o regionalismo na política externa brasileira no século xxi - a infraestrutura física na...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO O REGIONALISMO NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI: A INFRAESTRUTURA FÍSICA NA ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO MOISÉS COSTA CONA

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Page 1: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

O REGIONALISMO NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI: A

INFRAESTRUTURA FÍSICA NA ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO

MOISÉS COSTA CONA

SÃO PAULO

2011

Page 2: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

MOISÉS COSTA CONA

O REGIONALISMO NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO SÉCULO XXI: A

INFRAESTRUTURA FÍSICA NA ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO PARA A OBTENÇÃO DO DIPLOMA DE BACHAREL EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS PELA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO.

ORIENTADOR: Profa. Dra. FLAVIA DE

CAMPOS MELLO

SÃO PAULO

2011

1

Page 3: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Aos meus pais, Juan e Tânia, pelos esforços e apoio incondicional em todas as etapas dessa graduação.

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Page 4: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

RESUMO

Este trabalho apresenta as perspectivas do projeto regional na América do Sul e o papel do Brasil nesse processo, enfatizando a política externa brasileira durante a primeira década do século XXI. Nesse sentido, busca-se analisar como os projetos de infraestrutura (transporte, telecomunicações e energia), sobretudo no âmbito da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), se apresentam na pauta da política externa brasileira, destacando as suas características e avanços para a integração autônoma da América do Sul, considerando ainda a crescente projeção da liderança diplomática e econômica do Brasil.

Palavras-chave: integração regional; política externa; infraestrutura; IIRSA.

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ABSTRACT

This work presents the perspectives of the regional project in South America and Brazilian role in this process, focusing on the Brazilian foreign policy during the first decade of the 21st century. In this sense, we seek to analyze how the infrastructure projects (transport, telecommunications and energy), specially under the Initiative for the Integration of the Regional Infrastructure of South America (IIRSA), are presented in the Brazilian foreign policy agenda, highlighting its features and enhancements to the autonomous integration of South America, and considering the increasing projection of the Brazilian diplomatic and economic leadership.

Key-words: regional integration; foreign policy; infrastructure; IIRSA.

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Page 6: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 10

1. A PLATAFORMA SUL-AMERICANA PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL

BRASILEIRA ........................................................................................................................ 13

1.1. A prioridade atribuída à America do Sul ......................................................................... 17

1.2. A ampliação da agenda regional e a emergência do regionalismo pós-liberal sul-

americano ................................................................................................................................ 20

2. A MOLDURA POLÍTICO-DIPLOMÁTICA DA INTEGRAÇÃO DA

INFRAESTRUTURA NA AMÉRICA DO SUL ................................................................ 28

2.1. Características estruturais da América do Sul .................................................................. 29

2.2. A conjuntura diplomática do lançamento da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura

Regional Sul-Americana (IIRSA) ........................................................................................... 35

2.3. A definição de uma agenda regional consensuada ........................................................... 39

3. A ATUAÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NA INTEGRAÇÃO DA

INFRAESTRUTURA FÍSICA REGIONAL ...................................................................... 49

3.1. A convergência entre o planejamento brasileiro de desenvolvimento territorial e a

IIRSA ...................................................................................................................................... 50

3.2. O desafio do desenvolvimento socioambiental sustentável ............................................. 54

3.3. O financiamento público aos projetos de infraestrutura regional e o papel do BNDES .. 56

3.4. Motivações e incentivos à participação do setor privado brasileiro ma integração da

infraestrutura regional ............................................................................................................. 60

3.5. A Unasul e o COSIPLAN: novos mecanismos institucionais da integração da

infraestrutura ........................................................................................................................... 66

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 68

ANEXOS ................................................................................................................................ 715

Page 7: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 73

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Page 8: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

LISTA DE SIGLAS

AIC – Agenda de Implementação Consensuada

ALADI – Associação Latino-americana de Integração

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CAF – Corporação Andina de Fomento

CAN – Comunidade Andina de Nações

CASA – Comunidade Sul-Americana de Nações

CCR - Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos

CCT – Comitê de Coordenação Técnica

CDE – Comitê de Direção Executiva

CEPAL – Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe

COSIPLAN – Conselho de Infraestrutura e Planejamento

EID – Eixos de Integração e Desenvolvimento

FOCEM – Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul

FONPLATA – Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata

GTE – Grupos Técnicos Temáticos

IIRSA – Iniciativa para a Integração da Infraestrutura da América do Sul

IFM – Instituições Financeiras Multilaterais

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

MERCOSUL – Mercado Comum do Sul

7

Page 9: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

MC – Ministério das Comunicações

MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

MME – Ministério das Minas e Energia

MPOG – Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

MRE – Ministério das Relações Exteriores

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

PAC – Programa de Aceleração do Crescimento

PPA – Plano Plurianual

PPP – Parceria Público-Privado

PSI – Projetos Setoriais Integrados

UNASUL – União das Nações Sul-Americanas

8

Page 10: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Reservas e demanda futura de gás natural na América do Sul ................................ 32

Tabela 2. Composição setorial/subsetorial da Carteira de Projetos IIRSA ............................. 41

Tabela 3. Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010 ........................... 45

Tabela 4. Projetos da IIRSA no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) .......... 53

Tabela 5. Projetos financiados pelo BNDES na América do Sul – Exportação de serviços de

engenharia e outros ................................................................................................................. 62

Tabela 6. Desembolsos do BNDES Exim para a área de infraestrutura no exterior................ 64

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Page 11: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

INTRODUÇÃO

A ampliação da agenda externa brasileira durante os oito anos de mandato do

presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou, no início do século XXI, importantes

modificações estruturais no sistema econômico e político internacional, as quais estiveram

pautadas num acelerado crescimento econômico entre 2003 e 2007; na crise financeira de

2008; e na recuperação econômica pós-crise dos países em desenvolvimento.

Nesse cenário em mudanças, abordar as relações entre o Brasil e a América do Sul e os

seus compromissos sul-americanos é imprescindível para o debate sobre a inserção

internacional brasileira, pois, ao mesmo tempo em que intensificava suas relações comerciais

e financeiras com potências emergentes, o Brasil assumia a liderança diplomática e política

dos processos de integração na região. O Ministro das Relações Exteriores do governo Lula,

Celso Amorim, refere-se à integração sul-americana como um bloco “que não é homogêneo,

que tem suas turbulências, mas que tem condição de formar uma grande unidade com

capacidade de negociar” (BRASIL, 2007).

A política externa brasileira na primeira década do século XXI evidenciou sua

motivação em acelerar os processos de integração regionais vigentes e expressos na América

do Sul, de modo a proporcionar condições para o desenvolvimento de todos os países da

região. Apesar de a prioridade conferida à região não representar uma completa novidade na

agenda de política externa do país, o regionalismo expresso durante os dois mandatos da

presidência de Lula se afastou daquele com propósitos estritamente comerciais, característicos

do período de transição liberalizante dos anos 1990.

A revisão crítica das políticas econômicas que foram adotadas na América do Sul é

apontada como conseqüência, sobretudo, do deslocamento para a esquerda que ocorreu nos

governos de diversos países da região (IPEA, 2010). Nesse sentido, as novas prioridades da

agenda regional se afastam daquelas categorias tradicionais de integração econômica

orientadas para a integração comercial.

Esse trabalho apresenta uma perspectiva sobre a revisão das estratégias de

desenvolvimento que têm lugar na América do Sul e como a integração de infraestrutura,

apesar de seus avanços modestos até o momento, passou a compor a agenda da diplomacia

brasileira e da elite econômica com maior destaque na primeira década do século XXI.

10

Page 12: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

No primeiro capítulo, realizamos uma revisão bibliográfica sobre a condução da

política externa brasileira durante a primeira década do século XXI, por meio de artigos de

centros de pesquisas governamentais e acadêmicos e de documentos e declarações do governo

diplomático brasileiro. Por sua análise, percebemos que a crescente projeção da liderança

diplomática e econômica do Brasil a nível global não causou descuido com seu entorno

geográfico. É na América do Sul que o Brasil encontra sua plataforma para inserção

internacional como potência emergente, uma vez que é preponderante em questão de

território, população, recursos naturais, indústria e avanço tecnológico (BARBOSA, 2008).

A construção de um espaço próprio sul-americano que é enfatizada com Lula leva-nos

a questionar de que forma o Brasil vê esse novo regionalismo; quais fatores condicionam essa

visão; como são administradas as relações bilaterais na região em temas de conflitos de

interesses; e quais os temas da agenda da integração regional foram tomados pelo Brasil como

prioritários para o desenvolvimento político, social e econômico da região.

Na sequência, apresentamos o cenário atual dos processos de integração na América

do Sul, os quais têm se afastado cada vez mais dos modelos tradicionais de integração

econômica orientada para a integração comercial. Essa análise será articulada com o gradual

processo de ressurgimento dos nacionalismos econômicos para o desenvolvimento em quase

todos os países da região. As resistências em aprofundar a liberalização preferencial ganharam

solidez e o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), como esquemas de

integração intrarregional, passaram a ser questionados por seu caráter exclusivamente

comercial. Os mecanismos institucionais criados no âmbito do Mercosul mostraram-se pouco

adequados para atender os interesses do Brasil, visto que temas não-comerciais e não-

econômicos passaram a ter maior prioridade na agenda e, a maior aproximação com os países

da região exigiu a criação de uma nova pauta para discutir a coordenação de políticas para o

aproveitamento dos recursos naturais existentes e para o combate ao crime transnacional

(BARBOSA, 2008). Nesse sentido, os temas de defesa e segurança, energia e infraestrutura

emergem na agenda de política externa para a região.

Nos marcos dos objetivos propostos por esse regionalismo denominado pós-liberal

(VEIGA; RIOS, 2008), no segundo capítulo, discutimos alguns problemas de insuficiência de

infraestrutura na região e a criação da Iniciativa de Integração de Infraestrutura Regional da

América do Sul (IIRSA). Desencadeada a partir da I Reunião de Presidentes da América do

11

Page 13: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Sul realizada em Brasília, em 2000, a IIRSA é uma iniciativa dos doze países sul-americanos

que visa à promoção do desenvolvimento da infraestrutura de transporte, telecomunicações e

energia em âmbito regional, disponibilizando as bases para uma maior integração comercial e

social sul-americana. Assim, ademais de sua estrutura técnica, apresentaremos os marcos

institucionais e diplomáticos em que a política externa brasileira esteve envolvida no processo

de criação da IIRSA.

Por fim, no terceiro capítulo analisamos a articulação entre os projetos e iniciativas

para a integração de infraestrutura propostos e em andamento na América do Sul com as

respostas da política externa brasileira em questões como financiamento; os marcos

regulatórios para a participação do setor privado; as negociações em âmbito diplomático e

econômico; a internalização da agenda de integração física consensuada; e os programas de

preocupação socioambiental. Em que medida tais recursos proporcionados pelo

posicionamento brasileiro conseguem promover o avanço da integração de infraestrutura?

Qual a prioridade dada e como essas questões foram negociadas em âmbito doméstico e

regional durante o governo Lula? Apresentaremos, assim, uma perspectiva sobre a evolução

da importância da agenda de integração regional de infraestrutura no século XXI,

considerando também os fatores e recursos econômicos e financeiros brasileiros direcionados

para esses projetos, de modo a identificar o grau de efetividade da prioridade conferida à

América do Sul e ao tema de infraestrutura.

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Page 14: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

1 A PLATAFORMA SUL-AMERICANA PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL

BRASILEIRA

A primeira década do século XXI foi marcada por aceleradas transformações no

sistema econômico e político global, as quais têm permitido alterações também nas posições

relativas de determinados Estados nacionais no sistema internacional. O posicionamento do

Brasil nesse contexto tem impulsionado reflexões sobre os elementos externos e internos aos

países que vêm proporcionando a ampliação relativa de suas capacidades de influenciar

determinadas deliberações globais, em diversos temas (IPEA, 2011).

A condução da política externa durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-

2010) diversificou e ampliou a participação da diplomacia brasileira em diversas arenas

institucionais internacionais, com especial empenho durante os momentos de crise e

instabilidade política e econômica.1 Ademais da participação nos fóruns internacionais, o

Brasil buscou articular suas ações com outras economias emergentes e investir no processo de

integração da América do Sul, por meio de mecanismos institucionais para a concertação

entre todos os Estados da região.

Embora já sejam perceptíveis alterações na inserção internacional do Brasil durante a

administração de Fernando Henrique Cardoso, é durante o governo Lula que a consolidação

de uma estratégia que poderia ser batizada de “autonomia pela diversificação”2, com ênfase na

cooperação Sul-Sul, busca estabelecer um equilíbrio com os países do Norte. Essa maior

articulação comercial e política com os países que compõem esse eixo Sul-Sul para o

desenvolvimento mundial – Ásia, África e América do Sul – consiste em um estilo próprio de

cooperação horizontal com ações que visam estabelecer os intercâmbios de conhecimento,

1 O Brasil liderou a missão de paz no Haiti, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU); teve papel ativo nas negociações econômicas multilaterais no âmbito do G-20 comercial, da Rodada Doha e do G-20 financeiro; buscou um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU; e teve atuação ativa na COP15 das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima.

2 VIGEVANI; CEPALUNI. A política externa de Lula da Silva: a estratégia da autonomia pela diversificação. 2007.

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lealdades políticas e sociais entre os países em desenvolvimento (HIRST; LIMA; PINHEIRO,

2010). Em 2006, na Argélia, o presidente Lula afirmou que:

A relação Sul-Sul não apenas é possível como necessária. O Sul não é um conjunto amorfo de países subdesenvolvidos e dependentes que nada têm a oferecer senão matérias-primas para os países ricos. (...) Juntos podemos ser mais fortes e não apenas aumentar o nosso comércio, mas participar com mais força dos foros econômicos e políticos em que se discutem as grandes questões de interesse da humanidade, como a OMC e a ONU. Agora, uma relação mais intensa, mais criativa e mais forte entre os países do Sul não implica esvaziar as relações com os países desenvolvidos, que são também importantes para todos nós. Vamos fazer como os desenvolvidos: aproveitar todas as oportunidades e fazer da nossa união a nossa força. (LULA, 2006).

Assim, um maior protagonismo internacional do país conduziu a ajustes e mudanças

na agenda de política externa brasileira durante a primeira década do século XXI, pois, novas

prioridades foram estabelecidas de acordo com os objetivos de inserção internacional do país.

Com a ênfase na cooperação Sul-Sul, a América do Sul deixou de ser vista apenas como

mercado cativo para ser o espaço legitimador de atuações maiores, como as participações no

G-20 comercial e no G-20 financeiro. Nesse novo contexto, o Brasil pôde reduzir sua

vulnerabilidade externa e atuar na execução de ações voltadas ao desenvolvimento econômico

e social. No plano doméstico, o abandono do modelo de substituição de importações se

consolida e a sociedade brasileira apresenta ter chegado a um consenso sobre a idéia de

desenvolver uma economia internacionalmente competitiva. Sobre esse aspecto, Bueno e

Cervo (2011) apontam que, em contraste ao paradigma estritamente neoliberal da política

externa brasileira3 (CERVO, 2008), emerge no governo de Fernando Henrique Cardoso, e se

consolida no governo Lula, o Estado logístico.

Logístico é aquele Estado que não se reduz a prestar serviços, como fazia à época do desenvolvimentismo, nem a assistir passivamente às forças do mercado e do poder hegemônico, como se portava à época do neoliberalismo. Logístico porque recupera o planejamento estratégico do desenvolvimento e exerce a função de apoio e legitimação das iniciativas de outros atores econômicos e sociais, aos quais repassa responsabilidades e poder (BUENO, CERVO, 2011, p. 529).

Os autores identificam, assim, que os fatores que contribuíram para a consolidação do

Estado logístico brasileiro, no governo Lula, estão ligados ao avançado nível de organização

dos agentes econômicos e sociais, o que possibilitou a função de coordenação do Estado – o

3 Para os autores, o Estado normal (ou neoliberal) é aquele cujo papel consistia em arrastar as sociedades para o desenvolvimento, e no qual a integração regional seria um meio para alcançá-lo, contudo, não há aspiração por parte dessas sociedades nesse processo.

14

Page 16: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

qual passa por um momento de estabilidade política e econômica - guiado pelos interesses

nacionais. E “ao colocar a estratégia a serviço do desenvolvimento (...), especialmente ao

recuperar a autonomia decisória na esfera política e ao voltar-se para o reforço do núcleo duro

da economia nacional” (BUENO, CERVO, 2011, p. 530), é que surge o Estado logístico, com

uma conduta diferente daquela do Estado neoliberal.

Nesse sentido, Hirst, Lima e Pinheiro (2010) destacam que, apesar das críticas

oposicionistas que denunciam o caráter partidário da política externa do governo Lula, o

Brasil “alargou como nunca sua ancoragem institucional com base na mobilização de

múltiplas agências do Estado com agendas externas próprias ou complementares às linhas de

ação do Itamaraty” e, desse modo, proporcionou o alargamento da agenda de temas e de

atores envolvidos (tanto burocráticos, como sociais) na formulação das ações internacionais

do Brasil. As autoras frisam que a política externa passou a ter uma base societal com a qual

não contava em outros momentos da história diplomática do país.

