o livro infantil e juvenil

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O LIVRO INFANTIL E JUVENIL: 1. LITERATURA INFANTIL NO BRASIL. BREVE LINHA DO TEMPO 2. A TRADIÇÃO MONOLÓGICA E A TRADIÇÃO DIALÓGICA 3. CECÍLIA MEIRELES E A INFÂNCIA, PARTICIPAÇÃO DE VIVIAN CAROLINE LOPES Paulo Verano 9 set. 2020 CJE, ECA, USP

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Page 1: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O LIVRO INFANTIL E JUVENIL:1 . L I TER ATUR A I NFANT I L NO B R AS I L . B R EV E L I NHA DO TEMP O

2 . A TR ADI Ç ÃO MO NO LÓ GI C A E A TR ADI Ç ÃO D I ALÓ GI C A3 . C EC Í L I A ME I R ELES E A I NFÂNC I A ,

PART I C I PAÇ ÃO DE V I V I AN C ARO L I NE LO P ES

Paulo Verano

9 set. 2020

CJE, ECA, USP

Page 2: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

PROGRAMA DA AULA (28/8)

▪ A literatura infantil no Brasil: breve linha do tempo.

▪ A tradição monológica e a tradição dialógica no livro literário para crianças: narrativa e poesia.

➢ Textos-base (narrativa): Olavo Bilac/Monteiro Lobato.

➢ Textos-base (poesia): Olavo Bilac/Vinicius de Moraes/Roseana Murray/Sérgio Caparelli/Cecília Meireles.

▪ Cecilia e a infância: participação de Vivian Caroline Lopes.

Page 3: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

LITERATURA INFANTIL NO BRASIL

Referencial teórico:

LAJOLO, M. e ZILBERMAN, R. Literatura infantil brasileira. São Paulo: Ática, 1991.

Page 4: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

REPÚBLICA E ABOLIÇÃO

“Como sistema regular e autônomo de textos e autores postos em circulação junto ao público, a história da literatura brasileira para a infância só começou tardiamente, nos arredores da proclamação da República, quando o país passava por inúmeras transformações. (...) Era a República que chegava, trazendo consigo e legitimando a imagem que o Brasil ambicionava agora: a de um país em franca modernização.” (p. 24)

Contexto: Café; Abolição da escravatura; Criação e desenvolvimento de mercado interno; Favorecimento das camadas médias, consumidoras virtuais de sua produção; Ampliação de quadro do funcionalismo público; Rede ferroviária; Ampliação dos portos; Urbanização crescente (São Paulo, Rio de Janeiro e Recife); Início da educação superior.

Page 5: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

PROCESSO DE URBANIZAÇÃO

“Decorrente dessa acelerada urbanização que se deu entre o fim do século XIX e o começo do XX, o momento se torna propício para o aparecimento da literatura infantil.” (p. 25)

Contexto: As sofisticadas revistas femininas; os romances ligeiros; o material escolar; os livros para crianças; a revista Tico-Tico (1905)

Page 6: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O PAPEL DA ESCOLAPara a transformação de uma sociedade rural em urbana, a escola exerce papel fundamental.

▪ “É entre os séculos XIX e XX que se abre espaço, nas letras brasileiras, para um tipo de produção didática e literária dirigida em particular ao público infantil.” (p. 25)

▪ “Até a chegada de D. João VI, em 1808, o suporte editorial (e até mesmo tipográfico) necessário para o assentamento de um sistema literário era, mais do que precário, inexistente. Decorre muito tempo até que tipografias, editoras, bibliotecas e livrarias tornem o livro um objeto não tão raro, ao menos nos centros urbanos mais importantes.” (p. 26)

Page 7: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

PROSA E POESIA: DOIS MODELOS

▪ “Ao modelo impassível do poema parnasiano francês, responderam os poetas brasileiros, em particular Olavo Bilac, com uma poesia lapidar e cintilante, admiravelmente bem escrita, mas percorrida subterraneamente por uma corrente forte de lirismo.” (p. 26)

▪ “A prosa, abandonando o gosto açucarado das histórias românticas, abriu-se em leque: enveredou pelos submundos, ambientes malcheirosos e moradias coletivas, como em O cortiço, de Aluísio Azevedo; ou corroeu e solapou os alicerces de instituições expressivas dos grupos dominantes, até então intocados pela crítica, feita então por Raul Pompeia, em O Ateneu.” (p. 26)

▪ Lima Barreto; Euclides da Cunha; Simões Lopes Neto; Monteiro Lobato.

