o ensino da lÍngua portuguesa nas escolas de … lima borges.pdf ·  · 2009-08-05com o direito...

44
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE” O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO NILDA LIMA BORGES ORIENTADOR: PROF. ANTÔNIO FERNANDO VIEIRA NEY RIO DE JANEIRO AGOSTO / 2002

Upload: doanhanh

Post on 03-Apr-2018

215 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

Page 1: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE

ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

NILDA LIMA BORGES

ORIENTADOR: PROF. ANTÔNIO FERNANDO VIEIRA NEY

RIO DE JANEIRO

AGOSTO / 2002

Page 2: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

2

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE

ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

NILDA LIMA BORGES

Trabalho monográfico como requisito

parcial para a obtenção do Grau de

Especialista em Docência do Ensino

Superior.

RIO DE JANEIRO

AGOSTO / 2002

Page 3: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

3

"É na linguagem, pela linguagem, que o homem se constitui como sujeito; porque só a linguagem fundamentada na realidade, na sua realidade que é do ser, realiza o conceito de ego".

(E. Beneviste)

Page 4: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

4

AGRADECIMENTOS

A Deus por ter nos criado seres dotados de inteligência e por ter nos

permitido realizar este trabalho.

Aos nossos familiares por não terem nos deixado fracassar, nas horas

difíceis e pela tolerância de nossas ausências no decorrer do curso.

Ao professor pela atenção que nos dispensou e pela dedicada orientação.

Aos nossos colegas de curso, pelo companheirismo e amizade.

Aos nossos colegas de trabalho, pelo incentivo que nos deram.

A todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para a realização

deste trabalho.

Page 5: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

5

SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................6

CAPÍTULO I

LEVANTAMENTO DE PROBLEMAS NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA.......8

CAPÍTULO II

UMA RETROSPECTIVA DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA........................11

2.1. O Ensino de Português segundo a LDB....................................................12

2.2. O Currículo ................................................................................................13

2.3. Tratamento Didático dado à Gramática da Língua Portuguesa.................16

2.4. Tratamento Didático dado à Leitura ..........................................................17

2.5. Tratamento Didático dado à Produção de Texto .......................................10

2.6. A Oralidade na Escola e na Aula de Português ........................................21

CAPÍTULO III

A LINGÜÍSTICA E O ENSINO DE PORTUGUÊS.....................................................23

3.1. A Língua e a Fala .....................................................................................25

3.2. Variantes da Língua ..................................................................................26

3.3. Língua Escrita e Língua Falada.................................................................29

3.1.1. A Língua Escrita ..........................................................................30

3.1.2. A Língua Falada ..........................................................................32

CAPÍTULO IV

O ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA NA FASE DA

ADOLESCÊNCIA ......................................................................................................37

4.1. O papel do Professor de Língua Materna .................................................38

CONCLUSÃO ...........................................................................................................41

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................43

Page 6: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

6

INTRODUÇÃO

O ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa em nosso país, há

algumas décadas, tem sido motivos de grandes preocupações por parte de

estudiosos da área; professores, pais de alunos e alunos, visto que grandes

deficiências são apresentadas nas modalidades: gramáticas, leitura e produção

textual, revelando assim complexidade e dificuldades no domínio desta língua,

conseqüentemente no processo de comunicação de seus falantes.

Assim sendo, reconhece-se um processo necessitado de revisão, pois

as verdadeiras intenções traçadas, quer por estudiosos da Língua, pedagogos,

professores e ou órgãos competentes, não demonstram realidades condizentes

com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do

tema: pesquisar sobre as dificuldades apresentadas pelos alunos de Ensino

Fundamental e Médio, relativas ao ensino de Língua Portuguesa nas escolas.

A primeira iniciativa, foi refletir, com base em suas experiências, como

professoras da disciplina em evidência seguida de teoria bibliográfica.

Para melhor entendimento e consistência dos dados analisou-se e

refletiu-se diversas obras de estudiosos da Língua. De maneira especial os

autores: Luft, Santos, Beltran, Geraldi, Filhos, Suassuna, e outros inclusive a

LDB por considerar que seus argumentos contribuiriam para o melhor

entendimento da proposta ora apresentada.

Page 7: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

7

Dando continuidade a este estudo, apresenta-se algumas reflexões

sobre intenções até então propostas para o ensino de Língua Materna,

observando os aspectos que se seguem:

1. Levantamento de problemas no ensino de Língua Portuguesa

2. Uma retrospectiva do ensino de Língua Portuguesa

3. O ensino de Português segundo a LDB

4. O currículo

5. O tratamento didático dado à gramática

6. O tratamento didático dado à leitura

7. O tratamento didático dado à produção textual

8. A oralidade na escola e na aula de Português

9. A Lingüística e o Ensino de Português

10. O ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa na fase da adolescência

11. O papel do professor de Língua Materna

Posteriormente, faz-se uma abordagem: Um reflexo do ensino-

aprendizagem de Língua Portuguesa, a fim de comprovar-se, se o que a Lei de

Diretrizes e Bases estabelece, para o referido ensino em nosso país, de fato,

torna-se realidade.

Por fim apresenta-se uma proposta sobre métodos e técnicas de ensino

como forma de contribuição para o melhoramento do ensino de Português nas

escolas de ensino fundamental e médio.

Page 8: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

8

CAPÍTULO I

LEVANTAMENTO DE PROBLEMAS NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

O ensino de Língua Portuguesa para os alunos brasileiros é

considerado um martírio, é tido como complexo e muito difícil. Por que isto

acontece? O que se tem feito para resolver essa problemática? Estes e outros

questionamentos também são difíceis de serem respondidos, apesar de muitos

estudiosos de áreas diversas contribuírem para, pelo menos, amenizar os

problemas que afligem e dificultam tanto o ensino quanto a aprendizagem.

É importante salientar, que a preocupação com o ensino de Língua

Portuguesa não é exclusiva de gramáticos, lingüistas, lexicógrafos, sociólogos,

psicólogos e outros estudiosos, mas também, de modo especial, de alunos e

professores de língua materna.

Contudo, necessário se faz buscar uma saída, baseada em

experiências da profissão como educadoras, em pesquisas teóricas e de campo,

a realidade do ensino de Língua Portuguesa no ensino fundamental e médio.

Os resultados assustadoramente ruins apresentados pelo ensino

público não são desconhecidos nem negados por estudiosos da área em estudo,

logo torna-se evidente a necessidade de mudanças significativas na qualidade da

educação formal oferecida pela escola pública, mais especificamente pelo ensino

da língua materna por ser oficialmente sentida, reconhecida e declarada.

Page 9: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

9

Contudo, é muito importante que se descubra o grau de relevância

desse problema para que eventualmente se possa trabalhá-lo e corrigi-lo a tempo

pois, muito tem-se falado sobre o assunto mas tão pouco é o que se tem feito

para mudar as estatísticas negativas a respeito da aprendizagem e

conseqüentemente adquirir maior conhecimento nesta área de estudo.

No que diz respeito ao ensino oficial da Língua Portuguesa, essa

preocupação se manifesta por meio das propostas lançadas pelas secretarias

estaduais e municipais de educação quando oferecem subsídios teóricos e

sugestões para o encaminhamento da prática pedagógica, a fim de estimular a

mudança de enfoque e de atitudes em relação à prática do ensino da língua

materna, bem como a busca de uma metodologia mais eficaz para o ensino da

língua: é o que tem originado inúmeras iniciativas por parte de professores. Mas

acredita-se que o grande problema do ensino concerne, ainda, no uso da

pedagogia tradicional nas escolas, com poucos ou nenhum crescimento ou

mudança nas práticas pedagógicas.

