o meu pai é um homem pássaro
DESCRIPTION
livro digitalizado o meu pai é um homem pássaroTRANSCRIPT
,J'"//
DAVID ALM0ND~/ /
,o MEU PAl E UM
~
. IDMEY-PASSARD
~ EDITORIAL PRESENCA
I:E-ra Ull1.amanha de Primavera, como tantas outras, no1 1numero 12 de Lark Lane. La fora, os passaros chil-reavam e piavam. 0 transito da cidade atroava e estron-deava e 0 despertador de Lizzie tinia e retinia. Ela saltouda cama, lavou 0 rosto, esfregou bem atras das orelhas,lavou os dentes, escovou 0 cabelo, vestiu 0 uniformeescolar, desceu, encheu a cafeteira electrica, ligou-a, paspao na torradeira, pas a mesa com dois pratos, duascanecas, duas facas, leite, manteiga e geleia, e depoisdirigiu-se para 0 fundo da escada.
- Pail - chamou. - Paizinho!N enhuma resposta.- Paizinho! Sao horas de se levantar!Nenhuma resposta.- Se nao se levantar ja eu subo e...Pisou ruidosamente 0 primeiro degrau e, a segmr,
o segundo.- Vou subir! - gritou.Ouviu urn resmungo e urn gernido e, depois, nada.
- Vou contar ate cinco. Urn ... dois ... dois e meio ...Paizinho!
Li de cima chegou urn grito abafado.- Espera ai, Lizzie! Espera ai!Ouviu-se urn estrondo e outro gemido e, depois, ali
estava ele, mal ajambrado num velho roupao e chinelosrotos, com 0 cabelo todo desgrenhado e a barba por fazer.
- Desya, ande - disse Lizzie.Ele desceu aos tropeyoes.- E nao olhe para mim dessa maneira.- Nao, Lizzie.Com urn puxao, ela endireitou-lhe os
do roupao.- Olhe para si! Esti num bonito
estado. Que diabo esteve a fazer Ii emcima?
Ele sorriu.- A sonhar - respondeu.- A sonhar! Que homem este.
Agora sente-se a mesa. Sente-se di-reito.
- Sim, Lizzie.Sentou-se na beirinha da ca-
deira. Tinha os olhos brilhantes eentusiasmados. Lizzie encheu-lhe
uma caneca de chi.- Beba - disse, e ele bebeu
urn golinho. - E coma essatorrada. - Ele mordis-cou urn canto da torrada.
- Coma-a como deve ser, pai.- Ele deu uma dentada maior. - E mastigue. - EleIll~sti(rOLl,durante uns InOlnentos. - E engula, paizinho.
Ele sorriu. - Sim, Lizzie. - Deu uma grande den-l:lda, mastigou, engoliu e escancarou a boca para ela vero sell interior.
- Engoli tudo. Estis aver?Ela deu urn estalo com a lingua e desviou os olhos.- Nao seja tolo, paizinho.Endireitou-lhe 0 cabelo e penteou-o. Endireitou-lhe
:t gala do casaco do pijama. Sentiu 0 restolho denso daI ~rba no queixo dele.
- Tern de cuidar de si. Nao pode continuar dessaInaneira, pois nao?
o pai abanou a cabeya.- Nao, Lizzie. Com certeza que nao, Lizzie.- Hoje quero que tome urn duche, faya a barba e se
vista como deve ser.- Sim, Lizzie.- Muito bem. E quais SaGos seus pIanos para 0 dia?Ele endireitou-se na cadeira e fitou-a.- Vou voar, Lizzie. Como urn pissaro.A filha revirou os olhos.-Ah, vai?- Vou, sim. E vou participar no concurso.- No concurso? Que concurso?Ele riu-se, inclinou-se para a frente e agarrou-lhe 0 brayo.- 0 Grande Concurso do Homem-Pissaro, eviden-
temente! Nao ouviste falar nisso? Vem a cidade! Ouvidizer isso ontem. Nao, anteontem. Ou naquele dia, fezna ultima terya-feira uma semana. 0 que interessa e queo primeiro a atravessar0 rio Tyne a voar ganha millibras.E eu vou concorrer. E verdade, Lizzie. E, realmente, ver-dade. Vou ganhar! Vou, finalmente, mostrar 0 que valho.
Levantou-se, abriu os brayos e agitou-os como se fos-sem asas.
- Os meus pes levantaram-se do chao? - pergun-tou. - Levantaram-se? Os meus pes levantaram-se dochao?
Correu a agitar os brayos, como se voasse.- Oh, paizinho, nao seja pateta.Lizzie correu atras do pai, que continuava a dar voltas
pela sala. Conseguiu, finalmente, alcanya-lo e voltou aalisar-lhe 0 cabelo e a endireitar-lhe 0 roupao.
- Pois sim - disse-lhe. - Talvez consiga voar comoum passaro, mas primeiro nao se esqueya de apanhar umpouco de ar e comer um bom almoyo, esta bem?
Ele acenou afirmativamente.- Pois sim, Lizzie - concordou e, depois, agitou de
novo os brayos e deu uma pequena gargalhada.- Ah, a tia Doreen disse que talvez passe por ci hoje.o pai estacou. 0 seu rosto desfigurou-se.- A tia Doreen? - perguntou.Franziu 0 rosto e suspirou.- Outra vez ela, nao!- Sim, outra vez ela. Vai faze-lo regressar a terra.Ele bateu 0 pe esquerdo. E bateu 0 direito.- Mas, Lizzie... - gemeu.- N em mas Lizzie, ne~ meio mas Lizzie. A tia
Doreen gosta de si, como eu gosto. E preocupa-se con-sigo, como eu me preocupo. Portanto, seja simpatico comela.
Os ombros dele descairam e os brayos penderam-lheao longo do corpo. Lizzie pegou na mala da escola e deuUlTl beijo no rosto do pai. Sorriu-lhe meigamente e aba-nou a cabeya. Parecia um rapazinho, ali parado.
- Que vou fazer consigo?- Nao sei, Lizzie - murmurou ele.
-13 hesitou.
- Nao sei se devo deixa-lo entregue a si proprio.Ele riu-se.- Claro que deves. Tens de ir para a escola, fazer as
tuas contas de somar e os teus ditados.Tinha razao. Ela precisava de ir para a escola. Gostava
da escola. Gostava das contas de somar, dos ditados e dassuas professoras, assim como do director, 0 Sr. Mint, quefora tao bondoso com eIa e com 0 seu pai.
- Esta bem, eu vou. Agora de-me um beijo de atelogo.
Ele beijou-a na face e abra~aram-se. Depois ela espe-tou 0 indicador:
- Nao se esqueya...- Esta bem, Lizzie, nao me esque~o. Lavar-me. Fazer
a barba. Comer um bom almo~o. Apanhar muito ar. E sersimpatico com a tia D.
- Muito bem. E isso mesmo.- E nao me esquecerei de voar.- Oh, paizinho!Ele pas-Ihe a mao nas costas e conduziu-a a porta.- Vai - disse-Ihe. - Nao precisas de te preocupar
com coisa nenhuma. Anda, vai para a tua linda escola.Ela abriu a porta e saiu para 0 jardim. Lan~ou-Ihe um
ultimo olhar.- Adeus, Lizzie, ate logo.- Adeus, paizinho, ate logo.Atravessou 0 jardim ate ao portao e saiu para a rua.
Parou um momento e olhou para tras, para ele.- vai, filha. Eu estou bem.Ela recome~ou a andar. Ele acenou-Ihe ate a perder
de vista e depois fechou a porta. Agitou os bra~os, a rirbaixinho.
- Pio, pia - disse. -' Tirou um peda~o de torradaque tinha escondido debaixo da lingua e cuspiu-o. - Piopio - disse de novo. - Pio pia, pia pio.
Depois viu uma mosca a passear em cima da mesa.Lambeu os labios - iam, iam - e foi atras dela.
Amosquinha era veloz de mais para ele. Levantou vooda mesa e zumbiu por cima da sua cabe~a. POlSOU
I pernas para 0 ar no tecto enquanto ele soprava, ofe-gwa e agitava os bra~os na sua direc~ao.
- Eu apanho-te, minha diabinha! - amea~ou.- Desce dai e engulo-te.
Mas ela nao desceu e ele nao a engoliu. Sentou-se no'hao, a recuperar 0 folego. Depois teve outra ideia eome~ou a rastejar ao lado do rodape. Arranhou as tabuas
do soalho com as unhas e encontrou pequenas baratas
pretas, pequenos insectos castanhos e pequenas coisasbrancas rastejantes, desenterrou-as com as unhas e meteu--as na boca.
- Jam iam! - murmurou. - De que servem torradaspara urn homem como eu? Urn homem como eu pre-'isa de vermes, moscas e centopeias.
Sentou-se, a dar estalinhos com os labios e a suspirard satisfa<;:ao.Levantou-se e agitou os bra<;:os.Parou ajanela e olhou para 0 jardim. Nao viu Lizzie a espreitar,atras de uma arvore.
- E urn homem como eu precisa de vermes! Tenhamcuidado, viscosos vermezinhos! Jam iam! Nao tarda, voltopara os apanhar!
Depois calou-se, os seus olhos tornaram-se vidrados eele sorriu muito profundamente. «Ah, se ela soubesse!»,murmurou para consigo. «Se a adoravel Lizzie soubesse!»Levou a mao a algibeira do roupao, tirou uma chave esubiu a escada em bicos de pes.
Foi para 0 quarto, tambem em bicos de pes, andou embicos de pes aroda da cama e dirigiu-se em bicos de
p ~s para urn armario que estava encostado a parede.Meteu a chave na fechadura, girou-a e, muito devagar,lI1uito cautelosamente, abriu a porta. Suspirou e sorriud contentamento.
- Venham ca para fora, minhas lindezas - disse.Meteu a mao no interior do armario e tirou urn par
de asas de confee<;:ao caseira.- Sao deslumbrantes!Despiu 0 roupao e colocou-as por cima do pijama.
Eram feitas de penas, cordel, peda<;:os de uma camisavelha, bocados de bambu, arame, cartao e penas, e penas,
penas.- Sao absolutamente deslumbrantes! Esperem so que a
minha Lizzie as veja.Pos-se em bicos de pes. Esticou os bra<;:os.Fechou os olhos.
Sonhou que voava como uma andorinha, como urn gaviao,como urn falcao, la muito alto, por cima ciacasa. E, enquantode sonhava, alguem come<;:oua gritar, no exterior.
- Inscri<;:oes para 0 Concurso do Homem-Passaro!Todas as Inscriyoes para 0 Grande Concurso do Homem--Passaro!
Ao principio, 0 pai nao ouviu, apesar de a voz gritartao alto e, ate, de ecoar pela rua e de as paredes e os telha-dos repercutirem 0 seu eco.
Correu pela escada abaixo. Escancarou a porta e gri-II de novo:-EU! EU! EU!a homem baixinho e gorducho baixou 0 megafone.Entrou e avanyou pelo jardim com 0 quadro de madeira
debaixo do brayo. Entrou na cozinha. Pas 0 megafone emima da mesa. Levantou 0 quadro. Lambeu 0 bico do lapisolhou para 0 paizinho. a paizinho tremeu. As suas asas
stremeciam de excitayao. Quase nao conseguia respirar.- Deseja, entao, participar no Grande Concurso do
Homem-Passaro? - perguntou 0 homenzinho gorducho.- Sim. Quero dizer, sim, por favor.
- Chamo-me Sr. Poop - disse 0 homem.- Sim, por favor, Sr. Poop, excelencia.
«Esperem s6 que a Lizzie veja», repetiu. «Sentir-se-a60 orgulhosa!»
A voz ecoou de novo, forte:- TODAS AS ENTRADAS PARA 0 CON-
CURSO DO HOMEM-pASSARO!Correu para a janela. Do' lado de fora da cancela do
jardim estavaurn homem baixo e gorducho. Segurava urnpequeno quadro de madeira e falava por urn megafone.
-TODAS AS ENTRADAS PARA 0 ...a pai abriu a janela.- Eh! - gritou, a acenar com os brayos para 0 ho-
menzinho gorducho. - Eu, senhor! EU!a homem parou, calou-se e olhou para Clma, para
;1 janela.- 0 SENH0 R? - gritou, rib0111.bante.- Sim! Eu! Espere s6 urn momento!
o Sr. Poop olhou para 0 paizinho, para as suas asas,parao quarto. Voltou a lamber 0 bico do lapis. Encostou-o aurn formulario preso no pequeno quadro de madeira.
- Nome? - perguntou.-Jackie - respondeu 0 paizinho.-Jackie que?o paizinho pestanejou. Pensou no assunto. Tentou
lembrar-se. Depois respondeu:- Cham.o-me Jackie ... Crow.- Tern a certeza? - perguntou 0 Sr. Poop.- Tenho - respondeu 0 meu pai. - Quero dizer,
tenho, sim, Sr. Poop.o Sr. Poop escreveu no seu quadro de madeira, e
enquanto escrevia murmurou: - Jack-ie C-Crow.Ocupayao?
o paizinho pestanejou de novo, pensou de novo etentou lembrar-se.
