o distrito como unidade de organizaÇÃo do …w3.ufsm.br/engrup/iiengrup/pdf/t33.pdf · da...

14
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA 1 O DISTRITO COMO UNIDADE DE ORGANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO RURAL E URBANO: o exemplo de Tapuirama (Uberlândia – MG) Silma Rabelo Montes¹ Beatriz Ribeiro Soares² Resumo Neste texto, discutimos a importância do distrito na organização territorial e econômica de um município, que apesar de subordinado política e economicamente ao município contribue para a organização do território rural e urbano do município. Nesse contexto, analisamos a organização do território e a interação rural-urbano nos distritos do município de Uberlândia: Miraporanga, Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos e, especialmente, no distrito de Tapuirama. No distrito de Tapuirama discutimos as mudanças no uso do solo e na organização socioeconômica a partir do processo de modernização agrícola do município de Uberlândia e da refuncionalização da rede urbana regional, tornando a cidade de Uberlândia um centro de referência em toda a região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Mostramos a influência deste processo na organização do espaço no distrito de Tapuirama. Palavras – chave: território – rural-urbano – distrito – Uberlândia – Tapuirama Introdução O objetivo geral definido para esse artigo é analisar o papel dos distritos no processo de organização do território rural e urbano de um município. Analisamos inicialmente, a importância do distrito no estado do Minas Gerais e na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e finalmente, no município de Uberlândia, após discutirmos as definições de município, cidade, distrito e vila. A discussão sobre os distritos do município de Uberlândia: Miraporanga, Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos e principalmente, do distrito de Tapuirama é parte de nossa dissertação de mestrado, que está sendo concluída.³

Upload: dodiep

Post on 10-Dec-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

1

O DISTRITO COMO UNIDADE DE ORGANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO RURAL E URBANO: o exemplo de Tapuirama (Uberlândia – MG)

Silma Rabelo Montes¹ Beatriz Ribeiro Soares²

Resumo Neste texto, discutimos a importância do distrito na organização territorial e econômica de um

município, que apesar de subordinado política e economicamente ao município contribue para

a organização do território rural e urbano do município. Nesse contexto, analisamos a

organização do território e a interação rural-urbano nos distritos do município de Uberlândia:

Miraporanga, Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos e, especialmente, no distrito de Tapuirama.

No distrito de Tapuirama discutimos as mudanças no uso do solo e na organização

socioeconômica a partir do processo de modernização agrícola do município de Uberlândia e

da refuncionalização da rede urbana regional, tornando a cidade de Uberlândia um centro de

referência em toda a região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Mostramos a influência

deste processo na organização do espaço no distrito de Tapuirama.

Palavras – chave: território – rural-urbano – distrito – Uberlândia – Tapuirama Introdução

O objetivo geral definido para esse artigo é analisar o papel dos distritos no processo de

organização do território rural e urbano de um município.

Analisamos inicialmente, a importância do distrito no estado do Minas Gerais e na

mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e finalmente, no município de Uberlândia,

após discutirmos as definições de município, cidade, distrito e vila.

A discussão sobre os distritos do município de Uberlândia: Miraporanga, Martinésia,

Cruzeiro dos Peixotos e principalmente, do distrito de Tapuirama é parte de nossa dissertação

de mestrado, que está sendo concluída.³

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

2

Mostramos que o processo de estruturação socioeconômica e política de cada um dos

distritos do município de Uberlândia está estritamente ligado à realidade do próprio

município, pois os mesmos mantêm interações com o seu entorno rural e com o distrito sede.

As mudanças ocorridas na estrutura populacional e no modo de vida dos seus habitantes estão

diretamente relacionadas ao processo de modernização agrícola ocorrido no município e da

consolidação da cidade de Uberlândia como centro urbano de referência regional.

1 – Os distritos do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: uma análise histórica e territorial

De acordo com dados coletados por Pinto (2003) existiam no Brasil, em 2000, 9.688

distritos, sendo 5.507 cidades, ou seja, distritos sedes e 4.181 vilas (sedes distritais).

Considerando-se a divisão administrativa por regiões, o Sudeste contribuía com 3.017

distritos, sendo 1.666 cidades e 1.351 vilas. Minas Gerais era e é o estado brasileiro que

possui o maior número de municípios e conseqüentemente, o maior número de distritos, com

um total de 1.568 distritos, sendo 853 cidades e 715 vilas ou sedes distritais.

