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Universidade de São Paulo Instituto de Física O Modelo de Landau-Lifshitz e a Integrabilidade em Teoria de Cordas Gabriel Weber Orientador: Prof. Dr. Victor de Oliveira Rivelles Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Fí- sica para a obtenção do título de Doutor em Ciên- cias Comissão examinadora: Prof. Dr. Victor de Oliveira Rivelles (IFUSP) Prof. Dr. Prof. Dr. Prof. Dr. Prof. Dr. São Paulo 2011

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  • Universidade de So Paulo

    Instituto de Fsica

    O Modelo de Landau-Lifshitz e aIntegrabilidade em Teoria de Cordas

    Gabriel Weber

    Orientador: Prof. Dr. Victor de Oliveira Rivelles

    Tese de doutorado apresentada ao Instituto de F-

    sica para a obteno do ttulo de Doutor em Cin-

    cias

    Comisso examinadora:

    Prof. Dr. Victor de Oliveira Rivelles (IFUSP)

    Prof. Dr.

    Prof. Dr.

    Prof. Dr.

    Prof. Dr.

    So Paulo

    2011

  • FICHA CATALOGRFICAPreparada pelo Servio de Biblioteca e Informaodo Instituto de Fsica da Universidade de So Paulo

    Weber, Gabriel

    O Modelo de Landau-Lifshitz e a Integrabilidade emTeoria de Cordas - So Paulo, 2011

    Tese (Doutorado) - Universidade de So Paulo.Instituto de Fsica - Depto. Fsica Matemtica.

    Orientador: Prof. Dr. Victor de Oliveira Rivellesrea de Concentrao: Fsica Matemtica

    Unitermos: 1. Teoria das Cordas; 2. Teoria Quntica deCampos; 3. Sistemas Dinmicos (Fsica Matemtica)

    USP/IF/SBI-066/201

  • Dont just read it; fight it! Ask your own questions, look for your own examples,

    discover your own proofs. Is the hypothesis necessary? Is the converse true? What

    happens in the classical special case? What about the degenerate cases? Where does

    the proof use the hypothesis?

    Paul R. Halmos

    minha v, Maria de Lourdes Nicolay Weber.

  • Agradecimentos

    I dont know half of you half as well as I should like; and I like less than half of you

    half as well as you deserve.

    J.R.R.Tolkien, The Lord of the Rings - The Fellowship of the Ring

    minha famlia, em particular aos meus pais, meus irmos e, principalmente, minha v por terem

    propiciados as condies iniciais e de contorno para que eu pudesse ser quem hoje sou.

    Rebeca e minha segunda famlia.

    Ao professor Luiz Antonio Peresi.

    Ao meu orientador Victor Rivelles.

    Aos meus colaboradores e amigos Arsen Melikyan e Aleksandr Pinzul.

    Aos meus irmos de sina Eliane, Leandro, Rennan e Srgio.

    Aos meus amigos Guilherme, Mrcio, Ncolas, Renato e Thomaz.

    Aos meus irmos em armas Fernando e Yuri e ao meu mestre Min.

    Aos tensores, em particular, ttis, Caio, Chico, Daniel, Dudu, Elisa, Elton, Leonardo, Manu, Pivo,

    Quel, Rafael, Renato, Timpa e Wilson.

    Ao Rone, Laura e Marcela por tornarem a sala 337 um ambiente produtivo e aconchegante.

    Finalmente, FAPESP e ao CNPq pelo apoio financeiro.

  • Resumo

    Nesta tese, estudamos a integrabilidade quntica de modelos contnuos relevantes no contexto

    da quantizao da supercorda do tipo IIB em AdS5S5, e, conseqentemente, de interesse paraa demonstrao e uma melhor compreenso da correspondncia AdS/CFT. Para os modelos de

    Landau-Lifshitz e de Alday-Arutyunov-Frolov, calculamos as amplitudes de espalhamento para trs

    partculas e mostramos a fatorabilidade de suas matrizes S em primeira ordem no-trivial. Propomos

    tambm um novo mtodo para a quantizao de sistemas integrveis contnuos no exemplo do

    modelo de Landau-Lifshitz su(1,1). Nosso mtodo fornece uma soluo alternativa para o problema

    do ordenamento operatorial, bem como uma prescrio para a deduo das identidades de trao e

    do espectro das cargas qunticas conservadas. Ademais, mostramos que, por ser baseado em um

    processo de regularizao e renormalizao operatorial, concomitante construo das extenses

    auto-adjuntas, a integrabilidade preservada durante a quantizao.

  • Abstract

    In this thesis, we study the quantum integrability of continuous models which arise from consis-

    tent truncations of type IIB supertring theory on AdS5S5, and, therefore are relevant for impro-ving our current understanding of the AdS/CFT correspondence. For the Landau-Lifshitz and the

    Alday-Arutyunov-Frolov models, we compute the three-particle scattering amplitude and show the

    factorizability of the corresponding S matrices at the first non-trivial order. We also propose a new

    method for quantizing continuous integrable systems and apply it to the su(1,1) Landau-Lifshitz

    model. Our method provides an alternative solution to the longstanding operator ordering problem

    and gives a prescription to obtain the quantum trace identities, and the spectrum for the higher-order

    local charges. Moreover, since it is based on operator regularization and renormalization, as well as on

    the construction of the self-adjoint extensions, the integrability is preserved during the quantization

    process.

  • Sumrio

    Agradecimentos v

    Resumo vii

    Abstract ix

    Sumrio xi

    Lista de Figuras xv

    I Introduo 1

    1 Motivao 3

    2 Integrabilidade Clssica 13

    2.1 Formalismo Hamiltoniano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    2.2 Geometria Simpltica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

    2.3 Integrabilidade de Liouville . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

    2.4 Integrabilidade na Teoria Clssica de Campos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

    2.4.1 O Modelo de Schrdinger no-linear - Um Exemplo Representativo . . . . . 25

    2.5 A Representao de Lax . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

    2.6 Quantidades Conservadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

    2.6.1 Identidades de Trao para o Modelo NLS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

    2.7 A Matriz r Clssica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

    2.8 O Mtodo do Espalhamento Inverso, o Problema de Riemann-Hilbert e a Linearizao

    das Equaes de Movimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

    3 Integrabilidade Quntica 59

    3.1 O Ansatz de Bethe Coordenado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

    3.2 O Mtodo do Espalhamento Inverso Quntico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68

    3.2.1 Sistemas Integrveis Clssicos Discretos - Uma Pequena Digresso . . . . . 69

    3.2.2 Sistemas Discretos Qunticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71

    3.3 O Ansatz de Bethe Algbrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76

  • xii Sumrio

    3.4 Quantizao de Sistemas Contnuos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80

    3.4.1 As Relaes de Comutao e a Matriz R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

    3.4.2 Coordenadas de ngulo e Ao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88

    3.5 A Equao de Yang-Baxter . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91

    3.5.1 Espalhamento em 1 + 1 Dimenses . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92

    3.6 Fatorabilidade da Matriz S para o NLS via Diagramas de Feynman . . . . . . . . . . 97

    3.6.1 Somando Todos os Diagramas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99

    II O Modelo de Landau-Lifshitz 109

    4 O Modelo de Landau-Lifshitz 111

    4.1 O Modelo de LL Clssico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112

    4.2 O Mtodo do Espalhamento Inverso Clssico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

    4.2.1 Cargas Conservadas Locais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117

    4.3 A Matriz r para o LL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121

    5 Fatorabilidade da Matriz S 123

    5.1 O Modelo de LL como uma Teoria Quntica de Campos . . . . . . . . . . . . . . . 125

    5.1.1 Quantizao do Campo Livre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128

    5.2 Espalhamento de Duas Partculas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131

    5.3 Espalhamento de Trs Partculas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134

    5.3.1 Clculos Diagramticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135

    5.4 Fatorao da Matriz S . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140

    6 Cargas Conservadas e Identidades de Trao 145

    6.1 Quantizao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148

    6.1.1 A Hierarquia dos OperadoresMm . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1546.2 Regularizao dos Operadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155

    6.2.1 Operador de Casimir . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157

    6.2.2 Hamiltoniano F-regularizado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1596.2.3 Espectro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161

    6.2.4 Cargas Conservadas Superiores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163

    6.3 Extenses Auto-Adjuntas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 165

    III O Modelo de Alday-Arutyunov-Frolov 169

    7 O Modelo de Alday-Arutyunov-Frolov 171

    7.1 A Supercorda em AdS5S5 como um Modelo Sigma . . . . . . . . . . . . . . . . 1717.1.1 A lgebra Superconforme . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172

    7.1.2 Graduao Z4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173

    7.1.3 A Supercorda de Green-Schwarz como um Conjunto Quociente . . . . . . . 175

  • Sumrio xiii

    7.1.4 Parametrizao do Conjunto Quociente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 176

    7.1.5 Simetrias Globais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178

    7.2 O Setor su(1|1) da Teoria de Supercordas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1817.2.1 A Lagrangeana do Modelo de Alday-Arutyunov-Frolov . . . . . . . . . . . . 183

    7.2.2 A Hamiltoniana e a Estrutura de Poisson do Modelo de Alday-Arutyunov-Frolov186

    7.2.3 A Conexo de Lax . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187

    8 Fatorabilidade da Matriz S 191

    8.1 O Modelo de AAF como uma Teoria Quntica de Campos . . . . . . . . . . . . . . 192

    8.1.1 Quantizao do Campo de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196

    8.1.2 Espalhamento de Pseudopartculas no Modelo de AAF . . . . . . . . . . . . 200

    8.2 Espalhamento de Duas Pseudopartculas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201

    8.3 Espalhamento de Trs Pseudopartculas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 204

    8.3.1 Clculo Diagramticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205

    8.4 Continuidade das Amplitudes de Espalhamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 210

    8.5 Fatorao da Matriz S . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 212

    8.6 Comentrios Finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215

    Concluso 218

    IV Apndices 219

    A Algumas Demonstraes 221

    A.1 Demonstrao do Teorema de Darboux . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 221

    A.2 Propriedades Analticas da Matriz de Transio para o Modelo NLS . . . . . . . . . 223

    A.3 Admissibilidade do Funcional Gerador das Quantidades Conservadas para o Modelo

    de Schrdinger no-linear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229

    B Matrizes Gama 233

    B.1 SO(4,1) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233

    B.2 SO(5) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 234

    B.3 SO(1,1) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 234

    C Equivalncia de Calibre entre o LL e o NLS 237

    D Integrais Relevantes para o Modelo de Landau-Lifshitz 241

    D.1 Integrais para o Espalhamento de Duas Partculas: Detalhes Computacionais . . . . 242

    D.2 Integrais para o Espalhamento de Trs Partculas: Detalhes Computacionais . . . . . 244

    E Diagramas de Feynman Adicionais para o Modelo de Landau-Lifshitz 247

  • xiv Sumrio

    F Equao de Dirac em Duas Dimenses 251F.1 Solues de Onda Plana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 252

    F.2 Relaes de Ortonormalizao e Completeza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 252

    G Integrais Relevantes para o Modelo de Alday-Arutyunov-Frolov 255G.1 Integrais para o Espalhamento de Duas Pseudopartculas: Detalhes Computacionais 256

    G.2 Integrais para o Espalhamento de Trs Pseudopartculas: Detalhes Computacionais . 258

    H Expresses Relevantes para a Demonstrao da Fatorabilidade da Matriz S no Modelode Alday-Arutyunov-Frolov 263