Esse empenho brasileiro para o adensamento da cooperação internacional,

especialmente no âmbito Sul-Sul, em consonância com o novo panorama econômico do país,

permitiu que o Brasil passasse a ser um “doador” internacional no que se refere à promoção

do desenvolvimento. Tanto no âmbito global, quanto no regional, o Brasil passou a ser

demandado por políticas de cooperação técnica, ligadas às áreas de agricultura, saúde,

educação, ciência e tecnologia, defesa, energia e cultura, o que condicionou à multiplicidade

de agências e atores envolvidos nas relações internacionais do país (HIRST, LIMA,

PINHEIRO, 2010, p. 3). Destaca-se a atuação do Ministério da Agricultura, por meio da

presença da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) em países africanos e

sul-americanos; do Ministério da Saúde e seus órgãos relacionados; e do Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, essencial para o diálogo entre o governo e

as ações de empresas brasileiras no exterior. Ademais da própria atuação do Ministério das

Relações Exteriores, Hirst, Lima e Pinheiro apontam a atuação internacional de movimentos

sociais e organizações não-governamentais, de governos subnacionais, do Congresso

Nacional e do próprio Presidente da República - a chamada “diplomacia presidencial.”

Bueno e Cervo (2011) afirmam que, pelas mudanças na ordem internacional ocorridas

de Cardoso a Lula, a política externa brasileira acompanhou o movimento dos países

emergentes em busca de democratizar a globalização. Essa articulação pró-ativa exigiu

15

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esforços do Estado para negociações, sustento dos interesses nacionais e alianças estratégicas

com outros países emergentes em defesa da redistribuição de poder nas relações

internacionais, adicionando o componente moral para o combate à pobreza e à fome.

Em suma, as mudanças percebidas na política externa brasileira na primeira década do

século XXI foram marcadas por diretrizes que contribuíram pela busca de maior equilíbrio

internacional, atenuando o unilateralismo. Consequentemente, se tornava essencial que o

Brasil estabelecesse seu papel nesse novo contexto internacional, com maior peso e

protagonismo nas negociações econômicas internacionais, o que foi feito por meio do

fortalecimento das relações bilaterais e multilaterais.

Vigevani e Cepaluni (2007) identificam os principais desdobramentos dessas diretrizes

de política externa. Em primeiro lugar, o aprofundamento da prioridade à América do Sul,

traduzido pela criação e institucionalização da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa)

– posteriormente rebatizada de União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Em segundo

lugar, houve a intensificação das relações diplomáticas e econômicas com outros países

emergentes, como Rússia, Índia, China e, mais recentemente, África do Sul - constituindo o

chamado BRICS. Em terceiro lugar, houve a participação de destaque do país nas negociações

da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2008. Em quarto lugar, e

apesar da ênfase na cooperação Sul-Sul, o Brasil não deixou de manter relações amistosas

com os demais países ricos, inclusive com os Estados Unidos. Em quinto lugar, o Brasil

também estreitou seu relacionamento com os países da África. Em sexto lugar, buscando

determinar um novo posicionamento brasileiro na ordem multilateral, um dos principais

objetivos da política externa do governo Lula foi a reforma do Conselho de Segurança da

ONU, visando um lugar de membro permanente para o Brasil. E, por fim, a agenda de

políticas sociais voltou à compor a pauta de política externa, com o objetivo de promover

maior equilíbrio entre Estados e populações.

1.1 A prioridade atribuída à América do Sul na PEB do governo Lula

16

Page 18: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

As tentativas de promover a transformação das fronteiras de separação em fronteiras

de cooperação na América do Sul, datadas desde a diplomacia do Barão de Rio Branco,

adquiriram máxima expressão no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (ZUGAIB,

2006), pois, além do interesse por avançar na construção de um projeto comunitário sul-

americano, Hirst, Lima e Soares (2010), destacam que o governo Lula buscou projetar a

presença brasileira como um fator de estabilidade democrática na região.

Em seu discurso de posse, Lula declarou que:

A grande prioridade da política externa durante o meu governo será a construção de uma América do Sul politicamente estável, próspera e unida, com base em ideais democráticos e de justiça social. Para isso é essencial uma ação decidida de revitalização do Mercosul, enfraquecido pelas crises de cada um de seus membros e por visões muitas vezes estreitas e egoístas do significado de integração. O Mercosul, assim como a integração da América do Sul em seu conjunta, é sobretudo um projeto político. Mas esse projeto repousa em alicerces econômico-comerciais que precisam ser urgentemente reparados e reforçados. Cuidaremos também das dimensões social, cultural e científico-tecnológica do processo de integração. Estimularemos empreendimentos conjuntos e fomentaremos um vivo intercâmbio intelectual e artístico entre os países sul-americanos. Apoiaremos os arranjos institucionais necessários, para que possa florescer uma verdadeira identidade do Mercosul e da América do Sul.4

Além de ser a área de maior interesse para a política externa do governo Lula, Hirst

(2009) destaca que esta também representa a de maior sensibilidade para o país. Nesse

sentido, a autora expõe que são quatro os fatores que determinam os vínculos do Brasil com

os seus vizinhos sul-americanos: i) a projeção da estabilidade democrática brasileira; ii) a

irradiação dos interesses econômicos do país; iii) a afirmação do Brasil como poder regional

no sistema internacional; e iv) a especificidade dos laços bilaterais que se constroem em cada

país em particular.

A diplomacia brasileira do governo Lula já avaliava que a integração regional requer

tanto vontade e coordenação política, quanto uma aproximação concreta, em termos

econômicos, sociais e dos próprios indivíduos.5 Contudo, a presença da China e a expansão

4 SILVA, Luiz Inácio Lula da. Discurso Inaugural, proferido na Sessão de Posse no Congresso Nacional. Brasília, Congresso Nacional, em 01 jan. 2003. Disponível em: <http://www.mre.gov.br>. Acessado em 15 set. 2011.

5 BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Repertório de política externa.17

Page 19: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

dos laços econômicos dos países sul-americanos com os países asiáticos se apresentam como

desafios para os formuladores da política externa brasileira. A posição brasileira, sobretudo

durante o primeiro mandato de Lula, foi proativa, não escondendo sua intenção de exercer

uma liderança efetiva, que seria a base para uma estratégia de poder regional, que projetaria o

Brasil no exterior (BARBOSA, 2008). Contudo,

em virtude da reação negativa que essa atitude despertou na vizinhança e do ativismo cada vez mais incômodo de Chávez, o governo brasileiro modificou seu discurso público, sem, no entanto, abandonar o papel protagônico da política externa sul-americana. Agora, apresenta-se como um ator de equilíbrio e moderação para a região (BARBOSA, 2008).

Nesse sentido, o argumento brasileiro que sustentou as iniciativas de integração

regional foi da necessidade de organizações intergovernamentais regionais que estruturassem

a institucionalidade requerida para a criação de mecanismos de coordenação e o

estabelecimento de projetos de cooperação.

Por um lado, considerou-se que a integração regional não poderia ficar restrita ao

âmbito do Mercosul, tanto por sua abrangência geográfica limitada à Bacia do Prata, como

por seu caráter principalmente comercial. Por outro lado, a integração latino-americana e

caribenha, embora considerada importante para o Brasil, foi percebida, em virtude do grande

número de países envolvidos, como mais complexa, e cujos objetivos iniciais deveriam ser

modestos. A preferência por priorizar a região sul-americana se deu pela percepção de que as

relações com o entorno geográfico imediato ao território brasileiro e a coordenação política de

projetos concretos de integração seriam viáveis em âmbito sul-americano. Nesse sentido, no

final da administração Cardoso, foi anunciada a assinatura de um Acordo de Livre Comércio

entre o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN), o qual o governo Lula manteve

as negociações e, por fim, foi firmado em dezembro de 2003.

Outro elemento importante para enfatizar a prioridade da política externa brasileira

para com seus vizinhos foi a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos, realizada em 2000,

em Brasília, e da qual resultaria a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-

Americana (IIRSA).

Historicamente, em termos das relações bilaterais, a parceria do governo brasileiro

com a Argentina é estratégica para a articulação da cooperação e integração regional. Suas

relações foram afetadas pela desvalorização do real em 1999 e pela crise econômica e social

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da Argentina entre 2001 e 2002 (BUENO; CERVO, 2011). Ademais dos contenciosos

comerciais envolvendo a exportação de manufaturados brasileiros à Argentina, dificultando

sua reindustrialização, os governos de Lula e Néstor Kirchner apresentavam divergências de

visões também em relação ao Mercosul. Como aponta Cervo (2008), para o presidente

argentino, a superação das assimetrias internas do bloco viria em primeiro lugar, enquanto

para o presidente brasileiro, o foco seria a integração de todo o subcontinente sul-americano.

Nas palavras de Cervo, “um desejava aprofundar o Mercosul e realizar em seu seio os

objetivos da recuperação econômica, outro, utilizá-lo para promover interesses regionais e

globais, tanto econômicos quanto políticos.”

Contudo, como destacam Hirst, Lima e Pinheiro (2010), o maior envolvimento

brasileiro e seu papel mediador em crises locais na América do Sul, tal como na Venezuela,

em 20036, na Bolívia, em 20037 e 20068, e no Equador, em 20049, atrelado às atividades

comerciais e de investimentos crescentes com seus vizinhos sul-americanos, não significou a

aceitação automática na América do Sul da liderança brasileira. Os maiores exemplos disso

consistem na falta de apoio da Argentina e da Colômbia à postulação brasileira a um assento

permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e nas dificuldades impostas ao

Brasil em temas bilaterais – como é o caso da atuação da Odebrecht no Equador, da

nacionalização das instalações da Petrobrás pelo governo Morales na Bolívia, e das

reivindicações do governo Lugo, no Paraguai, para a renegociação dos termos do Tratado de

Itaipu.

6 No início de 2003, uma grande greve organizada pela oposição do governo Chávez atingiu o setor petrolífero venezuelano, responsável por 80% dos investimentos do país. O Brasil encaminhou ajuda ao país vizinho e propôs a criação de um Grupo de Países Amigos da Venezuela, que reuniu também Estados Unidos, Espanha, Portugal, Chile e México.

7 Em 2003, uma série de manifestações populares e conflitos envolvendo sindicatos, plantadores de coca, cidadãos comuns e o governo do presidente boliviano Gonzalo Sanches de Lozada, tomou as ruas do país após o governo declarar sua intenção em vender as reservas de gás natural do país para os Estados Unidos através de um porto chileno.

8 Com a aprovação da Lei dos Hidrocarbonetos, em 2005, houve novo impulso do movimento para a nacionalização das reservas de gás natural da Bolívia.

9 Em dezembro de 2004, teve início uma crise no Equador após o presidente Lucio Gutiérrez reestruturar a Suprema Corte de Justiça do país, demitindo 27 dos 31 juízes, somente semanas depois de a Corte ter apoiado os esforços da oposição de tirá-lo do cargo por acusações de corrupção. Com a reestruturação, o ex-presidente Adbalá Bucaram teve sérias acusações de corrupção derrubadas, permitindo seu retorno do exílio e causando revolta da população que protestou nas ruas.

19

Page 21: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Nesse sentido, a intenção da diplomacia brasileira durante o governo Lula para a

América do Sul alcançou resultados relevantes para a promoção da integração sul-americana.

Em primeiro lugar, foi criada a Casa, em dezembro de 2004. Em segundo lugar, foi criada

também a IIRSA e houve o estabelecimento de uma Agenda de Implementação Consensuada.

Em terceiro lugar, substituindo a Casa, houve a criação da Unasul e a assinatura de seu tratado

constitutivo em maio de 2008. Em quarto lugar, ocorreu a institucionalidade da Unasul como

ferramenta para a solução de controvérsias e tensões na região, tais como as que ocorreram

entre a Venezuela e a Colômbia10. Em quinto lugar, foram criados conselhos setoriais no

âmbito da Unasul11, visando debater e a articular de políticas em âmbito regional. Por fim,

houve ainda a eleição do primeiro Secretário-Geral da Unasul12, em maio de 2010.

1.2 A ampliação da agenda regional e a emergência do regionalismo pós-liberal sul-

americano

Em distintos contextos econômicos e políticos, os objetivos dos projetos de integração

regional modificaram-se ao longo do tempo. Deos e Wegner (2010) sintetizam que, nos anos

1960 e 1970, na América Latina, entendia-se que a integração deveria ser base para a

superação dos obstáculos estruturais do processo de industrialização, minimizando as

vulnerabilidades externas dos países.

A formulação das estratégias de inserção internacional dos países está fortemente

ligada a condicionantes externos - aqueles relacionados à evolução econômica e política

internacional – e domésticos. O abandono do paradigma livre-cambista na América do Sul,

impulsionado pela ascensão de líderes políticos de esquerda em diversos governos nacionais

na região, inclusive no Brasil, a partir dos últimos anos do século XX, traçou novos contornos

10 Uma crise entre os dois países se intensificou depois que a Colômbia levou à Organização dos Estados Americanos (OEA) denúncias de que a Venezuela abrigava guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e do Exército de Libertação Nacional (ELN). As acusações levaram o presidente venezuelano, Hugo Cháves, a romper relações diplomáticas com Bogotá.

11 Atualmente, a UNASUL conta com sete conselhos setoriais para tratar de assuntos relacionados a energia; saúde; defesa; infraestrutura e planejamento; desenvolvimento social; tráfico de drogas; e educação, cultura, ciência, tecnologia e inovação.

12 O primeiro secretário-geral da UNASUL foi o ex-presidente da Argentina, Néstor Kirchner.20

Page 22: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

para o conceito de integração econômica regional, no qual a promoção do desenvolvimento e

a busca de mecanismos políticos mais abrangentes de concertação entre os Estados

procuravam desvincular o modelo comercial de integração característico dos anos 1990.

Saraiva (2010) indica que as iniciativas de integração regional mais tradicionais na

América do Sul, o Mercosul e a CAN, “vão cedendo espaços para modelos mais cooperativos

que se afastam das categorias tradicionais de integração econômica orientadas para a

integração comercial.” A autora continua e aponta que, devido ao fato dessas iniciativas

buscarem uma melhor inserção das economias nacionais no sistema econômico internacional,

ficaram conhecidas como o “regionalismo aberto”, sendo orientadas para a obtenção de uma

economia de mercado mais aberta e com expectativas de articulação com outros países para a

construção de uma economia de escala competitiva internacionalmente.

O próprio Mercosul, hoje, parece ter um futuro incerto. Por um lado, Souto Maior

(2006) afirma que a falta de instituições adequadas faz com que desavenças de natureza

protecionista, principalmente entre os dois maiores parceiros do bloco – Brasil e Argentina –

tornem-se assuntos politicamente sensíveis. Por outro lado, há também as assimetrias

estruturais13 entre os dois sócios maiores e os dois menores – Paraguai e Uruguai -, porém,

não há, no bloco, mecanismos compensatórios eficazes para lidar com as insatisfações de

parte destes últimos.

Segundo dados do Banco Mundial, em 2008, Paraguai e Uruguai representavam

menos de 4% da população e 3% do PIB do bloco.14 O Brasil, em contraste, representava

cerca de 80% da população e 75% do PIB. Essas assimetrias que, segundo estudo do Instituto

de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), não têm sido reduzidas de forma significativa,

“determinam em parte a capacidade de os Estados-membros do Mercosul se beneficiarem da

maior integração econômica.” No mesmo estudo, o IPEA identifica que, a partir de 2003, o

processo de integração do bloco sub-regional tem sido retomado a partir de uma nova

perspectiva, na qual se procura conferir maior visibilidade às dimensões social e político-

institucional da integração, não se restringindo apenas aos aspectos comerciais.

13 Assimetrias estruturais são aquelas que se originam de discrepâncias na dimensão econômica, na posição geográfica, na dotação de fatores, no acesso à infraestrutura regional, na qualidade institucional e no nível de desenvolvimento dos Estados-membros (IPEA, 2010).

14 Medido em paridade de poder de compra (PPP, na sigla em inglês).21

Page 23: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Embora, em seus primeiros anos, o Mercosul tenha sido bem sucedido em promover

maior intercâmbio comercial, suas contribuições ficaram muito aquém das expectativas

econômicas existentes para a integração. Como afirma Kfuri, nesse contexto, um novo

modelo de regionalismo que ampliará a agenda de integração sul-americana surge com um

caráter multidimensional, procurando atender também a demandas sociais, culturais, políticas

e infraestruturais. Veiga e Ríos (2008) definem um processo de revisão crítica das políticas

econômicas adotas na região nos anos 1990, o qual é desenvolvido por alguns países da região

em graus distintos:

Emerge, através de iniciativas bastante heterogêneas como a Unasul e a ALBA, um regionalismo pós-liberal na região, que pretende expressar, no campo das relações intra-regionais, uma nova ordem de prioridades e uma nova agenda diretamente relacionada ao deslocamento para a esquerda do eixo de poder político em diversos países da região. (VEIGA, RÍOS, 2008, p. 2)

Como os autores apontam, o contexto de uma tendência liberalizante nos países da

América do Sul começou a ser alterado a partir de sucessivas crises das economias

emergentes nos últimos anos do século XX, tal como ocorreu no Brasil, em 1999, com a

desvalorização cambial, e com a Argentina, em 2001. Esse novo regionalismo abriu espaço

para discussões sobre os impactos distributivos do comércio e a questão das assimetrias,

sendo os principais exemplos desse novo regionalismo a ativa participação do Brasil nesses

processos, a criação da Unasul e o relançamento do Mercosul, em 2003 (KFURI, 2010).

