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90 91 Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 90-100, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 90-100, 2011. O CORPUS DO PS PERFORMANCE ALÉM DA LINHA DO HORIZONTE The computer corpus Unbeleaveble performance. Niura Borges Videoartista. Mestre em Artes Visuais (UFRGS) Especialista em Artes Visuais - poéticas visuais: gravura, fotografia e imagem digital (Feevale, Novo Hamburgo, RS, Brasil) Pesquisadora Imagem Escultura do Tempo (UFRGS). Atua principalmente nas seguintes áreas: Videoarte, Audiovisual Do- cumental, Experimental e Performance. Patricia Soso Atriz e performer. Formada pela Scuola di Teatro Arsenale, em Milão/Itália. Possui experiência profis- sional Internacional. Pesquisadora CNPq Interartes:: processos e sistemas interartísticos e estudos de performance. Formada em Ciências Jurídicas e Sociais (UNISINOS, São Leopoldo, RS, Brasil). Rosemary Brum Historiadora, socióloga e performer. Pesquisadora do Grupo Interartes: Processos e Sistemas Inte- rartísticos e estudos de performance. Socióloga do Núcleo de pesquisa em história (UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil) Trabalha com estudos de Historia oral, Migraçao e Sensibilidades. Especialista em filosofia da linguagem e do pensamento (UNISINOS, São Leopoldo, RS, Brasil).Mestre em socio- logia (UFRGS), Doutora em história (PUCRS, Porto Alegre, RS, Brasil). This article intends to reflect about the PS Project carried out by the performance study group from Porto Alegre, Geperformancepoa.[1]. The PS Project holds two artistic propositions, PS and PS NETWORK, which came from the desire for communicability of the body in performance and from the search for an enlarged dimension of the relations in different spaces of connection. P S surgiu como proposta de pesquisa, atendendo à convite da exposição Galeria Regresso , realizada no Memorial do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, em 2011, e organizada pelo artista-curador brasileiro Pablo Ferretti, cuja curadoria procurou redesenhar o conceito de Arte Postal, entendendo pessoas como geografia, englobando questões como efemeridade e deslocamento. Pessoas como Geografia reu- niu trabalhos da Inglaterra e vários pontos do Brasil como São Paulo, Goiânia e Uberlândia. Os questionamentos do coletivo Geperformancepoa sobre deslocamento e efemeridade em performance, atentou a possibilidade comunicativa do corpo e sua relação com o espaço. A investigação levou a pesquisa em direção àquilo que o corpo poderia ter dito, ou que havia esquecido de dizer, ou seja, um caminho em direção ao corpo em Post Scriptum. Mas de que forma o corpo poderia se fazer em ação revelando aquilo que ele havia esquecido de dizer? Optamos por construir uma proposta de apresentação do corpo em PS, em corpo pessoal, revelando-o parti- cularizado e ao mesmo tempo, interligado aos corpos do coletivo. A pesquisa sobre arte postal nos remeteu ao passado já que os meios de troca/comunicação eletrônicos são mais imediatos e com certa impessoalidade, ou pessoalidade particularizada. Pensamos que necessariamente poderíamos utilizar meios eletrônicos na nossa proposta mas que seria mais contundente remetermos as origens da arte postal pois isso poderia gerar questionamentos quanto as mudanças dos meios de comunicação e de troca. Um elemento acrescentou-se ao corpo como possibilidade de resgate do “ainda não dito” - máquinas de escrever antigas. Com ela criamos quatro (4) variações de performance PS, particularizadas em nossas áreas específicas de pesquisa. Para falar do “ainda não dito”, Fernanda Stein (dança), criou Gavetas. Cartas de família de um tio falecido, esperando um destino final, foram espalhadas sobre “sua máquina”, no piso do corredor, por onde necessariamen- te o público passaria para ir até a sala de exposição, onde estava instalada a mostra Galeria Regresso. A performer sentada ao chão, com uma lingerie delicada , antiga, reforçava a idéia de passado, memória, dor e separação. Oferecia ao público a leitura intima de seu familiar querido. PS (2011) Geperformancepoa . Memorial do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS. Performer Fernanda Stein Foto: Rafael Ferretti Niura Borges (artes visuais) concebeu seu PS em uma videoperformance denominando-a Um cor- po através da janela. A proposta surgiu de um desejo de captação da ação do corpo em performance e da projeção simultânea em imagem vídeo, em tempo real, na sala da exposição Galeria Regresso. Para ação de performance, a artista escolheu como local, as escadarias de acesso ao último piso do memorial do Rio Grande do Sul e ali escorregou seu corpo sobre os degraus, levando junto a máquina de escrever. A cada patamar de escada se debruçava sobre a máquina tocando as teclas PS. A imagem desta ação foi captada em ponto de vista da escada em abismo e projetada, através de pequena janela, localizada bem ao alto na sala de exposição. “As janelas e sua localização, bem ao alto, me instigavam a utilizá-la, como forma de provocar o ponto de vista do espectador, fazendo-o procurar para ver através da janela, provoca-lo na sua visualidade, intimando-o como um explorador a andar para ver, a descobrir por si mesmo.” Olhando para a janela, o espectador curioso, pode ver em tempo presente, a ocorrência da ação nas escadarias. Este artigo faz uma reflexão sobre o projeto PS, executado pelo grupo de estudo de performance de Porto Alegre, Geperformancepoa. O projeto tem duas proposições artísticas: PS e PS Network, que foi criado por causa da comunicabilidade do corpo em performance e da busca por uma dimen- são maior das relações em diferentes espaços de conexão. Palvras-chave: Projeto PS, Corpus, Rosemary Brum Keywords: PS project, Corpus, Rosemary Brum

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O CORPUS DO PSPERFORMANCE ALÉM DA LINHA DO HORIZONTE

The computer corpusUnbeleaveble performance.

Niura Borges Videoartista. Mestre em Artes Visuais (UFRGS) Especialista em Artes Visuais - poéticas visuais: gravura, fotografia e imagem digital (Feevale, Novo Hamburgo, RS, Brasil) Pesquisadora Imagem Escultura do Tempo (UFRGS). Atua principalmente nas seguintes áreas: Videoarte, Audiovisual Do-

cumental, Experimental e Performance.

Patricia Soso Atriz e performer. Formada pela Scuola di Teatro Arsenale, em Milão/Itália. Possui experiência profis-sional Internacional. Pesquisadora CNPq Interartes:: processos e sistemas interartísticos e estudos de

performance. Formada em Ciências Jurídicas e Sociais (UNISINOS, São Leopoldo, RS, Brasil).

Rosemary BrumHistoriadora, socióloga e performer. Pesquisadora do Grupo Interartes: Processos e Sistemas Inte-rartísticos e estudos de performance. Socióloga do Núcleo de pesquisa em história (UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil) Trabalha com estudos de Historia oral, Migraçao e Sensibilidades. Especialista em filosofia da linguagem e do pensamento (UNISINOS, São Leopoldo, RS, Brasil).Mestre em socio-

logia (UFRGS), Doutora em história (PUCRS, Porto Alegre, RS, Brasil).

This article intends to reflect about the PS Project carried out by the performance study group from Porto Alegre, Geperformancepoa.[1]. The PS Project holds two artistic propositions, PS and PS NETWORK, which came from the desire for communicability of the body in performance and from the search for an enlarged dimension of the relations in different spaces of connection.

PS surgiu como proposta de pesquisa, atendendo à convite da exposição Galeria Regresso , realizada

no Memorial do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, em 2011, e organizada pelo artista-curador

brasileiro Pablo Ferretti, cuja curadoria procurou redesenhar o conceito de Arte Postal, entendendo

pessoas como geografia, englobando questões como efemeridade e deslocamento. Pessoas como Geografia reu-

niu trabalhos da Inglaterra e vários pontos do Brasil como São Paulo, Goiânia e Uberlândia.

Os questionamentos do coletivo Geperformancepoa sobre deslocamento e efemeridade em performance,

atentou a possibilidade comunicativa do corpo e sua relação com o espaço. A investigação levou a pesquisa em

direção àquilo que o corpo poderia ter dito, ou que havia esquecido de dizer, ou seja, um caminho em direção

ao corpo em Post Scriptum. Mas de que forma o corpo poderia se fazer em ação revelando aquilo que ele havia

esquecido de dizer?

Optamos por construir uma proposta de apresentação do corpo em PS, em corpo pessoal, revelando-o parti-

cularizado e ao mesmo tempo, interligado aos corpos do coletivo.

A pesquisa sobre arte postal nos remeteu ao passado já que os meios de troca/comunicação eletrônicos são

mais imediatos e com certa impessoalidade, ou pessoalidade particularizada. Pensamos que necessariamente

poderíamos utilizar meios eletrônicos na nossa proposta mas que seria mais contundente remetermos as origens

da arte postal pois isso poderia gerar questionamentos quanto as mudanças dos meios de comunicação e de troca.

Um elemento acrescentou-se ao corpo como possibilidade de resgate do “ainda não dito” - máquinas de

escrever antigas. Com ela criamos quatro (4) variações de performance PS, particularizadas em nossas áreas

específicas de pesquisa.

Para falar do “ainda não dito”, Fernanda Stein (dança), criou Gavetas. Cartas de família de um tio falecido,

esperando um destino final, foram espalhadas sobre “sua máquina”, no piso do corredor, por onde necessariamen-

te o público passaria para ir até a sala de exposição, onde estava instalada a mostra Galeria Regresso. A performer

sentada ao chão, com uma lingerie delicada , antiga, reforçava a idéia de passado, memória, dor e separação.

Oferecia ao público a leitura intima de seu familiar querido.

PS (2011) Geperformancepoa . Memorial do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS. Performer Fernanda Stein

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Niura Borges (artes visuais) concebeu seu PS

em uma videoperformance denominando-a Um cor-

po através da janela. A proposta surgiu de um desejo

de captação da ação do corpo em performance e da

projeção simultânea em imagem vídeo, em tempo

real, na sala da exposição Galeria Regresso. Para

ação de performance, a artista escolheu como local, as escadarias de acesso ao último piso do memorial do Rio

Grande do Sul e ali escorregou seu corpo sobre os degraus, levando junto a máquina de escrever. A cada patamar

de escada se debruçava sobre a máquina tocando as teclas PS. A imagem desta ação foi captada em ponto de

vista da escada em abismo e projetada, através de pequena janela, localizada bem ao alto na sala de exposição.

“As janelas e sua localização, bem ao alto, me instigavam a utilizá-la, como forma de provocar o ponto de vista

do espectador, fazendo-o procurar para ver através da janela, provoca-lo na sua visualidade, intimando-o como

um explorador a andar para ver, a descobrir por si mesmo.” Olhando para a janela, o espectador curioso, pode ver

em tempo presente, a ocorrência da ação nas escadarias.

Este artigo faz uma reflexão sobre o projeto PS, executado pelo grupo de estudo de performance de Porto Alegre, Geperformancepoa. O projeto tem duas proposições artísticas: PS e PS Network, que foi criado por causa da comunicabilidade do corpo em performance e da busca por uma dimen-são maior das relações em diferentes espaços de conexão.

Palvras-chave: Projeto PS, Corpus, Rosemary Brum

Keywords: PS project, Corpus, Rosemary Brum

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PS (2011) Geperformancepoa . Memorial do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.videoperformer Niura Borges

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Patricia Soso (teatro) partiu da dificuldade de falar. Que coisas foram difíceis de serem ditas ou

escritas? A dificuldade da mesma maneira foi encontrada ao engolir algo. “Lembrei-me da expressão

‘engolir sapos’, tida como metáfora de impossibilidade de resolver, digerir certa situação.” O ‘nó na

garganta’ foi outra expressão encontrada que representava a relação da fala e a garganta, lugar onde

passa o som e também os alimentos. “Que alimento eu tenho dificuldade de comer? Pensei em uma

cebola. Uma cebola comida como se fosse uma maçã. E pimentões crus.” No momento da perfor-

mance, a artista carregava cebolas e pimentões e os colocava dentro de uma máquina de escrever. “Era

como se fossem as palavras que eu não conseguia dizer, eu decidi engoli-las. Comecei a descascar a

cebola e a comê-la. Aconteceu uma situação que não fora prevista. Meu organismo rejeitou a cebola,

e de um golpe expeli com um vomito o vegetal. Segurei na boca num reflexo e então decidi abrir um

pimentão e colocar dentro todo o conteúdo expelido, fazer um funeral num outro objeto e deixar que

repousasse.” Após essa ação involuntária a artista começou a falar as frases de PS. Que ela gostaria de

ter dito. E também cantou. “O canto expressa por meio lírico aquilo que também queremos dizer, mas

trata-se de assunto ‘ indigesto’.”

PS (2011) Geperformancepoa Memorial do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.

Performer Patricia Soso

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Rosemary Brum (sociologia) denominou seu PS O carteiro e o

poeta. Apresentou-se na sala de exposição arrastando uma máquina

de escrever sobre um longo manto de lã. A artista caminhava entre o

público enquanto retirava de uma sacola de correio e distribuía para

eles, cartas com instruções, enviadas pela performer londrina. Ao fi-

nal, abandonou o manto e as cartas não distribuídas, no chão, ao lado

de “sua máquina”. Durante toda a abertura da exposição, como um

oráculo, as pessoas, apanhavam as cartas e internalizavam as men-

sagens. A intervenção da performer Londrina convidada e discutida

durante a elaboração do trabalho foi integrada somente neste P S.

“Como jogos surrealistas, as “instruções” enviadas funcionaram

particularmente como uma forma de chain game chamada one into

another, propósito desses jogos englobaria as possibilidades de en-

contrar um caminho entre os nossos interesses e isso poderia ser a

performance em si.”

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94 95Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 90-100, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 90-100, 2011.

PS (2011) Geperformancepoa . Memorial do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.Performer Rose Brum

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Provocando o corpo à conexões em seu estado sensível e tangível, à exigência de sua comunicabilidade, nasceu PS REDE, em novembro de 2011, uma elaboração continuada, um desdobramento do PS, na qual o corpo expande sua dimensão territorial, circunscrito a comunicação restrita e atinge a relação de troca imediata e a posteriore, como performance além da linha do horizonte, centrada na comunicabilidade do corpo, ou sua potencialidade comunicativa, na troca.

A cotidiana e a massiva utilização das redes sociais como meio comunicador, incitou o coletivo a transpor para o mundo virtual o corpo em Post Scriptum. Na comunicação instantânea das redes sociais existiria possibi-lidades de construção de PS? O que haveria de performance em uma ação em rede social?

