES

O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL DE SOCIALIZAÇÃO ORKUT

Dissertação apresentada à Universidade de Franca como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Linguística. Orientadora: Profa. Dra. Maria Regina Momesso.

FRANCA 2009

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FABIANA PARPINELLI GONÇALVES FERNANDES

O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL DE SOCIALIZAÇÃO ORKUT

COMISSÃO JULGADORA DO PROGRAMA DE MESTRADO

EM LINGUÍSTICA

Presidente: Profa. Dra. Maria Regina Momesso Universidade de Franca

Titular 1: Profa. Dra. Maria José Rodrigues Faria Coracini Universidade Estadual de Campinas

Titular 2: Profa. Dra. Marina Célia Mendonça Universidade de Franca

Franca, 21/08/2009

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DEDICO este trabalho aos pilares da minha vida... Antonio Carlos e Arlete, meus pais. Alex, meu marido. Diego e Pietro, meus filhos.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, sempre, em primeiro lugar, que tudo abençoou tornando em

realidade mais um sonho; ao meu marido, Alex, pela paciência, carinho e amparo nos momentos

mais difíceis; aos meus filhos, Diego e Pietro, que nos momentos de estudo

estiveram privados do carinho materno; aos meus pais, Antonio Carlos e Arlete, pelo incentivo aos estudos; ao meu irmão, Affonso Celso e minha cunhada, Cynthia, pelo carinho e

apoio à distância; à minha irmã, Vanessa e meu cunhado, Danilo, pelo carinho e apoio

presencial; à minha orientadora, Maria Regina Momesso, pelo incentivo para

ingressar no Mestrado, por suas valiosas contribuições e pela dedicação, paciência e confiança. Obrigada por compartilhar seus conhecimentos;

a UNIFRAN, pelos auxílios concedidos; aos professores que aceitaram participar da minha Banca de

Qualificação, Maria Silvia Olivi Louzada e Marina Célia Mendonça, pela contribuição no aprimoramento e aprendizado da primeira etapa deste trabalho;

aos professores Marina Célia Mendonça e Maria José Rodrigues Faria

Coracini que gentilmente aceitaram participar e colaborar com este trabalho fazendo parte da Banca de Defesa;

aos professores e coordenadora do Programa de Mestrado em

Linguística da Unifran, pelos ensinamentos e incentivo; a todos os amigos e familiares que de uma forma ou de outra me

estimularam e contribuíram para a realização desta dissertação de mestrado.

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Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa, e perceber diferentemente do que se vê, é indispensável para continuar a olhar ou a refletir. Michel Foucault.

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RESUMO

FERNANDES, Fabiana Parpinelli Gonçalves. O sujeito tradutor e intérprete na rede digital de socialização orkut. 2008. 155 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Franca, Franca. Objetivamos, com esta dissertação, analisar as práticas discursivas e identitárias de sujeitos tradutores e intérpretes em uma comunidade do orkut – uma rede digital de comunicação e socialização onde circulam discursos, ideologias, simulações, jogos de relações e interesses. O corpus de análise constituiu-se de uma comunidade digital do orkut intitulada Tradutores/Intérpretes BR formada por 8.820 membros, número que cresce a cada nova consulta, cuja finalidade é debater sobre a formação profissional e o mercado de trabalho de tradutores e intérpretes brasileiros que possuem a língua portuguesa (do Brasil) como uma de suas línguas de trabalho. A fundamentação teórica centrou-se na Análise de Discurso francesa a partir de suas fontes - Pêcheux e Foucault – principalmente nas leituras de Foucault (1987, 1992, 1998) sobre as práticas discursivas, práticas de subjetivação, sua concepção acerca do arquivo e técnicas de si; em Lévy (1996, 1999) e Lemos (2000, 2004) quanto ao ciberespaço; Hall (2002), Bauman (1998, 2001, 2007) e Baudrillard (1981, 1997, 2003) nas questões sobre identidade e contemporaneidade; Castells (1999) no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto das novas tecnologias e à identidade do tradutor; e em autores que contribuíram com as reflexões sobre pós-modernidade e contemporaneidade, novas tecnologias e seus efeitos de sentido. Os resultados apontam para a observação de que o orkut pode ser visto como um espaço em que o sujeito tradutor busca a sua identidade ou identidades profissionais e pessoais, tenta compreender quem ele é e quem são os outros sujeitos envolvidos. Dessa forma o orkut deixa de ser apenas uma rede de socialização para ser um importante espaço de prática discursiva e social com vistas à formação identitária do internauta tradutor. As práticas discursivas e identitárias analisadas apontam para um sujeito multifacetado, conflitante e descontínuo que procura estabelecer sua identidade profissional ressaltando flexibilidade, dinamicidade, competitividade, competência e o domínio não só da língua como também das novas tecnologias de informação, portanto falando de um lugar social moderno e virtual simulado pelo suporte que acolhe o discurso. Observamos que a subjetividade do tradutor e intérprete é construída por meio de discursos já institucionalizados pelo mercado globalizado. As práticas discursivas e identitárias dentro do espaço virtual expõem toda angústia de um sujeito desejante por estabelecer um lugar e um status de “profissional de tradução” reconhecido e valorizado pela sociedade. Portanto, o orkut passa a ser um instrumento de marketing, um lugar em que o sujeito tradutor/intérprete pode criar simulacros identitários e ganhar visibilidade dentro do mercado e junto à comunidade. Palavras-chave: Discurso; Identidade; Tradutor e Intérprete; Redes Digitais; Orkut.

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ABSTRACT FERNANDES, Fabiana Parpinelli Gonçalves. The translator and the interpreter in the digital social network: orkut. 2008. 155 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Franca, Franca. The aim of this work is to examine the discursive and identity practices of translators and interpreters in an orkut community, a digital social network where discourses, ideologies, simulation, relationships and interest games flow. The corpus of analysis consisted of a digital community on orkut called Tradutores/Intérpretes BR constituted by 8,820 members, a number that grows each new consultation, which purpose is to discuss the professional learning and the labor market of Brazilian translators and interpreters who have the Portuguese Language (from Brazil) as one of their working languages. The theoretical foundation focused on the French Analysis of Discourse from its sources - Pêcheux and Foucault - especially on readings of Foucault (1987, 1992, 1998) on the discursive practices, practices of subjectivity, archieve and techniques of self; in Lévy (1996, 1999) and Lemos (2000, 2004) on the cyberspace; Hall (2002), Bauman (1998, 2001, 2007) and Baudrillard (1981, 1997, 2003) about identity and contemporanity; Castells (1999) regarding the communication; Coracini (2006, 2007), regarding the impact of new technologies and the translator’s identity; and in authors who contributed to the discussions on post-modernity and contemporanity, new technologies and their effects of sense. The results point to the observation that the orkut can be seen as an area in which the translator looks for his/her professional and personal identity or identities, tries to understand who he/she is and who the other involved subjects are. Thus, orkut is no longer a digital social network to be an important area of discursive and social practice regarding to the identity formation to the translator. The discursive and identity practices analyzed point to a multifaceted, conflicting and non-continuous subject who tries to establish his/her professional identity emphasizing flexibility, dynamics, competitiveness, competence and mastery not only of language but also of new information technologies, so speaking of a modern and virtual social place simulated by the virtual hosts that support the discourse. We observed that the translator and interpreter’s subjectivity is constructed through discourses already institutionalized by the global market. The discursive and identity practices within the virtual place show the anxiety of a subject who desire to establish a place and a status of "translation professional" recognized and valued by the society. Therefore, the orkut becomes a marketing tool, a place where the translator and interpreter can create identities simulacrum and gain visibility within the market and in the community. Keywords: Discourse; Identity; Translator-Interpreter; Digital Networks; Orkut.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

1 DISCURSO E IDENTIDADE: perspectiva teórica .............................................15

1.1 ANÁLISE DO DISCURSO FRANCESA: quadro geral ........................................15

1.2 ARQUIVO, FORMAÇÃO DISCURSIVA E MEMÓRIA ........................................22

1.3 PRÁTICAS DISCURSIVAS E IDENTITÁRIAS .....................................................30

2 (IN)VISIBILIDADE DA TRADUÇÃO E DO TRADUTOR NO BRASIL: de Paulo Rónai ao orkut ...............................................................................................43 2.1 PANORAMA DA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO BRASILEIRA............................... 43

2.2 A INVISIBILIDADE DO TRADUTOR E INTÉRPRETE E SUA BUSCA

PELA VISIBILIDADE..................................................................................................52

2.3 A TRADUÇÃO, O TRADUTOR E A TECNOLOGIA.............................................61

3 CONTEMPORANEIDADE E NOVAS TECNOLOGIAS ......................................68

3.1 CIBERESPAÇO E CIBERCULTURA ...................................................................68

3.2 MODERNIDADE LÍQUIDA E SUJEITO LÍQUIDO-MODERNO............................76

3.3 IMPACTO IDENTITÁRIO DAS NOVAS TECNOLOGIAS DE

INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO.......................................................................... 80

4 ANÁLISE DO ARQUIVO DIGITAL.......................................................................87

4.1 DESCRIÇÃO DO OBJETO DISCURSIVO: A rede digital de socialização Orkut.87

4.2 AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E IDENTITÁRIAS DO TRADUTOR E

INTÉRPRE TE NA COMUNIDADE TRADUTORES/INTÉRPRETES BR..................99

4.3 EFEITOS DE SENTIDO......................................................................................120

CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................125

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REFERÊNCIAS .......................................................................................................127

GLOSSÁRIO DE TERMOS DA INFORMÁTICA E INTERNET...............................137

ANEXO A - Página de apresentação do orkut ........................................................144 ANEXO B - Página de perfil de usuário do orkut .....................................................145 ANEXO C - Página da comunidade Tradutores/Intérpretes BR ..............................146 ANEXO D - Resultado de pesquisa sobre “tradução” .............................................148 ANEXO E - Resultado de pesquisa sobre “tradutor” e “tradutores”.........................149 ANEXO F - Página de regras da comunidade Tradutores/Intérpretes BR ..............150 ANEXO G - Página de FAQ (Frequent Asked Questions) ......................................151 ANEXO H - Página de aviso de privacidade do orkut..............................................152 ANEXO I – CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) ................................... 153 ANEXO J – E-mail do SINTRA sobre número de tradutores filiados ......................154 ANEXO K – Dados demográficos do orkut ..............................................................155

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INTRODUÇÃO

Vivemos a chamada era da pós-modernidade que, nas palavras de

Lipovetsky (2004), são os “tempos hipermodernos”, ou segundo Bauman (2001), a

fase da “Modernidade Líquida”, ou ainda, para Giddens (2002), “modernidade alta ou

tardia”. Todas estas terminologias não são consensuais quanto ao término da

modernidade e o início deste “novo”1 período, entretanto, Coracini (2006, p.134)

afirma que, apesar dos diferentes olhares de cada uma das nomenclaturas acima,

“algo resta da modernidade, já que ela se acha, inclusive, presente na própria

nomenclatura, modificada por um prefixo [...] ou por um adjetivo [...]”.

Bauman (2001) afirma que estamos passando por um processo de

“liquefação” das estruturas e instituições sociais, ou seja, passando da fase “sólida”

para a fase “fluida”, a chamada Modernidade Líquida e que os fluidos são assim

chamados, pois não conseguem manter a forma por muito tempo, continuam

mudando sob influência das menores forças. Por compartilharmos desta mesma

visão, utilizaremos a nomenclatura Modernidade Líquida quando mencionarmos a

contemporaneidade onde o mundo é dominado pela tecnologia que afeta o modo de

ser, ver, sentir, viver e agir do ser humano.

Com o advento da Internet, novas práticas discursivas e de

articulações sociais ocorreram, entre elas, o e-mail, blogs, chats, youtube, orkut,

msn, webcams, podcast, videologs, fotologs e second life, promovendo um

compartilhamento social mediado pela tecnologia.

O orkut2, uma das principais redes digitais de socialização3 do século

XXI, tem por objetivo viabilizar as relações sociais envolvidas em ambiente virtual.

Na página de apresentação, o próprio site se autodenomina de várias formas:

1 Neste trabalho utilizaremos as palavras “novo” e “nova” entre aspas com o sentido de (re)significação, uma vez que para análise de discurso francesa nenhum discurso é novo, original, sempre há um já dito, um já lá, um repetível, determinando os deslocamentos promovidos pelo sujeito nas fronteiras de uma formação discursiva (interdiscurso). No entanto, esse já dito, esse já lá, nunca é repetido da mesma maneira, portanto, carrega em si (re)significações. 2 A palavra orkut será escrita em letra minúscula neste trabalho para se diferenciar do nome de seu criador Orkut Büyükkokten, escrito em letra maiúscula. No próprio site, a palavra orkut aparece em toda a plataforma (sistema operacional) em letra minúscula. 3 O conceito de socialização utilizado nesta pesquisa encontra-se em Bauman (1997, p.138). O autor afirma que “a socialização (pelo menos na sociedade moderna) visa a criar um ambiente de ação feito de escolhas passíveis de serem ‘desempenhadas discursivamente’, que se concentra no cálculo racional de ganhos e perdas”.

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comunidade online, rede social, rede de amigos, rede digital, rede de relacionamento

(veja Anexo A). Neste trabalho optamos pela utilização do termo “rede digital” para

definirmos o orkut, corpus de análise desta pesquisa4.

O orkut é composto por duas partes: as páginas pessoais dos usuários,

também chamadas de “perfis” (veja Anexo B) e as comunidades (veja Anexo C).

Neste espaço virtual repleto de perfis e comunidades, o indivíduo se

(re)constrói como sujeito ou sujeitos por meio de suas práticas discursivas, uma vez

que a virtualidade pode projetar sua subjetividade de forma real ou imaginária,

porém, o impacto identitário das novas tecnologias de socialização ainda são pouco

conhecidos.

O número de comunidades no orkut é imenso, bem como a diversidade

de assuntos abordados. Para esta pesquisa foi necessária uma busca para

sabermos quantas comunidades no orkut tinham como tema a “tradução”, área de

interesse da pesquisadora devido à sua formação acadêmica e atuação no mercado

de trabalho. Em uma primeira busca obteve-se um resultado de 892 comunidades5

(veja Anexo D). Em uma segunda busca com o assunto “tradutor” e posteriormente

“tradutores”, chegou-se, respectivamente, a 130 e 72 comunidades6 (veja Anexo E).

Dessa forma, para a análise dessa dissertação, foi necessário escolher uma entre

tantas comunidades disponíveis.

Tendo visitado e analisado diversas dessas comunidades, observamos

que seus objetivos também eram diversos, tais como: comunidades de tradução

juramentada, de textos religiosos, audiovisual (dublagem e legendagem), de

músicas, literária, científica, de RPG, de Mangás, dos livros do Harry Potter, de

ferramentas de auxílio ao tradutor, de estudos da tradução, de protestos a traduções

mal feitas, além de tradutores vinculados a instituições de ensino superior.

Com tantas opções de escolha optamos pela comunidade intitulada

Tradutores/Intérpretes BR7, por ser a maior e a mais antiga comunidade de tradução

encontrada no orkut, formada por 8.820 membros8 e, por tratar-se de uma

comunidade de tradutores e intérpretes brasileiros que trabalham com a língua

4 Disponível em: <http://www.orkut.com.br/About.aspx>. Acesso em: 20 abr. 2008. 5 Pesquisa realizada no campo de busca por comunidades no orkut em 15 de maio de 2007. 6 Ibid. 7 Disponível em <http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=50302>. Acesso em: 15 maio 2007. 8 No início da pesquisa (marco/2007) o número de membros da comunidade era de 6.017, número que cresce a cada nova consulta à comunidade. O resultado de 8.820 foi obtido em 14 de julho de 2009.

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portuguesa (do Brasil) como uma de suas línguas (fonte ou alvo), cuja finalidade é

debater sobre a formação profissional e o mercado de trabalho (veja Anexo C).

A pesquisadora, como usuária do orkut há cerca de 4 anos com perfil próprio

e membro de algumas comunidades, sejam elas de tradução ou de interesses

diversos, tem conhecimento sobre o manuseio deste espaço. Pôde perceber, ao

longo desses anos, as mudanças ocorridas no layout do site, na configuração do

usuário, na criação de novos recursos para a construção de perfis e comunidades

(adição de vídeos; uso de itálico, negrito e cores na formatação do texto; aumento

na capacidade de adição de fotos (10.000 atualmente); criação do aplicativo

“BuddyPoke”; disponibilização do serviço de bate-papo online; entre tantos outros),

bem como a recente preocupação do site com questões sobre privacidade por meio

de dicas de segurança e recursos de restrição de informações no perfil do usuário.

Esse trabalho, portanto, deve ser tomado como fruto do contato cotidiano com o

corpus de pesquisa.

Os dados coletados foram analisados na perspectiva metodológica do

trajeto temático, e, para isso, foi escolhido um tema que nos pareceu mais

significativo para a prática profissional destes sujeitos: a questão da formação

profissional, seja ela, acadêmica ou informal. Uma vez que a área de tradução e

interpretação não é regulamentada, isto é, não requer formação acadêmica para a

atuação profissional no mercado de trabalho; que universidades oferecem cursos de

tradução em diferentes níveis (graduação e pós-graduação), que existem cursos

livres para a capacitação destes profissionais; e que a comunidade se propõe a

discutir a formação profissional e o mercado de trabalho, imaginamos que debates

sobre este tema sejam recorrentes.

Diante deste quadro, justifica-se a escolha deste “arquivo” digital como

corpus de análise sobre as práticas discursivas e identitárias do tradutor e intérprete

em redes digitais de socialização. O conceito de arquivo encontra-se em A

Arqueologia do Saber de Michel Foucault, publicado em 1969, e será abordado no

tópico 1.2.

Na fase arqueológica de Foucault, o filósofo tenta construir uma

história dos saberes onde o centro de sua investigação é a relação entre o discurso,

a história, os sujeitos e a produção de sentidos (GREGOLIN, 2007a, p. 73). Na

arqueologia, Foucault não busca encontrar nos discursos a atividade consciente do

sujeito, ou seja, aquilo que ele teve intenção de falar. Pelo contrário, ele busca

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interrogar “as condições que propiciaram o aparecimento de um determinado

enunciado e não outro em seu lugar” (NAVARRO-BARBOSA, 2004, p. 111), o que

nos faz crer que os discursos encontrados na comunidade Tradutores/Intérpretes BR

inscrevem-se em um mesmo arquivo e no interior de uma mesma formação

discursiva, pois surgiram em função de “um jogo de relações” e de “regularidades

específicas” (FOUCAULT, 1987, p. 149), o que os tornam passíveis de investigação

nesta dissertação.

Um dos questionamentos que norteou a pesquisa foi o de verificar

quem é o sujeito tradutor/intérprete da contemporaneidade e como ele se constitui

nas redes digitais de socialização, neste caso, em uma comunidade do orkut.

Assim, o objetivo geral foi refletir sobre a noção de sujeito e sobre as práticas

discursivas e identitárias na contemporaneidade. Os objetivos específicos referem-

se a questões como: a) pensar a noção de sujeito a partir da perspectiva da análise

de discurso francesa; b) verificar que práticas discursivas e identitárias se fazem no

espaço virtual da comunidade analisada; c) identificar quais efeitos discursivos se

fazem acerca das subjetividades do profissional tradutor/intérprete na mídia digital,

proporcionando uma visão mais crítico-reflexiva da atual realidade da profissão de

tradutor e intérprete.

Buscamos compreender esse processo de subjetivação, não a partir de

grandes linhas de pesquisa sustentadas por embasamentos teóricos que foram ao

longo dos tempos construídos, quase sempre de forma distinta, mas sim a partir dos

“discursos” produzidos em suas práticas cotidianas, de forma a “acolher o discurso

em sua irrupção de acontecimentos” (FOUCAULT, 1987, p. 28). Logo, a

fundamentação teórica centra-se na Análise de Discurso francesa (AD) a partir de

suas fontes: Michel Pêcheux, seu fundador e Michel Foucault (1987, 1992, 1998)

sobre as práticas discursivas, práticas de subjetivação, sua concepção acerca do

arquivo e técnicas de si - são nos princípios de convergência entre ambos que esta

pesquisa está fundamentada; em Lévy (1996, 1999) e Lemos (2004), quanto a

cibercultura; Hall (2002), Bauman (2001, 2007) e Baudrillard (1981, 2003) nas

questões sobre identidade e contemporaneidade; Castells, no que tange à

comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto das novas

tecnologias e à identidade do tradutor; e em autores que contribuíram com as

reflexões sobre pós-modernidade, novas tecnologias e seus efeitos de sentido.

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Assim a pesquisa é de cunho qualitativo e de caráter histórico-

bibliográfico fundamentando-se em autores de comprovada autoridade e relevância,

estabelecendo-se a relação entre conceitos como novas tecnologias, ciberespaço,

cibercultura, subjetividade, discurso, tradução, entre outros.

A reflexão analítica estabelecida com os autores foi baseada na

perspectiva teórica da Análise do Discurso. Utilizamos o método dedutivo-

bibliográfico, ou seja, partindo da amostragem dos dados coletados, foram feitas as

análises e chegamos a possíveis conclusões a respeito de quem seja o tradutor e

intérprete internauta, usuário de uma comunidade digital de socialização, portanto,

pertencente à modernidade líquida.

A dissertação divide-se em cinco partes. Na primeira parte abordamos

os pressupostos teóricos da análise do discurso francesa, bem como os conceitos

relevantes para a análise do corpus escolhido, entre eles, arquivo, formação

discursiva, memória discursiva, práticas discursivas e identitárias, sujeito, discurso e

técnicas de si. Na segunda parte apresentamos um panorama da história da

tradução do Brasil e questões sobre a invisibilidade do tradutor e intérprete e sua

busca pela visibilidade. Na terceira parte abordamos questões a respeito do

ciberespaço, da cibercultura, da modernidade líquida, do sujeito líquido moderno,

bem como do impacto identitário das novas tecnologias de informação e

comunicação. Na quarta parte analisamos o arquivo digital por meio das práticas

discursivas e identitárias do tradutor e intérprete em uma comunidade digital e seus

efeitos de sentido. Por último, em nossas considerações finais, pretendemos mostrar

uma perspectiva de análise que pode ser explorada, aplicando-se os pressupostos

teóricos, ou mesmo, instigando outros pesquisadores a buscarem no espaço virtual

instrumentos de aplicabilidade das teorias discursivas e da constituição da

identidade do sujeito tradutor e intérprete na contemporaneidade.

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1 DISCURSO E IDENTIDADE: perspectiva teórica

Nenhuma voz individual se pode aí distinguir; só o conjunto se impõe ao ouvido.

Michel Foucault.

A primeira parte desta dissertação tem como objetivo central

apresentar o espaço teórico no qual nos colocamos para fazer nossas análises: a

Análise do Discurso de linha francesa.

1.1 ANÁLISE DO DISCURSO FRANCESA: quadro geral

O campo do saber que rege este estudo é o da Linguística, mas, por

existir no interior deste campo do conhecimento muitas linhas de pesquisas que se

sustentam em diversos embasamentos teóricos, torna-se necessário delimitar que

área da Ciência da Linguagem foi por nós escolhida. Nosso olhar não está voltado

apenas para os sons, as palavras, as frases, os textos ou linguagens, mas para tudo

isso, com o intento de chegarmos à observação específica do discurso.

Análise do Discurso, doravante AD, foi escolhida para nos guiar neste

trajeto, pois concebe o discurso como um novo objeto de análise, diferente do

enunciado e do texto, e que não pode ser pensado separado da história.

Nesta pesquisa, achamos relevante iniciarmos nossas reflexões

analisando o que o surgimento de uma ciência, que acreditava só ser possível

perceber os sentidos em suas “movências” (GREGOLIN, 2001), representou para os

estudos da linguagem.

A AD francesa surge no final dos anos 1960, em um período marcado

por intensas atividades políticas como o Movimento de Maio de 19689 na França,

9 Na Europa ‘libertada’ (França, Alemanha, Itália), a fúria juvenil contra um sistema que só se fazia fortalecer com a prosperidade econômica e que invadia a orgulhosa cultura local com produtos de qualidade duvidosa, vai desembocar em movimentos e manifestações diversas de rebelião nos meios

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pelo estruturalismo na Europa10, e pelas novas interrogações que surgiam no âmbito

das ciências humanas. A AD teve como marco inaugural o lançamento do livro de

Michel Pêcheux, Análise Automática do Discurso, de 1969, e a revista Langages, de

1966, organizada por Jean Dubois, e foi pautada por um debate filosófico que

buscava combater o excessivo formalismo linguístico da época.

Segundo Maldidier (1994, p. 16):

Nos anos que precederam 1968-70, J. Dubois e M. Pêcheux, independente um do outro, elaboraram o que vai se chamar Análise do Discurso. Ao tomarmos o viés de dupla narração, muito sucinta, é a diferença, antes de tudo que se destaca. Jean Dubois, linguista é um universitário. Seu trajeto é o de numerosos linguistas da época: estudos literários, gramaticais, depois passagem para a linguística. É já um grande nome da linguística francesa, um lexicólogo reconhecido. Ele participa de todos os empreendimentos que, na década de 1960, manifestam o espírito de conquista da linguística: da elaboração de dicionários à criação de revistas (assim é criada Languages, em março de 1966). Michel Pêcheux, por sua vez, é filósofo. Desde o meio do decênio ele se encontra envolvido nos debates teóricos que se desenvolvem na rua ULM, em torno do Marxismo, da psicanálise e da epistemologia.

O encontro entre um linguista (Dubois) e o filósofo (Pêcheux) permitiu

estabelecer as bases para as práticas da linguagem por meio da ruptura com toda

uma conjuntura política e epistemológica, e pela articulação com outras áreas das

ciências humanas: a linguística, o materialismo histórico e a psicanálise.

Em meio a este contexto histórico, a AD, em sua fase inicial, fixou sua

atenção para o estudo da formação ideológica manifestada em textos políticos.

Maldidier (1994) também menciona que houve uma dupla fundação

para a AD na França: de um lado Dubois via a AD como uma continuação natural da

estudantis e operários. Tais movimentos – reunidos no termo Maio/1968, mas que se estenderam por todo o primeiro semestre daquele ano – tinham como principal traço comum o fato de escaparem ao controle das forças organizadas nos sindicatos e partidos políticos e de criticarem as ideologias estabelecidas tanto de direita quanto de esquerda, atacando-se a todos os partidos políticos e grupelhos esquerdistas. Em Paris, o movimento de maio de 1968 vai se radicalizar no Movimento das Ocupações, que reunia estudantes e operários numa luta comum contra todo poder constituído – na família, na empresa, na universidade ou na política – e em favor de propostas mais radicais de mudança (BELLONI, 2003, p. 124). 10 No campo da linguística, o trabalho do francês Ferdinand de Saussure (Cours de Linguistique Général, 1916) publicado após sua morte, serviu por muito tempo como o modelo da corrente estruturalista de formação francesa. Baseava-se no estudo da estrutura da língua e do uso coletivo, comum a todos os falantes, desprezando o individual por considerar que a língua é homogênea e dinâmica, enquanto a fala é mutável. Assim, separou langue e parole, a fim de estudar apenas a língua (langue) como sistema.

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Linguística na qual o objeto de estudo eram os enunciados; do outro, Pêcheux

buscava uma ruptura com a noção da ideologia reinante – o estruturalismo – e

propunha a criação de um novo campo de investigação no qual o objeto de estudo

era o discurso e sua relação com a ideologia e o sujeito.

Ao recusar a concepção instrumental da linguagem, originada do Curso

de Linguística Geral de Ferdinand de Saussure, em 1970, Pêcheux provocou

grandes transformações na linguística: a compreensão do fenômeno da linguagem

passou a ser procurada fora da dicotomia saussureana (língua x fala; sincronia x

diacronia; sintagma x paradigma; significante x significado) e sua instância passou a

ser o discurso.

Portanto, para a AD, o discurso é a instância de articulação da língua-

sujeito-história, isto é, da relação do linguístico com o ideológico.

Vale ressaltar que Saussure descartou a presença do sujeito nos

estudos linguísticos, pois considerava o sujeito apenas usuário de um código. Ao

constituir a língua como objeto da linguística, ele excluiu o individual e o subjetivo

para o âmbito da fala. Para Saussure, o significado é fixo e a língua deve ser

estudada como código social, desconsiderando “marcas” individuais. Enquanto a

língua é o sistema social dos signos compartilhado por uma determinada cultura, a

fala é entendida como “ato individual e virtual que só se atualiza na e pela fala”

(ORLANDI, 1995, p. 32).

Para a construção dos pilares teóricos da AD, Pêcheux (1993) baseou-

se na releitura do filósofo francês Louis Althusser sobre Ideologia e aparelhos

ideológicos do Estado (uma releitura de Marx) e nas influências de autores de

disciplinas distintas como o filósofo francês Michel Foucault (sobre a noção de

formação discursiva, a partir da qual outros conceitos foram elaborados:

interdiscurso, memória discursiva, práticas discursivas, entre outros); o linguista

russo Mikhail Bakhtin (sobre o princípio dialógico da linguagem que serve de base

para a heterogeneidade discursiva) e o psicanalista francês Jacques Lacan

(conceitos psicanalíticos sobre o imaginário, o simbólico e o real). Desta forma,

Pêcheux (1993) constrói uma teoria de entremeio que tem como objetivo principal o

discurso.

A AD de Pêcheux é uma ciência transdisciplinar onde são articuladas

“três regiões do conhecimento científico”: o materialismo histórico, como teoria das

formações sociais e de suas transformações, compreendida aí a teoria das

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ideologias; a linguística, como teoria dos mecanismos sintáticos e dos processos de

enunciação ao mesmo tempo; e, a teoria do discurso, como teoria da determinação

histórica dos processos semânticos (PÊCHEUX; FUCHS, 1997, p. 163-164). E estas

três regiões do conhecimento são atravessadas por “uma teoria da subjetividade, de

natureza psicanalítica” (PÊCHEUX; FUCHS, 1997, p. 164).

A Análise do Discurso passou por três épocas diferentes, conhecidas

como: AD-1, AD-2 e AD-3 e, cada uma delas revela as influências advindas dos

pilares teóricos utilizados.

Para Gregolin (2007a, p. 60):

O que foi chamado de “três épocas da análise do discurso” por Pêcheux revela os embates, as reconstruções, as retificações operadas na constituição do campo teórico da análise do discurso francesa. O solo epistemológico precisou ser revolvido e as mudanças delineiam os debates teóricos e políticos que surgiram de crises que atingiram a reflexão sobre como se dá a articulação entre o discurso, a língua, o sujeito e a História.

Fernandes (2007, p. 85) afirma que as três épocas da AD “não se

definem precisamente por uma divisão cronológica” e que elas “refletem a

elaboração e reelaboração dos conceitos que constituem o aparato teórico e

metodológico deste campo do saber”.

Na primeira fase teórica, chamada de AD-1, Pêcheux (1993), ainda

influenciado pelo estruturalismo, preocupa-se em desenvolver uma metodologia

teórica propondo uma análise automática do discurso a fim de buscar uma

exterioridade do texto. Pêcheux, também, sofre as influências da obra de Althusser,

Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado, de 1970, em que o conceito de

ideologia (estrutura e funcionamento) foi de fundamental importância para suas

reflexões teóricas sobre a AD.

Na AD-1, Pêcheux (1993) considera os discursos como homogêneos,

fechados em si (noção de maquinaria discursiva) e resultantes de condições de

produção estáveis11. O sujeito era visto como assujeitado, atravessado pela

ideologia e pelo inconsciente, e tinha a ilusão de ser a fonte do discurso.

Para Pêcheux (1993, p. 311):

11 O discurso, na primeira fase da AD, era compreendido como discurso político (engajado nas lutas de classes, em embate com as idéias marxistas) ou discurso religioso, ambos fechados em si mesmos.

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Um processo de produção discursiva é concebido como uma máquina autodeterminada e fechada em si mesma. De tal modo que um sujeito-estrutura determina os sujeitos como produtores de seus discursos: os sujeitos acreditam que ‘utilizam’ seus discursos quando na verdade são seus ‘servos’ assujeitados, seus suportes.

Metodologicamente, a AD1 pressupunha:

[...] reunir um conjunto de traços discursivos empíricos [...] fazendo a hipótese de que a produção desses traços foi, efetivamente, dominada por uma, e apenas uma, máquina discursiva além de construir a partir desse conjunto de traços e através de procedimentos linguisticamente regulados, o espaço da distribuição combinatória das variações empíricas desses traços (PÊCHEUX, 1990b, p. 313).

Após ter sido criticado e questionado sobre o estatuto do sujeito e do

discurso, Pêcheux problematiza sua metodologia e é levado para uma segunda fase.

Esta segunda fase, denominada AD-2, teve início em 1975 com o

lançamento de Les Vérités de la Palice12, onde Pêcheux aprimorou conceitos e

introduziu noções fundamentais para a teoria: rompeu com a noção de maquinaria

estrutural fechada da fase anterior; elaborou a teoria dos dois esquecimentos13;

reafirmou sua vinculação às teorias althusserianas afirmando que os aparelhos

ideológicos não só produzem, como também alteram as condições de produção;

apresentou a noção de formação discursiva heterogênea, baseadas nas leituras de

Michel Foucault.

Segundo Pêcheux (1990b, p. 314), sobre a noção de formação

discursiva, advinda das leituras de Foucault:

[...] a noção de formação discursiva tomada de empréstimo a Michel Foucault, começa a fazer explodir a noção de máquina estrutural fechada na medida em que o dispositivo da FD está em relação paradoxal com seu ‘exterior’: uma FD não é um espaço estrutural fechado, pois é constitutivamente ‘invadida’ por elementos que vêm de outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhes suas evidências discursivas fundamentais (por exemplo, sob a forma de ‘preconstruídos’ e de ‘discursos transversos’).