Embora as vitórias das forças de esquerdas nos principais países do continente e o

acelerado crescimento das economias da região entre 2001 e 2008 tenham fortalecido os

processos de integração da América do Sul, a crise de 2008 mudou o cenário regional e

evidenciou as dificuldades e limitações fiscais e financeiras dos países em proceder com os

projetos econômicos e sociais planejados anteriormente. As grandes dificuldades em realizar

um projeto sul-americano se mostraram relacionadas a quatro principais fatores. Primeiro, as

economias sul-americanas são, essencialmente, primário-exportadoras e há pouca integração

entre elas. Segundo, as assimetrias e desigualdades nacionais e sociais são significativas. Em

terceiro lugar, falta uma infraestrutura de âmbito continental que possibilitasse maior

interação e integração. E, por fim, os objetivos regionais não são caracterizados como

permanentes o que impossibilita uma estratégia regional em longo prazo (IPEA, 2010).

22

Page 24: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Nesse sentido, a Unasul, como afirma Saraiva (2010), tem um perfil diferente das

demais iniciativas para a integração da América do Sul e se aproxima mais de um instrumento

de governança regional. Sendo a herdeira a iniciativa brasileira que, em 2004, em Cuzco,

levou à criação da Comunidade Sul-Americana, “a partir da eleição de Lula, a diplomacia

brasileira concentrou esforços mais diretos na sua institucionalização.” Dois anos após sua

criação, durante a cúpula de 2006, na Bolívia, Lula enfatizou a importância de haver o

comprometimento dos países sul-americanos para a integração energética e para o

fortalecimento das políticas sociais na região, além de debater pontos sobre a livre circulação

de pessoas na região e sobre a proteção ao meio ambiente (KFURI, 2010). Foi no ano

seguinte, na cúpula realizada na Isla Margarita, na Venezuela, que os presidentes

concordaram em alterar o nome da instituição para Unasul. Na mesma reunião na Venezuela,

ocorreu também a I Cúpula Energética Sul-Americana, da qual participaram nove dos doze

chefes de Estado e de governo da região, os quais acordaram na criação de um Conselho

Energético, visando a articulação de estratégias e ações no setor para a América do Sul

(KFURI, 2010).

O Mercosul, por sua vez relançado, abandonou aos poucos a idéia de um bloco

puramente comercial, mas estendeu sua preocupação com a integração física e social dos

países., de modo que novos órgãos para tratar temas como de direitos humanos, democracia e

questões sociais foram criados.

O Tratado de Assunção, em seu Art. 6º, ao criar o Mercosul, mencionava que os seus

Estados-membros reconheciam a existência de “diferenças pontuais no ritmo de liberalização

comercial” para Uruguai e Paraguai, contudo, o que se concedeu a essas economias durante

todo o processo de constituição e de consolidação do bloco foi uma maior flexibilidade em

relação aos compromissos assumidos. Até 2003, não constava na pauta do bloco o tratamento

dessas assimetrias por meio de políticas positivas.15 Ao tentarem revitalizar o bloco, os

presidentes dos Estados-membros identificam que o enfrentamento dessas assimetrias era

condição essencial para o sucesso do Mercosul e, a partir de então, nas declarações conjuntas

dos presidentes dos Estados-membros do Mercosul, a temática foi introduzida. Em um

terceiro momento, em 2004, o discurso passa a tratar da redução de assimetrias e, em 2007, o

15 São denominadas políticas positivas aquelas que buscam a redução das assimetrias por meio da intervenção ativa dos Estados, mediante a elaboração de políticas e de programas e ações que diminuam as disparidades produtivas e socioeconômicas entre os países membros do bloco (IPEA, 2010).

23

Page 25: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

termo é substituído por superação de assimetrias (IPEA, 2010). No âmbito do Mercosul,

surgirá, em 2005, o Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM), cuja atuação

prioriza as áreas em que as disparidades entre os Estados-membros são maiores e cuja

redução das diferenças entre os sócios é indispensável para equacionar as assimetrias. Essas

áreas são: infraestrutura física, estrutura produtiva, índices sociais dos Estados-membros e

fortalecimento institucional do bloco.

Anualmente, devem ser depositados no FOCEM US$100 milhões, dos quais 70%

devem ser aportados pelo Brasil, 27% pela Argentina; 2% pelo Uruguai; e 1% pelo Paraguai.

Para ser consonante aos objetivos do bloco, Paraguai e Uruguai têm o direito de utilizar até

48% e 32% anuais dos recursos do fundo, respectivamente. Brasil e argentina podem sacar até

10% anualmente, para investir em projetos que mitiguem as assimetrias entre os parceiros do

Mercosul.

Assim, é visível a introdução de temas econômicos não comerciais, tais como a

integração energética e de infraestrutura física; a cooperação financeira; investimentos; e

temas sociais e culturais, na agenda de integração entre os países sul-americanos (ALVES,

2008). O que se percebe, contudo, não é uma reversão brusca das políticas de abertura

características dos anos 1990, mas sim inflexões na direção de políticas mais protecionistas e

atitudes mais cautelosas em relação à liberalização unilateral (VEIGA, RIOS, 2008, p. 6).

A perspectiva do governo brasileiro quanto à nova agenda de integração de

infraestrutura é visível na formulação co Ministro das Relações Exteriores do governo Lula,

Celso Amorim:

De 2003 para cá, concluímos o acordo entre o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (CAN) e concebemos e impulsionamos diversos projetos para a integração da infraestrutura, em transportes, comunicações e energia. Essa integração física (...) constitui parte essencial do projeto de desenvolvimento do próprio Brasil. A aprovação, por exemplo, de financiamento do BNDES no valor de US$ 400 milhões para a ligação rodoviária do Acre ao Pacífico, via Peru, tem significado histórico e econômico sem precedentes, não apenas para a integração regional, como também para o progresso do Oeste brasileiro. (AMORIM, 2005, p. 2)

Nesse sentido, a Unasul surge como uma “síntese do novo conceito de América do

Sul” e que, segundo Veiga e Rios (2008), não é incompatível com os acordos sub-regionais

existentes - o Mercosul e a CAN. A Unasul surge como “o vetor da expansão geográfica e da

24

Page 26: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

expansão temática dos acordos sub-regionais”, mas que não impede que esses acordos

avancem em seus objetivos de constituição de uniões aduaneiras. No entanto, o que os autores

identificam é o desaparecimento da “convergência liberal”, que vigorou entre os países da

América do Sul durante os anos 1990, e a adoção de diferentes estratégias de inserção

internacional, nas quais as agendas de interesses não são convergentes.

Por um lado, há países que buscam ampliar sua integração à economia internacional e

as negociações com os Estados Unidos, protegendo os investimentos estrangeiros – como é o

caso do Chile. Por outro lado, Venezuela e Bolívia possuem maior preocupação em rever as

políticas de proteção aos investimentos estrangeiros. A Argentina, por sua vez, fortaleceu seu

posicionamento protecionista em âmbito comercial, especialmente impondo barreiras

tarifárias às exportações brasileiras que afetavam sua indústria. A maior economia da região,

o Brasil, nas negociações internacionais, assumiu postura ofensiva no debate sobre a

liberalização do comércio agrícola. Assim, a viabilidade de uma integração econômica é

questionável, pois não somente o Mercosul possui problemas internos entre seus sócios (desde

o protecionismo argentino, até as assimetrias reclamadas por Uruguai e Paraguai), mas a CAN

também carece de falta de vontade política e vulnerabilidade externa para levar adiante sua

integração. A aproximação entre os dois blocos evidenciaria mais assimetrias, principalmente

no que tange à economia brasileira em relação às demais, tornando a integração econômica da

região um objetivo complexo e distante.

A criação da Unasul dá origem a um ambicioso plano de cooperação e, ainda que de

forma superficial, seu tratado constitutivo abrange quase todas as esferas da integração e

ainda deixa margem para que novos mecanismos e propostas sejam adicionados ao processo

de integração regional. A prioridade do diálogo político da organização é refletida pelo

principio da unanimidade entre os Estados-membros na tomada de decisões (BUENO;

CERVO, 2011). Em sua estrutura, têm destaque o Conselho de Chefes de Estado, o Conselho

de Ministros de Relações Exteriores e o Conselho de Delegados.

Em sentido econômico, a Unasul se propõe a discutir e coordenar a implementação de

projetos que promovam a integração produtiva, energética e de infraestrutura. Conjuntamente

com o tratado constitutivo da organização, surge uma nova instituição: o Conselho Energético

(o qual terá origem na I Cúpula Energética Sul-Americana, na Isla Margarita, na Venezuela),

25

Page 27: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

partindo da percepção de que, para a região, a questão energética é um pilar essencial para o

desenvolvimento.

Outras instituições relacionadas à Unasul tomar forma em novas reuniões

presidenciais e ministeriais, como o Conselho de Saúde Sul-Americano e o Conselho de

Defesa, demonstrando uma forte tendência na regionalização de setores que anteriormente

estavam sob a égide de regimes internacionais. Ainda, destaca-se o Conselho de Infraestrutura

e Planejamento (COSIPLAN), cujo estatuto foi aprovado na I Reunião Ordinária de Ministros

do Conselho, em 2010, em Quito, e ao qual a IIRSA será subordinada, segundo o Plano de

Ação Estratégico 2012-2022 do Conselho.

Em sentido geopolítico, embora não tenha o objetivo de ser uma aliança militar, a

organização confere ênfase à segurança regional, de modo a afastar da região a interferência

de potências mundiais e organismos multilaterais internacionais (BUENO; CERVO, 2011).

Há ainda a proposta de consolidação do Banco do Sul – fortemente apoiada pelo

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) -, visando reduzir a

atuação e influência do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e do Banco

Interamericano de Desenvolvimento (BID) na região.

Assim, apesar dos ambiciosos planos traçados em seu tratado constitutivo, para muitas

propostas no âmbito da Unasul há pouca previsão de como ocorrerão. Por seu caráter

intergovernamental, a Unasul carecer de mecanismos adequados para internalização de

normas, subordinando sua eficácia às regras dos seus Estados-membros, uma vez que a

entrada em vigor das normas da organização depende da internalização dessas por todos os

membros.

Desse modo, pode-se dizer que o novo regionalismo sul-americano expresso pela

Unasul é antes de tudo a tentativa de criar medidas de confianças entre os países, preparando

o cenário na América do Sul para uma futura – e talvez distante – integração, uma vez que,

enquanto fórum político, esta tem a capacidade de estabelecer o diálogo entre os doze Estados

da região. O que se percebe não é que as esferas econômica e jurídica foram relegadas, mas

sim condicionada ao diálogo político. Contudo, mesmo nesse cenário, os Estados precisam

visualizar ganhos para que os processos de integração fossem adiante. E, no capítulo 3,

26

Page 28: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

analisaremos com mais atenção os interesses e ações da diplomacia brasileira na consolidação

da integração da infraestrutura física regional.

2 A MOLDURA POLÍTICO-DIPLOMÁTICA DA INTEGRAÇÃO DA

INFRAESTRUTURA NA AMÉRICA DO SUL

27

Page 29: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

No passado, os governos dos países sul-americanos, especialmente o Brasil, baseavam

o planejamento da infraestrutura física nacional e regional nas suas preocupações de natureza

geopolítica e em objetivos nacionais estratégicos para a segurança territorial. Os projetos

considerados prioritários até então eram aqueles cujas contribuições estivessem relacionadas à

ocupação de territórios, à consolidação da presença nacional em determinado entorno

geográfico e à autossuficiência econômica. Eliana Zugaib (2006) destaca que, por essas

motivações, os governos recorriam a políticas centralizadas de planejamento e de

investimentos, o que resultou, de um lado, no surgimento de pólos de desenvolvimento

econômico, e de outro, em investimentos ineficientes em infraestrutura, com impactos

socioambientais negativos.

Como destacado no capítulo anterior, objetivos políticos e diplomáticos da integração,

como o aumento do poder de negociação e a representação regional, foram consolidados na

América do Sul atendendo às exigências de uma nova ordem no sistema internacional, que

emergia ao final do século XX, sem, contudo, abandonar os esforços pela integração

econômica. Iglesias (2006) menciona que os avanços nessa direção se apresentam por meio de

duas estratégias. Primeiro, o aperfeiçoamento das zonas de livre comércio na região e,

segundo, pela integração dos sistemas de energia, transporte e telecomunicações, tendo como

base as experiências bilaterais, regionais e subregionais existentes.

Por meio de relatórios e publicações produzidos por instituições regionais, tais como o

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Corporação Andina de Fomento (CAF) e

a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), e das informações

disponibilizadas no banco de dados digital da IIRSA, buscamos definir o cenário de

emergência da IIRSA e quais as respostas a Iniciativa propôs para a conjuntura da

infraestrutura regional vigente até então, com especial ênfase aos interesses brasileiros

expressos no direcionamento de suas ações.

2.1 Características da infraestrutura física da América do Sul

A atual situação da infraestrutura na América do Sul apresenta um quadro

relativamente deficiente em comparação a estruturas existentes em outros países em

desenvolvimento. A situação não é de homogeneidade nem entre os setores e os subsetores da

28

Page 30: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

infraestrutra física, nem, é claro, entre os países da região. Moreira (2005), em sua análise

sobre os fundamentos econômicos da IIRSA, define com precisão o relativo atraso sul-

americano e a isso acrescenta o fato de que a infraestrutura da região não foi concebida para o

comércio intrarregional e, por esse motivo, os custos de transporte no comércio são altos e se

apresentam como uma barreira efetiva à integração dos mercados nacionais.

Apesar das iniciativas de integração das economias sul-americanas durante o século

XX, os volumes de comércio intrarregional ainda são baixos em relação aos que poderiam se

esperar entre vizinhos com economias relativamente abertas e convênios comerciais

preferenciais.

Conforme apresentam os relatórios de planejamento e de atividades da IIRSA, a

América do Sul é, por um lado, uma região rica em recursos naturais, com matriz

agroindustrial diversificada. Por outro lado, ela abrange um território cuja densidade

demográfica não é uniforme em toda sua extensão, havendo grandes vazios entre os núcleos

de concentração populacional - cidades como Buenos Aires, Bogotá, Lima, Rio de Janeiro e

São Paulo.

Os problemas de infraestrutura nas diversas regiões da América do Sul são variados e,

segundo se afirma no documento de definição da carteira de projetos da IIRSA, em alguns

casos, seria necessária a melhoria nos serviços de infraestrutura existentes pelo aumento da

demanda e, em outros, seria necessário trabalhar para integrar áreas isoladas.

Resumidamente, o documento identifica algumas das principais restrições à

infraestrutura de integração no território sul-americano que, somadas aos aspectos relatados

no estudo Un nuevo impulso a la integración de la infraestructura regional en América del

Sur, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), desenvolvido em 2000, apresenta a

conjuntura regional que desperta o interesse dos países sul-americanos em estabelecer não

somente a cooperação para a realização dos projetos de infraestrutura, mas também o

estabelecimento da conectividade entre suas economias e sociedades.

Com as iniciativas de zonas de livre comércio desenvolvidas na década de 1990,

houve certo crescimento do comércio intrarregional, se constituindo, assim, no principal fator

de evidenciou a insuficiência das conexões de infraestrutura de transporte, além de mostrar as

possibilidades de integração no setor energético (IGLESIAS, 2008).

29

Page 31: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Para setor de transportes, Moreira (2005) destaca que a infraestrutura não é propícia

para o comércio interregional, mas sim, tendo em vista a exportação de bens intensivos em

recursos naturais, é notável que a infraestrutura de transporte foi definida para o comércio

extrarregional, basicamente com a Europa. As barreiras geográficas, tais como os Andes, a

Amazônia e os grandes rios que cortam o subcontinente, e a ausência de estímulos para a

criação de uma infraestrutura funcional durante o processo de substituição de importações –

no qual vigoravam políticas fortemente protecionistas – contribuíram para um cenário

deficiente no setor de transporte rodoviário, apresentando problemas de capacidade

insuficiente em alguns trechos, além de cruzamentos urbanos congestionados; problemas de

segurança viária; baixa proporção entre o número de vias pavimentadas e o número de

estradas existentes; estado das pistas, acostamentos e sinalização que demandam expressiva

manutenção; além de requisitos de habilitação díspares entre os países, assimetrias tributárias

e custos substanciais nas passagens de fronteira.

