o estado e a produÇÃo de habitaÇÕes de interesse

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A D IVERSIDADE DA G EOGRAFIA B RASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 4042 O ESTADO E A PRODUÇÃO DE HABITAÇÕES DE INTERESSE SOCIAL PELO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA: considerações sobre o Conjunto Maria Amélia I e II em Catalão (GO) PAULO CÉSAR PEREIRA MATOS 1 JOSÉ HENRIQUE RODRIGUES STACCIARINI 2 Resumo: A intensa urbanização ocorrida no Brasil a partir da segunda metade do século XX contribuiu de forma efetiva para o crescimento desordenado e desigual das cidades, com diversas áreas de segregação social, criadas por ações tanto do capital privado como pelo próprio Estado. Na atualidade, essas ações são concretizadas, também, a partir das políticas públicas para a produção de habitações de interesse social, na figura do Programa Minha Casa Minha Vida, criado em 2009. A produção destas habitações pelo MCMV tem como objetivo alcançar, principalmente, famílias que detêm renda entre 0 e 03 salários mínimos, portanto, a forma em que se dá a construção destas, tangenciam para uma reflexão: são essas habitações objeto de inclusão ou segregação social?! A partir disto, será feita uma análise preliminar acerca dessas habitações de interesse social do MCMV, mediante a análise do Conjunto Maria Amélia I e II localizado em Catalão (GO). Palavras-chave: Estado; Minha Casa Minha Vida; Espaço Urbano. Abstract: The intense urbanization that took place in Brazil from the second half of the twentieth century contributed effectively to the uncontrolled and uneven growth of cities, with different areas of social segregation, created by actions of both private capital and the state itself. Currently, these actions are implemented, too, from public policies for the production of social housing, in the figure of the Minha Casa Minha Vida, created in 2009. The production of these dwellings by MCMV aims to achieve mainly owning households earning between 0 and 03 times the minimum wage, therefore, the way that gives the construction of these, tangent to reflect: are these dwellings object inclusion or social segregation?! From this it will be a preliminary analysis on these social housing of MCMV, by analyzing the set Maria Amelia I and II located in Catalão (GO) Key-words: State; Minha Casa Minha Vida; Urban Space. 1 Introdução Entende-se que as cidades na sociedade contemporânea tem se constituído cada vez mais como o locusdas mais diversas atividades, sendo também palco de variados conflitos e, dentre estes, está a luta constante das classes sociais menos abastadas, ao direito de moradia. Nas últimas décadas devido a fatores como a 1 - Aluno no Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGC), nível mestrado da Unidade Acadêmica Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG. Membro do Núcleo de Estudos Geografia, Trabalho e Movimentos Sociais (GETeM) 2 - Professor associado da Unidade Acadêmica Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG. Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGC), nível mestrado da Unidade Acadêmica Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

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O ESTADO E A PRODUÇÃO DE HABITAÇÕES DE INTERESSE SOCIAL PELO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA: considerações sobre o

Conjunto Maria Amélia I e II em Catalão (GO)

PAULO CÉSAR PEREIRA MATOS1 JOSÉ HENRIQUE RODRIGUES STACCIARINI2

Resumo: A intensa urbanização ocorrida no Brasil a partir da segunda metade do século XX

contribuiu de forma efetiva para o crescimento desordenado e desigual das cidades, com diversas áreas de segregação social, criadas por ações tanto do capital privado como pelo próprio Estado. Na atualidade, essas ações são concretizadas, também, a partir das políticas públicas para a produção de habitações de interesse social, na figura do Programa Minha Casa Minha Vida, criado em 2009. A produção destas habitações pelo MCMV tem como objetivo alcançar, principalmente, famílias que detêm renda entre 0 e 03 salários mínimos, portanto, a forma em que se dá a construção destas, tangenciam para uma reflexão: são essas habitações objeto de inclusão ou segregação social?! A partir disto, será feita uma análise preliminar acerca dessas habitações de interesse social do MCMV, mediante a análise do Conjunto Maria Amélia I e II localizado em Catalão (GO).

Palavras-chave: Estado; Minha Casa Minha Vida; Espaço Urbano.

