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0 UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito Civil e Processual Civil Rosiane Morales Frota Valenciano O CASAMENTO, REGIME DE BENS E SUA (I)MUTABILIDADE LINS-SP 2008

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UNISALESIANO

Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium

Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito

Civil e Processual Civil

Rosiane Morales Frota Valenciano

O CASAMENTO, REGIME DE BENS E SUA

(I)MUTABILIDADE

LINS-SP

2008

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ROSIANE MORALES FROTA VALENCIANO

O CASAMENTO, O REGIME DE BENS E SUA (I)MUTABILIDADE

Monografia apresentada à Banca examinadora do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium, como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Direito Civil e Processual Civil sob a orientação dos Professores M.Sc. Sérvio Túlio Vialogo Marques de Castro e M.Sc. Heloisa Helena Rovery da Silva.

LINS – SP

2008

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Valenciano, Rosiane Morales Frota

O casamento, regime de bens e sua (i)mutabilidade / Rosiane Morales Frota Valenciano. – – Lins, 2008.

48p. 31cm.

Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium – UNISALESIANO, Lins, SP para Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito Civil e Processual Civil, 2008

Orientadores: Sérvio Túlio Vialogo Marques de Castro; Heloisa Helena Rovery da Silva

1. Direito Civil. 2. Direito de Família. 3. Casamento. 4. Regime de Bens. 5. Imutabilidade. I Título.

CDU 347.6

V247c

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ROSIANE MORALES FROTA VALENCIANO

O CASAMENTO, REGIME DE BENS E SUA (I)MUTABILIDADE

Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium,

para a obtenção do título de especialista em Direito Civil e Processual Civil.

Aprovada em:___/___/____

Banca examinadora:

Prof. M.Sc. Sérvio Túlio Vialogo Marques de Castro

Mestre em Direito pela Universidade de Marília

_______________________________________________________________

Profª. M.Sc. Heloisa Helena Rovery da Silva

Mestre em Administração pela CNEC/FACECA – MG

_______________________________________________________________

Lins – SP

2008

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DEDICATÓRIA

Dedico esta pesquisa ao meu marido

Carlos Alberto pelo apoio e incentivo e

aos meus filhos Caio Augusto e Lais.

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AGRADECIMENTO

Agradeço a DEUS pela capacidade que

me foi concedida, graciosa e

incondicionalmente.

Ao meu orientador SÉRVIO, pela

paciência, incentivo e sabedoria,

própria dos grandes homens, com

quem muito aprendi. Acreditou no meu

trabalho, deu-me a liberdade

necessária, dividindo comigo as

expectativas, conduzindo-me a maiores

reflexões e, desta forma, enriquecendo-

me. Minha especial admiração e

gratidão.

À todos os professores do curso de

pós-graduação do Unisalesiano, que

transmitiram valiosos conhecimentos.

E a todos que de forma direta ou

indireta contribuíram para a realização

desta pesquisa.

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RESUMO

O casamento representa a base da família e recebe proteção especial do Estado, é revestido de formalidades, mas é no regime matrimonial de bens que encontram-se os principais efeitos jurídicos, pois este regulamenta as relações patrimoniais decorrentes do casamento. O Código Civil Brasileiro estabeleceu, em enumeração exemplificativa quatro espécies de regime de bens, mostrando, a prática que são elas as escolhidas em geral pela sociedade. Concedeu, outrossim, liberdade de escolha, embora em algumas hipóteses haja regime obrigatório. Cada regime de bens traz peculiaridades próprias. Uma das características do regime de bens no ordenamento jurídico brasileiro é a possibilidade de sua alteração durante a vigência do casamento, mediante autorização judicial requerida por ambos os cônjuges de forma motivada. A possibilidade de alteração do regime de bens trouxe uma otimização ao princípio da autonomia das partes, podendo o casal insatisfeito com o regime de bens que rege seu casamento alterá-lo, para melhor se adequar a sua realidade, desde que não traga prejuízo a terceiros. Palavras-chave: Direito Civil. Direito de Família. Casamento. Regime de Bens. Imutabilidade.

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ABSTRACT

The marriage is the foundation of the family and receives special protection of the state, is coated with formalities, but in the scheme of matrimonial assets that are the main legal effects, as it regulates relations property arising out of wedlock. The Brazilian Civil Code established in illustrative list four species of scheme assets, showing the practice that they are chosen by society in general. It conceded, instead, freedom of choice, although in some cases there is compulsory system. Each system of property brings its own peculiarities. One of the characteristics of the goods in the Brazilian legal system is the possibility of his amendment during the marriage, by judicial authorization required by both spouses so motivated. The possibility of changing the regime of goods brought an optimization of the principle of party autonomy, could the unsatisfied couple with the regime of goods that governs your marriage change it to better fit the reality, provided they do not bring harm to others.

Keywords: Civil Law. Right of Family. Weddings. Goods Scheme. Immutability.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................... 9

CAPÍTULO I – EVOLUÇÃO DO INSTITUTO DO CASAMENTO............. 12

1 HISTÓRICO................................................................................. 12

1.1 Conceito...................................................................................... 13

1.2 Natureza jurídica......................................................................... 15

CAPÍTULO – FORMALIDADES – PROCESSO DE HABILITAÇÃO....... 17

2 FORMALIDADES........................................................................ 17

2.1 Processo de habilitação.............................................................. 17

2.2 Invalidade do casamento............................................................ 19

2.3 Efeitos jurídicos........................................................................... 20

CAPÍTULO III – DO REGIME DE BENS................................................... 22

3 INTRODUÇÃO E CONCEITO..................................................... 22

3.1 Espécies de regime de bens....................................................... 24

3.2 Forma e escolha do regime......................................................... 24

3.3 Espécies do regime de bens no Código Civil.............................. 25

3.3.1 Regime de comunhão parcial de bens........................................ 25

3.3.2 Regime de comunhão universal de bens.................................... 27

3.3.3 Regime de participação final nos aquestos................................. 28

3.3.4 Regime da separação................................................................. 31

CAPÍTULO IV – (I)MUTABILIDADE......................................................... 33

4 IMUTABILIDADE E IRREVOGABILIDADE DO REGIME DE

BENS......................................................................................................... 33

4.1 Direito intertemporal.................................................................... 36

4.2 Mutabilidade................................................................................ 40

CONCLUSÃO............................................................................................ 43

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REFERÊNCIAS......................................................................................... 46

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INTRODUÇÃO

O direito manifesta cuidados especiais com a família, e hoje se

reconhece tanto a família oriunda do casamento, quanto à da união estável.

Mas é o casamento o centro de onde irradiam as normas básicas do

direito de família, que constituem o direito matrimonial.

O casamento é considerado a mais importante instituição de direito

privado, por ser a base da família, que é tida como o eixo da sociedade.

Porém, a sociedade não é estática, ela avança, quebra barreiras, não

despreza o passado, mas adapta os fatos humanos ao momento vivido,

exigindo modificações dos nossos ordenamentos.

A aprovação de um Novo Código Civil é a prova dessa adaptação e

trouxe mudanças importantes ao direito de família.

Nesta pesquisa será abordado sobre o casamento, suas formalidades,

por ser ele um ato solene, bem como um apanhado dos principais aspectos

patrimoniais do casamento, e a (i)mutabilidade dos regimes de bem.

O direito matrimonial abrange normas concernentes à validade do

casamento, as relações pessoais entre os cônjuges, com a imposição de

direitos e deveres recíprocos, bem como as suas relações econômicas, que

chegam até a constituir um autêntico instituto, que é o regime de bens entre os

cônjuges.

O casamento civil brasileiro adota a livre escolha do regime patrimonial,

podendo os nubentes, antes da celebração, escolher entre os quatro regimes

que a Lei permite ou um que se adapte melhor as suas necessidades através

do pacto antenupcial, respeitando os preceitos legais para sua validade.

Hoje, porém, o casal pode alterar o regime de bens escolhido à época

da celebração do casamento, mediante autorização judicial com pedido

motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas

e ressalvadas os direitos de terceiros (artigo 1.639, parágrafo 2º do Código

Civil). (BRASIL, 2002).

O regime de bens que era imutável e irrevogável passou a ser mutável

por força da Lei, embora essa alteração seja relativa e envolva requisitos para

ser concedida.

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Essa alteração dividiu os doutrinadores pátrios, quanto à proteção em

relação aos cônjuges e terceiros, e principalmente quanto ao impacto social

dessa nova norma.

Nesta pesquisa serão tratadas as opiniões dos doutrinadores e quais

suas fundamentações em relação a matéria.

Outra questão relevante no ordenamento civil, que também dividiu os

doutrinadores, é se a modificação abrangeria só os casamentos realizados sob

a égide do Código Civil atual ou também os realizados na vigência do Código

de 1916.