Por sua vez, a rede ferroviária apresenta restrições para a operação de trens de grande

porte; diferenças de bitolas e gabaritos entre os países; a velocidade permitida para a

circulação é considerada baixa, assim como os investimentos na modalidade; além da falta de

integração dessa rede com os demais modais de transporte. O mesmo relatório aponta que a

participação do segmento ferroviário nos fluxos internacionais é relativamente baixa, tendo

em vista que as ferrovias sul-americanas foram concebidas, em sua maioria, para o transporte

interno. A rede ferroviária sul-americana foi construída, em sua grande parte, durante a

primeira metade do século XX e, nesses dias, carece de problemas relacionados ao

financiamento e à gestão.

Os aeroportos dos países da América do Sul apresentam problemas de capacidade

insuficiente em determinados terminais, falta de equipamentos que garantam a confiabilidade

e a segurança operacional e requisitos de habilitação de aeronaves díspares.

Por fim, os portos e as demais vias navegáveis da América do Sul demandam medidas

e correções que assegurem a boa navegabilidade, entre elas a maior conexão com os modais

terrestres. Há ainda uma forte regulamentação de segurança que impõe custos excessivos ao

modal e também a demora na aplicação de tratados de transporte fluvial na região.

30

Page 32: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

O setor de energia na América do Sul tem-se mostrado como um ponto sensível para

as relações diplomáticas, pois, as restrições identificadas para a integração evidenciam

situações de concentração excessiva em certas fontes de fornecimento, deficiências em

capacidade de geração de energia, deficiências de infraestrutura de transmissão de energia em

países exportadores e importadores e diferenças em tarifação de recursos energéticos. Em um

estudo da CEPAL sobre as experiências da América Latina em infraestrutura, Santiago (2011)

afirma que os elementos que levaram os países da região a introduzir um processo de reforma

energética – em particular, sobre a energia elétrica – estão relacionados à necessidade de

investimento na expansão dos sistemas; ao desenvolvimento dos mercados de capital internos;

à necessidade de introduzir competitividade nos segmentos ou mercados nos quais é possível;

e à recuperação da eficiência dos sistemas elétricos. Nesse sentido, as modificações na

indústria elétrica implicaram na reestruturação dos segmentos da cadeia ligados à geração, à

transmissão e à distribuição de energia; no surgimento de novos atores; e em uma nova

estrutura institucional.

Em relação ao mercado de gás natural, em geral, os países da América Latina e do

Caribe não são atores significativos internacionais, representando cerca de 4% das reservas

mundiais. No entanto, na região, a Venezuela concentra 69% da oferta disponível de gás

natural, enquanto a Argentina e o Brasil concentram 35% e 27%, respectivamente, da

demanda da América do Sul. Como afirma Santiago (2011), atualmente, a busca pelo avanço

na integração nesse segmento, depois da experiência frustrada com o Mercosul e com a CAN,

está fixada no lançamento da UNASUL, com vistas a garantir condições de

autoabastecimento e de potencial de exportação para outras regiões.

Com a oferta concentrada em poucos países, a criação de uma instituição para a

promoção da integração gasífera não foi sustentada, e as interconexões bilaterais firmadas

intensificaram o sentimento de desconfiança entre os países. O principal exemplo dessa

conjuntura foi a nacionalização das reservas de gás bolivianas pelo governo de Evo Morales,

em 2006, o que implicaria no aumento dos impostos deste produto e ameaças de expropriação

da infraestrutura produtiva das empresas estrangeiras instaladas no pais, entre elas a brasileira

Petrobrás.

31

Page 33: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Segundo dados apresentados pela CEPAL, a oferta de gás natural na América do Sul,

em 2008, era estimada em 279 TCF16, enquanto a demanda projetada para o período entre

2008 e 2020 seria de apenas 104 TCF (Tabela 1).

Tabela 1. Reservas e demanda futura de gás natural na América do Sul

Países Oferta em 2008 (TCF) Demanda para 2008-2020 (TCF)

Argentina 17 37

Bolívia 22 2

Brasil 23 28

Colômbia 4 6

Chile 1 7

Equador 3 1

Peru 17 4

Venezuela 192 19

Total 279 104

Fonte: Gas Energy (GAS SUMMIT, 2008). Elaboração: Santiago (2008).

O Brasil tem clara capacidade na exploração e na produção de petróleo e gás -

representada basicamente pela Petrobrás - porém, suas reservas, disponíveis no momento,

especialmente de gás, são insuficientes. Como menciona Iglesias (2006), a discussão sobre a

ampliação da rede de gasodutos nas primeiras proposições da IIRSA é fundamental para os

interesses de abastecimento do Brasil.

Ademais, os interesses brasileiros na integração da rede de transportes e de energia na

região não estão limitados aos impactos diretos no comércio. O país possui as principais

empresas da América do Sul da área de serviços de engenharia, de fabricação de

equipamentos e de materiais para construção, e conta com um forte setor produtor de bens de

capitais. E, ainda, como afirma Iglesias (2006), essas empresas “tienen en los proyectos

16 Trilhão de pés cúbicos. 1 TCF equivale a 28,3 bilhões de metros cúbicos.32

Page 34: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

regionales una alternativa para las restricciones a la inversión pública y privada que existen en

el mercado doméstico.”

O setor de telecomunicação nos países sul-americanos também apresenta níveis de

infraestrutura insuficientes, incluindo acesso limitado a tecnologias da informação e da

comunicação em regiões rurais e diferenças regulatórias entre os países. Apesar disso, houve

significativos níveis de crescimento na maioria dos países da região, contribuindo para uma

melhora na cobertura telefônica e de internet em relação ao cenário que predominou em

décadas anteriores.

Até esse momento, o desenvolvimento das telecomunicações na América do Sul tem

ocorrido de forma heterogênea entre os países. Como aponta o relatório de Santiago (2011),

em relação ao acesso à internet:

A provisão de serviços de internet é uma das áreas mais novas no negócio de telecomunicações, cujo desenvolvimento em nível mundial teve início em 1990. Diferentemente dos países desenvolvidos, o nível de conectividade à internet nos países da região no final da década passada era praticamente inexistente, alcançando uma densidade média de apenas 1,29 conexão a cada 100 habitantes. Entretanto, nos primeiros anos da década 2000, produziu-se um crescimento importante nas conexões, o que implicou a melhora da densidade de internet, alcançando um nível de 5,16 em 2006 (SANTIAGO, 2011).

A modernização e a relativa expansão dos serviços de telecomunicação na América do

Sul encontram como um de seus fatores a privatização das empresas desse setor nos países da

região17, atrelado à redução progressiva do custo da tecnologia, devido aos avanços

computacionais e de informática que permitiram o aumento da capacidade de transmissão das

redes já existentes e a automatização de muitos processos. Ainda, segundo Santiago, dados da

primeira metade dos anos 1990 evidenciam que as empresas de telefonia fixa da região já

haviam digitalizado e automatizado aproximadamente 100% de suas redes,

independentemente do tipo de propriedade da empresa.

Diante desse contexto, quais as dificuldades mais evidentes para uma iniciativa de

integração da infraestrutura regional? Iglesias (2006) aponta que, tendo em vista os interesses

brasileiros em relação à construção das obras de infraestrutura de integração, o problema

17 O processo de privatização não implicou em melhoras significativas para o desenvolvimento da indústria da telecomunicação em todos os países da região. Como aponta Santiago (2011), no caso da Venezuela, o Estado não desenvolveu políticas concorrenciais sob o argumento de permitir a expansão da rede, o que gerou um monopólio que estagnou os avanços no setor.

33

Page 35: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

central são as restrições existentes ao aumento do endividamento do setor público e a

dificuldade de constituir garantias adequadas para o financiamento quando a obra planejada é

realizada por empresas privadas. Ainda, quando tratamos da operação de um projeto de

infraestrutura, seja pelo setor privado somente ou por meio de uma Parceria Público-Privada

(PPP), além da dificuldade em constituir garantias para o financiamento da construção, é

necessário considerar também os riscos relacionados à regulação da operação, como as

intervenções reguladoras e as mudanças nos contratos pelos governos locais, os quais podem

provocar alterações expressivas na rentabilidade do projeto.

Por fim, uma característica sobressalente da integração sul-americana no século XXI

tem sido a institucionalização dos projetos transfronteiriços de infraestrutura, com evidente

enfoque na superação de barreiras de coordenação técnica, legal, administrativa e financeira,

por meio da incorporação do tema aos planos nacionais de desenvolvimento e pela definição

de uma nova agenda das relações econômicas na América do Sul.

Na sequência, se realiza uma breve apresentação dos avanços regionais na construção

de uma infraestrutura física sul-americana no âmbito do projeto IIRSA, a iniciativa mais

importante na atualidade que trata do tema e cujo objetivo é o desenvolvimento da

infraestrutura regional de transporte, energia e telecomunicações em um marco de

competitividade, sustentabilidade ambiental, qualidade social e institucional.

2.2 A conjuntura diplomática do lançamento da Iniciativa para a Integração da

Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA)

O início do século XXI para a América do Sul esteve marcado pelo fortalecimento e a

consolidação de suas instituições democráticas, pela valorização da estabilidade política, pelo

compromisso com os direitos humanos e com a proteção ao meio ambiente, pela superação de

injustiças sociais e pelo desenvolvimento de suas populações18. Esses aspectos possibilitaram

um ambiente de cooperação que, ademais das tensões diplomáticas existentes, permitiu a

18 COMUNICADO DE BRASÍLIA, 2000.34

Page 36: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

adesão dos países ao princípio de solução pacífica e negociada de controvérsias. Os

comprometimentos com o crescimento de suas economias e com a promoção de um

desenvolvimento sustentável constituíram, assim, nos dois pilares fundamentais para o

aprofundamento dos processos de integração regionais.

A IIRSA teve origem com a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos, em Brasília,

em 2000. Na oportunidade, os presidentes dos doze países sul-americanos19 se reuniram e

assinaram acordo para a realização de ações conjuntas que pudessem impulsionar a

aproximação política, social e econômica do continente, tendo como principal foco a

modernização da infraestrutura regional para a integração física. O Comunicado de Brasília,

resultado desse encontro pioneiro na história da América do Sul, declara que:

Los Presidentes coincidieron en la evaluación de que la estabilidad política, el crecimiento económico y la promoción de la justicia social, en cada uno de los doce países de América del Sur, dependerán en buena medida de la ampliación y de la profundización de la cooperación y del sentido de solidaridad existente en el ámbito regional y del fortalecimiento y de la expansión de la red de intereses recíprocos. Identificaron, en ese sentido, una seria de temas cuyo tratamiento podrá beneficiarse de un enfoque especifico de cooperación suramericana: democracia; comercio; infraestructura de integración; drogas ilícitas y delitos conexos; información, conocimiento y tecnología (COMUNIDADO DE BRASÍLIA, 2000).

Assim, apesar do Comunicado de Brasília abranger também temas como a

democracia, o comércio, o tráfico de drogas ilícitas e ciência e tecnologia, foi sobre a

infraestrutura física que se alcançaram acordos mais amplos, imediatos e operacionais. Em

parte, pode-se dizer que esse resultado foi fruto de trabalhos desenvolvidos previamente e que

contaram com ativa participação do governo brasileiro.

A pedido do governo brasileiro, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),

com suporte da Corporação Andina de Fomento (CAF) e do Fundo para o Desenvolvimento

da Bacia do Prata (FONPLATA), elaborou um Plano de Ação a Integração da Infraestrutura

Regional da América do Sul, o qual teve por base estudos, como o já citado Un nuevo impulso

a la integración de la infraestrutura regional en América del Sur (BID, 2000) e Infrastructure

for Sustainable Development and Integration of South America, de Eliezer Batista da Silva

19 Estiveram presentes os Presidentes do Brasil, Fernando Henrique Cardoso; da Argentina, Fernando de La Rúa; da Bolívia, Hugo Bánzer Suárez; do Chile, Ricardo Lagos Escobar; da Colômbia, Andrés Pastrana Arango; do Equador, Gustavo Noboa; da Guiana, Bharrat Jagdeo; do Paraguai, Luis Angel González Macchi; do Peru, Alberto Fujimori; do Suriname, Runaldo Ronald Venetiaan; do Uruguai, Jorge Batlle Ibañez; e da Venezuela, Hugo Chávez.

35

Page 37: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

(1996). Com suas propostas para ampliar e modernizar a infraestrutura física da América do

Sul nas áreas de transporte, telecomunicações e energia, o objetivo do Plano de Ação era

configurar Eixos de Integração e Desenvolvimento para o futuro espaço econômico ampliado

da região, com especial atenção à situação dos países que enfrentam dificuldades geográficas

de acesso marítimo aos mercados internacionais. O lançamento político da IIRSA incluiu

também um cronograma de ações, que teria inicio com a convocatória de uma reunião a nível

ministerial para consolidar uma visão regional integrada sobre as linhas de ações necessárias.

Assim, os Ministros de Transporte, Telecomunicações e Energia dos doze países se

reuniram em dezembro de 2000, em Montevidéu. Nessa reunião, foram definidas as diretrizes

fundamentais sobre os distintos órgãos institucionais da IIRSA, o calendário dos trabalhos a

serem executados dentro dos Eixos de Integração e Desenvolvimento e dos Processos

Setoriais Integrados aprovados.

A IIRSA, como um mecanismo institucional de coordenação de ações

intergovernamentais dos doze países sul-americanos, tem o objetivo de construir uma agenda

comum para impulsionar projetos de integração de infraestrutura de transportes, energia e

comunicações. Sua criação, em 2000, responderia a um forte consenso dos doze países na

busca pela promoção da competitividade e da sustentabilidade econômica crescente, para que

a região alcance, de forma independente, um padrão de desenvolvimento estável, eficiente e

equitativo (IIRSA, 2010, p. 11).

A IIRSA propõe desenvolver e integrar a infraestrutura da região por meio de

determinadas linhas de ação. A primeira delas consiste no fortalecimento das capacidades

nacionais de investimentos e a coordenação entre os países. A segunda, promover a

harmonização em contexto institucional e regulatório de infraestrutura. E, em terceiro lugar,

identificar e desenvolver um conjunto de projetos que estimulem a participação do setor

privado (IGLESIAS, 2008).

Concebida como um projeto regional capitaneado por instituições financeiras

multilaterais, a IIRSA representou, por um lado, uma tentativa dos governos na busca por

aproveitar a maior agilidade e flexibilidade destas agências, para driblar restrições

orçamentárias e legais internas aos Estados. Por outro lado, com demasiada influência nos

36

Page 38: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

projetos, as decisões dessas agências oscilam de acordo com seus interesses próprios na

região20.

Como apontado anteriormente, os avanços em matéria técnica para a criação de um

projeto sul-americana para a integração de infraestrutura foram alavancados por iniciativa do

governo brasileiro. Contudo, o contexto político sul-americano em que foi feito o

Comunicado de Brasília permitiu a consolidação dessas expectativas. A consolidação da

democracia eleitoral foi um feito sem precedentes na região. Naquele momento, os doze

governos sul-americanos haviam sido democraticamente eleitos nos anos 1990 e, buscando

fortalecimento diante de possibilidades de futuras ameaças ao regime democrático, os países

da América do Sul apresentaram respostas coletivas para a defesa dos princípios

democráticos.

No caso do Mercosul, isso se deu pela Declaração Presidencial sobre o Compromisso

Democrático, em 1996, por parte dos quatro membros do bloco (Argentina, Brasil, Paraguai e

Uruguai) e pelo Protocolo de Adesão de Bolívia e Chile. Mais tarde, em 1998, os seis países

subscreveram o Protocolo de Ushuaia sobre o Compromisso Democrático. Por meio desses

instrumentos, os países reconheceram a vigência de instituições democráticas como condição

indispensável para a existência e o desenvolvimento dos processos de integração, sendo que

toda alteração da ordem democrática consistiria em um obstáculo inaceitável para a

continuidade do processo de integração regional (IIRSA, 2010).

Por sua vez, a CAN produziu, em 1998, a Declaração do Conselho Presidencial

Andino, na qual se estabeleceu que o bloco se constitui por uma comunidade de nações

democráticas e que tem entre seus objetivos principais o desenvolvimento da democracia e o

respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais. Entre 1998 e 2000, os mandatários

dos países andinos também subscreveram o Protocolo Adicional ao Acordo de Cartagena,

denominado Compromisso da Comunidade Andina pela Democracia, o qual destaca como

condição essencial para a cooperação andina e para a integração, a vigências de instituições

democráticas (IIRSA, 2010).

Assim, inspirados nesses dois protocolos, os presidentes sul-americanos manifestaram,

em Brasília, que a manutenção do estado de direitos e o respeito ao regime democrático em

20 Considera-se, ainda, que os Estados Unidos são o maior acionista do BID, com peso de 30% no total de votos nas decisões do BID.

37

Page 39: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

cada um dos doze países constituem compromissos compartidos e seriam essenciais para a

continuidade dos encontros regionais. Nesse sentido, a região fez progressos notáveis na

direção de uma área de paz e de um ambiente de cooperação e amizade entre os governos.

