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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
FRANCISCA SUERDA SOARES DE OLIVEIRA
O PROGRAMA NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA
AGRICULTURA FAMILIAR: uma análise do processo de implementação no
período de 1999-2012
NATAL/RN
2013
FRANCISCA SUERDA SOARES DE OLIVEIRA
O PROGRAMA NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA
AGRICULTURA FAMILIAR: uma análise do processo de implementação no
período de 1999-2012
Monografia de Graduação apresentada ao
Departamento de Economia da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte como
exigência para obtenção do título de Bacharel
em Ciências Econômicas.
Orientador: Prof. Dr. João Matos Filho
NATAL/RN
2013
FRANCISCA SUERDA SOARES DE OLIVEIRA
O PROGRAMA NACIONAL DE FORTALECIMENTO DA
AGRICULTURA FAMILIAR: uma análise do processo de implementação no
período de 1999-2012
Monografia de Graduação apresentada ao
Departamento de Economia da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte como
exigência para obtenção do título de Bacharel
em Ciências Econômicas.
Aprovada em: __/__/____
_________________________________________
Prof. Dr. João Matos Filho
Orientador/DEPEC-UFRN
__________________________________________
Prof. Ms. Joacir Rufino de Aquino
Examinador/UERN
DEDICATÓRIA
A Deus, pela força e fé nas horas que achei que não iria mais seguir em frente.
A razão do meu viver, meus pais, Francisca Jacira e Marcos Antônio, que sempre me fizeram
acreditar na realização dos meus sonhos e trabalharam muito para que eu pudesse realizá-los.
A meu companheiro de todas as horas, Jonathan Alves, que sempre me apoiou nas horas
difíceis e compartilhou comigo todos os momentos.
Aos meus irmãos, Suenya Soares e Sanderson Marcos por todo o amor e apoio.
Aos meus amigos e familiares.
Dedico com muito amor este trabalho, a todos que de alguma forma tornaram este caminho
mais fácil de ser percorrido. Compartilho a imensa alegria deste momento, tão almejado por
mim.
AGRADECIMENTOS
A Deus, o criador de todas as coisas e razão do meu viver.
Aos meus pais, Francisca Jacira Soares e Marcos Antônio Dutra de Oliveira, pelos contínuos
ensinamentos, pela renúncia e a imensa capacidade de amar.
Aos meus irmãos, Sanderson Marcos Soares de Oliveira e Suenya Soares de Oliveira, que
sempre estiveram ao meu lado e torceram por mim.
A minha grande amiga e irmã Suenya Soares, por todo o apoio, pelo companheirismo,
carinho, dedicação, muitíssimo obrigada por tudo.
Ao meu namorado, Jonathan Alves da Silva, por toda dedicação e apoio nos momentos que
achei que não conseguiria, estando sempre ao meu lado, me ajudando e incentivando.
A minha família, em especial, para duas pessoas tão importantes na minha vida, Francisca
Elaine Soares Cordeiro e Francisca Jandira Soares, pela compreensão, paciência e amor.
Aos meus amigos, que sempre me apoiaram, por toda paciência e dedicação a nossa amizade.
Em especial, minhas eternas amigas, Luanny Barbara e Aline Rodrigues.
Aos meus mestres, do curso de Ciências Econômicas da UFRN, por estarem sempre
dispostos a ensinar e contribuir para a evolução profissional dos seus alunos.
Ao meu orientador João Matos Filho, que mais do que um orientador, sempre foi um amigo,
agradeço pela confiança no meu potencial, pela paciência, dedicação, incentivo e orientação.
Enfim, por ter despertado em mim o senso crítico e a busca incessante do conhecimento.
Não poderia deixar de agradecer a todos que compõem o Grupo Interdisciplinar de Estudos e
Avaliação de Políticas Públicas (GIAPP), pela imensa contribuição, pelas sextas-feiras
sempre e cada vez mais produtivas.
A todos da Secretaria do DEPEC que sempre aguentaram minhas agonias e resolveram meus
problemas burocráticos, Natália, Ricardo e Carmem.
A todos os anjos que encontrei nos corredores da UFRN, Márcia Costa, Isabel Borges,
Perilônia Campos, Carina Aparecida, Elaine Monique, Barbara Maia, Arthur Rodrigues, Ellen
Medeiros.
A todos da turma de Ciências Econômicas 2009.2, por tornarem os dias mais felizes,
principalmente nas agonias de provas, trabalhos, seminários. Agradeço a todos que
contribuíram com a sua amizade e apoio.
A todos da incubadora OASIS que apesar do curto período de convivência, fez os dias mais
felizes e especiais.
Agradeço a todos, porque ninguém alcança nada sozinho. Esse trabalho é fruto de muita
dedicação e do companheirismo de muitas pessoas que passaram e permanecem em minha
vida.
“Quem caminha sozinho pode até chegar mais rápido, mas aquele que
vai acompanhado, com certeza vai mais longe." (Clarice Lispector).
RESUMO
O PRONAF entrou na agenda decisória do governo com o objetivo de “promover o
desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de
modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de emprego e a melhoria
de renda”. Este trabalho tem como objetivo avaliar o processo de implementação do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), com destaque para os seus
aspectos distributivos em relação às regiões que compõem o país e no estado do RN, no
período de 1999-2012. Considerando que os resultados do PRONAF são bastante
diferenciados entre regiões, estados, microrregiões e municípios, indaga-se, como questão de
pesquisa: quais os resultados que estão sendo obtidos com a implementação do PRONAF?
Que fatores explicam esta diferenciação? Por que os agricultores mais pobres e mais
numerosos são aqueles que têm menos acesso à política de crédito do PRONAF? Para atender
os fins objetivados foram examinados, de um lado, o comportamento do PRONAF nas
regiões e no Rio Grande do Norte, e, de outro, o desempenho das culturas e criações que são
típicas dessas regiões e do estado, em particular. Na busca de resposta para essas questões
foram utilizadas pesquisas bibliográfica e documental, além da análise de dados secundários
com base em procedimentos de estatística descritiva. Verificou-se que as regiões mais
desenvolvidas e capitalizadas são os caminhos de aplicação dos recursos, em detrimento das
regiões menos desenvolvidas. Além disso, as culturas com maior sazonalidade e típicas dos
municípios mais pobres do Rio Grande do Norte, como é o caso do milho, feijão e mandioca,
não sofreram alterações em sua tendência natural, após a inserção do crédito rural. Desta
forma, o PRONAF ao longo do período em análise vem se mostrando como uma política
pública de viés excludente, setorial e desigual, na medida em que, seus efeitos e impactos
concentram-se em determinados produtos, produtores e regiões.
Palavras – chave: Política Pública; PRONAF; Crédito Rural, Avaliação.
ABSTRACT
PRONAF entered the legislative agenda of the government with the aim of "promoting
sustainable development of the rural segment formed by farmers in order to give them an
increased productive capacity, employment generation and income enhancement”. This study
aims to evaluate the process of implementation of the National Program for Strengthening
Family Agriculture (PRONAF), highlighting its distributional aspects in relation to the
regions that make up the country and the state of the RN in the period 1999-2012. Since the
results of PRONAF are quite different among regions, states, municipalities and micro-
regions, we look into, such as the research question: what results are being achieved with the
implementation of the PRONAF? What factors explain this difference? Why the poorest and
most numerous farmers are those who have less access to the credit of PRONAF? To meet the
targeted purposes were examined on one hand, the behavior of PRONAF among the regions
and Rio Grande do Norte, and on the other, the performance of crops and livestock that are
typical of these regions and the state in particular. In seeking to answer these questions
bibliographic and documentary research were used, in addition to secondary data analysis
procedures based on descriptive statistics. It was found that the more developed regions and
capitalized are the application paths of resources, to the detriment of less developed regions.
Furthermore, crops with greater seasonality and typical of municipalities the poorest Rio
Grande do Norte, such as maize, beans and cassava, are unchanged, no changes in its natural
trend, after insertion of rural credit. Thus, PRONAF over the period under analysis is proving
to be a public policy of exclusionary, sectoral and unequal bias, in that, their effects and
impacts are concentrated in certain products, producers and regions.
Keywords: Public Policy; PRONAF; Farm Credit; Evaluation
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1- Representação das interações das dimensões do desenvolvimento sustentável. ...... 30
Figura 2 - Ciclo das Políticas Públicas. ................................................................................. 41
Figura 3 - Tipos de Políticas Públicas ................................................................................... 43
Figura 4 - Dimensão de atuação das políticas públicas ......................................................... 44
Figura 5 - Modelo de intervenção setorial ............................................................................ 47
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Crédito rural do Pronaf por ano fiscal (1999-2012). Valor financiado
refere‐se a bilhões de reais. .................................................................................................. 59
Gráfico 2 - Distribuição do público potencial do PRONAF – Brasil (2006), em (%) ............. 60
Gráfico 3 - Evolução dos recursos do Pronaf, por região geográfica (1999-2012) ................. 61
Gráfico 4 - Panorama em termos percentuais na distribuição dos recursos do PRONAF, por
região (1999-2012)............................................................................................................... 62
Gráfico 5 - Distribuição do crédito do PRONAF por grupos de agricultores familiares – Brasil
(2006) .................................................................................................................................. 64
Gráfico 6 - Proporção das assistências técnicas recebidas, por região geográfica (2006) ....... 67
Gráfico 7 - Dinâmica dos recursos financiados pelo PRONAF no RN (1999-2012) .............. 71
Gráfico 8 - Principais causas da inadimplência do grupo B no RN (2009) ............................ 74
Gráfico 9 - Média percentual dos contratos do Pronaf, no estado do RN (1999-2012) .......... 75
Gráfico 10 - Divisão dos recursos do PRONAF alocados no estado do RN, por atividade
(1999-2012) ......................................................................................................................... 75
Gráfico 11 - Evolução do rebanho de bovinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012) ........ 76
Gráfico 12 - Evolução do rebanho de caprinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012) ....... 76
Gráfico 13 - Evolução do rebanho de ovinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012) .......... 76
Gráfico 14 - Evolução da quantidade produzida de feijão (tonelada), no estado do RN (1990-
............................................................................................................................................ 77
Gráfico 15 - Evolução da quantidade produzida de milho (tonelada) no estado do RN (1990-
2012) ................................................................................................................................... 77
Gráfico 16 - Evolução da quantidade produzida de melão (tonelada) no estado do RN (1990-
2012) ................................................................................................................................... 77
Gráfico 17 - Evolução da quantidade produzida de mandioca (tonelada) no estado do RN,
(1990-2012) ......................................................................................................................... 78
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Linhas de crédito do PRONAF, Plano Safra (2013-2014) ................................... 54
Quadro 2 - Classificação dos agricultores “pronafianos” por grupo, extraído da DAP. ......... 56
Quadro 3- Principais mudanças ocorridas no PRONAF (1997 a 2013) ................................ 57
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Potenciais beneficiários do PRONAF por grupos – Brasil (2006) ........................ 57
Tabela 2 - Total de recursos do PRONAF por estabelecimento e área em hectare, por região
(2006 e 2012) ....................................................................................................................... 63
Tabela 3 - Distribuição do número de estabelecimentos dos grupos do PRONAF – Brasil
(2006) .................................................................................................................................. 64
Tabela 4 - Número de estabelecimentos “pronafianos” associado a cooperativas (2006) ....... 66
Tabela 5 - Distribuição do montante de crédito do Pronaf (%), por ano e por estado (1999-
2012) ................................................................................................................................... 68
Tabela 6 - Distribuição do público potencial do PRONAF “B” – Região Nordeste (2006) .... 69
Tabela 7 - Número de contratos do PRONAF no Rio Grande do Norte (1999-2012) ............ 70
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BACEN Banco Central do Brasil
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BANCOOB Banco Cooperativo do Brasil
BANSICREDI Banco Cooperativo Sicredi S.A
CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
CPF Cadastro de Pessoas Físicas
CR Clube de Roma
CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
CUT Central Única dos Trabalhadores
DAP Declaração de Aptidão ao Pronaf
DNTR Departamento Nacional de Trabalhadores Rurais
EMATER Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EMBRATER Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
EUA Estados Unidos da América
FAO Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
FEBRABAN Federação Brasileira das Associações de Bancos
GM Geneticamente Modificados
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPCA Índice de Preços ao Consumidor Ampliado
MDA Ministério de Desenvolvimento Agrário
MERCOSUL Mercado Comum do Sul
OMC Organização Mundial do Comércio
ORNA’S Ocupações Rurais Não-Agrícolas
PAA Programa de Aquisição de Alimentos
PAM Pesquisa Agrícola Municipal
PEA População Economicamente Ativa
PLANAPO Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica
PNATER Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural
PNRA Programa Nacional de Reforma Agrária
PPM Pesquisa Pecuária Municipal
PROAGRO Programa de Garantia da Atividade Agropecuária
PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
RV Revolução Verde
SAF Secretaria de Agricultura Familiar
SNCR Sistema Nacional de Crédito Rural
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 16
1 ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE O DESENVOLVIMENTO RURAL NO
CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO: DO SETORIAL AO MULTIFUNCIONAL.. 21
1.1 AGRICULTURA FAMILIAR VERSUS AGRICULTURA PATRONAL ..................... 24
1.2 ABORDAGENS E VERTENTES TEÓRICAS DO DESENVOLVIMENTO
AGRÍCOLA BRASILEIRO ................................................................................................. 25
1.2.1 Revolução Verde ..................................................................................................... 25
1.2.2 Limites do Crescimento .......................................................................................... 26
1.2.3 Biotecnologia ........................................................................................................... 28
1.2.4 Agroecologia e o Desenvolvimento Sustentável ..................................................... 29
1.3 DESENVOLVIMENTO RURAL ................................................................................. 31
2 DISCORRENDO SOBRE A ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
AGRICULTURA: DIMENSÕES MACROECONÔMICA E SETORIAL ..................... 39
1.4 ETAPAS DE UMA POLÍTICA PÚBLICA ................................................................... 41
1.5 TIPOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS............................................................................. 43
1.6 DIMENSÕES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................... 44
3 ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO: O PROGRAMA NACIONAL DE
FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR.............................................. 50
1.7 COMPORTAMENTO DO CRÉDITO DO PRONAF POR REGIÃO GEOGRÁFICA DO
PAÍS .................................................................................................................................... 60
1.8 COOPERATIVAS E ASSISTÊNCIA TÉCNICA COMO AGENTES
DINAMIZADORES. ........................................................................................................... 66
1.9 ATUAÇÃO DO PRONAF NA REGIÃO NORDESTE ................................................. 68
1.10 DESEMPENHO DO PRONAF NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE .......... 70
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 80
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 82
16
INTRODUÇÃO
A longa trajetória da agricultura se iniciou no período neolítico, há cerca de 10 mil
anos atrás, quando o homem começou a cultivar plantas e criar animais, ao invés da vida
nômade em busca de caça, pesca e do extrativismo vegetal como forma básica de
sobrevivência. Desde então, as transformações ocorridas nos distintos conceitos de agricultura
são recorrentes: atividade dedicada ao cultivo da terra para produção de alimentos e matérias-
primas; setor da economia que cumpre funções específicas, ou seja, provisão de alimentos e
matérias-primas, geradora de divisas externas, financiamento da industrialização,
fornecimento de força de trabalho e mercado interno para produtos industriais; segmento do
complexo agroindustrial, ou dos complexos agroindustriais, também chamados cadeias
produtivas ou sistema agroalimentares. Nesse sentido, a agricultura mudou sua matriz
econômica de produção, alterou as relações de trabalho e a interação com os outros setores
econômicos, tornou-se uma atividade integrada com os demais setores, indústria e serviço
(MOZOYER; ROUDART, 2010).
O processo de modernização da agricultura, principalmente na Europa e nos Estados
Unidos, impulsionou a transformação da agricultura artesanal – caracterizada pela utilização
dos fatores rudimentares de produção e pelo conhecimento passado de geração a geração –
numa agricultura moderna, intensiva e mecanizada. A partir de então, a agricultura se
transformou num sistema de produção articulado com a indústria, e assumiu uma nova
configuração vista por alguns autores como um grande complexo agroindustrial, enquanto
outros enxergaram vários complexos industriais construídos em torno de produtos agrícolas
específicos e integrados às indústrias pela via da aquisição de máquinas, equipamentos e
insumos, ou pela venda de alimentos e matérias-primas para processamento industrial.
A intervenção do Estado foi fundamental para viabilizar as transformações ocorridas
na agricultura brasileira, ao impulsionar sua realização a partir da criação de políticas de
crédito rural, garantia de preços e tecnologia agropecuária, implementadas, respectivamente,
pelas seguintes instituições: agências oficiais de crédito, notadamente o Banco do Brasil e o
Banco do Nordeste; Comissão de Financiamento da Produção (CFP); Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e seus centros e Empresas Estaduais de Pesquisa
Agropecuária; Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER) e
Empresas Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATERs).
17
Para alguns especialistas da área, o crédito rural, no período de 1965 a 1980, foi a
principal política que alavancou a industrialização do campo. Durante o período de 1970 a
1985, foram transferidos para agricultura, a preços de 1997, cerca de US$ 31,5 bilhões na
forma de subsídios (COELHO, 2001).
Diferentemente dos países desenvolvidos, as transformações ocorridas na agricultura
brasileira não foram difundidas de forma generalizada por todas as regiões, países, produtores
e produtos. No caso brasileiro, apenas uma parte dos agricultores foi introduzida na lógica
industrial de produção, enquanto uma grande parcela dos agricultores ficou à margem desse
processo.
Nesse contexto, a agricultura familiar, dada suas diferenciadas características de
produção e organização social, encontrou grandes dificuldades para se inserir neste modelo de
modernização e foi “incapaz” de buscar um sistema próprio de reprodução, suficiente para sua
manutenção e fixação no campo. O êxodo rural passou a ser, então, um importante indicador
para verificar o número de agricultores que não conseguiram permanecer no campo, e
migraram para as grandes cidades, na maioria das vezes, não aptas para fornecer os elementos
básicos de sua subsistência, formando as periferias e favelas, onde se concentram os maiores
bolsões de pobreza.
Diversos programas foram criados para tratar das consequências negativas da
modernização da agricultura, em geral conhecidos pela denominação de apoio ao pequeno
produtor rural, baixa renda e combate à pobreza rural, sem que os problemas históricos de
pobreza e exclusão social fossem resolvidos. Por esta razão, as discussões sobre a necessidade
de uma política específica para agricultura familiar se acentuaram nos anos 1980, com a
redemocratização e a promulgação da nova Constituição Federal, e particularmente nos anos
1990 com a promulgação do PRONAF.
Na realidade, outros fatores impulsionadores contribuíram para a criação do
PRONAF, entre os quais se incluíram a pressão da sociedade civil organizada, dos sindicatos
rurais e de uma classe reduzida de agricultores familiares modernizados, principalmente da
Região Sul do país. O PRONAF foi criado pelo Decreto Presidencial n° 1.946, de 28 de junho
de 1996, “com a finalidade de promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural
constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade
produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda” (BRASIL, 1996, p.1).
As diretrizes de modernização e industrialização agrícola contidas nos princípios do
PRONAF fundamentam-se em um conjunto de ações, entre as quais estão incluídas: a criação
de linhas específicas de financiamento de custeio, investimento e comercialização para a
18
agricultura familiar; a formação de infraestrutura e a oferta de serviços de pesquisa;
assistência técnica e capacitação dos agricultores; o apoio à diversificação e verticalização da
produção agropecuária; e, como consequência, a profissionalização; o aumento de renda e a
melhoria das condições de vida das famílias rurais. A garantia de financiamento, nas suas
diversas modalidades, foi e continua sendo reconhecida como a principal ação implementada
pelo PRONAF com vistas ao fortalecimento da agricultura familiar. Por esta razão essa
política foi privilegiada para ser analisada nesta monografia.
