o desemprego - um caso de sucesso

24
Pobreza e Exclusões Sociais Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso Universidade do Algarve Escola Superior de Educação e Comunicação Mestrado em Educação Social - 1º Ano Unidade Curricular de Pobreza e Exclusões Sociais 2013/2014 O OUTRO LADO DO DESEMPREGO Um caso de sucesso Docente: Vanessa Sousa Discentes: Cecília Pires, nº 40046; Rita Gonçalves, nº 41807 e Ricardo da Palma, nº 43043 Faro, novembro de 2013

Upload: civic-servent

Post on 26-Jun-2015

544 views

Category:

Education


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

Universidade do Algarve

Escola Superior de Educação e Comunicação

Mestrado em Educação Social - 1º Ano

Unidade Curricular de Pobreza e Exclusões Sociais

2013/2014

O OUTRO LADO DO DESEMPREGO

Um caso de sucesso

Docente:

Vanessa Sousa

Discentes:

Cecília Pires, nº 40046; Rita Gonçalves, nº 41807 e Ricardo da Palma, nº 43043

Faro, novembro de 2013

Page 2: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

“Há uma força motriz mais poderosa que o vapor, a

eletricidade e a energia atómica: a vontade.”.

Albert Einstein

Page 3: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

Índice

Introdução .............................................................................................................................. 3

1. O Objeto de estudo ........................................................................................................... 4

1.1. Exclusão Social e Desemprego .............................................................................. 4

1.2. A resiliência no desemprego .................................................................................. 5

1.3. Empreendedorismo VS Emprego .......................................................................... 5

2. O Estudo: que caminhos? ................................................................................................. 6

2.1. Fases estruturantes da investigação ....................................................................... 8

2.2. O desenho da investigação: primeiros passos ........................................................ 9

2.3. Análise de conteúdo ............................................................................................. 11

2. Análise e interpretação de resultados ............................................................................. 12

2.1. Teóricas VS Empíricas ........................................................................................ 13

2.2. Exclusão Social e Desemprego ............................................................................ 13

2.3. A resiliência no desemprego ................................................................................ 14

2.4. Empreendedorismo VS Emprego ........................................................................ 14

3. Conclusões ...................................................................................................................... 15

Bibliografia .......................................................................................................................... 17

ANEXOS ............................................................................................................................. 19

Grelha de análise de conteúdo da entrevista ................................................................. 20

Page 4: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

3

Introdução

Enquadrado na avaliação da unidade curricular (UC) Pobreza e Exclusões Sociais do

Mestrado em Educação Social, da ESEC-UAlg, a presente abordagem resulta da proposta da

docente da UC, Vanessa Sousa, a qual, dada a sua atualidade e importância, bem como a

constante presença no nosso País, motivou a que a escolha do tema incidisse no desemprego

enquanto fator de exclusão social. Emerge também de um caso concreto de desemprego e das

perceções cotidianas que tendem a manter-se bem vincadas na vida dos portugueses, bem

como dos fundamentos teóricos de alguns autores, mormente de Bruto da Costa (1998), que

define o desemprego como um propulsor de exclusão social.

Nesta senda, pretende-se efetuar uma abordagem à criação do próprio emprego como

fator de resiliência ao desemprego, e, do geral para o particular iremos tratar o conceito de

exclusão social, partindo dos seus princípios norteadores, e, inevitavelmente, chegar ao

desemprego, encarando-o como um fenómeno que afeta cada vez mais indivíduos e cada vez

mais de diferentes estratos sociais. Nesta abordagem ir-nos-emos focar com maior incidência

no domínio económico (parcos rendimentos ou inexistentes, impossibilidade de obtenção de

bens e serviços indispensáveis ao pleno funcionamento do indivíduo em sociedade), onde a

situação de desemprego assume um papel preponderante na fragilização da estrutura social do

indivíduo e das suas condições psicológicas, comportamentais e das relações familiares.

Apoiados nos dados mais recentes do Eurostat relativos à taxa de desemprego (média

EU: 11%; média Portugal: 16,3%)1, que levam a crer que as atuais orientações políticas de

promoção de crescimento económico, tanto nacionais como europeias, sugerem resultados

pouco positivos quanto à empregabilidade, propomo-nos, recorrendo a um exemplo de

sucesso de criação do próprio emprego (negócio), refletir sobre se uma aposta em paradigmas

de promoção de capacitação das pessoas para uma autoeducação empreendedora permite por

si só impulsionar alternativas de vida de forma autónoma e promover um volte face à atual

crise económica e social. Acreditamos que atitudes ativas, dinâmicas e por vezes arrojadas de

abordar o mercado de trabalho e com estímulos que levem as pessoas ao (re) aproveitamento

de recursos e oportunidades promoverão a desejada transformação social.

Enquanto Educadores Sociais, promotores da mudança social, pretendemos provocar a

sociedade com esta ilustração positiva de criação do próprio emprego como alternativa

resiliente ao desemprego. Reconhecemos que esta resiliência, ao ser encarada como uma

1 Dados do Eurostat referentes ao mês de setembro de 2013 – consulta em novembro de 2013

Page 5: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

4

estratégia a seguir, tende a servir de alavanca ao aumento da autoestima, capacitação e

valorização pessoal e coletiva.

1. O Objeto de estudo

1.1. Exclusão Social e Desemprego

Na linha de pensamento de Bruto da Costa (1998), as pessoas são consideradas

socialmente excluídas quando se combinam a falta de meios económicos, o isolamento social

o acesso limitado aos direitos sociais e civis, bem como o acesso insuficiente aos recursos

pessoais, familiares, económicos e culturais, e pode, portanto, ser definida como a fase

extrema do processo de desenvolvimento da marginalização (Castel, 19902, citado em Costa,

1998).

Quando falamos de exclusão social significa a exclusão n(d)a sociedade, aqui vista

como a rutura do conjunto de sistemas sociais básicos (sociabilidade, económico,

institucional, espacial e simbólico). Assim, a sua definição tende a ser mais complexa do que

a do conceito de pobreza, na medida em que não se depende apenas de determinantes

económicos mas em termos mais amplos de integração ou participação na sociedade em um

ou vários domínios desses sistemas sociais. É, pois, um processo dinâmico dentro de qualquer

sociedade e que representa uma acumulação contínua de fatores sociais e económicos ao

longo do tempo (problemas laborais, formas de educação e estilos de vida, saúde,

nacionalidade, alcoolismo, toxicodependência, violência…) (Costa, 1998).