Nesta fase, o sujeito discursivo ainda permanecia assujeitado. 12 Em português, publicado como Pêcheux, M. Semântica e Discurso: uma crítica á afirmação do óbvio. Campinas Editora da Unicamp, 1988. 13 Para Pêcheux, há dois tipos de esquecimentos: no esquecimento número 1, o sujeito cria uma realidade discursiva ilusória; colocando-se na origem da autoria do que diz, na fonte exclusiva do sentido de seu discurso, o sujeito tem a ilusão de que é ele o criador absoluto de seu discurso; no esquecimento número 2, ao retomar seu discurso para explicar a si o que diz, o sujeito tem a ilusão de que o discurso reflete o conhecimento objetivo que tem da realidade (PÊCHEUX, 1990b).

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Do ponto de vista metodológico, conforme afirmou Pêcheux (1993, p.

315), a AD2 permaneceu praticamente na prescrição da primeira época:

[...] o deslocamento é, sobretudo, sensível ao nível da construção dos corpora discursivos, que permitem trabalhar sistematicamente suas influências internas desiguais, ultrapassando o nível da justaposição contrastada.

Esta fase representou um período de amadurecimento da AD,

resultando nos embasamentos teóricos que levaram ao surgimento da AD-3 e sua

forma atual: o discurso como efeito de sentido entre locutores.

A AD-3, terceira fase, foi marcada por uma profunda avaliação de

Pêcheux sobre os fundamentos teóricos e metodológicos de seu trabalho: encerrou-

se a noção de homogeneidade e estabilidade discursiva e, também, a de maquinaria

discursiva estrutural. A posição do sujeito foi debatida passando a ser considerado

não mais como interpelado por uma ideologia, mas por várias ideologias. O sujeito

torna-se heterogêneo, ou seja, vários discursos manifestam-se na sua fala. A sintaxe

perdeu o estatuto de neutralidade. Surgiu grande interesse em torno da noção de

enunciação.

Esta fase foi marcada pela aproximação de Pêcheux com as propostas

de Bakhtin sobre heterogeneidade e interdiscurso e pela idéias de Foucault no que

diz respeito: a uma leitura “sem filtro” onde Pêcheux é levado a analise da

singularidade do acontecimento discursivo e não apenas de sua estrutura

(GREGOLIN, 2007a); ao método arqueológico de fazer a “leitura de arquivo”; à

noção de história como descontinuidade levando as investigações não somente a

textos legitimados, mas também a discursos cotidianos.

Para Fernandes (2007, p. 90), a reformulação dos vários conceitos na

terceira fase serviram para que a “Análise do Discurso tivesse continuidade após a

morte de Pêcheux, em 1983”.

Em todas as suas fases, a Análise do Discurso foi repensada e essas

reflexões sempre tinham como ponto nodal a articulação entre discurso, língua,

sujeito e história.

Pêcheux, conforme afirmou Maldidier (2003, p. 16) tentou, até o limite

do possível, re-pensar tudo o que o discurso, enquanto conceito ligado a um

dispositivo, designava para ele.

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No Brasil, a AD surge apenas em meados dos anos de 1980, quase

vinte anos após seu surgimento na França.

As condições para a implantação desta teoria não eram favoráveis no

Brasil devido ao período de ditadura militar (1964 a 1985), pois, “por trás das

palavras pronunciadas outras são ditas” (FERNANDES, 2007, p. 90).

Este atraso fez com que muitos trabalhos aqui produzidos fossem

sustentados em diferentes bases teóricas das diferentes fases da AD francesa e em

pressupostos iniciais que já haviam sido superados na França.

Gregolin (2003), ao afirmar que os trabalhos brasileiros têm

aproximações e distanciamentos em relação aos trabalhos produzidos pelo grupo de

Pêcheux, lembra que o Brasil tem outra história, e, portanto, outra AD.

Vale ressaltar que a produção brasileira é de imenso valor, conta com

uma diversidade de corpus de análise (verbal e não-verbal, discurso político,

religioso, jurídico, midiático, científico, tecnológico e cotidiano) e vem aprofundando

questões fundamentais sobre o discurso.

A denominação Análise do Discurso francesa ainda é utilizada para

demarcar uma legitimidade, um “lugar” teórico, na prática desta ciência que articula a

linguística com outras áreas da ciência humana.

É justamente essa proposta de articulação que torna a AD tão

interessante e que fez com que tenha sido escolhida como fundamentação teórica

para essa dissertação.

Privilegiamos, em nossas abordagens, a terceira fase da Análise do

Discurso por ela ser mais abrangente que as fases anteriores.

Portanto, os conceitos articulados e aplicados nesta pesquisa são

frutos da revisão teórico-metodológica efetuada por Pêcheux desenhando um novo

caminho para a Análise do Discurso Francesa.

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1.2 ARQUIVO, FORMAÇÃO DISCURSIVA E MEMÓRIA

Até o momento, já definimos que a linha de pesquisa desta dissertação

é a Análise do Discurso de linha francesa, oriunda dos trabalhos de Michel Pêcheux.

No entanto, outras delimitações serão necessárias, visto que a AD passou por três

fases diferentes e sofreu a influência de outros pilares teóricos.

Um dos teóricos que fornece campo apropriado para nossos estudos é

Michel Foucault. Este filósofo francês abriu um leque fascinante de inúmeras

investigações envolvendo questões sobre os saberes, o sujeito, o processo de

subjetividade, a loucura, o poder e a sexualidade. Diante desta multiplicidade de

olhares, é possível buscar interpretações para um grande número de investigações,

porém, esta mesma multiplicidade torna este autor impossível de ser caracterizado

como representante de uma única episteme.

Nossa escolha por este filósofo deve-se ao fato de o sujeito ter sido o

foco de suas investigações, mesmo que nem sempre de forma consciente em todos

os seus trabalhos, como veremos no tópico 1.3.

Sabemos que o caminho escolhido não é estável e apresenta inúmeras

reconstruções e concordamos com Marshall (1994, p. 24) ao afirmar que: faz parte

da estratégia foucaultiana desfamiliarizar e reconstruir nossas concepções e práticas

cotidianas.

As contribuições de Michel Foucault para a AD foram inúmeras,

principalmente na segunda e terceira fases, conforme analisado no tópico 1.1. No

decorrer destas duas fases, houve momentos em que as idéias de Pêcheux foram

contraditórias às idéias de Foucault e outros em que elas se aproximaram. Apesar

das divergências e convergências nos diálogos entre Pêcheux e Foucault, são nos

princípios de convergência entre ambos que esta pesquisa está fundamentada,

sendo o principal deles: considerar o sujeito como heterogêneo e constituído por

meio da e na linguagem, conforme Gregolin (2007a).

É importante esclarecer que Pêcheux e Foucault tiveram projetos

epistemológicos distintos. Enquanto Pêcheux buscou construir a Análise de

Discurso, mantendo uma forte relação com a Linguística, Foucault não teve como

objetivo imediato construir uma teoria do discurso - suas temáticas envolveram as

relações entre os saberes e os poderes na história ocidental e estiveram voltadas

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para a construção histórica das subjetividades, mantendo uma forte relação com a

História e a Filosofia.

Apesar de trilharem caminhos diferentes, durante o percurso, alguns

conceitos como o de formação discursiva, arquivo e noção de sujeito, cruzaram-se e

dialogaram. Outros, como a questão do assujeitamento e da ideologia, entraram em

choque.

Para Gregolin (2007a, p. 125) Foucault não é um adversário de

Pêcheux no que diz respeito a uma teoria do discurso. O que eles propõem não está

em oposição, mas em complementaridade, já que se trata, antes, de diferenças e

não de contraditoriedade. E, segundo esta mesma autora (2007a, p. 125), a

diferença fundamental no trabalho de ambos diz respeito “à maneira de se situarem

frente ás propostas althusserianas”, ou seja, as categorias clássicas do marxismo.

Entendemos que as abordagens discursivas de Pêcheux e Foucault

podem contribuir na problematização de nossos saberes e de nossos discursos,

reflexão a qual nos propomos na presente pesquisa.

Iniciamos nossas reflexões teóricas acerca dos pressupostos

foucaultianos sobre o método arqueológico, que, nesta dissertação, foi eleito para

investigar a rede discursiva que entrelaça as práticas discursivas e identitárias do

tradutor e intérprete em contexto digital, no caso, uma comunidade do orkut.

Em Arqueologia do Saber, publicado em 1969, Foucault explica teórica

e metodologicamente o método arqueológico que já havia sido mencionado em

obras anteriores como O nascimento da clínica: a arqueologia do saber médico, de

1963, e As palavras e as coisas: a arqueologia das ciências humanas, de 1966,

mas, cujo significado, segundo o próprio autor, “tinha deixado vazio” (FOUCAULT,

1969 apud GREGOLIN, 2007a, p. 91).

A arqueologia foi, até o final da década de 1970, o método que marcou

as pesquisas de Foucault e, posteriormente, o termo passou a ser chamado de

genealogia14, duas terminologias não só complementares, mas inseparáveis.

14 A atividade genealógica requer a busca da singularidade dos acontecimentos, sobretudo naquilo que não participa da história, como "[...] os sentimentos, o amor, a consciência, os instintos" (FOUCAULT, 2000 p. 260), fazendo emergir o entendimento sobre os espaços onde desempenharam papéis distintos e/ou foram excluídos do discurso verdadeiro.

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Devido à ambiguidade da palavra “arqueologia”, Foucault recusa dois

sentidos que podem ser associados a ela: “busca da origem” e “escavação de

significados secretos” (GREGOLIN, 2007a, p. 82).

O objeto de estudo do método arqueológico é o saber de uma época

buscando-se compreender as condições histórico-sociais que possibilitaram a

irrupção de acontecimentos discursivos no interior de um mesmo arquivo e o

aparecimento de determinados enunciados e não outros em seu lugar.

O acontecimento discursivo, segundo Gregolin (2007a, p. 83), apesar

de possuir uma irrupção brutal, “obedece a uma combinação de regras, que

constituem o arquivo, e que determinam as condições de possibilidades de sua

aparição”.

Em A Arqueologia do Saber, Foucault (1987, p. 148-149) explica o que

considera ser um arquivo:

[...] a lei do que pode ser dito, o sistema que rege o aparecimento dos enunciados como acontecimentos singulares. Mas o arquivo é, também, o que faz com que todas as coisas ditas não se acumulem indefinidamente em uma massa amorfa, não se inscrevam, tampouco, em uma linearidade sem ruptura e não desapareçam ao simples acaso de acidentes externos, mas que se agrupem em figuras distintas, se componham umas com as outras segundo relações múltiplas [...].

O conceito de arquivo de Foucault (1987) reformulou a maneira de

organizar o corpus a ser analisado, visto que, nos estudos da História, era

privilegiado em sua forma linear e cronológica e, na AD, é organizado a partir de

uma diversidade de textos, de um trajeto temático e de um acontecimento discursivo.

Opondo-se aos estudos da história tradicional, em que o pesquisador

busca encontrar relações de causalidade nos documentos do passado, Foucault,

pelo método arqueológico, propõe ao pesquisador transformar o documento em

monumento, descobrindo suas especificidades e a lei que os rege15.

Para tanto, Foucault (1987) propõe não uma análise que busque o

emparelhamento dos textos e suas regularidades, pelo contrário, ele deseja romper

15 Para Foucault, a história tradicional “se dispunha a ‘memorizar’ os monumentos do passado, transformá-los em documentos e fazer falarem estes rastros que, por si mesmos, raramente são verbais, ou que dizem em silêncio coisa diversa do que dizem” (FOUCAULT, 1987, p. 8). Com essa crítica, Foucault propõe o abandono da crítica documental, uma vez que, o monumento falaria por si mesmo.

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o fio da continuidade e buscar o descontínuo, as brechas, a especificidade que é

preservada em cada texto.

Mandarin (1979 apud SARGENTINI, 2004, p. 88) partindo de Foucault,

afirma que:

[...] o conjunto de enunciados constitui o arquivo de uma época. Este conjunto não é a coleção de um espaço homogêneo [...] mas um conjunto de regiões heterogêneas de enunciados produzidos por práticas discursivas irredutíveis.

O próprio Foucault (1987, p. 149) afirma que o arquivo não é o que

recolhe a poeira dos enunciados que novamente se tornaram inertes e que permite o

milagre eventual de sua ressurreição; é o que define o modo de atualidade do

enunciado-coisa; é o sistema de seu funcionamento. Também não é o que unifica

tudo o que foi dito no grande murmúrio confuso de um discurso, nem o que nos

assegura a existência no meio do discurso mantido, mas sim, o que diferencia os

discursos em sua existência múltipla e os especifica em sua duração própria.

Gregolin (2007a, p. 98) afirma que na obra Arqueologia do Saber,

Foucault une todos os conceitos por ele estudados: enunciado; formações

discursivas; conjunto de enunciados (discurso); práticas discursivas; a priori

histórico; positividade e arquivo. Do micro ao macro podemos dizer que Foucault

parte da concepção de enunciado para a de arquivo e, o discurso, conceito central

da investigação arqueológica, passa a ser situado entre a estrutura e o

acontecimento, pois, de um lado temos as regras da língua e de outro, aquilo que é

efetivamente dito.

Outros autores que também refletiram sobre o conceito de arquivo,

após 20 anos de estudos em Análise do Discurso, foram: Guilhaumou & Maldidier

(1994, p. 164):

Na perspectiva atual, consideramos a complexidade do fato arquivista. O arquivo nunca é dado a priori, e em uma primeira leitura, seu funcionamento é opaco. Todo arquivo, principalmente manuscrito, é identificado pela presença de uma data, de um nome próprio, de uma chancela institucional, ou ainda pelo lugar que ele ocupa em uma série. Essa identificação, puramente institucional, é para nós insuficiente: ela diz pouco do funcionamento do arquivo. Nossa prática atual de análise do discurso retoma as preocupações dos historiadores de mentalidades, que na construção de objetos como a morte, o medo, o amor, o profano e o sagrado, instalam pela confrontação de séries arquivistas, regimes múltiplos de produção, circulação e leitura de texto.

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Analisar discursos baseados nas concepções de Foucault sobre

arquivo implica buscar os enunciados não interrompendo a sua trajetória, pelo

contrário, implica em buscá-los em sua movências. Por movências entende-se, de

acordo com Gregolin (2004, p. 36), a movimentação dos enunciados [...] nos atos

praticados por sujeitos historicamente determinados.

E, para que os enunciados sejam analisados como pertencentes a um

mesmo discurso, Foucault (1971 apud GREGOLIN, 2007a, p. 107-108) propõe

quatro critérios de análise:

a) os enunciados devem estar relacionados a um mesmo domínio de objetos; b) os enunciados devem ser originados por uma mesma modalidade de enunciação [...]; c) um discurso será individualizado pelas escolhas e estratégias de argumentação que mobiliza; d) cada discurso define uma diferente função para o sujeito, isto é, define estatutos, posições que o sujeito pode ocupar.

Entretanto, Foucault não busca encontrar nos discursos a atividade

consciente do sujeito, ou seja, aquilo que ele teve intenção de falar. Pelo contrário, a

arqueologia busca interrogar “as condições que propiciaram o aparecimento de um

determinado enunciado e não outro em seu lugar” (NAVARRO-BARBOSA, 2004, p.

111).

Navarro-Barbosa (2004, p. 116), em seu trabalho, O acontecimento

discursivo e a construção da identidade na História, afirma que: a nossa sociedade

dispõe de um arquivo sobre o que é ser brasileiro, negro, escravo, índio, sobre a

nossa constituição como colônia e depois como nação, sobre nossa natureza. Por

meio deste arquivo, é possível observar o que a nossa sociedade pode dizer de si

mesma (2004, p.116).

Podemos afirmar que o mesmo ocorre com a comunidade do orkut

Tradutores/Intérpretes BR que, ao ser analisada à luz da AD e dos pressupostos

teóricos foucaultianos, apresenta-nos um arquivo digital sobre o que é ser um sujeito

tradutor e intérprete nos tempos da modernidade líquida.

Portanto, conforme afirmou Sargentini (2004, p. 91) o arquivo passa a

ser, então, um lugar para se pensar as práticas discursivas de uma sociedade.

Essas reflexões nos fazem crer que os discursos encontrados na

comunidade Tradutores/Intérpretes BR inscrevem-se em um mesmo arquivo e no

interior de uma mesma formação discursiva, pois surgiram em função de “um jogo

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de relações” e de “regularidades específicas” (FOUCAULT, 1987, p. 149), o que os

torna passíveis de investigação nesta dissertação. Dessa forma, o conceito de

formação discursiva elaborado por Foucault e revisitado por Pêcheux é de extrema

importância para nossas reflexões.

Quando Pêcheux traz para a AD, em sua segunda fase, a noção de

formação discursiva (FD), ele relaciona tal conceito à questão da luta ideológica de

classes e da ideologia (marxismo), ausentes na proposta de Foucault. Tratava-se,

segundo o próprio Pêcheux afirmou em seu artigo Remontons de Foucault a

Spinoza16 (1990c), de extrair da noção de Foucault o que ela tinha de materialista e

revolucionária, ou seja, a concepção foucaultiana de discurso como prática.

Foucault (1987, p. 43) define formação discursiva como:

[...] no caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puderem definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva.

Em 1971, Pêcheux (1990b, p. 314) traz para a AD a noção de

formação discursiva, doravante FD, de Foucault e a reinterpreta como:

[...] a noção de formação discursiva tomada de empréstimo a Michel Foucault, começa a fazer explodir a noção de máquina estrutural fechada na medida em que o dispositivo da FD está em relação paradoxal com seu ‘exterior’: uma FD não é um espaço estrutural fechado, pois é constitutivamente ‘invadida’ por elementos que vêm de outro lugar (isto é, de outras FD) que se repetem nela, fornecendo-lhes suas evidências discursivas fundamentais (por exemplo, sob a forma de ‘preconstruídos’ e de ‘discursos transversos’).

Para Pêcheux, a FD estava intimamente relacionada com a noção de

formação ideológica, devido ás suas leituras de Althusser (1998) sobre Ideologia e

Aparelhos Ideológicos do Estado, reiterando seu estreito laço com o marxismo.

Em 1975, Pêcheux publica Les Verites de La Palice17 (1988, p. 160)

retomando os conceitos, anteriormente formulados, de formação discursiva:

16 Título em português: Remontemos de Foucault a Spinoza. 17 Em português: Semântica e discurso: uma crítica a afirmação do óbvio. Campinas: Unicamp, 1988.

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Chamaremos, então, formação discursiva, aquilo que, numa formação ideológica dada, isto é, a partir de uma posição dada numa conjuntura dada, determinada pelo estado de luta de classes, determina o que pode e o que deve ser dito (articulando sob forma de um sermão, uma arenga, um panfleto, uma exposição, de um programa, etc.).

Pêcheux acrescenta ao conceito de formação discursiva a discussão

sobre a materialidade do discurso, ou seja, o sujeito é interpelado pela ideologia que

o constitui – o assujeitamento – e, ao enunciar, todo sujeito fala a partir de uma

formação discursiva.

Ao rever a trajetória da Análise do Discurso, Pêcheux, em sua terceira

fase, observa que uma FD é constitutivamente invadida por outras FDs rompendo

com a noção de homogeneidade do discurso, discursos estes, repletos de

contradições. Tanto para Pêcheux quanto para Foucault, a contradição é um

princípio constitutivo de toda FD. Entretanto, Foucault propõe analisar as diferentes

FDs a partir de suas possibilidades de emergência, diferente de Pêcheux, que atribui

à ideologia um papel importante para a análise dos discursos. Temos aqui uma

divergência fundamental entre os dois autores.

Com a noção de heterogeneidade discursiva, advindas das idéias de

Authier-Revuz sobre heterogeneidade constitutiva e marcada, Pêcheux não só

abandona o conceito de discurso homogêneo, como desestabiliza a unidade do

sujeito em direção ao “outro”.

Desta forma, no interior de uma mesma FD existem vária vozes, vários

discursos que se cruzam, e que, segundo Pêcheux (1988, p. 57), “é

constitutivamente frequentada por seu outro”.

Esse “outro”, da formação discursiva, nos leva a outra questão

profundamente relevante ao escopo da AD: a memória discursiva.

Segundo Paveau (2007), o conceito de memória discursiva, em seu

sentido próprio, foi cunhado em 1981 por J. J. Courtine em seus trabalhos de análise

do discurso político a partir de suas leituras de Foucault, especificamente,

Arqueologia do saber, de 1969.

No simpósio sobre memória do II Seminário de Estudos em Análise do

Discurso – II SEAD, realizado em Porto Alegre, no ano de 2005, Paveau (2005, p. 1)

afirma que:

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Como a maioria dos conceitos provenientes da Análise do discurso, elaborada em torno de M. Pêcheux entre 1968 e 1983, a noção de memória discursiva é desde então utilizada fora de sua ancoragem teórica e histórica, e, sobretudo, isolada das noções com as quais ela faz sentido, em particular o interdiscurso e o pré-construído. Esse conceito está de tal modo "en errance" (Maldidier, L'inquiétude du discours, 1990) que o nome de J.-J. Courtine, que foi quem introduziu essa noção em AD, está ausente do Dicionário de Análise do discurso, de D. Maingueneau e P. Charaudeau.

Para Courtine (1981, p. 52), “o que entendemos pelo termo ‘memória

discursiva’ é algo distinto de qualquer memorização psicológica do tipo daquela que

os psicolinguistas consideram para produzir a medida cronométrica”. Courtine (1981,

p. 53) define memória discursiva como a “existência histórica do enunciado no seio

de práticas discursivas determinadas pelos aparelhos ideológicos”. Em seus

estudos, Courtine transpôs a análise da memória discursiva para o nível do

enunciado, mostrando como a memória dos enunciados é importante a função

enunciativa e como seus sinais podem ser identificados materialmente na estrutura

linguística dos enunciados, bem como seu apagamento.

Ao estimular o diálogo entre Pêcheux e Foucault, Courtine inseriu “no

coração da noção de FD a problemática da memória cujo trabalho produz a

lembrança ou o esquecimento, a reiteração ou o silenciamento de enunciados”

(GREGOLIN, 2007b, p. 158).

A partir da terceira fase da AD, na qual o discurso passou a ser tido

como heterogêneo, o conceito de interdiscurso se torna central e, por diversas

vezes, é confundido com a memória discursiva. Para Eckert-Hoff (2008, p. 44) o

interdiscurso é definido como a memória discursiva e é a memória discursiva que

permite “atar o fio do discurso (intradiscurso) em sua exterioridade (interdiscurso)”.

O conceito de memória discutido por Pêcheux no artigo O papel da

memória (2007, p. 50) aparece associado não à idéia de uma “memória individual”,

mas sim no entrecruzamento da “memória mítica”, da “memória social” e da

“memória construída pelo historiador”.

Pêcheux (2007, p. 52) afirma que:

[...] a memória discursiva seria aquilo que, face a um texto que surge como acontecimento a ler, vem restabelecer os ‘implícitos’ (quer dizer, mais tecnicamente, os pré-construídos, elementos citados e relatados, discursos-transversos, etc.) de que sua leitura necessita: a condição do legível em relação ao próprio legível.

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Agustini (2007), ao analisar o conceito de memória discursiva proposto

por Pêcheux (2007) afirma que: podemos, portanto, compreender essa memória

discursiva como o efeito da presença do interdiscurso (eixo da verticalidade) no

acontecimento (eixo da horizontalidade) do dizer.

Nesse sentido, ao definirmos a memória discursiva como interdiscurso,

como um saber discursivo que possibilita que nossas palavras façam sentido,

estamos considerando que esse saber corresponde a palavras já ditas e esquecidas

que amarram o sujeito ao “esquecimento”, independente de sua vontade. Na

comunidade do orkut Tradutores/Intérpretes BR, por meio da memória discursiva, os

tradutores enunciam, em meio a um espaço repleto de outros enunciados, o que é

ser um sujeito tradutor em nossa sociedade. E estes discursos não partem de um

único, mas principalmente de dois lugares enunciativos (área acadêmica e mercado

de trabalho), muitas vezes em confronto, mostrando a angústia em definir quem é o

sujeito profissional tradutor/intérprete contemporâneo. Assim, ao analisarmos os

discursos destes profissionais, estamos pensando o enunciado (dito) em relação ao

arquivo. E todos estes já-ditos em algum lugar, em algum momento, têm efeito sobre

o que está posto no material discursivo da comunidade analisada.

Por meio deste confronto entre posições enunciativas, buscamos

entender, definir, especificar e até mesmo construir um quadro sobre a(s)

identidade(s) do tradutor e intérprete pertencente à modernidade líquida.

1.3 PRÁTICAS DISCURSIVAS E IDENTITÁRIAS

Faremos agora uma rápida reflexão sobre a questão do sujeito desde

os estudos da Linguística Moderna até a Análise do Discurso, no que diz respeito à

ausência e/ou presença do sujeito e suas relações com a linguagem e a história.

Também mostraremos algumas divergências nos pressupostos teóricos de Pêcheux

e Foucault no que envolve as questões do sujeito. Além disso, veremos a

constituição do sujeito a partir de sua relação consigo mesmo por meio das técnicas

de si de Michel Foucault. A concepção instrumental da linguagem, advinda do Curso de

Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure, publicado em 1916, três anos após a

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sua morte, provocou profundas transformações na ciência linguística, pois propôs

um deslocamento conceitual separando a prática da teoria da linguagem. A língua

deixou de ser estudada como um meio de expressão de sentido passando a ser

vista como um sistema cujo funcionamento deveria ser descrito. Ao separar a língua

da fala, Saussure excluiu o sujeito e as questões relativas ao sentido da linguagem

de seus estudos.

Foi com o trabalho do linguista francês Émile Benveniste sobre a teoria

da enunciação que o sujeito, excluído dos estudos de Saussure, começa a

conquistar seu espaço no cenário da lingüística francesa.

A concepção de sujeito homogêneo, onipotente, centrado, fonte do seu

dizer, proposto por Benveniste, vai ser contestada pela AD que tem como objeto de

estudo o discurso, pois, segundo Indursky (1998, p. 112-13), o sujeito da linguística

não passa de um lugar na estrutura da frase.

Devemos entender que a Análise do Discurso não compreende o

sujeito como indivíduos que possuem uma “existência particular no mundo” nem

mesmo que seja um “ser humano individualizado”, “uma pessoa”, mas sim um

“sujeito discursivo que tem existência em um espaço social e ideológico, em um

dado momento da história e não em outro” (FERNANDES, 2007, p. 33).

O sujeito da AD não é homogêneo, mas sim heterogêneo18, constituído

por diferentes vozes sociais19, pois seu discurso é entrecruzado por diferentes

discursos que se negam e se contradizem. Sua voz revela seu lugar social e para

compreendermos o sujeito discursivo é necessário “compreendermos quais são as

vozes sociais que se fazem presentes em sua voz” (FERNANDES, 2007, p. 35).

Segundo Coracini (2001) foi com Authier-Revuz, baseando-se em

Bakhtin e no sujeito psicanalítico de Lacan, que emergiu a noção de

heterogeneidade nos estudos discursivos não mais como diversidade entre os

indivíduos, nem como vozes complementares no diálogo comunicativo, nem mesmo

18 A noção de heterogeneidade discursiva encontra-se em Jacqueline Authier-Revuz subdividida em heterogeneidade constitutiva e mostrada. A autora compreende o sujeito como descentrado onde “um ‘eu’ implica outros ‘eus’ e o outro se apresenta como uma condição constitutiva do discurso do sujeito” (FERNANDES, 2007, p. 44). 19 As diferentes vozes sociais nos remetem à noção de polifonia , desenvolvida por Mikhail Bakhtin onde “vozes, oriundas de diferentes espaços sociais e diferentes discursos, constitutivas do sujeito discursivo” (FERNANDES, 2007, p. 45).

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como vozes que habitam signos linguísticos, mas ao contrário, como constitutiva

deste e de todo dizer.

É importante ressaltar que Pêcheux construiu a noção de sujeito da AD

apoiando-se na noção althusseriana sobre o atravessamento da ideologia e na

noção lacaniana sobre o inconsciente como constitutivo. A noção de ideologia, para

Althusser (1998, p. 93), está intrinsecamente relacionada à de sujeito, pois, “a

ideologia interpela os indivíduos enquanto sujeitos”. Para ele, a ideologia age de

modo a recrutar sujeitos dentre os indivíduos ou a transformar indivíduos em

sujeitos.

Foi somente mais tarde, nas segunda e terceira fases, que Pêcheux

reconheceu as contribuições teórico-metodológicas foucaultianas para a AD.

A perspectiva psicanalítica sobre o inconsciente traz para a AD um

sujeito descentrado que tem a ilusão de ser o centro de seu dizer e que exerce

controle sobre o sentido do que fala, mas, que “desconhece que a exterioridade está

no interior do sujeito, em seu discurso está o ‘outro’, compreendido como

exterioridade social” (FERNANDES, 2007, p. 41).

Ao elaborar a teoria dos dois esquecimentos, Pêcheux reafirma sua

vinculação às teorias de Althusser afirmando o caráter desigual do assujeitamento e

acentuando que os aparelhos ideológicos não só produzem como alteram as

condições de produção.

Para Pêcheux (1990b), o sujeito caracteriza-se por dois

esquecimentos: no esquecimento n.1, o sujeito tem a ilusão de que é o criador

absoluto do seu discurso, a origem do sentido, apagando tudo que remeta ao

exterior de sua formação discursiva; no esquecimento n. 2, o sujeito tem a ilusão de

controlar tudo o que ele diz, de ser a origem de seu dizer. Na terceira fase da AD,

Pêcheux revê o conceito de sujeito passando a considerá-lo não mais como

interpelado por uma ideologia, mas por várias ideologias.

A AD então é marcada por um sujeito que deixa de ser o centro e a

origem de seu dizer passando a funcionar como efeito produzido pela ideologia no

discurso. O ideológico e o inconsciente, em Pêcheux, não podem ser pensados

como elementos residuais da linguagem, pelo contrário, são elementos constitutivos

de todo e qualquer discurso e, consequentemente, de todo sujeito. Da mesma

forma, o sujeito também é considerado elemento constitutivo da linguagem.

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Iniciaremos as reflexões sobre o sujeito em Foucault, mostrando a

trajetória de seus estudos cujo principal foco de investigações foi o sujeito, mesmo

que nem sempre tenha sido de forma consciente.

A quantidade e diversidade de textos escritos por Foucault não permite

uma sistematização fácil da sua obra. Muitos estudiosos optam pela periodização

dos textos foucaultianos por meio de um tema em comum. Desta forma, de modo

geral temos: na década de 1960, textos arqueológicos cujo tema é o saber20; nos

anos 1970, textos genealógicos, preocupados com o poder21; e, nos anos 1980,

textos arqueogenealógicos, tematizando a questão da ética e do sujeito22.

Outra forma de sistematização das obras de Foucault é analisar as

entrevistas de Foucault ocorridas no fim dos anos 1970 e início dos 1980, com o

intuito de resumir o seu projeto intelectual.

Uma preocupação frequente de Foucault era buscar o ponto central de

sua teoria. Ao ser entrevistado por S. Hasumi, em 13 de outubro de 1977, em Paris,

o filósofo francês admitiu acreditar que sua principal preocupação até o momento

havia sido “uma espécie de análise dos saberes e dos conhecimentos, tais como

existem em uma sociedade como a nossa” (FOUCAULT, 2003, p. 224). Entretanto,

ele concluiu que, na verdade, sua principal preocupação sempre fora “o poder ou a

interface entre poder e saber, entre verdade e poder” (FOUCAULT, 2003, p. 229).

Foucault (2003, p. 227) sintetizou a essência de seu trabalho como:

[...] é toda essa ligação do saber e do poder, mas tomando como ponto central os mecanismos de poder, é isso, no fundo, o que constitui o essencial do que eu quis fazer.

O filósofo também afirma que a preocupação com o poder não era só

dele, mas, “o problema de todo mundo” e menciona seu interesse sobre as questões

do sujeito: “solo, não ouso dizer sólido, pois por definição ele é minado, perigoso, o

solo sobre o qual eu me desloco” (FOUCAULT, 2003, p. 225-230).

20 Principais obras: História da loucura, de 1961; O nascimento da clínica, de 1963; As palavras e as coisas, de 1966; A Arqueologia do saber, de 1969 e A ordem do discurso, de 1970. 21 Principais obras: Vigiar e punir, de 1975 e Microfísica do poder, de 1979. 22 Principais obras: História da sexualidade 1 – a vontade de saber, de 1982; História da sexualidade 2 – o uso dos prazeres, de 1984; e História da sexualidade 3 – o cuidado de si, de 1984.

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Um ano mais tarde, em 1978, Foucault (2003, p. 306) esclarece em

entrevista a J. Bauer que, desde História da Loucura, publicado em 1961, o objetivo

de seu trabalho tinha sido contestar aspectos da sociedade, mostrando “suas

fraquezas e seus limites”. Não apenas a preocupação com a relação entre saber e

poder estava presente em seus trabalhos, mas, também a preocupação com o que

afeta o sujeito. Foucault (1995, p. 231-232) inicia o artigo O Sujeito e o Poder,

publicado por Rabinow e Dreyfus em 1983, resumindo o alvo de todo o seu trabalho

no decorrer de vinte anos: o sujeito. As idéias que eu gostaria de discutir aqui não representam nem uma teoria nem uma metodologia. Eu gostaria de dizer, antes de mais nada, qual foi o objetivo do meu trabalho nos últimos vinte anos. Não foi analisar o fenômeno do poder nem elaborar os fundamentos de tal análise. Meu objetivo, ao contrário, foi criar uma história dos diferentes modos pelos quais, em nossa cultura, os seres humanos tornaram-se sujeitos. [...] Assim, não é o poder, mas o sujeito, que constitui o tema geral de minha pesquisa. É verdade que me envolvi bastante com a questão do poder [...]. Era necessário estender as dimensões de uma definição de poder se quiséssemos usá-la ao estudar a objetivação do sujeito. Será preciso uma teoria do poder? Uma vez que uma teoria assume uma objetivação prévia, ela não pode ser afirmada como uma base para um trabalho analítico. Porém, este trabalho analítico não pode proceder sem uma conceituação dos problemas tratados, conceituação esta que implica um pensamento crítico – uma verificação constante.