Como o PS, que deriva do post-scriptum pode também ser utilizado como uma estratégia retórica? Como funcionaria na rede social mais precisamente no facebook? Uma incógnita.

O que e como seria postado? Qual o tom da postulação? Solicitação? Súplica? Arrependimento? Memória? Desejo? Quais seria os sujeitos e objetos das postagens? Os atuantes são os que postam. E nós, o que seremos? Somos também pessoas que postam, mas de outra camada?

A investigação direcionou-se às camadas mais profundas: o que temos a dizer? Quando dizemos, o que que-remos dizer através de um meio eletrônico? Isso muda o dizer? Ao lerem os PS, haveria influencia mutua entre os participantes? Quantos PS uma pessoa poderia postar? Que imagem, escrita, som, música caberiam num PS? O excesso de informação da rede social aproxima a comunicação? A tecnologia da internet e rede social é um facilitador da interatividade? Qual o papel dos meios sobre as relações?

Com estas indagações projetamos, ‘ferramentas de trabalho’ que viabilizassem deslocamentos virtuais das postagens. Ela daria conta do “meio” de realização da performance e atendeu ao que situa como a “condição con-temporânea do artista”. Ou seja, como proposta de fluência, deslocamento e mobilidade como valores, venham a ser desenvolvidas tendo em vista a ação/intervenção. No nosso caso, na rede social Facebook.

Para tanto, criamos uma página específica no Facebook e denominamos COLETIVO GEPERFORMANCE-POA. Neste espaço virtual, abrimos o evento postando uma solicitação de participação no trabalho artístico e

enviando-a a alguns amigos. “Convidamos para um trabalho artístico colaborativo. No nosso endereço no facebook coletivo geperfor-

mancepoa você pode expressar o seu PS, postando em qualquer formato, imagem, som, música, escritos...”Junto ao convite e solicitação, postamos uma poesia de autoria do coletivo desenvolvida para o primeiro

projeto PS.

“Você gostaria de participar de um trabalho artístico ? VOCÊ QUER?

POSTE SEU PS!!

“antes que eu me esqueçaO que eu não disse

Quando não quero dizer mais nadaNão fui no local combinado

Houve um atrasoOu o texto era longo

e não caberia num postalou se você estivesse na frente do computador?”

Iniciada a postagem, ao mesmo tempo em que se iniciou a tro-ca de caráter informativo, explicando de que se trata o PS, entra-mos em uma zona de incertezas:

“Proposição na qual a ação performática localiza-se no des-locamento das relações na rede social, sobre as possibilidades de ações dos espectadores com vistas a compreensão de si próprios , através da construção de eventos e situações’”

Inicialmente não foi possível estabelecer se houve mútua in-fluencia entre os PS. Alguns participantes postaram mais de um P.S., outros solicitaram informações e outros não postaram.

A performer Rose Brum acompanhou intensamente o processo com cuidado e atenção. Tomou as ideias e as investigou a partir da Hermenêutica do Sujeito de Michel Foucault. A escuta e o olhar como possibilidades de cuidados de si, a possi-bilidade de recuperação do sujeito através da linguagem, sua transformação. Em vista disso será o FACEBOOK um templo dos deuses? Um oráculo que buscamos na rede? O PS é um “conhece-te a ti mesmo?

A epimeléia heautoû é o cuidado de si mesmo. Na meditação do autor, desde os gregos ao cristianismo a perspectiva da escuta e do olhar é uma noção que vem se ampliando. Designa uma certa perspectiva de estar no mundo. Implica em atenção, cuidado, um olhar e uma relação consigo mesmo e com o outro. Constitui um corpus importante para a história das representações, das teorias e das práticas de subjetividade.

Com as ideias de atenção e cuidado a performer acompanhou nos três turnos as postagens, mais interessada no aprendizado do processo do que no resultado possível, no produto que daí deriva.

“Produto implica a elaboração de um programa, normalmente de caráter documental, destinado a ter uma

distribuição formal a mais ampla possível; processo pelo contrário, implica uma atividade na qual se reduz ao

mínimo o intervalo de tempo que vai da produção do material a sua apresentação pública, assim como a distância

espacial que normalmente separa o lugar de produção do lugar de exibição. ”

Passou a sentir os PS em seu corpo. Incentivou e comentou, percebendo que a maior parte das postagens vinha de amigos pessoais que convidara. No geral, mantinha neutralidade, agradecendo as postagens sempre que ocorriam. As postagens ocorriam no endereço de e-mail pessoal, ou do coletivo. Talvez por desconhecerem o procedimento: postagem no “menu”. Essa alta subjetivação da plataforma do lado de “cá”- pela performer “res-pondente” influenciou a troca.

A relação entre a arte e as tecnologias não é nova, mas, com certeza, as novas tecnologias de produção de

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imagem atuais, incitam formas de relações e modos de percepção nunca vistas. A partir delas, pela relação homem-máquina se molda novos paradigmas na arte. Como nos diz Edmond Couchot:

“Uma nova técnica figurativa não conduz forçosamente a uma nova arte, mas faz surgir as condições de sua

aparição. Ela modela a percepção, age sobre o imaginário, impõe uma lógica figurativa, uma visão do mundo.”

A proposta pelo seu envolvimento direto com a tecnologia é atingida pelo conceito de reversibilidade, ou seja, uma mudança na qual um sistema e sua evolução não ocorrem pelo isolamento, mas sim, pela interação com outros sistemas e com as singularidades do humano. O compartilhamento produzido pela troca é capaz de gerar novos sistemas abrir novos territórios dentro de uma proposta de pesquisa.

Na expectativa de participação do convidado, como mais uma faceta do modo de nos revelarmos na rede, convidamos a visitar o blog do grupo. Entendeu-se a necessidade de uma atitude mais ativa, isto é, era preciso insistir, convocar.

Na sequência, o projeto tomou direções distintas. Da análise dos PS confidenciados ao projeto, fomos to-mados pela vontade de configurar nossos PS. Dar uma boca para essas escritas tornando-as mais vivas, mais atuantes. Como veríamos e sentiríamos um PS? Se apenas nos detivéssemos em uma boca que fala? Uma palavra dita e registrada? E se déssemos ‘corpo’ – boca, voz, pele – a essas palavras escritas? Optamos pela releitura de PS selecionados, reconfigurando-o em imagem movimento vídeo.

Not I – PS REDE (2011) GeperformancepoaPerformer Patricia Sosos

Frame vídeo - Niura Borges

Tomamos como referência para construção dos vídeos a peça de Samuel Beckett, Not I . A peça constitui-se de dois personagens: a boca e o ouvin-te. A boca fala em fluxo ininterrupto, palavras, pen-samentos, imagens, pois passou os últimos anos em silêncio. A verborragia é uma resposta, uma ação, um fazer, um reagir contra tudo, contra todos os

sistemas opressores e inibidores. É um grito que revela angústias, desesperos, medos, mas acima de tudo que quer reagir, que necessita ser.

Na gravação em vídeo do Not I do PS Rede, o corpo é recortado, enquadrado no espaço virtual da tecnologia. Sua presença em performance é intermediada pela máquina, um corpo tecnologizado atuante em performance pela presença em tempo real de gravação e presença em tempo diferido, conservando--se infinitamente. O plano de filmagem em close-up, focado na boca das performers, que pronunciavam o texto, retomou a corporeidade e singularizou-a, na sua particularidade íntima, boca personagem, boca sujeito.

O PS REDE enquanto vídeo quer colocar num mesmo grito todas essas palavras não ditas. Palavras essas que sozinhas não tiveram a força de serem proferidas. No texto das postagens coletivas acreditamos tratar-se de uns cem números de vozes, de bocas, de dores, de memórias, agora vivas através das nossas bocas registradas em imagem movimento.

O participante do PS REDE, ao acessar o PS Not I, ao mesmo tempo em que sente um estranhamento, se iden-tifica e se projeta sobre ela, fazendo de um fragmento de corpo, órgão emissor da fala, a boca, um personagem.

O que há de performance art aqui? Performance é a arte da ação por princípio, e se faz no campo prático do tempo presente. Ação implica em descrição, compreensão, interação, ética, moral. Tomamos aqui a concepção de Cohen (1999, p.225), que entende o fenômeno performativo “enquanto um momentum de passagem, da trans-missão da intervocalidade corpóreo-sinestésica, entre atuante, platéia na gesta e na fixação do fato e do texto cultural”. Cohen (1996, p.69) afirma que a performance “está apoiada numa tríade: linguagem (texto, narrativa), suporte (mídia) e atuação”.

O poder de criação do performer exige a convocação do corpo, da ação e do público. O tempo e o espaço de ocorrência, por sua vez, independem do controle direto do performer.

De que corpo estamos tratando no PS REDE? Corpo sígnico, corpo humano? Certamente próximo do mani-festo por Ponzio, Augusto, Calefato, Petrilli, Patrizia, Petrrilli ( 2007, p.239)

Entendemos o conceito de “corpo” em um duplo sentido: como matéria extra-sígnica e como “corpo huma-no” como já se viu, deve-se considerar a linguagem verbal como ancorada estreitamente na produção, troca e consumo sígnicos não verbais. Questão também parte constitutiva da realidade social: do simples gerir e posicio-nar-se do corpo humano às relações sexuais, à circulação de mercadorias, á comunicação de signos e sinais feitos de imagens, sons, cores, etc.

PS REDE engendrou, manipulou, explorou o campo prático, e ainda sugeriu um corpo cuja base se manifesta entre o material e o imaterial, e ainda pretendeu agir nele e através dele. Pensando como Mark Hansen:

Not I – PS REDE (2011) – GeperformancepoaPerformer Patricia Sosos

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“Nós não podemos mais confinar a corporificação ao corpo, não podemos mais contê-la dentro da pele

orgânica, porque as técnicas contemporâneas facilitam a distinção mundo-corpo (uma não divisão) que é fun-

damentalmente informacional em sua imaterialidade e porque a atividade humana corporificada é de alguma

maneira, o agente desta dissolução.”

A pergunta sobre como o público poderia interagir no espaço público das redes sociais proposto pelo PS REDE, via Facebook, sem transferir a responsabilidade e riscos da ação, que é do performer, para si foi em parte respondida, como veremos a seguir.

Constituir o Corpus do PS REDE tratou-se, pois, de uma proposição na qual a ação performática localizou--se no deslocamento das relações e redes. A proposta PS REDE realizada na rede de relacionamentos Facebook abordou possibilidades de ações do corpo e sua amplitude das ações em deslocamento sobre a possibilidade ampliada das relações de corpos no espaços. Transpusemos para o espaço virtual a demonstração do processo artístico e de pesquisa do grupo.

Percepção, presença, deslocamento, intercambio, mapas afetivos roteiros, psicogeografia (BRUNO, 2007) emocional ou sensível de todo modo estiveram entre as premissas do projeto P.S seguindo as pesquisas e traba-lhos já realizados pelo grupo desde sua formação (2009).

PS REDE foi pensado no sentido relacionado à nossa intenção: a experiência na extensão da rede social, do desejo de comunicação de uma sensibilidade não expressada ainda. Mas qual seria o novo sentido sendo a ação transposta para um domínio público exponencial, como a rede social. Seria compreendido? O sentido não seria a resultante da própria interação? Não sabíamos.

A performance - toda ela - está no campo da comunicação, o seu discurso se constrói nas relações e con-frontos que torna possível identificá-la como performance arte e não outra coisa. Na rede social, contando com inúmeras possibilidades expressivas, sem precedentes no campo artístico com um trabalho semelhante (daí o interesse da experimentação), como seria?

O PS REDE quis, pois, provocar o corpo à conexões de seu estado sensível e tangível, à exigência de sua comunicabilidade. O que há de performance no P.S. REDE? Esta foi a questão levantada pelo coletivo durante a elaboração do trabalho e tornou-se nosso desafio. O potlatch esclareceu-nos. Apaziguou no que buscávamos como veremos mais adiante. As relações em rede geraram uma potlatch, com espelhamento durante e ao fim, dos especatadores/actuantes.

Igualmente essa proposta de trabalho artístico em que a interação do espectador foi viabilizada através de solicitação à participação de uma experiência artística é concretamente realizável como performance art. Enten-demos que o Facebook faz parte da circulação de mercadorias simbólicas, são mensagens sígnicas de um meio eletrônico.

Acreditamos na força da palavra, na força ondulatória das ações que elas desencadeiam no tempo e no espaço. Este trabalho teve um caráter contaminador. Não por acaso usamos a terminologia biológico/virtual ‘vírus’ para nomear os efeitos destas ações performáticas. No decorrer dos meses de planejamento e execução das performances PS e PS REDE houve um crescente familiarizar-se com questões afetivas, tocadas pelas per-formances, que se traduziram em tomadas de decisões e observamos como a participação do público teve um caráter catártico.

E uma vez que propusemos um projeto em rede, pudemos perceber esta performance ressonar mais longe

e de maneira mais disseminada e livre. Percebemos como as pessoas falavam de si, de suas histórias, de suas

vivências. Ao publicarem seus P.S. elas abriram mão de suas individualidades, e talvez não sem esforço, e com-

partilharam estes pensamentos com outras pessoas.

Estas palavras que estavam presas, e tinham motivos para estarem no lugar onde estavam, apareceram com

uma vontade de serem ditas. Mesmo doces ou engraçadas, as palavras não foram colocadas ao acaso. Não se

tratava simplesmente de mensagens cotidianas, de avisos, de recados. Foram palavras pensadas. Cada vírgula

tinha o seu motivo de ser. Sentíamos a responsabilidade, a dor, a alegria, o humano sendo ‘materializado’ através

de caracteres numa página de uma rede social.

Com uma lógica de conexão que se estabelece compartilhada, gerando multiplicidades, com agenciamentos

internos próprios de cada sujeito participantes, mas sem limites, com conexão em todas as direções e dimensões.

Como o que nos propõe Deleuze e Guattari, na formação rizomática .

“...um rizoma não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo.

A árvore é filiação, mas o rizoma é aliança. A árvore impõe o verbo ‘ser’, mas o rizoma tem como tecido a con-

junção ”e. e...e...” Há nesta conjunção força suficiente para sacudir e desenraizar o verbo ser. ”

Uma formação multiplicante, onde o sujeito se instala no meio, em um tecido específico, construído pelo

exercício do corpo na atuação de postagem na rede Facebook. Como multiplicidades, sujeitos no exercício da

performance, ampliam seus corpos para além da linha do horizonte, atuantes como grandezas e dimensões que

não podem crescer sem a conexão, sem a partilha, sem o intercambio, sem a interação, sem a troca.