O estado de Minas Gerais encontra-se dividido em 12 mesorregiões: Campo das

Vertentes, Central Mineira, Jequitinhonha, Metropolitana de Belo Horizonte, Noroeste de

Minas, Norte de Minas, Oeste de Minas, Sul/Sudoeste de Minas, Triângulo Mineiro/Alto

Paranaíba, Vale do Mucuri, Vale do Rio Doce e Zona da Mata. (Figura 1 e Tabela 1 a seguir).

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

3

Figura 1 – Minas Gerais: mesorregiões geográficas

Tabela 1 – Minas Gerais: número de microrregiões, distritos e vilas por mesorregião – 2005

Mesorregião Microrregião Municípios Distritos Vilas Campo das Vertentes Central Mineira Jequitinhonha Metropolitana de Belo Horizonte Noroeste de Minas Norte de Minas Oeste de Minas Sul/Sudoeste de Minas Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba Vale do Mucuri Vale do Rio Doce Zona da Mata Total

3 3 5 8 2 7 5 10 7 2 7 7 66

36 30 51 105 19 89 44 146 66 23 102 142 853

70 53 99 223 40 175 66 203 120 42 222 267

1.580

34 23 48 118 21 86 22 57 54 19 120 125 727

Fonte: IBGE (2005) Organização: MONTES, S. R. (2006).

Como percebemos na tabela 1 destas mesorregiões, as que apresentam o maior número

de distritos são respectivamente, Zona da Mata, Metropolitana de Belo Horizonte, Vale do

Rio Doce e Sul/Sudoeste de Minas, pois a partes central, sul, leste e a zona da mata fazem

parte da região denominada por Bacelar (2003) e Pinto (2003) de região das “Minas” e

engloba vários municípios de pequena extensão territorial. Já as porções norte, noroeste e

oeste do estado de Minas Gerais abrangem um menor número de municípios e distritos

porém, os mesmos possuem extensões territoriais maiores. Os autores acima citados

denominam essas áreas de região dos “Gerais”. (Figura 2).

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

4

Pinto (2003, p. 68) explica as causas das diferentes formas de ocupação das “Minas” e

das “Gerais”. A ocupação espacial das “Minas” esteve estritamente ligada à exploração do ouro e dos diamantes, que ditavam a formação dos núcleos urbanos. As pessoas aglomeravam-se e estabeleciam-se nas margens dos rios, de onde retiravam o ouro e os diamantes e, ainda, em locais propícios à ocupação e ao abastecimento das regiões das lavras. Desta forma, foi criado um intricado sistema de vilas e arraiais, próximos uns dos outros. Os caminhos e as estradas que foram surgindo a partir do século XVIII interligavam esses núcleos urbanos. Deste modo, percebe-se hoje, que a malha municipal das regiões sul, central e da zona da mata é mais intensa, sendo constituída por municípios de área territorial pequena e sendo muito próximos uns dos outros. Os “Gerais” foram desbravados pelas bandeiras e entradas paulistas, que rumavam em direção a Goiás e Mato Grosso. Essa região foi dividida em enormes sesmarias que, por sua vez, deram origem aos latifúndios, isto é, fazendas que ocupavam territórios imensos, o que acabou dificultando a formação de vilas e arraiais próximos uns dos outros. Assim, explica-se o por quê da malha municipal das regiões oeste, noroeste e norte ser menos intensa e constituída por municípios de área territorial maior.

O Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, com um total de 120 distritos, sendo 66 cidades e

54 vilas (Tabela 2), faz parte da região denominada de “Gerais” e formou-se a partir da

doação de sesmarias, originando-se grandes propriedades rurais, resultando-se em municípios

e conseqüentemente, em distritos de grande extensão territorial. A maior parte dos municípios

do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba possuem apenas o distrito sede. São 39 municípios

apenas com o distrito sede. Somente sete municípios possuem três ou mais distritos cada, a

exceção do distrito sede. Uberlândia encontra-se neste grupo com quatro distritos, além do

distrito sede.

Tabela 2 – Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: número de municípios,

distritos e vilas por microrregião geográfica – 2005

Microrregião Nº de municípios Nº de distritos Nº de vilas Uberlândia 10 19 09

Uberaba 07 12 05 Ituiutaba 06 09 03

Figura 2 – As “Minas” e as “Gerais” Fonte: Bacelar (2003, p. 63).

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

5

Frutal 12 18 06 Araxá 10 15 05

Patos de Minas 10 25 15 Patrocínio 11 22 11

Total 66 120 54 Fonte: IBGE/SIDRA (2005) Organização: MONTES, S. R. (2006)

Consideramos necessário apresentar as definições de município, cidade, distrito e vila.

