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1 O EMPREGO DAS FORÇAS ARMADAS NA GARANTIA DA LEI E DA ORDEM: UMA PERSPECTIVA JURÍDICA Leonardo Sucar dos Anjos 1 RESUMO O presente artigo tem por finalidade estudar dentro de uma perspectiva jurídica a destinação constitucional das Forças Armadas denominada Garantia da Lei e da Ordem. No presente trabalho foram apresentados os conceitos, natureza jurídica e espécies da Garantia da Lei e da Ordem tomando por base as normas legais vigentes no Brasil bem como a doutrina militar referente ao tema. Após esta abordagem conceitual e histórica foram analisados os fundamentos, princípios e espécies de ações desenvolvidas pelas Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem. A pesquisa teve base bibliográfica e valeu-se do método indutivo por meio de uma pesquisa histórica, analítica e documental. Ao final a pesquisa buscou esclarecer, por meio de uma reflexão, a luz do ordenamento legal vigente, os aspectos legais do emprego de tropas na Garantia da Lei e da Ordem. Palavras-chave: Direito Constitucional. Forças Armadas. Garantia da Lei e da Ordem. ABSTRACT The purpose of this article is to study from a legal perspective the constitutional destination of the Armed Forces called Law and Order Guarantee. In the present work the concepts, legal nature and species of the Law and Order Guarantee were presented, based on the legal norms in force in Brazil as well as the military doctrine referring to the subject. After this conceptual and historical approach were analyzed the foundations, principles and species of actions developed by the Armed Forces for the Guarantee of Law and Order. The research had a bibliographic basis and was based on the inductive method through historical, analytical and documentary research. In the end the research sought to clarify, through a reflection, the light of the current legal order, the legal aspects of the use of troops in the Guarantee of Law and Order. Palavras-chave: Constitutional Law. Defense Forces. Guarantee of Law and Order. 1 Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba e pós-graduado em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá, Mestrando em Estudos Marítimos nas áreas de Ciência Política e Relações Internacionais pelo do Programa de Pós-graduação em Estudos Marítimos na Escola de Guerra Naval. Atualmente Professor de Direito na Academia Militar das Agulhas Negras. E-mail: [email protected]

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1

O EMPREGO DAS FORÇAS ARMADAS NA GARANTIA DA LEI E DA

ORDEM: UMA PERSPECTIVA JURÍDICA

Leonardo Sucar dos Anjos1

RESUMO

O presente artigo tem por finalidade estudar dentro de uma perspectiva jurídica a destinação

constitucional das Forças Armadas denominada Garantia da Lei e da Ordem. No presente

trabalho foram apresentados os conceitos, natureza jurídica e espécies da Garantia da Lei e da

Ordem tomando por base as normas legais vigentes no Brasil bem como a doutrina militar

referente ao tema. Após esta abordagem conceitual e histórica foram analisados os

fundamentos, princípios e espécies de ações desenvolvidas pelas Forças Armadas para a

Garantia da Lei e da Ordem. A pesquisa teve base bibliográfica e valeu-se do método indutivo

por meio de uma pesquisa histórica, analítica e documental. Ao final a pesquisa buscou

esclarecer, por meio de uma reflexão, a luz do ordenamento legal vigente, os aspectos legais do

emprego de tropas na Garantia da Lei e da Ordem.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Forças Armadas. Garantia da Lei e da Ordem.

ABSTRACT

The purpose of this article is to study from a legal perspective the constitutional destination of

the Armed Forces called Law and Order Guarantee. In the present work the concepts, legal

nature and species of the Law and Order Guarantee were presented, based on the legal norms

in force in Brazil as well as the military doctrine referring to the subject. After this conceptual

and historical approach were analyzed the foundations, principles and species of actions

developed by the Armed Forces for the Guarantee of Law and Order. The research had a

bibliographic basis and was based on the inductive method through historical, analytical and

documentary research. In the end the research sought to clarify, through a reflection, the light

of the current legal order, the legal aspects of the use of troops in the Guarantee of Law and

Order.

Palavras-chave: Constitutional Law. Defense Forces. Guarantee of Law and Order.

1 Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba e pós-graduado em Direito Público pela Universidade

Estácio de Sá, Mestrando em Estudos Marítimos nas áreas de Ciência Política e Relações Internacionais pelo do

Programa de Pós-graduação em Estudos Marítimos na Escola de Guerra Naval. Atualmente Professor de Direito

na Academia Militar das Agulhas Negras. E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como tema a Garantia da Lei e da Ordem, a GLO, sigla que

corriqueiramente identifica esta forma de emprego, dimana de uma das três destinações

constitucionais conferidas pela carta magna às Forças Armadas e tem se constituído na forma

mais recorrente de atuação por parte das tropas federais.