Semelhante ao potlatch. Potlatch é uma linguagem de troca para uma forma de linguagem não verbal em

que circulam relacionamento entre seres humanos. Marcel Mauss (1925) examinou como os métodos de troca

nas sociedades tidas como primitivas compreendia uma complexa rede de reciprocidades, intercambio e seria a

origem antropológica do contrato social. A palavra potlatch, que significa dar, era ritualizada em gestos de oferta

de bens e de riquezas. Incentivava uma espécie de competição, na medida em que os grupos sociais (tribos ou

famílias), no trocar e exibir dons de valor na ação conduzia a uma desigualdade subjacente. O sistema de trocas

era estabelecido porque o agraciado ao receber presentes, aceitava e obrigava-se à reciprocidade do gesto. Forma

não verbal, em chave semiótica o potlatch, em quantidade e a qualidade de dons trocados torna-se signo de uma

relação social desejada.

Potlatch foi o campo das interações mantidas pelos P S. Dádivas em forma e razão das trocas na rede social

onde:a. Artefato, produto e obra postados que o corpo visivo e o olhar soube despender sobre uma linguagem

cinésica , das cores, da escuta.

b. As relações em rede geraram espelhamento durante e ao fim, dos espectadores /atuantes.

c. Quanto ao Oráculo? No séc. XXI buscamos na rede.

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101Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

100Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 90-100, 2011.

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Recebido em 14 de Agosto de 2010. Aprovado para publicação em 17 de Novembro de 2011

Portinari, leitor de Quixote

Portinari is a Don Quixote reader

Célia Navarro FloresDoutorado em Letras pela Universidade de São Paulo, Brasil é Professora Adjunta da Universidade Federal de Sergipe, Brasil, atuando na graduação e no Programa de Pós-graduação em Letras (PPGL)

In this article we intend initially to show how the plasticity of Cervantes text collaborates with the task of the Illustrator, i.e. as Don Quixote is a book that is propitious to illustrate; in a second moment, we’ll discuss those formal elements of the designs and, finally, we’ll show a possible reading that Portinari makes of Cervantes’ work.

Quando pensamos na dupla Dom Quixote e Sancho Pança logo imaginamos um cavaleiro alto e ma-gro e um escudeiro baixo e gordo. O apelo visual do par é muito forte e isso se deve, a nosso ver, principalmente, graças à força plástica da escritura cervantina, que propicia ao leitor a visualização

das personagens e dos episódios narrados. Os protagonistas da história, juntamente com suas montarias, são apre-sentados ao leitor, de uma maneira muito visual, através da descrição de uma incerta ilustração, no capítulo nove da primeira parte do Quixote. Vejamos primeiramente porque consideramos essa ilustração incerta. O capítulo oito da primeira parte termina com o narrador interrompendo sua narrativa e alegando que não havia encontrado os escritos contendo a continuação da história de Dom Quixote. No início do capítulo nove, conta-nos o narrador que um rapaz queria vender-lhe alguns manuscritos árabes; como não sabia ler árabe, o narrador pede para que um mourisco os traduza. O tradutor abre o livro e começa a rir porque encontra uma anotação, na margem, que diz que Dulcinéia del Toboso tinha a melhor mão para salgar porcos como nenhuma outra mulher na Mancha. Ao ouvir o nome de Dulcinéia, o narrador reconhece ser aquela a continuação da história de Dom Quixote. Reco-nhecimento confirmado pela leitura do título da obra pelo tradutor. O narrador compra os manuscritos e pede ao mourisco que venha a sua casa para traduzi-los. Logo na seqüência, há a descrição da ilustração representando a cena interrompida no capítulo oito: a batalha do cavaleiro com o biscainho:

(...) Logo me apartei com o mourisco (...) e lhe roguei que me vertesse aqueles cartapácios, todos os que tratassem de D. Quixote, em língua castelhana, sem nada lhes tirar nem pôr, oferecendo-lhe em troca a paga o que ele quisesse. Contentou-se com duas arroubas de passar e duas fangas de trigo e prometeu traduzi-los bem e fielmente e com muita brevidade. Mas eu, para mais facilitar a tarefa e não dar de mão tão feliz achado, o levei a minha casa, onde em pouco mais de um mês e meio traduziu a história inteira, do mesmo modo que aqui se refere.

Neste artigo, pretendemos mostrar, inicialmente, mostrar como a plasticidade do texto de Cer-vantes colabora com o trabalho do Ilustrador. Como exemplo, podemos tomar o livro Dom Quixote, que é propício para ser ilustrado; num segundo instante, discutiremos estes elementos formais dos designs e finalmente, mostraremos uma leitura possível que Portinari fez do trabalho de Cervantes.

Palvras-chave: Dom Quixote, Portinari, Cervantes

Keywords: Don Quixote, Portinari, Cervantes

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102 103Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

Estava no primeiro cartapácio pintada muito ao natural a batalha de D. Quixote com o biscai-nho, postos na mesma postura que a história representa, levantadas as espadas, um coberto com sua rodela, o outro com o coxim, e a mula do biscainho tão vivamente que a tiro de balestra se via que era de aluguel. Trazia o biscainho escrito ao pé um título que dizia “D. Sancho de Azpetia”, que, sem dúvida, devia de ser o seu nome, e aos pés de Rocinante havia outro que dizia “D. Quixote”. Estava Rocinante maravilhosamente pintado, tão de longo e comprido, tão desmaiado e magro, com tanto espinhaço, tão héctico confirmado, que mostrava bem às claras com quanto avisamento e proprie-dade se lhe pusera o nome de “Rocinante”. Junto dele estava Sancho Pança, tendo seu asno pelo cabresto, aos pés do qual havia outro rótulo que dizia “Sancho Sancos”, e havia de ser porque, pelo que a pintura mostrava, tinha ele a barriga grande, o tronco breve e as pernas finas e longas, e por isso deve de ter recebido o nome “Pança” e de “Sancos”, que com essas duas alcunhas o chama por vezes a história. (CERVANTES, 2008, p. 134)

Quando o narrador diz “traduziu a história inteira, do mesmo modo que aqui se refere”, pressupõe-se que, na seqüência, teremos a tradução do livro. Porém, o que temos é a descrição de uma ilustração, fato que põe em dú-vida a existência do desenho. Não sabemos se no manuscrito, há de fato uma ilustração ou apenas sua descrição. Se houvesse o desenho, o narrador teria reconhecido ser aquela a história de Dom Quixote, porém ele só o faz quando ouve o nome de Dulcinéia. É claro que todas essas dúvidas e incertezas que acometem o leitor fazem parte do sutil jogo narrativo de Cervantes. De qualquer maneira, há a descrição de uma ilustração que faz com que o leitor visualize não apenas a referida “batalha”, mas, principalmente, as personagens cervantinas.

Dom Quixote já havia sido descrito fisicamente no primeiro capítulo: “Beirava o nosso fidalgo a casa dos cin-quenta. Era de compleição rija, parco de carnes, rosto enxuto (...)” (CERVANTES, 2008, 55). A descrição física de Sancho surge apenas na ilustração: “a barriga grande, o tronco breve e as pernas finas e longas”. No capítulo sete, Sancho é descrito apenas como um “lavrador seu vizinho, homem de bem — se é que tal título se deve dar a quem é pobre —, mas por demais crédulo” (CERVANTES, 2008, p. 113), porém, o sobrenome Pança já predis-punha o leitor a imaginá-lo gordo e barrigudo, imagem que é confirmada pela descrição da ilustração. Rocinante, por sua vez, é descrito também no primeiro capítulo: “Foi então ver seu rocim e, embora tivesse mais quartos que um real e mais tachas que o cavalo de Gonela, que “tantum pellis et ossa fuit”, le deu que nem o Bucéfalo de Alexandre nem Babieca, o de El Cid, a ele se igualavam”. (CERVANTES, 2008, p.59)

Sua descrição é confirmada pela suposta ilustração: “tão de longo e comprido, tão desmaiado e magro, com tanto espinhaço, tão héctico confirmado”. O cavaleiro dá-lhe o nome de Rocinante que era “significativo do que tinha sido quando rocim, antes do que era agora” (CERVANTE, 2008, 59). A imagem do pangaré fraco e doente também é confirmada pela ilustração, pois o cavalo “mostrava bem às claras com quanto avisamento e proprie-dade se lhe pusera o nome de “Rocinante””. Enfim, a incerta ilustração enfatiza — para o leitor que já conhecia a descrição do cavaleiro — as diferenças físicas entre os dois protagonistas e confirma as anteriores alusões à magreza de Rocinante e a barriga de Sancho. Podemos dizer, portanto, que além de um autor, provavelmente o Quixote possui também um ilustrador fictício.

É interessante observar que o escritor espanhol não se detém em descrições detalhadas de ambientes ou de personagens. A representação da luta entre Dom Quixote e o biscainho, por exemplo, é descrita de uma maneira concisa: em poucas linhas temos a batalha pintada “muito ao natural”.

A plasticidade do texto de Cervantes já fora apontada anteriormente por Helena Percas de Ponsetti, que fala

de uma linguagem visual, pictórica, presente na ficção cervantina, responsável pelo perspectivismo a que o leitor é submetido:

(...) Cervantes can be seen to develop his fiction along two levels simultaneously: a narrative level that abounds in action and in dialogue about lifestyles, ideals, and ethics, and a visual, pictorial level in which objects, forms, textures, and colors sustain, refute, qualify, or transform what is said or intimated. The reader’s perspective depends upon the degree of reaction to the visual language (...). (PONSETTI, 1988, p. 12)

A autora encontra, no texto do Quixote, “técnicas” usadas por pintores (Surrealismo, Expressionismo, Im-pressionismo):

Cervantes’s recourse to the techniques used by painters to revel his character’s innermost thou-ghts and feelings and to convey his own ideas and critical judgments supports his claim (voiced by Don Quijote) that the painter and the writer are one and the same: “el pintor, o el escritor, que todo es uno” (2:71). For his part, the narrator-editor confirms that the author “paints” rather than ex-pounds his thoughts (“pinta los pensamientos”[2:40]).

(...)Cervantes’s “painting” techniques are many and varied. They range from impressionistic-rea-

listic (naturalistic) descriptions of characters, actions, locations, and scenes, to expressionistic por-trayals and surrealistic conveyance of ideas. (PONSETTI, 1988, p. 13)

As personagens cervantinas foram inúmeras vezes representadas nas artes visuais como pinturas, desenhos e esculturas. As palavras de Sancho parecem ter sido proféticas quando, no capítulo setenta e um da segunda parte, diz: “Eu aposto (...) que antes de muito tempo não ha de haver bodega, estalagem nem pousada ou barbearia onde não ande pintada a historia de nossas façanhas” (CERVANTES, 2008, p. 819). No caso da ilustração, temos vários artistas famosos que ilustraram o Quixote de Cervantes: Doré, Dourmier, e Dalí entre muitos outros. As ilustrações que acompanham os textos literários possuem o poder de provocar tal impressão em nossa mente, de modo que se torna difícil desvincular o texto da imagem. Para Claus Clüver:

(...)as ilustrações são, entre outras coisas, interpretações que necessitam elas mesmas de inter-pretações; mas como quer que as leiamos, elas afetarão o modo como leremos os textos que ilustram, mesmo quando sua maneira de reescrita acaba na verdade por subverter os textos. Há críticos que tendem a considerar qualquer forma de ilustração como forma de subversão. (CLÜVER, 1997, p. 44)

Por outro lado, o pintor francês Henri Matisse, ao falar sobre ilustrações que realizou para um livro de poe-mas de Mallarmé, diz: “El artista plástico, para aprovechar al máximo sus posibilidades, debe tratar de no atar-se servilmente al texto. Por el contrario, debe trabajar libremente, tratando de enriquecer su propia sensibilidad con su contacto con el poeta que va a ilustrar” . (MATISSE, 1998, p. 264)

Depois, perguntam a Matisse o que é ilustrar um texto, e ele responde: “Ilustrar un texto no significa com-pletarlo. Si un escritor necesita de un artista para explicar lo que él dice, es porque ese escritor es insuficiente. Encontré escritores en cuyos textos no había nada que hacer: lo habían dicho todo . MATISSE, 1998, p. 265)

Parece-nos que, além do forte apelo visual das personagens e da plasticidade da escritura cervantina, outro motivo dessas múltiplas recriações é que no texto cervantino “não está tudo dito”, usando palavras de Matisse. É um texto polissêmico, que propicia múltiplas leituras e interpretações.

Dado o exposto, podemos considerar que, os ilustradores — enquanto leitores da obra de Cervantes — ex-

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pressam suas leituras por meio da gravura realizada. É o que ocorre com a série Dom Quixote de Portinari, da qual podemos inferir uma leitura particular do pintor.

A leitura de Portinari

Como vimos, a polissemia das imagens verbais, os paradoxos, as ambigüidades, as contradições, o perspec-tivismo, enfim, o jogo narrativo cervantino (que coloca o leitor numa zona de intersecção entre o sonho, a imagi-nação e a realidade), colabora para as inúmeras interpretações da obra. Um exemplo disso é a série de desenhos que Portinari realiza para ilustrar o Dom Quixote de Cervantes. Nessa série, há um grande número de desenhos sobre episódios cujas fronteiras entre o real e o irreal são tênues: a aventura dos moinhos de vento, na qual o cavaleiro vê gigantes onde há moinhos; o episódio do ataque às ovelhas, no quando o cavaleiro vê uma batalha entre dois poderosos exércitos onde há apenas carneiros; o episódio da Dulcinéia encantada, no qual o escudeiro leva o cavaleiro a crer que três lavradoras são Dulcinéia e duas damas; o encontro com os duques, no qual Dom Quixote e Sancho Pança são tratados como se fossem, de fato, cavaleiro e escudeiro, quando, na verdade, não passam de bobos de corte nas mãos da aristocracia ociosa; a aventura de Clavilenho, na qual o cavalo de madeira está no chão, enquanto os ginetes imaginam-se no céu; a ilha de Baratária, onde Sancho imagina-se governador sendo apenas um joguete nas mãos dos duques.