Mesmo que nem sempre de forma consciente, a problematização do

sujeito sempre foi o principal alvo das teorias de Michel Foucault, seja como “objeto

de saber”, “objeto de poder” e “objeto de construção identitária” (GREGOLIN, 2007a,

p. 64). E este é um dos motivos que justifica a escolha desse filósofo, juntamente

com os pressupostos teóricos de Michel Pêcheux, como um dos principais

sustentáculo desta pesquisa, que tem por objetivo investigar as práticas discursivas

e identitárias do tradutor e intérprete em uma comunidade do orkut.

O pensamento de Foucault acerca do sujeito foi, desde o início, uma

crítica pela forma como o sujeito é compreendido pela filosofia, ou seja, um sujeito a-

histórico, autoconstruído e livre. Para Foucault (2001, p. 7), “o sujeito é constituído

na trama histórica”. Neste sentido, Foucault buscou “pensar o sujeito como um

objeto historicamente construído sobre as bases de determinações que lhe são

exteriores” (REVEL, 2005, p. 84).

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Foucault postulava que o sujeito, além de se constituir na trama

histórica (conforme mencionado anteriormente), ele se constitui por meio das

práticas discursivas e na articulação entre saber e poder23.

O processo pelo qual o sujeito se constitui em sujeito é chamado por

Foucault de subjetivação, ou seja:

[...] um processo pelo qual se obtém a constituição de um sujeito, ou mais exatamente, de uma subjetividade. Os “modos de subjetivação” ou “processo de subjetivação” do ser humano correspondem, na realidade, a dois tipos de análise: de um lado, os modos de objetivação que transformam os seres humanos em sujeitos – o que significa que existe somente sujeitos objetivados e que os modos de subjetivação são, nesse sentido, práticas de objetivação; de outro lado, a maneira pela qual a relação consigo, por meio de um certo número de técnicas, permite constituir-se como sujeito de sua própria existência (REVEL, 2005, p. 82).

Gregolin (2007a, p. 61-62) divide a obra foucaultiana em “três épocas”

a partir de “três modos de produção histórica das subjetividades”:

1. Em um primeiro momento ele pesquisou os diferentes modos de

investigação que produzem a objetivação do sujeito voltando seu olhar para a

história da loucura e a investigação dos saberes da cultura ocidental buscando o

método arqueológico.

2. Em um segundo momento ele propõe uma análise das articulações

entre os saberes e os poderes por meio da genealogia do poder.

3. Por fim, ele investigou a subjetivação a partir das técnicas de si

direcionando suas pesquisas para as questões da sexualidade, ética e estética.

Desta forma, temos, resumidamente, segundo Oliveira & Louzada

(2008, p. 208) três modos de subjetivação que transformam os seres humanos em

sujeito: “os modos de investigação, as práticas classificatórias e os modos de

transformação, que nos são aplicados pelos outros e por nós mesmos”.

Para compreendermos o sujeito tradutor/intérprete do orkut,

pertencente à Modernidade Líquida, adotamos de Pêcheux a noção de sujeito

heterogêneo, disperso, interpelado por várias ideologias e marcado pela

impossibilidade de controle dos efeitos de sentido de seu dizer. Unimos ao conceito

de Pêcheux, o conceito de Foucault acerca do sujeito, que o concebe como

23 Pêcheux não fala em relações de poder, mas na questão dos lugares sociais e ideológicos ocupados pelo sujeito. Temos aqui outra divergência entre os dois autores.

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historicamente construído, produzido no entrecruzamento do discurso, da sociedade

e da história, um sujeito que não é dado a priori, mas que está em constante

construção em suas práticas discursivas, sociais e em relação ao outro.

Uma vez que o sujeito foucaultiano é constituído em suas práticas

discursivas, o conceito de discurso é de extrema importância para a análise aqui

proposta.

Ao instaurar o discurso como objeto de investigação da Análise do

Discurso, Pêcheux promoveu mudanças importantes no modo de se pensar a língua

e a linguagem questionando o estruturalismo linguístico e o corte epistemológico

saussureano que excluía o sujeito e a significação.

A noção elementar que se tem de discurso como sinônimo de

mensagem, informação, palavras combinadas em frases, não corresponde ao

interesse fundamental da AD. Fernandes (2007, p. 18), explica o que não vem a ser

discurso: “não é a língua, nem texto, nem a fala, mas que necessita de elementos

linguísticos para ter uma existência material” implicando em uma “exterioridade à

língua” e complementa que “o discurso não é a língua(gem) em si, mas precisa dela

para ter existência material e/ou real”.

Numa visão pecheutiana, o discurso é tido como um “efeito de sentido

entre interlocutores” e nele se inter-relacionam língua e história, onde participam

elementos externos, buscando no contexto em que é construído o discurso, os seus

possíveis sentidos.

Portanto, a AD não pode ser confundida com uma simples análise de

texto, uma vez que esta se detém nas relações internas analisando apenas o

aspecto linguístico do discurso. Para a AD a situação histórico-social na qual o

discurso é organizado é de extrema relevância na extração dos “efeitos de sentido”,

provocados pelo sujeito discursante e nos sujeitos ouvintes ou leitores do discurso.

O discurso aparece no pensamento de Foucault devido à sua

preocupação em conhecer o que torna este ou aquele discurso possível e não outro

em seu lugar. Sua preocupação com o discurso não o relaciona enquanto expressão

de uma idéia ou de uma linguagem, mas enquanto condições de possibilidade ou

condições da “formação discursiva”.

Em Arqueologia do Saber, Foucault (1987, p. 135) explica o conceito

de discurso:

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Chamaremos de discurso um conjunto de enunciados, na medida em que se apóiem na mesma formação discursiva; ele não forma uma unidade retórica ou formal, indefinidamente repetível e cujo aparecimento ou utilização poderíamos assinalar (e explicar, se for o caso) na história; é constituído de um número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência.

Em geral, podemos entender o discurso, na perspectiva foucaultiana,

como um conjunto de enunciados que obedecem a regras de funcionamento

comuns.

Não se pode compreender o conceito foucaultiano de discurso

desvinculando-o de uma prática, pois esta lhe é inerente. A conceituação de

discurso como prática social, apresentada em A Arqueologia do Saber, de 1969, em

Vigiar e punir, de 1975, e em A Ordem do discurso, de 1971, enfatiza a idéia de que

o discurso sempre é produzido em razão de relações de poder. Na verdade, em

Foucault tudo é prática e tudo está imerso em relações de poder e saber, que se

implicam mutuamente.

Como mencionado anteriormente, analisar discursos apoiando-se nos

escritos de Michel Foucault requer aceitar o desafio de tentar flagrar os enunciados

não interrompendo a sua trajetória, mas sim, persegui-los em suas diversas

movências colhidos onde funcionou como prática enunciativa, desafio o qual nos

propomos no quarto capítulo desta dissertação.

Como mencionado anteriormente, a trajetória das investigações de

Foucault pode ser dividida em três modos de produção histórica das subjetividades.

É para o terceiro momento, das questões do sujeito como “objeto de construção

identitária” (GREGOLIN, 2007a, p. 64), dos “modos de transformação” (OLIVEIRA;

LOUZADA, 2008, p. 208), dos procedimentos de subjetivação, ou seja, das técnicas

de si, que encerraremos nossas investigações.

Foucault, ao se debruçar sobre as questões da ética, procurou saber

como se dá a constituição do sujeito a partir de sua relação consigo mesmo. Para

tanto, recorreu a textos de pensadores como Sócrates, Platão, Marco Aurélio,

Sêneca e abarcou a problemática em torno da ética e do cuidado de si em três

volumes da obra História da Sexualidade (publicados respectivamente nos anos de

1982, 1984 e 1984), tema este bastante difundido nas culturas gregas e romanas.

Assim, Foucault buscou respostas para o nascimento de uma moral a partir de

reflexões sobre a sexualidade, desejo e prazer.

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Ao recorrer aos estudos da antiguidade clássica até o início dos

séculos I e II de nossa era, definida por Foucault (2004a, p. 79) como “uma

verdadeira idade de ouro na história do cuidado de si”, o filósofo francês traz para a

modernidade os modos de subjetivação pelos quais nos reconhecemos enquanto

sujeitos. A partir dos gregos antigos, Foucault desenvolve uma comparação com a

moral judaico-cristã levando ao surgimento da observação da vida como obra de

arte.

Enquanto na Grécia e em Roma a subjetividade era produzida a partir

de preocupações com o uso dos prazeres, na modernidade, os modos de

subjetivação passam a ser produzidos por meio de saberes institucionais que

fabricam indivíduos para o funcionamento da máquina estatal. Desta forma, a cultura

do cuidado de si deu lugar à cultura da subjetivação.

Em A Hermenêutica do Sujeito, Foucault (2004a, p. 15) explica o

cuidado de si como:

[...] uma maneira de ser, uma atitude, formas de reflexão, práticas que constituem uma espécie de fenômeno extremamente importante, não somente na história das representações, nem somente na história das noções ou das teorias, mas na própria história da subjetividade ou, se quisermos, na história das práticas da subjetividade.

Foi por meio da máxima délfica24 “gnothi seautou” (conhece-te a ti

mesmo) e do ascético25 “epimeleia heautou” (cuida de ti mesmo) que Foucault

descreveu as técnicas antigas que se estabeleciam entre mestre e discípulo, e

também aquelas em que cada indivíduo se relaciona consigo mesmo.

A máxima “gnothi seautou” (conhece-te a ti mesmo) constituía-se de

regras e recomendações rituais de quem vinha em busca de Deus: examina em ti

mesmo o que precisa saber - não sendo apenas uma significação filosófica. Mas,

com Sócrates - em Alcebíades, de Platão - emerge o cuidado de si em seu sentido

filosófico: antes de dirigir-se à cidade, o jovem Alcebíades deveria ocupar-se consigo

mesmo, pois, o cuidado de si era importante para que o poder pelo qual se está

destinado seja exercido.

24 Delfos é uma cidade grega que na antiguidade era o local dos Jogos Píticos e de um famoso oráculo (o oráculo de Delfos), que ficava dentro de um templo dedicado ao deus Apolo. Delfos era conhecida entre os gregos como o centro do universo. 25 A ascese consiste na prática da renúncia do prazer ou mesmo a não satisfação de algumas necessidades primárias, com o objetivo de atingir determinados fins espirituais.

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A noção de “epimeleia heautou” (cuida de ti mesmo) envolve três

aspectos principais: uma atitude de respeito a si mesmo, aos outros e ao mundo;

uma maneira de prestar atenção ao que se pensa; e ao que sucede ao pensamento.

Na cultura greco-romana, o cuidado de si tornou-se um princípio

incondicionado, um objetivo de vida, uma regra aplicada e praticada por todos. O

sujeito constituía-se mais de suas ações retas do que de conhecimentos

verdadeiros.

Porém, houve um distanciamento da noção de “epimeleia heautou”

(cuida de ti mesmo) dos gregos e romanos ao ser incorporada às práticas cristãs.

Enquanto para os gregos e romanos o sujeito buscava sua subjetivação mediante

uma prática ou exercício sobre si, no cristianismo, o sujeito renuncia a si mesmo,

pela confissão, por meio de uma objetivação de si em um discurso verdadeiro.

Os discursos sobre a verdade na antiguidade clássica eram realizados

entre o discípulo e o mestre. Cabia ao discípulo o silêncio, a escuta, a escrita e

leitura e, ao mestre, a parrhesia, uma forma de transmissão do discurso verdadeiro

ao discípulo a fim de torná-lo um sujeito de veridicção. Já nas práticas cristãs, o

discurso verdadeiro é realizado por meio da confissão, em que o sujeito fala de si

mesmo tornando-se o objeto desse discurso.

Foucault mostra que o cuidado de si como exercício filosófico, desde a

Antiguidade greco-romana até o cristianismo, período sobre o qual concentra suas

investigações, é um dos fios condutores possíveis para uma história ou genealogia

das práticas de subjetividade.

Ao analisar o cuidado de si, Foucault buscou investigar dois problemas:

O primeiro consiste em compreender, em particular, como o nascimento de um certo número de técnicas ascéticas a partir do conceito clássico de cuidado de si foi, posteriormente, atribuído ao cristianismo. “Nenhuma habilidade técnica ou profissional pode ser adquirida sem exercício; nem pode se aprender a arte de viver, a technê tou biou, sem uma ascese que deve ser tomada como um treinamento de si por si” [...].O segundo problema concerne, na verdade, à história desses aphrodisia como campo de investigação específico da relação com o si: trata-se de buscar apreender como os indivíduos foram levados a exercer sobre si mesmos e sobre os outros “uma hermenêutica do desejo na qual seu comportamento sexual esteve, sem dúvida, envolvido, mas não certamente como domínio exclusivo”, e de analisar os diferentes jogos de verdade utilizados no movimento de constituição do si como sujeito do desejo (REVEL, 2005, p. 33-34).

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Segundo Foucault, (1992, p. 132), a escrita de si era, para os filósofos

gregos, uma das atividades que contribuíam para o “auto-adestramento”, uma

prática essencial no aprendizado da arte de viver. A escrita de si, que é também uma

escrita para os outros, é uma das técnicas de si26 da epimeleia heautou que consiste

em duas formas: a correspondência e os hypomnemata.

Foucault analisa a correspondência praticada na Grécia como uma

forma de escrita de si. Ao examinar as cartas de Sêneca a seu discípulo Lucílio,

Foucault (1992, p. 150) afirma que elas forneciam a impressão de proximidade física

entre os correspondentes dando a sensação de “um contato face a face”.

Sêneca, em suas cartas, põe em prática a máxima: devemos pautar a

nossa vida como se toda a gente a olhasse. Para Foucault (FOUCAULT, 1992, p.

151), “a reciprocidade que a correspondência estabelece não se restringe ao

simples conselho ou ajuda; é ela a do olhar e do exame”. Foucault (1992, p. 155)

considera que “a carta é também uma maneira de se apresentar ao correspondente

no decorrer da vida cotidiana, em que se atesta não a relevância de uma atividade,

mas a qualidade de um modo de ser”.

Já os hypomnemata, segundo Foucault (1992, p. 134-135), “podiam

ser livros de contabilidade, registros notariais, cadernos pessoais que serviam de

agenda”. Constituíam uma memória material das coisas pensadas, lidas ou ouvidas.

Não eram vistos como simples auxiliares da memória, mas como material para ser

lido, relido, meditado, para entreter-se a sós ou com outros e que, portanto, deviam

ser trazidos à mão.

Segundo o próprio Foucault (1992, p. 137-138):

Há que re-situar os hypomnemata no contexto de uma tensão muito sensível naquela época: no interior de uma cultura muito fortemente marcada pela tradicionalidade, pelo valor reconhecido ao já dito, pela recorrência do discurso, pela prática “citacional” com a chancela da Antiguidade e da autoridade, desenvolvia-se uma ética muito explicitamente orientada pelo cuidado de si para objetivos definidos como: [...] tirar proveito e desfrutar de si próprio.

A utilização dos hypomnemata compreendia duas fases: a escrita e a

leitura. Quanto à fase escritural, pode-se dizer que a elaboração de um

26 Segundo Gregolin (2007a, p. 64), técnicas de si são “os procedimentos de subjetivação que constituem, para o sujeito, a idéia da identidade”.

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hypomnemata contribuía para reforçar a relação do indivíduo consigo mesmo. Já a

fase de leitura proporcionava instantes de reflexão e tranquilidade.

A escrita de si, apesar de estar presente na história da humanidade, foi

se transformando ao longo dos tempos, refletindo, assim, as mudanças sociais,

tecnológicas e subjetivas ocorridas.

Podemos observar, na contemporaneidade, a necessidade do homem

de estabelecer uma identidade para si próprio, de estabelecer-se como indivíduo,

ou, segundo as palavras de Bauman (2006, p. 30-31), de “ser o verdadeiro eu”:

Hoje em dia, ‘individualidade’ significa em primeiro lugar a autonomia da pessoa, a qual, por sua vez, é percebida simultaneamente como direito e dever. Antes de qualquer outra coisa, a afirmação ‘Eu sou um indivíduo’ significa que sou responsável por meus méritos e meus fracassos.

Ainda segundo Bauman (2006, p. 28) existem vários “auxílios” que nos

guiam na busca do “verdadeiro eu”, da nossa individualidade. Podemos dizer que as

novas tecnologias propiciaram o surgimento de novas “técnicas de si”, a fim de

buscar uma identidade, a constituição do sujeito.

E é seguindo essa perspectiva das técnicas de si, em especial da

escrita de si, que examinamos as práticas de subjetivação dos tradutores e

intérpretes em uma comunidade no orkut.

As técnicas de si aparecem onde existem identidades em formação, e

a Internet é um meio propício para seu aparecimento. Por meio delas, é possível

identificar as relações de poder bem como o pertencimento do indivíduo a um

determinado grupo.

Ao contrário da escrita de si dos greco-romanos e dos cristãos, no

orkut não existe a figura do mestre ou do sacerdote, porém, a escrita destina-se ao

olhar do outro, que pode exercer a função de mestre, de sacerdote e de juiz.

Vemos a escrita de si como uma forma de reflexão, de mostrar-se, de

transformar-se, de estabelecer relações de saber e de poder. É uma escrita que se

completa com a leitura de outros sujeitos e com a sua reescrita, produzindo efeitos

de sentido em quem as escreve e as lê, levando ao surgimento não de um dito novo,

mas de um dito (re)significado.

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Podemos observar uma retomada da escrita de si entre os usuários da

Internet, seja nos blogs, fotoblogs e orkut. Por isso, consideramos que essas “novas”

práticas de “narrativas do eu” podem oferecer subsídios importantes sobre as fortes

transformações que hoje atravessam a produção de subjetividades, pois, ao falar

sobre si, o indivíduo constrói a si próprio, construindo a própria identidade na ação

de dizer-se.

Segundo Oliveira, em seu artigo sobre a constituição do sujeito virtual

dos blogs e orkut, (2005, p. 91):

As práticas sociais discursivas e ideológicas envolvem a escrita e a leitura digital, a navegação e a interação, e todo esse processo lembra o princípio grego “conhece-te a ti mesmo”, constituindo-se por sua vez em ‘jogos de verdade’ e relações de força, que são colocados como técnicas específicas que o homem utiliza para se compreender melhor.

A autora (2005, p. 91) também afirma que os discursos produzidos em

ambiente virtual são marcados pela subjetividade e trazem conteúdos nem sempre

discutidos em diálogos face a face propiciando “descobertas de si”, ou seja, funções

das “técnicas de si” foucaultianas.

Nesse sentido, entendemos que a comunidade Tradutores/Intérpretes

BR, por meio dos depoimentos postados no fórum de discussão e nos polls

(enquetes), pode funcionar com uma técnica de si, um hypomnemata moderno, em

que o sujeito, por meio de práticas discursivas, busca sua identidade e se constitui

enquanto sujeito tradutor/intérprete moderno, capaz de atuar no mercado de

trabalho.

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2 (IN)VISIBILIDADE DA TRADUÇÃO E DO TRADUTOR NO BRASIL: de Paulo Rònai ao orkut

O substantivo tradução raramente vem desacompanhado de um complemento, o verbo traduzir nunca é intransitivo e - mais importante - geralmente tem sujeito oculto. Ivone Castilho Benedetti.

O objetivo deste capítulo é apresentar as raízes da invisibilidade da

tradução e do tradutor no Brasil e a busca pela visibilidade profissional seja no

resgate de sua história seja em sua práxis tradutória na contemporaneidade.

2.1 PANORAMA DA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO BRASILEIRA

Ao contrário da história da tradução ocidental, principalmente européia,

extensamente abordada em seu surgimento, desenvolvimento e práticas em

diversos períodos (da idade antiga, com a invenção da escrita até a

contemporaneidade com os estudos de tradução) e por diversos autores tais como

Jean Deslile & Judith Woodsworth, com a obra Translators through history, lançada

em 1995; Douglas Robinson, com Western translation theory: from Herodotus to

Nietzsche, de 1997; Routledge encyclopedia of translation studies, organizada por

Mona Baker, em 1998, a história da tradução no Brasil apresenta escassa

bibliografia e documentação sobre o assunto, o que reforça, segundo Wyler (2003a,

p. 25), “a invisibilidade da tradução e do tradutor no país”.

Nos mais variados aspectos, a tradução no Brasil tem sido

descontínua, seja em seu surgimento (tradução oral com a chegada dos

portugueses em 1500 e tradução escrita com a chegada dos Jesuítas em 1549 e,

posteriormente, com a chegada da corte real e a fundação da Imprensa Régia em

1808), seja na condição social do tradutor, nas políticas editorias, nas teorias e

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estudos sobre tradução, até mesmo nas publicações sobre o assunto (WYLER,

2003ª, p. 29-30).

Iniciamos nossas reflexões sobre o panorama da história da tradução27

no Brasil a partir de um levantamento dos trabalhos de tradução aqui publicados

(livros, artigos, revistas, teses e monografias), que apenas recentemente começaram

a surgir, mas cuja importância (da atividade de tradução) existe há mais de 500

anos: da mediação entre colonizadores portugueses e indígenas até o fato de

sermos um país onde “80% dos livros de prosa, poesia e referência, bem como

manuais e catálogos, são traduzidos” (WYLER, 2003a, p. 13).

O primeiro livro sobre tradução publicado no Brasil foi Escola de

Tradutores, escrito por Paulo Rónai, em 1952, um tradutor/revisor húngaro que se

refugiou no Brasil fugindo da segunda guerra mundial. O livro é composto por artigos

de diversos assuntos (tradução literária, tradução técnica, estudo comparado de

traduções de um mesmo texto, tradução e versão de poesias, crítica a livros sobre o

assunto) produzidos, segundo o próprio autor, “em circunstâncias pouco favoráveis à

unidade de composição” (intervalos de aula e em meio a trabalhos escritos diversos)

que, em nota de advertência ao leitor na 5ª edição, as quatro edições anteriores,

esgotadas, justificam-se “pela ausência de trabalhos em português sobre um

assunto cuja relevância vem sendo reconhecida” (RÓNAI, 1987, p. 11).

Em 1990, o poeta-tradutor José Paulo Paes, publica o livro Tradução: a

ponte necessária, livro pioneiro sobre a história da tradução no Brasil28. No capítulo

inicial, Paes (1990) apresenta um levantamento cuidadoso das editoras, tradutores e

primeiras obras brasileiras sobre tradução, cuja publicação foi impulsionada,

primeiramente, pelo número crescente de cursos de formação de tradutores

(graduação), e, posteriormente, pelos encontros, congressos (nacionais e

internacionais) e revistas especializadas que vieram a seguir:

27 Sabemos que o processo de tradução e o de interpretação envolve semelhanças, mas também diferenças, bem como a formação, as teorias e as competências requeridas destes dois profissionais. Mesmo assim, ao mencionarmos apenas a área de tradução, estamos nos referindo tanto à tradução de textos escritos quanto à tradução oral (interpretação). O mesmo ocorre nos casos em que nos referirmos ao profissional apenas como tradutor, também estamos incluindo o intérprete (tradutor oral) em nosso discurso. 28Tradução literária no Brasil foi um artigo escrito em 18 set. 1983 para o número especial do Folhetim da Folha de São Paulo dedicado à tradução. Posteriormente, foi incluído no livro Tradução: a ponte necessária, publicado em 1990, sofrendo pequenas inclusões e atualizações de dados referentes ao itinerário histórico da tradução literária (PAES, 1990, p. 7).

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O ensino universitário teve outrossim o condão de estimular os estudos de tradutologia, disciplina que encontrou seu órgão mais categorizado na revista Tradução & Comunicação, dirigida por Erwin Theodor e Julio Garcia Morejón (9 números publicados entre 1981 e 1986). A mesma editora [Álamo, Faculdade Ibero-Americana de São Paulo] que lançou essa revista, cuja publicação foi infelizmente suspensa, lançou também o volume A tradução da grande obra literária [coletânea organizada por Waldivia Portinho, 1982], a qual veio enriquecer a nossa ainda pobre bibliografia tradutológica, onde já figuram, a par dos livros pioneiros de Paulo Rónai [Escola de tradutores, de 1952, e A tradução vivida, de 1975] e Brenno Silveira [A arte de traduzir, de 19542], obras como Tradução: ofício e arte de Erwin Theodor [1976], O que é tradução de Geir Campos [1986], Cultura e tradutologia [1983] e Estudos de tradutologia [1981], coletâneas organizadas por Delton de Mattos, Tartufo 81 (ensaio sobre a poética da tradução de teatro) [1980], de Guilherme Figueiredo, Território da tradução, de Iumna Maria Simon (org.) [revista Remate de Males n. 4, 1984], Oficina de tradução, de Rosemary Arrojo [1986], e poucas outras (PAES, 1990, p. 31).

Assim como Rónai (1987), Paes (1990) também relata as dificuldades

enfrentadas por pesquisadores sobre a história da tradução e suas raras referências

ao tema.

Frota (2007, p. 138), em artigo intitulado, Um balanço dos estudos da

tradução no Brasil, cujo objetivo foi realizar um levantamento de obras publicadas a

partir do ano de 1996, afirmou que, entre a publicação de Escola de tradutores, em

1952, e Tradução: a ponte necessária, em 1990, passaram-se trinta e oito anos e

foram publicados no Brasil apenas “treze livros, cinco coletâneas e um periódico”

sobre tradução (FROTA, 2007, p. 138).

Em um estudo clássico sobre a indústria editorial brasileira, O livro no

Brasil: sua história29, escrito pelo inglês Laurence Hallewell e publicado em 1985,

foram dedicadas, segundo Wyler (2003a, p. 24), apenas 28 páginas às questões

sobre tradução, (menos de 4% do total das 692 páginas).

Também são raras as referências aos tradutores e à tradução nos sete

volumes de História da inteligência brasileira, de Wilson Martins, publicados em

1976, e nos cinco volumes de História da literatura brasileira, de Silvio Romero,

publicados em 1943.

Se o período de trinta e oito anos entre os pioneiros, Escola de

Tradutores e Tradução: a ponte necessária, foi marcado, como afirmou Paes (1990,

p. 31) por uma “pobre bibliografia tradutológica”, a década de 1990 deu início a uma

intensa publicação de livros, coletâneas, periódicos, dissertações e teses 29 Originalmente era uma tese de doutorado escrita em 1970, editada em inglês em 1982 e publicada no Brasil em 1985.

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propiciando um aumento no volume dos estudos sobre tradução em contexto

brasileiro. Para Frota (2007, p. 148):

[...] é possível confirmar a percepção que se vem tendo de um visível aumento no volume de estudos feitos sobre a tradução por pesquisadores brasileiros. Aumento que vinha se mantendo em uma base estável, recrudesce consideravelmente na primeira metade da década de 1990 e transforma-se em um verdadeiro boom a partir daí.

As publicações brasileiras sobre tradução abordam uma grande

heterogeneidade de temas, subsídios teóricos e metodológicos em diferentes áreas

e subáreas do conhecimento, tais como: linguística, estudos literários, semiótica,

filosofia, história, comunicação social, psicologia, entre outras, o que reitera a

vinculação da tradução a outros campos do saber.

Pagano & Vasconcellos (2003, p. 8-9), em seus estudos sobre teses e

dissertações sobre tradução publicadas no Brasil nas décadas de 1980 a 1990,

afirmaram que: dos 95 trabalhos de mestrado, doutorado e livre-docência publicados

no Brasil no referido período, apenas dois trabalhos eram sobre a história dos

estudos da tradução no Brasil. São eles: Percursos críticos e tradutórios da nação:

Brasil e Argentina e Tendências nos Estudos da Tradução Literária: passado e

presente30.

Para Frota (2007, p. 147), “à expansão de teses e dissertações

realizadas nos últimos anos se articula uma expansão no lançamento de livros sobre

tradução”, pois, muitas teses e dissertações servem de ponto de partida para a

publicação de artigos e livros.

Os estudos sobre a história da tradução no Brasil utilizam, na maioria

das vezes, conceitos e metodologias de outras áreas disciplinares, como a história,

buscando contextualizar cultural e historicamente os produtos e processos

tradutórios. É o que Wyler (2003a, p. 24) chama de “pesquisa historiográfica em

tradução”.

Segundo a autora:

A historiografia da tradução é uma área de conhecimento híbrida, dado que não aborda apenas as traduções em si, mas as circunstâncias que cercaram sua produção em cada período em cada país, todas muito diferentes entre si. Disso decorre que, se quisermos realizar pesquisas

30 Autores e data de defesa não foram citados por Pagano & Vasconcellos (2003).

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confiáveis, teremos que nos voltar para o conhecimento da história de nosso país (WYLER, 2003b, p. 109).

Frota (2007, p. 157) divide os trabalhos historiográficos no campo da

tradução em dois grandes temas: a da própria disciplina (gerada pelo interesse de

sua história) e a da práxis tradutória (as funções, modalidades, diferentes papéis e

identidades do tradutor). É neste segundo tema, sobre a identidade do tradutor, que

nossa pesquisa busca traçar um retrato do sujeito tradutor/intérprete em uma

comunidade do orkut respaldado pelo contexto histórico da contemporaneidade.

Dando continuidade aos levantamentos iniciados por Paes (1990)

sobre as obras de tradução publicadas nas décadas de 1970 e 1980 e por Frota

(2007) nos estudos da tradução desenvolvidos no Brasil a partir de 1996,

selecionamos alguns estudos brasileiros publicados no início do século XXI que

contribuem para a bibliografia sobre história da tradução no Brasil.

Sabemos que, ao destacarmos esses trabalhos como uma forma de

amostragem representativa, deixamos de mencionar diversos outros estudos

brasileiros de caráter historiográfico em livros, artigos, teses e dissertações,

impossíveis de serem mencionados por uma questão de tempo e espaço.

Uma coletânea organizada por Adriana Pagano, no ano de 2001(a),

Metodologias de pesquisa em tradução, apresenta algumas das metodologias de

pesquisa em pauta no início do século XXI sobre os estudos da tradução, sendo

elas: Protocolos verbais31 em interação com vídeo e monitor de TV; Software

Translog32; uso de corpora eletrônico; utilização de softwares para coleta e análise

de dados. Neste período, a inegável presença da tecnologia começou a inserir

novas matizes nos estudos da tradução.

No quinto capítulo da referida coletânea, Pagano (2001b) apresenta o

artigo, As pesquisas historiográficas em tradução, situando o estudo da tradução no

Brasil em seu contexto político e social comparado com a tradução na Argentina.

Também em 2001, foram reunidos diversos artigos historiográficos na

Crop: revista da área de língua e literatura inglesa e norte-americana do

Departamento de Letras Modernas/Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências

31 O Protocolo Verbal é uma técnica introspectiva de coleta de dados que consiste na verbalização dos pensamentos dos sujeitos. 32 Desenvolvido pela equipe de Arnt L. Jakobsen, da Escola de Administração de Copenhague o Translog é um programa de computador que permite registrar, tecla a tecla, todo o processo mecânico de escrita de um texto.

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Humanas (USP) de número 6, organizada por John Milton (2001a) que escreveu a

introdução da revista sob o título Emerging Views on Translation History in Brazil e

também o artigo The Translations of the Brazilian Book Club, the Clube do Livro

(2001b).

No ano seguinte, John Milton (2002) publica O Clube do Livro e a

tradução onde o autor discute as traduções publicadas pelo Clube do Livro33 e sua

função social para a formação de leitores brasileiros dando continuidade ao trabalho

do ano anterior.

Em 2003 Lia Wyler publica Línguas, poetas e bacharéis: uma crônica

da tradução no Brasil, tecendo um histórico da evolução da profissão e do tradutor

(oral e escrito) no Brasil desde o seu descobrimento - chamado de “achamento” pela

autora - até a década de 1970, mostrando as contribuições da tradução à cultura

brasileira.

Também, no ano de 2003, Lenita Esteves escreve o artigo A tradução

do romance-folhetim no século XIX brasileiro, abordando questões sobre o papel da

tradução na literatura do século dezenove no Brasil.

Outra publicação relevante, do ano de 2003 foi, Conversa com

tradutores: balanços e perspectivas da tradução, organizado por Ivone Castilho

Benedetti e Adail Sobral. Nesta coletânea, os autores apresentaram dez perguntas a

dezenove tradutores de diferentes especialidades: literária; técnica; audiovisual

(legendagem e dublagem); jornalística; juramentada; revisão; copidescagem34 e

interpretação (simultânea), que refletiram sobre teoria e prática. Na introdução do

livro, Francis Henrik Aubert (2003) sintetiza o percurso temático da obra e seus

desdobramentos:

[...] a formação do tradutor, a noção sempre fugaz do certo e do errado, as flutuantes valorizações do mercado e da remuneração decorrente, as peculiaridades de cada área (temática ou discursivamente definida), a relação entre o tradutor e a sociedade, o papel do vernáculo e os riscos (?) que a tradução pode representar para a integridade do idioma, a

33 O Clube do Livro, fundado em 1943, tinha o objetivo de estimular a leitura por meio da publicação de livros com preços mais acessíveis que os vendidos em livrarias. As traduções eram feitas às pressas para atender a uma demanda do mercado de massa. Por ser um período de ditadura, o conteúdo das obras a serem traduzidas obedecia à ordem política do país (censura) exigindo enredo de fácil compreensão, linguagem homogeneizada, notas de rodapé com julgamentos, explicações e conselhos, proibição de temas políticos e religiosos, além de cortes e alterações significativas do original (ROLIN, 2006). 34 Copidesque (do inglês copy desk) é o trabalho editorial realizado pelo redator ou revisor de textos ao realizar mudanças e aperfeiçoamentos em um texto a fim de torná-lo mais acessível aos leitores.

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globalização, e até as perspectivas da automatização do processo tradutório.

