o descortinar da paisagem a partir de um … · 7/12/2016 · 3 conceito fundamental do pensador...
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O DESCORTINAR DA PAISAGEM A PARTIR DE UM MONUMENTO ENTRÓPICO: o caso do elevado Costa e Silva em São Paulo
NEVES, Rafael H. (1); BERNARDINI, Sidney P. (2)
1. UNICAMP. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura, Tecnologia e Cidade
(PPGATC), Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo. Avenida Albert Einstein, 951, Cidade Universitária, Campinas, SP. CEP: 13083-852
2. UNICAMP. Docente no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura, Tecnologia e Cidade (PPGATC), Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo.
Avenida Albert Einstein, 951, Cidade Universitária, Campinas, SP. CEP: 13083-852 [email protected]
RESUMO
Interpretar a metrópole contemporânea exige atenção aos fragmentos urbanos, aos meta-espaços, espaços-entre, paisagens essas surgidas através da experimentação em detrimento ao design. Novas demandas exprimem novas condições e mutações. Este artigo parte de uma hipótese de que um monumento entrópico, em conformidade com os escritos de Robert Smithson, pode ser um catalisador de novos enquadramentos paisagísticos. O emblemático elevado Costa e Silva localizado na capital paulista, conhecido popularmente como “Minhocão”, é um objeto característico da condição mutante do espaço urbano, que conforma a atribuição de um monumento entrópico. Construído em 1970 e inicialmente pensado como solução viária para o fluxo de automóveis entre regiões da cidade, aos moldes do modelo rodoviarista que pautou as intervenções urbanas em São Paulo já a partir da década de 1930, seu caráter foi colocado à prova ao longo de décadas pela população. De uma estrutura amorfa, impassível ao contexto, as apropriações e reivindicações das pessoas sobre a infraestrutura descortinaram a urbanidade latente que todo objeto em conformação com o espaço público deve elucidar. O elevado como nova tipologia dentro de uma perspectiva contemporânea. Como conceito formador de princípios arquitetônicos a fim de embasar um aporte metodológico de investigação e proposição de fatos arquitetônicos na urbe, apontando os condicionantes de formulação das premissas arquitetônicas envoltas no processo projetual complexo, apoiado nas conceituações de absurdo, emergência e antifragilidade.
Palavras-chave: Paisagem; Monumento; Emergência; Complexidade; Absurdo;
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O que caracterizaria um monumento? A grandiosidade de sua estatura, de suas dimensões
que atestam a memória e a admiração de uma comunidade? Um ponto de intersecção com a
história. Uma celebração da perpetuação da memória? A monumentalidade enseja uma série
de construções da paisagem, de vinculação do design com a história e o cotidiano presente.
Legibilidade. Reconhecimento. Pausa. Este artigo parte de uma hipótese de que um
monumento entrópico, em conformidade com os escritos de Robert Smithson, pode ser um
catalisador de novos enquadramentos paisagísticos. Ou seja, um monumento que não
ressalta a história e o momento, mas que celebra a performance do evento, como fator
propulsor da dinâmica da paisagem. A intenção é formular uma perspectiva contemporânea
para o campo, tanto da criação quanto da preservação, através de uma ontologia
metaprojetual baseada nos conceitos de absurdo1 (como interrupção), emergência2 (como
processo aberto) e antifragilidade3 (como um antídoto à obsolescência), a fim de revigorar a
essência da paisagem além de sua materialidade, estimulando o debate sobre a apreensão
dos espaços urbanos.
A leitura entrópica admite o imprevisto, a mutação da cultura da paisagem, um monumento
em permanente construção, ao contrário da identidade, que centraliza tal cultura num ponto.
Os monumentos entrópicos espalham-se sobre o território urbano. Não emergiram através de
forças centrais, mas da adaptação interativa do meio, onde o objeto se adapta ao ambiente.
Reconhecer ações antes características de determinados lugares em outras condições.
Tipos, referenciados como índice, como a ideia de pracialidade, de Eugênio Queiroga (2001).
O elevado Costa e Silva, na cidade de São Paulo, como um exemplo de monumento
entrópico, é um objeto característico da condição mutante do espaço urbano. Construído em
1970 e inicialmente pensado como solução viária para o fluxo de automóveis entre regiões da
cidade, aos moldes do modelo rodoviarista, seu caráter foi colocado à prova ao longo de
décadas pela população. A vitalidade de tal monumento advém da apropriação da obra com
1 Conceito formulado pelo filósofo Albert Camus, o absurdo é o confronto consciente entre o homem e o mundo,
numa relação de inadequação entre ambos. O mundo não é racional e o absurdo aponta esta inadequação, não sugerindo uma conclusão mas, um ponto de partida. O pensamento camusiano, com toda carga niilista, parece ser útil ao processo de criação, como veiculado nesta artigo, pois é uma forma de interrupção do processo de projeto.