A exclusão social e a pobreza são sem dúvida dos maiores desafios do nosso século, na

medida em que colidem com o exercício dos direitos fundamentais dos seres humanos.

Tomando como ponto de partida estes direitos fundamentais, abordaremos a partir da posição

de Bruto da Costa, a exclusão social do tipo económico, quando este a refere como “falta de

acesso a fontes de recursos, que incluem o mercado de trabalho, em função ao salário que se

aufere; o sistema da segurança social, pelas pensões, abonos, subsídios, etc.” (1998, p.15).

No que toca ao conceito de desemprego, e baseando a abordagem no pensamento

teórico de Maruani (2002), onde esta autora, recorrendo a conceitos históricos, refere que

foram as políticas sociais que contribuíram para a invenção do desemprego enquanto

construção social em constante movimento e transformação, levou a que refletíssemos sobre a

forma de olhar este conceito.

2 Castel, R., (1990). Extreme Cases of Marginalization, from Vulnerability to Desaffiliation, comunicação

apresentada no European Seminar on Social Exclusion, realizado em Alghero (Itália) em Abril de 1990.

Page 6: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

5

Entendemos, portanto, que estar/ser desempregado não significa estar apenas privado de

um trabalho remunerado, voluntária ou involuntariamente, mas também reconhecer como

legítimo a procura ativa de emprego. As próprias condições de inscrição e de direito ao

subsídio de desemprego, e que se estende numa enorme franja da nossa sociedade, não fazem

mais do que limitar as fronteiras desta mesma legitimidade. Estas condições sinalizam e

oficializam os limites do direito ao desemprego que só pode existir se houver direito ao

trabalho.

1.2. A resiliência no desemprego

Como referem Louçã e Caldas (2009, citados em Santos, 2011), ironizando sobre o

pensamento neoliberal que aponta como evidente que os despedimentos de hoje serão, talvez,

o emprego de amanhã, recorremos a este ponto de vista para, numa inversão ideológica, o

propor como fator impulsionador da abordagem ao tema da criação do próprio emprego

enquanto resiliência ao desemprego.

Numa perspetiva norteada pelos pensamentos de autonomia, capacitação, mudança e

empowerment, pretendemos, recorrendo ao pensamento de Paulo Freire, mostrar que o

desemprego por si só não poderá continuar a ser entendido pela sociedade como um veículo

propulsor de pobreza e de endividamento das famílias e, logo, de exclusão social. Boaventura

de Sousa Santos entende o desemprego como um dos principais “detonadores da insolvência

pessoal e familiar“ (2011, p.69). Neste sentido, entendemos, que esta atitude empreendedora,

de criação do próprio emprego e encarada como capacidade pessoal para resistir, lidar e reagir

de modo positivo em situações adversas, será a forma de apresentar indícios de viragem para

novas formas de encarar a vida e o mercado de trabalho e, logo, de abordar o desemprego

enquanto fator propulsor de exclusão social.

1.3. Empreendedorismo VS Emprego

Para abordar o tema do empreendedorismo, num sentido ativo, arrojado e diligente e

que se pretende apontar como um dos pontos marcantes deste trabalho, aprofundamos o

conhecimento através das várias pesquisas e leituras documentais e que nos levaram não só à

objetiva definição do conceito como à clareza das suas caraterísticas, munindo-nos de

pensamentos teóricos contemporâneos e que compreendem o empreendedorismo como

orientação para o desempenho e está relacionado com a exploração de oportunidades

rentáveis (Shane & Venkataraman, 2000).

Nesta linha de pensamento, Baptista, Teixeira e Portela (2008) acrescentam ao conceito

de empreendedorismo as componentes oportunidade e necessidade. Estas componentes

Page 7: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

6

apontam que o facto de o indivíduo criar o seu próprio emprego depende de estímulos de cariz

económico e que distinguem estes dois tipos de empreendedorismo. Estamos perante um

processo de empreendedorismo de oportunidade quando os indivíduos que têm maior capital

social conseguem alcançar uma determinada oportunidade de negócio que se prevê lucrativa e

acreditam alcançar com maior facilidade os seus objetivos pessoais e económicos. Já o

empreendedorismo por necessidade ocorre quando os indivíduos se deparam sem alternativas

favoráveis (falta de rendimentos por se encontrarem desempregados ou em empregos

inadequados) para subsistir e optam por criar estratégias para ultrapassar essas situações,

nomeadamente a criação do próprio emprego. É no tipo de empreendedorismo por

necessidade que baseamos o nosso trabalho

2. O Estudo: que caminhos?

Tal como defendem Albarello, Digneffe, Maroy, Ruquoy, Saint-Georges (1995), como

qualquer trabalho realizado em ciências sociais é necessário recorrer a métodos, técnicas, e

estratégias específicas consoante o assunto em questão. Abordar o tema da criação do próprio

emprego, numa perspetiva empreendedora e de resiliência ao desemprego, quer pela forma

como nos propomos abordá-lo, quer pelo fenómeno negativo do desemprego que teima em

vincar-se na nossa sociedade, mostrou-se um desafio deveras relevante. Assim, iniciou-se a

investigação deste trabalho, intitulado: «O Outro Lado do Desemprego: Um Caso de

Sucesso»; e partindo da questão geral de investigação: «Que atitudes de resiliência perante o

desemprego podem evitar a exclusão social?».

Tendo em conta que esta investigação implica o estudo de relações sociais e a

compreensão de problemas, a presente abordagem aponta para uma investigação de carácter

qualitativo, tal como define Guerra (2006), em que investigação implica uma reflexão do

estudo por parte do investigador, sendo este o principal instrumento de recolha de dados e

adota uma postura objetiva durante a recolha desses mesmos dados (observa, participa e

conversa …). Dentro da investigação qualitativa, o método do estudo de caso foi o que mais

se adequou à investigação que pretendíamos realizar. Este método aprofunda a investigação

de um indivíduo, de uma família, de um grupo ou de uma organização, que implica que a

unidade social não seja demasiado extensa, centra-se na recolha intensiva de informação

acerca de enumeras práticas e representações sociais e serve para aumentar o conhecimento

relativamente a um determinado indivíduo e gerar novas hipóteses (Gauthier, 2003).