Diante das divergências de opiniões, alguns casos já chegaram aos

Tribunais que já manifestam opiniões e direcionam essa inovação trazida pela

legislação civil adequando-a da melhor forma a nossa sociedade.

O pedido de alteração é feito pelos cônjuges que não querem mais a

regência e os efeitos do antigo regime, expostos os motivos e respeitados os

direitos de terceiros, cabe ao Juiz conceder a mudança e conseqüentemente

os seus efeitos jurídicos.

A mudança poderá favorecer muitos casais, porém, por ser norma

recente é tratada com ressalvas pela sociedade.

Essa mudança evidencia os novos rumos do direito de família,

adaptando-se a evolução e as necessidades da sociedade.

O objetivo geral do presente estudo é descrever as mudanças que a

mutabilidade dos regimes de bens trará ao instituto do casamento e suas

conseqüências jurídicas.

A pergunta problema que norteou o trabalho: Até que ponto as

mudanças advindas com a mutabilidade trouxeram conseqüências à instituição

do casamento entre os cônjuges e terceiros?, foi respondida, após estudos

realizados na doutrina e na jurisprudência, utilizando-se a revisão de literatura

como método de pesquisa.

O trabalho está assim dividido:

Capítulo I – apresenta a evolução histórica do instituto do casamento.

Capítulo II – analisa as formalidades do processo de habilitação para o

matrimônio.

Capítulo III – descreve o regime de bens, suas espécies, formas e

escolha.

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Capítulo IV – aborda a imutabilidade e irrevogabilidade do regime de

bens.

E, finalmente, vem a conclusão.

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CAPÍTULO I

EVOLUÇÃO DO INSTITUTO DO CASAMENTO

1 HISTÓRICO

De todas as instituições criadas pelo espírito humano, a família e o

casamento foram às únicas que resistiram, de forma contínua e indestrutível, a

marcha inexorável da humanidade.

Os ciclos econômicos, as conquistas industriais, a variabilidade dos

regimes políticos, as revoluções sociais, a indescritível persistência das guerras

científicas, a evolução do pensamento e das mentalidades, nada conseguiu

destruir a noção de família, que perdura inabalável através da história da

civilização.

No direito romano a base da família natural é o casamento, que segundo

Francisci, (apud LEITE, 1991, p. 57) é definido como “a convivência do homem

e da mulher com a intenção de ser esposo e esposa, de ter filhos e construir

uma sociedade íntima e perpetua”.

É importante ressaltar que não foi a religião que criou a família, esta é o

fruto da evolução humana, mas foi seguramente a Igreja que lhe impôs as

regras, contornos legais e a forma jurídica.

É inegável a influência que a Igreja possui em matéria familiar,

sobretudo quando se trata do casamento.

Os fatores econômicos e sociais dos séculos XV e XVI criaram

condições para o início da Reforma religiosa e a surpreendente rapidez de sua

propagação. Os efeitos da Reforma foram a separação definitiva do mundo

espiritual, as conjecturas do Estado e da Igreja, o civil do eclesiástico, que

produziu como conseqüência a regulamentação do casamento pelas leis do

Estado e contraído perante a autoridade que o representa, surgindo, assim, o

casamento civil.

Além disso, a preocupação da Igreja Católica com os casamentos

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clandestinos e a necessidade de normatização da matéria, uma vez que, com o

nascimento do anglicanismo, católicos passaram a não reconhecer os

casamentos celebrados por protestantes e vice-versa, também ajudou na

criação do casamento civil.

No Brasil eram respeitadas as normas do Concílio de Trento na época

da Colônia e do Império, mas com o advento da Independência do Brasil,

tornou-se necessário uma legislação própria. (LEITE, 1991).

O Decreto nº 181, de autoria de Ruy Barbosa, e promulgado no dia 24

de janeiro de 1890, instituiu o casamento civil no Brasil, sendo a única forma

valida para a celebração de matrimônios. (CASAMENTO..., 2008).

Esse decreto causou alvoroço entre a população católica, principalmente

nos meios rurais, instituiu-se o casamento civil, negando-se efeitos civis ao

matrimonio realizado perante a Igreja, ou seja, em face da Lei, o mero

casamento religioso passou a gerar apenas concubinato.

Para Leite, (1991, p. 370), “O casamento, que era um sacramento,

passa a ser encarado como um contrato, que depende do Estado, sendo

reconhecido a ele o poder para legislar sobre o casamento”.

Com a Lei nº 1.144 de 11/09/1861, cujo projeto era do Ministro da Justiça, Diogo de Vasconcelos, houve a permissão para o casamento de pessoas não católicas. O enlace deveria ser celebrado, por óbvio, segundo o ritual religioso professado pelos nubentes. Esta lei conferiu efeitos civis aos casamentos religiosos realizados pelos não católicos, desde que estivessem devidamente registrados, criando um registro estatal para atender à situação dos não católicos (grifo nosso). (BRANDÃO, 2002).

Com a separação do Estado e da Igreja, consagrado na Carta Magna de

1891, inaugurando a era republicana, só se reconheceu o casamento civil, cuja

celebração é gratuita e nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial,

nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos

Estados (artigo 72, § 4º e 7º). (BRASIL, 1891).

Com isso o casamento civil passou a ser o vínculo constituinte da

família brasileira, e assim perdura por 118 anos.

A Carta Magna de 1988 poucos preceitos dedicou ao casamento

limitando-se a prescrever no caput do artigo 226, que a família, base da

sociedade, tem especial proteção do Estado, reiterou no § 1º ser civil o

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casamento e gratuita a celebração. No § 2º concedeu efeito civil ao casamento

religioso, nos termos da lei. (BRASIL, 1988).

A realidade social brasileira, todavia, desconhece ou resiste à

celebração do casamento exclusivamente civil, persistindo em contraí-lo

apenas na religião, não se utilizando do registro desses casamentos religiosos

para que tenham efeitos civis como garante a Lei de Registros Públicos.

O casamento irradia efeitos nas órbitas pessoal e patrimonial. O código

Civil de 2002 de forma acertada dividiu em dois títulos o direito de família, um

para reger o direito pessoal e outro para disciplinar o direito patrimonial.

(BRASIL, 2002).

O direito pessoal que corresponde ao Titulo I do Livro IV do Código Civil

de 2002, disciplina o núcleo do Direito de Família, que se subdivide em dois

subtítulos: Do Casamento e Das relações de parentesco (grifo nosso).

(BRASIL, 2002).

O direito patrimonial de família, Titulo II, do mesmo Livro, é um ramo,

dentro do direito de família, que envolve todos os aspectos patrimoniais

inerentes as pessoas ligadas pelos vínculos oriundos da família. Nele são

regulamentados os regimes de bens, tratado no subtítulo I, no subtítulo II trata

dos alimentos e no subtítulo III fala sobre o bem de família. (BRASIL, 2002).

1.1 Conceito

O casamento é considerado a base da família, e é tido como o eixo

principal da sociedade, trazendo o pilar de todo o sistema social, moral e

cultural do País.

O casamento é a união do homem e da mulher que se dá através do

companheirismo e amor para que ambos tenham uma vida comum,

compartilhando o mesmo destino e os mesmos ideais.

Reforça essa idéia a clássica definição de Bevilácqua:

O casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações sexuais; estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e

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de interesses e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer. (BEVILÁCQUA, 1954, p. 130)

Para Diniz (2001, p. 33): “O casamento é um vínculo jurídico entre o

homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que

haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família legítima”.

Na definição de Rodrigues (2000, p. 17): “Casamento é o contrato de

direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de

conformidade com a Lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem

da prole comum e se prestarem mútua assistência”.

1.2 Natureza jurídica

Existe polêmica se a natureza jurídica do casamento é Contrato ou

Instituição.

Para a concepção contratualista o casamento é um contrato civil, regido

por normas comuns a todos os contratos concluindo-se e se aperfeiçoando

pelo consentimento dos nubentes de forma recíproca.

Para a concepção institucionalista o casamento é tido como uma grande

instituição social, refletindo uma situação jurídica que surge da vontade dos

nubentes, mas cujas normas, efeitos e forma estão preestabelecidos pela Lei.

A doutrina eclética ou mista une o elemento volitivo ao elemento

institucional, tornando o casamento um ato complexo, ou seja,

concomitantemente contrato (na formação) e instituição (no conteúdo), sendo

mais que um contrato, muito embora não deixando de ser contrato.

“Ligada à variedade das definições, vem naturalmente a diversidade na

conceituação. Para Lafayette é um ‘ato solene’, para Sá Pereira é uma

‘convenção social’, para Bevilácqua é um ‘contrato’”. (PEREIRA, 2002, p. 35).

Segundo Rodrigues:

O casamento assume a feição de um complexo, de natureza institucional, que depende da manifestação livre da vontade dos nubentes, mas que se completa pela celebração, a qual é ato

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privativo de representante do Estado. Não há inconveniente, dada à peculiaridade do fenômeno, de chamar ao casamento contrato de direito de família. (RODRIGUES, 2000, p. 20).