Com o advento da Lei Complementar nº 97 de 9 de junho de 19992, alterada pela Lei

Complementar nº 117 de 2004, pela Lei Complementar nº 136 de 2010 e do Decreto nº 3.897

de 24 de agosto de 20013, a atuação das Forças Armadas tomou uma nova perspectiva.

Inicialmente decorria de um estado de exceção, passou a ser desinente do surgimento de um

quadro de ineficiência dos órgãos de segurança pública em face de distúrbios sociais internos,

causados por questões sócio-políticas ou até mesmo por eventos de grande visibilidade mundial.

Neste contexto, onde se faz necessária a manutenção ou preservação da ordem pública,

bem como a incolumidade das pessoas e do patrimônio, a simples requisição das tropas federais

para atuar em algum ente da federação, seja de forma isolada ou conjuntamente, a fim de manter

ou restabelecer a ordem social, passou a ser suficiente para ensejar a atuação das forças armadas

em cenário de GLO. Aumentando, sobremaneira, as operações desta natureza, justificando o

estudo do tema do emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem, haja vista sua

atualidade e relevância.

O emprego de militares federais em um contexto interno sempre produziu bastante

controvérsia. Questões ligadas à legalidade, à legitimidade, à necessidade ou até mesmo à

banalização do uso de um meio que, segundo entendimento de alguns, não seria vocacionado

para tal, sempre são suscitadas quando as tropas estão atuando em ambientes urbanos.

Partindo do pressuposto de que qualquer exército tem como razão de existência a

Guerra, surge a problemática que instiga um estudo pormenorizado das diversas legislações que

decorrem direta ou indiretamente do art. 142 da Constituição do Brasil a fim de esclarecer o

2 Dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas. No estudo

designada por Lei Complementar 97/99. 3 Fixa as diretrizes para o emprego das Forças Armadas na Garantia a Lei e da Ordem, e dá outras providências.

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que é GLO, seus desdobramentos, aspectos legais e doutrinários, identificando quais as normas

legais legitimam o emprego das Forças Armadas nesta operação de não guerra?

O emprego de tropas federais na Garantia da ordem pública, assim entendida como

estabelecimento ou reestabelecimento de uma situação de normalidade social onde as leis em

vigor são cumpridas, não é algo recente. Desde 1824 as constituições do Brasil trazem em seu

conteúdo a previsão legal do emprego do poder coercitivo do estado no intuito de sustentar a

integridade do império4; manter as leis do interior5; garantir os poderes constitucionais, a ordem

e a lei6; garantir os poderes constituídos, a lei e a ordem7; e por fim a garantir dos poderes

constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem8.

O contexto social na atualidade se caracteriza pelo aumento da violência urbana, o crime

cada vez mais organizado e os órgãos de segurança pública cada vez mais ineficazes no combate

à criminalidade, aliado a isso somam-se a má gestão pública, corrupção, legislação ultrapassada

e o sistema prisional falido, como elementos ensejadores da atual calamidade pública vigente

nos municípios.

Esta condição sócio-política tem contribuído para o aumento de requisições e emprego

de recursos federais, particularmente das Forças Armadas no apoio ao restabelecimento ou

manutenção da ordem, a fim de permitir que os órgãos de segurança pública possam

desenvolver suas atividades a contento, tornando comum algo incomum, que é a presença de

integrantes das Forças Armadas nas ruas participando ativamente nas rotinas da população.

Segundo o Palácio do Planalto9 somente entre 2010 e 2017, GLO foi decretada 29 vezes.

O objetivo geral do estudo é, por meio de uma pesquisa teórica e qualitativa a respeito

do conteúdo jurídico e doutrinário da Constituição da República Federativa do Brasil,

particularmente de seu artigo 14210, contribuir para uma melhor compreensão dessa forma de

4 Art. 145 da Constituição de 1824. 5 Art. 14 da Constituição de 1891. 6 Art. 162 da Constituição de 1934 7 Art. 177 da Constituição de 1946 e Art. 92 da Constituição de 1967. 8 Art. 142 da Constituição de 1988. 9 Entenda como funciona a operação de Garantia da Lei e da Ordem. Disponível em:

http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-planalto/noticias/2017/05/entenda-como-funciona-a-operacao-de-

garantia-da-lei-e-da-ordem 10 As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais

permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do

Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa

de qualquer destes, da lei e da ordem.

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emprego das Forças Armadas, sem, contudo, esgotar o assunto que se reveste de grande

importância considerando as recorrentes solicitações para emprego em um contexto de GLO.

Para tal buscou-se discorrer sobre tema valendo-se dos seguintes objetivos específicos:

identificar as destinações constitucionais e infraconstitucionais das Forças Armadas,

contextualizando por meio das normas específicas, investigar as diferenças legais de cada uma,

bem como as diversas formas de atuação que o estudo chamou de espécies de emprego em

GLO, ou seja, ações ou operações que podem ser desenvolvidas, tecer breves comentários às

Operações de Pacificação e por fim fazer uma referência a inadequação legal do uso do termo

GLO.