A abordagem indutiva permitiu-nos fazer a correspondência entre a observação e a

realidade e parte da questão particular «Que atitudes de resiliência perante o desemprego

Page 8: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

7

podem evitar a exclusão social?» para chegar a conclusões generalizadas (Flick, 2005).

Pretende-se que esta abordagem seja objetiva e, assumindo um papel crítico e reflexivo face à

situação do desemprego em Portugal, recorrer aos princípios norteadores da Educação Social

de intervir positivamente na vida das pessoas, para que possamos apontar estratégias que as

conduzam ao bem-estar social.

Atendendo que o estudo trata de um caso específico, entendemos que a entrevista seria a

técnica de investigação qualitativa por excelência e que melhor se ajustava ao trabalho

(Guerra, 2006). A recolha de dados foi feita através da pesquisa documental (documentos de

caráter não científico) e bibliográfica (do tema em estudo e reconhecidas cientificamente), tal

como defende Oliveira (2007), a qual favorece a observação do processo de desenvolvimento,

ou não, do indivíduo, grupos, conceitos, saberes, comportamentos, crenças, valores, práticas,

etc. (Cellard, 2008). Outra das formas de recolha de dados foi através da entrevista

semiestruturada, tipologia que mais enquadrava ao nosso trabalho pela abertura e flexibilidade

das questões do guião e que levaram o participante a fazer uma leitura da fase concreta da sua

vida (Quivy e Campehoudt, 2008), que neste caso particular se baseou na criação do próprio

emprego como forma de resiliência à situação de desemprego em que se encontrava, e ainda

pela observação do investigador durante a entrevista.

Neste estudo, a amostragem, caraterística da investigação qualitativa, incidiu na

modalidade (por caso único) por acontecimento e a sua estratégia tratou-se de uma

amostragem estatística, uma vez que eram conhecidas as caraterísticas e dimensões do caso

em concreto a estudar, existindo sempre a noção do número de participantes a entrevistar

(um), sem que houvesse a preocupação da quantidade de entrevistas mas sim com a qualidade

daquela a realizar (Flick, 2005). Para além disso a qualidade da informação recolhida através

da pesquisa documental, entrevista e respetiva análise foi bastante fundamentada, apesar de, e

segundo Duarte (2002), os dados resultantes desta investigação qualitativa, geralmente

abundantes, serem muitas vezes difíceis de tratar. Neste sentido, foi usada a análise de

conteúdo teorizada por Bardin (2008) e Silva e Pinto (1986) no sentido de facilitar o

tratamento dos dados e suas triangulações bem como da melhor interpretação.

Page 9: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

8

2.1. Fases estruturantes da investigação

Com base na figura acima apresentada, e fundamentada pelo pensamento de Fortin

(2000), foi desta forma que delineámos as etapas desta investigação. A fase concetual, onde

foram delineadas as ideias que orientaram a investigação, tendo em conta a necessidade da

delimitação do domínio para que fosse viável a sua realização, foi também a fase em que se

procedeu a toda a revisão da bibliografia e documentação indispensável para se conhecer e

compreender os conteúdos e, assim, situar o objeto de estudo no contexto dos atuais

conhecimentos. Esta fase compreendeu ainda a escolha do tema: «O Outro Lado do

Desemprego: Um Caso de Sucesso» enquanto problema de investigação, onde a pertinência, o

valor teórico e prático e as dimensões metodológicas aplicadas, que, levaram à questão de

investigação: «As atitudes de resiliência perante o desemprego podem evitar a exclusão

social?» traçando-se um quadro de referência apropriado, que permitiu definir o paradigma de

investigação e que conduziu às questões de abordagem do problema.

Na fase metodológica elegeu-se um desenho de investigação que delineou o paradigma e

os métodos de recolha e de análise dos dados, projetou o plano de obtenção de respostas às

questões, definiu-se variáveis (Exclusão; Desemprego; Emprego; Práticas de resiliência;

Conscientização; Empowerment; Empreendedorismo) que operacionalizaram o estudo e

definiu-se a amostra (um caso de sucesso de uma pessoa desempregada que criou o próprio

emprego).

Por fim, na fase empírica, que consistiu na operacionalização/execução das fases

anteriores, recolheram-se, organizaram-se e trataram-se os dados em função do objeto de

Escolha do desemprego

enquanto propulsor de

exclusão social como

objeto de investigação;

Elaboração do quadro de

referência que conduzirá

às questões e orientará o

guião;

Seleção, revisão e análise

de literatura

fundamental.

Perceção da resiliência

no desemprego.

Elaboração do desenho

da investigação.

Seleção de um caso

(único) de sucesso de

criação do próprio

emprego - amostra.

Variáveis do estudo:

Exclusão; Desemprego;

Emprego; Atitude;

Conscientização;

Empowerment;

Empreendedorismo.

Investigação qualitativa

– estudo de caso.

Recolha de dados através

de pesquisa documental,

entrevista

semiestruturada,

gravação, transcrição e

observação resultante da

mesma.

Análise de conteúdo e

triangulação de dados.

Interpretação,

apresentação e

comunicação dos

resultados.

EMPÍRICA

METODOLÓGICA CONCETUAL

Page 10: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

9

estudo, sendo utilizadas todas as técnicas e subsequente triangulação de todos os dados,

procedendo-se às suas interpretações e à comunicação dos resultados ao participante.

Contudo, e como em qualquer abordagem qualitativa, raramente se segue uma linha

sequencial rígida e fixa. Algumas etapas aconteceram em simultâneo e de forma interativa

(por ex. a formulação do problema de investigação; identificação das questões para elaborar o

conceito e a descrição do fenómeno; escolha dos métodos de recolha de dados; a escolha do

contexto social e da amostra; a recolha e análise de dados; elaboração das hipóteses

interpretativas que dão significado à situação; reformulação interativa do problema e das

questões, e/ou modificações conforme dados novos que foram surgindo).

2.2. O desenho da investigação: primeiros passos

O quadro abaixo ilustra, em concreto, o desenho que balizou a investigação e que

permitiu uma maior aproximação ao tema. Neste sentido, e segundo Fortin (2000), este

desenho além de permitir ao leitor uma perceção mais clara quanto ao objeto de estudo,

permitiu-nos também aplicar as estratégias mais adequadas quer na consistência da

investigação quer na fundamentação teórica utilizada na abordagem ao tema e de todas as

variáveis identificadas.