- Sr. Crow - insistiu 0 Sr. Poop. - Qual e a suaocupayao? Que trabalho faz?
- Sou urn homem-passaro - respondeu, sem hesi-tar. - Sim, sou urn homem-passaro. Creio que costu-mava fazer outra coisa qua~quer, mas agora nao consigolembrar-me do que era. Sou urn homem-passaro!
o Sr. Poop lambeu 0 bico do lapis.- Homem-Passaro -lnurmurou, enquanto escrevia.
- Equal e 0 seu metodo de propulsao?o paizinho arregalou os olhos para de. 0 que e que
o homem queria dizer com «metodo de propulsao»?-0 que?- Qual e 0 seu metodo de propulsCio, Sr. Crow - expli-
au Sr. Poop. - Como vai voar?Finalm.ente 0 paizinho compreendeu, encolheu os
oillbros e bateu as asas na direcc;:aodo tecto.
- Ora essa, com as rninhas asas, evidentemente. NaoS30 maravilhosas,Sr. Poop?
Bateu as asasmais rapidamente. Correu a volta da sala.- Nia acha que sao maravilhosas?
Quando 0 meu pai parou e se endireitou, corado,ofegante e cansado, 0 Sr. Poop inspeccionou as
.as. Tocou delicadamente nas penas. Fungou. Puxou.Ponderou. Suspirou.
- Entao? - perguntou 0 meu pai. - Nao as achal11agnificas?
- Hmnlmmmmmnlnl ... - foi a 1mica resposta doSr. Poop.
- Oh, bem sei - suspirou 0 paizinho. - Ainda nao'ao perfeitas. Precisam de um pontinho aqui, um alfinetealem, um prego ali, um peda<;:ode cartao acola, maisalgumas penas acola. Mas tirando isso...
-Hmrmnrnnunmnmrmrrurunrrlllllnml111Tnmmrmnmm- repetiu 0 Sr. Poop.
- E eu terei um bico e uma crista, evidentemente -acrescentou 0 paizinho.
o Sr. Poop andou a volta dele. Tocou. Fungou.Puxou. Suspirou.
- Asas, bico, crista - disse, baixinho.o paizinho observava-o. Escutava-o. Sabia que 0 Sr.
Poop se encontrava longe de estar convencido.- E tenho fe! - afirmou 0 paizinho. 0 Sr. Poop
olhou para ele.- Fe, Sr. Crow?- Sim, Sr. Poop, fe. Sei que posso faze-lo, com-
preende? Acredito que posso.o Sr. Poop ponderou de novo. Deu uma palmadinha
na bochecha. Lambeu a ponta do lapis. Deu umas palma-dinhas na barriga gorducha. E depois falou:
- A competi<;:aosera intensa, Sr. Crow. Vem de todosos cantos do mundo. Hi um tipo de Fran<;:aque apa-rafusou asas na sua bicicleta. Ha um rapazola do ]apaocom uma vara de salto de tres metros de comprimento.Ha urn tipo do Brasil com urn chapeu-de-chuva nacabe<;:ae uma helice no traseiro. Vao trazer para-quedas,catapultas, centrifugadoras, cones de helices, molas gigan-tes e...
- E eu tenho as minhas asas e a minha fe - afirmouo meu pal.
- Hmmmmm - respondeu 0 Sr. Poop. - Ternonsciencia dos perigos? Pancadas na cabe<;:a,ossos par-
tidos, golpes e contusoes, afogamento no rio ... Cair do'eu nao e aconselhavel, Sr. Crow.
- Cair! - exclamou desdenhosamente 0 meu pai.- Deixe ver esse lapis.
o Sr. Poop deu-lhe 0 lapis. E estendeu-lhe a placa demadeira.
- Assine aqui, Sr. Crow.o meu pai assinou, com um floreado.- E aqui - pediu de novo 0 Sr.Poop. - E tambem aqui.o meu pai assinou outra vez, e mais outra.o Sr. Poop examinou 0 impresso de registo. Depois
:lssinou-o por seu turno, com uma pequena e gorducha:lssinatura.
- Inscri<;:aoaceite - declarou, e 0 meu pai ofegouI contentamento e estendeu os bra<;:ospara abra<;:ar0 Sr.
i> op, que expeditamente se desviou.- Voltamos a ve-lo no proximo domingo. A partida
" as dez horas da manha. Aconselho-o a usar urn capaceter'sistente. Adeus.
Tirou 0 megafone de cima da mesa e meteu a pIacad:1sinscri<;:oesdebaixo do bra<;:o.Saiu. 0 paizinho obser-vou-o enquanto ele atravessava 0 jardim, saia pela can-l' ·Ia e desaparecia na rua, do Iado de fora.
Depois 0 meu pai observou os passaros, no ar.- Capacete! - exclamou. - Quem precisa de capa-
c ·te? OIha aquele corvo, Ia em cima. Repara na maneiracomo paira no ar. Repara como bate as asas e voa taoIll:lraviIhosae faciImente. E assim que se faz!
Picou ali parado a sonhar e, sonhando, voou alto sobreI) j'lrdim, alto sobre a cidade, alto sobre 0 rio Tyne ... eII~ viu Lizzie esgueirar-se detras da arvore e ir direita a(.j '. E continuou sem reparar quando ela parou a suaIt· 'nte e agitou a mao diante do seu rosto.
- Paizinho - chamou ela. - Paizinho.Ele estava ausente no seu maravilhoso sonho de voar.
Voltou para dentro de casa, fechou a porta e nem perce-beu que Lizzie se esgueirava la para dentro, ao lado dele.
j ~
II. .•••r 0paizinho correu a volta da,fl . sala.Agitou os bra~os como/1\,In se voasse. Piou, arrulhou, grasnouIjH,¥~' e assobiou. Lizzie estendeu a mao,
n,Wr quando ele passava velozmente11)",! 1 Ch M .~JlH Ill/I por e a. amou-o. as 0 pal
'l~'l'iHtjl~\ ~~~~o~i~on~::o o::~~a~la obser-~lJ" "i~~Ji JJ : I - Estou no ar! - gritou ele.
H).I!I!' - Os meus pes estao levantados'1~"III~IJ do chao! Estao, sim!
,,' f1nl' Riu-se de si mesmo.~ l~/'tit d !l - Nao estao nada, rneu pateta
"'~1~j{'~H' cabe~a de passarinho - disse.( ( - Mas hao-de estar! Urn pouco
, '\. mais de pratica. Mais algumas-~:F'W~. horas! Mais uns dias! Uiiii!
Deu uns passos carnbaleantes e parou. Inclinou-se paraa frente, extenuado e a ofegar. Inspeccionou as asas.Mexericou nas penas, nos cordeis, nos grampos e nascavilhas. Sim, estavam longe da perfei~ao. Sirn, pre-cisavam de uns ajustarnentos: urn apertozinho aqui, urnpuxaozinho ali. Mas erarn pura magia para os seus olhos.Eram melhores do que helices ou para-quedas, melhoresdo que catapultas ou varas de saltar. Seriam as asas que 0
fariam subir no ar como urn passaro, seriam elas que lhe
trariam a vitoria, a ele, Jackie Crow, morador em LarkLane, 12. Abrayou-se a si mesmo, sonhando acordadocom 0 dia do concurso. Viu os outros a debaterem-se norio e a gritarem por socorro enquanto ele batia as asas,Ii muito em cima. E viu Lizzie ali em baixo, na margemdo rio, a olhar para cima, para ele, e a acenar e a gritarpara que todos ouvissem: «Aquele ali e 0 meu paizinho!E Jackie Crow! 0 meu pai e um homem-passaro! E 0melhor homem-pissaro do mundo e 0 paizinho maisformidivel que jamais existiu!»
Ele riu-se e apanhou urn besouro do chao. Lizzie ago-niou-se, quando 0 viu atiri-lo, com um piparote, paradentro da boca.
- Hmm humm ... - murmurou, deliciado.Tirou as coisas do pequeno-almoyo da mesa e depois
subiu para cima dela.- Nao, paizinho! - gritou Lizzie.- Urn! - disse ele. - Dois ... !- Nlio, paizinho - gritou Lizzie e saltou para 0 sal-
var, mas tarde de mais.- Tres! Partida!Saltou rumo ao tecto e despenhou-se no chao.- Ai! - gritou. - Vi,. as minhas costas! Ai, aI,
o meu joelho! - Ai, ai, a minha cabeya!- Pai. Oh, Paizinho! - exc1amou Lizzie. - Ainda
se mata!Ele soltou uma pequena gargalhada, apesar da dor.- Quase consegui, Lizzie! Desta vez nao voei por
pouco! Viste-nos? Os meus pes estavam ... - Calou--se. Fitou-a de olhos arregalados. - Que fazes aqui,pequena?
Ela passou 0 brayo por baixo das asas dele e ajudou-oJ sentar-se.
- Estou aqui porque estava preocupada COnslg0.E tinha razao. Podia ter partido as costas.
- Partir as costas, eu? Nao sejas pateta. - Meneouos ombros. - Gostas das minhas asas, Lizzie? Guardeisegredo delas. Queria que fossem uma grande surpresapara ti.
Ela tocou nas asas e cheirou-as.- Bern. .. suponho que SaG encantadoras, paizinho,
mas ...- Qual suponho, qual que ... Estas asas VaG tornar-
-nos famosos e ricos!- Mas, paizinho ...- Seja como for, devias estar na escola. E as tuas con-
tas de somar e os teus ditados? 0 que diri 0 Sr. Mint?Lizzie nao sabia 0 que 0 Sr. Mint diria, mas sabia que
ficaria preocupado. Sabia que quereria saber 0 que estavaa passar-se.
- 0 Sr. Mint e urn homem simpatico. Compreendeque, as vezes, preciso de £Icar em casa.
Continuou a observar as asas. Reparou que 0 cor-del, as penas e os arames estavam cuidadosamenteentretecidos. Tocou com a ponta do dedo numa penaisolada. Era tao macia, tao maravilhosamente for-mada. Tocou noutra, de urn negro carregado e relu-zente.
- Esta e de urn melro?- E, sim, Lizzie.Tirou as asas que produziram urn som roc;agante,
quando as ergueu, como se fossem arvores, como se fos-sem coisas vivas. Apontou outras penas. Mostrou-lhe umapena de pombo, uma de tordo e uma de pega. Mostrou--lhe como uma pena de corvo e grande e como sao fortesas penas de uma gaivota. Mostrou-lhe tambbn a penaminuscula e delicada de urn pintarroxo, a pena delicada-mente colorida de urn pintassilgo e a bonita pena da car-ric;a femea.
Lizzie sorria, enquanto ele Ihas mostrava. E suspiravacom ele perante a beleza das penas e das asas. 0 seu paifora sempre habil com as rIlaos. Soubera sempre fazercoisas, como a casinha de bonecas que Ihe dera no seuquinto aniversario, as marionetas e 0 teatro de marione-tas que £Izera naquele Natal quando ela tinha seis anos.E 0 baloic;o no jardim, e a casinha de brincar que pare-cia uma cabana de urn conto de fadas. E livros feitos emcasa, e bonecas. Mas estas asas eram uma coisa nova, umacoisa estranha, uma coisa maravilhosa.
- Sao encantadoras, paizinho - murnlurou.- Sao do jardim - explicou 0 pai. - E surpreen-
dente 0 que encontramos caido debaixo das arvores. Hapenas caidas por todo 0 lado.
- E tao inteligente - disse Lizzie, a aba-nar a cabec;a. - Mas tambem e tao pateta, paizinho.
Urn homem nao pode voar s6 porque se cobre de penas.- Pode, sim! E uma questao de coordenar como deve
ser 0 saltar e 0 bater das asas. Acredita nisso, e la vais avoar. - Depois suspirou. - Mas ha apenas urn pro-blema.
- Qual?Em resposta, 0 pai agarrou na barriga e bamboleou-a.
Ela sorriu. Desde que se lembrava, ele fora sempre urnbocado gorducho.
- 15to e 0 problema - respondeu 0 pai. - Olha paraesta barriga, Lizzie. Sou demasiado gordo. E isso que estaa impedir-me. Alguma vez viste urn passaro gordo?Alguma vez viste urn passaro cambaleante?
Lizzie pensou no assunto. Havia aqueles grandes e ana-fados perus do Natal que mal conseguiam andar, quanto
mais voar. Mas tarnbern nao se esperava que voassern.Esperava-se, sirn, que carninhassern a barnbolear-se,cornessern alirnentos ricos durante alguns rneses e depois[ossern parar, recheados, a urna mesa de Natal. E haviaaqueles galinaceos atarracados naquelas minusculas gaio-las. E ...
o pai adivinhou 0 que ela estava a pensar.- Algurna vez viste urna aye carnbaleante que [osse
capaz de voar?Lizzie abanou a cabe<;:a.- E claro que nao viste! - E porque? Por causa do
que elas cornern!Apanhou urn pequeno besouro do chao e atirou-o,
com urn piparote, para dentro da boca. Lizzie soltou urngritinho.
