o perfil dos delitos do omissÃo imprÓpria no brasil -em busca de legitimação por meio da...
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1 INTRODUÇÃO
Desde há muito a doutrina parece ter renunciado ao propósito de elencar
exaustivamente todas as hipóteses de ocorrência dos delitos comissivos por omissão
na Parte Especial dos Códigos Penais; ou pelo argumento da impossibilidade fática
desta tarefa ; ou pelas lacunas na punibilidade que isto geraria.
É de questionar se talvez não fosse esse o preço a se pagar para que se tivesse
uma regulamentação mais respeitosa ao princípio da taxatividade (GRASSO, 1983,
p.448), pois, “por não se tipificar legalmente um grupo de condutas que praticamente
esgotam os exemplos doutrinários e jurisprudenciais, se coloque em quebra o princípio
da legalidade e toda segurança jurídica” (ZAFFARONI, 1982, p.37).
O fato é que a doutrina em algum momento da história acreditou ter chegado ao
seguinte dilema: ou não punia nenhuma omissão semelhante à da mãe que mata o filho
por inanição; ou punia a todas abrindo mão do princípio da legalidade.1
Neste sentido parece ter havido um “acordo” de que só abrindo mão do princípio
da legalidade se poderia regular devidamente esta espécie de delito, já que se tornara
inaceitável sustentar a causalidade natural da omissão. A omissão imprópria surge
como uma espécie de exceção a este princípio.
A fórmula encontrada foi a inclusão das cláusulas genéricas nas Partes Gerais, a
equivalência com a ação e a causalidade jurídica. A aceitação desta sofrível estrutura
perdurou por tanto tempo e está, atualmente, tão arraigado em nossa doutrina que
muitas das vezes se confunde omissão imprópria com a própria fórmula, sem se
questionar de uma compatibilidade ou não com o Estado Democrático de Direito.
Lembremos que “no Estado de Direito, as relações entre a autoridade e a
liberdade devem estar claramente definidas” (MUNHOZ NETTO, 1983, p.27).
A esse respeito a doutrina nacional parece que se resignou com o acréscimo do
§2º do art.13 sem se dar conta que isto, malgrado melhore, não contribui lá grandes
coisas em relação à segurança jurídica.
1 Obviamente não houve “um momento” tampouco um “acordo”, a hipótese é puramente metodológica, da mesma forma como fez Rousseau, analogamente, para explicar o contrato social.
1
Longe de soluções estes problemas tendem a caminhar a se tornarem ainda
mais graves com as flexibilizações e relativizações (SILVA SANCHEZ, 2002, p.21) dos
princípios penais deflagradas pela Sociedade de Risco2 e pelo seu Direito Penal do
Risco (GOMES e BIANCHINI, 2002, p.118). Os delitos omissivos impróprios, neste
contexto, transformam-se em poderosa arma do jus puniendi estatal, insurgindo-se nas
legislações na forma de tipos imprecisos e demasiadamente abertos e fomentando o
que Ferrajoli (2002, p.36) criticou de decisionismo ou Baratta (1994, p.12) de Direito
Penal jurisprudencial.
Se não bastasse os riscos incalculáveis à segurança jurídica que surge da
flexibilização ao princípio da taxatividade, não nos damos conta também que o critério
da equivalência entre os delitos de omissão com os de ação parte flagrantemente para
analogia in malam partem, haja vista que a equivalência radica-se na semelhança de
injustos entre ambos.
Nada mais atual, portanto, que a frase de Radbruch quando afirma que“ o
problema dos delitos comissivos por omissão não está em se encontrar uma cláusula
geral melhor, senão algo melhor que uma cláusula geral (apud , TOCILDO, 1995,
p.52).”
Pelos motivos já relatados e pela atualidade do tema é que escolhemos os
delitos comissivos por omissão como objeto desta monografia, ou seja, como forma de,
com isto, somar, mesmo que de forma singela, alguma contribuição a este assunto tão
complexo.
Razão assiste à doutrina quando afirma que a omissão é uma das questões mais
controversas da dogmática e que “sempre representou, na verdade, um ponto nebuloso
na teoria do delito” (Tavares, 1996, p.21). Tal argumento se aplica mais ainda para os
delitos comissivos por omissão, visto que até hoje a doutrina ainda não encontrou uma
explicação totalmente convincente de por que e de quando não evitar a ocorrência de
um resultado equivale a causá-lo.
A presente monografia, portanto, debruçou-se nas respostas às seguintes
perguntas: 1º)No que consiste a omissão? 2º)O que são os crimes comissivos por
omissão? 3º)Como é tratado no Direito Penal Brasileiro? 4º) Como é tratado pela
2 Denominação dada por ULRICH BECK para sociedade atual, caracterizada pelo aparecimento de riscos de dimensões globais.
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doutrina nacional? 5º) Esta forma de regulamentação fere o Princípio da Legalidade?
6º) O modelo adotado pela doutrina nacional fere o Princípio da Legalidade? 7º)Como
de lege ferenda é possível corrigir esta incompatibilidade? 8º)De lege lata qual é a
melhor saída?
Cumpre por último registrar, mesmo que adiantando as respostas da última
pergunta formulada, que procuramos nos trabalhos de um dos mais prestigiados
autores da atualidade, Silva Sanchez, as soluções para muitos dos questionamentos
levantados acima.
Com efeito, a identidade estrutural, assunto pouco ou quase nada tratado no
meio acadêmico nacional, se mostra sem sombra de dúvidas, senão apto a dirimir
todos os problemas oriundos da omissão imprópria, no mínimo um mecanismo eficaz e
coerente no manuseio das categorias dogmáticas de modo a adequá-las aos
paradigmas do Estado Democrático de Direito.
Por fim é de se esclarecer que esta monografia deve ser encarada tão-somente
como uma introdução ao pensamento do autor e não um meio de explicar
exaustivamente o tema da identidade estrutural, o que seria a princípio impossível;
tanto pelo exíguo espaço; como pela complexidade do assunto.
Explicado isto, passemos a uma maior pormenorização dos capítulos.
O capítulo I procura responder a primeira pergunta nº1, no que consiste a
omissão? Partindo das principais concepções normativas, quais sejam: a ação
esperada; o aliud agere; e a omissão como relação de discordância. Optamos por não
eleger uma definição deixando a cargo do leitor esta tarefa, todavia esclarecemos sob a
necessidade de um substrato material que oriente a norma, sob pena da criação de
crimes mera desobediência. Substrato que será na ação esperada, a expectativa social;
no aliud agere, a ação praticada diversa da ordenada; e na teoria da omissão como
discordância, o fato que fundamenta o juízo, ou seja, a efetiva conduta seja ela passiva
ou ativa.
O capítulo II volta-se para a pergunta nº2, o que são os crimes omissivos por
omissão? Com a intenção de diminuir um pouco a confusão terminológica da doutrina
no momento de classificar e distinguir os crimes omissivos enumeramos os critérios
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mais adotados. Expusemos, ademais, as principais classificações, sejam bipartidas
quanto tripartidas.
No capítulo III elencamos sistematicamente os modelos de regulamentação que
a omissão imprópria tem recebido, tanto na legislação estrangeira, com o decorrer da
história, quanto o modelo sui generis como foi concebida no direito penal brasileiro.
Deixamos expresso o inconformismo com o mero paliativo que representa o
art.13§2º, prestando-se apenas a mascarar o problema da legalidade dos delitos
comissivos por omissão.
No mais, demonstramos que dentre os países que possuem tal cláusula geral, o
modelo por nós adotado pelo possui alguns pontos positivos, pois alem de enumerar as
situações em que o agente se encontra na posição de garantidor, não equipara a
omissão à comissão por meio da equivalência, restando §2º compatível com o critério
da teoria da identidade estrutural.
Preocupou-se, evidentemente, em responder a pergunta nº3, como é tratado no
direito penal brasileiro?
No capítulo IV voltou-se para as perguntas nº 2, 3, 7,8,quais sejam: O que são os
crimes comissivos por omissão? Como é tratado no direito penal brasileiro?Como de
lege ferenda é possível corrigir esta incompatibilidade? De lege lata qual é a melhor
saída?
O presente capítulo demonstrou que não há relação de causalidade na omissão,
nem natural e nem qualquer outra. O que há é imputação. Em seguida aponta os
critérios que a doutrina tem adotado para esta imputação e explica porque o critério da
criação do risco é, atualmente, o que melhor responde o problema da imputação.
Mais adiante expõe o modelo incoerente assumido para o caput do art.13 com a
reforma de 1984 e as conclusões a que chega a doutrina brasileira acerca da
causalidade dos crimes comissivos por omissão.
.Por último conclui com as soluções de lege ferenda para corrigir o caput do
art.13 e de lege lata com a adoção doutrinariamente do critério da criação do risco para
a imputação do resultado.
Apenas no capítulo V é que expusemos com mais vagar o critério da identidade
estrutural como fundamento à punibilidade dos delitos omissivos impróprios. Antes,
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contudo, explicamos as nuances do critério adotado, de uma maneira geral, pela
doutrina nacional e estrangeira, ou seja, a equivalência axiológica com a comissão
como resposta à fundamentação de sua punibilidade e de como ela se mostra falha em
relação ao Estado Democrático de Direito, seja por ampliar demasiadamente os crimes
que podem ser cometidos por omissão; seja por incluir o argumento analógico como
fundamento.
A pergunta que o presente capítulo se direcionou foi a eminentemente a nº 4,
Como é tratado pela doutrina nacional? Todavia já acena para conclusão do capítulo
seguinte referente às perguntas nº 6 e 8, ou seja ,O modelo adotado pela doutrina
nacional fere o Princípio da Legalidade? De lege lata qual é a melhor saída?
O capítulo VI se identifica com a procura das soluções para os problemas
levantados até então, tanto de lege ferenda quanto de lege lata. Começa demonstrando
a flagrante inconstitucionalidade tanto na forma em que a legislação nacional
regulamenta os delitos comissivos por omissão, quanto na maneira como a doutrina o
concebe. (perguntas nº5 e 6) De lege ferenda, enumera as soluções apontadas pela
doutrina como inclusão de tipos na Parte Especial ou a adoção de um regramento dos
delitos comissivos por omissão semelhante à culpa,( pergunta nº 7); e de lege lata parte
para exposição detalhada do critério da identidade estrutural e material como a única
saída coerente para a equivalência entre a omissão e a ação.
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2 PRINCIPAIS TEORIAS NORMATIVAS ACERCA DA OMISSÃO
2.1 OMISSÃO COMO AÇÃO ESPERADA OU DETERMINADA 3
Após a doutrina perceber que a omissão não se caracteriza necessariamente
por um não fazer nada, nihil facere, como até então se pensava (muitas vezes se
pratica uma conduta comissiva diversa, como a mãe que tricota enquanto o filho morre
de inanição) e por outra, também não se restringia ao não fazer algo, passou-se a
compreendê-la como um juízo normativo através de um conceito de expectativa criado
primeiramente por Von Liszt, passando por Rohland, Gallas até ser desenvolvido mais
precisamente por Mezger. (KAUFMANN, 2006, p.70)
Segundo o autor omitir é “não fazer algo, não é simples não fazer. O
fundamento de todo delito de omissão se constitui ‘uma ação esperada’ ”(MEZGER,
1955, p.289). Passou a doutrina a definir a omissão como um não fazer algo esperado,
ou não fazer algo determinado.
Neste sentido podemos encontrar fartos exemplos, tanto na doutrina nacional
como estrangeira que definem a omissão como : “expectativa frustrada de ação”.
(SANTOS, 2002, p.111), “abstenção de uma ação esperada” (GOMES, 2004, p.179) “o
não empreendimento de uma ação determinada e esperada” (LISZT, 2006,
p.208),“omissão de uma ação determinada pela norma” (BITENCOURT, 2003, p.171)
“omissão de uma ação determinada” (MUNHOZ NETTO,1983, p.15)“omissão consiste
em não fazer algo determinado” (NOVOA MONREAL, 1984, p.51)etc.
Diverge a doutrina, todavia, sobre a origem desta expectativa. Uma parte afirma
que as normas sociais geram expectativas de ação, outra, por outro lado, sustenta que
essa expectativa só pode se originar do tipo penal.
3 Existem sutis diferenças entre e o conceito de omissão como “non facere quod debetur” (não fazer algo determinado pela lei) e a doutrina da ação esperada. tanto assim que pelas duas teorias se digladiaram Grispigni e Mezger. A primeira refere-se à ação que era esperada, a segunda à ação que era de se esperar. (ANTOLISEI apud COSTA JUNIOR, 1982, p.61). Pelas semelhanças normativas que apresentam julgamos metodologicamente conveniente tratá-las da mesma forma, como um só conceito.
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A bem da verdade todos são unânimes de que existem omissões à outras
normas que não as jurídicas , como as sociais e morais. O Problema surge quando se
questiona se existe identidade entre elas e as omissões jurídico-penais, ou seja, se
omissão para o Direito Penal é outra coisa completamente diversa deste tipo de
omissão ou não.
2.1.1 defraudação às expectativas extrajurídicas ou sociais.
Para este setor da doutrina as omissões têm relevância e existência mesmo fora
do Direito.
Neste sentido, omitimos quando deixamos de cumprimentar algum conhecido
que encontramos na rua; quando não recolhemos o nosso lixo que o gato espalhou na
calçada; quando deixamos de avisar a polícia de que a casa de um vizinho está sendo
roubada, etc. “Apesar da expectativa social de uma ação, o sujeito não a realiza”
(JESCHECK apud MIR PUIG, 2007, p.165).
Obviamente, conquanto relevantes, nem todas as ações que realizamos ou
aquelas que nos furtamos de realizar são considerados crimes pela norma penal: “o
Direito só de ocupa com a omissão injurídica (LISZT, 2006, p.208)”.
O Direito Penal, segundo esta concepção, quando ordena um mandamento
apenas está selecionando os comportamentos omissivos já preexistentes que de
alguma forma agridem os bens jurídicos tutelados.
Alerta-se para que a omissão assim entendida não pode ser confundida como
ontológica, pois continua existindo para alguém que espera, ou seja, por um juízo
normativo. Quer-se, com isso, preservar um substrato natural para omissão que
atenda ao princípio do cogitationis poenam nemo patitur.
Argumenta-se ainda, com razão, que compreendida a omissão apenas como
criação do tipo penal, isto poderia justificar a criação de omissões como mera infração
de dever.
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Mourullo, atento a isto, afirma que o próprio Mezger se apercebeu que a doutrina
da ação esperada caminhava para compreensão da omissão como essencialmente
normativa, razão pela qual o professor de Monique fez questão de distinguir a ação
esperada de ação exigida. Omissão ilícita seria apenas a omissão esperada e exigida
(apud COSTA JUNIOR, 1982, p.64)
O Direito Penal Brasileiro, no entanto, parece afastar-se deste entendimento
quando afirma no §2º do Art. 13: “A omissão é penalmente relevante quando...”
Tavares (1996, p.32-33), buscando fundamentos na teoria personalista de Roxin,
critica este posicionamento do Direito Brasileiro:
[...] deve-se considerar que, ao lado das imposições decorrentes da norma jurídica, subsistem deveres sociais de convivência, que integram o substrato das categorias axiológicas. Justamente esse fundamento social é que assinala o conteúdo extrajurídico da omissão. Não podemos, assim, partir do princípio de que a omissão só tem relevância para o campo do Direito, porque então estaremos emprestando à norma jurídica, além do seu objetivo regulamentador, o efeito exclusivo de criadora de deveres sociais [...]
No Brasil podemos encontrar referências a um substrato natural para omissão
ainda em (MUNHOZ NETTO, 1983, p.16), (COSTA JUNIOR, 1996, p.123), e (COSTA
JÚNIOR, 1982, p.64).
2.1.2 defraudação a uma expectativa jurídica.