Page 8: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

PRODUÇÃO DIVERSIFICADA PARA UM PÚBLICO VIRTUAL

▪ “O resultado é um mosaico: o virtuosismo poético de Olavo Bilac, as vaguidades não menos rebuscadas dos simbolistas, a denúncia urgente e contorcida de Euclides da Cunha ou Raul Pompeia, o regionalismo de Monteiro Lobato, entre 1890 e 1920, configuram a produção literária brasileira em suas várias vertentes.” (p. 27)

▪ “Tarefa missionária de dar testemunho de seu país, atuando, por meio da literatura, no ambiente que desejavam transformar.” (p. 27)

▪ “Entre 1890 e 1920, com o desenvolvimento das cidades, o aumento da população urbana, o fortalecimento das classes sociais intermediárias entre aristocracia rural e alta burguesia de um lado, escravos e trabalhadores rurais de outro, entra em cena um público virtual.” (p. 27)

Page 9: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

EM BUSCA DE UM “MATERIAL ADEQUADO” DE LEITURA PARA CRIANÇAS

▪ “O consumo de bens culturais espelha o padrão de escolarização e cultura com que esses novos segmentos sociais desejam apresentar-se frente a outros grupos, com os quais buscam ou a identificação (no caso da alta burguesia), ou a diferença (os núcleos humildes de onde provieram).” (p. 28)

▪ “Também as campanhas pela instrução, pela alfabetização e pela escoladavam retaguarda e prestígio aos esforços de dotar o Brasil de uma literatura infantil nacional.” (p. 28)

▪ “Nesse clima de valorização da instrução e da escola, simultaneamente a uma produção literária variada, desponta a preocupação generalizada com a carência de material adequado de leitura para crianças brasileiras.” (p. 28)

Page 10: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O LIVRO PARA CRIANÇAS COMO “NOVO FILÃO EDITORIAL”

▪ “Intelectuais, jornalistas e professores arregaçaram as mangas e puseram mãos à obra; começaram a produzir livros infantis que tinham um endereço certo: o corpo discente das escolas igualmente reivindicadas como necessárias à consolidação do projeto de um Brasil moderno.” (p. 28)

Tarefa patriótica + recompensa financeira

▪ “Escritores e intelectuais dessa época eram extremamente bem relacionados nas esferas governamentais, o que lhes garantia a adoção maciça dos livrosinfantis que escrevessem.” (p. 29)

▪ O livro infantil como uma das profissionalizações possíveis para o escritor. Novo filão editorial

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O LIVRO PARA CRIANÇAS ATÉ OS ANOS 1920

Contexto dessa fase

▪ Panorama fortemente marcado por obras estrangeiras.

▪ Antes de 1880, circulavam no Brasil apenas as traduções.

▪ Primeiros tradutores: Carlos Jansen e Figueiredo Pimentel.

▪ Contos seletos das mil e uma noites (1882), Robinson Crusoé (1885), Viagens de Gulliver (1888), As aventuras do celebérrimo Barão de Münchhausen (1891), Contos para filhos e netos (1894) e D. Quixote de la Mancha (1901).

▪ Por fim, desponta Monteiro Lobato, como escritor e como editor da Editora Nacional.

Page 12: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O LIVRO PARA CRIANÇAS ATÉ OS ANOS 1920

Contexto dessa fase

▪ Os clássicos de Grimm, Perrault e Andersen são divulgados nos Contos da Carochinha (1894), nas Histórias da avozinha (1896) e nas Histórias da baratinha (1896), assinadas por Figueiredo Pimentel e editadas pela Livraria Quaresma.

▪ A partir de 1915, traduções e adaptações coordenadas por Arnaldo de Oliveira Barreto constituíram a Biblioteca Infantil Melhoramentos.

▪ Contos infantis (1886), de Júlia Lopes de Almeida e Adelina Lopes Vieira.