- Eles cornern insectos, rnoscas, bagas, sernentes evermes - disse 0 pai. - Nao cornern alirnentos ricos.Nao cornern torradas. E, decisiva e definitivarnente, naocornern os jantares da tua tia Doreen!
Engoliu outro insecto.E corne<;:oua piar: Pio, pio! Pio, pio!Urn passaro assobiou, no exterior.- Ouves? Esta a trabalhar.E corne<;:oua grasnar - «Cau cau! Cau cau!»- como
urna gralha, e urna gralha respondeu-lhe do exterior.- Estas aver? Serei urn verdadeiro hornern-passaro
como deve ser. E tudo por ti, pequena. Vais orgulhar-temuito de nos.
- Mas, paizinho - disse ela em voz rneiga, a segu-rar-lhe levernente no bra<;:o-, nao preciso de que seja1Im homern-passaro. Preciso apenas de que seja 0 rneup~lizinho.
) pai parou. Olhou Lizzie nos olhos.
- A serio? - perguntou, como se tal pensarnentonunca Ihe tivesse passado pela cabe<;:a.
E Lizzie recorne<;:oua [alar, mas [oi interrornpida porLImavoz do exterior.
-Jack! Jackie!o pai encolheu-se.- Oh, nao! - gerneu. - Ela ja aqui esta!Levantou-se de urn pulo. Grasnou como urn corvo.
Correu para 0 jardirn. Nada conseguiria dete-lo.- Ola, verrnesinhos! - charnou.
Atia Doreen irrompeu peIa saIa.Trazia um aventaIverde com flo-
res vermelhas. Tirou 0 chapeu ama-reIo. Bateu no chao com as reluzentesbotas azuis. Pas um grande saco decompras axadrezado em cima da mesa.
- Elizabeth! - chamou. - VisteaqueIe grande homem pateta Ii fora? I
- Que grande homem pateta? -perguntou Lizzie.
- N estasredondezas hi apenas umgrande homem pateta, e nao sou eu etambem nao es tu. Deve ser por causadaquele concurso pateta, nao achas?
- Sim, Tia Doreen.A tia Doreen revirou os olhos.- Homem-pissaro, francamente!
- exclaulou. - A cidade inteira estia ficar maluca. Na minha opiniao, aspessoas deviam manter-se pessoas.Nao concordas, Elizabeth?
- Sim, Tia Doreen. .....-_.- Deviam manter os pes assentes
na boa terra de Deus. Nao concor-d3S, Elizabeth?
- Sim, Tia Doreen.
- E claro que concordas.A tia Doreen bamboleou-se pela sala a agitar os bra<;:os,
a grasnar como uma ave e a olhar para 0 ceu para de-monstrar como tudo era estupido.
- Estas aver? Nao hi absolutamente nenhuma pos-sibilidade. Passaros sao passaros e seres humanos sao sereshumanos. Espero que te tenham ensinado isso na ... -Calou-se. Fitou Lizzie. - Por que nao estas na escola,minha menina?
Lizzie baixou os olhos. Que diabo podia responder?- Nao me sinto bem - disse, por fim.- Po is a mim pareces-me suficientemente bem!
o que se passa contigo?- D6i-me uma perna ... Nao, a cabe<;:a.Quero dizer,
d6i-me a barriga. - Inclinou-se para a frente e levou asmaos a barriga. - Aiii!, gemeu. - D6i-me
a barriga. Aiii!A tia Doreen franziu os labios e
semicerrou os olhos, e nao acredi-tou numa s6 palavra.
- Com que entao, dor debarriga! Boa comida caseira,
e disso que precisas. E edo que aquele calmeidoidiota precisa, ele e todos.As coisas por aqui vao demal a piOL Dois e doisquantos sao?
- 0 que? - pergun-tou Lizzie.
- Nao queriasdizer «Perdao?»
- Perdao - corrigiu Lizzie.- Dois mais dois quantos sao? Preciso de ver em que
medida estas a ficar para tras.- Quatro.A tia Doreen contou pelos dedos.- Certo! Pelo menos alguma coisa esta a correr bem.
Desde que a tua pobre ma ... Desde entio, ele esta a ficarmais chalado do que 0 chao - Trope<;:ounas asas queestavam caidas no chao. - Que coisas sao estas?
Lizzie baixou-se e levantou-as, para a tia Doreen aspoder ver.
- Sao as asas dele - explicou.A tia Doreen fitou-a de olhos arregalados.- As asas dele? Essa agora! E pior do que eu pensava!
- Olhou para 0 jardim e viu 0 paizinho com urn vermependurado defronte do rosto. Ofegou, assustada. - Quediabo esta ele a fazer com aquele pobre verme?
Lizzie olhou, tambem, e Vlram 0 verme desaparecerna boca do paizinho.
- Parece que esta a come-lo, tia Doreen.A tia fez uma careta e abriu a boca, como se fosse
vomitar.-Jackie! - gritou. - Jackie, homem, deixa-o em
paz, idiota! - Mas 0 paizinho pegou noutro verme esegurou-o a frente do rosto. - Oh, nao! Oh, valha-meDeus! Brrrrr! - Fechou os olhos e apertou a barriga.- Que raio de casa e esta?
- E uma casa agradavel, evidentemente - respondeuLizzie.
- Foi, em tempos que ja la vao! - A tia Doreenagarrou-a e apertou-a contra 0 peito volumoso. - Oh,minha querida, minha pobre crian<;:a!
- Eu nao sou uma pobre crian<;:a- protestou Lizzie,em voz abafada.
- Ai, es, sim, e sabes que es. - Depois afastou Lizziee pas-se muito direita. - Guarda aquelas estupidas asas- ordenou.
Lizzie pendurou-as atras da porta.- Muito bem. Chegou a altura de par maos a obra!
- declarou a tia Doreen. -"Ha urn pouco de gorduranaquele saco de compras. Tira-a, sim, pequena. Do queaquele homem precisa e de urn pastel de carne!
Atia Doreen lavou e esfregou bem a mesa. Lizzie tiroumargarina, ovos e farinha do saco das compras.
Encheu urn jarro de agua. Foi buscar colheres de pau euma grande ta<;:amisturadora. Pas as coisas em cima damesa, a frente da tia Doreen, que deitou tudo numaonnde tigela e comecou a misturar e a mexer. Mantinhab 'os olhos afastados da janela.
- Voar, francamente! - exclamou. - Nada melhordo que urn prato de boa comida para trazer urn poucode born senso a urn mundo idiota. Bolinhos de banha,nada melhor. Olha para aquelas deliciosas migalhas degordura. Aqueles bocadinhos estaladi<;:os.Espera so queo delicioso cheiro da cozedura comece a sentir-se. Fazcom que 0 mais pateta dos homens recupere, num abrire fechar de olhos, a no<;:aoda realidade. Bater e amassar,Doreen! Bater, amassar e moldar em deliciosas bolinhas.
Amassou um reluzente pastel branco e segurou-o nopunho. Atirou-o ao ar e apanhou-o. Atirou-o de novo edeixou-o cair, com um baque, no chao. Sorriu.
- Optimo. Aquele esta suficientemente solido.Fez outro.
- Agarra!- gritou e atirou-o a Lizzie.- Que tal, hem?E como urn matacao de chumbo. Perfeito! - Viu 0 pai, lafora, a subir por uma cerejeira. - Sai dessaarvore, homem!- gritou-lhe. - Ainda nos pae tao tarantas como ele.
Fez outro d6nute recheado. Foi a porta e gritou:-Jackie, desce ja dessa arvore!Ele nao fez caso. Continuou a subir, a piar e a gras-
nar. A tia Doreen estendeu 0 brayo para tras e atirou-lheo d6nute recheado. 0 pai nao deu por nada, quando 0
d6nute passou por ele e caiu na relva como uma bala decanhao. Ela gemeu e voltou a fechar a porta.
- Rezo para que nao vas pelo mesmo caminho,Elizabeth.
- Nao, tia Doreen, nao vou - respondeu Lizzie.A tia Doreen deu-lhe urn beijo repenicado no rosto.- Optimo. A tua mae teria orgulho de ti. Acabei de
dizer ao teu director, 0 Sr. Mint. ..- 0 Sr. Mint? - repetiu Lizzie.- Sim, 0 Sr. Mint. Estava a dar-lhe uma palavrinha.
A teu respeito e a respeito do tonto do teu... Ele disseque es uma boa menina bem-comportada. Trabalha sem-pre com afinco, disse-me. E sempre bem-educada. Boamenina. Como se escreve gato?
- 0 que? - perguntou Lizzie.- Perdiio - corrigiu a tia Doreen- Perdao - repetiu Lizzie.- Diz como se escreve «gato».- G-A- T-O - disse Lizzie.A tia Doreen sorriu.- Isso mesmo. Vais sair-te muito bem. Mais d6nutes
recheados!Recome<;:ou a trabalhar e, enquanto trabalhava,
cOl11e<;:oua cantar:
D6nutes! D6nutes recheados! Adoraveis d6nutes!Mis tu re, bata, amasse e torne a bater!Amolgue-os, coza-os, retire-os e escorra-os!D6nutes recheados, oh, deliciosos d6nutes recheados!
Enquanto cantava, Lizzie dan<;:avaao ritmo da cantiga.Levantou os brayos, agitou-os e abandonou-se ao sonhotonto de voar. A tia Doreen ferveu agua numa grandepanela e foi deitando os d6nutes recheados, urn por urn.Quando estavam cozidos, colocou-os numa prateleirapara fumegarem e arrefecerem e 0 seu aroma deliciosoflutuou pela cozinha. Nisto, a porta escancarou-se derepente e 0 paizinho entrou a correr. Trazia na mao urnsaco de compras dentro do qual alguma coisa se sacudiae sacolejava e grasnava e gritava.
- Apanhei-a!- gritou de. - Apanhei-a, Lizzie!Vivaaa!\ i.t 1
{ f" J
- Ora essa!Nao quero fazer-lhe mal nenhuni, Lizzie.- Levantou 0 saco e voltou a encosta-lo a cara. - Quero
S 'I' teu amigo - murmurou, mas a gralha nao queria ser,1Inigadele. Comeyou as bicadas dentro do saco e 0 sell. rande bico cinzento furou-o e picou 0 nariz rosado dopaizinho. Pas a cabeya toda de fora e olhou, zangada, com(S olhos pequenos e brilhantes que pareciam berlindes.- Ola, gralha. Eu so quero ... - Mas 0 passaro deu-lheLImabicada na bochecha e guinchou. Grasnou e bateu asasas.A tia Doreen gritou, assustada.
- Livra-te dele, homem! Solta-o antes que nos ataquea todos.
o paizinho correu para a porta e atirou 0 saco e 0 pas-saro para 0 ar. Depois 0 saco caiu, aterrou na cabeya dopaizinho e ficou Ii
- Adeus, gralha - gritou ele.-Jackie - disse a tia Doreen.-0 que e?- Come urn donute recheado.-Hem?!Ela atirou-lhe urn.- Come um, homem!Ele pegou-lhe, olhou-o, cheirou-o e depois atirou-o
pela porta fora.- Era urn lindo passaro - disse.- 0 que fez foi cruel - ralhou Lizzie.- Ele estava a olhar para mim como se quisesse ser
meu amigo - justificou-se 0 pai. - Sorriu-me.- Foi cruel, paizinho - repetiu Lizzie.- Achas que foi, Lizzie? - Fez uma pausa, pensativo.
- Ele nao pareceu muito zangado.- Donute recheado - repetiu a tia Doreen, ati-
rando-lhe outro.
Correu a volta da sala como se estivesse a ser arras-tado pelo saco que nao parava de saltar para 0 ar
e despenhar-se de novo no chao. Ele segurava-o bemapertado. 0 cabelo esvoayava-lhe aroda da cabeca. Osseus olhos estavam estranhos, desvairados, agi~ados.A certa altura, parou e tentou olhar para dentro dosaco, mas voltou a fecha-lo rapidamente, gritando: «Ui!Quieto, calma! Estou apenas a tentar ver-te!» E 0 sacoarrancou de novo, desencabrestado, arrastando-o con-sigo. Parou de novo. Encostou 0 agitado saco ao rosto.«Calma, sossega», disse. «Queres uma lagarta?» Masaquilo voltou a grasnar e a agitar-se e 0 paizinho vol-tou a ser levado a reboque. A tia Doreen parou de-fronte dos donutes recheados. Lizzie estava especada,imobilizada pelo espanto.
- Que diabo estas a fa~er? - perguntou, por fim, atia Doreen.
- Apanhei a gralha! - gritou 0 paizinho.- Apanhaste a gralha? Nao me digas! Que ideia foi
essa de apanhar uma gralha?- E para pesquisar. Quero examina-la e descobrir 0
que estou a fazer de errado. Quieto! Quietinho! Sossega,passaro idiota!
