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Revista SÍNTESE D IREITO DE F AMÍLIA ANO XVII – Nº 95 – ABR-MAIO 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Superior Tribunal de Justiça – Nº 46/2000 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Saletti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Álvaro Villaça Azevedo, Daniel Ustárroz, João Baptista Villela, José Roberto Neves Amorim, Priscila M. P. Correa da Fonseca, Sergio Matheus Garcez, Sergio Resende de Barros COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Carolina Fagundes Leitão, Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Cristiana Sanchez Gomes Ferreira, Eliane Limonge Duri, Flávio Tartuce, Leonardo Alves de Oliveira, Natália de Souza Paula, Rodrigo Alves Zaparoli ISSN 2179-1635

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Revista SÍNTESE Direito De Família

ano XVii – nº 95 – abr-maio 2016

repositório autorizaDo De JurispruDência

Superior Tribunal de Justiça – Nº 46/2000

Diretor eXecutiVo

Elton José Donato

Gerente eDitorial e De consultoria

Eliane Beltramini

coorDenaDor eDitorial

Cristiano Basaglia

eDitora

Simone Costa Saletti Oliveira

conselho eDitorial

Álvaro Villaça Azevedo, Daniel Ustárroz, João Baptista Villela, José Roberto Neves Amorim, Priscila M. P. Correa da Fonseca, Sergio Matheus Garcez, Sergio Resende de Barros

colaboraDores Desta eDição

Carolina Fagundes Leitão, Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Cristiana Sanchez Gomes Ferreira, Eliane Limonge Duri, Flávio Tartuce,

Leonardo Alves de Oliveira, Natália de Souza Paula, Rodrigo Alves Zaparoli

ISSN 2179-1635

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1999 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito de Família.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Capa: Tusset Monteiro Comunicação

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE DIREITO DE FAMÍLIA Nota: Continuação de REVISTA IOB DE DIREITO DE FAMÍLIA v. 1, n. 1, jul. 1999

Publicação periódica Bimestral

v. 17, n. 95, abr./maio 2016

ISSN 2179-1635

1. Direito de família – periódicos – Brasil

CDU: 347.6(05)(81) CDD: 340

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

Solicita-se permuta.Pídese canje.

On demande l’échange.Si richiede lo scambio.We ask for exchange.

Wir bitten um austausch.

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Prezados leitores, nesta edição escolhemos como Assunto Especial o tema “Regime de Bens e o Novo CPC”, contando com um artigo de autoria do ilustre jurista Flavio Tartuce.

O regime de bens é o conjunto de regras que os noivos devem escolher antes da celebração do casamento para definir juridicamente como os bens do casal serão administrados durante o casamento.

O regime deve ser escolhido quando os noivos fazem o pedido da habilitação do casamento e disciplina as relações econômicas entre os cônjuges durante o mesmo.

Na Parte Geral você encontrará relevantes temas com artigos de autoria de Cristiana Sanchez Gomes Ferreira e Carolina Fagundes Leitão, Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas e Natália de Souza Paula, Leonardo Alves de Oliveira e Rodrigo Alves Zaparoli.

E, na Seção Especial “Estudos Jurídicos”, artigo de Eliane Limonge Duri intitulado “Socioafetividade Parental – Uma Análise Psicojurídica”.

É com prazer que a IOB deseja a você uma ótima leitura!

Eliane Beltramini

Gerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos .................................................................... 7

Assunto Especial

Regime de Bens e o novo CPC

doutRina

1. Da Ação de Alteração de Regime de Bens no Novo CPCFlávio Tartuce ............................................................................................9

Parte Geral

doutRinas

1. A Holding Patrimonial Familiar e seus Incentivos: uma Análise JuseconômicaCristiana Sanchez Gomes Ferreira e Carolina Fagundes Leitão .................21

2. O Cônjuge que Comete Homicídio Doloso e a Possibilidade de Afastamento da Meação por meio da Declaração de IndignidadeCláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas e Natália de Souza Paula ..........41

3. As Formas Coercitivas para Compelir o Devedor de Alimentos a Adimplir com sua Obrigação: Avanços Perpetrados pela Jurispru - dência e Abarcados pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015)Leonardo Alves de Oliveira ......................................................................74

4. Cônjuge Concorrendo com Ascendentes e o Cálculo da sua LegítimaRodrigo Alves Zaparoli .............................................................................89

JuRisPRudênCia

Acórdãos nA ÍntegrA 1. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1082. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1133. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1194. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás ...................................................1415. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais .......................................1476. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná .................................................1587. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro ......................................1628. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul ...............................1669. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina .....................................17210. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ............................................178

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ementário

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................181

Seção Especial

estudos JuRídiCos

1. Socioafetividade Parental – Uma Análise PsicojurídicaEliane Limonge Duri ...............................................................................203

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................212

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação

do Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publicações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da SÍNTESE.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Regime de Bens e o Novo CPC

Da Ação de Alteração de Regime de Bens no Novo CPC

FLávIO TARTuCEDoutor em Direito Civil pela USP, Professor do Programa de Mestrado e Doutorado da Facul-dade Especializada em Direito – Fadisp, Professor dos cursos de Graduação e Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Privado da Escola Paulista de Direito – EPD, sendo coordenador dos últimos, Professor da Rede LFG, Diretor Nacional e Estadual do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFam, Advogado, Consultor Jurídico em São Paulo.

O novo CPC, ao lado do tratamento das ações de família e da regulamentação do divórcio, traz um dispositivo relativo à ação de alte-ração de regime de bens (art. 734). A regulamentação instrumental dessa demanda é novidade no sistema processual brasileiro.

Como é cediço, a possibilidade jurídica dessa ação de modifica-ção do regime de bens foi criada pelo Código Civil de 2002, especial-mente pelo seu art. 1.639, § 2º, segundo o qual: “É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”. A regra foi praticamente repetida pelo caput do art. 734 do novo Código de Processo Civil, in verbis:

A alteração do regime de bens do casamento, observados os requisitos legais, poderá ser requerida, motivadamente, em petição assinada por ambos os cônjuges, na qual serão expostas as razões que justificam a alteração, ressalvados os direitos de terceiros.

Cumpre destacar que as normas são claras no sentido de somente admitirem a alteração do regime mediante pedido judicial de ambos os cônjuges, em havendo uma ação de jurisdição voluntária, que corre na Vara da Família, se houver. Em projeções legislativas, existe a tentati-va de se criar a possibilidade de alteração administrativa do regime de bens, por meio de escritura pública, conforme o PLS 470/2013, conhe-cido como Estatuto das Famílias do IBDFam, que conta com o apoio deste autor. Na verdade, a reafirmação da necessidade de uma demanda

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judicial no novo Código de Processo Civil já nasce desatualizada diante de outras projeções mais avançadas.

A alteração somente é possível, nos termos literais das normas, se for fundada em pedido motivado, desde que apurada a procedência das razões invocadas. Esse justo motivo constitui uma cláusula geral, a ser preenchida pelo juiz caso a caso, à luz da operabilidade e do sistema aberto adotado tanto pelo CC/2002 quanto pelo CPC/2015.

Como primeiro exemplo, pode ser citado o desaparecimento de causa suspensiva do casamento (art. 1.523 do Código Civil), sendo pos-sível alterar o regime da separação obrigatória de bens para outro, na linha do que consta do Enunciado nº 262 do CJF/STJ da III Jornada de Direito Civil. A jurisprudência superior já conclui desse modo, cabendo trazer à colação:

Por elementar questão de razoabilidade e justiça, o desaparecimento da causa suspensiva durante o casamento e a ausência de qualquer preju-ízo ao cônjuge ou a terceiro permitem a alteração do regime de bens, antes obrigatório, para o eleito pelo casal, notadamente porque cessada a causa que exigia regime específico. Os fatos anteriores e os efeitos pre-téritos do regime anterior permanecem sob a regência da lei antiga. Os fatos posteriores, todavia, serão regulados pelo CC/2002, isto é, a partir da alteração do regime de bens, passa o CC/2002 a reger a nova relação do casal. Por isso, não há se falar em retroatividade da lei, vedada pelo art. 5º, inciso XXXVI, da CF/1988, e sim em aplicação de norma geral com efeitos imediatos. (STJ, REsp 821.807/PR, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 19.10.2006, DJ 13.11.2006, p. 261)

Como segundo exemplo de um justo motivo, a jurisprudência pau-lista deferiu a alteração diante de dificuldades contratuais encontradas por um dos consortes. Assim julgando, por todos:

Regime de bens. Pedido de alteração do regime de comunhão parcial de bens para o de separação total. Alegação de dificuldade de contratação de financiamento para aquisição de imóvel residencial, por força das dívidas contraídas pelo cônjuge varão. Preenchimento dos requisitos pre-vistos no art. 1.639, § 2º, do Código Civil verificado. Ausência de óbice à alteração do regime de bens do casamento. Medida que não acarretará prejuízo algum aos cônjuges ou aos filhos. Terceiros que não serão atin-gidos pela alteração, que gerará efeitos apenas ex nunc. Alteração deter-

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minada. Recurso provido. (TJSP, Apelação com Revisão nº 600.593.4/4, Acórdão nº 4048973, São Paulo, 1ª CDPriv., Rel. Des. Luiz Antonio de Godoy, J. 08.09.2009, DJESP 06.11.2009)

De toda sorte, há quem entenda pela desnecessidade de motiva-ção para que o regime de bens seja alterado judicialmente, eis que se trata de uma exigência excessiva constante da lei. Em suma, haveria uma intervenção dispensável do Estado nas questões familiares, o que feriria o princípio da não intervenção, previsto no art. 1.513 do CC/2002 e de outros regramentos do direito de família. Com esse sentir, decisão do Tri-bunal gaúcho, de relatoria do Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, que conta com o nosso apoio:

Apelação cível. Regime de bens. Modificação. Inteligência do art. 1.639, § 2º, do Código Civil. Dispensa de consistente motivação. 1. Estando expressamente ressalvados os interesses de terceiros (art. 1.639, § 2º, do CCB), em relação aos quais será ineficaz a alteração de regime, não vejo motivo para o Estado-juiz negar a modificação pretendida. Trata-se de indevida e injustificada ingerência na autonomia de vontade das partes. Basta que os requerentes afirmem que o novo regime escolhido melhor atende seus anseios pessoais que se terá por preenchida a exigência legal, ressalvando-se, é claro, a suspeita de eventual má-fé de um dos cônjuges em relação ao outro. Três argumentos principais militam em prol dessa exegese liberalizante, a saber: 1) não há qualquer exigência de apontar motivos para a escolha original do regime de bens quando do casamento; 2) nada obstaria que os cônjuges, vendo negada sua pretensão, simulem um divórcio e contraiam novo casamento, com opção por regime de bens diverso; 3) sendo atualmente possível o desfazimento extrajudicial do próprio casamento, sem necessidade de submeter ao Poder Judiciário as causas para tal, é ilógica essa exigência quanto à singela alteração do regime de bens. 2. Não há qualquer óbice a que a modificação do regi-me de bens se dê com efeito retroativo à data do casamento, pois, como já dito, ressalvados estão os direitos de terceiros. E, sendo retroativos os efeitos, na medida em que os requerentes pretendem adotar o regime da separação total de bens, nada mais natural (e até exigível, pode-se dizer) que realizem a partilha do patrimônio comum de que são titulares. 3. Em se tratando de feito de jurisdição voluntária, invocável a regra do art. 1.109 do CPC, para afastar o critério de legalidade estrita, decidindo--se o processo de acordo com o que se repute mais conveniente ou opor-tuno (critério de equidade). Deram provimento. Unânime. (TJRS, Apela-ção Cível nº 172902-66.2011.8.21.7000, Marcelino Ramos, 8ª C.Cív., Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, J. 28.07.2011, DJERS 04.08.2011)

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Consigne-se que, em sentido muito próximo, o Tribunal Paulis-ta entendeu que não há necessidade de detalhamento das razões, ou seja, pela “desnecessidade de apresentação muito pormenorizada de razão” para a alteração do regime (TJSP, Apelação nº 0018358-39.2009.8.26.0344, Acórdão nº 5185207, Marília, 7ª CDPriv., Rel. Des. Gilberto de Souza Moreira, J. 01.06.2011, DJESP 09.08.2011).

Mais recentemente, pronunciou-se da mesma maneira o Superior Tribunal de Justiça, conforme publicação que consta do seu Informativo nº 518, com o seguinte tom:

Nesse contexto, admitida a possibilidade de aplicação do art. 1.639, § 2º, do CC/2002 aos matrimônios celebrados na vigência do CC/1916, é importante que se interprete a sua parte final – referente ao “pedido motivado de ambos os cônjuges” e à “procedência das razões invocadas” para a modificação do regime de bens do casamento – sob a perspecti-va de que o direito de família deve ocupar, no ordenamento jurídico, papel coerente com as possibilidades e limites estruturados pela própria CF, defensora de bens como a intimidade e a vida privada. Nessa linha de raciocínio, o casamento há de ser visto como uma manifestação de liberdade dos consortes na escolha do modo pelo qual será conduzida a vida em comum, liberdade que se harmoniza com o fato de que a inti-midade e a vida privada são invioláveis e exercidas, na generalidade das vezes, no interior de espaço privado também erguido pelo ordenamento jurídico à condição de “asilo inviolável”. Sendo assim, deve-se observar uma principiologia de “intervenção mínima”, não podendo a legislação infraconstitucional avançar em espaços tidos pela própria CF como in-violáveis. Deve-se disciplinar, portanto, tão somente o necessário e o suficiente para a realização não de uma vontade estatal, mas dos próprios integrantes da família. Desse modo, a melhor interpretação que se deve conferir ao art. 1.639, § 2º, do CC/2002 é a que não exige dos cônjuges justificativas exageradas ou provas concretas do prejuízo na manutenção do regime de bens originário, sob pena de esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada dos consortes. Nesse sentido, a constituição de uma sociedade por um dos cônjuges poderá impactar o patrimônio comum do casal. Assim, existindo divergência conjugal quanto à condução da vida financeira da família, haveria justificativa, em tese, plausível à alteração do regime de bens. Isso porque se mostra razoável que um dos cônjuges prefira que os patrimônios estejam bem delimitados, para que somente o do cônjuge empreendedor possa vir a

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sofrer as consequências por eventual fracasso no empreendimento. (STJ, REsp 1.119.462/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 26.02.2013)

Em suma, tem-se mitigado jurisprudencialmente a estrita exigência normativa do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, o que vem em boa hora, pois são os cônjuges aqueles que têm a melhor consciência sobre os emba-raços que o regime de bens adotado pode gerar em sua vida cotidiana.

A interpretação deve ser a mesma no que diz respeito ao novo Código de Processo Civil, que, mais uma vez, parece estar na contramão da jurisprudência, ao exigir expressamente a motivação para a mudança do regime.

Ainda nos termos da literalidade dos dois comandos, material e processual, a alteração do regime de bens não poderá prejudicar os direi-tos de terceiros, presente uma intenção legislativa de se proteger a boa-fé objetiva e de desprestigiar a má-fé. De modo algum, essa alteração do regime poderá ser utilizada com intuito de fraude, inclusive tributária. A jurisprudência tem exigido cabalmente a prova de ausência de preju-ízos a terceiros (TJSP, Apelação nº 644.416.4/0, Acórdão nº 4168081, Boituva, 4ª CDPriv., Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani, J. 29.10.2009, DJESP 10.12.2009). Na mesma linha, o Enunciado nº 113 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil:

É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando, então, o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os côn-juges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade.

De qualquer forma, destaque-se que, em havendo prejuízo para terceiros de boa-fé, a alteração do regime deve ser reconhecida como meramente ineficaz em relação a esses, o que não prejudica a sua vali-dade e eficácia entre as partes. Como bem explica Débora Brandão,

o resguardo dos direitos de terceiros por si só não tem o condão de obstar a mutabilidade do regime de bens. Aponta-se como solução para ele a elaboração de um sistema registral eficiente, tanto do pacto antenupcial como de suas posteriores modificações, para devida publicidade nas re-lações entre os cônjuges a terceiros e a produção de efeitos, ou seja, a alteração só produziria efeitos em relação a terceiros após a devida pu-

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blicidade da sentença, cuja natureza é constitutiva, restando inalterados todos os negócios posteriormente praticados. Respeita-se, dessa forma, o ato jurídico perfeito. (BRANDÃO, Débora Vanessa Caús. Regime de bens no Código Civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 103)

Concluindo, nessa esteira, no âmbito jurisprudencial, “a alteração do regime de bens não tem efeito em relação aos credores de boa-fé, cujos créditos foram constituídos à época do regime de bens anterior” (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70038227633, Porto Alegre, 8ª C.Cív., Rel. Des. Rui Portanova, J. 24.08.2010, DJERS 30.08.2010). O acórdão julgou pela desnecessidade de prova, pelos cônjuges, da inexistência de ações judiciais ou de dívidas, pois isso não prejudica a eficácia da alteração do regime entre os cônjuges. Em síntese, não se seguiu a linha do citado Enunciado nº 113 do CJF/STJ, pois a perquirição da existên-cia de dívidas ou demandas não seria uma exigência para a modifica-ção do regime. Houve, nesse contexto, um abrandamento do texto do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, servindo a mesma conclusão para o art. 734, caput, do CPC/2015.