2 Conceito que indica um comportamento auto organizado dentro de um sistema complexo: múltiplos agentes
interagindo dinamicamente de diversas formas, seguindo regras locais e não percebendo qualquer instrução de nível mais alto. O sistema seria considerado emergente quando todas as interações locais resultassem em algum tipo de macrocomportamento observável. (JOHNSON, 2003, p.15).
3 Conceito fundamental do pensador Nassim Nicholas Taleb, “o antifrágil aprecia a aleatoriedade e a incerteza, o
que também significa – acima de tudo – apreciar os erros, ou pelo menos certo tipo de erro.” (TALEB, 2012, p.22). E, ainda: “A antifragilidade não se resume à resiliência ou à robustez. O resiliente resiste a impactos e permanece o mesmo; o antifrágil fica melhor.” (TALEB, 2012, p.21).
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valores opostos aos elaborados, uma vez que vem deixando, aos poucos, de ser utilizado
como um viaduto para automóveis e passando a se constituir como um espaço de lazer e
apropriação urbana pela população em geral. É um ponto de subversão da paisagem, uma
criação absurda que fomenta um descobrimento por vir, novas conexões, onde a paisagem
advém de um processo inconsciente de si mesma.
Tal exemplo é um ponto de reflexão da paisagem como processo, não como forma, como um
fim em si. O resultado presume que a paisagem a ser preservada é aquela que vai além da
fixidez de um retrato passado ou de sua importância arquitetônica e cultural; ao reconhecer a
paisagem como potência criadora, como suporte emergente dos vínculos passados e futuros.
Complexidade e contradição
O fenômeno urbano é marcado por uma equação caótica de diversos personagens
entremeando-se no cenário de cheios e vazios do território. As ciências complexas vêm
ganhando cada vez mais espaço nas últimas décadas, questionando a linearidade da ciência
tradicional na produção do conhecimento. Na arquitetura e no urbanismo, as aproximações
críticas da complexidade sobre as disciplinas são características de alguns autores como
Jacobs (2009), Venturi (1966), Alexander (1965). A epistemologia complexa não reduz a
história a processos determinísticos e oferece novos métodos sobre pesquisa organizacional.
“Imagens como auto-organização, estruturas dissipativas e complexidade dinâmica podem
oferecer um excelente arcabouço para os estudos organizacionais.” (SILVA, 2000, p.5).
É fundamental compreender os sistemas na conformação do espaço urbano. Sua
complexidade advém do fato de não ter uma clareza única, literal. Na sua essência reside na
verdade um paradoxo. "O sistema começa por apresentar-se como unitas multiplex, isto é,
como paradoxo: considerado sob o ângulo do todo, é uno e homogêneo; considerado sob o
ângulo dos constituintes, é diverso e heterogêneo." (MORIN, 1977, p.102).
Vale lembrar porém, que um sistema complexo é diferente de um sistema desordenado. O
primeiro engendra propriedades funcionais que permitem o sistema produzir conteúdo. Há
ordem no caos. Dentro da complexidade há uma ordem oculta que precisa ser vasculhada. Na
condição de desordem, não há uma propriedade de ligação que permite narrar o efeito do
sistema. O mesmo cuidado com as narrativas reducionistas tem de ser feito com o
complexismo. Não se pode tomar a desordem e o caos como imagem, como signo
determinado sem reconhecer os princípios abstratos internos à aparência. Morin (2005) é
taxativo sobre a perspectiva da pesquisa complexa quanto uma narrativa pronta, ao apontar
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mal-entendidos como encará-la como receita, como a grande resposta de todas as
indagações e não como um meio para o pensar, um desafio à simplificação. “Dessa forma, a
complexidade surge como dificuldade, como incerteza e não como clareza ou como resposta.”
(SILVA, 2000, p.6).
Contrariamente aos ideais reducionistas das grandes metanarrativas, a cidade é um sistema
complexo, marcado por uma diversidade de relações de seus personagens. Querer reduzir tal
caos numa ideia de unidade provoca como consequência única o congelamento do tempo, a
supressão da vida em relação à arte e ao design. A arrogância do desenho etéreo esteriliza o
descompasso da vida humana. A complexidade de um sistema - ou de uma cidade - consiste
"em associar em si a ideia de unidade, por um lado, de diversidade ou multiplicidade, por
outro, que em princípio se repelem e se excluem." (MORIN, 1977, p.102). O sistema é uma
unidade global com qualidades próprias irredutíveis e indivisíveis. Como diz Morin:
A ideia de unidade complexa vai ganhar densidade se pressentimos que não podemos
reduzir nem o todo às partes nem as partes ao todo, nem o uno ao múltiplo nem o
múltiplo ao uno, mas que temos de tentar conceber em conjunto, de modo
simultaneamente complementar e antagônico, as noções de todo e de partes, de uno e
de diverso. (MORIN, 1977, p.103).