Ora, se o PRONAF é uma política de natureza distributiva, estaria ela cumprindo esta
função e, assim, contribuindo para evitar as formas extremas de desigualdade e assegurar a
coesão interna da sociedade, ou ao contrário, estaria contribuindo para aumentar a
desigualdade regional e entre as diversas categorias de agricultores familiares? E, finalmente,
considerando que os resultados do PRONAF são bastante diferenciados entre regiões, estados,
microrregiões e municípios, indaga-se, como questão de pesquisa: quais os resultados que
estão sendo obtidos com a implementação do PRONAF? Que fatores explicam esta
diferenciação? Por que os agricultores mais pobres e mais numerosos são aqueles que têm
menos acesso à política de crédito do PRONAF?
O objetivo geral deste trabalho é analisar o processo de implementação do PRONAF,
com destaque para os seus aspectos distributivos em relação às regiões que compõem o país,
em especial, a região Nordeste e o estado do Rio Grande do Norte, bem como, verificar se a
política distributiva de crédito rural, em particular, o PRONAF cumpre sua função de
equidade social. Além disso, objetiva-se elencar alguns dos elementos que podem responder,
pelo menos em parte, as disparidades na absorção do crédito rural do PRONAF em algumas
regiões, em detrimento de outras. E, por fim, é objeto desta monografia verificar se a política
de crédito, por si só, é suficiente para dinamizar as atividades, agrícola e pecuária, dos
agricultores familiares mais carentes, em especial, no estado do Rio Grande do Norte.
Para alcançar os fins propostos nesse estudo, formam estabelecidos cinco objetivos
específicos: i) sistematizar o número de contratos firmados, bem como, o montante de crédito
rural financiado; ii) verificar a evolução de ambos, nas regiões e no estado do RN; iii) mostrar
a evolução de alguns cultivos agrícolas e da pecuária; iv) comparar o número de contratos
com cooperativas e assistência técnica entre as regiões do país; v) mostrar o índice de
inadimplência do principal grupo no estado do Rio Grande do Norte, o grupo B. Além disso,
procurou-se fazer uma discussão sobre as teses do desenvolvimento rural contemporâneo e a
literatura das políticas públicas, e estabelecer correlações entre a política pública do PRONAF
e o desenvolvimento rural.
19
Após duas décadas de existência do PRONAF, a maioria das pesquisas se concentra na
avaliação dos produtos, efeitos e impactos do programa, bem como na questão da equidade na
distribuição dos recursos, nas três esferas de atuação. Contudo, existem poucos estudos cujo
foco de análise seja a região Nordeste, com ênfase na desigual distribuição dos recursos do
programa entre os estados da região, em particular o estado do Rio Grande do Norte. Além
disso, são quase inexistentes os estudos que façam uma possível correlação entre o crédito
rural do PRONAF e o desenvolvimento das culturas agrícolas típicas da cesta básica alimentar
agricultura das famílias rurais. Os dados mostraram que a maioria dos agricultores familiares
mais necessitados e responsáveis pela produção dos principais produtos da dieta humana, são
“excluídos” dos efeitos transformadores do PRONAF.
A hipótese que inicialmente se constrói é que há uma desigualdade na distribuição de
recursos. Contudo essa disparidade não é apenas inter-regional, mas é intra-regional, bem
como, os impactos são limitados e não transbordam igualmente entre regiões, estados e
municípios. Além disso, parte-se da hipótese que a política distributiva de crédito rural que
objetiva promover o desenvolvimento rural, como no caso do PRONAF, deveria cumprir sua
coesão social, no que concerne a uma distribuição equânime. No entanto, o PRONAF não
vem cumprindo sua função de equidade social, uma vez que as regiões mais beneficiadas são
espaços econômicos historicamente mais organizados e capitalizados. A política de crédito,
por si só, não é capaz de inserir o agricultor familiar pobre no mercado, e é insuficiente para
elevar o nível de sua produção, dada que as condições institucionais, políticas, culturais,
climáticas e econômicas presentes no meio rural são heterogêneas e, muitas vezes, são
“insensíveis” a uma política de crédito, sendo necessária uma articulação combinada de
políticas públicas, a fim de modificar a realidade existente.
A elaboração desta monografia fundamentou-se em dois tipos básicos de pesquisa: a
bibliográfica a documental, complementada com estatística descritiva. A primeira foi utilizada
para a revisão da literatura, enquanto a segunda possibilitou a obtenção das informações
relativas aos objetivos e às normas que orientam a execução do PRONAF. Em seguida, as
informações quantitativas expressas em valores foram organizadas sistematicamente e
tratadas com métodos estatísticos e os dados foram coletados nos sites do Banco Central
(BACEN) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As séries de valores
foram devidamente organizadas e deflacionadas com base no Índice de Preços ao Consumidor
Ampliado (IPCA), ano-base 2012.
Do ponto de vista metodológico, consiste em uma pesquisa de ordem qualitativa e
quantitativa e utiliza o método dedutivo. Este trabalho baseou-se em pesquisas bibliográficas
20
– livros, artigos científicos e teses que abordam a temática proposta – e documental –
fundamentada no decreto presidencial 1.946, lei da agricultura familiar nº 11.326, de 24 de
Julho de 2006.
A pesquisa apresenta um caráter misto, com a utilização de estratégia exploratória
sequencial na sua fase inicial composta pela coleta e análise de dados qualitativos, seguida da
coleta e análise de dados quantitativos. Foi examinada a relação entre as variáveis estudadas
através de procedimentos de estatística descritiva sob a concepção construcionista social1,
caracterizada por seu subjetivismo e por desenvolver indutivamente uma teoria. Finalmente,
foi analisado o processo de implementação do PRONAF, no Brasil, regiões com ênfase no
Nordeste e no estado do Rio Grande do Norte.
Além desta introdução, o trabalho possui outros três capítulos. O capítulo 1 realiza
uma abordagem teórica sobre o desenvolvimento rural no capitalismo contemporâneo: do
setorial ao multifuncional. O segundo capítulo faz uma revisão da literatura sobre a teoria das
políticas públicas, evidenciando o conceito e as tipologias; nele também será feita uma a
análise das políticas públicas para a agricultura: nas dimensões macroeconômica e setorial.
No terceiro capítulo, será feita uma análise dos dados do PRONAF, no que concerne a sua
evolução e quais os resultados após sua implementação. Por fim, são apresentadas as
considerações finais do estudo.
1 Concepção Construcionista Social compartilha da noção principal de que o domínio social influencia o
desenvolvimento individual de um modo formativo, em que o indivíduo constrói ou se apropria de significados
em resposta às experiências nos contextos sociais. Para o Construcionismo Social nós construímos teorias a
respeito do funcionamento do mundo através da interação social.
21
1
ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE O DESENVOLVIMENTO RURAL NO
CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO: DO SETORIAL AO MULTIFUNCIONAL
Os registros sobre a agricultura e o seu papel nas sociedades remontam aos fisiocratas,
que foram primeiros teóricos a fornecer contribuições significativas, passando pelos clássicos,
os neoclássicos, os marxistas e os neomarxistas, até chegarem à multiplicidade de abordagens
contemporâneas, englobadas sob a denominação de “novo rural brasileiro”. Seguindo
paradigmas diversos, essas abordagens incluem a economia do agronegócio, as ocupações
rurais não agrícolas, a ressignificação da agricultura familiar, a pluriatividade e a
multifuncionalidade da agricultura.
Apesar da longa trajetória acima referida, a economia agrícola só veio a ser
institucionalizada nas universidades brasileiras no imediato pós-guerra, quando a agricultura
passou a ser analisada segundo as teorias ortodoxas da firma, ou mais especificamente, pela
ótica da substituição de fatores ditos tradicionais por fatores modernos de produção e do papel
dos preços na alocação eficiente de recursos. No atual debate, a tecnologia continua a ser
fundamental para o desenvolvimento agrícola. No entanto, a agricultura assumiu papéis mais
amplos como fonte de crescimento econômico e equilíbrio da balança comercial. O espaço
rural, por sua vez, deixou de ser apenas o lócus do setor agropecuário, dando lugar ao exercício
de múltiplas atividades, agrícolas e não agrícolas, entre as quais se incluem as indústrias rurais,
o turismo, as atividades de lazer, a recuperação da biodiversidade e a conservação do
patrimônio histórico e cultural (ALBUQUERQUE, 1987; FEIJÓ, 2011; GRAZIANO DA
SILVA, 2002).
Dentre os teóricos que inspiraram ou contribuíram para o estudo da economia agrícola
no Brasil no imediato pós-guerra podem ser destacados Theodore William Schultz, Rui Miller
Paiva, John Mellor, William Arthur Lewis que objetivaram mostrar as melhores combinações
de fatores de produção (terra, trabalho e capital) e a tecnologia, que possibilitassem os melhores
níveis de eficiência, em termos de rentabilidade nas distintas atividades agrárias. Apesar de
compreender a importância dessas concepções, esse trabalho não irá detalhá-las.
A inquietude no campo da economia agrícola é crescente e se difunde em toda esfera de
estudo, sendo a agricultura uma atividade viva e em constante transformação. Recentemente, a
questão agrícola deixa de ser centro único de atenção, dando origem a um debate mais amplo,
conhecido como a questão rural, que vai além dos aspectos relativos à produção, produtividade,
22
tecnologia e políticas agrícolas. A preocupação se circunscreve na estrutura de posse e uso da
terra, relação social de organização e exploração da terra, reforma agrária, pluriatividade,
multifuncionalidade e políticas públicas direcionadas para fomentar o desenvolvimento rural.
Quando a economia agrícola apareceu no cenário das disciplinas aplicadas das
ciências econômicas e agrárias nas universidades brasileiras no início dos anos 1960, os
pressupostos teóricos dominantes asseguravam que a agricultura tradicional não seria capaz
de promover o crescimento agrícola além do que já o tinha feito porque a produtividade
marginal dos fatores de produção secularmente utilizados já havia atingido o seu ponto
máximo.
Ao contrário do que ocorrera no passado, somente os agricultores que fossem capazes
de utilizar os fatores de produção modernos, isto é, que incorporassem os conhecimentos
científicos desenvolvidos no campo da nutrição e do melhoramento genético das plantas e dos
animais; do manejo dos solos e dos fertilizantes químicos; das máquinas e implementos
agrícolas; e, da economia agrícola e administração rural, seriam capazes de produzir
alimentos e matérias-primas com elevados níveis de produtividade (SCHULTZ, 1964).
A substituição de fatores tradicionais, obtidos com base no conhecimento transmitido
de geração em geração, por fatores modernos, fruto do conhecimento científico, seria então a
chave para uma nova etapa do desenvolvimento agrícola, pois com o persistente aumento da
produtividade e da oferta de produtos de origem vegetal e animal, poderiam as famílias deixar
que seus filhos fossem para as cidades sem que a oferta agrícola entrasse em declínio e os
preços dos alimentos se elevassem, sufocando as possibilidades do desenvolvimento da
indústria e dos serviços urbanos (SCHULTZ, 1964).
Esta nova concepção de agricultura – baseada no conhecimento científico de plantas e
animais, na produção de sementes híbridas, no uso intensivo de insumos, máquinas e
equipamentos de origem industrial, e na especialização e produção em escala – resultou na
emergência e na difusão de um novo padrão de produção agropecuária, conhecido como
agricultura moderna ou Green Revolution (Revolução Verde), que passou a funcionar como
uma espécie de idéia-guia para o desenho de novas organizações e sistemas de geração,
adaptação e difusão de tecnologias agropecuárias e de economia agrícola e administração
rural em todo o mundo.
Os aumentos da produtividade dos cultivos e criações e os seus impactos sobre a oferta
agrícola mundial foram de tal magnitude e abrangência, que fizeram do engenheiro agrônomo
Norman Borlaug, considerado o pai da Revolução Verde, o ganhador do Prêmio Nobel da Paz
em 1970. Todavia, a aparente unanimidade conferida pelo Prêmio Nobel dado a Borlaug logo
23
se dissipou. Enquanto os apoiadores reafirmavam o caráter virtuoso da Revolução Verde, seus
críticos nela enxergavam efeitos negativos tanto do ponto de vista econômico, quanto social e
ambiental, entre os quais se incluíram: crescente dependência da agricultura em relação à
indústria; deterioração dos preços dos produtos agrícolas; modernização restrita a um pequeno
número de produtos, produtores e regiões; impactos ambientais negativos provocados pelo
desmatamento, monoculturas, poluição dos rios e surgimento de doenças provocadas pela
aplicação e consumo de alimentos contaminados pelo elevado nível de agrotóxicos.
As abordagens teóricas desenvolvidas a partir da idéia-guia que gerou a Revolução
Verde, reafirmando-a, ampliando-a ou contestando-a, deram origem a uma miríade de
abordagens teóricas que buscaram não somente analisar o fenômeno da modernização, mas,
além disto, propor alternativas de políticas públicas e medidas para o enfrentamento dos
problemas de pobreza e fome das amplas parcelas da população rural que ficaram à margem
do processo de modernização da agricultura.
Destacam-se hoje, em meio a uma verdadeira “torre de babel” de interpretações
teóricas e vertentes analíticas pouco desenvolvidas, desde abordagens setoriais, entre as quais
se incluem a própria Revolução Verde, a economia do agronegócio e a agricultura familiar,
até vertentes analíticas multissetoriais, dentre as quais se destacam as ocupações rurais não-
agrícolas, a pluriatividade e a multifuncionalidade da agricultura.
O PRONAF, cuja implementação foi objeto de análise nesta monografia, buscou a sua
inspiração original nas idéias-guias da Revolução Verde e do correspondente processo
histórico que orientou a modernização da agricultura e a profissionalização dos agricultores
familiares europeus, particularmente dos jovens agricultores, como mostram, por exemplo, os
escritos relativos à história da agricultura e à política agrícola francesa (CARNEIRO, 1997).
Não seria surpresa, como de fato não o foi, se a modernização da agricultura familiar
brasileira seguisse uma rota semelhante àquela do agronegócio brasileiro e da agricultura
familiar francesa. Tanto na Europa, como no Brasil, as idéias-guias da Revolução Verde e das
demais abordagens teóricas geraram estratégias e políticas públicas para o meio rural. Por esta
razão, esta monografia seguirá, daqui por diante, a seguinte sequência: no restante deste
capítulo, uma breve caracterização das abordagens e vertentes analíticas acima referidas. No
próximo capítulo, um mapeamento e caracterização das principais políticas que foram
desenvolvidas com o objetivo de fortalecer a agricultura familiar brasileira, com destaque para
o PRONAF, cuja implementação é o objeto de estudo privilegiado nesta monografia.
24
1.1 AGRICULTURA FAMILIAR VERSUS AGRICULTURA PATRONAL
O debate teórico sobre a conceituação e a caracterização da agricultura familiar e
patronal não é algo fácil de ser feito. O cerne da questão extrapola o contexto da extensão da
área de cada propriedade. Elementos como produção, mão-de-obra, geração de renda, grau de
modernização e integração com o mercado interno e externo, constituem elementos
fundamentais para distinção entre essas categorias. Na realidade, o conceito de agricultura
familiar é relativamente recente no Brasil; antes, falava-se em pequena produção, pequeno
agricultor, agricultura de baixa renda ou de subsistência e até mesmo o termo camponês
(DENARDI, 2001).
A legislação brasileira, na Lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964 define a
propriedade familiar, como “o imóvel que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e
sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso
social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e
eventualmente trabalhado com a ajuda de terceiros”. Na lei 11.326 de 24 de julho de 2006,
que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e
Empreendimentos Familiares Rurais, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar
rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes
requisitos: i) não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; ii)
utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu
estabelecimento ou empreendimento; iii) tenha percentual mínimo da renda familiar originada
de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo
Poder Executivo; iv) dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.
Assim, a agricultura familiar apresenta um tripé de relação indissociável entre família,
propriedade e trabalho. É a forma de organização produtiva em que os critérios adotados para
orientar as decisões relativas à exploração agrícola não se subordinam unicamente ao ângulo
da produção e/ou rentabilidade econômica, mas levam em consideração também as
necessidades e objetivos da família. Contrariando o modelo patronal, no qual há completa
separação entre gestão e trabalho, no modelo familiar estes fatores estão intimamente
relacionados (CARMO; SALLES 1998).
No que concerne às políticas públicas para agricultura familiar no Brasil, o Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura familiar (PRONAF), representa a mais importante
política econômica para esse segmento, juntamente com a política social de previdência rural.
Contudo, como iremos ver nesse trabalho, o PRONAF não contribui de forma equânime para
25
as propriedades de agricultura familiar e os diferentes cultivos. Redefine uma nova divisão
dessa categoria, entre agricultores familiares tradicionais, que produzem essencialmente com
a família, utilizam pouca tecnologia no processo produtivo e reduzida capacidade de inserção
do mercado; e, a moderna agricultura familiar, que é altamente integrada ao mercado,
consegue incorporar os avanços técnicos de produção e organização facilmente, tem
capacidade para contratar funcionários, no limite, 2 funcionários permanentes segundo a
legislação brasileira e possui elevado nível de renda.
As transformações ocorridas com a globalização, sobretudo com a modernização da
agricultura, fez com que essa atividade ficasse cada vez mais capitalizada e competitiva.
Nesse contexto, o agronegócio é visto como um complexo de sistemas que inclui não apenas
as atividades dentro da propriedade rural (dentro da “porteira agrícola”). Pelo contrário,
ultrapassa a fronteira da propriedade rural, relacionando-se principalmente, com as atividades
de distribuição de suprimentos agrícolas (insumos), de armazenamento, de processamento e
distribuição dos produtos agrícolas, serviços financeiros, transportes, marketing e seguros.
Corresponde, portanto, à totalidade dos impactos que a agricultura exerce na economia como
um todo: à jusante (pré-porteira) e a montante (pós-porteira).
Além do agronegócio – que é responsável pela competitividade da atividade
agropecuária brasileira no panorama internacional – outros segmentos se beneficiam com a
criação de políticas de subsídios, impostos, preço, comercialização, modernização e
investimentos direcionados como será visto a seguir.
1.2 ABORDAGENS E VERTENTES TEÓRICAS DO DESENVOLVIMENTO
AGRÍCOLA BRASILEIRO
1.2.1 Revolução Verde
As primeiras experiências de êxito no uso de técnicas tecnológicas na transformação
dos fatores de produção ocorreram no século XIX a partir da comprovação empírica de Justus
Von Liebig, ao perceber que a produtividade das plantas era diretamente proporcional ao uso
de fertilizantes, adubos químicos, utilização de agrotóxicos, mecanização e alteração genética
dos alimentos. Já em 1940 nota-se a difusão e implantação das novas técnicas agrícolas pelo
mundo, especialmente nos EUA e Europa os pioneiros desse processo, mas é em 1960 que a
Revolução Verde ganha notável atenção (ALBERGONI; PELAEZ, 2007).
26
O termo Revolução Verde (RV) foi efetivamente criado em 1966, em uma conferência
em Washington, cujo lema era “é a Revolução Verde, feita à base de tecnologia, e não do
sofrimento do povo”. Objetivava acima de tudo ser capaz, a partir da mutação de plantas e
solos, uso de fertilizantes químicos e intensa mecanização, permitir o cultivo de variadas
culturas em diferenciados lugares, homogeneizando a agricultura mundial, dinamizando-a e
elevando o seu potencial econômico. Essas novas técnicas de produção também permitiram
romper o paradigma do fantasma neomalthusiano, ao mostrar que não há limite físico aos
recursos naturais que impossibilitem o crescimento econômico.