Cumpre ressaltar que outras decisões exigem tal prova, para que a alteração patrimonial seja considerada idônea e, então, deferida pelo juiz da causa (por todos: TJDF, Recurso nº 2006.01.1.036489-5, Acórdão nº 386.017, 6ª T.Cív., Rel. Des. Luis Gustavo B. de Oliveira, DJDFTE 12.11.2009, p. 121; e TJSP, Apelação nº 644.416.4/0, Acór-dão nº 4168081, Boituva, 4ª CDPriv., Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani, J. 29.10.2009, DJESP 10.12.2009). A questão, como se vê, é polêmica, devendo ser aprofundada com a emergência do novel Estatuto Processual.

Aliás, expressa o § 1º do art. 734 do CPC/2015 que, ao receber a petição inicial da ação de alteração de regime de bens, o juiz determina-rá a intimação do Ministério Público e a publicação de edital que divul-gue a pretendida modificação, somente podendo decidir o juiz depois de decorrido o prazo de 30 dias da publicação do edital. Como se vê, o novo Estatuto Processual aprofunda a preocupação com a possibilidade de fraudes, determinando a atuação do MP, mesmo não havendo inte-resses de incapazes. Por todos os argumentos antes expostos, a preocu-pação parece excessiva e desatualizada ante a doutrina e a jurisprudên-cia consolidadas diante do Código Civil Brasileiro de 2002.

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No que concerne à publicidade da modificação do regime patri-monial, no ano de 2012, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o mero registro da sentença transitada em julgado tem o condão de dar publicidade à alteração do regime de bens, não devendo prevalecer nor-ma da Corregedoria do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul, que apontava a necessidade de publicação de editais dessa alteração. Assim, em certo sentido, não se adotou, por igual, a parte final do citado Enun-ciado nº 113, que determina a necessidade de ampla publicidade na modificação do regime. Vejamos a ementa do decisum:

Civil. Família. Matrimônio. Alteração do regime de bens do casamento (CC/2002, art. 1.639, § 2º). Expressa ressalva legal dos direitos de tercei-ros. Publicação de edital para conhecimento de eventuais interessados, no órgão oficial e na imprensa local. Provimento nº 24/2003 da Cor-regedoria do Tribunal Estadual. Formalidade dispensável, ausente base legal. Recurso especial conhecido e provido. 1. Nos termos do art. 1.639, § 2º, do Código Civil de 2002, a alteração do regime jurídico de bens do casamento é admitida, quando procedentes as razões invocadas no pedido de ambos os cônjuges, mediante autorização judicial, sempre com ressal-va dos direitos de terceiros. 2. Mostra-se, assim, dispensável a formalidade emanada de Provimento do Tribunal de Justiça de publicação de editais acerca da alteração do regime de bens, mormente pelo fato de se tratar de providência da qual não cogita a legislação aplicável. 3. O princípio da publicidade, em tal hipótese, é atendido pela publicação da sentença que defere o pedido e pelas anotações e alterações procedidas nos registros próprios, com averbação no registro civil de pessoas naturais e, sendo o caso, no registro de imóveis. 4. Recurso especial provido para dispensar a publicação de editais determinada pelas instâncias ordinárias. (STJ, REsp 776.455/RS, 4ª T., Rel. Min. Raul Araújo, J. 17.04.2012, DJe 26.04.2012)

O novo CPC traz um dispositivo relativo à ação de alteração de re-gime de bens (art. 734). A regulamentação instrumental dessa demanda é novidade no sistema processual brasileiro. No que diz respeito à pos-sibilidade jurídica dessa ação de modificação do regime de bens, esta foi criada pelo Código Civil de 2002, especialmente pelo seu art. 1.639, § 2º, segundo o qual: “É admissível alteração do regime de bens, me-diante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”. A regra foi praticamente repetida pelo caput do art. 734 do novo Código de Processo Civil. Trata-se de demanda que ganhou grande relevância entre os familiaristas nos últimos anos.

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Analisadas as questões relativas à justa causa para a mudança e os direitos de terceiros, é preciso abordar os efeitos da sentença que defere a alteração. O presente autor segue a posição segundo a qual os efeitos da alteração do regime são ex nunc, ou seja, a partir do trânsito em julgado da decisão, o que nos parece cristalino, por uma questão de eficácia patrimonial.

Conforme pontuado pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, nos autos do Recurso Especial nº 1.300.036/MT, julgado pela Terceira Turma do STJ em maio de 2014,

o segundo ponto controvertido situa-se em torno da fixação do termo inicial dos efeitos dessa alteração do regime de bens: retroação à data do casamento (eficácia ex tunc) ou a partir da data do trânsito em julgado da decisão judicial que o alterou (eficácia ex nunc). Essa questão, ainda hoje debatida na doutrina e na jurisprudência, é relevante na espécie, pois as partes, após alguns anos de união estável, casaram-se, em 24.05.1997, pelo regime da separação de bens, alterando esse regime para comunhão parcial em 2007, deflagrando-se o processo de separação em outubro de 2008. Em relação à eficácia ex tunc, o acórdão recorrido sintetiza os argumentos em prol dessa tese, sendo o principal deles o de que o regime de bens do casamento deve ser único ao longo de toda a relação con-jugal. Em relação à eficácia ex nunc, o argumento central é no sentido de que a eficácia da alteração de um regime de bens, que era válido e eficaz, deve ser para o futuro, preservando-se os interesses dos cônjuges e de terceiros.

Ao final, o Ministro Sanseverino segue a segunda solução, com-partilhada por este autor, “pois não foi estabelecida pelo legislador a necessidade de que o regime de bens do casamento seja único ao longo de toda a relação conjugal, podendo haver a alteração com a chancela judicial. Em Cortes Estaduais, na mesma esteira, cabe destacar julga-dos do Tribunal Gaúcho e Paulista” (por todos: TJRS; Apelação Cível nº 0056229-48.2015.8.21.7000, Porto Alegre, 7ª C.Cív., Rel. Des. Jorge Luís Dall’Agnol, Julgado em 26.05.2015, DJERS 03.06.2015; e TJSP, Apelação nº 0013056-15.2007.8.26.0533, Acórdão nº 5065672, Santa Bárbara d’Oeste, 9ª CDPriv., Relª Desª Viviani Nicolau, Julgado em 12.04.2011, DJESP 01.06.2011).

Esclareça-se que a natureza desses efeitos é capaz de afastar a ne-cessidade de prova da ausência de prejuízos a terceiros pelos cônjuges,

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para que a alteração do regime de bens seja deferida, conforme susten-tamos em texto anterior. Ademais, eventuais efeitos ex tunc fariam que o regime de bens anterior não tivesse eficácia, atingindo um ato jurídico perfeito, constituído por vontade dos cônjuges.

No âmbito da doutrina e da própria jurisprudência, ressalte-se, to-davia, que a questão não é pacífica. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, por exemplo, entendem que os efeitos são ex tunc por-que, “quando os cônjuges pretendem modificar o seu regime, o patrimô-nio atingido, que sofrerá a incidência do novo regramento, é, por óbvio, aquele existente até a data da sentença da mudança. Ora, com isso, é forçoso convir que os bens e valores amealhados – em conjunto ou sepa-radamente – pelos consortes até o momento da mudança serão atingidos pelo pronunciamento judicial, submetendo-se, pois, a novo regramento. Sob esse aspecto, a sentença, pois, necessariamente, incide no patrimô-nio anterior. Daí por que a sua eficácia é ex tunc” (Novo curso de direito civil direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2012. p. 336). Tam-bém podem ser encontradas decisões estaduais que seguem esse cami-nho (por todos: TJMG, Apelação Cível nº 1.0223.11.006774-9/001, Rel. Des. Luis Carlos Gambogi, Julgado em 26.06.2014, DJEMG 07.07.2014; e TJDF, Recurso nº 2010.01.1.006987-3, Acórdão nº 440.239, 1ª T.Cív., Rel. Des. Natanael Caetano, DJDFTE 25.08.2010, p. 77).

Exposta a controvérsia e reiterada nossa posição pelos efeitos ex nunc da sentença que altera o regime de bens, é preciso retomar debate de direito intertemporal a respeito dessa demanda, regulamentada agora pelo novo CPC. Seria possível alterar regime de bens de casamento ce-lebrado na vigência do Código Civil de 1916 e do Código de Processo Civil de 1973?