Por este conceito de omissão, de raízes neokantianas, só quem poderia esperar
de alguém determinada ação seria apenas e tão-somente o Direito, ou melhor, o tipo
penal.4
O conceito de omissão se confundiria com o conceito de omissão antijurídica.
O principal argumento para quem sustenta este tipo de pensamento é que em
algumas situações o Direito Penal prevê omissões que não encontram nenhum
correspondente social ou moral.
4 Não faremos distinção nesta monografia entre a corrente que afirma que só há omissões para o Direito das que, mais especificamente, afirmam que só há omissões típicas. Deixemos apenas o registro.
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Neste sentido baseia-se a crítica de Gallas (apud MIR PUIG, 2007, p.165), autor
que levou a extremos a normativização do conceito de omissão:
Para a presença de um delito omissivo não é imprescindível a existência de uma expectativa social pré-jurídica, defraudada pela conduta do sujeito, pois ainda que a mesma faltasse, bastaria o dever de atuar imposto pela lei penal.
Lenckner (Apud SILVA SANCHEZ, 2006, p.123-124) acrescenta que tipos como
determinados deveres de denúncia, apenas são fundamentadas pelo mandado jurídico
não existindo qualquer expectativa prévia
Pensamos que a ação esperada como defraudação de uma expectativa limitada
ao tipo penal só se sustentaria nos regimes totalitários, onde o direito penal não está
vinculado ao princípio da lesividade, podendo, portanto, tipificar condutas a seu bel
prazer, v.g, como o simples não levantar-se para saldar o Governador do Estado
(ZAFFARONI,1982, p.37).
2.2. ALIUD AGERE
Aliud Agere significa fazer algo diverso. Tem origens que remontam o próprio
Luden, porém não se identifique propriamente com seu pensamento, haja vista que o
que há atualmente é uma reformulação do sustentado no século XIX.
Comentou Heitor Costa Jr (1982, p.73): “representa a volta do aliud agere, sem
os defeitos originais de Luden, que afirmava a causalidade da omissão.”
O aliud agere parte do pressuposto de que só existem normas proibitivas.
Podem, todavia, se transformar em enunciados proibitivos (tipos comissivos) ou em
enunciados mandamentais (tipos omissivos). O tipo proibitivo proíbe determinada
conduta, v.g não matarás. Por outro lado o tipo mandamental também tem origem em
uma norma proibitiva, qual seja: “proíbe ações distintas da devida, que é a descrita pelo
tipo” (ZAFFARONI, 1982, p.32)
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Bacigalupo (1974, p150-151) explica: “Ao tipo proibitivo resulta adequada
somente a ação que coincida com a descrita no tipo. Ao tipo imperativo é adequada
toda ação que não coincida com a ordenada pela norma [...]”
O autor, contrapondo-se ao conceito de ação esperada ou determinada, afirma
que omissão como um “não fazer determinado” deve transformar-se em “um fazer que
não seja o determinado (apud COSTA JUNIOR, 1982, p.63)”.
Ontologicamente, por conseguinte, só existiriam ações. É o tipo que definirá se
esta ação será um delito comissivo ou omissivo. Assim sendo, se estuda; se trabalha;
se dirige; se respira. Sempre se está realizando alguma ação. Mir Puig (2007, p.166)
observa que mesmo quando um sujeito omite passivamente, este comportamento está
ligado a um significado social positivo. Assim, quando alguém simplesmente observa
um acidente, efetivamente “está parado observando”, ou seja, um comportamento ativo.
Ação e omissão, neste sentido, são apenas “técnicas legislativas distintas”
(ZAFFARONI e PIERANGELI, 1997, p.538), formas que assumem a norma proibitiva.
Concluindo: omissão é apenas uma técnica utilizada pelo tipo penal para proibir
condutas distintas daquela ordenada pelo enunciado mandamental.
2.3 OMISSÃO COMO RELAÇÃO DE DISCORDÂNCIA (SILVA SANCHEZ).
Os tipos penais interpretam as condutas de maneira atributiva (adscrição).
Deduz-se daí, que o que os tipos penais imputam como homicídios, lesões, etc. não
coincide necessariamente com a linguagem que usualmente definimos como condutas
de matar, lesionar, etc. (descrição)
O conteúdo de sentido deste juízo pode adotar um caráter omissivo ou
comissivo, portanto, o fato, objeto do juízo, poderá tanto dar lugar a uma realização
típica comissiva (crimes comissivos) como uma realização típica omissiva (crimes
omissivos).
Omissão não é de nenhuma forma uma espécie de comportamento. Não
corresponde a um não fazer como também não é um fazer diverso. Aqui se distingue
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claramente do aliud agere. É uma relação de discordância da conduta realizada com a
pretensão que dimana do bem jurídico. (a ação também seria uma relação de
discordância entre a conduta realizada e a pretensão)
É o juízo típico adscritivo (imputação) que dirá se a conduta realiza um tipo
comissivo ou omissivo. Omissão, propriamente, só surgirá a partir de uma
interpretação realizada pelo tipo penal, todavia, não é um juízo sobre um nada, o
substrato material sempre será uma conduta efetiva, real, seja ela uma atividade ou
uma inatividade.
Nestes moldes, a omissão não corre o risco de cambiar-se para uma mera
infração de dever
Ademais, a diferença entre comissão e omissão não se fundamenta em um
conceito meramente formal de normas de mandato e de proibição (de proibição,
proíbem uma conduta, de mandato, ordena) posto que em toda norma proibitiva
também esteja contido um comando e nas preceptivas uma proibição.
Mandato e proibição se distinguem sim, mas em um plano material. Mandato
expressa um conteúdo de salvaguarda de um bem jurídico e proibição expressa um
conteúdo de dever de não ingerência na esfera jurídica alheia.
A partir deste modelo traçado, Silva Sanchez (2006, p.180) definiu omissão
como:
[... ]um juízo típico mediante o qual se imputa a uma conduta a não realização de uma pretensão positiva de salvaguarda (tipicamente) indicada como necessária ex ante para proteção do bem jurídico.
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3 NOMENCLATURA E CLASSIFICAÇÃO
Os crimes omissivos impróprios possuem tantos pontos de embate travados pela
doutrina que podemos dizer que desde sua gênese, ou seja, em sua própria
nomenclatura, já reina demasiada divergência. Com efeito, a doutrina sempre criticou e
continua a criticar o nome omissão própria e omissão imprópria. Se repararmos
bem, não há qualquer motivo justo para denominarmos uma de própria e outra de
imprópria. “Imprópria por quê?” pergunta Tavares (1996 p.64)
Costuma-se também denominar esta espécie de delito de delitos comissivos
por omissão, nomenclatura não menos livre de críticas. De fato, o crime não é
praticado de forma comissiva, como sugere o nome, mas sim de maneira omissiva
tanto quanto os delitos comissivos próprios.
Essas imprecisões terminológicas, ao contrário do que se possa parecer, não
são recentes. Na verdade são, como bem observou Giovanni Grasso (1983, p.11),
resíduos históricos de Luden, seu criador, para quem esta espécie de delito seria “no
fundo” delitos de comissão uma forma de causação do resultado proibido (LUDEN apud
MIR PUIG, 2007, p.270).
Alguns autores estrangeiros distinguem ainda entre os delitos omissivos
impróprios e os comissivos por omissão. Para eles, apenas estes últimos não estariam
expressos no tipo penal (MIR PUIG, 2007, p.269).
Chegou-se a batizá-los de omissões simples e omissões qualificadas
(JESHECK apud TAVARES, 1996, p.64) sem que, contudo, obtivesse o mesmo êxito
do nome tradicional.
Malgrado a denominação usual não ser a mais apropriada, parece haver entre
ela e a doutrina um sentimento ambivalente, misto de amor e ódio. Mesmo com as
constantes críticas, se firmou de modo tão arraigado, que não podemos deixar de usá-
la sob o risco de não nos fazermos entender. Deixada registrada a crítica,
continuaremos daqui por diante a nos utilizar do seu nome tradicional.
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Após este breve comentário acerca de sua nomenclatura, cumpre partirmos para
distinção entre os delitos omissivos próprios e impróprios ou comissivos por omissão.
Como vimos a doutrina tradicionalmente tem classificado os delitos omissivos
em: próprios e impróprios5,todavia, ainda não há um critério seguro para a distinção
entre elas.
Com efeito, dependendo do critério utilizado chegaremos a resultados totalmente
diversos, causando confusão ainda maior em quem procura desatar este nó górdio que
se constituem os delitos omissivos.
Neste sentido, crimes como o previsto no art.133,§1º e 2º do CPB possuem uma
natureza nebulosa, seriam omissões próprias ou impróprias?O que dizer então da
omissão prevista no art.164, cuja tipo, que não prevê características especiais para o
autor, exige um resultado material para sua configuração?
Vejamos, de uma maneira geral, cada critério de classificação e suas críticas.
3.1 CONCEITO BIPARTIDO
O conceito bipartido de omissão classifica as omissões em próprias e impróprias,
variando, contudo, quanto aos critérios de distinção. Vejamos:
3.1.1Critério quanto ao caráter da norma violada (critério normológico)
Este critério remonta as lições de Von Liszt. Embora hoje praticamente
abandonado, talvez tenha sido este o primeiro critério de distinção entre os crimes
omissivos próprios e impróprios. Assim sendo, nos crimes omissivos próprios haveria
uma desobediência a uma norma mandamental (que impõe o cumprimento de
5 A doutrina tem falado em crimes “omissivos por comissão” para situações em que mesmo o agente tendo praticando uma conduta ativa se subsume em um tipo omissivo. São exemplos desta situação o dona da casa que fecha a porta, antes aberta, quando vê que alguém iria entrar por estar fugindo de cachorros que o perseguiam, ou de alguém que retira o salva-vidas logo após haver jogado, por reconhecer no socorrido desafeto seu. Esta espécie de delitos todavia não se constituem em uma nova modalidade de crime omissivo ao lado da omissão própria e imprópria, posto que necessariamente se configurará em uma omissão própria, imprópria ou um delito comissivo (ORDEIG, 2003, p.53)
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determinada ação) e nos impróprios, a uma norma de proibição (que proíbe a causação
de um evento). Isto ocorria porque os crimes de omissão imprópria, como vimos
anteriormente, eram tidos como particular manifestação do agir ilícito (GIOVANNI
GRASSO, 1983, p.4-5).
Não obstante o seu abandono, de uma maneira geral, pela doutrina, este critério
ainda possui alguns defensores. É o caso de Novoa Monreal (1984, p 124) para quem a
distinção entre os dois delitos repousa no fato de que: um tem origem em uma norma
mandamental, omissão própria, e outro, comissivos por omissão, em uma norma
proibitiva.
No mesmo sentido propugnava Maurach (apud MESA, 2005, p.66), porém, tendo
abandonado esta distinção ao longo do tempo.
3.1.2 Critério quanto à previsão do evento no tipo penal
Outro critério que normalmente se utiliza a doutrina para diferenciá-los é a
necessidade ou não da produção do resultado. Os crimes omissivos próprios,
comparados aos comissivos, corresponderiam aos crimes de mera conduta, enquanto
os crimes omissivos impróprios se corresponderiam aos crimes materiais. Dizendo de
outra maneira: nos crimes omissivos próprios o evento não é elemento do tipo,
enquanto que nos crimes omissivos impróprios a realização do resultado pertence ao
tipo. (GRASSO, 1983, p.6-7)
Podemos encontrar, nesta esteira, a definição proposta por Ivo Caraccioli (apud
JESUS, 2002, p.132). Omissivos próprios seriam:
[...]os que perfazem coma simples abstenção da realização de um ato, independentemente de um evento concreto posterior” e os impróprios “aqueles em que o sujeito, mediante uma omissão, permite a produção de um resultado posterior que o condiciona
No Brasil, encontramos o exemplo de vários autores que partem do mesmo
critério. Luiz Flávio Gomes (2004, p.184):
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[....]Crimes omissivos próprios são os que não descrevem e não exigem nenhum resultado naturalístico para sua consumação formal” e omissivos impróprios ,seriam os que “descrevem e exigem resultado naturalístico e caracterizam-se pela não execução (omissão) pelo agente da conduta esperada para evitar esse resultado
Munhoz Netto (1983, p.11) define os crimes de omissão da seguinte maneira:
[...]O que distingue estas formas de crimes omissivos, é que, na primeira a punição independe da produção de qualquer resultado, enquanto que, nas demais, a superveniência real ou potencial do resultado é elemento caracterizador do crime consumado ou de sua tentativa.
Encontramos, igualmente, fartos exemplos na doutrina estrangeira. Wessels
(1976, p.158) distingue os dois delitos nos seguintes termos:
[...] Fatos puníveis que se esgotam na infração a uma norma mandamental e na simples omissão de uma atividade exigida pela lei. [...] São delitos omissivos impróprios, em contrapartida, os fatos puníveis nos quais o omitente está obrigado, como garantidor, a impedir o resultado, e nos quais o omitir-se corresponde valorativamente a realização do tipo legal através de um fazer ativo
Mir Puig (2007, p.269), na mesma esteira de classificação leciona que, assim
como os comissivos- que podem ser classificados em de delitos de mera atividade e
delitos de resultado- a omissão pode contentar-se apenas com o não fazer ( própria)
ou podem exigir a não evitação de um resultado (omissão imprópria)
Vale ressaltar que a distinção por este critério, por vezes, encontra algumas
falhas. Como bem lembrou Novoa Monreal (1984, p.52) em algumas situações
podemos nos deparar com crimes omissivos próprios com resultado material, como é o
caso do nosso art.164 do CPB
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3.1.3 Critério do círculo de autor
Critério muito utilizado é o do círculo de autores, sendo este inclusive o assumido
doutrinariamente pelo finalismo (TAVARES, 1996, p.63).
È corrente se lecionar nos manuais que os crimes omissivos impróprios se
diferenciam dos omissivos próprios pelo fato de que: neste existe a obrigação a todos
imposta; naqueles há uma omissão qualificada, ou seja, há uma norma mandamental
que ordena a certa categoria específica que impeça o resultado, por conta de ter uma
especial relação com o bem jurídico em questão.
Assim, a mãe tem o dever de impedir que o filho morra de fome; o salva-vidas de
impedir que nadador morra na piscina; a enfermeira contratada para cuidar de pessoa
idosa de ministrar os remédios necessários; o criador da ação precedente perigosa de
impedir que o resultado se produza.
Embora este critério nos pareça, a primeira vista, resolver bem o problema
conceitual que existe nestes delitos, por vezes se mostra precipitada.
Veja que adotando apenas o critério do círculo de autores haveria crimes de
omissão imprópria em toda omissão que exigisse características especiais do sujeito
ativo, ou seja, crimes próprios. Entre outros, os previstos nos artigos 168-A, 312, 315,
318 do CPB.
Vê-se desde logo, portanto, que não corresponde exatamente à essência dos
delitos omissivos impróprio.
No Brasil, Juarez Tavares (1996, p.74) parece adotar um critério misto entre o
critério do autor e o critério legal que veremos a seguir, tendendo, entretanto, mais a
este último.6
6 A bem da verdade, o autor começa por defender uma conjugação dos critérios dentro, todavia ,de uma classificação bipartida, e parece concluir adotando uma classificação tripartida, qual seja : crimes omissivos próprios, impróprios e omissivos impróprio de resultado
16
3.1.4 Critério legal
Segundo o critério legal, cujo criador foi Kauffmann, o que distinguiria os crimes
de omissão seria apenas a forma adequação típica. Enquanto nos delitos de omissão
própria essa subsunção se dá imediatamente e de forma direta, isto não ocorre,
todavia, com a omissão imprópria, onde a subsunção se dá por meio de uma norma
mandamental e extensiva (cláusula geral) que é prevista no nosso Código Penal no
art.13 §2.