Page 13: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O LIVRO PARA CRIANÇAS ATÉ OS ANOS 1920

Contexto dessa fase

1897, Zalina Rolim, O livro das crianças1904: Olavo Bilac, Poesias infantis1904: Olavo Bilac e Coelho Neto, Contos pátrios1907: Júlia Lopes de Almeida, Histórias da nossa terra1910: Olavo Bilac e Manuel Bonfim, Através do Brasil1912: Francisca Júlia e Júlio da Silva, Alma infantil1917: Júlia Lopes de Almeida, Era uma vez1919, Tales de Andrade, Saudade (encerra esse primeiro período da literatura infantil brasileira)

Page 14: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

O LIVRO PARA CRIANÇAS ATÉ OS ANOS 1920

Datam também desse mesmo período as antologias folclóricas e temáticas, estas últimas geralmente com o objetivo de constituírem material adequado para celebrações escolares.

1909, Alexina de Magalhães Pinto, Os nossos brinquedos1910, Arnaldo Barreto, Ramon Roca e Teodoro de Morais, A festa das aves1914, Presciliana D. de Almeida, Livro das aves1916, Júlia Lopes de Almeida e Adelina Lopes Vieira, A árvore1916, Alexina de Magalhães Pinto, Cantigas das crianças e do povo, Danças populares1917, Alexina de Magalhães Pinto, Provérbios populares

Page 15: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

A NACIONALIZAÇÃO DA LITERATURA INFANTIL

▪ “Os textos que justificam as queixas de falta de material brasileiro são representados pela tradução e adaptação de várias histórias europeias que, circulando muitas vezes em edições portuguesas, não tinham, com os pequenos leitores brasileiros, sequer a cumplicidade do idioma.” (p. 31)

▪ Surgem vários programas de nacionalização desse acervo literário europeu para crianças. Importância da adaptação.

1882-1891, Carlos Jansen, Contos seletos das mil e uma noites (1882), Robinson Crusoé (1885), As aventuras do celebérrimo Barão de Münchhausen (1891)1894, Figueiredo Pimentel, Contos da Carochinha1915, Editora Melhoramentos, Biblioteca Infantil

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O NACIONALISMO NA LITERATURA INFANTIL

▪ “Apropriação brasileira de um projeto educativo e ideológico que via no texto infantil e na escola aliados imprescindíveis para a formação de cidadãos.” (p. 32)

Inspirações:

1877, Le tour de la France par deux garçons (Dever e pátria), de G. Bruno1886, Cuore, do escritor italiano Edmond De Amicis. Tradução de João Ribeiro, de 1891

▪ Patriotismo

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O NACIONALISMO NA LITERATURA INFANTIL

▪ Presença de um protagonista criança é um dos procedimentos mais comuns da literatura infantil.

▪ G. Bruno inspira, em 1910, o famosíssimo Através do Brasil que, escrito por Olavo Bilac e Manuel Bonfim, constituiu-se na leitura apaixonada e obrigatória de muitas gerações de brasileiros.

1886, Júlia Lopes de Almeida e Adelina Lopes Vieira, Contos infantis1889, João Vieira de Almeida, Pátria1901, Afonso Celso, Por que me ufano de meu país1904, Olavo Bilac e Coelho Neto, Contos pátrios1907, Júlia Lopes de Almeida, Histórias da nossa terra

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A EXALTAÇÃO DA NATUREZA NA LITERATURA INFANTIL

▪ A grande lição do livro Através do Brasil (Bilac e Bonfim, 1910) é a do civismo, do patriotismo, da brasilidade e da exaltação da natureza

▪ Coleção Icks de Biblioteca Escolar: As nossas histórias (1907); Os nossos brinquedos (1909); Cantigas das crianças e do povo e Danças populares (1916); Provérbios populares, máximas e observações usuais (Escolhidos para uso das escolas primárias), de 1917.

Page 19: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

SAUDADE, DE TALES DE ANDRADE (1919)

▪ Extrema valorização da natureza se torna radical na obra que, praticamente, encerra esse primeiro período da nossa literatura para jovens: o livro Saudade, que Tales de Andrade publica em 1919.

▪ A ficção de Tales de Andrade endossa e propaga a imagem de um Brasil que encontra na agricultura sua identidade cultural, ideológica e econômica.

▪ Saudade é a apologia da felicidade e da riqueza por intermédio da agricultura, riqueza e felicidade acenadas como resultado social do programa político que o livro abraça.