O trabalho se desenvolveu por meio de um estudo metodológico11 cuja a abordagem

foi o método indutivo, onde se pretendeu observar as formas de emprego das Forças Armadas

em ações de GLO, descobrir a relação entre elas e apresentar uma generalização desta relação

com suas causas e efeitos. Os dados foram obtidos por meio de uma pesquisa bibliográfica e

documental, onde se estudou a doutrina, se analisou leis, jurisprudências, ainda se valeu de

documentações indiretas e observação os elementos legais embasadores e legitimadores deste

processo. Não se busca a verdade, mas sim conclusões que sejam prováveis e aceitáveis.

1 DESENVOLVIMENTO

1.1 Destinação constitucional e atribuições infraconstitucionais das Forças Armadas

A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), trata das Forças Armadas em

seu capítulo II, composto pelos artigos 142 e 143. Neste capítulo são tratados diversos temas

voltados à definição, organização e à destinação das Forças armadas. Quanto a destinação,

elemento ensejador do presente estudo, a Constituição nos apresenta o seguinte: [...] “e

destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de

qualquer destes, da lei e da ordem”.

11 LAKATUS; MARKONI, 2003. GIL, 2008

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Não obstante haja o acertado e histórico entendimento de que a defesa da pátria seja a

missão principal de qualquer Exército, e as demais missões secundárias, tal distinção não

encontra amparo na norma constitucional.

A Constituição, não faz qualquer discernimento entre as atribuições constitucionais das

Forças Armadas. Classificar a missão principal como sendo a defesa da pátria e a partir daí as

demais como secundárias, ainda que a tese seja empossada com total coerência e propriedade,

não se adequa à norma legal e, por assim dizer, também não se alinha com a atual realidade do

Brasil, em virtude do emprego recorrente das forças em operações de não guerra. Daí decorre

a apreensão, a luz do diploma legal, de que atribuir uma diferenciação, em principal e

secundária, às atribuições constitucionais das Forças Armadas seja juridicamente e

factualmente inadequada.

Ainda com amparo na norma constitucional, forçoso é concluir que, em tese, qualquer

que sejam as atividades realizada pelas Forças Armadas, estas devem estar inseridas em uma

das três destinações previstas na constituição, tratando-se tais atribuições, portanto, de gêneros

de onde decorrem as diversas espécies, gêneros estes que aqui passaremos a denominar como

operações e por vezes de ações a serem desenvolvidas pelos militares.

Falamos em tese, pois, o emprego das Forças Armadas não ficou restrito ao conteúdo

constitucional, a Lei complementar nº 97/99, traz em seu conteúdo outras atribuições que se

constituirão em ações das Forças Armadas, não incluídas entre as destinações constitucionais,

o que iremos, a luz do glossário jurídico, intitular como atribuições infraconstitucionais.

Nesse sentido a legislação infraconstitucional, mais especificamente a Lei complementar

nº 97/99 atribuiu outras ações, expressamente fora do contexto daquelas previstas no art. 142

da CRFB, quais sejam, as atribuições subsidiárias e as operações de paz. 12

Cumpre ressaltar que estas destinações infraconstitucionais, expressas na lei, não

constituem uma simples menção normativa ou uma forma de atuação constitucional das forças,

trata-se de atribuições fora da previsão constitucional e por consequência rechaça a

possibilidade de sua inclusão no rol de operações voltadas para GLO ou de qualquer outra

descrita na Lei Maior.

12 Artigos 1º e 15 da Lei Complementar nº 97/99.

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Ao explorarmos o dispositivo legal, especificamente nas expressões “Sem

comprometimento de sua destinação constitucional”, constante do art. 1º, bem como "e na

participação em operações de paz", no art. 15, concluímos que ambas não estão incluídas no

propósito da norma constitucional, ou seja, não estamos tratando de atribuições constitucionais,

nem tão pouco são espécies integrantes destas.

Há que se atentar para não confundir atribuições infraconstitucionais com ações

constitucionais previstas em outras normas. Como será possível aferir, apesar de previstas fora

da constituição, algumas ações são, na verdade, espécies que se adequam a uma das três

destinações constitucionais.

Para ilustrar tal assertiva podemos aludir às operações de Garantia da Votação e

Apuração (GVA) nas eleições que ocorrem em diversos municípios do Brasil, a exemplo das

eleições municipais ocorridas no ano de 201513. Tal emprego encontra seu esteio na Lei nº

4.737, de 15 de julho de 1965, art. 23, XIV14, tratando-se, na verdade, de um emprego das

Forças Armadas em um contexto de GLO do pleito eleitoral, não obstante esteja prevista em

uma norma infraconstitucional.