Neste sentido, o delito previsto no art.133§ 1º e 2º seria omissivo próprio pelo
simples fato de se encontrar expresso no CPB.
3.1.5 Crítica aos critérios expostos
A bem da verdade, salvo o critério da norma violada, em todos os outros
podemos encontrar características de ambos os crimes omissivos, portanto, não estão
de todo errados.Examinados individualmente, todavia, não encontramos em nenhum
deles a essência dos delitos comissivos por omissão.
Partindo exclusivamente do critério do autor, teríamos necessariamente omissão
imprópria em todo e qualquer crime omissivo que exige características especiais para o
autor, como os artigos 168-A, 312, 315, 318 do CPB.
Adotado o critério legal, deixaríamos de fora situações idênticas às previstas no
art.13§ 2ª, como o delito previsto no art.133 do CPB.
Por outro lado, o critério do resultado também não satisfaz observado que há em
alguns tipos omissivos previstas na Parte Especial a exata previsão de um resultado.
A doutrina nacional tem partido para uma conjugação entre os vários critérios
como única solução.
Nessa esteira, v.g, Juarez Tavares (TAVARES, 1996, p.73), chama atenção que
apenas adotando um critério do círculo de autores não bastaria para explicar a
17
distinção, sendo imprescindível outro critério. Existirá, portanto, omissão própria,
quando “a não realização da ação possível implique por si mesma na violação de uma
norma mandamental”. Estaremos diante de omissão imprópria, por sua vez, quando “a
não realização da ação possível, por parte de um sujeito na posição de garantidor,
implique no não impedimento do resultado, na mesma medida de sua produção por
ação”
Não podemos negar que crimes como o de abando de incapaz qualificado,
art.133,§1 e § 2 e o de omissão de socorro, art. 135, valorativamente, nada têm em
comum. Por outro lado, também é evidente que entre aqueles e os delitos omissivos
previstos no art.13§2º há uma abissal diferença de estruturas.
É neste sentido que a doutrina tem sugerido classificações tripartidas para os
delitos de omissão, que responda de forma mais coerente às nuances dogmáticas
presentes nas diversas espécies de omissão.
3.2 CONCEITO TRIPARTIDO
A par da conhecida classificação bipartida um setor cada vez maior da doutrina
vem sugerindo uma classificação tripartida. Algumas dessas classificações se originam
apenas por aspectos meramente formais, outras, no entanto, acrescentando um critério
valorativo. Estas últimas, subdividem os delitos comissivos por omissão em: omissões
que se equiparam à ação e omissões que não chegam a se equiparar. Vejamos alguns
dos mais importantes:
Rodriguez Mourullo (apud SILVA SANCHEZ, 2006, p.423) propõe uma
subdivisão dos crimes comissivos por omissão sob um aspecto meramente formal, qual
seja : se estão expressamente tipificados ou não.
Começa o autor por distinguir os delitos omissivos de mera conduta e de conduta
e resultado. Até aqui coincidiria, embora com outra nomenclatura, ao conceito bipartido
de omissões já conhecido por nós.
Ocorre que estes últimos se subdividem em delitos de omissão e resultados e os
comissivos por omissão. Os primeiros seriam os expressamente tipificados pela lei; os
18
segundos não estariam tipificados. Por esta classificação o delito do art.133 do CPB
seria chamado de omissão e resultado.
O mesmo caminho parece seguir Huerta Tocildo (TOCILDO, 1997, p.71).
Primeiramente a autora critica o fato de que crimes como o de “denegação de
assistência sanitária ou abandono dos serviços sanitários” (o tipo exige um risco grave
para saúde das pessoas) e “omissão de socorro” art. 195 e art.196 do Código Penal
Espanhol, estejam no mesmo título, “da omissão do dever de socorro”, dando a idéia de
que o primeiro seja apenas uma forma agravada de omissão de socorro.
Mais adiante, afirma que estes delitos poderiam ser chamados de delitos de
omissão e resultado, porém conclui que tal classificação tripartida não valeria à pena.
Silva Sanchez (SILVA SANCHEZ, 2006, p.425) adicionando um critério
valorativo, começa distinguindo omissões equivalentes à comissão e não equivalentes
à comissão.
Por sua vez, acaba por classificá-las em: (a) omissões puras gerais, (b)
omissões puras de garante e (c) comissão por omissão.Omissões puras gerais
decorreriam de um dever de solidariedade geral,a todos, e coincidem com o conceito de
omissivos próprios. Todas são tipificados expressamente e são, em geral, menos
graves.
Omissões próprias de garante são omissões de determinado círculo de sujeitos
de gravidade intermediária, cujos injustos não são equiparáveis à comissão. Como
exemplos destas omissões estariam a ingerência e as omissões oriundas de relação de
parentesco em geral e as que não há um compromisso inequívoco do garante. Estes
crimes omissivos; às vezes se encontram tipificados na Parte Especial; às vezes não.
Os comissivos por omissão seriam apenas aquelas omissões praticadas por
garantidores e que possuem identidade estrutural com os delitos comissivos,
fundamentadas na responsabilidade de organização ou domínio do risco, sejam elas
expressamente tipificados ou não.
De lege lata o autor sugere que, devido à amplitude do delito de omissão de
socorro e se a construção típica permitir, as omissões de garante sejam punidas como
se fossem omissões de socorro.De lege ferenda propõe que sejam criados tipos
qualificados de omissão de socorro.
19
Solução semelhante parece ter optado o Direito Penal brasileiro nos §4º e 7º dos
artigos 121 e 129, do CPB e nas omissões de trânsito descritas no Código de Trânsito
Nacional, ou seja, nestes casos o agente não se transforma em garante e não responde
pelo delito de comissão, mas por uma omissão pura qualificada.
E neste sentido que Sheila Bierrenbach (2002, p.90) afirma que a ingerência
“quase não encontra acolhida no direito positivo brasileiro”.
A própria autora parece ter uma classificação própria quando admite a existência
dos delitos omissão e resultado, para crimes como o previsto no art.164, por exigir o
tipo o efetivo dano, e de omissivos próprios de garante, art. 133 ,134,136 e 138, por
ser praticado por autores especiais (garantidores) (Idem, p.25).
20
4. DAS DIVERSAS FORMAS DE TRATAMENTO DA OMISSÃO IMPRÓPRIA, TANTO
NO DIREITO COMPARADO, QUANTO NO DIREITO BRASILEIRO
Para melhor compreensão da maneira como os delitos comissivos por omissão
são tratados no direito brasileiro se faz necessário uma pequena incursão nas
legislações estrangeiras. Obviamente, por serem esses delitos frutos de longas
construções jurisprudenciais e dogmáticas, muitas dessas formas de tratamento já
encontraram modificações pelas legislações atuais respectivas, possuindo relevância
para nós apenas histórica. Este é o caso da legislação espanhola, modificada
recentemente pela reforma de 1995 e da alemã.
A importância de compararmos os diversos modelos é manifesta: todos se
mostram deficientes. Até hoje, nenhum sistema logrou um êxito total, mas apenas
experimentou algumas pequenas melhorias apenas paliativas.Certamente este é o caso
da legislação brasileira com a inclusão da posição de garantidor deflagrada pela
reforma de 1984.
Outro ponto que surge da análise destes diversos modelos é a irrefutável
conclusão de que não há, nem nunca houve, um tratamento uniforme dispensado a
esses delitos. Por conseguinte, por mais que a dogmática penal trabalhe com
categorias universais, como dolo, culpabilidade, tipicidade, etc. O mesmo não ocorre,
necessariamente, com a omissão imprópria. Se compararmos algumas legislações
entre si, veremos que em muitos casos há total incompatibilidade na forma de
regulamentação em relação a esta espécie de delito. Portanto, é apenas a partir do
modelo implementado em cada estatuto penal que poderemos traçar os contornos dos
delitos comissivos por omissão e não o inverso.
Sendo assim, passemos à verificação dos diversos modos com que a omissão
imprópria foi disciplinada pelas legislações no decorrer da história para, em seguida,
aprofundarmos o modelo brasileiro.
21
4.1 EXPERIÊNCIA DA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA
As formas com que as legislações têm disciplinado os crimes comissivos por
omissão são, de uma maneira geral, as seguintes: ou deixa-se a cargo da doutrina e
jurisprudência esta tarefa; se prevê figuras omissivas (com posição de garantidor) na
parte especial, da mesma maneira como se faz com as omissões próprias; cria-se uma
cláusula geral de equivalência sem, contudo, eleger as fontes da posição de garantidor;
prevê-se cláusula de equivalência e elege as posições de garantia; ou como foi feito no
Direito Brasileiro, indicando as fontes do dever de garantidor, apenas aponta quando a
omissão é relevante.
4.1.1 Sem previsão expressa, mas como construção jurisprudencial e doutrinária.
Esta foi, sem dúvida, a primeira forma de tratamento dos delitos de omissão
imprópria. A falta de previsão legal em legislações de países como Alemanha e Áustria
não impediu sua a subsunção por meio dos correspondentes tipos comissivos, oriundas
de construções jurisprudenciais e doutrinárias.
Por mais que se intuíssem os riscos ao princípio do nullum crimem sine lege,
como não punir o homicídio por omissão se crimes como dano a saúde e abandono de
incapaz eram explicitamente previstos nos códigos penais?
Ademais, alegava-se a impossibilidade da legislação prever todos os casos em
que a jurisprudência havia equiparado o omitir ao equivalente fazer positivo (GRASSO,
1983, p.25)
Os delicta per omissionem commissa experimentaram, nesta primeira fase,
demasiado alargamento. De fato, chegou-se a responsabilizar o cônjuge que não
impedia crime do outro; o réu que não revelava a mentira de testemunha; o vendedor
de bebidas que não impedia a saída do bêbado e até mesmo o dono do restaurante
22
passou a ser responsabilizado como co-autor por não impedir lesão corporal ocorrida
em seu estabelecimento. (Idem p.19)
Na Alemanha, tão-só em 1969 foi incluída cláusula de equivalência, ou seja,
somente após de os delitos comissivos por omissão alcançaram seu período de
máxima ampliação com o nacional-socialismo e pela Escola de Kiel (Idem, p.17).
Atualmente, ainda existem legislações onde não há qualquer previsão legal,
embora a tendência do Direito Penal seja diametralmente oposta: retirar das mãos da
doutrina e da jurisprudência, optando cada vez mais por delimitá-las legalmente, para o
bem da segurança jurídica.
Em países do common law, de tradição anglo-saxônica, poderia ser até
justificado a jurisprudência assumir semelhante papel, no entanto, em países como o
Brasil, de tradição romano-germânica, não há como conciliar com o princípio elementar
do nullum crimem nulla poena sine legem.
4.1.2 Com previsão na parte especial
Alguns países como a França e a Bélgica, diferentemente da Alemanha, desde
cedo, prudentemente, compreenderam que não poderiam deixar os delitos comissivos
por omissão apenas a cargo da doutrina e da jurisprudência sem encontrar o princípio
da legalidade como obstáculo
Ao invés de formularem uma cláusula de equiparação, primeiramente, preferiram
criar alguns tipos de omissão na Parte Especial. Assim é o caso de abandono material
da lei francesa de 1898, ou das omissões do art.62, 63§1º de 1941, que puniam quem
não impedia ou não comunicava o cometimento de um crime.
Em um momento posterior a doutrina e a jurisprudência atentaram-se de que a
interpretação estrita dos tipos penais só impedia que os delitos comissivos por omissão
se subsumissem em um tipo doloso, haja vista que semelhante empecilho não existia
nos delitos culposos (tipos abertos)
23
De fato, a imprudência, como ensina a doutrina, é proteiforme:7 pode consistir
em um fato positivo ou em uma simples abstenção (GRASSO, 1983, p.74).
Para corrigir os vazios na punibilidade que inevitavelmente surgiam passou-se a
converter os delitos os delitos omissivos dolosos e comissivos culposos (JESCHECK
apud SOUZA, 2003, p.39).
Se é certo que a maneira mais segura de regramento dos delitos comissivos por
omissão só poderá ocorrer com a previsão de tipos na Parte Especial, não é menos
correto que a experiência de países como a França e Bélgica, todavia, não
demonstraram uma utilização deste método de forma satisfatória, posto que não
chegaram a implementar um sistema que correspondesse efetivamente aos moldes que
propugna a doutrina.
Com efeito, é de se questionar as reais vantagens deste modelo se comparado
ao nosso atual. À semelhança destes países, também possuímos delitos comissivos
por omissão tipificados na Parte Especial, como o abandono material, art.244, ou como
o abandono de incapaz, art. 133 ou até mesmo os §4º e 7º dos artigos 121 e 129, do
CPB e as omissões de trânsito descritas no Código de Trânsito Nacional, ou seja: de
certa forma também possuímos um tratamento dos delitos de omissão imprópria na
Parte Especial.
Certamente, o que não possuímos é um modelo uniforme e coerente de
tratamento na Parte Especial.
Giovanni Grasso, atento a isto, referiu-se ao sistema franco-belga como “os mais
coerentes seguidores do liberalismo”. Conclui, todavia, que apesar da coerência de tal
solução, ela não veio acompanhada de uma efetiva “racionalidade” e “suficiência” do
sistema. (GRASSO, 1983, p78)
Ademais, transformar delitos dolosos em culposos nos parece uma saída no
mínimo incongruente
7 Que muda de forma freqüentemente. (referência a Proteu, deus grego)
24
4.1.3 Previsão de cláusula de equivalência sem indicar as fontes de dever
Seguindo uma orientação do Código Penal italiano de 1930 (Código penal de
Rocco) passou-se a incluir nos textos uma cláusula geral que permitia a equivalência
entre o crime omissivo e o comissivo, procurando solucionar tanto o problema da
causalidade, quanto às exigências do nullum crimen nulla poena sine legem.
Hodiernamente, existe tendência mundial de se incluir tal cláusula, porém,
poucos são os países que indicam as fontes de posição de garante como fez o Brasil.
O Código penal italiano possui a seguinte redação:
Art. 40. Nexo de causalidade. Ninguém pode ser punido por um fato previsto na lei como crime, se o evento danoso ou perigoso, do qual depende a existência do crime, não é conseqüência de sua ação ou omissão. Não impedir um evento, que se tem a obrigação jurídica de impedir, equivale a o causar
O Código Penal alemão seguiu os moldes do CP de Rocco acrescentando em
seu texto:
§ 13. Comissão por omissão: Quem se omite de impedir um resultado pertencente ao tipo legal de uma lei penal, só é punível quando tenha o dever jurídico de evitar tal resultado e a omissão equivale à sua produção por ação.
A pretensa solução que a cláusula de equivalência traria não satisfaz, no
entanto, de nenhuma forma as exigências decorrentes do princípio da legalidade
Lembramos mais uma vez a frase de Munhoz Netto (1983, p.27) “no Estado de
Direito, as relações entre a autoridade e a liberdade devem estar claramente definidas”
Ademais, a opção em equiparar a ação à omissão pela mera equivalência, que
de maneira geral parece ser a tendência dos códigos penais atuais, no entanto, utiliza-
se do argumento analógico, incompatível com o princípio da legalidade. (ver tópico 6.1)
25
4.1.4 previsão da cláusula de equivalência e eleição expressa das fontes da
posição de garantidor
Segundo a doutrina dominante, de maneira geral, esta parece ser a via eleita que
dissiparia as criticas e os questionamentos de cujos crimes omissivos são acusados.
Destarte, com a cláusula expressa de equivalência, pretensamente se resolveria o
problema do nullum crimem sine lege, proporcionando o mínimo de segurança que
exige os delitos comissivos por omissão. Elegendo as fontes do dever de garante, por
sua vez, retiraria das mãos dos juízes e da doutrina a decisão de quando há ou não a
situação de garantidor.
Sem dúvidas a indicação das fontes de dever por meio de critérios objetivos é
louvável, porém, não especifica claramente, por si só, quando de fato se está na
posição de garante.