    Referncias Bibliogrficas 267

    ndice Remissivo 275

  • Lista de Figuras

    1.1 Carter dual das D-branas: (a) hiperplanos onde as cordas abertas se prendem; (b)

    fonte para cordas fechadas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

    1.2 Equivalncia entre as estruturas integrveis no contexto da correspondncia AdS/CFT:

    pelo lado da teoria de calibre, temos cadeias de spin integrveis, enquanto que pelo

    lado da teoria de cordas, temos o modelo sigma para uma corda rodando com alto

    momento angular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

    2.1 Superfcie de nvel. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

    2.2 Uma folha f2n no espao de fase. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

    2.3 Caminho fechado de integrao = 4i=1i . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

    3.1 Representao grfica da matriz S para o espalhamento entre duas partculas em

    uma teoria relativstica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94

    3.2 Usando o operador e iQs para deslocar uma partcula. . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

    3.3 Trs trajetrias possveis para o espalhamento de 3 3 partculas. A igualdade dasamplitudes de espalhamento em (a), (b) e (c) equivale equao de Yang-Baxter

    (3.5.2). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

    3.4 Diagrama de 1-lao para o espalhamento de duas partculas no modelo NLS. . . . . 98

    3.5 Primeira equao integral para T . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100

    3.6 Segunda equao integral para T . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

    3.7 Terceira equao integral para T . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102

    5.1 Interpretao geomtrica do termo de Wess-Zumino. . . . . . . . . . . . . . . . . . 126

    5.2 Prescrio de plos para o propagador do modelo de LL. . . . . . . . . . . . . . . . 128

    5.3 Qualquer ciclo fechado com propagadores orientados na mesma direo se anula

    identicamente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

    5.4 (a) Correes para a energia do estado fundamental; (b) Correes para a funo de

    Green. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130

    5.5 Diagramas do tipo bolha para o espalhamento de duas partculas. . . . . . . . . . . 131

    5.6 Vrtice de interao na representao dos momentos, para a ao truncada at a

    quarta ordem nos campos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131

  • xvi Lista de Figuras

    5.7 Vrtices de interao na representao dos momentos adicionais para a ao truncada

    at a sexta ordem nos campos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135

    5.8 Os diagramas de Feynman para o nvel de rvore para o espalhamento de trs part-

    culas no modelo de LL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 136

    5.9 Representao diagramtica do vrtice de interao no espao dos momentos. . . . 136

    5.10 Representao diagramtica da amplitude de espalhamento em segunda ordem. . . . 137

    5.11 Diagramas de Feynman correspondentes equao (5.3.8a). . . . . . . . . . . . . . 138

    5.12 Diagramas de Feynman para o primeiro termo das equaes (5.3.8a) e (5.3.10) com

    as derivadas explicitamente colocadas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 142

    7.1 Definio do setor su(1|1) na teoria de Supercordas a partir do setor su(1|1) na teoriade calibre dual. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181

    8.1 Vrtices de interao na representao dos momentos. . . . . . . . . . . . . . . . . 195

    8.2 Prescrio de plos para o propagador do modelo de AAF. . . . . . . . . . . . . . . 200

    8.3 Diagrama tipo bolha para o espalhamento de duas pseudopartculas. . . . . . . . . . 201

    8.4 Diagramas de Feynman para a amplitude de espalhamento a 1-lao V (2)1 (k,p). O

    primeiro grfico corresponde ao valor principal da contribuio oriunda dos termos

    com apenas uma contrao, enquanto que o segundo, soma das contribuies das

    funes delta dos termos com apenas uma contrao com as contribuies advindas

    do termo com duas contraes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207

    8.5 Grficos de Feynman correspondentes s amplitudes de 1-lao: (a) V (2)2 (k,p) e

    V(2)

    3 (k,p), (b) V(2)

    4 (k,p). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207

    8.6 Contorno de integrao sobre q0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 210

    A.1 Folheao do espao de fase pelas hipersuperfcies t e s . . . . . . . . . . . . . . 222

    D.1 Disposio dos plos em q0 de (D.1.1) e contorno de integrao. . . . . . . . . . . 243

    D.2 Caminho de integrao para a integral radial. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 245

    E.1 Diagramas de Feynman para o segundo termo da equao (5.3.8a) com as derivadas

    explicitamente colocadas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 247

    E.2 Diagramas de Feynman proporcionais a g22 , correspondendo equao (5.3.8b). . . 248

    E.3 Diagramas de Feynman proporcionais a g23 , correspondendo equao (5.3.8c). . . . 248

    E.4 Diagramas de Feynman proporcionais a g1g2, correspondendo equao (5.3.8d).

    Por simplicidade omitimos os diagramas obtidos por reverso temporal. . . . . . . . 248

    E.5 Diagramas de Feynman proporcionais a g1g3, correspondendo equao (5.3.8e).

    Por simplicidade omitimos os diagramas obtidos por reverso temporal. . . . . . . . 249

    E.6 Diagramas de Feynman proporcionais a g2g3, correspondendo equao (5.3.8f).

    Por simplicidade omitimos os diagramas obtidos por reverso temporal. . . . . . . . 249

    G.1 Disposio dos plos em q0 de (G.1.1) e contorno de integrao. . . . . . . . . . . 257

    G.2 Caminho de integrao para o primeiro termo de (G.2.3). . . . . . . . . . . . . . 259

  • Parte I

    Introduo

  • Captulo 1

    Motivao

    Physics is like sex. Sure, it may give some practical results, but thats not why we

    do it.

    Richard Phillips Feynman

    Dois dos mais desafiadores e importantes problemas da fsica terica contempornea consis-

    tem em compreender apropriadamente a gravitao quntica e as interaes fortes no regime no-

    perturbativo. A teoria de cordas permeia esse contexto de uma forma particularmente interessante e

    no-trivial. De fato, foi inicialmente idealizada, no final da dcada de sessenta, como uma tentativa

    de descrever a fora nuclear forte. Sua formulao, baseada em objetos fundamentais unidimen-

    sionais estendidos, fornecia uma explicao qualitativa de vrios aspectos intrigantes da interao

    forte obtidos experimentalmente, como as trajetrias de Regge, de uma forma surpreendentemente

    elegante. O motivo de tal apelo era o carter unificado da descrio de uma mirade de hdrons

    distintos como apenas diferentes modos vibracionais de um nico objeto fundamental: a corda. No

    entanto, com o advento da cromodinmica quntica (QCD), no incio da dcada de setenta, aliado

    constatao de que a teoria de cordas sofria de alguns problemas tcnicos, bem como era incapaz

    de incorporar o comportamento partnico, evidenciado por novos dados experimentais e explicado

    prontamente pela QCD, fez com que a motivao original por trs dos modelos de cordas russe e o

    interesse por eles desvanecesse.

    Contudo, algumas dessas dificuldades tcnicas que assolavam a teoria de cordas, como a presena

    de partculas sem massa adicionais em seu espectro e a necessidade de um espao-tempo com

    dimesionalidade maior do que quatro para a sua consistncia, e ajudaram a elimina-la como uma

    possvel candidata para a descrio das interaes fortes, foram tambm responsveis por impedir o

    seu completo esquecimento. A presena de uma partcula sem massa e com spin dois no espectro

    da corda fechada indicou a possibilidade da teoria de cordas fornecer uma teoria para a gravitao

    quntica. De fato, a teoria de supercordas fornece, atualmente, o nico arcabouo terico capaz

    de incorporar tanto a gravidade quanto a mecnica quntica de uma forma consistente e livre de

    anomalias [15]. Ademais, a necessidade de dimenses extras fomentou a hiptese de que a teoria

    de cordas no seria apenas uma teoria de gravitao quntica, mas uma teoria unificada de todas as

    interaes e partculas. Esse alumbramento, ocorrido em meados da dcada de oitenta, usualmente

  • 4 Motivao

    conhecida como a primeira revoluo das supercordas.

    Por outro lado, ainda na dcada de setenta, ficou claro que as ferramentas tericas disponveis di-

    ficilmente seriam capazes de fornecer uma soluo para a QCD. Por ser uma teoria assintoticamente

    livre, ou seja, cuja constante de acoplamento efetiva decresce com o aumento da energia, forte-

    mente acoplada a baixas energias, impossibilitando, pois, uma abordagem perturbativa nesse regime.

    Foi sugerido por t Hooft [6] que a QCD, uma teoria de Yang-Mills com grupo de calibre SU(3),

    poderia ser significativamente simplificada caso o posto do grupo calibre1 N fosse suficientemente

    grande, de forma a possibilitar uma expanso em potncias de 1/N. Notadamente, essa expanso

    permite escrever a funo de partio da teoria de calibre como uma soma sobre superfcies com

    caracterstica de Euler :

    Zcalibre =

    NF() com = g2Y MN,

    onde gY M a constante de acoplamento da teoria de calibre e denominada a constante de t

    Hooft. Considerando o limite de t Hooft, que corresponde a tomar N com fixo, verifica-seque os diagramas no-planares2 so suprimidos.

    Surpreendentemente, uma expanso similar tambm aparece naturalmente no contexto da teoria

    de cordas, pois a interao entre cordas, que consiste em junta-las ou separa-las, pode ser interpretada

    como a adio ou remoo de buracos ou alas3 sua folha-mundo. Mais explicitamente,

    Zcordas =

    gs F() com gs = e,

    onde representa o dilton. A analogia com a expanso na teoria de calibre se completa ao identifi-

    carmos o fator 1/N com a constante de acoplamento da teoria de cordas gs . Essa coincidncia entre

    as expanses perturbativas fornece uma das primeiras evidncias em favor de uma dualidade entre

    teorias de cordas e de calibre.

    A descoberta das D-branas, em meados da dcada de noventa, motivou o estudo de efeitos

    no-perturbativos e das dualidades entre as diversas teorias de cordas, levando, assim, a um me-

    lhor entendimento da relao com a teoria de calibre e geometrias associadas a buracos negros.

    Toda essa atividade culminou na unificao das cinco teorias de cordas existentes, no contexto da

    recm proposta teoria M. Esse perodo normalmente conhecido como a segunda revoluo das

    supercordas. As D-branas so slitons da teoria de supercordas e, do ponto de vista da teoria de

    perturbaes, podem ser entendidas simplesmente como as superfcies onde as pontas das cordas

    abertas se prendem [7]. Assim, ao considerarmos um conjunto de N branas coincidentes, as cor-

    das abertas podem comear e terminar em branas distintas, carregando, pois, dois ndices que vo

    de 1 a N. Conseqentemente, a dinmica de baixas energias descrita por uma teoria de calibre

    com grupo U(N) [8]. Essas branas se acoplam aos campos de Ramond-Ramond, que pertencem ao

    multipleto da supergravidade, e, portanto, carregam as respectivas cargas. De forma que, quando

    adicionamos as D-branas, elas geram um fluxo que contribui para o tensor de energia-momento, e,1Claramente, para o caso da QCD N=3.2Aqueles que no podem ser desenhados sobre um plano ou uma esfera.3A caracterstica de Euler de uma superfcie est relacionado com o seu gnero g, o nmero de alas, e o nmero

    de fronteiras (ou buracos) b, atravs da seguinte relao: = 22gb.

  • 5

    N

    (a) (b)

    N

    Figura 1.1: Carter dual das D-branas: (a) hiperplanos onde as cordas abertas se prendem; (b) fontepara cordas fechadas.

    portanto, curvam a geometria. As solues das equaes da supergravidade dotadas de tais fluxos

    so significativamente similares s solues de buracos-negros carregados extremos na relatividade

    geral.