Segundo Beltran, o que se deve pretender no ensino da língua

materna é chamar a atenção para a importância de reconhecer a linguagem do

aluno no meio em que vive, no seu mundo, aproveitar o que há de bom nessa

linguagem e, a partir deste achado adicionar seu repertório lingüístico as

conquistas da variedade culta da linguagem que vem sendo enriquecida por

sucessivas gerações.

Conforme o acima exposto, vê-se que, um dos grandes problemas de

ensino de Português é o excesso de teoria, pois, ao passo que esta se distancia

Page 10: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

10

da realidade deixa uma lacuna que, na maioria das vezes, é preenchida com

indecisões e indagações nunca respondidas.

Outro grande problema que persiste até hoje é a má aplicação dos

“recursos” na escola e/ou pela escola. Como por exemplo: materiais de péssima

qualidade, que às vezes, já chegam com defeitos nas escolas e mau uso de

materiais tais como livros, computadores, vídeos e outros.

A título de comprovação do supracitado convém-se mencionar o

pensamento de GONÇALVES FILHO (1991, p.110):

“Provavelmente a língua é, no elenco das disciplinas, a que melhores

condições oferece para o seu trabalho; basta saber que o aluno já sabe

falar – o que já é um instrumento natural disponível. Se queremos

buscar um conteúdo social relevante para o ensino da língua, o ponto

de partida é recriar o já criado em seu meio embora pobre”.

Conclui-se portanto, que o estudo proposto deste tema é de grande

importância para a solução desta problemática.

Page 11: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

11

CAPÍTULO II

UMA RETROSPECTIVA DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Durante a trajetória de investigação sobre o ensino da Língua

Portuguesa, desde de sua origem, o que inclue as contribuições dos gregos e

romanos, passando pela Idade Média e Renascimento até os dias atuais,

constata-se que esta prática no ensino da Língua Portuguesa sempre se

confundiu com o ensino da gramática normativa.

Certamente o excesso de terminologias, retenção dos conteúdos dados

como simples repetição mecânica das regras definidas, o tratamento da frase

descontextualizada e a análise pela análise fora a base desse ensino que

culminou numa supervalorização da língua escrita e numa depreciação da língua

oral.

Contudo, alterações no ensino da Língua, se fizeram necessário e

vários foram os estudiosos que contribuíram para a evolução do ensino da Língua

Portuguesa, como Fausto Barreto (1887) que demonstrou preocupação em

reformular o ensino da língua materna elaborando um programa donde derivaram

as gramáticas portuguesas escritas por brasileiros nas primeiras décadas do

século XX, conforme o exposto.

A partir do século XX, mais precisamente na década de 60 e 70,

surgiram várias propostas de reformulação do ensino da Língua Portuguesa.

Page 12: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

12

Nesse período deu-se a valorização da criatividade como condição suficiente para

desenvolver a comunicação do aluno, com eficiência.

No entanto, somente no início da década de 80 foi que estabeleceu-se

uma nova crítica ao ensino da Língua Portuguesa, quando as pesquisas

produzidas por uma lingüística independente da tradição normativa e apoiada na

psicolingüística e psicologia da aprendizagem, comprovaram suas idéias e

possibilitaram avanços nesta área da educação.

E apesar de novas pesquisas neste final de década, percebe-se que

muitas mudanças ainda são necessárias para melhoria do ensino em nosso país,

logo o surgimento de contribuições como a deste estudo certamente terá

relevância.

2.1. O Ensino de Português segundo a LDB

No percurso desta avaliação achou-se conveniente averiguar também

o tratamento que as Leis de Diretrizes e Bases da Educação têm dado ao ensino

do vernáculo e constatou-se que as várias leis concorrem para um melhor

aproveitamento da disciplina. Quanto ao posicionamento da Lei 4.024 de 20 de

dezembro de 1961 “a Língua Portuguesa é colocada como a disciplina por

excelência da escola brasileira, porque é o meio de comunicação nas relações

humanas e, portanto, a via de acesso regular à aprendizagem geral”.

Concorrendo para o mesmo fim, a Lei 5.692/71 de 11 de agosto de

1971 consagra em seu artigo 4.º § 3.º que “no ensino de 1.º e 2.º graus, o estudo

da língua nacional dar-se-á como instrumento de comunicação e como expressão

Page 13: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

13

da cultura brasileira”. É importante salientar ainda, que com base na lei, esta

disciplina dispõe de uma carga horária privilegiada, dada importância que tem em

relação às outras disciplinas , com exceção de Matemática.

Ainda sobre o ensino da Língua Portuguesa, a mais recente Lei,

9.394/96 de 20 de dezembro se 1996, mais precisamente no artigo 26, § 1.º “o

estudo deve abranger obrigatoriamente o conhecimento do mundo físico e natural

da realidade social e política, especialmente do Brasil”.

Evidentemente os procedimentos pedagógicos dos docentes devem

concorrer para as finalidades básicas da educação que são de desenvolver o

educando assegurando-lhe a formação comum indispensável para o exercício da

cidadania e oferecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos

posteriores.

Mediante o exposto, reconhece-se que em termos de filosofia de

trabalho faz-se necessário que a escola sempre busque apoio nos dispositivos

legais de maneira que possa desenvolver suas atividades não de forma aleatória,

mas que estejam consoantes aos objetivos propostos pela Lei regente do ensino

em estudo. Contudo observa-se que isso ainda não acontece de forma satisfatória

no processo ensino-aprendizagem.

2.2. O Currículo

Para melhor esclarecimento da complexidade do ensino de Língua

Portuguesa far-se-á uma abordagem sobre o currículo.

Page 14: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

14

Sabe-se que o termo currículo é altamente polissêmico, e dada essa

complexidade o não entendimento do real sentido constitui-se num problema para

o ensino.

Para RIBEIRO apud AMOR (1993, p.24) “currículo é o elenco de

seqüência de matérias ou disciplina com um dado plano de estudos e respectivas

cargas horárias”.

Já AMOR (1993, p.24) baseada em enfoques mais recentes sobre o

problema de entendimento do currículo o considera de dupla perspectiva, que vai

além dos aspectos extrínsecos e o define como “um conjunto de intenções que

balizam as intervenções pedagógicas dentro de um processo vivenciado pelo

sujeito de aprendizagem, que resulta das interações provocadas por essa

intervenção”.

Partindo de um sentido amplo de currículo e tendo como base a teoria

de AMOR, enfatiza-se as seguintes implicações:

1. O currículo como algo mais – é diferente do currículo escrito, formal, oficial,

uma vez que estes constituem, apenas, um referencial muito genérico de

intenções, conteúdos e meios educativos.

2. O currículo real – constitui e caracteriza-se num trabalho de interpretação,

contextualização e operacionalização do currículo oficial, desenvolvido pelo

professor que é considerado um agente privilegiado no processo de educação.

3. O currículo com dimensão processual – é o que engloba aspectos como

circunstâncias, fatos, ocorrências que dinamizam a interação pedagógica e

evidencia a importância que o aluno assume em sua caracterização.