. Por outro lado, a cláusula de equiparação por meio da equivalência não só se
presta como mero paliativo, como atropela o princípio da legalidade por meio da
analogia in malam partem. Daí talvez a doutrina espanhola muito ter relutado até a
reforma do Código Penal espanhol de 1995.
O Direito Penal espanhol, portanto, é hoje a legislação mais recente e
representativa desta forma de tratamento:
Artigo 11. Os delitos ou faltas que consistam na produção de um resultado somente se entenderão cometidos por omissão quando a não evitação deste, ao infringir um especial dever jurídico do autor, equivalha, segundo o sentido do texto da lei, a sua causação.Para tal efeito se equiparará a ação à omissão: a) Quando exista uma específica obrigação legal ou contratual de atuar. b) Quando o omitente tenha criado uma ocasião de risco para o bem juridicamente protegido mediante uma ação ou omissão precedente
26
4.2 A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA
O Direito Brasileiro possui uma forma bastante peculiar de sistematização da
omissão imprópria. Se comparado aos modelos acima apresentados, até que podemos
encontrar alguns pontos positivos nesta forma sui generis, porém, não há como negar
sua flagrante inconstitucionalidade, como veremos melhor no tópico 7.1
Disto isto, passemos à análise de suas características.
Em primeiro lugar, incongruente, cria uma omissão cuja natureza teratologicamente
parece ser mista, causal-normativa, como veremos no Capítulo 5. Por outro lado, como
ponto positivo, não segue o exemplo espanhol partindo para equivalência entre a
omissão e a comissão, além de que indica textualmente as fontes do dever de
garantidor.
Conquanto presentes algumas imprecisões técnicas, cremos que podemos lucrar
de alguma forma com este modo de disciplina dos delitos comissivos por omissão,
desde fique claro, a curto prazo, ou seja, antes que venha reforma que regule de forma
satisfatória os delitos comissivos por omissão na Parte Especial.
Passemos a uma breve incursão nos códigos e projetos brasileiros a fim de
melhor compreender o contexto da sistemática atual.
O Código do Império, de 1830, em seu art. 2º § 1º, apenas referia-se vagamente
à omissão quando dispunha sobre o crime:
Código Penal de 1830
Art.2. julgar-se-á crime ou delicto:§ 1º Toda a acção ou omissão voluntária contraria às Leis penaes
Sem grandes modificações seguiram-se o Código de 1890 e o Projeto de 1899,
apenas indicando a omissão ao lado da ação como condutas delitivas.
Código Penal de 1890
Art. 2º A violação da lei consiste e acção ou omissão; constitui crime ou contravenção
27
Projeto de 1899
Art. 11 Constitui crime ou contravenção toda cação ou omissão, contrária à lei penal
Como vimos no tópico 4.1.3, o primeiro código a tratar expressamente os delitos
de omissão imprópria foi o Código de Rocco de 1930, em que não impedir o evento
equivale a causar. Partia o Código Italiano, portanto, do critério da equivalência para
equiparar a omissão à ação.
Copiando o modelo inaugurado pelo Código de Rocco e o Código Uruguaio de
1933 o Projeto Alcântara Machado, em seu texto original, procurou fundamentação para
equiparação, da mesma forma, na técnica da equivalência adotada na Itália e pela
doutrina estrangeira e nacional.
Projeto Alcântara Machado (1938)
Art. 9º. O agente só responderá pelo evento que for efeito de sua ação ou omissão§1º.Faltar à obrigação jurídica de impedir o evento equivale a causá-lo
A comissão revisora, todavia, suprimiu tal sistemática por achá-la desnecessária.
Ocorre que a doutrina da época travava sérias contendas sobre a causalidade na
omissão, inclinando-se a uma postura naturalística. Discutia-se, portanto, a
necessidade de uma cláusula de equivalência. Nelson Hungria (1959, p.69-70) um dos
componentes da comissão revisora, é apenas um dos autores que nela não qualquer
utilidade.
O Código de 1940, distinguindo-se da tendência de outras legislações
contemporâneas, optou pela supressão da previsão da cláusula de equivalência do
Projeto Alcântara Machado, deixando a critério da doutrina e jurisprudência a busca de
uma solução.
CPB-1940
Art.11. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido
28
Posteriormente, com o novo projeto para o Código Penal que lhe foi incumbido,
Nelson Hungria reviu sua posição anterior. A exposição de motivos do Código de 1969
possuía a seguinte explicação:
Importante é o que agora aparece como referência aos crimes comissivos por omissão. Não se encontram especificados na lei vigente, nem nos Códigos de sua época, os pressupostos da conduta típica, dessa categoria de delitos, defeito que as legislações penais modernas vêm corrigindo. Como se demonstrou, amplamente, a ilicitude aqui surge, não porque o agente tenha causado o resultado, mas porque o não impediu, violando o dever de garantidor. È indispensável fixar na lei as fontes de tal dever de atuar.
O Código de 1969, no entanto, nunca experimentou vigência, sendo revogado
pela lei 6016/73. In verbis:
CPB-1969
“Art.13. O resultado de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.§2º. A omissão é relevante como a causa quando o omitente devia e podia agir para evitar o resutado.O dever de agir incumbe a quem tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; a quem, de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; e a quem, com seu comportamento anterior, criou o risco de sua superveniência”
Antes que a Reforma de 1984 viesse, a doutrina, ciente do risco que sofria o
princípio da legalidade, clamava por uma reforme que incluísse uma cláusula geral de
equivalência e indicasse as fontes do dever de garantia. As palavras de Alcides Munhoz
Netto (1983, p.26) representam bem os anseios da doutrina:
Enquanto a expressa previsão das hipóteses de dever de evitar o resultado não for incorporada ao nosso direito positivo, persistirá o problema de compatibilizar os crimes de omissão imprópria com o princípio da anterioridade da lei penal [...]. Com isso, o princípio do nulla poena sine lege experimenta profunda limitação, já que a conduta não está inteiramente determinada
Presidida por Francisco de Assis Toledo, a reforma de 1984, continha
originalmente a seguinte redação:
29
Texto original da reforma de 1984
Art.13. O resultado de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem, por ação, o tenha causado ou, por omissão, não o tenha imputado.
§ 2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado
O Deputado Egídio Ferreira de Lima, todavia, não se sabe lá muito bem o
porquê, achou por bem apresentar emenda, cuja conseqüência foi a supressão do
caput do presente artigo, retornando assim ao vetusto pensamento naturalístico do
legislador de 1940.
Chegamos à atual sistemática dos delitos comissivos por omissão do Código
Penal Brasileiro. Um misto de equívocos naturalísticos de Nelson Hungria e da
nostalgia conservadora do Deputado Egídio Ferreira Lima, ou seja, uma colcha de
retalhos.
A parte os sérios problemas conceituais quanto à causalidade e a conseqüente
inconstitucionalidade gerd pela criação de tipos vagos, até que podemos tirar algum
proveito daí. Vejamos:
Primeiramente a reforma adicionou a tão esperada delimitação das fontes do
dever de garante, embora recorrendo às fontes formais, há muito abandonada pela
doutrina e jurisprudência alemã (HUERTA TOCILDO, 1997, p.14). Não esqueçamos
que não são fartos os exemplos de países que delimitam, de forma tal como a nossa, a
posição de garantidor, mesmo que isto, repetimos, não satisfaça completamente o
problema da legalidade.
Certamente não bastará a mera indicação formal para esta delimitação, devendo
haver uma conjugação entre este critério formal e um critério material, cabendo ao
intérprete esta tarefa ( BIERRENBACH, 2002, p.76).
30
Pois bem, além da enumeração do elenco das fontes do dever de atuar a
reforma não adotou a equivalência como é tendência entre os países que prevêem
expressamente uma cláusula geral. È o caso da Itália, Alemanha e Espanha.
Como veremos com mais vagar em capítulo posterior, a mera equivalência de
injustos entre a omissão e a ação, causa sérios riscos à legalidade, uma vez que utiliza
da analogia in malam partem.
Importante deixar claro, no entanto, que parte da doutrina parece caminhar
noutro sentido, ou seja, buscando o caput da redação de Alcântara Machado suprimida
por Nelson Hungria, aos moldes do Código de Rocco.
Sheila Bierrenbach (2002, p.104) chega a propugnar de lege ferenda a
modificação de tal artigo “corrigindo de forma a integrá-lo pela equiparação entre o
conteúdo materiais de injustos entre a omissão e a comissão”. Conclui a autora, que
“melhor seria se o Código Penal houvesse copiado fórmula italiana que afirma que não
impedir o resultado equivale a causá-lo (2002, p.56).”
Para nós, se houvesse uma reforma apenas pontual no art.13 e não sistemática
como propõe a doutrina, esta não deveria se espelhar na redação do Projeto Alcântara
Machado, mas sim, no próprio caput original da reforma de 1984. Só assim teríamos
um modelo, pelo menos, congruente com a doutrina moderna.
31
5 CAUSALIDADE E OMISSÃO
5.1 CAUSALIDADE NA OMISSÃO
5.1.1causalidade mecânica, naturalística
Causalidade é o vínculo físico-natural que liga um efeito a sua causa(imputatio
facti). Juridicamente está representada pela teoria da equivalência formulada por Glaser
e introduzida nas jurisprudências dos tribunais do Reich por Von Buri, segundo a qual
causa é toda condição de um resultado que não pode ser mentalmente eliminada, sem
que o resultado também o seja em sua manifestação concreta.8
Muito bem, em um primeiro momento da omissão os autores do século XIX
procuraram encontrar um vínculo natural para ligar a inatividade ao resultado, da
mesma forma como o faziam com os delitos comissivos de resultado.
Luden, 1840, foi quem primeiro distinguiu claramente entre os crimes omissivos
próprios e os impróprios, sendo, para ele, aqueles uma infração a uma norma
preceptiva e estes a lesão de um direito subjetivo alheio.
A partir dele, portanto, é que se percebeu que além do repertório expresso de
delitos oriundos de um não fazer, a maioria dos crimes de ação podia ser executada
também por uma inação.
Era intuitivo que a doutrina passasse a uma procura de causalidade na omissão,
tal qual nos crimes comissivos, de forma a fundamentar a punibilidade desses delitos. É
a chamada fase causal.
Luden sustentava que omitir é um obrar de outro modo, para tanto, encontrava
a causalidade na conduta positiva que o agente realiza simultaneamente à omissão.
Outros como Krug, Glaser, Merkel, por outro lado, procuravam este momento
causal na conduta anterior; Binding, Von Buri, Orteman, Halschnar, Janka, Bünger, na
omissão mesma.9
8 Não trataremos aqui das inúmeras falhas que a teoria da conditio sine qua non possui. Para ver mais (TAVARES, 2000, p.206-222)9 Para uma análise melhor das várias teorias ver (COSTA JÚNIOR., 1996, p.114-117)
32
Todos os esforços no sentido de procurar causalidade na omissão, todavia,
foram inúteis, pois que há muito se intuiu que do nada, nada surge.10
Como explicava Von Listz(LISZT, 2006, p.212): o resultado produzido não é em
momento algum causado pela omissão, mas sim pelas forças que exercem atividade
colateralmente à omissão. Assim, a criança que a mãe deixou morrer, morre pela
consumpção; o nadador a quem o companheiro recusa a mão de asfixia, etc.
Por óbvio, esta fase causal, para nós, apenas tem um interesse meramente
histórico, pois que há muito abandonada pela doutrina.
5.1.2 “causalidade” lógica, “causalidade” jurídica ou quase-causalidade.
A partir do momento em que se renunciou a encontrar um nexo-causal entre a
inação e o resultado, passou-se a afirmar que a causalidade, nestes casos, não seria
igual à das ciências naturais, mecânica, mas representaria uma categoria do
pensamento. Neste sentido, toda modificação no mundo exterior possuía condições
positivas e condições negativas. Por este argumento quando um trem colide com um
automóvel, a condição positiva é o fato que ambos se encontraram em um determinado
momento entre a estrada e a via férrea; a negativa seria o fato de não terem abaixado a
barreira de proteção que alertaria o motorista. Ambas as condições teriam causado o
acidente.
Outro exemplo é fornecido pela doutrina de Everaldo Cunha Luna (1982, p.51):
[...] diga-se que o não impedir o resultado pressupõe, na cadeia causal, uma condição negativa (Antolisei, Mourullo). Assim, no fato de deixar a mãe de alimentar o próprio filho, para matá-lo, uma condição negativa foi posta para a causação do resultado morte. Condições tão necessárias ao resultado como seriam, exemplificando, as condições positivas de atirar com a arma de fogo ou de ministrar veneno mortal.
Conclui o autor que no exemplo da mãe que não alimenta o filho e que vem a
morrer de fome, a causa da morte não são as forças naturais, a inanição, porém a
10 Frase atribuída a Radbruch
33
própria omissão. O processo orgânico de desnutrição, ao contrário, seria o próprio
resultado. (1982, p.52)
Alguns autores, não obstante entenderem que o não emprego de energia gera
uma condição negativa e, neste sentido, a omissão como causal, afastam-se um pouco
deste pensamento. Sustentam que o que não é causal é o omitente e não propriamente
a omissão, pois que, eliminado o omitente o resultado ainda assim ocorreria.
Kaufmann (2006,p.80-81) foi quem inaugurou este intrincado raciocínio.
Seguindo a mesma linha de pensamento, Bacigalupo (1974, p.165) dá o exemplo de
alguém se afogando na piscinha e de outra pessoa na borda apenas olhando. Se
estivesse ou não o omitente no local, ainda assim, o resultado ocorreria. Conclui o autor
“o omitente em si, portanto, não é causal, a diferença do que ocorre no delito de ação.
A causalidade da omissão não provém do omitente.”
Para os defensores da causalidade jurídica, para que o omitir seja considerado
causa, deveria ser aplicado um processo hipotético semelhante à fórmula da conditio
sine qua non. Toda vez que incluído a conduta esperada o resultado desaparecesse na
mente, a omissão seria verdadeira causa.
5.2 IMPUTAÇÃO E OMISSÃO
Deixadas de lado as concepções causais acerca da omissão, passemos a
aprofundar a sua verdadeira natureza.
Primeiramente, se faz necessário colocar os pingos nos is. No atual estágio de
evolução da doutrina, não há mais como confundir relação de causalidade com
imputação. Semelhante confusão só se justificava em época anterior à imputação
objetiva, em que a doutrina, com malabarismo, necessitava criar causalidades para
tentar corrigir a amplitude que significava a conditio sine qua non.
A primeira, imputatio factis, se caracteriza por se tratar de um nexo real,
ontológico, ou seja, do mundo as coisas, que liga um resultado a sua causa. Já a
34
segunda, imputação, imputatio juris, significa “atribuição de resultado de lesão ao bem
jurídico ao autor, como obra dele( SANTOS, 2002,p50)”.
É preciso esclarecer que com as modificações trazidas pela mecânica quântica e
pelo princípio da indeterminação, a causação, como indica a doutrina moderna, não
pode ser mais entendida como um juízo de certeza, tal qual dantes (TAVARES, 1996,
p.15),(SANTOS, 2002,p.42-43)Todavia, para o Direito Penal a causalidade deve ser
baseada na certeza, embora isto só seja possível ex post, (TAVARES, 2000,p.209),
antes, só poderíamos falar de probabilidades.
Conclui-se daí que nos delitos comissivos há causação e imputação, todavia
pode haver atribuição sem que, contudo, haja necessariamente causação. É o caso dos
delitos comissivos por omissão.
A causalidade ou quase-causalidade na omissão só foi um lamentável e inútil
recurso que a doutrina encontrou para não assumir que a forma de regramento dos
delitos comissivos por omissão que se adotava feria claramente o princípio da
legalidade, posto que não houvesse aí, real causalidade.