Ora, entender a arquitetura de modo isolado, como objeto arquitetural, reduz a condição
metaprojetual à unidade da forma. Conceber uma metodologia projetual "numa ciência que
procurava os seus fundamentos precisamente no redutível, no simples e no elementar",
resultará no enfraquecimento das ferramentas conceituais que investigarão condições
não-lineares emergentes. Tal metodologia permite calibrar as ferramentas analíticas, nunca
eliminar as contribuições passadas, buscando e eliminando erros a serviço da busca da
verdade, a serviço da verdade, como diria Popper.
A relação entre arquitetura e cidade configura a experiência do mundo concreto do homem,
uma formação contínua de um extenso palimpsesto, com suas diversas camadas, formando
um complexo sistema. O tempo imprimiu a organização das partes fundindo-as à unidade
global, ao todo. A cidade é um todo complexo de ordem e desordem que fica à mercê do
tempo e das relações diversas de sua unidade mínima, os indivíduos. Uma característica
muito importante nesse processo é o conceito de “emergência”. Termo comum, sugere algo
que "emerge", que enuncia um momento fortuito. O conceito representa um comportamento.
Comportamento que emerge sem qualquer previsão, proposta ou suposição quando da
implementação de algo. A característica fundamental é a auto-organização, a capacidade de
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se tornar mais organizado com o passar do tempo. Uma "mistura de ordem e anarquia é o que
chamamos de comportamento emergente" (JOHNSON, 2003, p.27). Como explica Morin:
Podemos chamar emergências às qualidades ou propriedades dum sistema que
apresentam um caráter de novidade em relação às qualidades ou propriedades dos
componentes considerados isoladamente ou dispostos de maneira diferente num outro
tipo de sistema. (MORIN, 1977, p.104).
As qualidades desse comportamento emergente nascem das associações, das combinações
diversas entre as partes, emergindo a estabilidade dentro do caos. A separabilidade -
condição própria do reducionismo - perdeu o seu valor absoluto. As partes não podem ser
identificadas quando os elementos são tomados isoladamente.
O pensamento científico clássico foi construído sobre três pilares: a ordem, a
separabilidade e a razão. A noção de separabilidade corresponde ao princípio
cartesiano segundo o qual para estudar um fenómeno devemos decompô-lo em
elementos simples. O pensar complexo não substitui a separabilidade pela
inseparabilidade, mas chama, uma vez mais, uma dialógica que utiliza o separável,
mas o insere no inseparável. (FERRARA, 2003, p.8).
A ciência da auto-organização se concretiza na imprevisibilidade, na incerteza e na
racionalidade aberta, em oposição à racionalização fechada. Operar a incerteza é ter
consciência de que não há o absoluto - pode-se fazer um paralelo ao problema da indução em
Popper e ao sentimento do absurdo em Camus - não existe o controle total do processo de
projeto, muito menos de seus resultados. Porém, este fato não anula a capacidade de projeto
e ao relativismo de que não existe o real e de que tudo é válido. Ao contrário, qual é a essência
do projetar o não-absoluto? Seria possível projetar “emergencialmente”? O contrassenso
aparente do projetar, do ver além, reside em se exigir a ordem, o controle, um manual de
como se deve proceder, em face ao descontrole da imprevisibilidade do tempo. Esse realismo
antiutópico marca a dissolução do objeto moderno. A atividade supera a forma, adicionando
assim o fator tempo. A previsibilidade da natureza era evidente na concepção metaprojetual
da tríade vitruviana, marcada pelo termos de ordem, estrutura e função. A ciência da
complexidade recicla tais termos fechados, remetendo a um embasamento mais aberto e
abstrato como, organização, sistema e relação. Encarar a arquitetura como objeto acabado
é negar o caráter sempre dinâmico da realidade. A arquitetura da realidade admite a
modulação da passagem do tempo por seus usuários (MONTANER, 2009, p.90).
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O pensamento complexo não visa substituir a ideia de ordem pela de desordem, ou ao
contrário, pois pretende, antes da exclusão, colocar em perspectiva dialógica ordem,
desordem e organização. “As ideias de ordem e desordem deixam de se excluir
absolutamente; ordem organizacional pode nascer a partir da turbulência e processos
desordenados podem nascer em contextos deterministas (FERRARA, 2003, p.8). A
complexidade do espaço metropolitano implica em novas habilidades das partes
componentes. A adaptação emerge no “design” de variados sistemas de auto-organização a
partir de milhões de decisões individuais consolidando uma ordem global a partir de
interações locais (JOHNSON, 2003, p.63-76). A cidade acontece. Padrões maiores emergem
de ações descoordenadas, do “caos” aparente imerso numa solução de estabilidade e
mudança. A espontaneidade de séculos de desenvolvimento das cidades tradicionais gerou
um padrão não-planejado, bottom-up, juntamente com a criação de uma paisagem artificial,
ao estilo top-down, conformando a natureza da cidade.