No entendimento de Diniz:

O casamento é uma instituição social, pois considerá-lo contrato é equipará-lo a uma venda e compra, colocando em plano secundário seus nobres fins. Deveras, difere o casamento, profundamente, do contrato em sua constituição, modo de ser, alcance de seus efeitos e duração. Logo, o casamento é um estado matrimonial, cujas relações são reguladas por norma jurídica. (DINIZ, 2001, p. 38-39).

O casamento é um ato complexo, é contrato em sua formação e

instituição no conteúdo, é mais que um contrato sem deixar de ser contrato.

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CAPÍTULO II

FORMALIDADES. PROCESSO DE HABILITAÇÃO

2 FORMALIDADES

O casamento desperta um grande interesse do Estado por ser ele o

gerador da família, que é a base da sociedade; e o disciplina minuciosamente,

cuidando de sua celebração, pressupostos e formalidades preliminares.

O casamento é revestido de formalidades para se evitar que os

nubentes convolem núpcias em desrespeito as normas jurídicas, sendo

portanto, um ato formal e é através do processo de habilitação matrimonial que

os nubentes deverão demonstrar que estão legalmente habilitados para o ato

nupcial

Por essa razão a celebração do casamento é precedida de processo de

habilitação, levada à efeito perante o Oficial do Registro Civil e esse processo

tem a finalidade de impedir que o casamento se realize com inobservância de

formalidades legais ou infração de algum impedimento dos que a Lei consigna.

2.1 Processo de habilitação

Na definição de Ceneviva (1986, p. 155): “Habilitar para o matrimônio

consiste em definir a aptidão jurídica dos nubentes que atuam no processo

juntamente com o oficial, o representante do Ministério Público e o Juiz”.

Esse processo tramita perante o Registro Civil das Pessoas Naturais,

junto ao Oficial do domicilio de ambos ou de pelo menos um deles e

compreende três fases distintas:

a) requerimento devidamente instruído com a documentação exigida

pela lei;

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b) afixação e publicação de editais; e

c) expedição de certificado de habilitação.

A primeira fase está prevista no caput do artigo 1.525 e seus incisos,

apresentados os documentos exigidos por este artigo, o oficial lavrará os

proclamas de casamento, mediante edital, que se afixará em lugar ostensivo do

Cartório e se publicará pela imprensa local, cumprindo assim a segunda fase.

(BRASIL, 2002).

O proclama é forma de publicidade ativa, destinada a transitoriedade,

dar ciência a todos do povo que duas pessoas querem casar-se, propiciando

ensejo de serem denunciados os impedimentos.

Nos termos do artigo 1.527, parágrafo único do Código Civil, a

autoridade competente, havendo urgência poderá dispensar a publicação dos

editais. (BRASIL, 2002).

A dispensa é permissão judicial para o não cumprimento da obrigação

de divulgar previamente o pretendido matrimônio.

É favor excepcional porque os proclamas se destinam, a permitir a

suscitação de impedimentos para o matrimônio e deve ser apreciado

atentamente pelo juiz.

A oposição de impedimentos constitui o ato pelo qual é noticiado ao

Oficial do Registro Civil a existência de impedimento que obsta a celebração do

casamento.

Deve ser a oposição apresentada de forma escrita e assinada à

autoridade competente e instruída com as provas do fato alegado.

De acordo com o entendimento de Batalha:

O procedimento de habilitação para o casamento tem natureza administrativa, através da qual se exerce a jurisdição graciosa ou voluntária. Entretanto, com a oposição de impedimentos matrimoniais, o processo assume aspecto nitidamente contencioso. (BATALHA, 1984, p. 198).

Analisada a oposição o Juiz decidirá pela procedência ou não do pedido

e conseqüentemente pela realização ou não do casamento.

Não havendo oposição e cumpridas as formalidades dos artigos 1.526 e

1.527, e não tendo se verificado nenhum fato obstativo, o Oficial extrairá o

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certificado de habilitação, encerrando assim a terceira fase. (BRASIL,

2002).

Estando o termo lavrado pelo Oficial atestando que os nubentes

preencheram os requisitos objetivos e subjetivos exigidos pela lei, não

possuindo qualquer causa proibitiva ou suspensiva de ordem matrimonial

poderá ser realizada a celebração do casamento, que é um ato solene, onde se

consulta sobre a livre vontade dos nubentes e a autoridade os declara unidos

pelo laço matrimonial.

O casamento civil é provado através da Certidão de Casamento, que

goza de presunção jurídica de veracidade do ato e constitui prova ordinária de

sua celebração.

2.2 Invalidade do casamento

Considera o Código Civil que tanto a nulidade como a anulabilidade são

institutos que invalidam o casamento.

Entretanto, tanto a doutrina quanto a jurisprudência, distinguem três

modalidades de imperfeição quanto à realização do ato nupcial:

a) casamento inexistente;

b) casamento nulo; e

c) casamento anulável.

Por casamento inexistente compreenda-se aquele que não reúne as

condições essenciais do casamento civil, como a diversidade de sexos,

consentimento dos nubentes e celebração do casamento.

O casamento inexistente será aquele que não preencher os requisitos e

não puder se formar, e, se não existe não há necessidade de se exigir que será

declarado inexistente.

Diferente será o casamento nulo, que tem existência, mas encontra-se

mareado de vícios que constituem manifesta infração aos princípios que

norteiam o instituto do casamento, especialmente os impedimentos

matrimoniais.

O casamento nulo é aquele que traz em seu bojo algum vício essencial

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previsto na lei, que não produz, em principio, efeitos jurídicos. A decretação da

nulidade deve ser processada por ação direta de nulidade, observado o rito

ordinário.

A anulação é prevista nos casos estipulados no artigo 1.550 do Código

Civil e põe termo à sociedade conjugal e ao vínculo matrimonial, deve ser

pronunciada mediante sentença judicial, não se admitindo, portanto a

decretação de anulação ex officio. (BRASIL, 2002).

A anulação do casamento, seja pela anulabilidade, seja pela nulidade,

implica no desfazimento do casamento, como se este não houvesse ocorrido,

não surtindo quaisquer efeitos, salvo os casos previstos no artigo 1.561 do

Código Civil. (BRASIL, 2002).

2.3 Efeitos jurídicos do casamento

O casamento não envolve uma simples convivência conjugal, e sim uma

convivência que ultrapassa o íntimo atingindo o social, o pessoal e o

patrimonial.

O mais considerável efeito jurídico é o patrimonial, que reside no regime

de bens.

Assim, os efeitos jurídicos patrimoniais do casamento surgem com

direitos e obrigações em relação à pessoa e aos bens patrimoniais do casal,

encontrados no regime de bens que tem peculiaridades próprias.

Conforme entendimento de Diniz (2001, p. 135): “O regime matrimonial

de bens é o conjunto de norma aplicáveis às relações e interesses econômicos

resultantes do casamento”.

Segundo Gomes (2001, p. 173): “Regime Matrimonial é o conjunto de

regras aplicáveis a sociedade conjugal considerada sob o aspecto dos seus

interesses patrimoniais. Em síntese, o estatuto patrimonial dos cônjuges”.

O regime patrimonial afeta exclusivamente a regulamentação dos bens

econômicos e seus reflexos entre cônjuges e entre cônjuges e terceiros.

Conforme o regime que for adotado, em decorrência do casamento pode

ocorrer que o cônjuge adquira a propriedade dos bens conjugais, e, é mediante

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o estabelecimento de regimes de bens durante o casamento que a Lei

estruturará e disciplinará as relações patrimoniais entre os cônjuges.

O casamento civil brasileiro adota a livre escolha do regime patrimonial,

podendo os nubentes antes da celebração do casamento escolher entre os

quatro que a Lei permite, a saber:

a) comunhão universal de bens;

b) comunhão parcial de bens;

c) separação de bens; e

d) regime de participação final nos aquestos.

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23

CAPÍTULO III

DO REGIME DE BENS

3 INTRODUÇÃO E CONCEITO

Considerando a vida em comum que se estabelece entre os cônjuges, a

partir do matrimônio, torna-se imprescindível que sejam prefixadas as diretrizes

e princípios que irão disciplinar as relações econômicas e os interesses dos

cônjuges.

Essas diretrizes e princípios constituem o estatuto patrimonial dos

cônjuges e recebe, em nosso ordenamento, o nome de regime de bens.

Bevilácqua, (1943, p. 171) traz um conceito sucinto: “Regime de bens no

casamento é o conjunto dos princípios jurídicos, que regulam as relações

econômicas dos cônjuges”.

Pereira (2004, p. 118) conceituou os regimes de bens como “princípios

jurídicos que disciplinam as relações econômicas entre os cônjuges, na

constância do casamento”.