    O passo seguinte foi dado por Maldacena em 1997 com a proposio da correspondncia AdS/CFT,

    que conjectura a equivalncia exata entre a teoria maximalmente supersimtrica de Yang-Mills (N = 4SYM) quadridimensional com grupo de calibre SU(N) e a teoria de supercordas do tipo IIB em

    AdS5S5 [9]4. A motivao para tal dualidade surge ao considerarmos cordas em uma geometriacriada por N D3-branas coincidentes, figura 1.1. Nesse caso, a geometria prxima ao horizonte

    AdS5S5, enquanto que a dinmica de baixas energias no volume-mundo quadridimensional dasbranas descrita por uma teoria de calibre com grupo U(N) e supersimetria N = 4. Essa descriodual admite duas representaes perturbativas vlidas em regimes distintos. Para gsN pequeno5, a

    descrio em termos de uma teoria de campos perturbativa vlida, ao passo que, para gsN grande,

    a descrio gravitacional perturbativa aplicvel, pois o raio de curvatura muito maior do que

    a escala da teoria de cordas. Dessa forma, somos levados naturalmente a supor que a teoria de

    Yang-Mills (no regime de acoplamento forte) descreve a regio prxima do horizonte de uma brana,

    cuja geometria AdS5S5.A correspondncia AdS/CFT o mais notvel exemplo da implementao do princpio hologrfico,

    por meio do qual uma teoria de gravidade quntica pode ser descrita atravs de uma teoria quntica

    de campos, esta ltima definida na fronteira do espao onde vive a teoria de gravitao [14]. Nesse

    caso, o espao quadridimensional da teoria de Yang-Mills corresponde fronteira do espao AdS5,

    enquanto que a esfera est associada simetria interna dos campos de calibre. A idia de holografia

    4Para algumas revises vide [1013].5Quando existem N D-branas coincidentes, o parmetro efetivo de expanso em laos para cordas abertas , de

    fato, gsN, em vez de simplesmente gs .

  • 6 Motivao

    surgiu originalmente do estudo das propriedades termodinmicas de buracos negros, em particular do

    limite de Bekenstein, que afirma que a entropia de um buraco negro proporcional sua rea, e no

    ao seu volume [15].

    A conjectura de Maldacena propem uma relao muito profunda entre as teorias de calibre

    (N = 4 SYM) e a gravitao quntica (supercordas do tipo IIB em AdS5S5), que proporcionou umaforma revolucionria de encarar esses dois problemas fundamentais da fsica terica contempornea.

    Ela estabelece um mapa concreto entre diversos objetos das duas teorias, como, por exemplo, seus

    parmetros livres. Pelo lado da teoria de calibre os dois parmetros livres necessrios so: a constante

    de acoplamento gY M e o nmero de cores6 N, que podem ser combinados na constante de t Hooft,

    = g2Y MN. J pelo lado da teoria de cordas, temos apenas um nico parmetro fundamental7:

    = l2s , onde ls o comprimento caracterstico da corda. A relao explcita entre tais parmetros

    a seguinte:

    4gs = g2Y M =

    Ne

    (R2

    )2= ,

    onde R o raio tanto de S5 quanto de AdS5.

    A N = 4 SYM possui uma funo nula, e por esse motivo constitui uma teoria conforme emquatro dimenses. A lgebra das transformaes conformes, so(4,2), inclui, alm dos geradores de

    Poincar, os geradores das transformaes de escala (dilataes) e os boosts conformes. A super-

    simetria estende a lgebra conforme, para a superconforme, psu(2,2|4), que contm adicionalmenteos geradores de su(4) so(6), e corresponde simetria R. J a teoria de supercordas do tipo IIBem AdS5S5 pode ser formulada como um modelo sigma no-linear com espao alvo dado peloconjunto quociente [16]:

    PSU(2,2|4)SO(4,1)SO(5) .

    Assim, do ponto de vista das simetrias, ambas as teorias so invariantes sob o mesmo supergrupo

    de Lie psu(2,2|4), e, conquanto no seja uma condio suficiente para a sua equivalncia, umacondio necessria.

    importante salientar que apesar de possuir uma estrutura muito semelhante com a QCD, afinal

    ambas so teorias de calibre quadridimensionais renormalizveis, baseadas nos mesmos tipos de

    partculas e interaes, a N = 4 SYM uma teoria muito mais simtrica. Em particular, apresentasupersimetria maximal e simetria conforme, ausentes na QCD. Embora teorias conformes sejam

    necessariamente no massivas, existe uma analogia entre os operadores locais da N = 4 SYM e aspartculas massivas da QCD. Tais operadores locais so compostos pelos campos fundamentais da

    N = 4 SYM atuando sobre um mesmo ponto do espaotempo e, da mesma forma que na QCD,suas cargas de cor so balanceadas, tornando-os pois, objetos invariantes de calibre. Nesse caso,

    a quantidade fisicamente relevante, que substitui a massa, a dimenso de escala dos operadores.

    Classicamente, ela obtida a partir da soma das dimenses dos campos constituintes, e, assim como

    a massa, recebe correes qunticas, as dimenses anmalas. A despeito de todas essas diferenas, a

    correspondncia AdS/CFT, por meio da N = 4 SYM, tem fornecido novas ferramentas que levaram

    6Posto do grupo de calibre.7Lembre-se que a constante de acoplamento gs o valor esperado do dlaton no vcuo, e, por isso no constitui

    um parmetro fundamental.

  • 7

    a compreenso de fenmenos fundamentais que permeiam tais sistemas fortemente acoplados, mas

    que no dependem muito dos detalhes da teoria especfica.

    Nesse contexto, o operador de dilatao assume um papel proeminente, correspondendo ao Ha-

    miltoniano na quantizao radial8. Os autovalores do operador de dilatao fornecem as dimenses

    de escala dos operadores locais de uma teoria com invarincia conforme, e so os nicos rtulos de

    uma representao (super-)conforme a poderem depender continuamente dos parmetros do mo-

    delo. Pelo lado da teoria de cordas, as quantidades de interesse fsicos so as energias dos diversos

    estados. De acordo com a verso mais geral da dualidade AdS/CFT os estados fsicos das teorias

    de cordas e calibre esto organizados no mesmo conjunto de multipletos de psu(2,2|4), de formaque as dimenses de escala dos operadores na teoria de calibre devem coincidir exatamente com as

    energias dos estados correspondentes na teoria de cordas.

    O grande poder preditivo da conjectura AdS/CFT advm do fato de que ela relaciona o limite de

    acoplamento fraco de uma teoria com o limite de acoplamento forte da outra. Portanto, torna-se

    possvel utilizar mtodos perturbativos em um dos lados da dualidade para se obter informaes sobre

    o regime no-perturbativo do outro. Desse ponto de vista, a correspondncia proporciona duas des-

    cries complementares de um mesmo sistema. Conseqentemente, problemas difceis de se estudar

    em uma descrio so, s vezes, fceis de se abordar na outra. Contudo, essa complementaridade

    de descries introduz uma grande dificuldade na verificao da validade da conjectura, dado que

    uma comparao direta entre os resultados obtidos em ambos os lados no geralmente poss-

    vel, em virtude das limitaes impostas pela natureza perturbativa dos mtodos disponveis. Dessa

    forma, grande parte da pesquisa inicial, concentrou-se no estudo de estados especiais (estados BPS),

    que por no receberem correes qunticas, em virtude da supersimetria, podiam ser diretamente

    computados em ambos os lados, fornecendo os primeiros testes da validade da dualidade.

    Em 2002, Berenstein, Maldacena e Nastase [17] consideraram excitaes ao redor de uma confi-

    gurao de cordas em forma de ponto que se movia com grande momento angular sobre um equador

    de S5. Nesse limite (limite de BMN), o fundo sentido pela corda corresponde a uma geometria de

    ondas planas, que permite uma quantizao exata da teoria. Assim, com o conhecimento do espec-

    tro exato da teoria de cordas, foi possvel inferir as dimenses de escala dos operadores na teoria de

    calibre. Esses resultados foram confirmados, atravs do clculo direto das dimenses de escala nas

    primeiras ordens [18]. Todavia, um progresso considervel tanto na demonstrao da validade de

    tal conjectura, quanto no entendimento das teorias de cordas e de calibre, foi apenas obtido com o

    descobrimento de estruturas integrveis em ambos os lados da dualidade9.

    Sistemas integrveis [2023] formam uma das mais fascinantes reas da fsica terica e da mate-

    mtica aplicada, o crescente interesse em sistemas completamente solveis proporcionou um rpido

    desenvolvimento e uma vasta aplicabilidade de seus mtodos. Partindo do estudo de ondas solitrias

    (slitons) em guas rasas e aspectos clssicos de equaes diferenciais parciais no-lineares integr-

    veis, a rea se expandiu, e hoje permeia muitos campos da fsica como, para citar apenas alguns, a

    fsica da matria condensada e a fsica de partculas elementares. Em suma, o conceito de integrabi-

    8O esquema de quantizao no qual os parnteses de Poisson so calculados na hipersuperfcie de mesma coordenadaradial.

    9Para uma reviso compreensiva da extensa (e crescente) literatura a respeito da aplicao da integrabilidade nocontexto da correspondncia AdS/CFT, vide [19]

  • 8 Motivao

    lidade corresponde s condies necessrias para que um dado sistema dinmico seja analiticamente

    solvel, incluindo tambm mtodos para obter tais solues e suas propriedades.

    Modelos integrveis so, em geral, caracterizados pela existncia de infinitas quantidades conser-

    vadas. Na mecnica clssica, por exemplo, a existncia de um nmero10 suficiente de integrais de

    movimento permite a introduo das variveis de ngulo e ao, e conseqente soluo das equaes

    de movimento por meio de quadraturas. J no contexto quntico, para teorias em (1+1) dimenses,

    a existncia de infinitas leis de conservao restringe severamente a forma da matriz S [24,25]. Em

    particular, o espalhamento em teorias integrveis qunticas fatorvel, ou seja, a matriz S para o

    espalhamento de n corpos dada simplesmente pelo produto de matrizes S para o espalhamento de

    duas partculas. Alm do mais, no decorrer de tal espalhamento no h produo nem aniquilao de

    partculas, e o conjunto inicial de momentos coincide com o final. Dessa forma, no surpreendente

    que se possa calcular a matriz S exatamente, bem como obter o espectro das excitaes, atravs da

    diagonalizao simultnea de todas as cargas conservadas.

    Pelo lado da teoria de calibre, a integrabilidade forneceu mtodos para o clculo da dimenso

    anmala de operadores locais no limite planar da N = 4 SYM, posto que, nesse caso, o operador dedilatao pode ser mapeado na Hamiltoniana de uma cadeia de spins integrvel [26, 27]. Enquanto

    que pelo lado da teoria de cordas, a estrutura integrvel relevante surgiu do modelo sigma para

    uma corda rodando com alto momento angular [2830]. Impressionantemente, uma equivalncia

    detalhada entre tais estruturas foi encontrada, apesar de se ter um modelo quntico discreto em

    um dos lados e um modelo contnuo clssico do outro [31], vide figura 1.2. O trabalho de Bena,

    Polchinski e Roiban [32] revelou a presena de simetrias yangianas, relacionadas com a existncia

    de um nmero infinito de correntes conservadas, e, por conseginte estabeleceu a integrabilidade

    clssica do modelo sigma de cordas. Ao se perceber que a integrabilidade se estende a todos os

    operadores da N = 4 SYM em primeira ordem [27], bem como tal resultado permanece vlido paraas duas ordens seguintes [18], foi proposto que a integrabilidade deveria ser uma propriedade exata.

    Ademais, as estruturas integrveis descobertas perturbativamente em ambos os lados da dualidade

    seriam manifestaes de um mesmo objeto no-perturbativo.