A descrição feita de Sancho e de Rocinante, na ilustração da batalha com o biscainho, poderia servir bem para descrever estas personagens nos quadros de Portinari, nos quais vemos nas costas de Rocinante as marcas de seus ossos, devido à magreza; Sancho é muito gordo, com uma barriga imensa, principalmente no quadro “Dom Qui-xote consultando o macaco” (fig.1), em que ele aparece de perfil. Na cena descri-ta pelo ilustrador fictício, estão presentes os dois animais: Rocinante e o asno de Sancho, assim como nas ilustrações de Portinari, as montarias, além de outros animais, estão presentes em quase todos os quadros.

Figura 1

“D. Quixote consultando o macaco”

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Dos vinte e um desenhos, os eqüinos aparecem em dezesseis, sendo que em muitos dos quadros há uma es-pécie de humanização de ambos. Em “Dom Quixote fazendo penitência de amor”, tanto o cavalo quanto o burro viram a cabeça, desviando os olhos da figura de Dom Quixote nu, como se sentissem vergonha ou quisessem demonstrar respeito pelo cavaleiro. No quadro “Dom Quixote e Sancho Pança prosternados diante de mulheres a cavalo”, Rocinante também abaixa a cabeça, em sinal de reverência, diante da suposta Dulcinéia. Em “Dom Qui-xote cavaleiro andante”, enquanto o cavaleiro está ajoelhado, dando a impressão de que reza, Rocinante mantém a cabeça baixa, como se também rezasse.

Temos ainda a presença de outros animais. Em “Sancho Pança atende ao chamado de Dom Quixote”(fig.2), há alguns bois e ovelhas que parecem ajoelhados como Dom Quixote e há um macaco, em “Dom Quixote consul-tando o macaco”. Chama-nos a atenção, o cão assistindo ao “manteamento” de Sancho, pois, segundo o narrador, o “manteamento” era praticado com os cães no carnaval. No quadro, há uma inversão: Sancho está no lugar do cão, que o assiste com interesse.

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Figura 2

“Sancho Pança atende ao chamado de Dom Quixote”

Outro elemento na série que nos chama a atenção é a ênfase na figura de Sancho, principalmente nos desenhos correspondentes à segunda parte do livro de Cervantes. Dos onze quadros, Sancho aparece em dez; sendo que em dois ele está desacompanha-do de Dom Quixote: “Sancho Pança deitado” e “Sancho Pança dormindo no burro”.

Em “Dom Quixote consultando o macaco” Sancho está em primeiro plano, assim como no quadro “O sonho azul de Sancho Pança”. Em “Sancho Pança dormindo no cavalo e venerado pelo povo”, o escudeiro

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106 107Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

é adorado como se fosse um deus. Os aldeões de Baratária estão prosternados diante de Sancho e há uma perso-nagem com a cabeça baixa, expressando respeito, que traz nas mãos a chave da cidade sobre uma faixa de tecido, como se fosse uma relíquia sagrada, para entregar ao escudeiro. Sancho aparece sobre um cavalo adornado, e dá-nos a impressão que Sancho está enorme, inchado, quase não conseguimos ver-lhe seu rosto. É como se ele estivesse inchado de orgulho, de soberba. A perspectiva pela qual é apresentado seu corpo sugere-nos ainda que nós também o estamos venerando. É como se o observador do quadro estivesse ajoelhado vendo Sancho sobre o cavalo (fig. 3).

Figura 3

“Sancho Pança dormindo no cavalo e venerado pelo povo”

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org.

brDevemos lembrar também que, nos desenhos correspondentes à primeira parte, há o manteamento de San-

cho, no qual este aparece em primeiro plano. Parece-nos que Portinari tem uma simpatia pela figura de Sancho e impressiona-se com a evolução da personagem na segunda parte do Quixote. Entendemos que há dois motivos principais para esta identificação com Sancho. Primeiro, Sancho Pança é um homem do campo, um lavrador, é um representante da classe social tantas vezes retratada por Portinari. Segundo, o próprio pintor teve origem humilde, saiu de sua pequena cidade do interior e atingiu a fama, o prestígio internacional.

Outro quadro que nos chama a atenção e afigura-nos fundamental para compreender a interpretação feita por Portinari é o último da série. Nele, verificamos que Dom Quixote morre vestindo armadura, diferentemente do livro de Cervantes, no qual a personagem falece em sua cama, após recuperar a lucidez e voltar a ser Alonso Quijana. Entendemos que, para o pintor, Dom Quixote é o eterno cavaleiro. Outro detalhe, neste quadro, que nos

chama a atenção é a presença de dois personagens brigando ao lado do cavaleiro morto, uma referência ao trecho do Quixote, quando o narrador diz que Cide Hamete não quis dizer onde nasceu o cavaleiro para deixar que as vilas disputem entre si o privilégio de tê-lo como seu cidadão:

Este fim teve o engenhoso fidalgo de La Mancha, cujo lugar no quis declarar Cide Hamete, para deixar que todas as vilas e lugares de La Mancha brigassem entre si para afiliá-lo y tê-lo por seu, como brigaram as sete cidades da Grécia por Homero. (CERVANTES, 1998, p. 846)

É curioso o pintor ter destacado este fato, aparentemente, secundário. Nessa série de desenhos, Portinari traz um aspecto fundamental da obra de Cervantes: o intrincado jogo de

oposições que vai desde a concepção física e psicológica das personagens até a delicada relação entre a realidade e a irrealidade ou o sonho. Portinari lança mão de alguns recursos para reproduzir tais oposições: a maneira como concebe as personagens fisicamente, as cores e as relações entre plano de fundo e primeiro plano. Entretanto, assim como na obra de Cervantes, as oposições não estão compartimentadas; elas, na maior parte das vezes, imbricam-se e confundem-se.

No Quixote de Cervantes, as duas personagens apresentam uma série de oposições: Dom Quixote é ma-gro, solteiro, letrado, fidalgo, enquanto Sancho é gordo, casado, analfabeto, camponês. Portinari enfatiza essas diferenças recriando um Dom Quixote extremamente magro e um Sancho extremamente gordo. A concepção física do cavaleiro destaca-se da dos demais personagens retratados. Dom Quixote assemelha-se a um boneco articulado, a um títere, um inseto, ou, como aponta Fabris, “parece pertencer mais ao reino das aparições do que à ordem terrena”:

O aspecto etéreo dado à figura de D. Quixote pode ser considerado um recurso expressivo de que o artista lança mão para criar um contraponto entre o devaneio do fidalgo e o princípio de realidade que domina os demais personagens do enredo visual. Tudo em D. Quixote é diferente do resto da hu-manidade: a figura ossuda, magra e vermelha, de olhos arregalados, cabelo, barba e bigode em de-salinho, parece pertencer mais ao reino das aparições do que à ordem terrena. (FABRIS, 1996, p. 28)

Podemos observar ainda na caracterização do cavaleiro, um elemento curioso: o elmo. O objeto que o Dom Quixote de Portinari tem sobre a cabeça, desde o segundo quadro, é o elmo de Mambrino. No capítulo XXI, da primeira parte, Dom Quixote e Sancho encontram um barbeiro e, ao ver sua bacia, o cavaleiro afirma que aquilo é o elmo de Mambrino. Após lutar e vencer o barbeiro, o cavaleiro apossa-se de sua bacia. No final do capítulo quarenta e quatro, na venda de Juan Palomeque, cavaleiro e escudeiro reencontram o barbeiro, que lhes exige a bacia de volta. Dom Quixote continua afirmando que aquilo não era uma bacia, mas sim o elmo de Mambrino e se nega a entregar-lhe o utensílio. Nessa altura, Sancho utiliza a palavra “bacielmo” para designar aquele ins-trumento que era bacia e ao mesmo tempo elmo. A imagem do “bacielmo” é bastante significativa no contexto da obra cervantina, pois justapõe uma simples bacia de barbeiro a um elmo de “ouro puríssimo”. No Quixote, o cavaleiro só obtém este objeto no capítulo vinte e um da primeira parte, portanto, ele não o poderia estar usando no quadro que representa sua sagração ou no referente ao manteamento de Sancho (cap. dezessete da primeira parte). Porém, o elmo de Mambrino, em nosso modo de ver, representa a confluência do grotesco com o sublime e é um elemento bastante representativo da loucura quixotesca (usar uma bacia sobre a cabeça dizendo que é elmo), esse objeto — ao lado dos moinhos de vento — passou a ser uma das marcas identificadoras na iconografia da personagem e foi, com propriedade, utilizada pelo pintor brasileiro.

Nos desenhos de Portinari, os contrastes não se limitam à concepção das personagens, mas encontram-se também no âmbito das cores. As duas cores predominantes, a amarela e a azul, são consideradas opostas: a ama-rela é tida como a mais quente das cores, enquanto a azul é a mais fria. Fabris aponta precedentes na utilização dessas cores em outros trabalhos de Portinari:

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108 109Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

O intenso cromatismo da série, na qual predominam amarelos e azuis, o desenho, não raro ingênuo em suas simplificações expressivas denotam outro momento da trajetória artística de Por-tinari, transposta para a interpretação das aventuras do cavaleiro espanhol. A saturação cromática que caracteriza o conjunto não deixa de ter parentesco com obras como A primeira missa no Brasil (1948), na qual o amarelo em vários matizes é a nota dominante da composição, os painéis Guerra e Paz (1952-1956), nos quais predominam azuis e amarelos, alguns desenhos da série Israel (1956) e algumas experiências com a abstração geométrica ensaiadas naquele mesmo período. (FABRIS, 1996, 28)

É interessante observar que, nos painéis Guerra e Paz, o pintor também utiliza essas duas cores de maneira opositiva: no painel Guerra predominam os azuis, enquanto que no painel Paz há predominância do amarelo.

Simbolicamente, a cor azul está relacionada ao céu, à imaterialidade, à pureza, à irrealidade e à elevação. Na maioria dos desenhos da série observamos que há um quadrado azul envolvendo a cabeça de Dom Quixote; é como se sua cabeça estivesse no céu, nas nuvens. Esta cor estaria simbolizando o sonho, os nobres ideais qui-xotescos. A partir de um determinado momento, o azul começa a envolver também a cabeça de Sancho, como se ele fosse sendo contaminado pelos ideais do cavaleiro, como podemos observar no quadro “Dom Quixote às cambalhotas” (fig.4).

Figura 4

“Dom Quixote às cambalhotas”

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Com relação aos diferentes planos dos desenhos, chama-nos a atenção o plano de fundo caracterizado pelo

predomínio do amarelo e do abstracionismo que se opõe e se confunde com o figurativismo do primeiro plano.

Mário Dionísio, citando Luraghi, fala sobre este recurso utilizado anteriormente pelo pintor:

Eugenio Luraghi, falando sobre a pintura de Portinari, chamou a atenção para a importância da formação

dos fundos com elementos geométricos que se entrecortam — melhor diríamos: entrecruzam — e invadem por

vezes os primeiros planos, numa técnica que “parece trazer para o campo do real a pintura abstrata”. (DIONÍSIO,

1963, p. 35)

Tal recurso parece borrar os limites entre o real e o irreal, como por exemplo no quadro “Sancho Pança atende

ao chamado de Dom Quixote”: o plano de fundo é uma parede, na qual Sancho estaria encostado ou é o mesmo

amarelo dos outros quadro, que não tem nada a ver com uma parede? E em “Sancho Pança servindo de diversão

para os aldeões”, o retângulo atrás do burro é uma porta ou faz parte do abstracionismo do plano de fundo (fig. 2)?

Fabris aponta os fundos amarelos vangoguianos como um elemento que destaca a irrealidade dos episódios:

“Em alguns fundos amarelos da série, Portinari evoca o traço espesso e sulcado de van Gogh e o movimento de

seus céus, talvez para melhor sublinhar o caráter irreal dos episódios narrados” (FABRIS, 1996, p. 30).

Chama-nos a atenção o fato do plano de fundo não variar de acordo com o tempo, isto é, ele permanece

amarelo independentemente de ser dia ou noite. O dia nos é sugerido pela presença do sol, como, por exemplo,

no quadro “Dom Quixote e Sancho Pança saindo para suas aventuras”. A noite pode ser percebida pela presença

da lua no fundo amarelo, como no quadro “Dom Quixote deitado e aldeões disputando”. Notamos ainda que há

uma escassez de paisagem; na maioria dos quadros as personagens estão sobre esse fundo amarelo com desenhos

geométricos. Tais recursos colocam as personagens num contexto atemporal e atópico, pois embora tenhamos a

presença do sol e da lua, esses elementos não interferem no contexto. A escassez de paisagem impossibilita-nos a

localização geográfica das personagens, sugerindo-nos que elas poderiam estar em qualquer lugar.

Outro expediente que colabora na criação dessa zona intermediária entre sonho e realidade é a representa-

ção das personagens que, em alguns quadros, ocupam posições fisicamente impossíveis. Citemos dois quadros:

“Dom Quixote arremetendo contra os moinhos de vento” e “O sonho azul de Sancho”. No primeiro, o corpo do

cavaleiro forma um ângulo, dando-nos a impressão de estar partido ao meio. No segundo, Sancho pendurado no

galho parece flutuar, contrariando a lei da gravidade.

“Dom Quixote e Sancho Pança no cavalo de pau” (fig.5) é outro quadro bastante representativo do jogo de

oposições criado pelo pintor. Nele encontramos: o dia, à direita, e a noite, à esquerda, o sol e a lua, o gordo e o ma-

gro, o céu e a Terra. Além disso, no episódio correspondente, existem dois planos: o da realidade — cavaleiro e

escudeiro estão, de fato, no jardim, sentados sobre um inerte cavalo de madeira — e o da imaginação — os perso-

nagens acreditam estar voando. Portinari representa o cavalo em pleno vôo, sobrepondo a imaginação à realidade.