Em comentários aos artigos do Código Civil Brasileiro, Paulo Luiz Lobo

Netto, assim definiu Regime de Bens:

O regime de bens tem por fito regulamentar as relações patrimoniais entre os cônjuges, nomeadamente quanto ao domínio e a administração de ambos ou de cada um sobre os bens trazidos ao casamento e os adquiridos durante a união conjugal. (LOBO, 2003, p. 231).

O regime de bens é o complexo de princípios jurídicos reguladores das

relações econômicas entre marido e mulher.

Na família existem relações entre os cônjuges e os filhos e entre os

cônjuges e terceiros. Quanto às relações entre os cônjuges, podem ser elas de

natureza pessoal ou patrimonial. As primeiras, embora o legislador estabeleceu

princípios mínimos, é uma exigência facultativa, é mais de ordem moral.

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As relações de ordem patrimonial, por serem complexas e delicadas,

visto importarem especialmente na solidez do matrimônio, foram também

tratadas pelo legislador. Este preferiu transferi-las da parte obrigacional do

código para o âmbito do direito de família, dando-lhes conotação diversa.

A organização do regime de bens se subordina a cinco princípios

essenciais, quais sejam:

a) liberdade das convenções antenupciais;

b) adequação a pertinência do regime;

c) variedade de regime de bens;

d) vigência de regime de bens; e

e) e imutabilidade relativa do regime de bens.

De acordo com o princípio da liberdade das convenções antenupciais, os

nubentes podem escolher o regime que quiserem, ou adotar como regime

matrimonial regras e diretrizes criadas por eles e que julgam ser a mais

conveniente aos seus interesses. Trata-se da constituição do pacto

antenupcial, que é um ato solene, firmado pelos nubentes antes da celebração

do casamento.

Essa liberdade não é absoluta, pois a existência do principio da

adequação e pertinência do regime, segundo o qual não é licito aos nubentes

pactuar cláusulas cujo objeto se confunde com suas relações pessoais ou em

face de terceiros e em relação aos filhos, devendo o pacto antenupcial se

adequar às limitações especiais fixadas nos artigos 1.653-1.657 do Código

Civil. (BRASIL, 2002).

O principio da variedade de regimes informa o rol de regimes adotados

pelo ordenamento jurídico, os quais poderão ser escolhidos pelos nubentes na

forma do parágrafo único, 1ª parte do artigo do artigo 1.640, a saber: regime da

comunhão parcial de bens, regime da comunhão de bens, o regime de

participação final nos aquestos e o regime da separação de bens. (BRASIL,

2002).

Pelo principio da vigência do regime de bens, este começa a vigorar

desde a data da celebração do casamento valido.

Finalmente o principio da imutabilidade relativa do regime adotado pelos

cônjuges, no Código Civil de 1916 adotava-se a imutabilidade absoluta, não se

permitindo a substituição do regime de bens adotado. (BRASIL, 1916). O novo

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ordenamento adotou no parágrafo 2º do artigo 1.639, a possibilidade da

alteração de forma excepcional, mediante autorização judicial, com pedido

devidamente justificável e formulado por ambos os cônjuges e que não traga

prejuízo a terceiros. (BRASIL, 2002).

3.1 Espécies de regime de bens

O Código Civil tipificou quatro espécies de regime de bens: da

comunhão universal, da comunhão parcial, da separação de bens e o de

participação final nos aquestos. Mas é lícito aos nubentes combinar as regras

desses regimes, ou criar novas regras, tornando, assim, infinito o número de

regimes matrimoniais possíveis entre nós. Washington de Barros Monteiro

conta que na Alemanha foram catalogados mais de 100 espécies de regimes

de bens, mas em nosso ordenamento existem quatro regimes de bens

tipificados, em regra, vigora a liberdade de vontade na escolha do regime como

preceitua o artigo 1.639 do Código Civil. (BRASIL, 2002).

3.2 Forma e escolha do regime

A vontade na escolha do regime matrimonial tem forma especial e única

estabelecida pelo legislador: é o pacto antenupcial. Trata-se de contrato

solene, feito antes do matrimônio, pelo qual as partes escolhem o regime de

bens que vigorará durante o casamento. Essa convenção patrimonial exige

escritura pública (artigo 1.653 do Código Civil) e capacidade para realizá-la. É

ato pessoal e não pode ser delegado a outrem a opção pelo mesmo. (BRASIL,

2002).

Segundo Rodrigues (2000, p. 167-168): “O pacto antenupcial é um

contrato solene, realizado antes do casamento, por meio do qual as partes

dispõem sobre o regime de bens que vigorará entre eles durante o

matrimônio”.

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O pacto antenupcial embora respeite a vontade do casal respeitará os

princípios de ordem pública, os fins e a natureza do casamento.

Não havendo opção, isto é, no silêncio dos nubentes, a própria lei

presume o regime de bens escolhido, que a partir da Lei nº 6.515/77 (BRASIL,

1977), é o Regime da Comunhão Parcial de Bens. Da mesma forma o regime

de bens é presumido no caso de nulidade do pacto antenupcial.

3.3 Espécies de regime de bens no Código Civil

3.3.1 Regime da comunhão parcial

O regime da comunhão parcial, também denominado regime legal é o

adotado quando não houver convenção antenupcial, ou for nula a ajustada

entre o casal, a partir da Lei nº 6.515/77. (BRASIL, 1977).

A maioria dos casamentos é celebrada sob esse regime, principalmente,

pela questão econômica, pois os demais regimes são escolhidos através de

pacto antenupcial, que é ato formal realizado no Cartório de Notas e tem um

custo, além do desconhecimento da grande maioria da população.

Trata esse regime que serão incomunicáveis todos os bens que cada um

dos cônjuges possui ao tempo do matrimônio, mas se comunicam seus frutos

bem como os adquiridos (aqüestos) na constância do casamento a título

oneroso.

O conceito legal desse regime vem disposto no artigo 1.658 do Código

Civil que diz: “No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que

sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos

artigos seguintes”. (BRASIL, 2002).

Na definição de Planiol; Ripert, (apud GOMES, 2001, p. 184): “Regime

da comunhão parcial é tido como o que melhor realiza a idéia de colaboração

ínsita aos regimes comunitários, pois a estabelece a partir do momento em que

nasce a sociedade conjugal”.

Esse regime caracteriza-se pela coexistência de 3 patrimônios a saber:

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a) o patrimônio comum – que são aqueles bens adquiridos a título

oneroso durante o casamento;

b) o patrimônio pessoal do marido – são aqueles bens que ele possuía

antes do casamento; e

c) o patrimônio pessoal da mulher – é o patrimônio que ela possuía

antes de contrair o matrimônio.

Nesse regime, se comunicam os bens adquiridos na constância do

casamento não se comunicando, entretanto os bens que cada um dos

cônjuges possuía antes do matrimonio ou lhes sobrevieram na constância dele,

por doação, sucessão ou sub-rogação.

Os bens particulares são enumerados nos incisos do artigo 1.659 e no

artigo 1.661 do Código Civil. (BRASIL, 2002).

A incomunicabilidade desses bens é acertada, pois não existe esforço

comum do casal o que estaria em desconformidade com o que o regime

propõe ao casal, porém, essa incomunicabilidade não se estende aos frutos

resultantes da venda desses bens, passando a fazer parte integrante do

patrimônio do casal.

Elencados no artigo 1.660 estão os bens que entram na comunhão, essa

comunicabilidade ocorre porque existe uma presunção de esforços do casal

para adquirirem um patrimônio comum, zelando por estes em benefício próprio

e da prole, trazendo mais conforto à vida em comum. (BRASIL, 2002).

A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos

cônjuges, e a administração dos bens particulares compete ao cônjuge

proprietário.

A dissolução desse regime dá-se pela morte de um dos cônjuges,

separação judicial, divórcio, nulidade ou anulação de casamento.

O Regime de bens terá sua dissolução pela morte de um dos cônjuges,

os bens que lhe pertenciam devem ser entregues aos herdeiros, se

ocorrer a separação judicial ou o divórcio faz-se a partilha somente dos bens

comuns.

Uma vez dissolvida a sociedade conjugal pela morte de um dos

cônjuges, os bens particulares que lhe pertenciam devem ser entregues aos

herdeiros, se ocorrer a separação judicial ou extrajudicial ou o divorcio faz-se a

partilha somente dos bens comuns.

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Cada cônjuge tem direito a metade ideal dos bens aquestos, que é a

meação. Quando ocorrer o falecimento de um dos cônjuges será destinado a

seus herdeiros, a meação da qual tinha direito, juntamente com os bens

particulares, se houver.

3.3.2 Regime da comunhão universal de bens

Até o advento da Lei nº 6.515/77 o regime legal era o da comunhão

universal de bens, que com a lei passou a ser um regime convencional sujeito

ao pacto antenupcial. (BRASIL, 1977).