- Solta-o, Jackie, solta-o, homem! - ordenou a tiaDoreen.
- E cruel, paizinho - disse Lizzie.
Ele desviou-se e 0 d6nutevoou pela porta fora e saltoue ressaltou pelo jardim. Elaolhou para 0 paizinho,zangada.
- Pronto, chega. Aca-bou-se. - Pas 0 chapeu.Sacudiu a farinha das maos. - Elizabeth, vaibuscar 0 teu casaco. Vens comigo.
Mas Lizzie ignorou as palavras da tia Doreen e foi parao lado do pai.
- Podia observar apenas os passaros, paizinho. Podiaolhar para eles,no jardim. Podia tomar apontamentos e fazerdesenhos. Nao precisa, realmente, de os apanhar, pois nao?
Ele baixou a cabec;:a.- Acho que nao - admitiu, em voz baixa.Lizzie apontou para 0 ceu, para uma gralha que voava
alto, sobre 0 jardim.- Olhe para aquela gralha. Consegue ver aquelas
penas espetadas como dedos na parte de tras das asas?Nao as tern nas suas asas, pois nao?
- Nao, nao tenho.- Lizzie! - chamou, brusca, a tia Doreen. - Vem ci!Mas Lizzie nao estava a ouvi-la e apontou de novo
para 0 ceu.- E olhe para aquela carricinha ... Oh, e escute como
cantam, paizinho.Observaram e escutaram juntos. Havia passaros no ceu
e nas arvores. Havia passarosnos telhados,nos muros e nos canos das chamines,
o seu canto ouvia-se por todo 0
lado e era muito belo.- Nao sao encantadores?
- Sim, sao encantadores - respon-deu 0 pai.
Escutaram juntos e, depois,ele assobiou e urn passaro asso-biou-lhe em resposta. Ele gras-nou e urn passaro grasnou em resposta.
- 0 paizinho e tao inteligente - murmurou Lizzie.- Elizabeth! - chamou de novo, aspera, a tia Doreen.
- Veste 0 casaco, ja!- Oh, e olhe ... - continuou Lizzie. - Consegue
ver aqueles dois pardalinhos?o pai sorriu. A tia Doreen limitou-se a olhar, sem
saber 0 que dizer.- Olha - disse 0 pai -, mais outro! Tres pardali-
nhos. - Observaram os pardais a saltitar pelo jardim.- E uma familia inteira de pardais.
- E olhe para aquelas andorinhas - disse Lizzie.- Repare nas pequeninas penas pontiagudas das suascaudas. Nao as tern, pois nao?
o pai abanou a cabec;:a.- Se calhar s6 precisa de mais urn bocadinho de tra-
balho nas asas, paizinho. Torcer urn bocadinho aqui,acrescentar mais uma pena ali... e levanta voo e la vai.- Deu-lhe urn pequeno abrac;:o.- Olhe, paizinho,talvez eu possa ajuda-lo.
o pai abriu muito os olhos. Sorriu. Estavamuito alegre.- Queres realmente dar uma ajuda?Ela sorriu-lhe. E claro que queria. Seria como quando
o ajudara a pintar a casinha de brincar, ou quando 0 aju-dara a dar 0 retoque final nos fantoches. Seria comoquando tinham plantado, juntos, 0 pequenofreixo no jardim e 0 pai dissera queformavam uma grande equipa.
- E claro que quero. E 0 meu paizinho, nao e?o pai riu-se.- Formamos uma grande equipa - disse.Pegou em Lizzie e ergueu-a acima da cabeya. Come-
yOUa correr a volta da sala, a seguri-la no ar como se elaestivesse a voar, e Lizzie riu-se, riu-se muito, e disse:
- Os meus pes ji estao no ar? Estao! Estao!A tia Doreen bateu 0 pe.- Poe essa rapariga no chao! - gritou.- Mas, tia Doreen, e divertido! - exclamou Lizzie,
a nr.A tia puxou 0 chapeu para baixo. Deu uma grande
dentada num donute e dirigiu-se pesada e decididamentepara a porta.
- Oh - queixou-se Lizzie. - Nao vi, tia Doreen.- Vou sair deste manicomio, Jackie - ameayou a tia.
- Elizabeth, esta e a tua ultima oportunidade, a ultima!Vem comigo, ji.
o paizinho pas Lizzie no chao.Ela nao se mexeu. Nao queria que a tia Doreen se
fosse embora zangada, mas nao podia deixar 0 seu pai-zinho. Abanou a cabeya.
- Estis aver 0 que fizeste a essa rapariga? - per-guntou a tia.
Lizzie riu-se.- Eu estou bem. - Sorriu a tia Doreen e depois
ao pai. - Talvez eu propria entre no concurso.Talvez faya asas para mim.
- Entramos juntos! - disse 0 pai.- Seremos uma familia de pissaroshumanos!
- Vamos comeyar! - respondeu Liz-zie, e correram os dois para 0 jardim. Come-
yaram a apanhar penas que estavam caidas debaixo dasarvores.
A tia Doreen saiu, zangada, pela porta fora.- Adeus, Titi Doreen! - gritou Lizzie.- Adeus, Doreen! - gritou 0 pai.- Eu e que lhes digo adeus! - replicou, irritada, a
tia Doreen.Afastou-se pelo jardim fora, saiu e fechou a cancela,
com forya.- Voltarei! - avisou. - E vou trazer
alguem para te aparar as asas!
('lpetes. Levaram tudo quanto conseguiram reunir para a(' )Zinha, ajoelharam-se no chao e juntaram todas as coi-S:IS, dando-lhes a forma de um ninho. Lizzie sorria e can-l:lrolava baixinho enquanto trabalhavam. 0 pai piava,:Issobiavae grasnava.
- Nao e maravilhoso? - perguntou. - Uma casinhaC 11'10 deve ser para nos.
Levou a mao a algibeira e tirou uma lagarta. Ergueu-a,slIspensa dos dedos, e depois meteu-a na boca e engo-liLl-a.
- Queres uma, Lizzie?Ela abanou a cabe<;a._ Prefiro isto - respondeu, e trincou alguns amen-
loins.o pai levantou-se, pos-se em bicos de pes, abriu as
:isas,levantou-as bem e meteu a barriga para dentro.- Olha, ja estou a ficar mais magro!_ Nao pode ser! - exc1amou ela, a rir, mas quando
lhou mais de perto pareceu-lhe que estava, de facto.'rocou-lhe com os dedos e chamou-lhe costelas de lata.
- Nao tarda, estarei leve como uma penal - exc1a-mou ele.
Continuaram a trabalhar, moldando cuidadosamente 0
ninho de modo a formar um circulo com uma concavi-dade funda no centro.
- Os passaros sao os melhores do mundo quando setrata de cuidar dos seus filhos, sabias? - disse 0 pai._ Criam-nos bem e fortes. Protegem-nos de todos ospengos.
Continuaram a trabalhar ate, finalmente, acabarem.I epois entraram e sentaram-se, com as suas encantado-ras asas postas, no seu ninho de fabrico caseiro, ao cantoda cozinha, e sorriram de contentamento.
Lizzie e 0 pai trabalharam todo 0 dia e pela noite foraa juntar penas, cordel, linha, peda<;osde tecido, cabi-
des, fitas, botoes e contas. Costuraram, cortaram e cola-ram. Na manha seguinte, as asas, 0 bico e a crista deLizzie estavam praticamente prontos. Lizzie e 0 paiencontravam-se parados a porta, usando cada um as suasasas. Estavam cansados, mas tambem muito felizes eorgulhosos de si mesmos. Lizzie encostou-se ao paie disse que ele tinha razao, que formavam uma equipafantastica. Um solluminoso descia obliquamente sobre ostelhados, infiltrava-se por entre as arvores e iluminavaos rostos felizes e entusiasmados de ambos. A toda a volta,passarospiavam e assobiavam. 0 transito da cidade troavae estrondeava. 0 pai soltou uma pequena gargalhada aopensar no que podiam fazer a seguir.
- Precisamos de um ninho, Lizzie.-Um ninho?- Sim. Para ficar tudo como deve ser. Para nos tor-
narmos passaros como deve ser.Lizzie fitou-o nos olhos.- Faz isso - disse-lhe ele. - Sentir-me-ei feliz.Ela sorriu, encolheu os ombros e disse:- Esta bem, paizinho. Do que precisaremos?Bom, precisavam de erva, galhos, palha, folhas, cordel,
panos de tabuleiro feitos em tiras, peda<;os de camisas,llLlsasvelhas, panos de po, peugas rotas, penas e cotao de
t.lpetes. Levaram tudo quanto conseguiram reunir para J
ozinha, ajoelharam-se no chao e juntaram todas as coi-sas, dando-Ihes a forma de urn ninho. Lizzie sorria e can-tarolava baixinho enquanto trabalhavam. 0 pai piava,assobiava e grasnava.
- Nao e maravilhoso? - perguntou. - Uma casinhaomo deve ser para nos.
Levou a mao a algibeira e tirou uma lagarta. Ergueu-a,uspensa dos dedos, e depois meteu-a na boca e engo-
liu-a.- Queres uma, Lizzie?Ela abanou a cabe<;:a.- Prefiro isto - respondeu, e trincou alguns amen-
doins.o pai levantou-se, pos-se em bicos de pes, abriu as
asas, levantou-as bem e meteu a barriga para dentro.- Olha, ja estou a ficar mais magro!- Nao pode ser! - exclamou ela, a rir, mas quando
olhou mais de perto pareceu-Ihe que estava, de facto.Tocou-Ihe com os dedos e chamou-Ihe costelas de lata.
- Nao tarda, estarei leve como uma penal - excla-mou ele.
Continuaram a trabalhar, moldando cuidadosamente 0
ninho de modo a formar urn circulo com uma concavi-dade funda no centro.
- Os passaros SaGos melhores do mundo quando setrata de cuidar dos seus filhos, sabias? - disse 0 pai._ Criam-nos bem e fortes. Protegem-nos de todos ospengos.
Continuaram a trabalhar ate, finalmente, acabarem.Depois entraram e sentaram-se, com as suas encantado-ras asas postas, no seu ninho de fabrico caseiro, ao cantoda cozinha, e sorriram de contentamento.
Lizzie e 0 pai trabalharam todo 0 dia e pela noite foraa juntar penas, cordel, linha, peda<;:osde tecido, cabi-
des, fitas, botGes e contas. Costuraram, cortaram e cola-ram. Na manha seguinte, as asas, 0 bico e a crista deLizzie estavam praticamente prontos. Lizzie e 0 paiencontravam-se parados a porta, usando cada urn as suasasas. Estavam cansados, mas tambem muito felizes eorgulhosos de si mesmos. Lizzie encostou-se ao paie disse que ele tinha razao, que formavam uma equipafantastica. Urn solluminoso descia obliquamente sobre ostelhados, infiltrava-se por entre as arvores e iluminavaos rostos felizes e entusiasmados de ambos. A toda a volta,passarospiavam e assobiavam. 0 transito da cidade troavae estrondeava. 0 pai soltou uma pequena gargalhada aopensar no que podiam fazer a seguir.
- Precisamos de urn ninho, Lizzie.-Urn ninho?- Sim. Para ficar tudo como deve ser. Para nos tor-
narmos passaros como deve ser.Lizzie fitou-o nos olhos.- Faz isso - disse-Ihe ele. - Sentir-me-ei feliz.Ela sorriu, encolheu os ombros e disse:- Esta bern, paizinho. Do que precisaremos?Born, precisavam de erva, galhos, palha, folhas, cordel,
panos de tabuleiro feitos em tiras, peda<;:osde camisas,hluSJS velhas, panos de po, peugas rotas, penas e cotao de
- Ali esta ele! Olhem! Olhem! Olhem!Lizzie soltava pequenas gargalhadas.- Homem pateta - disse. - De qualquer maneir:l,
SaGas maes que poem os ovos, nao os pais.- Sim, tens razao - concordou 0 pai, mas continuoL!
a apontar e a acenar ate 0 passarinho imaginario se afas-tar e desaparecer. - Adeus - disse. - Adeus, encanta-dor passarinho.
Depois voltaram a sentar-se em siH~ncio no ninho, atarde alongou-se e e1es dormitaram e sonharam os seussonhos de voar.
- Era capaz de ficar aqui sentado para sempre - disseo pai. - S6 eu e tu. - No entanto, levantou-se, desubito. Mas nao ha tempo para isso e temos de pensar aesse respeito. Vamos despachar essas penas da cauda, essesbicos e essas cristas, Lizzie!
Voltaram, portanto, ao trabalho. Lizzie observou 0 paie, passados momentos, disse:
- Pa ... papa ...- Sim? 0 que e, querida?- Bern ... Temos de compreender que, mesmo com
as penas, os bicos e as cristas pode nao ... resultar.- 0 que? - perguntou 0 pai. Pestanejou, abanou a
cabec;:acomo se nao a cOlnpreendesse, ou como se naoa quisesse compreender.