Desta forma é viável o entendimento no sentido de que as atribuições subsidiárias e as

operações de paz, são ações das Forças Armadas expressamente fora de suas destinações

constitucionais, por consequência também da GLO, pois de outra forma estaríamos diante de

um vício de inconstitucionalidade.

Importante consignar que, somente por meio do poder constituinte derivado podemos

alterar a norma constitucional, inserindo atribuições diversas das já previstas na lei máxima,

sendo vedada tal iniciativa a uma Lei Complementar.

Por fim, objetivando substancializar o entendimento das instituições integrantes das

Forças Armadas, em face da destinação constitucional, a Marinha do Brasil, o Exército

Brasileiro e a Força Aérea Brasileira inseriram a GLO como parte integrante de suas missões

institucionais.

13 Decreto 14.403 de 22 de agosto de 2016. 14 Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965. Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior; XIV -

requisitar a força federal necessária ao cumprimento da lei, de suas próprias decisões ou das decisões dos Tribunais

Regionais que o solicitarem, e para garantir a votação e a apuração.

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Neste sentido a Marinha do Brasil tem como Missão "preparar e empregar o Poder

Naval, a fim de contribuir para a Defesa da Pátria; para a garantia dos poderes constitucionais

e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem; para o cumprimento das atribuições

subsidiárias previstas em Lei; e para o apoio à Política Externa”15. No mesmo sentido o Exército

Brasileiro busca "contribuir para a garantia da soberania nacional, dos poderes constitucionais,

da lei e da ordem, salvaguardando os interesses nacionais e cooperando com o desenvolvimento

nacional e o bem-estar social, para isso, preparar a Força Terrestre, mantendo-a em permanente

estado de prontidão;16"e finalmente a Força Aérea Brasileira que se manifesta da seguinte forma

"a Constituição Federal estabelece como destinação das Forças Armadas a defesa da pátria, a

garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, a garantia da lei e da

ordem de onde derivam a missão e as atribuições do Comando da Aeronáutica (COMAER)17."

1.2 Conceito e natureza jurídica da Garantia da Lei e da Ordem

Inicialmente insta esclarecer que não há, na legislação vigente, uma definição para a

GLO. O Decreto nº 3.897 de 24 de agosto de 200118, em seu art. 3º19, apenas se limita a

apresentar as ações, seus requisitos e objetivos, cabendo à doutrina, por meio desses elementos,

construir tal conceito.

Paulo Nader20 define a lei em sentido estrito como “um preceito comum e obrigatório,

emanado do Poder Legislativo, no âmbito de sua competência”. E ainda consigna a relação da

lei com a ordem pública da seguinte forma: “A lei de ordem pública, ao contrário das que

15 Missão da Marinha do Brasil. Disponível em: https://www.marinha.mil.br/content/missao-e-visao-de-futuro-

da-marinha. 16 Missão e visão de futuro do Exercito Brasileiro. Disponível em http://www.eb.mil.br/missao-e-visao-de-futuro 17 Missão da Força Aérea Brasileira. Disponível em: http://www.fab.mil.br/institucional 18 Fixa as diretrizes para o preparo e o emprego das Forças Armadas na GLO, 19 Art. 3º Na hipótese de emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, objetivando a preservação

da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, porque esgotados os instrumentos a isso previstos

no art. 144 da Constituição, lhes incumbirá, sempre que se faça necessário, desenvolver as ações de polícia

ostensiva, como as demais, de natureza preventiva ou repressiva, que se incluem na competência, constitucional e

legal, das Polícias Militares, observados os termos e limites impostos, a estas últimas, pelo ordenamento jurídico. 20 NADER, 2014, p 164 e 165.

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integram a ordem privada, reúne preceitos de importância fundamental ao equilíbrio e à

segurança da sociedade, pois disciplina os fatos de maior relevo ao bem-estar da coletividade”.

Por tutelar os interesses fundamentais da sociedade, prevalece independentemente da vontade

das pessoas.

Para Paulo Furtado e Uadi Lâmmego Bulos, a ordem pública seria a "situação e o estado

de legalidade normal, em que as autoridades exercem suas precípuas atribuições e os cidadãos

as respeitam e acatam." 21

Emerson Garcia complementa ao ensinar que etimologicamente, o termo ordem deriva

do latim ordine, e sempre estará associado ao conceito de correção, que pode ser analisado em

diversos planos, como o normativo, onde ordem se assemelha à lei e a ordem jurídica, ou o

sociológico, onde ordem aponta para a paz e a tranquilidade públicas. 22

Em lógica decorrência dos conceitos apresentados, podemos compreender a GLO como

“a preservação ou o restabelecimento do equilíbrio e da segurança da sociedade, de modo a

permitir que o Estado, por meio dos seus poderes constituídos, possa exercer as suas destinações

constitucionais objetivando o bem-estar geral”.23

Desta forma a GLO se conforma com um gênero, uma situação fática dentro de contextos

jurídicos, políticos e sociais específicos, limitado no tempo e no espaço geográfico que pode

ser, por exemplo, de ordem eleitoral, ambiental ou até mesmo que envolva aspectos

relacionados à segurança pública.