Há uma natureza inerente, um princípio organizador que emerge a pátina da vida, típica das
“cidades naturais”, conforme menciona Christopher Alexander (1965) em seu clássico artigo A
cidade não é uma árvore. Alexander faz um mapeamento das relações complexas do
ambiente urbano, identificando padrões em conjuntos que farão parte de um sistema. O artigo
é uma crítica às tentativas do design moderno em produzir as “cidades artificiais”,
marcadamente em um esquema rígido de “árvore” em detrimento à complexidade de um
“semilattice”. Árvore e semilattice são diagramas que demonstram a ramificação de um
sistema através da conjunção das partes. Aponta a falha dos designers de não conseguirem
captar a propriedade que “deu vida às cidades antigas” e o malogrado desejo destes de se
aterem às “características físicas e plásticas do passado” em detrimento “dos princípios
abstratos de ordenamento” notáveis da antiga urbe (ALEXANDER, 1965).
O todo é superior à soma das partes. Esse é o lema característico dos sistemas emergenciais.
Transcende a polarização entre reducionismo e holismo. O fenômeno urbano não pode ser
interpretado, e projetado, por uma coleção de partes autóctones ou por uma totalidade que
não reduz às partes. Árvores e semilattices, seguindo os conceitos de Alexander, traduzem as
aspirações do design quanto ao seu controle. A totalidade do espaço é resultado da
conjunção dos fixos e fluxos, conforme menciona Milton Santos. A arquitetura como um entre
vivenciado pode produzir a potência ou a nulidade do lugar. Entre o todo e as partes, a cidade
e a arquitetura, a pátina da vida se revela na metamorfose cotidiana das relações impessoais
da sociedade.
Relações sujeito-objeto dependem de diversos níveis de interações e escalas de
conhecimento. O fato é que todo o conhecimento é limitado. Como o design pode determinar
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a imposição de um plano que subjuga conhecimentos locais? O planejador teria condições de
apreender a totalidade das informações, aspirações e planos individuais da sociedade? O
menosprezo do conhecimento prático dentro de certas circunstâncias particulares de tempo e
lugar, não vislumbra a potência e a criatividade da incerteza. Essa complexidade de ações
dificilmente seria projetada centralmente. Há um conhecimento disperso na sociedade onde o
design deveria se ater, se ligar ao mundo baixo para que surja uma ordem superior. Para
Hayek (1988) é necessária a descentralização desse “diretório central”, para que assim se
possa “garantir que o conhecimento das circunstâncias particulares de tempo e lugar sejam
prontamente utilizados”. Emerge assim, uma ordem espontânea (HAYEK, 1967) de baixo
para cima.
A ordem espontânea deve à tradição uma base moral. Descobertas acidentais e um processo
penoso de tentativa e erro elevaram a civilização. Supor que se deve todas as vantagens e
oportunidades oferecidas pela civilização a um plano deliberado e não à observância de
normas tradicionais seria induzir ao erro e não vislumbrar o risco herdado do passado. A
ineficiência de um racionalismo extremo, propugnada por uma moral intelectual, está em
acreditar que pode satisfazer melhor a sociedade que os métodos tradicionais.
Nosso objetivo tem que ser, como aprendemos com Karl Popper, cometer nossos
sucessivos erros o mais rápido possível. Se no meio tempo tivéssemos de abandonar
todas as conjecturas atuais, que não podemos provar como verdadeiras, logo
voltaríamos ao nível do selvagem, que confia apenas em seus instintos. Contudo, é o
que todas as versões do cientismo recomendaram - do racionalismo cartesiano ao
positivismo moderno. (HAYEK, 1988, p.98).
A ordem espontânea advém da experimentação. Algo entre a intuição e a razão. A arquitetura
é a mediação desses atributos, um agente moderador do progresso. A cultura da cidade
pré-industrial é retomada pela crítica arquitetônica a partir da década de 1960, como condição
última de uma urbanidade realmente viva. A tradição ressurge revelando seus espaços
testados frente à tabula rasa modernista que produziu, também, suas próprias tipologias e
novos programas. Cada época produziu hipóteses que foram lançadas à realidade, arriscando
um sistema de relações espaciais e temporais. Mergulhado no cotidiano, o risco sugere
condições laboratoriais que permitem o entendimento do fato arquitetônico lançado
(PORTAS, 1969, p.29).
Da mesma maneira que a força da gravidade faz com que a água sempre encontre a
maneira de chegar ao solo, acusando no seu percurso as fissuras da construção, o
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descompasso dos elementos construtivos, assim também a força da realidade sempre
termina acusando o descompasso entre o projeto (o que se imaginou que deveria
ocorrer) e a vida (o que de fato ocorre). (ARAVENA, 1999).