O artigo 1.667 do Código Civil conceitua assim o regime: “O regime da

comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e

futuros dos cônjuges e suas dividas passivas, com as exceções do artigo

seguinte”. (BRASIL, 2002).

Através desse regime os bens tornam-se comuns, assim tanto aqueles

adquiridos anteriormente ao casamento como os adquiridos na constância se

tornam indivisos, ou seja, cabe a cada um a metade ideal do patrimônio.

Esse regime é adotado através do pacto antenupcial que deve ser

redigido por escritura pública sob pena de nulidade.

Será nula a convenção, ou a cláusula que prejudique os direitos

conjugais, ou paternos, ou ainda as que contravenham disposição absoluta de

Lei.

Nesse regime a comunicabilidade é a regra, mas o artigo 1668 traz o rol

dos bens excluídos da comunhão universal, ou por terem efeitos

personalíssimos ou devido a sua própria natureza. (BRASIL, 2002).

De acordo com o artigo 1.669 a incomunicabilidade desses bens não se

estende aos frutos quando estes vierem durante o casamento. (BRASIL,

2002).

A administração dos bens é comum, ambos os cônjuges podem

administrar.

A comunhão universal de bens cessa com a dissolução da sociedade

conjugal pela morte de um dos cônjuges, pela sentença anulatória do

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matrimônio, pela separação judicial e pelo divórcio obtido de forma direta após

dois anos de separação de fato.

Dissolvida a comunhão os bens serão repartidos em duas partes iguais,

uma para cada cônjuge, e efetuada a divisão do ativo e do passivo, cessará a

responsabilidade de cada um dos cônjuges para com os credores do outro

(artigo 1.671 do Código Civil). (BRASIL, 2002).

Segundo Diniz :

Através desse regime os bens presentes e futuros, adquiridos antes ou depois do matrimônio, tornam-se comuns, constituindo uma só massa. Instaura-se o estado de indivisão, passando a ter cada cônjuge o direito à metade ideal do patrimônio comum. (DINIZ, 2001, p. 145).

Já Rodrigues (2002, p. 197) pontifica que é um condomínio peculiar,

porque insuscetível de divisão e alienação antes da dissolução da sociedade

conjugal.

Deveras esse regime que era até 1977, tido como legal, hoje a escolha

dele entre os casais é rara.

3.3.3 Regime de participação final nos aqüestos

O regime de participação final nos aquestos foi a inovação trazida pela

Lei nº 10.406/2002. (BRASIL, 2002).

A sua constituição decorre dos princípios da liberdade das convenções

antenupciais e da variedade de regime de bens existente em nosso

ordenamento.

O conceito deste regime vem disposto no artigo 1.672 do Código Civil:

No regime de participação final nos aquestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento. (BRASIL, 2002).

O regime de participação final nos aquestos é uma espécie de regime

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misto, contendo princípios aplicáveis à comunhão parcial e à separação de

bens, baseando-se em bens próprios, durante toda a constância do casamento

e, ao final da sociedade conjugal, na apuração dos aquestos a serem excluídos

desses bens próprios.

Com a dissolução da sociedade conjugal haverá a compensação dos

bens adquiridos onerosamente na constância do casamento.

Para Diniz

Existe a formação de massas de bens particulares incomunicáveis durante o casamento, mas que se tornam comuns no momento da dissolução do casamento, sendo que na constância do matrimônio os cônjuges têm a expectativa de direito à meação, pois cada um é credor da metade do que o outro adquirir, a título oneroso. (DINIZ, 2001, p. 161).

Para Villela:

A participação final nos aqüestos pretende ser a síntese conciliativa de dois valores antagônicos na organização patrimonial do casamento. De um lado, quer incorporar os ideais do regime da comunhão, que, além de expressar a unidade de vida do casal, assegura aos cônjuges mútua proteção econômica. De outro lado, não deseja abrir mão da maior autonomia conjugal e das comodidades que conferem os regimes separatórios. Por isso, ao mesmo tempo que define uma participação de cada cônjuge nos incrementos patrimoniais do outro, evita – ao menos em sua formação pura – a constituição de qualquer massa comum de bens. (VILLELA, 1974, p. 7).

Assim, para Colomer (apud VILLELA, 1974, p. 8) sua originalidade se

deve:

Ao fato de que ele se situa a meio-caminho dos regimes comunitários e do regime de separação de bens, porque combina, em mistura sabiamente dosada, o cuidado separatista da independência dos esposos e a vontade comunitária de participações nos ganhos.

Afirma Diniz:

Trata-se de um regime misto, pois durante a vigência do matrimônio aplicam-se-lhe as normas da separação de bens, pela quais cada cônjuge possui seu próprio patrimônio, tendo a titularidade do direito

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de propriedade sobre os bens adquiridos, que comporão uma massa incomunicável de bens particulares. (DINIZ, 2001, p. 162-163).

Segundo Brandão não se trata de regime misto, pois:

Do calculo para estipular os valores sobre os quais a participação se dará, não se chega efetivamente à meação, porque ela diz respeito à parte do patrimônio próprio que já é seu. Aqui, especificamente, o que se tem é um direito de credito oriundo da simples apuração da compensação dos aquestos adquiridos. (BRANDÃO, 2007, p. 236).

O Código Civil o trata como regime misto, pois, durante o casamento, os

cônjuges têm expectativa de direito à meação, de maneira que a partilha, em

caso de dissolução da sociedade conjugal, obedece uma precisa e rigorosa

verificação contábil, comparando-se o patrimônio existente por ocasião das

núpcias com o final.

Nota-se que difere esse regime da comunhão parcial de bens porque a

participação é a partir da celebração das núpcias e no regime de participação

final nos aqüestos existe a formação de massas de bens particulares

incomunicáveis durante o matrimônio, mas que se tornam comuns no momento

de sua dissolução.

Ocorrendo a dissolução do casamento, seja pela morte, anulação,

declaração de nulidade, separação judicial ou extrajudicial e divorcio, apurar-

se-á o montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios

os bens anteriores ao casamento e os sub-rogados em seu lugar, os obtidos

por cada cônjuge por herança ou doação, e os débitos relativos a esses

bens vencidos e a vencer (artigo 1.674, I, II e III do Código Civil). (BRASIL,

2002).

Nas operações de subtração deverão observar eventuais doações feitas

por um cônjuge, como preceitua o artigo 1.675 do Código Civil. (BRASIL,

2002).

Na essência esse regime prima pelo respeito à individualidade e

autonomia de cada um dos cônjuges.

Por se tratar de um regime novo em nosso ordenamento, é pouco aceito

na sociedade.

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3.3.4 Regime da separação

Esse regime caracteriza-se pela incomunicabilidade dos bens presentes

e futuros do casal, permanece separado quanto à propriedade dos bens, sua

administração e gozo e as dívidas passivas.

Segundo Rodrigues:

O regime de separação de bens vem a ser aquele em que cada consorte conserva, com exclusividade, o domínio, posse e administração de seus bens presentes e futuros e a responsabilidade pelos débitos anteriores e posteriores ao matrimônio. (RODRIGUES, 2000, p. 202).

Existem duas massas particulares, a do homem e da mulher. Esse

regime pode ser escolhido pelo casal através do pacto antenupcial ou ser uma

determinação da Lei.

Será uma determinação legal no casamento das pessoas que

contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do

casamento; da pessoa maior de 60 (sessenta) anos; de todos os que

dependerem, para casar, de suprimento judicial, conforme preceitua o artigo

1.641 do Código Civil. (BRASIL, 2002).

Fora esses casos, os nubentes que quiserem adotar esse regime

deverão instituí-lo numa convenção antenupcial (artigo 1.639 do Código Civil),

que em respeito ao principio da liberdade das convenções permite-se que haja

comunicação de alguns bens. (BRASIL, 2002).

Existe, portanto, duas espécies de separação no casamento:

a) pura e limitada, será pura aquela que estabelece a

incomunicabilidade de todos os bens, tanto aqueles que se possuía

antes quanto aqueles adquiridos durante o casamento. Nesse regime

se tem dois patrimônios distintos. Será limitada se a

incomunicabilidade não atingir os bens adquiridos na constância do

matrimônio; e

b) absoluta ou relativa, será absoluta quando o casal assim estipular de

forma expressa no pacto antenupcial e relativa quando não dispensar

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de forma expressa, tendo, portanto, a comunicação dos bens

adquiridos na constância do casamento.

A súmula 377 do Supremo Tribunal Federal afirmou que se comunicam

os bens adquiridos na constância do casamento celebrado sob o regime da

separação legal de bens.