Cabe aqui uma constatação que nos chamou atenção sobre a questão

do profissional intérprete (tradutor oral): dos dezenove entrevistados, cinco deles

possuíam formação em tradução/interpretação, atuação na área de interpretação de

conferência ou docência em tradução/interpretação35, porém, nenhum deles

mencionou a atividade de interpretação ao responder à primeira pergunta do

questionário:

“Em que área(s) você tem atuado?; Quais as peculiaridades dessa(s)

área?; O que há de comum entre ela(s) e as outras áreas?”.

Supomos que a proposta do livro, Conversa com tradutores: balanços

e perspectivas da tradução (2003), seja apenas abordar a questão da tradução

escrita, deixando a tradução oral para a realização de outras obras futuras. Mesmo

assim, não poderíamos deixar de mencionar que o número de publicações sobre

interpretação (tradução oral) no Brasil é infinitamente inferior ao número de

publicações sobre tradução (escrita).

A interpretação de conferência: interfaces com a tradução escrita e

implicações para a formação de intérpretes e tradutores, um dos poucos artigos

destinados à interpretação, escrito por Reynaldo José Pagura, foi publicado em 2003

na revista DELTA de n. 19, um número especial destinados a Trabalhos de

Tradução. O artigo faz uma retrospectiva sobre a história da interpretação, elabora

uma lista dos termos usados na área e apresenta as semelhanças e diferenças entre

o processo de tradução (escrita) e o de interpretação (oral).

No mesmo ano, Solange Mittmann (2003) publica, com base na

Análise do Discurso francesa, a primeira proposta de tradução em uma perspectiva

discursiva chamada Notas do Tradutor e Processo Tradutório: análise e reflexão sob

uma perspectiva discursiva. Na nova concepção de tradução como processo

discursivo, onde o discurso é entendido como “efeito de sentido entre interlocutores”,

a autora confronta duas visões teóricas (a concepção tradicional vs a concepção

contestadora) e apresenta uma proposta particular sobre o processo tradutório

dentro do quadro epistemológico da AD (materialismo histórico, linguística e

discurso) onde o autor, o tradutor e o leitor produzem sentidos. Mittmann propõe por 35 O currículo dos profissionais entrevistados encontra-se no próprio livro, na folha de apresentação de cada um deles.

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meio da análise do discurso entender a tradução, o tradutor e as relações que se

estabelecem dentro do processo tradutório.

Em 2005 acontece O I Congresso Internacional de Tradução da

Abrates36 com o tema: “Tradutores, tecnologia e caminhos para a qualidade”. Em

meio a diversos temas sobre a tradução e a tecnologia, cinco palestras estavam

relacionadas a questões da prática tradutória interpelada pelo advento da tecnologia,

mostrando as circunstâncias que cercam a produção da tradução em um

determinado período e lugar. São elas: A tradução de eventos virtuais (José Manuel

da Silva); O tradutor e o futuro da tecnologia (B. Piropo); Os direitos do tradutor

técnico e as memórias de tradução (Adauto Vilela); O processo tradutório do século

XXI (Aline Reguine); e, Localização de software no Brasil: contribuições acadêmicas

para o mercado profissional (Gabriela Castelo Branco).

Em 2007, Maria José Coracini publica A celebração do outro: arquivo,

memória e identidade: línguas (materna e estrangeira), plurilinguismo e tradução. A

obra divide-se em quatro partes, compostas por vários textos que abordam noções

como identidade, escritura, sujeito e discurso a partir de autores como Foucault,

Pêcheux e Derrida. A autora problematiza as teorias do discurso, bem como

questões sobre modernidade, pós-modernidade, globalização, identidade e ciência.

Na quarta parte do livro, Da identidade do tradutor e do professor de línguas,

Coracini reflete, em um trabalho inédito, sobre a configuração da identidade do

tradutor com base em artigos publicados em periódicos sobre tradução, prefácios de

obras traduzidas e coletâneas de texto sobre tradução.

Também, em 2007, é lançado no Brasil o primeiro livro sobre

interpretação (tradução oral), Sua majestade, o intérprete: o fascinante mundo da

interpretação simultânea. Ewandro Magalhães Júnior, intérprete de conferência,

narra vários aspectos da profissão de intérprete de conferência, os desafios

enfrentados por estes profissionais, oferece dicas àqueles que pretendem ingressar

na atividade, além de informações históricas sobre o surgimento da interpretação de

conferência.

No ano de 2008, Adail Sobral publica o livro, Dizer o “mesmo” a outros:

ensaios sobre tradução, composto por oito ensaios sobre tradução e interpretação

frutos de reflexões elaboradas a partir de textos, palestras, simpósios e congressos

36 Disponível em: <http://www.abrates.com.br/congresso/port/prog.asp> Acesso em: 8 jan. 2009.

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apresentados pelo autor. No sétimo ensaio são abordadas questões sobre as

condições do tradutor no mundo globalizado. O autor também faz reflexões, no

oitavo ensaio, sobre a situação do intérprete de Libras (Língua Brasileira de Sinais)

como atividade de tradução (oral) sob o título Traduzir em Libras também é dizer o

“mesmo” a “outros”.

De 07 a 10 de setembro de 2009, será realizado o X Encontro Nacional

de Tradutores e o IV Encontro Internacional de Tradutores37, organizado pela

ABRAPT (Associação Brasileira de Pesquisadores em Tradução) e pela UFOP

(Universidade Federal de Ouro Preto), sob o tema Nas trilhas da tradução: para

onde vamos? O encontro tem por objetivo refletir sobre o crescimento da disciplina

Estudos da Tradução nos últimos 40 anos que gerou diferentes especialidades e

recortou o campo disciplinar em subáreas específicas (Historiografia, Tradução

Audiovisual, Tecnologias da Tradução, Estudos de Corpora, Modelagem da

Tradução, Tradução Juramentada, Ensino de Tradução, Tradução Literária,

Terminologia, Estudos sobre Competência e Desempenho Experto, Abordagens

Textuais e Cognitivas, Estudos de Textos Sensíveis, Localização, Estudos da

Interpretação, entre outras) bem como, discutir o futuro da tradução.

Para encerrarmos nosso levantamento dos estudos historiográficos em

tradução no início do século XXI, em pesquisa realizada no Portal Domínio Público38,

das 98 (noventa e oito) teses e dissertações sobre tradução disponibilizadas no site

em mídia digital, 6 (seis) abordam questões sobre tradução e contemporaneidade,

ou seja, a prática tradutória interpelada pela tecnologia, e 1 (uma) aborda a história

da tradução, sendo elas: Enfrentamento do problema das divergências de tradução

por um sistema de tradução automática: um exercício exploratório (Mirna Fernanda

de Oliveira, UNESP Araraquara, tese de doutorado, 2006); Avaliação de tradução

automática no mercado de localização de software: um estudo de caso (Gabriela

Castelo Branco Ribeiro, PUC-Rio, dissertação de mestrado, 2006); Iguais, mas

diferentes: em busca de uma interface entre segmentação cognitiva, sistemas de

memória de tradução e variação léxico-gramatical, no par linguístico alemão-

português (Júlio César Moreira Matias, UFMG, dissertação de mestrado, 2007); O

impacto dos sistemas de memória de tradução nos processos de revisão de

37 Disponível em: <http://www.nastrilhasdatraducao.ufop.br/inicio.html>. Acesso em: 15 abr. 2009. 38 Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp.>. Acesso em: 2 jun. 2009.

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tradutores profissionais brasileiros (Bartira Gotelipe Gomes Batista, UFMG,

dissertação de mestrado, 2007); Processos de orientação inicial e em tempo real e

sua interface com sistemas de memória de tradução (Ingrid Trioni Nunes Machado,

UFMG, dissertação de mestrado, 2007); TSL, uma linguagem para especificação de

tradutores (Marcello Novaes de Amorim, UFES , dissertação de mestrado, 2007; e

Práticas da Tradução no Ocidente: uma retrospectiva histórica39 (Lia Márcia Barroso

Jucá Rolim, PUC-Rio, dissertação de mestrado, 2006).

Como mencionado anteriormente, a historiografia sobre tradução teve

inicio no Brasil pela obra de Paes em 1990, década marcada por intensos estudos

tradutórios. Mas, foi a partir do ano de 2000 que observamos uma maior

preocupação com o resgate da história da tradução e do sujeito tradutor, seja pela

história da própria disciplina, pela prática tradutória mediada pela tecnologia, pelo

discurso e pela identidade, caracterizando-se por um trabalho bastante diversificado

e também fragmentado quanto à sua afiliação institucional (principalmente aos

programas de pós-graduação).

Segundo Pagano & Vasconcellos (2003, p. 19), a preocupação da

comunidade acadêmica em pesquisar a história da tradução no Brasil faz com que

os trabalhos sobre historiografia já se constituam como evidência da maturação da

disciplina no contexto nacional.

Saber como tradutores de diversos períodos, incluindo a

contemporaneidade, enxergam a tradução, sua história e contribuição para a cultura

brasileira, representa uma tentativa de rompimento com a invisibilidade e uma busca

pela visibilidade, assunto que abordaremos a seguir.

2.2 A INVISIBILIDADE DO TRADUTOR E INTÉRPRETE E SUA BUSCA PELA

VISIBILIDADE

Como vimos anteriormente, se o Brasil é um país onde 80% dos livros

(prosa, poesia, referência, manuais e catálogos) são traduzidos, ao contrário de

outros países onde a tradução de livros estrangeiros não ultrapassa 2,5% a 3,5 % do

39 A dissertação apresenta algumas das práticas tradutórias mais significativas na história do mundo ocidental (Europa) além de práticas de tradução realizadas no Brasil desde a chegada dos portugueses até a década de 1960.

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mercado editorial (WYLER, 2003a, p. 13), por que a atividade de tradução e o

tradutor se mantêm invisíveis no Brasil?

São diversas as circunstâncias que alimentam a invisibilidade da

tradução e do tradutor brasileiro. Iniciaremos nossos estudos abordando a questão

da ausência de regulamentação da área.

A luta pela regulamentação da profissão de tradutor e intérprete no

Brasil vai ao encontro da fundação da primeira associação brasileira de tradutores, a

ABRATES. Fundada na cidade do Rio de Janeiro em 21 de maio de 1974 por um

grupo de intelectuais liderados por Paulo Rónai, a associação contava em sua

fundação com a participação de 112 tradutores e tinha como objetivos principais à

melhoria nas condições de trabalho do tradutor e o aprimoramento da qualidade

profissional da tradução.

Em 1976, a ABRATES, juntamente com a APIC (Associação Paulista

dos Intérpretes de Conferência)40, apoiada pelas ATPs (Associações de Tradutores

Públicos), pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e por três

instituições de ensino superior (PUC, UFRS e Faculdade Ibero-Americana41),

elaborou um projeto-lei para a regulamentação da profissão no Brasil e o

encaminhou ao Ministério do Trabalho. Foram elaborados dois anteprojetos, um para

os tradutores de textos escritos e outro para intérpretes de conferência. Entre idas e

vindas, o pedido foi indeferido em 1980, sob a alegação, entre outros motivos, de

interesse de empreendimentos particulares e por fechar o mercado de trabalho a

profissionais autodidatas ou de outra formação profissional (WYLER, 2003a, p.148-

149).

Somente em setembro de 1988, o Ministério do trabalho reconheceu a

profissão de tradutor registrada sob o n. 2614 na CBO - Classificação Brasileira de

Ocupações – como “filólogos, tradutores, intérpretes e afins” (veja Anexo I) cujas

atividades requerem formações diferenciadas: o superior completo para filólogos e

linguistas e o ensino médio ou o diploma de técnico para tradutores e intérpretes.

Compete, segundo a CBO, a estes profissionais: traduzir textos e documentos;

interpretar discursos orais e/ou língua de sinais; resgatar a língua como expressão

de uma cultura; pesquisar; elaborar textos; e prestar assessoria a clientes. No que 40Fundada em 1971 a APIC, Associação Paulista de Intérpretes de Conferência, atualmente atende pelo nome de Associação Profissional de Intérpretes de Conferência, abrangendo todo o território nacional e não apenas o Estado de São Paulo. 41 Faculdade Ibero Americana, atual UNIBERO (Centro Universitário Ibero Americano).

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se refere às competências pessoais, ainda segundo este órgão, os tradutores e

intérpretes devem: manter a excelência da crítica; trabalhar em equipe; demonstrar

discrição, acuidade auditiva, fluência e proficiência; adaptar discurso ao público alvo;

trabalhar sob pressão (do tempo); utilizar técnicas de orientação e mobilidade;

demonstrar erudição, agilidade de raciocínio, neutralidade, capacidade de

concentração, flexibilidade, pró-atividade e capacidade de improvisar. Não fazem

parte das ocupações de n. 2614 os professores nas áreas de língua e literatura do

ensino superior.

Apenas os Tradutores Públicos e Intérpretes Comerciais, conhecidos

como Tradutores Juramentados, possuem regulamentação de sua área de atuação,

sob o Decreto 13.609 de 21 de outubro de 1943, assinado por Getúlio Vargas. Para

o ingresso ao referido ofício exige-se aprovação em concurso público e nomeação

pela Junta Comercial do Estado.

Segundo Wyler (2003a, p. 16-17), sem a regulamentação da área, não

se pode exigir do tradutor uma formação básica homogênea, nem evitar a

proliferação de cursos de “produzir tradutores”, nem protestar sobre a presença de

tradutores temporários (profissionais bilíngues) que buscam a tradução em períodos

de recessão econômica, nem tampouco concorrer com a baixa remuneração aceita

por tradutores que pouco ou nada investiram em sua formação. Porém, não há um

consenso entre tradutores sobre a necessidade de regulamentação da área, mesmo

entre os tradutores graduados em tradução e interpretação, desta forma, não

aprofundaremos sobre os méritos desta questão neste trabalho.

Não existe no Brasil um estudo que comprove o número oficial de

profissionais que executam a tarefa de tradução, exceto para o cargo de tradutores

públicos, onde as Juntas Comerciais oferecem uma listagem com a relação dos

profissionais, número de matrícula, idioma que traduzem e formas de contatos

(endereço, telefone e e-mail). Tanto o SINTRA (Sindicato dos Tradutores) quanto a

APIC (Associação Profissional dos Intérpretes de Conferência) oferecem apenas

uma listagem de seus membros, representando um número muito pequeno dos

tradutores e intérpretes que atuam de forma profissional no país, os quais continuam

invisíveis perante o mercado de trabalho e à população.

Para termos uma noção da pouca representatividade dos números

oferecidos pelos órgãos representantes da classe, o SINTRA possui cerca de 400

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tradutores filiados42 e a APIC possui 130 intérpretes associados43. A comunidade

Tradutores/Intérpretes BR, corpus deste trabalho, possui 8.820 membros que

possuem a língua portuguesa (do Brasil) como uma de suas línguas de trabalho e

em uma enquete sobre a filiação ou associação dos membros da comunidade a

algum órgão representante, 73% dos membros que participaram da enquete

responderam não participarem de nenhum desses órgãos44.

Ao lado da ausência de regulamentação e da falta de dados

estatísticos sobre o profissional, o desconhecimento da população sobre em que

concerne a profissão de tradução e interpretação gera algumas crenças que

corroboram com a invisibilidade da tradução e do tradutor em contexto brasileiro.

Segundo Pagano (et al., 2000, p. 11), as crenças “além de influenciar a performance

do tradutor, elas também determinam a forma como a sociedade em geral tende a

avaliar a tradução como profissão e o tradutor como agente dessa atividade”.

Entre algumas crenças famosas, Pagano (2000, p. 11-12) menciona: a

tradução é uma arte reservada a uns poucos que podem exercê-la graças a um dom

especial; a tradução é uma atividade prática que requer apenas um conhecimento

de língua e um bom dicionário; o tradutor deve ser falante bilíngue ou ter morado

num país onde se fala a língua estrangeira com que trabalha; só se pode traduzir da

língua estrangeira para a língua materna; e o mais famoso trocadilho: traduttori,

traditori.

Todas essas crenças apresentam algo em comum: a falta de

informação de que a tradução requer, além do profundo conhecimento linguístico

(seja da língua de partida quanto da língua de chegada), conhecimento cultural e

histórico (das línguas envolvidas), literário, temático, competências tradutórias,

experiência e qualificação. É bastante comum a visão de que a tradução envolve

apenas uma operação de transcodificação de uma língua para outra, intermediada

pelo uso de dicionários demonstrando a falta de conhecimento sobre a concepção

de língua. Se assim fosse, um bom dicionário bilíngue ou um programa de tradução

automática seriam suficientes, o que nos leva a outra crença: o tradutor humano

42 Informação fornecida pela secretária do Sintra, Nila Soares em 24 de junho de 2009, por e-mail, uma vez que o site do Sintra não possui uma busca pelo número total de tradutores (Veja Anexo J). 43 Pesquisa realizada no site da APIC em 20 de junho de 2009. Disponível em <http://www.apic.org. br/website/home/>. Acesso em: 20 jun. 2009. 44 Disponível em <http://www.orkut.com.br/Main#CommPollResults.aspx?cmm=50302&pct=11865561 98 &pid=1380085530>. Acesso em: 20 jun. 2009.

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será substituído pelos programas de tradução automática, crença já desmistificada,

uma vez que, os sistemas de tradução automática funcionam como ferramentas de

auxílio ao tradutor e não como substituto dos mesmos.

Sobre a visão que as pessoas e até mesmo alguns tradutores

apresentam da tradução, Azenha Júnior (2006, p. 161-162) afirma que: os avanços

feitos nos estudos da tradução parecem estar restritos ao plano da reflexão

acadêmica e são pouco eficazes para alterar a prática e a noção de tradução fora

das Instituições de Ensino Superior.

O trocadilho em italiano, “traduttori, traditori”, em português, “tradutor,

traidor”, traz consigo a idéia de infidelidade do tradutor e, como refletir sobre

tradução é ser remetido a clichês ou crenças, podemos citar ainda outro pensamento

popular preconceituoso e generalizante: “As traduções são como as mulheres:

quando fiéis, não são bonitas; e quando bonitas, não são fiéis”.

Mas a quem o tradutor deve ser fiel: ao autor, à obra, à época, ao

público-alvo?

Diversos fatores (intra e intersubjetivos, temporais, linguísticos,

culturais, sociais) fazem-se presentes no ato tradutório e exercem influências sobre

o processo e sobre o texto traduzido impondo um conjunto de servidões45 ao

tradutor, e estas servidões implicam, segundo Aubert (1994, p. 84), em “seu

‘esquartejamento’, sua aniquilação e, no limite, a impossibilidade de satisfazer de

maneira integral a qualquer uma das múltiplas exigências postas ao ato tradutório”.

O autor (AUBERT, 1994, p. 85) encerra as questões sobre as servidões impostas

afirmando que:

o tradutor somente poderá desincumbir-se de sua tarefa se dispuser de um grau de autonomia e livre-arbítrio diante dos interesses conflitantes e contraditórios suficiente para assegurar uma elaboração consciente de seu texto, produto este também, e necessariamente, autônomo.

Para Coracini (2007, p. 193-194), o famoso trocadilho é um exemplo de

heterogeneidade ou memória discursiva presente nas representações do tradutor e

de sua tarefa:

45 As servidões analisadas por Aubert (1994) referem-se a três questões: 1. É cabível exigir do tradutor seu próprio apagamento?; 2. Em que medida é aceitável o desvio do texto traduzido em relação ao original?; 3. Admitida a diversidade linguística e cultural, ate que ponto a diversidade constitui, efetivamente, um conjunto de servidões impositivas?

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A voz de especialistas [...] que falam da traição inevitável do tradutor; a voz daqueles (linguistas e especialistas da tradução) que pregam a possível fidelidade ao texto original; a voz de quem pratica o ofício e se defronta com a contingência da prática; a voz do discurso religioso da culpa, acompanhado pelo desejo da fidelidade, de transparência da linguagem, de controle do sujeito; a voz, enfim [...], daquele que se encontra no espaço (in)cômodo do entre-línguas, que causa prazer e desprazer, angústia e orgulho...

Outro fator que contribui para a invisibilidade do tradutor é a ausência

de um lugar devidamente demarcado da tradução dentro das instituições

acadêmicas. Em 1968 foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases (LDB),

proporcionando que os cursos de tradução fossem criados nos departamentos de

Letras, em nível de graduação. Nos anos seguintes, foram criados os primeiros

cursos de tradução no Brasil: em 1969 na PUC do Rio de Janeiro e em 1972 na

Faculdade Ibero-Americana (atual UNIBERO). Ainda hoje, o curso de graduação em

Tradução continua vinculado ao curso de Letras e o de pós-graduação não possui o

status de tradução como “área de concentração” em seus programas, estando

atrelados, na maioria das vezes à área de Linguística.

A respeito das pesquisas em tradução, Arrojo & Frota (1993), do Grupo

de Trabalho em Tradução, o GTTrad, relatam que:

Os estudos sobre tradução têm se desenvolvido principalmente às margens da pesquisa que se faz tanto nas áreas de Letras como de Linguística. Essa marginalidade tem impedido o crescimento da tradução como área de pesquisa autônoma e isolados aqueles que a ela se dedi- cam. Consequentemente, além de desorganizada e incipiente, a pesquisa na área tem frutificado ao sabor do acaso e do capricho das outras áreas com lugar garantido nas instituições e nos programas de pós-graduação.

Benedetti (2003, p. 26-27) menciona outras faces da invisibilidade do

tradutor: a invisibilidade social, ou seja, o fato do tradutor ser socialmente ignorado,

ser um sujeito anônimo, cujo nome não é citado e nem mesmo lembrado como

existente e, quando o é, sua presença apenas atende a uma exigência da lei dos

direitos autorais e a invisibilidade textual, a qual compete ao tradutor produzir textos

que não pareçam traduzidos, que sejam redigidos com tamanha fluência na língua

de chegada que o leitor não tenha impressão de estar lendo um autor estrangeiro.

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Podemos acrescentar à invisibilidade social do tradutor, o fato do

mesmo, na maioria das vezes, trabalhar em casa ou em escritório próprio, afastado

dos clientes e das empresas com as quais mantém contato, apenas por telefone e e-

mail, dados estes observados em uma enquete realizada na comunidade

Tradutores/Intérpretes BR, sobre o local de trabalho dos tradutores: 85%

responderam trabalhar em casa ou escritório próprio, 6% que trabalham em

empresas, 4% trabalham em agência de tradução e 3% em outros locais46.

Sobre a invisibilidade textual sabemos que ela foi contemplada pelas

concepções tradicionais ou logocêntricas da tradução que exigiam o apagamento da

voz do tradutor para que apenas a voz do autor transparecesse. Posteriormente,

com os estudos da tradução, a possibilidade de fidelidade do sentido estável de um

texto de uma língua para o texto de outra língua foi contestada e a tradução passou

a ser vista como ato de interpretação propiciando um novo papel para o tradutor: o

papel de autor.

Atualmente, em uma nova concepção de tradução, como processo

discursivo, na qual o discurso é entendido como “efeito de sentido entre

interlocutores”, Mitmman (2003) propõe, às luzes da Análise do Discurso francesa,

um lugar do tradutor como produtor do texto da tradução a partir da imagem que ele

faz do autor por meio da leitura particular que faz do texto original. Com o avanço

dos estudos da tradução, podemos observar o caminho da invisibilidade do tradutor

em direção à sua visibilidade.

Para Wyler (2003a, p. 17), a imprensa também desempenha um papel

ativo para a invisibilidade do tradutor: “se por um lado, ela valoriza quantitativamente

as obras traduzidas em suas páginas e colunas literárias, por outro desvaloriza o

tradutor omitindo seu nome em resenhas, anúncios e listas de livros mais vendidos”.

É importante ressaltarmos que a mídia se destina a falar sobre o tradutor apenas em

três momentos específicos: quando o tradutor é autor renomado, quando a tradução

é de poemas (interessando à mídia a questão da fidelidade, da impossibilidade de

tradução de poemas, das perdas ocorridas) e quando a tradução apresenta má

qualidade.

Em busca pelo reconhecimento institucional da tradução e do tradutor, em

1986, sob orientação do Professor Edson Rosa da Silva, da UFRJ, foi inserido o

46 Disponível em: <http://www.orkut.com.br/Main#CommPollResults.aspx?cmm=50302&pct=12217 60924&pid=375610101>. Acesso em: 20 jun. 2009.

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Grupo de Trabalho de Tradução, GTTrad aos demais Grupos de Trabalhos (GTs) da

ANPOLL (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e

Linguística)47. O GTTrad tem por objetivo servir como veículo de discussão

acadêmica para questões referentes à tradução fomentando o diálogo e o

intercâmbio entre os pesquisadores da área.

Também desempenhando um importante papel para a divulgação das

pesquisas na área de tradução temos os inúmeros periódicos e publicações

especializadas em tradução, que inicialmente eram divulgados em mídia impressa e,

atualmente, também se encontram em mídia digital, entre eles: TradTerm48, uma

revista do Centro Interdepartamental de Tradução e Terminologia (CITRAT) da USP

lançada em 1994; Cadernos de Tradução49, uma revista da Pós-Graduação em

Estudos da Tradução da UFSC lançada em 1996; Tradução & Comunicação -

Revista Brasileira de Tradutores50, publicada de 1981 a 1986 pela Faculdade Ibero-

Americana e relançada em 2001. Revista Eletrônica Unibero de produção

Científica51, uma publicação eletrônica das pesquisas realizadas por alunos e

professores dos cursos de graduação da referida instituição no período de 2003 a

2006; Tradução em Revista52, uma publicação da PUC-Rio lançada em 2004; além

de diversas outras revistas e periódicos produzidos por outras áreas do saber que

possuem artigos sobre tradução, como por exemplo, a DELTA53 – Revista de

Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, lançada em 1985 pela

PUC-SP.

Não podemos deixar de mencionar os órgãos representantes dos

tradutores e intérpretes, SINTRA, ABRATES e APIC que em seus sites divulgam

informações relevantes para a área, tais como, palestras, cursos, eventos, fontes de

consultas, instituições de ensino, valores praticados, links de interesse da categoria,

dicas de livros, listas e fóruns de discussão, programas eletrônicos de busca por

47 Atualmente existem 33 GTs da ANPOLL. Disponível em: <http://www.anpoll.org.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=53&Itemid=63> Acesso em 19 de junho de 2009. 48 Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/citrat/citrat.htm>. Acesso em: 18 jun. 2009. 49 Disponível em: <http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/traducao>. Acesso em: 18 jun. 2009. 50 Disponível em: < http://www.unibero.edu.br/>. Acesso em: 18 jun. 2009. 51 Disponível em: <http://www.unibero.edu.br/>. Acesso em 18 de junho de 2009. 52 Disponível em: < http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/trad_em_revista.php?strSecao=input0>. Acesso em: 18 jun. 2009. 53 Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=0102-4450&lng=en&nrm=iso >. Acesso em: 18 jun. 2009.

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profissionais, bem como o boletim ABRATES54 de artigos escritos por seus

membros.

Com o surgimento dos primeiros cursos de tradução no final da década

de 1960 e com a expansão destes cursos e dos estudos de tradução a partir da

década de 1980 e 1990, houve uma intensificação nas publicações de trabalhos

(dissertações, teses, artigos, coletâneas e livros) e na organização de encontros e

congressos nacionais e internacionais de tradução, contribuindo para a visibilidade

do profissional, tanto no Brasil quanto no exterior. Além dos eventos de instituições

de ensino superior espalhadas por todo o país que promovem seminários, palestras

e encontros locais sobre tradução.

Assegurado por lei, o direito autoral do tradutor representa um ganho

por sua visibilidade: o direito patrimonial sobre sua criação intelectual. A Lei do

Direito Autoral, aprovada em 19 de fevereiro de 1998 afirma, no Capítulo II - da

autoria das obras intelectuais - Art. 14: “é titular de direitos de autor quem adapta,

traduz, arranja ou orquestra obra caída no domínio público” e no Art. 53 - da

utilização de obras intelectuais - “em cada exemplar da obra o editor mencionará no

caso de tradução, o título original e o nome do tradutor”.

Desta forma, conforme afirmou Rocha (1984, p. 224), a tradução

regularmente feita é, portanto, considerada como uma criação nova, sobre a qual o

seu autor (o tradutor) tem o pleno exercício de seu direito de autor.

Com o advento da internet, tornou-se prática comum à escrita e leitura

de blogs de tradutores, com o intuito de busca por informação, entretenimento,

interação entre profissionais da área e até mesmo visibilidade.

Para Oliveira (2006, p. 139):

As práticas discursivas dos blogs, num primeiro momento, surgiram como discursos identitários, da emergência da subjetividade de pessoas comuns, que resolveram tornar público o que sentiam, percebiam e viam o mundo. Mas muitos perceberam que o blog era uma ferramenta propícia para fazer marketing pessoal, empresarial, político, entre outras formas de autopromoção.

Também fruto da contemporaneidade o orkut, com suas inúmeras

comunidades de tradutores e intérpretes, favorece não apenas novas formas de 54 Disponível em: <http://www.abrates.com.br/>. Acesso em: 18 jun. 2009.

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articulações sociais, de informação e cultura mas também novas práticas discursivas

e identitárias que expõem toda angústia de um sujeito desejante por estabelecer um

lugar e um status de “profissional de tradução” reconhecido e valorizado

promovendo sua visibilidade para a sociedade, o mercado de trabalho e entre os

membros da comunidade. Assim, por meio das ferramentas da web, os tradutores

poderiam estar demarcando um lugar social e ideológico, adquirindo saber, poder,

respeito e valorizando a sua profissão e sua atividade.

2.3 A TRADUÇÃO, O TRADUTOR E A TECNOLOGIA

Da máquina de escrever à popularização do computador na década de

1980 (preço acessível e interface amigável) e, posteriormente à chegada da Internet

no Brasil por volta dos anos de 1990, muitas mudanças significativas ocorreram em

todos os setores da atividade humana, inclusive na tradução.

O quadro abaixo, elaborado pela pesquisadora-tradutora, mostra como

a presença do computador vem afetando a prática tradutória e até mesmo

redefinindo algumas das tarefas do tradutor, mudanças que foram observadas pela

mesma que vivenciou o impacto da presença do computador tanto no período de

sua formação acadêmica (1989 a 1992) quanto em seu ingresso no mercado de

trabalho a partir de 1993, uma vez que, como mencionado anteriormente, foi na

década de 1980 que o computador tornou-se popular devido ao lançamento, para o

mercado consumidor, dos primeiros computadores pessoais para uso doméstico e

para fins específicos (computação gráfica) e em 1996, ano de início das vendas de

assinatura de acesso à rede pelo primeiro provedor do Brasil, Universo Online.

ANTES DO COMPUTADOR

DEPOIS DO COMPUTADOR

TECNOLOGIA

Máquina de escrever, máquina elétrica

Computador, impressora, monitores múltiplos,

scanner, OCR, anti-vírus ARQUIVO Papel Digital APRESENTAÇÃO Manuscrito, datilografado Digitado, impresso, arquivo

digital

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62

ENTREGA DO TRABALHO

Pessoalmente, correio Pessoalmente, correio, e-mail

CONSULTA Fonte fixa (publicações impressas)

Fonte fixa, fonte móvel (Internet)

CONTATOS

Pessoalmente, telefone Pessoalmente, telefone, celular, e-mail, MSN, Skype,

orkut, blog VOLUME DE TRADUÇÃO

Menor Maior

CUSTO DA TRADUÇÃO Menor Maior PRAZO DE ENTREGA Maior Menor PREÇO Maior Menor TRABALHO Solitário, grupos

pequenos Solitário, em equipe,

em rede

Numa perspectiva geral de utilização, o computador facilita a criação

de texto escrito por meio dos processadores de texto (como, por exemplo, o Word da

Microsoft) e possibilita a manipulação de conteúdos digitais diversos. Já em

perspectiva específica da informática aplicada à tradução, podemos citar diversas

ferramentas de auxílio à tradução, tais como, corretores ortográficos e gramaticais;

dicionários eletrônicos; bases de dados terminológicos; corpora eletrônicos; sistemas

de tradução automática; sistemas de tradução assistida, também conhecidos por

memórias de tradução; além de todas as facilidades criadas pela internet tais como

glossários e dicionários on-line, redes de comunicação formadas por listas, fóruns de

discussão, blogs e orkut, e fácil acesso a diversos conteúdos como fonte de

pesquisa e contextualização.

De todas as ferramentas de auxílio à tradução, duas nos chamam a

atenção por refletirem as mudanças ocorridas na prática tradutória mediada pela

tecnologia: os sistemas de tradução automática e as memórias de tradução. Nosso

objetivo não é discorrer sob o impacto causado por estas ferramentas na qualidade

da produção tradutória, trabalho já realizado por Stupiello em 200855, mas sim

apresentá-las como exemplo de transformação ocorrida no trabalho do tradutor na

contemporaneidade.

Os sistemas automáticos de tradução, conhecidos em inglês por

Machine Translation (MT), ou simplesmente Tradução Automática (TA), são

programas de computador que traduzem automaticamente textos nos mais variados 55 STUPIELLO, Erika Nogueira de Andrade. O impacto das novas tecnologias no tempo e na qualidade da produção tradutória. Estudos Linguísticos, São Paulo, v. 37, p. 145-154, 2008.

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63

pares de idiomas. Frutos do avanço da tecnologia computacional, não pretendem

substituir o trabalho do tradutor humano, como reza a crença popular.

O interesse pela tradução automática não é recente: impulsionados

pelos estudos em 1946, período pós-guerra, por americanos e ingleses,

desacreditados nas décadas de 1960 e 1970, retomados na década de 1980 e

proliferados na década de 1990 com o advento da internet, os sistemas de tradução

automática passaram a ser grandes aliados a tradutores e usuários da web

(ALFARO, 1998).

Esses programas possibilitaram uma forma de prática tradutória onde o

tradutor já não mais inicia sua tradução em uma folha em branco, mas sim partindo

de um texto pré-traduzido que requer revisão.