Introduzida efetivamente no Brasil no período da ditadura militar (1964-1985) veio
acompanhada de um pacote de medidas que buscava assegurar o sucesso desse processo no
país na mesma medida quando comparado aos índices de produtividade e eficiência
econômica vistos nos países desenvolvidos. A criação de políticas públicas, o fornecimento de
crédito subsidiado e atrelado à compra de agrotóxicos e adubos químicos, a criação de
institutos de pesquisa e desenvolvimento de tecnologia para o meio rural, como a Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), em 1971 e de um serviço de extensão
rural para levar a tecnologia até o agricultor foram as principais medidas realizadas
(OCTAVIANO, 2010).
Não há dúvidas do potencial econômico, especialmente no curto prazo da “Revolução
Verde” para o crescimento econômico. Em particular, no Brasil esse processo possibilitou
extraordinários aumentos de produtividade da terra, do trabalho, do capital e superávits na
balança comercial. Contudo, o sucesso desse processo tem apresentado consequências
negativas como exclusão de produtores, de produtos e de regiões, apontando para um
processo insustentável de desenvolvimento. Por essas razões, novas interpretações teóricas
têm sido formuladas sobre a agricultura tanto nos países desenvolvidos como naqueles em
desenvolvimento, como será visto a seguir.
1.2.2 Limites do Crescimento
Fundado em 1968, o Clube de Roma (CR), grupo formado por debatedores de um
vasto conjunto de assuntos relacionados à política, economia internacional e, sobretudo, ao
meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Em uma das reuniões do Clube, surgiu a
partir de um relatório denominado “os limites de crescimento” uma das principais teses
discutida e debatida nas reuniões, tornando-se um dos documentos mais vendidos sobre meio
ambiente no mundo. Para os adeptos da teoria dos limites de crescimento o mundo é finito e
27
possui restrições ao crescimento, devido aos condicionantes que são naturais e inerentes aos
fatores ambientais. A ideia central da Revolução Verde, crescimento ilimitado a partir da
introdução de inovações no processo produtivo diverge-se da vigente teoria dos limites ao
crescimento (CORAZZA, 2005).
Para os defensores da teoria do limite de crescimento, o processo de crescimento não é
ilimitado. Pelo contrário, há um equilíbrio a ser alcançado entre as taxas de crescimento do
capital, depreciação e natalidade devem ser iguais às taxas de mortalidade, preservação dos
recursos naturais e níveis de poluição que são aceitáveis. Argumentam que as transformações
ocorridas com a introdução do pacote tecnológico da RV resultaram numa sociedade que não
sabe viver com os limites invencíveis, mas numa busca incessante de superá-los. Contudo, a
sociedade tem que tomar consciência que a tecnologia solucionará problemas, mas não
desviará do foco principal do problema, onde o mundo é finito.
Outra ideia que “nasce” em reuniões do Clube de Roma é a tese do modelo de
Bariloche, que faz uma contestação à teoria dos limites ao crescimento. A pergunta central
que norteia os estudiosos dessa vertente - Catástrofe ou Nova Sociedade? A hipótese básica é
que há sim limitação ao crescimento, porém não é de ordem física como defende a tese dos
limites ao crescimento. As limitações são condicionadas pela natureza sociopolítica e estão
institucionalizadas dentro da estrutura da distribuição desigual de poder entre e dentro das
nações (HERRERA, et. al. 1976).
Nesse contexto, a aceitação e implementação das políticas ocorrem de forma
diferenciada entre as nações: qualquer política de redução de impactos ambientais enfrentaria
dificuldades para ser implantada de forma homogênea em um mundo socioeconomicamente
desigual. Portanto, o fenômeno de degradação ambiental não é uma consequência inevitável
do progresso econômico, mas resultado dos diferentes valores sociais destrutivos.
Os elevados custos dos preços de petróleo, principal insumo da indústria de
agrotóxicos, a importância conferida às três bases de críticas da revolução Verde (social,
ambiental e econômica), as transformações ocorridas no espaço rural e urbano
contemporâneo, direcionam a busca por um modelo de desenvolvimento sustentável. Nesse
contexto, a biotecnologia surgiu como um possível modelo capaz de viabilizar uma
agricultura sustentável economicamente e com significativo potencial de exploração
comercial.
28
1.2.3 Biotecnologia
Tecnologia de melhoramento genético e animal baseado na transgenia e genômica, a
biotecnologia rompe as fronteiras e marca um novo estágio para a agricultura, onde a
modificação molecular é o destaque desse novo processo tecnológico. Técnica produtiva que
permite reduzir a dependência das inovações químicas e mecânicas, aspectos predominantes
da Revolução Verde. Em contrapartida, assegura redução nos custos, aumento de
produtividade e garantia de qualidade.
O grande diferencial da biotecnologia é a possibilidade de criar novas espécies através
do melhoramento, combinação ou inserção de genes nas plantas, tornando-as mais tolerantes a
herbicidas; resistentes a insetos e vírus; alta qualidade dos produtos e aumento significativo
do seu potencial econômico. Atualmente, os produtos geneticamente modificados (GM)
compõem importantes commodities com alto valor no comércio mundial, como o milho, soja
e algodão.
No Brasil, diferente do que ocorreu nos EUA e Argentina a exportação de produtos
GM sempre foi inexpressiva no PIB nacional, não conseguindo alcançar 5% de toda pauta
exportadora do País. Muitas foram às dificuldades para criar um quadro regulatório estável e
coerente, o que resultou no atraso do Brasil em relação aos seus concorrentes nos últimos oito
anos. Apesar do Decreto 1.752, de 20 de dezembro de 1995, que regulamentou a Lei de
Biossegurança e conferiu a CTNBIO o poder de emitir pareceres conclusivos, uma ação
judicial movida pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e pelo Greenpeace
impede a produção e a comercialização desses produtos desde 1998 (SILVEIRA; BORGES;
BUAINAIN, 2005).
Contudo, recentemente, a produção de transgênicos está difundida em quase todas as
regiões agrícolas do planeta, e a adoção da biotecnologia pelos produtores atinge níveis nunca
alcançados por outras tecnologias avançada, em toda história da agricultura. A exemplo, em
2009 o cultivo de culturas geneticamente modificadas alcançou uma marca de mais de 14
milhões de agricultores, em 134 milhões de hectares, distribuídos em 25 países (James, 2010).
Nesse contexto, acompanhando a tendência mundial, o Brasil em 2009 se tornou o
segundo maior produtor de plantas geneticamente modificadas (GM) do mundo, ficando atrás
apenas dos Estados Unidos. Em destaque, o plantio de soja, milho e algodão transgênicos, que
alcançou patamares de 21,4 milhões de hectares semeados, superando em 100 mil hectares a
área plantada na Argentina (Isaaa, 2010).
29
Não há consenso sobre os aspectos positivos ou negativos, se assim pode denotar, na
produção de produtos geneticamente modificados. Não há dúvidas de seu potencial na
redução de custos e aumento da produtividade. Porém, recentes estudos mostram que o
consumo destes produtos pode trazer consequências ainda desconhecidas para a saúde
humana. É nesse contexto, caracterizado por uma nova sociedade demandante, com
preferências cada vez mais exigentes e cautelosas, que a preocupação com o que se consome e
como se produz, sobretudo na discussão mundial da sustentabilidade ambiental, resulta nos
debates da agroecologia e do desenvolvimento sustentável.
1.2.4 Agroecologia e o Desenvolvimento Sustentável
A agricultura desde sua institucionalização vem sofrendo muitas transformações.
Passou da agricultura tradicional, intensiva em trabalho e terra, para a agricultura moderna,
baseada em insumos industriais, crescente dependência da agricultura à indústria, fortes
agressões ao meio ambiente. Contudo, a produção agrícola vem passando por um novo
processo de transição que se iniciou nos anos 1990 e cuja essência é a ecologização. Trata-se
de um fenômeno novo e gradual, porém sua principal característica é a mudança na forma de
manejo dos agroecossistemas, inspirada em um modelo de estilos de agricultura menos
agressiva e inspirado num desenvolvimento sustentável e humanizado.
Agroecologia vem com uma nova personificação da agricultura, um sistema capaz de
fazer bem aos homens e ao meio ambiente como um todo, afastando-nos da orientação
dominante de uma agricultura intensiva em capital, energia e recursos naturais não
renováveis, agressiva ao meio ambiente, excludente do ponto de vista social e causadora de
dependência econômica (CAPORAL; COSTABEBER, 2001).
Diferente do processo produtivo da agricultura convencional, a produção
agroecológica não busca a maximização de lucros, pela produção em escala, mas a otimização
do agroecossistema, a realização de práticas saudáveis e que conservem os recursos naturais.
Enfatiza a importância dos saberes históricos dos agricultores, o conhecimento tácito e
intransferível. Entretanto, o debate econômico da agricultura sustentável se delimita
principalmente numa problemática: será que essa agricultura e sua tradicional forma de
produção asseguram a atividade agrícola a cumprir sua função social e econômica?
Para Veiga (2003) trata-se, evidentemente, de um nobre e generoso projeto, mas que
talvez esteja sobrepondo o otimismo da vontade (ou da esperança) ao inevitável pessimismo
(ou pragmatismo) da razão. Principalmente porque uma agricultura que preserve os recursos
30
naturais e o ambiente certamente não poderá resultar da difusão de qualquer nova tecnologia
genérica de fácil adoção. As atuais soluções consideradas mais sustentáveis não são
facilmente multiplicáveis. São bem específicas a cada ecossistema e muito exigentes em
conhecimento agroecológico.
O Desenvolvimento Sustentável ultimamente é tema de profundo debate mundial,
objetiva atender as necessidades básicas da geração atual, sem comprometer as gerações
futuras, com a utilização dos recursos escassos de forma consciente. A sustentabilidade possui
algumas bases, entre elas as suas multidimensões: social, ambiental, econômica, cultural,
política e ética. Mas me deterei nas principais que formam o conjunto básico da
sustentabilidade, a dimensão econômica, social e ambiental, conforme mostra figura a seguir.
Fonte: Pervanchon (2007).
Os aspectos da dimensão ecológica referem-se à relação do homem com o meio
ambiente. As atividades econômicas e suas formas de produção devem estar necessariamente
em harmonia com as condições do meio ambiente. Assim, a produção e a intervenção humana
devem ser feitas a partir dos sinais fornecidos pela natureza e não devem ser violados em
hipótese alguma, para que possa promover um desenvolvimento hoje, sem comprometer o
desenvolvimento futuro. Portanto, uso consciente dos fatores de produção vai além da
preservação e melhoria das condições químicas, físicas e biológicas, mas da preservação e
manutenção dos agrossistemas, respeitando suas condições naturais (CAPORAL;
COSTABEBER, 2002).
Figura 1- Representação das interações das dimensões do desenvolvimento sustentável.
31
Na dimensão social, trata-se da equidade na distribuição dos benefícios e custos da
produção agroecológica. Na procura da igualdade das condições e melhoria de vida entre os
indivíduos, a partir da produção e consumo de produtos “limpos” que não fazem mal para a
saúde humana. Além disso, no âmbito social preocupa-se com a redução das diferenças entre
setores sociais, na promoção equitativa de emprego, renda, acesso a serviços e tecnologias
(CAPORAL; COSTABEBER, 2002).
Por último, a dimensão econômica trata-se da busca equilibrada de produtividade e
redução de custos da produção compatível com o consumo de energias renováveis,
conduzindo a sistemas autossuficientes e viáveis em longo prazo. Portanto, é uma
indissociável relação entre a dimensão ecológica e econômica (CAPORAL; COSTABEBER,
2002).
Em suma, a sustentabilidade envolve três pilares básicos. Primeiro, o ecológico,
manutenção das características do ecossistema que são essenciais para a sobrevivência de
longo prazo. Segundo, o econômico, refere-se à obtenção de uma renda suficiente para que o
manejo continue atrativo. Por último, o social, trata-se da justiça na distribuição dos
benefícios e dos custos, quanto no respeito aos valores sociais e culturais da população
envolvida, aproximando-o do desenvolvimento rural, como será visto a seguir (NIJKAMP,
1990).
Estudos mais recentes, conhecidos pela expressão “agricultura pós-moderna” colocam
defendem as possibilidades de um tipo de agricultura, ainda em construção, que se
fundamenta nos princípios do trabalho familiar, da autonomia, da co-produção e do capital
ecológico como fundamentos de uma nova agricultura ainda em construção. Buscar
autonomia é produzir o máximo de insumos que for possível, ao comprá-lo da indústria; co-
produzir significa produzir com a natureza ao invés de dominá-la; utilizar o capital ecológico
significa valorizar a natureza e não destruí-la, mediante a aplicação dos princípios da
agricultura ecológica. (PLOEG, 1995).
1.3 DESENVOLVIMENTO RURAL
As transformações ocorridas resultante da globalização e introdução cada vez mais
intensa de progresso tecnológico nas técnicas de produção e organização, não são exclusivas
de uma análise setorial, mas são globais. Na agricultura, são multifuncionais, há em
andamento um processo de transformação estrutural da agricultura e do espaço rural. Pensar
32
em rural, logo vem em mente, atraso, atividade agrícola e pobreza. Contudo, a partir das
recentes mudanças ocorridas na organização dos agricultores, nas variadas formas de geração
de renda e emprego, outras inovadoras ocupações e funções surgem no campo.
Primeiro, o campo não é apenas lugar de trabalho, é também lugar de moradia, lazer e
turismo, onde existem pessoas que não trabalham em atividades agrícolas, mas não são
desempregadas, pelo contrário, a nova configuração do meio rural brasileiro consiste na
existência de uma elevada População Econômica Ativa (PEA) empregada em atividades não-
agrícolas. Deixar a atividade agrícola não significa necessariamente deixar o campo, isso
ocorre pelo surgimento dessas novas ocupações no meio rural, as ORNA’S e a previdência
social, que desmente o mito do êxodo rural inexorável (GRAZIANO DA SILVA, 2002).
Segundo, pensar em rural não é pensar em atraso. A “linha” que delimita a dimensão
rural e urbana no espaço geográfico e social vem desaparecendo pela incapacidade de definir
e verificar onde começa uma dimensão e terminar a outra. Atualmente, se observa no campo
atividades, serviços e acesso a tecnologias que eram exclusivas da população que reside no
meio urbano. A globalização é responsável pela redução dessa distância do que é
exclusivamente rural e urbano, ocorre uma articulação entre essas dimensões. Cada vez fica
mais fácil encontrar no campo, serviços que eram exclusivos das grandes cidades, como
intermediários bancários, supermercados, centros de comércio, pacotes de canais fechado e
planos de internet e entre outros.
O que se chama hoje de nova configuração do rural brasileiro, nada mais é do que a
importância que algumas atividades vêm assumindo nesse espaço. O novo não significa ser
criado agora, mas o novo é o que já existia e só vem ganhando importância agora. Os três
aspectos mais importantes da nova conformação do meio rural brasileiro, trabalhado pelo
Projeto Rurbano2, coordenado pelo professor José Graziano da Silva, é a existência de uma
agropecuária moderna, atividades não agrícolas e novas atividades agropecuárias específicas.
A agropecuária moderna existente no meio rural brasileiro é resultado de um reduzido
grupo de grandes agricultores e está intimamente ligada às agroindústrias, na produção de
commodities para exportação. Dada à mecanização do campo ocorrida a partir de 1960,
forma-se um excedente de trabalhadores no meio rural. Esses trabalhadores historicamente
saiam do campo em busca de novos postos de trabalho, o conhecido êxodo rural, mas a partir
de 1990 não é isso que vem ocorrendo no espaço rural brasileiro. Esses trabalhadores vêm
2 O projeto Rurbano começou em 1997, com o objetivo de reconstruir séries históricas a partir dos dados da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). É um projeto temático denominado "Caracterização do
Novo Rural Brasileiro", do Núcleo de Economia Agrícola do IE-Unicamp, que conta com financiamento da
FAPESP e do PRONEX/CNPq-FINEP.
33
assumindo novas funções no campo, que são ocupações não-agrícolas derivadas da crescente
urbanização do meio rural e configuram importantes alternativas de emprego e renda.
O setor de empregados doméstico e construção civil são os que mais absorvem mão-
de-obra das chamadas ORNA’S, os aspectos comuns a ambos é o baixo nível de escolaridade
e qualificação necessário. Portanto, nas regiões onde a atividade agropecuária moderna não é
comum em todo o território, as ocupações rurais não-agrícolas são uma importante
“ferramenta” para a geração de emprego e renda no meio rural. Contudo, predomina-se na
geração de ocupações de baixa qualificação e escolaridade.
O surgimento das atividades não-agrícolas no meio rural brasileiro, não é específico de
uma região, mas está disseminada por todo o país. Além disso, é característica comum entre
muitos países, tantos em nações que possuem uma agropecuária moderna, como naquelas
onde o pacote tecnológico da revolução verde alcançou proporções menores (GRAZIANO
DA SILVA, 2002).
O surgimento de novas atividades agropecuárias é resultado da importância econômica
que muitas atividades que são seculares no país, mas que não tinham até recentemente
importância econômica. Como a piscicultura, horticultura, apicultura, fruticultura de mesa,
atividades que são recriadas com a incorporação de novos serviços e produtos. São atividades
direcionadas para nichos específicos de mercado, e ganham impulso a partir de uma dinâmica
que tem mais a ver com as demandas específicas de grupos de consumidores de média e alta
renda dos grandes centros urbanos do país, do que do tradicional processo de agregar valor
por meio da industrialização (GRAZIANO DA SILVA, 2002).
Esses são aspectos predominantes na conformação no novo rural brasileiro e geram
novos mitos no meio rural. Percebe-se claramente a importância econômica e social do
surgimento das ocupações rurais não-agrícolas. Entretanto, essas atividades não configuraram
a solução para o problema do desemprego, e muito menos, o motor do desenvolvimento das
regiões atrasadas. As ORNA’S são atividades importantes e indispensáveis atualmente na
nova conjuntura do meio rural, mas deve haver um amplo diagnóstico das diferentes
demandas de Políticas Públicas que possam promover o desenvolvimento, resultando não
apenas na promoção de políticas compensatórias, mas de políticas econômicas que
efetivamente promovam o desenvolvimento. A regulamentação pública é indispensável nesse
processo.
No meio rural brasileiro, como também em outros países da América Latina, a PEA
rural vem crescendo, enquanto ocorre uma redução da PEA agrícola. Esse fenômeno é
resultado do surgimento das novas formas de aumentar as fontes e vias de acesso a rendas.
34
Assim como as ORNA’S, a pluriatividade da família representa um novo modo de ocupação
da força de trabalho. São similares quanto ao surgimento de ocupações que são não-agrícolas,
na diversificação da prestação de serviços e não da produção agrícola, em suma, nas relações
sociais do trabalho. Mas, diferente da amplitude das ocupações rurais não-agrícolas, na
pluriatividade familiar a unidade de referência é a família e as atividades que compõe a renda
familiar. É resultado da decisão consensual entre os indivíduos e das famílias rurais pela
combinação ou não de outros tipos de trabalho, além da atividade agrícola.
A pluriatividade ocorre quando pelo menos um membro da família exerce a
combinação de atividade agrícola, para-agrícola e não-agrícola. Nada mais é do que o
exercício de combinação de múltiplas atividades por pessoas que pertencem a uma mesma
família. Surge como uma inovadora forma de organização da família e resulta da
modernização técnico-produtiva da agricultura; da terceirização agrícola; queda nas rendas
agrícolas; mudança no mercado de trabalho; das políticas públicas de incentivo as atividades
não-agrícolas e da importância conferida agricultura familiar. E se intensifica à medida que
as relações entre os agricultores e o ambiente social e econômico em que estiverem situados
se tornam mais complexos e diversificados (SCHNEIDER, 2006).
