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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
O EMPODERAMENTO FEMININO: ANÁLISE DA PARTICIPAÇÃO DA
MULHER MANAUARA FRENTE A UMA AUTARQUIA ESTADUAL
LACERDA, Ana Cláudia dos Santos/a1
PEDRAÇA, Aline dos Santos/a2
ARAÚJO, Clóvis Sena de/a3
Resumo: O presente estudo busca analisar as mudanças ocorridas no cenário mercadológico da cidade de
Manaus focalizando a inserção da mão de obra feminina e suas condições de trabalho nesse contexto. O
objeto específico de análise é a forma de trabalho da servidora pública que exerce suas atividades numa
esfera tradicionalmente exclusiva aos homens. Evidencia-se que, apesar da apropriação desse espaço,
ainda são muitos os impasses para atuação feminina nessas áreas cujas demandas são desafiantes e
extremamente diferentes das exigidas na esfera do lar. O perfil dessas mulheres, as transformações sociais
conquistadas que possibilitaram o ingresso delas no espaço público, a leitura masculina sobre essa
realidade, a forma de seu ingresso nessa esfera e os conflitos que enfrentam cotidianamente, são dentre
outras, questões aqui refletidas. A pesquisa tem como base autores que facilitaram a compreensão da
realidade contemporânea a partir das transformações ocorridas nos últimos séculos, que envolvem
questões de gênero, o mercado de trabalho e outras especificidades do mundo moderno como Hannah
Arendt, Eric Hobsbawn, Iraildes Calda Torres, Heloísa Lara Costa e Karl Marx, dentre outros. Concluiu-
se que fatores econômicos, políticos, sociais, o processo de globalização contribuíram para a inserção da
mulher manauara no espaço do trabalho público, apesar das desvantagens que essa condição acarreta para
que seja estabelecida um sistema de igualdade, objeto amplamente tratado quando se pensa a questão de
gênero.
Palavras-chave: Trabalho. Capitalismo. Gênero. Servidora Pública.
Introdução
No mundo dinâmico em que vivemos, existe um desempenho crescente das
diversas profissões quer por homens, quer por mulheres e, o acesso destas a um leque de
profissões cada vez mais diversificado, que outrora eram habitualmente desempenhadas
por homens, percebe-se o despertar do interesse feminino por profissões onde sua
presença era, até pouco tempo, quase inconcebível.
Diante das situações ocorridas, acredita-se que motivado pelas evoluções sociais,
econômicas e culturais que levam a questionar os papéis tradicionais de cada gênero.
Neste contexto, a presente produção científica investiga a condição da mulher, no
mercado de trabalho dando ênfase à servidora pública na esfera estadual do serviço
1Bibliotecária Coordenadora– Universidade Nilton Lins; Aluna Especial do Programa de Pós –
Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia – PPGSCA – Universidade Federal do Amazonas -
UFAM. 2 Assistente Social; Mestranda em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia – Universidade Federal
do Amazona - UFAM 3 Sociólogo - Aluno Especial do Programa de Pós – Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia –
PPGSCA – Universidade Federal do Amazonas - UFAM.
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público de Manaus, que hoje ocupa lugares outrora habitualmente preenchidos por
homens, atuando muitas vezes, com melhor desenvoltura.
Nesse sentido, existe por parte da sociedade, o reconhecimento da capacidade
feminina em atividades antes atribuídas apenas aos homens, e hoje com as várias
mudanças socioeconômicas, a mulher tem conquistado um espaço cada vez maior na
sociedade e têm alcançado os mais diversos cargos e funções no mercado de Manaus,
outrora ocupados pelos homens, nas mais variadas esferas do setor público. Diante deste
fato, esta produção científica possibilita a compreensão de como se processa as
transformações do perfil da servidora pública que se tornou massa pungente na
governabilidade de nossa cidade, independente da esfera pública em que a mesma se
encontre, transformando a relação de trabalho no meio que ela está inserida.
A hipótese inicial é a de que apesar da mulher estar conquistando um amplo
espaço no setor público, mostrando competência, e respondendo e correspondendo às
exigências requeridas pela esfera pública, ainda assim há muito que ser feito, uma vez
que as mulheres ainda são a minoria, sobretudo nos primeiros escalões ou em cargos
eletivos, mesmo imbuídas das mesmas condições e capacidades que os homens.