Para tal o poder público poderá se valer das Forças Armadas que, em atenção a sua

destinação constitucional, irão atuar por meio de operações militares24, das mais diversas, a fim

de preservar ou restabelecer a lei e a ordem.

Com isso, faz-se necessário observarmos que as ações das Forças Armadas se processam

por meio de operações militares, que são planejadas e desenvolvidas de acordo com as

particularidades de cada situação fática, levando em consideração o tempo, espaço e finalidade.

21 FURTADO; BULOS, 1997, p. 132 22 GARCIA, 2009, p. 48f 23 Conceito do próprio autor. 24 Portaria nº 004-EME, de 9 de janeiro de 2014. Aprova o Manual de Fundamentos (EB20-MF-10.103) Operações,

4ª Edição, 2014. “conjunto de ações realizadas com forças e meios militares das Forças Armadas, coordenadas em

tempo, espaço e finalidade, de acordo com o estabelecido em uma Diretriz, Plano ou Ordem para o cumprimento

de uma tarefa, missão ou atribuição”

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Tornando-se oportuno e conveniente rechaçar qualquer dúvida quanto à natureza do emprego

das Forças Armadas em operações ou ações de GLO.

Em que pese, por vezes, as semelhanças na forma de atuação das tropas federais e das

forças de segurança pública, estas possuem natureza distintas, devendo ser afastada a ideia de

que a atuação das Forças Armadas em GLO está no âmbito da segurança pública, malgrado,

ocasionalmente, ocorra a substituição dos órgãos responsáveis por esta atribuição do poder

público25.

A fim de concluir o tópico, congruente é o artigo 15 da Lei Complementar nº 97/9926 que

em seu teor dissipa qualquer dúvida quanto a natureza do emprego das Forças Armadas em

GLO, deixando claro que tal emprego tem à natureza jurídica de atividade militar e não de

segurança pública.

1.3 A Garantia da Lei e da Ordem nas normas infraconstitucionais

Neste momento já podemos perceber que a destinação constitucional hora em estudo

transcende o conteúdo do art. 142 da Constituição e, permeando os demais dispositivos

vigentes, encontra em nosso ordenamento legal o seu suporte jurídico também nas normas

infraconstitucionais, estas sim, capazes de indicar de forma mais dogmática a real natureza das

operações desencadeadas.

Inicialmente temos a Lei Complementar nº 97/9927, que além de ratificar a GLO como

destinação das Forças armadas, ainda apresenta a natureza, características e procedimentos para

a sua efetivação, em total coerência com sua importância hierarquia das leis.28 Trata-se de uma

das principais normas reguladores no âmbito do emprego das Forças Armadas constituindo-se

em amparo legal para grande parte das ações desenvolvidas no contexto da GLO, desde que

atendidos os requisitos legais a qual destaco, dentre outros, "o esgotamento dos instrumentos

25 art. 144 da Constituição da República Federativa do Brasil. 26 Art. 15, § 7o A atuação do militar nos casos previstos nos arts. 13, 14, 15,16-A, nos incisos IV e V do art. 17, no

inciso III do art. 17-A, nos incisos VI e VII do art. 18, nas atividades de defesa civil a que se refere o art. 16 desta

Lei Complementar e no inciso XIV do art. 23 da Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), é

considerada atividade militar para os fins do art. 124 da Constituição Federal. 27 Artigos 1º, e art. 15, §§1 ao 7º 28 KELSEN, 2000.

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destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio",

assim reconhecido quando declarado pelos chefes dos poderes executivos.29

No âmbito eleitoral, o artigo 23, XIV da Lei nº 4737,30 de 15 de julho de 1965, possibilita

a atuação da força federal, quando solicitada, para o necessário cumprimento da lei e garantir a

votação e a apuração. Temos como exemplo o recente o Decreto nº 9.379, de 21 de maio de

2018, que autorizou a atuação das Forças Armadas nas eleições municipais do ano corrente a

fim de garantir a ordem pública.

Questões ambientais também ensejam a atuação das forças armadas na GLO. O Decreto

nº 7957, de 12 de março de 2013, que regulamenta a atuação das Forças Armadas na proteção

ambiental, em seu artigo 8º31, expressamente nomeia o emprego das Forças Armadas para GLO

em operações de proteção ambiental.

Ainda as ações de apoio a Cooperação Federativa previstas no Decreto nº 5289, de 29 de

novembro de 200432, conforme ditames do seu art. 9º, §2º33 que determina que os recursos

materiais da Força Nacional de Segurança Pública sejam colocados à disposição do Ministério

da Defesa no caso de emprego das forças Armadas na GLO.