A família pluriativa não representa a decadência da propriedade familiar, mas uma
etapa de diferenciação social e econômica das famílias agrícolas. A discussão sobre as
potencialidades da pluriatividade para o desenvolvimento rural é vasta e controversa, mas,
sem dúvida, representa papel importante na geração de novas ocupações, elevação da renda,
estabilidade ocupacional, redução da pobreza e êxodo rural, qualidade de vida e bem-estar.
No entanto, a promoção de desenvolvimento rural requer uma articulação combinada
de políticas sociais e econômicas, e a pluriatividade apesar de sua excepcional contribuição
como mecanismo de inclusão social, redução da pobreza e da desigualdade rural, promoção
de emprego e diversificação dos rendimentos familiares, não pode representar a base para o
desenvolvimento, mas somente uma parte da sua ampla estratégia.
Como mostra Schneider (2007), estudos recentes sobre o tema do desenvolvimento
rural, qualificam-no como um processo genuinamente multidimensional, e as questões
relacionadas ao emprego e às formas de ocupação são transversais. Nesse sentido, a
pluriatividade parece assumir um interesse de primeira ordem nesse debate, pois os estudiosos
vislumbram no estímulo à diversificação dos processos produtivos, nas formas de produção
ambientalmente sustentáveis, na mudança do sentido cognitivo e simbólico do espaço rural e
nas relações diferenciais com os mercados fatores que podem impulsionar transformações nas
relações de trabalho.
35
Nesse contexto, o desenvolvimento rural não é algo facilmente alcançado, representa-
se em desafios concretos para a pluriatividade, porém como muitos autores apontam a forma
pluriativa na organização social, constitui papel de êxito na elevação da renda; estabilização e
redução da sazonalidade; diversificação das fontes de rendas; geração de novas ocupações;
desenvolvimento dos territórios rurais; redução das migrações campo-cidade e apoio a
multifuncionalidade do meio rural.
Apoio a multifuncionalidade é a atribuição das novas funções do meio rural. Nesse
sentido, a terra além de fator de produção, passa a ter uma acepção patrimonial, a terra não é
somente lugar de trabalho, é também moradia. Nesse recente processo em curso de
transformação da agricultura e do meio rural, permite que o espaço rural deixe de ser apenas o
espaço de produção agrícola, mas valorize-se por suas funções paisagísticas, gastronômicas,
étnicas, culturais e ambientais. Desta forma, à medida que o meio rural vem cumprindo outras
funções, surgem demandas vinculadas ao consumo de bens não-tangíveis, a agricultura
incorpora uma função pública que não se concretiza em mercadorias ou serviços remunerados
pelo mercado, o agricultor é remunerado pela sociedade através do Estado (SABOURIN,
2008).
A multifuncionalidade vai além dos princípios da pluriatividade, pois o debate não se
circunscreve apenas no lugar que a agricultura assume na sociedade, e na sua contribuição
para o desenvolvimento econômico e social, mas redefine as formas de organização da
sociedade, e a relação agricultor x sociedade. Defende a necessidade de firmar um novo
contrato social entre agricultores e sociedade, onde o Estado tem o papel de destaque na
negociação entre as bases e cria espaços institucionalmente legitimados.
Na percepção francesa o agricultor deve ser remunerado pela provisão dos bens
públicos que são prestados à sociedade, no que concerne a preservação e conservação dos
recursos naturais e paisagens; fornecimento e garantia alimentar; ocupação das áreas rurais e
preservação cultural do ambiente. Desta forma, o agricultor não é remunerado pela tradicional
forma mercantil do mercado, mas pela a importância social que esse indivíduo assume na
sociedade (CARNEIRO; MALUF, 2005).
De acordo com Laurent (2000) apud Carneiro e Maluf (2005, p.48)
A multifuncionalidade da agricultura é um conjunto de contribuições da agricultura
(além da função primária de produzir bens: alimentos e fibras) a um
desenvolvimento econômico e social considerado na sua unidade; o reconhecimento
oficial da multifuncionalidade exprime a vontade que essas diferentes contribuições
36
possam ser associadas de maneira sustentável e coerente segundo as modalidades
julgadas satisfatórias pelos cidadãos.
Nesse sentido, é necessária a elaboração de novas estratégias políticas, fundadas em
novos princípios econômicos, sociais e biotécnicos. De forma que, os fins econômicos não
sejam articulados e avaliados independentes dos resultados sociais e ambientais almejados.
Contudo, o reconhecimento da multifuncionalidade no Brasil é incipiente. Para sua
expansão deverá existir espaços de formulação de políticas públicas de desenvolvimento rural
que atualmente são inviáveis e estão longe de acontecer. Primeiro, porque deverá existir uma
constituição em funcionamento que regularize e assegure os direitos desses agricultores.
Segundo, há uma descontinuidade política no funcionamento das políticas públicas. Terceiro,
existe no Brasil uma noção vaga e fluida da definição e qualificação da agricultura familiar, o
que representa dificuldades de operacionalização dessa categoria, apesar do considerável salto
realizado com a criação da lei 11.326 de 24 de julho de 2006.
Conforme Sabourin (2008), no Brasil, o caráter multifuncional da agricultura não é
contestado, apesar das recentes afirmações de interesse do Ministério do Desenvolvimento
Agrário - MDA e a nova direção da Embrapa ao declararem apoio à agricultura familiar e a
multifuncionalidade da agricultura como prioridade (CAMPANHOLA, 2003), ainda são raros
os instrumentos de uma política de multifuncionalidade (SOARES, 2000). Na América Latina
e nos países do Sul, a principal medida de tipo multifuncionalidade já experimentada consistiu
na remuneração de serviços ambientais, em particular o sequestro de CO2, por meio de
subvenção para projetos florestais, agroflorestais ou silvo-agro-pastorais. Mas, essa realidade
vem se alterando ao longo do século XXI, a criação da Bolsa Verde3, instituída pela Lei nº
12.512, de 14 de outubro de 2011, e regulamentado pelo Decreto nº 7.572, de 28 de setembro
de 2011 tem como objetivos: i) incentivar a conservação dos ecossistemas (manutenção e uso
sustentável); ii) promover a cidadania e melhoria das condições de vida; iii) elevar a renda da
população em situação de extrema pobreza que exerça atividades de conservação dos recursos
naturais no meio rural; iv) incentivar a participação dos beneficiários em ações de capacitação
ambiental, social, técnica e profissional.
As discussões de desenvolvimento rural referidas acima tratam de um
desenvolvimento exógeno. Contudo, todas podem ser sintetizadas numa abordagem de
3 O Programa de Apoio à Conservação Ambiental Bolsa Verde, lançado em setembro de 2011, concede, a cada
trimestre, um benefício de R$ 300 às famílias em situação de extrema pobreza que vivem em áreas consideradas
prioritárias para conservação ambiental. O benefício será concedido por dois anos, podendo ser renovado. Como
47% das 16,2 milhões de pessoas que vivem em situação de extrema pobreza estão na área rural, a proposta é
aliar o aumento na renda dessa população à conservação dos ecossistemas e ao uso sustentável dos recursos
naturais.
37
desenvolvimento rural, com enfoque territorial, desenvolvimento endógeno. Falar em
desenvolvimento territorial significa pensar num território não apenas em sua dimensão
geográfica, o território é um espaço social construído e organizado. Os territórios passam a ser
agentes de transformação social e não um mero suporte de recursos físicos para objetos,
atividades e processos econômicos (VÁZQUEZ BARQUERO, 2001).
De acordo com Abramovay (2001, p. A3)
O território é mais que uma simples base física para as relações entre indivíduos e
empresas, possui um tecido social, uma organização complexa feita por laços que
vão muito além de seus atributos naturais, dos custos de transportes e de
comunicações. Um território representa uma trama de relações com raízes históricas,
configurações políticas e identidades que desempenham um papel ainda pouco
conhecido no próprio desenvolvimento econômico.
Como relata Reis (1992), territórios são como espaços organizadores de funções
econômicas, onde se iniciam, desenvolvem-se e se potencializam processos relacionais de
estruturação produtiva, originando materialidades econômicas particulares em cujo contexto
de funcionamento as referências de ordem local podem ser significativas.
O desenvolvimento rural, com enfoque territorial, permite a superação entre urbano
versus rural e das tradicionais análises setoriais. Na verdade, as dicotomias e os antagonismos
são substituídos pelo escrutínio da diversidade de ações, estratégias e trajetórias que os atores
(indivíduos, empresas ou instituições) adotam visando sua reprodução social e econômica
(SCHNEIDER, 2004).
O território passa a ser unidade de referência para atuação do Estado e de
regulamentação das políticas públicas. Nesse cenário, com a maior organização da sociedade
civil, novos atores podem participar do processo de discussão do desenvolvimento rural.
Assim, o desenvolvimento territorial rural necessita de uma nova arquitetura institucional,
onde a sociedade civil organizada e o Estado atuam de forma combinada e se complementam
em múltiplos sentidos.
As transformações ocorridas no panorama social, econômico, político, institucional e
ambiental discutidas acima, resultam na conformação de demandas por políticas públicas para
responder aos anseios da sociedade. Podem ser elas de natureza macroeconômica: política
econômica, cambial, monetária, fiscal e comercial, isolada ou combinada, pode ser utilizada
para gerar políticas específicas destinadas a estimular, desestimular ou regular as atividades
econômicas e o comportamento dos agentes nos diversos setores da economia, e, em
particular na agropecuária.
38
Mas, também podem ser de natureza setorial: Sistema Nacional de Crédito Rural
(SNCR), Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF),
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Microcrédito, Política Nacional de Assistência
Técnica e Extensão Rural (PNATER), Programa de Garantia da Atividade Agropecuária
(PROAGRO), Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO),
Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA). Nesse contexto, a literatura das políticas
públicas, suas tipologias e dimensões de atuação, serão objetos de análise no próximo
capítulo, enquanto no terceiro capítulo será feita uma análise da implementação do PRONAF.
39
2
DISCORRENDO SOBRE A ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
AGRICULTURA: DIMENSÕES MACROECONÔMICA E SETORIAL
Podemos inferir das análises realizadas no capítulo anterior que existem problemas
que por sua natureza afetam a um agricultor isoladamente como a falta de oportunidade de
emprego para um ou mais dos seus filhos, enquanto outros afetam a todos os agricultores que
têm terra insuficiente para produzir e viver uma vida digna, como é o caso da concentração
fundiária, da desigualdade na distribuição de renda e da falta de oportunidades de emprego no
campo. Os primeiros são problemas privados, que se resolvem na esfera do mercado,
enquanto os últimos são problemas públicos, cuja solução requer a intervenção ou a regulação
do Estado.
No caso da agricultura existem certas especificidades que são próprias do seu caráter
biológico – rigidez diante dos riscos climáticos, sazonalidade, estacionalidade e baixa
elasticidade dos produtos agropecuários – que afetam a todos os agricultores e que requerem a
intervenção do Estado. A ação pública torna-se, portanto, necessária diante da existência de
problemas públicos, ou seja, daqueles problemas que não somente afetam um grande número
de pessoas, mas, além disto, que entram na agenda dos governos e são por eles formulados,
legitimados, financiados e implementados.
Compreender a origem da área de conhecimento da política pública é, portanto,
essencial e indispensável para o melhor entendimento sobre seus desdobramentos. O campo
de estudo das políticas públicas é em geral reconhecido como uma subárea da Ciência
Política. No entanto, é mais correto considerá-la como campo de estudo de caráter
multidisciplinar que se alimenta de diversas áreas do conhecimento, entre as quais se incluem
a Ciência Política, a Economia, o Direito e a Administração. (DIAS; MATOS, 2012).
Na Europa, a área de conhecimento decorreu de um desdobramento de teorias
explicativas sobre o papel do Estado. Conforme a literatura dos anos 1980 e 1990, uma
política pública, é o resultado de ações praticadas pelo Estado e da sua mais importante
instituição, o governo. Verificava-se, assim, a centralidade do Estado como único e principal
ator produtor de políticas públicas. Esta análise tornar-se semelhante com a abordagem
estatista, que defende a hipótese de monopólio de atores estatais na promoção de políticas
públicas. Nessa vertente, o que determina se uma política é ou não “pública” é a
40
personalidade de seu criador. Portanto, só é considerada política pública, políticas cujo ator
protagonista seja ator estatal (SOUZA, 2006).
Mais recentemente, a literatura europeia dos anos 2000 tem enfatizado o conceito de
“ação pública” ao invés de política pública, para designar o protagonismo das organizações
da sociedade civil e do mercado na formulação e implementação de políticas públicas. Nos
EUA, diferentemente da Europa, o campo de conhecimento já havia surgido como resultado
das discussões acerca do papel das ações governamentais e suas implicações para a sociedade
civil. Assim, políticas públicas não se limitam apenas a projetos, incentivos, políticas e ações
cujo ator protagonista seja o Estado, mas também a sociedade civil e as demais organizações
que participam do processo de construção das políticas públicas. Hoje, tanto na Europa quanto
nos EUA o estudo das políticas públicas assemelha-se à abordagem multicêntrica, onde as
organizações privadas, organismos governamentais ou não governamentais, juntamente com
atores estatais são responsáveis pelo processo produtor da política. Sendo assim a definição da
política pública não está na personificação do ator criador, mas ao problema que se é
enfrentado, considerando política pública aquelas ações que são pensadas para resolver
problemas que são considerados públicos, independente se o tomador de decisão tenha
personalidade jurídica estatal ou não estatal (SOUZA, 2006).
Uma vez entendido os entraves e discussões que cercam o debate teórico da área de
conhecimento do que é uma política pública fica nítido a limitação acerca de uma definição
uniforme e geral sobre o que pode ser considerado e o que é de fato uma política pública, e
quais seus atores relevantes. Assim, para auxiliar na compreensão será esboçado abaixo de
forma sucinta algumas das definições acerca do que seja uma política pública, e, em seguida,
algumas tipologias de políticas públicas para orientar as análises da política analisada, isto é,
o PRONAF.
Conforme Souza (2006), as definições do que seja uma política pública são bastante
diferenciadas: campo dentro do estudo da política que analisa o governo à luz de grandes
questões públicas (Mead, 1995)4; como um conjunto de ações do governo que irão produzir
efeitos específicos (Lynn, 1980)5; soma das atividades dos governos, que agem diretamente
ou através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos (Peters, 1986)6; aquilo que o
governo decide fazer ou não fazer (Dye, 1984)7.
4 MEAD, L. M. “Public Policy: Vision, Potential, Limits”, Policy Currents, Fevereiro: 1-4. 1995. 5 LYNNLynn, L. E. Designing Public Policy: A Casebook on the Role of Policy Analysis. Santa Monica, Calif.:
Goodyear. 1980. 6 PETERS, B. G. American Public Policy. Chatham, N.J.: Chatham House. 1986. 7 DYE, Thomas D. Understanding Public Policy. Englewood Cliffs, N.J.: Prentice-Hall. 1984.
41
No entanto, são diversas as razões que justificam a existência de uma política pública.
Podem elas buscar a eficiência econômica, minimizar a pobreza, evitar a exclusão social e
fomentar a igualdade social. Mas, sem dúvidas, trata-se de um conjunto de decisões que
buscam orientar e manter o equilíbrio social, gerando mecanismos equilibradores ou não para
modificar o atual panorama (SOBOTTKA, 2006, p. 1).
De uma maneira geral as políticas podem ser caracterizadas em quatro dimensões: i)
no âmbito institucional é uma decisão elaborada por uma autoridade legal; ii) no plano
decisório, é um conjunto sequenciado de decisões numa situação específica e surge como uma
resposta a um problema ou necessidade; na dimensão comportamental, é a escolha de fazer ou
não fazer, mas uma política é, acima de tudo, um curso de ação e não apenas uma decisão
singular; iv) por fim, tem um sentido causal, na medida em que, são os produtos de ações que
têm efeitos no sistema político e social (SARAVIA; FERRAREZI, 2006, p.31).
1.4 ETAPAS DE UMA POLÍTICA PÚBLICA
As políticas públicas passam por diversos estágios, uma espécie de ciclo, mecanismo
que organiza uma política pública em fases. A divisão por etapas é uma espécie de
esquematização da criação de uma política e compõe uma importante ferramenta teórica.
Contudo, o processo descrito abaixo, nem sempre ocorre de forma sequenciada, apesar de que
geralmente essas fases fazem parte em alguma etapa do processo construtivo da política.
Fonte: Políticas Públicas: coletânea-volume 1, ENAP, Elaboração Própria.
Figura 2 - Ciclo das Políticas Públicas.
42
A primeira etapa é a formação da agenda trata da inclusão de determinado problema
que assume status de “problema-público”, ou seja, são pleitos e necessidades entendidas
como relevantes que necessitam da intervenção de autoridades políticas legítimas. Mas, o
processo de formação da agenda não é algo simples de ser feito, pois muitos fatores
interferem e condicionam essa etapa: limitações humanas, financeiras, materiais, falta de
tempo, de vontade política ou de pressão social, podem interferir diretamente na inserção ou
exclusão de um assunto na agenda (SUBIRATS, 1989). Nesse contexto, a formação da
agenda é algo complexo que envolve diversos atores.
Em seguida, o momento de elaboração da política pública nessa etapa ocorre o estudo
do problema e as possíveis soluções ou alternativas. Terceiro, é a formulação, onde de fato
ocorre à criação da alternativa. A elaboração precede a formulação por ser o estudo feito ex-
ante das possíveis alternativas, enquanto na elaboração é a transformação de forma efetiva do
problema em solução.
A etapa de implementação, é a fase onde as intenções são convertidas em ações
efetivas. Trata-se da preparação para pôr em prática a política pública. É o momento onde as
decisões acomodam-se à realidade, ajustam-se ao campo de aplicação, se inscrevem nas
rotinas dos agentes que implementam a política (FLEXOR; LEITE, 2006, p.10).
Na fase de execução da política, é a sua realização na prática. O acompanhamento
trata-se do processo de supervisão da execução da política. É etapa onde tem a capacidade de
fornecer as informações da política, e possibilita o diagnóstico de possíveis adequações
necessárias, ou mudanças, que assegurem o resultado pretendido em sua elaboração.
Por fim, a etapa de avaliação. É recomendável que ocorra ex-ante, o que é mais
comum nas ciências econômicas. Na análise de políticas públicas prioriza-se a avaliação ex-
post ou a posteriori da política pública. É um ato normativo que toma como referência um
parâmetro de análise, indicadores e padrões almejados na implementação. Assim, são a
comparação espacial e temporal do problema ao efeito ocasionado pela política, suas
consequências previstas e não previstas, uma vez que os resultados efetivos são relativamente
independentes das expectativas iniciais.
O ciclo acima descrito é um recurso metodológico aplicável à análise de qualquer
política pública. Porém, há que se atentar para a existência de uma grande variedade de
políticas públicas, desde as setoriais às macroeconômicas; das distributivas às redistributivas;
e das regulatórias às constitucionais. Tal diferenciação exige tratamento adequado para dar
conta das especificidades da análise em cada tipo de política pública.
43
1.5 TIPOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS
As políticas públicas são, pois, mecanismos de intervenção e regulamentação estatal
que além das distintas áreas de atuação assumem diferenciações conceituais que resultam em
quatro grandes tipos, classificados a partir de seus impactos na sociedade, em conformidade
com a tipologia de Lowi (1964), apresentada a seguir:
i) Distributivas – geram benefícios concentrados para alguns grupos de atores e custos
para toda a coletividade;
ii) Redistributivas – concedem benefícios concentrados para algumas categorias e
implicam custos concentrados sobre outras categorias;
iii) Regulatórias – estabelecem padrões de comportamento, serviço ou produto para
atores públicos e privados; e
iv) Constitutivas – constitui-se por regras sobre os poderes, são aquelas políticas que
definem as competências, jurisdições e regras do “jogo”.