Porém, a exaltação do modelo rural começa a fadigar: Lima Barreto (Triste fim de Policarpo Quaresma, 1915), Monteiro Lobato (Urupês, 1918)

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A LÍNGUA COMO SÍMBOLO PÁTRIO

O modelo da língua nacional

▪ 1912, Alma infantil, Francisca Júlia e Júlio da Silva

▪ “São inúmeros os textos desse período nos quais a língua portuguesa, como tema ou pretexto para poemas e histórias, transforma-se em símbolo pátrio, equivalente à bandeira, à história ou a heróis do Brasil.” (p. 43)

Novamente o exemplo é Bilac: o poema “Língua Portuguesa”

Page 21: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

MODERNIZAÇÃO: LOBATO (FASE 2)

1921, Monteiro Lobato, Narizinho Arrebitado

▪ “Monteiro Lobato investe progressivamente na literatura para crianças, de um lado como autor, de outro como empresário, fundando editoras, como a Monteiro Lobato e Cia., depois a Companhia Editora Nacional e a Brasiliense, e publicando os próprios livros.” (p. 45)

▪ “Na mesma ocasião, começam a despontar autores novos, como Francisco Marins, Maria José Dupré, Lúcia Machado de Almeida, entre outros. As modificações revelam o limiar de uma nova era, não apenas da literatura, mas da sociedade brasileira, dando lugar a uma arte de orientação pós-modernista.” (p. 46)

Page 22: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

MODERNIZAÇÃO: LOBATO (FASE 2)

▪ Década de 1920: destacam-se, dentre as criações de autores nacionais, quase que solitárias, as obras de Monteiro Lobato.

▪ 1920-1945: toma corpo a produção literária para crianças, aumentando o número de obras, o volume das edições, bem como o interesse das editoras, algumas delas, como a Melhoramentos e a Editora do Brasil, dedicadas quase que exclusivamente ao mercado constituído pela infância.

Page 23: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

MODERNIZAÇÃO: LOBATO (FASE 2)

1926, Gondim da Fonseca, O reino das maravilhas1931, Monteiro Lobato, Reinações de Narizinho1936, José Lins do Rego, Histórias da velha Totônia1936, Érico Veríssimo, As aventuras do avião vermelho1938, Viriato Correia, Cazuza1939, Lúcio Cardoso, Histórias da Lagoa Grande1939, Graciliano Ramos, A terra dos meninos pelados1940, Luís Jardim, O boi aruá1940, Murilo Araújo, A estrela azul1941, Guilherme de Almeida, O sonho de Marina e João Pestana1943, Henriqueta Lisboa, O menino poeta1944, Graciliano Ramos, Alexandre e outros heróis

Outros nomes: Malba Tahan, Lúcia Miguel Pereira, Marques Rebelo, Jorge de Lima, Antônio Barata, Menotti del Picchia

Page 24: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

MODERNIZAÇÃO: LOBATO (FASE 2)

▪ “O crescimento quantitativo da produção para crianças e a atração que ela começa a exercer sobre escritores comprometidos com a renovação da arte nacional demonstram que o mercado estava sendo favorável aos livros.” (p. 47)

▪ Contexto: Consolidação da classe média; Avanço da industrialização e da modernização econômica e administrativa do país; Aumento da escolarização dos grupos urbanos; Nova posição da literatura e da arte após a revolução modernista; Maior número de consumidores.

▪ Algumas editoras: Editora Globo (Érico Veríssimo, Lúcio Cardoso, Cecília Meireles), Companhia Editora Nacional (Monteiro Lobato, Viriato Correia), Melhoramentos, Editora do Brasil.

Page 25: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

MONTEIRO LOBATO

O sítio é integralmente o Brasil, estando embutido nele tudo que Monteiro Lobato queria representar da pátria

▪ “O sítio não é apenas o cenário onde a ação pode transcorrer. Ele representa igualmente uma concepção a respeito do mundo e da sociedade, bem como uma tomada de posição a propósito da criação de obras para a infância. Nessa medida, está corporificado no sítio um projeto estético envolvendo a literatura infantil e uma aspiração política envolvendo o Brasil — e não apenas a reprodução da sociedade rural brasileira.” (p. 56)

Page 26: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

A TRADIÇÃO MONOLÓGICA EA TRADIÇÃO DIALÓGICA

Page 27: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

A TRADIÇÃO MONOLÓGICA EA TRADIÇÃO DIALÓGICA

▪ Olavo BilacRio de Janeiro, 1865-1918

▪ Coelho Neto, Júlia Lopes de Almeida; Tales de Andrade; Manuel Bonfim...