O crescimento da participação da mulher nos mais variados espaços da
sociedade local, nacional e internacional é inegável, na iniciativa pública não é
diferente, o Brasil foi governado por uma mulher no Planalto Central e também o
mesmo ocorre em alguns Estados, além disso, a participação feminina vem se alastrando
em todas as áreas públicas, hoje temos as mulheres a frente de Ministérios, Secretarias,
Fundações e Autarquias federais, estaduais e municipais. A mulher tem conseguido
romper à barreira do preconceito e adquirido a confiança do empregador de um modo
geral, seja ele público ou privado.
As mulheres nestes últimos anos protagonizaram inúmeras batalhas por um
mundo de igualdade contra toda opressão e direitos iguais. “Aos poucos a mulher
conquista seu espaço no mercado de trabalho, contudo sempre reivindicando tratamento
igualitário ao do homem no acesso ao emprego e nas condições de trabalho.”
(NASCIMENTO, p.45).
Nesse contexto, faz-se necessário um estudo sobre como, porque e por quais
fatores a mulher adentrou no mundo do trabalho, saindo da esfera doméstica para um
patamar mais elevado, conquistando maiores espaços, chegando a ocupar postos de
comando nas grandes corporações, tendo inclusive muitos homens como seus
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comandados, tanto na iniciativa privada quanto na pública. Faz-se necessário, no
entanto, conhecermos não só o contexto histórico, mas também alguns conceitos
essenciais para entendermos as mudanças ocorridas no mundo do trabalho e o
reconhecimento da capacidade feminina em postos que antes eram atribuídos apenas aos
homens. Diante disso, a produção científica se constitui de três partes principais. A
primeira dedicada aos conceitos e explanação sobre o trabalho, capital e educação,
desde Henry Ford até a valorização do setor de serviços com o advento da acumulação
flexível; A segunda parte enfoca a questão de sexo e gênero nas relações do trabalho; e
por último, a mulher como força motriz no mercado de trabalho, tanto na esfera privada
quanto na pública, onde foi traçado um perfil dessa mulher que conquistou seu espaço
dentro das organizações e que continua participando ativamente das transformações
desse mundo corporativo.
A metodologia adotada para esta produção científica foi a pesquisa bibliográfica,
que consistiu no exame da literatura científica, para levantamento e análise do que já se
produziu sobre o tema. Para Ruiz (1996) “é uma atividade de localização e consulta de
fontes diversas de informações escritas, para coletar dados gerais ou específicos a
respeito de determinado tema”. (p. 150). Essa pesquisa auxilia na escolha de um método
mais apropriado, assim como num conhecimento das variáveis e na autenticidade da
pesquisa.
A pesquisa deu-se em uma Autarquia estadual da cidade de Manaus – AM. Os
sujeitos investigados foram mulheres que trabalham nesse Órgão Público e que exercem
as mais diversas funções, da mais simples até níveis de gestão. O critério de seleção das
mulheres pesquisadas ocorreu de forma aleatória, pois se respeitou e obedeceu-se a livre
escolha de cada participante na pesquisa. Nestas condições, também foram feitas
entrevistas e questionários com questões semi - estruturadas e não - diretivas. Utilizou-
se uma linguagem simples e direta para que a pesquisada respondente compreendesse
com clareza o que estava sendo perguntado. Foi feito uma abordagem exploratória, visto
que tais mudanças exigiram alterações na base da sociedade, nas relações de produção e
gestão.
Capital, trabalho e educação
Karl Marx (1974) relata: “trabalho é condição natural da existência humana”.
Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a
natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação impulsiona,
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regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a
natureza como uma de suas forças. Põem em movimento as forças naturais de
seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se dos recursos
da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. [...] Uma aranha
executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um
arquiteto ao construir sua colmeia. Mas o que distingue o pior arquiteto da
melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-
la em realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já
existia antes idealmente na imaginação do trabalhador. (MARX; ENGELS,
1987, p. 148)
Com o advento da Revolução Industrial em 1750 e fortalecido após a 2ª guerra
mundial, o capitalismo dita as regras do jogo econômico, político e social. A
implantação, por Henry Ford, do ‘dia de oito horas e cinco dólares’4, deu início ao
chamado fordismo, que consistia em um modelo de produção, que começava na fábrica
e que se expandia para fora de seus muros sob um caráter ideológico, político e cultural.