Page 11: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

10

TEMA DE

INVESTIGAÇÃO

FORMULAÇÃO DA

QUESTÃO GERAL

DE

INVESTIGAÇÃO

FORMULAÇÃO DAS QUESTÕES

ESPECÍFICAS

(O QUÊ)

FORMULAÇÃO DOS CONCEITOS

SENSIBILIZADORES (A REVISÃO DE LEITURA:

PRINCIPAIS REFERÊNCIAS TEÓRICAS E

CONCEITOS CHAVE)

O OUTRO LADO

DO

DESEMPREGO:

UM CASO DE

SUCESSO

As atitudes de

resiliência perante o

desemprego podem

evitar a exclusão

social?

1- Caraterização social do

entrevistado

i. Idade;

ii. Naturalidade e nacionalidade;

iii. Área de residência;

iv. Habilitações literárias;

2- Experiência profissional

i. Profissão

ii. Que outras atividades profissionais

exerceu?

iii. Qual a atividade profissional que mais

se identifica? E porquê?

iv. Qual foi a sua última atividade

profissional? Quanto tempo durou?

3- Situação de desemprego

i. Porque ficou desempregado?

ii. Já tinha estado desempregado

anteriormente?

iii. Como se sentiu enquanto

desempregado (psicologicamente e

socialmente)?

iv. Enquanto esteve desmpregado sentiu-

se excluído do seu gupo de amigos ou

família? Porquê?

v. Quanto tempo esteve desempregado até

decidir iniciar o seu próprio negócio?

4- Atitude perante o

desemprego/criação do próprio

negócio

i. Que tentativas fez para regressar ao

mercado de trabalho?

ii. Como encarou a situação?

iii. O que o motivou para criar o seu

próprio emprego?

iv. Inspirou-se em alguém para avançar

com o seu próprio negócio?

v. Sentiu alguns

constrangimentos/dificuldades? Se sim,

quais? E como os ultrapassou?

vi. Já tinha trabalhado anteriormente na

área profissional em que iniciou o seu

negócio?

vii. Que tipo de conhecimentos tinha na

área? (optou por criar o seu próprio

emprego)

viii. Porque é que escolheu abrir um

negócio em vez de trabalhar por conta

de outrem?

ix. Era algo que queria fazer antes de ter

ficado desempregado, ou foi a uma

opção de recurso?

x. Que carateristicas pessoais considera

ter que o ajudaram na criação do

próprio emprego?

xi. Sentiu que corria alguns riscos ao criar

o próprio negócio? Quais?

xii. Como acha que seria a sua situação

económica e social hoje se não tivesse

optado por criar o seu próprio negócio?

1. Conceitos de construção do objeto de estudo

O desemprego como um propulsor de exclusão social -

Costa, B. (1998).

Os excluídos (…) devem ser educados para terem domínio

sobre a sua vida e poderem ter os meios para fazer uma

reflexão constante sobre a sua vida e decidir

conscientemente sobre ela - Freire, P. (1983).

O desemprego por si só não poderá continuar a ser

entendido pela sociedade como um veículo propulsor de

pobreza e exclusão social - Santos, B.S. (2011).

O empreendedorismo - Shane, S. & Venkataraman, S.

(2000)

Baptista, A; Teixeira, M; Portela, J. (2008). Motivações e

obstáculos ao empreendedorismo em Portugal e propostas

facilitadoras.

2. Conceitos Metodológicos

Métodos, técnicas, metodologias e estratégias específicas

esta abordagem - Albarello, L.; Digneffe, J.; Maroy, C.;

Ruquoy, D. & Saint-Georges, P. (1995).

Os dados recolhidos através da investigação qualitativa são

geralmente abundantes, mas muitas vezes difíceis de tratar

- Duarte, R. (2002).

Investigação qualitativa e análise de conteúdo, a fim de

conhecer os sentidos e razões que contribuem para a ação

dos indivíduos na sociedade - Guerra, I. (2006).

O estudo de caso serve para aumentar o conhecimento

relativamente a um determinado individuo e gerar novas

hipóteses - Gauthier, B. (2003).

Haguette, T. (1997). Metodologias qualitativas na

Sociologia. 5ª edição. Petrópolis: Vozes.

Lakatos, E. & Marconi, M. (2003). Fundamentos de

metodologia científica. 5ª edição. São Paulo: Atlas.

Ludke, M. & André, M. (1986). Pesquisa em educação:

abordagens qualitativas. São Paulo: E.P.U.

Identificação das fases e etapas de investigação – Fortin,

M. (2000).

Tipos, características e dimensões da amostragem - Flick,

U. (2005).

Histórias de Vida - Poirier,J., Chapier-Valadon, S. (1995).

Análise de conteúdo (definição) - Krippendorf, K. (1980).

Entrevista semiestruturada - Quivy, R. & Campenhoudt,

L.V. (2008)

Transcrição de dados linguísticos - Paiva, M. (2004).

Fases da análise de conteúdo - Bardin, L. (2008).

3. Conceitos de Educação Social

É ao responder aos desafios que as pessoas exigem de si

próprias reflexão, crítica, criatividade, eleição, decisão,

organização e ação que fazem dela um ser adaptado à

realidade e mais integrado - Freire, P. (1980).

A Educação Social emerge para dar resposta a uma

diversidade de problemas sociais - Samagaio, F. (2006).

Um dos grandes desafios do ES é preparar os indivíduos

para questões como as da solidariedade e da tolerância para

que possa combater problemáticas, tais como, por exemplo,

a exclusão social - Serapicos, A. (2003).

SELEÇÃO DOS

SUJEITOS DE

INVESTIGAÇÃO

(QUEM?)

ESCOLHA DOS

MÉTODOS E

TÉCNICAS

ADEQUADAS

(COMO?)

Um caso de

sucesso de criação

do próprio

emprego como

substituição da

situação de

desemprego –

resiliência.

Investigação

qualitativa;

Método estudo de

caso

Técnicas:

- Pesquisa documental;

- Entrevista

semiestruturada;

- Análise de conteúdo

Page 12: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

11

2.3. Análise de conteúdo

A análise de conteúdo, tal como definida por Krippendorf (1980), é “uma técnica de

investigação que permite fazer inferências, válidas e replicáveis, dos dados para o seu

contexto”. No mesmo raciocínio, Bardin (2008) diz que a análise de conteúdo não serve

apenas para se proceder à descrição dos dados apurados, atendendo que não se pretende

apenas reproduzir os conteúdos das mensagens através da técnica utilizada, mas sim

apresentar algumas significações dessas mesmas mensagens e que se traduzam em

conhecimento.