Figura 3 - Tipos de Políticas Públicas
Classificá-las a partir de tipologias específicas é uma forma de definir seus atores,
instituições, grupos e estilos que estão imersos no universo da política pública. Outra forma
de construir uma tipologia de políticas públicas é organizá-las segundo a área de atuação.
Fonte: Adaptado de Flexor e Leite (2006, p. 16).
44
1.6 DIMENSÕES DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
A fragmentação das políticas públicas a partir do raio de impacto que elas exercem
possibilita que o analista observe e leve em consideração a relação de uma política pública, ou
um arranjo de políticas e/ou programas, com o contexto mais amplo. Portanto, essa divisão
por dimensões de impacto, permite uma diferenciação possível para pensarmos os diversos
casos de políticas (policies) em diversos contextos institucionais (polity) e arranjos políticos
(politics), sendo essas de natureza macroeconômica, regional e setorial, conforme serão
detalhados a seguir (FLEXOR; LEITE, 2006).
i) Macroeconômicas – políticas que determinam o ambiente econômico e os
parâmetros básicos que condicionam e orientam as decisões de investimento. Na verdade,
essas políticas exercem grande impacto sobre as condições gerais da produção, uma vez que
determinam ou influem fortemente na formação dos preços básicos da economia, por sua vez,
na competitividade da economia nacional (BUAINAIN, 1999, FLEXOR; LEITE, 2006);
ii) Regionais – políticas que não estão limitadas a um setor econômico, mas parte de
um projeto de cunho regional, que objetivam elevar a eficiência dos espaços e munir de
externalidades positivas o “universo” almejado (BUAINAIN, 1999, FLEXOR; LEITE, 2006);
iii) Setoriais – capacita o setor público, fornecendo parâmetros de análise que
possibilitam intervir nas condições e variáveis específicas de cada setor, e, assim, definir as
condições especiais para acesso ao mercado interno e externo, além de determinar “metas”
específicas para cada ramo da atividade econômica (BUAINAIN, 1999, FLEXOR; LEITE,
2006).
Figura 4 - Dimensão de atuação das políticas públicas
Fonte: Adaptado de Flexor e Leite ( 2006, p. 16).
45
As políticas públicas se desenvolveram em maior grau e se destacam principalmente
no campo da política econômica. Ocorre que como mostra Lindblom (1980), “o essencial da
política é econômico e o grosso da economia é político”. As políticas econômicas são de
abrangência macroeconômica, onde seus principais instrumentos de regulamentação
consistem:
a) Política Comercial: Refere-se ao grau de proteção da economia nacional em relação às
economias do resto do mundo. Para alguns autores, o elevado protecionismo da
economia pode prejudicar seu dinamismo, uma vez que reduz os impactos da
concorrência do livre comércio na criação de novas tecnologias, novas vias de
distribuição e comercialização. Contudo, os setores mais “frágeis” devem ser supridos
pela promoção de políticas comerciais que assegurem um crescimento sustentável e
duradouro, bem como grau de protecionismo equilibrado que garanta seu desempenho
e dinamismo econômico;
b) Política Cambial: A taxa de câmbio define o nível de preços da economia,
consequentemente, seu grau de competitividade. Assim, é um importante instrumento
na determinação do crescimento econômico, do dinamismo dos setores e distribuição
de renda entre eles. Nesse sentido, como mostra Buainain e Rello (2005), a taxa de
câmbio é a variável que exerce a maior influência sobre o desempenho do setor
agrícola e da economia como um todo. Portanto, uma política comercial alinhada com
uma política de câmbio configura-se num instrumento de êxito na promoção de
crescimento econômico;
c) Política Fiscal: Constitui-se por políticas de preços, investimentos, gastos em
infraestrutura e incentivos fiscais, subsídios e impostos. É um conjunto combinado de
medidas pelas quais o Governo arrecada receitas e realiza despesas de modo a
proporcionar locação eficiente dos recursos providos, estabilização macroeconômica e
redistribuição de renda. No caso do setor agropecuário, por se tratar de um setor
“periférico” a elaboração de políticas públicas são de caráter residual, cuja restrição
orçamentária é um determinante central. Nesse sentido, alocação desses recursos
escassos, é resultado de pressões de caráter político, que podem desviar as prioridades
definidas tecnicamente e com o manejo da política setorial alcançar o desenvolvimento
do setor;
d) Política Monetária: Política responsável pela geração dos recursos necessários para o
funcionamento do “aparelho” econômico. Pode ser classificada em: políticas
46
expansionistas, quando ocorre a expansão de crédito para estimular a produção, nível
de emprego e renda; e restritivas, ao contrário da anterior, reduz a oferta de crédito e
eleva o custo do dinheiro, comprometendo a capacidade e eficiência produtiva dos
agentes. Promove a estabilidade monetária e a liquidez geral da economia. Além disso,
financia o déficit econômico, através da emissão de base monetária e títulos da dívida.
No entanto, a implementação da política macroeconômica é, em boa medida,
condicionada pelo comportamento da economia e da política internacional. Nesse sentido, a
visão macroeconômica da realidade é basicamente homogeneizadora e tende a minimizar, ou
mesmo a menosprezar, a diversidade e, portanto, aumenta a dificuldade para implementar
políticas públicas setoriais condizentes aos objetivos macroeconômicos de estabilização
econômica, taxa de câmbio valorizada e taxas de juros elevadas (DELGADO, 1998).
Além das políticas macroeconômicas, o Estado utiliza-se das políticas setoriais para
interferir na agricultura. Entre elas destacam-se três eixos principais: a) política agrícola, que
consiste em um instrumento de regulamentação dos preços de produtos e fatores, como
também, das formas de comercialização e financiamento, incentivos e subsídios fiscais e no
nível do padrão tecnológico adotado, portanto, influencia diretamente e decisivamente no grau
de integração inter-setorial e de internacionalização da agricultura; b) política agrária, tem a
capacidade de intervir na estrutura fundiária prevalecente no meio rural, através de sua
transformação ou regularização nas regiões onde aterra já foi historicamente apropriada
privadamente e de sua influência no processo de ocupação de novas terras; e c) políticas ou
programas diferenciados de desenvolvimento, são usualmente dirigidos a segmentos
empobrecidos do campesinato, não integrados à modernização produtiva, muitas vezes
assumem ou assumiram, como no Brasil, um caráter de políticas de desenvolvimento regional
(DELGADO, 2001).
Ocorre que, na medida em que as variáveis macroeconômicas definem as condições
gerais de funcionamento da economia, os mecanismos da política setorial permitem ao setor
público a intervenção nas condições e variáveis específicas de cada setor. Capacitando-o a
agir através de duas bases, por um lado, reforçar ou mitigar os sinais e condições
determinadas pela política macroeconômica e, no outro, afetar o nível e composição da oferta
e demanda nos mercados agropecuários, estimulando determinados segmentos e penalizando
outros segundo as prioridades da política econômica e as pressões dos agentes (BUAINAIN,
1999, p. 74).
47
A partir das transformações ocorridas na agricultura brasileira, houve uma pressão
crescente para a elaboração de novas políticas. Além das políticas macroeconômicas, referidas
acima, surgem às políticas setoriais, objetivando atender às especificidades de cada
conjuntura, como mostra a figura a seguir, entre elas, destacam-se: Política de Preços
Mínimos e Comercialização; Assistência Técnica e Extensão Rural; Crédito Rural; Seguro
Rural; PRONAF; Programa de Aquisição de Alimentos; Política Nacional de Defesa
Agropecuária; a de Reforma Agrária; de Biotecnologia; de Agroecologia e Produção Orgânica
e a de Economia Solidária.
Fonte: Buainain. (1999, p. 122).
Conforme a heterogeneidade das regiões se intensifica, enquanto a modernização
tecnológica se aprofunda em determinados espaços, em detrimento de outros, alcançar o
desenvolvimento regional demanda uma intervenção efetiva do Estado na Agricultura, não
apenas nas situações tradicionais, como no caso de intempéries climáticas, aperfeiçoamento
de condições de trabalho para agricultores, desenvolvimento tecnológico, políticas de fomento
Figura 5 - Modelo de intervenção setorial
48
à produção, equalização de preços, como também na implementação de medidas que possam,
entre outras coisas, minimizar disparidades existentes entre o meio urbano e rural,
propiciando garantia de renda para o agricultor e contribuir no sentido de proteger a
agricultura doméstica (LEITE, 2001).
Mas, alavancar economicamente um segmento social, muitas vezes, tão fragilizado
como é o caso da agricultura familiar brasileira, requer um conjunto combinado de políticas
públicas pertinentes que promova o desenvolvimento sustentável e duradouro, levando em
consideração a sua principal característica, a diferenciação social, no que concerne as idéias,
valores, interesses, preferências, culturas, condições socioambientais e econômicas. Nesse
sentido, como argumenta Brose (1999, p. 58), o desenvolvimento local, baseado na
agricultura familiar, depende fundamentalmente da intervenção estatal, regulando as
assimetrias do mercado através de políticas públicas. Se deixada à própria sorte frente às
forças de mercado, a agricultura familiar se transforma em alvo fácil de monopólios e
intermediários que se apropriam do valor agregado da produção.
Acontece que, historicamente, são muitas as dificuldades que podem ser elencadas
para a promoção do desenvolvimento da produção agrícola familiar no Brasil, entre elas:
baixa capitalização, acesso a linhas de crédito oficiais, à tecnologia, disparidades produtivas
inter e intra-regionais, acesso à assistência técnica à produção rural e acesso aos mercados
modernos. Características como: multisetoriedade rural; diversidade produtiva (através de
sistemas integrados de produção animal, vegetal e manejo florestal); e tipo de mão-de-obra
utilizada na produção; são comuns a um grande universo de pequenos agricultores familiares
(BIANCHINI, 2005).
Portanto, é norteado por esse sentimento de preocupação crescente e aprofundamento
do conflito econômico e social da agricultura familiar, que ações governamentais,
implementadas e gerenciadas pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA)
conjuntamente com a Secretaria de Agricultura Familiar (SAF) vêm sendo elaboradas, no
intuito de assegurar o modo de vida, e manter esses agricultores no campo. Porém, é somente
a partir dos anos 1990, que se percebe um aumento significativo do desenvolvimento de
programas de apoio específico para esta categoria, em destaque, o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar, principal política pública de apoio aos agricultores
familiares. Na verdade, o PRONAF foi à primeira política pública que colocou o agricultor
familiar como protagonista do processo de desenvolvimento rural.
Ocorre que, a partir do século XXI, podemos ver um esforço de mudança na forma de
atuação do Governo Federal, no tocante à agricultura familiar, suas ações têm concentrado,
49
em quatro eixos específicos: a) redução da pobreza rural, por meio da intensificação de
articulações entre as atuais políticas; b) segurança e soberania alimentar e nutricional,
priorizando a continuidade e o aumento constante da oferta de alimentos de boa qualidade,
com valorização dos alimentos produzidos pela agricultura familiar e organização de sua
produção; c) sistemas de produção sustentáveis, tratando de buscar políticas que estimulem
mais intensamente a transição para sistemas de produção sustentáveis; e d) geração de renda e
agregação de valor, com a preocupação de apoiar a relação da agricultura familiar e o atual
mercado, fomentando alianças estratégicas com o objetivo de fortalecer modelos e arranjos
produtivos com vistas a viabilizar as economias dos pequenos e médios empreendimentos
rurais. Nesse sentido, as ações governamentais para a agricultura familiar vêm passando por
um processo relevante de mudança. Não apenas o crédito rural do PRONAF, mas
especialmente as ações de Assistência Técnica e Extensão Rural, os mecanismos de seguro,
tanto os de risco climático quanto os de risco de preços de mercado, vêm sendo ampliados e
qualificados, com o objetivo de melhor atender a agricultura familiar brasileira (BRASIL,
2010).
Apesar dos avanços percebidos na elaboração de políticas públicas específicas para
agricultura familiar e a implementação de outros mecanismos – assistência técnica, seguro de
produção e preço, pesquisa e extensão – os resultados obtidos, em algumas regiões, não
respondem aos objetivos almejados, a inserção do agricultor familiar no mercado competitivo,
elevação da capacidade produtiva, da produtividade geral da produção e geração de renda
suficiente para seu sustento, portanto, o desenvolvimento desse segmento. Na verdade, a
maioria das famílias que residem no meio rural do estado do Rio Grande do Norte, são
pluriativas e sobrevivem de outras fontes de rendas não provenientes da atividade agrícola, a
exemplo, as transferências diretas de renda (Bolsa Família) e previdência rural.
Portanto, no capítulo três será feita uma análise de implementação do PRONAF no
Brasil, com ênfase na Região Nordeste e no estado do Rio Grande do Norte. Em
conformidade, essa análise consistirá na elaboração de um conjunto de gráficos e tabelas com
os dados do programa em estudo, além de uma análise comparada da evolução de algumas
culturas agrícolas e da pecuária do estado, para verificar qual a atividade econômica do estado
– a agricultura ou pecuária – auferiu maior dinamismo após a implementação do PRONAF.
Também, serão pontuados elementos que diferenciam as regiões e podem, pelo menos em
parte, responder algumas das inquietações, no que concerne o desenvolvimento desigual e os
diferentes resultados obtidos na implementação de uma política pública, em particular, o
PRONAF.
50
3
ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO: O PROGRAMA NACIONAL DE
FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR
Conforme visto no capítulo anterior, a agricultura familiar sempre compôs o tecido
social do espaço rural brasileiro. Segundo os dados do Censo Agropecuário de 2006 a
agricultura familiar brasileira representou 84,36% (4.366.267) dos estabelecimentos
brasileiros, 33% do valor total da produção dos estabelecimentos agropecuários, ocupando
uma área de 80,10 milhões de hectares, cerca de 24%, numa área média de 19,34 há ( IBGE,
2006)
Com base nos dados acima, fica clara a expressividade incontestável dessa categoria
e de sua indiscutível importância socioeconômica. Nesse sentido, o Estado brasileiro foi
reconhecendo a especificidade das demandas deste segmento social na agenda de prioridades
políticas da nação. Contudo, a criação de políticas públicas específicas somente ocorre a partir
de meados da década de 1990, quase um século de atraso quando comparado aos países
desenvolvidos. Em 1996, no governo de Fernando Henrique Cardoso foi elaborado e
implementado o PRONAF, que representa para a maioria dos policy makers, a principal
política pública para os agricultores familiares. Em outras palavras, o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar, passou a ser entendido como a mola de alcance para
uma estratégia nacional de valorização da diversidade social da agricultura familiar e do meio
rural. Nesse sentido, cabe a essa política pública combater as desigualdades sociais e regionais
que sempre foram marco das políticas estatais tradicionais voltadas para estimular a
modernização tecnológica da agricultura brasileira (AQUINO; SCHNEIDER, 2010).
Mais do que um instrumento de política agrícola, o PRONAF foi o marco
fundamental das políticas públicas para a agricultura familiar no Brasil. Na realidade, até a
primeira metade dos anos 1990 a agricultura familiar era tratada pelas expressões agricultura
de subsistência, agricultura de baixa renda, produção para autoconsumo, o que denotava o
caráter residual ou a pouca importância que era atribuída à agricultura familiar como
produtora de alimentos e matérias-primas para os centros urbanos industriais ou para a
exportação de commodities agrícolas. Os agricultores familiares, por sua vez, eram
formalmente considerados como mini-produtores para efeito exclusivo de enquadramento no
Manual de Crédito Rural, o que lhes obrigava a disputar o crédito com os demais produtores e
atender às mesmas exigências contratuais relativas aos grandes produtores (BELIK, 2000).
51
O PRONAF emergiu na complexa conjuntura dos anos 1990, que foi marcada, no
plano internacional, pela liberalização do comércio e do acesso facilitado aos mercados
internacionais de produtos agropecuários; a inclusão dos temas da pobreza rural e da
agricultura familiar na agenda dos organismos multilaterais de financiamento e
desenvolvimento, como o Banco Mundial e a Organização das Nações Unidas para
Agricultura e Alimentação (FAO); e, pelo alinhamento da política comercial brasileira com as
diretrizes da Organização Mundial do Comércio (OMC) e aos países membros do Grupo
CAIRNS, portanto com a liberação do comércio de commodities agropecuárias e o acesso aos
mercados dos países desenvolvidos.
No plano interno os acontecimentos históricos que mais contribuíram para a criação
do PRONAF podem ser localizados já nos anos 1980, com o processo de democratização do
país e o protagonismo das organizações dos trabalhadores rurais, dos movimentos sociais e da
própria sociedade civil, que culminaram com a promulgação da Constituição de 1988, a
descentralização das políticas públicas e a criação de políticas de combate à pobreza,
transferência direta de renda e fortalecimento da agricultura familiar. A partir da criação do
PRONAF, a política agrícola brasileira passou a ser constituída por uma clara dualidade: de
um lado, o apoio ao agronegócio e às exportações de commodities agrícolas; de outro, a
criação, manutenção e crescimento da alocação de recursos para as políticas de combate à
pobreza rural, transferência direta de renda e fortalecimento da agricultura familiar, dentre as
quais o PRONAF assumiu uma posição destacada.
Como muitos autores apontam, o PRONAF foi uma resposta do Estado às pressões
das organizações dos trabalhadores rurais por políticas, projetos e ações governamentais, em
particular pelos sindicatos dos trabalhadores rurais ligados à Confederação Nacional dos
Trabalhadores da Agricultura (CONTAG) e ao Departamento Nacional de Trabalhadores
Rurais da Central Única dos Trabalhadores (DNTR/CUT), especialmente nos três estados da
Região Sul, que exigiam apoio estatal para os pequenos agricultores que estavam sendo
afetados pelo processo de globalização e liberação comercial, inclusive pelas expectativas de
liberação do comércio regional e pelas possibilidades de importação de produtos
agropecuários para o Brasil no contexto do MERCOSUL (SCHNEIDER; CAZELLA;
MATTEI, 2004).
Vale destacar outros elementos que contribuíram para a inclusão dos problemas da
agricultura familiar na agenda governamental, e para a criação do PRONAF, entre os quais se
incluem os estudos realizados conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para a
52
Alimentação e Agricultura (FAO) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA), que trouxeram à tona o debate político da agricultura familiar brasileira.
Não existe unanimidade quanto à origem das ideias subjacentes à criação do
PRONAF. Para Carneiro (1997), as diretrizes do PRONAF têm como referência experiências
europeias, principalmente da França, que no pós-guerra elegeu a agricultura familiar e os
jovens agricultores como diretrizes para o desenvolvimento rural. Não obstante, Veiga
questiona esta ideia, considerando a concepção do PRONAF mais próxima da agricultura
familiar e do farmer americano do que do agricultor familiar francês.
Na realidade, tanto a agricultura francesa quanto à americana, e a agricultura familiar
em particular, seguiram o caminho da modernização da agricultura inspirada na Revolução
Verde, que foi o paradigma dominante a partir do imediato pós-guerra. Em ambos os casos, a
consolidação da economia agrícola americana e a reconstrução da economia rural francesa,
deveu-se acima de tudo ao sucesso do seu setor rural, que apoiado em sua rentabilidade e
produtividade crescentes contribuiu para garantir a autossuficiência alimentar, a
competitividade da economia nacional e, em consequência, para a melhoria da qualidade de
vida da população rural.