Pinto (2003, p. 29) considera município como a menor unidade territorial brasileira com governo próprio, é formado pelo distrito-sede, onde acha-se localizada a cidade, que á a sede municipal e que leva o mesmo nome do município e, que corresponde à zona urbana municipal e; também pelo território ao seu entorno, a zona rural municipal, que pode ser dividida em distritos, cuja maior povoação recebe, geralmente, o nome de vila.

O município é portanto, o conjunto formado pela zona rural e pela zona urbana. De

acordo com Wanderley (2001, p. 4) levando-se em consideração o IBGE, é considerado como

rural “a população e domicílios recenseados em toda a área fora dos limites urbanos, inclusive

os aglomerados rurais de extensão urbana, os povoados e os núcleos” e como urbano “as

pessoas e os domicílios recenseados nas áreas urbanizadas ou não, correspondentes às cidades

(sedes municipais), às vilas (sedes distritais) ou às áreas urbanas isoladas”.

Apesar de alguns autores criticarem essa definição, administrativamente e legalmente

no Brasil, a sede municipal é designada de cidade, independente do número de habitantes que

tenha. Para muitos autores, cidade pode também ser considerada como centro urbano e, nesse

caso existiriam no Brasil muito mais cidades que as que existem, já que muitos núcleos

urbanos se desenvolveram e superam a própria sede do município mas, por não conseguirem

sua emancipação política continuam sendo apenas distritos de algum município.

O distrito é, portanto, uma subdivisão do município, que tem como sede, a vila. Ele não

tem autonomia administrativa e só pode ser criado por meio de lei municipal, porém,

obedecendo os requisitos exigidos pela lei estadual. Pinto (2003) denomina o distrito de

“embrião do Município” pois é o distrito que dá origem ao município através da emancipação

político-administrativa, ou seja, o ato pelo qual o distrito deixa de estar subordinado ao

município de origem e passa a constituir um novo município.

A sede do distrito, ou seja, a vila é considerada como urbana, pois no Brasil, a

localidade onde existe extensão de serviços públicos é considerada como urbana e este é o

caso das vilas dos distritos.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

6

Mas além da cidade e da vila, tanto o distrito sede como os outros distritos do município

possuem um entorno rural e isto complementa a configuração territorial e aprofunda as

relações rural-urbano num município e numa região.

2 – O município de Uberlândia e seus distritos: formação territorial e político-econômica

O município de Uberlândia localiza-se na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto

Paranaíba e possui uma área de 4.115.09 Km², sendo 3.896 Km² de área rural e 219,09 Km²

de área urbana. Possui o distrito sede e mais quatro distritos: Miraporanga, Martinésia,

Cruzeiro dos Peixotos e Tapuirama. (Figura 3).

Legenda:

1 - Área Urbana2 - Distrito Sede3 - Distrito de Martinésia4 - Distrito de Cruzeiro dos Peixotos5 - Distrito de Miraporanga6 - Distrito de Tapuirama

2

34

5 6

1

Fonte:

Autor:

Prefeitura Municipal de Uberlândia

Hélio Carlos Miranda de Oliveira

N.M.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

7

Figura 3 – Município de Uberlândia: divisão dos distritos – 2006 Fonte: Oliveira; Silva; Paula (2006, p. 78).

Alguns distritos do município de Uberlândia, como Miraporanga e Tapuirama, por

exemplo, são tão antigos quanto o distrito sede. O arraial de Santa Maria (atual Miraporanga)

surgiu quase na mesma época do arraial de São Pedro do Uberabinha (Uberlândia) e a fazenda

da Rocinha, que seria o ponto de origem do distrito de Tapuirama teria sua fundação na

mesma época das primeiras sesmarias, distribuídas no município de Uberlândia, inclusive na

área do distrito sede.

No entanto, desde a sua emancipação política, ou seja, desde que deixou de ser distrito

de Uberaba e tornou-se município, a força política e econômica de São Pedro do Uberabinha

(Uberlândia) sobrepõe-se sobre as demais áreas principalmente, sobre a vila do distrito de

Santa Maria, que naquele período possuía uma importância econômica maior que São Pedro

do Uberabinha, que , entretanto teve um declínio econômico e populacional, em função do

aumento da força política e econômica da já então cidade sede do município.