Muito a propósito são as palavras de Paulo Queiroz (2005, p.169) citando
Kelsen: “a causalidade só pode ser concebida enquanto causalidade material
pertencente ao mundo do ser, regido pelo princípio da causalidade; no mundo
axiológico (dever ser) vige o princípio da imputação”. Semelhante confusão
terminológica tão-só se justifica porque “o legislador não fala a linguagem da crítica do
conhecimento, e sim aquela da vida prática”, pode, portanto “promover a omissão à
categoria causal (COSTA JUNIOR, 1996, p.122)”.
Conclusão semelhante já chegava Von Liszt (LISZT, 2006, p.212-213) no século
XIX. Transcrevemos as palavras lúcidas do autor: “Usamos, pois, de uma linguagem
indubitavelmente inexacta, quando falamos em causar por omissão. Trata-se sómente
de saber si a sciencia deve conservar ou não essa linguagem commum” (sic). E conclui
sobre a pergunta que deve ser formulada: “Não deve ella ser formulada n’estes termos;
‘quando a omissão é causal?’ E sim d’este modo: ‘quando a omissão é illegal?’” (sic)
Cabe repensarmos o motivo pelo qual, atualmente, continuarmos repetindo
frases do tipo: a omissão só é causa do resultado quando...
35
5.2.1. equivalentes da causação
Desde os trabalhos de Kauffman que a maior parte da doutrina entende que
ação e omissão possuem estruturas totalmente diversas. Negada a causalidade da
omissão era necessário, portanto, encontrar um elemento que desempenhasse função
semelhante à causação, ligando o resultado não impedido ao omitente da ação devida,
como obra sua.
A doutrina aponta basicamente o juízo hipotético de não evitação, como requisito
que possibilita atribuir o resultado ocorrido ao agente, como obra sua. As hipóteses
seriam as seguintes: estando o agente na posição de garante, se ação omitida
pudesse, com uma probabilidade próxima da certeza, evitar o resultado, então, a
omissão equivale a causar; ou, de outra forma, estando o agente na posição de
garante, se ação omitida tivesse diminuído o risco da produção do evento, então, o
omitir equivale a causar.
Outro setor em ascensão11, por outro lado, afirma que não se pode procurar na
ação não realizada o vínculo de imputação, posto que, por não ter ocorrido de fato, só
poderia este vínculo se embasar na mera probabilidade. Ao revés, buscam este nexo
na própria omissão em si, como criadora do risco para o bem jurídico, ou seja, um juízo
de certeza.
Alguns desses autores fazem diferença ainda entre o equivalente à causalidade
e o critério de imputação12. Neste sentido os juízos hipotéticos não seriam propriamente
equivalentes da causalidade, mas meras regras de imputação:
Probabilidade próxima da certeza
JUÍZOS HIPOTÉTICOS : Diminuição do risco
11 Liderada por nomes como Gimbernat Ordeig e Luzon Peña12 Neste sentido Silva Sanchez. Para o autor o equivalente funcional da causalidade na omissão seria a posição de garante nos casos de identidade estrutural (2006, p.465) e o critério para imputação a domínio do risco idêntico ao da comissão, que surge com o descumprimento do compromisso de atuar como uma barreia de contenção (p.471). Não obstante o autor afirmar que a omissão em si não cria risco nenhum para o bem jurídico parece que posição é apenas aparente, como afirma Rodriguez Mesa, pois falar que o que cria o risco é a infração do dever de atuar como uma barreira de contenção ou dizer que a omissão cria o risco, não há lá tamanha diferença.(2005,p.144)
36
JUÍZO DE CERTEZA Criação do risco pela omissão.
5.2.1.1 Nexo de não evitação com probabilidade beirando a certeza
Este sem dúvida é o critério mais utilizado pela doutrina. Os que adotam este
critério baseiam-se em uma espécie de paralelismo com os delitos de comissão.
(inversão da fórmula de thyrèn). Ora, se exige para que se realize o nexo causal entre
uma ação e um resultado a certeza de que suprimida a conduta o resultado não
ocorreria, e como isto seria impossível de se averiguar na omissão, conformou-se a
doutrina, como único remédio, em contentar-se com um alto grau de probabilidade.
Se o controlador de tráfego ferroviário não comunica a partida do trem e o
motoqueiro morre porque a cancela não foi abaixada “pode se afirmar que a realização
da ação mandada excluiria o resultado com probabilidade próxima da certeza
(SANTOS, 2002, p116)”, ou seja,“ a probabilidade muito grande de que a conduta
devida teria interrompida o processo causal que desembocou no resultado
(ZAFFARONI; PIERANGELI, 1997, p.541).”
Em algumas situações este critério poderia resolver suficientemente o problema,
entretanto, em outras mais complexas, ele se mostra irremediavelmente deficiente.
É o caso em que há mera possibilidade e o omitente é conhecedor disto. A
doutrina cita o exemplo do médico que recusa medida terapêutica que apenas pudesse
diminuir pouca coisa os riscos de morte. Neste caso o médico não poderia ser
responsabilizado, pois não haveria como se constatar a probabilidade próxima da
certeza.
Juarez Tavares (1996, p.95) fornece o exemplo do pai que vendo seu prédio
pegar fogo, encontra-se com o dilema: jogar as crianças para os vizinhos segurarem no
solo ou esperar o salvamento. Ora, de qualquer maneira as crianças poderiam morrer.
Por esses e outros problemas é que a doutrina, baseada na teoria da imputação
objetiva elaborada por Roxin, vem passando a utilizar o critério da diminuição do risco
para dirimir as dúvidas que surgem com a imputação da omissão.
37
5.2.1.2 Critério da diminuição do risco
Como é sabido, a teoria da imputação objetiva surgiu primeiramente com Larenz
e Hardwig, posteriormente sistematizada e aplicada na teoria do delito por Roxin
(TAVAREZ, 2000, p.223) como forma de corrigir a amplitude da causalidade. Hoje, se
caracteriza mais como uma “exigência geral da realização típica” (MIR PUIG, 2006,
p.202). Por conseguinte, a rigor “é mais uma teoria de ‘não-imputação’ do que uma
teoria “da imputação’” (QUEIROZ, 2005, p.175).
Pois bem, um dos critérios que se utiliza a imputação objetiva é o critério da
criação ou incremento de um risco. Por ele só poderá haver imputação quando se cria
ou incrementa risco proibido e relevante ao bem jurídico.
Transpassado para omissão imprópria, da mesma forma que fez com a fórmula
de thyrèn (causação), a doutrina transformou o critério do incremento do risco em
diminuição do risco, como requisito para atribuição do resultado (imputação).
Neste sentido a pergunta que se deve fazer é: a ação omitida teria diminuído o
risco para ocorrência do resultado?
Gimbernat Ordeig (2003, p.45) afirma que este critério apenas desmascara o
critério da probabilidade próxima da certeza, ou seja, quando os tribunais julgam estar
utilizando o critério da probabilidade, na verdade, estão fazendo uso do critério da
diminuição do risco:
[...] se o mais que se pode dizer é que, se o omitente houvesse atuado ( mais ou menos) provavelmente haveria evitado o resultado, então o que procede é chamar as coisas por seu nome e formular que basta com que a ação exigida houvesse diminuído o risco de produção do resultado para que entre em joga a responsabilidade por uma comissão por omissão consumada[...]A teoria da diminuição do risco não faz outra coisas que desmascarar a atual doutrina dominante[...]”.
Se este critério se mostra original ou se nada mais faz do que dar nome aos
bois, não importa muito. O que salta aos olhos e que a doutrina vem chamando atenção
38
é o fato de sua utilização poder dar margem a uma espécie de vulneração ao princípio
do in dúbio pro reo, transformando os delitos comissivos por omissão em delitos de
perigo.
No exemplo do médico, a possibilidade não seria interpretada em favor do
médico, mas sim contra ele, critica Ordeig (2003, p.48)
Rodriguez Mesa (MESA, 2005, p.139) leciona que o problema real não reside
nem tanto nas objeções já levantadas, mas sim no fato de que, no critério da diminuição
do risco, a “perigosidade se constrói sobre a relação entre algo que nunca existiu e o
resultado: sobre uma ficção e não sobre uma realidade”
5.2.1.3 critério da criação ou incremento do risco pela omissão.
Imaginemos primeiro o seguinte exemplo:
Um pai se compromete a ministrar diariamente ao filho determinado remédio sem
o qual ele morreria. Não o dando, vem o filho em uma semana a falecer. Ocorre que se
comprova, posteriormente, que devido a um erro do laboratório o remédio não possuía
seu princípio ativo. Aplicado tanto o critério da probabilidade próxima da certeza, quanto
da diminuição do risco, nenhum juízo hipotético explicaria a imputação do resultado.
Diferentemente dos critérios expostos, se tem dito que a omissão em si cria
normativamente um risco não permitido para o bem jurídico, distinguindo-se, portanto,
dos critérios anteriores, processos causais hipotéticos, em que a relação é com a ação
omitida e não com a própria ação.13
Explica Gimbernat Ordeig (apud MESA, 2005, p.141) que o juízo de perigosidade
se estabelece tanto pelo foco de perigo, quanto em razão de sua não neutralizada por
medidas de precaução. Como os focos de perigo têm uma tendência expansiva a se
estenderem além do nível do permito, o legislador prevê que determinadas pessoas
apliquem medidas de contensão. É dentro dessa perspectiva que a desobediência em
interpor medidas de contensão, possibilitando, desta forma, a expansão de um perigo,
equivale a causá-lo.
13 Neste sentido Gimbernat Ordeig, Luzón Peña, Rodriguez mesa
39
No juízo de perigosidade nos delitos comissivos, como é sabido, analisa-se se
conduta se mostra adequada, conforme critérios de previsibilidade objetiva, a produzir
um resultado desvaloroso.
Diferentemente da perigosidade dos crimes comissivos, proveniente da própria ação do
sujeito, na omissão, estes riscos são oriundos ou da natureza ou de outros
comportamentos humanos. Na omissão se valora, pela experiência, a possibilidade de
estes riscos virem a se desestabilizar, transformando-se em riscos não permitidos.
Deve-se levar em conta a experiência para se aferir se este resultado aparece ou
não como conseqüência possível da omissão.
No caso do pai que não leva o filho doente ao médico, não é o caso de se
perguntar se o filho morreria ou não com o atendimento médico, mas sim, se o
falecimento do menino se deve à criação do risco pela omissão. É perigosa a omissão
que ex ante é adequada a desestabilizar o risco da enfermidade, transformando-o, de
um risco tolerado a um risco não permitido.
No caso do médico, ciente disto, que recusa medida terapêutica que apenas
pudesse diminuir pouca coisa os riscos da morte do paciente, não se puniria porque a
ação omitida pudesse diminuir os riscos de morte, mas sim porque o omitente, estando
na posição de garantidor, tinha o dever de neutralizar os riscos criados pela natureza,
impedindo que se desestabilizassem e se transformassem em riscos não permitidos.
Ademais, para que haja imputação deve a omissão se encaixar nos fins de
proteção da norma, ou seja, alem da criação do risco pela omissão, este risco deve ser
tão-somente aquele que a norma tinha como intenção de evitar e não outro qualquer.
Neste sentido se o filho morre de um acidente com a ambulância que o levava
para o hospital, pelo fato de a mãe não ter lhe alimentado adequadamente, o resultado,
neste caso, obviamente, não poderá ser imputado à mãe.
Com efeito, este critério tem a enorme vantagem de trabalhar com juízo de
certeza e não de probabilidade. Ademais, se a essência da omissão é normativa, não
faz sentido a insistência em procurar critérios de imputação semelhantes aos da
causação, como ocorre nos juízos hipotéticos.
Restará, portanto, saber quando de fato o omitente possui, de forma inequívoca,
o dever jurídico de agir para interromper o curso causal.
40
5.3 CAUSALIDADE, IMPUTAÇÃO E O ART. 13§ 2º DO CPB
Como vimos no tópico 4.2, até o Projeto Alcântara Machado a legislação
nacional dava pouca ou quase nenhuma atenção ao problema dos delitos omissivos.
A doutrina da época, todavia, travava grandes discussões acerca da causalidade
na omissão. Questionava-se se havia de fato causalidade aos moldes dos crimes
comissivos ou apenas uma causalidade jurídica.
São conhecidos os elogios tecidos por Nelson Hungria à Comissão Revisora do
Código de 1940 por ter retirado de seu texto a cláusula de equiparação copiada do
Código de Rocco e que constava originariamente no Projeto Alcântara Machado.
Ora, o que equivale, por óbvio, não causa. A equivalência é puramente
normativa.
Nelson Hungria resume bem o pensamento da doutrina da época sobre a
omissão. Para este autor a omissão era sim causal, todavia, não mecanicamente
causal como ocorre com a ação, o que segundo ele corresponderia à tentativa de
explicar a quadratura do círculo, mas sim logicamente causal (1959, p.69-70).
A doutrina de maneira geral, antes do movimento de reforma que deu origem as
modificações de 1984, seguia a mesma posição de Nelson Hungria, “embora alguns
continuassem a aceitar a causalidade naturalística da omissão (MUNHOZ NETTO,
1983, p13)” sendo poucos os que já sustentavam a omissão como juízo normativo
(FRAGOSO, 1982, p.43).
O Código de 1940 e o natimorto Código de 1969 nenhuma contribuição
significativa trouxeram ao problema da causalidade omissiva.
Alteração de tal monta só viria a ocorrer em nossa legislação com a Reforma de
1984, cuja redação original do caput do art.13 definia a omissão como juízo normativo,
coerente com a doutrina da época. Todavia, modificada por emenda, sua redação
passou a repetir a mesma fórmula naturalística dos Códigos de 1940 e 1969. Em sua
redação original, o caput do art.13 previa:
41
O resultado de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem, por ação, o tenha causado, ou, por omissão, não o tenha impedido
Assim é que temos o atual art.13 §2º do Código Penal Brasileiro, o qual se
analisado precipitadamente haveríamos de chegar à conclusão de uma teratológica
omissão de natureza mista, causal e normativa. A propósito, a doutrina com razão tem
criticado esta redação. Com efeito, o caput do art.13 do Código Penal trata a omissão
como causal e o § 2 como normativa, in verbis
Art.13 – O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido [...].[...] §2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente podia e devia agir para evitar o resultado [...].
Se não bastasse esta confusão de critérios, a própria redação demonstra-se no
mínimo claudicante, pois que, como bem lembrou Sheila Bierrenbach (2002, p.56), não
são apenas nas hipóteses enumeradas pelas alíneas do § 2º que se pode considerar a
omissão como relevante, se levarmos em conta que há, certamente, semelhante
relevância nas omissões próprias.
Atento ao problema para a causalidade gerado pela redação do art.13
Cernicchiaro classifica a Emenda do Dep. Egídio Ferreira Lima como “verdadeira
afronta à unidade e coerência do sistema (apud SOUZA, 2003, p.50)”.
O fato é que a omissão não é causal. Nem o Código Penal atual quis que
tratássemos como causal, de outra forma não acrescentaria o parágrafo segundo. Se
repararmos bem, não há uma fidelidade à conditio sine qua non sequer nos crimes
comissivos, haja vista o acréscimo de um critério de imputação inserido com o
parágrafo primeiro, que “praticamente desnatura a teoria da condição por ele adotada
(TAVAREZ, 200, p.216).”
A explicação mais convincente é que “o legislador não fala a linguagem da crítica
do conhecimento, e sim aquela da vida prática”, pode, portanto “promover a omissão à
categoria causal (COSTA JUNIOR, 1996, p.122)”.