Ford acreditava que o novo tipo de sociedade poderia ser construído
simplesmente com a aplicação adequada ao poder corporativo. O propósito
do dia de oito horas e cinco dólares era obrigar o trabalhador a adquirir a
disciplina necessária à operação do sistema de linha de montagem de alta
produtividade. (HARVEY, 1992, p. 122)
Até os dias de hoje o capitalismo continua dando as cartas do poder no mundo
moderno. As transformações na economia política do capitalismo vão desde os
processos do trabalho a hábitos de consumo.
O capital deflagrou, então, várias transformações no próprio processo
produtivo, por meio da constituição das formas de acumulação flexível, do
downsizing, das formas de gestão organizacional, do avanço tecnológico, dos
modelos alternativos ao binômio taylorismo/fordismo, onde se destaca
especialmente o “toyotismo” ou modelo japonês. (ANTUNES, p.47).
As relações sociais do trabalhador nas condições de produção capitalista
envolvem o controle social das capacidades físicas e mentais. A educação, o
treinamento, sentimentos sociais (a ética do trabalho, a lealdade aos
companheiros, o orgulho local ou nacional) e propensões psicológicas (a
busca da identidade através do trabalho) desempenham um papel e estão
claramente presentes na formação de ideologias dominantes cultivadas pelos
meios de comunicação de massa, pelas instituições religiosas e educacionais,
pelos vários setores do aparelho do Estado, e afirmadas pela simples
articulação de sua experiência por parte dos que fazem o trabalho (HARVEY,
1992).
O movimento estabelecido por Henry Ford alcançou a sua forma mais
contundente entre os anos de 1945 a 1972. Com o advento da Organização das Nações
Unidas - ONU, Ford se aliou fortemente a Keynes5, no fortalecimento do capitalismo
através do fomento fabril com a criação das zonas francas nos países estrategicamente
4 Forma de recompensa para os trabalhadores da linha automática de montagem de carros; oito horas de
trabalho por cinco dólares. 5 Teoria econômica consolidada pelo economista inglês John Maynard Keynes que propunham a
intervenção estatal na vida econômica com o objetivo de conduzir a um regime de pleno emprego.
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colonizados provocando um surto de expansões internacionalistas de alcance mundial.
Mas, com a grave recessão de 1973, o modelo fordista-keynesiano desmoronou em
meio às crises política e econômica.
“Os sindicatos, por tratar dos seus próprios interesses, se viram cada vez mais
atacados a partir de fora, pelas minorias excluídas, pelas mulheres e pelos
desprivilegiados” (HARVEY, 1992).
Deve-se acrescentar a isso todos os insatisfeitos do Terceiro Mundo com um
processo de modernização que prometia desenvolvimento, emancipação das
necessidades e plena integração ao fordismo, mas que, na prática, promovia a
destruição de culturas locais, muita opressão e numerosas formas de domínio
capitalista em troca de ganhos bastante pífios em termos de padrão de vida e
de serviços públicos [...] Movimentos em prol da libertação nacional –
algumas vezes socialistas, mas com frequência burguês-nacionalistas –
mobilizaram muitos desses insatisfeitos sob formas que por vezes pareciam
bem ameaçadoras para o fordismo global. (HARVEY, 1992, p. 133)
A estrutura rígida estabelecida por Ford e pelos governos estadistas-militares
que se estabeleceram quase que em sua totalidade pelo mundo afora dificultavam a cada
dia os investimentos de capital fixo em longo prazo, impedindo a flexibilidade de
planejamento do mercado. Nesse contexto, o mundo capitalista entrou em crise e
precisava de uma estratégia para sair do caos e reestruturar a economia.