Os acontecimentos ocorridos nos anos posteriores como: a construção de ferrovia, de

pontes e rodovias, a construção de Brasília, os processos de modernização agrícola e de

urbanização, incentivaram ainda mais o fortalecimento da cidade de Uberlândia frente à área

rural do município, inclusive dos distritos e também em toda a região do Triângulo

Mineiro/Alto Paranaíba.

Desta forma, precisamos estudar a relação campo-cidade para entendermos a

importância econômica da cidade de Uberlândia e o declínio dos quatro distritos

principalmente, das vilas destes distritos.

Tomando como referência o número de domicílios e de habitantes urbanos e rurais da

cidade sede, do sub-distrito (entorno rural do distrito sede) e dos demais distritos podemos ter

uma noção do desenvolvimento socioeconômico dos mesmos e ver a relevância da cidade

sede em relação ao espaço rural. Na tabela 3 podemos verificar que o número de domicílios

existentes nos distritos, principalmente na vila dos mesmos é muito pequeno. A vila do

distrito de Miraporanga, por exemplo, possui apenas 38 domicílios. Em relação aos habitantes

a realidade não é muito diferente, pois os distritos apresentam um pequeno número de

habitantes, principalmente, os distritos de Martinésia e Cruzeiro dos Peixotos. A exceção do

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

8

distrito de Tapuirama, esses habitantes concentram-se na área rural dos mesmos, destacando-

se Miraporanga, com 4.870 habitantes na área rural e apenas 115 na vila. Nesta tabela,

percebe-se a influência que a cidade de Uberlândia exerce sobre a área urbana e rural dos

distritos e como a proximidade física, o desenvolvimento socioeconômico e cultural da cidade

sede e também a modernização agrícola do município fez com que os habitantes rurais e até

das vilas (urbanos) se deslocassem para a cidade sede em busca de melhores oportunidades de

trabalho e estudo e melhores condições de vida.

Tabela 3 – Município de Uberlândia: dados populacionais e de domicílios, por distritos –

2000

Cidade / Sub-distrito e

distritos

Situação de

domicílio

Domicílios População

Urbano - 488.982 Distrito sede (cidade e

sub-distrito Rural - 3.074

Urbano 122 390 Cruzeiro dos Peixotos

Rural 256 786

Urbano 87 330 Martinésia

Rural 170 541

Urbano 38 115 Miraporanga

Rural 1.223 4.870

Urbano 435 1.596 Tapuirama

Rural 166 530 Fonte: IBGE (2000) – Dados obtidos no SEDUR (Secretaria Municipal de Planejamento e Desenvolvimento Urbano). Organização: MONTES, S. R. (2006).

A redução da população rural e o processo de declínio socioeconômico dos distritos são

explicados pela refuncionalização dos centros urbanos em decorrência das transformações no

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

9

campo, da industrialização planejada e das inovações tecnológicas impostas à economia

regional, o que levou à projeção de alguns centros urbanos, como é o caso de Uberlândia.

Como a cidade de Uberlândia consegue, através de seu poder hegemônico, exercer uma

forte influência em nível regional, em relação a seus distritos não seria diferente. É impossível

estudar a estrutura socioespacial e política dos distritos sem levar-se em conta o processo de

urbanização da cidade de Uberlândia e as mudanças que esta conseguiu provocar.

Assim, as múltiplas interações entre o rural e o urbano no município de Uberlândia foram marcadas pelo desenvolvimento capitalista, visto que a modernização agrícola favoreceu a concentração fundiária e a mecanização do campo contribuindo para a expulsão do pequeno agricultor e grande parte da mão-de-obra rural, que ampliou as desigualdades sociais no campo e conseqüentemente, levou ao crescimento urbano da cidade de Uberlândia devido ao seu poder político-econômico. (MONTES, SOARES, 2005, p. 8).

Mas devemos considerar que apesar de sofrer uma forte influência da cidade, os

distritos do município de Uberlândia são economicamente muito importantes para o

município. A área rural dos distritos, especialmente dos distritos de Miraporanga e

Tapuirama, onde desenvolveram-se mais intensamente as lavouras de soja e milho, contribui

para o desenvolvimento econômico do município. Além dessas culturas, desenvolve-se a

pecuária, principalmente leiteira, também nos distritos de Martinésia e Cruzeiro dos Peixotos.