A contradição da realidade é um poderoso insumo para o design a fim de reprogramar a sua
síntese. A realidade imprime uma condição complexa que exige do design uma
complementação, aventurando-se em seu abstrato processo de invenção, com potencial de
se criar relações inéditas entre os comportamentos dos usuários e o ambiente físico. Para
Nuno Portas (1969, p.31), é “de se estranhar o vulgar desinteresse dos mesmos projetistas
pela ‘sorte’ do seu projeto, ou seja, o que é mais grave, pela ‘sorte’ dos que o habitam”. Qual é
a “sorte” do projeto do elevado paulistano? Tal sorte elevou a sua condição infra estrutural a
um novo padrão de organização, ou seja, a uma nova tipologia?
A experimentação arquitetônica em nível tipológico resgata a experiência acumulada da
cidade. Anthony Vidler (1976) destaca a questão do tipo na cidade, e a própria cidade como
tipo, alçando-a a uma terceira tipologia, num evidente “desejo de resgatar a continuidade da
forma e da história em contraposição à fragmentação gerada pelas tipologias elementares,
institucionais e mecânicas” do passado modernista. O tipo emergido é um sobrevivente da
complexidade e contradição da qual foi exposto ao longo do tempo. Ele é resultado da
ambiguidade da obra, do projeto consumado, onde o controle cede à incerteza, a previsão ao
fato, o abstrato ao concreto, a intenção à percepção. Descortinar a ordem difícil de um cenário
complexo e contraditório de processos espontâneos em curso, é o que faz esses novos
territórios emergentes da cidade contemporânea; engendrar novas formas na arquitetura e no
urbanismo despidas da nostalgia pós-moderna e do purismo moderno.
Descortinamento
“Para mim, ver o muro de Berlim como arquitetura foi uma magnífica primeira revelação em
arquitetura, sobre como a ausência pode ter mais força que a presença.”
Rem Koolhaas
Esta seção procura refletir os limites da arquitetura [Figura 1], o estado da arte do
pensamento arquitetônico, ao propor uma amplidão crítica às interpretações da disciplina, a
fim de desobstruir um reducionismo que não permite vislumbrar as potencialidades ocultas em
determinadas formas emergidas de uma urbanidade espontânea. O monumento entrópico,
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conforme enunciado, faz parte do que Bernard Tschumi (1980, p.174) descreve como obra
limite: “Assim como a pista secreta em um romance policial, essas obras são essenciais.”
Para Tschumi, os limites são áreas estratégicas da arquitetura.
Se a corrente dominante entre os historiadores descartou inúmeras obras por
considerá-las “arquitetura conceitual”, “arquitetura de papelão”, espaços “poéticos” ou
“narrativos”, chegou a hora de questionar sistematicamente as suas estratégias
reducionistas. Colocá-las em questão não é simplesmente exaltar o que essas
estratégias rejeitam. Ao contrário, significa entender o que as atividades de fronteira
escondem e encobrem. (TSCHUMI, 1980, p.176).
Figura 1. Imagem do Muro de Berlim, extraída do ensaio O Muro de Berlim como Arquitetura, de Rem
Koolhaas, 1970. Fonte: KOOLHAAS, Rem.; MAU, Bruce. S, M, L, XL. Nova York: The Monacelli
Press.1998 (1995).
Reconhecer as ações diversas da contemporaneidade é fundamental ao parecer crítico da
disciplina a fim de detectar e potencializar soluções futuras. Os monumentos investigados são
espaços sistemáticos que apontam condições, possibilidades do acontecimento, de uma
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“catástrofe genésica”, remetendo às entidades do urbano, como a ideia de pracialidade.
Conforme explica Queiroga sobre o conceito de pracialidade [Figuras 3 e 4]:
Tratou-se de reconhecer que as ações que outrora caracterizavam as praças públicas
– convívio, encontro e manifestações públicas – lugares por excelência da esfera
pública geral e da esfera pública política, não mais se estabeleciam com exclusividade
neste espaço livre público. As ações típicas da praça verificam-se nos mais diversos
espaços em função dos diferentes contextos urbanos que assim lhes propiciam
ocorrer. (QUEIROGA, 2012, p.60).
Esta artigo acaba por reivindicar o elevado como arquitetura, a fim de explorar o limite da
disciplina, revelando excessos e códigos ocultos que sugerem outras definições, outras
intepretações, que não se restrinja ao objeto-em-si, mas ao estado do monumento entrópico e
sua incorporação à paisagem urbana. Conforme comenta Martha Telles (2010, p.81) “Os
monumentos entrópicos de (Robert) Smithson encontram-se em estado de possibilidade de
identificação e experimentação a cada vez, a cada visita à paisagem artificial pós-industrial.”
[Figura 2]. Conforme o próprio artista: “Ao invés de fazer-nos lembrar o passado como os
velhos monumentos, os novos monumentos parecem nos fazer esquecer o futuro”
(SMITHSON, 1966, p.11).