A questão de sexo e gênero nas relações do trabalho
[...] o Polo Norte e o Polo Sul, são igualmente polos, sua essência é idêntica, e o
mesmo acontece com o sexo feminino e o sexo masculino, que formam uma única e
mesma espécie, uma única essência - a essência humana (Marx, Engels)
No ambiente de trabalho, muitas vezes, vemos e/ou sentimos que homens e
mulheres não são tratados da mesma maneira, principalmente quando se define
hierarquia e posições de comando. Geralmente, as mulheres “preferem” ser mandadas
por homens, pelo hábitus6, ou preconceito. Segundo Torres (2005) adotar uma
perspectiva de gênero implica estabelecer um diálogo com sujeitos sociais, homens e
mulheres que possuem opiniões e posicionamentos diferenciados no cotidiano de suas
ações.
6 Segundo Miceli, a categoria habitus é um sistema de disposições do passado que sobrevive no atual,
atualizando-se nas práticas, e tende a perpertuar-se. Seria o produto de todo esse longo trabalho de
inculcação e de apropriação que, mesmo que muito mais intenso e determinante durante as primeiras
experiências do mundo social, prolonga-se por toda a existência dos agentes. A relativa homogeneidade
dos habitus subjetivos (de classe, de grupo) encontra-se assegurada na medida em que os indivíduos
internalizam as representações objetivas segundo as posições sociais de que efetivamente desfrutam.
(Fraxe).
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O gênero é construído na relação com a diferença e vai além das diferenças
biológicas, portanto, o gênero é plural e dinâmico e constitui as relações
sociais por jogos de poder. A desigualdade da mulher na perspectiva do
trabalho tem raízes nas relações sociais de dominação, reforçando
preconceitos e exploração (SWAIN, 2005).
Segundo Marx e Engels (1977) “A primeira divisão do trabalho é a que se fez
entre o homem e a mulher para a procriação dos filhos, [...] que o primeiro antagonismo
de classes que apareceu na História coincide com o desenvolvimento do antagonismo
entre o homem e a mulher na monogamia; e a primeira opressão de classes, com a
opressão do sexo feminino pelo masculino” (NOGUEIRA, p. 244)”.
Na visão de Gambini apud Torres (2005) “o poder masculino esconde um
grande medo: encontrar dentro de si algo que contradiga aquilo que está afirmando [...]
O homem diz que a mulher é inferior porque inconscientemente, sabe que ela é mais
forte”.
Na discussão sobre gênero e trabalho não se pode desqualificar o papel dos
movimentos feministas, principalmente após 1960, quando as mulheres conseguiram
direito ao voto - com exceção de alguns países islâmicos, onde até hoje as mulheres são
vistas como objeto apenas de reprodução – e iniciaram uma verdadeira revolução,
levantando questões sobre como a mulher pode combinar carreira com casamento e
família; liberação sexual; igualdade no tratamento e oportunidade no mundo do
trabalho. Mudaram os papéis femininos e alargou-se a margem de liberdade individual.
As mulheres estão entre os grupos sociais que construíram a sua cidadania
em meio ao derramamento de sangue e às perdas de vida, desde o marco da
Revolução Industrial. Elas transgrediram leis, subverteram papéis e
enfrentaram a dominação com um espírito aguerrido e heroico, comparado ao
das guerreiras amazonas que abraçavam a luta como um ofício especializado
(Torres, 2005).
Nesse cenário, as servidoras públicas amazonenses têm evoluído historicamente
e se organizado nos diversos setores, como educação, saúde, etc., para lutar por
interesses coletivos, conquistando espaços, ampliando seus ideais políticos e sociais,
abrindo um leque para outros setores e categorias, encorajando as mulheres da nossa
sociedade a avançar em todos os níveis, classes sociais e credos. Nesse sentido, as
mulheres desempenham um grande papel no processo de transformação no mundo
corporativo, saindo da limitada esfera doméstica para alcançar os mais variados postos
de trabalho, indo das mais simples funções às mais complexas, ocupando postos em
setores outrora dominados pelos homens.
A servidora pública no mercado de trabalho
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A conquista do espaço feminino no mundo do trabalho é histórica. A
Constituição Federal Brasileira profere que homens e mulheres possuem direitos e
obrigações iguais e que é proibida a diferenciação de salários, de exercício, de função e
de critério de admissão por motivo de sexo, cor, credo ou estado civil. E a luta da
mulher para que esses direitos sejam realmente postos em prática é longínqua.