Ainda que o Comunicado de Brasília tenha acordado que a região era uma zona de

paz, a iniciativa, contudo, somente foi formalizado pouco depois, com a Declaração sobre

Zona de Paz Sul-Americana, em Guayaquil, em 2002. A ideia do Comunicado de Brasília de

que a América do Sul pode apresentar-se no cenário internacional como um ator importante

exigiu, assim, o desenvolvimento de um forte multilateralismo que fosse capaz de responder

às mudanças internacionais, visando o equilíbrio entre os direitos e os compromissos dos

países pelo desenvolvimento.

Desde a I Reunião de Presidentes Sul-Americanos em Brasília, em dez anos de

vigência da Iniciativa, foram realizadas doze cúpulas sul-americanas nas quais foi possível o

progresso para o lançamento da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) – sob a qual

foram realizadas as últimas seis das doze reuniões presidenciais mencionais. Em 2002, a II

Reunião de Presidentes Sul-Americanos ocorreu em Guayaquil, no Equador, e a III Reunião,

em 2004, em Cuzco, no Peru. Foi na III Reunião de Presidentes Sul-Americanos que o ideal

da integração regional pôde ultrapassar o plano teórico, ingressando em um plano de ação

(ZUGAIB, 2008). Naquele momento, se assumiu o compromisso de impulsionar a

implementação de 31 projetos prioritários de infraestrutura física da IIRSA.

A partir do ano seguinte, os presidentes dos países da América do Sul passaram a se

reunir sob a égide da Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), primeiro em Brasília, e,

em seguida, na cidade de Cochabamba, na Bolívia, em 2006. Em 2007, foi realizada a I

Cúpula Energética Sul-Americana, na e Isla Margarita, na Venezuela. As reuniões

presidenciais foram adquirindo um crescente formato institucional que culminou na

aprovação do Tratado Constitutivo da Unasul, em Brasília, em maio de 2008. Sob a Unasul,

em 2008, os chefes e chefas de Estado se reuniram em Brasília (Brasil), Santiago (Chile) e na

Costa do Sauípe (Brasil); em 2009, em Quito (Equador) e Bariloche (Argentina); e, em 2010,

em Los Cardales (Argentina) e Georgetown (Guiana)

A partir de 2009, e com a consolidação crescente da Unasul, se inaugurou um novo

capítulo institucional. Primeiro, porque a integração física regional está, agora, dentro de uma

38

Page 40: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

agenda mais ampla e que, necessariamente, exigirá interação com outras frentes de processos,

tanto em ordem política, como social, econômica e social. A Unasul tem delegado estas

responsabilidades aos respectivos conselhos que foram criados na instituição, entre eles o

Conselho de Infraestrutura e Planejamento (COSIPLAN), o qual será estudado no capítulo 3.

2.3 A definição de uma agenda regional consensuada

Ao longo de seus dez anos de trabalho, a IIRSA se constituiu em um dos principais

fóruns em que os doze países da região se viam representados para discutir o planejamento da

infraestrutura do território sul-americano. Pela primeira vez, a América do Sul atuou unida

para a definição de uma carteira de projetos de infraestrutura nos setores de transporte,

energia e telecomunicações. O propósito desta seção é ilustrar o trabalho realizado na IIRSA

para a identificação e seleção de projetos de integração, assim como os esforços em

harmonizar regulamentações que tenham impacto sobre a viabilidade dos mesmos. Ao mesmo

tempo, buscamos levantar quais são os fatores que tornaram possível o avanço no diálogo e na

cooperação intergovernamental.

A IIRSA se organiza em quatro níveis de decisão: O Comitê de Direção Executiva

(CDE), as Coordenações Nacionais (CN), os Grupos Técnicos Executivos (GTE) e o Comitê

de Coordenação Técnica (CCT).

As diretrizes e prioridades estabelecidas pelos governos são transmitidas à Iniciativa

por meio de um conselho de Ministros de Planejamento e de Infraestrutura, os quais compõem

o CDE. O órgão atua em matéria de coordenação de planos de investimentos, marcos

regulatórios, regulamentação institucional e financiamento. Igualmente, é responsável por

validar as propostas técnicas dos GTE e do CCT. As reuniões co CDE também têm

acontecido ininterruptamente, desde 2000, quando os Ministros de Transporte,

Telecomunicações e Energia dos doze países se encontraram em Montevidéu.

As CNs são responsáveis pela execução local do plano de ação da Iniciativa, mediante

a articulação de atividades com os diversos setores do governo nacional e atores relevantes da

sociedade. A Coordenação Nacional da IIRSA no Brasil é exercida pela Secretaria de

39

Page 41: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Planejamento e Investimentos Estratégicos (SPI) do Ministério do Planejamento, Orçamentos

e Gestão (MPOG)21.

A coordenação dos trabalhos e dos Grupos Técnicos (GTE, responsáveis pela

execução dos trabalhos) é responsabilidade das agências financeiras multilaterais (BID, CAF

e FONPLATA), que formam o Comitê de Coordenação Técnica (CCT). Além de encaminhar

projetos para análise para o CDE, o CCT é responsável também pela contratação de estudos e

consultorias para orientar a tomada de decisões dos governos sobre os projetos e avanços do

processo de integração física.

A estrutura institucional da IIRSA permitiu encarar uma das dificuldades para que a

Iniciativa avançasse. A interação dos representantes dos doze governos sul-americanos, com o

apoio técnico e logístico dos organismos regional, permitiu a coordenação exitosa de

múltiplos atores envolvidos no processo. Ademais desses procedimentos de interação, foi

necessário o estabelecimento de enfoques, conceitos e metodologias que facilitassem os

entendimentos sobre uma agenda complexa. Essa complexidade era derivada do caráter

multinacional, multissetorial e multidisciplinar da IIRSA.

O Plano de Ação revisado em Montevidéu previa seu desenvolvimento seria realizado

levando em consideração os Eixos de Integração e Desenvolvimentos (EIDs),

complementados com os Processos Setoriais de Integração (PSIs). Em relação ao

aperfeiçoamento da visão da IIRSA, podemos identificar três etapas bem definidas em sua

história. A primeira se estendeu desde 2000 até o fim de 2003, e foi marcada pela proposta e

discussão dos EIDs e dos PSIs, assim como na preparação das Visões de Negócios22 de cada

Eixo e no planejamento inicial dos projetos. Politicamente, esse foi um período importante

que possibilitou a identificação das sensibilidades nacionais.

Entre 2003 e 2004 pôs-se em andamento o esforço em construir consensos entre os

países em torno de uma carteira comum de projetos prioritários. Com base nas experiências

21 A Coordenação Nacional da IIRSA foi atribuída à SPI pelo Decreto de 17/09/2011, que cria a Comissão Interministerial para a Integração da Infraestrutura Regional da América do Sul. Essa Comissão é integrada por um representante dos seguintes Ministérios: do Planejamento, Orçamento e Gestão; das Relações Exteriores; dos Transportes; das Comunicações; e de Minas e Energia.

22 A Visão de Negócios de cada EID consistiu na análise do território, das atividades econômicas, dos aspectos sociais e ambientais, e dos projetos identificados como necessários e seus impactos na integração regional.

40

Page 42: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

dos estudos metodológicos, a partir de 2005 se definiu uma segunda etapa cujo objetivo foi

produzir um salto de qualidade no planejamento territorial. Nesse momento, buscou-se

articular a infraestrutura com outras dimensões do desenvolvimento territorial, visando as

oportunidades produtivas, a preservação do patrimônio natural, considerando os impactos

sociais. Os pilares desse processo sempre fora os conceitos de Eixos de Integração e

Desenvolvimentos e os Processos Setoriais de Integração.

Um EID é um faixa territorial multinacional, um espaço geoeconômico, que inclui

certa dotação de recursos naturais, concentração populacional, áreas produtivas e serviços

logísticos. Por sua vez, um PSI tem por objetivo identificar os obstáculos de natureza

normativa e institucional que impedem o desenvolvimento e a operação da infraestrutura

básica na região, propondo ações para sua superação. Inicialmente foram propostos 12 EIDs

que, apôs discussões, foram redefinidos em 10, a partir da identificação de fluxos econômicos

atuais e potenciais, seguindo as lógicas do regionalismo aberto, da geoeconomia de facilitação

de fluxos e da formação de corredores voltados para fora da América do Sul (IPEA, 2011).

Os dez EIDs apresentados na reunião da CDE, em Santiago, em 2003, foram:

Eixo do Amazonas, cuja área se estende desde os portos do Pacífico na

Colômbia, no Peru e no Equador, até os portos brasileiros de Manaus, Belém e

Macapá;

Eixo Andino, que consiste em uma faixa desde a Bolívia, passando por

Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, e incorpora os dois principais

corredores viais norte-sul que interligam as cidades dos cinco países;

Eixo Andino do Sul, cujo desenvolvimento foi relativamente menor, sendo

concebido, inicialmente, pela faixa fronteiriça entre a Argentina e o Chile;

Eixo de Capricórnio, cuja área abrange o entorno do trópico de mesmo nome,

envolvendo a Argentina, a Bolívia, o Brasil, o Chile e o Paraguai, tendo em

seus extremos importantes instalações portuárias, tanto no Oceano Pacífico,

quanto no Atlântico;

41

Page 43: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Eixo do Escudo Guianense, abrangendo a Guiana, o Suriname, a Venezuela e

regiões dos estados do norte brasileiro, ou seja, regiões com baixa densidade

populacional e alta concentração de povos indígenas;

Eixo da Hidrovia Paraguai-Paraná, definido como uma área de influência que

comporta territórios da Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai – todos

eles vinculados de modo direto aos rios Paraguai, Paraná, Tietê e Uruguai;

Eixo Interoceânico Central, que consiste em uma faixa que abrange os portos

do sul do Peru, no Oceano Pacífico, passando por regiões do Chile, Bolívia e

Paraguai, até os portos no Atlântico no sudeste brasileiro;

Eixo Mercosul-Chile, que vincula os principais centros econômicos, cidades e

portos dos territórios de Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai;

Eixo Peru-Brasil-Bolívia, que congrega a zona da tríplice fronteira desses

países, ligando regiões amazônicas aos portos peruanos no Oceano Pacífico;

Eixo do Sul, que abrange uma pequena faixa entre os portos do sul chileno, no

Oceano Pacífico, e os portos do sul argentino, no Oceano Atlântico.

Em relação aos PSIs, o Plano de Ação de Montevidéu estabeleceu seis deles:

instrumentos de financiamento de projetos de integração física regional; integração

energética; facilitação de passos de fronteiras; tecnologias da informação e da comunicação

(TICs); sistemas operativos de transporte aéreo; sistemas operativos de transporte marítimo; e

sistemas operativos de transportes multimodais.

Após a etapa de definição dos eixos de atuação da IIRSA, passou-se para uma fase de

ordenamento da Carteira de Projetos, que ocorreu entre os anos de 2003 e 2004 e foi realizado

por diversos GTEs. Essa etapa construiu consensos sobre a importância relativa dos grupos de

projetos que foram definidos para cada EID, uma vez que houve vinculação direta da

infraestrutura física necessária com as características produtivas, sociais e ambientais dos

territórios envolvidos. Desse modo, um primeiro resultado tangível que detectamos ao

analisar o processo de desenvolvimento da Iniciativa é a constituição, entre 2003 e 2004, da

primeira Carteira de Projetos IIRSA, resultado de profundo debate e reuniões periódicas entre

os chefes de Estado e seus ministros e esforços das equipes técnicas em detectar os aspectos e

42

Page 44: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

as obras específicas que seriam necessárias para o desenvolvimento econômico das regiões do

continente.

Tabela 2. Composição setorial/subsetorial da Carteira de Projetos IIRSA

SETOR E SUBSETOR

Transporte Energia Telecomunicações

ProjetosInvestimentos(em milhões de

US$)Projetos

Investimentos(em milhões de

US$)Projetos

Investimentos(em milhões de

US$)

Aéreo 24 2.690,3 - - - -

Rodoviário 207 32.991,1 - - - -

Ferroviário 61 12.746,9 - - - -

Fluvial 74 2.837,4 - - - -

Marítimo 31 3.391,2 - - - -

Multimodal 15 439,7 - - - -

Passos de fronteira

39 293,5 - - - -

SETOR E SUBSETOR

Transporte Energia Telecomunicações

ProjetosInvestimentos(em milhões de

US$)Projetos

Investimentos(em milhões de

US$)Projetos

Investimentos(em milhões de

US$)

Harmonização regulatória energética

- - 1 380,4 - -

Geração de energia

- - 27 28.433,3 - -

Interconexão energética

- - 36 11.870,7 - -

Interconexão de comunicações

- - - - 9 44,7

TOTAL 451 55.390,1 64 40.684,4 9 44,7

43

Page 45: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

FONTE: IIRSA, Carteira de Projetos 2010

Conforme demonstra a Tabela 2, a Carteira de Projetos IIRSA apresenta um elevado

número de projetos concentrados no setor de transporte e, especialmente, no subsetor

rodoviário. Por sua vez ainda que em menor número, os projetos do setor de energia

representam 12% do total de projetos da Carteira, porém, 42% dos investimentos estimados

(e, dentro desse setor, merece destaque o subsetor de geração de energia, com quase 30% do

total dos investimentos estimados da Carteira).

Cabe ainda mencionar que, na Carteira de Projetos IIRSA, predomina os projetos de

âmbito nacional (estes alcançam um total de 443 projetos, correspondendo a 83% do total de

projetos da Carteira). Em seguida, figuram os projetos de âmbito binacional (78 projetos que

correspondem a 15%) e multinacional (13 projetos que correspondem a 2%). Assim mesmo,

esses projetos de âmbito nacional estão, em sua maioria, ligados com o melhoramento das

infraestrutura de integração entre os países. Tratando-se especificamente do Brasil, esse

aspecto será estudado mais a fundo no capítulo 3. A Carteira de Projetos IIRSA passou por

sucessivas mudanças, nas quais foram se agregaram novos projetos23. Assim mesmo, em

2004, na III Reunião de Presidentes Sul-Americanos, em Cuzco, os governos aprovaram a

Agenda de Implementação Consensuada (AIC) 2005-2010, visando concentrar esforços para a

execução de 31 projetos considerados estratégicos em uma perspectiva regional. A seleção

dos projetos da AIC 2005-2010 surgiu, assim, de um processo de decisão interno de cada país

e de negociação e consenso entre os governos da região. Ao mesmo tempo em que a

integração da infraestrutura física era uma tarefa de longo prazo, a AIC buscou eleger projetos

cujo resultado concreto pudesse ser enxergado em curto prazo, para que seus impactos

estimulassem a mobilização e as expectativas políticas e sociais em torno da Iniciativa.

Tabela 3. Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010

Nº Projetos EID/PSI Milhões de Países Status

23 Em 2003, a Carteira de Projetos IIRSA conformava 335 projetos para a integração da infraestrutura regional, com investimentos estimados em US$ 37,4 bilhões. Em 2010, a Carteira já era composta por 524 projetos, cujo investimento estimado era de US$ 96,1 bilhões.