São efeitos desse regime:

a) cada cônjuge conserva a propriedade plena e exclusiva dos bens que

possui ao casar e dos que adquirir na constância do casamento;

b) os bens pertencentes a cada um ficam sob sua exclusiva

administração;

c) cada cônjuge pode dispor livremente dos seus bens sendo eles

móveis e quanto aos imóveis dependerá do consentimento do outro;

d) o passivo dos cônjuges é separado tal como o ativo de seus

respectivos patrimônios; e

e) os créditos entre os cônjuges regulam-se pelas disposições

concernentes à obrigação entre pessoas estranhas.

Marido e mulher são obrigados a concorrer para as despesas do casal

com os rendimentos de seus bens, assim como são responsáveis pelas dividas

que contraírem (artigos 1.642 e 1.687 do Código Civil). (BRASIL, 2002).

Com a dissolução do casamento, cada um dos consortes retira o seu

patrimônio. Havendo o falecimento de qualquer dos cônjuges o outro entrega

aos herdeiros do falecido a parte deste e se houver bens comuns o

administrará até a partilha.

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CAPÍTULO IV

(I)MUTABILIDADE

4 IMUTABILIDADE E IRREVOGABILIDADE DO REGIME DE BENS

O regime de bens tem início com o casamento. O Código de 1916

consagrava a imutabilidade do regime de bens, regra que era entendida como

absoluta, quer resulta-se o regime da vontade das partes (pacto) quer da

vontade da lei (regime legal ou supletivo e o obrigatório da separação).

(BRASIL, 1916).

A irrevogabilidade e a imutabilidade impõem a proibição da alteração do

regime de bens após a celebração do casamento.

Duas eram as principais ordens de razão a justificar as regras: uma de

proteção aos nubentes e outra de proteção a terceiros.

Quanto aos nubentes, fala-se que após o matrimônio, não teriam eles,

ou o mais fraco, independência de vontade suficiente para fazer manter o

regime que lhe fosse mais protetivo. Quanto aos terceiros, à estabilidade da

relação patrimonial do casal é garantia para suas relações econômicas.

O casamento é a perpetuidade do relacionamento entre os consortes. E

essa perpetuidade deve existir não só no aspecto moral da relação, mas

também no que concerne às relações patrimoniais.

O princípio da imutabilidade, entretanto, não é consectário do sistema

em todos os povos. Muitos são os países que permitem a alteração, sempre

respeitados os direitos de terceiros.

As decisões em relação à mutabilidade do regime de bens vêm de longa

data, devido a importância do Direito, ser um reflexo das necessidades das

sociedades de cada época.

Entre nós a proibição era absoluta, com raros exemplos apontados como

hipóteses de atenuação da imutabilidade do regime de bens.

O artigo 230 do Código Civil de 1916 tinha como exceção o artigo 7º, §

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5º da Lei de Introdução do Código Civil, que contemplava a situação do

estrangeiro que vinha a se naturalizar brasileiro, concedendo-lhe a faculdade,

no ato da entrega do decreto de naturalização, pelo regime da comunhão

parcial de bens, desde que houvesse a anuência do outro cônjuge. (BRASIL,

1916).

O Código atual trouxe a possibilidade da alteração durante o casamento,

mediante a satisfação de alguns requisitos.

O principio da imutabilidade do regime patrimonial visava à preservação

dos direitos de terceiros e dos próprios cônjuges, uma norma voltada a

proteção da mulher casada no século XIX que perdurou por 86 anos e com a

evolução da sociedade e a igualdade entre homens e mulheres, a legislação

ampliou a liberdade dos cônjuges, impondo ainda assim restrições.

As divergências quanto à mutabilidade do regime de bens faz surgir

entre os doutrinadores duas correntes, uma favorável e a outra contra a

mudança do regime de bens.

Para uma corrente o Código Civil tornou vulnerável as relações que

envolvem cônjuges e terceiros, utilizam-se o argumento da preservação do

interesses de terceiros, bem como a necessidade de proteger o cônjuge mais

frágil da possível coação que o outro viesse a exercer para garantir a alteração

que lhe fosse mais apropriada. Para eles o principio da mutabilidade do regime

de bens na vigência do casamento proporcionou insegurança econômica aos

terceiros que mantinham negócios com os cônjuges, ao casal e à sociedade.

Carvalho Neto; Fugie (apud BRANDÃO, 2007, p. 110) criticam a

inovação do artigo 1639, § 2º, do Código Civil:

Trata-se de disposição extremamente perigosa, que pode dar margem a uma série de conflitos. Não será incomum a pressão de um cônjuges sobre o outro para alteração do regime na constância do casamento, o que poderá ser questionado após a dissolução da sociedade conjugal. Ademais, pode haver fraude contra credores e mesmo eventual filho fora do matrimonio por um dos cônjuges (notadamente o marido). Melhor seria que o legislador mantivesse o regime da inalterabilidade do regime do sistema passado.

A posição favorável à mutabilidade do regime de bens defende que

embora o Código Civil de 1916 consagrasse o principio da imutabilidade hoje

ele não se aplica mais, nos dias atuais predomina a igualdade entre homens e

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mulheres na esfera do casamento, o diploma ampliou a liberdade, mas impôs

medidas de segurança para se preservar direitos de terceiros e dos cônjuges.

(BRASIL, 1916).

Para Gomes (apud BRANDÃO, 2007, p. 131):

A mutabilidade no fim de contas, é também a manifestação do principio de que o casamento não é, obviamente, qualquer fonte de incapacidade e deve por isso mesmo ser introduzida em nome da autonomia patrimonial dos cônjuges.

A faculdade da alteração do regime de bens na vigência do casamento

prevista no artigo 1639, § 2º traz requisitos para sua modificação, como ser

através de um processo judicial, haver consensualidade do casal, ser motivado

e provar a necessidade da mudança e principalmente que não traga prejuízos a

terceiros, por isso à necessidade de sua ampla publicidade. (BRASIL, 2002).

Para Carvalho Santos (apud DINIZ, 2001, p. 141):

Não se justifica o princípio da irrevogabilidade do regime matrimonial, já que aconselha-se a modificação, e quem, no tocante a terceiros, seus direitos podem ser ressalvados, sem que haja necessidade de se acolher a inflexibilidade do princípio da imutabilidade, imposto pela legislação.

A alteração só deverá ser autorizada, se requerida por ambos os

cônjuges, acompanhada de justificativas, e seu acolhimento deverá depender

de decisão judicial, verificando o órgão judicante se o pedido foi manifestado

livremente, se motivos plausíveis aconselham seu deferimento e se não

prejudicará tal modificação direito de terceiros.

O pedido dos cônjuges deve ser subscrito por ambos, sendo

inadmissível que o seja unilateralmente. O texto legal deixa claro que a

manifestação dos cônjuges é ato personalíssimo.

O processo judicial é necessário diante da relevância da medida,

visando proteger interesses dos cônjuges e de terceiros, evitando assim

abusos, é procedimento de jurisdição voluntária, inadmissível a postulação

unilateral.

A norma dispõe ainda sobre a motivação e sua prova, porém não

especifica em quais circunstâncias será considerada justificável a modificação.

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O enunciado do artigo 1.639 recomenda que para a autorização judicial

para alteração do regime de bens na constância do casamento deve ser

procedida de comprovação acerca da inexistência de divida de qualquer

natureza. (BRASIL, 2002).

O artigo 1.671 do Código Civil dispõe que: extinta a comunhão, e

efetuada a divisão do ativo e do passivo, cessará a responsabilidade de cada

um dos cônjuges para com credores do outro. Isso porque em relação aos

credores anteriores seus direitos estão resguardados. (BRASIL, 2002).

A partir do trânsito em julgado poderá operar-se a mutabilidade do

regime de bens.

A averbação será feita mediante a indicação minuciosa da sentença (Lei

nº 6.015/73, artigos 97 e 99), arquivando-se o mandado. Com a averbação, a

alteração do regime de bens produzirá efeitos em relação a terceiros, ex nunc,

sendo que as certidões extraídas deverão necessariamente, mencionar a

alteração do regime de bens, nos termos do artigo 21 da Lei nº 6.015/73, com a

transcrição da averbação. (BRASIL, 1973).

4.1 Direito intertemporal

Outra discussão considerável entre doutrinadores foi se a alteração

abrangeria os casamentos realizados sob a égide do Código Civil de 1916,

nota-se aqui um conflito intertemporal. (BRASIL, 1916).

De um lado a segurança das relações estabelecida pelo Código Civil de

1916 e o estabelecido no atual Código Civil que traz em seu texto a

mutabilidade como conseqüência da evolução da sociedade. (BRASIL, 1916,

2002).

Essa discussão dividiu os doutrinadores pátrios, vejamos algumas

opiniões:

Para Diniz:

[...] o art. 2.039 é o aplicável ao regime matrimonial de bens, que, portanto, será mutável, se o casamento se deu sob a égide do Código de 1916, salvo as exceções admitidas pela jurisprudência, durante a sua vigência. Se assim é, nada obsta a que se aplique o art 1639, x2

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do novo Código, excepcionalmente, se assim o magistrado entender, aplicando o art.5 da LICC, para sanar lacuna axiológica que, provavelmente, se instauraria por gerar uma situação em que se teria a não correspondência da norma do CC de 1916 com os valores vigentes na sociedade. (DINIZ, 2003, p. 320).