Page 15: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

15

4. O currículo como processo não linear – é considerado de relações complexas

e difíceis entre o que o aluno aprende, o que o professor ensina e o que o

autor do currículo tinha em vista para ambos.

Segundo o autor clássico, TYLER apud AMOR (1993, p.34) “O saber, o

educando e a sociedade são as fontes que concorrem para a constituição de um

bom currículo”. Portanto, um currículo, em qualquer dos seus níveis, não existe

sem um sistema de valores político-educacional tomados com o fundamento das

decisões e orientações pedagógicas que lhe dão sustentação.

É importante lembrar que o novo currículo requer do professor uma

mudança de postura frente a nova concepção filosófica de currículo, passando

pelos componentes fundamentais como os objetivos, conteúdos, estratégias e

avaliação.

Em síntese, o conteúdo global de um currículo de língua materna se

estabelece em função de condições, orientações e necessidades geradas pela

vida social, pois é no social que se criam mais situações de aprendizagem e se

estabelece os padrões de desempenho lingüísticos e é possível, também, que se

faça uma avaliação desse desempenho.

Page 16: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

16

2.3. Tratamento Didático dado à Gramática da Língua Portuguesa

A gramática é fundamental como instrumentadora da língua culta mas,

não se deve deixar também de valorizar as vivências e experiências lingüísticas

do aluno e sua gramática natural.

Segundo BELTRAN (1989, p.107) “A gramática é um dos caminhos,

um meio e não o fim, não se deve dizer que ela é a parte mais importante do

ensino da Língua; não se deve supervalorizá-la, nem tão pouco menosprezá-la.”

Reconhece-se que a gramática tem seu papel de elevada importância,

pois é através da norma culta que se pode conhecer o requinte e valor dado a

determinada língua. E é esta a que se usa normalmente em correspondências

comerciais e produções literárias. Assim sendo, o professor funciona apenas

como elemento de apoio no ensino.

Apesar do acima exposto, pode-se ressaltar que a teoria gramatical é

adotada nas escolas brasileiras, de uma forma comodista e servil. Um modelo

oficial, pronto, que apresenta uma tabela terminológica e várias flexões

dificultando-se assim o aprendizado da nossa própria língua materna e pior,

deixando o falante sem liberdade para criar.

Para maior entendimento observa-se o que diz LUFT (1997, p.93) “A

gramática mal ensinada incute servilismo.” Esse ato é considerado nocivo ao

ensino da língua materna, pois incute nos estudantes diante de supostas

autoridades a idéia de que os gramáticos são os donos da língua contrariando a

lógica de que donos da língua são todos os falantes. Logo, o que deve haver é

Page 17: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

17

apenas um padrão não uma norma lingüística colocada acima da própria língua

oficial.

De fato, o ensino de teoria gramatical tradicional ou moderna consome

naturalmente, grande parte do tempo disponível para as aulas de Português,

visto ser este ocupado com definições, classificações, análises, exercícios

gramaticais, etc. É lógico que já se conhece o resultado desse apego a

conteúdos de gramática, o aluno não aprende a teoria e vai se convencendo de

que “não sabe a língua” e com isso o bloqueio da criatividade, a inibição da

linguagem, a sensação de incapacidade e insegurança são inevitáveis.

Para POSSENTI (1996, p.54) “É perfeitamente possível aprender uma

língua sem conhecer os termos técnicos com os quais ela é analisada.”

Portanto, Um mínimo de bom - senso nos diz que a meta das aulas de

língua materna é conseguir que os alunos, apoiados em seus conhecimentos

intuitivos da língua, desenvolvam e aprimorem suas capacidades criativas.

2.4. Tratamento Didático dado à Leitura

Nas três últimas décadas, a concepção acerca da leitura tem, suscitado

uma grande polêmica que parte dos diferentes enfoques e critérios ao abordar os

problemas teóricos que devem ter-se em conta para sua definição, fato que tem

grande implicação no que diz respeito ao seu aprendizado.

A maior parte dos educadores estão conscientes da necessidade de

estimular e desenvolver em seus alunos as habilidades necessárias para que

estes compreendam o que foi lido, contudo freqüentemente detectam que a

Page 18: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

18

maioria de seus alunos não sabem interpretar, compreender ou assimilar os

conhecimentos expostos nos textos. Logo não adquirem capacidade de

aprendizagem através da leitura; por outro lado se sentem limitados na hora de

enfrentar esta problemática por que requer uma maior informação teórica e

prática para analisá-la e criar estratégias produtivas que correspondam aos

interesses e níveis de desenvolvimento de seus alunos.

Mediante estudos, refiro-me ao que tem sido defendido por diversos

investigadores sobre a temática:

LAJOLO apud GERALDI (1985, p.59) diz:

“Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido de um texto. É a partir do texto, ser capaz de atribuir-lhe significação, conseguir relacioná-lo a todos os outros significativos para cada um reconhecer nele o tipo de leitura que seu autor pretendia e dono da própria vontade entregar-se a esta outra, ou revelar-se contra ela, propondo outra não prevista.”

DUBOIS apud SUÁREZ (1996, p. 64) “a leitura é um processo de

interação entre pensamento e linguagem e a compreensão é a construção do

significado do texto por parte do leitor”.

Como se pode notar, a leitura é um processo cujo principal objetivo é a

busca de significado ou a compreensão do que é lido. É importante, portanto,

fazer a distinção entre o ato de aprender a ler e o ato de ler, porque se o

professor não está consciente, nem torna consciente os seus alunos de que o

propósito da leitura é compreender o texto e não pronunciar corretamente o

escrito será difícil realizar um esforço adicional para extrair o significado do que

tem lido.

Page 19: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

19

Contudo, observa-se que grande tem sido a preocupação dos

professores do 1º grau com o aproveitamento da leitura, num processo mecânico

de decodificação. Prova disso são os alunos que ingressam no ensino médio

com extrema dificuldade de compreensão, reflexão e crítica de um texto.

Levando-se em conta que o aluno deste ciclo do ensinamento (5ª à 8ª

séries) encontra-se no período decisivo para sua formação como leitor, cabe à

escola assumir a responsabilidade de organizar-se em torno de um projeto

educativo comprometido com a transitoriedade do leitor de textos facilitados

(infantis e infanto–juvenis) para o leitor de textos mais complexos e reais tais

como os jornalísticos e literários e do leitor de fragmentos para o leitor de textos

integrais.

Conscientes de que a leitura não é apenas a decodificação de palavras

ou frases mas uma forma de interação social e que o leitor competente deve ser

capaz de ler nas entrelinhas, de identificar os elementos implícitos no texto e de

estabelecer relações a outro já lido, cabe à escola uma função insubstituível no

sentido de combater esses desequilíbrios.

2.5. Tratamento Didático dado à Produção de Texto

Se o aluno já alcançou a boa condição de leitor sendo capaz de ler nas

estrelinhas, de fazer inferências daquilo que não está explícito no texto,

certamente terá maior competência lingüística para produzir seus próprios textos

de forma coesa e coerente demonstrando através de uma linguagem elaborada o

entendimento de mundo que adquiriu de forma crítica.

Page 20: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

20

Acredita-se, que para que haja um clima de confiança favorável à

aprendizagem em se tratando de produção textual, o professor deverá conduzir o

seu aluno e não condená-lo, orientando-o aos melhores caminhos e corrigindo-o

sucintamente, mostrando exemplos e passando experiência cultural, social,

gramatical de caráter lingüístico.