Abstract: The intense urbanization that took place in Brazil from the second half of the twentieth

century contributed effectively to the uncontrolled and uneven growth of cities, with different areas of social segregation, created by actions of both private capital and the state itself. Currently, these actions are implemented, too, from public policies for the production of social housing, in the figure of the Minha Casa Minha Vida, created in 2009. The production of these dwellings by MCMV aims to achieve mainly owning households earning between 0 and 03 times the minimum wage, therefore, the way that gives the construction of these, tangent to reflect: are these dwellings object inclusion or social segregation?! From this it will be a preliminary analysis on these social housing of MCMV, by analyzing the set Maria Amelia I and II located in Catalão (GO)

Key-words: State; Minha Casa Minha Vida; Urban Space.

1 – Introdução

Entende-se que as cidades na sociedade contemporânea tem se constituído

cada vez mais como o “locus” das mais diversas atividades, sendo também palco de

variados conflitos e, dentre estes, está a luta constante das classes sociais menos

abastadas, ao direito de moradia. Nas últimas décadas devido a fatores como a

1 - Aluno no Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGC), nível mestrado da Unidade Acadêmica

Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG. Membro do Núcleo de Estudos Geografia, Trabalho e Movimentos Sociais (GETeM) 2 - Professor associado da Unidade Acadêmica Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG.

Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGC), nível mestrado da Unidade Acadêmica Especial - Instituto de Geografia - Regional Catalão/UFG

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revolução ocorrida na agricultura, com a introdução de maquinário moderno na

produção, há uma massiva expulsão de milhões de pessoas que buscam os centros

urbanos como uma possível e/ou única alternativa de sobrevivência e, com isso,

ocorre à formação de cidades cada vez mais desiguais.

A apropriação do espaço urbano ocorre de diversas formas, pelos mais

variados grupos, com os diferentes objetivos e é transformado em prol de

necessidades momentâneas, onde pode-se considerar a cidade como o processo

contínuo de produção da sociedade em decorrência da reprodução das relações

sociais.

É notório, logicamente em maior ou menor escala, a ação de agentes como

promotores imobiliários e proprietários fundiários e até mesmo o Estado, como

principais responsáveis pela criação de grandes áreas de segregação devido à

apropriação do espaço urbano seguindo os interesses de reprodução do capital.

Por sua vez, o solo urbano, na cidade capitalista está impregnado à

propriedade privada, proporcionando renda, devido a sua forma diferenciada de

usos pelos mais variados grupos econômicos que através desta apropriação do

mesmo é constituída uma série de relações e conflitos. Podemos classificar a

utilização do solo urbano, em três segmentos distintos, sendo eles o uso industrial,

comercial e residencial.

Quanto ao uso residencial do solo urbano, como o mesmo está constituído

da propriedade privada, torna-se necessário dispender de determinado valor

monetário para conquistar o direito a uma parcela deste solo, que será destinado à

construção da habitação. Por sua vez, para as classes de menor poder aquisitivo,

que não possui renda monetária suficiente para alcançar a tão desejada moradia

própria, restam às políticas públicas voltadas para a produção de habitações de

interesse social, que são direcionadas a estas classes de menor renda.

Atualmente no cenário nacional, o Programa Minha Casa, Minha Vida

(MCMV) figura como o principal meio de acesso a moradia própria, destas classes

sociais. O MCMV, criado no ano de 2009, no então governo do ex-presidente Luiz

Inácio Lula da Silva, possuí como alvo as famílias que possuem renda de 0 a 03

salários mínimos, visando assim, diminuir o déficit habitacional que persiste no Brasil

há décadas.

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Posto isto, o objetivo deste trabalho é fazer uma análise sobre a produção

de habitações de interesse social pelo atual MCMV que possui parceria entre o

Estado e o capital privado, buscando elencar e discutir alguns aspectos dessa

política pública, que por sua vez, é essencial no que diz respeito à inserção das

classes sociais de menor renda em uma cidade cada vez mais excludente,

buscando elencar, algumas análises preliminares no que se refere ao Conjunto

Maria Amélia I e II construído pelo MCMV no ano de 2013 em Catalão (GO), que

figura como o objeto de pesquisa da dissertação de mestrado que está sendo

construída.