    Logo, para um melhor entendimento da correspondncia AdS/CFT necessrio quantizar a teoria

    de supercordas em AdS5S5, a qual, conquanto um modelo classicamente integrvel, resistiu a todasas tentativas de quantizao atravs dos mtodos convencionais desenvolvidos na teoria de sistemas

    integrveis qunticos, em particular no contexto do mtodo do espalhamento inverso quntico [33,

    34]. Notamos, contudo, que a integrabilidade quntica da teoria de cordas em AdS5S5 tem sidouma hiptese corriqueira para permitir diversos avanos como o clculo das relaes de disperso para

    excitaes elementares e da matriz S descrevendo o seu espalhamento [13,35]. Tais dificuldades no

    so exclusividade da teoria de cordas, aparecendo tambm em vrios outros modelos relevantes,

    como, por exemplo, o modelo principal quiral, o modelo de sine-Gordon e o modelo de Landau-

    Lifshitz. Dentre elas, uma das mais crticas relativa presena de termos no-ultralocais, ou seja,

    proporcionais a,

    () ,

    10Esse nmero corresponde aos graus de liberdade do sistema, caso ele seja finito.

  • 9

    t

    S3 AdS5

    S5

    Figura 1.2: Equivalncia entre as estruturas integrveis no contexto da correspondncia AdS/CFT:pelo lado da teoria de calibre, temos cadeias de spin integrveis, enquanto que pelo lado da teoria decordas, temos o modelo sigma para uma corda rodando com alto momento angular.

    que, em geral, impossibilitam a aplicao do mtodo do espalhamento inverso [2023].

    bem sabido que modelos contnuos proporcionam um problema de quantizao severamente

    mais complicado do que suas contrapartes discretas. Isso se deve presena de divergncias advindas

    de um produto mal definido de operadores atuando sobre um mesmo ponto, que no caso de sistemas

    discretos so suavizadas pelo espaamento da rede. Apesar de existirem diversas tcnicas de discre-

    tizao, as quais podem no ser diretamente aplicveis ao j mais complexo modelo sigma de cordas,

    elas, em geral, levam a resultados sensivelmente complicados [36], envolvendo operadores no-locais.

    Portanto, se estamos interessados em estender a correspondncia entre as estruturas integrveis no

    contexto da dualidade AdS/CFT alm do limite de cordas com grande momento angular, precisamos

    aprender a lidar diretamente com modelos integrveis qunticos contnuos. Um primeiro passo nessa

    direo foi dado em [37], onde propusemos um novo mtodo para a quantizao de modelos inte-

    grveis contnuos no exemplo representativo do modelo isotrpico su(1,1) de Landau-Lifshitz (LL),

    sem recorrer a nenhum esquema de discretizao.

    Alternativamente, possvel estudar a integrabilidade quntica de um dado modelo, ao consider-

    lo como uma teoria de campos bidimensional e testar a fatorabilidade de sua matriz S por meio de

    clculos perturbativos. A fatorabilidade da matriz S [24, 25] uma propriedade fundamental dos

    modelos integrveis qunticos, e um dos princpios que permitem preservar a integrabilidade de uma

    teoria durante a sua quantizao. Sua relao com o mtodo do espalhamento inverso quntico

    bem conhecida [38], contudo at recentemente, tenha sido apenas verificada para o caso mais simples

    do modelo no-linear de Schrdinger (NLS) [39]. No obstante, essa tcnica tem sido amplamente

    utilizada no contexto da dualidade AdS/CFT para a obteno da matriz S e das equaes de Bethe

    a partir da hiptese de integrabilidade quntica [35, 40]. Dessa forma, torna-se pois, imperativa a

  • 10 Motivao

    verificao da fatorabilidade da matriz S para tais modelos. Interessantemente, a demonstrao

    dessa propriedade requer um intrincado mecanismo de cancelamentos entre amplitudes advindas de

    diferentes ordens [41,42].

    Uma oportunidade particularmente interessante de se abordar a quantizao da teoria de super-

    cordas em AdS5S5 consiste em estudar os modelos oriundos de seus truncamentos consistentesa subsetores que sejam duais a setores fechados da teoria de calibre [35, 41, 42]. Espera-se que

    tais modelos percam algumas das propriedades interessantes da teoria completa, como a invarincia

    conforme e a renormalizabilidade, contudo a integrabilidade clssica deve persistir. Dessa forma, os

    modelos resultantes, apesar de mais simples, devem ainda propiciar exemplos representativos das di-

    ficuldades associadas quantizao da teoria de cordas. Nesse contexto dois modelos sobressaem: o

    modelo su(2) de LL e o modelo de Alday-Arutyunov-Frolov (AAF) [43], que surgem, respectivamente,

    dos truncamentos consistentes aos setores su(2) e su(1|1).

    Tanto o modelo su(2) de LL quanto o de AAF constituem exemplos formidveis das dificuldades

    associadas quantizao de sistemas integrveis contnuos. Notadamente, a formulao do mtodo

    do espalhamento inverso quntico exige uma definio cuidadosa dos operadores qunticos, de forma

    a evitar as singularidades inerentes s lgebras operatoriais de tais modelos, bem como a correta

    reconstruo dos espaos de Hilbert [37, 44]. Alm disso, interessante ressaltar que o modelo

    de AAF o primeiro exemplo de um modelo integrvel ferminico no-trivial, que apresenta uma

    estrutura no-linear e singular.

    Esta tese est organizada da seguinte maneira. No restante da parte I, fazemos uma reviso

    dos conceitos bsicos relacionados integrabilidade clssica e quntica. No captulo 2, considera-

    mos a integrabilidade clssica, inicialmente no contexto da mecnica clssica, em sistemas com um

    nmero (n) finito de graus de liberdade, introduzimos o conceito de integrabilidade de Liouville e

    demonstramos que suas equaes de movimento so solveis por quadraturas, se existirem n quan-

    tidades conservadas e independentes em involuo. Ademais estabelecemos a relao entre essas

    quantidades e as variveis de ngulo e ao. A seguir, generalizamos o conceito de integrabilidade

    para sistemas com um nmero infinito de graus de liberdade, de forma a podermos analisar teorias

    de campos clssicas. Apresentamos o modelo de Schrdinger no-linear (NLS), a teoria de campos

    clssica mais completamente estudada, com a qual ilustramos todos os conceitos importantes. A

    partir da representao de Lax, construmos a matriz de transio e mostramos como as infinitas

    cargas conservadas podem ser extradas ao considerarmos o seu trao. Em particular, para o modelo

    NLS obtemos, explicitamente, as identidades de trao. Para verificar se as integrais de movimento

    assim obtidas esto em involuo empregamos o formalismo da matriz r . Finalizamos esse captulo

    com uma discusso sobre a existncia de um mapa injetor responsvel por linearizar as equaes

    de movimento e introduzimos os conceitos essenciais do mtodo do espalhamento inverso clssico

    (MEIC).

    No captulo 3 abordamos a difcil questo de estender o conceito de integrabilidade ao contexto

    quntico. Comeamos discutindo o Ansatz de Bethe coordenado (ABC), que usamos para diago-

    nalizar o Hamiltoniano da verso quntica do modelo NLS e assim inferir o seu espectro. A seguir,

    desenvolvemos o mtodo do espalhamento inverso quntico (MEIQ), que combina idias do MEIC

    com as do ABC para fornecer uma abordagem mais sistemtica para se obter as autofunes e seus

  • 11

    respectivos autovalores. Inicialmente, consideramos sistemas discretos, para os quais desenvolvemos

    o Ansatz de Bethe algbrico (ABA). E posteriormente para modelos contnuos, no exemplo do modelo

    NLS, exibimos as construes necessrias para se obter o equivalente quntico das coordenadas de

    ngulo e ao e as quantidades conservadas. Comentamos as dificuldades associadas a deduo das

    cargas conservadas de ordem superior e sua relao com a incapacidade do ordenamento de Wick em

    fornecer uma soluo para o problema do ordenamento de operadores. Discutimos tambm o papel

    desempenhado pela equao de Yang-Baxter no contexto do espalhamento de partculas em teorias

    de campos em 1 + 1 dimenses. Finalmente, baseados nessas idias estabelecemos a integrabilidade

    quntica do modelo NLS, ao demonstrarmos a fatorabilidade de sua matriz S, com o uso de uma

    abordagem perturbativa baseada em diagramas de Feynman.

    Nas partes II e III apresentamos material original, baseados nos artigos [41], [37] e [42].

    Na parte II, estudamos o modelo de Landau-Lifshitz (LL), que descreve a cadeia contnua de spins

    de Heisenberg, e, mais recentemente, surgiu no contexto da correspondncia AdS/CFT como uma

    das primeiras evidncias da estrutura integrvel subjacente. Estamos particularmente interessado

    na verso que aparece no subsetor RS3 da supercordas em AdS5S5 no limite de momentoangular grande. No captulo 4, apresentamos o modelo de LL clssico em suas diferentes verses:

    anisotrpica e isotrpica, su(2) e su(1,1). Aplicamos o MEIC para as duas verses isotrpicas:

    su(2) e su(1,1) e comentamos sobre a equivalncia de calibre entre o LL e o NLS. No captulo

    5, baseado na publicao [41], consideramos o modelo de LL isotrpico su(2) como uma teoria de

    campos, conforme obtido a partir da teoria de cordas. Examinamos a quantizao do campo livre e

    constatamos propriedades interessantes relacionadas com o carter no-relativstico do modelo, que

    permitem o clculo exato da matriz S para o espalhamento da duas partculas. A seguir, com o

    intuito de sondar a integrabilidade quntica do modelo, estudamos o espalhamento de trs partculas

    e conclumos que, devido a um intrincado esquema de cancelamentos, a matriz S fatorvel na

    primeira ordem no trivial.

    No captulo 6, baseado em [37], consideramos em detalhe a quantizao do modelo de LL. Con-

    sideramos apenas a verso hiperblica (su(1,1)) do modelo de LL, uma vez que s ela admite uma

    quantizao consistente com respeito ao vcuo ferromagntico. Discutimos minuciosamente o pro-

    cedimento de regularizao e renormalizao dos campos necessrio para definir consistentemente o

    produto de operadores atuando sobre um mesmo ponto, bem como a estrutura algbrica resultante

    e demonstramos a integrabilidade quntica do modelo. Com os operadores qunticos devidamente

    regularizados podemos prosseguir com a construo das cargas conservadas, sua conseqente diago-

    nalizao e a deduo das identidades de trao. Explicamos em que sentido o nosso mtodo pode ser

    considerado como uma alternativa ao processo de discretizao e estabelecemos uma conexo expl-

    cita com o MEIQ. Finalmente, consideramos a construo das extenses auto-adjuntas das cargas

    conservadas.

    Na parte III, analisamos o modelo de ALday-Arutyunov-Frolov (AAF). No captulo 7, fazemos

    uma breve reviso de alguns fatos relevantes sobre a formulao da teoria de supercordas do tipo

    IIB em AdS5S5 como um modelo sigma. De forma a podermos proceder com a reduo ao setorsu(1|1) para obtermos o modelo de AAF. Discutimos tanto a sua formulao Lagrangeana, quantoHamiltoniana. Finalmente, exibimos a representao de Lax para o modelo de AAF, obtida por um

  • 12 Motivao

    processo de reduo semelhante, a partir do par de Lax para o modelo de cordas, e, assim, estabele-

    cemos a sua integrabilidade clssica. No captulo 8, baseado na publicao [42], discutimos o modelo

    de AAF como uma teoria de campos quntica e preparamos todo o ferramental necessrio para o

    clculo das amplitudes de espalhamento de duas e trs partculas. Fornecemos uma deduo baseada

    em mtodos tradicionais da matriz S para os setores com duas e trs partculas e demonstramos a

    sua fatorabilidade na primeira ordem no trivial.

    Na concluso, coletamos os principais resultados obtidos. Relegamos aos apndices A-H todos

    os detalhes tcnicos pertinentes que no foram exibidos no texto principal.