- Mas mesmo que nao resulte - continuou Lizzie- nao tera, realmente, importancia. Mesmo que tenhamde nos pescar do rio nao tera realmente importancia, poisnao, paizinho?
o pai pestanejou de novo e fitou-a. Engoliu umalagarta. Agitou as asas.
- Pio, pio! - disse.Lizzie sacudiu-lhe 0 brac;:o.
o pai riu-se e agitou 0 rabo.- Uiii! - disse. - Sinto urn ovo a sair.Pas urn ovo imaginario. Meteu a mao debaixo do
corpo, pegou-lhe e ergueu-o no ar, entre os rostos deles.Lizzie tirou-lho das maos. Disse que era lindo, com aluminosa casca azul sarapintada de castanho. Depoisdevolveu-lho e e1e voltou a coloca-lo no ninho.
- Agora vou sentar-me nele, ate chocar - disse, efechou os olhos e concentrou-se. - Ven'l, vem, pin-tainho - murmurou, e levantou-se de repente. - Deuresultado! - Pegou no piritainho imaginario, aconche-gou-o nas maos e encostou-o ao rosto. - Ola, peque-nino. Nao e encantador, Lizzie?
Lizzie olhou para baixo, para as maos do pai e sorriu.- E deslumbrante! - exclamou e, estendendo a mao,
tocou no pintainho imaginario e fez-lhe festas.Depois 0 pai abriu as maos e levantou-as.- Ele ja esta a crescer - disse. - Vail Voa! - 0 pas-
saro imaginario voou, afastando-se de1es. 0 pai apontou,I roda da sala e fingiram que estavam aver 0 passaroIIovi nho em folha a voar ali aroda.
- Compreende, nao compreende? - perguntou.- Pode nao funcionar. Mas, aconteya 0 que acontecer,te-lo-emos feito juntos, nao e verdade, paizinho? E issoque importa, realmente.
o pai levantou-se de urn pulo e comeyou a correra volta da sala, a bater as asas.
- Pio pio! - gritou. - Pio pio!- Paizinho! - protestou Lizzie. - Nao esta a ouvir-
-me?Depois soou urn grito, vindo do exterior.- ULTIMAS INSCRIC;:OES PARA 0 CON-
CURSO DO HOMEM-pASSARO!Lizzie e 0 pai pararam, imoveis. 0 grito voltou.MAIS ALGUEM QUER INSCREVER-SE
PARA 0 GRANDE CONCURSO DO pAs-SARO HUMANO?
o pai abriu a porta. 0 baixinho e gorducho Sr. Poopestava do lado de fora da cancela com 0 seu megafone ea sua prancha de apontamentos.
MAIS ALGUEM QUER INSCREVER-SEPARA ...
- Pst! - chamou 0 pai. - Venha ca, Sr. Poop!
O Sr. Poop olhou com atenyao para 0 paizinho. Pas-sou pela cancela na direcyao da porta.
- Mas ja 0 temos a si, Sr. Crow - disse.- Nao, nao se trata de mim - explicou 0 meu pai.
- Trata-se desta jovem.Desviou-se para 0 lado e indicou Lizzie, aIi pa-
rada.- Ah! - exclamou 0 Sr. Poop. - Mas nao e muito
jovem para uma aventura tao perigosa?- Eu olharei por ela. Os passaros sao os melhores do
mundo quando se trata de cuidarem dos flihos.- Hmmmmmm - murmurou 0 Sr. Poop.o paizinho levou-o para dentro de casa. 0 Sr. Poop
semicerrou os olhos, fitou Lizzie, deu urn estalinho coma lingua e abanou a cabeya. ,
- Ela e forte - afirmou 0 paizinho. - E corajosa.E a rapariga mais corajosa do mundo. Toda a gente 0 diz,nao e verdade, Lizzie?
- Ah, sim? - perguntou 0 Sr. Poop.Lizzie encolheu os ombros. Pensou no que 0 Sr. Mint
dissera a seu respeito, nas coisas que a tia Doreen as vezesdizia e nas que 0 seu pai sempre dizia. E pensou na suamaezinha, que diria que ela era corajosa, a mais corajosade todos os corajosos.
- As vezes - respondeu ao Sr. Poop.Os olhos dele suavizaram-se momentaneament
- Boa menina - murnlurou. - Depois levantou aprancha dos apontamentos e lambeu 0 bico do lapis.- Nome?
- Elizabeth - respondeu Lizzie.- Eli-za-beth - soletrou 0 Sr. Poop. Elizabeth que?- Elizabeth Crow! - respondeu 0 pai.- Elizabeth que?- Crow - disse 0 pai. - Cau caulo Sr. Poop olhou ambos com aten<;:ao.- Tern a certeza?- Tenho - respondeu 0 pai muito depressa. - Nao
e, Lizzie?- S-sim - confirmou ela, e deu consigo a imi-
tar 0 pai e a grasnar como uma gralha. - Caucaul Cau caul
o Sr. Poop tomou nota.- Ocupa<;:ao? - per-
guntou.Lizzie encolheu os
ombros.-Sou apenas
uma rapariga, achoeu. Ando na escola. , j J 'l.j.,.
- Nao - COf- "Iii ~L j
rigiu 0 pai. - Es 'fill j II1~mais do que isso! Es \l,~'illil.1 ;.uma Rapariga-passaro. 1'!/ 1 ,1.Eu sou urn Homem-Passaro, W, '~I:j.ela e u?'la Rapariga-Pas- .. " H:i' . f
E d f '1' ,r. ",' y lY'saro. e amI Ia. , ~Ii})'" ,1'o Sr. Poop es- .J /d'v
" J 'I 'fcrcveu lSS0,com a ~,i ~sua letra redondi-":i2~; ,':s"{,,_
nha. Fez uma pausa. Voltou a olhar para eles. Obscrvollas asas de Lizzie.
- Metodo de propulsao? Asas e fe, suponho?- Sim. Correcto. Asas e fe. E 0 bico e a crista. Mos-
tra-lhe, Lizzie.Lizzie pas 0 bico e a crista.- Nao deve ter visto nada semelhante, pois nao? -
perguntou 0 pai. - E teremos penas de cauda, tal comourn passaro como deve ter. Foi a Lizzie que teve a ideia.Ela e urn genio em metodo de propulsao!
o Sr. Poop observou Lizzie e 0 pai. Espreitou paradentro do ninho. Deu uma palmadinha na face. Lambeuo bico do lapis.
- Hrnmm - murmurou. - Hmmmmmmmmmm.Friccionou a barriga gorducha.- Cada dia sac mais - comentou. - Ha urn cam-
pdo de salto em comprimento nurn navio vindo de Ma-dagascar. Ha urn praticante de saIto a vara vindo deSrnolensko. Ha uma jovem trapezista de Malta, urn con-dutor de carros de mao de Cuba e sete rodopiantesdervixes de Tashkent. Ha saltadores em espi-ral, vaiadores, os que descem a pique e aoataque e os que saltarn atraves de arcos.Ha urn tipo que tern urn milhaode pulseiras elasticas cor-de--rosa. Ha escorregas, fisgas ebestas com tres metros e ...
- E ha os que sac comonos, com asas! - acrescentouo meu pal.
- Pois ha - admitiu 0 Sr.Poop. - Infelizmente, ha. - Esten-deu a prancha de apontamentos e 0 lapis
a Lizzie. - 0 rio esta muito molhado nesta altura doano, Menina Crow. Assine aqui. E aqui. E tambem aqui.
Lizzie assinou e sorriu.Ele estudou a assinatura.- Inscriyao aceite! - declarou, assinou, tambem, ele
proprio, e meteu a prancha de apontamentos debaixo dobrayo.
- Tern asas de agua, Menina Crow? - perguntou 0
Sr. Poop.- Asas de agua! - troyou 0 paizinho. - Va-se em-
bora, Sr. Poop, toca a andar.o Sr. Poop voltou a sair.- Ate domingo! - despediu-se. - A partida e as dez
horas da manha!o meu pai fechou a porta atras dele.- Homem-Passaro e Rapariga-Passaro - comentou.
- Seremos os maiores voadores que 0 mundo jamais viu.Uuuupi! - Desatou a correr a volta da sala e depoisparou, a pensar.
- Eu deixo-te ganhar, Lizzie - disse, por fim.- 0 que?- Deixo. Deixo-te ganhar. Quase no fim, abrando e
tu podes ultrapassar-me. Podes passar por mim como umaflecha e atravessar a meta. E isso mesmo! Lizzie Crow,Passaro-Humano! Deem mil libras aquela pequena!
Desataram as gargalhadinhas. Depois pararam. E escu-taram.
- Esta alguem no jardim - murmurou Lizzie.Dirigiram-se para a janela em bicos de pes. Espreita-
ram para 0 jardim.- Quem e? - perguntou 0 pai, num sussurro.Nao viam nada diferente do habitual, apenas as arvoresas sombras a adensarem-se sob os ramos das arvores.
Mas havia urn ruido sussurrante e, agora, parccia l\lIl'
,II yuma coisa se movia atraves das sombras. 0 que scri:\?Lizzie espreitou fixamente, mais fixamente ainda, cd 'pois distinguiu urn vulto familiar.
- Oh, e apenas a tia Doreen, outra vez - respon-I u, mas logo a seguir arquejou. - Oooh, e 0 Sr. Mint'sta com ela!
- Depressa! - disse 0 pai. - Para 0 ninho!
Atia Doreen e 0 Sr. Mint hesitaram, a porta. Encos-taram-lhe as orelhas. Nao se ouvia nada. 0 Sr. Mint
teve urn calafrio.- Tern a certeza de que isto esta certo, Sra. Doody?
- perguntou.- E claro que esta certo - respondeu a tia Doreen.
- 0 homem e doido varrido. Temos de libertar a pobrerapariga das garras dele.
Girou, devagarinho, a mac;:anetada porta e abriu-a,tambem devagarinho.
- Mas entrar a socapa na casa de alguem ... - lem-brou 0 Sr. Mint. - UlTl homem com a minha posic;:ao...
A tia Doreen arrastou-o atras dela.- De que sao feitos os directores das escolas, hoje em
dia? De plasticina? - perguntou. - No meu tempoeram mulheres e homens de ac;:o!
Tirou urn d6nute da algibeira do avental e estendeu--lho.
- Tome. Isto vai dar-lhe coragem.o Sr. Mint olhou para 0 estranho objecto.- 0 que e?A tia Doreen fitou-o, espantada. Seria possivel que ele
nao soubesse 0 que era urn d6nute?- Ora essa, e urn d6nute recheado! - exclamou.- Mas eu nao gosto de d6nutes recheados - disse 0
Sr. Mint.
- E claro que gosta. Toda a gente gosta de donutesrecheados. Enfie-o pe1a goe1a abaixo!
Puxou-o para dentro. Olhou em redor da sala. 0 Sr.Mint mordiscava 0 donute.
- Sim, na verdade e uma coisa muito saborosa -disse, surpreendido. E voltou a mordiscar. - E, real-mente, deliciosa, Sra. Doody.
- 0 que? - resmungou e1a.- 0 donute, Sra. Doody. E... e delicioso.A tia Doreen corou e baixou os olhos.- Acha, realmente, Sr. Mint?- Acho, Sra. Doody.- Doreen - corrigiu a tia Doreen. - Pode tratar-
-me por Doreen.Foi a vez de 0 Sr. Mint corar e baixar os olhos.- Obrigado, Doreen - respondeu e voltou a mor-
discar 0 donute. - Sabe, hoje em dia nao se encontramdonutes recheados como estes. Nao com urn sabor assim.Nao com ... esta consistencia.
- Obrigada, Sr. Mint - agradeceu a tia Doreen.- Mortimer - murmurou e1e. - Mortimer Mint.- Mortimer Mint? - repetiu, como num eco, a tia
Doreen. - Mortimer Mint? Parece uma especie de docede horte1a-pimenta!
- Era 0 que a minha mae costumava dizer. Costu-mava tratar-me por Docinho. Ou Chupa-Chupa.
- Chupa-Chupa?o Sr. Mint mordeu 0 labio.- Nao diz as crianc,:as,pois nao, Doreen? Eu nao con-
scguiria suportar se a senhora dissesse as crianc,:ase elasJ IlC chamassem Polo na escola e ...
A tia Doreen ergueu urn dedo. Semicerrou as palpe-hr:ls C olhou em redor da sala.
- Chiu! - ordenou, sibilante. - Escute! E lIJ11.1
especie de flip-jlap. Uma especie de sussurro. Um rcstollur. .. Urn assobiar baixinho.
Olhou de novo em redor da sala. Ficaram a escut:l.Ouviam 0 adorave1canto dos passaros vindo do exterior,o transito distante, 0 estrepito e 0 estrondear longinquosda cidade. Ouviam a propria respirac,:ao.0 bater caden-ciado e forte dos seus corac,:oes. Estavam parados emsilencio, meio extasiados. 0 Sr. Mint sorriu. Assobioubaixinho, com os passaros. Ergueu os brac,:os,como seestivesseprestes a voar.