É certo que mesmo sem um conhecimento maior de mundo, um falante

nato da língua portuguesa, poderá produzir um texto mesmo que, oralmente. Já

de forma escrita um aluno de 5ª a 6ª também será capaz de produzir um texto

livre, e mesmo com erros gramaticais, de ortografia, concordância, mas rico em

conteúdo de informação e experiências, além de criativo. Já a partir de 7ª e 8ª, o

que se pede é redação, que é uma produção não tão livre, mas criteriosa,

baseada em técnicas e normas, algumas de caráter cientifico nas áreas das

ciências e outras mais livres de caráter subjetivo, contudo sem nunca abandonar

as normas, dificultando e, na maioria das vezes fazendo o aluno desistir de

produzir, até mesmo passar a detestar a Língua Portuguesa, enquanto disciplina,

gerando por conseguinte, aversão a redações: o aluno passa a achar que não é

capaz de escrever textos.

Para tanto, uma das condições para que o aluno tenha êxito na sua

produção textual é a escolha criteriosa de temas interessantes, que venha de

encontro às experiências vivenciadas por ele, a fim de que produza textos que

demonstre o seu nível de conhecimento. A título de comprovação do que foi dito

pode-se citar: WITTGENSTEIN apud BELTRAN (1989, p.26), “os limites de minha

linguagem representam os limites do meu mundo”.

Page 21: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

21

Na produção de texto o aluno procura cada vez mais expor seus

conhecimentos a respeito de determinados assuntos. Neste ponto é que se há de

convir que ler é o primeiro passo para o aprendizado do mundo numa dimensão

maior.

2.6. A Oralidade na Escola e na Aula de Português

Um outro aspecto que retrata a crise pela qual passa o ensino da

língua é o tratamento que vem sendo dispensado ao uso da oralidade em sala de

aula que, na maioria das vezes é “própria” apenas do professor.

É sabido que a preocupação com o domínio da “leitura” e da “escrita”

fez com que a escola desconsiderasse o oral e conseqüentemente causasse

dano de ordem psico-afetivo e social à vida do aluno.

Na atual conjuntura educativa é comum encontrar-se alunos com

bloqueios referentes ao exercício da fala: normalmente se recusam a falar ou

falam com dificuldades e por isso se retraem deixando, às vezes, de

manifestarem opiniões por medo de cair no ridículo. Outros apresentam

dificuldades quanto ao uso da palavra perante públicos diferentes.

Para SANTOS (1996, p.25) inspirada na pedagogia de Freinet declara

que:

“A finalidade maior no ensino de Português baseado na expressão livre do aluno não é somente favorecer-lhe o domínio do código lingüístico, mas é também e principalmente por meio desse domínio criar condições favoráveis para que ele - indivíduo e ser social co-detentor e co-construtor de uma cultura – possa tornar-se cada vez mais independente e capaz de enfrentar com o máximo de realização, o seu destino de homem e cidadão”.

Page 22: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

22

Somente com o surgimento da lingüística moderna, é que está sendo

dado maior relevo a realidade oral e interacional de linguagem, mas no contexto

pedagógico sua importância continua sendo ignorada por muitos professores que,

por terem cursado apenas o magistério desconhecem os fundamentos dessa

ciência e as contribuições que ela pode proporcionar ao ensino da Língua

Portuguesa.

Aqui, levanto uma problemática bastante comum nas salas de aula -

mais precisamente de português – que também já foram comentados por AMOR

(1994, p.67):

“os professores falam três ou quatro vezes mais do que a totalidade

dos alunos seja por exposição diretas ou por interrogatórios e o aluno

quando fala, na maioria das vezes, é para responder ao professor”.

Retornando-se agora, a questão da oralidade em sala de aula,

destaca-se o fato de que, se o ensino da Língua Portuguesa tem como objetivo

desenvolver a competência lingüística do aluno, deve passar necessariamente

pelo uso da língua nas diversas modalidades e a oral por excelência.

Page 23: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

23

CAPÍTULO III

A LINGÜÍSTICA E O ENSINO DE PORTUGUÊS

Como já foi colocado em outros momentos deste trabalho, superior a

crise do ensino-aprendizagem do Português passa pela busca de uma concepção

de linguagem diferente da tradicional.

Alguns autores reconhecem a Lingüística como um meio capaz de

transformar a realidade do ensino de Português contribuindo para a formação de

novas atitudes por parte dos professores da área, tais como as noções de

linguagem e língua, variedades e registros e a noção de que a língua não é

estática.

O ensino da língua portuguesa nas escolas está direcionado mais

especificamente para a escrita. Cagliari (1992) afirma que há mais preocupação

como a aparência da escrita do que com o que ela realmente faz e representa.

Tal postura nos parece totalmente errada e fora de propósito. Faz-se necessário

mostrar que a língua escrita é mais uma modalidade da língua a ser aprendida.

Não se pode, de forma nenhuma, desprestigiar e desconsiderar as modalidades

orais que estão em uso nos diversos segmentos da sociedade, em todos os seus

níveis. Nesse contexto, há que se considerar a questão da adequação – cada

situação exige de quem nela está envolvido comportamento, vestimenta e

linguagem adequados.

Page 24: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

24

Há que se considerar, ainda, a questão do preconceito lingüístico. Na

maior parte das vezes, o ensino de nossa língua é feito de forma bastante rígida,

como se tudo que fosse diferente do que está registrado ou codificado nas

gramáticas tradicionais fosse inteiramente errado. É nesse aspecto que

deparamos com os conceitos de "certo" e "errado" no uso da língua.

Explicitamente, o ensino da gramática normativa tem o objetivo de banir de nossa

língua formas consideradas "empobrecedoras", "desviantes", "indignas" de uma

língua bem falada, não adequada ao uso das pessoas "de bem". Essa é uma

prática que deve ser eliminada de vez em nossas escolas. Trata-se de uma

postura preconceituosa, pois em nome da "boa língua" pratica-se a injustiça social

humilhando o ser humano por meio da não-aceitação do seu mais importante

meio de expressão cultural, isto é, o sistema de comunicação próprio da

comunidade ao seu redor.

A existência de diferentes modalidades no uso da língua e o domínio da

norma culta são questões que preocupam todos os envolvidos com o ensino do

idioma. Claro que, apesar da aceitação dos diferentes níveis do uso da língua, o

domínio do padrão culto escrito é condição indispensável para o aprimoramento

cultural, moral e intelectual do indivíduo e o crescimento do País e de nosso povo.

Cabe à escola, portanto, ensinar a normal culta escrita sem menosprezar as

demais modalidades da língua consideradas "erradas" por alguns segmentos

tradicionalistas do sistema educacional.

As atitudes próprias de um professor com conhecimento lingüístico é a

valorização da gramática individual e internalizada do aluno de onde o ensino de

língua deve partir. “é o docente quem deve saber Lingüística e gramática para

Page 25: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

25

bem ensinar esse manejo, e não forçosamente o aluno”. (GEORGES MOUNIN, in

MARTINET, 1979, p.127 apud LUFT, 1997, p.97).

Com o advento da Lingüística e a divulgação de seus pressupostos

deu-se um redimensionamento na pedagogia do ensino da Língua. Com base

nesses fundamentos os livros didáticos recentes apresentam textos que utilizam

as modalidades lingüísticas informais como a gíria e a linguagem familiar.

Mostram também, a sintaxe, a semântica, a fonologia de forma mais elaborada e

menos complexa.