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110 111Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

http://www.portinari.org.br

Figura 5

“Dom Quixote e Sancho Pança no cavalo de pau”

Sobre este desenho, Annateresa Fabris diz:

(...) o caráter irreal da cena descrita por Cervantes, com o magro fidalgo a evocar “uma figura de tapeçaria flamenga, pintada ou tecida nalgum triunfo romano”, ganha uma interpretação lírica de Portinari. O cavalo, definido por zonas geométricas, alça-se num céu simultaneamente diurno e noturno, no qual o azul e o amarelo se fundem harmonicamente, criando duas grandes áreas de saturação cromática. Citação do cavalo de Guernica, Clavilenho, branco e cinza, carrega na garupa um D. Quixote que mais parece um gafanhoto com sua carapaça negra, quase desencar-nado, e um roliço Sancho Pança, aviltado pelo medo e reduzido quase a bola. A credulidade de D. Quixote, o domínio absoluto do ideal sobre o real, a ponto de não perceber a burla de que era alvo, aglutinam-se nessa que é provavelmente a ilustração mais expressiva da série. Nela Portinari pa-rece enfeixar sua visão irônica e carinhosa do cavaleiro, que acredita no sonho e não percebe que o vôo é apenas fruto da imaginação e de alguns truques baratos. Concentrando a representação no momento da mais pura ilusão, o pintor faz interagir cavalo e cavaleiros numa composição de-finida horizontalmente, tanto pela distensão do primeiro, captado no momento do galope, quanto pela lança de D. Quixote que amplifica as linhas direcionais do desenho ao enfatizar a abertura do campo visual à esquerda. O efeito de tapeçaria de que fala Cervantes pode ser encontrado no tratamento bidimensional dado à cena, na qual fundo e primeiro plano constituem uma dimensão única, a sublinharem ainda mais a irrealidade da situação. (FABRIS, 1996, 28)

Outro elemento do Quixote que também está presente nos desenhos é a comicidade. Os desenhos têm um

tom alegre, divertido e ingênuo. Em carta para Flávio Motta, o pintor declara: “Para descansar, estou ilustrando

o Dom Quixote, o que me tem divertido muito.” (Apud FABRIS, 1996, p. 27). Talvez porque o lápis de cor o

remetesse a sua infância; segundo Drummond, o pintor dizia: “— Gosto de lápis de cor. Lembra meu tempo de

menino.” (ANDRADE, 1974).

A técnica escolhida, desenho com lápis de cor, deveu-se ao fato de Portinari encontrar-se proibido pelos mé-

dicos de utilizar tintas à base de sais de chumbo, devido a uma intoxicação causada por esse material. Talvez essa

escolha tenha determinado em certa medida a leitura que o pintor realiza da obra cervantina, pois ao remetê-lo

a seu “tempo de menino” e considerar o Quixote uma obra divertida, o artista enfatiza o lado ingênuo de Dom

Quixote e seu escudeiro.

Como vimos, Annateresa Fabris fala da ingenuidade do desenho portinariano: “o desenho, não raro, ingênuo

em suas simplificações expressivas”, em outra ocasião, a autora aponta o aspecto naïf da série:

A série Dom Quixote caracteriza-se por um sutil equilíbrio de amarelos e azuis alçados a suas notas mais vibrantes. O desenho propositalmente naïf contrapõe um esguio Dom Quixote a um ro-busto Sancho Pança, cuja corporeidade não é definida através de linhas, mas pelo uso magistral da cor. (FABRIS, 1990, 65)

O ludismo comparece em várias instâncias. Há exemplo disso na caracterização de alguns personagens: Dom

Quixote assemelha-se a um boneco articulado ou a um inseto animado; Rocinante, que segundo Fabris, possui

“o aspecto de um brinquedo de encaixe” (FABRIS, 1996, p. 28); Clavilenho, pela posição de suas patas e de sua

cabeça, lembra-nos um cavalinho de carrossel; e Ginés de Passamonte em “Dom Quixote consultando o maca-

co” assemelha-se a um pirata que trocou o tradicional papagaio por um macaquinho. Também a recorrência de

diversos animais (bois, cavalos, burro, cão, macaco, javali, ovelhas) nos remete à ingenuidade do mundo infantil.

Gostaríamos, inclusive, de lembrar a importância da temática da infância na obra de Portinari. Vários são os

quadros nos quais são representados jogos infantis e crianças com animais.

Muitos dos episódios selecionados por Portinari são cômicos e são representados de uma maneira divertida.

No quadro “O sonho azul de Sancho”, além do fato do escudeiro estar flutuando, o javali assiste à cena. Em “Dom

Quixote às cambalhotas”, temos o cavaleiro praticando um ato bastante relacionado com as brincadeiras infantis:

a cambalhota; além disso, a representação da personagem com as nádegas desnudas é cômica. Há também uma

série de episódios nos quais as personagens caem, sofrem agressões físicas ou fracassam em suas aventuras. Em

“Dom Quixote arremetendo contra o moinho de vento”, “Dom Quixote arremetendo contra as vacas” e “Queda

de Dom Quixote e Sancho Pança dormindo”, temos o momento exato da queda das personagens. No episódio do

“manteamento” de Sancho (Fig. 2), um dos mais divertidos do Quixote, o próprio cavaleiro mal consegue conter

o riso diante da cena. No quadro, o escudeiro é representado em pleno vôo e o cavaleiro espia semi-oculto por

uma parede. No episódio da luta com as ovelhas, Dom Quixote é apedrejado, quebra os dentes e recebe o epíteto

de Cavaleiro da Triste Figura. No desenho, em “seqüência de derivação cinematográfica”, temos o momento em

que o cavaleiro entranha-se no rebanho de carneiros. O quadro assim é descrito por Fabris:

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112 113Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 101-113, 2011.

A cena do ataque às ovelhas, por ser resolvida bidimensionalmente, cria uma imbricação entre D. Quixote e os animais, que traduz eficazmente a imagem proposta por Cervantes do cavaleiro que “se entranhou” pelo rebanho e “começou a alancear nelas, tão denodado como se desse em verda-deiros inimigos mortais”. A entrada rebanho a dentro é articulada num esquema cruciforme, domi-nado pela vertical constituída por D. Quixote à qual se sobrepõem três verticais menores (Sancho Pança e dois pastores), que possibilitam visualizar o desenrolar do episódio em vários momentos sucessivos — a admoestação do escudeiro, o ataque ao rebanho, o revide dos ovelheiro —, numa seqüência de derivação cinematográfica. (FABRIS, 1996, p. 28)

Chamamos a atenção também para o quadro “Sancho Pança armando Dom Quixote”, no qual o estrangula-

mento do cavaleiro com o rosto azul remete-nos às brincadeiras de palhaços de circo ou às brigas de personagens

de desenhos animados.

Enfim, encontramos no Quixote de Cervantes, um intrincado jogo de oposições: a caracterização tanto física

quanto psicológica das personagens, a dicotomia entre sonho e realidade, mentira e verdade, popular e erudito e

outras. Portinari recria essas oposições na representação física dos protagonistas; no uso de cores contrastantes

como o amarelo e o azul e na coexistência de diferentes manifestações estéticas, como o figurativismo do primei-

ro plano que se opõe ao abstracionismo do plano de fundo. Porém, o sonho e a realidade, assim como na obra de

Cervantes, não são categorias estanques, mas interligadas. Nos quadros de Portinari são os desenhos geométricos

do plano de fundo que parecem saltar e mesclar-se com o real do primeiro plano. Realidade que não é tão real

assim, pois em algumas cenas as personagens parecem desafiar as leis da gravidade ou a anatomia humana. As

personagens parecem descontextualizadas, vivendo num ambiente de sonho, irreal, atópico e atemporal, efeito

produzido principalmente pelo constante fundo amarelo e geométrico. Além disso, o Cavaleiro da Triste Figura

traz sobre a cabeça o elmo de Mambrino, um objeto que é simultaneamente elmo e bacia, que conjuga o sonho

com a realidade, o sublime com o grotesco. A comicidade, outro aspecto fundamental do livro cervantino, é re-

produzida no Dom Quixote de Portinari, porém pelo viés do ludismo ingênuo e infantil.

Referências

ANDRADE, Carlos Drummond. “Portinari falando”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26.nov.1974.

CEVANTES SAAVEDRA, M. de. O engenhoso cavaleiro Dom Quixote de La Mancha. Tradução de Sérgio

Molina. 4º ed. São Paulo: Editora 34, 2008.

CLÜVER, Claus. “Estudos Interartes” in Literatura e Sociedade. Revista de Teoria Literária e Literatura

Comparada. N° 2, 1997, pp. 37-55.

DIONÍSIO, M. Portinari: 1903-1962. s.l.p.: Artis, 1963.

FABRIS, Annateresa. Portinari leitor (Catálogo). Museu de Arte Moderna, 1996. pp. 27-28.

_________________. Portinari, pintor social. São Paulo: Perspectiva, 1990.

FLORES, C. N. Carlos Drummond de Andrade: Cavaleiro de Tristíssima Figura, São Cristovão, EDUFS,

2008.

FLORES, C. N. Dois quixotes brasileiros na tradição das interpretações do Quixote de Cervantes. Tese de

doutorado, Universidade de São Paulo, 2007.

MATISSE, Henri. Reflexiones sobre el arte. Buenos Aires: Emecé, 1998.

PERCAS DE PONSETTI, Helena. Cervantes the writer and painter of ‘Don Quijote’. Columbia: University

of Missouri Press, 1988.

Ilustrações:

Portinari, Candido. “Dom Quixote consultando o macaco” (fig.1). Disponível em:

http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_1218.JPG . Acesso em: 25.ago.2011.

Portinari, Candido. “Sancho Pança atende ao chamado de Dom Quixote” (fig.2). Disponível em:

http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_1231.JPG. Acesso em 25.ago.2011.

Portinari, Cândido. “Sancho Pança dormindo no cavalo e venerado pelo povo” (Fig. 3). Disponível em:

http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_1225.JPG. Acesso em 25.ago.2011.

Portinari, Candido. “Dom Quixote às cambalhotas” (fig.4). Disponível em:

http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_1221.JPG . Acesso em: 25.ago.2011.

Portinari, Candido. “Dom Quixote e Sancho Pança no cavalo de pau” (fig.5). Disponível em:

http://www.portinari.org.br/IMGS/jpgobras/OAa_1227.JPG. Acesso em: 25.ago.2011.

Recebido em 11 de Setembro de 2011. Aprovado para publicação em 18 de Novembro de 2011

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114 115Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011.

WE ARE YOU, US Latinization’s Next Wave:

ESTABLISHING A “NEW” DIRECTION FOR 21st CENTURY LA-TINO ART IN THE USA: (The Ground-breaking Emergence of

the We Are You Project’s WAY IT’S Art Exhibition)

Dr. José Manuel Rodeiro, MFA, Ph.D. (Coordinator of Art History, Art Department, New Jersey City University, NJ, EUA)

From its inception in 2005, New York City’s We Are You Project (WAY) has been a revolutionary

Latino socio-artistic phenomenon ripe with both national and global implications, using art to shed

light on five pertinent 21st Century Latino themes: 1). Latino immigration, 2). Latinization, 3). the

current Anti-Latin backlash, 4). The rise of Pan-Latino transculturalism, as well as examining 5). Latino identity

in the 21st Century. Also, motivating the We Are You Project are recent US Census figures, which indicate

that after 2050 CE, the US-Latino population will represent 51% of the total US-population. Wisely, WAY ap-

prehends the inevitability of Latino population growth, realizing that it will occur despite the height-and-length

of ridiculous billion-dollar barbed-wire topped fences and walls along the Rio Grande and the Sonoran Desert.

The reaching of a 51% majority status after 2050 CE will redefine or reclassify Latino culture and Latino art

as America’s dominant “mainstream culture and art.” This glaring US socio-cultural inevitability is known as

Latinization, whose greatest manifestation will be felt economically, in terms of Latino buying power; as well

as politically, as Latinos assume greater political-awareness and activism. Already, Latinization is apparent in

the arts (i.e., movies, music, dance, visual art, and other art-forms), fulfilling the enlightened prophecy made in

1987 by art-critic Barbara Rose in New Criterion magazine, where she claimed that Latino Art is, “Among the

best art being done in America.” Today, as manifested by the We Are You Project’s daring artistic initiatives,

Rose’s assertion remains a farsighted and accurate observation. Yet, as a “way” (by means of art, culture, and

creativity) for Latinos to address immigration, Latinization, Anti-Latino ethno-racism, pan-Latin transcultural-

ism and Latino identity, the We Are You Project did not arise over-night from thin-air, rather WAY’s post-2005

legacy can be traced to America’s socio-political struggles for civil rights, tolerance, and freedom spanning from

the late-18th Century until now.

As a “way” to spotlight the contributions of US-Latinos within America’s (1776 until now) history of

socio-political struggle for civil rights, tolerance, and freedom, the We Are You Project has initiated a landmark

artistic initiative; selecting and presenting key Latino artists and art-works for a global-venture known as the We

Are You International Traveling Show (WAY IT’S), which has garnered a comprehensive array of art-works

done by major contemporary Latino artists, reflecting ancestral heritages from over a dozen Latin American na-

tions. Most importantly, these selected artists examine or exemplify difficult 21st Century Latino concerns, i.e.,

immigration, Latinization, discrimination, pan-Latin transculturalism, cultural identity as well as recent examples

of growing US ethno-racism. Behind these problematic Latino concerns, their contextual impetus ensues from

eight (8) key Latino socio-political and art historical events, affecting every Latina/o living in the USA. The

primary sources of WAY IT’S subject matter and iconology are these eight decisive “US-related” socio-political

and art historical events, which include: 1). The fact that Frédéric Bartholdi’s “Statue of Liberty” was influenced

by Edouard de Laboulaye’s symbolic interpretation (or analysis) of the US The Bill of Rights. 2). The recent

bevy of unconstitutional Latino immigration laws (e.g., Arizona, Alabama, Georgia, South Carolina, and other

states) that have unjustly targeted Hispanics. 3). The 14th Amendment’s “untapped” inherent potential to pro-

vide civil-rights protection to Latinos, as well as basing current Hispanic needs for civil rights upon the sterling

example of Dr. Martin Luther King and the Southern Christian Leadership Conference’s (SCLC’s ) struggles for

Frédéric Bartholdi’s “Statue of Liberty”

O presente trabalho teve seu início em 2005, quando nós da New York City’s We Are You Project

(WAY), revolucionário fenômeno sócio-artístico Latino com implicações a nível nacional e global, usavamos a arte para lançar luz sobre cinco temas pertinentes ao século 21 Latino: 1). Imigração latina, 2). Latinização, 3). a corrente reacionária anti-latino-, 4). A ascensão do Pan-Latino trans-culturalismo e seus efeitos 5). Identidade latina, no século 21

The present work has been initiated in 2005, when we, from New York City’s “We are You” project (WAY) - the latin socio-artistic revolutionary phenomenom with national and global implications - used art to shed light about five pertinent themes to the 21th latin century: 1). Latin Immigration, 2). Latinization, 3). The reactionary anti-latin current, 4). The ascencion of the Pan-Latin transcultura-lism and its effects, 5). Latin Identity on the 21th century.

Palvras-chave: Projeto We Are You, Imigração e Identitade Latina

Keywords: We Are You Project. Latin Immigration and Identity

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116 117Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011.