[...] as mulheres sempre foram detentoras de um certo poder decorrente de
um saber próprio, transmitido por gerações. Foram curandeiras, parteiras,
rezadoras, cartomantes, quiromantes. Detinham o conhecimento de ervas a
partir de onde produziam remédios naturais. Seu poder se estendia a medida
que ampliavam sua clientela. Com isso passaram a constituir uma ameaça ao
poder médico e foram combatidas nas Universidades e também porque ao se
reunir passavam segredos e informações que perturbavam aos homens pelo
desconhecimento (COSTA, 2005, p. 101).
Conforme Nogueira (2004), o processo da flexibilização abriu as portas para o
maior número de mulheres no mercado de trabalho, porém de maneira mais precária e
desigualdade salarial. Ou seja, o capitalismo intensificou a desigualdade e a exploração
da mão de obra feminina.
O mesmo se deu proporcionalmente nas organizações públicas, onde a mulher
até bem pouco tempo, com raríssimas exceções de perfil e função, exercia papeis
meramente auxiliares ou menores expressões.
O capital utilizou-se da mulher no mundo do trabalho, o que acarretou
significados distintos: se por um lado, o ingresso do trabalho feminino no
espaço produtivo foi uma conquista da mulher, por outro lado, permitiu que o
capitalismo ampliasse a exploração através do universo do trabalho feminino
(NOGUEIRA, p. 248).
O capitalismo, ao mesmo tempo em que cria condições para a emancipação
feminina, acentua a sua exploração ao estabelecer uma relação aparentemente
“harmônica” entre precarização e mulher, criando formas diferenciadas de extração do
trabalho excedente (NOGUEIRA apud ANTUNES, 2004, p. 277).
Antes desse espaço, dado pela flexibilização, a mulher pertencia quase
exclusivamente à esfera doméstica, sendo responsável pelo cuidado com os homens e as
crianças da casa. Conforme afirma Nogueira (2004), acreditava-se que a mulher não
tinha capacidade de pensar e refletir sobre as ações políticas, econômicas, culturais e
sociais.
Tal pensamento perdurou por séculos, sendo quebrado através das constantes
lutas, reivindicações e mudanças nos diversos cenários da sociedade.
Nos primórdios da divisão social do trabalho, tanto a mulher livre quanto a
mulher escrava tinham o seu espaço de trabalho pertencente à esfera
doméstica, pois eram responsáveis pala manutenção da subsistência e
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reprodução, passando por vários campos, como o da alimentação, higiene dos
homens e das crianças (NOGUEIRA, p. 244).
O processo de inserção da mulher é marcado por essa influência histórica e pela
relação de poder desigual entre os gêneros. Por desafio ou por necessidade, as mulheres
entraram no mundo do trabalho, enfrentando tarefas antes restritas aos homens.
A entrada em massa de mulheres casadas – ou seja, em grande parte mães –
no mercado de trabalho e a sensacional expansão da educação superior
formaram o pano de fundo, pelo menos nos países ocidentais típicos, para o
impressionante reflorescimento dos movimentos feministas a partir da década
de 1960. (HOBSBAWM, 1995, p, 305).
Uma das maiores mudanças no século XX foi à inserção de mulheres casadas na
classe operária e em outros setores da sociedade, como por exemplo, na educação
superior, “um farol de emancipação feminina” (HOBSBAWM, p. 305)
Os motivos pelos quais as mulheres casadas foram inseridas no mercado de
trabalho deveram-se mais pela pobreza, pela mão de obra barata, por serem mais dóceis
e pelo aumento de famílias chefiadas por mulheres, do que pela posição e direitos da
mulher (HOBSBAWM, p. 307).
Apesar da crise de desemprego na década de 80, “’a atividade feminina não
parou de crescer’. Esse período caracterizou-se pela feminização do contingente
assalariado, em particular no setor terciário (serviços)” (NOGUEIRA, 2004, p. 255).
A inserção feminina no mundo do trabalho ao longo de todos esses processos
vem acompanhada de discriminações, exclusões, baixos salários, e muita luta pela
igualdade social e trabalhista.
Nas organizações públicas brasileiras, sobretudo na local, tal fator foi favorecido
em virtude do regime trabalhista vigente até a Constituição de 1988, que era celetista
mesmo no âmbito público, sendo modificado a partir do governo do Presidente José
Sarney, que passou todos os celetistas para o regime estatutário.