Observa-se pois, que das destinações constitucionais decorrem diversas operações ou

ações que encontram sustento em normas infraconstitucionais específicas, permitindo listar as

ações de manutenção ou restabelecimento da ordem pública e da incolumidade das pessoas e

29 Decreto Nº 3.897, de 24 de agosto 2001. Fixa as diretrizes para o emprego das Forças Armadas na GLO e da

outras providências. 30 Lei nº 4737 de 15 de julho de 1965, art. 23 Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior. XIV - requisitar

a força federal necessária ao cumprimento da lei, de suas próprias decisões ou das decisões dos Tribunais Regionais

que o solicitarem, e para garantir a votação e a apuração. 31 Decreto 7957, de 12 de março de 2013, art. 8º No caso de emprego das Forças Armadas para garantia da lei e

da ordem em operações de proteção ambiental, caberá ao Ministério da Defesa a coordenação, o acompanhamento

e a integração das ações a serem implementadas pelos órgãos e entidades envolvidos, resguardadas as respectivas

competências legais. 32 Disciplina a organização e o funcionamento da administração pública federal, para desenvolvimento do

programa de cooperação federativa denominado Força Nacional de Segurança Pública, e dá outras providências 33 Decreto 5289 de 29 de novembro de 2004, art. 9º A União poderá fornecer recursos humanos e materiais

complementares ou suplementares quando forem inexistentes, indisponíveis, inadequados ou insuficientes os

recursos dos órgãos estaduais, para o desempenho das atividades da Força Nacional de Segurança Pública [...] §

2º Em caso de emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, na forma da legislação específica,

o Presidente da República poderá determinar ao Ministério da Justiça que coloque à disposição do Ministério da

Defesa os recursos materiais da Força Nacional de Segurança Pública.

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do patrimônio34;as Operações de Garantia da Votação e Apuração Eleitoral (GVA)35; de Apoio

à Cooperação Federativa36; de Proteção Ambiental37; e de Cooperação e Coordenação com

Agências, ainda conhecidas no âmbito interno como Operação de Pacificação38, excluindo-se

as ações subsidiárias e as operações de paz.

1.4 Breves comentários às Operações de Cooperação e Coordenação com Agências

(Operações de Pacificação)

Quanto a este tipo de operação cabe aqui tecer algumas reflexões haja vista que esta

espécie de emprego das Forças Armadas tornou-se bastante recorrente, em face da crescente

atuação do crime organizado impedindo ou dificultando a atuação do estado em alguns pontos

das regiões metropolitanas.

As operações de cooperação e coordenação com agências são aquelas que normalmente

ocorrem nas situações de não guerra, nas quais o emprego do poder militar é usado no âmbito

interno e externo, não envolvendo o combate propriamente dito, exceto em circunstâncias

especiais.39

O termo pacificação40 desde as ações legalistas e reconciliadores conduzidas no período

Monárquico e início da República, onde as forças militares atuaram na contenção das revoltas

e movimentos separatistas internos, são entendidas como ações cujo objetivo é estabelecer ou

reestabelecer a ordem pública e a paz social criando condições seguras para a atuação do Estado

em locais onde não é possível ou esta parcialmente comprometida por iminente estabilidade

institucional.

34 Lei Complementar nº 97/99 35 Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965. 36 Decreto nº 5.289 de 29 de novembro de 2004. 37 Decreto nº 7.957, de 12 de março de 2013. Exceto os que envolvem crimes ambientais transfronteiriços. 38 Quando realizadas com base na Lei Complementar nº 97/99. 39 Manual de operações do Exército Brasileiro. EB70-MC-10.223. p 3-15. 40 Portaria nº 005 - EME, de 5 de janeiro de 2015. Aprova o Manual de Campanha (EB20-MC-10.217)

Operações de Pacificação, p. 1-3. 1a Edição, 2015.

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Viceja grande discussão sobre a natureza das Operações de Cooperação e Coordenação

com Agências, sendo entendida pela maioria como uma atuação na GLO, entendimento este

que acreditamos ser o mais adequado, haja vista o próprio conceito desse tipo de operação.

São características dessas operações, uso limitado da força; coordenação com outros

órgãos governamentais e/ou não governamentais, execução de tarefas atípicas, combinação de

esforços políticos, militares, econômicos, ambientais, humanitários, sociais, científicos e

tecnológicos, caráter episódico.

Destaque-se que não há subordinação entre as agências e, sim, cooperação e coordenação,

interdependência dos trabalhos, maior interação com a população, influência de atores não

oficiais e de indivíduos sobre as operações e ambiente complexo.

Destacamos que tal emprego pode ocorrer em situação de guerra, onde serão

desencadeadas de forma simultânea ou sucessiva com as demais operações básicas, ofensivas,

defensivas e de apoio a órgãos governamentais ou, em situação de não guerra, sendo esta forma

de emprego o objeto do presente estudo.