44

Page 46: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

US$

1Duplicação da Rodovia 14 entre Paso de los Libres e Gualeguaychú

Mercosul-Chile

780,0 AR (BR) Execução

2Adequação do Corredor Río Branco-Montevidéu-Colonia-Nueva Palmira

Mercosul-Chile

234,0UY (AR-

BR)Execução

3Construção da Ponte Internacional Jaguarão-Río Branco0

Mercosul-Chile

35,0 BR-UYPré-

execução

4Duplicação do Trecho Palhoça-Osório (Rodovia Mercosul)

Mercosul-Chile

700,00BR (AR-

UY)Execução

5Projetos Ferroviário Los Andes-Mendoza (Ferrovia Transandina Central)

Mercosul-Chile

5.100,00 AR-CHPré-

execução

6Rodovia Internacional 60-CH (setor Valparaíso-Los Andes)

Mercosul-Chile

286,0 CH (AR) Execução

7 Gasoduto do Nordeste ArgentinoMercosul-

Chile1.000,0 AR (BO) Execução

8Construção da Ponte Binacional Salvador Mazza-Yacuiba e Centro de Fronteira

Capricórnio 23,0 AR-BOPré-

execução

9Nova Ponte Puerto Presidente Franco-Porto Meira, com Centro de Fronteira Paraguai-Brasil

Capricórnio 80,0 PY-BRPré-

execução

10Construção da Rodovia Pailón-San José-Puerto Suárez

Interocêanico Central

477,0BO (BR- CH-PE)

Execução

Nº Projetos EID/PSIMilhões de

US$Países Status

11Anel Ferroviário de São Paulo (Trechos Norte e Sul)

Interoceânico Central

850,0 BRPré-

execução

12Passagem de Fronteira Infante Rivarola-Cañada-Oruro

Interoceânico Centraç

2,0 BO-PY Execução

13Construção da Rodovia Cañada Oruro-Villamontes-Tarija-Estación Abaroa (1ª Etapa)

Interoceânico Central

49,0 BO (PY) Execução

14 Rodovia Toledo-PisigaInteroceânico Central

95,0 BO (CH) Execução

15Pavimentação e melhoramento da Rodovia Iquique-Colchane

Interoceânico Central

42,0 CH (BO) Execução

16 Recuperação do Trecho El Sillar Interoceâni 120,0 BO (CH, Pré-

45

Page 47: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

co Central PE) execução

17Centro Binacional de Atendimento de Fronteira Desaguadero

Andino 7,5 BO-PEPré-

execução

18Passagem de Fronteira Cúcuta-San Antonio Del Táchira

Andino 2,0 CO-VE Perfil

19Melhoramento da Navegabilidade do Rio Meta

Andino 108,0 CO-VE Execução

20Corredor viário Tumaco-Pasto-Mocoa-Puerto Asis

Amazonas 373,0 CO Execução

21Rodovia Paita-Tarapoto-Yurimaguas, Portos e Centros Logísticos

Amazonas 681,2 PE (BR) Execução

22Rodovia Lima-Tingo María-Pucallpa, Portos e Centros Logísticos

Amazonas 1.351,3 PE (BR) Execução

23 Porto Francisco de Orellana Amazonas 105,3 EQPré-

execução

24Pavimentação Iñapari-Porto Maldonado-Inambari, Inambari-Juliaca/Inambari-Cuzco

Peru-Brasil-Bolívia

1.384,3 PE (BR) Execução

25 Ponte sobre o rio AcrePeru-

Brasil-Bolivia

12,0 BR-PE Concluído

26Rodovia Boa Vista-Bonfim-Lethem-Georgetown (1ª Etapa: estudos)

Escudo das Guianas

3,3 GY-BR Execução

Nº Projetos EID/PSIMilhões de

US$Países Status

27 Ponte sobre o rio TakutuEscudo das

Guianas10,0 GY-BR Concluído

28Rodovia Venezuela (Ciudad Guayana)-Guiana (Georgetown)-Suriname (Paramaribo) (1ª Etapa)

Escudo das Guianas

0,8 VE-GY-SU Perfil

29Melhoramentos na Vi Nieuw Nickerie-Paramaribo-Albina e Travessia Internacional sobre o rio Marowjine

Escudo das Guianas

105,0 SU-GY Execução

30Exportação por Envios Postais para Pequenas e Médicas Empresas

TICs 5,0 Regional Execução

31Implementação do Acordo de Roaming na América do Sul

TICs 1,3 Regional Execução

46

Page 48: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

FONTE: IIRSA. Carteira de Projetos 2010.

Nota: Entre parêntesis identifica-se o(s) país(es) vizinho(s) influenciado(s) pelo projeto.

Esse espaço regional de coordenação criado pela IIRSA fomentou a cooperação entre

os países, sendo o principal exemplo o projeto da AIC Exportação por Envios Postais para

Pequenas e Médias Empresas, que busca promover a inserção dessas empresas no mercado

internacional por meio de um processo de exportação simplificado e com custos reduzidos

usando da plataforma logística dos correios nacional. Em um primeiro momento, foi feita a

adaptação da experiência brasileira do programa “Exporta Fácil” que, desde seu lançamento,

em 1999, proporcionou um aumento de 15% da base exportadora, sendo utilizado por cerca

de 25 mil empresas, exportando para mais de 190 países mais de 800 tipos de produtos.

A importância estratégica da AIC e da seleção de projetos que a formaram consistiram

em um “ponto de ruptura” na implementação da Iniciativa, uma vez que, segundo o Relatório

de Avaliação da AIC24, esta (i) propôs o estabelecimento de uma agenda de implementação

consensuada dos projetos IIRSA que, além de se tornar um marco simbólico e político desta

nova etapa da Iniciativa, permitiu acelerar a obtenção de resultados concretos em projetos de

alto impacto para a integração física continental; (ii) definiu um conjunto limitado de projetos,

o que ampliou a possibilidade de sua execução, já que facilitaria o estabelecimento de

prioridades por parte dos governos; e (iii) buscou estabelecer prioridades nos planos e

orçamentos nacionais, assim como nas atividades das agências financeiras, na estruturação de

esquemas de Parceria Público-Privada e na atração do setor privado para os projetos da

IIRSA.

Em suma, a organização institucional adotada para a IIRSA tem sido eficaz para a

construção de consensos políticos, assim como para reduzir as falhas de coordenação entre os

governos sul-americanos em relação aos temas da integração física. Sem dúvidas, como todo

processo institucional, a IIRSA ainda apresenta limitações a superar, no entanto, é indiscutível

seu caráter inovador e sua força operacional para a identificação das necessidades da região.

24 Relatório de Avaliação da Agenda de Implementação Consensuada2005-2010. p. 14.47

Page 49: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

3 A ATUAÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NA INTEGRAÇÃO DA

INFRAESTRUTURA FÍSICA REGIONAL

A ideia de avançar na questão de investimentos em infraestrutura e na integração dos

sistemas de infraestrutura da região não é nova para a diplomacia brasileira que,

historicamente, a vê como parte necessária do processo de integração econômica e da

expansão do comércio exterior brasileiro sobre a América do Sul (IGLESIAS, 2008).

As ações desenvolvidas pelo governo brasileiro se mostraram fundamentais para a

evolução das etapas pelas quais a IIRSA passou, considerando desde a proposição de estudos

técnicos, a convocação de reuniões entre líderes dos doze países sul-americanos, as propostas

48

Page 50: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

organizacionais da IIRSA e o relacionamento com as instituições financeiras multilaterais

(IMF) que apóiam formalmente a Iniciativa: BID, CAF e FONPLATA.

Os investimentos efetuados no âmbito da IIRSA têm um impacto substancial nas

economias da região e contribuem para elevar os níveis de competitividade e de

desenvolvimento social, criando novas oportunidades para as populações (IIRSA, 2010). O

reflexo do objetivo fundamental de melhor a infraestrutura física que conecta os países sul-

americanos consistem em implicações sociais importantes. Uma infraestrutura melhor é uma

ferramenta para a geração de novas oportunidades para as populações nas áreas mais pobres e

isoladas, facilitando sua integração à economia regional.

Neste capítulo, buscamos apresentar em que medida a diplomacia brasileira logrou a

internalizar dos aspectos fundamentais da IIRSA nos programas de desenvolvimento

econômico e social brasileiro e como buscou orientar os mecanismos institucionais do Estado

e a sociedade brasileira para a realização dos projetos e idéias da Iniciativa. No primeiro

momento, analisamos a inclusão de obras da Carteira de Projetos IIRSA na pauta de projetos

de infraestrutura nacionais e como a conjuntura regional também foi essencial para a

definição de projetos de infraestrutura nacionais não orientados à integração. Logo após,

expomos breves considerações sobre as questões sociais e ambientais, postas como alvos de

desenvolvimento da IIRSA. Em seguida, destacamos o apoio do financiamento público aos

projetos de infraestrutura regional como modo de alavancar a atuação das grandes empresas

brasileiras das áreas de serviços de engenharia e fabricantes de materiais e equipamentos para

construção na América do Sul. Por fim, apresentaremos brevemente a nova configuração da

agenda de integração da infraestrutura física regional e a atuação do Brasil já no governo de

Dilma Rousseff.

3.1 A convergência entre o planejamento brasileiro de desenvolvimento territorial e a

IIRSA

49

Page 51: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

A construção de um espaço sul-americano integrado não consistia em uma estratégia

bem definida para o regionalismo aberto característico dos anos 1990. Mudanças efetivas,

contudo, ocorreram a partir de 2000, quando os doze presidentes sul-americanos se reuniram

em Brasília e as discussões em torno da construção de um projeto sul-americano de integração

física tiveram como resultado a criação da IIRSA.

A IIRSA, com um mandato inicial de dez anos, se constituiu em um mecanismo

institucional de coordenação das ações intergovernamentais dos países sul-americanos,

inspirada no princípio de que a integração da infraestrutura regional promoveria a criação de

um espaço privilegiado de cooperação para o desenvolvimento socioeconômico sustentável.

Em cumprimento ao Comunicado de Brasília, os ministros de Transporte, Energia e

Telecomunicações dos doze países elaboraram um plano de ação para a integração de

infraestrutura regional, no qual ganhou ênfase os Eixos de Integração e Desenvolvimento

(EIDs), baseados na aplicação da Metodologia de Planejamento Territorial Indicativo.

Iglesias (2008) defende a ideia de que o investimento em infraestrutura e a integração

dos sistemas de infraestrutura da região são, para a diplomacia brasileira, uma das partes

necessárias para o processo de integração econômica e expansão das exportações brasileiras

no continente. Motivada pela relativa ausência de conexões em termos de transportes e de

comunicações, a própria IIRSA foi resultado de ideias originadas da diplomacia e dos

funcionários da área de planejamento do governo brasileiro. E, de igual modo, o autor aponta,

que o lançamento da Comunidade Sul-Americana de Nações, com forte ênfase na integração

de infraestrutura, contou com a ação mais pró-ativa do governo brasileiro.

O conceito de Eixos de Integração e Desenvolvimento, desenvolvido a partir das

idéias de Eliezer Batista, ex-presidente da Companhia Vale do Rio Doce e ex-ministro de

Minas e Energias durante o governo de João Goulart, descritas no livro Infraestrutura para o

Desenvolvimento Social e Integração na América do Sul, foi um dos subsídios para a

elaboração do Plano Purianual (PPA) do governo federal para os períodos de 1996-1999 e

2000-2003 (IPEA, 2011), que resultou em uma carteira de oportunidades para os

investimentos públicos e privados, ações coordenadas com diversos setores de infraestrutura e

também projetos e ações de desenvolvimento social, ambiental e de informação25 (IGLESIAS,

25 Em 1997, o governo brasileiro contratou diversos estudos para a identificação dos eixos de integração e desenvolvimento no Brasil. Esses estudos revisaram a rede de infraestrutura econômica do país com o objetivo de verificar as regiões onde havia desequilíbrios entre a demanda e a oferta de

50

Page 52: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

2008). Para Couto (2006), a IIRSA representaria, assim, a tentativa brasileira de expandir esta

metodologia de planejamento territorial para toda a região.

Como Zugaib aponta:

Há uma correlação entre os princípios básicos que fundamentam os eixos de integração e desenvolvimento nacional e aqueles traçados para alcançar a integração em escala continental. Esses princípios básicos norteiam a escolha dos projetos de infraestrutura que mais contribuem para aumentar a eficiência e a sustentabilidade do desenvolvimento econômico (ZUGAIB, 2006).

E, ainda, para José Paulo Silveira:

Um eixo de desenvolvimento não é um corredor de transportes, mas um espaço geoeconômico, onde existem demandas e oportunidades que devem ser satisfeitas mediante ações integradas. Tais ações devem ser realizadas nos campos da infraestrutura econômica (transportes, energia, telecomunicações, recursos hídricos), desenvolvimento social (educação, saúde, moradia), informação e conhecimento (qualificação profissional, desenvolvimento tecnológico, difusão e acesso à informação), além de gestão ambiental (SILVEIRA, 2001).26

Nesse sentido, Tavares de Araujo (2009) afirma que os projetos da IIRSA foram

escolhidos através de cinco parâmetros principais, os quais sejam: a adequação dos

investimentos aos ecossistemas de cada região; os impactos transnacionais; a

complementariedade entre os projetos organizados em torno de um projeto âncora; as

sinergias resultantes da interação direta e indireta entre os eixos; e a geração de oportunidades

de emprego e renda para os habitantes locais.

O autor destaca ainda que 60% dos projetos da Carteira de Projetos IIRSA “são

empreendimentos nacionais cujos impactos afetam os países vizinhos, em virtude dos critérios

de seleção referidos anteriormente.” Grande parte dos demais projetos consiste em operações

binacionais para a construção de pontes, túneis, passagens de fronteira, transmissão de

energia, eclusas, hidrovias, ferrovias e rodovias. O Brasil, por exemplo, está envolvido

diretamente em apenas seis dos projetos identificados na AIC, contudo, executa também

outros 34 projetos da IIRSA por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),

conforme relata a Tabela 4. Segundo Tavares de Araújo, isso se deve ao fato do PAC somente

diversos componentes dessa infraestrutura.

26 MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO. “Eixos da América do Sul impulsionarão desenvolvimento”. 08/10/2011.

51

Page 53: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

ter sido lançado em janeiro de 2007, de modo que esses projetos adicionais não consistiam em

projetos prioritários em 2004, quando foi consensuada a agenda de 31 projetos prioritários da

IIRSA.

O PAC organizou seus projetos e ações em três setores: infraestrutura logística,

infraestrutura energética e infraestrutura social e urbana. Sua principal ênfase é na conclusão

de projetos já em execução e na recuperação da infraestrutura existente. Para o período de

2007 a 2010, o PAC tinha investimentos estimados na ordem de US$ 252 bilhões. Mais de

50% do total de investimentos estimados do PAC seria destinado a projetos de infraestrutura

energética, basicamente na área de petróleo e gás natural e na geração de energia. Os projetos

de infraestrutura social e urbana representavam 34% desse total, e as obras logísticas

aproximadamente 12%. Essa atuação em projetos de energia reflete, em primeiro lugar, a

preocupação brasileira de que o crescimento econômico e a falta de investimentos na geração

de energia produzissem uma crise elétrica semelhante a que ocorreu em 2001. Em segundo

lugar, esta preocupação também foi estimulada pela crise com a Bolívia, buscando fontes

domésticas de gás. Em terceiro lugar, há uma necessidade crescente de investimentos na

exploração de petróleo no país (IGLESIAS, 2008).

Essa necessidade de investimentos na infraestrutura doméstica não se apresenta como

uma contradição à infraestrutura de conexão que o Brasil desenvolve com seus vizinhos no

âmbito da IIRSA. Considerando os projetos de logística, os dois eixos de atuação – doméstico

e regional – podem ser complementares. O crescente investimento do PAC concentrado no

setor de energia resulta, em parte, das próprias dificuldades da integração energética na região

– obrigando a Petrobrás a focar em seus projetos de geração de energia hidroelétrica no Brasil

(IGLESIAS, 2008).

Tabela 4. Projetos da IIRSA no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

Rodovias e Pontes

FerroviasPortos e

AeroportosHidrovias Energia Total

Amazonas 2 - 1 - - 3

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Page 54: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Capricórnio 2 2 1 - - 5

Escudo Guianense 2 - - - - 2

Hidrovias Paraguai-Paraná - 1 - 2 - 3

Interoceânico Central 3 - 1 - - 5

Mercosul-Chile 9 - 6 - - 15

Peru-Brasil-Bolívia - - - - 2 2

Total 18 3 9 2 2 34

Fonte: Ministério do Planejamento. Elaboração: TAVARES DE ARAUJO (2009).

Pelos dados apresentado na Tabela 4, identificamos que o PAC confere importância

especial ao Eixo de Capricórnio (o qual abrange também Argentina, Paraguai, Bolívia e

Chile) e ao Eixo Mercosul-Chile, sendo que cinco projetos, de um total de sete nos quais o

Brasil participa no Eixo de Capricórnio, estão incluído do PAC. O principal foco brasileiro

nesse eixo consiste em obras do setor de transporte no estado do Paraná, tais como o aumento

da capacidade do Porto de Paranaguá, a construção do anel viário de Curitiba e a construção

de uma nova ponte na fronteira do país com o Paraguai, para descongestionar o fluxo da Ponte

da Amizade.

Em relação ao Eixo Mercosul-Chile, dos 24 projetos da IIRSA em que há participação

brasileira, 15 estão incluídos no PAC e também consistem, essencialmente, em obras do setor

de transporte (como rodovias, portos e aeroportos), tais como o trecho sul do anel viário de

São Paulo, adaptações nos aeroportos de Campinas e Guarulhos e no porto de Itajaí.

3.2 O desafio do desenvolvimento socioambiental sustentável

O tema da sustentabilidade ambiental tem permeado as instituições, as políticas

públicas e as opiniões de diversos atores locais na América do Sul. No Brasil, os EIDs da

IIRSA cruzam áreas onde estão concentradas as maiores reservas naturais do país, em matéria

de minérios, recursos energéticos e biodiversidade. Assim, ainda que a região amazônica não

53

Page 55: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

seja a área do país onde estão localizados os fluxos de comércio e populacionais mais densos,

torna-se estratégica a discussão sobre as ações que o governo brasileiro tem empreendido na

região em questão de infraestrutura de integração regional.

Dos quatro EIDs que recortam a Amazônia, três tem sua expansão rumo ao Pacífico

(Eixo Andino, Eixo Amazônico e Eixo Peru-Brasil-Bolívia), e apenas um rumo ao Caribe

(Eixo do Escudo Guianense), o que evidencia o fato de que a integração regional da

infraestrutura física liderada pelo Brasil possui objetivos estratégicos de inserção econômica

internacional, alcançando com precisão os portos do Pacífico no Peru, no Equador e na

Colômbia (SENHORAS & GUZZI, 2009).