- Sao apenas os passaros, Doreen.A tia Doreen deu urn estalinho com a lingua.- Apenas os passaros?E ai, precisamente, que bate 0
ponto, Sr. Mortimer Mint. Estao a acontecer coisas estra-nhas nesta casa. Coisas estranhas, coisas peculiares. Tra-palhadas com penas, bicos e asas. E eu nao tolero isso!- Passou qualquer coisa, zumbindo, pe1a frente do seunariz. Deu urn saIto. - Oh, apre! 0 que foi aquilo?
- Uma mosquinha, apenas uma mosquinha - res-pondeu 0 Sr. Mint, dando uma leve palmada no brac,:oda tia Doreen. - Nao vai contar, pois nao?
A tia Doreen pestanejou.- Contar a quem?- As crianc,:as.A respeito do Polo - disse, baixinho.- Nao seja tao parvo, Mortimer. 0 que temos de fazer
e encontrar aque1a pobre rapariga. Veja a barafunda emque e1avive. Olhe para aque1e monte de lixo no chao!
Deu a volta a sala em bicos de pes e aproximou-se maisdo monte de lixo. Era 0 ninho, evidentemente. Os olhasda tia Doreen arregalaram-se. Apontou para 0 ninho.Lizzie e 0 pai estavam ali sentados, absolutamente imov -is,com as asas cruzadas por cima das respectivas cabeyas.
- Eu nao disse que havia trapalhadas? - perguntou,esgani<;:ada.
Aproximou-se mais, em bicos de pes. Inclinou-se parabaixo. 0 Sr. Mint foi atras dela. Inclinou-se tambem.
De subito, 0 pai levantou-se de urn saIto, bateu as asase grasnou: «Cau caul Cau cau!»
E 0 Sr. Mint desatou a gritar esgani<;:adamentee cor-reu na direc<;:aoda porta. Atia Doreen agarrou-o pelo colarinho e puxou-o para
dentro. 0 meu pai agitou os bra<;:ose grasnou afrente deles.
- Eis 0 culpado! - exclamou a tia Doreen -:E eleque tern andado a desencaminhar 0 seu aluno! 0 Ho-mem-Passaro e ele!
o Sr. Mint estendeu a mao e disse:- Muito prazer em ve-lo de novo, Sr. ..- Cau! Cau! - disse 0 paizinho. - Caul CaulEstendeu 0 bico para 0 Sr. Mint, que se dirigiu de
novo para a porta.- Mortimer! - gritou a tia Doreen. - POLO!o Sr. Mint parou. Baixou os olhos para 0 chao.- Diga 0 que pensa ao pai de Lizzie.o Sr. Mint esfregou os olhos e nao disse nada.- Vamos, homem - insistiu a tia Doreen. - Diga-
-lhe por que esta aqui. Com a breca! :E urn director esco-lar, homem!
Lizzie abriu as asas e saiu do ninho. Dirigiu-se, deva-gar, para eles.
- Elizabeth,vem ca- chamou a riaDoreen. - Temosdete afastarde tudo isto. Mortimer, encarregue-se da sua alunJ.
Lizzie bateu as asas.- Cau cau! - gritou.- Olhe para ela! - exclamou a tia. - OUp-J. 1"li
zabeth! Quantos sao sete mais dois mais seis IllJis oilo
mais cinco? Esta aver? Nao responde. A rapariga v:li .1caminho da destruiyao. «Diz como se escreve Checos/ovaquia.» Esta aver? Nao responde. A rapariga vai a GIIIII
nho da desgraya e da destruiyao.- Cau caul - disseLizzie.- Cau cau cau cau cau C111!
Fingiu correr para 0 Sr. Mint, mas parou e sorriu-Jlll'.Tinha a certeza de que ele compreenderia.
Depois disse, baixinho:- S6 estou a faltar a escola para poder olhar pelo mell
pai, Sr. Mint.- Olhar por ele? - perguntou esganiyadamente a 6:1
Doreen. - 0 homem precisa e de ser internado!- Nao faya caso da tia Doreen - pediu Lizzie.
- Ela as vezes e urn pouco tonta.- Ela e 0 que? - guinchou a tia.Lizzie dirigiu-se para ela, a agitar os brayos, e deu-Ihe
urn beijo na face.- Mas na realidade e adoravel. - Sorriu, quando a
tia abriu a boca, espantada, e dirigiu-se de novo ao Sr.Mint. - Volto para a escola na pr6xima segunda-feira,depois do concurso.
pai tirou 0 bico.- Assim e que se fala, Lizzie - disse. - Vai, DorCCIl.
WISr. Mint. Vao, vao!Sr. Mint sorriu e voltou-se para sair. A tia Doreen
(lbservava-o, pasmada.- Entao e assim? - gritou. - Nao tern, realmente,
Illais nada para lhes dizer? 0 senhor e urn homem dis-Linto. Urn homem com autoridade. Urn homem ques:1becontrolar uma situayao!
o Sr. Mint suspirou. E ponderou. Deu uma palmadi-IIha na cabeya e afagou 0 queixo. Voltou para tras. Exa-l11inoucuidadosamente as asasdo paizinho e as de Lizzie.. Llspirou e ponderou de novo. Ficaram todos a espera.
- Acha que funcionara? - perguntou.- 0 que? - guinchou a tia Doreen.- E claro que sim - respondeu 0 paizinho. - Estas
asas que fizemos SaGmaravilhosas, Sr. Mint.o Sr. Mint continuou a ponderar.- Creio que ... - murmurou - ...se correr suficien-
temente depressa e saltar suficientemente alto e bater asasas com forya suficiente ...
Trotou aroda da sala. Deu pequenos saltos e tentoubater com os brayos como se fossem asas.
- A ideia e essa - disse 0 paizinho. - Quer par asminhas asas e experimentar?
- Mortimer! - guinchou a tia Doreen e atirou-Iheurn d6nute que nao the acertou, seguiu em frente, bateuna parede e ficou Ii colado.
- Tambem vamos ter penas de cauda - disse 0 pai-zinho. - A ideia foi da Lizzie.
- Ah! - exclamou 0 Sr. Mint. Optima idei::l,Elizabeth. Ela e uma menina muito esperta, sabem? -Meditou profundamente. - Sao os ossos, nao sao? Os
ossos dos passaros sao muito mais leves do que os nossos.Por isso, para compensar, temos de ...
- MORTIMER! - gritou, zangada, a tia Doreen.- POLO! - 0 Sr. Mint nao fez caso.
- E claro - prosseguiu - que ha exemplos de cria-turas pesadas que sao capazes de planar ou voar ... - Des-colou 0 d6nute da parede. Atirou-o para cima e para baixo,para avaliar 0 seu peso. - Interessantes problemas, Sr. ..Crow. Desconfio de que estas a aprender muito, Elizabeth.
Sopesou 0 d6nute.- Se conseguissemos descobrir uma maneira de ser-
mos arremessados com forya suficiente ... Inclinou-separa tras, recuou 0 brayo e arremessou 0 d6nute pela salafora. 0 bolo passou, com urn silvo, pela cabeya da tiaDoreen e embateu de novo na parede. 0 Sr. Mint sor-riu. - Ainda e possivel participar no concurso?
- E claro que sim - respondeu 0 paizinho. - 0 tipoesteve aqui esta manha. Inscreva agora 0 seu nome, Sr.
Mint.o Sr. Mint acenou com a cabeya e reflec-
tiu. A tia Doreen agarrou-lhe 0 brac;:o epuxou-o para a porta.
- Adeus, tia Doreen! Gostei muito de a vel'. AcklIS,. r. Mint. Verno-nos na segunda-feira.
- Ou ate mesmo no domingo! - respondeu 0 Sr.Mint.
- Isso seria formidavel! - exclamou Lizzie.- 0 director escolar voador! - disse 0 pai.A tia Doreen suspirou.- 0 mundo esta louco - gemeu.Lizzie lembrou-se, de subito, do que a tia Doreen lhe
perguntara.- Oh, tia Doreen ...-0 que?- Sao vinte e oito - respondeu Lizzie.A tia fitou-a, com os olhos muito abertos.- Sete mais dois mais seis mais oito mais cinco
disse Lizzie. - A resposta e vinte e oito. E Checoslova-quia. E: C-H-E-C-O ...
- Certo! - confirmou 0 Sr. Mint. - Linda menina,Elizabeth!
Mas a tia Doreen limitou-se a tapar os ouvidos comas maos.
- E verdade - disse. - 0 mundo enlouqueceu!
Entao ficara escuroComo 0 interior da barriga do tubarao.E depois dormiremosCom os cordeiros do agricultorE seremos felizesComo uma fralda acabada de lavar.
o anoitecer vem a{Como um delicioso scone com manteiga.A noite nao tarda a aparecerComo a barbatana de um peixinho.
Lizzie bateu palmas, baixinho.- E lindo, paizinho - sussurrou.Juntou-se a ele e cantaram de novo a canc;:ao.- Fui eu mesmo que a fiz - disse 0 pai.- Es urn paizinho muito inteligente.o sol nao tardou a desaparecer por completo, a escuri-
dao foi alastrando pelo ceu cor de tinta e as estrelascome-c;:arama brilhar. Piou urn mocho, e depois outro.
- Adoro a noite - disse Lizzie.- Tambem eu. E tu tens razao, sabes?-Em que?- Tens razao - repetiu ele. - Nao importa se voa-
mos ou caimos. Temo-nos urn ao outro. Fazemo-lo jun-tos. E so isso que importa.
Lizzie sorriu.- Sim - disse baixinho. - E so isso que importa.o luar prateado inundou, brilhante, a sala. Os mochos
piaram e, algures, uma ave nocturna cantou. Lizzie e 0pai voltaram a cantar e danc;:aramao ritmo da propriacanc;:aoe do canto dos passaros. Andaram devagar, silen-ciosamente. Ergueram os brac;:os,bateram as asas, can-taram, assobiaram e arrulharam; de vez em quando,tinham de olhar para baixo, para terem a certeza de queos seus pes nao estavam, realmente, levantados do chao.
E depois adormeceram e sonharam os sonhos dos pas-saros.
Opai e Lizzie observaram 0 Sr. Mint enquanto elesaia do jardim. Depois fecharam a porta.
- Coitada da tia Doreen - disse Lizzie.- Sim - concordou 0 pai. - Coitada da tia Doreen.
o Sr. Mint e urn tipo simpatico, nao e?- E - concordou Lizzie. - Depois deu uma gar-
galhadinha e levou a mao a boca.- Polo Mint! - murmurou.- Polo Mint! - exc1amou 0 pai.o dia comec;:avaa escurecer. Olharam pela janela na
direcc;:aodo par-do-sol que brilhava, incandescente, porentre as arvores e sobre os te1hados da cidade.
- 0 tempo voa - disse 0 pai, sorrindo e apontandopara 0 ar. - La esta ele, a fugir para longe! Agarra-o!- Deu urn salto, segurou 0 tempo entre as maos e mos-trou-o a Lizzie.Ela pegou-lhe e atirou-o de novo para 0 ar.
- La vai e1e! - gritou. - Adeus. Adeus, tempo!Ficaram os dois a olhar. 0 ceu comec;:oua arder, em
tons fortes de vermelho, amare10 e laranja, e tornou-semuito belo.
o pai cantou:
•* *
- 9ue dia e hoje? - perguntou Lizzie.-E 0 DIA DO GRANDE CONCURS()
DO HOMEM-pASSARO! - gritou 0 Sr. Poop.- Oh, nao! - exclamou 0 paizinho.- Nao estamos prontos! - exclamou Lizzie.Dirigiu-se, com passo incerto, para a janela. La forJ,
na rua, estava 0 pequeno e gorducho Sr. Poop com 0 sellmegafone.
- Vieram do Atol de Bikini e de Baton Rouge! Vie-ram de Chattanooga e de Chateauneufl Olha! Ali esta aMulher Libelinha do Dubai! E 0 Helic6ptero Humano,Hubert Hall!
- Paizinho! Vamos chegar atrasados!Atarefaram-se a ajustar as asas. Puseram os bicos, as
cristas e as caudas.
RATAPLANl RATAPLAN!CHEGOU A HORA DO GRANDE CON-
CURSO DO HOMEM-pASSARO!A voz do Sr. Poop ecoou pelas mas fora, ressaltou das
paredes e dos telhados, ecoou pela cidade inteira.- RATAPLAN! RATAPLAN!o paizinho e Lizzie dormiam profundamente. A voz
do Sr. Poop vibrou e ecoou nos sonhos deles.- RATAPLAN! RATAPLANl- 0 que e aquilo? - perguntou 0 paizinho.
- Esta ali Benny, 0 Rapaz Zangao, vindo de muitolonge, de Burramurra! - gritou 0 Sr. Poop. - Vamos!o concurso esta quase a comeyar! Rataplan! RATA-PLAN!