Por conseguinte, temos como exemplo de Operações de Pacificação as operações

desencadeadas nos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Espírito Santo, que

fundamentadas na Lei complementar nº 97/99 e no Decreto nº 3.897 de 24 de agosto de 2001,

atuaram na GLO e tinham como objetivo a preservação da ordem pública e a incolumidade das

pessoas e do patrimônio fruto da inoperância ou incapacidade operativa dos órgãos de segurança

pública.

Como elemento essencial do estudo das Operações de Pacificação na GLO pertinente é a

transcrição as duas Diretrizes Ministeriais nº 14 de 25 de novembro de 2010 e nº 15 de 04 de

dezembro de 2010 que determinaram a atuação das forças armadas na cidade do Rio de Janeiro

especificamente no complexo da penha e no complexo do alemão e a Portaria nº 239/GM/MD,

de 20 de janeiro de 2017, cujo anexo foi a Diretriz Ministerial nº 05/2017 que determinou a

atuação no município de Natal-RN.

Ao analisarmos os dispositivos que legitimam a atuação na cidade do Rio de Janeiro - RJ

e Natal - RN podemos identificar expressamente as características inerentes ao emprego das

Forças Armadas na GLO e a sua adequação ao que preconiza o Decreto nº 3897 de 25 de agosto

de 2001, bem como a lei complementar nº 97.

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Verifica-se, pois, a autorização presidencial após solicitação do Governador do Estado do

Rio de Janeiro e do Rio Grande do Norte para atuação das forças armadas especificamente na

GLO a fim de preservar a ordem pública, com efetivos, área e período previamente definidos,

bem como, a sua forma de atuação.

Tais elementos são, por força dos dispositivos legais supramencionados41, pré-requisitos

indispensáveis para a atuação das Forças armadas na GLO podendo assim, ser considerados

como elementos caracterizadores da destinação constitucional.

Cumpre salientar que o emprego na pacificação não se aplica somente aos casos de

declarado regime de exceção amparado pelos art. 13642 e art. 13743 da Constituição da

República Federativa do Brasil, mas, também em face de uma impossibilidade por parte dos

órgãos competentes que declaradamente se mostram indisponíveis inexistentes ou

insuficientes44.

Sobreleva notar que a atuação das Forças Armadas na GLO se dá por meio de ações das

mais diversas o que nos permitiu relacionar as principais ou mais comuns espécies de operações

desenvolvidas pelas forças armadas.

1.5 A inadequação legal do uso do termo “Operação de Garantia da Lei e da Ordem”

Tomando por base o manual de Garantia da Lei e da Ordem (MD 33-M-10)45, a Operação

de Garantia da Lei e da Ordem é uma operação militar determinada pelo Presidente da

República e conduzida pelas Forças Armadas de forma episódica, em área previamente

estabelecida e por tempo limitado, que tem por objetivo a preservação da ordem pública e da

incolumidade das pessoas e do patrimônio em situações de esgotamento dos instrumentos para

isso previstos no art. 144 da Constituição ou em outras em que se presuma ser possível a

perturbação da ordem.

41 Lei Complementar nº 97/99, art. 15, §§2º e 3º. 42 Estado de Defesa. 43 Estado de Sítio. 44 Lei Complementar nº 97/99, art. 15, §3º. 45 Portaria Normativa nº 186/MD, de 31 de janeiro de 2014, que dispõe sobre a publicação “Garantia da Lei e da

Ordem”.

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Inicialmente, cumpre salientar que o Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001 que fixa

diretrizes para o preparo e o emprego das forças armadas na garantia da lei e da ordem, não

denomina o emprego das Forças Armadas como operação, mas sim como uma ação, conforme

podemos comprovar por meio da leitura de seu artigo 1º.

Tais ações que, segundo o Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001, tem por objetivo à

manutenção ou o restabelecimento da ordem pública, o que poderá ser realizado por meio de

operações militares, estas entendidas o conjunto de ações realizadas com forças e meios

militares das Forças Armadas, coordenadas em tempo, espaço e finalidade, de acordo com o

estabelecido em uma Diretriz, Plano ou Ordem para o cumprimento de uma tarefa, missão ou

atribuição.46

Observamos que inexiste suporte legal para a terminologia “Operações de Garantia da

Lei e da Ordem”, haja vista que, como já tratado, a GLO é gênero previsto na Constituição

brasileira de onde decorrem ou devem decorrer todas as ações das Forças Armadas. A utilização

de tal terminologia torna-se tão inespecífica quanto seria o termo “operação de defesa da

pátria”, termo que, não por acaso, inexiste no meio militar.