Um dos avanços mais frequentes registrado na literatura dedicada à avaliação do
PRONAF é o reconhecimento da sua relevância e do seu ineditismo como política pública
criada pelo Estado, com a participação de um grande número de atores, entre os quais se
destacam, como já referido, agências internacionais e nacionais de financiamento e
desenvolvimento, como a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação e
o Banco Mundial; organizações do Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais, em
especial a CONTAG; organizações governamentais, como a EMBRAPA e os Bancos
Oficiais; organizações não governamentais; e instituições oficiais de ensino e pesquisa.
Entre os operacionalizadores do crédito do programa estão os agentes financeiros que
compõem o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), Banco do Brasil, o Banco do
Nordeste e Banco da Amazônia, e os bancos vinculados: o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social- BNDES, Banco Cooperativo do Brasil- BANCOOB,
Banco Cooperativo Sicredi S.A- BANSICREDI e associados à Federação Brasileira das
Associações de Bancos - FEBRABAN.
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) financia
projetos individuais ou coletivos, que gerem renda aos agricultores familiares e assentados da
reforma agrária. Para participar do programa o agricultor deve preencher uma declaração de
aptidão ao Pronaf – DAP, que pode ser obtida de forma gratuita, no sindicato dos
53
trabalhadores rurais ou na Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural
(Emater), é utilizada como instrumento de identificação do agricultor familiar no acesso às
políticas públicas.
Para obtenção da DAP, o agricultor familiar deve dirigir-se a um órgão ou entidade
credenciada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA, de posse do CPF e
de dados acerca de seu estabelecimento de produção (área, número de pessoas residentes,
composição da força de trabalho e da renda, endereço completo). (SAF, 2013). De acordo
com o Manual Operacional do PRONAF (MA/SDR/DATER, 1996), só poderiam pleitear os
financiamentos os agricultores familiares que:
a) explorassem parcela da terra na condição de proprietários, posseiros, arrendatários
ou parceiros;
b) mantivessem até dois empregados permanentes, sendo admitido o recurso eventual
a ajuda de terceiros, quando a natureza sazonal da atividade agropecuária o exigir;
c) não detivesse, a qualquer título, área superior a quatro módulos fiscais,
quantificados na legislação em vigor;
d) obtivessem, no mínimo, 80% (oitenta por cento) de sua renda bruta anual da
exploração agropecuária e/ou extrativa;
e) residissem na propriedade ou em aglomerado rural ou urbano próximo;
f) possuíssem faturamento máximo anual até R$ 27.500,00.
Esses pré-requisitos iniciais de enquadramento no programa foram vastamente
avaliados e criticados. Sobretudo, a ideia de um modelo de “verdadeiro agricultor”, aquele
que corresponde com o perfil de um profissional com capacidade empresarial apto para
encontrar na atividade agrícola o seu sustento e de sua família, que tenha no mínimo 80% da
renda familiar originária da agricultura. Estão, portanto, excluídos os agricultores que, por
motivos variados (natureza sazonal da atividade agrícola, impossibilidade de aproveitar, na
produção, a totalidade da mão-de-obra familiar disponível, oferta de emprego na região em
situação mais favorável que a agricultura, redirecionamento dos projetos familiares ou
individuais de forma a incorporar novos rendimentos e ampliar a capacidade de consumo,
entre outros) são levados a desempenhar atividades não-agrícolas de caráter complementar, e
desta forma, não conseguiriam sobreviver unicamente da exploração agropecuária, obtendo de
outras fontes como aposentadorias e atividades não-agrícolas, mais de 20% do total da renda
familiar (TONNEAU; AQUINO; TEIXEIRA, 2005).
Neste sentido, instituir o “bom” agricultor como aquele que aufere a renda familiar
quase exclusivamente da atividade agrícola, implica excluir as possibilidades de combinar a
54
agricultura com outras fontes de renda que, em alguns casos, são indispensáveis à
continuidade da própria atividade agrícola e, portanto, fundamentais para a retenção da mão-
de-obra no campo. (CARNEIRO, 1997).
Desta forma, em junho de 2007, no lançamento do Plano Safra da Agricultura Familiar
2007/2008, o PRONAF-crédito apresenta-se como uma política pública diferenciada que tem
a finalidade de “apoiar com financiamento às atividades agropecuárias e não-agropecuárias
exploradas mediante emprego direto da força de trabalho do produtor rural e de sua família.”
Em função disso, nota-se que o seu desenho normativo, no início limitado unicamente às
atividades agropecuárias, passou a prever um leque bastante diversificado de linhas de ação
(AQUINO; SCHNEIDER, 2010), conforme descritas abaixo:
Quadro 1 - Linhas de crédito do PRONAF, Plano Safra (2013-2014)
LINHAS DE CRÉDITO OBJETIVO
Pronaf Custeio Destina-se ao financiamento das atividades agropecuárias e de beneficiamento ou
industrialização e comercialização de produção própria ou de terceiros enquadrados no Pronaf.
Pronaf Mais Alimentos – Investimento
Destinado ao financiamento da implantação, ampliação ou modernização da infraestrutura de produção e serviços, agropecuários ou não agropecuários, no estabelecimento rural ou
em áreas comunitárias rurais próximas.
Pronaf Agroindústria Linha para o financiamento de investimentos, inclusive em infraestrutura, que visam o
beneficiamento, o processamento e a comercialização da produção agropecuária e não agropecuária, de produtos florestais e do extrativismo, ou de produtos artesanais e a
exploração de turismo rural.
Pronaf Agroecologia Linha para o financiamento de investimentos dos sistemas de produção agroecológicos ou orgânicos, incluindo-se os custos relativos à implantação e manutenção do
empreendimento.
Pronaf Eco Linha para o financiamento de investimentos em técnicas que minimizam o impacto da
atividade rural ao meio ambiente, bem como permitam ao agricultor melhor convívio com o bioma em que sua propriedade está inserida.
Pronaf Floresta Financiamento de investimentos em projetos para sistemas agroflorestais; exploração
extrativista ecologicamente sustentável, plano de manejo florestal, recomposição e manutenção de áreas de preservação permanente e reserva legal e recuperação de áreas
degradadas.
Pronaf Semiárido Linha para o financiamento de investimentos em projetos de convivência com o semi-
árido, focados na sustentabilidade dos agroecossistemas, priorizando infraestrutura hídrica e implantação, ampliação, recuperação ou modernização das demais infraestruturas,
inclusive aquelas relacionadas com projetos de produção e serviços agropecuários e não agropecuários, de acordo com a realidade das famílias agricultoras da região Semiárida.
Pronaf Mulher Linha para o financiamento de investimentos de propostas de crédito da mulher
agricultora.
Pronaf Jovem Financiamento de investimentos de propostas de crédito de jovens agricultores e
agricultoras.
55
Pronaf Custeio e
Comercialização de Agroindústrias Familiares
Destinada aos agricultores e suas cooperativas ou associações para que financiem as
necessidades de custeio do beneficiamento e industrialização da produção própria e/ou de terceiros.
Pronaf Cota-Parte Financiamento de investimentos para a integralização de cotas-partes dos agricultores familiares filiados a cooperativas de produção ou para aplicação em capital de giro,
custeio ou investimento.
Microcrédito Rural Destinado aos agricultores de mais baixa renda, permite o financiamento das atividades agropecuárias e não agropecuárias, podendo os créditos cobrirem qualquer demanda que
possa gerar renda para a família atendida. Créditos para agricultores familiares enquadrados no Grupo B e agricultoras integrantes das unidades familiares de produção
enquadradas nos Grupos A ou A/C.
Fonte: Plano Safra 2013-2014, Elaboração Própria.
Para alguns estudiosos, a segmentação por linhas de crédito pode ser vista por dois
ângulos, positivo ou negativo. Primeiro, não há dúvidas que dada à heterogeneidade dos
espaços econômicos e das diferentes oportunidades na obtenção de renda, uma vez que as
atividades não-agrícolas ganham destaque no novo rural brasileiro, a criação e diversificação
do crédito rural pode ser muito positivo e primordial na geração de renda e emprego no
campo, e, por conseguinte, a fixação do homem no campo. Entretanto, há uma tendência à
segmentação do seu público beneficiário por função de patrimônio e categoria, dividindo a
unidade familiar ao invés de fortalecê-la.
Ocorre que a divisão por linhas de crédito não é a única forma de fragmentação dos
beneficiários do programa. A discriminação dos estabelecimentos potencialmente
beneficiários do PRONAF, estratificados em grupos, com base nas variáveis de renda e mão-
de-obra familiar nos trabalhos do estabelecimento permite outra classificação. Todos os
beneficiários do grupo B, C, D, E, tem em comum não dispor, a qualquer título, de área
superior a 4 (quatro) módulos fiscais, quantificados segundo a legislação em vigor, e
explorem parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário, parceiro ou
concessionário. Os outros dois grupos que compõe o programa – A e A/C - são assentados do
Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA).
56
Quadro 2 - Classificação dos agricultores “pronafianos” por grupo, extraído da DAP.
Fonte: Documento de Declaração de Aptidão ao Pronaf - DAP. Elaboração própria.
A estratificação por grupos de beneficiários permite acessar informações
individualizadas de cada segmento que compõe a estrutura da agropecuária brasileira. Nesse
contexto, fornece informações cruciais para o desenho de políticas públicas específicas a cada
grupo e região. A partir de 2004, o grupo E foi inserido entre os grupos de beneficiários do
PRONAF. A introdução de novos beneficiários, em particular, a criação de um novo grupo,
resulta consequências imediatas: em primeiro lugar, porque quando a classe mais capitalizada
entra no processo concorrencial de divisão dos recursos, assim o faz com a força dos
agricultores e das organizações sindicais, maior poder de pressão dentro dessas organizações e
entre elas e os governos nas suas diferentes esferas; em segundo lugar, por que os agricultores
mais capitalizados oferecem mais garantias reais para os bancos, comparativamente aos
GRUPO CARACTERÍSTICAS
A Assentados pelo Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) ou beneficiários do Programa de
Crédito Fundiário do Governo Federal que ainda não foram contemplados com operação de
investimento sob a égide do Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária (Procera) ou que
não foram contemplados com o limite do crédito de investimento para estruturação no âmbito do
Pronaf.
B Obtenham renda bruta anual familiar de até R$4.000,00 (quatro mil reais), no mínimo, 30% (trinta por cento) da renda familiar da exploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento;
trabalho familiar como base na exploração do estabelecimento.
C Obtenham renda bruta anual familiar acima de R$4.000,00 (quatro mil reais) e até R$18.000,00
(dezoito mil reais), no mínimo, 60% (sessenta por cento) da renda familiar da exploração
agropecuária e não agropecuária do estabelecimento; trabalho familiar como predominante na
exploração do estabelecimento, utilizando apenas eventualmente o trabalho assalariado.
A/C Agricultores familiares egressos do Grupo "A" ou que já contrataram a primeira operação no Grupo
"A", que não contraíram financiamento de custeio nos Grupos "C", "D" ou "E".
D Obtenham renda bruta anual familiar acima de R$18.000,00 (dezoito mil reais) e até R$50.000,00
(cinqüenta mil reais), no mínimo, 70% (setenta por cento) da renda familiar da exploração
agropecuária e não agropecuária do estabelecimento; trabalho familiar como predominante na
exploração do estabelecimento, podendo manter até 2 (dois) empregados permanentes, sendo
admitido ainda o recurso eventual à ajuda de terceiros.
E Obtenham renda bruta anual familiar acima de R$50.000,00 (cinqüenta mil reais) e até
R$110.000,00 (cento e dez mil reais), no mínimo, 80% (oitenta por cento) da renda familiar da
exploração agropecuária e não-agropecuária do estabelecimento; trabalho familiar como
predominante na exploração do estabelecimento, podendo manter até 2 (dois) empregados
permanentes, admitido ainda a eventual ajuda de terceiros.
57
agricultores das regiões mais carentes, o que os habilita absorver a maior parte dos recursos,
nos quais o valor médio dos contratos é maior.
Com auxílio da tabela 1, permite visualizar em que proporção os grupos compõe o
total dos beneficiários do PRONAF. Verifica-se que há uma forte concentração dos usuários
do programa no grupo B, com mais de 2,4 milhões de estabelecimentos, alcançando o patamar
de quase 60% do contingente de produtores familiares “pronafianos”. Além dessa
constatação, a tabela 1 permite observar que o Grupo E, grupo composto pelo maior nível de
renda tem uma reduzida representação no panorama geral. Contudo, como veremos adiante, a
presença desse grupo E na divisão dos recursos e a distribuição espacial dos diferentes grupos
de agricultores nas regiões do país traz implicações importantes para responder alguns dos
objetivos almejados nesse trabalho, às disparidades regionais (AQUINO et al. 2013).
Tabela 1 - Potenciais beneficiários do PRONAF por grupos – Brasil (2006)
Fonte: Relatório de Pesquisa do IPEA 2013.
A seguir, outras mudanças do PRONAF podem ser percebidas ao longo de sua
operacionalização, desde sua implementação em 1996 até os dias atuais. Conforme, serão
sintetizadas a seguir:
Quadro 3- Principais mudanças ocorridas no PRONAF (1997 a 2013)
Grupos PRONAF Total de estabelecimentos %
Grupo A 533.454 13,06
Grupo B 2.416.127 59,18
Grupo C 782.982 19,18
Grupo D 287.464 7,04
Grupo E 62.899 1,54
Total 4.082.926 100
ANO MUDANÇAS
1997
Inclusão de novos beneficiários: pescadores artesanais, aqüicultores e seringueiros extrativistas;
redução das taxas de juros; criação de novas linhas de financiamento, destinadas a melhorar a infra-
estrutura e os serviços comunitários rurais.
1998 Redução da taxa de juros para 5,75% ao ano e criação da linha Pronaf Agregar.
1999 Classificação dos beneficiários do Pronaf em grupos “A”, “B”, “C” e “D”, para fins de acesso aos
créditos; criação de crédito coletivo para pessoas jurídicas: destinado a associações, cooperativas e
58
Fonte: Adaptado da apresentação power point de Mendes.
No entanto, os limites desses avanços logo aparecem quando se considera as
dimensões históricas, institucionais, processuais, e organizacionais que são próprias das
políticas públicas e do PRONAF em particular.
Não há dúvidas, que eleger a agricultura familiar e ampliar o conceito de
desenvolvimento com a noção de sustentabilidade foi um avanço, ao menos no discurso, já
que a agricultura familiar foi sempre esquecida pelas políticas de modernização da agricultura
brasileira desde o final dos anos 1960. Apesar de ter sido vista como um marco e um processo
inovador e promissor para a agricultura familiar em todo território nacional, o PRONAF vem
outras formas de agrupamento; possibilidade de financiamento de atividade não-agrícolas, como o
turismo rural e o artesanato.
2000 Redução da taxa de juros para 4% ao ano; criação de custeio especial para assentados da reforma
agrária e beneficiários do Programa de Crédito Fundiário.
2001 Elevação do limite de financiamento; aumento do período de carência para projetos de investimento; a
possibilidade de substituição do projeto técnico de investimento por proposta simples.
2002 Suspensão, pelo programa, do financiamento à cultura do fumo; elevação do limite de crédito em
projetos iniciais para beneficiários do grupo “A”.
2003 Implementação de medidas de simplificação e racionalização dos contratos, permitindo renovações por
até 05 anos; criação do Pronaf Semi-Árido, Pronaf Florestal e do Cartão Pronaf.
2004 Inclusão de novas linhas de financiamento, como o Pronaf Mulher, Pronaf Jovem; criação do grupo
“E”.
2005 Inclusão das linhas de crédito Pronaf “B” (microcrédito rural) e Pronaf Agroecologia.
2006 Criação do Pronaf Comercialização; criação da SIBRATER.
2007 Criação do Pronaf ECO, linha de crédito de investimento para Energia Renovável e Sustentabilidade
Ambiental.
2008 Unificação dos Grupos C, D e E para acesso aos programas; linha crédito pronaf mais alimentos.
2009 Ampliação do crédito para pronaf custeio, microcrédito rural, pronaf mulher, pronaf floresta;
financiamento dos veículos utilitários; criação do selo da agricultura familiar.
2010
Novos limites de financiamento, nas linhas de crédito: pronaf jovem, pronaf agroindústria, semiárido;
apoio à reconversão produtiva dos produtores de fumo; o pronaf mais alimentos passa também a
financiar projetos coletivos de até R$ 500 mil.
2011 Medidas combinadas de ampliação de crédito e redução de taxas de juros.
2012 Preocupação crescente com a sustentabilidade na agricultura familiar, criação da rota da
sustentabilidade; intensificação das políticas de proteção ao agricultor familiar (SEAF, PGPAG).
2013
Passam a serem enquadrados no Pronaf todos os agricultores familiares que tiveram até R$ 360 mil de
renda; os limites de financiamento de custeio e investimento aumentaram, respectivamente, R$ 80 mil
para R$ 100 mil, RS 130 mil para R$ 150 mil.
59
acompanhando a mesma lógica das políticas setoriais e produtivistas que marcaram o
desenvolvimento do capitalismo na agricultura brasileira (CARNEIRO, 1997).
De Acordo com Carneiro (1997, p. 76)
Ainda que se chame a atenção para a diferença desta nova política em relação às
anteriores, que foram criticadas como produtivistas, excludentes, e focadas na
dimensão quantitativa do crescimento econômico em detrimento da dimensão
qualitativa do bem-estar social, as metas anunciadas confluíram para a velha fórmula
desenvolvimentista: aumento da capacidade produtiva = diminuição de preço no
mercado = competitividade.
Nesse contexto, o crédito rural do PRONAF a cada ano se amplia, como pode ser
visto no gráfico 1 abaixo, e se consolida como instrumento capaz de fornecer recursos
financeiros para modernizar e desenvolver a agricultura familiar e conseguinte aumentar a
produção agrícola. Contudo, os impactos do programa não ocorrem na mesma dimensão e
intensidade em todos os espaços geográficos do país.
Gráfico 1 – Crédito rural do Pronaf por ano fiscal (1999-2012). Valor financiado
refere‐se a bilhões de reais.
Com auxílio da ilustração acima percebe nitidamente o crescimento acelerado do
crédito do PRONAF. Em resumo, o volume de recursos oferecidos por meio do Pronaf para
custeio e investimento subiu de R$ 4,02 bilhões no ano de 1999 para R$ 16,3 bilhões, o que
representa um crescimento equivalente a 300% no período em análise nesse trabalho. Nesse
contexto, a garantia de financiamento em valor suficiente, no tempo oportuno e na forma
adequada às especificidades da agropecuária é um requisito básico da política de crédito rural
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração Própria
60
em geral e, por extensão, do financiamento para a agricultura familiar. Espera-se ainda que o
seu caráter público se materialize em uma justa distribuição do número de contratos e do valor
dos financiamentos entre as regiões e os agricultores familiares. Quer dizer, as regiões e os
agricultores familiares mais pobres e mais numerosos, deveriam receber proporcionalmente
mais recursos, para que as desigualdades inter-regionais e interpessoais fossem reduzidas.
1.7 COMPORTAMENTO DO CRÉDITO DO PRONAF POR REGIÃO GEOGRÁFICA DO
PAÍS
O público potencial do PRONAF se amplia a cada ano, quando observamos o número
de contratos firmados ano a ano, percebemos que houve um aumento expressivo e
considerável. Em 1999 cerca de 791.677 mil contratos firmados e em 2012 foram 1.823.210
mil contratos. A primeira implicação que pode ser extraída desses dados é que o programa
vem se difundindo entre a categoria dos agricultores familiares e cada vez mais agricultores se
enquadram nos critérios instituídos para acessar o crédito e assim o fazem, segundo evolução
crescente de contratos firmados.
O gráfico 2, apresentado na sequência, mostra a distribuição regional do número de
estabelecimentos agropecuários que acessaram o crédito do programa, conforme mostra o
relatório de pesquisa do IPEA8, a partir dos dados do censo agropecuário de 2006.