Muitos poderiam pensar que a resposta é negativa, diante do que consta do art. 2.039 do Código Civil de 2002, in verbis: “O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido”. Essa, contudo, não é a melhor conclusão para os devidos fins práticos.

Um dos primeiros autores na doutrina brasileira a perceber a real intenção do legislador foi Euclides de Oliveira. A respeito do art. 2.039, explica o jurista que esse dispositivo legal

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apenas determina que, para os casamentos anteriores ao Código Civil de 2002, não poderão ser utilizadas as regras do novo Código Civil re-ferentes às espécies de regime de bens, para efeito de partilha do patri-mônio do casal. Ou seja, somente as regras específicas acerca de cada regime é que se aplicam em conformidade com a lei vigente à época da celebração do casamento, mas, quanto às disposições gerais, comuns a todos os regimes, aplica-se o novo Código Civil. (Alteração do regime de bens no casamento. In: DELGADO, Mário Luiz; ALVES, Jones Figueirêdo [Coord.]. Questões controvertidas no novo Código Civil. São Paulo: Método, v. 1, 2003. p. 389)

Em síntese, como o art. 1.639, § 2º, do CC/2002 é uma norma geral quanto ao regime de bens, pode ser aplicada a qualquer casamen-to, entendimento esse que foi acatado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, já no remoto ano de 2004 (TJSP, Apelação Cível nº 320.566-4/0, São Paulo, 10ª CDPriv., Rel. Marcondes Machado, 08.06.2004, v.u.).

Contudo, coube ao Superior Tribunal de Justiça fazer a melhor in-terpretação da questão. Isso porque a Corte utilizou o art. 2.035, caput, do CC/2002 e a Escada Ponteana para deduzir que é possível alterar regime de bens de casamento celebrado na vigência da codificação ma-terial anterior.

Como é notório, Pontes de Miranda, em seu Tratado de Direito Privado (tomos 3, 4 e 5), dividiu o negócio jurídico em três planos. O pri-meiro é o plano da existência, no qual estão os pressupostos mínimos de um negócio jurídico, que formam o seu suporte fático: partes, vontade, objeto e forma. O segundo é o plano da validade, em que os elementos mínimos de existência recebem qualificações, nos termos do art. 104 do CC/2002, a saber: partes capazes; vontade livre; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei. Por fim, no plano da eficácia, estão as consequências do negócio jurídico, elementos relacionados com os seus efeitos (condição, termo, encargo, inadimplemento, juros, multa, perdas e danos, entre outros).

Relativamente a esses três planos e à aplicação das normas jurídi-cas no tempo, estabelece o importante art. 2.035, caput, do Código Civil em vigor:

A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores,

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referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução.

Em resumo, o que o dispositivo legal está estabelecendo é que, quanto aos planos da existência e da validade (o primeiro está dentro do segundo), devem ser aplicadas as normas do momento da constituição ou celebração do negócio. No tocante ao plano da eficácia, devem inci-dir as normas do momento dos efeitos.

O regime de bens, por razões claras e lógicas, situa-se no plano da eficácia, pois diz respeito às consequências práticas do casamento, à modificação ou extinção de direitos. Ademais, a existência ou a validade do casamento não depende do regime de bens adotado. Em comple-mento, é notório que, não havendo adoção por qualquer regime, preva-lecerá o regime legal ou supletório, qual seja, o da comunhão parcial de bens (art. 1.640 do Código Civil).

Diante dessas premissas, entendeu o Tribunal da Cidadania, em conhecido precedente, que “apresenta-se razoável, in casu, não con-siderar o art. 2.039 do CC/2002 como óbice à aplicação de norma ge-ral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as ra-zões invocadas pelos cônjuges para tal pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI, da CF/1988, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com efeitos imediatos” (STJ, REsp 730.546/MG, 4ª T., Rel. Min. Jorge Scartezzini, J. 23.08.2005, DJ 03.10.2005, p. 279). Sucessi-vamente, outros julgados surgiram na mesma esteira desse julgamen-to, estando a questão consolidada em nossa jurisprudência (por todos: STJ, REsp 1.112.123/DF, 3ª T., Rel. Min. Sidnei Beneti, J. 16.06.2009, DJe 13.08.2009; TJRS, Apelação Cível nº 383376-78.2012.8.21.7000, Bagé, 5ª C.Cív., Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, J. 29.11.2012, DJERS 05.12.2012; TJSP, Apelação nº 9102946-53.2007.8.26.0000, Acórdão nº 5628185, São Paulo, 4ª CDPriv., Rel. Des. Fábio Quadros, J. 17.11.2011, DJESP 24.01.2012; TJPR, Apelação Cível nº 0413965-9, Astorga, 11ª C.Cív., Rel. Des. Mário Rau, DJPR 28.03.2008, p. 110; TJMG, Apelação Cível nº 1.0439.06.053252-0/001, Muriaé, 7ª C.Cív., Rel.

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Des. Antônio Marcos Alvim Soares, J. 06.03.2007, DJMG 04.05.2007; e TJRJ, Apelação Cível nº 2007.001.08400, 5ª C.Cív., Rel. Des. Milton Fernandes de Souza, J. 27.03.2007).

Cumpre esclarecer, por oportuno, que esse entendimento jurispru-dencial já tinha amparo doutrinário no Enunciado nº 260, aprovado na III Jornada de Direito Civil, realizada em 2004, nos seguintes termos: “A alteração do regime de bens prevista no § 2º do art. 1.639 do Códi-go Civil também é permitida nos casamentos realizados na vigência da legislação anterior”. Em suma, essa é a posição majoritária da doutrina e da jurisprudência brasileiras, que vem ser integralmente mantida na vigência do Estatuto Processual emergente.

Voltando aos preceitos do novo CPC, conforme o § 2º do art. 734, os cônjuges, na petição inicial ou em petição avulsa, podem propor ao juiz meio alternativo de divulgação da alteração do regime de bens, a fim de resguardar direitos de terceiros. Assim, por exemplo, não obsta a divulgação da alteração em um jornal local ou em um sítio da Internet. Mais uma vez, há, na opinião deste autor, uma preocupação excessiva com a fraude, na contramão da doutrina e da jurisprudência construídas sob a égide do Código Civil de 2002.

Por fim, demonstrando a mesma preocupação, após o trânsito em julgado da sentença de alteração do regime de bens, serão expedidos mandados de averbação aos cartórios de registro civil e de imóveis. Nos termos do mesmo § 3º do art. 734 do CPC/2015, caso qualquer um dos cônjuges seja empresário, deve ser expedido também mandado de aver-bação ao registro público de empresas mercantis e atividades afins.

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Parte Geral – Doutrina

A Holding Patrimonial Familiar e seus Incentivos: uma Análise Juseconômica

CRISTIAnA SAnChEz GOmES FERREIRAMestre em Direito Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Advogada Es-pecializada em Direito de Família e Sucessões, Professora de Direito de Família e Sucessões.

CAROLInA FAGunDES LEITãOPós-Graduada em Processo Civil e Constituição pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Especialista em Direito de Empresa pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUCRJ), Advogada.

RESUMO: O presente estudo visa a promover uma análise jurídica e econômica da adoção do pla-nejamento sucessório no Brasil, contexto no qual destacam-se as holdings familiares patrimoniais. Tem como objetivo, em um primeiro momento, esclarecer quais os benefícios da Análise Econômica do Direito na explicação de suas causas e prováveis consequências. Em um segundo momento, objetiva-se analisar as características específicas de cada alternativa de planejamento sucessório, com especial enfoque nas holdings familiares patrimoniais.

PALAVRAS-CHAVE: Análise econômica do Direito; planejamento sucessório; holdings patrimoniais familiares; Direito de Família; Direito das Sucessões.

ABSTRACT: The study aims to promote a legal and economic analysis of adopting succession plan-ning in Brazil, context in which Family Holdings Companies are highlighted. Aims, at first, to clarify the benefits of Economic Analysis of Law (Law and Economics) in explaining its causes and likely conse-quences. In a second step, the objective is to analyze the specific characteristics of each alternative of succession planning, with special focus on Family Holdings Companies.

KEYWORDS: Law and economics; Succession planning; family holdings companies; Family Law; Inheritance Law.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O planejamento sucessório e a Law and Economics; 2 Doação de bens em vida; 3 Testamento; 4 Holding Familiar e Patrimonial; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como escopo o estudo da adoção do formato de as assim denominadas holdings patrimoniais familiares para uma empresa familiar, visando à sucessão familiar e à proteção patrimo-nial. Para tanto, utilizar-se-á do ferramental da Análise Econômica do

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Direito, permitindo-se, assim, a exploração de vantagens oriundas da interdisciplinaridade proposta.