A partir desta pesquisa detectou-se inúmeros problemas que dificultam

o ensino da Língua Portuguesa e que a Lingüística como ciência moderna, aponta

alguns caminhos já mencionados, contudo não se pode afirmar que representa a

cura para todos os males deste ensino. Necessário faz-se refletir sobre a idéia de

LUFT (1997, p.96).

“Nenhum ensino em crise pode ser salvo pela simples troca de uma

teoria por outra, ainda que esta, como a Lingüística seja do mais alto

nível científico. Porque não é esse problema. O problema não é

teorizar melhor”.

3.1. A Língua e a Fala

Dois conceitos do filólogo suíço Ferdinand de Saussure são básicos

para os estudos lingüísticos: língua e fala. A língua é a estrutura que compreende

as convenções adotadas por determinado grupo social. A fala está sujeita a

modificações regionais, gírias e jargões, relacionados à forma como os indivíduos

Page 26: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

26

utilizam essas convenções. A fala varia, além disso, em função dos diversos

registros em que é empregada, ou seja, os níveis de linguagem ora mais formais,

ora mais descontraídos. Não se fala da mesma maneira quando se está

pronunciando uma conferência ou conversando despreocupadamente com um

amigo pelo telefone; e não se escreve da mesma maneira um ensaio acadêmico e

uma carta pessoal.

3.2. Variantes da Língua

Uma língua nunca é idêntica em todas as suas manifestações. As

variações podem ser históricas ou diacrônicas (de época para época), diatópicas

(de lugar para lugar), diastráficas (de classe social para classe social) e ainda de

situação para situação (formal ou informal). As variações podem se dar em vários

níveis: fonético, como a pronúncia do "s" carioca que difere da do "s" paulista, ou

o "l" de certas regiões do Rio Grande do Sul (animal / "animau"); sintático, como a

regência do verbo assistir (assistir ao jogo / assistir o jogo); ou lexical (macaxeira,

mandioca, aipim são variações regionais que designam o mesmo tubérculo).

Língua padrão - A variabilidade da língua deve-se às diferenças

socioeconômicas e regionais do país. Existe, entretanto, a necessidade de se

estabelecer uma língua padrão, acima de todas as variantes, para ser usada no

ensino básico e na produção cultural. As convenções que regem essa língua

padrão a tornam distante da língua escrita informal, e mais distante ainda das

formas orais. Isso não significa que as demais variantes da língua sejam melhores

ou piores que a norma padrão, culta ou literária.

Page 27: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

27

Os falantes nativos de uma língua possuem um código comum que é

utilizado e compreendido dentro de uma determinada comunidade. O falante

possui, desde a infância, um sistema de regras intuitivamente interiorizado,

compartilhado pelos membros da comunidade e aperfeiçoado com seu

desenvolvimento intelectual. Ao contrário do ensino de uma língua estrangeira,

que pressupõe o desconhecimento da estrutura da língua e exige um treinamento

artificial, o ensino da língua portuguesa nas escolas deve complementar o saber

que a criança já possui, desde que começa a falar, melhorando e tornando eficaz

a expressão oral e escrita.

A gramática normativa registra, dentro da diversidade das modalidades

da língua, o padrão de como falar e escrever corretamente. Reflete a norma culta,

que deve ser usada em documentos e cerimônias oficiais, no ensino básico, nos

meios de comunicação e na maior parte dos modos de produção cultural.

A gramática explícita contém a descrição dos mecanismos de

funcionamento da língua e abrange as variações gramaticais decorrentes da

variabilidade e da evolução da língua. O conjunto de normas da língua

portuguesa, que recebe o nome de gramática, não é imutável. A fala evolui

rapidamente, incorporando à língua novas expressões e descartando outras, ou

seja, está em constante modificação. Uma boa gramática deve ser

freqüentemente revista para que possa abranger as mudanças advindas da língua

falada. A gramática que não acompanha a variabilidade da língua só é possível

no caso das línguas mortas, como o grego clássico por exemplo. Já as normas

ortográficas controlam a grafia das palavras, e eventuais reformas requerem

aprovação do Congresso ou Parlamento.

Page 28: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

28

A gramática implícita é a gramática dos falantes. Também chamada de

"natural", consiste num sistema de regras interiorizado pelos falantes desde a

infância, permitindo a eficácia do processo comunicativo. Este sistema é um saber

intuitivo que o falante domina, mesmo que não saiba as regras da gramática

tradicional. Essa gramática implícita compreende as significações, a estruturação

de textos e frases e as estruturas lingüísticas complexas que não se confundem

com uma combinação aleatória de palavras. As gramáticas dos teóricos e

estudiosos reproduzem, através de regras e nomenclaturas, esse processo

natural e implícito resultante da necessidade básica de comunicação do ser

humano que vive em sociedade.

As crianças enquanto falantes de português, desenvolvem uma

"gramática natural", isto é, a capacidade inata de, através de um conjunto de

hipóteses e associações, identificar as informações que lhes são dirigidas.

Quando a criança fala uma frase e recebe aprovação, ela arquiva a regra. O seu

potencial lingüístico permite a articulação do som (pronúncia das frases) com o

significado (conteúdo da mensagem), fazendo a criança utilizar as palavras e

estruturas adequadas para se comunicar. Por exemplo, uma criança de 5 ou 6

anos não diria "a palavra chorou" ou "o comer fugiu". Nessa fase, ela pode ser

considerada gramaticalmente adulta e intuitivamente já domina noções de sujeito,

verbo e concordância, pois usa formas verbais flexionadas segundo as categorias

de pessoa e número. A partir das falas cotidianas, a criança que já fala com

desembaraço domina a gramática autêntica da língua, construindo frases simples,

compostas e complexas. Apenas não conhece os termos técnicos.

Page 29: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

29

3.3. Língua escrita e língua falada

O que diferencia as modalidades oral e escrita da língua é o

planejamento. O que vem a ser isso exatamente?

O texto falado, de forma geral, é criado no momento da conversação,

não possuindo rascunho, como geralmente ocorre no texto escrito. A língua oral

apresenta uma tendência para o plano e não planejamento. Poderíamos dizer que

é planejada localmente, isto é, planejada passo a passo, à medida que se

desenvolve a conversação. O texto escrito pode ser planejado, revisto,

rascunhado. O texto conversacional se apresenta pouco elaborado em

comparação com a elaboração presente no texto escrito. Quando falamos, vamos

construindo nosso texto. De acordo com a ração de nosso interlocutor, repetimos

a informação, mudamos o tom, reformulamos nossa explicação. Em decorrência

disso, as idéias são menos complexas. Além disso, do ponto de vista sintático, o

texto conversacional é bastante fragmentado, uma vez que as frases são

cortadas, havendo, assim, por vezes, rupturas na construção à medida que a

frase se desvia de sua trajetória, tomando outra direção sintática. Essa forma

fragmentada da modalidade oral – presença de anacoluto, frases truncadas, etc –

é um aspecto que diferencia em muito as duas modalidades.

Por seu lado, o texto escrito, embora possa ser refeito, não deixa

perceber, ao ser dado como pronto, as marcas de sua elaboração. Ele se

apresenta acabado, coeso, com seqüência temporal. Há, ainda, a questão do

planejamento, que na escrita vai desde o tema a ser desenvolvido, chegando ao

Page 30: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

30

planejamento lingüístico. A modalidade escrita da língua pressupõe a articulação

de idéias e de aspectos lingüísticos.