  • Captulo 2

    Integrabilidade Clssica

    Begin at the beginning, the King said gravely, and go on till you come to the end:

    then stop.

    Lewis Carroll, Alices Adventures in Wonderland

    No contexto de sistemas dinmicos, o conceito de integrabilidade est relacionado com a exis-

    tncia de folheaes invariantes e regulares da variedade na qual o sistema est definido. Uma

    n-folheao de uma variedade m-dimensional M pode ser entendida como uma coleo Mi de subva-

    riedades n-dimensionais de M, conexas e disjuntas aos pares, denominadas folhas da folheao de M,

    de forma que, para cada ponto x M, exista uma carta (U,), com x U e tal que para cada folhaMi a intersecoMi U seja vazia ou uma coleo contvel de subespaos n-dimensionais afins, cujasltimas m n coordenadas sejam constantes. Assim, uma folheao regular e invariante aquelacujas folhas so variedades imersas de menor dimenso possvel que so invariantes sob o fluxo.

    Para o caso particular de sistemas Hamiltonianos, o conceito de integrabilidade admite um refi-

    namento relacionado ao teorema de Liouville, a saber, podemos relacionar a existncia de folheaes

    invariantes e regulares com a existncia de um conjunto maximal de invariantes em involuo com

    respeito a lgebra de Poisson do sistema. Tais invariantes em involuo, so fisicamente mais re-

    levantes, uma vez que correspondem s integrais de movimento do sistema, como por exemplo a

    energia e o momento. Com a ajuda delas possvel, atravs de quadraturas, encontrar solues

    explcitas das equaes de movimento. No que se segue, vamos expor um tratamento simplificado e

    sucinto que permite ao leitor vislumbrar essa conexo.

    2.1 Formalismo Hamiltoniano

    Na mecnica clssica, o movimento de um sistema descrito por uma trajetria imersa no espao

    de fase, que , em geral, um espao de dimenso par, descrito por coordenadas de posio e momento.

    Por concreteza, consideramos um sistema com n graus de liberdade (n finito) descrito por um espao

    de fase 2n, com coordenadas locais:

    = (pi ,qi) , i = 1, . . . ,n.

  • 14 Integrabilidade Clssica

    Dessa forma, o espao de fase corresponde, localmente, a um conjunto aberto de R2n, mas que

    globalmente pode apresentar uma topologia no-trivial, como por exemplo, a de uma esfera, ou a de

    um toro. As variveis dinmicas so funes f : 2nRR, de forma que f = f (p,q,t), onde t umparmetro especial, denominado tempo. Sejam duas tais funes, f ,g : 2nR R, introduzimosos parnteses de Poisson de f e g como a seguinte funo:

    {f ,g} :=n

    k=1

    f

    pk

    g

    qkf

    qk

    g

    pk. (2.1.1)

    Claramente, os parnteses de Poisson (2.1.1) so antissimtricos:

    {f ,g}={g, f } ,

    e satisfazem a identidade de Jacobi:

    {f ,{g,h}}+{g,{h, f }}+{h,{f ,g}}= 0.

    Ademais, dizemos que duas funes f e g esto em involuo, se satisfazem:

    {f ,g}= 0.

    Claramente, as coordenadas locais satisfazem os parnteses de Poisson cannicos:

    {pi ,pj}= 0, {qi ,qj}= 0, {pi ,qj}= i j . (2.1.2)

    Dada uma Hamiltoniana H(p,q,t), que, em geral, independe do tempo, a dinmica do sistema

    determinada pela seguinte equao diferencial:

    df

    dt=f

    t+{H,f } , f = f (p,q,t). (2.1.3)

    Fixando f = pi ou f = qi , obtemos as equaes de Hamilton

    qi =H

    pi, pi =

    H

    qi, (2.1.4)

    que compem um sistema de equaes diferenciais de primeira ordem1. O sistema (2.1.4) deter-

    minstico, uma vez que as coordenadas generalizadas a um tempo arbitrrio (t) so univocamente

    determinadas pelas 2n condies iniciais (0). Alm disso, os elementos de volume no espao de fase

    so conservados.

    Definio 2.1.1. Uma funo f : 2nR R dita ser uma constante do movimento2 se satisfizerf = 0, quando as equaes de Hamilton (2.1.4) forem vlidas. Equivalentemente, f

    (p(t),q(t), t

    )=

    c , onde c uma constante, se p(t) e q(t) forem solues de (2.1.4).

    Naturalmente, quando encontramos um sistema de equaes diferenciais como (2.1.4), perguntamo-

    1Onde denotamos as derivadas temporais por um ponto.2Ou uma carga conservada, ou uma primeira integral, ou uma integral do movimento,. . .

  • 2.2 Geometria Simpltica 15

    f(p, q) = c

    Figura 2.1: Superfcie de nvel.

    nos se existem solues, se sim, quantas e como construi-las. Em geral, o sistema (2.1.4) solvel

    se existe um nmero suficiente de integrais de movimento, pois cada uma elimina uma equao dife-

    rencial. Suponha, por exemplo, que exista uma carga conservada f que no dependa explicitamente

    do tempo e que defina uma hipersuperfcie f (p,q) = c em 2n, com c constante, vide figura 2.1.

    Duas hipersuperfcies correspondentes a cargas conservadas independentes se interceptam em uma

    superfcie com codimenso 2 em 2n. De maneira geral, a trajetria descrita sobre uma superfcie

    com dimenso 2nL, onde L o nmero de integrais do movimento independentes, se L= 2n1essa superfcie uma curva e uma soluo de (2.1.4).

    Assim, o problema de construir uma soluo de (2.1.4) reduzido construo dessas hipersu-

    perfcies, mas para isso necessrio encontrar um nmero correspondente de cargas conservadas. De

    fato, dadas duas integrais de movimento independentes, que no dependam explicitamente do tempo,

    sempre podemos usar seus parnteses de Poisson para definir uma terceira constante do movimento.

    O teorema de Noether, por sua vez, fornece algumas primeiras integrais, relacionadas s simetrias do

    sistema. Contudo, as cargas conservadas obtidas dessa maneira no so, em geral, suficientes para

    prosseguirmos.

    2.2 Geometria Simpltica

    Existe uma forma natural de se estender o formalismo Hamiltoniano ao se generalizar o conceito de

    parnteses de Poisson (2.1.1). Uma abordagem mais geomtrica da mecnica clssica, fornecida pela

    geometria simpltica [45,46], permite uma melhor compreenso dos sistemas integrveis. Considere,

    ento, o conjunto das funes diferenciveis no espao de fase 2n e denote por F(2n), a lgebrade tais funes. Definimos, pois, o conceito de parnteses de Poisson:

    Definio 2.2.1. Os parnteses de Poisson so uma derivao bilinear e antissimtrica da lgebraF(2n) : { , } : F(2n)F(2n)F(2n) tal que:

  • 16 Integrabilidade Clssica

    Antissimetria: {f1, f2}={f2, f1};

    Linearidade: {f1,af2 +bf3}= a{f1, f2}+b{f1, f3}, com a,b constantes;

    Regra de Leibnitz: {f1, f2f3}= {f1, f2}f3 + f2{f1, f3};

    Identidade de Jacobi: {f1,{f2, f3}}+{f2,{f3, f1}}+{f3,{f1, f2}}= 0.

    Dado que os parnteses de Poisson so lineares em suas entradas e satisfazem a regra de Leibnitz,

    para cada funo H F(2n) podemos associar um campo vetorial XHf = {H,f } em 2n. Se H fora Hamiltoniana do sistema, esse campo define a evoluo temporal de f :

    f =XHf = {H,f }, f F(2n). (2.2.1)

    Assim, podemos definir o conceito de variedade de Poisson.

    Definio 2.2.2. Uma variedade 2n na qual um parnteses de Poisson est definido dita umavariedade de Poisson.

    Uma das mais importantes propriedades dos parnteses de Poisson no contexto da mecnica

    clssica que se f1 e f2 forem quantidades conservadas, ou seja,

    {H,f1}= 0 e {H,f2}= 0,

    ento {f1, f2} tambm conservada em virtude da identidade de Jacobi. Em geral, os parntesesde Poisson so degenerados, ou seja, existem funes fi F(2n) tais que {fi ,g}= 0 para qualquerg F(2n). O conjunto dessas funes fi denominado centro da lgebra de Poisson. Se o centrofor no-trivial, isto , se pelo menos uma dessas fi no for uma funo constante, possvel reduzir

    o sistema dinmico em questo, ao impor que todas as funes do centro sejam iguais a valores

    constantes. Esse procedimento define uma folheao de 2n e os parnteses de Poisson em cada

    folha so no-degenerados.

    Para um dado sistema local de coordenadas x i de 2n podemos escrever:

    {f1, f2}2n = Pi j(x)

    f1x i

    f2x j

    . (2.2.2)

    A antissimetria dos parnteses de Poisson impem que:

    P i j(x) =P j i(x),

    enquanto que a identidade de Jacobi assume a seguinte forma:

    P issPjk +P kssP

    i j +P jssPki = 0.

    Um caso de especial interesse ocorre quando P i j inversvel, implicando, em particular, que o centro

    da lgebra de Poisson trivial e que a dimenso da variedade seja par. Denotando a inversa de P i j

  • 2.2 Geometria Simpltica 17

    por (P1)i j , temos que sP i j =P ias(P1)abP bj , que inserido na identidade de Jacobi fornece:

    P isP jaP kb(s(P

    1)ab +b(P1)sa +a(P

    1)bs)

    = 0

    s(P1)ab +b(P1)sa +a(P1)bs = 0,

    onde usamos o fato de que P i j inversvel. Essas condies garantem a existncia de uma 2-forma

    fechada:

    =1

    2(P1)i jdx

    i dx j , (2.2.3)

    ou seja, tal que d = 0. Essa 2-forma invariante sob transformaes de coordenadas, e por isso

    globalmente definida em 2n.

    Definio 2.2.3. Seja 2n uma variedade diferencivel com dimenso par. Uma estrutura simplticaem 2n dada por uma 2-forma diferencial fechada e no-degenerada :

    d = 0 e 6= 0 : (,) 6= 0, , Tx2n.

    O par (2n,) denominado uma variedade simpltica.

    No contexto de variedades simplticas existe um isomorfismo natural entre campos vetoriais e

    1-formas estabelecido pela estrutura simpltica. Sejam V(2n) e r (2n), o conjunto de todos oscampos vetoriais e o espao vetorial de todas as r -formas diferenciais, respectivamente, em 2n, e

    considere o produto interior associado a um vetor arbitrrio V(2n), i : r (2n) r1(2n).Assim, para cada vetor V(2n) podemos associar a seguinte 1-forma atravs da estrutura simpl-tica:

    7 i = (, ).

    Portanto, estabelecemos um isomorfismo entre V(2n)1(2n). Com esse isomorfismo podemosintroduzir o campo vetorial Hamiltoniano associado funo f F(2n), Xf , implicitamente por:

    iXf = (Xf , ) =df .

    Em termos das coordenadas locais x i em 2n, temos:

    =1

    2i jdx

    i dx j ,

    Xf =Xif i =

    i jj f , (2.2.4)

    com i j = (i j)1. Conseqentemente, com o conhecimento da forma simpltica , podemos re-

    construir os parnteses de Poisson:

    {f1, f2}=Xf1 (f2) =Xf2 (f1) = (Xf1 ,Xf2 ), (2.2.5)

    ou, em componentes:

    {f1, f2}=i ji f1j f2.