Muito embora a relação entre Direito e Economia seja antiga, foi somente a partir dos anos 60 do século passado que se iniciou o mo-vimento cunhado de Law and Economics, que trata da utilização dos conceitos da Economia para a compreensão de fenômenos jurídicos e sofisticação na formulação das leis, visando a torná-las cada vez mais eficientes. Para Rachel Sztajn,

tomando a Economia como poderosa ferramenta para analisar normas jurídicas, em face da premissa de que as pessoas agem racionalmente, conclui-se que elas responderão melhor a incentivos externos que indu-zam a certos comportamentos mediante sistema de prêmios e punições. Ora, se a legislação é um desses estímulos externos, quanto mais forem as normas positivadas aderentes às instituições sociais, mais eficiente será o sistema.1

A ciência econômica parte da premissa de que os indivíduos buscam seus objetivos a partir da escolha de determinadas formas de atuação, fenômeno denominado de “racionalidade”2. Tendo-se o pla-nejamento sucessório, pois, como alternativa jurídica resultante de uma escolha tomada pelos agentes visando à redução de custos fiscais, fi-nanceiros e, por vezes, sobretudo, emocionais, muito tem a Law and Economics a contribuir na explicação das causas que têm elevado a sua utilização no cenário contemporâneo brasileiro.

Em um primeiro momento, analisar-se-á quais as principais alter-nativas disponíveis à consecução do planejamento sucessório no Brasil, para que, posteriormente, seja o enfoque do estudo centrado na figura da holding familiar patrimonial, mediante uma análise de seus custos e benefícios em diversas esferas.

1 O plaNejameNTO SUceSSóRIO e a law aND ecONOmIcS

A expectativa de significativo aumento da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e a especulação acerca da

1 SZTAJN, Rachel. Law and Economics. In: ZYLBERSZTAJN, Décio e STAJN, Rachel (Org.). Direito e economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

2 FRIEDMAN, David D. Price theory. Chicago: South-Western Publishing Co. 1986. p. 02.

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instituição de tributo sobre as grandes fortunas3 têm incentivado muitas famílias e empresários a lançar mão do planejamento sucessório como forma de prevenir elevados e inesperados custos.

O ITCMD (Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações de quaisquer Bens ou Direitos) é imposto de competência estatal e do Distrito Federal, que incide quando da transmissão não onerosa de bens ou direitos, tal como ocorre na herança (transferência do patrimônio da titularidade do falecido aos herdeiros) ou na doação, havendo variação de sua alíquota de 4% a 8% no território nacional. Em agosto de 2015, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) encaminhou ao Se-nado proposta de majoração da alíquota para 20%, o que potencializou a busca, por parte de gestores familiares, por escritórios de advocacia especializados em planejamento sucessório.

No Rio Grande do Sul, a Lei nº 14.741, de 24.09.2015, substituiu as alíquotas da tributação incidente sobre Causa Mortis e Doações. Na primeira hipótese, esta pode agora variar de 0 a 6%; na segunda, de 3 a 4%. Referida majoração é analisada como um novo (e relevante!) in-centivo para a busca de alternativas de planejamento sucessório no Rio Grande do Sul.

Verifica-se, portanto, que alterações em leis fiscais (ou tão somente a possibilidade de isto vir a ocorrer) criam incentivos a que famílias com patrimônio significativo e/ou avessas ao risco valham-se das alternativas disponíveis em termos de planejamento sucessório, o que é objeto de análise da Law and Economics. De acordo com Cristiano Carvalho, ao pesquisar a influência da tributação no comportamento humano:

[...] a tributação é uma das mais fortes intrusões que o sistema jurídico tem o condão de fazer na esfera de autonomia privada. Por essa mesma aptidão de afetar a liberdade individual, os tributos são potentes estí-mulos ao comportamento humano, aptos a alterar escolhas e ações do cidadão. Surpreendentemente, a doutrina jurídica clássica (não apenas a tributária) desenvolvida e ensinada em nossas plagas não se preocu-pa com a relação entre normas jurídicas e comportamento individual. A análise econômica, por outro lado, enfoca precipuamente os incentivos

3 O imposto sobre as grandes fortunas (IGF), embora previsto na CF/1988, não é regulamentado.

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gerados aos indivíduos pelo sistema jurídico, como também as consequ-ências efetivas acarretadas pelos estímulos.4

A análise dos incentivos e desincentivos à promoção do planeja-mento sucessório, bem como o sopesamento entre os custos e benefícios de cada uma das alternativas viáveis, constitui-se, assim, em típico fenô-meno da análise econômica do Direito.

O cenário atual, no entanto, tem sido tomado por outros tipos de preocupações que têm fomentado a busca pela mesma ferramenta. Cite-mos os principais: (1) aversão à morosidade de ações judiciais de inven-tário; (2) instabilidade jurisprudencial no âmbito do Direito Sucessório brasileiro (cujos julgados têm se demonstrado substancialmente coliden-tes no que tange às regras de quem herda e quanto herda – sobretudo no que tange às distintas regras entre a sucessão do cônjuge e do com-panheiro); (3) custas judiciais expressivas; e, ainda, (4) litígios entre os herdeiros, os quais, como é sabido, podem culminar na desestruturação de núcleos familiares.

A atribuição de custos é tida, pois, como fator decisivo na concep-ção do incentivo (ou não) à estruturação de um planejamento sucessó-rio personalizado aos anseios dos titulares dos bens, de modo que uma análise econômica nos auxilia a ponderar os interesses e buscar soluções eficientes.

Simone Tassinari Cardoso define planejamento sucessório como “o conjunto de atos, pesquisas, instrumentos jurídicos que visam a atin-gir determinados objetivos, tendo em vista a preocupação com o mo-mento morte do titular de certa gama patrimonial”5. Refere, a mesma autora, que alguns instrumentos já podem ser considerados tradicionais em matéria de planejamento sucessório, tais como (a) doação de bens em vida e a (b) transferência dos bens para a chamada holding patrimo-nial, cabendo citar, ainda, a (c) formulação de testamentos.

4 CARVALHO, Cristiano. Análise econômica da tributação. In: TIMM, Luciano (Org.). Direito e Economia no Brasil. São Paulo: Atlas, 2012.

5 CARDOSO, Simone Tassinari. Algumas peculiaridades dos instrumentos tradicionais de planejamento sucessório. In: DA ROSA, Conrado Paulino; THOMÉ, Liane Maria Busnello (Org.). O direito no lado esquerdo do peito: ensaios sobre direito de família e sucessões. Porto Alegre: IBDFam/RS, 2014.

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2 DOaÇÃO De beNS em vIDa

Conforme define o art. 538 do Código Civil brasileiro, doação é “o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patri-mônio bens ou vantagens para o de outra”. Muito embora a legislação brasileira autorize a celebração do contrato por instrumento particular, as doações de bens imóveis devem, rigorosamente, observar a forma pública.

Por regra explícita do art. 544 do Código Civil, a doação de ascen-dente para descendente constitui em “adiantamento” do que lhe cabe por herança, o que obriga os herdeiros donatários a informar, quando do inventário, quais bens receberam, para que assim se possa equalizar os quinhões entre os herdeiros, instituto ao qual é conferida a nomenclatu-ra de “colação de bens”, a ocorrer pelo valor atribuído ao(s) bem(ens) no ato da liberalidade ou estimativa realizada na época6. A colação pode ser dispensada, no entanto, se expressa a sua dispensa por parte do doa-dor, quando então tais bens sairão da sua parte disponível.

Ressalte-se que a doação realizada de ascendente para descen-dente dispensa a anuência dos demais filhos, o que somente ocorre na venda ou permuta de bens com importâncias desiguais7.

Embora alguns detectem maiores custos do que benefícios na doa-ção, salientando a perda de propriedade e do poder dentro do negócio, bem como a inflexibilidade dos rumos do patrimônio doado, outros, ao contrário, compreendem que a medida propicia que os herdeiros pos-sam atuar melhor nos negócios, já gozando da sensação de controle ou, ainda que este esteja reservado, tenham a possibilidade de já praticar e desenvolver habilidades essenciais ao negócio8.

De acordo com Luiz Kignel, contudo, a estratégia comporta maio-res desvantagens do que vantagens: “Além de não se poder alterar a partilha efetuada (receio de alguns, como dito antes), é temerária a situa-ção na qual, após a transmissão, os pais não sejam atendidos em seus reclamos materiais, que poderiam ser satisfeitos com parte do patrimô-nio doado”9.