O presente artigo está organizado em duas partes, sendo a primeira uma

reflexão acerca da produção do espaço urbano e os agentes sociais. E a segunda

parte busca-se trabalhar na conceituação do programa Minha Casa Minha Vida,

trazendo algumas reflexões iniciais acerca da produção de habitações de interesse

social pelo MCMV em Catalão (GO), com a análise preliminar do Conjunto Maria

Amélia I e II, que teve suas obras finalizadas no findar do ano de 2013 e entregues

os apartamentos aos moradores somente em março de 2015.

2 – A cidade, o Estado e a habitação de interesse social: alguns

apontamentos

A produção do espaço urbano e da cidade perpassa por uma série de

condicionantes, sendo este espaço, como apontado por Carlos (2008), condição,

meio e produto das relações sociais e já a cidade, aparece como o lugar da

reprodução do capital e da vida.

Sendo assim, a cidade figura como um complexo conjunto de relações

estabelecidas a partir da necessidade de reprodução do capital que irá determinar

as formas de ocupação do solo urbano e também ocorrerão as mais variadas

classes sociais na busca de uma parcela deste solo para poder se reproduzir

enquanto ser social. Por sua vez, o espaço urbano aparece como produto no

processo de produção e reprodução do capital, dotado de contradições que são

emergentes destes processos e é também, o local onde o homem irá

produzir/consumir o seu espaço, ou seja, um modo de vida.

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O homem, nesta lógica, apropria-se de parcelas do espaço visando se

reproduzir enquanto ser social e necessita, para viver, ocupar um determinado lugar

no espaço. Só que o ato em si não é meramente o de ocupar uma parcela de

espaço, ele envolve o ato de produzir o lugar (CARLOS, 2008, p. 85). Tal processo

materializa-se na realização de suas necessidades intrínsecas, tal como a

construção da sua habitação.

Na cidade contemporânea, um dos principais desafios encontrados diz

respeito ao acesso a espaços destinados a construção da moradia, e juntamente ao

acesso às infraestruturas básicas que são necessárias a reprodução da vida do

homem enquanto sujeito social. No cenário urbano, da cidade capitalista, ocorre à

ação de diversos agentes sociais, como aponta Corrêa (1989) e dentre estes, é

válido ressaltar a ação do capital imobiliário na figura dos promotores imobiliários e

proprietários fundiários que modificam o espaço na busca por maior lucro com o

parcelamento e a venda do solo urbano.

Podemos, então, classificar a utilização do solo urbano em três vertentes;

pelo uso industrial e comercial, e pelo uso residencial e de lazer e também pelos

usos públicos comuns a todos os moradores, independente de posição social.

A primeira vertente citada destina-se as empresas, inseridas neste contexto

como uso industrial e comercial, se dá através da apropriação do solo urbano

objetivando extrair lucro com a sua ocupação na realização de atividades produtivas

(atividades secundárias e terciárias) ou atividades de circulação comercial,

financeira. Já a utilização deste solo pelo “morador”, este por sua vez, busca ocupar

determinada parcela do solo urbano no intento de estabelecer o seu local de

moradia, seja por meio da compra do imóvel e/ou aluguel e em determinados casos,

através de ocupações ilegais na área urbana. Neste sentido, Rodrigues (2013) faz

algumas ponderações acerca do acesso à moradia, pois

Para morar é necessário ter capacidade de pagar por esta mercadoria não fracionável, que compreende a terra e a edificação, cujo preço depende também da localização em relação aos equipamentos coletivos e a infraestrutura existente nas proximidades da casa/terreno. (RODRIGUES, 2013, p.14)

Nessa segunda vertente e como visto nas colocações de Rodrigues (2013),

a moradia torna-se uma mercadoria que será consumida de acordo com a faixa de

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renda monetária pertencente a cada sujeito inserido no processo de reprodução do

capital. Deste modo, como ressaltado por Singer (1982), a propriedade privada do

solo urbano faz com que a posse da renda monetária seja requisito indispensável à

ocupação do espaço urbano (SINGER, 1982, p. 33).