    Outro conceito importante que pode ser construdo em um espao simpltico o de transforma-

  • 18 Integrabilidade Clssica

    es simplticas, para isso considere uma bijeo : 2n 2n, a transformao da forma simpltica sob :

    ()m(V,W ) = (m)(V,W ),

    onde m 2n e o diferencial de , levando um vetor tangente em m em um vetor tangente em(m). Diz-se que a transformao simpltica se = , isto , uma transformao simpltica

    aquela que preserva a forma simpltica. Para uma transformao infinitesimal, especificada por

    um vetor X em 2n, e essa condio equivalente a LX = 0, com LX = diX + iXd sendo a derivadade Lie. Com respeito aos parnteses de Poisson a condio de simpleticidade de uma transformao

    adquire a seguinte forma:

    {f1, f2}= {f1,f2}.

    Proposio 2.2.4. Qualquer fluxo Hamiltoniano uma transformao simpltica.

    Demonstrao: Seja H uma hamiltoniana e XH o campo vetorial associado, tal que iXH = dH,ento:

    LXH = (iXHd +diXH) = d(iXH) =d2H = 0.

    Exemplo 2.2.5. O exemplo mais simples de um espao simpltico dado por 2n = R2n com ascoordenadas cannicas = (pi ,qi) e a seguinte forma simpltica:

    = dpi dqi .

    De forma que para duas funes quaisquer f (pi ,qi) e g(pi ,qi) definidas no espao de fase, os parn-

    teses de Poisson podem ser escritos em termos das coordenadas cannicas como (2.1.1). Por sua

    vez, o campo vetorial Hamiltoniano associado a uma funo f F(2n) dado por:

    Xf =f

    qipi +

    f

    piqi .

    De fato, esse exemplo bem geral, uma vez que, pelo menos localmente, o teorema de Darboux

    garante tal construo.

    Teorema 2.2.6. Em qualquer variedade simpltica (2n,) possvel introduzir, localmente ao redorde um ponto m0, coordenadas cannicas = (pi ,qi) tais que = dpi dqi . Alm do mais, possvelescolher p1 como qualquer funo H em 2n tal que dH(m0) 6= 0.

    A demonstrao desse teorema se encontra no apndice A.1.

    2.3 Integrabilidade de Liouville

    Em virtude da equao (2.2.1) fica claro que a Hamiltoniana uma quantidade conservada

    sob a evoluo temporal, de forma que o movimento ocorre em uma subvariedade do espao de

    fase definida por H = E, onde E uma constante. Sistemas dinmicos descritos pelas (2.1.4)

    no so exatamente solveis em geral, contudo para uma certa classe desses sistemas, conhecidos

  • 2.3 Integrabilidade de Liouville 19

    como sistemas integrveis no sentido de Liouville, solues explcitas podem ser obtidas por meio de

    quadraturas. Antes de formularmos precisamente esses conceitos, instrutivo considerar um exemplo

    ilustrativo de modo a melhor compreender a geometria da situao.

    Exemplo 2.3.1. O Oscilador Harmnico: Considere o espao de fase bidimensional parametrizadopelas coordenadas cannicas = (p,q), de modo que a Hamiltoniana assume a seguinte forma:

    H =1

    2(p2 +2q2),

    com os parnteses de Poisson dados por:

    {p,q}= 1.

    O espao de fase fibrado em elipses H = E, com exceo do ponto (0,0), que estacionrio. Um

    outro sistema de coordenadas melhor adaptado ao oscilador harmnico (,):

    p = cos e q =

    sin, (2.3.1)

    com os seguintes parnteses de Poisson no-nulos:

    {,}=

    .

    Nessas coordenadas podemos escrever o fluxo como:

    =

    2E, = t+ 0,

    ou seja, o fluxo ocorre nas elipses descritas acima.

    No complicado generalizar esse resultado para a soma direta de n osciladores harmnicos, cuja

    Hamiltoniana dada por:

    H =1

    2

    n

    i=1

    (p2i +2i q

    2i ),

    com parnteses de Poisson dados pela equao (2.1.2). Agora, existem n quantidades conservadas

    em involuo, Fi = 12 (p2i +

    2i q

    2i ), e a variedade de nvel

    f2n = { 2n : Fi = fi} um toro real

    n-dimensional. O movimento ocorre nesses toros, que folheiam o espao de fase. tambm possvel

    introduzir n ngulos i , que assim como no caso unidimensional, evoluem linearmente no tempo com

    freqncias i .

    Inspirados pelo exemplo 2.3.1 introduzimos o conceito de integrabilidade no sentido de Liouville:

    Definio 2.3.2. Um sistema dinmico Hamiltoniano definido em uma variedade simpltica (2n,)com Hamiltoniana H integrvel no sentido de Liouville, se existirem n funes independentes Fi ,

    i = 1, . . . ,n tais que:

    1. {H,Fi}= 0;

    2. {Fi ,Fj}= 0.

  • 20 Integrabilidade Clssica

    A condio 1 da definio 2.3.2 implica que as funes Fi so conservadas com respeito aofluxo do campo vetorial Hamiltoniano, enquanto que a condio 2 demanda que tais funes estejam

    em involuo. J a independncia dessas funes significa que, para um ponto qualquer do espao

    de fase, os dFi so linearmente independentes, o que equivale ao fato de que o espao tangente

    superfcie Fi = fi existe para todos os pontos e sua dimenso n. Notamos que no podem

    existir mais do que n quantidades conservadas independentes em involuo, pois caso contrrio os

    parnteses de Poisson seriam degenerados, o que incompatvel com a condio de que o espao de

    fase seja uma variedade simpltica. A Hamiltoniana H deve depender das coordenadas do sistema,

    que em virtude do teorema de Darboux, podem ser tomadas, ao menos localmente, como = (pi ,qi),

    somente atravs das integrais de movimento Fi .

    Como imediata conseqncia da definio 2.3.2 podemos demonstrar que as solues das equa-es de movimento de um sistema integrvel no sentido de Liouville podem ser obtidas por quadratu-

    ras, ou seja, atravs de um nmero finito de integraes e operaes algbricas. Esse o contedo

    do teorema de Liouville.

    Teorema 2.3.3. Seja um sistema dinmico Hamiltoniano integrvel no sentido de Liouville, ento assuas equaes de movimento so integrveis por quadraturas.

    Demonstrao: Considere a variedade simpltica (2n,) onde o sistema dinmico Hamiltonianointegrvel est definido. Uma vez que a forma simpltica fechada, pelo lema de Poincar3, temos

    que, ao menos localmente, ela exata. Assim, podemos introduzir a 1-forma cannica = pidqi de

    forma que = d. Queremos construir uma transformao cannica (simpltica) (pi ,qi) (Fi ,i),tal que as quantidades conservadas Fi estejam dentre as novas coordenadas:

    = dpi dqi = dFi di . (2.3.2)

    Para isso, seja a variedade de nvel f2n = {(p,q) 2n : Fi(p,q) = fi}. Pelo teorema da funoimplcita, podemos resolver para os pi em f2n, pi = pi(f ,q). Considere, ento, a seguinte funo:

    S(F,q) mm0

    =

    qq0

    pi(f ,q)dqi , (2.3.3)

    com o caminho de integrao em f2n indo do ponto com coordenadas(p(f ,q0),q0

    )ao ponto(

    p(f ,q),q), onde q0 apenas um valor de referncia, vide figura 2.2. Se essa funo existir, ou seja,

    se a integrao no depender do caminho entre m0 e m, ento:

    pi =S

    qi,

    e definindo i por:

    i =S

    Fi,

    temos que:

    dS = idFi +pidq

    i .

    3Lema de Poincar: Se uma vizinhana U de uma variedade M contrtil a um ponto p M, ento qualquerr -forma fechada exata em U.

  • 2.3 Integrabilidade de Liouville 21

    q0 q q

    p

    f2n

    m0m

    Figura 2.2: Uma folha f2n no espao de fase.

    Finalmente, como d2S = 0 conclumos que a equao (2.3.2) verdadeira. Assim, se S for

    uma funo bem definida, temos que a transformao cannica, pois 0 = d2S = LXS . Agora,para mostrarmos que S existe, devemos mostrar que ela independente da escolha do caminho de

    integrao. Pelo teorema de Stokes, suficiente provarmos que:

    d f2n

    = f2n

    = 0.

    Seja Xi o campo vetorial Hamiltoniano associado com Fi :

    Xi =Fiqk

    pkFipk

    qk,

    esses campos vetoriais so tangentes variedade de nvel f2n, uma vez que esto em involuo,

    Xi(Fj) = {Fi ,Fj}= 0.

    Como por hiptese os Fi formam um conjunto de funes independentes, temos que o espao tan-

    gente subvariedade f2n gerado em cada ponto m 2n pelos vetores Xi |m (i = 1, . . . ,n). Masento, (Xi ,Xj) =dFi(Xj) = 0, de forma que demonstramos que | f2n = 0. Logo, S existe.

    Conforme provamos anteriormente, a existncia de S implica a existncia da transformao can-

    nica (pi ,qi) (Fi ,i), com Fi sendo as cargas conservadas, portanto as equaes de movimento se

  • 22 Integrabilidade Clssica

    tornam triviais:

    Fi = {H,Fi}= 0, (2.3.4a)

    i = {H,i}=H

    Fi= i , (2.3.4b)

    onde os i dependem apenas de F e conseqentemente so constantes no tempo. Nessas coorde-

    nadas, a soluo das equaes de movimento assume a seguinte forma:

    Fi(t) = Fi(0) , i(t) = i(0) + i t. (2.3.5)

    Assim, construmos uma soluo explcita das equaes de movimento de um sistema dinmico

    Hamiltoniano, ao supormos a existncia de quantidades conservadas em involuo. As integrais de

    movimento Fi , por sua vez, introduzem superfcies n-dimensionais, as variedades de nvel f2n a partir

    da condio Fi = fi , que fornecem uma folheao invariante e regular do espao de fase.

    A partir das coordenadas que introduzimos para demonstrar o teorema 2.3.3 podemos construiras famigeradas coordenadas de ngulo e ao. Para isso, notamos que da condio de ser fechada

    em f2n, conclumos que a funo S invariante sob deformaes contnuas do caminho (m0,m).

    Porm, se f2n possuir ciclos no-triviais, S se torna uma funo multivalorada definida em uma

    vizinhana de f2n. A variao sob um ciclo dada por:

    cicloS =

    ciclo

    uma funo apenas de F . Assim, temos que as variveis i tambm assumem vrios valores

    cicloi =

    FicicloS.

    Dessa forma, podemos escolher coordenadas especiais em f2n, que sejam duais a esses n ciclos

    fundamentais Ci . Inicialmente, definimos as coordenadas de ao Ij como as integrais da 1-forma

    cannica sobre os ciclos Cj ,

    Ij =1

    2

    Cj

    .

    Os Ij so funes apenas das constantes de movimento Fj e supomos que sejam independentes, de

    forma que se soubermos os valores de Ij , ento f2n estar determinada. Consideramos a funo

    geradora (2.3.3) com os Fj substitudos pelos Ij e denotamos por j as coordenadas conjugadas a

    Ij . A transformao cannica gerada por S definida por:

    pj =S

    qje j =

    S

    Ij.

    Assim,Cj

    dk =

    Ik

    Cj

    dS =

    Ik

    Cj

    (pidqi +

    idIi)

    =

    Ik

    Cj

    S

    qidqi =

    Ik

    Cj

    = 2jk ,

  • 2.4 Integrabilidade na Teoria Clssica de Campos 23

    onde usamos que sobre a variedade de nvel f2n, dIi = 0. Mostramos, pois, que as coordenadas jpodem ser entendidas como coordenadas angulares normalizadas. A existncia dessas coordenadas

    angulares indica que sob certas circunstncias a topologia do espao de fase deve ser similar a de um

    n-toro.