No eixo do escudo das Guianas, o objetivo econômico das obras se divide entre o escoamento de produtos oriundos da Zona Franca de Manaus com destino anos mercados consumidores da América do Norte e Europa, por meio do Mar do Caribe, e a utilização de recursos naturais e o aproveitamento do potencial hidrelétrico. Na projeção entre a Amazônia e o Pacífico, os eixos Peru-Brasil-Bolívia, Amazônico e Andino buscam dois objetivos geoeconômicos (...) a expansão do continente rumo ao Oceano Pacífico por meio da cooperação interestatal logística em transportes fluviais e rodoviários para o escoamento de commodities agrícolas e minerais [e] (...) a busca pela construção de redes energéticas desde essas regiões, findando abastecer as áreas centrais industrializadas do continente (SENHORAS & GUZZI, 2009).

No entanto, especialmente na região amazônica, onde os impactos dos projetos da

IIRSA afetam comunidades indígenas, populações tradicionais e ribeirinhas em 137 Unidades

de Conservação, a Iniciativa apresenta um risco potencial negativo em virtude das “ricas

zonas de biodiversidade e história pré-colombiana”, provocando o aumento de conflitos

sociais - ocasionados pelas migrações, grilagem, conflitos de terra e concentração fundiária ao

longo das redes logísticas e transporte – e ambientais – com o aceleramento do desmatamento

direto induzido pela construção de usinas hidrelétricas, rodovias, ferrovias e instalações de

fibras óticas, entre outras obras de infraestrutura, além da expansão da fronteira agrícola.

A afirmação de Senhoras e Guzzi (2009) é que falta à IIRSA e também aos projetos da

Iniciativa que incorporaram os Planos Plurianuais brasileiros uma “concepção estratégica da

gestão ampliada do meio ambiente”, pois têm se evidenciado limitações quanto ao

monitoramento dos impactos ambientais dos projetos (especialmente aqueles ligados à

integração da Amazônia e do Pacífico) e a falta de consideração sobre a conservação

54

Page 56: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

histórico-cultural e ambiental das localidades por onde perpassam as redes logísticas e

energéticas, fazendo as promessas de desenvolvimento, geração de emprego e

competitividade somente um mote do governo.

Especialmente a geração de energia hidrelétrica na Amazônia é complexa devido aos

impactos socioambientais das usinas. O Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, por exemplo,

incluso no Eixo Peru-Brasil-Bolívia, cuja construção está a cargo do consórcio formado pela

empresa estatal Furnas e pela construtora Odebrecht, orçada em US$ 12, 5 bilhões, é

composto por quatro hidrelétricas, sendo duas delas localizadas em Rondônia (usinas de Santo

Antônio e Jirau), próximas à fronteira com a Bolívia.27 Juntas, essas duas hidrelétricas têm

previsão de inundação de uma área de 529 km², o que acarretará no deslocamento da

população diretamente afetada, dando início a um processo de ocupações desordenadas.

Já nos estudos de impacto ambiental das represas de Santo Antônio e Jirau, foram

identificados impactos que afetariam os peixes, a fauna, a flora e a ameaça de propagação de

uma série de doenças tropicais entre a população, não somente no Brasil, mas no Peru e na

Bolívia também. Essa população, que geralmente já se encontra em precárias condições

econômicas e sociais, cria expectativas fomentadas pelo governo de geração de emprego,

contudo, com o início das obras, o que se percebe é o início de conflitos entre a população

local e os trabalhadores que se direcionam para a região em caráter temporário, pois esse

deslocamento afeta a demanda regional de bens, de serviços públicos, de habitações, ademais

do acúmulo de resíduos sólidos. Assim, as áreas protegidas passam a apresentar um alto grau

de vulnerabilidade por parte de novas atividades econômicas não-sustentáveis e necessidade

de migrações, principalmente em relação ao aumento da atividade madeireira e ao avanço do

desmatamento.

Desse modo, os projetos de infraestrutura para a integração da região amazônica

brasileira com seus vizinhos do norte apresentam um caráter estratégico para esse conjunto de

países, contudo, as estratégias para sua implementação nem sempre são as mais adequadas

socialmente e ambientalmente tendo em vista as comunidades locais impactadas pelas obras.

O que se observa nesse aspecto (e que será melhor definido na seção seguinte), é um forte

27 As outras duas represas que compõe o Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira são a Cachuela Esperanza, localizada em território boliviano e que se encontra em fase de estudos, e a Guajará-Mirim, também em fase de estudos iniciais, está localizada em águas binacionais Brasil-Bolívia (IIRSA, 2009).

55

Page 57: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

lobby de grandes grupos privados nacionais que executam as diversas obras de energia

elétrica e transporte rodoviário que passam por territórios ricos em biodiversidade ou por

reservas indígenas (no caso da Amazônia), o que compromete o desenvolvimento ambiental e

social sustentável em detrimento da ampliação do capital de um grupo seleto (SENHORAS &

GUZZI, 2009).

3.3 Motivações e incentivos à participação do setor privado brasileiro na integração da

infraestrutura regional

Esta seção tem como objetivo avaliar em que medida o movimento de investimentos

diretos realizados pelas empresas construtoras brasileiras em âmbito regional para os projetos

de infraestrutura tem contribuído para o processo de integração regional, apresentando

também as percepções do setor privado brasileiro composto pelas empresas exportadoras e

usuários da infraestrutura e dos serviços logística na região. Assim, claramente percebe-se

uma clivagem de posicionamento do setor privado brasileiro. De um lado, aponta-se à

“razoável distância entre as agendas dos setores público e privado no que tange à integração

física e logística da América do Sul” (SENNES; MENDES 2008), quando tratamos das

empresas usuárias da infraestrutura, e, de outro, a participação ativa das construtoras brasileira

na implantação da infraestrutura de transportes e energia (SARTI & HIRATUKA, 2001;

IGLESIAS, 2008; ANTUNES, 2007).

Iglesias (2008) aponta que o interesse brasileiro na integração da rede de transporte e

de energia não se limita somente à abertura de corredores de exportação. O Brasil é o país da

região que possui as grandes empresas da área de serviços de engenharia e conta com os

setores industriais de bens de capital e de equipamentos e materiais de construção

relativamente desenvolvidos, sendo os projetos regionais a grande alternativa que as empresas

brasileiras de serviços de engenharia e de equipamentos e materiais de construção para

contornarem as restrições ao investimento público e privado que existem no mercado

doméstico.

56

Page 58: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Em seu estudo sobre os interesses brasileiros na integração de infraestrutura na

América do Sul, Iglesias mapeou as principais multinacionais brasileiras e identificou que

dessas, sete estão relacionadas ao setor de serviços de engenharia, construção e materiais de

construção; três são empresas de engenharia e construção (Odebrecht, Andrade Gutierrez e

Queiroz Galvão); duas atuam no ramo do cimento (Votorantim e Camargo Correa) e outras

duas atuam na área de insumos para a construção (Gerdau e Tigre).

Sarti e Hiratuka (2011) utilizam o nível de distribuição geográfica de seus

investimentos para avaliar a importância dos países da região nas estratégias de

internacionalização das empresas brasileiras. Dados levantados por um estudo da Fundação

Dom Cabral, em conjunto com a Columbia University, em 2007, apresentam o índice de

distribuição regional dos investimentos das vinte maiores multinacionais brasileiras. Entre as

empresas já citadas anteriormente, percebe-se grande concentração de atuação das seguintes

empresas na América Latina: Andrade Gutierrez (88%), Tigre (86%), Gerdau (73%),

Camargo Corrêa (67%), Odebrecht (58%) e Votorantim (25%).

As empreiteiras brasileiras têm participado ativamente da implantação da

infraestrutura de transporte e energia na América do Sul, e são referências nos planos

tecnológico, financeiro e de gestão empresarial. Segundo aponta Antunes (2007), em estudo

da CEPAL, a construção de infraestrutura pelas empresas brasileiras tem também a vantagem

de contar com o apoio do BNDES (ponto que será analisado na próxima seção). Essas ações

empresariais em países da região contribuem também para a expansão dos mercados de

consumo para produtos brasileiros, uma vez que, para obter financiamento público, exige-se

uma cota mínima de produtos nacionais nas obras no exterior.

As obras da IIRSA representaram uma importante oportunidade para as construtoras

brasileiras no exterior e, desde os anos 1990, já havia uma estreita relação entre as

empreiteiras brasileiras e o corpo diplomático do país28. A Odebrecht, a Andrade Gutierrez, a

Queiroz Galvão e a Camargo Corrêa estão envolvidas no ambicioso projeto da Rodovia

Interoceânica, a qual, quando concluída, terá 2.586 km, e ligará os portos de Ilo e Matarani,

no sul do Peru, ao Oceano Atlântico, no Brasil.

28 FOLHA DE S. PAULO. Diplomacia brasileira ajudou empreiteiras.18/09/2011.57

Page 59: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

A Odebrecht também participa de outros projetos no Peru, tais como uma rodovia de

955 km que o Porto de Paita, no Oceano Pacífico, ao Porto de Yurimaguas, no Rio Huallaga;

na Argentina (gasodutos) e Venezuela. A Andrade Gutierrez presta serviços de construção no

Peru (túneis, usinas, portos), na Bolívia (trechos rodoviários), no Equador (oleodutos, pontes,

rodovias) e na Colômbia (ferrovias).

Em relatório sobre a integração regional e a IIRSA, por meio de entrevistas com

representantes do setor privado e público, a Prospectiva Consultoria identificou “uma

perspectiva negativa quando abordado o tema da convergência entre os acordos de integração

regional e as prioridades do setor privado” e que “embora haja alguma interlocução com o

setor privado, esta é limitada”, uma vez que o governo estabelece maior diálogo com as

grandes empreiteiras nacional, é receptivo à identificação das necessidades das demais

empresas, porém não converte esse conhecimento em ações. Converge com os resultados

desse estudo, a análise que Iglesias faz junto a representantes empresariais e que aponta certa

preocupação sobre a estratégia da IIRSA concentrar seus projetos de transporte no setor

rodoviário, tendo em vista que este não é o modal de transporte de cargo mais eficiente e

barato – além, é claro, das estradas serem indutoras de um processo de desmatamento.

A IIRSA, por se constituir em um projeto de integração física, ou se infraestrutura

hard, não congrega aspectos de integração regulatória (infraestrutura soft) para os serviços de

logística que utilizarão da estrutura de transportes construída. Segundo o mesmo estudo da

Prospectiva Consultoria, isso se deve ao fato da dificuldade de mobilização dos atores e

instâncias envolvidos nas questões regulatórias, sendo mais rentável em curto prazo, menos

propenso a gerar oposição política e mais fácil a mobilização de interesses de grupos privados

específicos – as construtoras.

Vitte (2009) afirma que, além das construtoras brasileiras, há grandes empresas

interessadas também em promover outros projetos da Carteira IIRSA, como os empresários

do agronegócio, especialmente as empresas dos setores de alimentos e grãos (como a Cargill,

a Louis Dreyfus, a Archer Daniels Midland e a Bunge) e de sementes transgênicas (como a

Monsanto) interessados nos projetos hidroviários, principalmente as obras de hidrovia

Paraguai-Paraná. O principal objetivo desses empresários é a redução dos custos para que

suas cargas cheguem aos portos do Pacífico, no Chile ou no Peru.

58

Page 60: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Ademais, Couto (2008) destaca o papel ativo de três das grandes empreiteiras

brasileiras na integração da infraestrutura da América do Sul: a Odebrecht, a Camargo Correa

e a Andrade Gutierrez. Essas empresas se constituíam em holdings e diversificaram seus

negócios, inclusive na América do Sul.

Além da área de engenharia, a Odebrecht é o maior grupo petroquímico da América ao controlar a empresa Braskem, e prevê investimentos bilionários nos próximos anos em sua subsidiária ETH Bioenergia, voltada para a produção de etanol da cana-de-açúcar. Já a Camargo Correa tem sua própria fábrica de cimento e controla a Alpargatas Calçados (Havaianas, Rainha, Topper, Timberland e Mizuno), é acionista da Siderúrgica Usinminas, da concessionária de energia do estado de São Paulo CPFL e ainda da Companhia de Concessões Rodoviárias, controladora da Dutra (RJ-SP) e no Paraná, totalizando 1452 km em concessões rodoviárias. A Andrade Gutierrez não fica atrás: também é acionista da Companhia de Concessões Rodoviárias; da prestadora de serviços de energia Light; controla a empresa de telecomunicações Telemar (que engloba também a Oi Celulares) e terá a concessão do aeroporto de Quito, no Equador, ainda em construção (COUTO, 2008).

Ainda, é importante destaca o papel do Grupo Eletrobrás nos projetos de construção de

complexos hidrelétricos e hidroviários na região, os quais favorecem as principais empresas

mineradoras na região da Amazônia, cujos principais gastos decorrer dos custos com energia

elétrica. A Petrobrás, após a abertura de seu capital, também tem expandido sua atuação na

América do Sul.

Segundo Couto (2008), a IIRSA e seu foco em construir rodovias, portos e

hidrelétricas nos países da América do Sul consiste, assim, na reprodução, em escala regional,

do modelo de infraestrutura que essas grandes empresas já desenvolveram no Brasil em

décadas anteriores.

3.4 O financiamento público aos projetos de infraestrutura regional e o papel do BNDES

A América do Sul se constitui em um dos principais destinos das exportações

brasileiras de bens e serviços com alto valor agregado, ademais de ser também uma das

prioridades da política externa brasileira para a integração física e econômica da região, em

59

Page 61: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

setores como transporte e energia. O apoio com financiamento público foi importante para a

internacionalização das empresas brasileiras de serviços de engenharia no passado e

atualmente ainda é muito relevante (IGLESIAS, 2008). Como instituição pública a serviço

dos interesses comerciais e econômicos brasileiros, Alves (2005) afirma que o BNDES

adquiriu aspectos institucionais próprios, diferentemente das instituições privadas que prezam

pelas garantias aos seus recursos, pela viabilidade e pelo retorno financeiro de seus

empréstimos.

Um banco como o BNDES pode suportar financiamento de longo prazo em condições

competitivas. Na segunda metade dos anos 1990, estruturou um sistema de financiamento à

exportação, com diversas linhas e condições. Convocado pelo governo brasileiro para

financiar os projetos de caráter integracionista na América do Sul, os recursos do banco têm

sido aplicados para fomentar as exportações de produtos e serviços brasileiros para os

vizinhos, não apoiando, necessariamente, os projetos de integração regional.

A partir de 2003, o BNDES incorporou em sua missão o objetivo estratégico de atuar

como órgão financiador da integração da América do Sul, financiando as exportações de bens

e serviços brasileiros, os investimentos diretos brasileiros e a integração da infraestrutura

regional (DEOS & WEGNER, 2010). As operações do BNDES para o financiamento das

obras de infraestrutura no exterior são concebidas como operações de exportação de serviços

de engenharia, na modalidade de financiamento pós-embarque e, no caso desses serviços, para

que o financiamento seja realizado, é necessário o cumprimento de certos requisitos.

Basicamente, as exportações brasileiras de bens a serem incorporados ao projeto devem ser

de, no mínimo, 35% do valor do financiamento (IGLESIAS, 2008).

Nesse sentido, o Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR) da

Associação Latino-Americana de Integração (ALADI) tem cumprido um importante papel na

viabilização de financiamento aos investimentos necessários. Em termos gerais, o CCR é um

mecanismo subscrito pelos bancos centrais de doze países da América Latina29 e, por meio

dele, são cursados e compensados os pagamentos derivados do comércio intrarregional. Os

financiamentos aos projetos de infraestrutura cursados no âmbito do CCR consistem,

essencialmente, no apoio do governo brasileiro às exportações de bens e serviços para países

29 Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Chile, Equador, México, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela.

60

Page 62: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

da América do Sul. O CCR se apresenta como um fator relevante nessa estruturação de

garantias dos financiamentos brasileiros para a região, uma vez que, segundo dados

publicados na Revista BNDES, 72% dos US$ 3 bilhões desembolsados pelo BNDES em

financiamentos para países da América do Sul, entre 1997 e 2007, contaram com o CCR

como instrumento mitigador de riscos. A relevância do BNDES no processo de integração

regional da América do Sul é visível em virtude de sua capacidade de investimento e por suas

relações com o BID e com a CAF, sendo uma das formas que o governo brasileiro tem

utilizados nos últimos anos para ampliar a influência do país na região, uma vez que a atuação

da instituição deixou de limitar-se somente ao território nacional (SILVA, 2004).

Como aponta o mesmo estudo, em 2007, o Brasil foi credor do CCR com todos os

países, à exceção do Chile, sendo o principal fator a utilização do convênio pelo Brasil para

operações de exportações financiadas. Sendo uma importante fonte de financiamento para

projetos de infraestrutura na região, o governo brasileiro dispõe de linhas de financiamento

através do próprio BNDES e do Proex Financiamento, operado pelo Banco do Brasil. Em

2007, segundo o BNDES, 99% dos US$ 490 milhões liberados pelo banco em financiamentos

para a América Latina destinaram-se a projetos de infraestrutura, sendo que, 92% foram

cursado no CCR.