Gráfico 2 - Distribuição do público potencial do PRONAF – Brasil (2006), em (%)
8 IPEA. Relatório de Pesquisa: caracterização do Público Potencial do PRONAF “B” na Região Nordeste e no
Estado de Minas Gerais. Uma análise baseada nos dados do Censo Agropecuário 2006. Disponível em:
http://www.ipea.gov.br.
Fonte: Relatório de pesquisa do IPEA
2013
61
Apesar da forte concentração do total de estabelecimentos na região nordeste, 50,82%
dos pronafianos, correspondente a 2.187.131 mil estabelecimentos, o gráfico 3, indica que a
lógica de uma justa distribuição dos recursos entre regiões e beneficiários não se concretiza.
As regiões mais desenvolvidas, que estão subsidiadas por uma forte organização institucional,
em forma de sindicatos e cooperativas, agricultores familiares com maior grau de informação
e capacidade técnica, elevada capacidade de endividamento são as que absorvem os maiores
montantes financiados pelo programa.
Gráfico 3 - Evolução dos recursos do Pronaf, por região geográfica (1999-2012)
Fonte: BACEN – Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria.
Nesse sentido, em termos relativos, as informações que podem ser extraídas do gráfico
acima é que houve um processo de concentração dos recursos financeiros do PRONAF entre
1999 e 2012, em termo geral, a dinâmica na distribuição do crédito do programa é
caracterizada por uma forte desigualdade. Contudo a desigualdade não é apenas por região
demográfica, mas por grupo beneficiário e produto, uma desigualdade em todas as esferas de
distribuição.
Enquanto em todas as demais regiões a utilização do crédito vem crescendo, algumas
regiões com maior expressividade, outras nem tanto, no Nordeste o movimento é inverso de
2006 a 2008. A absorção do recurso na região é declinante e cada vez mais inexpressiva no
quadro geral do país, quando tomamos como referência a quantidade de estabelecimentos
rurais e o valor do crédito transferido. Na realidade, o maior grau de associativismo, a melhor
62
distribuição da estrutura fundiária, a maior capacidade de endividamento dos agricultores do
Sul e do Sudeste, comparativamente aos do Norte, Centro-Oeste e Nordeste, combinados com
o aumento do teto de financiamento, contribuíram para acentuar as desigualdades inter-
regionais previamente existentes, ao invés de reduzi-las como seria de se esperar em um
programa de desenvolvimento rural com foco na agricultura familiar.
Gráfico 4 - Panorama em termos percentuais na distribuição dos recursos do PRONAF, por
região (1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria.
Quando analisamos em termos percentuais, fica mais evidente a acentuada
concentração na distribuição dos recursos do programa. No cômputo geral, a partir de uma
média simples, no acumulado do período de 1999 a 2012, mais da metade do montante de
crédito do programa se concentrou nos três estados da região Sul do país: Rio Grande do Sul,
Paraná, Santa Catarina, em média, anualmente cerca de 51% das aplicações financeiras do
Pronaf foram transferidas para a região Sul, acompanhando a tendência concentradora, a
região Sudeste é a segunda maior via de escoamento, aproximadamente 20% em média a cada
ano são direcionados para o Sudeste do país. Por outro lado, a região Nordeste, Norte e
Centro-Oeste, respectivamente, concentram em média 16 %, 6% e 7%. Os resultados
mostram-se bastante incompatíveis com a racionalidade de uma política pública distributiva
de desenvolvimento rural.
Na verdade, existem diferentes maneiras para mostrar a lógica concentradora e
desigual na distribuição dos recursos do PRONAF. A evolução do crédito e dos contratos são
os principais parâmetros de estudo. Nessa monografia foi introduzida outra forma, pouco
63
explorada na análise da divisão do montante. Consiste no valor financiado por área e número
de estabelecimentos da agricultura familiar. A média de recursos por hectare e quantidade de
estabelecimentos pode ser um interessante indicador da taxa de investimento de capital em
cada região. Nesse sentido, a partir dos dados do Censo Agropecuário 2006, e um recorte
temporal do valor financiado pelo programa em cada região no ano de 2006 e posteriormente
2012, permitem verificar quais as regiões que obtiveram maior aplicação de recurso por
hectare de área e total de estabelecimentos.
Tabela 2 - Total de recursos do PRONAF por estabelecimento e área em hectare, por região
(2006 e 2012)
Regiões Estab. Área (ha)
N Norte 412.666 16.611.277
NE Nordeste 2.187.131 28.315.052
SE Sudeste 699.755 12.771.299
S Sul 849.693 13.054.511
CO Centro-Oeste 217.022 9.350.556
Recursos 2006 R$ por estab. R$ por área
N 775.185.225,73 1.878,48 46,67
NE 2.568.042.227,12 1.174,16 90,7
SE 1.915.743.717,11 2.737,73 150
S 4.022.713.191,97 4.734,31 308,15
CO 589.902.946,74 2.718,17 63,09
Recursos 2012 R$ por estab. R$ por área
N 1.186.950.218,12 2.876,30 71,45
NE 2.387.439.699,49 1.091,59 84,32
SE 3.563.929.192,91 5.093,11 279,06
S 8.174.424.396,03 9.620,44 626,18
CO 1.046.234.646,57 4.820,87 111,89
Fonte: IBGE- Censo Agropecuário 2006 e BACEN, Elaboração própria.
A tabela 2 mostra que o investimento por hectare entre as regiões são bastante
diferenciados. No entanto, o que mais chama atenção ao analisar a tabela é o altíssimo valor
concentrado na região Sul do país. Essa região concentrou no ano de 2006 mais de 40% do
total de investimento por hectare e em 2012 foram mais de 50% direcionados a essa região.
Significa dizer, que apesar de todo o discurso oficial do PRONAF, em se apresentar como
política pública distributiva, capaz de gerar renda e desenvolver a categoria dos agricultores
familiares, em particular, os mais carentes, na prática não se concretiza. Na realidade, essa
política vem compartilhando das mesmas características das políticas de crédito
implementadas no meio rural brasileiro, concentradora, desigual e seletiva.
64
Gráfico 5 - Distribuição do crédito do PRONAF por grupos de agricultores familiares –
Brasil (2006)
Fonte: Relatório de pesquisa do IPEA 2013
Tabela 3 - Distribuição do número de estabelecimentos dos grupos do PRONAF – Brasil
(2006)
REGIÕES GRUPO A GRUPO B GRUPO C GRUPO D GRUPO E
Total % Total % Total % Total % Total %
Norte 141.482 26,52 154.318 6,39 79.716 10,18 16.315 5,68 3.841 6,11
Nordeste 212.091 39,76 1.567.863 64,89 238.209 30,42 45.698 15,9 11.072 17,6
Sudeste 38.238 7,17 356.526 14,76 160.803 20,54 59.705 20,8 14.452 23
Sul 60.982 11,43 269.668 11,16 266.742 34,07 154.223 53,7 31.070 49,4
Centro-
Oeste
80.661 15,12 67.752 2,8 37.512 4,79 11.523 4,01 2.464 3,92
Brasil 533.454 100 2.416.127 100 782.982 100 287.464 100 62.899 100
Fonte: Relatório de pesquisa do IPEA 2013
Contrapondo as informações do gráfico 5 e da tabela 3, verifica-se que 39,28% dos
recursos do PRONAF são direcionados para os agricultores familiares enquadrados no grupo
D, 20,72% e 16,77% respectivamente são direcionados ao grupo C e E. Esses grupos (C, D e
E) são formados por agricultores familiares mais capitalizados e com maior estrutura
fundiária. Nesse sentido, como mostra a tabela 3 eles estão concentrados prioritariamente na
região Sul. Enquanto, apesar do Nordeste deter a maior parte dos agricultores familiares com
condições de enquadramento no PRONAF, em outras palavras, como mostrado no gráfico 2,
mais de 50% do público potencial está concentrado na região Nordeste, no entanto, a maior
65
parte desses beneficiários são do Grupo A e B, grupos formados por agricultores familiares
mais carentes, que possuem o menor nível de renda, e conseguinte, menores empreendimentos
familiares.
Nesse contexto, as informações que podem ser extraídas no gráfico e tabela acima,
fornecem pilares para entender um dos elementos que contribuem para a concentração dos
ativos financeiros do PRONAF na região Sul, que apesar de não possuir maior parte do
público potencial, é na região Sul que se localiza a grande parte dos beneficiários do grupo C,
D e E, por conseguinte, grupos que tem maior capacidade de endividamento, uma vez que a
disponibilidade de recursos direcionados para empréstimos nesses grupos são maiores, e
possuem maior estrutura física para investir e modernizar.
De fato, os dados informados acima revelam o viés concentrador e privilegiador que
caracteriza a política de crédito do PRONAF ao longo de sua trajetória histórica. Deste modo,
se concretiza uma das hipóteses inicial do estudo. Há disparidades na repartição das
aplicações financeiras do programa, onde os maiores beneficiários do programa têm sido
efetivamente os agricultores mais capitalizados, são esses que operam com o maior valor
financiado por estabelecimento agrícola e área da agricultura familiar. Enquanto isso, a
grande maioria dos agricultores familiares mais empobrecidos do país não consegue acessar
efetivamente o crédito do programa, ou não sustenta de forma duradoura o benefício, sejam
por questões climáticas, culturais, econômicas, institucionais, limitações físicas de absorção
do recurso, entre outras.
De maneira geral, conforme Aquino e Schneider (2010), muitas explicações cerca o
debate sobre os limites do PRONAF como política pública de caráter distributivo, entre as
aspirações, alguns teóricos associam a desigualdade na distribuição a problemas operacionais
e sociopolíticos que estariam fora do raio de ação do programa. Assim, entre os fatores
arrolados com maior frequência para explicar o quadro de desigualdades socioespaciais
apresentado, destacam-se:
Os elevados obstáculos burocráticos impostos pelo sistema bancário aos agricultores
familiares com níveis de renda inferiores; a maior organização dos agricultores mais
capitalizados; as pressões de empresas agroindustriais às quais estes produtores estão vinculados; a concentração de agências bancárias e cooperativas de crédito nos
estados da região Sul; e a desarticulação e baixa inserção social dos produtores do
Norte e do Nordeste.
Em suma, percebe-se claramente que as regiões que historicamente sempre foram as
mais desenvolvidas, capitalizadas e organizadas economicamente são os espaços que
concentram a maior proporção dos recursos financeiros do programa. Assim, diferente do que
66
se pensava na formulação da política pública, não houve redução da distância entre regiões
“desenvolvidas” e “não desenvolvidas”, ao contrário, houve intensificação da heterogeneidade
econômica e uma acentuada desigualdade social e econômica.
1.8 COOPERATIVAS E ASSISTÊNCIA TÉCNICA COMO AGENTES
DINAMIZADORES.
Admite-se que as dificuldades vivenciadas continuamente pelo agricultor familiar no
rural brasileiro reafirmam a importância da criação de associações e cooperativas como um
canal importante de produção, organização de produção, agregação de valor e de
comercialização da produção (PIRES, 2003). Além disso, o serviço de assistência técnica e
extensão rural constituem um importante instrumento de apoio ao desenvolvimento rural.
Neste sentido, de acordo com a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão
Rural (PNATER), enfatiza como missão:
Participar na promoção e animação de processos capazes de contribuir para a construção e execução de estratégias de desenvolvimento rural sustentável, centrado
na expansão e fortalecimento da agricultura familiar e das suas organizações, por
meio de metodologias educativas e participativas, integradas às dinâmicas locais,
buscando viabilizar as condições para o exercício da cidadania e a melhoria da
qualidade de vida da sociedade.
Nesse contexto, alguns elementos já foram apontados como os possíveis “causadores”
dos diferentes impactos do PRONAF. Será objeto de esboço nessa monografia, a elevada
organização dos agricultores familiares, no que concerne ao número de estabelecimentos
agropecuários cujo produtor “pronafiano” é associado à cooperativa e recebeu assistência
técnica, por região geográfica. Ressalta-se, no entanto, que mais estudos devem ser realizados
para isolar e mensurar o grau de influência desses fatores nos efeitos e impactos do PRONAF
em distintos ambientes político-institucionais, geográficos e sócio-culturais.
Tabela 4 - Número de estabelecimentos “pronafianos” associado a cooperativas (2006)
Regiões Número de estabelecimentos agropecuários (Unidades)
Norte 5.294
Nordeste 14.277
Sudeste 36.560
Sul 75.138
Centro-Oeste 8.367
Total 139.636
Fonte: IBGE- Censo Agropecuário 2006. Elaboração própria.
67
A partir da figura acima, percebemos claramente que não há dúvidas que as regiões
que se destacam na absorção do crédito do Pronaf além de serem regiões capitalizadas e mais
desenvolvidas historicamente, são regiões que possuem maior organização em forma de
cooperativas. A formação de cooperativas numa região pode consistir num importante agente
fomentador de desenvolvimento, uma vez que as cooperativas têm a capacidade de articular
diversas políticas públicas, que quando combinadas possuem maior êxito, formam-se num
instrumento dinamizador da economia local e dos espaços econômicos circunvizinhos.
Gráfico 6 - Proporção das assistências técnicas recebidas, por região geográfica (2006)
Fonte: IBGE- Censo Agropecuário 2006. Elaboração própria.
A fragilidade da agricultura em relação a outras atividades econômicas uma vez que se
trata de atividade de alto risco e de baixa rotatividade de capital, faz dela um setor transferidor
natural de renda para os outros setores, necessitando de políticas públicas diferenciadas que
permitam ao agricultor se capitalizar (NETO, 2001). Mas, a criação das políticas públicas
específicas para agricultura familiar no meio rural brasileiro não apenas objetivam capitalizar
essa categoria, mas introduzi-la num ambiente social e econômico “justo”. A assistência
técnica e extensão rural é outro importante mecanismo de inserção e apoio a essa classe, pois
permitem o diálogo entre os centros de pesquisa agropecuários e o mundo rural, contribuindo
ativamente no que diz respeito aos processos de desenvolvimento local. No Brasil, as ações de
extensão rural estão presentes desde o final da década de 1940, com a criação da Associação
de Crédito e Assistência Técnica Rural de Minas Gerais e, conforme discutidos na literatura,
sempre foram movidas pela idéia de que o incremento de técnicas modernas de produção
causariam melhorias nas condições de vida das pessoas envolvidas (PIRES, 2003).
68
1.9 ATUAÇÃO DO PRONAF NA REGIÃO NORDESTE
A desproporção também é compartilhada quando se analisa a distribuição do crédito
do programa no interior das regiões. Neste, especificamente o Nordeste. Na verdade, ocorre
que o PRONAF ainda enfrenta dificuldades para alcançar os seus principais objetivos na
Região Nordeste, em particular no que se refere ao fortalecimento da agricultura familiar, ao
aumento da renda e da ocupação, e à melhoria das condições vida dos seus beneficiários,
principalmente no semiárido, onde se concentram os maiores bolsões de pobreza rural. Além
das irregularidades climáticas que são cíclicas no semiárido, a média dos contratos de crédito
nesses espaços é muito baixa, já que a maior parte dos agricultores familiares nesses espaços
incluem-se no chamado Grupo B, cerca de 64,89% como mostra tabela 3, cuja capacidade de
endividamento é uma das menores dentre todos os beneficiários do PRONAF. Nessas
condições, a elevação do limite de crédito do PRONAF, ocorrida recentemente, permitiu a
inclusão de novos agricultores familiares mais capitalizados, o que intensificou ainda mais a
desigualdade.
Tabela 5 - Distribuição do montante de crédito do Pronaf (%), por ano e por estado
(1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria.
A partir da sistematização dos dados em termos percentuais verifica-se que alguns
estados da região Nordeste, concentram mais recursos do que outros. Duas observações
importantes podem ser extraídas: primeiro, a Bahia sempre foi o estado líder na recepção dos
recursos, de acordo com uma média simples, foram em média 26% ao ano, transferidos para o
ANO AL BA CE MA PB PE PI RN SE
1999 4,59 25,79 12,98 8,43 6,85 16,76 13,72 3,51 7,37
2000 2,75 28,02 13,83 14,61 6,22 7,93 11,69 4,71 10,23
2001 9,46 32,18 7,41 11,46 6,29 6,95 8,99 8,68 8,57
2002 9,11 34,20 5,69 16,18 2,45 4,40 9,76 8,90 9,32
2003 6,42 32,63 5,51 15,99 1,34 5,63 11,10 14,38 7,00
2004 4,24 32,55 11,09 14,64 4,73 5,92 10,27 10,27 6,30
2005 4,78 23,06 10,50 19,78 6,06 8,48 12,02 9,39 5,93
2006 4,66 21,76 13,90 16,85 7,65 13,47 8,60 7,78 5,32
2007 4,59 22,00 15,14 15,22 5,28 17,17 8,25 7,14 5,20
2008 5,34 22,30 18,18 13,36 4,66 17,10 7,70 5,95 5,41
2009 6,94 22,53 16,83 14,38 5,73 15,09 8,25 5,07 5,17
2010 6,65 21,45 15,67 17,63 5,71 14,53 8,04 4,62 5,69
2011 6,81 23,39 13,68 17,37 6,35 13,40 8,41 5,40 5,19
2012 6,28 22,73 15,86 14,12 6,01 14,40 9,79 5,74 5,06
69
estado baiano, e por outro lado, o Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe sempre formaram
as regiões que menos receberam financiamento do programa, respectivamente em média,
7,25%, 5,9% e 6,5% anualmente.
Tabela 6 - Distribuição do público potencial do PRONAF “B” – Região Nordeste (2006)
Fonte: Relatório de pesquisa do IPEA 2013
A tabela 5 mostra a distribuição do “público potencial” dos estados na região
nordeste, os estados que mais se destacam é Bahia, Ceará, Maranhão e Pernambuco, a Bahia
lidera com o maior número de estabelecimento 497.489, 31,73% da proporção regional e
20,58% da proporção nacional. Além desses dados, quando se verifica o número de
estabelecimentos da agricultura familiar, nas diversas condições (condição do produtor,
proprietário, assentado sem titulação definitiva, arrendatário, parceiro, ocupante, produtor sem
área) e o número de estabelecimentos que não obtiveram financiamento por motivos variados
(falta de garantia pessoal, não sabe como conseguir, burocracia, falta de pagamento do
empréstimo anterior, medo de contrair dívidas, outro motivo, não precisou), esses estados,
juntamente com o Piauí são os que se destacam na existência do maior número de possíveis
beneficiários das políticas públicas para agricultura familiar, em particular, o PRONAF.
Além disso, ainda com base nos dados do Censo Agropecuário 2006, dentre os
estados que compõem a região Nordeste, os quatros estados – Bahia, Pernambuco, Ceará e
Maranhão - têm maior expressividade em termos percentuais no valor da produção por
estabelecimento “pronafiano”, produtos da agroindústria rural, respectivamente, 27,6%, 6,7%,
8,1%, 36,2% no âmbito regional, e 11%, 2,7%, 3,2% e 14,5% no âmbito nacional.
Nesse contexto, podemos perceber que a distribuição dos recursos por estado da
região nordeste segue em proporções diferentes. Contudo, a existência de um público
Estados Estabelecimento do Grupo B Regional (%) Nacional(%)
AL 78.683 5,02 3,25
BA 497.489 31,73 20,58
CE 254.062 16,21 10,52
MA 167.918 10,71 6,95
PB 104.100 6,64 4,31
PE 194.908 12,43 8,07
PI 166.211 10,6 6,88
RN 42.234 2,69 1,75
SE 62.258 3,97 2,58
TOTAL 1.567.863 100 64,89
70
potencial diverso em cada estado e a expressividade econômica dos estados no valor da
produção regional, formam índices de compreensão.