Bateram as asas. Acenaram para 0 ceu.- Ola, maezinha! - disseram baixinho. - Ola, que
ridalDepois respiraram fundo, voltaram a abrayar-se e sai-
ram a correr pela porta fora.- Estamos prontos! - exclamou 0 paizinho. - Lizzie,poe as tuas asas como deve ser! As minhas esrao bem?
Abriu a porta e voltou a gritar:- Estamos quase prontos, Sr. Poop!- Enrao venham, VENHAM! - gritou 0 Sr. Poop.- E verdade? - quis saber Lizzie. - E verdade que
vieram todas aquelas pessoas de todos aqueles lugares?o Sr. Poop pareceu surpreendido com a pergunta.- E claro que e verdade! - respondeu.- Nao tern a sensayao de
estar a sonhar? Olhe, ali vai 0
Eddie Elastico de Elsmere Port!E Danny, 0 Dardo de Donegal!Winnie Gira-Gira de Wye! Ve-nham ver Bess Bern-Bonita deBaffin Bay! Sid Sobe-Sobe de ...Venham! Despachem-se! Jun-tem-se a nos!
- Esta pronto, paizinho? -perguntou Lizzie.
- Prontinho, Lizzie.- Como estou eu?- Perfeita - respondeu 0
pai. - E eu?- Esta como urn Hornem-
-Passaro.Abrayararn-se.- Irnagina ... Se a tua rnae-
zi nha nos pudesse ver agora!
-Jackie, homem! Lizzie! Como se escreve pneullI:I-tiza\=ao?Quantos SaGvinte mais oito, mais sete, mais trcse mais seis? Estas aver? Nenhuma resposta! 0 teu cere-bro est} todo baralhado! Nao fa\=asisso, menina!
Lizzie e 0 paizinho desataram a rir e passaram por elaa correr, direitos ao Sr. Poop.
- Ca estao elas! - gritou 0 Sr. Poop. - Abramcaminho para as Gralhas! Ca estao elas, Lizzie Saltadorae Jack Saltitao, os seres voadores la de baixo! 0 Concursodo Homem-Passaro! ESTA NA HORA DO GRANDECONCURSO DO HOMEM-pASSARO!
- Ah, os parv6ides, os cabe\=asde amendoim- disse a tia Doreen.
Abriu a boca, ofegante, quando viu 0 Sr.Mint sair pela cancela a correr, com fogode artiflcio amarrado ao traseiro e 0
NAO FA\=AS ISSO!Era a titl Doreen, samdo a trote pela cancela.
- Oh, Doreen, nao sejas ta~ assustadi\=a!- Nao fa\=asisso, Lizzie - repetiu a tia Doreen.
- Ele e pateta como urn d6nute!- Nao e nada - protestou Lizzie. - E maravilhoso.
- Beijou a bochecha da tia Doreen. - E a tia tambeme maravilhosa.
barrete bicudo na cabec;:a.Soprou-lhe urn beijinho, quandopassou por ela.
- E 0 altaneiro professor principal, Missil Mint!- gritou 0 Sr. Poop. - Deixem-no passar!Abram cami-nho! Abram caminho!
o Sr. Poop viu a tia Doreen ali parada e dirigiu-separa a cancela do jardim.
- Algumas inscric;:5esde ultima hora? - perguntou,abrindo muito os olhos. - E a senhora?
- Eu? - disse a tia Doreen, com voz roufenha.- Sim, a senhora. Venha, junte-se a nos. Diga-nos
como se chama equal e 0 seu metodo de propukio! Naohesite. Suba com os outros para 0 ceu.
A tia Doreen meteu a mao na algibeira do avental.Atirou urn bolinho ao Sr. Poop, que se baixou e deu umagargalhada.
- Ah! - gritou. - E a Dumpling Dora de Dung-ness?
Ela atirou-lhe outro bolinho e depois correu para den-tro de casa. Tirou a sua gordura, a sua farinha, os seusovos, a sua agua. Pas tudo numa grande tigela e comec;:oua misturar, a mexer, a bater e a cantar.
- Bolinhos, bolinhos, deliciosos, oh, deliciosos boli-nhos ...
La fora, iniciou-se 0 concurso.- 0 NOSSO PRIMEIRO CONCORRENTE! -
gritou Sr. Poop. - Woodpecker Wallie, vindo da distanteWhitley Bay!
A tia Doreen parou e escutou.- E de loucos - disse. - E impossivel. Ninguem
seria capaz de ...-CINCO! - gritou 0 Sr. Poop. - QUATRO ...
1RES ... DOIS ... UM! - La vai ele, minha gente!
Rufou urn tambor. A multidao gritoLl estroIHlo,',1mente. A tia Doreen fechou os olhos e rezou.
- Forc;:a,Wallie! - incitou-o 0 Sr. Poop. - Oil,SIM ... ! OH, SIM ... ! Oh, nao..!
Ouviu-se urn grande, urn tremendo chapel- Deixe la, Wallie! - gritou 0 Sr. Poop. - Quelll
se segue na fila?
Atia Doreen misturou, rnexeu e bateu.- Bolinhos fofos! - cantarolou. Saborosos,
deliciosos bolinhos fofos ...Ia fazendo pausas e batendo.- 0 rneu cerebro da voltas e reviravoltas - disse.
- 0 rneu pensarnento torce-se e retorce-se. 0 rneucora<;:aoprotesta e galopa. Oh, trolaro-laro ...
Mas os seus olhos estavarn a ser atraidos para a janela,para 0 concurso. Os seus ouvidos estavarn a ser arrasta-dos pela voz do Sr. Poop.
- Que rnaquina rnaravilhosa! - exc1arnava 0 Sr.Poop. - Que cria<;:ao, que inven<;:ao, que rnecanisrno!
A tia Doreen nao conseguia ver nada. Bern se punha embicos de pes, mas nao via nada a nao ser arvores e ceu vazio.
- Esta pronta? - gritou 0 Sr. Poop.Ela nao se conteve. Correu para fora de casa. Arnari-
nhou por urna cerejeira.- Pedale depressa, rninha senhora! - gritou 0 Sr.
Poop. - Pedale depressa!A tia Doreen fez urn esfor<;:oe subiu rnais alto. Olhou
na direc<;:ao do ceu, sobre 0 rio.- Pedale rnais depressa! - gritou novarnente 0
Sr. Poop. - Pedale rnais depressa! Mais depressa! Maisdepressa! La vai ela!
E, sirn, ali estava urna bicic1eta com asas a voar pelocell fora! E, nela, urna rnulher a pedalar tao velozrnentc
que nern se the viam os pes. Urna rnultidao gritava, ova-cionava, berrava.
- Mais depressa! - gritou 0 Sr. Poop. - Mais rapidodo que isso, rninha senhora! E esse 0 estilo! OH, SIM!. ..
Mas a bicic1eta ziguezagueou, ressaltou e caiu com urntrernendo estrepito, urn grande estardalha<;:o e urn alaridodecepcionado da rnultidao.
- OH, NAO! - gritou 0 Sr. Poop. - Tirern-nadali, rapazes! Melhor sorte para a proxima vez, rninhasenhora. E agora, olhern! E 0 Eddie Elastico! La vern ele!
Houve urn ofegar de excita<;:ao, urn rnurrnurio, urns11encio, 0 rufar de urn tarnbor.
A tia Doreen conseguiu subir urn pouco rnais. Final-I1lente podia ver ate ao rio. Via as rnultidoes aglorneradas'm cada rnargern. E viu Eddie Elastico com 0 sell fatod' borracha azul e 0 seu capacete arnarelo. Viu-o aCCl1;lra l11ultidao e depois encostar-se, para descansar as COSI:IS,
a uma enorme catapulta feita de urn milhao de bandas deelastico. Viu os auxiliares puxarem a catapulta para tras eestica-Ia ate ficar tensa, cada vez mais tensa.
- E assim mesmo, rapazes! - exc1amou 0 Sr. Poop.- Estiquem bem esses elasticos. Puxem com mais fon;:a.Estas bern, Eddie? Estas pronto, Eddie?
Eddie ergueu os polegares, em sinal de resposta. Re-cuou, recuou, ao mesmo tempo que a catapulta se ia esti-cando atras dele.
- Excelente! - gritou 0 Sr. Poop. - Afastem-se,senhoras e senhores. Muito bern, rapazes. Cinco, quatro,tres... Ainda nao! Ainda nao! - Mas os rapazes nao con-
seguiram suportar 0 esforyo e largaram cedo de malS.- Aguenta, Eddie! - gritou 0 Sr. Poop. Mas Eddiesoltara-se e, descontrolado, voava as cambalhotas pelo ar.
- Uiii! - gemeu a tia Doreen.- Oiii! - gemeu 0 Sr. Poop. - OH, NA.O!Ouviu-se urn gemido, urn estrepito e urn enorme
chapel, e 0 Sr. Poop gritou:- Azar, Eddie! Bern, pesquem-no dali para fora!
E agora, Lenny, 0 Saltador, a Pulga Humana!A tia Doreen olhou para baixo. Tremeu. Subira dema-
siado alto. Como conseguiria, alguma vez, descer dali?- Se alguem e capaz de 0 fazer, e 0 Lenny! - gri-
tou 0 Sr. Poop.- Nao fayas isso! - gritou a tia Doreen. - E urn
disparate! E uma loucura. E imposslvel! Tirem-me daqui!
- Li vais tu, rapaz! Salta, Lenny, salta!Lindo menino!Mais alto! MArS ALTO! Salta para a... Ora bolas!
Grito e gemido, chapinhar e esbracejar, e «Pesquem--no dali, rapazes! Azar, Lenny! Quem se segue?»
E a tia Doreen, sozinha em cima da cerejeira, gritava:- Socorro! Socorro! Tirem-me daqui!
Lizzie e 0 pai esperavam no declive para 0 rio. Tre-miam de nervosismo. Davam gritos de encoraja-
mento e ofegavam decepcionados. Nao paravam quietose treinavam pequenos saltos e corridas. Batiam as asas.Acenavam a multidao.
Benny, 0 Zangao, zumbia por cima das suas cabe<;:asepara baixo, para 0 rio. Winnie girava 0 seu moinho depapel e saltou em parafuso para a agua. Bess Salta-Poci-nhas desceu a saltitar, dentro de uma enorme bola, poruma ingreme e comprida rampa e caiu a pique na agua.Sid, 0 Planador, planou do alto de um campanario, deutres cambalhotas e atirou-se ao Tyne com um perfeitomergulho de andorinha. 0 Helic6ptero Humano HubertHalllanc;:ou-se de um telhado, pairou no ar enquanto aslaminas de fabrico caseiro do helic6ptero zumbiram aroda da sua cabec;:adurante dois segundos e depois caiucomo uma pedra. E durante todo esse tempo a multidaogritava, ladravam caes, miavam gatos, guinchavam gai-votas e 0 Sr. Poop, de pe em cima de um escadote altoe com um megafone junto da boca, gritava uma serieinfindavel de conselhos.
- Mais alto!Mais alto!
Mais RapidoMais Ousado!
Isso! Isso! Finalmente! Iupi!Ai Jesus! Oh, nao! Oh, diabo!Pesquem-no dai para fora!
Pesquem-na!Quem se segue?Maravilhoso!
Inacreditavel! '. ~Surpreendente! ~~ '\
Isso e que e estilo! ~ "l ~,Oh, diabo! a?, sim! Oh, nao! ~ "J.t"-~Que categona! ~ "" l~ I
Oh, diabo! 1 " '''" ...JOh ~ . na~o'. I'" """}, nao, ura, I ~ "'..•..'" \
'j.. •••••••.•
I"",,,,. I', \E foram trambolhoes e gran- ! "" . i •.. ~
des mergulhos, c gritos e als, ate, ;', -'<.. -,.~ . ~ "
finalm;;~e,~o:~~~~~~a._ }"" ~~>,"~• ~\1 ,.~. ~
gritou 0 Sr. Poop. - Che- f ...,....;gou a vez das gralhas! f ,•..",""-. ~"-fAbram caminho para 0 pai ~ ,."",.•.templumado e para a sua •saltitante filha!
Lizzie e 0 pai levantaram-se de urn pulo.A multidao rugiu.
- Reparem no trabalho que aquelas asasexigiram! - gritou 0 Sr. Poop. - Quantainvenyao! Quanto engenho! Conseguirao?Gritem para que avancem, senhoras e senho-res! Gritem para que subam!
Mas Lizzie hesitou.- E a tia Doreen? - perguntou.- A tia Doreen 0 que?- Nao podemos fazer isto sem deixar
que a tia Doreen veja - explicou a menina.Olharam ambos para tras, na direcyao da
casa.- Tia Doreen! - gritou Lizzie. - TIA
DOREEN! E A NOSSA VEZ!Mas a tia Doreen sabia que era a vez deles
e estava a tremer na arvore, com os olhosfechados com forya e as maos a tapar as ore-Ihas.
- Venha! - chamou 0 Sr. Poop. - Asorte favorece os corajosos!
- Venha! - gritou a multidao.- Venha! - gritaram os outros concorrentes.- Venha! - disse Lizzie ao pai e comeyou a correr
direita a casa.- De-nos dois minutinhos! - gritou 0 pai ao Sr.