Deste modo, após realizarmos a entrevista, foi importante que a transcrição dos dados

recolhidos reproduzissem o discurso narrado de uma forma fiel, apontando que a

(…) fidelidade aos dados orais deve ser o objectivo de toda a transcrição.

Queremos registar o que foi dito por um falante da forma como foi dito.

Uma transcrição não é e não pode ser uma edição da fala do entrevistado.

(Paiva, 2004, p.136)

A análise de conteúdo da entrevista foi conduzida indo ao encontro das etapas

fundamentais desenhadas por Bardin (2008). Numa primeira fase, denominada por pré-

análise, foi realizada uma leitura exaustiva das informações recolhidas (leitura flutuante), as

quais nos orientaram para as questões norteadoras, que, por seu lado, nos sugeriram a

explicação do fenómeno observado (criação do próprio emprego). A escolha de índices que

apontaram para o objetivo geral da investigação (criação do próprio emprego como

determinante da inclusão social), de acordo com o seu quadro teórico, fundamentou toda a

abordagem.

Quanto à constituição do corpus, defendido por Bardin (2008), foi definida toda a

panóplia de fundamentos teóricos que entendemos realçar e selecionar para serem submetidos

à respetiva análise e que definiram a organização da informação e deram respostas de forma:

exaustiva, em que se esgotou a comunicação na sua totalidade e não se omitiu qualquer dado;

representativa, cuja amostra representou o universo; homogénea, em que os dados expuseram

o tema e em que a técnica e a recolha dos dados foram uniformes; pertinente, cujos

documentos adequaram-se quer ao conteúdo quer ao objetivo da entrevista; e exclusiva, cuja

classificação da categoria correspondeu apenas a um único elemento.

Com estes critérios, e seguindo a linha de Silva e Pinto (1986), procurou-se a existência

de padrões e regularidades existentes nos discursos de modo a preparar uma lista prévia de

categorias de codificação, sendo que uma “categoria é habitualmente composta por um termo

Page 13: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

12

chave que indica a significação central do conceito que se quer aprender, e de outros

indicadores que descrevem o campo semântico do conceito” (pp.110-111).

A segunda fase, definida por Bardin (2008) como a etapa da exploração do material,

compreendida pelo processo de transformação sistemática dos dados e agrupados em

unidades, permitiu uma descrição correta das caraterísticas importantes do conteúdo e

implicou a já referida categorização (que apesar de não ser uma etapa obrigatória de toda a

análise de conteúdo, a maioria dos procedimentos de análise de conteúdo organizam-se em

redor deste processo). Com o objetivo de alcançar o n central do texto em função das regras

estabelecidas, partimos da análise de unidades de registo, que surgem como o momento da

aplicação do que foi trabalhado na pré-análise, e que, segundo Carmo e Ferreira (1998),

(…) é o segmento mínimo de conteúdo que se considera necessário para poder

proceder à análise, colocando-o numa dada categoria e de unidade de contexto

que constitui o segmento mais longo de conteúdo que o investigador considera

quando caracteriza uma unidade de registo, sendo a unidade de registo o mais

curto. (pp.257)

E, por último, o tratamento dos resultados e a devida interpretação e, já na posse de um

corpus de informação trabalhado e organizado de acordo com os objetivos da investigação e

das questões levantadas, foi possível propor inferências e realizar interpretações de acordo

com o quadro teórico definido.

2. Análise e interpretação de resultados

Antes de realizar qualquer interpretação dos dados obtidos, pretendemos também

interpretar a influência da entrevista enquanto técnica de excelência, que além da mesma

permitir inferências sobre as dimensões identificadas, permitiu também melhorar a sua

aplicabilidade e operacionalização e aferir com maior relevo sobre os constrangimentos e

potencialidades. Neste campo metodológico, pretendemos salientar a flexibilidade estrutural

da entrevista como um dos aspetos que consideramos positivo, visto permitir qualquer

alteração ao referencial temático do decurso da entrevista. O facto de se ter verificado algum

constrangimento por parte do entrevistado pela utilização do equipamento de gravação áudio,

entendemos ser um aspeto menos positivo e que pode ter condicionado a entrevista. Foi

observável que a presença deste instrumento, e tal como defende Wenger (2002) não deixou o

participante muito à vontade. É também de sinalizar que, por vezes, a proximidade entre o

participante e o investigador pode ser um dos fatores menos positivos, onde o participante

pode entender que a informação que se pretende pode ser já do conhecimento do investigador

Page 14: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

13

e, logo, seja uma perda de tempo e/ou que o mesmo crie dúvidas quanto à utilização do dados,

contrariando desta forma, e resumindo-nos apenas a esta caso concreto, ao que defende

(Bourdieu, 1999). Desta forma, achamos que a opção da entrevista ser conduzida por um

investigador e participante desconhecido, desde que seja dado o seu consentimento e devida

elucidação do motivo do estudo, tende a recolher-se dados mais profundos, sem subterfúgios

e com maior objetividade.

Neste ponto do presente trabalho importa referir que a existência de um quadro teórico

de referência consistente, que permita abordar os aspectos e temas relevantes da investigação,

e a experiência empírica dos investigadores são fatores determinantes do produto final

(Bogdan & Biklen, 1994, p.206).

Entendemos ainda que a interpretação dos dados deva seguir uma estrutura e de acordo

com as dimensões/variáveis consideradas relevantes, que permita contribuir para a facilidade

da sua leitura.

2.1. Teóricas VS Empíricas

É na relação entre o quadro teórico e o trabalho de campo que pretendemos equacionar

os dados recolhidos. Neste sentido, e sendo certo que o panorama socioeconómico português

atual não é dos mais favoráveis, seria, supostamente, fácil abordar o tema do desemprego e da

exclusão social tal como os defende teoricamente Bruto de Costa (1998). Contudo, encarando

o objeto de estudo como um forte desafio e pretendendo ir mais além entendemos, pela leitura

dos dados obtidos, que o estar/ser desempregado não significa estar apenas privado de um

trabalho remunerado, voluntária ou involuntariamente, mas também reconhecer como

legítimo a procura ativa de emprego. As próprias condições de acesso e direito ao subsídio de

desemprego, e que se estende a uma enorme franja da nossa sociedade, não fazem mais do

que limitar as fronteiras desta mesma legitimidade. Estas condições sinalizam e oficializam os

limites do direito ao desemprego que só pode existir se houver direito ao trabalho (Maruani,

2002). É nesta linha que a exclusão social tende a ganhar forma ao considerar que as pessoas

são socialmente excluídas quando se combinam a falta de meios económicos, o isolamento

social o acesso limitado aos direitos sociais e civis, bem como o acesso insuficiente aos

recursos pessoais, familiares, económicos e culturais (Costa, 1998).