Os sistemas de tradução automática não são eficientes em todos os

tipos de textos. Eles podem ser úteis principalmente em textos [...] altamente

técnicos que tratam de um tópico muito delimitado [...] (MELBY, 1999 apud

ARAÚJO, 2002). Já, com os textos literários, por suas características de múltiplos

elementos significantes, os sistemas de TA não apresentam resultados satisfatórios.

Apesar de diversas limitações (semânticas, pragmáticas, entre outras),

estes sistemas eliminam grandes quantidades de trabalho “braçal” por parte do

tradutor, gerando economia de tempo, o que resulta em um aumento de

produtividade.

Os sistemas de tradução assistida, em inglês, Translation Memory

(TM) ou simplesmente, Memória de Tradução (MT), são bancos de dados integrados

a editores de textos que memorizam as traduções realizadas por tradutor humano e,

durante o processo de tradução recuperam fragmentos idênticos ou parecidos, que

deverão ser validados pelo tradutor. Nestes sistemas, quem traduz é o tradutor

humano, não a máquina. O processo envolve, além da memória de tradução,

ferramentas de gestão terminológica, processamento de texto, edição, gestão de

projetos e controle de qualidade.

Sobre a utilização destes sistemas, Stupiello (2008, p. 151) afirma que:

[...] com a possibilidade de reaproveitamento de traduções anteriores, o tradutor necessariamente ganhará tempo no trabalho, o que pode ser um atrativo importante para um mercado que demanda traduções com prazos cada vez menores.

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Nogueira & Nogueira (2004) apresentam diversas vantagens sobre a

utilização destes sistemas: apresentação do texto de partida e do texto de chegada

na mesma tela; dificulta o risco de saltar um período ou um parágrafo; preservação

da diagramação original do texto; preservação de números, nomes próprios e

pontuação; gestão de glossários; criação de um corpus bilíngue; consistência

terminológica. Sua utilização propicia um ganho geral de qualidade, economia de

custo e tempo.

Ao contrário da tradução automática, que parecia representar uma

ameaça à função do tradutor, a memória de tradução apresenta-se como verdadeira

aliada ao tradutor por gerenciar a tarefa tradutória e não traduzi-la automaticamente.

O que não podemos deixar de mencionar é o fato de que as agências de tradução

pedem desconto ou não pagam por segmentos56 que apresentem repetições

internas (100% de repetição no mesmo texto), externas (ocorrências contidas na

memória de tradução da agência) ou fuzzy match (ocorrências com pequenas

alterações) representando uma redução no valor a ser pago pelos serviços do

tradutor. Atualmente, podemos encontrar este assunto sendo discutido nos

encontros e congressos de tradutores, bem como nos diversos blogs e comunidades

de tradutores no orkut.

Em novembro de 2008, uma pesquisa inédita foi apresentada na ATA

49th Annual Conference57, na Flóriada, Estados Unidos, por duas tradutoras

brasileiras, Giovana Boselli e Cristina Silva. Intitulada Mixing Computer-Assisted

Translation and Machine Translation: the good, the bad and the ugly, as

pesquisadoras combinaram uma ferramenta de tradução automática gratuita (Google

Translate) com uma ferramenta de memória de tradução comercial (Trados). O

interesse pela pesquisa surgiu após assistirem a uma palestra na ATA 48th Annual

Conference em São Francisco, Estados Unidos, no ano de 2007, onde o consultor

Renato Beninato, proprietário da empresa Common Sense Advisory58, sediada em

Boston, afirmou que o tradutor que não estivesse usando o Google Translate estaria

perdendo tempo e dinheiro.

56 Segmentos referem-se a períodos ou frases memorizadas pelos sistemas de memória de tradução. 57 ATA (American Translator Association). Disponível em: <http://www.atanet.org//conf/2008/index. htm>. Acesso em: 18 jun. 2009. 58 Empresa de pesquisa e consultoria em globalização e localização de softwares. Disponível em: <http://www.commonsenseadvisory.com/>. Acesso em: 19 jun. 2009.

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65

As pesquisadoras se interessaram pelo assunto e iniciaram uma

pesquisa a fim de verificarem os reais benefícios da utilização de um sistema de

tradução automática gratuito e ao alcance de qualquer usuário da internet com um

dos sistemas de memória de tradução muito popular entre as agências de tradução

no Brasil.

Foi criada uma memória em branco, para onde foi importado um antigo

glossário do Word, da Microsoft, após uma adaptação para um formato legível pelo

Trados. Foram criados 3 textos com cerca de 500 palavras cada, com frases

extraídas da própria memória criada, porém sofrendo pequenas

alterações (expansão e redução de palavras, adição de frases novas), para que

parte das repetições encontradas na memória de tradução fossem inferiores a 100%.

Foi realizada uma pré-tradução no Trados, usando a memória, e as frases que

resultaram em 0% de ocorrência na memória de tradução foram automaticamente

traduzidas pelo Google Translate.

Os erros apresentados pelo sistema de tradução automática foram

analisados e avaliados com base em uma tabela de tipologia de erros, adaptada da

tabela usada pelos avaliadores do exame de tradução da ATA, que, além de

tipologia incluiu uma faixa de pontuação para cada erro.

O resultado apresentou uma possível viabilidade no uso dos dois

sistemas, uma vez que os erros apresentados pelo tradutor automático ficaram

dentro de um número aceitável, permitindo um trabalho de pós-edição que possibilite

ao tradutor uma economia de tempo no processo tradutório. As duas ferramentas

possibilitariam, ao tradutor, maior agilidade e gerenciamento do processo tradutório

unindo o que há de útil em cada uma das ferramentas. Para as pesquisadoras, é

importante considerar que tal resultado foi atingido dentro de um ambiente

controlado e com textos de área técnica, sendo possível que a base de dados do

Google Translate já contenha uma considerável quantidade de frases sobre o

assunto. Tivesse tal pesquisa sido realizada com textos literários ou de maior grau

de especificidade técnica, o resultado poderia ter sido diferente, talvez inaceitável

para uso profissional59.

59 A pesquisa ainda não se encontra publicada em forma de artigo. As informações foram retiradas da apresentação em Power Point disponibilizadas na internet e de correspondência eletrônica entre as pesquisadoras e as autoras desta dissertação. Apresentação disponível em: <http://www.slideshare. net/allinportuguese/Mixing-CAT-and-MT>. Acesso em: 19 jun. 2009.

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66

Com esta pesquisa, e com tantas outras que não podemos mencionar

neste trabalho de dissertação por uma questão de tempo e espaço, torna-se clara

que a presença de pesquisadores brasileiros em diversos encontros e congressos

contribui para uma maior visibilidade do tradutor e da tradução, tanto em âmbito

nacional quanto internacional. E, que a internet vem propiciando a divulgação destas

pesquisas e de diversas outras informações sobre a tradução e sobre o tradutor,

seja em periódicos e publicações especializadas em tradução, atualmente

disponibilizados em mídia digital; sites dos órgãos representantes (SINTRA, APIC,

ABRATES); sites de tradutores e de agências de tradução; e mais recentemente,

blogs de tradutores e comunidades de tradução no orkut.

Duas redes de comunicação e socialização vêm chamando a atenção

de pesquisadores, os blogs e o orkut, por democratizarem o acesso à palavra, ao

espaço público e, consequentemente, a visibilidade pessoal e profissional. Podemos

observar a presença de tradutores e intérpretes também nestas redes.

Sobre blogs e orkut, Oliveira (2005, p. 89) afirma que:

[...] nesse espaço, o indivíduo através de práticas discursivas (re)constrói o ‘sujeito’ ou os ‘sujeitos’ que aparentemente experimentam sua vida e suas relações dentro de uma aura menos excludente e mais libertária.

Esta proposta também encontra-se neste estudo ao analisarmos as

práticas discursivas e identitárias de tradutores e intérpretes na comunidade

Tradutores/Intérpretes BR.

Tanto os blogs quanto os perfis e comunidades do orkut, podem ser

criados por usuários que não possuem experiência em programação, devido à

estrutura de design pronta oferecida por ferramentas gratuitas na Internet. Não

apresentam custo, basta que o usuário tenha um computador e acesso à internet e

podem ser acessadas por qualquer pessoa. Estes fatores contribuíram para a

popularidade e rápido crescimento destas redes.

São inúmeros os blogs e comunidades de tradutores disponíveis na

Internet: tradutores renomados, estudantes de tradução, tradutores juramentados,

agências de tradução, entre tantos outros.

Existem diversas razões que levam uma pessoa a criar e participar

destas redes: necessidade de expressar-se, de interagir em comunidade, de dividir

conhecimento, de buscar reconhecimento e visibilidade.

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Geralmente, os blogs e as comunidades do orkut são temáticos e a

presença de links confere “autoridade” devido ao compartilhamento de fontes e

descobertas. Mesmo em blogs ou comunidades autobiográficas, as discussões

centram-se em assuntos de interesse coletivos nos quais os autores apresentam

alguma competência.

Oliveira (2005, p. 93), em seus estudos sobre o sujeito virtual, aponta

diversos autores, tais como Julian Dibbel, David Edwards e Allucquère Roseanne

Stone, que dedicam seus estudos sobre a emergência de novos fetiches e sistemas

de poder bem como formas sutis de exercer micro-poder, baseadas na competência

individual. Estes estudos indicam “a necessidade de socialização dos indivíduos, do

desejo de pertencer a newgroups; com a possibilidade de serem espreitadores ou

não da interação alheia, sem interagir” (OLIVEIRA, 2005, p. 93-94).

Nos blogs, assim como no orkut, as práticas discursivas envolvem os

participantes numa aura de libertação, de poder se dizer o que quiser propiciando

um discurso libertário, antes proibido ou que apenas podia ser dito por outros,

(OLIVEIRA, 2006, p. 144), o que vem contribuir com a visibilidade destes sujeitos,

entre eles, os tradutores e intérpretes pertencentes à contemporaneidade.

Por tudo isso, podemos concluir que a tradução na contemporaneidade

requer o emprego de recursos tecnológicos que confiram agilidade à produção

tradutória a fim de manter a competitividade do tradutor bem como torná-lo visível ao

mercado de trabalho e ao grupo que o cerca. Porém, conforme atestam Biau Gil &

Pym (2006), cada nova tecnologia requer novo investimento, não apenas na

aquisição de ferramentas, mas também, na aprendizagem de como usá-las.

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68

3 CONTEMPORANEIDADE E NOVAS TECNOLOGIAS

O real está morto, o que sobrevive no mundo midiático, cibernético, digital, eletrônico, televisivo, das nets em geral, é o seu simulacro, e somente esse é “verdadeiro”, ou melhor, veridictório.

Jean Baudrillard.

Neste capítulo abordamos alguns conceitos fundamentais sobre a

contemporaneidade: ciberespaço, cibercultura, modernidade líquida, bem como, o

impacto das novas tecnologias de informação e comunicação na identidade do

sujeito líquido-moderno.

3.1 CIBERESPAÇO E CIBERCULTURA

As novas tecnologias de informação e de comunicação, conhecidas

como TICs, e a virtualidade delas advinda, têm produzido significativas

transformações na relação do sujeito com o mundo, revolucionando as diversas

dimensões da vida humana: mercado de trabalho, instituições de ensino, práticas

sociais, códigos culturais, etc. Para Castells (2002, p. 412), trata-se da “gênese de

um novo mundo”:

Um novo mundo está tomando forma neste fim de milênio. Originou-se mais ou menos no fim dos anos 60 e meados da década de 70 na coincidência histórica de três processos independentes: revolução da tecnologia da informação; crise econômica do capitalismo e do estatismo e a consequente reestruturação de ambos; e apogeu de movimentos sociais culturais, tais como libertarismo, direitos humanos, feminismo e ambienta lismo. A interação entre esses processos e as reações por eles desenca deadas fizeram surgir uma nova estrutura social dominante, a sociedade em rede; uma nova economia, a economia informacional/global; e uma nova cultura, a cultura da virtualidade real. A lógica inserida nessa economia, nessa sociedade e nessa cultura está subjacente à ação e às instituições sociais em um mundo interdependente.

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Porém, a emergência e a estruturação deste “novo mundo” não

deslocaram de imediato e por completo o outro mundo que o antecedeu. Existem

simultaneidades e conflituosidades entre eles o que nos faz vivermos em um mundo

em rebuliço.

Os estudiosos que discutem questões acerca das novas tecnologias se

dividem entre os tecnófilos, que acreditam que a cultura digital proporcionará

avanços nas relações humanas, como Lévy (1999) e Lemos (2004), apesar de

admitirem os problemas trazidos pelas novas tecnologias; os tecnófobos, que vêm a

cultura digital como destruidora de valores éticos, morais, uma cultura elitista,

desumana, autoritária, como Baudrillard (2003); e há ainda aqueles que não

parecem estar muito certos de seus efeitos, como Turkle (1996).

Pelizaro e Oliveira (2008, p. 140-141) propõem uma outra perspectiva:

uma perspectiva, baseada em Foucault (2005 apud PELIZARO e OLIVEIRA, 2008),

onde “nada é bom ou ruim, mas que é necessário ver as dispersões, conhecer as

possibilidades discursivas, pois nada é fixo, nada é conclusivo, tudo pode ser

(re)significado”.

Também nesse contexto, Marcondes-Filho (2001, p. 37) enfatiza que:

[...] o que devemos considerar aqui não é exatamente se isso (a digitalização, a velocidade e o excesso informativo interferindo na ordenação física e psíquica dos sujeitos) é positivo ou negativo, pois assim cairíamos novamente nas ciladas da metafísica, mas que nova disposição estaria se formando e a que nova sociedade conduzindo.

Sem tomarmos partido nem da “salvação” nem da “destruição” da

humanidade, acreditamos, assim como Oliveira (2004) que as novas tecnologias

provocam mudanças significativas na relação entre sujeito, discurso e sociedade,

que há uma (re)significação das identidades emergentes da cultura digital e,

também, o surgimento de novas formas de controle. Para isso, tomamos como

corpus de pesquisa a comunidade Tradutores/Intérpretes BR e analisamos as

práticas discursivas destes profissionais e seus efeitos de sentido, ainda pouco

estudados.

O advento das novas tecnologias de informação e comunicação e a

forma como vêm sendo utilizadas pelos governos, empresas, escolas, indivíduos e

diversos setores sociais possibilitou o surgimento da "sociedade da informação",

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período caracterizado pelo crescente papel social da informação no

desenvolvimento da civilização moderna, por um crescimento da partilha dos

produtos e serviços de informação no PIB e pela formação de um espaço global de

informação60.

Portanto, ao falarmos sobre as novas tecnologias da informação e

comunicação três conceitos são de extrema relevância: ciberespaço, virtualidade e

cibercultura.

O termo ciberespaço foi cunhado na década de 1980 pelo escritor

canadense William Gibson. Gibson utilizou o termo pela primeira vez no romance

Burning Chrome, escrito em 1982 e seu conceito foi apresentado no romance

Neuromancer de 1984 como:

Uma alucinação consensual, vivida diariamente por bilhões de operadores legítimos, em todas as nações, por crianças a quem se estão a ensinar conceitos matemáticos. Uma representação gráfica de dados abstraídos dos bancos de todos os computadores do sistema humano. Uma complexidade impensável. Linhas de luz alinhadas no não espaço da mente; nebulosas e constelações de dados. Como luzes de cidade, retrocedendo (GIBSON, 1991, p. 67).

Neuromancer retrata um mundo no qual as novas tecnologias e a mídia

estão por toda parte e no qual os seres humanos se fundem nessas tecnologias

perdendo o controle de suas extensões.

Para Lemos ([s.d.], online) o ciberespaço apresentado por Gibson em

Neuromancer é:

[...] um espaço não físico ou territorial, que se compõe de um conjunto de redes de computadores através das quais todas as informações (sob as suas mais diversas formas) circulam. O cyberespaço gibsoniano é uma "alucinação consensual" onde podemos nos conectar através de "chips" implantados no cérebro. A Matrix, como chama Gibson, é a mãe, o útero da civilização pós-industrial onde os "cybernautas" vão penetrar. Ela será povoada pelas mais diversas tribos, onde os "cowboys" do cyberespaço circulam em busca de informações vitais para suas empresas ou suas vidas. A Matrix de Gibson, como toda a sua obra, faz uma caricatura do real, do quotidiano.

60 Glossário da Sociedade da Informação. Disponível em: <http://www.ait.pt/pdf/bibliografia/ glossario_ sociedade_informacao.pdf >. Acesso em: 20 jun. 2009.

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71

Segundo Cascais (2001), o termo também integra o conceito de

realidade virtual, na qual o indivíduo entra em um mundo tridimensional gerado pelos

computadores pela utilização de algum dispositivo.

Apesar da internet ser considerada o principal ambiente do ciberepaço,

graça à sua popularização e natureza de hipertexto, o ciberespaço também pode

ocorrer na relação do homem com outras tecnologias como o celular, os pagers, a

comunicação entre rádio-amadores e por serviços do tipo “tele-amigos” (JUNGBLUT,

2004).

O prefixo “ciber” vem do grego, “controle”. Foi nesse sentido que o

físico Norbert Wiener cunhou, nos anos 1940, o termo cibernética com o significado

de “ciência do controle” e da “comunicação entre os seres vivos e as máquinas”. A

partir daí, o prefixo “ciber” deu origem a diversas outras palavras: ciberpoeta,

ciberpunk, cibercidade, ciberarte, cibercultura, entre outras, “abrangendo todas as

manifestações que circulam no domínio da computação ou das máquinas

inteligentes” (CASCAIS, 2001).

Ainda não experimentamos o ciberespaço tal qual descrito em

Neuromancer, ou seja, uma ligação neural direta com o ciberespaço, porém já o

experimentamos como uma realidade virtual, uma simulação da realidade, mesmo

sem termos clareza de seu impacto sobre a identidade do ser humano.

Vejamos como dois estudiosos representantes de movimentos

antagônicos (tecnófilo e tecnófobo), enxergam a virtualidade:

Lévy (1996), em sua obra, O que é virtual? afirma que o virtual é um

processo que percorre, desde sempre, a condição humana: contratos, estados,

corpos, leis, meios de comunicação e transporte, línguas e estradas. O virtual é um

“não-presencial” que está presente, existente e que produz efeitos. O virtual não é

uma não-realidade. Não se define em oposição àquilo que é real, pelo contrário, ele

se opõe a atual, à atualização. O virtual pertencente ao real.

Já Baudrillard (1997) estabelece um confronto entre o virtual (o mundo

artificial criado pelas mídias) e o real. A expansão do virtual dá-se à custa do real,

que se esvazia e se desertifica.

Coelho (2001, p. 5), em seus estudos sobre a comunicação virtual,

colabora de modo efetivo para uma maior diferenciação entre os preceitos de Lévy e

Baudrillard:

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Enquanto Baudrillard entende o virtual como o esvaziamento do real e o fim da comunicação, Lévy interpreta o virtual como o exercício da criatividade e a garantia da permanência dos processos comunicacionais. Para Baudrillard, o virtual significa o fim do sentido, para Lévy é a criação de novos sentidos.

Do ciberespaço da ficção até o seu aparecimento na década de 1990,

foram diversas as definições para ele apresentadas e, nem mesmo entre os

estudiosos, há uma consensualidade:

Lévy (1999, p. 92) define-o como um “espaço de comunicação aberto

pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores”.

Segundo o autor:

Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de rede hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou destinadas à digitalização. Insisto na codificação digital, pois ela condiciona o caráter plástico, fluido, calculável com precisão e tratável em tempo real, hipertextual, interativo e, resumindo, virtual da informação que é, parece-me, a marca distintiva do ciberespaço. Esse novo meio tem a vocação de colocar em sinergia e interfacear todos os dispositivos de criação de informação, de gravação, de comunicação e de simulação. A perspectiva da digitalização geral das informações provavelmente tornará o ciberespaço o principal canal de comunicação e suporte de memória da humanidade a partir do próximo século (LÉVY, 1999, p. 92-93).

Para o autor, o ciberespaço especifica não somente a infra-estrutura

material da comunicação digital, como também todo o universo de informações que

ele abriga e os seres humanos que navegam nesse universo.

Em contraposição à visão de Lévy, Koepsell (2004, p. 125) afirma

apenas a condição física do ciberespaço:

[...] um meio composto de chips de silício, fios de cobre, fitas e discos magnéticos, cabos de fibra ótica e de todos os outros componentes de computadores, meios de armazenamento e redes que armazenam, transmitem e manipulam bits. [...]. O software existe no ciberespaço como o texto existe no papel ou como uma estátua existe em pedra.

Para Gennari (1999) o termo ciberespaço é sinônimo de espaço

cibernético, enquanto Rabaça e Barbosa (2001), o consideram como universo

virtual. De acordo com Ramal (2002) o ciberespaço designa a estrutura virtual

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73

transnacional de comunicação interativa. Ou ainda, segundo Fragoso (2000) a World

Wide Web passou a ser genericamente identificada como ‘o ciberespaço’.

De forma consensual, porém, temos o ciberespaço como o mais novo

espaço de comunicação, socialização, organização, acesso e divulgação de

informação e conhecimento advindo das novas tecnologias. Um espaço que absorve

todas as outras mídias e oferece recursos até então inimagináveis. Um espaço

pouco conhecido, cheio de incertezas em sua práxis, formulações teóricas e impacto

no ser humano. Um espaço virtual, aberto, fluido, navegável, caótico e desordenado.

Um espaço que se constrói em cima de sistemas, e, portanto, chamado por Lévy

(2000) de “sistema do caos”, um sistema onde impera a desordem devido à

quantidade e à diversidade dos fluxos de informação e das variadas e múltiplas

interações estabelecidas entre os sujeitos. “Mas, seria mesmo um lugar? Ou seria

um não-lugar, por onde circulam desconhecidos, descomprometidos, ‘coexistência

de individualidades distintas, semelhantes e indiferentes uma às outras’”

(CORACINI, 2006, p. 139).

Nesta pesquisa, consideramos ciberespaço como um espaço virtual

criado pelas novas tecnologias de informação e comunicação, particularmente a

internet.

Concordamos com Lemos (2000, p. 10) ao afirmar que o ciberespaço é

um espaço de práticas sociais cuja função não é inibir ou substituir as práticas

anteriores: a escola virtual vs a escola real; a comunidade virtual vs comunidade

real; a cidade virtual vs a cidade real; corpo virtual vs corpo real. Trata-se, portanto,

segundo o autor (idem) em insistir, “não em uma lógica excludente, mas em uma

dialógica da complementaridade [...] que estaria em franca oposição à lógica do

aniquilamento ou da destruição pura e simples de instâncias canônicas”.

Sobre a cibercultura, ela surgiu nos anos 1950, com a informática e a

cibernética, tornou-se popular por meio dos microcomputadores na década de 1970,

consolidou-se nos anos 1980 pela informática de massa e nos anos 1990 com o

surgimento das tecnologias digitais e a popularização da Internet (LEMOS, 2004).

Não devemos entender a cibercultura como uma cultura guiada pela

tecnologia. Na verdade, ela é a cultura contemporânea fortemente marcada pelas

tecnologias digitais presente na vida cotidiana de cada indivíduo.

Segundo Lévy (1999, p. 17), a cibercultura é "o conjunto de técnicas

(materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de

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valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço". Para o

autor (idem), ela é o principal canal de comunicação e suporte de memória da

humanidade.

Com o surgimento desse espaço virtual, novas formas de socialização

e de organização social emergiram: chats, fóruns, e-mails, listas de discussão,

comunidades, blogs, tribos, personagens (hackers, crackers), cibercrimes (invasão

de servidores e computadores para alteração ou roubo de dados, desvio de dinheiro

em contas bancárias, fraudes com cartão de crédito, violações de propriedade

intelectual, pedofilia, protestos políticos com dimensões criminosas, terrorismo),

cibermilitâncias (diversas ONGs virtuais tais como SOS Mata Atlântica, Geenpeace,

Women Rights), dentre vários outros.

Ao contrário das mídias convencionais (jornal, rádio e TV), a

cibercultura provém de um espaço de comunicação flexível no qual todos podem

transmitir e receber informações de qualquer lugar do mundo sejam elas texto,

imagem ou som. A cooperação torna-se um dos pontos centrais, ocorrendo por

meio do compartilhamento de arquivos, músicas, fotos, filmes, mensagens, textos,

etc.

Embora as novas tecnologias tenham proporcionado a criação de

espaços para a circulação de informações e idéias, temos na cibercultura ainda

velhos problemas conhecidos pela humanidade como as desigualdades sociais, pois

há neste espaço os excluídos digitais - uma grande maioria de pessoas que não

dispõem de computadores e de acesso à rede.

Na cibercultura, o espaço virtual torna-se uma extensão do espaço

urbano, com suas universidades, escolas, livrarias, bibliotecas, bancos, comércios,

cinemas, museus, entre outros, estando também presente no cotidiano das pessoas:

home banking, cartões de crédito, voto eletrônico, pagers, imposto de renda via

rede, inscrições via internet. Neste contexto, temos as chamadas cibercidades, que,

segundo Lemos (2000, p. 4), são “fluxos de informações”.

Para Lemos (2000, p. 4):

[...] as cibercidades diferenciam-se das cidades reais por não serem constituí das por fluxo e trânsito de pessoas pelo tecido urbano. Ela não é um campo onde transitam coisas, mas um espaço eletrônico onde trafegam bits e bytes.

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Até mesmo os cenários culturais convivem com as novas tecnologias

digitais da comunicação que, refletindo em suas formas de representação, fazem

emergir objetos artísticos chamados de ciberarte.

Para Machado (2001, p. 11):

[...] seria impensável uma época de florescimento cultural sem um correspondente progresso de suas técnicas de expressão, como também é impensável uma época de avanços tecnológicos sem consequências no plano cultural.

A ciberarte é a arte da comunicação, um evento dialógico que

necessita da participação do espectador onde o autor cede espaço a vários co-

autores que desencadeiam outras possibilidades de direções manipuladas ou

acessadas pelo mundo virtual (LIESEN, 2005).

Podemos afirmar que o ciberespaço abriu espaço para uma arte em

que o público não exerce apenas a observação, mas sim a navegação, a interação e

a simulação.

Para Baudrillard (1981), o ciberespaço só permite simulações de

interação e não verdadeiras interações. O internauta não acessa narrativas da

história real, mas apenas o simulacro de algo ao mesmo tempo distante e próximo

no espaço e no tempo.

Ainda segundo o autor (1981), o que sobrevive no mundo midiático não

é o real, mas o simulacro do real, ou seja, o virtual é um simulador do mundo real

que cria no internauta a sensação de que ele é um sujeito onipotente e onipresente,

pois pode vigiar, espiar, entrar e sair da Internet sem ser percebido, assunto

explorado nos tópicos a seguir.

Parte integrante da sociedade contemporânea, o ciberespaço e a

cibercultura são espaços comuns alimentados por todos aqueles que os utilizam

oferecendo objetos, hipertextos comunitários e memórias compartilhadas que levam

à constituição da “inteligência coletiva”.

Para Lévy (1996), uma inteligência distribuída em toda parte, sempre

valorizada e sinergizada em tempo real.

Para Momesso (2009), “uma combinação de inteligência,

conhecimento e criatividade (por meio da rede planetária de computadores) para a

produção de riqueza e desenvolvimento social”.

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Para encerrarmos, vale ressaltar que o ciberespaço provocou diversas

mudanças no âmbito das relações sociais, pois é um meio que permite a interação e

o contato de um indivíduo com o outro impondo novas formas de ver, de ser, de

fazer, de ler, de escrever, de entender e interpretar o mundo e o que nos rodeia. De

modo geral, todos nós fomos afetados, pois as novas tecnologias de informação e

comunicação tornaram-se ações cotidianas.

No entanto, não temos muito claras e definidas todas as mudanças que

ocorreram e como tudo isso afetou e ainda afeta nossa vida.

Diante do exposto, passamos a analisar a modernidade líquida, uma

era pós-moderna marcada pela tecnologia, e o sujeito líquido-moderno bem como o

impacto que as novas tecnologias causaram na identidade deste sujeito.

3.2 MODERNIDADE LÍQUIDA E SUJEITO LÍQUIDO-MODERNO

Vivemos, neste início de século XXI, a era da pós-modernidade, da

contemporaneidade. Como mencionado no início desta dissertação, há entre os

estudiosos o uso de diferentes nomenclaturas para este período.

Neste trabalho optamos por utilizar ora pós-modernidade, ora

contemporaneidade e, principalmente, “modernidade líquida” por compartilharmos da

visão de Bauman (2001) de que estamos passando por um processo de “liquefação”

das estruturas e instituições sociais, ou seja, passando da fase “sólida” para a fase

“fluida”, “líquida”.

Recorremos a algumas obras de Zygmunt Bauman, um dos maiores

sociólogos da atualidade, na tentativa de apresentar os principais aspectos da

sociedade atual, a chamada “modernidade líquida”.

Em seu livro, Modernidade Líquida, Bauman (2001) faz uma reflexão

sobre a contemporaneidade e cria uma metáfora para melhor definir o estado em

que o mundo se encontra: a chamada modernidade líquida. O autor compara o

período atual com a matéria líquida e conclui que a sociedade está impregnada de

propriedades pertencentes aos líquidos, tais como a fluidez, a difusão, a mobilidade

e a aparente leveza.

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Os fluidos se movem facilmente. Eles ‘fluem’, ‘escorrem’, ‘esvaem-se’, ‘respingam’, ‘transbordam’, ‘vazam’, ‘inundam’, ‘borrifam’, ‘pingam’, são ‘filtrados’, ‘destilados’; diferentemente dos sólidos, não são facilmente contidos – contornam certos obstáculos, dissolvem outros e invadem ou inundam seu caminho... Associamos ‘leveza’ ou ‘ausência de peso’ à mobilidade e à inconstância: sabemos pela prática que quanto mais leves viajamos, com maior facilidade e rapidez nos movemos (BAUMAN, 2001, p. 8).

Este estado liquefeito tem como características a maleabilidade, a

flexibilidade e, principalmente, a capacidade de moldar-se a diversas estruturas.

Como consequência desse processo temos as aceleradas

transformações da sociedade e das relações afetivas. Assim como os líquidos,

nossa sociedade não consegue manter a forma por muito tempo, continua mudando

sob influência das menores forças.

Segundo Bauman (2001), as diversas esferas da sociedade

contemporânea, tais como a vida pública, a vida privada, os relacionamentos

humanos, vêm passando por transformações cujas consequências esgarçam o

tecido social. Tais transformações, fazem com que as instituições sociais percam a

solidez e se liquefaçam, tornando-se amorfas, como os líquidos. A concretude dos

sólidos, inabaláveis, derrete-se e assume a forma líquida. Esta desintegração da

solidez serviu para dar lugar às individualidades e agora os indivíduos é que ditam

os parâmetros do comportamento.

Bauman (2001) afirma que a modernidade sólida, que teve início com

as transformações clássicas e o advento de um conjunto estável de valores e modos

de vida cultural e político, deixou de existir e em seu lugar surgiu a modernidade

líquida. Nesta, tudo é volátil, as relações humanas não são mais tangíveis e a vida

em conjunto (familiar, de casais, de grupos de amigos, de afinidades políticas e

assim por diante) perde consistência e estabilidade.

A decadência de instituições sociais que, até então, eram referência

para a construção da sociedade provoca o que Hall (2002) intitula de “crise da

identidade” que afeta o indivíduo enquanto sujeito e a comunidade enquanto coletivo

deste sujeito.

A rapidez com que se operam mudanças na sociedade, “alteram as

paisagens culturais de classe, gênero, etnia, raça e nacionalidade” (HALL, 2002, p.

11) provocando no sujeito um sentimento de perda de “si mesmo”, pela perda de

suas referências. A crise de identidade, conforme Hall (2002) é a descentralização

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dos indivíduos do seu lugar no mundo social e cultural, mas também de si mesmos,

pois abala a idéia que eles têm de si próprios como sujeitos integrados.

Vivemos uma era marcada pelo encurtamento das distâncias físicas,

valorização do poder de consumo e presença da mídia nas relações sociais.

A identidade do sujeito líquido moderno já não é fixa ou permanente,

pois o indivíduo pode assumir diferentes posições, conforme o papel que está

representando.

Segundo Bauman (1998, p. 92):

[...] a modernidade é a impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa estar em movimento. Não se resolve necessariamente estar em movimento – como não se resolve ser moderno. É-se colocado em movimento ao se ser lançado na espécie de mundo dilacerado entre a beleza da visão e a feiúra da realidade – realidade que se enfeiou pela beleza da visão. Nesse mundo, todos os habitantes são nômades, mas nômades que perambulam a fim de se fixar. Além da curva, existe, deve existir, tem de existir uma terra hospitaleira em que se fixar, mas depois de cada curva surgem novas curvas, com novas frustrações e novas esperanças ainda não destroçadas.

Por não serem fixas, as identidades tornaram-se efêmeras, líquidas,

rapidamente esgotam-se e são abandonadas por outras mais convenientes aos

olhos dos indivíduos que as almejam.

Na era da modernidade líquida, as relações humanas tendem também

a se tornarem voláteis, descartáveis, substituíveis. O comprometimento e o

compromisso em longo prazo são vistos como armadilhas a serem evitadas.

Vivemos a era de desapego, de desamparo social e de uma suposta liberdade.

Surgem, então, novos sentimentos: no plano pessoal, a solidão, o desamparo e o

isolamento e no plano social, a violência e o terrorismo ocorridos, segundo Bauman

(2001), em “não-lugares”, em “terras-de-ninguém”.

As “terras-de-ninguém” padecem de normas sociais, que sejam claras

e respeitadas por todos. Na era da exacerbação individualista, todos e cada um

seguem suas próprias normas e convicções.

Nesta era líquido-moderna, as tecnologias de informação e

comunicação despontam como potentes colaboradores do processo de construção

identitária dos sujeitos, fabricando, em grande escala, modelos para identificação e

projeção. A internet e as novas tecnologias vieram justamente atender às

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necessidades da modernidade líquida: liberdade, movimento e constante

modernização.