Interligado a este fator, cita-se a terceira vertente de utilização do solo

urbano, configurando-se como o uso coletivo do mesmo que, por sua vez, perpassa

pela construção e alocação de infraestruturas e bens de comum interesse a todos os

moradores da cidade independente de sua posição social, pelo Estado3. Em alguns

casos, no que tange as classes sociais mais abastadas, estas serão beneficiadas

com melhores infraestruturas, enquanto as de menor poder aquisitivo tenderá a

escassez de algumas dessas em seus espaços (bairros) de moradia.

Assim, entende-se o Estado, como um dos principais agentes responsáveis

pela transformação do espaço urbano da cidade, pois o mesmo busca contribuir no

processo de acumulação do capital com medidas adotadas que favorecem os

grandes detentores do capital e dos meios de produção através de incentivos fiscais

e outras facilidades; atua ainda para atender parte das reivindicações sociais de

classes menos favorecidas financeiramente e socialmente tal como a dos

trabalhadores assalariados.

Atualmente, uma das principais reivindicações e necessidades da classe

menos abastada na qual se insere os trabalhadores de baixa renda, está à busca

pelo acesso a moradia própria. No intuito de amenizar tal situação, o Estado por

meio de políticas públicas que visem a produção de habitações de interesse social

fomenta programas em âmbito nacional, como a Fundação Casa Popular (FCP), o

Banco Nacional de Habitação (BNH), voltados a produção de habitações para estas

classes.

Vale ressaltar que essas políticas públicas voltadas à habitação popular

chamada também “Habitações de Interesse Social” são realizadas pelo Estado em

suas três instâncias político-administrativas (união, estado e município), em parceria

com empresas privadas responsáveis pela produção física das unidades

3 Este agente atua diretamente na organização e na regulamentação dos usos do solo urbano,

através de políticas adotadas pelo mesmo, podendo ainda ser considerado como grande industrial, consumidor de espaço e de localizações específicas, proprietário fundiário e promotor imobiliário e alvo dos chamados “movimentos sociais urbanos”. (CORRÊA, 1989, p.24).

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habitacionais. No caso do MCMV, trata-se de um programa de cunho nacional, que

é disseminado aos governos municipais. Por sua vez, são estes, os responsáveis

pela licitação da empresa responsável pela edificação física das habitações e cabe

ainda ao poder municipal (prefeitura, Secretaria de Habitação) “ceder” o espaço

onde serão edificadas tais habitações.

2.2 – O Programa Minha Casa Minha Vida em Catalão (GO): breve análise do conjunto Maria Amélia I e II

O programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) foi criado em 2009, no

governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (Lula). Na gestão do ex-

presidente Lula, foi formulada uma série de medidas visando o desenvolvimento

econômico de diversos setores no país, através de investimentos bilionários,

denominado “Programa de Aceleração do Crescimento” (PAC).

Inserido nessa perspectiva, o MCMV criado pela Lei n.º 11.977, objetiva,

principalmente, financiar habitações para as classes de baixa renda compreendidas,

inicialmente, nas faixas salariais de salários mínimos em que as formas de

financiamento vão de acordo com a faixa salarial. O programa é coordenado

diretamente pela Caixa Econômica Federal (CEF) com a utilização de recursos do

Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), tendo o capital privado como agente

construtor de tais habitações e também, há de se ressaltar as Parcerias Público-

Privadas (PPP’s), na construção das habitações.

As metas iniciais do MCMV eram de construção em âmbito nacional de um

milhão de moradias que foi modificado, posteriormente, para três milhões de

moradias sejam elas, na forma de conjuntos horizontais e verticais abrangendo

famílias que possuem renda mensal de até 10 salários. Visando alcançar tal

objetivo, o programa foi dividido em duas fases respectivamente: o MCMV fase 1 e

fase 2, mudando apenas algumas regras para financiamento a fim de que possa,

abarcar um maior quantitativo de famílias que possuem renda mensal de até 1600

reais.