No que diz respeito aos menores salários, a mulher encontra-se sempre
predominante, quando comparada aos homens. Ambos, homens e mulheres,
nos mesmos setores de atividades, concentram-se em faixas distintas de
salários, apontando uma acentuada desigualdade em relação aos valores
médios pagos para os trabalhos realizados conforme o sexo. (NOGUEIRA,
2004 p. 270).
Mas, há também muitas conquistas. Com o estabelecimento de concursos
públicos, com a ampliação de novas instituições de ensino, a busca constante e
crescente de um maior aperfeiçoamento por parte da mulher, cresce exponencialmente o
número de mulheres no mercado de trabalho, tanto na iniciativa pública quanto na
privada. As estatísticas apontam que há mais mulheres que homens no Brasil. Mostram
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também que elas vêm conseguindo emprego com mais facilidade que seus concorrentes
do sexo masculino. E que seus rendimentos crescem a um ritmo mais acelerado que o
dos homens.
A gestora pública
A feminização do mundo do trabalho é por certo positiva, uma vez que permite
avançar o difícil processo de emancipação feminina e, desse modo minimizar as formas
de dominação patriarcal no espaço doméstico (NOGUEIRA, 2004, p. 275).
O capitalismo, embora explorador em relação à mulher, [...] propiciou um ataque
à patriarquia, abrindo oportunidades públicas à mulher e também oportunidades de
organização mais efetiva, que nas formas históricas anteriores de organização do
trabalho (COSTA, 2005, p.79-80).
O gerenciamento de empresas sejam elas públicas e/ou privadas pelas mulheres
é uma conquista recente que vem acompanhada de rupturas de paradigmas, conflitos e
tensões nas relações de poder com o gênero masculino. Essa é uma tendência mundial e
em nosso país avança a passos largos, vermos as mulheres ocupando os principais
postos, atualmente não só nossa Presidente é uma mulher, mas também, existem
mulheres ocupando os principais cargos em nosso país que vão desde a mais alta corte
da magistratura, Ministérios, Secretarias diversas em todas as esferas, às Empresas
mundialmente conhecidas e estratégicas dentro da governabilidade brasileira como a
Petrobrás, sem falarmos do avanço das mesmas na iniciativa privada.
[...] a mulher para ser aceita e respeitada, absorveu algumas atitudes e
características masculinas, negando a sua identidade, reformulando seus
projetos pessoais e enfrentando atitudes de preconceito por parte de homens e
mulheres, tendo que provar cotidianamente que tem capacidade para
desempenhar o papel de comando (TORRES, 2005).
Nesse sentido, é essencial que a mulher para acessar o mercado de trabalho
competitivo, estabeleça relações com o conhecimento científico, especializando-se cada
vez mais.
O perfil das mulheres gestoras inclui algumas características como a
sensibilidade, afetividade, versatilidade, submissão, percepção aguçada, entre outras,
que até pouco tempo eram consideradas fraquezas, hoje, passaram a somar a outras,
como proatividade, pontualidade, foco e são consideradas essenciais no processo
produtivo de gerenciamento. Características que as mulheres, sempre cultivaram como
um dom, buscando sempre desenvolvê-las e amadurecê-las em cada situação.
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Assim, a mulher vem conquistando seu espaço no mundo do trabalho,
conciliando sua atividade profissional, com a atividade, familiar, maternal, matrimonial,
mas mudar o atual “status quo” dominante de séculos não é uma tarefa fácil e simples.
É preciso ressaltar que as condições de vida das mulheres no sistema capitalista, onde
prevalece o neoliberalismo, são caracterizadas pela ausência de políticas públicas
especialmente voltadas para as mulheres, onde se observa a falta de valorização da mão
de obra, e que para o capitalismo a mulher só aumenta o exército de reserva.
Considerações finais
Indubitavelmente, as mulheres representam um importante papel na economia
mundial, nacional, estadual e municipal. A globalização aumentou a competitividade
nacional e internacional e implicou na perda de postos de trabalho, corte de custos de
produção, aumento da flexibilidade, terceirização e formas temporárias de emprego.