▪ Monteiro LobatoTaubaté, 1882-1948

▪ José Lins do Rêgo, Graciliano Ramos, Luís Jardim, Lúcio Cardoso, Cecília Meireles...

Page 28: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

A TRADIÇÃO MONOLÓGICA EA TRADIÇÃO DIALÓGICA

Duas tradições, com seus nomes representativos, suas temáticas e suas abordagens distintas (Modelo de abordagem)

▪ Temáticas (Pátria, Família, Moral, Costumes etc.)

▪ Linguagem (Formal x Coloquial)

▪ O narrador (Toma partido x Relata apenas)

▪ O leitor (imagens do leitor implícito x explícito pelo narrador)

▪ O livro (papel social/cultural do texto/da literatura)

▪ Modelo de comunicação (Monologia x Dialogia)

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“A PÁTRIA”, DE OLAVO BILAC. IN: BILAC E COELHO NETO, CONTOS PÁTRIOS (1904)

“O pai, velho soldado que a vida das guerras alquebrara, gostava de lembrar, à noite, quando toda família se reunia na sala de jantar em roda da grande mesa antiga, os episódios das campanhas que vira.A mulher não ouvia com prazer aquelas histórias de cargas de cavalaria, de emboscadas, de assaltos, tão cheias de sangue e de horror. Quando o velho recordava aquele tempo, com os cotovelos na mesa e o cigarro no canto da boa, — ela revivia a angústia dos dias passados na solidão, sem notícias do marido que lá andava no Paraguai. Via toda a agonia daqueles seis anos de sobressalto e choro, daquelas noites em que não podia dormir sem ver em sonhos o marido estendido, retalhado de golpes, numa poça de sangue, sem confissão e sem um carinho, entre os montões de cadáveres, sobre os quais passavam, sem respeito, as patas dos cavalos, no ardor da batalha. (...)”

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“VALENTIAS”, DE MONTEIRO LOBATO. IN: REINAÇÕES DE NARIZINHO (1931)

“Pedrinho fora dar uma volta com o capitão dos couraceiros vindos para a guarda do príncipe. Esses valentes soldados tiveram ordem de ficar fora da casa, para que tia Nastácia não se assustasse. Pedrinho fez logo boa camaradagem com o capitão, que era grande contador de proezas.Contou duma terrível luta entre dois espadartes e duas baleias, a que ele assistiu de pertinho. Sua valentia consistira nisso — assistir de pertinho. Contou depois as suas próprias façanhas, lutas com lagostas, ataque a um filhote de peixe-espada.Pedrinho tinha paixão por histórias de caçadas, guerras, lutas de boxe —aventuras de terra e mar, como dizia dona Benta. Ouvia com interesse as histórias do couraceiro e contava outras. Contou histórias de onças, tigres-de-bengala, leões do Uganda, jacarés do Amazonas. (...)”

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OLAVO BILAC (1865-1918)O avô (In: Poesias infantis, 1904)

Este, que, desde a sua mocidade,

Penou, suou, sofreu, cavando a terra,

Foi robusto e valente, e, em outra idade,

Servindo à Pátria, conheceu a guerra.

Combateu, viu a morte, e foi ferido;

E, abandonando a carabina e a espada,

Veio, depois do seu dever cumprido,

Tratar das terras, e empunhar a enxada.

Hoje, a custo somente move os passos...

Tem os cabelos brancos; não tem dentes...

Porém remoça, quando tem nos braços

Os dois netos queridos e inocentes.

Conta-lhes os seus anos de alegria,

Os dias de perigos e de glórias,

As bandeiras voando, a artilharia

Retumbando, e as batalhas, e as vitórias...

E fica alegre quando vê que os netos,

Ouvindo-o, e vendo-o, e lhe invejando a

sorte,

Batem palmas, extáticos, e inquietos,

Amando a Pátria sem temer a morte!

Page 32: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

OLAVO BILAC (1865-1918)A avó (In: Poesias infantis, 1904)

A avó, que tem oitenta anos,

Está tão fraca e velhinha!...

Teve tantos desenganos!

Ficou branquinha, branquinha,

Com os desgostos humanos.

Hoje, na sua cadeira,

Repousa, pálida e fria,

Depois de tanta canseira:

E cochila todo o dia,

E cochila a noite inteira.