No que diz respeito às modalidades de financiamento, estas são divididas

entre faixas salariais como já foi abordado anteriormente. Tais modalidades se

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dividem em três grupos: o P1 que abrange famílias com faixa salarial de até três

salários, o P2 para famílias de três a seis salários e o P3 que abrange famílias de

seis a dez salários. O enfoque da pesquisa em andamento centraliza-se no

chamado P1 que compreende as classes de baixa renda, onde a construção das

habitações para esta faixa se dá com recursos do FAR em parceria com a CEF e

empresas de capital privado no ramo da construção civil. O público-alvo do PMCMV,

inicialmente, são as famílias que possuem até 03 salários de renda mensal e

possuem acesso ao subsídio integral no ato do financiamento da casa própria e as

parcelas são reduzidas, não podendo ultrapassar 10% da renda bruta familiar.

Contextualizando Catalão, a cidade situa-se na região Sudeste do estado de

Goiás, ficando a 255 km da capital deste estado - Goiânia e aproximadamente, 311

km da capital federal - Brasília. De acordo com o Censo do IBGE em 2010, a

população na cidade era de 86.647 mil habitantes e com estimativa para 2014 de

chegar próximo aos cem mil habitantes, sendo assim, podendo ser considerada

segundo IBGE, como cidade de médio porte. Segundo dados extraídos do IBGE,

seu território é de aproximadamente 3.821,463 Km²; a cidade recebe grandes fluxos

de trabalhadores de cidades vizinhas que trabalham nas empresas e também no

comércio, pois oferece uma gama maior de serviços e atividades comerciais.

Em Catalão (GO), foi construído pelo MCMV, um conjunto horizontal no ano

de 2010, o Jardim Evelina Nour II com 450 habitações no total. A partir do ano de

2012, teve início na cidade, a edificação de mais cinco conjuntos habitacionais,

porém, muda-se a forma física dos mesmos de horizontais para verticais, sendo

estes pequenos prédios de dois andares. Ao todo, os cinco conjuntos verticais

edificados até o fim de 2013, soma-se 663 unidades habitacionais (apartamentos),

de acordo com dados levantados no Plano Local de Habitação de Interesse Social

(PLHIS) de 2014, disponibilizado pela Secretária Municipal de Habitação, de Catalão

(GO).

Dentre os novos conjuntos verticais, está o conjunto Maria Amélia etapa I e II

(imagem 01 - 02), objeto desta pesquisa, localizando-se no extremo sul da cidade

de Catalão com 208 apartamentos. O bairro em que está inserido o conjunto Maria

Amélia I e II, apresenta algumas deficiências no que diz respeito a infraestrutura

como escolas, postos de atendimento médico e etc. É importante destacar que o

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referido conjunto teve suas obras finalizadas findar do ano de 2013 e início de 2014,

porém, só foi entregue em Março deste ano (2015).

Imagem 01 e 02 - Condomínio Maria Amélia I e II: vista da entrada à esquerda e vista lateral a direita

Fonte: MATOS, Paulo César Pereira. 2014

Nas imagens acima, vislumbra-se o conjunto Maria Amélia I e II. Como

mencionado, situa-se na última rua do bairro Maria Amélia, que faz divisa com uma

área rural, divido por uma cerca. Dentre os recentes empreendimentos verticais

construídos, o conjunto Maria Amélia I e II, possui o maior quantitativo de

apartamentos e famílias (208 apartamentos) e é, porém, o que menos possuí

infraestrutura e equipamentos públicos de uso coletivo (escolas, creches, postos de

saúde, etc.).

De acordo com dados levantados na Secretária Municipal de Habitação, o

principal motivo pelo atraso na entrega dos apartamentos ocorreu devido a falta da

rede de esgoto, sendo este, um dos principais requisitos exigidos pela Caixa

Econômica Federal (CEF) nas obras financiadas pelo MCMV com recursos do

Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Buscando solucionar o problema, foram

construídas fossas sépticas coletivas, onde já ocorreram alguns problemas com tal

sistema, como o entupimento e vazamento dos dejetos em uma rua de terra próxima

as fossas sépticas que dão acesso a chácaras próximas ao condomínio.