Pereira (2004, p. 192), adota posição intermediaria ao permitir a

mutabilidade do regime de bens inclusive para casamentos celebrados

anteriormente à vigência do atual Código, desde que o novo regime tenha

efeitos ex nunc, ou seja, ele só pode atingir “bens e negócios jurídicos

adquiridos e contratados após a decisão judicial que autorizar a mudança”.

Afirma Oliveira que:

[...] somente as regras específicas acerca de cada regime é que se aplicam em conformidade com a lei vigente à época da celebração do casamento, mas quanto às disposições gerais comuns a todos os regimes aplica-se o novo Código Civil. (OLIVEIRA, 2003, p. 395).

Na mesma esteira de pensamento vai Delgado (2003, p. 506):

As disposições constantes dos artigos 1.639 a 1.657 são regras de distintas e independentes daquelas que compõem os regimes de bens propriamente ditos. Integram o chamado direito patrimonial privado e prescrevem os princípios aplicáveis à sociedade conjugal, do ponto de vista dos seus interesses patrimoniais. Disciplinam, no âmbito da sociedade conjugal, a propriedade, a administração, o gozo e a disponibilidade dos bens e obrigações que os cônjuges podem ou não assumir, qualquer que seja o regime de bens

Os regimes de bens no novo Código Civil brasileiro sofreram várias

modificações em suas estruturas internas, assim sendo, a despeito das

modificações suportadas pelos próprios regimes de bens, os casamentos

celebrados sob a égide do Código Civil de 1916 obedecerão às normas a que

se submeteram na época de sua realização. Isso não quer dizer que haja

proibição de alteração para os casados anteriormente à vigência do novo

diploma. Apenas as regras internas dos regimes antes do Código de 2002

continuarão a ser observadas pelos cônjuges que estão submetidos a eles.

Então quem casou durante a vigência do Código de 1916 respeitará as

normas atinentes ao seu regime de bens, ali enumeradas e quem se casou sob

a égide do novo diploma observará as normas por este estabelecida.

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A discussão chegou aos Tribunais, observam-se algumas decisões:

EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA - CASAMENTO - REGIME DE BENS - ALTERABILIDADE – LEI NOVA "VERSUS" LEI ANTIGA - PRINCÍPIO DA IGUALDADE. – Não obstante celebrado sob a égide do Código Civil de 1916, o casamento poderá ter seu regime de bens alterado, desde que satisfeitos os requisitos do parágrafo 2º do artigo 1.639 do atual Código Civil, na medida em que ali não se excepcionou os casamentos anteriores, também não o fazendo o artigo 2.039, salvo no tocante à ressalva da inalterabilidade automática do regime. – Desaparecendo a motivação que impedia a alteração do regime de bens do casamento, não se justifica a distinção entre casamentos novos e antigos, uma vez que o instituto é único e, em se tratando de situação que exige requerimento conjunto, não haverá prejuízo para os cônjuges. Apelação Cível Nº 1.0518.03.038304-7/001 – Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Sr. Des. Moreira Diniz, Julgado em 20/05/2004 - v.u.). EMENTA: DIREITO CIVIL – MODIFICAÇÃO DE REGIME DE BENS – CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL ANTERIOR - POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – RECURSO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 1.0024.04.301004-0/001, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Sr. Des. Audebert Delage, Julgado em 14/10/2004 - v.u.). EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS. DESOBEDIÊNCIA AO DISPOSTO NO ART. 1.639, § 2º, DO CC. A pretensão dos recorrentes esbarra no não-atendimento ao disposto no art. 1.639, § 2º, do CC, vez que ausente prova de que terceiros não serão prejudicados com a modificação pretendida. Recurso desprovido. Apelação Cível Nº 70022174403, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 26/11/2007 EMENTA.:"APELACAO CIVEL. CASAMENTO. ALTERACAO DO REGIME DE BENS. SEXAGENARIO. IMPOSICAO LEGAL (ARTIGO 1.641, II, CCB). IMPOSSIBILIDADE. E VEDADA A ALTERACAO DO REGIME DE BENS DE CASAMENTO CELEBRADO POR PESSOA MAIOR DE 60 (SESSENTA) ANOS, UMA VEZ QUE A OBRIGATORIEDADE DA ADOCAO DO REGIME DE SEPARACAO DE BENS DECORRE DE IMPOSICAO LEGAL (ARTIGO 1.641, II, CCB). - IN CASU, A CONDICAO SUSPENSIVA DETERMINANTE DA IMPOSICAO DO REGIME DE SEPARACAO DE BENS, POR RAZOES OBVIAS, NUNCA IRA OCORRER, VISTO QUE DECORRE DA IDADE 'AVANCADA' DA PESSOA. – O PEDIDO E JURIDICAMENTE IMPOSSIVEL QUANDO O ORDENAMENTO O PROIBE EXPRESSAMENTE, DEVENDO O FEITO SER EXTINTO SEM JULGAMENTO DE MERITO, NOS TERMOS DO ARTIGO 267, VI DO CPC. APELO CONHECIDO E IMPROVIDO." Apelação Cível n.200702109848001 – Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Goias, Relator: Sr. Des. Kisleu Dias Maciel Filho, Julgado em 04/03/2008 - v.u.). EMENTA: CIVIL – REGIME MATRIMONIAL DE BENS – ALTERAÇÃO JUDICIAL – CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071) - POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) - CORRENTES DOUTRINÁRIAS - ART.

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1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 - NORMA GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA. CIVIL 1 - Apresenta-se razoável, in casu, não considerar o art. 2.039 do CC/2002 como óbice à aplicação de norma geral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI, da CF/88, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com efeitos imediatos. 2 - Recurso conhecido e provido pela alínea "a" para, admitindo-se a possibilidade de alteração do regime de bens adotado por ocasião de matrimônio realizado sob o pálio do CC/1916, determinar o retorno dos autos às instâncias ordinárias a fim de que procedam à análise do pedido, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002. (Recurso Especial Nº 2005/0036263-0, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Min. Jorge Scartezzini, Julgado em 23/08/2005 - v.u.). EMENTA: APELAÇÃO. REGIME DE BENS. ALTERAÇÃO. VIABILIDADE. Viável a alteração do regime de bens dos casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 1916. Precedentes jurisprudenciais. Preenchidas as condições para, no caso concreto, permitir aos apelantes que alterem o regime de bens pelo qual casaram. DERAM PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70012999900, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 05/10/2006 - v.u.) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS DO CASAMENTO. MUDANÇA DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS PARA O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DOS BENS. POSSIBILIDADE. Mostra-se cabível a alteração do regime de casamento, mesmo que o casamento tenha sido celebrado na vigência do revogado Código Civil de 1916. Inteligência do art. 1.639, § 2º, do CCB. A alteração do regime de bens retroage a data do casamento, pode ser posposta a qualquer tempo, desde que resguardados os direitos de terceiros. Recurso provido. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70019891571, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 29/08/2007) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS DO CASAMENTO. MUDANÇA DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS PARA O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. POSSIBILIDADE. Ë perfeitamente possível a alteração do regime de casamento, mesmo que este tenha sido celebrado na vigência do revogado Código Civil de 1916, com base no parágrafo 2 do art. 1.639 do CCB. A alteração do regime de bens retroage a data do casamento, pode ser proposta a qualquer tempo, desde que resguardados os direitos de terceiros. Recurso provido. (Apelação Cível Nº 7002568844, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 26/03/2008) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS DO CASAMENTO. MUDANÇA DO REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS PARA O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DOS BENS. POSSIBILIDADE. Mostra-se cabível a alteração do regime de casamento, mesmo que o casamento tenha sido celebrado na vigência do revogado Código Civil de 1916. Inteligência do art. 1.639, § 2º, do CCB. A alteração do regime de bens retroage a data do

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casamento, pode ser posposta a qualquer tempo, desde que resguardados os direitos de terceiros. Recurso provido. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70019891571, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 29/08/2007)

Como se vê a jurisprudência de nossos Tribunais vem se firmando no

sentido de admitir a mutabilidade do regime de bens, desde que presentes os

requisitos estabelecidos no artigo 1.639, § 2 º do Código Civil. (BRASIL, 2002).

Assim sendo, se os casados sob a égide do Código Civil de 1916

quiserem alterar o regime de bens, não haverá qualquer óbice, desde que

respeitados os requisitos para esta alteração, e as normas que regerão o novo

regime serão as do Código Civil de 2002, uma vez que o novo regime será

acordado na vigência deste diploma.