African-American civil rights in the late-1950s and throughout the 1960s. 4). The Pro-Latino implications of the

1954 Supreme Court ruling known as Pedro Hernandez v. The State of Texas. 5). since 1992, the rise of “Lati-

nization.” 6). The official 1992 national US celebration of 1492’s Quincentenary. 7). The 1977 rise of Latino

Postmodernism and 8). current 21st Century pan-Latino transculturalism. These eight socio-political and artistic

“ideas”/”events” comprise the We Are You International Traveling Show’s prime motivations.

The Impact of Edouard de Laboulaye’s Ideas on Bartholdi’s “Statue of Liberty:’’

Paradoxically one of the prime influences moti-

vating 21st Century WAY IT’S art is Frédéric Bar-

tholdi’s “Statue of Liberty;” a 19th Century work

of art, which “currently” terrifies hardnosed US

rightwing extremists, because that magnum opus

symbolizes an open-door policy toward immigra-

tion, “welcoming” what right-wingers deem to be

highly undesirable: a glut of Latino immigrants

and refugees. Sadly, the US political right cannot

fathom or comprehend the value of additional Latino

immigrants, or worse, they hate the colossal bronze

statue because they astutely interpret Lady Liberty’s

hidden iconology, correctly --- as it was originally

described and intended by 19th Century French his-

torian Edouard de Laboulaye.

In 1865, during a party near Versailles at

the home of Edouard de Laboulaye, the conversation turned to Abraham Lincoln’s assassination, prompting

the host to assert that the USA’s victory in the Civil War and Lincoln’s martyrdom signified America’s striving

to achieve the ideals celebrated within three of its founding-documents: Declaration of Independence (1776),

the US Constitution (1788), and The Bill of Rights (1791). De Laboulaye insisted that the The Bill of Rights

was the most inspiring. Among the guests was Frédéric Bartholdi, a young Alsatian Beaux-Arts neo-classical

sculptor. De Laboulaye suggested to Bartholdi that a sculptural-tribute ought to be erected, honoring the ideal

of universal human “Freedom” for which Lincoln died, as well as the 625,000 US Civil War combatants. De

Laboulaye insisted that it should be a monument about all humanity’s (as well as the USA’s) eternal aspiration

to attain the ideals engraved in The Bill of Rights. Furthermore, he suggested that preferably France should

create and provide such an impressive gift for the 1876 centennial

celebration commemorating the 1776 American Revolution, ---- to

which, Bartholdi proclaimed, “I will do it!”

Curiously, during de Laboulaye’s party, the discussion

had been about the US Civil War (1861-1865); nevertheless, as the

last guests departed, it was clear that this friendly get-together had

germinated a trans-Atlantic plan for a colossal French sculpture

entitled, La Liberté éclairant le monde (Liberty Enlightening the

World), which would continually celebrate and reaffirm the virtues

of America’s Revolution (1776- 1783). Even today, this gigan-

tic and thought-provoking memorial continues to rouse great hope

among all freedom-loving and just people, who see Lady Liberty

standing defiantly in New York’s harbor. Stealthily, the Statue of

Liberty’s capacity to inspire hope results from its inherent “Labou-

layean” iconology, which ingeniously implies that the USA’s 19th

Century Civil War was merely an extension of America’s 18th Cen-

tury Revolution. Evidence of this is apparent in the broken chains

at the feet of the statue, which symbolically references Lincoln’s

1863 emancipation of the slaves.

The first artist to fully comprehend these innate “Labou-

layean” motifs that cloak Bartholdi’s The Statue of Liberty was the

Brazilian Postmodernist Duda Penteado in his Neo-Neoexpres-

sionist piece entitled We Are You (2005), which presents a colorful

hyper-emotive image of a Latina mother protecting her infant child,

symbolizing America’s emergent 21st Century Latino population.

Throughout his We Are You piece, Penteado ingeniously alludes

to Bartholdi’s Liberty, as well as de Laboulaye’s insistence that

America must continue to cultivate The Bill of Rights (with its ide-

als of fairness and due process) hopefully praying that in the 21st

Century, these Rights will protect Latinos from the throng of 21st

Century unconstitutional and anti-American laws recently passed

in Arizona, Alabama, Georgia, South Carolina, and other states,

which unfairly target Hispanics. Similar to Penteado’s fascination

with Lady Liberty, the grand master of Latino contemporary art,

Raphael Montanez Ortiz, the Founder in 1969 of El Museo del Bar-

rio (East Harlem, NYC) created a large (5’ x 9’) digital collage

masterpiece entitled Liberty in a Tempest Teapot (2011), utilizing

Batholdi’s Statue of Liberty as an allegorical metaphor. Addition-

ally, Ortiz’s daring image provides a thought-provoking satirical

Duda Penteado “We Are You” 2005, Acrylic on canvas, 48” x 24” (Collection of the artist).

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118 119Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011.

rewriting of Emma Lazarus’s New Colossus poem (1883), which

he ironically alters to describe the current heartbreaking betrayal of

the US Bill of Rights by blustering far-right extremists within the

new-fangled Tea Party, who avidly advocate repressive discrimina-

tion against Latinos. Ortiz’s dramatic image bravely solicits, “Who

or what will save America from this rising 21st Century anti-Latino

neo-fascist storm?”

The Inherent Potential of the 14th Amend-

ment’s to Protect the Civil Rights of Latinos:

[(Today, another Hernandez v Texas (1954) is urgently needed to

reinforce the 14th Amendment’s “birth-clause” as an unambiguous

and clear indication of US citizenship)]:

The next momentous event affecting the We Are You

Project’s ascertainable history occurred three years after the end of

the Civil War in 1868, when the 14th Amendment to the US Con-

stitution was ratified, guaranteeing citizenship to “all persons born

in the United States.” Yet, in 2011, the State of Alabama (and like-

wise earlier Arizona and other states, which have generated similar

laws) passed H.B. 56, an ethno-racist law abridging the “privileges

and immunities” of Latino citizens, thereby, denying Hispanics fair

and equal legal protection(s) and benefits. Alabama’s 2011 uncon-

stitutional law H.B. 56 went so far in its anti-Latino calumny as to

deny citizenship to natural-born US-citizens.

Forlornly, due to the 21st Century’s rising tide of intoler-

ance, discrimination, unconstitutional laws and pure anti-Ameri-

canism; sadly, the broad protective-power of the 14th Amendment

has been unable to fully safeguard US Latinos from the rampant

bigotry evident in several states’ anti-Latino legislative-agendas.

At this time, Latinos desperately need another ground-breaking

Pro-Latino Supreme Court ruling; such as the 1954 case known as

Pedro Hernandez v. The State of Texas. This case was success-

fully argued, (by two valiant Tejano Lawyers, Gus Garcia and Car-

los Cadena), heroically deliberating before the US Supreme Court

of Chief Justice Earl Warren in 1954. Thankfully, the high court’s

ruled in support of Hernandez, which granted Latinos for the first

time in US history appropriate due process under law, extending to

Latinos the full power of the US Bill of Rights; as well as designat-

Raphael Montanez Ortiz “Liberty in a TempestTeapot” 2011, Digital Collage Pain-ting, 5’ x 9’(Collection of the Artist).

ing Latinos as being (ethnically and racially), a “Class Apart.” To-

day, Latinos need another case like Hernandez v Texas to reinforce

the 14th Admendment’s “birth-clause” as a valid indication of US

citizenship. Alabama’s new law H.B. 56 unjustly questions Latino

children’s US-birth right, depending on whether one or both par-

ents are illegal aliens; such legislation relates directly to the issue

of Latino identify; a pivotal concern within WAY IT’S’s aesthetic

parameters. The use of identity as a fulcrum for figurative imagery

is evident to Cuban painter, Raul Villarreal, whose ancestral lineage

includes hereditary from Taino-Culture, Africa, and Spain. As a

result, in his image entitled No Longer (IN)Visible (acrylic & oil

on canvas, 48” x 36,” 2004) explores Latino identity. Additionally,

this duende-filled self-portrait alludes to Afro-Caribbean religious

motifs, particularly those associated with Palo Monte (Palo May-

ombe Religion), as well as referencing Ralph Ellison’s Invisible

Man (published in 1952). Villarreal’s art reflects Ellison’s inner

(immanent) psychological awareness; whereby, in order to hide;

often people dissemble their identity, placing too much emphasis

on what is seen and not enough on what is felt, or just under the sur-

face. For this reason, Villarreal’s self-image is transparent, reveal-

ing at its core-essence: a vital throbbing heart. In these raw heart-

felt concerns, Latinos are precisely what Earl Warren described, “A

class apart!”

Among the WAY IT’S artists grappling with contempo-

rary Latino identity is Colombian-American artist Sergio Villami-

Gus Garcia, heroically deliberating before the US Supreme Court of Justice Earl Warren in 1954.

Raul Villarreal “No Longer (IN)Visible” 2004, Acrylic and oil on canvas, 48” x 36” (Collection of the artist).

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120 121Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011.

zar, who juxtaposes double frontal self-portrait mug-shots (or passport-photos), wherein he uncompromisingly

confronts himself (his actual facial features), his “being,” depicting one self-portrait with swarthy complexion

and a moustache, the other with bleached skin and no moustache. Since so much, of what negatively confronts

Latinos, pertains to immigration policies, the ambivalent and humorous irony in Villamizar’s photographic self-

portraits affords little distinction between these photos possible function as being paradoxically perhaps “por-

traits,” “mug-shots,” or “passport-photos.”

The Groundbreaking Significance of the 1992 Quincentenary and the Dawn of Latinization:

In terms of art and culture, the We Are You Project’s 21st Century agenda has its art historical roots

in three earlier 20th Century and 21st Century Hispanic events, enterprises, and endeavors: 1). The 1992 Quin-

centenary awakening (or first simultaneous “coast-to-coast” national emergence) of US Latino art and culture,

including the genesis of the term “Latinization;” 2). The unexpected advent of Latino Postmodernism in Cuba in

1977 and its arrival in Miami and New York in the 1980s, and 3). The first attempts at Pan-Latino Transcultural-

ism (including the first transcultural Latino art movement of the 21st Century: “Neo-Latinoism”).

For anyone studying the evolution of Latino Culture, nothing is as “eye-opening” about Latino history

as the 1892 400th anniversary of Columbus’s arrival in the New World, which remarkably did not focus atten-

tion on US-Latinos; instead the emphasis was placed on Italian-Americans and on other non-Spanish speaking

European nations, as well as marginally including such ethnic curiosities as subjugated US Amerindian tribes

living “peacefully” on reservations. The nation-wide neglect of Latinos during the USA’s October 1892 400th-

year celebration of the 1492 “Discovery of America by Columbus” exposes both the utter political and economic

powerlessness of US Latinos in the late-19th Century, and the growing US anti-Latin mood attributable to the

pending imminent war with Spain (1898), wherein American soldiers fought and died in Puerto Rico, Cuba, and

the Philippines, etc. Or, the USA’s 1892 awareness of an inevitable confrontation with Colombia in order to

secure the Panama Canal (1903), as well as other Caribbean and Central American US Marine peacekeeping

Sergio Villamizar “Before and Happily Ever After” 2006, Digital Print ,24” x 32” (Collection of the artist).

incursions, throughout the 19th Century fin de siècle. Thus, the focus of the 1892 Commemoration of Colum-

bus’s arrival generally spotlighted and honored Italy as Columbus’s alleged birthplace, as well as the birthplace

of thousands of arriving (via Ellis Island) Italian-American immigrants.

Conversely, one hundred years later during the United States of America’s 1992 Quincentenary Cel-

ebration, for the first time (if only for one year (1992)), Latinos were properly highlighted, studied, and noticed,

rightly attaining the full focus of the USA’s celebration, marking the 500-year observance of Christopher Co-

lumbus’s 1492 encounter with indigenous Americans, which then sparked from the 16th Century onward “New

World” and “Old World” contact(s), interactions, conflicts as well as intercourse (sexual-coupling), igniting the

initial growth of North American Latino culture as well as Latin-American “Latin” culture.

The 1992 Columbus Quincentenary afforded US Latinos moments of self-realization and self-

awakening, seeing (for the first time) glimpses of their bright future as US citizens. Nevertheless, the 1992

Quincentenary did provide Latinos with the first ray-of-hope that their lives in the USA might improve. For

example, in this optimistic light, on Monday, October 12, 1992, at Goucher College, (Baltimore, Maryland)

during an art historical lecture by the author of this essay (Dr. José Rodeiro), he used for the first time, the term

“Latinization” to characterize the objectives of a Quincentenary Latino art show organized by Helen Glazer (the

Director of Goucher College’s Rosenberg Gallery), which she entitled “Approaching the Quincentenary: Latino

Art 1982-1992.” The term Latinization was invented by Rodeiro to denote the inescapable growth and spread

of Latino culture throughout the USA, including the inevitable 21st Century absorption of Latino culture by the

US-mainstream (which shortly after 2050 CE will manifest and mark an unavoidable cultural shift) establishing

the predominance in the USA of Latino values, art, music (dance), food and lifestyle.

For this reason, thanks to the Quincentenary, in-and-around the year 1992, the USA’s mainstream “art

world” was overtaken by the need to finally and seriously focus on Latino art and culture “for an entire year.” In

1992, to mark the occasion, Spain proudly sent replicas of Columbus’s three tiny ships to New York City. Sud-

denly, all the top Latino artists were in demand for a series of groundbreaking Quincentenary Latino art exhibi-

tions that would define the “general” nature of Latin Art to “the present.”