Assim, reforça-se as relações de poder, não só políticas, mas especialmente, econômicas

do distrito sede em relação ao espaço rural, inclusive dos distritos. É por isso que em nível do

município de Uberlândia, no momento, é praticamente impossível que algum de seus distritos

emancipem-se do município, pois a força política e econômica que o mesmo mantêm sobre

esses distritos é muito grande e como a lei federal, através do emenda constitucional número

15, de 1996, agora prevê o plebiscito em todo o município e não mais apenas na área

interessada em emancipar-se, dificilmente haverá interesse do distrito sede de emancipar

algum de seus distritos.

3 – O distrito de Tapuirama: estudo de caso

O distrito de Tapuirama compreende uma área localizada a sudeste do município de

Uberlândia e inclui a parte rural e a vila (área urbana). O acesso à vila do mesmo é pela Br

452, uma rodovia pavimentada e bem conservada até o local.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

10

Os habitantes da vila do distrito são considerados estatisticamente, como urbanos, no

entanto, em nossa pesquisa detectamos que os mesmos sentem-se muito rurais do que

urbanos, uma vez que as suas relações de trabalho estão muito mais voltadas para o campo do

que para a cidade.

A área rural do distrito é beneficiada pelas condições naturais como o relevo plano; uma

rica rede hidrográfica, com a presença dos rios Araguari e Uberabinha, além de vários

córregos e ribeirões; o clima possui uma estação seca no inverno e uma estação chuvosa no

verão e o solo, que apesar de ácido, através da aplicação de corretivos, torna-se fértil. E com

isso a vegetação natural do cerrado está, aos poucos, sendo substituída por áreas de pastagens

e atualmente, principalmente pelas lavouras e milho e soja.

Com a modernização agrícola do município e conseqüentemente, do distrito de

Tapuirama, tivemos profundas mudanças no uso do solo na região do distrito.

Na década de 1970, apesar de já um pouco transformada, a área ainda mantinha grandes

extensões de cerrado, cerradinho, formações arbóreas, formações hidrófilas (vegetação de

várzea) e formações higrófilas (covoais). Porém, já existia a ação antrópica, com a presença

de áreas de pastagens e de reflorestamento. As áreas de lavouras ainda ocupavam pequenos

trechos.

Já no final da década de 1980, ocorreu uma diminuição da vegetação natural e um

crescimento das áreas de pastagens e de culturas temporárias. O reflorestamento ainda se

mantinha na mesma área da década anterior.

Nos últimos anos, ou seja, já no início do século XXI, percebemos mudanças nítidas no

uso do solo na região do distrito de Tapuirama. Ocorreu uma sensível diminuição das áreas de

pastagens e um grande aumento das áreas de lavouras temporárias principalmente, com o

cultivo de soja e milho. A área de reflorestamento foi substituída por lavouras.

Assim como no restante do município, também no distrito de Tapuirama, a

modernização agrícola permitiu a acumulação capitalista, favorecendo a concentração de

terras nas mãos de grandes proprietários e provocando o êxodo rural através da liberação de

mão-de-obra.

Em decorrência disso os pequenos proprietários, os trabalhadores rurais e os pequenos

arrendatários deixaram o campo e deslocaram-se para a cidade de Uberlândia ou para a vila

do distrito de Tapuirama e tornaram-se moradores urbanos e uma maioria continuou

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

11

exercendo atividades rurais e é por isso que a grande parte da população do distrito é

constituída de trabalhadores rurais.

O distrito passou a exercer uma atração para trabalhadores rurais de outras regiões do

estado de Minas Gerais e até de outros estados como a Bahia, que se deslocaram para a vila

do distrito e se empregam em atividades rurais principalmente, na extração e resina. Esses

trabalhadores moram na vila e são, portanto, moradores urbanos, no entanto deslocam-se

diariamente para o campo, onde são trabalhadores rurais.

A importância das atividades rurais na área do distrito pode ser visualizada na figura 4,

que mostra a plantação de soja nas imediações do distrito. No primeiro plano percebe-se a

plantação de soja e no segundo plano, as construções da vila do distrito, o que demonstra

visualmente a interação campo-cidade na área do distrito.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

12

Figura 4 – Tapuirama: o rural e o urbano – 2006 Autora: MONTES, S. R. (2006).

Através das entrevistas aplicadas aos moradores do distrito de Tapuirama, os mesmos

enfatizam a importância econômica do distrito para o município de Uberlândia, através das

atividades agropecuárias. Esses mesmos habitantes apontam entre as suas expectativas para o

futuro do mesmo, que este venha a emancipar-se do município. Para eles, o distrito possui

riquezas econômicas que viabilizaria o processo de emancipação, mesmo que a longo prazo.