Segundo Lemos (2004, p. 12):

[...] a internet encarna a presença da humanidade a ela própria, já que todas as culturas, todas as disciplinas, todas as paixões aí se entrelaçam. Já que tudo é possível, ela manifesta a conexão do homem com sua própria essência, que é a aspiração à liberdade.

Na modernidade líquida ter é ser e estar, pois você é o que você

possui, e os que não podem consumir se tornam excluídos deste jogo. Na sociedade

líquida a exclusão é frequente.

Em Vidas Desperdiçadas (2005a), Bauman classifica os seres

humanos que não conseguem se inserir no processo da modernidade e da

globalização de “refugo humano”. Desta forma, a descartabilidade passou a ser uma

característica dos seres humanos e de suas relações, obedecendo à máxima da

sociedade: o consumismo. O sujeito líquido modernidade está permanentemente

ameaçado pela possibilidade de se tornar supérfluo, lixo, e, portanto, ter sua vida

desperdiçada antes mesmo de nascer. Vivemos a cultura do lixo, do descartável.

A globalização é excludente, traiçoeira, eliminadora. Ela produz

sujeiras, dejetos e lixo humano que são jogados longe dos grandes centros urbanos,

em terras inabitadas, sem organização ou política de reciclagem.

As relações humanas passaram a ter as seguintes características: a

astúcia, o desvio, a fuga, a evitação, a rejeição de confinamento territorial (BAUMAN,

2001, p. 18). Vivemos o fim do engajamento mútuo, pois, estamos o tempo todo

ocupados e para os “indesejados”, temos a tecnologia a nosso favor: a secretária

eletrônica que permanece ligada mesmo quando estamos em casa, a caixa postal

do celular, o e-mail “não recebido”.

Quando a identidade perde as âncoras sociais, os indivíduos buscam

como identificação o “nós”. E, segundo Bauman (2005b, p. 31):

[...] os grupos que os indivíduos destituídos pelas estruturas de referência ortodoxas tentam encontrar ou estabelecer hoje em dia tendem a ser eletronicamente mediados, ‘frágeis totalidades virtuais’, em que é fácil entrar e ser abandonados.

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Essas comunidades virtuais são simulacros da realidade, pois o sujeito

escolhe o que ser e de qual comunidade participar, e apesar das comunidades

serem incapazes de dar substância à identidade do sujeito, cada participante é livre

e decide quando abandonar as mesmas.

Temos um sujeito múltiplo, dissimulado que se agarra às tecnologias

de informação e comunicação (blogs, orkut e sites interativos) a fim de superar o

medo de ser descartado (MOMESSO, 2009).

Viver nessa fase líquido-moderna significa deixar de lado qualquer

esperança de estaticidade e totalidade, para adaptar-se às mudanças e aderir a uma

sociedade difusa, na qual quem não a acompanha, não participa do jogo é rotulado

de “consumidor falho” e será excluído (BAUMAN, 1998).

Conclui-se que a modernidade líquida é leve, fluida e mais dinâmica

que a modernidade sólida, porém, a passagem de uma a outra acarretou profundas

mudanças em todos os aspectos da vida humana, inclusive na identidade dos

sujeitos, assunto abordado a seguir.

3.3 IMPACTO IDENTITÁRIO DAS NOVAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

São consideradas novas tecnologias de informação e comunicação

(TICs), as tecnologias que captam, transmitem e distribuem informações (texto,

imagem, vídeo e som) por meio de comunicação em redes, mediada ou não por

computadores. São elas: os computadores pessoais; as webcams; os CDs e DVDs;

os diversos suportes para guardar e portar dados (disquetes, discos rígidos, cartões

de memória, pendrives, zipdrives); a telefonia móvel; a TV por assinatura (parabólica

ou a cabo); as tecnologias digitais de imagens e sons (scanners, fotografia digital,

vídeo digital, som digital, TV digital, rádio digital); as tecnologias de acesso sem fio

(Wi-Fi, Bluetooth, RFID); e a internet com todos os seus recursos (e-mail, listas de

discussão, World Wide Web, websites, home pages, streaming, poadcasting).

Nesta dissertação, ao nos referirmos ao impacto das novas tecnologias

de informação e comunicação, estamos exclusivamente nos reportando à

constituição da(s) identidade(s) do sujeito no mundo mediado pela internet.

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Desde a chegada da Internet no Brasil na década de 1990, mais

especificamente em 1996, com os a chegada dos primeiros provedores de acesso à

rede, o discurso sobre esta nova tecnologia já preconizava a chegada de uma rede

planetária que iria mudar a vida de todos: a “nova era” (MOMESSO, 2009). Quase

15 anos depois, podemos observar diversas mudanças no cenário econômico, no

governo, na indústria, na saúde, na educação, no cotidiano e, consequentemente,

no comportamento das pessoas.

O computador deixou de ser usado apenas como ferramenta para

produzir textos, sons e imagens e, por meio da Internet, tornou-se um importante

meio de contato social. Com tantas mudanças, “novas” práticas discursivas foram

instituídas tornando imprescindível a discussão sobre a(s) identidade(s) do sujeito no

mundo globalizado e mediado pela Internet.

Momesso (2009, p. 1) em seus estudos sobre a construção do sujeito

na contemporaneidade, nomeia a internet e seus diversos dispositivos de

“ferramentas da web 2.0”. Segundo a autora, são ferramentas nas quais “o usuário

passa de mero espectador a participante ativo [...] como, por exemplo, gerar o

próprio conteúdo, criar comunidades e interagir”, a qual Lévy (1996 apud

MOMESSO, 2009) já havia preconizado como a era da “construção coletiva de

conhecimento”.

Estas “ferramentas da web 2.0” tornaram-se conhecidas por

propiciarem a possibilidade de expressão (blogs, fotologs, videologs); de interação

(orkut, My Space, YouTube); de lucratividade devido à interação entre clientes

(Amazon); de busca por informação (Google); de produção coletiva de produtos

(Linux, Wikipédia) (LÉVY, 1996 apud MOMESSO, 2009, p. 5).

Ainda, segundo MOMESSO (2009, p. 4), o orkut, os blogs e os sites

interativos, veem sendo utilizados para a construção da identidade na

contemporaneidade, ou seja, utilizados como:

[...] técnicas de si” a fim de aplacar o medo de não pertencimento ao mundo digital. Por meio deles, cria-se a sensação de dominar a si próprio e à maquina, de estar dentro do mundo virtual e, consequentemente, de não ser excluído desta “nova era” .

Iniciamos nossas reflexões sobre o impacto das novas tecnologias de

informação e comunicação a partir das questões sobre a comunicação que ocorre

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em ambiente virtual: a comunicação mediada pelo computador (CMC) cujo

crescimento tem sido significativo e exponencial desde o surgimento da internet.

A comunicação mediada pelo computador propiciou “novas” formas de

socialização engendradas no ciberespaço cuja principal característica é a

interatividade.

A comunicação no ciberespaço pode ocorrer por meio do envio de e-

mails, pela participação em listas eletrônicas, fóruns de discussão, chats, orkut,

comunidades virtuais, nos sites interativos estabelecendo várias formas de interação

e socialização que ocorrem por meio de códigos e regras desenvolvidas pelos

próprios usuários mudando o que o sujeito tradicionalmente entendia por tempo e

espaço, provocando impactos nas relações entre os indivíduos, deslocando as

identidades dos sujeitos e agregando valores.

Um dos primeiros exemplos significativos de comunicação mediada

pelo computador foram as salas de bate-papo virtual, conhecidas como chats. Nos

chats a comunicação ocorre em espaço físico distinto, mas com o mesmo tempo de

interação, ou seja, de forma síncrona, em tempo real. Na comunicação de forma

síncrona, o fator tempo é determinante, pois condiciona com quem o usuário poderá

interagir sendo necessário que todos os envolvidos estejam conectados ao mesmo

tempo.

Com o surgimento do orkut, blogs e sites interativos, a necessidade de

o sujeito dividir o mesmo tempo e espaço com seu interlocutor tornou-se inexistente.

Por utilizarem uma forma de comunicação assíncrona, em tempo não-real, as

mensagens podem ser trocadas em horários distintos, diferente dos chats,

possibilitando um maior grau de diversidade dos usuários, ou seja, pessoas com

estilos de vida e horários diferentes. Desta forma, estas ferramentas inauguraram

uma comunicação desvinculada das questões temporais e espaciais possibilitando o

contato entre pessoas de diferentes localidades, interesses e níveis sociais.

No mundo globalizado, a comunicação que ocorre no ciberespaço,

muitas vezes, é maior e mais frequente que a realizada face a face e, devido à

grande mobilidade social no meio digital, torna-se mais fácil conhecer pessoas em

diversos lugares do mundo e não mais o vizinho do apartamento/casa ao lado.

Sobre a internet, Castell (2005, p. 255) afirma que: sem dúvida, essa

tecnologia é mais do que uma tecnologia. É um meio de comunicação, de interação

e de organização social sobre a qual se baseia uma nova forma de sociedade, a

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“sociedade em rede”, onde tudo é sistêmico e interconectado o que favorece uma

maior facilidade de acesso e troca de informações entre os diversos sujeitos

(CASTELLS, 1999b).

As alterações de espaço e tempo decorrentes das novas tecnologias

de informação e comunicação permitem que o sujeito esteja simultaneamente em

diferentes lugares, o que, de acordo com Kleiman & Vieira (2006, p. 121) agrega

superpoderes ao sujeito contemporâneo: um sujeito onipotente, livre das amarras

sociais, dos contornos geográficos e da estratificação.

O sujeito das novas tecnologias sofreu transformações em sua

concepção de território. É o chamado “fim da geografia”:

A era da internet foi aclamada como o fim da geografia De fato, a internet tem uma geografia própria, uma geografia feita de redes e nós que processam o fluxo de informação gerados e administrados a partir de lugares. Como a unidade é a rede, a arquitetura e a dinâmica de múltiplas redes são as fontes de significados e função para cada lugar (CASTELLS, 2003, p.170).

Devido a não necessidade da presença física, proporcionada pelas

novas tecnologias, o sujeito desfruta de uma sensação de liberdade e também de

uma ausência de responsabilidade social tornando-se “descompromissado de

qualquer problema local, pois a qualquer momento ele pode se mover para outro

lugar sempre que esse se torne inóspito e pouco favorável aos seus propósitos”

(KLEIMAN & VIEIRA, 2006, p. 123).

Temos, com as novas tecnologias, uma nova versão do panóptico de

Jeremy Benthan61 (2000), um modelo de prisão do final do século XVIII que permite

a um vigilante observar todos os prisioneiros sem que estes possam saber se estão

ou não sendo observados. O termo também foi utilizado por Foucault em sua obra

Vigiar e Punir (2004b) para tratar da sociedade de controle, e por teóricos das novas

tecnologias, como Pierre Lévy (1999) e Howard Rheingold (1996), para designar o

possível controle exercido pelos novos meios de informação sobre seus usuários. De

acordo com Bauman (1999, p. 57), a imagem do panóptico já não é eficaz para

traduzir, em termos contemporâneos, os dispositivos de vigilância, uma vez que, o

solitário vigilante, em sua torre central, foi substituído por milhões de olhos

61 BENTHAM, Jeremy. O panóptico. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

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eletrônicos. Vivemos a era do sinóptico em que cada indivíduo é observado por

muitos e o orkut, nosso corpus de análise, bem como os blogs, são exemplos deste

sinóptico de observação de múltiplos olhares sobre o indivíduo.

A sociedade de controle passa, então, a potencializar a invisibilidade

do poder que se dilui por meio do ciberespaço, promovendo a sensação de uma

aparente liberdade.

Oliveira (2005) afirma que “o sujeito da internet é um banco de dados”

e que muitos não têm consciência disso. Para Poster (2000 apud KLEIMAN &

VIEIRA, 2006, p. 123), a armazenagem maciça de dados do sujeito na internet

resulta em um “superpanóptico”, com a diferença de que são os vigiados que

fornecem voluntariamente os dados a armazenar. Coracini (2005, p. 16) caracteriza

este momento como um pós-panóptico imperceptível e camuflado “que orienta sem

orientar, seduz sem convencer, manobra na invisibilidade das necessidades

desnecessárias, construídas, inventadas, sem que nos apercebamos”.

O fluxo constante de informações que os usuários da internet

disponibilizam em suas redes digitais de relacionamentos gera uma superexposição

podendo colocar em risco a imagem e a integridade física do indivíduo. Para

bloquear os perigos da superexposição, algumas redes estão criando filtros que

permitam o bloqueio ao acesso de informações.

A internet possibilitou a simulação da realidade. Nela os sujeitos

podem viver os simulacros da realidade desejada, vestindo-se de uma determinada

identidade e livrando-se dela quando for conveniente. Segundo Baubrillard (1981), o

que sobrevive no mundo midiático, não é o real, mas o simulacro do real, ou seja, o

digital é um simulador do mundo real e cria no internauta a sensação de que ele é

um sujeito onipotente e onipresente capaz de vigiar, espiar, entrar e sair da Internet

sem ser percebido. Ainda segundo Baubrillard (1981), o ciberespaço só permite

simulações de interação e não verdadeiras interações. O internauta não acessa

narrativas da história real, mas apenas o simulacro de algo ao mesmo tempo

distante e próximo no espaço e no tempo.

O sujeito da internet vive em constante fluxo e, por meio de simulacros

do real, busca se constituir como um ser livre, original e dono de seu discurso.

Entretanto, ao observarmos a constituição identitária desse sujeito, vigiado por

múltiplos olhares, temos, assim como a AD defende, um sujeito não-livre, não-

original e que não é dono do seu dizer.

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Toda essa ilusão de liberdade, de onipotência (sujeito que tudo pode) e

onipresença (sujeito que pode estar onde quiser), gera consequências na

constituição da identidade do sujeito:

[...] desde achar que tudo pode ser comprado, inclusive o amor de uma pessoa e a própria felicidade, até não aceitar nenhuma derrota e chegar ao crime com a maior naturalidade: afinal, a vida do outro, como a sua, também passou pelo processo de objetivação (CORACINI, 2006, p.149).

A internet traz a ilusão de aproximação entre as pessoas, mas na

verdade, ela não afasta a solidão. Segundo uma matéria publicada por Schelp

(REVISTA VEJA, 8 jul. 2009, p. 94-102), uma pesquisa realizada por sociólogos,

psicólogos e antropólogos concluiu que as redes digitais de socialização, entre elas

o orkut, não conseguem suprir as necessidades afetivas mais profundas do ser

humano tornando-se um local de encontro de contatos superficiais. Apesar de serem

úteis, segundo o autor (idem), para manter amizades que foram separadas pelo

tempo ou distância e também para unir pessoas com interesses em comuns, as

redes criam amizades de “laços fracos”, superficiais, efêmeras. Como consequência,

o indivíduo tem a ilusão de diminuição da solidão social, quando na verdade há um

aumento da solidão emocional, da depressão e de isolamento.

Para Momesso (2009), com a posse do domínio das TICs, o sujeito

teria o “saber e o poder”62 que poderão, aparentemente garantir a sua sobrevivência

no mundo social, pessoal, profissional e ideológico. Esta parece ser a busca do

tradutor e intérprete contemporâneo para garantir a visibilidade de uma profissão e

de um profissional ainda pouco valorizado pelo mercado de trabalho.

Infelizmente, a chegada da Internet não resolveu e provavelmente não

resolverá o problema das desigualdades sociais, econômicas e culturais. E, uma das

grandes preocupações sobre a utilização das novas tecnologias refere-se ao

analfabetismo digital daqueles que estão excluídos da chamada sociedade da

informação e do conhecimento. Apesar dos discursos que circulam na mídia

mostrarem as novas tecnologias como democráticas e que estão em pleno processo

de acessibilidade, sabemos que o acesso de todos às novas tecnologias é um

processo demorado.

62 Segundo Foucault (2001), o homem está sempre em busca de ter o domínio do saber e do poder.

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Para Castells (1999) os grupos sociais disputam e usam as novas

tecnologias para servir ao poder. Desta forma, temos a expansão do poder apenas

para uma minoria, enquanto a grande maioria desfavorecida continuará à margem

dessa sociedade digital, principalmente na sociedade brasileira “caracterizada pela

modernidade tecnológica, mas com grande contingente de população com pouca ou

nenhuma escolaridade” (KLEIMAN & VIEIRA, 2006, p. 119). Longe de serem

inclusivas e de oferecerem iguais oportunidades de acesso a todos, as novas

tecnologias de informação e comunicação produzem desigualdades de

infraestrutura, de tecnologia, de conhecimento e de poder em nível global.

Encerramos nossas reflexões sobre o impacto das novas tecnologias

na identidade do sujeito, com as palavras de Coracini (2006, p. 154):

[...] neste líquido mundo moderno, então, teimar em permanecer arraigado ao passado só leva ao sofrimento, à frustração, à derrota. É preciso penetrar no mundo das transitoriedades, aprender a viver suas oscilações, mas para questionar mesmo aquilo que parece inquestionável, para que possamos, na medida do possível, usar a máquina a nosso favor e não ser simplesmente usados, dominados, transformados por ela, engolidos pelo vício pela avalanche da virtualidade.

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4 ANÁLISE DO ARQUIVO DIGITAL

É precisamente porque as identidades são construídas dentro e não fora do discurso que nós precisamos compreendê-las como produzidas em lugares históricos e institucionais específicos, no interior de formações e práticas discursivas específicas, por estratégias e iniciativas específicas. Stuart Hall.

O objetivo deste capítulo é apresentar e analisar os dados colhidos no

arquivo digital Tradutores/Intérpretes BR. Inicialmente, apresentamos o surgimento e

o funcionamento operacional do orkut, uma rede digital de socialização. Em seguida,

identificamos e refletimos sobre as práticas discursivas e identitárias destes

profissionais na referida comunidade, bem como seus efeitos de sentido.

4.1 DESCRIÇÃO DO OBJETO DISCURSIVO: A rede digital de comunicação e

socialização Orkut

Como mencionado anteriormente, com o advento da Internet, o homem

pôde reorganizar os mecanismos comunicacionais, favorecendo o surgimento de

novas formas de articulações sociais, de informação e cultura.

Lemos (2004, p. 21) afirma a presença das novas tecnologias em todas

as atividades e práticas contemporâneas:

[...] da mecânica à eletricidade, da microeletrônica, às nanotecnologias, a tecnologia propaga-se a uma enorme velocidade, infiltrando-se tanto em objetos do quotidiano como no corpo humano e [...] as novas tecnologias vêm se misturando ao nosso ambiente cultural de forma quase imperceptível, aproximando a tecnologia contemporânea do prazer estético e do compartilhamento social.

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Como exemplo dessa aproximação do prazer estético e do

compartilhamento social, podemos mencionar o orkut, com seus inúmeros perfis e

comunidades, objeto de estudo deste trabalho.

O orkut foi criado em 22 de janeiro de 2004, pelo engenheiro e

projetista turco Orkut Buyukkokten63 , durante os 20% da jornada de trabalho que a

empresa Google disponibiliza aos seus funcionários para realizarem atividades

relacionadas a algum projeto pessoal. Quando algum destes projetos é aprovado e

implementado, seu autor ganha um prêmio chamado “Founders” como forma de

incentivo ao funcionário criativo e inovador.

A criação do orkut deu-se devido à dificuldade que os calouros da

Universidade Stanford, local onde Orkut estudou pós-doutorado em Ciências da

Computação, tinham em fazer novas amizades, pois, segundo seu próprio criador,

os amigos eram feitos apenas no primeiro ano universitário e mantidos até se

formarem. Em uma palestra realizada no Brasil64, Orkut justificou esta dificuldade

afirmando que, “se você puxa conversa com uma menina, ela acha que é uma

cantada; se você fala com um cara, ele acha que você é gay!”.

Em 2001, Orkut criou sua primeira rede digital de relacionamentos, a

Club Nexus, para alunos da Universidade Stanford, e, em 2002, uma outra rede para

ex-alunos desta mesma universidade, a InCircle. Em 2004, já trabalhando no

Google, lançou o orkut, com o intuito de ser uma rede globalizada, ao alcance das

pessoas do mundo inteiro, mas sem a pretensão de que se tornasse uma das

maiores redes digitais de socialização mundialmente conhecida.

Segundo Coscarelli (2007), nos 5 primeiros meses, a rede contava com

2 milhões de usuários cadastrados e no ano de 2007, com cerca de 40 milhões.

Atualmente, possui mais de 68 milhões de usuários cadastrados, número que não

para de crescer.

Dos 68 milhões de usuários que participam desta grande rede digital

de socialização, o Brasil é o país com o maior número de usuários (49,71%),

superando inclusive os Estados Unidos da América, seu país de origem (20,47%).

Este fato resultou na criação de uma versão brasileira do orkut em abril de 2005. Em 63 Orkut Buyukkokten nasceu na Turquia, onde estudou na renomada Universidade Bilkent, em Ancara, tem pós-doutorado em Ciência da Computação na Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e desenvolveu o embrião do site nos bancos da universidade californiana, até ser contratados pela empresa Google de seus ex-colegas Sergey Brin e Larry Page. Disponível em: <http://www1. folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u97858.shtml>. Acesso em: 20 fev. 2008. 64 Disponível em: <http://vidageek.net/2007/04/13/palestra-do-orkut/>. Acesso em: 20 fev. 2008.

Page 90: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

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terceiro e quarto lugares estão a Índia (18%) e o Paquistão (0,90%),

respectivamente (Veja Anexo K).

Se considerarmos uma pesquisa realizada em 2007 pelo Núcleo de

Pesquisa, Estudos e Formação (Nupef) apontando que apenas 20% dos brasileiros

têm acesso à internet65, enquanto mais da metade da população americana a

possui, podemos inferir que o brasileiro apresenta uma "queda" pelo fácil acesso às

informações sobre outras pessoas (voyerismo), facilidade em adaptar-se às novas

tecnologias e gosto em fazer novas amizades, mesmo que de forma virtual.

O próprio criador do orkut, ao ser entrevistado pela Folha Online66,

após sua chegada ao Brasil em 2005, diz não ter idéia sobre o motivo da presença

maciça de brasileiros em sua rede:

Talvez seja cultural, tenha a ver com a personalidade de vocês, que são conhecidos como um povo amigável. Pode ser devido à própria característica do mecanismo de entrada no site (só pode se cadastrar quem receber um convite de um dos cadastrados). Eu tenho alguns amigos que têm amigos brasileiros, e assim foi se espalhando (DÁVILA, 2005).

Beth Saad, professora de Mídias Digitais da Escola de Comunicação e

Artes da Universidade de São Paulo, justificou a grande presença de brasileiros na

rede, pois “o brasileiro tem um espírito gregário, quer a casa cheia de amigos. No

orkut, faz a mesma coisa: convida o maior número de amigos possível” (SAAD apud

NOGUEIRA; TERMERO; LEAL, 2004, p. 98).

O orkut é uma rede digital de socialização, também chamada de rede

de relacionamento, filiada ao Google, com o objetivo de viabilizar as relações sociais

envolvidas em ambiente virtual por meio de perfis de usuários cadastrados e

comunidades virtuais.

Em seu texto de apresentação67 (Veja Anexo A), o orkut divulga a sua

“missão”: ajudar o usuário na criação de uma “rede de amigos mais íntimos e

chegados”, sejam eles, amigos que se separaram pela distância ou tempo, novos

amigos que tenham interesses em comum, pessoas que estejam procurando

65Dados fornecidos pelo Núcleo de Pesquisa, Estudos e Formação (Nupef) da organização não-governamental Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits). Disponível em <http://www. esta dao.com.br/tecnologia/not_tec50368,0.htm>. Acesso em: 20 fev. 2008. 66 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u97858.shtml>. Acesso em: 20 fev. 2008. 67 Disponível em: <http://www.orkut.com/About.aspx> . Acesso em: 20 fev. 2008.

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relacionamentos afetivos ou contatos profissionais tornando a vida social do usuário

mais “ativa e estimulante”.

A palavra missão confere à rede digital de relacionamento orkut o

poder para agir sobre, parece ser um discurso religioso de “catequização das novas

tecnologias”, tal como as Missões Jesuíticas que tinham por objetivo a criação de

uma sociedade cristã. Na contemporaneidade, cabe ao orkut, o poder de criação de

uma sociedade: a sociedade digital. A promessa do orkut em tornar a vida social

mais “ativa e estimulante” cria o efeito de afastamento de um dos grandes males do

ser humano: a solidão.

O orkut também apresenta um discurso libertário. Tal discurso pode ser

percebido quando os usuários são orientados a lerem o perfil dos futuros amigos

antes de se relacionarem com os mesmos, ou ainda, quando estimulados a criarem

e participarem, não apenas em uma comunidade, mas em várias comunidades,

enfatizando a mobilidade e o trânsito livre desses usuários. Todas essas ações

enunciativas parecem criar um efeito de sentido de desarraigamento,

desterritorização do sujeito no ciberespaço, liberdade de poder circular onde quer e

quando quer e da maneira que melhor lhe convier.

Na fase inicial, para participar do Orkut, o usuário precisava receber

um convite para tornar-se um membro participante. Nos primeiros meses, a ânsia

para fazer parte deste sistema fez com que serviços de e-commerce vendessem

convites para os interessados a preços inimagináveis, contrariando seu objetivo de

criar uma “rede de amigos mais íntimos e chegados”. Atualmente, o único requisito

exigido para o usuário fazer parte da comunidade é a criação de uma conta de e-

mail no Google.

A página pessoal é formada por dados que compõem o perfil do usuário

cadastrado, entre eles: foto ou imagem, auto-descrição (quem sou eu), informações

pessoais divididas em três categorias (social, profissional e pessoal), scrapbook

(página de recados), álbum de fotografias, arquivos de vídeos, lista de amigos, lista

de comunidades e depoimentos que podem ser acessados e visualizados por todos

os membros do orkut. Também possui espaço para divulgação de eventos, listagem

dos amigos aniversariantes do dia/semana, visualização das atualizações feitas nas

páginas dos amigos, entre tantos outros recursos.

No início desta pesquisa (março de 2007), qualquer usuário do orkut tinha

acesso irrestrito às informações de outros usuários. Desde fevereiro de 2009, o site

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vem desenvolvendo ferramentas que restrinjam a visualização de determinadas

informações que podem permanecer acessíveis apenas ao usuário proprietário do

perfil, aos amigos deste usuário, aos amigos dos amigos ou a qualquer membro do

orkut68, assunto que abordaremos mais adiante.

Ao preencher os dados no perfil, o usuário busca relatar a sua

identidade ou identidades tentando mostrar aos outros quem ele é e ao mesmo

tempo pode funcionar como uma forma de autocompreensão de si. Podemos pensar

que esse processo de reformulação de enunciados no perfil do orkut, funciona como

uma “técnica de si” (FOUCAULT, 1992) que o ajuda a transformar-se a si mesmo.

Seria um hypomnemata moderno, em que o sujeito busca sua identidade e se

constitui enquanto sujeito da contemporaneidade.

Um fator importante sobre o preenchimento dos dados do perfil refere-

se à constante reformulação destes campos por parte dos usuários, que, reformulam

sua subjetividade frente a novos acontecimentos, novas experiências. São trechos

de músicas preferidas, frases filosóficas, desabafos, perguntas retóricas, frases de

impacto, enfim, enunciados que delineiam comportamentos, estilo de vida, modos de

pensar e agir do usuário. Temos nesses sujeitos uma identidade fluida, líquida, pois,

mudam sob a influência das menores forças (BAUMAN, 2001), inclusive em função

do humor e dos acontecimentos cotidianos dos internautas.

Um outro fator importante relacionado ao preenchimento do perfil são

os chamados fakes, ou perfis falsos, pois muitos usuários criam mais de um perfil

por meio da abertura de contas diferentes, prática condenada pela política do site,

mas que não é cumprida na prática. Tal prática corrobora com o efeito de sentido da

mutabilidade, do não fixar-se, da fluidez constante que acompanha o movimento do

mundo virtual que se encontra sempre em transformação rápida e efêmera.

A criação de perfis de pessoas que se passam por outras está sujeita

ao encerramento de suas contas no orkut. A rede digital de relacionamento prega o

discurso da veracidade, da honestidade, da autenticidade a fim de que seus

usuários criem perfis verdadeiros, coerentes com a sua identidade offline69, caso

contrário, poderão ser punidos – um discurso autoritário cujo efeito de sentido é o

não mais pertencimento ao grupo. Entretanto, é comum o relato na mídia de artistas

68 Disponível em: <http://www.orkut.com.br/Main#html/pt-BR/privacy.orkut.html?rev=4>. Acesso em 19 de fevereiro de 2009. 69 Neste caso, offline tem o sentido de vida real em contraposição à vida virtual.

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e de pessoas anônimas sobre a criação de falsos perfis com os seus nomes É o

caso da atriz Mel Lisboa que, em artigo para a Revista Veja (SCHELP, 2009, p. 102),

denuncia a existência de um perfil falso, onde alguém está se passando por ela.

O que nos chama a atenção sobre a prática de falsos perfis é que

existe no orkut diversas comunidades que ajudam na elaboração e gerenciamento

de falsos perfis, que divulgam fotos ou sugerem nomes para serem utilizados nesta

prática, que proporcionam a troca ou permuta de falsos perfis caso o usuário esteja

cansado de seu fake, que discutem os motivos que levam o usuário a se utilizarem

desta prática. Por meio dos perfis falsos, o usuário pode construir uma identidade

idealizada, ou seja, um simulacro de sua identidade desejada aproveitando-se do

exercício livre de navegar na ilusão do anonimato e da impunidade pelas páginas do

orkut.

No orkut podemos encontrar dados estatísticos sobre o perfil de seus

usuários70 (Veja Anexo K), tais como:

1. Faixa etária: aproximadamente 54,58% dos usuários encontram-se

entre 18 e 25 anos de idade, representando a grande maioria; 13,58% entre 26 e 30

anos; 6,03% entre 31 e 35 anos; com porcentagem inferior a 4% encontram-se os

usuários acima de 36 anos de idade.

2. Estado civil: 55,83% dos usuários não declaram seu estado civil;

27,30% declaram-se solteiros; 8,99% casados; e 5,77% namorando. Os relaciona-

mentos ou casamentos abertos representam 1,85% e 0,21%, respectivamente.

3. Interesses dos usuários ao se cadastrarem na rede: 48,94% dizem

estarem interessados em fazer amigos; 15,05% procuram por companheiros para

diversas atividades; 16,16% buscam por namorados; 14,56% buscam contatos

profissionais.

Apesar da preocupação do site em apresentar informações sobre o

perfil de seu usuário, os dados não representam exatidão, pois, além dos perfis

falsos, mencionados anteriormente, no ciberespaço o usuário vive os simulacros da

realidade desejada preenchendo seus dados pessoais da forma que mais lhe

interessar. É importante observar que, devido à política do orkut em não permitir a

participação de menores, a opção para o preenchimento da idade inicia-se a partir

dos 18 anos. Sabemos que inúmeras crianças e adolescentes brasileiros possuem

70 Disponível em: < http://www.orkut.com.br/Main#MembersAll.aspx >. Acesso em: 15 jul. 2009.

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perfil no orkut e mentem a sua idade no preenchimento de seus dados pela

inexistência de uma opção verdadeira ou para simularem a maioridade sonhada, o

que vem a favorecer a construção da identidade do sujeito em uma cultura de

simulação onde é possível trocar as representações do real pelo seu simulacro.

Além disso, no ano de 2005, um boato dizendo que o usuário que se

declarasse ser de um outro país, que não o Brasil, obteria um sistema mais rápido e

livre de erros, fez com que muitos usuários brasileiros declarassem residir em outros

países, tornando os dados estatísticos sobre o orkut mais imprecisos.

Por todos estes motivos, seria impossível traçar o perfil do usuário do

orkut por meio do simples levantamento de dados oferecidos pelo site. O resultado

final daria margem a dúvidas e erros impossíveis de serem averiguados.

Após todo o processo de cadastro no Google e criação de um perfil, o

usuário pode, então, fazer parte de ou criar comunidades no orkut.

Em sua obra Comunidade, a busca por segurança no mundo atual,

Bauman (2003, p. 7) afirma que comunidade “sugere uma coisa boa: o que quer que

‘comunidade’ signifique, é bom ‘ter uma comunidade’, ‘estar numa comunidade’ [...].

Comunidade, sentimos, é sempre uma coisa boa”.

Porém, nesta mesma obra, o sociólogo polonês desconstrói a idéia

formada, que atravessa o imaginário coletivo, de que comunidade é o “paraíso

perdido” ou o “paraíso ainda esperado”, onde estaremos protegidos e a salvo.

Bauman (2003, p. 7) sugere que, na verdade, existe um preço a pagar pelo privilégio

de viver em sociedade:

[...] o preço é pago em forma de liberdade, também chamada autonomia, direito à auto-afirmação e à identidade e [...] não ter comunidade, significa não ter proteção, porém, alcançar a comunidade significa perder a liberdade (BAUMAN, 2003, p. 10).

A oposição entre liberdade e comunidade proposta por Bauman (2003)

deve-se, ao sentido que o autor atribui à noção de comunidade: uma rede de

compromissos de longo prazo, de direitos inalienáveis e obrigações inabaláveis, com

compromissos de “compartilhamento fraterno”.

Rheingold (1996, p. 20) um dos primeiros autores a utilizar o termo

“comunidade digital”, define-a como:

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[...] agregados sociais que surgem da Rede [Internet], quando uma quantidade suficiente de gente leva adiante essas discussões públicas durante um tempo suficiente, com suficientes sentimentos humanos, para formar redes de relações pessoais no espaço cibernético [ciberespaço].