2.2. Exclusão Social e Desemprego

A partir dos dados obtidos e tendo por referência o quadro teórico definido

previamente para a pesquisa, constatou-se que o participante único da amostra conseguiu

travar o processo de exclusão social (de tipo económico) ao decidir criar o seu posto de

Page 15: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

14

trabalho. O entrevistado optou por criar o seu próprio emprego, como alternativa a não

conseguir encontrar trabalho, sendo que essa opção já tinha sido ponderada anteriormente

quando se encontrava a trabalhar por conta de outrem. A mera situação de se encontrar

desempregado acarretava um conjunto de sentimentos e representações que o próprio

participante rejeitava e é observável quando, questionado acerca do seu estado de espírito

aquando da situação de desemprego, o mesmo refere que foi uma situação constrangedora

porque em primeiro lugar estava desocupado e em segundo lugar a situação financeira era

bastante desfavorável e que o levava a algumas inquietações quanto ao fato de não saber

como pagar as suas contas mensais.

Ainda que de uma forma algo subtil, foi possível perceber que o participante sentiu

algum grau de exclusão social quando refere que se sentiu «desamparado porque não tinha

nada para fazer» e algum isolamento social dada a distância física entre a família e entre os

amigos, uma vez que não é natural do Algarve e cujas distâncias não permitiram um apoio

mais próximo.

2.3. A resiliência no desemprego

O facto de o participante ter insistentemente procurado emprego e, paralelamente, ter

procurado aconselhamento junto de terceiros próximos, quanto à possibilidade de se lançar

por conta própria, confirma a existência de uma atitude de resiliência do participante. Esta

atitude comprova-se quando o mesmo indica que enquanto esteve desempregado procurou

ativamente emprego através do envio de currículos para diversas entidades. Como, não

conseguia voltar ao mundo do trabalho, optou por se aconselhar com familiares que o

ajudaram financeiramente e a planear como iria criar o próprio negócio. Consideramos que o

entrevistado, apesar de ter tido o apoio de familiares, mesmo sem esse apoio, embora o

processo de sair da situação de desemprego fosse mais moroso, possivelmente, arriscava na

mesma criar o seu próprio negócio e no limite ponderava procurar emprego fora de Portugal.

Achamos que é desta forma, dada a aparente persistência, «teimosia» e atitude lutadora com

que encarou esta fase da sua vida, que fundamenta a sua personalidade resiliente.

2.4. Empreendedorismo VS Emprego

Nesta vertente, e pela análise dos dados podemos constatar que existiu uma atitude

empreendedora do participante, quer pelo facto de ter decidido arriscar no seu próprio negócio

quer, inclusive, por arriscar num negócio cuja área não tinha quaisquer conhecimentos. No

entanto é importante ressalvar que também tomou esta decisão porque tinha o apoio da sua

companheira, a qual já tinha experiência na área da pastelaria. Esta atitude permitiu-lhe

Page 16: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

15

resolver as dificuldades que sentia em voltar ao mercado de trabalho enquanto trabalhador por

conta de outrem, que era a realidade vivida até ficar no desemprego.

Entendemos que, neste caso concreto, trata-se de um caso de empreendedorismo por

necessidade, atendendo ao facto do participante ter tido a iniciativa de criar o seu próprio

emprego por se encontrar na situação de desempregado, sem perspetivas de conseguir

encontrar qualquer emprego, levando-o a numa situação económica desfavorável e que de

alguma forma pôs em causa a sua subsistência. Esta estratégia de contornar a situação,

criando a alternativa favorável para a ultrapassar com a aposta da criação do próprio emprego

demonstra uma clara atitude empreendedora.

3. Conclusões

Apoiando-nos do pensamento de Louçã e Caldas (2009, citados em Santos, 2011),

que, ironizando sobre o pensamento neoliberal que aponta como evidente que os

despedimentos de hoje serão, talvez, o emprego de amanhã, recorremos a este ponto de vista

para, numa inversão ideológica, propor o tema da criação do próprio emprego enquanto fator

de resiliência ao desemprego, resiliência essa bem patente nesta abordagem.

É, com atitudes empreendedoras, como a registada no nosso entrevistado, enquanto

respostas a necessidades específicas e conjunturais que devemos basear a nossa reflexão. O

empreendedorismo depende parcelarmente de estímulos de cariz económico (Baptista,

Teixeira, Portela, 2008), mas também é certo que a vontade, o crer, a criatividade e a

capacidade de iniciativa determinam a sua aplicação. Numa perspetiva norteada pelos

pensamentos de autonomia, capacitação, mudança e empowerment de Paulo Freire,

pretendemos inferir que o desemprego, visto por Boaventura de Sousa Santos (2011) como

um dos principais “detonadores da insolvência pessoal e familiar“ (p.69), por si só não poderá

continuar a ser entendido pela sociedade como um veículo propulsor de pobreza e de

endividamento das famílias e, logo, de exclusão social. Uma atitude empreendedora, de

criação do próprio emprego, exemplificada na presente abordagem, deverá ser encarada como

capacidade pessoal para resistir, lidar e reagir de modo positivo em situações adversas e, deste

modo, que rompa com a forma do desemprego, que apesar de ser um tipo de exclusão social,

apresente indícios de viragem para novas formas de encarar a vida e o mercado de trabalho.

Enquanto Educadores Sociais, um dos grandes desafios é preparar os indivíduos para

questões como as da solidariedade e da tolerância para que possa combater problemáticas, tais

como, por exemplo, a exclusão social (Serapicos, 2003). E nas perspetivas freireanas de

educar para intervir (que se referem a mudanças reais nas relações das pessoas e na sua

Page 17: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

16

autonomia, no trabalho, na educação e na saúde), e que durante toda a sua vida procuram dar

voz aos grupos mais oprimidos e excluídos da sociedade para que pudessem ter domínio sobre

a sua vida, entendemos que a situação de vulnerabilidade criada pelo desemprego é um dos

campos férteis da atuação da Educação Social e pode ser um dos caminhos de mudança e que

mostre às pessoas que podem criar os meios para fazer uma reflexão constante sobre a sua

vida e decidir conscientemente sobre ela.