The most prestigious and ambitious show, which occurred on the eve of the Quincentenary (1987) was

“Hispanic Art in the United States: Thirty Contemporary Painters and Sculptors,” which featured 180 Latino

works-of-art carefully curated by Jane Livingston and John Beardsley, including works by Chicano artists like

Carlos Almaraz, Gilbert Lujan, Frank Romero, and Gronk. Importantly, Livingston and Beardsley established

the Los Angelino catatonic-schizophrenic, Martin Ramirez (1885-1960) as a Latino art trailblazer. Art histori-

cally, Livingston and Beardsley wisely placed three well-known sculptors Luis Jiminéz, Robert Graham, and

Manuel Neri appropriately as significant Latino art pioneers. The show also introduced the following Latino

artists, e.g., from Cuba: Carlos Alfonzo, Luis Cruz Azaceta, Paul Sierra, and Pedro Perez; or from Puerto Rico:

Ibsen Espada and Arnaldo Roche-Rabell; or from South America: Ismael Frigerio and Lydia Buzio; as well

as numerous Chicano and Chicana contemporary masters (beyond those already mentioned above). Many

other Quincentenary-related shows emerged, e.g., in 1988, Bronx Museum launched a show entitled: “The Latin

American Spirit Show;” or UCLA’s legendary West Coast Latino “CARA Show” (1990-1993), as well as other

significant Latin-Art exhibitions. Of all the groundbreaking Quincentenary shows that occurred in 1992, the best

was “Approaching the Quincentenary: Latino Art 1982-1992,” organized by Helen Glazer, the Director of the

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Rosenberg Gallery, Goucher College, Baltimore, Maryland, featur-

ing major postmodern Latino artists, including: Cuban-American

artists: Arturo Bassols, Maria Castigliola, J. Tomas Lopez, Tomas

Marais, José Marin, Maria Sonia Martín, José Rodeiro; and the

Puerto Rican-American artists: Maritza Davila, Peter Gaztambide,

Carlos Suenos, and Chicano artist Luis Jimenez. Another major

Quincentenary show occurred at the Smithsonian’s Hirshhorn Mu-

seum, entitled “Crosscurrents of Modernism: Four Latin American

Pioneers” emphasizing the top four Latin American 20th Century

masters, who had, according to the Smithsonian, dominated 20th

Century art: Diego Rivera (Mexico), Joaquin Torres-Garcia (Uru-

guay), Wilfredo Lam (Cuba) and Roberto Matta Echuarren (Chile).

This show provoked heated controversy due to the exclusion of

Frida Kahlo.

Learning from such appalling acts of gender-bias and

chauvinism, as the exclusion of Frida Kahlo from the Hirshhorn’s

“Crosscurrents” Quincentenary exhibition, today, the We Are You

Project WAY IT’S exhibit has attracted a strong coterie of eminent

feminist Latina artists, i.e., Marta Sanchez, Rosario D’ Rivera, Jo-

sephine Barreiro, Jacqui Casale, Maritza Davila, Lisette Morel,

Ceci Castleblanco as well as others. In their images, Sanchez and

Barreiro explore different aspects of Neo-Neoexpressionism from

the gritty hyper-emotive art of Barreiro to the inspired fanciful im-

ages of Sanchez; while the paintings of D’Rivera, Casale, Morel,

Davila and Castleblanco create vivacious monumental lyrical ab-

stractions that are paradoxically, at the same time, both formal and

whimsical.

Postmodernism and Cuba’s ‘Volume I Show:

The current We Are You Project’s attempt to transcend

Postmodernism cannot be fully understood without considering

how Latino Postmodernism first manifested. By 1977, in Havana,

Cuba, the daring art impresario, Gerardo Mosquera began favor-

ing art that employed found-objects, installation art, kitsch and

Santería. By 1981, these methods dominated, a groundbreaking

“island-based” Cuban exhibit known as ‘Volume I,’ featuring José

Bedia, Rubén Torres Llorca, R. Rodríguez Brey, G. P. Monzón,

and others. Critics in Cuba questioned the validity of ‘Volume I’

as socialist art. In the 1980s, several members and supporters of

Frank Romero “The Arrest of the Paleteros” 1996, Oil on canvas, 8” x 12”

Carlos Alfonzo “Where Tears Can’t Stop” 1986, Acrylic on canvas, 8” x 10”

‘Volume I’ fled to Mexico City, and then settled in the USA, after

congregating at the Nina Menocal Gallery (Mexico). Thus, their

art was termed “Ninart,” e.g. T. Esson, Alberto Rey, Alvaro García,

R. R. Brey, J. Bedia, A. Cuenca (the well-known photographer), C.

Castaneda, Ileana Villazón, F. Gelabert (the sculptor) and R. Lopéz-

Marín “Gory” (the photographer). The blanket departure of Cuba’s

‘Volume 1’ Generation to the USA, encouraged Castro’s regime

to reconsider its suppressive artistic policies, allowing for greater

individual expression. Luckily for Cuban art in Havana, Mosquera

remained on the island, organizing Cuban Biennials, these epic

shows helped shape the artistic-careers of several Post-“Volume 1”

US-bound waves of refugee artists, as well as ‘islanders.’

As more refugee artists arrived in Florida, a vibrant gal-

lery-scene emerged in Miami. In 1983, the surge of Miami-Cuban

art was the focus of the “Miami Generation” show, inaugurating

the Cuban Museum of Art and Culture, Miami. Other significant

Cuban-American exhibitions followed, including “Outside Cuba,”

1987, “Cuba-USA,” 1991, curated by Giulio Blanc, or the ‘Break-

ing Barriers’ Show, 1997, curated by Jorge Santis. Also, signif-

icant (since first attempted by Wifredo Lam in the 1940s) is the

predominance in visual art of spiritual motifs relating to Santeria

as well as other Afro-Caribbean religions, especially among Cuban

Neo-Expressionism e.g. Luis Cruz Azaceta, José Bedia, Paul Si-

erra, Pedro Pérez, Tomas Esson, and Carlos Alfonso (1950-1991).

Since 1990, Cuban-American radical Postmodernism has merged

with Neo-Surrealism and Hyperrealism; this is evident in the mas-

terful art of Tomás Sánchez, Jesus Rivera, as well as Raul Villar-

real. Villarreal’s paintings of isolated stately Royal Palm-trees that

stand erect against bright blue skies or dramatic sunsets with occa-

sional symbol-laden clouds (connoting maps of Cuba), such images

express a heartbreaking nostalgia for Cuba, e.g., With(IN) Skies,

(acrylic & oil on canvas, 30 x 60, 2005).

Pan-Latino Transculturalism:

By 2001, the brilliant Puerto-Rican American curator Dr.

Isabel Nazario (at that time, director of the Rutgers University’s

Center for Latino Art & Culture) began organizing a series of major

Luis Jimenez “Vaquero” 1987, Polychrome Fiberglass, 16” x 9” x 5”Smithsonian Collection: (National Museum of American Art).

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comprehensive Latino exhibitions, which would evolve into the acclaimed innovative endeavor known as The

Transcultural Art Initiative in New Jersey and New York. By thoroughly researching the top Latino artists in

the New York/New Jersey region, Nazario carefully planned a series of edifying landmark Latino exhibitions,

featuring (to name a few of the artists) Carolina Alvarado-Narvarette, Michele Araujo, Yolanda Avila, Hugo

Bastidas, Olga Bautista, Antonio Carreño, Alphonso Corpus, Jo-Anne Echevarria-Myers, Eugenio-Espinoso,

Benedict J. Fernandez, Diana Gonzalez Gandolfi, Diosmel González, Noe Hernandez, Maria Lau, Mariana

Maldonado, Claudio Mir, Alexandra Morel, Raphael M. Ortiz, José Rodeiro, Fausto Sevilla, Tony Velez, Raul

Villarreal and others.

During the end of the 20th Century and the start of the 21st Century, a group of creditable Latino art

critics, curators, and theorists manifested, including foremost Luis Camnitzer, Conceptualism in Latin Ameri-

can Art (Austin: University of Texas Press, 2007); Mari Carmen Ramírez, “Tactics for Thriving on Adversity:

Conceptualism in Latin America, 1960-1980,” in Global Conceptualism: Points of Origin, 1950s-1980s. Also,

contributing to the growing realm of Latino contemporary “art-ideas” were Nicomedes Suárez-Araúz, Shifra

Goldman, Alejandro Anreus, Tomas Ybarra-Frausto, Isabel Nazario, Rocío Aranda-Alvarado, Denise Carvalho

and José Rodeiro.

Isabel Nazario’s The Transcultural Art Initiative (2001-2005) encouraged a phenomenon known as the

“Neo-Latino Art Movement.” In 2003, the name for this phenomenon (“Neo-Latino”) was invented by Cuban

artist Raul Villarreal to describe a cluster of New York City Metropolitan-area artists, who advocated nascent

rudimentary-forms of Pan-Latino transculturalism. From 2003 until 2006, this group dominated New York/

New Jersey’s Latino Art scene, participating in scores of major regional exhibitions. The core group included

Olga Cruz (the leader), Josephine Barreiro, Hugo X. Bastidas, Olga Mercedes Bautista, Gerardo Castro, Leandro

Flaherty, Raniel Guzman, Hugo W. Morales, Jason Rivera, José Rodeiro, Raúl Villarreal, Sergio Villamizar, and

Neo-Latino exhibition at the Harold B. Lemmer-man Gallery (NJCU), artists Hugo Morales, Raniel Guzman, Gal-lery Director Midori Yoshimo-to, NJCU President Carlos Hernandez, artist Gerardo Castro, and artist, art histo-rian , and coordina-tor of Art History at NJCU Dr. José Rodeiro.

William Coronado, as well as others.

A growing awareness of Latino transculturalism permeated early-21st Century Hispanic art and culture.

For example, along with Mexican master Roberto Márquez, Ecuadorian-American artist, Hugo Xavier Bastidas

is considered one of the top Latino artists working in the United States. In the early 21st Century, Bastidas was

one of the founding Neo-Latino artists, who in 2009 along with Josephine Barreiro, Gerardo Castro, Hugo W.

Morales, Sergio Villamizar, Williams Coronado, José Rodeiro and Raul Villarreal joined the We Are You Proj-

ect’s WAY IT’S initiative; for which he generated an extraordinary oil painting entitled Bearing Gifts, analyzing

the human cost of crossing the Rio Grande into “El Norte.” Bastidas’s painting provides an ironic insight into the

tragic nature of illicit border-crossings. First, the title contains the word “Bearing,” which relates to an image (in

the center of the composition) of a discarded toy bear accidentally dropped on a patch of cacti by a child during

a traumatic run across the Rio Grande. The word “Bearing” also connotes “conveyance,” since undocumented-

aliens frequently carry all their prized-belongings on their journey. Lastly, the word is a pun on the name of Vitus

Bering, the Danish sea-captain employed by the Russian Navy of Czar Peter the Great. Captain Bering was

ordered to find a Pacific Ocean route from Russia to Mexico. In 1725, he accidentally discovered the Bering

Straits, the prehistoric passageway by which the ancient Amerindians presumably arrived in all the Americas.

Via his brown-sepia image of a lost toy bear, Bastidas brilliantly reverses the concept of courageous journeying,

discovery, and exploration, by conceding these heroic qualities to illegal immigrants and their daring attempts to

enter the US illicitly. Also, significant to Bastidas’s image are Amnesis aesthetic ideas inherent in Bolivian poet

Nicomedes Suárez-Araúz’s Theory of the Lost Object.

Hugo Xavier Bastidas “Bearing Gifts” 2009, Oil on canvas, 24” x 36” (Via The Nohra Haime Gallery).

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A 21st Century Longing for a Latino Renaissance:

As the 21st Century emerged, Hispanics from the Pacific Coast to the Atlantic Coast hungered for a

21st Century US-Latino Renaissance, realizing that such a cultural renewal would in all likelihood invigorate

the whole US-art scene. By 2010, the longing for a Renaissance increased; especially, after the Islamo-fascist

attacks of 9/11/2001, and the resulting excruciating and interminable US-led “War on Terror” that indirectly

effected the US-economic collapse of 2007- 2008. During this dark time, much of mainstream US visual art

generally favored various postformal and a-formal approaches to art-making. These were mostly anti-creative

methodologies that were mostly “un-visual,” and by-and-large hyper-conceptual, mechanical, inhuman, ersatz,

sheer technology, text-based, inauthentic, anti-art (Neo-Dada/Neo-Fluxus), invisible and un-emotive. These

early-21st Century hyper-conceptual methods espoused the current Western academic “anti-art” dogma. Yet,

during this sad period in the history of art (which is best exemplified by the last two Whitney Biennials); Latino

art courageously bucked all effortless anti-art trends, and continued to bravely emphasize the visual-nature of

visual art; perhaps resulting as Gertrude Stein argued in Everybody’s Autobiography (1937) from an “innate”

Iberian awareness of their unique intensely ocular Hispano-art history, which persistently and historically insists

that visual art must be first and foremost VISUAL! For this reason, certainly any feasible and viable 21st Cen-

tury US-Latino Renaissance would require firm art historical grounding, necessitating a sweeping and expansive

cosmic historical overview of US Latino culture and art from 1492 until today. Notably, the We Are You Project

is currently undertaking such a valorous, bold, sweeping and expansive art historical overview of Latino art from

the early-16th Century onward.

Among aestheticians anticipating a 21st Century Latino reinvigoration of all the arts was the Bolivian-

born poet and theorist Nicomedes Suárez-Araúz, whose book Amnesis: The Art of the Lost Object (1988) pro-

pounded a new and influential concept, based on amnesia as a structural metaphor for creativity, viewing the

realm of the forgotten as both the essential source and the elemental form of all artistic creativity and fabulation.

In the 21st Century, according to critic Sunka Simon, Amnesis remains a growing aesthetic concern. Also,

significant to this highly desired emergence of a Latino Renaissance was the surfacing in 2010 of the We Are

You Project’s WE ARE YOU INTERNATIONAL TRAVELING SHOW (WAY IT’S), which was initiated by

Dr. Carlos Hernandez (President, New Jersey City University (NJCU)); Mr. Mario Tapia (President and CEO,

Latino Center on Aging (LCA)), and Duda Penteado, (a Brazilian contemporary artist living in the New York’s

metropolitan-area).

THE WE ARE YOU INTERNATIONAL TRAVELING SHOW (“WAY IT’S”)

Starting in the late-1990s, Duda Penteado, (who, along with Vik Muniz and Romero Britto, is one

of the most celebrated Brazilian artists working in the USA), slowly began to envision a unique Latino global

visual-art initiative, reflecting a revolutionary concept that would transform and facilitate new activism, and

socio-political renewal, and unification among all Latinos: “Pan-Latino Transculturalism.” The heroic first

steps in this venture began in 1997, when Penteado met Dr. Carlos Hernandez, a prominent New Jersey Latino

university president with almost 40 years of service in American

higher education. Then, in 2000, Penteado met Mr. Mario Tapia

(President and CEO, Latino Center on Aging (LCA)), who joined

this key initial group of Latino “cultural-visionaries.” Tapia had

devoted over thirty-years of his life to helping Latinos throughout

the New York metropolitan-area, as well as nationally and inter-

nationally. Both of these men had a profound impact upon Pen-

teado’s rising concern for the complex milieu surrounding the lives

of most US-Latinos, affecting a growing notion (within him) that

the USA was in dire need of radical cultural and artistic reforms.