Mais do que fóruns de discussão, as comunidades do orkut são redes de

interesse que possibilitam a socialização por meio do debate de temas. Elas

possuem uma imagem ou foto geralmente relacionada ao seu tema e um texto que

descreve seus objetivos e propósitos. São formadas pelo “fórum”, onde os membros

discutem um assunto proposto em cada tópico; por “enquetes”, cujo objetivo é colher

opiniões dos seus membros de forma quantitativa; por “eventos”, um espaço de

divulgação de cursos e encontros; por uma listagem de todos os “membros” que as

compõem; e por uma listagem de comunidades relacionadas. O usuário do orkut

pode ingressar em qualquer comunidade, desde que aceito pelo moderador, quando

moderada, bem como se desvincular delas quando desejar.

O universo de comunidades no orkut é imenso. Existem comunidades

com os mais diversos propósitos e diferentes graus de participação de seus

membros.

Lemos (2002) diferencia dois tipos de comunidades digitais: aquelas

em que existe um sentimento de afinidade subjetiva, cujo compartilhamento de

interesses, emoções e trocas de experiências por meio das discussões são de

extrema importância para a união do grupo, chamadas de “comunidades virtuais” e

aquelas que funcionam como lugares de passagem onde os membros colocam

informações para serem lidas, mas sem o intuito de discussão, de interação, meros

serviços de informações, as “agregações eletrônicas”.

Um grande número de membros não assegura um grande número de

discussões e debates. Muitos membros sequer fazem comentários sobre os temas

discutidos agindo por meio de uma observação silenciosa ou para que elas

apareçam em seu perfil como forma de exibição de seus gostos, de suas convicções

culturais, religiosas, políticas. Cria-se nesses sujeitos a sensação de “estar lá”, de

pertencimento ao grupo.

Devido ao grande número comunidades digitais no orkut, algumas

críticas vêm sendo feitas sobre a criação de múltiplas comunidades sobre um

mesmo tema. Beth Saad (apud COSCARELLI, 2004) afirma que:

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A idéia original é a de juntar comunidades mundiais gigantescas para debater determinados temas, mas o que se encontra lá são várias pequenas comunidades sobre o mesmo assunto brigando entre si. A própria ECA é um exemplo disso. Existem quatro ou seis comunidades que se auto-intitulam ECA, mas nenhuma delas se lembrou - ou quis - se unir à outra.

Estas comunidades, muitas vezes, estão conectadas entre si pela

presença de membros em comum. Geralmente, apresentam um certo grau de

rivalidade tanto em relação ao número de membros que as compõem quanto ao

número de discussões propostas.

Uma vez que o usuário pode ingressar em qualquer comunidade,

desde que aceito pelo mediador, quando moderada, ele também pode se

desvincular delas quando desejar. O fato do sujeito do orkut desfrutar de uma

aparente liberdade incondicional, torna-o “isento de uma responsabilidade social em

relação ao seu grupo local” (KLEIMAN; VIEIRA, 2006, p. 122), pois ele pode a

qualquer momento se mover para outro lugar mais favorável a seus propósitos. Para

Bauman (1998, p. 16), aquele que for livre para fugir da localidade é livre para

escapar das consequências de suas ações.

Ao contrário das comunidades, em seu sentido sociológico, cujos

membros eram ligados por responsabilidades mútuas e objetivos comuns, vemos, no

orkut, a proliferação de “comunidades estéticas” (BAUMAN, 2003) que não

postulam vínculos coletivos, nem compromissos com o outro, nem mesmo um laço

de união permanente. São comunidades voltadas a interesses específicos. São

comunidades flexíveis, para sujeitos flexíveis da modernidade líquida. A metáfora da

fluidez de Bauman (2001) adéqua-se perfeitamente a elas.

Por outro lado, autores como Fernback e Thompson (1995) acreditam

que as comunidades virtuais possam gerar grupos de interesses reais e duradouros

uma vez que seus membros se reúnem por interesses comuns e não por mera

agregação geográfica, histórica ou de origem étnica.

Os principais problemas relacionados ao orkut não estão ligados ao

site em si, mas aos danos causados pelas informações que ali circulam: usuários

que agem de má fé, falsos perfis (fakes), divulgação de comunidades ilegais (apoio à

pedofilia, ao preconceito, crimes digitais, falsidade ideológica, calúnia, difamação,

injúria, neonazismo, intolerância religiosa, venda de drogas e receitas médicas,

incitação ao crime, formação de quadrilha), entre tantos outros.

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Em março de 2006, o Ministério Público de São Paulo pediu à Justiça

Federal a quebra de sigilo de centenas de usuários brasileiros do orkut devido a

informações sobre crimes praticados dentro do serviço do Google, sendo eles:

pornografia infantil, ódio racial, venda de drogas e de medicamentos sem receitas.

Segundo o GARRA (Grupo Armado de Repressão a Roubos e

Assaltos), uma das divisões de elite da Polícia Civil do Estado de São Paulo, alguns

sequestros no Brasil já foram realizados com a ajuda de dados obtidos no orkut. Os

bandidos apropriam-se de dados e fotos das eventuais vítimas disponibilizados em

seu perfil, estudam os ambientes que elas frequentam, monitoram conversas via

scraps (mensagens trocadas pelos usuários), estudam o círculo social e seu padrão

de vida a fim de planejar sequestros e falsos sequestros.

As informações contidas no perfil do usuário, seus amigos e suas

comunidades podem ser acessadas e visualizadas por todos os usuários do orkut. A

exposição torna-se imanente. Desta forma, esta rede funciona como um grande

banco de dados sobre o usuário. Porém, grande parte dos usuários não tem

consciência de que o ambiente virtual é tão controlador quanto o real, e muitas

vezes mais perigoso.

Segundo Bauman (2001, p. 16), ao contrário da era do panóptico, em

que poucos observavam muitos, estamos vivendo a era do sinóptico, em que muitos

observam poucos O orkut, com seus perfis e comunidades virtuais, é um exemplo de

sinóptico de observação de múltiplos olhares sobre o indivíduo.

Caldeira (2005), jornalista e editor do site Bem na Internet, descreve o

preço que se paga pelo pertencimento a uma rede digital de socialização - a

superexposição:

Sequestradores (longe de mim, porque dinheiro é o que eu menos tenho) ou possíveis interessadas em minha pessoa, logo descobrirão muitas informações acerca de mim, acessando o meu perfil ou vasculhando as comunidades as quais faço parte no 'orkut'. Vão saber que já estudei no IEC e na PUC, que nasci no dia 27 de agosto, que gosto do x-tudo do Trimano`s, que tenho fobia de barata, que odeio falsidade, traição e "toquim" de 3 segundos no celular, que me irrito para achar a ponta do durex, que adoro horário político, que durmo com dois travesseiros, que amo a minha mãe, que amo Montes Claros, que escuto MPB e forró, que quem eu quero não me quer, que eu sobrava na Educação Física na escola, que 'Werther', de Goethe, é meu livro de cabeceira (salve as discussões de alto nível que correm na comunidade deste clássico do Romantismo) e tantos outros passos de minha vida.

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Segundo Coracini (2006, p. 144):

[...] penetrar na intimidade de outros é uma maneira de penetrar na própria intimidade, na medida em que nos assemelhamos ao outro ou na medida em que o outro nos constitui (o outro com cujos traços nos identificamos).

Em seus primeiros discursos, o orkut apresentava-se como uma ‘rede

de amigos confiáveis” ou “rede íntima de amigos” onde “todo mundo conhece

alguém” e, ainda hoje, continua confiável para muitos usuários. A necessidade de

convite para o ingresso à rede e de cadastramento de informações pessoais e até

mesmo a presença de uma foto opunha-se à idéia de anonimato, presente em outra

rede que existia na época – o chat. Parecia haver um certo grau de constrangimento

entre os usuários caso as informações apresentadas no orkut não correspondessem

à verdade, uma vez que, para estar naquele espaço era necessário ter sido

convidado. Pregava-se valores como a intimidade e a confiabilidade o que dava

uma aparente segurança ao orkut.

Passados 5 anos, o convite foi substituído pela criação de uma conta

no Google e, os discursos de confiabilidade como forma de segurança deram lugar

a privacidade de informações como garantia de segurança. Para evitar os perigos

da superexposição gerados pelo excesso de informação na rede, o orkut vem

criando filtros que permitam que o usuário bloqueie o acesso de algumas

informações, como por exemplo, o bloqueio da visualização de recados para

aqueles que não são amigos. Também existem as políticas de privacidade e

segurança disponíveis no menu de navegação do site tais como “proteção e

segurança”71 e “conselhos para os pais”72. Alguns usuários estão adotando o

apagamento de recados postados no scrapbook como forma de controle e

preservação de sua intimidade.

O preenchimento das informações pessoais no perfil não é obrigatório

e, as informações ali colocadas, são de responsabilidade do usuário - cabe a ele

preservá-las. Uma vez exposto, todos os dados do usuário (suas fotos, os lugares

que frequenta, as pessoas com quem se relaciona às mensagens trocadas) podem

ser visualizados e compartilhados por todos. Podemos observar um certo

71 Disponível em: < http://www.google.com/support/orkut/bin/answer.py? answer=48579 &hl= pt-BR&p =About. aspx >. Acesso em: 14 jul. 2009. 72 Disponível em:< http://www.google.com/support/orkut/bin/answer.py?answer=48664 >. Acesso em: 14 jul. de 2009.

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exibicionismo e narcisismo no sujeito líquido-moderno. Até mesmo no Orkut que

deu seu nome à rede digital que criou. Vivemos a sociedade do espetáculo que dá

ao sujeito a sensação de liberdade ao expor a sua intimidade construindo “a ilusão

de que a vida é um espetáculo para ser assistido e vivido” (CORACINI, 2006, p.

145).

Independente das questões de privacidade, vigilância e segurança, o

número de usuários que utilizam o orkut cresce a cada dia com o intuito de

reencontrar amigos, ampliar o círculo social, criar redes de interesses.

Cresce também, o número de redes semelhantes ao orkut, é o caso do

Twitter, a segunda rede mais popular entre os brasileiros (SCHELP, 2009), o

Facebook, a maior de todas as redes do mundo (SCHELP, 2009), o Linkedin, uma

rede digital para contatos profissionais, o Beltrano, o Gazzag, o Multiply, entre

tantos outros, que possuem layout e navegação bastante parecidos.

Um dos fatores que contribuíram para a explosão do orkut refere-se à

facilidade em seu manuseio. Trata-se de uma rede extremamente amigável aos

usuários, ou seja, fácil de ser manuseada, o que o torna sedutor ao usuário. Soma-

se a isso o livre acesso ao perfil de todos os usuários, o gerenciamento de seus

contatos, a autonomia para criar, aderir ou excluir-se de qualquer comunidade, a

atribuição de valores a outros membros (testemunho ou karma), tornaram o orkut a

“sensação do momento”.

Além disso, na contemporaneidade, aquele que não tem o saber e o

poder sobre a tecnologia computacional e sobre o ciberespaço está cada vez mais à

margem da sociedade e corre o risco de ser excluído da sociedade da informação e

do conhecimento.

Padilha (2003) afirma que “a Internet, ícone máximo do mundo

globalizado, é o divisor de águas do nosso tempo. A quem está dentro, tudo! A quem

está fora, nada!”.

Tudo isso gera no sujeito não só o desejo de pertencimento a um

mundo pós-moderno, mas também, o desejo de ser detentor do poder tecnológico, a

fim de torna-se um ser virtual, ligado a outros sujeitos virtuais semelhantes.

Só o tempo dirá se o orkut será apenas mais um modismo como o ICQ,

o IRC, o MSN, redes digitais que tiveram seu número de usuários reduzido ou

estagnado ao passar a fase de novidade.

Page 100: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

99

Provavelmente, novas formas de socialização surgirão, mas o orkut

continuará significativo por ter inaugurado uma rede digital de socialização que

quebrou as barreiras de tempo e espaço propiciando a socialização de um grande

número de pessoas em espaço global.

Fizemos todo esse panorama do orkut para salientar que a comunidade

analisada insere-se numa aura de modernidade, de adaptabilidade, de saber e

poder sobre as novas tecnologias, um lugar desterritorializado que (re)cria discursos

e subjetividades.

4.2 AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E IDENTITÁRIAS DO TRADUTOR E

INTÉRPRETE NA COMUNIDADE TRADUTORES/INTÉRPRETES BR

A noção de prática discursiva, ponto de partida para a reflexão sobre a

comunidade Tradutores/Intérpretes BR, como já vimos, encontra-se em Foucault e

Pêcheux.

Retomando o conceito de Foucault (1987, p.133) para quem a prática

discursiva constrói um saber e pode definir-se pelo saber que ela forma, buscamos

nas práticas discursivas na comunidade Tradutores/Intérpretes BR perceber como

os discursos constituem os tradutores e intérpretes líquido-modernos que vivem

entre simulações, simulacros e utopias.

Na modernidade líquida, Bauman (2007) afirma que a vida é feita de

consumo e de descarte daquilo que não tem validade, inclusive da identidade. Para

alguns autores como Hall (2002) e Giddens (2002), devido às novas tecnologias,

estamos vivendo em meio a uma “crise de identidade”, onde as identidades

estabilizadas se encontram em declínio deslocando o sujeito de seu lugar do mundo

o que resulta em sua fragmentação.

Assim, em meio às crises de identidade e fragmentação do sujeito, a

busca pela identidade segue dois caminhos antagônicos: ser um sujeito livre das

amarras sociais ou pertencente a um determinado grupo (BAUMAN, 2007).

Refletir sobre a identidade neste contexto torna-se relevante. Segundo

Bauman (2007), ao nos deparamos com as incertezas e as inseguranças da

“modernidade líquida”, nossas identidades sociais, culturais, religiosas, sexuais e

profissionais sofrem um processo de contínua transformação, pois os sentimentos

Page 101: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

100

de identidade e pertencimento não são definitivos nem sólidos, mas negociáveis e

revogáveis, ou seja, tudo depende das decisões que o indivíduo toma, do caminho

que percorre e da maneira como age. O mesmo pode ser observado com a

identidade dos usuários do orkut, entre eles os tradutores e intérpretes, pois

participam de um espaço propício para as negociações e revogações das

identidades que podem mudar conforme o indivíduo precisa e deseja.

Desde a publicação do primeiro livro sobre tradução no Brasil, Escola de

Tradutores, em 1952, e posteriormente, a criação dos primeiros cursos de

graduação em tradução na década de 1970, bem como, os inúmeros encontros,

congressos e publicações de revistas especializadas vinculadas aos cursos de pós-

graduação (mestrado e doutorado), os tradutores buscam refletir sobre as teorias da

tradução aplicadas à sua prática tradutória em diferentes contextos. Os discursos ali

produzidos se encontram na ordem do dizer acadêmico: um sujeito formado,

qualificado, ligado à academia e à pesquisa, reconhecido pelo mercado de trabalho.

Essa prática discursiva dos tradutores e intérpretes, até então

presentes em periódicos e revistas especializadas sobre tradução, anais de eventos

(encontros, congressos), prefácios de obras traduzidas e livros passam, com o

advento da internet, a ser encontrado em ambientes digitais (blogs, comunidades no

orkut, homepages de tradutores e de agências de tradução).

No entanto, no ambiente virtual, os discursos ali presentes parecem ser

produzidos na ordem do dizer mercadológico com questões sobre a produtividade, o

preço, o prazo, o local e as condições de trabalho. São poucas as situações, em que

se observam discursos focados na formação profissional.

Se antes tínhamos os teóricos da tradução refletindo sobre sua prática

tradutória temos agora o mercado de trabalho direcionando tais reflexões.

Entretanto, estes discursos, sejam eles tradicionais ou tecnológicos, da academia ou

do mercado de trabalho, manifestam uma memória discursiva, resultado de

discursos anteriores que, também é constituída de esquecimentos e silêncios:

saberes sócio-histórico-ideológicos que se armazenam em cada história e que, no

jogo discursivo do ir e vir, resgatam sentidos antigos e produzem novos efeitos

nestes sentidos, segundo as posições sustentadas por quem produz e por quem

recebe o texto.

Passamos, agora, a analisar as práticas discursivas e identitárias

presentes em espaço virtual. Os efeitos de sentido decorrentes das práticas

Page 102: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

101

discursivas recorrentes serão analisados no tópico a seguir. Tomamos como corpus

para nossa pesquisa a comunidade Tradutores/Intérpretes BR integrante da rede

digital de socialização orkut.

Criada em 30 de abril de 2004, apenas 3 meses após o surgimento do

orkut, é a mais antiga e maior comunidade de tradutores e intérpretes brasileiros

constituída por 8.820 membros. É uma comunidade moderada, ou seja, possui um

dono e outros 5 moderadores encarregados de analisar o conteúdo das mensagens

postadas e de tomar decisões, tais como, aceitar ou recusar a adesão de novos

membros, apagar comentários inadequados à política da comunidade e banir

membros indesejados ou que não se adequam as regras estabelecidas pelos

moderadores da comunidade.

No início do orkut, cada comunidade possuía apenas um dono ou

moderador. Mas, em abril de 2008, foi criada a possibilidade de se ter até dois donos

(co-proprietários) e 10 moderadores para tomarem decisões em conjunto. Estes

múltiplos moderadores garantem que a comunidade continue ativa caso o perfil do(s)

dono(s) seja comprometido ou excluído do orkut devido à invasão de crackers.

Nesta análise, utilizaremos a palavra moderadores para designar tanto

o dono, quanto os outros 5 moderadores da comunidade analisada.

Como todas as comunidades do orkut, a composição é:

1 Cabeçalho de navegação da comunidade:

2 Corpo da página: comunidade propriamente dita:

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3 Rodapé de navegação do site do orkut e Google:

A comunidade utiliza as cores padrão do orkut: tonalidades de azul e

branco, o que corrobora para a construção de uma identidade visual do orkut.

Segundo Rousseau (2002), no estudo da linguagem das cores, toda cor pode se

resumir a uma sensação. A cor azul é comumente associada ao céu, ao ar, “a uma

idéia de elevação, de leveza, de esferas inacessíveis, ao menos pelo corpo” e a cor

branca, a reunião de todas as cores, simboliza a própria luz evocando “os lugares

altos, que parecem nos aproximar do céu” (ROUSSEAU, p. 37-38;107-108).

O jogo de cores azul e branco sugere a construção de uma prática

discursiva simbólica caracterizada pela própria navegação que o suporte oferece, ou

seja, a elevação a lugares altos e distantes, até então inatingíveis pelo ser humano –

o ciberespaço.

Seu layout é composto por 7 módulos. Apresentamos, em cada um

deles, as principais práticas discursivas e identitária.

1. Módulo menu de navegação - composto por foto ou imagem, número de membros e links de opções de comandos:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030273

73 Acesso em: 15 jul. 2009.

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Foi escolhida como imagem representativa da comunidade a figura de São

Jerônimo, santo católico, tradutor da vulgata, a tradução oficial da bíblia do grego

antigo e hebraico para o latim, por isso, escolhido o padroeiro dos tradutores cuja

data é comemorada no dia 30 de setembro. Nesta imagem, São Jerônimo encontra-

se debruçado sobre uma mesa, ar compenetrado, provavelmente, traduzindo. Tal

prática discursiva parece sugerir que seus moderadores querem receber os

membros da comunidade com o efeito de sentido de lugar sagrado, pois está

protegido e amparado pela benção de seu padroeiro. A imagem de São Jerônimo

também pode evocar a Oração a São Jerônimo:

Ó Glorioso São Jerônimo, na preocupação desta vida, nós elevamos o nosso pensamento a ti que estás na glória de Deus. Tu que passastes a vida nos estudos dos livros sagrados, chamastes as pessoas à fonte da verdadeira sabedoria, nós filhos deste século conturbado, fervoroso, imploramos o teu patrocínio contra todos os perigos. Incentivai-nos e guiai-nos na procura da verdade e da justiça e fazei com que lendo as escrituras sagradas, possamos transmiti-las e traduzi-las em palavras e em gestos da nossa vida. Amém.

O discurso religioso representa a busca pela verdade, o desejo de fidelidade

do tradutor, pois, traduzir é ser fiel a algo (ao texto, ao autor, à sua intenção, à

cultura, ao contexto, à língua do texto) uma tradicional “auto-representação do

tradutor e de sua tarefa” (Coracini, 2007, p. 184-185). Além disso, representa

também o discurso da fé de que todos naquele espaço serão embuídos da

“verdadeira sabedoria”, estarão livres do perigo (que pode ser do descarte do

mercado de trabalho, da falta de competência, da competição e de ser passado para

trás), pois os moderadores são aqueles que estão autorizados a guiar, em nome do

padroeiro, seus seguidores (participantes da comunidade) para vencer num mundo

cruel e exigente. Tal prática discursiva parece acalmar a insegurança, pois, aliados

às novas tecnologias os sujeitos não se encontram mais sós, pertencem ao grupo

dos tradutores - mas não qualquer grupo, um grupo protegido pela ação divina.

Podemos também inferir que a imagem sugere que a ação da tradução deva

espelhar-se nas ações e na prática de seu padroeiro e que, naquele lugar virtual, a

prática tradutória segue as regras ditadas ou a ordem discursiva ditada pelo santo

padroeiro.

Page 105: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

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2. Módulo principal - composto pelo nome da comunidade, sua descrição e alguns

dados de identificação.

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030274

Observamos, no nome da comunidade, um discurso nacionalista da

língua portuguesa do Brasil em contraposição à língua portuguesa falada em outros

países como Portugal, Angola, Cabo Verde, Moçambique, Guiné-Bissau, Macau,

São Tomé e Príncipe, Timor-Leste, entre outros. O negrito parece ter sido utilizado

como estratégia discursiva para enfatizar a língua utilizada pela comunidade, o

português do Brasil. É um discurso atravessado pela memória discursiva das

diferenças de vocabulário, pronúncia e sintaxe do português falado no Brasil e em

outros países. Independente do Acordo Ortográfico como tentativa de unificação

entre essas línguas, a comunidade reforça o discurso das diferenças entre elas.

A comunidade tem por objetivo o “debate sobre formação profissional,

cursos, mercado, ferramentas, terminologia, remuneração, teoria...”. É um enunciado

74 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 106: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

105

marcado pelo discurso acadêmico (formação profissional, cursos e teoria) que o

inicia e o finaliza (talvez este seja seu objetivo principal) e pelo discurso do mercado

de trabalho (mercado, ferramentas, terminologia, remuneração) localizado entre o

início e o final do discurso acadêmico (talvez, seu objetivo secundário). Também

podemos inferir uma busca pela junção de ambos, teoria e prática.

O uso das reticências expressa a linguagem informal com marcas

textuais da oralidade, comum no meio digital, abrindo um campo de possibilidades

de assuntos a serem debatidos.

Apesar do módulo principal ser um espaço destinado à descrição

temática da comunidade, ele foi utilizado pelos moderadores para a apresentação de

regras de conduta. A presença das condicionais e do imperativo carrega traços de

um discurso autoritário, ou seja, os moderadores pretendem que todos os membros

da comunidade, principalmente os novatos, leiam e obedeçam as regras ali contidas

para que haja um bom funcionamento da mesma.

Dois links corroboram para que haja o desejado bom funcionamento da

comunidade, principalmente, por parte de membros novatos, são eles, “FAQ”

(Frequent Asked Questions), uma compilação das discussões mais freqüentes (veja

Anexo G) e “mais detalhes do funcionamento”, as regras gerais da comunidade

(Veja Anexo F).

O tópico central, todo em negrito, é dirigido aos sujeitos não-tradutores,

possíveis clientes, que possam vir a freqüentar a comunidade. Ele enfatiza o

discurso econômico de que tradução, apesar da não regulamentação, é uma

atividade profissional que requer remuneração. O tópico seguinte, “se precisa de

traduções remuneradas, deixe sua mensagem e inclua o par de línguas”, dá ênfase

ao discurso econômico anteriormente enunciado e direciona o cliente ao local para o

qual se deve dirigir (fórum) descartando a necessidade de leitura das normas gerais.

Ao enunciar “pense duas vezes antes de postar: o apagamento de

mensagens é desaconselhado pelos moderadores”, ainda por meio de discurso

autoritário, os moderadores anunciam uma tentativa de dominarem a proliferação de

discursos contrários às normas da comunidade.

A localização destas informações, bem como o uso do negrito, da cor

azul dos links e da disposição dos textos em forma de tópicos são estratégias

discursivas de autoridade que colaboram para que ocorra uma leitura prévia destas

informações.

Page 107: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

106

O que nos chama a atenção sobre os moderadores da comunidade é

seu anonimato. Todos eles utilizaram como estratégia discursiva nomes fictícios

(Mod..., Moderatrix, P, !, Sr. Imoderado, :8) e perfis falsos de moderadores. Apesar

dos alguns dos nomes remeterem à sua função (moderar a comunidade), são

sujeitos que tomam as decisões escondidos sob o véu do anonimato a fim de não

serem cobrados pelas decisões tomadas (não aceitar novos membros, apagar

comentários, banir membros da comunidade). É um discurso autoritário sem face. O

discurso do anonimato dos moderadores contraria o discurso da veracidade e da

amizade preconizados pelo orkut: “a criação de perfis verdadeiros”, “rede de

amigos”, “onde todo mundo conhece alguém”.

A respeito da privacidade sobre as informações contidas na

comunidade, não há restrições para que não-membros naveguem pelos conteúdos e

discussões promovidas. Se por um lado há a liberdade de visualização do discurso

que nela circula, por outro lado, o mesmo é controlado pelos moderadores na

intenção de delimitar a produção de sentidos.

3. Módulo membros - composto pelo perfil pessoal de cada membro da

comunidade. Possui um link que possibilita a visualização de todos os membros.

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030275

É neste espaço que a comunidade “mostra a sua cara”, como uma

forma de divulgar quem são os tradutores e intérpretes brasileiros da 75 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 108: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

107

contemporaneidade. São diversas faces de um povo miscigenado por raças, línguas

e cultura. A maioria dos perfis dos tradutores são fotos de rostos sorrindo num gesto

de alegria e descontração.

Coracini (2007, p. 186-188) afirma que o tradutor se define pela tarefa

e pelo trabalho e que auto-representa sua prática como: “traduzir é sentir prazer”:

Prazer na mastigação, na fermentação, na digestão, para que o texto seja penetrado ou penetre, passe pelo corpo e faça sentido provocando identificações no sujeito e permitindo-lhe prazer, gosto, gozo..., que advém da dor, do sofrimento do trabalho..., numa espécie de masoquismo. Em seguida, a ânsia de perfeição que remete à ânsia de fidelidade manifestada pelo número de leituras feitas [...], pelas consultas a dicionários [...], pela anotação dos ‘possíveis problemas’, enfim, por uma metodologia de trabalho fortemente linear que observa, diagnostica, pesquisa, prevê (problemas), busca soluções. [...] Prazer que remete ao desejo de origem do sujeito enunciador, de ser a origem de algo [...]. Euforia advinda da mistura entre esforço e reconhecimento.

Ao fazer uso de uma fotografia sorridente, o sujeito constrói uma

imagem de si de alegria e contentamento, portanto, as fotos enunciam um discurso

sincrético, figurado pelo verbal e não verbal, de um sujeito feliz pelo lugar que

ocupa.

4 Módulo comunidades relacionadas - composto por link para outras

comunidades com tema em comum.

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030276

76 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 109: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

108

Neste espaço o discurso da credibilidade se materializa por meio do

sincretismo de imagens de outras comunidades de temas relacionados à tradução e

interpretação. As comunidades em questão são numerosas, porém menores,

abordam temas complementares, mas não idênticos, e, aparentemente, não

representam rivalidade ou ameaça à comunidade Tradutores/Intérpretes BR. A

utilização de links em sites é uma forma de ter a credibilidade atestada. O mesmo

ocorre com a comunidade analisada que teve sua credibilidade atestada por outras

comunidades, inclusive de um conceituado centro de treinamento profissional da

cidade de São Paulo, a Alumni.

Vale ressaltar que são os moderadores que escolhem quais

comunidades adicionar, o que funciona como um discurso autoritário que busca

dominar a proliferação de discursos.

5 Módulos enquetes - composto por perguntas postadas pelos membros da

comunidade cujo objetivo é colher opiniões de forma quantitativa que podem ser

comentadas. Possui links para a criação de novos tópicos para enquete, para a

denúncia de spam e para a visualização de todas as enquetes já realizadas.

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030277

O módulo enquetes, em seu formato completo, é composto por uma

página com 24 enquetes que foram realizadas no período de 29 de março de 2007 a

77 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 110: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

109

2 de fevereiro de 2009 organizadas em ordem cronológica de postagem. Seis delas

encontram-se encerradas para votação e as demais permanecem abertas.

O resultado de uma enquete permanece visível aos membros da

comunidade, mesmo quando encerrada.

Algumas vezes, é deixado à mostra no corpo da comunidade, como no

exemplo a seguir:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030278

Analisamos o enunciado das 24 enquetes a fim de buscar os discursos

circulantes neste espaço.

A maioria dos enunciados revela dois lugares discursivos: mercado

de trabalho e prática profissional. Foram enunciadas questões sobre produtividade

(média de palavras traduzidas por dia), remuneração (preço cobrado, salário

mensal), local de trabalho (casa, empresa, agência própria), filiações (sindicatos e

associações), área de atuação (tradutor, intérprete, ambos), tipos de traduções

realizadas (literária, técnica, juramentada), aspectos positivos (aprendizado de

línguas, satisfação profissional) e negativos (honorários não recebidos, oscilação na

oferta de serviço, dores causadas pelo excesso de trabalho) da profissão e

tecnologia (utilização de memória de tradução).

Em nenhum momento foi utilizado o discurso acadêmico da teoria

(presente na descrição da comunidade) como embasamento para a prática

78 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 111: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

110

tradutória e apenas um enunciado refere-se ao nível de qualificação destes

profissionais (pós-graduação, graduação, ensino médio). Se persarmos que, até

mesmo o que não é dito tem significado, os enunciados reforçam uma memória

discursiva na qual “o mercado de trabalho requer pouca teoria e muita prática” ou

ainda “é a prática que garante a sobrevivência do tradutor”.

Um enunciado nos chamou atenção pelo fato de ter sido a enquete

mais votada: “você já visitou algum país onde se fala o idioma com o qual você

trabalha?”.

71% dos membros afirmaram conhecer o país da língua estrangeira

com a qual trabalham. Ao afirmar ter visitado um país estrangeiro, o tradutor cria a

ilusão de status e maior competência linguística sobre os demais membros da

comunidade. A expressiva votação confirma “o desejo da língua do outro que,

ilusoriamente, é perfeita” (CORACINI, 2007, p. 193).

Ainda na enquete, dois enunciados expressaram interesse sobre a relação

entre a participação dos membros e a comunidade, são eles: “Desde quando você

frenquenta esta comunidade” e “Você participa desta comunidade?”. Diante da

exposição da frequência e da participação constrói-se o discurso do pertencimento,

do fazer parte, não apenas como ouvinte, mas como membro atuante que colabora

com as discussões propostas. Isso estabiliza a rede social e cria os vínculos que

fortalecerão a durabilidade ou não dessa comunidade virtual. Como também pode

criar o status por determinado grupo ser participante ativo ou não.

6 Módulo eventos - composto por uma listagem de cursos e encontros postados

pelos membros da comunidade. Possui links para a criação de novos eventos,

para a denúncia de spam e para a visualização de todos os eventos postados.

Eventualmente, é deixado à mostra no corpo da comunidade.

Page 112: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

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Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030279

Neste espaço o discurso presencial se materializa na possibilidade da

socialização sair do virtual em direção ao real, ou, para Lévy (1996, p. 16), em

direção ao atual80. É o desejo do contato face-a-face, de desvendar os simulacros

presentes nos perfis dos amigos virtuais, de compartilhamento de momentos felizes

(aniversários, congressos, encontros), muitas vezes chamados de orkontros. Além

disso, serve também como forma de marketing e divulgação dos locais e instituições

que promovem o evento.

7 Módulo fórum - composto pelos tópicos destinados à discussão por ordem de

postagem. Possui links para a criação de novos tópicos para discussão, para a

denúncia de spam e para a visualização de todos os tópicos postados.

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030281

79 Acesso em: 15 jul. 2009. 80 Segundo o autor, o termo ‘virtual’ não pode se opor ao ‘real’, mas sim a ‘atual’. 81 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 113: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

112

O módulo fórum, em seu formato completo, é composto por 137

páginas com uma média de 50 tópicos por página, contendo, aproximadamente,

cerca de 6.850 tópicos postados no período de 14 de junho de 2004 a 18 de julho de

2009.

Em meio à grande multiplicidade de enunciados, passamos a olhar os

tópicos, em busca do trajeto temático proposto para esta dissertação: a questão da

formação profissional, seja ela, acadêmica ou informal.

Como mencionado anteriormente, apesar da ausência de

regulamentação, existem inúmeros cursos de formação profissional, acadêmicos ou

livres, que formam tradutores para um mercado de trabalho que não exige tal

formação, além disso, esta também parece ser uma preocupação da comunidade

em seu enunciado de descrição (“formação profissional”, “cursos” e “teoria”).

Também já mencionado, o fato destes enunciados ocuparem uma

posição de relevância (primeiro, segundo e último elementos no discurso), poderia

ter o efeito de sentido de que o objetivo principal da comunidade é a discussão da

formação profissional por meio de cursos (livres) e teorias (academia), colocando o

mercado de trabalho em segundo plano, ou, ainda, que a comunidade busca a

junção entre formação (cursos e teoria) e mercado de trabalho (prática) pois, o

enunciado “mercado, ferramentas, terminologia, remuneração” encontra-se entre

“formação” e “teoria”. Buscamos, no discurso dos tradutores e intérpretes postados

no fórum de discussão, resposta a esta indagação.

Iniciamos nossa busca por enunciados que trouxessem a idéia de

cursos contribuindo para a formação de tradutores e intérpretes. Observamos que

inúmeros cursos são oferecidos aos membros da comunidade por meio do fórum.