Tal programa, o MCMV, apresenta-se como um importante meio para os

trabalhadores de baixa renda no que tange o acesso à moradia própria. No entanto,

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a questão não perpassa apenas em produzir as habitações em qualquer lugar e de

qualquer forma; é necessário que haja o mínimo de dignidade em tais habitações e

no local e/ou bairro que estas estão localizadas. Uma crítica a ser feita baseia-se no

fato de se primar em diminuição dos custos com a produção e aumento do

quantitativo de unidades por parte do capital privado e até mesmo do Estado,

através da edificação de prédios demasiado pequenos e em locais distantes do

centro que possuem pouca, ou nenhuma infraestrutura e equipamentos públicos

necessários ao atendimento destes trabalhadores.

Devido a atual dinâmica espacial encontrada em Catalão (GO), há a

possibilidade de produção de habitações em conjuntos horizontais, favorecendo uma

qualidade de vida melhor aos beneficiários do mesmo. Tal fator é notório, no

conjunto Evelina Nour II, também construído pelo MCMV com recursos do Fundo de

Arrendamento Residencial, a melhoria substancial nas habitações, o que não é

possível em conjuntos verticais.

Como uma reflexão inicial, apontam-se as construções em massa de

apartamentos de interesse social, pelo MCMV, como uma forma do capital privado

lucrar com a produção das mesmas, pois o Estado desonera os custos de produção

no que diz respeito a gastos com o terreno e em alguns casos, na própria compra do

local que será edificado tais habitações, como em Catalão (GO) que é amparado

pela Lei 2.210/044 de uso do Solo Urbano. Contribuindo para o modelo de cidade

excludente, segregando as classes de trabalhadores mais pobres em determinados

locais da cidade, ou seja, em bairros do centro operacional e sem as devidas

infraestruturas necessárias, como rede de esgoto, escolas, hospitais a exemplo do

Conjunto Maria Amélia I e II, que fora brevemente analisado.

3 – Considerações Finais

A cidade em sua atual forma configura-se como o resultado das relações

instituídas no espaço urbano da mesma, que por sua vez, está sempre em processo

de mutação devido às necessidades intrínsecas de cada um dos agentes sociais

nele inseridos. O solo urbano e posteriormente, a moradia, aparece na cidade

4 Antigo Plano Diretor de Desenvolvimento Sustentável Urbano e Ambiental de Catalão (GO) de 2004,

atualmente o novo ainda encontra-se em revisão.

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capitalista como mercadoria que necessita de determinado valor monetário para

obter acesso a uma parcela deste solo e consequentemente, ter o direito ao acesso

a moradia.

A propriedade privada do solo urbano segrega e exclui crescente parcela da

população que não detêm de renda monetária suficiente para comprar seu “direito” a

moradia. É neste sentido que surgem as programas e políticas públicas voltadas a

produção de habitações de interesse social. Tais programas e políticas são

fomentados pelo Estado, visando atender a crescente demanda por parte dos

trabalhadores de baixa renda. Atualmente, o Programa Minha Casa Minha Vida,

atua no sentido de “suprir” as demandas por moradia dessa classe, no entanto, tal

programa influencia também, na segregação social destas famílias beneficiárias

deste programa.

Não diferente disto, como foi visto a partir da análise do conjunto Maria

Amélia I e II, construído no ano de 2013 na cidade de Catalão (GO) pelo MCMV,

está situado em um bairro periférico e sem as infraestruturas necessárias como

escola, hospital e rede de esgoto para atender os 208 apartamentos que foram

edificados nas duas etapas do mesmo.

Como é notória a complexidade que a temática requer através da breve

análise feita do conjunto Maria Amélia I e II, as atuais políticas públicas na figura do

MCMV, precisam abarcar a concepção de “moradia digna” em sua amplitude para

esta terminologia não seja desconstruída ou, apenas, delineada e na prática venha a

se contradizer na construção física dos empreendimentos populares.

Por fim, permeando tais reflexões, é importante ponderar que a discussão

hora apresentada, trata-se de uma breve explanação acerca da pesquisa que se

encontra em andamento no Programa de Pós-Graduação em Geografia, da

UFG/Regional Catalão. Apresentando-se ainda como um fio condutor para futuras

discussões que envolvem a atual política habitacional de interesse social, na figura

do Programa Minha Casa Minha Vida que possui a atuação do capital privado na

busca na produção física das unidades habitacionais e tangenciam para uma série

de questões.

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