Às vezes, porém, o bando

Dos netos invade a sala...

Entram rindo e papagueiando:Este briga, aquele fala,Aquele dança, pulando...A velha acorda sorrindo.E a alegria a transfigura;Seu rosto fica mais lindo,Vendo tanta travessura,E tanto barulho ouvindo.Chama os netos adorados,Beija-os, e, tremulamente,Passa os dedos engelhados, Lentamente, lentamente,Por seus cabelos doirados.

Fica mais moça, e palpita,E recupera a memória,Quando um dos netinhos grita:“Ó vovó! conte uma história!Conte uma história bonita!”Então, com frases pausadas,Conta histórias de quimeras,Em que há palácios de fadas,E feiticeiras, e feras,E princesas encantadas...E os netinhos estremecem,Os contos acompanhando,E as travessuras esquecem,- Até que, a fronte inclinandoSobre o seu colo, adormecem...

Page 33: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

OLAVO BILAC (1865-1918)Os pobres (In: Poesias infantis, 1904)

Aí veem pelos caminhosDescalços, de pés no chão,Os pobres que andam sozinhos,Implorando compaixão.Vivem sem cama e sem teto,Na fome e na solidão:Pedem um pouco de afeto,Pedem um pouco de pão.São tímidos? São covardes?Têm pejo? Têm confusão?Parai quando os encontrardes,E dá-lhes a vossa mão!

Guia-lhes os tristes passos!Dá-lhes, sem hesitação,O apoio de vossos braços,Metade de vosso pão!Não receies que, algum dia,Vos assalte a ingratidão:O prêmio está na alegriaQue tereis no coração.Protegei os desgraçados,Órfãos de toda a afeição:E sereis abençoados Por um pedaço de pão...

Page 34: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

OLAVO BILAC (1865-1918)A boneca (In: Poesias infantis, 1904)

Deixando a bola e a peteca,Com que inda há pouco brincavam,Por causa de uma boneca,Duas meninas brigavam.

Dizia a primeira: "É minha!"— "É minha!" a outra gritava;E nenhuma se continha,Nem a boneca largava.

Quem mais sofria (coitada!)Era a boneca. Já tinhaToda a roupa estraçalhada,E amarrotada a carinha.

Tanto puxaram por ela,Que a pobre rasgou-se ao meio,Perdendo a estopa amarelaQue lhe formava o recheio.

E, ao fim de tanta fadiga,Voltando à bola e à peteca,Ambas, por causa da briga,Ficaram sem a boneca...

Page 35: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

CECÍLIA MEIRELES (1901-1964)Ou isto ou aquilo (In: Ou isto ou aquilo, 1964)

Ou se tem chuva e não se tem solou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possaestar ao mesmo tempo em dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender aindaqual é melhor: se é isto ou aquilo.

Page 36: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

VINICIUS DE MORAES (1913-1980)A galinha-d’Angola (In: A arca de Noé, 1970)

CoitadaDa galinha-D'AngolaNão andaRegulandoDa bolaNão páraDe comerA matracaE viveA reclamarQue está fraca:

— "Tou fraca! Tou fraca!"

O relógio (In: A arca de Noé, 1970)

Passa, tempo, tic-tacTic-tac, passa, horaChega logo, tic-tacTic-tac, e vai-te emboraPassa, tempoBem depressaNão atrasaNão demoraQue já estouMuito cansadoJá perdiToda a alegria

De fazerMeu tic-tacDia e noiteNoite e diaTic-tacTic-tacTic-tac...

Page 37: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

SERGIO CAPARELLI (1947-)

Poesia visual, 2000 (com Ana Cláudia Grunszinsky)

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CECÍLIA E A INFÂNCIA

Participação de Vivian Caroline Lopes.

▪ Doutoranda em Literatura Brasileira pela FFLCH com pesquisa Poesia, desenho e pintura em Cecília Meireles.

▪ Vencedora do Prêmio Jabuti 2015 na categoria Paradidático com a Coleção Arte é Infância.

▪ https://www.youtube.com/watch?v=he2eeNHpUlk&t=793s

Page 44: O LIVRO INFANTIL E JUVENIL

PRÓXIMA AULA

16 de setembro: Apresentação e discussão em grupos do livro Literatura Infantil Brasileira: História & Histórias, de Marisa Lajolo e Regina Zilberman. São Paulo: Ática, 2007.