Francisco de Assis Toledo (1991, p.116), idealizador da reforma de 1984,
comentando o problema da causalidade assim se referiu aos delitos comissivos por
omissão:
42
[...] O problema da causalidade nestes delitos comissivos por omissão tem
ensejado inúmeras disputas doutrinárias que, entre nós, com a reforma penal,
perde relevância. Com efeito, o legislador pátrio estabeleceu um nexo de
causalidade normativo entre a omissão e o resultado, no art.13 e parágrafos do
Código Penal, especificando as hipóteses em que esse nexo deve ser
reputado presente, a saber: A omissão terá o mesmo valor penalístico da ação
quando o omitente se colocar, por força de um dever jurídico (art.13§2º) na
posição de garantidor da não ocorrência do resultado
A bem da verdade, chamem do que for: causalidade normativa, causalidade por
ficção jurídica, não importará muito. Certamente mais prudente seria se déssemos às
coisas seus respectivos nomes, pois se a omissão é normativa, o que há é imputação e
não causação.
Mais importante, entretanto, é o tratamento que dispensamos a ela. Não faz
sentido algum, por conseguinte, adaptarmos à omissão as mesmas e velhas fórmulas
empregadas para a causação, como o da eliminação hipotética. As regras da
imputação são próprias.
6 DO ATUAL ESTÁGIO DO FUNDAMENTO DE PUNIBILIDADE DOS DELITOS
COMISSIVOS POR OMISSÃO
No capítulo passado averiguamos quando o não evitar um resultado se equipara
ao causá-lo. O presente capítulo se trata de saber por que a não evitação do resultado
deve receber a mesma pena de quem houvesse causado, ou seja, qual o fundamento
da punibilidade dos delitos comissivos por omissão.
Ora, nos crimes comissivos a responsabilidade é intuitiva: se pune o agente
porque foi ele o causador do resultado. É certo que os critérios da imputação objetiva
43
podem surgir em auxílio, porém nunca poderiam substituir a causalidade (GOMES,
2004, p.113) como propõem alguns autores, entre eles Jakobs (TAVARES, 2000,
p.223) e Damásio (2002, p.XVII).
Como resposta a fundamentação da punibilidade dos delitos de omissão
imprópria, atualmente, a doutrina caminha em dois sentidos: a) segundo esta corrente
(ampla maioria), comissão e omissão possuem estruturas ontológicas e normativas
completamente diversas, daí porque tão-só cabe aferir quando, do ponto de vista
axiológico de merecimento da pena, elas se equivalem. Grosso modo, aqui estariam
presentes os delitos comissivos por omissão; b) como outro ponto de vista, parte da
doutrina, cada vez mais ascendente, sustenta ser possível ação e omissão possuírem
conteúdo de desvalor idêntico, em um plano normativo, quando respondam pelo
mesmo e único fundamento material de injusto.
Predominantemente, tanto a doutrina nacional como estrangeira, segue o
entendimento da omissão imprópria como estrutura ontológica e normativa totalmente
diversa da comissão. Como conseqüência, o que poderia haver de comum entre ambos
é uma equivalência axiológica e isto, segundo afirma-se, fundamentaria sua
punibilidade.
Abre-se, todavia, uma nova via de compreensão dos delitos comissivos por
omissão, em nosso entender, muito mais coerente e consentânea com o Estado
Democrático Direito. Por ela o que fundamentaria a equiparação entre omitir e o atuar
não seria propriamente uma equivalência axiológica dos delitos omissivos com os
crimes comissivos, mas sim uma efetiva e real identidade estrutural entre eles.
Há, por conseguinte, praticamente duas formas diametralmente opostas de
compreensão dos delitos comissivos por omissão. Certamente com reflexos dogmáticos
diversos, cujas características trataremos neste tópico.
6.1 DA EQUIVALÊNCIA AXIOLÓGICA COMO CRITÉRIO PARA A EQUIPARAÇÃO
44
A partir de Kaufmann (2006, p.265) passou-se a compreender a omissão
imprópria como um tipo completamente diverso da comissão, um subtipo dos delitos de
omissão.
Havia, portanto, diferenças materiais e estruturais intransponíveis entre comissão
e omissão, haja vista que as primeiras resultam da vulneração às normas proibitivas e
as segundas às normas mandamentais.
Segundo o autor, era impossível que uma mesma norma motivasse tanto um
fazer como um não fazer, haja vista mandato e proibição terem diversos destinatários.
Enquanto as normas proibitivas eram destinadas a todos, erga omnes, isto não
ocorreria com as normas mandamentais, as quais se destinavam apenas a um pequeno
número de pessoas ligadas estreitamente aos bens jurídicos tutelados.
Afastando-se do pensamento de Nagler, para quem a posição de garante como
elemento implícito do tipo permitia que a omissão imprópria realizasse o tipo comissivo,
sustentava Kaufmann (2006, p.263):
[...] A posição de garante não é um elemento implícito do tipo do delito comissivo, senão um requisito do tipo de delito de omissão (imprópria). Porém, então a omissão imprópria não realiza o tipo do delito comissivo, senão outro tipo distinto, precisamente o delito de omissão imprópria
Este tipo de comissão imprópria seria distinto do correspondente comissivo, não
só pelo fato de que, nestes últimos, há causação e os primeiros não, mas também
porque os delitos de omissão imprópria necessitam da posição de garante, os
comissivos, pelo contrário, não.
Ora, se havia diferenças estruturais e materiais intransponíveis a única solução
possível para equiparação com a comissão só poderia radicar-se em critérios
puramente axiológicos, ou seja, na semelhança de injustos e no merecimento da
mesma pena, “ no sentimento de justiça” (BACIGALUPO Apud MESA, 2005, p.48) ou
na “mais elementar sensibilidade jurídica”(MUÑOS CONDE,1988,p33).Omitir-se
“corresponderia valorativamente à realização do tipo legal através de um fazer ativo”
(WESSELS, 1976 p.158).
45
A posição de garante, segundo a doutrina, surge como o elemento da tipicidade
dos delitos comissivos por omissão que permitiria que estruturas tão diferente
recebesse a mesma pena.
Dito de outra forma: quando a mãe deixa de amamentar a criança não a mata,
pois que não causou sua morte. No entanto, castiga-se como houvesse matado, tendo
em vista que a não evitação do resultado morte por alguém com responsabilidade
qualificada (garantidora), art.13§2º, “mostra-se equivalente, ao menos
aproximadamente, em merecimento de pena à conduta de matar” (SILVA SANCHEZ,
2006, p.455) prevista no art.121 do CPB, sendo merecedora, por conseguinte, da
mesma pena.
Segundo este posicionamento, o art13§2º do Código Penal Brasileiro deveria ser
lido como fundamento à tipicidade dos crimes omissivos impróprios, pois é somente
nele que se encontra prevista a norma de mandamento e só através dele é possível
que o juiz no caso concreto construa o tipo omissivo, tendo como base o tipo comissivo
correspondente. A omissão imprópria, portanto, tendo como fundamento de tipicidade a
posição de garantidor, não perfaz o mesmo tipo que o do delito comissivo
correspondente. (MESA, 2005, p.51)
A cláusula de equivalência contida nos códigos penais, por conseguinte, seria
peça chave para resolver o problema da legalidade. Como conseqüência da
equivalência axiológica, em tese, “todos os crimes comissivos, portanto, poderiam ser
cometidos através da omissão imprópria” (TAVARES, 1996, p.81), pois que todos eles
podem ter semelhança axiológica, mesmo crimes que descrevem condutas
eminentemente positivas, como estupro e furto (ZAFFARONI, 1982, p.37)
Como lecionaram ZAFFARONI e PIERANGELI (1997, p.543) “não restaria outro
recurso senão considerar que praticamente detrás de todos os tipos ativos há uma
espécie de ‘falsete, que é o tipo omissivo equivalente não escrito [...]”
Veja que posicionamentos de doutrinadores14 que seguem o critério da
equivalência, mas restringem sua aplicação aos tipos da Parte Especial, cuja redação
permita sua subsunção, conquanto louvável em termos de segurança jurídica, são
14 Serve como exemplo Heleno Fragoso (1984, p.231)
46
totalmente incoerentes, posto que a omissão não se subsumem, como vimos, não só
em tipos que descrevem condutas eminentemente ativas, mas em nenhum tipo causal.
Resulta daí as seguintes conclusões:
Nº1) Omissão e ação não pode ser estruturalmente idênticas, pois originam-se de
normas diferentes.(proibitivas e mandamentais)
Nº2) Os tipos comissivos por omissão não realizam diretamente os tipos
correspondentes da Parte Especial. Estes devem ser lidos como eminentemente
causais.
Nº3) Os delitos comissivos por omissão só recebem a mesma pena do
correspondente comissivo pela aplicação de um critério axiológico, ou seja,
merecimento de pena, haja vista possuírem carga de injusto semelhante.
6.2 IDENTIDADE MATERIAL E ESTRURAL COMO FUNDAMENTO PARA
EQUIPARAÇÃO
Quanto à primeira conclusão nº 1 do tópico 6.1, a doutrina moderna vem
refutando tal distinção meramente formal, entre mandato e proibição. Mandato e
proibição não seriam diferentes tipos de normas, mas apenas duas distintas formas que
podem expressar o conteúdo imperativo das normas penais. Ambas, portanto, possuem
a mesma carga valorativa, qual seja: evitar a lesão ou exposição de perigo de um bem
jurídico.
Sentido semelhante podemos encontrar em lições que remontam Luden, Savigny
e Kelsen15, para os quais as normas de mandato e proibição têm natureza idênticas,
podendo expressar qualquer conteúdo normativo indistintamente, ou seja, uma ação
mandada e uma omissão proibida e vice-versa.(Apud SILVA SANCHEZ, 2006, p.188),16
15 Afirmava Kelsen(Apud KAUFMANN, 2006, p26) “toda proibição pode transformar-se em mandato e todo mandato em proibição” 16 No mesmo sentido leciona Jakobs (2003. p.35) que as relações negativas não se compõem apenas de proibições de iniciar lesões e as relações positivas não se compõem tão-somente de mandatos. O autor dá o exemplo de um motorista que desacelera (omitir) seu automóvel para não atropelar pedestre, mas
47
Os tipos previstos na Parte Especial, não obstante serem eminentemente
proibitivos, não significa dizer que não possam expressar conteúdo material preceptivo.
Desta forma, atrás de um enunciado proibitivo é possível advir duas normas primárias:
uma de proibição, outra de mandato (MESA, 2005, p.78)
Argumenta-se que distinção simplista de que as normas penais ou são apenas
mandamentais ou proibitivas se encontra em franco declínio. Parte-se, portanto, do
caráter de mão-dupla das normas contidas no tipo.
Com efeito, não se pode, no atual estágio dogmático, compreender as normas
penais como puramente proibitivas ou mandamentais, pois que dessa maneira os bens
tutelados pelo direito penal não receberiam a devida proteção (TAVARES, 1996, p.37).
Senão vejamos:
Se levássemos em conta que a norma mandamental fosse exclusivamente uma
ordem de fazer, não haveria o seu desrespeito com uma atividade diversa, mas apenas
com o não fazer.
Por outro lado, contido em uma norma proibitiva que ordena o não fazer, está
também uma atividade. Como argumenta Juarez Tavares tratando da complexidade da
norma proibitiva: “ao mesmo tempo que proíbe uma atividade, por exemplo, a atividade
de matar, impõe, também, uma atividade de respeito á vida humana. Isto está implícito
na norma proibitiva” (Idem,.p.37)
Em decorrência do exposto acima, a conclusão nº 2 do tópico 6.1, ou seja, de
que os tipos de resultado da Parte Especial devem ser lidos como tipos que descrevem
condutas causais e que, por conseguinte, não abarcariam a omissão, cai por terra.
Acerca desta objeção, Silva Sanchez (2006, p.178) explica que a filosofia
analítica faz distinção entre descrição e adscrição, entendida esta como atribuição de
um resultado moral por um fato, ou seja, imputação. O que existe no tipo não seria
apenas descrição, mas adscrição, pois o tipo penal não deve ser entendido apenas
como um preceito legal, mas também como categoria dogmática.
Tipo preceito legal é o tipo escrito, o pressuposto de fato da norma secundária,
aquele que atende às exigências do principio da legalidade sob um aspecto formal. Tipo
categoria dogmática é expressão do injusto específico do delito.
se não reduz deve frear (ação). Completa exemplificando que o médico que deve operar (ação) também está obrigado a não embriagar-se (omitir)
48
Desta forma, aquilo que os tipos penais imputam como homicídios, lesões, nem
sempre coincide com o que estimamos como condutas de matar, lesionar etc. Eles não
possuem o significado de descrição de causalidade, mas de adscrição, ou seja,
imputação de responsabilidade (MESA, 2005, p.80).
Trocando em miúdos, podemos dizer que na Parte Especial do Código Penal
estão presentes tipos omissivos, comissivos, omissivos e comissivos e aparentemente
apenas comissivos, cuja redação (tipo como categoria dogmática) permite também a
adscrição de condutas omissivas.
Vale trazer as lições de Mir Puig( apud MESA, 2005, p.80) :
[...] Uma concepção social prevista pela lei permite incluir nos tipos de causação a comissão por omissão. Não haverá o uso, com isso, da analogia, senão de uma interpretação que, embora extensiva, segue sendo licita por respeitar os limites do ‘sentido literal possível
Fica a pergunta se isto não feriria o princípio da legalidade constituindo-se em
analogia in malam partem, todavia, cabe aqui lembrarmos a distinção feita por
Gimbernat Ordeig entre analogia e interpretação analógica dentro do sentido literal
possível.
[...] É perfeitamente possível distinguir aplicação analógica e analogia. E a delimitação entre ambas se efetua, efetivamente, quando se pensa no 'sentido literal possível'. A interpretação analógica trata de determinar o que diz o Direito Penal em relação a uma questão duvidosa quando recorre à comparação de outras figuras delituosas ou instituições penais similares. A interpretação analógica pode estender (como o caso do conceito 'moradia' do art. 490 (hoje art. 202) ou a restringir (como no caso de roubo com homicídio) o comportamento punível. Mas, tanto restringindo como estendendo, deve manter-se sempre dentro do marco do 'sentido literal possível'
Exemplos semelhantes de interpretação extensiva permitida já nos eram
fornecidos pela doutrina de Nelson Hungria (1955, p. 82) cujas lições explicavam a
clara distinção entre analogia e interpretação.
[...] Quando o Código incrimina a bigamia (artigo 235) está necessariamente implícito que abrange na incriminação a poligamia; quando incrimina o rapto (artigo 219), sem outra distinção que a referente aos meios executivos, compreende não só o rapto per abductionem (com remoção da vítima de um lugar para outro) como o rapto per obsidionem (com arbitrária retenção da vítima em lugar aonde fora por sua livre vontade); quando um fato é incriminado por criar uma situação de perigo (v.g.: o fato previsto no art. 130 do
49
Código Penal), também o é, não obstante o silêncio da lei, quando cria uma situação de dano efetivo (crime exaurido)
Assim sendo, dentro de um sentido literal possível, artigos como o 121 do CP,
proibido não é apenas matar em si, termo que implicaria na produção de uma morte
que, como qualquer resultado, não pode ser objeto de proibição, mas a conduta que
levam ao resultado morte (SILVA SANCHEZ, 2006, p.460)17
Neste sentido leciona Bacigalupo (1974, p.149):
[...] em certas condições, e a pesar de não existir nenhuma prescrição penal que o autorize, tanto a doutrina como a jurisprudência tem aceitado que um tipo penal proibitivo estruturado sobre a base da realização ativa de uma ação),pode, sem embargo, levar-se a cabo mediante uma omissão, por exemplo o tipo de homicídio, art.79 do Código Penal, não só é cometido pela forma ativa que expressamente caracteriza a lei, senão que também o é em certas circunstâncias de maneira omissiva. Portanto, baixo um tipo proibitivo (ex. matar a outro) resulta possível subsumir a conduta do que não impede a realização do resultado (ex. a morte de alguém).