Um dos efeitos da globalização é a introdução de novas tecnologias e de novas
formas de organização e de gestão para elevar a produtividade. Durante os últimos anos
vimos uma grande mudança nas funções tanto de empresas da iniciativa privada quanto
nas organizações públicas, paralelo a rápida evolução dos métodos de trabalho em todas
essas áreas e setores.
A globalização se instalou definitivamente entre nós. Em curto espaço de tempo
o conhecimento ficou obsoleto e a busca da informação se tornou incessante.
A economia sofreu transformações pelo impacto da flexibilidade do trabalho,
pela mão de obra rotacional e pelo consumo exagerado, até mesmo pelas coisas
consideradas fugazes (moda, estética, espetáculos, etc.) fomentando o setor de serviços
e consultorias. Essa nova estrutura do mercado de trabalho também deu acesso a
posições mais privilegiadas às mulheres, porém com uma remuneração extremamente
baixa e a força de trabalho mais explorada, ocasionando uma migração natural da
mulher para o setor público, impulsionada pela crescente oferta de concursos e pela
estabilidade.
A educação também foi renovada e serviu como uma alavanca de poder para a
mulher. O acesso ao conhecimento científico e técnico deslanchou com um aumento
crescente de universidades, institutos de pesquisas e escolas técnicas, que visam não só
o acesso ao conhecimento, mas também o lucro, fomentando assim um capitalismo mais
competitivo.
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Com o advento da globalização a mulher conquistou um espaço antes
inimaginável no mercado de trabalho, saindo do papel meramente coadjuvante passando
a assumir em muitas famílias, empresas, negócios e atividades afins o papel de
protagonista o que lhe permitiu avançar nas mais diferentes áreas trabalhistas, sociais,
familiares, etc.
Ocupou espaços antes legados somente a homens, até mesmo no campo militar e
político, bem como, em áreas que “supostamente” requereriam mais força física,
quebrando assim o paradigma de que ela, mulher, é o sexo frágil. Inseriu-se em postos
de chefia, inaugurou novas formas de gerenciamento, com mais feminilidade,
sensibilidade e relacionamento interpessoal.
Enfim, conquistou seu espaço e transformou a economia, a família, o mercado,
as mais diversas formas de relações. Não se trata de reivindicar a supremacia feminina,
mas de construir um novo relacionamento entre homens e mulheres, fundamentado nos
melhores valores de cada um.
Na verdade, o jeito feminino de administrar, de gerir, de gestar não é superior
e/ou substituto do modelo masculino, mas singular. A ascensão feminina não representa
uma ameaça ao homem, mas, um diferencial que com suas habilidades naturais pode
contribuir perfeitamente de maneira simbiótica para o sucesso não só de uma empresa
e/ou de uma organização pública, mas também de toda e qualquer área pessoal e
profissional.
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TORRES, Iraildes Caldas. As novas amazônidas. Manaus: Edua, 2005
WEBER, Maximillion. A Ética protestante e o espírito do capitalismo. Tradução de
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Thomson Learning. 2005.
WEBER, Maximillion. A Ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo:
Marin Claret, 2006.
Female empowerment: analysis of women's participation before a state autarchy
Astract: The present study seeks to analyze the changes that occurred in the market
scenario of the city of Manaus, focusing on the insertion of the female labor force and
its working conditions in this context. The specific object of analysis is the form of
work of the public servant who carries out her activities in a sphere traditionally
exclusive to men. It is evident that, despite the appropriation of this space, there are still
many impasses for female performance in these areas whose demands are challenging
and extremely different from those demanded in the home sphere. The profile of these
women, the conquered social transformations that allowed them to enter the public
space, the masculine reading about this reality, the form of their entry in this sphere and
the conflicts they face daily, are among others, issues reflected here. The research is
based on authors who have facilitated the understanding of contemporary reality
through the transformations that have occurred in recent centuries, involving questions
of gender, the labor market and other specificities of the modern world such as Hannah
Arendt, Eric Hobsbawn, Iraildes Calda Torres, Heloísa Lara Costa and Karl Marx,
among others. It was concluded that economic, political, social factors and the
globalization process contributed to the insertion of the Manauara woman in the public
Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
work space, despite the disadvantages that this condition entails in order to establish a
system of equality, an object widely dealt with when one thinks The gender issue.
Keywords: Labor. Capitalism. Gender. Public Servant.