É assim que

(…) no ato mesmo de responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de

vida, o homem se cria, se realiza como sujeito, porque esta resposta exige dele

reflexão, crítica, invenção, eleição, decisão, organização, acção. Todas essas

coisas pelas quais se cria a pessoa e que fazem dela um ser não somente adaptado

à realidade e aos outros, mas integrado. (Freire, 1980, p.15).

Como pista de uma futura investigação, e tendo em conta as características deste

trabalho, que serviu apenas como ilustração de uma das formas de encarar o desemprego, não

nos permitiram aferir que parcela da sociedade encara o risco calculado da criação do próprio

emprego como ponto de viragem à situação adversa do desemprego, e que parcela “cai na

subsidiodependência” que a leva ao débil modo de vida condigna, com apontamentos de

sobrevivência social, de forma a evitar qualquer tipo de exclusão e até mesmo de pobreza.

Seria, assim, de todo interessante estudar esta temática numa perspetiva mais macro

(por exemplo: com vários casos de sucesso/insucesso de uma comunidade), enquadrando no

estudo a perspetiva de educadores sociais e provocar a sociedade com registos e estratégias de

empowerment, autonomia, valorização, estímulo ao (re)aproveitamento de recursos, etc., que

despertem as comunidades e promovam o bem estar social.

Page 18: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

17

Bibliografia

Albarello, L.; Digneffe, J.; Maroy, C.; Ruquoy, D. & Saint-Georges, P. (1995). Práticas e

Métodos de Investigação em Ciências Sociais. Lisboa: Gradiva.

Baptista, A; Teixeira, M; Portela, J. (2008). Motivações e obstáculos ao

empreendedorismo em Portugal e propostas facilitadoras. Trabalho apresentado em

Comunicação ao XIV Congresso da APDR. Comunicação ao XIV Congresso da

APDR, Tomar.

Bardin, L. (2008). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Cellard, A. (2008). A análise documental. Em: Poupart, J. et al. A pesquisa qualitativa:

enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes.

Costa, B. (1998). Exclusões Sociais. Lisboa: Gradiva.

Duarte, R. (2002): Pesquisa qualitativa: reflexões sobre o trabalho de campo”. Cadernos

de pesquisa, n.º 115, p.139-154.

Flick, U. (2005). Métodos qualitativos na investigação científica. Lisboa: Monitor.

Fortin, M. (2000). O Processo de Investigação: Da concepção à realização. Loures:

Lusociência.

Freire, P. (1980). Conscientização. São Paulo: Moraes.

Freire, P. (1983). Pedagogia do Oprimido. 12ª Edição, Rio de Janeiro: Paz e Terra.

Gauthier, B. (2003). Investigação social: da problemática à colheita de dados. Lisboa:

Lusociência.

Guerra, I. (2006). Pesquisa Qualitativa e Análise de Conteúdo: Sentidos e formas de uso.

Estoril: Princípia Editora, Lda., 1ª edição.

Krippendorf, K. (1980). Content Analysis. An Introduction to its Methodology. Londres:

Sage.

Maruani, M. (2002). Les mécomptes du chômage. Lonrai: Ateliers de Normandie Roto

Impression s.a.s.

Oliveira, M. (2007). Como fazer pesquisa qualitativa. Petrópolis: Vozes.

Paiva, M. (2004). Transcrição de dados linguísticos. In: Mollica, M. & Braga, M. (orgs.),

Introdução à sociolinguística: o tratamento da variação. 2ª ed. São Paulo: Contexto,

pp.135-146.

Poirier,J., Chapier-Valadon, S. (1995). Histórias de Vida- Teoria e Prática. Oeiras: Celta.

Page 19: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

18

Quivy, R. & Campenhoudt, L.V. (2008). Manual de Investigação em Ciências Sociais.

Lisboa: Gradiva.

Samagaio, F. (2006). A educação social e a investigação: algumas generalidades em

torno de um perfil profissional. Cadernos de estudo. Porto: Escola Superior de

Educação de Paula Frassinetti, n.º 3, pp. 17-23.

Santos, B.S. (2011). Portugal: Ensaio contra a autoflagelação. Coimbra: Almedina.

Shane, S. & Venkataraman, S. (2000). The promise of entrepreneurship as a field of

research. Academy of Management Review, 25(1):217-226.

Silva, A; Pinto, J. (1986). Metodologia das Ciências Sociais. Porto: Afrontamento.

Page 20: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

19

ANEXOS

Page 21: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

20

Grelha de análise de conteúdo da entrevista

Problemática Análise Excerto

Experiência profissional

Atualmente o entrevistado

exerce a profissão de

empresário na área da

pastelaria. Tendo já

trabalhado como técnico de

análise de águas, vendedor

de produtos químicos. A

anterior profissão que

exerceu foi de distribuidor

durante 4 anos.

«empresário de pastelaria»

«[…] técnico de análise de

águas […] vendedor::: de

produtos químicos […]

distribuidor.»

«Análise de águas […]»

« Fui distribuidor

[…]Trabalhei lá

aproximadamente 4

anos […]»

Situação de desemprego

Foi dispensando do seu

trabalho como distribuidor,

porque a empresa

encontrava-se com poucos

clientes e sentiram

necessidade de reduzir o

pessoal.

Tendo o mesmo vivido a

situação de desemprego

durante um ano e dois meses.

Esta situação foi muito

constrangedora para ele,

porque viu-se com falta de

dinheiro para pagar contas e

sentiu-se desocupado.

Diariamente sentia-se

desamparado porque não

tinha nada para fazer, os

amigos encontravam-se a

trabalhar e a família

encontrava-se distante não o

conseguindo sempre o apoio

que necessitava.

Mesmo perante a situação de

desemprego, não se sentiu

deprimido e não se isolou. O

mesmo procurou sempre que

possível estar com os amigos

e a namorada.

Enquanto estava

desempregado e como não

encontrava trabalho pensou

na possibilidade de criar o

seu próprio negócio.