Entre as riquezas que poderiam gerar renda, apontadas pelos moradores estão

principalmente, a produção agropecuária e a exploração das riquezas naturais e culturais do

mesmo que, se bem organizadas poderiam gerar renda suficiente para a manutenção do

mesmo, até mesmo como município independente. Mas pelas questões históricas, políticas-

jurídicas e econômicas discutidas anteriormente neste texto, sabemos que este é um processo,

no momento, difícil de realizar-se.

Considerações finais

Pelo número de distritos que temos no Brasil, no estado de Minas Gerais e na

mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba podemos concluir que os mesmos são

muito importantes para o município onde se localizam.

Pela legislação vigente no estado de Minas Gerais e até no país, é complicado o

processo de emancipação política de distritos, o que torna ainda mais difícil, quando esses

distritos localizam-se em municípios que possuem uma importância política-econômica e

conseguem exercer uma influência muito grande sobre esses distritos. E esse é o caso dos

distritos do município de Uberlândia.

A modernização agrícola do município e o processo de urbanização da cidade de

Uberlândia reforçaram as relações de poder político e econômico sobre os distritos de

Miraporanga, Cruzeiro dos Peixotos, Martinésia e Tapuirama. Todavia, é importante destacar

que apesar do poder político e econômico que a cidade de Uberlândia exerce sobre os

distritos, os mesmos, principalmente o de Tapuirama, possuem riquezas econômicas

(agropecuária), naturais e culturais que poderiam ser melhor aproveitadas e gerar renda para o

próprio distrito e a longo prazo, viabilizar o seu processo de emancipação política.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

13

Notas

¹ - Mestranda do curso de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia ² - Profª Drª do curso de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia ³ - Dissertação de Mestrado de Silma Rabelo Montes, sob a orientação da Profª Drª Beatriz Ribeiro Soares, intitulada “Entre o campo e a cidade: as territorialidades do distrito de Tapuirama (Uberlândia – MG) – 1975 a 2005”. Referências

ARAÚJO, F.A.V. de. et al. Relações campo-cidade: estudo da dinâmica sócio-espacial do distrito Cruzeiro dos Peixotos em Uberlândia (MG). In: Simpósio Nacional de Geografia Agrária, III / Simpósio Internacional de Geografia Agrária, II / Jornada Ariovaldo Umbelino de Oliveira, I.,2005, Presidente Prudente: UNESP, FCT, 2005. (mimeo). BACELAR, Winston K. de A. Os mitos do “Sertão” e do Triângulo Mineiro: as cidades de Estrela do Sul e Uberlândia nas teias da modernidade. 2003. 211f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2003. BRASIL, Constituição (1988). Disponível em: <http://www.senado.gov.br> Acesso em: jun. 2004. IBGE - Censo 2000. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br> Acesso em mai. 2005. IBGE/SIDRA – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://www.ibge/sidra.gov.br> Acesso em: mai. 2005. MONTES, S. R., SOARES, B. R. Interação campo e cidade: algumas considerações sobre a realidade socioespacial do município de Uberlândia (MG) e seus distritos. In: ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISAS, I., 2005, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: NEGEF/UERJ, 2005, 1 CD –ROM. OLIVEIRA, Hélio Carlos Miranda de; SILVA, Renata Rastrelo e; PAULA, Dilma Andrade de. Entre o rural e o urbano: modos de vida no distrito de Cruzeiro dos Peixotos no município de Uberlândia (MG). In: SOARES, Beatriz Ribeiro; OLIVEIRA, Hélio Carlos Miranda de; MARRA, Thiago Batista. (Org.). Ensaios Geográficos. Uberlândia: PET Geografia. p. 73-92.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG

LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA

II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA

14

PINTO, Georges José. Do sonho à realidade: Córrego Fundo – MG: Fragmentação territorial e criação de municípios de pequeno porte. 2003. 248 f. Dissertação ( Mestrado em Geografia) - Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2003. SOARES, Beatriz Ribeiro. Uberlândia: da cidade Jardim ao Portal do Cerrado – imagens e representações do Triângulo Mineiro. 1995. 347 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. WANDERLEY, Maria de Nazareth B. Urbanização e ruralidade. Relações entre a pequena cidade e o mundo rural e estudo preliminar sobre os pequenos municípios em Pernambuco. Recife, 2001. Disponível em <http://www.ipese.com.br/manabawa>. Acesso em: 07 jul. 2003.