Conforme consta no texto "Modalidades do Uso da Língua", de autoria

conjunta de Maria da Aparecida Meirelles de Pinilla, Maria Cristina Ruigoni Costa

e Maria Thereza Indiani de Oliveira, texto hospedado no site da Secretaria da

Educação do Estado do Rio de janeiro, denominado "Rede Escola", foi apontado

por Ochs (1979) quatro níveis de planejamento no discurso: falado não planejado,

falado planejado, escrito não planejado e escrito planejado.

3.1.1. A língua escrita

Estamos tão acostumados a ler e a escrever em nossa vida diária, que

não percebemos que nem todos escrevem e lêem como nós. Em muitas famílias

de classe social baixa, escrever pode se restringir a assinar o próprio nome ou, no

máximo, a redigir listas de palavras ou recados. Para as pessoas que vivem

nesse mundo restrito, escrever como a escola propõe pode ser algo estranho,

fora de sua realidade, inútil. Contudo, as pessoas que vivem num meio social

onde se lêem jornais, revistas, livros, etc. e que escrevem freqüentemente, num

ambiente em que as crianças, desde cedo, tomam contato com o texto escrito,

acham muito natural o que a escola ensina, pois isso representa uma continuação

do que essas pessoas já faziam e já esperavam que a escola propusesse esse

mesmo procedimento.

Segundo CAGLIARI (1992), alfabetizar grupos sociais que encaram a

escrita como uma simples garantia de sobrevivência é diferente de alfabetizar

Page 31: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

31

grupos sociais que consideram a escrita, além de necessária, uma forma de

expressão individual de arte, de cultura e de passatempo.

Afirma CAGLIARI (1992) que ninguém escreve ou lê sem motivação. É

justamente por isso que em determinadas culturas o uso da escrita se apresenta

como algo secundário e dispensável. Em outros grupos sociais, contudo, a escrita

é algo absolutamente imprescindível. Essa atitude perante a escrita não se

observa só comparando, por exemplo, a cultura européia com a cultura dos

indígenas. Atitudes conflitantes com relação à escrita podem ser observadas em

uma grande cidade. Entre seus habitantes, sem dúvida alguma, todos

necessitam, de um modo ou de outro, saber ler certas coisas. No entanto, o

número cai enormemente quando se conta os que necessitam produzir a escrita.

Muitas pessoas podem até ler jornais, revistas, etc., mas escrevem muito pouco.

Não basta saber escrever. É preciso ter uma motivação para isso. A

maioria da população de uma cidade trabalha em atividades que não exigem

diretamente o uso da escrita. Por essa razão os programas de alfabetização,

principalmente aqueles voltados para adultos, precisam ser elaborados de acordo

com as reais necessidades de cada um, e não em função de uma cultura julgada

ideal.

A escrita tem por objetivo primeiro a leitura, que é uma interpretação da

escrita que consiste em traduzir os símbolos escritos em fala. Alguns tipos de

escrita se preocupam com a expressão oral e outros simplesmente com a

transmissão de significados específicos. que devem ser decifrados por quem é

habilitado. Nesse caso, os aspectos fonológico, lexical, sintático, que marcam a

linearidade do discurso lingüístico, não têm indicação específica, ficando a cargo

Page 32: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

32

do leitor encontrar a forma mais adequada de realizá-los. Muitas vezes, esse tipo

de escrita se serve de palavras-chave para a sua decifração. Seus exemplos mais

comuns são os sinais de trânsito.

Um desenho não participa necessariamente de um tipo de escrita. A

escrita, para ser qualificada como tal, precisa de um objetivo bem definido, que é

fornecer subsídios para que alguém leia. Um desenho não precisar ser feito para

que alguém o leia. Claro está que se pode entender o valor dos temas leitura, ler,

dizendo que se pode "ler" a natureza, o mundo, as pessoas, etc. Nesse sentido,

qualquer desenho ou fotografia pode ser decifrado, comentado lingüisticamente,

sem que seja necessariamente um sistema de escrita, sem que ocorra uma leitura

propriamente dita.

Historicamente, muitos sistemas de escrita se desenvolveram a partir

de desenhos. A escrita começou a existir no momento em que o objetivo do ato

de representar pictoricamente tinha como endereço a fala e como motivação fazer

com que, por meio da fala, o leitor se informasse a respeito de alguma coisa. É

claro que as informações da escrita não se restringem somente à informação do

leitor. A função informativa é a primeira cronologicamente, mas não é a única e

nem sempre a principal.

3.1.2. Língua falada

A modalidade falada de nossa língua é vista, muitas vezes, de uma

forma errada. Já afirmamos que a escola direciona o ensino da língua à língua

escrita. Conseqüentemente, a gramática normativa está voltada para a língua

Page 33: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

33

escrita, mesmo quando tenta abordar assuntos específicos da língua falada. Faz-

se necessário separar o que pertence à língua escrita e o que pertence à língua

falada. Não vamos, aqui, nos alongar com considerações teóricas sobre

fonologia. Esse não é o objetivo de nosso trabalho. O que queremos demonstrar

nesta fase preambular de nossa dissertação é que é demonstrar que há vários

modos de usarmos a língua, e que a língua oral é apenas uma delas. Além disso,

há diversas formas de usarmos a língua falada. Em suma, há diferentes modos de

se falar uma língua.

Um aspecto a ser levantado é o fato de se criarem valores de certo e

errado para tais disparidades no uso da língua de acordo com uma gramática

normativa preestabelecida por estudiosos. Depreende-se disso um

comportamento preconceituoso da sociedade com relação a essas diferenças.

CAGLIARI (1992) afirma que a escola, como representante da sociedade,

costuma incorporar tais preconceitos, mesmo sem ter consciência disso. É

importante entendermos os casos de variação lingüística e como ela ocorre em

nossa sociedade.

Na verdade, as línguas evoluem com o tempo, se transformam e vão

adquirindo peculiaridades próprias em função de seu uso por comunidades

específicas. Todas as variedades do ponto de vista estrutural-lingüístico são

perfeitas e completas em si. O que as diferencia são os valores sociais que seus

membros têm na sociedade. Dessa forma, um baiano falará como um baiano, e

não como um gaúcho; uma pessoa de classe social alta não falará como uma

pessoa de classe social baixa, e assim por diante.

Page 34: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

34

As formas diferentes de falar ocorrem porque as línguas, ao longo do

tempo, transformam-se, assumindo peculiaridades características de grupos

sociais diferentes, e os indivíduos aprendem a língua ou o dialeto da comunidade

em que vivem. O latim vulgar, por exemplo, foi, em certa época, considerado um

dialeto das classes pobres, e, por isso, desprestigiava-se que o falava.

Paulatinamente, a sociedade da época foi substituindo o latim clássico pelo latim

vulgar, que, aos poucos, transformou-se nas línguas românicas.

As considerações acima têm como objetivo demonstrar que, ao

contrário do que muita gente diz, as línguas, quando se transformam com o

passar do tempo, não se degeneram, não se tornam imperfeitas, estragadas, mas

adquirem novos valores sociolingüísticos, ligados às novas perspectiva da

sociedade, que também muda. Nessas transformações, não aparece o "certo" e o

"errado" lingüístico, mas o diferente. Certo e errado são conceitos pouco honestos

que a sociedade usa para marcar os indivíduos e classes sociais pela maneira de

falar e para os rotular. Essa atitude da sociedade revela seus preconceitos, pois

marca as diferenças lingüísticas com marca de prestígio ou estigma. .