6 Art. 2.004 do CCB.

7 CARDOSO, Simone Tassinari. Op. cit., p. 297.

8 KIGNEL, Luiz; PHEBO, Márcia Setti; LONGO, José Henrique. Planejamento sucessório. São Paulo: Noeses, 2014. p. 61.

9 Idem, ibidem.

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Há que se referir, por fim, a possibilidade de a doação dos bens ou quotas ocorrer mediante reserva do usufruto por parte dos doadores, enquanto aos donatários tocará a “nua-propriedade” dos bens. A partir desta comum modalidade (doação de bens com reserva de usufruto), os doadores, enquanto vivos, permanecem no uso, gozo e administra-ção dos bens, a incluir a percepção dos frutos e rendas que derivem da exploração do patrimônio. Quando operada sua morte, então, ocorre a consolidação da propriedade plena na pessoa dos donatários.

A doação pode ainda agregar cláusula de reversão, de modo que, caso os doadores sobrevivam aos donatários, os bens retornem à sua esfera patrimonial, não se destinando aos seus herdeiros.

Ademais, é também possível a inserção de cláusulas de inaliena-bilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, as quais podem ser muito úteis para a proteção do patrimônio familiar.

Cabe registrar que, mesmo que os bens doados não integrem o pa-trimônio conjugal dos filhos e filhas casados e conviventes sob o regime da comunhão parcial de bens (ou sob o regime da comunhão univer-sal, se houver cláusula de incomunicabilidade), é indispensável a vênia conjugal para sua alienação na constância do relacionamento. Assim, pode-se afirmar que confiar que os filhos venderão os bens para dar suporte aos genitores na adveniência de necessidade não é suficiente, dependendo-se da anuência, pois, dos genros e das noras, salvo no regi-me da separação total de bens10.

3 TeSTameNTO

O Direito das Sucessões tem fundamento na Constituição Federal, art. 5º, inciso XXX11, que consagra o direito de herança. A matéria é tra-tada no Livro V do vigente Código Civil, entre os arts. 1.784 a 2.027. Na esfera processual, aplicam-se as normas do Código de Processo Civil, entre os arts. 610 e 673 do novo diploma processual. A sucessão causa mortis consiste na transmissão dos bens da pessoa falecida aos seus her-deiros, beneficiários esses que podem ter essa qualificação por força da lei (legítimos) ou por força de testamento (testamentários).

10 CARDOSO, Simone Tassinari. Op. cit., p. 303.

11 Art. 5º, XXX: “é garantido o direito de herança; [...]”.

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Em suma, com a morte, restará aberta a sucessão12, transmitindo-se a herança aos herdeiros, sejam legítimos ou testamentários. Os primeiros dividem-se em duas classes: herdeiros necessários13 e facultativos14. Aos primeiros, é garantida a metade dos bens deixados pelo falecido, o que se constitui na “legítima”, consoante reza o art. 1.846 do CC15.

Por outro lado, na sucessão fundada em testamento, tem-se que o testador só poderá dispor da metade da herança, nos termos do art. 1.789 do CC16.

Trata o testamento de ato personalíssimo de caráter revogável, o qual pode ser praticado por qualquer pessoa capaz, respeitadas as normas legais e as limitações havidas por lei, devendo-se respeitar a legítima e as meações dos cônjuges e companheiros. Na hipótese de a liberdade ter sido extrapolada pelo testador, utiliza-se o expediente de “redução das disposições testamentárias”, mediante ação judicial com a finalidade de ajustar o testamento, proporcionalmente, à disposição permitida em lei.

De acordo com Luiz Kignel, o testamento deve ser utilizado para:

Compor direito patrimonial do cônjuge ou companheiro sobrevivente, conforme o regime de bens adotado pelo casal; (ii) organizar o paga-mento da parcela legítima aos herdeiros necessários; (iii) dispor sobre a divisão da parcela disponível; (iv) atribuir encargos e/ou condições na transmissão de parcela determinada dos bens; (v) efetuar liberalidades patrimoniais para terceiros; (vi) se for o caso, dispensar os herdeiros da colação; (vii) nomear curadores especiais quando houver herdeiros me-nores ou incapazes; (viii) nomear tutores, nas mesmas condições do item anterior; (ix) dispor sobre a ratificação de acordos societários, termos e compromissos firmados pelo testador; (x) reconhecer a paternidade; (xi) nomear inventariante para administrar os bens do espólio desde o falecimento até a partilha; e (xii) nomear testamenteiro para executar as disposições testamentárias.17

12 FRANKE, Leila Piske. Possibilidades jurídicas e viabilidade econômica na constituição de empresas administradoras de bens próprios. Revista Jurídica, 2008. Disponível em: <http://proxy.furb.br/ojs/index.php/juridica/article/view/840/660>. Acesso em: 20 set. 2015.

13 Art. 1.845 do CCB: “São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge”.

14 Caso o falecido não tenha deixado herdeiros necessários ou feito testamento, serão chamados à sucessão os herdeiros facultativos, sendo assim chamados os companheiros e parentes colaterais até o 4º grau. Em não havendo herdeiros necessários ou facultativos, a herança é declarada jacente e é destinada ao ente público.

15 Art. 1.846 do CCB: “Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima”.

16 “Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.”

17 KIGNEL, Luiz; PHEBO, Márcia Setti; LONGO, José Henrique. Op. cit., p. 79.

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Em comparação com a doação, vejamos que, ao contrário desta, o testamento é revogável e retratável, podendo o testador, de forma unila-teral e a qualquer tempo, alterar as disposições testamentárias ou mesmo revogá-las. Ademais, não há pagamento de qualquer imposto pelo ato, o que é postergado para o momento do inventário (o fato gerador, afinal, é o óbito do testador). Ocorre, tão somente, o pagamento de emolumentos ao tabelionato de notas na hipótese de o formado adotado for o público.

O caminho do testamento é costumeiramente adotado para que sejam evitados conflitos entre herdeiros, pois após a morte do testador não há mais espaço para discussões sobre o mérito da herança. Porém, a problemática das empresas não resta solucionada via testamento, ao qual não se permite definições de distribuição de funções no âmbito das unidades produtivas, por exemplo, para o que a criação da holding familiar pode ser uma solução, como se verá adiante.

4 HOlDINg FamIlIaR e paTRImONIal

A expressão holding tem origem na língua inglesa e, traduzida para o português, significa segurar, manter, controlar, guardar. Tal ideia tem aplicação direta ao Direito Societário, tanto brasileiro quanto mun-dial, que denominam justamente de holdings determinadas sociedades, em termos adiante detalhados.

O art. 982 do Código Civil vigente18 divide as sociedades em dois grupos: sociedades simples e sociedades empresárias. As primeiras se organizam de forma simples, da mesma forma que suas atividades se desenvolvem de forma simples. No que tange às segundas, conforme Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede, “há um tipo específico de atividade negocial que caracteriza a empresa: a atividade econômica or-ganizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços”, sendo o elemento central a organização dos meios sob a forma de empresa19.

18 Art. 982 do CCB: “Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais. Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa”.

19 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Holding familiar e suas vantagens: planejamento jurídico e econômico do patrimônio e da sucessão familiar. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 11.

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A holding, por sua vez, não se constitui em espécie societária au-tônoma, precisando se revestir sob a forma de alguma dessas espécies, simples ou empresária, nos termos disciplinados pelo Código Civil, para que possa assumir personalidade jurídica, devendo, inclusive, respeitar os requisitos inerentes ao modelo escolhido.

Para os autores sobreditos, Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede, não há limitação à classificação das holdings, que poderão, assim, ser sociedades simples ou empresárias, a depender do tipo so-cietário que adotarem20 – devendo ser registradas ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, ou na Junta Comercial, de acordo com a escolha, respectivamente21.

Inicialmente, refere-se que há, na doutrina, entendimento no senti-do de que a sociedade limitada é a forma de organização mais indicada para as holdings, já que acarreta em maiores vantagens, benefícios e economia, por haver maior flexibilidade de decisões, menor burocracia e maior controle, custos menores e responsabilidade limitada ao capital.

No que tange às espécies de holdings propriamente ditas, para João A. Borges Teixeira22, entre as principais se destacam:

A holding pura, que pode ser definida como a sociedade cujos es-copos principais são a aquisição, a titularidade, a alienação e o controle de participações societárias. Tais escopos são exercidos com profissio-nalismo, vez que a holding os tem como principal atividade e razão da sua existência, como vértice e estrutura de controle (conforme art. 2º, §§ 1º e 2º23, c/c art. 243, § 2º24, ambos da Lei nº 6.404/1976 c/c

20 Tipos societários esses sobre os quais os autores Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede referem o que segue: as sociedades empresárias podem adotar, segundo o Código Civil, (1) sociedade em nome coletivo, (2) sociedade em comandita simples, (3) sociedade limitada, (4) sociedade anônima ou (5) sociedade em comandita por ações, ao passo que as sociedades simples podem optar por (1) sociedade simples em sentido estrito, (2) sociedade em nome coletivo, (3) sociedade em comandita simples, (4) sociedade limitada ou (5) sociedade cooperativa.