Tal entendimento se fundamente no fato de que, por vezes, s Forças Armadas atuam de

forma semelhante tanto em um cenário de GLO, quanto em uma ação subsidiária na faixa de

fronteira contra crimes transfronteiriços ou em uma Operação de Paz, pois sob o aspecto

tático47, as tarefas são semelhantes, porém em contexto jurídico distinto.

Entendemos que por tais razões o uso de tal terminologia pode ocasionar uma apreensão

deturpada e confusa ao não permitir a identificação precisa da real natureza jurídica da ação

desencadeada pela força.

2 CONSIDERAÇÕES FINAIS

46 Portaria nº 004-EME, de 9 de janeiro de 2014. Aprova o Manual de Fundamentos EB20-MF-10.103

Operações, 4ª Edição, 2014. p. 2-1. 47 Do grego taktiké ou téchne; arte de manobrar tropas é qualquer elemento componente de uma estratégia, com a

finalidade de se atingir a meta desejada num empreendimento qualquer. Disponível em:

http://www.defesanet.com.br/doutrina/noticia/16894/As-Taticas-da-Raposa-de-Aco/

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O emprego das Forças Armadas na Garantia da Lei e da Ordem está inserida em um

cenário que não pode prescindir de uma noção mínima das circunstâncias legais que legitima a

presença das tropas no cotidiano das cidades onde são empregadas. Estes militares devem,

ainda, estar conscientes de que as suas ações devem primar pela total legalidade, evitando danos

a população e o desgaste da instituição.

Neste cenário sócio-político o artigo buscou esclarecer a destinação constitucional das

Forças Armadas conforme previsto no Art. 142, da Constituição brasileira, com ênfase na GLO,

identificando e excluindo as atribuições infraconstitucionais contidas na Lei Complementar nº

97, de 1999, sendo elas as ações subsidiárias e as operações de paz, do âmbito da GLO.

O estudo, a fim de solucionar a questão sobre qual as normas legais legitimam o emprego

das Forças Armadas na GLO, procurou determinar um conceito geral e preambular da GLO,

como sendo a preservação ou o restabelecimento do equilíbrio e da segurança da sociedade, de

modo a permitir que o Estado, por meio dos seus poderes constituídos, possa exercer as suas

destinações constitucionais objetivando o bem-estar geral, cuja natureza jurídica é de operação

militar.

Ainda, face a importância do tema, o artigo apresentou breves comentários a respeito das

Operações de Cooperação e Coordenação com Agências, a fim de integra-la às espécies de

ações na GLO, juntamente com as demais, a quais foram relacionadas da seguinte forma, as

operações de Garantia da Votação e Apuração Eleitoral, Operações de Apoio à Cooperação

Federativa, Operações de Proteção Ambiental.

Por fim, buscou-se, por meio de uma análise da legislação pertinente ao tema, sancionar

a inadequação legal do termo "Operação de Garantia da Lei e da Ordem" em virtude de

concernir de uma designação abrangente que não especifica ou evidencia a natureza jurídica da

ação que está sendo realizada.

As operações militares na era do conhecimento se caracterizam por seu amplo espectro48

muito além do combate entre oponentes armados com aplicação dos meios de combate de forma

simultânea ou sucessiva, de forma ofensiva ou defensiva, de pacificação, de GLO, de apoio as

48 A abrangente concepção de emprego da Força Terrestre. Disponível em:

http://www.defesanet.com.br/doutrina/noticia/13760/A-abrangente-concepcao-de-emprego-da-Forca-Terrestre/

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instituições governamentais e internacionais e de assistência humanitária, em um ambiente de

emprego conjunto interagências.

O conceito operativo do Exército é definido por uma forma de atuação que tem como

premissa maior a combinação, simultânea ou sucessiva, de operações ofensivas, defensivas e

de cooperação e coordenação com agências, em situação de guerra e de não guerra, aplicado a

qualquer situação no território nacional e/ou no exterior, cuja preponderância de uma operação

sobre outras se dará conforme circunstancialmente.

Tal emprego, se dá cada vez mais em ambiente humanizado, sustentado pela legalidade e

legitimidade, tem exigido que o militar, em todos os níveis, possua amplo conhecimento das

normas e da natureza jurídica na qual as suas ações estão inseridas, a fim de que as suas decisões

sejam embasadas nem convenções e normas, tornando-as legítimas e receptivas pela população.

Nessa composição as ações exigem um alto grau de coordenação entre os contingentes

militares e as diversas agências envolvidas. Torna-se necessária intervenção dos comandantes

no nível tático, em virtude de fortes influencias e implicações advindas das ações dos militares

envolvidos, em qualquer nível hierárquico. Ações que se traduzem em uma consciência da

repercussão desinente, uma vez que, nesse gênero de operação, intervenções no nível tático tem

consequências no nível estratégico e, até mesmo, no nível político, devendo a legitimidade ser

sempre visto como um princípio de guerra.

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