    Notamos tambm que ao usarmos as funes em involuo Fi 4, possvel resolver simultanea-

    mente as n equaes de evoluo temporal:

    dF

    dti= {Fi ,F},

    pois

    ti tjF tj tiF = {Fi ,{Fj ,F}}{Fj ,{Fi ,F}}= {{Fi ,Fj},F}= 0.

    Uma vez que os campos vetoriais Hamiltonianos esto bem definidos e so linearmente independentes

    em todos os pontos, os fluxos definem uma ao localmente livre5 e transitiva6 de um pequeno

    conjunto aberto de Rn sobre a superfcie f2n. Supondo que f2n seja compacta e conexa, esses fluxos

    se estendem para todos os valores de tempo ti e preenchem toda a superfcie f2n, temos, pois, uma

    ao sobrejetora de Rn em f2n. O estabilizador de um ponto um subgrupo Abeliano discreto de Rn,

    dado que a ao localmente livre, ele deve ser da forma Zn. Portanto, f2n surge como o quociente

    de Rn por Zn, ou seja, como um toro. Esse refinamento do teorema de Liouville conhecido como

    teorema de Arnold-Liouville.

    Teorema 2.3.4. Seja um sistema dinmico Hamiltoniano integrvel no sentido de Liouville, ento:

    1. f2n uma variedade suave e invariante sob o fluxo de fase com Hamiltoniana H = F1;

    2. O fluxo de fase com Hamiltoniana H determina um movimento condicionalmente peridico em

    f2n, isto , em coordenadas angulares i , i = 1, . . . ,n temos que:

    didt

    = i , = (f );

    3. As equaes cannicas com Hamiltoniana H podem ser integradas por quadraturas;

    4. Se a variedade f2n for compacta e conexa, ento difeomrfica a um toro n-dimensional

    T n = {(1, . . . ,n) mod 2}.

    A demonstrao desse teorema pode ser encontrada em [45].

    2.4 Integrabilidade na Teoria Clssica de Campos

    At ento consideramos apenas sistemas com um nmero finito de graus de liberdade, desen-

    volvendo nesse contexto um critrio objetivo para determinar se um dado sistema integrvel ou

    no. Contudo, desejamos estudar modelos integrveis em teorias de campos, e para isso precisamos

    4Equivalentemente, podemos utilizar as variveis de ao Ii .5Sem pontos fixos.6Para todos os pontos.

  • 24 Integrabilidade Clssica

    estender o conceito de integrabilidade para sistemas com um nmero infinito de graus de liberdade.

    Tal generalizao envolve o desenvolvimento do mtodo do espalhamento inverso clssico (MEIC),

    que fornece um algoritmo para se encontrar solues de equaes diferenciais parciais no-lineares

    integrveis.

    O conceito de integrabilidade de Liouville, fornecido pela definio 2.3.2, admite uma extensoimediata para o caso de teorias de campos, que consiste em permitir que o nmero de graus de liber-

    dade n seja infinito. Assim, para que uma teoria de campos seja integrvel, ela deve possuir infinitas

    quantidades conservadas em involuo. Entretanto, essa definio esconde algumas sutilezas, a mais

    notvel delas est relacionada com o fato de que um dado sistema pode no ser integrvel mesmo

    possuindo infinitas cargas conservadas em involuo. Isso devido ao fato de que precisamos de

    uma integral do movimento para cada grau de liberdade, de forma que mesmo um nmero infinito

    pode no ser suficiente. Portanto, para podermos abordar essa questo de um modo mais rigoroso,

    necessrio que se construa um mapa injetor entre os graus de liberdade do sistema e suas primeiras

    integrais. Esse mapa est diretamente relacionado com a construo das coordenadas de ngulo e

    ao.

    A estrutura de Poisson, que introduzimos na seo 2.2, til no estabelecimento do formalismo

    Hamiltoniano para sistemas com infinitos graus de liberdade. Formalmente, podemos substituir as

    coordenadas i(t) pela varivel dinmica (x,t), de forma que o ndice discreto i se torna a varivel

    contnua e independente x . O espao de fase 2n, antes localmente isomrfico a R2n, substitudo por

    um espao de funes suaves sobre um subconjunto D R com condies de contorno adequadas.De uma forma bem esquemtica temos que fazer as seguintes substituies:

    Equaes Diferenciais Ordinrias Equaes Diferenciais Parciais,

    i(t), i = 1, . . . ,n (x,t), x D,

    i

    D

    dx,

    Funes f () Funcionais F [(x,t)],

    i

    .

    Os funcionais so dados por integrais da seguinte forma:

    F [(x,t)] =

    D

    dx f (,x,2x, . . .),

    enquanto que a derivada funcional dada por:

    F

    (x,t)=f

    x

    f

    x+

    (

    x

    )2f

    (2x)+ , com

    (x,t)

    (y ,t)= (x y).

    De uma forma anloga a (2.2.2) podemos definir os parnteses de Poisson:

    {F,G}=D2dx dy (x,y ,)

    F

    (x,t)

    G

    (y ,t), (2.4.1)

  • 2.4 Integrabilidade na Teoria Clssica de Campos 25

    onde a estrutura de Poisson (x,y ,) deve garantir a antissimetria de (2.4.1) e a validade da

    identidade de Jacobi. A escolha cannica corresponde a:

    (x,y ,) =1

    2

    x(x y) +

    1

    2

    y(x y), (2.4.2)

    com a qual encontramos:

    {F,G}=1

    2

    D

    dx

    [

    x

    F

    (x)

    G

    (x)

    F

    (x)

    x

    G

    (x)

    ], (2.4.3)

    que o equivalente em dimenso infinita de (2.1.1). Note que para obtermos (2.4.3) a partir de

    (2.4.2) precisamos usar que o operador de diferenciao x anti-auto-adjunto com respeito ao

    produto interno usual:

    (,) =

    D

    dx (x)(x).

    Nesse caso, as equaes de Hamilton adquirem a seguinte forma:

    t= {H[],}=

    D

    dy

    y

    (H

    (y)

    )(x)

    (y)=

    x

    H

    (x). (2.4.4)

    No que se segue, faremos uma considerao geral, porm, naturalmente incompleta7, do mtodo

    do espalhamento inverso clssico utilizando uma teoria de campos clssica em duas dimenses definida

    em um cilindro com coordenadas espacial [L,L] e temporal (,+), cuja HamiltonianaH fornece uma equao no-linear integrvel de evoluo Hamiltoniana. Finalmente, importante

    ressaltar que todas as manipulaes formais que efetuamos podem ser justificadas e fundamentadas

    no contexto da anlise funcional.

    2.4.1 O Modelo de Schrdinger no-linear - Um Exemplo Representativo

    Ilustramos nossas consideraes acerca do MEIC atravs do exemplo mais simples, contudo re-

    presentativo, de sua aplicao: o modelo de Schrdinger no-linear (NLS). O sistema dinmico

    considerado gerado pela seguinte equao no-linear:

    i

    t=

    2

    x2+ 2g ||2, (2.4.5)

    com condies iniciais

    (x,t)t=0

    = (x), (2.4.6)

    onde (x,t) uma funo com valores complexos, o campo clssico carregado, e ||2 = , coma barra denotando a conjugao complexa. O domnio da varivel x a reta real inteira, 1, ento os seguintes parnteses de Poisson so vlidos:

    {T (2,1;) , L(, ;)}= 21

    d T (2,;)1k {L(, ;) , L(, ;)}T (,1;)1k .

    Demonstrao: Como a matriz de transio T (2,1;) satisfaz (2.6.2):[2 L(2, ;)

    ]T (2,1;) = 0 com T (1,1;) = 1,

    podemos escrever que:

    T (2,1;) = P exp

    21

    dL(, ;).

    Dividindo o intervalo [1;2] em subintervalos infinitesimais i , a matriz de transio pode ser escrita

    como:

    T (1,2;) = limN

    PN

    i=1

    Ti() = limN

    TNTN1 T1,

    com

    Ti() := P exp

    i

    di L(i , ;) = 1k +

    i

    di L(i , ;) +O(2),

    onde {Ti() , Tj()}= 0 se i 6= j . Logo, temos que:

    {T (2,1;) , L(, ;)

    }= limN

    {P

    N

    i=1

    Ti() , L(, ;)

    }.

    Uma vez que os parnteses de Poisson satisfazem a regra de Leibnitz, podemos mostrar que:{P

    N

    i=1

    Ti() , L(, ;)

    }= P

    N

    i=1

    N

    j=i+1

    [Tj()1k

    ]{Ti() , L(, ;)

    } i1l=1

    [Tl()1k

    ].

    Faamos, isso por induo finita em N. Claramente, para N = 1 temos que{T1() , L(, ;)

    }={

    T1() , L(, ;)}. Supomos, pois, que a tese verdadeira e provamos para N+ 1:{

    PN+1

    i=1

    Ti , L

    }=

    {TN+1P

    N

    i=1

    Ti , L

    }= TN+11k

    {P

    N

    i=1

    Ti , L

    }+{TN+1,, L}P

    N

    i=1

    Ti 1k

    = P TN+11kN

    i=1

    N

    j=i+1

    (Tj 1k){Ti , L

    } i1l=1

    (Tl 1k) +{TN+1,, L

    }P

    N

    i=1

    Ti 1k

    = PN

    i=1

    N+1

    j=i+1

    (Tj 1k){Ti , L

    } i1l=1

    (Tl 1k) +{TN+1,, L

    }P

    N

    i=1

    Ti 1k

    = PN+1

    i=1

    N+1

    j=i+1

    (Tj 1k){Ti , L

    } i1l=1

    (Tl 1k) .

  • 46 Integrabilidade Clssica

    Conseqentemente,

    {T (2,1;) , L(, ;)

    }= limN

    PN

    i=1

    N

    j=i+1

    [Tj()1k

    ]{Ti() , L(, ;)

    } i1l=1

    [Tl()1k

    ]= limN

    PN

    i=1

    N

    j=i+1

    [Tj()1k

    ]{1k +

    i

    di L(i , ;) , L(, ;)

    }i1

    l=1

    [Tl()1k

    ]= limN

    PN

    i=1

    N

    j=i+1

    [Tj()1k

    ]i

    di{L(i , ;) , L(, ;)

    } i1l=1

    [Tl()1k

    ]=

    21

    dT (2,;)1k{L(, ;) , L(, ;)

    }T (,1;)1k .

    Lema 2.7.5. Nas mesmas condies do lema 2.7.4, os seguintes parnteses de Poisson so verda-deiros:{

    T (2,1;) , T (2,1;)}

    =

    21

    d1

    21

    d2 T (2,1;)T (2,2;)

    {L(1, ;) , L(2, ;)

    }T (1,1;)T (2,1;).

    Demonstrao: Procedendo de forma anloga demonstrao do lema 2.7.4, escrevemos,

    {T (2,1;) , T (2,1;)

    }= limN

    {T (2,1;) , P

    N

    i=1

    Ti()

    }

    = limN

    PN

    i=1

    N

    j=i+1

    1k Tj(){T (2,1;) , Ti()

    } i1l=1

    1k Tl()

    = limN

    PN

    i=1

    N

    j=i+1

    1k Tj()

    i

    di{T (2,1;) , L(i , ;)

    } i1l=1

    1k Tl()

    =

    21

    d2 1k T (2,2;){T (2,1;) , L(2, ;)

    }1k T (2,1;).

    Finalmente, ao utilizarmos o lema 2.7.4 obtemos a tese.

    De posse lema 2.7.5 podemos demonstrar o seguinte teorema.

    Teorema 2.7.6. Se os parnteses de Poisson entre os elementos da conexo de Lax L(, ;)admitem a representao em termos da matriz r , equao (2.7.5), ento os parnteses de Poisson

    dos elementos da matriz de transio so dados por15:{T (2,1;) , T (2,1;)

    }=[r(),T (2,1;)T (2,1;)

    ]. (2.7.13)

    15Ou por {T1(2,1;),T2(2,1;)

    }=[r12(),T1(2,1;)T2(2,1;)

    ].