21 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. cit., p. 13.

22 TEIXEIRA, João A. Borges. Holding familiar & proteção patrimonial. São Paulo: 2011. Disponível em: <http://www.fiscosoft.com.br/a/3gw6/holding-familiar-tipo-societário-e-seu-regime-tributario-joao-alberto-borges-teixeira>. Acesso em: 15 set. 2015.

23 “Art. 2º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes. § 1º Qualquer que seja o objeto, a companhia é mercantil e se rege pelas leis e usos do comércio. § 2º O estatuto social definirá o objeto de modo preciso e completo.”

24 Já anteriormente transcrito.

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art. 1.053, parágrafo único, do CC25). Em outras palavras, holdings puras, por definição, são meios de organização patrimonial e não influenciam os resultados das controladas mais do que o fazem os controladores pes-soas físicas26.

A holding mista é aquela que, além da participação, exerce explo-ração de alguma atividade empresarial. No Brasil, por questões fiscais e administrativas, é a espécie de holding mais utilizada27.

Já a holding familiar, conforme ensinamento de Adolpho Bergamini, é aquela que controla o patrimônio de uma ou mais pessoas físicas, ou seja, ao invés de as pessoas físicas possuírem bens em seus próprios nomes, passam a possuí-los por meio de uma pessoa jurídica – a controladora patrimonial, que geralmente se constitui na forma de so-ciedade limitada, que, via de regra, tem a seguinte denominação social: Empreendimentos ou Participações Ltda.28. Com isto, consoante palavras de Fred John Santana Prado, facilita-se a administração dos bens e a su-cessão hereditária, garantindo a manutenção das empresas em nome dos descendentes do sucessor. Ademais, esta sociedade pode ter maiores benefícios fiscais e proteção patrimonial29.

Há outras classificações menos expressivas na doutrina, tais quais: holding administrativa, holding de controle, holding de participação ou holding imobiliária, sobre as quais se deixará de discorrer diante da me-nor expressividade quanto ao tema ora em análise.

Colaciona-se, a seguir, interessante entendimento de Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede sobre a holding familiar:

A chamada holding familiar não é um tipo específico, mas uma con-textualização específica. Pode ser uma holding pura ou mista, de admi-nistração, de organização ou patrimonial, isso é indiferente. Sua marca

25 “Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima.”

26 LODI, João Bosco; LODI, Edna Pires. Holding. 4. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. p. 4-5.

27 Idem, p. 5.

28 BERGAMINI, Adolpho. Constituição de empresa Holding Patrimonial, como forma de redução de carga tributária da pessoa física, planejamento sucessório e retorno de capital sob a forma de lucros e dividendos, sem tributação. Revista Jus Vigilantibus, 2003. p. 107.

29 PRADO, Fred John S. A holding como modalidade de planejamento patrimonial da pessoa física no Brasil. Jus Navigandi, 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/18605>. Acesso em: 22 set. 2015.

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característica é o fato de se encartar no âmbito de determinada família e, assim, servir ao planejamento desenvolvido por seus membros, conside-rando desafios como organização do patrimônio, administração de bens, otimização fiscal, sucessão hereditária etc.30

Segundo Tavares Borba, o contrato social destas sociedades, se limitadas, estipula as regras de administração inter vivos, ou, na hipótese de sucessão, o fundador escolhe quem e como serão geridos a sua em-presa e seus bens na sua ausência31.

Em suma, são características da holding familiar: (a) com ela admi-nistra-se patrimônio próprio ou da família; (b) pode ser manter a admi-nistração sob o controle do fundador; (c) seu capital social é integraliza-do por meio da incorporação de bens móveis, imóveis, dinheiro e outros direitos. Todos estes ativos são transferidos dos sócios para a holding; (d) a sociedade passa a auferir as rendas decorrentes dos ativos transferi-dos; (e) a sociedade não deve participar de atividades de risco.

No que tange aos objetivos da holding familiar, tem-se justamente: (a) a segurança patrimonial; (b) o planejamento tributário, com redução da carga fiscal; (c) organização do patrimônio familiar/da sucessão. No entanto, por certo, o uso dessa faculdade jurídica não pode ser optado por motivações ilegais, ou seja, com vistas a burlar direitos sucessórios, direitos de credores, regimes de casamento ou quaisquer outros.

Segundo Rafael Diogo Pereira, ademais, a criação da holding fa-miliar garante que as questões familiares sejam isoladas das questões patrimoniais, separando eventuais conflitos internos32. Lançando-se mão deste tipo de pessoa jurídica, os problemas pessoais ou familiares não a afetarão, já que, nestas situações, não serão as pessoas físicas, tomadas por emoção, que definirão as diretrizes a serem seguidas, mas sim a própria holding.

Ou seja, as relações passam a ser submetidas às regras de Direito Societário e não mais do Direito de Família33 (havendo, por conseguin-

30 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. cit., p. 9.

31 BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 8. ed. Rio de Janeiro Renovar, 2003.

32 PEREIRA, Rafael Diogo, et al. Governança, sucessão e profissionalização em uma empresa familiar: arranjando o lugar da família multigeracional. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, São Paulo, v. 14, n. 43, 2012. p. 176-191.

33 ROCHA, Pedro Figueiredo; SANTOS, André Felipe. Holding Familiar. Tibúrcio Rocha 2014, p. 9-10. Disponível em: <http://www.tiburciorocha.com.br/wp-content/uploads/2012/03/Artigo-Holding-Familiar.pdf>. Acesso em: 15 set. 2015.

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te, a necessidade de os sócios respeitarem a affectio societatis e o en-volvimento e comprometimento da família com os objetivos da pessoa jurídica).

Nesta senda, consoante o que preleciona Tiago Pereira Barros, a adoção da holding familiar proporcionará

a continuidade dos negócios, afastando as ingerências de parentes e pro-tegendo o patrimônio dos herdeiros com a preservação dos bens perante os negócios da sociedade, sendo certo que a arguição de nulidade des-tas doações somente poderá ser feita por herdeiro necessário ou terceiro prejudicado.34-35

No que se refere à proteção contra terceiros, também chamada de blindagem patrimonial, Juliana Paola Avilla Petrin e Ricardo Pereira Rios elucidam:

Atualmente a maior preocupação do empresário em relação ao patri-mônio seria o envolvimento e vinculação de seus bens particulares e do grupo. Nesse contexto, a Holding permite uma “blindagem patrimonial”, uma vez que todos os seus bens e participações societárias passam para a Holding, evitando que estes sejam atingidos por eventuais processos judiciais, que, ocasionalmente, possam vir a ocorrer e acabar com aquilo que foi construído em uma ou mais gerações.36

Os mesmos autores ainda completam a ideia anterior, na mesma obra, referindo que, para que o risco sobredito seja elidido, indicado está que se gravem as quotas sociais da holding com a cláusula de im-penhorabilidade37. Indo além, Tiago Pereira Barros aduz que o contro-lador poderá doar aos seus herdeiros as quotas-partes da companhia, gravando-as com cláusula de usufruto vitalício em favor do doador, as-

34 BARROS, Tiago Pereira. Planejamento sucessório e holding familiar/patrimonial. Jus Navigandi. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/23837/planejamento-sucessorio-e-holding-familiar-patrimonial>. Acesso em: 13 set. 2015.

35 Em explicação à ideia das doações referida pelo autor, colaciona-se outro trecho constante da mesma obra: “A holding familiar constitui uma forma preventiva e econômica se de realizar a antecipação da herança, pois o controlador poderá doar aos seus herdeiros as quotas-partes da companhia, gravando-as com cláusula de usufruto vitalício em favor do doador, assim como de impenhorabilidade, incomunicabilidade, inalienabilidade e reversão”.

36 PETRIN, Juliana Paola Avilla; RIOS, Ricardo Pereira. A Holding e o Processo da Sucessão Familiar. Revista Eletrônica Gestão e Negócios, v. 5, n. 1, 2014, p. 18. Disponível em: <http://www.uninove.br/marketing/fac/publicacoes_pdf/administracao/v5_n1_2014/Juliana.pdf>. Acesso em: 3 set. 2015.

37 PETRIN, Juliana Paola Avilla; RIOS, Ricardo Pereira. A Holding e o Processo da Sucessão Familiar. Revista Eletrônica Gestão e Negócios, v. 5, n. 1, 2014, p. 18. Disponível em: <http://www.uninove.br/marketing/fac/publicacoes_pdf/administracao/v5_n1_2014/Juliana.pdf>. Acesso em: 3 set. 2015.