O artigo 2.039 do Código Civil de 2002, ao afirmar que o regime de bens

nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior é o por ele

estabelecido, refere-se tão-somente, aos regimes-tipo, e, por isso, continuarão

àquele diploma submetidos, e quanto as disposições gerais serão regidos pelo

Código Civil de 2002. (BRASIL, 2002).

4.2 Mutabilidade

O regime de bens não é escolhido para ser alterado, somente quando

houver necessidade é que a mudança será requerida.

A mutabilidade do regime de bens é medida excepcional e encontra

lugar tanto nos regime-tipo quanto nos regimes personalizados.

O pedido é feito pelos cônjuges que não querem mais a regência e os

efeitos do antigo regime, expostos os motivos e respeitados os direitos de

terceiros, cabe ao Juiz conceder a mudança e conseqüentemente os efeitos

jurídicos esperados pelos cônjuges, dando à norma eficácia plena.

Na alteração de um regime por outro haverá previa liquidação e

permanência da responsabilidade do patrimônio anterior pelas dividas

assumidas, cada regime-tipo traz características especificas que devem ser

observadas cuidadosamente.

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Assim sendo, a alteração do regime separatista para o de comunhão

parcial merece especial atenção em relação à elaboração de inventario dos

bens presentes dos cônjuges para que as massas particulares, aquelas

anteriores ao casamento, sejam preservadas, já que os adquiridos dali para

frente ingressarão na comunhão.

Se a alteração for do regime de separação para o de comunhão

universal, tal providência não se impõe enfaticamente, mas é prudente a

inserção de um rol de bens que dela serão excluídos em virtude da própria lei

para que não paire dúvidas e abra margem à discussão futura.

Se a separação for alterada para o regime da participação final nos

aqüestos, nenhuma providência se impõe, porque, na constância do

casamento, os regimes receberam da lei tratamento similar, pois é no momento

da extinção do regime que ele assume características próprias, especificas.

Alterando-se o regime de participação final nos aquestos para o de

comunhão parcial, a liquidação será de rigor para que o crédito obtido pelos

cônjuges, nessa liquidação, seja identificado a fim de integrar a massa

particular.

Havendo a mudança de qualquer dos regimes comunitários para o

separatista, será necessária a liquidação e partilha dos bens porque não pode

haver dois regimes disciplinado o mesmo casamento.

Observados os preceitos legais e cumpridas as formalidades previstas

no Código Civil é possível aos cônjuges escolherem o regime que regera o

casamento.

A averbação dessa mudança será feita mediante a indicação minuciosa

da sentença. A alteração do regime de bens produzirá efeitos em relação a

terceiros, ex nunc, sendo que as certidões extraídas deverão necessariamente,

mencionar a alteração do regime de bens, nos termos do artigo 21 da Lei nº

6.015/73, com a transcrição da averbação. (BRASIL, 1973).

Os efeitos decorrentes da modificação do regime de bens são de suma importância tanto para os cônjuges como para terceiros; e o registro de casamento com a conseqüente expedição da certidão é o instrumento de veiculação, ou seja, publicidade desta modificação. (DOMINGUES, 2008, p. 22).

A sociedade conjugal é regida pelo regime de bens, por isso estará

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sempre presente na vida do casal, seja na compra de um imóvel, na separação

ou na morte, não escapando os cônjuges ou terceiros de seus efeitos.

A Certidão de Casamento devidamente averbada é necessária para

garantir aos cônjuges e a terceiros a publicidade, autenticidade, segurança e

eficácia dos atos jurídicos.

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CONCLUSÃO

O Estado protege a família porque vê nela a célula básica de sua

organização social.

O conceito de família é abrangente, pois abarca todas as suas

variações, porém é indiscutível que é com o casamento civil que visualizamos o

direito matrimonial revestido na forma jurídica.

Assim sendo, o Casamento é investido de formalidades previstas no

Código Civil e na Lei de Registros Públicos de nº 6.015/73, por isso visto por

muitos como um contrato solene.

O casamento é um ato complexo, é um contrato em sua formação e

instituição em seu conteúdo, é mais que um contrato sem deixar de ser

contrato.

Para a realização do casamento é necessário que os nubentes

apresentem os documentos exigidos pelo artigo 1.525 e incisos do Código Civil

Brasileiro, para que o Oficial do Registro Civil proceda ao Processo de

Habilitação, que é a forma de dar publicidade ao ato para dar ciência à

sociedade que duas pessoas querem se casar e oportunidade para serem

levantados os impedimentos.

O impedimento matrimonial é a ausência de requisito ou a existência de

qualidade que a lei articulou entre as condições que invalidam ou apenas

proíbem o casamento, elencados nos artigos 1.521 e 1.523 do Código Civil,

qualquer dos impedimentos, tanto a nulidade quanto a anulabildade são

institutos que invalidam o casamento.

Superada essa fase, e estando o casal devidamente habilitado será

realizada a celebração do casamento, que é um ato solene em que consultada

a livre vontade dos contraentes, a autoridade os declara unidos pelo laço

matrimonial, recebendo o casal a Certidão de Casamento que é a prova de sua

realização e validade.

O casamento é mais que uma convivência conjugal, ultrapassa o intimo

atingindo o social, o pessoal e o patrimonial.

O mais considerável efeito jurídico é o patrimonial que reside no regime

de bem e cabe ao casal a livre escolha do regime que irá reger a vida em

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comum.

O Código Civil tipificou quatro espécies de regime de bens, porém o

casal pode adequar um que se amolde melhor a sua vida através do pacto

antenupcial, desde que respeitados os preceitos legais.

Os regimes de bens existem para regular as relações econômicas dos

cônjuges entre si e para com terceiros.

Cada regime de bens traz peculiaridades próprias:

O regime da comunhão parcial que também é o legal, ou seja, no

silencio das partes é o que regerá o casamento, consiste na separação

patrimonial dos nubentes no casamento, conservando cada qual os bens

próprios e comungando-se apenas os adquiridos na constância do casamento

(aquestos), à título oneroso, é o que melhor expressa a comunhão do casal,

pois todos os bens adquiridos de forma onerosa será partilhado de forma igual

entre os cônjuges.

Esse regime é o mais adotado pela maioria dos casais, pois as demais

opções de regimes são escolhidas através do pacto antenupcial, realizado no

Cartório de Notas e tem um custo o que desmotiva muitos casais alem do

desconhecimento da maioria deles.

O Regime da Comunhão universal de bens consiste na comunicação de

todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e das respectivas dívidas, com

poucas exceções expressas em lei.

O Regime da participação final nos aquestos é uma inovação trazida

pelo Código Civil de 2002, pouco adotado entre os casais brasileiros, primeiro

por desconhecimento e pela dificuldade de entender a liquidação por ele

proposta.

Trata-se de um regime misto, contendo princípios aplicáveis à comunhão

parcial e à separação de bens, cuida de forma dosada com a independência

do casal e a vontade comunitária de participação nos ganhos adquiridos

durante a união.

Com a dissolução do casamento regido por esse regime há uma

verdadeira verificação contábil, apurando-se os aquestos, ou seja, os ganhos

obtidos para serem partilhados.

O Regime da Separação de bens configura-se pela incomunicabilidade

patrimonial, conservando cada cônjuge o seu acervo e sob sua própria

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administração. Pode ser escolhido pelas partes através do pacto antenupcial

ou ser obrigatório por determinação da lei, conforme preceitua o 1641 do

Código Civil.

É mediante o estabelecimento de regimes de bens durante o casamento

que a Lei estruturará e disciplinará as relações patrimoniais entre os cônjuges.

Seja qual for a escolha do casal o Código Civil em seu artigo 1639, §2º

permite a alteração mediante a satisfação de alguns requisitos, como ser

requerida por ambos os cônjuges, acompanhada de justificativas e depende de

decisão judicial.

O processo é necessário diante da relevância da medida visando

proteger o interesse dos cônjuges e de terceiros.

A alteração do regime de bens como toda mudança foi recebida com

ressalvas pela sociedade, porem vem se firmando e demonstrando sua

aplicabilidade.

A regra da mutabilidade contida nas disposições gerais dos regimes de

bens se aplica a todos os casamentos, sejam eles celebrados antes ou depois

do Código Civil de 2002, pois o ordenamento facultou sua alteração no curso

do casamento, sem distinguir a época de sua celebração, e ainda a sujeitou a

vontade de ambos os cônjuges.

A possibilidade de alteração criada pelo Código Civil trouxe uma

otimização ao princípio da autonomia da vontade das partes. Toda vez que um

casal desejar a alteração do regime de bens, essa mudança será baseada em

um motivo subjetivo, que sendo justificável e não trazendo prejuízos a terceiros

não haverá, porque do Judiciário obstar a alteração.

A análise de cada caso concreto é que trará o motivo justo ou não para

aquela alteração, por isso não devemos ser resistentes à essa mudança.

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REFERÊNCIAS

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