Tal descortinamento procura averiguar as potencialidades do fragmento. Ao espaço dilatado,
o objeto arquitetônico assumiu uma autonomia desconhecida, marcada pela técnica e forma,
e por uma liberdade que acaba por destruir o léxico da cidade oitocentista. “O fragmento
operou por muito tempo na modernidade, produzindo uma série de importantes contradições”
(SECCHI, 2012, p.105). A arquitetura e a paisagem da complexidade e contradição está à
espera de um projeto que possa repropor temas e interrogações, novas possibilidades
compositivas que permitam uma recomposição da experiência.
Em seu princípio de racionalização progressiva, urbanismo e arquitetura articulavam a
cidade em termos de totalidades, abstrações construídas com base em um modelo
temporal histórico e ideal. Menos do que mera constatação e celebração de tal
realidade, Smithson percebe nos fragmentos da modernidade novos temas de
trabalho. (TELLES, 2010, p.80).
A quebra dos limites não procura separar e personificar um novo estilo. O exercício
arquitetônico exige uma constância no pensar, numa autopoiese municiada com as
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considerações exteriores da disciplina. A mutação constante exige a quebra das convenções
arquitetônicas. Qual o ideal de um monumento? O que seria um monumento contemporâneo
dessa metrópole genérica? Sua essência reside na perpetuação da memória de um
acontecimento, um design de memória. O monumento aqui promulgado poderia ser uma
espécie de religamento, um ponto de ordem e desordem, um conflito do absurdo camusiano,
que leva ao “salto”, à inconclusão do cotidiano. Segundo esse princípio, o monumento deixa
de ser algo ensimesmado, casado com o passado; passa a ser algo aberto, estranho,
divorciado do absoluto.
A potência do vazio, do inconcluso. O vazio não necessariamente como ausência, mas
também, como um cheio esvaziado, ou seja, uma presença sem história, sem referência, sem
conexão com a densidade do mundo, sem consciência. Tais espaços de “presenças
ausentes”, poderiam abrigar uma nova organização discursiva. O vazio positivo, ou seja,
espaços livres de um design a priori, aberto à (im)possibilidades, são espaços efetivamente
da incerteza de um design entrópico. [Figura 5].
O monumento entrópico explora o limite do valor arquitetônico tradicional como elemento
primário; seu aspecto espacial não remete a uma memória e sua funcionalidade não é algo
dada a priori. Um objeto arquitetural que remete ao segundo princípio (termodinâmico) que
não pode articular-se “nem com um conceito de ordem - sempre repulsivo - nem com um
conceito de organização - sempre ausente. Podia unicamente oscilar entre a insignificância
duma versão mínima e a enormidade duma versão máxima.” (MORIN, 1977, p.69). Como
ressalta Nelson Brissac Peixoto: “Os monumentos, como os jardins e as ruínas, são
construções que existem no limite da utilidade e da permanência. Eles flertam com o
desaparecimento.” (PEIXOTO, 2012, p.372).
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Figura 2. Imagens do trabalho fotográfico de Robert Smithson, Monuments of Passaic, de 1967.
Disponível em
<http://revistacarbono.com/artigos/05os-meteoritos-mayana-redin/attachment/revista19-pdf/> Acesso
em: 09 ago. 2016; Disponível em:
<http://www.robertsmithson.com/photoworks/monument-passaic_300.htm> Acesso em: 09 ago. 2016.
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Figura 3. Intervenções do artista plástico Felipe Morozini. Um exemplo de pracialidade criada.
Disponível em: <https://www.instagram.com/felipemorozini/?hl=pt-br> Acesso em: 12 jul. 2016.
Figura 4. Festa Junina no minhocão, evento que reuniu 4000 pessoas em 2013. Um exemplo de
pracialidade espontânea. Foto: Rivaldo Gomes, Folhapress, 2013.
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Figura 5. Imagem da paisagem urbana da região do elevado Costa e Silva. Descortinar as nuances
urbanas de um espaço fragmentado. Fonte:
Esta narrativa complexa desestabiliza a visão do sujeito clássico que permeou a arquitetura e
os espaços urbanos. Uma desestabilização que não os invalida, mas que permite uma
apreensão dos espaços e dos fatos urbanos mais condizente à condição contemporânea. A
concepção do monumento se identifica com a persistência dos fatos urbanos, um ponto de
convergência da urbanidade, da práxis urbana, não se remetendo apenas ao ponto de vista
físico. A persistência de tal objeto é constituída "por seu valor constitutivo, pela história e pela
arte, pelo ser e pela memória", como lembra Aldo Rossi (2001, p.56). A palavra "persistência"
adquire um sentido mais apropriado ao que este artigo desenvolve em relação ao monumento
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entrópico, pois, vincula-se mais a uma ideia de organização sistemática, sujeita à dicotomia
da ordem e desordem, própria do segundo princípio, expostas no "limite da utilidade e da
permanência", como descreve Peixoto. Há uma complexidade imanente ao monumento em
sua constituição, que não pode ser apreendida em sua essência com a literalidade de uma
imagem que possa ser transposta. Como lembra Rossi:
...reconhecer apenas aos monumentos uma efetiva intencionalidade estética, a ponto
de colocá-los como elementos fixos da estrutura urbana, pode ser uma simplificação.