Poop.Correram para a cancela, entraram no jardim, trans-
puseram a porta e chegaram a cozinha. Nao estava laninguem! Abriram a boca, ofegantes e surpreendidos.Procuraram. Gritaram por ela. Onde estavaa tia Doreen?Ouviram, entao, urn grasnido esquisito, vindo do exte-rior, e olharam. A tia Doreen estava na cerejeira! Sairama correr e pararam por baixo dela. 0 pai olhou para cima,estupefacto.
- Doreen! Que estas a fazer ai na cerejeira?- Nao se importe com isso agora - disse Lizzie.
- E a nossa vez, Titi Doreen! Tern de descer dai e ver--nos voar!
A voz do Sr. Poop ecoou sobre os telhados. .-AS GRALHAS! 0 QUE ACONTECEU AS
GRALHAS? TEM DE VOLTAR, CASO CONTRA-RIO SERAo DESQUALIFICADAS!
- Por favor, Titi Doreen! Por favor! - suplicOtJLizzie.
- Mas e tudo ... - disse a tia.- Nao se importe com 0 que podera ser, Titi. Sc Il~O
volta agora e nao vem connosco estara tudo perdido!
- LIZZIE! JACKIE! - gritou 0 Sr. Poop. - ONDEDIABO ESTAO AS GRALHAS?
- Por favor! - pediu 0 paizinho.- Por favor! - repetiu Lizzie.- PERDERAM A CORAGEM? - gritou 0 Sr.
Poop.A tia Doreen olhou para baixo, para eles.- Mas eu nao posso descer - disse, baixinho.- LIZZIE! JACKIE! VOLTEM JA!- Salte - disse Lizzie. - Salte, Titi Doreen, salte!- SE CORAJOSA! - gritou 0 Sr. Poop.E a tia Doreen respirou fundo, murmurou uma breve
OrayaO,saltou ... e caiu como urn bolinho recheado aolado deles.
V0ltaram para tras, a trote e a correr a toda a velocidade, para 0 rio. A multidao soltou urn enOrJllC
grito de allvio e contentamento.- MUlTO BEM! - gritou 0 Sr. Poop. - EU
SABIA QUE NAO NOS DElXARIAM FICAR MAL.AFASTEM-SE! ABRAM CAMINHO PARA ASGRALHAS!
Lizzie e 0 pai deram as maos, prontos para comeyarenl.- Deseje-nos sorte, tia Doreen - pediu Lizzie.- Diz-nos que esperas que corra bem - pediu 0 pai.-JACKIE! - gritou 0 Sr. Poop. - LIZZIE!- De-nos urn abrayo - pediu Lizzie.- Da-nos urn beijinho - pediu 0 pai.- Diga que nos ama e espera que nos saiamos bem.- VENHAM! - gritou 0 Sr. Poop.o paizinho e Lizzie olharam para a tia Doreen. A tia
Doreen olhou para eles.- Ai! - murmurou. - Adoro os dois e espero que
se saiam bem- Estamos preparados, Sf. Poop! - gritou 0 paizi-
nho.-PRONTO, FINALMENTE AS GRALHAS
ESTAO PRONTAS! COLOQUEM A RAM P/\,RAPAZES!
Os ajudantes ergueram uma rampa a beira do rio. III
tambor comeyou a rufar. A multidao murmUC.lV:l,:1 ,·i(:1i1.1.
- Agora deem-Ihes espayO suflciente - pediu 0 Sr.Poop, em tom mais brando. - Afastem-se! Asas eJef -murmurou pe10 megafone. - Nada de extravagante par:)as gralhas. Nada de maquinas, ou motores, ou flsgas, oubandas de elastico. Asas, fe, esperanya e... atrevo-me :1
dize-Io? .. amor!A rampa estava pronta. Inc1inava-se para cima. A sua
extremidade pairava sobre a agua. 0 paizinho e Lizziesubiram para e1a, preparados para correr. A tia Doreen
espreitava por entre os dedos. 0 seu corayao batia comforya, a galope. 0 seu cerebro temia e tremia pe10s dois.
- Reparem na expressao dos olhos de1es - mur-murou 0 Sr. Poop. - Reparem naque1es corajosos sor-risos. Trabalho arduo, concentrayao, asas e conflan<;:a!E amor, senhoras e senhores. Amorf Se alguem merece CSl(:
premio, as Gralhas merecem-no, sem duvida nenbulll:I.- Por favor - sussurrou a tia Doreen, com os pll
nhos cerrados e os olhos fechados com forp. - 1'<) I
favor, Jackie. Por favor, Lizzie. Avancem. Voem!
- Estao prontos? - gritou 0 Sr. POOp. - Estaofirmes?
o paizinho ergueu os polegares. Lizzie imitou-o.Sorriram urn ao outro.
- Dez - disse 0 Sr. Poop.nove .
oitosete ...
selS ...
cinco ... Estamos com voces a cern porcento, Jackie! Bon voyage, Lizzie!
A multidao gritou e ovacionou. 0 tambor rufou.-EM FRENTE! - gritaram. - AVAN<;A,
JACKIE! AVAN<;A, LIZZIE!- 0 ceu e 0 limite! - bradou 0 Sr. Poop. - QUA-
TRO ...TRES ...
DOIS ...UM...
PARTlRAM!Lizzie e 0 pai come<;:arama correr na direc<;:aodo rio,
muito depressa, muito afincadamente, cheios de corageme esperan<;:a.Bateram as asas ao aproximarem-se do fimda rampa. Ergueram os bra<;:ospara 0 ceu. Saltaram. E foi60 fantastico, 60 ousado, tao maravilhoso! Lizzie olhoupara 0 pai, que saltava ao seu lado. Olhou para 0 vastoceu azul e para a cidade que se estendia a toda a voltadeles. Bateram as asas e riram estrepitosamente do jubiloe da loucura daquilo.
A Titi Doreen nao foi capaz de ver. Fechou os olhos.- FOR<;A! - gritou 0 Sr. Poop.- ISSO, FOR<;A! - gritou em coro a multidao.
-SIM!SIM!
SIM!
-AAAAIII! _.. gritou 0 Sc\'\\
POOp quando 0 paizinho hesitou, aosaltar. Mas Lizzie riu-se ainda mais ebateu palmas, cada vez com mais forya. "
- Nao tern importincia, paizinho!- gritou.
- Vai sozinha, Lizzie! - gritou-lheele em resposta. - Continua. Voal
Mas depois a propria Lizzie come-yOUa calf.
- AAAIIII! - gritou 0 Sr. Poop.-OH, NAO!
- OH, NAO! gritou a turba.E ela caiu no rio com Unl tremendo
chapel
'.- ), ~ ....• t~··'
- Oh, meu Deus! - gritou 0 Sr. Poop. - Paciencia.Melhor sorte para a proxima vez, Gralhas. Tirem-nos dela. Quem se segue?
Na margem do rio, a tia Doreen bateu os pes.- Pumba, catrapumba, pumba! - exclamou. - Zas,
catrapaz, paz!Deixou-se £Icar urn momento. Observou Lizzie e 0
paizinho que voltaram a nado para terra e depois regres-sou a trote para a cozinha e para os seus bolinhos. Atia Doreen fez urn tabuleiro cheio de macios, bran-
cos, luzidios e fumegantes bolinhos. Eram osmelhores que jamais £Izera, brancos como neve, pesa-dos como chumbo. Estavam em cima da mesa da cozi-nha, a espera que Lizzie e 0 paizinho regressassem acasa.
«Vao acalma-los», disse para consigo. «Vao faze-losvoltar a realidade.» Limpou uma lagrima. Ergueu os bra-'(os para 0 ceu e depois baixou-os lentamente. «Oh, po-bres almas!»,murmurou.
Nao passara ainda muito tempo quando ouviu a can-cela abrir-se e, depois, passos no jardim. Lizzie e 0 paientraram, todos molhados, encharcados, com as asas aescorrer agua pesadamente caidas aos seus lados.
- Ola, Titi Doreen - saudou Lizzie.- Ola, Doreen - disse 0 pai. - Voltamos.- Entrem - disse a tia Doreen. - Despachem-se,
tirem essasasas molhadas.Ajudou-os a tira-las e pendurou-as cuidadosamente na
parte de tras da porta da cozinha.- Olhem, tenho aqui uns belos bolinhos acabados de
fazer para voces.- Delicioso - disse 0 paizinho.- Delicioso - repetiu Lizzie.A tia pos-lhes toalhas nos ombros, sentaram-se todos
a mesa e foram mordiscando os bolinhos. La fora, 0 di:l
estava a escurecer e 0 paizinho e Lizzie comec;:arama can-tar a sua canc;:ao.
o entardecer chegaComo um delicioso scone com manteiga.A noite nao tardara a espreitarComo a barbatana de um peixinho.Entao ficara tudo escuroComo a barriga do tubarao.E dormiremos todosCom as ovelhas do lavradorE seremos JelizesComo uma Jralda acabada de lavar.
- Essa e uma bonita canc;:ao- e1ogiou a tia Doreen.- Obrigado - agradeceu 0 paizinho. - Fui eu que
a fiz.- Es urn homem muito inteligente.Lizzie murmurou sonhadoramente:- Quarenta e quatro.- Quarenta e quatro que?- E a conta de somar que me deu: vinte, mais oito,
mais sete, mais tres, mais seis... E igual a quarenta e qua-tro. E pneumatizac;:ao escreve-se P-N-E-U-M ...
- Esta certo - declarou a tia Doreen. - Bern, pensoque esta. Es uma rapariguinha muito inteligente.
Continuaram a comer e a cantar e depois 0 pai recos-tou-se na cadeira.
- Estes sao... Hmmm! Doreen, estes bolinhos sao, defacto, deliciosos.
- Oh, Jackie! - exclamou a tia. - Es, realmente,urn rapaz adoravel. Toma mais urn.
Lizzie e 0 paizinho tornaram-se mais calorosos efelizes. Suspiraram e sorriram e, por fim, Lizzie nao podeconter-se l11ais.
- Oh! - exclamou, ofegante. - Foi tao encantador!Foi tao ... Oh!
- Foi maravilhoso! - disse 0 paizinho. - Foi formi-davel! Foi tao ...
- Oh, corremos tllo depressa! - disse Lizzie.- E saltamos tllo alto!- E batemos as asas com tanta for~a!- E 0 ar estava tllo l£mpido!- E tllofresco!Olharam, contentes, uns para os outros. Lembraranl,
com alegria, as suas recordac;:oese os seus sonhos.- E nllo teve importancia! - declarou 0 pai. - Nao
teve imporrancia quando eu cai!- Eu ri-me! - exclamou Lizzie. - Nao teve impor-
tancia quando eu cail- Eu ate me ri - confessou 0 pai. - Oh, e a agua ...- Tao molhada! - disse Lizzie, a rir.- Tao fria!- Tao ...Levantaram-se de urn salto das cadeiras. Comec;:aram
a imitar uma danc;:ade passaros aroda da mesa.- Anda, Doreen! - chamou 0 pai.- Fac;:a-noscompanhia, tia Doreen! - pediu Lizzie.A porta abriu-se e 0 Sr. Mint apareceu e parou, tam-
bem e1e todo encharcado e com os fundilhos das calc;:asqueimados e todos rotos.
_ Mortimerl - exc1amou surpreendida a tiaDoreen. - Tambem tu?
- Sim, tambem eu, Doreen.Dirigiu-se para eles, a pingar e a abanar a cabe<;:a.- Mas, oh! - exclamou. - Foi tao maravilhosol Foi
tao magnifico! Flap flap chapel Flap flap chapelSoltou uma pequena gargalhada.- Come urn bolinho - ofereceu a tia Doreen.- Que born - elogiou ele. - Delicioso, Doreen!- Estamos a dan<;:ar- disse Lizzie. - Venha. Junte-
-se a nos!E 0 Sr. Mint comeu 0 seu bolinho e juntou-se a dan<;:a
a volta da mesa.- Anda, Doreen - disse, estendendo 0 brac;:opara a
sua mao.- Mas os bolinhos estao a arrefecer - alegou ela.o Sr. Mint puxou-a mais para si.- Vais adorar, quando come<;:ares- disse-lhe.Por fim, a tia Doreen afastou-se da mesa e juntou-se
a eles.- Assim e que e, Titi Doreen! - exclamou Lizzie.- Assimmesmo e que se faz!- corroborou 0 paizinho.Doreen comec;:ou a danc;:armais depressa e cOin ll1~lis
entusiasmo, dando pequenas gargalhadas e rindo.- Estas formidavel! - elogiou 0 Sr. Mint. - l~st:ls
adoravel!
- Os meus pes estao levantados do chao? - gritoua Titi Doreen. - Os meus pes estao levantados do chao?
- Estao! - gritou Lizzie. - Estao, Titi Doreen!Estao, a serio!
\,1.:"~""\
t
\
\\.\\'.
\