Obviamente, mesmo que alguns tipos permitam a atribuição, não serão todas as
omissões que alcançarão uma identidade de desvalor, tanto da ação quanto do
resultado, com os crimes comissivos. Ou seja, não é toda omissão que se identifica
materialmente e estruturalmente com a comissão. Nestes casos, não haverá delitos
comissivos por omissão, podendo, em cada caso concreto e devido a amplitude do
delito de omissão de socorro, responderem por este delito(SILVA SANCHEZ, 2006,
p.425).
Apenas haverá identidade de desvalor da ação e do resultado, quando o
omitente, na posição de garante, possuía um domínio do risco típico normativamente
idêntico a quem, ativamente, colocou em marcha um curso causal (MESA,2005 p.116).
A partir deste ponto os autores que defendem a identidade material e estrutural entre a
omissão e ação divergem no que consistiria este controle sobre o risco. Seguiremos a
proposta de Silva Sanchez.
Para o autor, haverá domínio do risco quando o omitente, embora com sua ação
anterior haja assumido voluntariamente18 um compromisso específico e efetivo de atuar 17 Note que a redação de alguns tipos pode impedir totalmente a adscrição omissiva. Tomemos o exemplo do crime de homicídio previsto no CP italiano: “ art. 575. omicidio.- Chiunque cagionare la morte di um uomo........” ou seja, “Qualquer um que ‘cause’ a morte de um homem...”18 Poderia haver dúvidas quanto à assunção voluntária, v.g, nos casos em que a mãe deixa de alimentar o filho e este morre de inanição. Nestes casos a assunção voluntaria não se dá porque o sujeito escolheu ser pai ou ser mãe, mas sim, porque poderia ter renunciado ao poder familiar e não o fez, impedindo a
50
como uma barreira de contensão dos riscos, não age, excluindo assim a possível
intervenção de terceiros. Dizendo de outra forma: com ação anterior, cria-se um risco
para o bem jurídico, abandonando-o posteriormente, quando este estava em sua
dependência pessoal. (2006, p.463-466)
Temos, portanto, o substituto funcional da causalidade. Com um comportamento
ativo cria-se naturalisticamente o risco, com a omissão, nestas hipóteses, cria-se
normativamente um risco para o bem jurídico19.
Apanágio obrigatório desta teoria, portanto, haveria omissão imprópria tão-
somente em casos restritos, inequívocos, quando não houvesse dúvidas da identidade
matéria e estrutural entre o ato que viole a norma mandamental e o ato violador do
preceito proibitivo.
Tal, evidentemente, leciona com lucidez Juarez Tavares( 1996,p.82) referindo-se
a identidade estrutural:
[...] afora os casos expressos, só se dá nos delitos contra a vida, a integridade corporal e a liberdade, cujos objetivos jurídicos, pela sua natureza e pelas conseqüências, necessitam de uma imediata e oportuna intervenção protetiva, que não pode ser postergada para não se tornar inócua.
A doutrina moderna tem seguido a mesma linha restringindo os crimes
comissivos por omissão para os bens jurídicos mais essenciais.
É o caso de Juarez Cirino dos Santos (2002, p.115) quando ressalta que “reduzir
a responsabilidade do garantidor aos bens mais importantes, como a vida e o corpo do
sujeito protegido, parece indicado pela natureza especial da omissão de ação
imprópria”
Neste sentido, Luiz Flávio Gomes (2004, p.185) ensina que a melhor doutrina
informa que “somente os relacionados com bens jurídicos de elevada importância (vida,
integridade física) é que se acham enquadrados no referido dispositivo legal”
Quando analisamos a conclusão nº 3 do tópico 6.1 vemos que não há porque a
equivalência contentar-se com critérios axiológicos quando é possível uma identidade
ação de terceiros.19 Esta criação do risco, critério para identidade estrutural, não pode ser confundida com a criação do risco, imputação objetiva.
51
estrutural e material entre ação e omissão. Ademais, como veremos mais adiante, a
equivalência se traduz em analogia in malam partem.
7.1 DAS IMPLICAÇÕES CONSTITUCIONAIS
Com todo o exposto até então, cumpre que nos perguntemos: é constitucional a
forma com que a legislação brasileira regula os delitos comissivos por omissão? É
constitucional a forma com que a doutrina concebe estes delitos?
É válido deixar claro desde logo que não vemos qualquer inconstitucionalidade
na omissão imprópria em si, posto que, sendo o Brasil um Estado Democrático e Social
de Direito, derivam daí não só obrigações de se abster de ações lesivas à esfera alheia,
como também, excepcionalmente, obrigações de salvaguarda de bens alheios postos
em perigo.20
Fazemos nossas as palavras de Everaldo Cunha Luna (1982, p.54) quando
afirma que: “a questão básica, fundamental, portanto, não está na própria essência da
omissão imprópria, mas no modo como deve ser disciplinada pelo Direito Penal”
A Constituição Federal de 1988 prevê o princípio da legalidade em seu art.5º,
XXXIX, à semelhança do art.1º do CPB, in verbis: “Não há crime sem lei anterior que o
defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Nada mais fazem que repetir a frase cunhada por Feuerbach: “nullum crimem,
nulla poena sine lege”.
A doutrina aponta quatro desdobramentos ou vedações que derivam daí:
a)nullum crimen, nulla poena sine lege praevia ( proibição da edição de leis retroativas que fundamentam ou agravem a punibilidade);
b)nullum crimen, nulla poena sine lege scripta ( proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pelo direito consuetudinário);
c) nullum crimen, nulla poena sine lege stricta (proibição da fundamentação ou do agravamento da punibilidade pela analogia); 20 Não concordamos, portanto, com o Prof. Paulo Queiroz (2005, p.174) cujo posicionamento parece ser contrário à omissão imprópria em si, quando afirma que os delitos comissivos por omissão seriam inconstitucionais por ofenderem o princípio da pessoalidade da pena, tendo em vista imputar ao omitente ação de outrem ou evento puramente natural, sendo ilegítima, portanto, qualquer responsabilização de resultado senão ao próprio autor da ação.
52
d)nullum crimen, nulla poena sine lege certa (a proibição de leis penais indeterminadas).
Vimos no tópico 4.1 “A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA” que antes da reforma de
1984 não existia em nossa legislação nenhum artigo que previsse os delitos comissivos
por omissão, o que, todavia, veio a ocorrer com a inclusão do art.13§2º. Cumpriu-se,
com isto, as exigência formais da lei anterior derivante do princípio da legalidade.
Resta nos perguntar se o atual art.13§ 2º, da mesma forma, responde aos sub-
princípios: c) e d), ou seja, a taxatividade e a proibição ao uso da analogia in malam
partem nas normas incriminadoras.
Vejamos primeiramente a taxatividade.
Carmo Antonio de Souza (2003, p.161-162) defendendo a constitucionalidade
desses delitos, leciona que o princípio da legalidade deve ser entendido de forma
relativa e não absoluta. Argumenta o autor que em algumas situações é inviável uma
perfeita adequação do fato à sua moldura legal. Fornece como exemplo as normas
penais em branco e os elementos normativos do tipo. Aduz, ainda, que nos delitos
comissivos por omissão seria impossível o magistrado não dispor de certa
discricionariedade e termina por concluir que o art.13, §2º não infringe de maneira
nenhuma o princípio da legalidade.
Pois bem, a doutrina faz distinção entre reserva legal absoluta e relativa. A
primeira ocorreria quando a Constituição faz exigência de edição de lei formal para
regulamentação integral da norma constitucional. A reserva legal relativa, de outra
forma, ocorre quando há permissão feita, pela própria Constituição, de que esta lei
formal apenas venha a fixar os parâmetros de atuação para o órgão administrativo, que
poderá complementá-la por ato infra-legal.(MORAES, 2005, p.37)
Certamente o autor quando se refere à relativização da reserva legal não está
fazendo alusão a esta hipótese, até porque ela tão-só poderia ocorrer com a
autorização expressa da própria Constituição.
Por ora, continuemos o raciocínio acerca da taxatividade.
Explica Regis Prado (2006, p.133) que o princípio da legalidade tem a função
garantista de procurar “evitar o arbitrium judicis através da certeza da lei, com a
53
proibição da utilização excessiva e incorreta de elementos normativos, de casuísmos,
cláusulas gerais e de conceitos indeterminados ou vagos”. Continua o autor:
[...] O princípio da taxatividade significa que o legislador deve redigir a disposição legal de modo legal de modo suficientemente determinado para uma mais perfeita descrição do fato típico (lex certa). Tem ele, assim, uma função garantista, pois o vínculo do juiz a uma lei taxativa o bastante constitui auto-limitação do poder punitivo-judiciário e uma garantia de igualdade.
Neste contexto, os tipos penais abertos (aqui se incluem os elementos
normativos e lei penal em branco e os delitos culposos) só se sustentariam em um
Estado Democrático de Direito, como explicou Zaffaroni e Pierangeli (1997, p.449-450)
quando é de todo impossível para o legislador, por mais cuidadoso que seja, especificar
todas as variantes do conteúdo proibido pela norma.
Não à-toa, autores mais sensíveis ao tema chegam a criticar o uso abusivo pelo
legislador de formas sintéticas, como: provocar aborto ou injuriar alguém como
atentatórias a princípio da legalidade(TAVARES, 2000, p.187),(QUEIROZ, 2005, p.28).
Ora, trocando em miúdos, o que o autor quer dizer quando afirma que o princípio
da legalidade deve ser entendido de forma relativa é que, pela natureza das coisas,
não haveria como o legislador explicitar todas as hipóteses típicas dos crimes
comissivos por omissão, portanto seria constitucional sua sistematização na Parte
Geral, delegando, assim, a tarefa de fechá-lo ao juiz.
Como veremos mais adiante, perde todo o sentido justificar o atual tratamento
dos delitos de omissão imprópria pelo fundamento da pretensa impossibilidade de
previsão na Parte Especial pela natureza das coisas, resultando daí que a abusiva
“abertura” do tipo dos delitos comissivos por omissão não se legitima.
Repetimos mais uma vez a frase de Munhoz Netto: “no Estado de Direito, as
relações entre a autoridade e a liberdade devem estar claramente definidas (1983,
p.27)”. Por conseguinte, só poderia haver certa dose de indeterminação quando fosse
de todo impossível ao legislador optar pela via mais segura o que, sem dúvidas, não
ocorre nos delitos comissivos por omissão.
De mais a mais, em um Estado Democrático de Direito a aplicação da pena só
tem sentido quando o agente podia só motivar na norma, mas não se motivou.
54
(MUNÕS CONDE, 1988, p130) Ora, como um indivíduo poderia se motivar na norma,
se esta norma não especificar com clareza o que proíbe?
Seria algo semelhante á situação que Kafka descreveu em seu livro, O processo,
cujo enredo descreve o protagonista sendo processado, julgado e executado sem saber
exatamente o que fez para merecer tal castigo.
Por esta razão, a doutrina vem chamando atenção para o fato de que a forma de
tratamento que os delitos comissivos por omissão têm recibo fere flagrantemente o
princípio da legalidade.
Mais precisamente, neste sentido, Paulo Queiroz (2005, p.173) se manifesta:
[...] é evidente que o Código, ao se utilizar de uma cláusula geral e grandemente vaga, que equipara ação a omissão, não atende a tal exigência político-criminal e se revela claramente antigarantista. Porque, afinal, o legislador limita-se, simplesmente, a esclarecer os pressupostos gerais do dever de agir e de impedir o resultado, mas nada esclarece quanto ao seu conteúdo, remetendo, ainda, a complementação de seu significado (lei penal em branco) a uma outra lei, a um contrato ou uma situação concreta de criação de risco em gera, ainda mais imprecisos e indeterminados, de sorte que fixar os limites da posição de garante é especialmente problemático.
A esse respeito, mesmo que timidamente, Munhoz Netto (1984, p.29) já alertava
para amplitude que representava a cláusula geral. “Talvez a fórmula legislativa não seja
a mais perfeita, constituindo-se em simples indicação genérica orientadora, ou em
‘mera frase programática’.”
Eduardo Novoa Monreal (1984, p.179-180) em obra que escreveu em
homenagem à Munhoz Netto é bem mais contundente em suas críticas quanto à
legalidade.
Primeiramente, ao tratar das expressas cláusulas de equiparação e enumeração
das fontes do dever, tal qual presentes em nosso Código Penal, art. 13§ 2º, leciona que
“em razão de sua generalidade e falta de firmeza seguem sendo objeto de crítica por
toda a doutrina”.
Mais adiante, comentando sobre os variados problemas que os delitos de
comissão por omissão representam, aponta que o principal deles é se chocar com o
princípio da legalidade que inspira o Direito Pena, além do fato que em muitos casos,
55
alguns delitos da Parte Especial possuírem características incompatíveis com os delitos
de omissão.
Em seguida conclui que a falta de um delito expresso que os inclua, viola o
princípio da legalidade e a proibição penal da analogia, pois constituem fatos não
tipificados.
Assumindo uma postura resignada Jeschek e Luiz Luíse (apud SOUZA, 2003, p.
160) entendem que a técnica analítica de indicação do dever de agir satisfaz, no
possível, as exigências do princípio da legalidade.
A despeito do ponto de vista da constitucionalidade, a doutrina moderna, chega à
única e inarredável conclusão: a de que a cláusula de equiparação, não obstante
amenizar o problema da legalidade indicando as fontes do dever de garante, de
maneira nenhuma se aproxima de sua completa resolução.
Com efeito, a odiosa indefinição e demasiada abertura do tipo penal atenta
ferozmente contra as garantias mais comezinhas do Estado Democrático de Direito,
acabando por solapar com duros golpes um dos seus mais proeminentes alicerces : o
princípio da taxatividade do tipo penal,ou seja, a segurança jurídica, deixando ao
arbítrio do juiz a definição do que seria e não seria crime.
A história não nos deixa esquecer, até porque bastante recente, a experiência
hecatômbica da escola de Kiel, cujo tipo penal chegou a tal ponto de tamanha
abstração a proibir tudo que ofendesse “o são sentimento do povo alemão (ASÚA,
1950, Tomo II, p.169)”, incluindo aqui, certamente, o odioso tipo penal de autor, o qual
proibia por ser algo e não por fazer. Zaffaroni aventa a possibilidade de se chegar ao
absurdo de considerar fato típico previsto no art.33 da Lei de Segurança Nacional
Brasileira fato de não se levantar para saldar o Governador do Estado (1982, p.37).
A taxatividade, todavia, é apenas um dos problemas que surgem decorrentes da
legalidade. Outra grave ofensa, esta certamente muito mais sutil, refere-se ao uso da
analogia in malem partem.
Analogia, grosso modo, significa dar tratamento idêntico entre algo que não está
na lei e algo que por ela foi regulado, em razão da semelhança existente. O termo é
originário do grego, na (entre) logos (razão). A vedação originária do principio da
legalidade é ao uso da analogia in malam partem, ou seja, aquela que de alguma forma
56
prejudica o réu. Lembremos o sub-princípio derivante do princípio da legalidade:
nullum crimen, nulla poena sine lege stricta (proibição da fundamentação ou do
agravamento da punibilidade pela analogia).
É preciso deixar claro a distinção entre analogia e interpretação, enquanto
aquela cria, pois de nenhuma forma compreendida no texto legal, esta apenas busca
um sentido dentre os sentidos que a lei possa ser compreendida, respeitando o sentido
literal possível (MIR PUIG, 2007, p.91).
Normalmente, a analogia ocorre nos limites que fundamentam a imposição da
pena. Assim estaríamos diante de analogia, em que pese alguns posicionamentos
esdrúxulos, se compreendêssemos que no termo arma, art.157, §2º, I, se inclui
brinquedo.
Em outros casos, a analogia não se ocorre nos limites da punibilidade, mas sim
na própria punibilidade.
Com efeito, a maioria da doutrina entende que a fundamentação da punibilidade
reside na equivalência entre o injusto dos delitos omissivos impróprios e os comissivos.