1.10 DESEMPENHO DO PRONAF NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
A agricultura familiar do Rio Grande do Norte vem sendo objeto de estudo frequente
de pesquisadores, instituições governamentais ou não governamentais, públicas e privadas. Na
verdade, há um esforço para melhor caracterizar esse estado, na tentativa de preencher
importantes e fundamentais lacunas, a fim de desenhar políticas públicas específicas as
demandas existentes dessa população.
Em âmbito geral, os dados do Censo Agropecuário 2006, constatou que no Rio Grande
do Norte existem cerca de 71.210 estabelecimentos da agricultura familiar, significa que
85,74% dos estabelecimentos do RN são propriedades da agricultura familiar - Lei 11.326,
ocupando uma área de aproximadamente 1.046.070 hectares, enquanto os estabelecimentos
não familiares ocupam uma área de 2.141.858 hectares, aproximadamente 67,18% da área
rural. Em média cada estabelecimento familiar, no exercício do censo, ocupava uma área de
14,68 hectares, enquanto, a área agrícola não familiar era de 180,85 hectares. Resultados que
mostram claramente a elevada concentração de terras e a péssima distribuição fundiária.
Tabela 7 - Número de contratos do PRONAF no Rio Grande do Norte (1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria.
ANO CONTRATOS
Custeio Investimento TOTAL
1999 5.454 2.794 8.248
2000 4.498 3.834 8.332
2001 4.172 13.106 17.278
2002 19.317 7.452 26.769
2003 42.836 17.934 60.770
2004 44.344 28.905 73.249
2005 41.378 88.835 130.213
2006 39.792 91.383 131.175
2007 35.512 55.676 91.188
2008 16.596 30.691 47.287
2009 10.298 31.008 41.306
2010 7.507 31.928 39.435
2011 6.314 35.948 42.262
2012 6.492 43.949 50.441
71
Gráfico 7 - Dinâmica dos recursos financiados pelo PRONAF no RN (1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria.
A tabela 6 mostra um dado muito curioso e que despertar notável atenção, como vimos
no histórico inicial desse tópico, os dados do Censo Agropecuário de 2006 mostra que no Rio
Grande do Norte existem cerca de 71.210 estabelecimentos da agricultura familiar. No
entanto, a tabela 6 mostra que ocorreram 130.213, 130.175 e 91.188 mil contratos,
respectivamente em 2005, 2006, 2007. Como explicar esse fenômeno onde o número de
contratos, ou seja, o público beneficiário é maior que o público existente nesse município?
Para acessar o crédito do PRONAF o produtor deve comprovar, mediante declaração de
aptidão (DAP) que está enquadrado nos requisitos necessários para ser beneficiário do crédito.
Como mostra Aquino (2006) no seu texto avanços e distorções do PRONAF no RN:
Se esse documento (DAP) só pode ser emitido pelo órgão local de assistência
técnica (EMATER) e pelos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs), depreende-
se, então, que a presença de muitos “penetras” no meio do público desse programa, é
fruto principalmente das “falhas institucionais” existentes na gestão dessa política
no âmbito de cada município em particular.
Outras importantes considerações que podem ser extraídas das ilustrações acima.
Primeiro, no cômputo geral houve um comportamento decrescente do número de contratos e
do valor financiado, a partir de 2006. Neste caso, esse comportamento pode ser explicado por
muitos fatores, alguns serão discutidos abaixo. Segundo, há uma mudança no “perfil” das
adesões do Pronaf. Ocorre que até 2004, exceto em 2001, os contratos e o financiamento eram
predominantemente para crédito de custeio, cerca de 70% eram destinados para essa
finalidade. Contudo, houve uma mudança nas adesões, a partir de 2004, sem exceções, o
72
crédito foi destinado para os contratos de investimento, em média 74%, diferente do quadro
geral do Brasil, onde o crédito para custeio ainda compõe quase 50% da cartilha de
empréstimo.
Em termos percentuais, o estado do Rio Grande do Norte no total que é repassado
para o Brasil e para a Região Nordeste tem pequena relevância, quase insignificante. Do total
que foi repassado para o Brasil, cerca de menos de 1% foi destinado para o RN, enquanto no
total de recursos repassados para o Nordeste, o RN se apropriou em média 6,4%.
O rural no estado do RN é quase predominantemente composto por estabelecimentos
agrícolas da agricultura familiar. Segundo os dados, são 71.210 estabelecimentos familiares,
cerca de 1,6 % da área rural familiar do país, ocupando uma área de 1.046.070 ha. A desigual
distribuição fundiária no estado é um importante entrave para o êxito das políticas públicas de
crédito que objetivam promover desenvolvimento. Isso ocorre porque há uma limitação física
da área na absorção do crédito, grande parte dos agricultores do estado é enquadrada na
categoria de pequeno agricultor, especificamente, nos grupos que têm os menores limites de
crédito disponível.
Além disso, o baixíssimo nível de escolaridade pode representar um entrave na
eficácia das políticas, muitas vezes, as políticas públicas objetivam metas complexas e são
formuladas sobre um número elevado de regras e requisitos, que são dubiamente entendidos,
ou em alguns casos, não interpretados pelos agricultores, ou como na maioria das vezes, não
há uma explicação das normas por parte dos bancos e agentes de desenvolvimento. Desta
forma, muitas vezes os agricultores desconhecem as vantagens e penalidades, no caso do
Pronaf, a vantagem do bônus de adimplência que por muitas vezes não se beneficiam.
Outros fatores conjuntamente colaboram para o “conturbado” acesso dos agricultores
familiares do estado, predominantemente, PRONAF B, ao crédito rural. Existe um ambiente
institucional a qual o agricultor do estado está imerso, que explica os entraves na eficácia das
políticas. Conforme relatos contidos no estudo, não há uma relação “ótima” entre agricultor e
banco. Entre as principais dificuldades apontadas pelos usuários em 2005, estão o atraso na
liberação do crédito (32%) e as exigências bancárias (27,4%). Somam-se, outras dificuldades,
tais como: atraso na operacionalização do financiamento por parte dos mediadores, mudanças
de planilhas e reformulações nos planos de crédito, falta de acompanhamento na operação,
entre outras (BASTOS, 2005).
Nesse sentido, nem mesmo a cobertura do risco bancário pelo Tesouro estimula os
agricultores a estabelecer, com os bancos, uma relação permanente, uma vez que, de qualquer
maneira, os empréstimos são garantidos, integralmente, pelo Tesouro. Portanto, a política de
73
crédito não significa, nessas situações, o fim da exclusão bancária tão característica da
pobreza brasileira. Na verdade, o maior desafio do governo brasileiro consiste em encontrar
os incentivos que podem levar os bancos a emprestar a populações pobres sem transformar o
crédito em subsídio direto (ABRAMOVAY; PIKETTY, 2005)
Assim, a compreensão das dificuldades enfrentadas pelo PRONAF deve-se à falta de
capilaridade e aos entraves burocráticos dos bancos oficiais, os quais, combinados com a
inexistência ou a insuficiência de assistência técnica, podem reduzir a eficiência do Programa,
em especial nas regiões mais pobres, onde a existência de assistência técnica, gratuita e de
qualidade é condição indispensável para o êxito de uma agricultura familiar sustentável
(BELIK, 2000).
O conceito de finanças de proximidade discutido por Abramovay (2003) pode
representar uma importante saída para a utilização mais eficiente dos recursos alocados nas
diversas linhas do PRONAF. Neste, os bancos oficiais ampliam os seus respectivos raios de
ação, além de instituições de repasse direto de crédito aos agricultores familiares,
descentralizam os pontos de oferta de crédito, reduzem o custo operacional do crédito, e
assumem um novo papel de fomentador do desenvolvimento regional, a partir da mobilização
de poupanças locais, estímulos a investimentos, incentivos a capacidade de planejamento
local e ao espírito de empreendedorismos dos agricultores familiares. Admite-se que o
empreendedorismo tende a ser mais forte onde o tecido econômico e social é mais denso: a
existência de bancos, a diversificação econômica, a presença de gama variada de serviços
públicos contribuem para reforçar as redes que vão estimular as iniciativas empresariais,
sobretudo das populações mais jovens. (ABROMAVAY, 2003).
Apesar da tradição de bons pagadores dos agricultores familiares do estado, 91,7 %
declararam que pretendiam liquidar seu débito até o vencimento. (BASTOS, 2005). Em geral,
há um elevado nível de inadimplência entre os membros do Grupo B. Conforme Holanda
(2010), muitos são os motivos, entre eles:
74
Gráfico 8 - Principais causas da inadimplência do grupo B no RN (2009)
Fonte: Adaptado de Holanda (2010).
Nesse contexto, dada a elevada inadimplência do estado, o número de possíveis
beneficiários reduz, porque já se endividaram e não podem mais acessar o crédito. Outras
importantes considerações podem ser feitas quando tratamos do crédito rural, em particular,
do PRONAF no estado do Rio Grande do Norte. Sobretudo, o direcionamento dos recursos do
programa, que a partir de 2000 foram quase exclusivamente para as atividades da pecuária.
Enquanto isso, as atividades agrícolas pouco dinamizou após a implementação dessa política.
As ilustrações abaixo mostram a utilização predominante dos ativos do PRONAF na pecuária,
e, por conseguinte, a concentração dos contratos em todos os anos da implementação, após
2000, nessa atividade. Em termos percentuais foram firmados, a partir de uma média simples,
78% dos contratos na pecuária, 71% dos recursos. Isso direciona a outra importante
observação, que apesar do maior número de contratos e recursos direcionados para a pecuária,
o valor médio dos contratos é mais baixo do que os valores médios da atividade agrícola, em
média, respectivamente R$ 3.110,43 e R$ 1.846,42.
75
Gráfico 9 - Média percentual dos contratos do Pronaf, no estado do RN (1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria
Gráfico 10 - Divisão dos recursos do PRONAF alocados no estado do RN, por atividade
(1999-2012)
Fonte: BACEN- Anuário estatístico do crédito rural. Elaboração própria
Em conformidade, as atividades – agrícola e pecuária – se dinamizam em intensidades
diferentes, diante dos diversos fatores acima referidos, entre os quais o crédito provavelmente
assume uma posição destacada. Pressupõe-se, assim, algumas atividades, cultivos, criação de
animais que são mais sensíveis às políticas de crédito do que outras, e como veremos abaixo,
não há dúvidas que há uma resposta mais “positiva” na atividade pecuária, quando comparada
com a atividade agrícola. Com o auxílio, dos dados da Pesquisa Pecuária Municipal (PPM) e
da Pesquisa Agrícola Municipal (PAM), constataremos qual o comportamento dessas
atividades ex-ante e ex-post a implementação do PRONAF.
76
Gráfico 11 - Evolução do rebanho de bovinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012)
Fonte: IBGE - Pesquisa Pecuária Municipal. Elaboração própria.
Gráfico 12 - Evolução do rebanho de caprinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012)
Fonte: IBGE - Pesquisa Pecuária Municipal. Elaboração própria.
Gráfico 13 - Evolução do rebanho de ovinos (cabeça), no estado do RN (1986-2012)
Fonte: IBGE - Pesquisa Pecuária Municipal. Elaboração própria.
77
Gráfico 14 - Evolução da quantidade produzida de feijão (tonelada), no estado do RN (1990-
2012)
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal. Elaboração própria.
Gráfico 15 - Evolução da quantidade produzida de milho (tonelada) no estado do RN (1990-
2012)
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal. Elaboração própria.
Gráfico 16 - Evolução da quantidade produzida de melão (tonelada) no estado do RN (1990-
2012)
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal. Elaboração própria.
78
Gráfico 17 - Evolução da quantidade produzida de mandioca (tonelada) no estado do RN,
(1990-2012)
Fonte: IBGE - Produção Agrícola Municipal. Elaboração própria.
Em termos gerais, a atividade pecuária e seu arranjo de condições e variáveis que são
próprias dessa atividade (menor risco e sazonalidade, maior resistência) e o ambiente natural
norte-rio-grandense, permitem que seus resultados sejam mais sensíveis às políticas de
estímulo ao crescimento, nesse caso, a política de crédito do PRONAF. A partir dos gráficos
do rebanho efetivo da pecuária (bovino, ovino e caprino) percebemos a dinâmica
“equilibrada” dessa atividade, e do inquestionável desempenho econômico após a
implementação do programa. Não há dúvidas, que outros elementos e variáveis
impulsionaram e colaboraram para o êxito nessa atividade ao longo do período em análise.
Contudo, admite-se que o crédito rural pode constituir-se num importante dinamizador
econômico da atividade pecuária.
No que concerne a atividade agrícola, o estado é composto predominantemente por
lavouras temporárias, em 2011 em área colhida, foram cerca de 62%, enquanto as lavouras
permanentes com apenas 38% do total de 422.647 da área colhida (hectares). Entre os
principais produtos estão: abacaxi, algodão arbóreo (em caroço), arroz, batata-doce, cana de
açúcar, cebola, fava, feijão, fumo, girassol, mamona, melancia, melão, milho, tomate e sorgo.
O Rio Grande do Norte representa pouca expressividade no âmbito da agricultura nacional, o
estado em 2011 produziu R$ 983,3 milhões, o que representou apenas 0,5% do valor da
produção agrícola brasileira. Apesare disto, quando se considera o Rio Grande do Norte
isoladamente, verifica-se que a agropecuária tem um papel fundamental nas exportações e na
alimentação e geração de ocupação para as famílias rurais.
79
Alguns fatores podem ser citados na tentativa de explicar a inexpressividade da
produção do estado em âmbito nacional. Entre eles: as condições climáticas não favoráveis;
concentração fundiária; a pequena área das unidades familiares de produção; e,
consequentemente, reduzida capacidade de produção e absorção de crédito; quase que
inexistente assistência técnica, desorganização da produção, distribuição e comercialização.
Ocorre que, a atividade agrícola está imersa num espaço natural, marcado por suas
restrições mútuas, interações e interdependência, cujo ajustamento não é algo facilmente
alcançado, uma vez que continuamos a depender da ação incontrolável das forças da natureza,
como chuva, sol, vento, condições do solo.
Nesse sentido, a atividade agrícola, dentre todas as demais, é altamente condicionada a
rigidez natural do meio ambiente, dificultando as elevações na produção apenas com políticas
pontuais, no caso o PRONAF. Apesar de constituir a atividade mais essencial, por ser
fornecedora dos alimentos que são básicos na dieta humana, é a atividade com a menor
sensibilidade, onde as culturas que possuem menores riscos e são menos sensíveis as
modificações naturais, bem como aqueles cultivos que estão em áreas adequadas, são os que
apresentam dinamismo com a política de crédito. De fato, percebemos que para a pequena
agricultura de subsistência do estado do RN o Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar ainda não conseguiu efetivamente contribuir para melhorar o panorama
econômico e social dos agricultores mais carentes. Portanto, o programa tem estimulado
pequenas e pontuais mudanças das estruturas produtivas e nas atividades agrícolas
tradicionais, em particular, dos cultivos clássicos dos pequenos estabelecimentos
agropecuários.
80
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O PRONAF como política pública específica para agricultura familiar, que
historicamente sempre foi marginalizada pelas políticas públicas para o meio rural brasileiro,
representou um marco na política agrícola brasileira, e, portanto, é considerado um avanço
sem precedentes no país. Anualmente, a cada plano safra, o PRONAF se consolida como
instrumento transformador dessa categoria, a exemplo, podemos verificar o crescimento
acelerado de recursos disponibilizados e dos beneficiários que continuamente firmam novos
contratos. Contudo, apesar das muitas mudanças de operacionalização e implementação, o
programa necessita de importantes e fundamentais ajustes para que de fato consiga cumprir
seus objetivos básicos, inclusão dos agricultores familiares, e, portanto, redução das
desigualdades sociais no campo.
Muitos são os entraves a serem superados, considerando que a questão do
desenvolvimento rural sustentável é bastante complexa, porém não pode minimizar o quanto
significativo é a distribuição de crédito. Todavia, para que o crédito cumpra sua função de
eficiência econômica e justiça distributiva em maior plenitude, existem fatores estruturais e
institucionais a serem superados, além daqueles relativos à superioridade técnica e produtiva
das unidades familiares de produção das Regiões Sul e Sudeste. Destacam-se entre esses
fatores, a concentração fundiária; a pequena área das unidades familiares de produção; e,
consequentemente, a sua baixa capacidade de produção e absorção de crédito dos
estabelecimentos familiares das Regiões Norte e Nordeste.
Apesar da curta trajetória histórica do programa, há uma miríade de estudos sobre o
tema, no que cerne seus impactos e efeitos. Ocorre que, dada à heterogeneidade dos espaços
geográficos do país, o PRONAF como política pública de fortalecimento da agricultura
familiar, ainda não conseguiu cumprir seu objetivo em âmbito nacional. Essa política é uma
espécie de “carimbo” para todas as regiões, estados e municípios não levando em
consideração as especificidades que são próprias de cada conjuntura e os diferentes contextos
históricos presentes em cada espaço. Assim, os maiores impactos transformadores se
concentram e privilegiam categorias específicas de agricultores familiares, sobretudo, os
agricultores mais capitalizados e integrados ao mercado, localizados nas regiões Sul e
Sudeste. Nesse sentido, podemos dizer que faz mais do mesmo, ou seja, continua financiando
o tradicional modelo agrícola produtivista, setorial e excludente em curso no rural brasileiro.
81
Mas, como discutido por Carneiro, os resultados alcançados no PRONAF desde sua
implementação eram previsíveis e esperados. Ocorre que, a concepção modernizante contida
nessa política, desde início direcionava aos caminhos que seriam percorridos. Nesse sentido, a
concentração dos benefícios e beneficiários e o limitado raio de alcance do programa, são
frutos da sua própria lógica operacional, uma vez, que o mesmo sustenta-se das noções de
rentabilidade crescente e produtividade, aspectos suficientemente capazes de inserir os
agricultores familiares no mercado, contribuindo para a competitividade da economia
nacional, geração de renda, emprego e capacidade de reembolso dos recursos públicos.
No estado do Rio Grande do Norte a atuação do programa é ainda mais preocupante,
verifica-se que há uma tendência descendente, dentre outros, os principais elementos são a
baixa escolaridade dos agricultores familiares e o elevado nível de inadimplência, que
consequentemente impulsiona a redução do público potencial do estado, uma vez, que a
grande maioria dos possíveis beneficiários já estão com o “nome sujo” na cartilha de crédito,
e não conseguem acessar novas linhas de financiamento, custeio ou investimento. Além disso,
para a pequena agricultura tradicional o programa não tem acrescentado, seja na quantidade
produzida ou na área plantada.
Na verdade, o sucesso do PRONAF como política desenvolvimentista e redutora das
desigualdades sociais no campo, está condicionado a um raio de ações não previstas no
desenho normativo do programa, que vão desde sua operacionalização, normas, concepção,
(re)definição do público-alvo e atores. Acima de tudo, a formulação de políticas públicas
combinadas, principalmente uma reforma educacional, que levem em consideração as
diferentes realidades que marca a agricultura familiar brasileira nos territórios rurais do Brasil.
Além disso, deve haver uma análise minuciosa se os bancos como instituições de
repasse dos recursos do PRONAF podem ser vistos como agentes “negativos” para a
eficiência do programa. Ainda não é possível avaliar com muita clareza, mas as exigências
bancárias podem ter afastado uma grande parcela dos pequenos agricultores rurais no acesso
ao crédito. Os estudos sobre os efeitos das instituições financeiras são vagos e quase
inexistentes, e trata-se de um assunto de extrema importância para um completo entendimento
dos impasses e efeitos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar no
RN.
82
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