Entre 1997 e 2007, o Equador foi o país sul-americano que mais utilizou o CCR em

suas operações com o BNDES – 99% do total -, seguido por Paraguai (94$), Bolívia (88%),

Argentina (81%) e Peru (77%). A Venezuela, contudo, que apresenta baixo índice de

utilização do CRR no período analisado (somente 28%), atingiu, em 2007, 100% de utilização

nas suas operações com o BNDES.

No que se refere ao BNDES, sua carteira de operações destinadas a projetos de infraestrutura na América do Sul tem crescido fortemente, somando cerca de US$ 11 bilhões entre operações contratadas e em perspectiva, para investimentos da ordem de US$ 24 bilhões em projetos para construção de rodovias, pontes, hidrelétricas, gasodutos, linhas de transmissão, aeroportos, hidrovias, portos, ferrovias e sistemas de transporte urbano (metrô e ônibus) (RÜTTIMANN & KOBLITZ, 2008).

Na Tabela 5, apresentamos os projetos de infraestrutura que são financiados pelo

BNDES.

61

Page 63: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Tabela 5. Projetos financiados pelo BNDES na América do Sul – Exportação de serviços

de engenharia e outros

País/Projetos Financiamento em US$

ARGENTINA 516.000.000

TGS – Gasoduto San Martín 200.000.000

TGN – Gasoduto Norte 37.000.000

Albanesi – Gasodutos 279.000.000

CHILE 208.000.000

Ampliação do Metrô de Santiago 208.000.000

COLÔMBIA 28.000.000

Transmilenio 28.000.000

País/Projetos Financiamento em US$

EQUADOR 511.565.000

Aviões Embraer para TAME 61.600.000

Hidroelétrica San Francisco 242.965.000

Irrigação Manabi 113.000.000

Irrigação Tabacundo 64.000.000

Rodovia Iteroceânica 30.000.000

PARAGUAI 77.000.000

Rota 10 77.000.000

URUGUAI 29.000.000

Linha de transmissão UTE 3.000.000

Irrigação Maldonado 26.000.000

VENEZUELA 326.400.000

Hidroelétrica La Vueltosa 121.000.000

Linha 4 – Metrô de Caracas 107.500.000

62

Page 64: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Linha 3 – Metrô de Caracas 78.000.000

Modernização Prod. Maíz y Ganado / Fondafa II

19.900.000

Total 1.695.965.000

FONTE: BNDES (2005).

Como é possível observar na Tabela 5, nem todos os projetos financiados pelo

BNDES consistem em projetos para a integração da infraestrutura entre os países da América

do Sul. O banco tem financiado também projetos específicos de infraestrutura em seus

vizinhos, tais como as obras no metrô de Caracas e no metrô de Santiago, os quais não

pertencem à Carteira de Projetos IIRSA.

Em 2003, o BNDES, em parceria com a CAF, apresentou durante o I Seminário

Internacional de Co-Financiamento BNDES/CAF, realizado no Rio de Janeiro, 22 projetos a

serem executados no âmbito da IIRSA. Entre esses projetos destacavam-se obras com grandes

impactos socioambientais, como o Complexo do Rio Madeira, no Brasil; a Hidrovia Paraná-

Paraguai, na Argentina; e o Terminal Portuário de Nueva Palmira, no Uruguai. Mais tarde, em

2005, foi assinado um memorando de entendimento que estabeleceu os mecanismos de

cooperação entre as duas instituições, visando o fomento e a atuação conjunta em

financiamento de projetos orientados para a integração regional. Como exemplo, no Eixo

Andino, o BNDES financia obras no trecho rodoviário Cuchu-Ingenio-Santa Bárbara (que

liga Peru e Bolívia) com desembolsos da ordem de US$ 89,9 milhões, enquanto a CAF aporta

US$ 175 milhões. Outras obras rodoviárias que visam aprimorar a conexão entre os

departamentos bolivianos e interligam a Bolívia à Argentina também são financiadas em

parceria pelo BNDES e pela CAF (DEOS & WEGNER, 2010).

Em 2008, o BNDES analisou 10 projetos de exportação de serviços de engenharia na

América do Sul, sendo que desses, somente quatro pertenciam à Carteira de Projetos IIRSA e

somente um integrava a AIC. Os projetos com financiamento já aprovados e em análise

concentravam-se na área de energia (tais como gasodutos e hidroelétricas) e, na visão de

Iglesias (2008), essa fato pode estar relacionado com o know-how das empresas brasileiras

nesse tipo de projetos já realizados no Brasil e em outros países.

63

Page 65: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Tabela 6. Desembolsos do BNDES Exim para a área de infraestrutura no exterior

Setor 2004 2005 2006 2007 2008

Água e saneamento - - - - 1.095

Engenharia e construção 227.990 292.152 180.322 599.766 917.846

Eletricidade e gás 542 1.427 334 14.754 41

Informações e comunicações - - - 95.210 -

Telecomunicações - 495 - - -

Total Exim - infraestrutura 228.532 294.074 180.656 709.730 918.982

Fonte: BNDES (DEOS et al., 2009).

Ainda que o BNDES não esteja financiando diretamente os projetos de integração, o

banco tem ampliado significativamente os seus desembolsos para a América do Sul. Em 2010,

por exemplo, foram destinados US$ 1,1 bilhão na linha pós-embarque para apoiar as

exportações de bens e serviços brasileiros destinados à região – recurso cinco vezes maior do

que em 2001, que foram da ordem de US$ 184 milhões. A participação do BNDES no

financiamento dos projetos de infraestrutura regional está condicionada, assim, à utilização de

bens de capital brasileiros, porém, a lógica dos projetos de integração financiados pelo banco

não estão em conformidade com os aqueles definidos na Carteira de Projetos IIRSA. Para

Iglesias:

BNDES trabaja en un horizonte de más corto plazo, financiando proyectos que maduran inmediatamente en mayores exportaciones de maquinaria y bienes de capital brasileños (ejemplo, vagones de subtes), mientras que los proyectos de IIRSA generarían mayores exportaciones solo cuando las rutas estén terminadas, los mercados ganados y las redes de distribución establecidas (IGLESIAS, 2008. p. 176).

O BID, por sua vez, buscou estabelecer maior interação com o BNDES para o

financiamento dos projetos de infraestrutura, tais como estradas, ferrovias e hidrovias que

ligam o Brasil aos seus vizinhos. O primeiro exemplo disso foi a busca pela parceria para a

finalização de uma rodovia ligando o estado de Roraima a Georgetown, na Guiana, num

projeto estimado em US$ 150 milhões. A Guiana, por ser um dos países mais pobres do 64

Page 66: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

continente, teria acesso a financiamentos com prazo e juros privilegiados dentro do BID.

Contudo, pela Guiana possuir baixa capacidade para contrair endividamento, o BNDES

entraria financiando as construtoras brasileiras que desenvolveriam a obra. A expectativa do

BID é de que, se bem sucedida essa parceria, as duas instituições financeiras poderiam

replicar suas ações em outros projetos de infraestrutura na região – sendo que, há alguns anos,

o BID elegeu uma carteira de 510 projetos prioritários na IIRSA, num investimento estimado

em US$ 74,5 bilhões. O principal risco, contudo, que incide sobre esse e outros projetos de

infraestrutura e que podem acarretar na falta de interesse das empresas brasileiras em serem

financiadas, é se eles são economicamente viáveis e capazes de gerar receita que sirva de

garantia ao empréstimo30.

Assim, é possível afirmar que a recente articulação entre os países sul-americanos em

torno do fomento à infraestrutura regional proporcionou um movimento importante por parte

do BNDES, dinamizando a internacionalização das empresas brasileiras apoiadas pelo banco

e ampliando as parcerias do banco brasileiro com as IMF em prol da execução dos projetos da

Carteira IIRSA.

3.5 A Unasul e o COSIPLAN: novos mecanismos institucionais para a agenda da

integração da infraestrutura

A I Reunião de Presidente Sul-Americanos em Brasília, realizada em setembro de

2000, como assinalado até aqui, foi um marco para que a América do Sul estivesse na

centralidade da política externa brasileira na primeira década do século XXI. A criação da

União das Nações Sul-Americanas, em maio de 2008, com a assinatura de seu tratado

constitutivo, representou um novo marco para o processo de integração. Esta seção tem o

objetivo de apresentar brevemente a nova dinâmica na qual se organiza o IIRSA, conformada

às estruturas da Unasul, levando em consideração o protagonismo brasileiro na proposição das

duas instâncias.

30 VALOR ECONÔMICO. “BID quer parceria com BNDES para a infraestrutura”. 12 jul. 2010.65

Page 67: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Após a assinatura do Tratado Constitutivo da Unasul, a IIRSA passou a ser vista como

o “braço” de infraestrutura da nova organização, porém, a formalização deste entendimento

somente ocorreu em junho de 2010, quando a presidência pro tempore equatoriana da Unasul

convocou, pela primeira vez, o Conselho Sul-Americano de Infraestrutura e Planejamento

(COSIPLAN) (IPEA, 2011). Por meio da decisão que criou o COSIPLAN, o Comitê de

Direção Executiva (CDE) da IIRSA foi incorporado ao Conselho, cujo principal papel passou

a ser a obtenção de respaldo político para as atividades e projetos que gerem desenvolvimento

econômico e social na região – refletindo a postura do Brasil em fortalecer os debates no

âmbito da Unasul, aprofundando a busca por alternativas em nível político e não apenas

técnico para a questão do financiamento.

A primeira reunião do Comitê Coordenador do COSIPLAN foi realizada no Rio de

Janeiro, em abril de 2011. Na ocasião, a Ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão,

Miriam Belquior31, reunida com a Secretária-Geral da Unasul, María Emma Mejía, com os

Coordenadores Nacionais dos países sul-americanos e com representantes das instituições

multilaterais envolvidas na IIRSA (BID, CAF, FONPLATA e CEPAL), inaugurou uma nova

etapa de discussões para a integração da infraestrutura física da região. Visando alcançar os

objetivos propostos, o COSIPLAN apresentou seu primeiro Plano de Ação Estratégico (PAE)

para o período 2012-2022, na qual apresentou intenções de aperfeiçoar as metodologias e

ferramentas para executar e concluir projetos; incorporar mecanismos de participação social; e

concentrar sua atenção no financiamento de projetos de alto impacto na região. Na ocasião

dessa reunião, o início dos trabalhos do COSIPLAN foi realizado sob a presidência pro

tempore do Brasil.

Passando a receber diretrizes políticas dos países da Unasul e reduzindo a influência

das IMF, a IIRSA transformada em um foro técnico do COSIPLAN, passou a ser responsável

pelo acervo catalogado de projetos da Iniciativa, porém, por ter iniciado suas atividades

recentemente, anão houve, até o momento, a definição de projetos de infraestrutura

prioritários pelo COSIPLAN. A questão do financiamento às obras de infraestrutura, assim, é

vista com expectativa positiva, uma vez que poderá ser tratada de modo mais bem

estruturado, mas que, ao mesmo tempo, necessita de respostas efetivas em curto prazo

(VALOR ECONÔMICO, 2011)

31 MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO. Miriam Belquior participa de reunião do COSIPLAN. 28/04/11.

66

Page 68: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A integração sul-americana tem vivido seu momento mais favorável nas últimas duas

décadas. Primeiro, a abertura dos mercados permitiu a ampliação do comércio intrarregional,

traduzida especialmente pelos dois principais blocos da região, o Mercosul e a CAN. Com

essas iniciativas foi possível o desenvolvimento de uma malha de acordos regionais que

proporcionou um ambiente com maior espaço para a cooperação regional e, além disso,

evidenciou os principais gargalos da infraestrutura regional. Segundo, a política externa do

Brasil, a maior economia da região, atribuiu à América do Sul sua zona de atuação prioritária,

com a qual reuniria esforços para atingir objetivos estratégicos de inserção internacional, os

quais não ficariam restritos ao caráter comercial. Isso permitiu a emergência de uma nova

definição estrutural da integração regional, expressa pela Unasul.

Não obstante, o caráter intergovernamental da Unasul evidencia uma baixa

institucionalidade do órgão, quando analisamos sua força para que seus Estados-membros

internalizem as suas regras, sendo conseqüências também da diversidade de interesses e de

tensões políticas na região. É justamente essa dificuldade que faz da Unasul um fórum de

concertação política que busca a estabilidade regional como requisito para avançar na

integração. Assim, a aproximação política é pressuposto de aproximação econômica, social e

cultural, uma vez que a estabilidade política também é responsável por uma maior atração de

capitais para os países da região.

67

Page 69: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

Se a inserção competitiva do Brasil no mercado internacional passa, em um primeiro

momento, pela integração sul-americana, não é mero acaso o grande investimento da

diplomacia brasileira e de outras instituições governamentais, como o BNDES e o próprio

presidente Luiz Inácio Lula da Silva – por meio da “diplomacia presidencial” -, em estreitar

as relações com os países vizinhos.

Pela avaliação da diplomacia brasileira, os dez anos de existência da IIRSA foram

úteis para o diagnóstico das necessidades de infraestrutura física na região, para o

desenvolvimento de metodologias adequadas e a criação de uma carteira de projetos

consensuada (PEREIRA, 2011). No entanto, as insuficiências em questão de financiamento de

longo prazo foram as principais causas dos entraves para a realização das obras de

infraestrutura. Apesar da atuação financiadora do BNDES para que as empresas brasileiras

tivessem maior presença na região, a Iniciativa careceu de mecanismos que estimulassem o

setor privado a se envolver nos projetos – seja pelos riscos de regulação das operações e

interferências dos governos sul-americanos, seja pela falta de retornos financeiros em curto

prazo para os executores das obras.

Ainda não é possível determinar a direção que a integração da infraestrutura física

regional tomará sob a égide do COSIPLAN, considerando que o órgão, cujo estatuto somente

foi aprovado em 2010, realizou apenas duas reuniões de seu Comitê Coordenador.

Sob o enfoque de projetos de desenvolvimento nacional e regional, identificamos que

o desencontro entre essas duas agendas, no Brasil, é menor do que nos demais países sul-

americanos. A Carteira de Projetos IIRSA foi fundamental para a definição de projetos

também no âmbito do PAC, ao menos no setor de transportes. No setor energético, o Brasil,

identificando entraves para o diálogo cooperativo nesse tema em âmbito regional, tem

desenvolvido projetos de geração de energia independentemente das prioridades regionais.

Em termos econômicos para o Brasil, buscamos mostrar que a IIRSA apresentou forte

ênfase na abertura de mercados para as empresas dos grandes setores da econômica,

principalmente as de serviços de engenharia e construção. É por meio dessas empresas que o

governo brasileiro tem executado suas estratégias de inserção de bens produzidos no Brasil

nos mercados sul-americanos, sobretudo quanto as obras de infraestrutura são financiadas

pelo BNDES.

68

Page 70: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

No território brasileiro, os eixos da IIRSA cruzam zonas onde estão localizadas as

maiores concentrações de recursos naturais nacionais, o que implica em fortes debates entre

os setores público e privado contra ambientalistas e defensores do desenvolvimento social e

econômico sustentável – que, aliás, foi um dos pilares da criação da Iniciativa. Quanto à

Amazônia brasileira, em vista da articulação de diversos eixos da IIRSA, esta será impactada

pela instalação de grandes projetos de infraestrutura, de modo que os efeitos sociais e

ambientais acentuem cada vez mais a desigualdade entre as populações. Os benefícios da

integração física regional são inquestionáveis para as economias dos países sul-americanos,

contudo, não é verdadeira a afirmação de que todos sairão como vencedores desse processo.

Nesse sentido, as instituições criadas para promover essa integração ainda terão que articular

medidas e programas para dirimir os impactos negativos na sociedade e no meio ambiente.

Assim, para que a idéia de integração da infraestrutura física regional seja realmente

internalizada no Brasil, tal como proposto nos Eixos de Integração e Desenvolvido no âmbito

da IIRSA, faz-se necessário que as discussões e percepções dessa iniciativa não estejam

limitadas àqueles ministérios que compuseram a Coordenadoria Nacional da IIRSA (MPOG,

MRE, MTE, MC, MME), mas sim, sejam articuladas também com o Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, com o Ministério do Meio Ambiente, com

governos sub-nacionais e com a sociedade empresarial, visando uma iniciativa de

planejamento e integração territorial regional efetiva para confrontar os padrões de

desigualdade vigentes na América do Sul – tanto entre os países, como entre regiões do

Brasil.

69

Page 71: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

ANEXO A – IIRSA: Eixos de Integração e Desenvolvimento

FONTE: IIRSA. Carteira de Projetos 2010.70

Page 72: O regionalismo na política externa brasileira no século XXI - a infraestrutura física na estratégia de integração

ANEXO B – IIRSA: Projetos da Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010

FONTE: IIRSA. Agenda de Implementação Consensuada 2005-2010.

71

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