Dois discursos foram recorrentes a esta busca: o discurso publicitário e o discurso

informativo. Com o intuito de ilustrar tais discursos, selecionamos os seguintes

recortes:

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Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030282

No recorte acima, o enunciador que faz a divulgação de um curso de

língua portuguesa gratuito utiliza o discurso publicitário como forma de marketing

(pessoal ou institucional). Seu enunciado atesta a credibilidade de um curso o qual

conhece, estudou ou ministra conteúdo.

Em enunciados de discurso publicitário, observamos que pouca

discussão é gerada. Geralmente é apresentada em 3 situações diferentes: quando o

enunciador busca outras informações que não foram mencionadas sobre o curso tais

como preço, local, data, pré-requisitos, entre outros; quando o enunciador questiona

o enunciado como forma de atestar sua participação ativa no fórum ou na

comunidade, como é o caso de “mais um telefone sem DDD”; e, quando o

enunciador contribui com alguma informação a qual resulta em marketing pessoal,

tal como em “sou professora do CCAA e a faculdade e lá, logo, DDD 21”.

82 Acesso em: 15 jul. 2009.

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114

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030283

O fórum também é utilizado para pedidos de indicações e informações

sobre cursos, principalmente pelos aspirantes a tradutor, tal qual o caso do

enunciador de “me interessei por fazer faculdade de Tradução/Intérprete”, um sujeito

inexperiente, desejante, não detentor do saber e poder.

O discurso informativo, encontrado nesses pedidos, na maioria das

vezes, não gera um grande número de discussões. Os membros que respondem a

tais solicitações acabam por utilizar este espaço como forma de marketing pessoal

atestando a qualidade de cursos por eles conhecidos ou realizados, como por

exemplo, nos enunciados “eu sei que a USP oferece. Com certeza outras oferecem

também, mas quais eu não saberia informar a você” e “no Ceará tem um excelente

curso em Lingüística Aplicada (Tradução)... fiz pela Estadual”.

Os enunciadores usam seu lugar de detentores de saber e poder para

contribuírem com os demais membros da comunidade sobre algo por eles

conhecido.

83 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 116: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

115

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030284

Algumas vezes, a busca por informação sobre a área gera discussões

devido à inexperiência ou falta de conhecimento do aspirante a tradutor, como no

exemplo que, ao formular seu pedido de informação sobre faculdades de tradução e

interpretação, o enunciador expressa o desejo de “atingir a fluência no idioma” por

meio de um curso universitário.

Neste momento, os tradutores experientes esclarecem os erros

cometidos assumindo um lugar discursivo do saber, logo, do poder, como no

enunciado “duvido que você consiga fluência em inglês falado em uma faculdade” ou

ainda “o curso de interpretação não dá fluência, ensina técnicas”, entre outros

enunciados deste mesmo enunciador detentor de saber acadêmico.

O direcionamento às FAQs, “dê uma olhadinha nas FAQs, tem muita

resposta lá”, também é um recurso freqüente utilizado por membros mais antigos da

comunidade que, por meio do discurso autoritário, tentam dominar a proliferação de

discursos reincidentes.

Algumas propagandas de cursos geram um número expressivo de

discussões o que nos remete à idéia de uma maior aceitação por parte dos membros

da comunidade. Esses cursos, na maioria das vezes, se referem à memória de

tradução e legendagem. O mesmo parece ocorrer com os cursos oferecidos por

84 Acesso em: 15 jul. 2009.

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116

profissionais de diferentes áreas do saber (direito, finanças, saúde, exportação) que

ministram cursos, não de línguas, mais sobre as terminologias e especificidades de

uma área específica. Podemos inferir que a aceitação se deve ao fato dos mesmos

não serem cursos ministrados em faculdades de tradução, portanto, não carregam a

memória discursiva da regulamentação e por seus professores serem profissionais

experientes que possuem conhecimento em uma tecnologia ou campo do saber que

está distante do conhecimento da grande massa de tradutores.

Fato semelhante também foi observado com os cursos de

interpretação, sejam eles propagandas de cursos a serem ministrados ou pedidos de

informações sobre onde encontrar cursos da referida modalidade. Imaginamos que

tal interesse esteja relacionado ao número inferior de intérpretes em relação a

tradutores que participam da comunidade, pois, uma enquete realizada em 29 de

março de 2007 apontou o seguinte resultado: 64% dos membros que responderam a

enquete são tradutores, 1% intérpretes, 23% tradutores e intérpretes e 9% nenhuma

das opções anteriores.

Buscamos nos comentários postados entender quem seria o sujeito

que não se enquadra em nenhuma das opções oferecidas e chegamos aos

seguintes enunciados:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030285

85 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 118: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

117

Apesar do pressuposto conhecimento das línguas, os estudantes-

tradutores não se vêem como profissionais.

Segundo Coracini (2007, p. 201), é:

[...] o sentimento da insegurança proveniente da tensão entre uma certa teoria ou visão idealizada, para não dizer idílica do tradutor – capaz de tudo controlar, como o cientista controla o seu objeto por meio do método que aplica.

Esses sujeitos buscam na comunidade e nos membros tradutores

experientes a voz de quem pratica o ofício, ainda não vivenciado e desejado por

eles.

Os cursos de memória de tradução, legendagem e interpretação,

possuem um elemento em comum: o discurso tecnológico envolvendo a prática

tradutória. Temos aqui, sujeitos líquido-modernos que desejam o saber tecnológico a

fim de serem inseridos no mercado de trabalho global.

Também encontramos diversos enunciados pedindo comparações

entre instituições diferentes que oferecem cursos similares ou buscando informações

sobre o melhor curso oferecido em determinada região do país. Tais enunciados são

direcionados à leitura das FAQs. Acreditamos que o discurso autoritário de controle

sobre o conteúdo a ser discutido ocorra pelo número de discussões já realizadas

sobre determinado assunto possibilitado pelo tempo de existência da comunidade -

mais de 4 anos. E, de uma forma menos ingênua, por expressarem assuntos

polêmicos que envolvem a questão da regulamentação e da filiação a determinadas

instituições de ensino.

Vejamos o exemplo a seguir:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030286

86 Acesso em: 15 jul. 2009.

Page 119: O SUJEITO TRADUTOR E INTÉRPRETE NA REDE DIGITAL …livros01.livrosgratis.com.br/cp106672.pdf · no que tange à comunicação; Coracini (2006, 2007), no que diz respeito ao impacto

118

Os enunciados mostram que independente da orientação dos

mediadores para que todos leiam as FAQs, muito membros não as lêem e fazem

perguntas já discutidas. Em represália, utiliza-se o discurso autoritário como forma

de resposta. Isso não quer dizer que as discussões não possam se desenvolver.

Quando ocorrem tendem a ser partidárias e de marketing pessoal.

No que tange questões sobre teoria, em meio a 137 páginas de

tópicos destinados à discussão, apenas 4 possuíam a palavra teoria em seu

enunciado. Em três deles, os enunciadores buscavam informações sobre

abordagens teóricas (conceito de invariância, teoria da legendagem e teoria da

terminologia). Em um deles foi apresentada a utilização da nota de rodapé como

recurso do tradutor. Com exceção do tópico sobre teoria da terminologia, postado

em 01 de junho de 2009, os demais datam do ano de 2005, 2007 e 2008 e, constam

de apagamentos de mensagens de membros que não mais freqüentam a

comunidade ou que trocaram de perfil pessoal, impossibilitando a análise discursiva

dos mesmos.

Vejamos a discussão sobre teoria da terminologia:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030287

87 Acesso em: 15 jul. 2009.

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O enunciador pede indicação de leitura (teoria) sobre uma dificuldade

por ele enfrentada (prática). Para que não haja dúvidas sobre o que ele está

procurando, em seu enunciado ele exemplifica suas necessidades por meio de sua

prática tradutória: “’Carro’ deve entrar em um glossário técnico de mecânica de

automóveis? Ou ‘ator’ num glossário específico de teatro?”, provavelmente, áreas

por ele já traduzidas. Seu enunciado traz marcas da memória discursiva que opõe

teoria VS prática atrelando a esta, a idéia de que o que se aprende na formação

acadêmica não se aplica no mercado de trabalho. Esse discurso se contradiz

quando é comparado ao discurso acadêmico do membro que postou comentário

posterior: “eu diria que” e “ou como diria uma professora” fazendo um paralelo entre

o discurso da prática e o da academia, e, também, ao enunciar “Isso é mais ou

menos o que eu tinha concluído depois de ler as pantanosas páginas do livro que

estou lendo”, pois, a teoria do livro se confirma nas conclusões tomadas.

Os demais membros, em um discurso colaborativo oferecem dicas de

livros e sites que possam ajudar o tradutor solicitante a resolver seu problema.

O discurso colaborativo é encontrado em inúmeras discussões por todo

o fórum e, principalmente, na página das FAQs. Nela encontramos compiladas

discussões, por um único membro da comunidade, que priorizavam a indicação de

livros, artigos, sites para pesquisa e obras de referência. A figura abaixo é um

recorte dessas discussões:

Fonte: http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=5030288

88 Acesso em: 15 jul. 2009.

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Ao selecionar e organizar discussões realizadas no fórum como

referência de leitura para os membros da comunidade, esse sujeito assume a

posição discursiva de mestre, que escolhe as melhores leituras para seus discípulos,

um sujeito detentor da verdade, do saber e do poder. Um lugar discursivo almejado

por qualquer profissional de tradução, não no que diz respeito à formação

acadêmica, vista por alguns e pelo Ministério do Trabalho, como desnecessária,

porém, o lugar de profissional reconhecido e respeitado pela comunidade, detentor

da verdade e do saber.

Para finalizar, observamos que as discussões presentes no fórum da

comunidade revelam certa preocupação com o vocabulário e com a estrutura dos

textos, em sua maioria, bem construídos, escritos em linguagem informal, mas com

pouco uso de emoticons89 e abreviações. Em outras palavras, evita-se o uso do

Internetês90, comum em ambiente virtual. A ausência de algum sinal de acentuação

ou de pontuação e até mesmo de alguma concordância verbal são comuns em

textos que não passam por uma releitura ou revisão, característica comumente

observada no ciberespaço, mas que não compromete as discussões propostas no

fórum. Dessa forma, podemos perceber nos membros da comunidade uma

preocupação com a língua, objeto de trabalho do tradutor.

4.3 EFEITOS DE SENTIDO

Para pensarmos os efeitos de sentido nos quais circulam as práticas

discursivas e identitárias da comunidade Tradutores/Intérpretes BR, nos apoiamos

em Foucault, cujo foco do estudo é o sujeito.

O sujeito, para Foucault (1987) constitui-se por meio das práticas

discursivas e em sua prática não importa quem fala, mas o que diz e de que lugar

diz, ou seja, sua função sujeito.

89 Caracteres usados para simbolizar sentimentos e estados de humor em comunicações pela Internet. 90 Linguagem utilizada na Internet por meio de abreviações, ausência de pontuação, acentuação ou regras gramaticais e uso de símbolos que expressam sentimentos e estado de humor como os emoticons.

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Os enunciados efetivos em uma determinada formação discursiva são

carregados por uma memória, possuem materialidade própria, modo de aparição e

domínio e são repetíveis.

A função sujeito, seu lugar no enunciado, é vazia e pode ser ocupada

por todos que preencherem certas condições ou por terem o direito de dizer o que

dizem devido a seu status, capacidade ou função.

Observamos que a função sujeito assumida pelos moderadores da

comunidade é a de tentarem dominar a proliferação de discurso, pois, por meio de

um discurso autoritário, podem tomar decisões protegidos pelo anonimato de suas

identidades. Segundo Foucault (1998), toda sociedade possui meios para controlar a

produção discursiva por temer seus efeitos.

As comunidades digitais trouxeram novas condições de produção de

discurso e uma das mais relevantes parece ser a ilusão do sujeito dizer o que quiser.

Os discursos sobre tradução, antes controlados pela ordem do dizer acadêmico,

passaram a ser enunciados por tradutores líquido-modernos de ambientes digitais

agora controlados pela ordem do dizer mercadológico.

Assim como os moderadores, alguns membros da comunidade

também tentam controlar a proliferação de discurso. Esses sujeitos são detentores

de um saber (acadêmico ou da prática tradutória) que lhes conferem poder e

autoridade para dizer o que dizem. Enunciam do lugar de tradutores experientes,

atuantes no mercado de trabalho, alguns com formação academia, outros, cuja

formação “informal” provém de suas experiências junto ao mercado de trabalho –

provedores de conteúdo autorizados pelo saber, logo, pelo poder.

Do outro lado, também provedores de conteúdo, mas não autorizados

pelo saber, estariam os estudantes de tradução e os aspirantes a tradutores que

incluem os profissionais da área de letras.

Para Foucault (1998), verdade e poder estão mutuamente interligados

pelas práticas discursivas que estabelecem relações de classes que implicam em

determinadas posições políticas e ideológicas, incluindo formações discursivas

atuantes entre si.

O discurso dos tradutores experientes, detentores do saber e do poder,

é marcado pela segurança advinda de sua formação acadêmica ou de sua prática

tradutória. Seu efeito de sentido é o dizer detentor da verdade, da experiência e da

segurança. Dizer daqueles que tem competência para falar sobre tradução, para

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orientar e conduzir outros sujeitos na prática tradutória. Já o discurso dos tradutores

inexperientes (estudantes e aspirantes) é marcado pela insegurança talvez de uma

visão idealizada sobre o que seja ser tradutor ou pela ausência da prática tradutória.

Seu efeito de sentido é da indecisão, da dúvida, da ânsia pela verdade que pode ser

oferecida pelos tradutores experientes, provedores de conteúdos autorizados pelo

saber.

Retomamos aqui a idéia de Bauman (2003) sobre a necessidade do

sujeito de pertencimento a uma comunidade, ou seja, a busca por segurança no

mundo da modernidade líquida:

Para nós em particular – que vivemos em tempos implacáveis, tempos de competição e de desprezo pelos mais fracos, quando as pessoas em volta escondem o jogo e poucos se interessam em ajudar-nos, quando em resposta a nossos pedidos de ajuda ouvimos advertências para que fiquemos por nossa própria conta [...] – a palavra “comunidade” soa como música a nossos ouvidos (BAUMAN, 2003, p. 8).

Essa busca por segurança faz com que tradutores detentores do

conhecimento do ambiente virtual procurem a comunidade como forma de garantia

(temporária) de não serem excluídos do mercado globalizado. Cria-se nesses

sujeitos a sensação de “estar lá”, de pertencimento a uma classe de profissionais

com o desejo de serem reconhecidos pelo grupo e pelo mercado de trabalho. Por

outro lado, perde-se a tão almejada liberdade, entendida por Bauman (2003, p. 10)

como autonomia, direito à auto-afirmação e à identidade. Portanto, temos na

comunidade sujeitos tradutores que têm a ilusão de serem donos de seu discurso,

de serem a origem de seu dizer envoltos numa áurea de libertação de poder dizer o

que quiser, onde e quando quiser. Quando, na verdade, estão presos à ordem

discursiva da comunidade à qual pertencem: o discurso da experiência VS o

discurso da inexperiência.

Outro discurso recorrente, entre os membros da comunidade, é o

discurso publicitário marcado pela presença de outros discursos: o discurso de

marketing institucional onde diversos cursos são divulgados pelos próprios membros

da comunidade; o discurso de marketing pessoal, forma de autopromoção por meio

de vínculos institucionais que demonstram o saber e o poder; discurso tecnológico

dos cursos aparentemente mais aceitos pelo grupo (memória de tradução,

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legendagem e interpretação); discurso autoritário dos membros experientes sobre os

membros inexperientes.

Não podemos deixar de constatar que o discurso autoritário se

sobrepõe aos demais discursos, pois a tentativa de dominar a proliferação de

discursos não desejados – pelos moderadores e pelos tradutores experientes – é

constante.

Muito comum na comunidade é o uso do discurso publicitário como

estratégia de marketing pessoal, onde o sujeito, ao divulgar suas ações, habilidades,

competências, qualificações, conhecimentos, faz-se existir tanto para os outros

membros da comunidade, quanto para o mercado de trabalho.

Observamos um confronto de dois lugares enunciativos: formação

acadêmica e mercado de trabalho que trazem a memória discursiva da teoria VS

prática. Este confronto é marcado pela valoração da experiência em relação ao

estudo.

Desta forma, os enunciados produzidos pelo discurso dos tradutores

por toda a comunidade nos trazem a resposta para a indagação sobre qual seria o

objetivo da comunidade ao ser apresenta em sua descrição como: “Debate sobre

formação profissional, cursos, mercado, ferramentas, terminologia, remuneração,

teoria ...”.

Acreditamos que a formação profissional ocupa um lugar de relevância

neste enunciado e que possa ocorrer por meio de cursos (não necessariamente

acadêmicos) e teorias (escondidas em meio a discussões “não-teóricas” mas que

acabam por trazer explicações para problemas de prática tradutória bem como em

meio aos inúmeros links para artigos e livros divulgados pelos próprios membros).

Mas o mercado de trabalho não ocupa posição inferior, pois é ele quem direciona

todos os questionamentos sobre a necessidade de formação de uma área invisível

aos olhos da sociedade. Temos, então, dois lugares enunciativos que se

complementam apesar dos embates partidários e ideológicos existentes. E o uso

das reticências abrem espaço para inúmeras outras discussões ainda por vir.

É importante salientar que, com base na AD, o sujeito tradutor,

membro da comunidade analisada, não tem controle sobre os efeitos de sentido do

seu discurso, assim como, nenhum sujeito discursivo o tem, pois a evidência do

sentido é uma ilusão. As possíveis intenções destacadas nesta pesquisa são fruto

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do efeito de sentido que os discursos ali encontrados produziram em nós, no

momento de nosso gesto interpretativo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Os trajetos de sentidos materializam-se nos textos que circulam em uma sociedade, criando interdiscursos cuja totalidade é inapreensível. A coerência visível em cada texto particular é efeito da construção discursiva: o sujeito pode interpretar apenas alguns dos fios que se destacam das teias de sentido que invadem o campo do real social.

Maria do Rosário Gregolin, 2003b, p. 96-97.

Ao iniciarmos esta pesquisa, dois questionamentos nortearam nossas

buscas: “quem é o sujeito tradutor/intérprete da contemporaneidade?” e “como ele

se constitui no orkut?”.

Buscamos respostas a estes questionamentos refletindo sobre as

práticas discursivas e identitárias destes sujeitos na comunidade Tradutores/

Intérpretes BR a partir de um trajeto temático sobre formação profissional.

Diferentemente do que pensávamos, a comunidade digital não

possibilitou a emergência de uma nova identidade para o tradutor e intérprete. Na

verdade, houve uma mudança no lugar discursivo ocupado pelos tradutores – antes,

um discurso encontrado na ordem do dizer acadêmico oriundo de artigos de

periódicos e revistas especializadas sobre tradução, anais de eventos (encontros,

congressos), prefácios de obras traduzidas, livros e, posterior ao advento da internet,

um discurso da ordem do dizer mercadológico que emerge de blogs, comunidades

no orkut, homepages de tradutores e de agências de tradução.

O discurso de liberdade promovido pelas novas tecnologias fez com

que os tradutores da comunidade acreditassem ser livres para dizer o que quiser

quando, na verdade, estão presos à ordem discursiva estabelecida pelos

moderadores e tradutores experientes pertencentes à comunidade. O mesmo

discurso de autoridade encontrado na ordem do dizer acadêmico (é preciso ter saber

e poder para dizer) também se faz presente na comunidade na tentativa de dominar

a proliferação de discursos pelo medo dos efeitos de sentidos por eles causados.

Porém, este discurso autoritário emerge na comunidade de forma discreta,

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mascarado pelas práticas discursivas de colaboração, de pertencimento ao grupo,

de amor à língua e à profissão.

Tomamos a comunidade Tradutores/Intérpretes BR como um grande

arquivo digital, uma vez que, os discursos ali encontrados se inscrevem no interior

de uma mesma formação discursiva, pois surgiram em função de “um jogo de

relações” e de “regularidades específicas” (FOUCAULT, 1987, p, 149).

Por meio da arqueologia de Foucault não buscamos encontrar nos

discursos da comunidade a atividade consciente do sujeito, ou seja, sua intenção,

pelo contrário, buscamos verificar as condições que propiciaram o aparecimento de

um determinado enunciado, condições estas, propiciadas pelo suporte que acolhe a

comunidade, o meio digital.

No arquivo digital da comunidade encontra-se um banco de dados

sobre o tradutor e intérprete da modernidade líquida: local onde trabalham; queixas

sobre a profissão; remuneração; produtividade; motivo da escolha profissional; grau

de escolaridade; áreas de atuação; filiações a instituições de ensino e sindicatos e

associações; satisfação profissional; tecnologias utilizadas, entre tantos outros

dados observados.

Assim, os discursos existentes nesse arquivo mostram um sujeito

profissional moderno, inserido no mundo globalizado, que sente prazer e orgulho

pela profissão em meio às angustias geradas pela oscilação de serviço, baixa

remuneração, ausência de regras claras sobre a profissão, dificuldades da prática

tradutória, por ser um “traidor”, e principalmente, pelo desejo de visibilidade

profissional.

Diante do exposto, podemos afirmar que o sujeito tradutor

contemporâneo, não é novo nem velho, mas o resultado da época que vivencia, ou

seja, a modernidade líquida (BAUMAN, 2001). Não é possível observar uma nova e

singular identidade, mas “novas” identificações de uma identidade, desde sempre

“cambiante e historicizada” (CORACINI, 2007, p. 207).

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GLOSSÁRIO DE TERMOS DA INFORMÁTICA E INTERNET Anti-vírus = Softwares que detectam e eliminam vírus de computador. Bit = Menor unidade utilizada para medir quantidade de informação. Um bit é expresso pelo algarismo 0 ou 1. Byte = Conjunto de 8 bits. Blog = Também conhecido por weblog, é uma página da web cujas atualizações, chamadas de posts, são organizadas cronologicamente como um diário. Bluetooth = Tecnologia para envio e recebimento de arquivos por ondas de rádio, sem a necessidade de fios. Boletim eletrônico = Também chamado de newsletter, é uma forma de mensagem eletrônica recebida pelo usuário, via internet, após efetuar seu cadastramento em algum site, geralmente sobre um determinado assunto. Buddy Poke - Boneco em formato 3D criado pelo usuário do orkut que possibilita a escolha de roupas, características físicas (pele, cabelo, dos olhos, bigode, barba, entre outras), humor e interação com bonecos de outros usuários tais como: beijar, paquerar, mandar flores, abraçar, entre outras formas de interação.

Cartão de memória = Dispositivo de armazenamento de dados com memória flash utilizado em videogames, câmeras digitais, telefones celulares, computadores entre outros aparelhos eletrônicos.

CD = Abreviação de Compact Disc, (disco compacto em inglês), é um dos mais populares meios de armazenamento de dados digitais.

Ciberpoeta = Poeta pós-moderno que utiliza o espaço virtual como forma de manifestação artística.

Ciberpunk = Movimento literário no gênero da ficção científica, criado nos Estados Unidos, que une altas tecnologias e caos urbano, sendo considerado como uma narrativa tipicamente pós-moderna.

Chat = Internet Relay Chat (IRC), ou apenas chat, é um protocolo de comunicação que permite a troca de arquivos e conversas em grupo ou privada. Muito popular no fim dos anos 1990, o chat decaiu e foi substituido por mensageiros instantâneos como o MSN e sites como o orkut.

CMC = Comunicação Mediada por Computadores é aquela que liga dois indivíduos atráves da transmissão de dados em uma rede de computadores. Dentre as mais conhecidas está o e-mail, os fóruns de discussão, os canais de notícias, a recente telefonia, etc. Seu principal expoente hoje é a Internet.

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Comunicação síncrona = Forma de comunicação que exige a participação simultânea de todos os envolvidos, entre elas o chat, a videoconferência e alguns ambientes de realidade virtual como os MUDs e os MOOs. Comunicação assíncrona = Forma de comunicação que não exige a participação em tempo real dos envolvidos, entre elas os correios eletrônicos (e-mails), os fóruns ou listas de discussão, os boletins eletrônicos (newsletter), as comunidades virtuais e o orkut. Comunidade moderada = Comunidade cujo conteúdo é controlado por um dono ou mediador e não permite a postagem de mensagens anônimas. Comunidade virtual = São redes de interesse que possibilitam a socialização por meio do debate de temas em fóruns de discussão. Cracker = Sujeito que pratica ilegalmente a quebra (cracking) de um sistema de segurança de programas, redes e computadores alheios. Disco rígido = Também conhecido como HD (hard disk). É a parte do computador onde são armazenados os dados. Disquete = Disco removível para armazenamento de dados no computador. DVD = Abreviatura de Digital Video Disk. É um disco óptico para armazenar sons, imagens e/ou informações digitais.

E-commerce = Comércio eletrônico ou ainda comércio virtual.

E-mail = Método que permite compor, enviar e receber mensagens por meio de sistemas eletrônicos de comunicação. O termo e-mail é aplicado tanto aos sistemas que utilizam a Internet e são baseados no protocolo SMTP, como aqueles sistemas conhecidos como intranets, que permitem a troca de mensagens dentro de uma empresa ou organização. Facebook = Maior rede digital de relacionamento do mundo. Fakes = Termo usado para denominar contas ou perfis falsos usados na internet. FAQs = Frequently Asked Questions (em português, “perguntas mais frequentes”). É uma compliação das perguntas mais frequentes acerca de um determinado assunto. Fórum de discussão = Páginas de Internet destinada a promover debates por meio de mensagens publicadas, abordando uma mesma questão.

Fotolog =Também conhecido por fotoblog ou flog. É um registo publicado na World Web semelhante ao blog mas com predominância de fotos ao invés de texto. A palavra é uma abreviação de "photo" (foto) e "blog" (diário).

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Google = Nome da empresa que criou e mantém o maior site de busca da internet, o Google Search. O serviço foi criado a partir de um projeto de doutorado dos então estudantes Larry Page e Sergey Brin da Universidade de Stanford em 1996.

Hacker = Usuário ou programador com grande conhecimento sobre o funcionamento de computadores e sistemas de rede. A palavra hacker, em inglês, é sinônimo de expert, alguém com conhecimentos profundos sobre um determinado assunto. Com o tempo, o termo passou a ser erroneamente confundido com cracker, sujeito que pratica ilegalmente a quebra (cracking) de um sistema de segurança de programas, redes e computadores alheios. Home page = Página inicial de um site da internet. Home banking = Serviço que permite ao cliente do banco consultar e manipular contas bancárias via internet. ICQ = Programa de comunicação instantânea pela Internet. A sigla é um acrônimo baseado na pronúncia das letras em inglês (I Seek You), em português, "Eu procuro você". Internauta = Usuário da Internet. Internet = Rede mundial de computadores que permite o acesso a informações e transferência de dados e mensagens por meio de um protocolo comum. IRC = Sigla de Internet Relay Chat. Um protocolo de comunicação utilizado na Internet basicamente para bate-papo (chat) e troca de arquivos, permitindo a conversa em grupo ou privada. Karma = Recurso do orkut onde o usuário pode distribuir elogios a outros usuários do orkut. Layout = Diagramação, esboço, desenho. Link = Termo em inglês que significa "ligação". Formado por texto ou imagem que, num documento de hipertexto, leva a outros documentos e sites. Geralmente, vem destacado na página.

Lista de discussão = Ferramenta da Internet que permite a um grupo de pessoas a troca de mensagens entre os membros de um grupo.

Mangá = Palavra usada para designar as histórias em quadrinhos japonesas que se destacam por seus traços estilizados e, na grande maioria das vezes, totalmente em branco e preto. A leitura difere-se da ocidental sendo feita da direita para a esquerda. Mediador = Em comunidades moderadas, o mediador ou moderador é o encarregado de analisar o conteúdo das mensagens a serem postadas e de tomar qualquer tipo de decisão, desde aceitar a adesão de novos membros até mesmo bani-los da comunidade.

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Moderada (comunidade) = Comunidade cujo conteúdo é controlado por um mediador ou moderador e não permite a postagem de mensagens anônimas. Moderador = Em comunidades moderadas, o moderador é o encarregado de analisar o conteúdo das mensagens a serem postadas e de tomar qualquer tipo de decisão, desde aceitar a adesão de novos membros até mesmo bani-los da comunidade. Monitores múltiplos = Dois ou mais monitores conectados a um único computador permitindo a visualização de programas diferentes em cada tela. MOOs = Sigla de Multi-User Object Oriented Environment. É um sistema de acesso multi-usuário, programável, interativo, para criação de ambientes em realidade virtual baseada em texto, visando jogos, conferências, bate-papo on-line e outras atividades que requerem comunicação em tempo real. MSN = Abreviação de Messenger (em português, mensageiro). É um programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft Corporation que permite ao usuário da Internet se relacionar com outro que tenha o mesmo programa em tempo real, podendo ter uma lista de amigos virtuais e acompanhar quando eles entram e saem da rede. MUDs = Sigla de Multi-User Dungeon. É uma modalidade de jogo de RPG via Internet em tempo real e modo texto. OCR = Sigla de Optical Character Recognition (Reconhecimento óptico de caracteres). São sofwares que permitem a leitura de textos digitalizados por um scanner, transformando-os em documentos em arquivo de texto editável. Online = Estado em que um computador está conectado a outro computador ou servidor através de uma rede. Orkut = Rede digital de socialização filiada ao Google. Criada em 24 de janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos. Seu nome é originado em seu criador, o projetista chefe Orkut Buyukkokten, engenheiro turco do Google. Pager = Aparelho receptor de mensagens transmitidas por radiofrequência.

Pendrive = Disco removível de armazenamento constituído por uma memória flash.

Podcast = Também chamado de podcasting. São arquivos de áudio, vídeo e fotos que podem ser acessados pela internet. A palavra "podcasting" é uma junção de iPod (um aparelho que toca arquivos digitais em MP3/MP4) e broadcasting (transmissão de rádio ou TV).

Polls = Enquetes realizadas nas comunidades virtuais do orkut com o intuito de colher opiniões dos membros de forma quantitativa.

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Processador de texto = Programa de computador utilisado para a criação de documentos simples a arquivos profissionais.

RFID = Abreviação de Radio-Frequency Identification que em português significa Identificação por Rádio Frequência. RPG = Role Playing Games (em português, "jogo de interpretação de papéis"). É um forma de jogo em que os jogadores assumem os papeis de personagens e criam narrativas colaborativamente. Scanner = Periférico de entrada responsável pela digitalização de imagens, fotos e textos impressos para o computador. Scrap = Recados postados pelos membros do orkut na página de recados (scrapbook). Scrapbook = Página de recados do orkut. Second Life = Ambiente virtual e tridimensional que simula em alguns aspectos a vida real e social do ser humano. Desenvolvido em 2003 pela empresa Linden Lab. Pode ser considerado um jogo, um mero simulador, um comércio virtual ou uma rede social. Seu nome significa, em português, "segunda vida" ou "vida paralela”. Skype = Empresa de comunicação via Internet que permite comunicação de voz e vídeo grátis entre os usuários do software. Site = Também chamado de website. Conjunto de páginas da Web acessíveis pelo protocolo HTTP (Hypertext Transfer Protocol, que em português significa Protocolo de Transferência de Hipertexto) na Internet. Spam – Também chamado de lixo eletrônico. Mensagens não desejadas geralmente em forma de propaganda ou mensagens de correio eletrônico não solicitadas. Streaming = Tecnologia para envio de áudio e vídeo pela Internet. Em português significa fluxo contínuo. Testemunho = Recurso do orkut utilizado para a postagem de depoimentos sobre amigos. Twitter = Rede digital de socialização. A segunda mais popular no Brasil depois do orkut. Videoconferência = Discussão que permite o contacto visual e sonoro entre pessoas que estão em lugares diferentes, dando a sensação de que os interlocutores encontram-se no mesmo local. Permite não só a comunicação entre um grupo, mas também a comunicação pessoa-a-pessoa.

Videologs = Também chamado de Videoblog ou Vlog, é uma variante dos blogs cujo conteúdo principal consiste em vídeos. Os vídeos são exibidos diretamente em uma página, sem a necessidade de se fazer download do arquivo.

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Web = Abreviatura de WWW (Word Wide Web) conhecida em português por Rede Mundial de Computadores. Webcam = Câmera de vídeo que capta imagens, transferindo-as de modo quase instantâneo ao computador, podendo ser utilizada em uma grande gama de aplicativos tais como videoconferência, editores de vídeo, editores de imagem, monitoramento de ambientes, entre outros. Website = Ou simplesmente site. Conjunto de páginas da Web acessíveis pelo protocolo HTTP (Hypertext Transfer Protocol), que em português significa Protocolo de Transferência de Hipertexto) na Internet. Wi-Fi = Abreviatura de Wireless Fidelity. Tecnologia de rede que permite o acesso sem fio à internet e á comunicação entre computadores. Youtube = Site que permite que seus usuários carreguem, assistam e compartilhem vídeos em formato digital. Zipdrive = Sistema de disco removível semelhante ao disquete.

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ANEXOS

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ANEXO A PÁGINA DE APRESENTAÇÃO DO ORKUT

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ANEXO B PÁGINA DE PERFIL DE USUÁRIO DO ORKUT

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ANEXO C PÁGINA DE COMUNIDADE DO ORKUT

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ANEXO D RESULTADO DE PESQUISA SOBRE “TRADUÇÃO”

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ANEXO E RESULTADO DE PESQUISA SOBRE

“TRADUTOR” E “TRADUTORES”

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ANEXO F PÁGINA DE REGRAS DA COMUNIDADE

TRADUTORES/INTÉRPRETES BR

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ANEXO G PÁGINA DE FAQ (FREQUENT ASKED QUESTIONS)

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ANEXO H PÁGINA DE AVISO DE PRIVACIDADE DO ORKUT

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ANEXO I CBO (CLASSIFICAÇÃO BRASILEIRA DE OCUPAÇÕES)

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ANEXO J E-MAIL DO SINTRA SOBRE NÚMERO DE TRADUTORES FILIADOS

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ANEXO K DADOS DEMOGRÁFICOS DO ORKUT

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