Não apenas a taxatividade, portanto, se encontra sob grave ameaça. Não há
como fugir ao fato de que a equivalência se configura em vergonhosa analogia há muito
proscrita do Direito Penal moderno, portanto inconciliável com o Estado Democrático de
Direito.
Não nos esqueçamos que a equivalência significa assumir que determinado
delito não foi praticado no mundo do ser, mas que por conter semelhante carga de
desvalor (injusto) merece a mesma aplicação da pena.
Silva Sanchez (2006, p.456) explica que a analogia, aqui, ocorre não na
limitação, mas sim na própria fundamentação da punibilidade:
[...] a analogia tem lugar nestes casos, não na limitação, senão precisamente na fundamentação da punibilidade [...] de modo que resulta ser claramente uma analogia contra o réu [...] é pois inconstitucional e não é possível mantê-la nem um minuto a mais
Com propriedade, Juarez Tavares (1996, p.81) afirma:
[...] a inserção de uma cláusula de equivalência entre ação e omissão nada mais faz do que admitir na interpretação integrativa dos tipos legais o argumento analógico, vindo a ampliar indevidamente as possibilidades da punição por omissão [...] Não basta para fundamentar a punibilidade que se
57
afirme uma semelhança entre ação e omissão, será preciso que o legislador indique,com absoluta precisão, os elementos que compõem essa punibilidade
Zaffaroni (1982, p.34-35) também afirma haver analogia na hipótese em tela,
mas para o autor, ela ocorre pelo fato de o juiz para construir o delito impróprio não
escrito, a partir da comparação dos tipos comissivos por omissão previstos na Parte
Especial. Some-se a isso o fato de que, sendo possível em tese qualquer delito previsto
na Parte Especial ser praticado por omissão imprópria, isto gerar alto teor de abstração
e indeterminação, trazendo conseqüências irremediáveis ao princípio da culpabilidade,
haja vista não se ter a exata e prévia noção do conteúdo da proibição, impossibilitando
assim a motivação na norma.
Fala-se, ademais, em ataques aos princípios da pessoalidade da pena e da
proporcionalidade, o que tornariam os delitos comissivos por omissão, da maneira
como tratados, irremediavelmente inconstitucionais (QUEIROZ, 2005, p.172).
7.2 SOLUÇÕES DE LEGE FERENDA
Não pode haver dúvidas de que a solução que de fato pode por fim a todos os
problemas levantados até então não se encontre presente na legislação, mas tão-só
possa surgir com uma reforma sistemática na forma de disciplinar os delitos comissivos
por omissão, ou seja, na Parte Especial.
Argumenta-se pela impossibilidade de previsão na Parte Especial de todas as
hipóteses de delitos comissivos por omissão, entre outros Bockelmann, Mezger e
Welzel (GRASSO, 1983, p.34), (MONREAL, 1984, p.193), limitação esta supostamente
decorrente da natureza das coisas (ZAFFARONI, 1982, p.35). Todavia, entendemos
que qualquer reforma que pretenda efetivamente resolver a questão da legalidade deve
deslocá-lo para Parte Especial.
58
No mesmo sentido se manifestou Juarez Tavares (1996, p.70):
[...] A solução mais coerente com a exigência do princípio da legalidade, embora não exaustiva e nem perfeita, seria a previsão, na Parte Especial do Código Penal, dos delitos que comportassem a punição pela omissão.
Ora, o que seria impossível pela natureza das coisas seria o legislador prever,
com todas as suas variações, os modos que se pudesse lesionar os bens jurídicos de
forma omissiva. Teríamos que ter tipos como, v.g matar o filho por inanição, não
impedir, o salva-vidas, que alguém se afogue, etc.
Aliás, semelhante impossibilidade também existiria para os crimes comissivos,
como percebeu Munhoz Netto (1983, p.27):
[...] Há semelhante dificuldade quanto á definição de todos os comportamentos comissivos capazes de ofender bens jurídicos fundamentais à co-existência entre homens. E nem por isso pensa-se em substituir o princípio da legalidade.
O certo é que é possível sim um regramento dos delitos comissivos por omissão
na Parte Especial, de modo a satisfazer as exigências do princípio da legalidade.
Passemos às sugestões indicadas pela doutrina. Ambas, tanto uma quanto
outra, se fossem levada a efeito, pensamos que chegaríamos a uma efetiva conclusão
do eterno embate, delitos comissivos por omissão vs. segurança jurídica.
7.2.1 previsão na parte especial
A primeira proposta apresentada pela doutrina é a previsão de, certas categorias
de delitos de omissão imprópria, na Parte Especial. Ora, se só ocorrem os delitos
comissivos por omissão em ataques aos bens jurídicos mais sérios, como indica a
doutrina, não haveria tanta dificuldade de sua previsão na Parte Especial.
Neste sentido, Zaffaroni (1982, p.37-38) escreve:
[...] Dado que em circunstâncias normais, quer dizer, no marco de um Estado de Direito democrático, os casos em que a jurisprudência e a mesma doutrina acodem a tais construções não são tão numerosos, não é impossível elaborar por escrito tais tipo impróprios de omissão
59
Conclui, mais adiante, que é inconcebível que:
[...] por não se tipificar legalmente um grupo de condutas que praticamente esgotam os exemplos doutrinários e jurisprudenciais, se coloque em quebra o princípio da legalidade e toda segurança jurídica (1982, p.37)
Esta parece ser a solução também cotejada na por Giovanni Grasso (1983,
p.448-449). Argumenta o autor italiano que o que estaria fadado ao insucesso seria
apenas a tentativa de formular exaustivamente as singulares situações de garantia que
possam vir em consideração em relação a cada crime de evento
A solução, portanto, seria a previsão apenas e tão-somente direcionada a crimes
de homicídio omissivo, lesões ou exposição a perigos graves.
7.2.2 solução semelhante à culpa
A Doutrina, de maneira geral, tem apontado uma solução semelhante à culpa
para o regramento na Parte Especial, até porque ambos possuem conteúdo muito
similar (TAVARES, 2003, p.240).
A saída seria: ao invés de a omissão ser tratada, tal qual a tentativa, como ocorre
atualmente, deveria se seguido o mesmo caminho que foi trilhado pela culpa.
Com efeito, do crimen culpae, nemerus apertus, que permitia que qualquer crime
da Parte Especial fosse cometido por culpa, partiu-se para uma delimitação expressa,
numerus clausus, definindo as hipóteses quando isto poderia ocorrer.
Entre nós, Munhoz Netto (1983, p.30) já partia pela via semelhante à culpa como
única saída viável à compatibilização dos delitos comissivos por omissão com o Estado
de Direito.
Alberto Silva Franco (1993, p.74) criticando a opção que fez a reforma de 1984
de regrar os delitos comissivos por omissão da atual maneira, afirma:
[...] diante da alternativa ou enumerar em artigos de lei, as fontes geradoras do dever de atuar, ou compor, tal como ocorre com o crime culposo, figuras típicas de omissão imprópria não há dúvidas que a opção que melhor atende ao direito de liberdade do cidadão é a segunda. O legislador de 84 preferiu, contudo, definir-se pela primeira, acolhendo, em linhas gerais, no texto legal, a tipologia clássica das fontes geradoras do dever de atuar, sem concessão
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algum às considerações da doutrina mais moderna, a respeito das fontes desse dever, de conotação ética e moral
Explica Paulo José da Costa Jr.(1996, p.132) a forma como deveria efetivar-se
esta alteração
[...] em razão dos motivos expostos e em benefício de segurança do direito, sugeriu-se a introdução, na Parte Geral, de cláusula mediante a qual a omissão imprópria só seria punida em casos expressos, em que a conduta constasse de preceito contido na Parte Especial. Seria algo de semelhante àquilo que se dá com o crime culposo: ‘salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente’( art.17, parágrafo único). Constaria da Parte Geral preceito em que se estabeleceria que, ‘salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido pela prática de conduta omissiva imprópria.
Atualmente, Paulo Queiroz (2005, p.173) também propõe semelhante saída.
Aos críticos de plantão que venham alegar que qualquer reforma na omissão
imprópria levada a efeito nesses moldes traria um vazio à punibilidade, haja vista, que
poderiam ficar de fora situações que colocariam em risco o bem jurídico, Zaffaroni
(1982,p.36) alerta do perigo de se buscar uma legislação sem lacunas, e chama
atenção para o fato de, na culpa, ficarem de fora crimes como furto e estupro, todavia,
ninguém se escandaliza com a atipicidade do furto culposo ou do estupro culposo.
7.3 SOLUÇÕES DE LEGE LATA
Pois bem, enquanto não advir tal reforma, pensamos que não é tarefa da
doutrina cruzar os braços esperando o porvir, mas sim apontar saídas razoáveis e
coerentes, manipulando a dogmática de forma a proteger os bens jurídicos, sem
atropelar os direitos fundamentais.
Se este tipo de delito ainda esteja longe de chegar à perfeição, tratemos então
de adequá-los, da melhor maneira possível, às limitações necessárias para que não se
tornem, ao alvedrio dos juízes, arma aplacadora da fome punitiva do estado.
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Com efeito, serão, portanto, as cores que imprimiremos à omissão imprópria,
com tintas liberais ou reacionárias, que teremos uma tela mais próxima ou afastada do
ideário do Estado Democrático e Social de Direito.
Neste sentido, apenas nos utilizando de uma espécie de interpretação
conforme haverá a possibilidade de legitimação dos delitos comissivos por omissão.
Cremos, desta forma, que a teoria da identificação estrutural senão conduz à
respostas definitivas, pelo menos se constitui em meio coerente de limites à
problemática dos delitos de omissão, daí porque, no mínimo, por si só já mereceria um
debate e aprofundamento maior por parte da academia.
A proibição ao uso da analogia in malam partem mostra-se a principal vantagem
quando se trabalha com a identidade estrutural. Ora, como vimos, a equivalência por
merecimento semelhança de injusto é totalmente inconstitucional por tratar-se de
analogia contra o réu, do mesmo mal, a identidade estrutural e material não padeceria.
De fato, o que há é uma identidade normativa com o ação, o que permitiria a sua
coerente equiparação.
Por outro lado, se é certo que os delitos comissivos por omissão se constituem
em delitos abertos por natureza, a taxatividade estará um pouco mais segura se houver
identificação estrutural entre o atuar e o omitir, e não mera semelhança de injusto,
posto que responderiam pelo mesmo e único fundamento material de injusto. Mormente
porque corresponderiam apenas às infrações mais graves aos bens jurídicos mais
importantes e que não causem dúvidas ao senso comum.
Segundo esta proposta haverá crimes comissivos por omissão toda vez em que:
a da conduta omissiva de um garantidor (art.13§ 2º) tendo completo domínio do risco,
puder ser imputada por meio de um tipo da Parte Especial, equiparando-se, com isso, à
ação.
Nas hipóteses que isto não ocorrer; ou pelo omitente não controlar efetivamente
o risco, portanto, não se transformando em garante; ou pelo tipo penal não permitir a
adscrição, ou seja, quando a omissão não puder ser equiparada a comissão, o que
pode ocorrer, lege lata, é a subsunção nos delitos de omissão de socorro, haja vista
sua amplitude, certamente, se presente seus requisitos. De lege ferenda seria a criação
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de omissões de socorro qualificadas, como ocorre com o §4º e 7º dos artigos 121 e
129, do CPB e nas omissões de trânsito descritas no Código de Trânsito Nacional.
No que diz respeito à proporcionalidade da pena cremos que o critério da
identidade fornece, da mesma forma, alguns pontos positivos.
De fato, como leciona Silva Sanchez (2006, p.477) não são todas as omissão
que podem ser consideradas idênticas à omissão. Segundo o posicionamento do autor,
existem omissões próprias, omissões impróprias que não chegam a se igualar à ação e
por último, omissões impróprias iguais à ação Apenas essas poderiam ser chamadas
de comissivos por omissão. Pois bem, diferentemente, tem se aplicado a equivalência a
estes dois grupos, ou seja, tanto à omissão idênticas á ação, quanto à não-idênticas à
ação, causando uma flagrante desproporção entre as condutas e penas.
Problema semelhante não ocorreria com a utilização do critério da identidade
estrutural, haja vista que os delitos comissivos por omissão ocorreriam tão-somente
quando ação e omissão fossem idênticas.
CONCLUSÃO
Cumpre que respondamos ás perguntas formuladas na introdução, quais sejam: :
1º)No que consiste a omissão? 2º)O que são os crimes comissivos por omissão?
3º)Como é tratado no Direito Penal Brasileiro? 4º) Como é tratado pela doutrina
nacional? 5º) Esta forma de regulamentação fere o Princípio da Legalidade? 6º) O
modelo adotado pela doutrina nacional fere o Princípio da Legalidade? 7º)Como de lege
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ferenda é possível corrigir esta incompatibilidade? 8º)De lege lata qual é a melhor
saída?
A essência da omissão é normativa,ou seja, deixar de fazer alguma coisa que a
lei exige. Não importará a teoria adotada, o mais importante é preservar o seu substrato
natural, que na ação esperada seria a expectativa social; no aliud agere, a conduta
positiva diversa; e na omissão como relação de discordância, a conduta real valorada
pela norma, seja ela positiva ou negativa.
A definição dos delitos comissivos por omissão não pode resultar apenas de um
dos critérios apontados pela doutrina, mas sim, a partir da conjugação deles. Podemos
defini-los como a não evitação de um resultado por alguém que se encontra em
situação de garante, estando este obrigado pela lei a agir.
Os delitos comissivos por omissão são tratados no Direito Penal Brasileiro por
meio do art.13§ 2º, ou seja, com a previsão de uma cláusula genérica e a enumeração
das hipóteses de dever de garantia.
A doutrina nacional, em sua maioria, entende que ação e omissão possuem
estruturas diversas e inconciliáveis, portanto,os crimes de comissão não poderiam ser
lidos como normas mandamentais. A única coisa que justifica a mesma pena entre a
omissão e a comissão é a semelhança de injusto entre ambos, ou seja, a equivalência.
Para atribuição do resultado como “obra sua” deverá ter havido um nexo de
evitação, a pergunta, portanto, que deveria se impor seria: “ a ação do omitente teria
evitado o resultado com probabilidade próxima da certeza?”
O modelo escolhido pelo Código Penal Brasileiro para regular os delitos de
omissão imprópria confronta diretamente com o princípio da legalidade.A forma vaga e
imprecisa prevista no art.13§ 2º fere flagrantemente o princípio da taxatividade.
A equivalência defendida pela doutrina se utiliza do argumento analógico para
fundamentar a punibilidade dos destes delitos, ofendendo com isto o princípio da
legalidade que proíbe a analogia in malam partem.
A solução de lege ferenda para corrigir o confronto com o principio da legalidade
é a previsão na Parte Especial desta espécie de delito.
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Como a doutrina moderna afirma que só há omissão imprópria nas infrações
mais graves aos bens jurídicos mais importantes, seria possível prevê ,em poucos tipos
na Parte Especial, os delitos comissivos por omissão.
Outra alternativa é um tratamento semelhante à culpa.
De lege lata propõe-se a teoria da identidade estrutural como resposta imediata
ao principio da legalidade. Como as normas penais não são apenas proibitiva ou
mandamentais, ou seja, as norma proibitivas também são mandamentais e vice-versa,
é possível a adscrição direta dos delitos comissivos por omissão nos tipos tidos da
Parte Especial.
Apenas haveria delitos comissivos por omissão quando a omissão se
identificasse, normativamente, material e estruturalmente com á comissão.
Com esta teoria pretende-se obter uma melhora quanto à taxatividade, haja vista
que apenas haveria identidade estrutural entre os delitos mais graves. Da mesma
forma, a teoria possui a vantagem de não utilizar do argumento analógico, preservando
o princípio da legalidade.
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