Thus, at the dawn of the 21st Century, Hernández, Tapia, and Pen-

teado saw a clear and pressing opportunity for a thorough overhaul

of American culture in order to properly accommodate the USA’s

growing Latino populace. They saw the possibility of a volcanic

paradigm-shift that would reinvigorate all of America’s art, edu-

cation, political-activism, health-care, immigration policy and en-

courage a “new” comprehensive and “hands-on” or “ground-level”

social-work system that would properly meet community-needs in

a straightforward manner, as well as the thorough review of US and

global socio-economic structures and other vital issues, which they

(Hernández and Tapia) deemed necessary for the improvement and

transformation of 21st Century and 22nd Century American culture

and life.

By 2001, Hernández and Tapia pointed out to Penteado

that US-Latino culture in the urban environment was undergoing

dramatic renovation(s) that permitted greater transcultural Latino

unity (e.g., Pan-Hispano transculturalism and Latinization, as well

as the prospect a broad socio-economic transformation, including

introducing within the US a completely “New Latino” identity or

persona capable of greater access into the American Dream, main-

stream US-culture, and socio-economic success, which was (at

that time and even now) to some extent only available generally

to “well-educated” Latinos. Most importantly, they believed that

the arts were central component or a crucial ingredient of such a

Renaissance.

As the “War on Terror” ensued after the attacks of

9/11/2001, many Latinos became the front-line military cohort

fighting the Mid-Eastern conflict. Due to the 9/11 attacks, the US

began to tighten its border-security, which affected primarily Lati-

Dr. Carlos Hernandez, NJCU President

Duda Penteado, Brazilian artist

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nos. Consequently, this post-9/11 US paranoia (with its unexpected

targeting of Latin immigrants) fostered a new Hispanics civil-rights

awareness. And, by means of emergent transculturalism, Latinos

of different ethnicities and national-origins were finding common

ground, and greater Pan-Latino unity. As a result, Tapia, Hernán-

dez, and Penteado began to notice that “Latinization” was gaining

momentum, attaining greater prominence (in US popular-culture),

as well as making strong headway within various US financial

arenas, while advancing Latin art and culture deeper-&-deeper

into the American mainstream, fermenting new and daring Pan-

Hispano ideas (i.e., Neo-Latinoism, transculturalism, cultural-

hybridization and other concepts associated with the prevalent

21st Century “Latino Condition”), evolving and manifesting as a

growing transcultural phenomenon throughout all American soci-

ety, effecting every aspects of US culture. This mounting surge of

“Latinization” crystallized in 2005, when Penteado was selected to

design the official poster for the 2nd National Conference on La-

tino Aging, for which he boldly created an expressionistic symbol

(or an emblem) capable of embodying the spirit of America’s new-

Jose Acosta “Hispanic Pri-de” 2011, Acrylic on can-vas, 24” x 32” (Collection of the artist).

Hugo Morales “Untitled-Silent Scream Series” 2004, Acrylic on canvas.

Latino identity. In June 2005, the poster was first unveiled, during

LCA’s 13th Golden Age Awards banquet in New York City, during

the dedication, Tapia delineated that Latinos were attaining a new

status in the 21st Century; which led him to pronounce, “We Are

the USA.” An idea that Penteado immediately took to heart and

brilliantly refashioned into the concept known as: “We Are You,”

which became the title of Penteado’s art work.

Soon the We Are You Project’s 2012-2018 global ini-

tiative known as the “We Are You International Traveling Show”

(“WAY IT’S”) appeared as a reality. Art historically, the WAY

IT’S arose from the tragic confluence of several epic-events and

the “ongoing” dilemma precipitated by those sad events ((described

below)). From 2005 onward, as more-and-more Latinos exerted

themselves and flourished in the USA and in the world, attaining

recognition and wealth. However, unexpectedly, an anti-Latino

backlash arose, which was sparked by growing ethno-racism ener-

gized by “fear-fueled” apprehension, mistrust, envy and paranoia

(trepidation), deriving from and concerning the 2007-2008 col-

lapse of the United States’ economy, which unleashed a torrent of

anti-Latino bias and intolerance, reaching its apogee in Arizona in

2009, followed by a series of Anti-Latino laws that were enacted in

four states (mostly in Arizona, as well as Oklahoma, Missouri, and

Alabama), with the most draconian occurring in Alabama in 2011.

Roberto Márquez “Map of Mexico”2011, Oil on canvas, 34”x 24”(Collection of the artist).

Jimmy Pena “Esfuerzo” 2004, Print, 24” x 55” (Collection of the artist)

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The worst provisions of these new laws blatantly violate the US-Constitution, e.g., the revoking of any US-born

Latino citizen’s “citizenship,” if either both or any one parent is proven to be undocumented. Sadly, additional

anti-Hispanic laws are under consideration in other states (i.e., Georgia, South Carolina, Virginia, Pennsylvania,

etc.). From 2009 onward, Latinos more-and-more were being designated personas non grata in the USA; or

identified as scapegoats for all that ailed America.

The fact that Latinos were suddenly being noticed led to the awareness of the growing importance of US

Hispanics. This growing realization sparked a large-scale Latino Conference in April, 2010 at NJCU that would

examine every aspect of Latino culture and life. As part of this Latino Conference, a panel was composed on the

topic of contemporary art moderated by Dr. Carlos Hernández entitled Art as a Catalyst for Social Change: “WE

ARE YOU.” Participating, in the event, along with Duda Penteado, was Dr. José Rodeiro [(Coordinator of Art

History at NJCU, and an acclaimed artist and scholar)], and other speakers were involved in the panel, includ-

ing art historian Dr. Sara Gil Ramos (Adjunct-Professor at NJCU) and curator and scholar Fausto Quintanilla,

Gallery Director, Queensborough Community College Art Gallery, NYC, NY). As part of the aftermath of this

conference, Penteado asked Rodeiro, as well as Robert Rosado (the Union City (NJ) Puerto Rican impresario),

and Raul Villarreal (the prominent metropolitan-area Cuban artist) to form a subcommittee to explore avenues

by which topnotch Latino artists might join the We Are You Project.

Soon an array of thirty prominent Latino artists from the full-breadth ((coast to coast)) of the USA,

as well as Latin America manifested, answering the “CALL,” which was promulgated online (and is currently

visible on the We Are You Project Website). The thirty that answered the call were endowed with hereditary

national ancestries or heritage from Mexico, Puerto Rico, Cuba, The Dominican Republic, Colombia, Ecuador,

Peru, Uruguay, Brazil, and Spain, etc. Thus, the exhibiting artists of the We Are You International Traveling

Show (WAY IT’S) materialized throughout 2010 and 2011. The artists that joined WAY IT’S were involved in

the following innovative and “cutting-edge” current Latino styles: “Neo-neoexpressionism,” “Metaphorical Re-

alism,” “Mystic-Lyricism” (“Eye-opener Art”), “Neo-Metaphysical/Urban-Assemblage Art,” “Neo-Ultraism”

(“Infra-realism”), and “Neo-Pop.” For example, among the WAY IT’S cohort is a dazzling coterie of artists

pursuing 21st Century Neo-neoexpressionism; this group includes: José Acosta, Josephine Barreiro, Duda Pen-

teado, Marta Sanchez; plus, occasionally Hugo Morales (whenever he is creating additional expressionistic

works for his ongoing hyper-emotive Silent Scream Series); in addition, within this stylistic-category is the urban

industrial landscape Cuban artist, Nelson Alvarez. However, art historically, Alvarez’s WAY IT’S submission

for the exhibition, (a floor-piece entitled Imaginary Border (diptych)), has a certain “Neo-HairyWho” aspects,

as well as functioning within the context of Neo-Metaphysical “Urban-Assemblage Art.”

Another stylistic-method perceptible in the WAY IT’S exhibition is “Metaphorical Realism.” Mimeti-

cally and poetically, this particular “visual-narrative” mode connects symbolic representational-imagery (mime-

sis) to “visualization” or story-telling: fabulation. There are a dozen WAY IT’S artists that create unique icono-

logical narratives, whose style is “generally” identified with a radical postmodern style known as “Metaphorical

Realism,” e.g., Willie Báez, Hugo Bastidas, Gerardo Castro, Williams Coronado, Roberto Marquez, Raphael

Montanez Ortiz, Joe Pena, Jimmy Pena, Jesus Rivera, José Rodeiro, and Raúl Villarreal. On the other hand,

a bevy of WAY IT’S artists are experimenting with Mystic-Lyricism (or “Eye-opener Art”); these are Fernando

Goldoni, Rolando Reyna, Jacqui Casale, and Lissette Morel. While another transvanguard WAY IT’S coterie

consists of Carlos Chavez, Pablo Caviedes, Rosario D’Rivera, and Sergio Villamizar, which are developing in-

novative Neo-Surreal styles, i.e., Neo-Ultraist works [(or Infrarealist works)] or Immanentist imagery. There are

elements of “Neo-Magic Realism” in Immantentism, Infra-realism, Neo-Ultraism, and Metaphorical Realism.

Additionally, within the WAY IT’S’s gamut of styles, there are two towering Latino Neo-Pop artists exhibiting

in the show: Hugo Morales (with his amusing Dora image) and Julio Nazario (with his poignant Purple Heart

image).

Thus, the above WAY IT’S images and themes examine the plight of US Latinos caught in the throes of

the current on-going “Great Recession” that began in 2007-2008; an economic downturn that is ensnared in the

wake of the events of 9/11/2001 with its concomitant incessant War on Terror, leading directly and indirectly to

the upheavals of the Arab-Spring (2011) and the growing international “Occupy Wall Street Movement” (2011),

wherein both struggles, many Latin Americans, US Latinos, Spaniards and Portuguese stand on the front lines

striving for Middle Eastern freedom and democracy, as well as a complete overhaul of Wall Street banking and

investment practices. Equally important are the growing new Latino civil rights struggle(s) against injustice(s),

such as the recent Arizona “Immigration Law” SB1070, which expands statewide police-powers to stop, ques-

tion, and detain anyone who looks slightly Hispanic, instantly demanding that they produce papers, in order to

prove that they are allowed to be in the USA; or, the more draconian Anti-Latino law recently (2011) passed in

Alabama (H.B. 56). Whether in Arizona or Alabama, even natural-born “Hispanic-looking” citizen are subject to

this unfair treatment. Such negative Anti-Latino attitudes have also been put forward by legislatures in Georgia,

Virginia, and Oklahoma, etc., etcetera.

Also, in contention against (or with) basic “We Are You” values are the string of additional “anti-

American” laws [(one-after-another)] that Arizona recently passed, including: SB 1070 bill; SB 1096 bill; HB

2631bill, and especially the deeply troubling and abhorrent HB 2281 bill, which would make it illegal in Arizona

for school districts to teach courses in “Ethnic Studies,” “Hispanic Studies,” or “Latino Studies,” etc. Viewing

this entire glut of recent anti-Hispanic legislation as “ethno-racist,” and primarily hate-driven, the WAY Project

believes that Latino artists and their art must assume the role of strong advocates for the needs and rights of all

Americans’ upholding the original spirit of The Bill of Rights (1789). Moreover, the We Are You Project’s WAY

IT’S global venture is not pleased by all the senseless and environmentally dangerous walls, which are blighting

the US/Mexican border.

Importantly, the We Are You Project’s WAY IT’S exhibition has both a USA component and a Latin

American component. The US-component is an attempt to employ art as a symbolic-mirror reflecting the lives

of US-Latinos during an era of escalating anti-Hispanic rhetoric, violence, segregation, unfair-legislation and

injustice. The Latin American component longs to place greater attention on art and culture throughout all of

the Americas, as well as spotlighting parallel US and Latin American socio-political struggles generated by rapid

economic emergence and globalization. Consequently, in order to inaugurate the 2012-2018 global tour of the

We Are You International Traveling Show (WAY IT’S), plans are underway for initial exhibitions that are set to

open in 2012. The inaugural exhibition will occur in spring, 2012, in New York City at the renowned Wilmer

Jennings Gallery (an affiliate of Kenkelaba House); this first exhibit will be followed by a venue in fall 2012 at

The Arts Guild New Jersey (Rahway, NJ) that will coincide with fall-2012’s national “Hispanic Heritage Celebra-

tion.” Check the We Are You Project’s Website for information regarding these initial WAY IT’S 2012 exhibi-

Page 22: O CORPUS DO PS - poeticasvisuais.com.br · O PS é um “conhece-te a ti mesmo? A epimeléia heautoû. Poétias isuais, Poétias isuais, performance. Poétias isuais, auru, v., n

132 133Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011. Poéticas Visuais, Bauru, v.2, n. 2, p. 114-133, 2011.

tions: <http://www.weareyouproject.org/6201.html>.

For all the above reasons, the highly anticipated WAY IT’S touring exhibition is one of the most com-

prehensive and insightful contemporary Latino art show ever assembled; presenting key Hispanic art-works from

a dozen Latin American nations, exhibiting unique 2-D subjects that broadly examine the following difficult

Hispanic concerns: immigration, Latinization, discrimination, Pan-Latin transculturalism, as well as identifying

all the myriad facets of Latino cultural identity as well as focusing on recent glaring examples within various US

state-governments of rampant Latinophobia, including vivid examples of widespread clandestine and private

anti-Latino activities that are occurring in 21st Century America. Hence, the We Are You Project uses art to

symbolically shed “Liberty’s” Laboulayean-light on all of the raging “anti-American” abuses and violations

of basic societal civil rights, which have been recently fomented by both ethno-racist state-governments (i.e.,

Arizona, Alabama, etc.) and individuals, who are unfortunately mired in extremism and injustice. During the

growing 21st Century anti-Hispanic crisis in the USA, the WAY IT’S artists are recognized as fresh ‘New Latino’

voices that demand justice for Latinos, as well as heroic agents for equitable systemic change. In their desire to

uphold the US Constitution; the US Bill of Rights, the 14th Amendment and vital historic Supreme Court deci-

sions; and through their vigorous Pro-Latino artistic-activism, and their yearning to improve the socio-economic,

cultural, artistic and political lot of both US-Latinos as well as all Latin Americans, the WAY IT’S artists employ

art as a both a catalyst for social change, and a “WAY” to champion Latino civil rights, believing that by so do-

ing inevitably the rights of all Americans from Tierra del Fuego to Hudson Bay will be preserved, because WE

ARE YOU.

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Recebido em 15 de Agosto de 2011. Aprovado para publicação em 16 de Novembro de 2011