(...) o processo dinâmico da cidade tende mais à evolução do que à conservação e que
na evolução os monumentos se conservam e representam fatos propulsores do próprio
desenvolvimento. (ROSSI, 2001, p.56).
A dimensão do monumento aqui propugnada não trata dos monumentos da permanência
histórica, mas, sim, da convergência catalisadora de novos enquadramentos paisagísticos.
Refere-se mais à dimensão dos “elementos primários”, que não se restringe apenas ao
monumento em si ou à atividades fixas, à entidades fechadas, evocando elementos capazes
de acelerar, ou contribuir, o processo de urbanização da cidade. Elementos estes nem
sempre construídos, detectáveis - lugar de acontecimentos (ROSSI, 2001, p.116). Trata-se
de reconhecer a eventualidade, o acaso, o acidental em detrimento a um design etéreo. A
paisagem desse descortinar admite o eventual, a complexidade e a responsabilidade da
liberdade. “Donde a necessidade do princípio de complexidade que, em vez de excluir o
acontecimento, o inclui e nos leva a olhar os acontecimentos da nossa escala terrestre, viva e
humana, aos quais uma ciência antieventual nos tornara cegos.” (MORIN, 1977, p.84).
O antigo universo não tinha singularidade na sua obediência às leis gerais, não tinha
eventualidade nos seus movimentos repetitivos de relógio, não tinha jogo no seu
determinismo inflexível... O universo que nasce aqui é singular precisamente no seu
próprio carácter geral; Este universo nascente nasce como acontecimento, e gera-se
em cascatas de acontecimentos. O acontecimento, triplamente excomungado pela
ciência clássica (por ser simultaneamente singular, aleatório e concreto), torna a entrar
pela porta cósmica, visto que o mundo nasce como acontecimento. Não é o nascimento
que é acontecimento, é o acontecimento que é nascimento, no sentido em que,
concebido no seu sentido mais forte, é acidente e ruptura, isto é, catástrofe. (MORIN,
1977, p.84).
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Os monumentos entrópicos emergem como acontecimento [Figura 6]. A persistência resulta
na condição “antifrágil” do conceito (TALEB, 2012), marcado pela relação de
“desordem-ordem-organização” (anel tetralógico de Morin, 1977), onde se admite a dispersão
como fator organizacional.
O pensamento complexo deve ser capaz de contextualizar e globalizar, pondo em
relação os conhecimentos compartimentalizados de natureza disciplinar, ao mesmo
tempo em que reconhece singularidades, individualidades, o concreto. Para Morin
(2008, p.156-157), o conceito de sistema exprime ao mesmo tempo unidade,
multiplicidade, totalidade, diversidade, organização e complexidade. (QUEIROGA,
2012, p.72).
Com a apreensão mais ampla sobre a relação dos sistemas de objetos e ações, próprios dos
espaços de apropriação pública, torna-se possível a possibilidade de novos arranjos espaciais
que possam desempenhar a característica de tipos tradicionais de espaços de convívio
(QUEIROGA, 2012, p.62). O caso do elevado Costa e Silva é paradigmático, pois revela um
espaço potencialmente promissor na conformação de um tipo consubstanciado pela
complexidade sistemática. O artefato urbano que emerge, advém das condições da ação, da
apropriação e não das leis da consciência do design. O elevado enseja uma tipologia do
pensamento complexo, onde o eventual possui uma dimensão no processo de criação. Uma
tipologia que marca um enredo entrópico, onde identidade e mutação, ordem e desordem,
expandem o universo da física (arquitetura) clássica, desintegrando uma ordem
simplificadora. Não é uma tipologia que converge, finalizada. Tampouco orgulhosa a princípio.
É uma tipologia do devir, em formação. Uma pedra bruta genérica lançada, arriscada, a ser
lapidada pelos agenciamentos inferiores. Pois, nessa busca de identidade do que seria
cidade, fica a pergunta de Koolhaas (2013, p.31): “Quais são as desvantagens da identidade
e, inversamente, quais as vantagens da vacuidade?” E, ainda: “O que resta se removermos a
identidade? Se, como comenta, a identidade centraliza, insistindo numa essência, num ponto
(2013, p.33), a entropia expande, abre-se ao imprevisto, salta ao absurdo. O mundo novo que
se abre é incerto e misterioso. É mais camusiano que newtoniano, parafraseando Morin – “É
mais shakespeariano que newtoniano” (MORIN, 1977, p.81). Para Morin, Newton focava a
ideia de leis, “para quem a natureza obedece sempre às mesmas leis nas mesmas
condições”, e ressalva que “nós devemos agora focar a ideia de condições, as quais, sendo
aleatórias, não obedecem às leis mas, precisamente, condicionam-nas.” (MORIN, 1977,
p.77).