« […] Só saí por falta de

trabalho ::: a empresa tinha

pouco movimento e tiveram

necessidade de reduzir o

pessoal […]»

« Tive cerca de um ano e

dois meses »

« Foi algo que pesou um

pouco em mim::: … é difícil

… falta de dinheiro para

pagar as contas … e não ter

aquela rotina::: andar sempre

desocupado::»

« Por vezes::: os amigos

estavam a trabalhar e eu

sentia-me desamparado […]

sentia me desamparado ::: a

minha família está em Beja

e:::: estou aqui sozinho …

Por mais que queiram apoiar,

não é aquele apoio

constante::: devido à

distância.»

« não. Sempre quis estar com

os amigos e com a namorada.

Não me sentia

deprimido(…)»

« Nesse tempo fui pensando

nessa possibilidade (criar o

próprio negócio)como

alternativa ao facto de não

encontrar trabalho e também

porque era algo que eu já

queria fazer … e esta

situação veio também como

Page 22: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

21

uma escapatória do facto de

estar desempregado»

Atitude perante o

desemprego/criação do

próprio negócio

O entrevistado enquanto

esteve desempregado

procurava ativamente

emprego enviando

currículos. Essa foi a forma

que arranjou para não passar

os dias desocupado.

Teve alguém com quem se

aconselhou e que o ajudou

em todo o processo para

conseguir criar o seu próprio

negócio.

Essa pessoa já tinha

experiência como empresário

na área da hotelaria e

restauração.

O entrevistado sentiu

algumas dificuldades durante

esse processo devido a todas

as burocracias (Finanças,

Segurança Social…) que

estão inerentes à criação do

próprio negócio. Por esse

motivo é que demorou cerca

de um mês para conseguir

abrir o negócio.

Neste processo contou com

apoio financeiro de

familiares o que permitiu

com que não tivesse que

recorrer a créditos. Porque se

tivesse recorrido a créditos

poderia vir a ter problemas.

Abriu o negócio numa área

em que nunca tinha

trabalhado mas contou com a

ajuda da companheira que já

tinha experiência,

Obtou por abrir o seu

negócio porque consegue

assim ter independência e

cria as suas próprias regras,

não ter que estar sobre sobre

« […] procurava ativamente,

entregava currículos e não

me chamavam::: E essa foi a

forma que encontrei também

para não estar parado […]

« […] Falei com alguém que

me ajudou a pensar::: a tomar

a decisão::: colaborou

comigo no sentido de

avançar. E essa pessoa foi

também uma das pessoas que

me inspirou para abrir este

negócio»

« […] essa pessoa::: … que

já tinha experiência como

empresário: uma pessoa de

negócios. Porque os negócios

dele também eram nesta

área»

« […] Acho que as

dificuldades que toda a gente

sofre::: existem muitos

entraves, muita burocracia

por parte da segurança social,

finanças, câmaras::: licenças

[…] Só em burocracias

demorei quase um mês até

conseguir abrir.

« […] o apoio de familiares,

não tive que me (endividar)

graças a Deus… é uma

vantagem::: […]»

« […] Não::: e não em queria

meter nisso porque iriam ser

mais problemas e preferi

assumir a dívida com os

familiares.»

« […] tinha poucos ou

nenhuns (0.1) mas a pessoa

que está comigo já tinha

experiência, já tinha trabalho

nisto e isso foi uma mais-

valia, já não começamos

necessariamente do zero.»

« […] Porque abrir o meu

negócio para já é uma

independência::: temos a

nossa independência ::: e

Page 23: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

22

o controle de terceiros.

Mesmo antes de estar

desempregado já tinha

pensando em abrir negócio

próprio mas não sabia era em

que área.

O entrevistado considera-se

teimoso e persistente e isso

foram duas das

características que o

ajudaram na criação do

próprio emprego. O mesmo

quando não está contente

com um resultado obtido

começa logo a pensar em

arranjar soluções para obter o

resultado esperado, o que

mostra que o mesmo também

é determinado.

Sentiu que corria alguns

riscos ao criar um negócio

próprio devido a todas as

burocracias que acarretam

estas situações. E, por outro

lado o negócio também podia

não correr como esperado e

não ter lucro nem para si,

nem para pagar a quem o

financiou neste projeto.

O mesmo considera que se

não tivesse tipo o apoio que

teve para conseguir criar o

seu próprio negócio,

provavelmente teria optado

por emigrar ou persistia na

procura de emprego.

Se não tivesse criado o seu

negócio provavelmente ainda

estava desempregado e a

trabalhar por fora para

ganhar algum dinheiro.

fazemos o nossos serviço à

nossa maneira::: criamos as

nossas próprias regras para

que tudo corra bem … Não

temos que estar sujeitos a

regras de outras pessoas:::

[…]»

« […] Sempre me passou

pela cabeça ((apontando o

dedo)), o ter um negócio meu

(hhhhhhh). Não tinha

pensado era em que área:::

mas surgiu esta oportunidade

e foi nesta que fiquei ::: (…)»

« A teimosia::: É preciso ser

teimoso e persistir no que se

quer::: Eu quando não estou

contente com o resultado:::

começo logo a pensar em

maneiras diferentes::: para

dar a volta e::: no fundo

chegar onde quero.»

« Sim::: sem dúvida. Porque

parar abrir negócio é preciso

muitas burocracias… e para

abrir um estabelecimento tem

que estar tudo nos conformes

… caso contrário pudesse

receber fiscalização e podia o

fechar:::: Também podia o

negócio correr mal e não

ganhar dinheiro sequer para

pagar a quem me ajudou.

«:::::: talvez não. Se calhar

escolhia sair de Portugal ou

:::procurava um emprego

durante mais algum tempo.»

« […] Continuava no

desemprego::: se calhar teria

a fazer uns PESCATOS para

ganhar mais algum […]»

Page 24: O desemprego - Um caso de sucesso

Pobreza e Exclusões Sociais

Mestrado em Educação Social O Outro Lado do Desemprego: Um caso de sucesso

23

Trabalho (visão do

entrevistado)

O entrevistado prefere

trabalhar porque é uma forma

de se sentir bem e de se

manter ocupado.

« […] É uma forma de estar

bem na vida e de se fazer o

que se gosta:::não é aquela

forma de irmos para o

trabalho já contrariados e

mais um dia:::: é uma coisa

importante para mim::: estar

ocupado ::: Não me imagino

já sem trabalhar.»