Para finalizar este tópico deste trabalho, convém fazermos algumas

considerações sobre o que se costuma chamar de variedade-padrão ou dialeto-

padrão. É preciso dizer o que significa isso exatamente.

CAGLIARI (1992) nos mostra o exemplo do Reino Unido. Lá, além de

se falarem cinco línguas diferentes: o inglês, o gaélico, o gaulês, o córnico e o

irlandês, existe um número enorme de dialetos da língua inglesa. São

semelhantes entre si, mas diferentes em muitos aspectos. Por isso, são

variedades diferentes da língua inglesa. Há, no entanto, uma variedade ou dialeto

Page 35: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

35

conhecido como "inglês da rainha", conhecido também como "inglês da BBC" ou,

como o denominam os lingüistas, received pronunciation, que é considerada a

variedade-padrão ou dialeto-padrão no Reino Único. Regionalmente, as pessoas

falam com sotaque local, usando a variedade típica de sua região. Contudo,

quando não querem revelar suas origens, passam a usar o "sotaque da rainha" ou

o inglês-padrão, sejam elas de que região forem ou pertençam elas a que classe

social. Quando um inglês ou escocês falam o inglês padrão, todos os seus

valores de prestígio e desprestígio, revelados pelo modo diferente de falar a

língua, ficam, de certo modo, "neutralizados".

No Brasil, a situação é diferente. Aqui, não existe um português do

presidente da República ou equivalente. Quando observamos o comportamento

da sociedade, notamos que, em São Paulo existe uma maneira da falar que goza

de grande prestígio e várias outras maneiras que, em graus diferentes, são

estigmatizados, chegando até ao dialeto caipira. No Rio de Janeiro, há um modo

de falar que também é de prestígio, mas que é diferente do modo de falar de

prestígio de São Paulo. Em outras regiões ocorre a mesma coisa.

Com a entrada dos meios de comunicação de massa, principalmente o

rádio e a TV, nas casas das pessoas, criou-se, conforme nos aponta Cagliari

(1992), um novo conceito de fala de prestígio em nosso país. Com a forte

influência da TV Globo, o chamado "padrão global" está penetrando nas falas das

pessoas e das comunidades.

Claro está que a questão da variedade lingüística é muito mais

complexa do que o aqui exposto. Em resumo, porém, podemos dizer que a

variação lingüística provém não só da evolução do idioma, mas de raízes locais,

Page 36: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

36

geograficamente delimitadas. Ela também aparece na sociedade estratificada à

maneira das classes sociais. É comum também no comportamento lingüístico de

uma pessoa, em diferentes circunstâncias de sua vida, independentemente da

classe social ou região a que pertença. Uma pessoa fala com diferenças às vezes

notáveis quando numa conversa informal ou em público. Observamos que uma

pessoa que lê procura uma pronúncia que nem sempre corresponde à sua

pronúncia na fala coloquial. Isso é o que os lingüistas chamam de "variação

estilística". Na verdade, todos nós falamos mais de um dialeto, que usamos de

acordo com as circunstâncias.

Page 37: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

37

CAPÍTULO IV

O ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA NA FASE DA

ADOLESCÊNCIA

Outro fator de suma importância para o entendimento da realidade

sobre o ensino da Língua Portuguesa diz respeito aos aspectos que devem ser

levados em conta, numa dada etapa, no ensino-aprendizagem da referida

disciplina.

Desta forma, precisa-se ressaltar que o processo de aprendizagem que

abrange as quatros séries finais do ensino fundamental coincidem com a fase da

adolescência, na faixa etária entre 11 e 15 anos: período de vida visivelmente

marcada pelas transformações que ocorre com o ser humano em várias

dimensões: sócio-cultural, afetivo-emocional, cognitiva e corporal.

Sabe-se, que nesta fase o indivíduo passa por um processo onde as

condições biológicas da aprendizagem, deve relacionar-se com a maturidade,

visto ser esta que determina a prontidão do organismo para a execução de

determinadas atividades, passando desde a integridade dos órgãos dos sentidos

até o funcionamento do sistema nervoso central.

Assim sendo, deve-se levar em conta, que a dimensão afetivo-

emocional do adolescente implica na busca da reinterpretação das experiências já

vividas e as que possa viver. Nessa fase o adolescente demonstra maior

Page 38: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

38

autonomia nas tomadas de decisões e desempenha suas atividades com maior

responsabilidade.

É justamente neste período, que o aluno desenvolve a aprendizagem

cognitiva. Sob esse aspecto o adolescente amplia suas formas de raciocínio,

organiza suas observações e opiniões, desenvolve a capacidade de investigação,

levanta hipóteses, compreende abstrações; analisa e sintetiza em direção à

construção do conhecimento cada vez mais formal.

Partindo desse princípio, o que a escola deve fazer é ajustar suas

atividades à competência dos alunos, de maneira a permitir que os educandos

tenham contatos com textos escritos mais complexos e conteúdos gramaticais

sistematizados.

4.1. O Papel do Professor de Língua Materna

Mediante o que fora abordado, torna-se evidente o papel do professor

considerando, ora, como detentor do conhecimento, ora como mediador e

orientador do processo ensino-aprendizagem, o que reforça a complexidade do

papel que exerce.

Para maior clareza do papel que aquele exerce vê-se a citação de

alguns autores: SANTOS (1996, p.253) “A busca de eficiência no ensino

pressupõe um trabalho permanente”. FREINET apud SANTOS (1996, p.287)

“nunca devemos dar essa tarefa por concluída porque em grande parte ela

continuará a ser uma tarefa de adaptação constante”.

Page 39: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

39

O grande papel do professor é o desafio de tornar o ensino mais

prazeroso e rentável, onde cada indivíduo demonstre a sua criatividade, a sua

visão crítica, o seu saber e o seu aprender.

As intervenções do professor são necessárias ao passo que se deseje

mudanças e crescimento cultural. Quando as coisas não vão bem, é ele o

responsável pelo diagnóstico e conseqüente tentativa de inovar e encontrar uma

saída inteligente para a eficácia de seu trabalho. O que ele não pode é deixar-se

vencer pelas mazelas detectadas no ensino- aprendizagem nem permitir que se

instale o caos em suas salas de aulas.

O professor de Língua Portuguesa de 5ª à 8ª séries exerce um papel

fundamental para o sucesso do aluno. Ele não pode ser um mero transmissor de

conhecimentos, mas um orientador, instrutor, agente do saber, seja no âmbito de

conhecimentos específicos, gerais, psicológicos, sociais e culturais. Deve ser

democrático, mas nunca exceder a passividade e a liberdade.

Eis algumas intervenções que poderão ser executadas pelo professor:

• Possibilitar, que na sala de aula, se instaure um clima de confiança,

compreensão, cooperação, trabalho individual e coletivo, responsabilidade,

respeito às diferentes manifestações da expressão;

• Assegurar que os alunos disponham do espaço e de instrumentos necessários

à realização da linguagem oral, da linguagem escrita ou ainda no campo da

análise lingüística e literária;

• Garantir uma organização para que todos os alunos realizem seus trabalhos

de forma equilibrada, seja ele individual, coletivo ou de intercâmbio grupal;

Page 40: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

40

• Oferecer ao aluno a oportunidade de decidir, de escolher e assumir uma

postura responsável;

• Auxiliar no esclarecimento de dúvidas, apresentar sugestões, informações

para facilitar as descobertas ou elaborações dos trabalhos;

• Encorajar o aluno a prosseguir rumo a novas descobertas, a novas tentativas

e realizações, enfim, prestar ao aluno apoio necessário para que se sinta

seguro e capaz de ir cada vez mais longe na construção do seu saber e para

que, enquanto indivíduo autônomo e ser social, cresça cada vez mais.