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Figura 6. Imagem da marquise do Ibirapuera. Uso do conhecimento local, que passou de uma
organização fechada (circulação), uma ordem clara, para uma desordem, o acaso, o acontecimento
dos fenômenos da urbanidade bottom-up, a evidência da emergência. A interrupção do absurdo
(surgimento de um novo ponto de partida – o que seria a marquise hoje?), o acaso programático
(contaminação). Uma entidade antifrágil: a partir da aleatoriedade do evento, o espaço apresentou
mais vantagens do que desvantagens. Um monumento entrópico por excelência.
Desse modo, o elevado como arquitetura, viabiliza uma possível tipologia justamente pela
profusão de condições que contaminaram a inerte estrutura viária. [Figura 7]. Um passeio pela
via permite ao olhar uma revelação de uma paisagem em construção permanente. Artistas de
rua em suas apresentações momentâneas, seja em uma peça de teatro improvisado nas
janelas dos apartamentos lindeiros à via, ou no aproveitamento de uma empena cega de um
edifício para a elaboração de um grafite. Ou ainda, na apropriação do espaço para prática
esportiva, cultural e festiva. Essa tipologia nasce do acontecimento, que evoca o acidente e a
ruptura. Uma tipologia da condição, ou seja, que não conforma uma forma a priori,
determinada e etérea, mas que possibilita a ordem espontânea advinda da incerteza do
futuro. A realidade é uma imprevisibilidade. Uma forma eternamente inacabada do tempo.
Sentimento por vezes impotente, encontra respaldo na filosofia camusiana. Para o filósofo, a
relação do homem é de inadequação ao mundo. Há um confronto consciente entre o homem
e o mundo. Esse confronto é a ideia de absurdo (CAMUS, 2009). O absurdo é a condição
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metafísica do homem. O mundo não é racional e o absurdo aponta esta inadequação, não
sugerindo uma conclusão mas, um ponto de partida. O absurdo assim, interrompe, interroga a
eternidade da paisagem, do absoluto; um termo provocador que estimula o processo de
criação e a conclusão da arquitetura. “Onde não há nada tudo é possível; onde há arquitetura
nada mais é possível” (KOOLHAAS, 1998).
Figura 7: Diagrama de estudo das principais linhas de descortinamento da paisagem ao longo da via e
dos conceitos que emergem do elevado. Fonte: Mapa produzido sobre imagem Google Earth, 2015,
pelo autor, 2016.
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Seriam as inconclusões das paisagens típicas da ideia de pracialidade, um ponto de partida
para um descortinamento epistemológico do projeto na contemporaneidade? O monumento
entrópico – exemplificado pelo elevado Costa e Silva [Figura 8] - caracteriza-se por uma obra
absurda, onde mutação e transformação ocorrem como parte do processo. Uma obra aberta,
revigorada por forças emergenciais não deliberadas por um design superior, emergida de
baixo para cima, numa espécie de religamento, um ponto de ordem e desordem, um ponto de
partida, não de conclusão. Uma entidade tipológica antifrágil que se beneficia com o caos,
capaz de se auto organizar, sempre a persistir como fato urbano. Seria esta forma, uma nova
condição tipológica da metrópole contemporânea? Uma paisagem do devir? Talvez, resida ali,
uma chave futura para pensar os espaços da cidade. Tais descortinamentos das paisagens
através dos monumentos entrópicos terá como resultado um meio de reflexão através de uma
ontologia metaprojetual, baseada na tríade absurdo – emergência – antifragilidade, capaz de
experienciar a variabilidade e complexidade das espacialidades da vida pública
contemporânea.
Figura 8: Imagem do elevado Costa e Silva. Paisagem entrópica modelada pelas interações das partes
sobre o todo. Fonte: Carla Christiani.
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Conclusão
Ao investigar a pertinência dos monumentos entrópicos, o artigo permite vislumbrar uma
paisagem em formação, uma paisagem potencial. Diferentemente de um monumento
tradicional, uma espécie de ponto acabado que conecta o presente ao passado, uma imagem
etérea e, também, de maneira diferente dos monumentos de Robert Smithson, que além de
fazer lembrar do passado, parecia fazer esquecer o futuro, o monumento referido neste artigo
tem como ponto de partida o futuro, pois a concepção do projeto se abre ao tempo, ao acaso.
Tal premissa, permite um alargamento dos aspectos materiais e imateriais do conceito de
patrimônio, ao descortinar a paisagem em busca de um diálogo mais complexo da relação
entre o edifício e a paisagem, propondo alternativas para os desafios contemporâneos
marcados pela fragmentação.
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