  • 2.7 A Matriz r Clssica 47

    Conseqentemente, os funcionais (n)() = tr[(TL( ;)Q()

    )n]geram as quantidades conservadas

    em involuo:

    {(n)(),(m)()}= 0. (2.7.14)

    Demonstrao: Comeamos demonstrando a validade da equao (2.7.13), para isso lembramosque a matriz de transio T (2,1;) satisfaz as seguintes equaes diferenciais:

    1T (2,1;) +T (2,1;)L(1, ;) = 0

    2T (2,1;)L(2, ;)T (2,1;) = 0

    com a condio T (,;) = 1. Substituindo os PPF, equao (2.7.5) no resultado do lema 2.7.5 eusando as equaes diferenciais satisfeitas pela matriz de transio, obtemos:{T (2,1;) , T (2,1;)

    }=

    21

    d1

    21

    d2

    [[T (2,1;)T (2,2;)

    ]r()

    (1 +2

    )[T (1,1;)T (2,1;)

    ]+

    +(1 +2

    )[T (2,1;)T (2,2;)

    ]r()

    [T (1,1;)T (2,1;)

    ]](12)

    =

    21

    d

    [[T (2,;)T (2,;)

    ]r()

    [T (,1;)T (,1;)

    ]].

    Integrando essa derivada total, obtemos a relao (2.7.13).

    Em seguida, mostramos que os funcionais (n)() geram as quantidades conservadas em invo-

    luo. Para isso, consideramos a equao (2.7.13) para L < 1 < 2 < L e a multiplicamos porQ()Q() pela direita. Ao notarmos que

    [r();Q()Q()] = 0,

    constatamos que (2.7.13) continua vlida quando T (2,1;) e T (2,1;) so substitudos por

    T (2,1;)Q() e T (2,1;)Q(), respectivamente. Em particular,{[T (2,1;)Q()

    ]n,[T (2,1;)Q()

    ]m}=

    =

    [r(),

    [T (2,1;)Q()

    ]n[T (2,1;)Q()

    ]m].

    Tomando o trao da equao resultante e usando o fato de que

    tr (AB) = tr (A)tr (B),

    bem como que o trao de um comutador se anula identicamente, inferimos:{tr[T (2,1;)Q()

    ]n,tr[T (2,1;)Q()

    ]m}= 0.

    Finalmente, ao considerarmos o limite 2 L e 1L, obtemos (2.7.14).

  • 48 Integrabilidade Clssica

    O teorema 2.7.6 no s afirma que as cargas conservadas esto em involuo, mas tambmque para cada carga conservada corresponde um fluxo Hamiltoniano. Para sermos mais explcitos,

    consideramos o exemplo do modelo NLS, e expandimos pL() = arccos(()

    2

    )(2.6.41), de (2.7.14)

    deduzimos:

    t = {In,} e t ={In,

    }, (2.7.15)

    ou seja, que para cada In em L, h um fluxo Hamiltoniano associado. Para n = 1,2 (2.6.42), tais

    fluxos possuem interpretaes fsicas simples e para n= 3 recuperamos a equao NLS, contudo para

    n > 3 as equaes resultantes no possuem uma interpretao trivial, sendo denominadas equaes

    no-lineares de Schrdinger de ordem mais alta. Mostramos, em seguida, que as correspondentes

    equaes de movimento assumem a forma de uma condio de curvatura nula.

    Teorema 2.7.7. Tomando () como a Hamiltoniana, temos que:

    L(, ;) :={(),L(, ;)

    }= M(;,) + [M(;,),L(, ;)] , (2.7.16)

    onde

    M(;,) = tr 1

    [(T (L,;)1k

    )r()

    (T (,L;)1k

    )(Q()1k

    )], (2.7.17)

    proporcionando equaes de movimento para uma hierarquia de tempos ao expandirmos em .

    Demonstrao: Para provarmos a equao (2.7.16) utilizamos o lema 2.7.4 para calcular a seguintequantidade:

    {T (L,L;) , L(, ;)

    }=

    LLd(T (L,;)1k

    ){L(, ;) , L(, ;)

    }(T (,L;)1k

    )=

    LLd(T (L,;)1k

    )[r(),L(, ;)1k +1k L(, ;)

    ](T (,L;)1k

    )()

    =(T (L,;)1k

    )r()

    [(L(, ;)T (,L;)

    )1k

    ]

    [(T (L,;)L(, ;)

    )1k

    ]r()

    (T (,L;)1k

    )+

    +(T (L,;)1k

    )r()

    (T (,L;)L(, ;)

    )

    (T (L,;)L(, ;)

    )r()

    (T (,L;)1k

    ).

    Usando as equaes diferenciais para a matriz de transio (2.6.2) podemos expressar os dois

    primeiros termos da ltima passagem como uma derivada em de

    V (;,) :=[T (L,;)1k

    ]r()

    [T (,L;)1k

    ].

    De forma que{T (L,L;) , L(, ;)

    }= V (;,) +

    [V (;,),1k L(, ;)

    ].

  • 2.7 A Matriz r Clssica 49

    Multiplicando ambos os lados por Q()1k pela direita e tomando o trao sobre o primeiro espaoconclumos que {

    (),L(, ;)}

    = M(;,) +[M(;,),L(, ;)

    ],

    onde

    M(;,) = tr 1

    [V (;,)

    (Q()1k

    )].

    Exemplo 2.7.8. Utilizamos o teorema 2.7.7 para mostrar como, no contexto do modelo NLS, pos-svel a partir da matriz r e da conexo de Lax Lx(x,t;) construir uma seqncia de matrizes Vn(x ;)

    fornecendo a representao de curvatura nula para as equaes de Schrdinger no-lineares de or-

    dem mais alta. Primeiramente, computemos a matriz M(x ;,) para o modelo NLS, substituindo a

    expresso da matriz r (2.7.11) em (2.7.17).

    M(x ;,) =g

    tr 1[(T (L,x ;)12

    )(T (x,L;)Q()12

    )]=

    g

    tr 1[

    (T (x,L;)Q()T (L,x ;)1k

    )]=

    g

    tr 1[(1k T (x,L;)Q()T (L,x ;)

    )

    ]=

    g

    T (x,L;)Q()T (L,x ;) tr 1

    =g

    T (x,L;)Q()T (L,x ;) (2.7.18)

    onde usamos a ciclicidade do trao na primeira posio

    tr 1

    [(A1k)X

    ]= tr 1(X)(A1k),

    com A sendo uma matriz kk e X uma matriz k2k2, a propriedade (2.7.1) da matriz de permu-tao, que

    tr 1

    [(1k A)X

    ]= A tr 1X,

    e finalmente que tr 1 = 12. Claramente, a expresso para M(x ;,) quasiperidica, pois:

    M(L;,) = gTL()Q()

    M(L;,) = gQ()TL()

    }M(L;,) =Q1()M(L;,)Q().

    A seguir, consideramos a representao com carter assinttico (2.6.20) para a matriz de tran-

    sio:

    T (x,y ;) = [1k +W (x ;)]eZ(x,y ;) [1k +W (x ;)]

    1 , (2.7.19)

    e a substitumos em (2.7.18). Usando a quasiperiodicidade de W (x ;),

    W (x + 2L;) =Q1()W (x ;)Q() 1k +W (L;) =Q1()[1kW (L;)

    ]Q(),

  • 50 Integrabilidade Clssica

    e o fato de que Z(x,y ;) diagonal, obtemos:

    M(x ;,) =g

    [1k +W (x ;)]eZL()Q() [1k +W (x ;)]

    1 . (2.7.20)

    Por outro lado (2.7.19) juntamente com a quasiperiodicidade de W (x ;) permitem escrever:

    TL()Q() = [1k +W (L;)]eZL()Q() [1k +W (L;)]

    1 .

    A unimodularidade de TL()Q() juntamente com a definio

    tr[TL()Q()

    ]= 2cos

    [pL()

    ]implicam

    eZL()Q() = cos[pL()

    ]12 + i sin

    [pL()

    ]3,

    cuja substituio em (2.7.20) leva a:

    M(x ;,) =g

    cos[pL()

    ]122sin

    [pL()

    ]V (x ;,), (2.7.21)

    com

    V (x ;,) =g

    2i() [1k +W (x ;)]3 [1k +W (x ;)]

    1 . (2.7.22)

    Notamos que o primeiro termo de (2.7.21) no depende de x e proporcional a 12, portanto no

    contribui para (2.7.16). Conseqentemente, sem perda de generalidade, podemos despreza-lo na

    definio da matriz M(x ;,):

    M(x ;,) =2sin[pL()

    ]V (x ;,). (2.7.23)

    Finalmente, calculamos

    tLx(x ;) ={pL(),Lx(x ;)

    }=

    {arccos

    (()

    2

    ),Lx(x ;)

    }=

    1

    2

    11(()

    2

    )2{(),Lx(x ;)}

    =1

    2sin[pL()

    ]{2sin[pL()]{xV (x ;,) +[V (x ;,),Lx(x ;)]}}= xV (x ;,) +

    [V (x ;,),Lx(x ;)

    ], (2.7.24)

    onde utilizamos o teorema 2.7.7 em conjunto com a expresso para a matriz M(x ;,) (2.7.23).Claramente, a equao (2.7.24) fornece a representao de curvatura16 nula que procurvamos.

    Substituindo a expanso assinttica de W (x ;) (2.6.21a)

    W (x ;) =

    n=1

    Wn(x)

    n+O

    (||

    ),

    16Note que essa representao deve ser entendida de maneira assinttica, isto , vlida at O(||).

  • 2.8 O Mtodo do Espalhamento Inverso, o Problema de Riemann-Hilbert e a Linearizaodas Equaes de Movimento 51

    em (2.7.22) e expandindo o fator 1 em potncias de 1 inferimos

    V (x ;,) = g

    n=1

    Vn(x ;)

    n+O

    (||

    )(2.7.25)

    onde os coeficientes Vn(x ;), que constituem a seqncia de matrizes que aparece na representao

    de curvatura nula para as equaes de Schrdinger no-lineares de ordem mais alta, so polinmios

    em , (x), (x) e suas derivadas espaciais, cujo grau em n1. Em particular, temos que:

    V1(x ;) =i

    23, V2(x ;) =Lx(x ;) e V3(x ;) = Lt(x ;). (2.7.26)

    Ao considerarmos a expanso (2.6.41) em (2.7.24) verificamos que as equaes de Schrdinger

    no-lineares de ordem mais alta,

    t = {In,} e t ={In,

    }com n N,

    admitem uma representao de curvatura nula com matrizes Lx(x ;) e Vn(x ;).

    Esse exemplo ilustra de uma maneira concreta que a existncia dos PPF fornece uma alternativa

    condio de curvatura nula.

    2.8 OMtodo do Espalhamento Inverso, o Problema de Riemann-Hilbert e a Linearizao das Equaes de Movimento

    Para mostrarmos a integrabilidade completa de um dado modelo precisamos contemplar as se-

    guintes questes:

    1. Existem cargas conservadas?

    2. As cargas conservadas esto em involuo?

    3. Existe um nmero suficiente de cargas conservadas?

    Para o caso onde o nmero de graus de liberdade finito, o critrio de Liouville (definio 2.3.2)estabelece que o nmero de integrais de movimento necessrias corresponde ao nmero de graus

    de liberdade do sistema. De forma que ao satisfazermos essas condies podemos utilizar o teo-

    rema de Arnold-Liouville (teorema 2.3.4) para construir as coordenadas de ngulo e ao e assimintegr