Entretanto, há outros papéis que o professor deverá desempenhar, é o

de psicólogo, além de pedagogo, didata, sociólogo e filósofo, a fim de que possa

saber lidar com as diversas situações que venha encontrar no processo do

ensino-aprendizagem.

O professor que é também um educador, deve trabalhar com o aluno e

não sobre ele, pois sendo educador e com mais experiência que o aluno – que

busca o saber – favorece um clima de confiança onde a aprendizagem alcance

uma porcentagem confortante de sucesso e eficácia.

Segundo os autores: Juan Díaz Bordenave, Adair Martins Pereira e

Alfredo González Morales, na aplicação dos métodos e das técnicas participativas

a aprendizagem é vista como construção; como um processo ativo onde o aluno

cria e recria seu próprio conhecimento mediante a solução coletiva de tarefas, a

troca e confrontação de idéias, opiniões e experiências entre estudantes e

professores, a proporção que haja entre ambos uma interação, maior será o grau

de aprendizagem e habilidades adquiridas por eles.

Page 41: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

41

CONCLUSÃO

O interesse do tema surgiu diante da necessidade de se examinar as

dificuldades apresentadas pelos alunos de 5a à 8a séries, do Ensino Fundamental

e do Ensino Médio, relativas ao processo de aprendizagem da Língua

Portuguesa.

Trabalhando com a docência do ensino fundamental e médio nas

escolas, observou-se que alunos demonstraram maior dificuldade na

aprendizagem da linguagem escrita do que alguns que tiveram a aquisição desta,

melhor estruturada. Aproximadamente 70 por cento de uma classe com 40 alunos

apresentou grande dificuldade de assimilação entre a língua falada e a língua

escrita, dificuldade essa que trazem desde o início de sua alfabetização.

Através de contatos com professoras primárias da mesma escola,

chegou-se à conclusão que, devido a confusões na linha construtivista e

metodologias mal trabalhadas, bem como o sistema de aprovação automática

nas duas séries iniciais, levaram as crianças a seguirem com essa dificuldade,

pois aqueles que não tiveram uma aquisição estruturada não conseguem

acompanhar a aprendizagem, ficando assim prejudicados nas séries seguintes,

principalmente na 5ª série, na qual encontram diversas disciplinas, cada uma

delas com um professor diferente, cada qual com sua maneira de trabalhar.

Sabe-se que a formação de professores, principalmente do ensino

fundamental, padece de muitos males, sobretudo, da carência da fundamentação

Page 42: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

42

lingüística. Assim os conteúdos programáticos de Morfologia, Fonética e

Fonologia, Sintaxe, Semântica e Estilística são repassados aos alunos, sem

preocupação qualitativa, o que empobrece a ação didática.

A Língua é a identidade de um povo. Como veículo de comunicação, é

considerada radiografia de uma nação, portanto é pelo seu uso que avalia-se os

seus detentores. Por isto decidiu-se estudar, pesquisar e analisar os resultados

sobre intenções e realidades no ensino-aprendizagem de língua materna.

No decorrer deste estudo, verificou-se que nas últimas décadas,

estudiosos altamente competentes e compromissados com esta problemática,

muito tem contribuído com seus estudos, quer seja na área da gramática, da

literatura, da produção textual e até mesmo da oralidade, a fim de que a Língua

Portuguesa seja aprendida com mais facilidade e conseqüentemente usada

conforme as diversas modalidades permitidas.

O fato da complexidade da Língua ser de grande abrangência, fez nos

empenharmos mais em retratar a verdadeira realidade do ensino em escolas

municipais e estaduais, tendo como suporte, fundamentação teórica, experiência

através da prática pedagógica, além de oferecer sugestões aos referidos

professores com a proposta de aplicação de métodos e técnicas participativas,

em suas aulas ou mesmo despertá-los para o estudo dos autores abordados ou

de outros, se assim o desejarem, a fim de que adquiram condições para

trabalharem de forma consciente e eficaz.

Concluiu-se portanto, que adquirir domínio sobre a língua, habilidade,

métodos e técnicas para a prática do ensino, custa ao professor, esforços,

vontade determinação, persistência e autodedicação.

Page 43: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

43

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMOR, Emília. Didática do Português: fundamentos e metodologia. Lisboa,

Textos, 1994.

BASTOS, Neusa Barbosa. Língua Portuguesa. História, Perspectivas, Ensino.

São Paulo: EDUC, 1998.

BECHARA, Evanildo. Ensino da Gramática. opressão? liberdade?. São Paulo:

Ática, 1985.

BELTRAN, José Luís. O ensino de Português: intenção ou realidade. São Paulo:

Moraes, 1989.

BORDENAVE, Juan Díaz, PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de ensino-

aprendizagem. 9. Ed. Petrópolis: Vozes, 1986.

BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa, ensino de 5.ª à

8.ª séries. Brasília: MEC/SEF, 1998.

BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da Língua Portuguesa. São

Paulo: FTD, 1995.

CAGLIARI, L. E. Alfabetização e lingüística. 5.ed. São Paulo, Scipione, 1992.

CAMPOS, Dinah Martins de Sousa. Psicologia da Aprendizagem. Petrópolis:

Vozes, 1986.

COSTA,.. Maria Cristina Rigoni; OLIVEIRA, Maria Thereza Indiani de, PINILLA,

Maria da Aparecida Meirelles de. Modalidades do uso da língua. Rede Escola.

Page 44: O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS ESCOLAS DE … LIMA BORGES.pdf ·  · 2009-08-05com o direito do cidadão brasileiro, motivo este responsável pela escolha do tema: ... surgiram

44

Site da Secretaria da Educação do Estado do Rio de Janeiro:

http://www.sectec.rj.gov.br/redeescola/especialistas/portugues/tema03/portm03.ht

ml.

FILHO, Antenor Antônio Gonçalves. Língua Portuguesa e Literatura Brasileira.

São Paulo: Cortez, 1991.

GATTI, Bernadete Angelina. Formação de professores e carreira: problemas de

movimentos e renovação. Campinas: Autores Associados, 1997.

GERALDI, João Wanderley. O texto na sala de aula: leitura e produção. 8. ed.

Assoeste. [199?].

LUFT, Celso Pedro. Língua e liberdade. São Paulo: Ática, 1997.

MAROTE, João Teodoro D’olim & FERRO, Gláucia D’olim Marote. Didática da

Língua Portuguesa. São Paulo: Ática, 1994.

POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: ALB:

Mercado de Letras, 1996.

SALOMON, Délio Vieira. Como fazer uma monografia. São Paulo: Martins

Fontes, 1996.

SANTOS, Maria Lúcia dos. A expressão livre no aprendizado da Língua

Portuguesa. São Paulo: Scipione, 1996.

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados,

1997.

SUASSUNA, Lívia. Ensino de Língua Portuguesa: uma abordagem pragmática.

Campinas: Papirus, 1995.