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sim como de incomunicabilidade38, inalienabilidade39 e reversão40, além de impenhorabilidade41.

Vale lembrar, apenas, quanto à questão da blindagem ora em co-mento que o doador das quotas da holding familiar não poderá ficar insolvente após as doações, sob pena de anulação da(s) doação(ões) por fraude a credores. E, ainda, consoante reza o art. 593 do CPC42, as trans-ferências dos ativos patrimoniais devem ser feitas à sociedade antes do ajuizamento de ações e execuções, bem como a inscrição em dívida ativa, sob pena de fraude à execução.

Ainda neste contexto, o sócio que estiver em condições de risco deve sair da holding ou reduzir significativamente a sua participação, afinal, as dívidas particulares do sócio podem atingir a sociedade na forma do art. 1.026 do CC, caput e parágrafo único43, e, ainda, art. 123, caput e parágrafo primeiro, da Lei de Falências (Lei nº 11.101/2002)44. Isto porque, como bem doutrinam Marcelo Lima Guerra e José Carlos Bastos Silva Filho, pode ser operada a desconsideração da personalidade jurídica quando houver fraude e/ou abuso de direito por parte dos sócios da sociedade. Ou seja, em situações excepcionais como as relatadas, as dívidas da sociedade serão redirecionadas para os sócios se a sociedade

38 Não comunicará com cônjuge ou companheiro(a).

39 Impedirá que o herdeiro/donatário disponha das quotas e possa trazer pessoas estranhas à família à sociedade.

40 Em caso de falecimento prévio do herdeiro/donatário, as quotas retornarão ao doador.

41 BARROS, Tiago Pereira. Planejamento sucessório e holding familiar/patrimonial. Jus Navigandi, 2013, p. 2. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/23837/planejamento-sucessorio-e-holding-familiar-patrimonial>. Acesso em: 13 set. 2015.

42 “Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de bens: I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real; II – quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; III – nos demais casos expressos em lei.”

43 “Art. 1.026. O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outro bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação. Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.”

44 “Art. 123. Se o falido fizer parte de alguma sociedade como sócio comanditário ou cotista, para a massa falida entrarão somente os haveres que na sociedade ele possuir e forem apurados na forma estabelecida no contrato social ou estatuto social. § 1º Se o contrato ou estatuto social nada disciplinar a respeito, a apuração far-se-á judicialmente, salvo se, por lei, pelo contrato ou estatuto, a sociedade tiver de liquidar-se, caso em que os haveres do falido, somente após o pagamento de todo o passivo da sociedade entrarão para a massa falida.”

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não puder saldá-las, mesmo que se trate de sociedade por responsabili-dade limitada45-46.

A constituição da pessoa jurídica, com a reversão do patrimônio da pessoa física para o capital social da primeira, permite ao sócio ad-ministrador dispor destes bens sem a anuência do cônjuge (também de-nominada de outorga uxória), seja qual for o regime de casamento. O doador das quotas ou ações pode, inclusive, gravar os títulos, como já se viu, com a cláusula de inalienabilidade, nos termos do art. 1.911 do CC47, que, por sua vez, implica em impenhorabilidade e incomunicabi-lidade – mas, obrigatoriamente, fundamentando este ato, caso seja rea-lizado por meio de testamento, consoante dispõe o art. 1.848 do CC48.

Importa salientar que, na hipótese de ser a holding constituída sob a forma de sociedade contratual, ainda que limitada, o art. 1.027 do CC49 proíbe o cônjuge ou companheiro a exigir, desde logo, a parte que lhe toca na quota social; deve, isto sim, requerer a liquidação das quotas, permitindo aos demais sócios (membros da família) entregar-lhe dinheiro, e não participação societária50-51.

O capital social da holding familiar será constituído mediante a integralização dos bens imóveis pertencentes ao patriarca/à matriarca. Diego da Silva Viscardi não aconselha a realização da integralização com bens móveis ou automóveis, por exemplo, já que têm elevada taxa de depreciação52.

45 GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. São Paulo: RT, 1998. p. 83.

46 SILVA FILHO, José Carlos Bastos. A desconsideração da personalidade jurídica na execução trabalhista frente à jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. Jus Navigandi, 2008, p. 1. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/12634/a-desconsideracao-da-personalidade-juridica-na-execucao-trabalhista-frente-a-jurisprudencia-do-tribunal-superior-do-trabalho>. Acesso em: 10 set. 2015.

47 “Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade.”

48 “Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.”

49 “Art. 1.027. Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade.”

50 Neste caso, o sócio ex-cônjuge deverá transferir, de sua parte, aos demais sócios, o equivalente ao que estes arcaram para indenizar o seu meeiro.

51 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. cit., p. 75.

52 VISCARDI, Diego da Silva. Holding Patrimonial: As vantagens tributárias e o planejamento sucessório. JurisWay. 2013. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=12303>. Acesso em: 20 set. 2015.

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Para a integralização, o valor atribuído aos bens imóveis será aquele constante à Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física do patriarca, do ano-calendário vigente – e não pelo valor de mercado do bem (vide art. 132 do Decreto nº 3.000/199953). Aqui, haverá, pois, uma enorme vantagem tributária comparativamente à sucessão feita por meio de inventário, já que, neste último, a avaliação é feita pela Secretaria da Fazenda e a tributação pelo valor de mercado, que, quase sempre, é muito superior ao da referida Declaração. E, em se mantendo o valor já declarado, não incidirá imposto sobre ganho de capital, que não terá supostamente havido.

Sob a presente perspectiva de análise dos custos e benefícios ineren-tes à constituição de uma holding familiar, e de modo a facilitar importantes compreensões, apresenta-se as tabelas comparativas a seguir: na primeira, compara-se as vantagens da holding familiar em relação ao inventário; nas demais, apresenta-se tabelas que ilustram as principais vantagens fiscais oriundas da estruturação de uma holding patrimonial familiar quando em comparação à carga tributária enfrentada por pessoa física:

Eventos Holding Familiar Inventário

1) Tributação da herança e doação 4% 4%

2) Tempo para criação ou tempo de trâmite

do inventário

30 dias em média 5 anos em média,

se judicial

3) Tributação dos rendimentos 11,33% 27,5%

4) Tributação da venda de bens imóveis 6,5454% 27,5%

5) Sucessão conforme Código Civil para ca-samentos com comunhão parcial de bens

Cônjuge não é herdeiro

Cônjuge é herdeiro

5 4

53 “Art. 132. As pessoas físicas poderão transferir a pessoas jurídicas, a título de integralização de capital, bens e direitos, pelo valor constante da respectiva declaração de bens ou pelo valor de mercado. § 1º Se a transferência for feita pelo valor constante da declaração de bens, as pessoas físicas deverão lançar nesta declaração as ações ou quotas subscritas pelo mesmo valor dos bens ou direitos transferidos, não se aplicando o disposto no art. 464. § 2º Se a transferência não se fizer pelo valor constante da declaração de bens, a diferença a maior será tributável como ganho de capital.”

54 O custo tributário final será de 5,93%, mais o adicional, chegando-se à dízima periódica de aproximadamente 6,54% sobre o valor total da alienação, e não sobre o ganho de capital propriamente dito, como na tributação da pessoa física.

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Imóveis no Não Circulante – Conta Investimentos:

Atividade: Aluguel de imóveis próprios

Tributo Base de Cálculo Alíquota Custo Tributário Final

IRPJ 32% do faturamento 15% 4,8%CSLL 32% do faturamento 9% 2,88%PIS 100% do faturamento 0,65% 0,65%

Cofins 100% do faturamento 3% 3%Total 11,33%

Atividade: Locação de Imóveis – Tributação:

Holding Patrimonial: 11,33% Pessoa Física: 27,5%

Atividade: Alienação de Imóveis – Ganho de Capital:

Holding Patrimonial – Estoque de Imóveis Pessoa Física

6,54% 15%

Como em tudo na vida, as holdings55 não têm somente vantagens. Têm, igualmente, na mão inversa, alguns pontos negativos, os quais merecem análise. São eles, nas palavras de Flávia Martins D. Varoto Cardoso:

Aspectos financeiros: não pode usar prejuízos fiscais (no caso de holding pura); tem maior carga tributária se não existir adequado planejamento fiscal; ter tributação de ganho de capital na venda de participações; ter maior volume de despesas com funções centralizadas, o que pode pro-vocar problemas dos sistemas de rateio; e ter imediata compensação de lucros e perdas das investidas, pela equivalência patrimonial.

Aspectos administrativos: elevada quantidade de níveis hierárquicos, o que aumenta o risco inerente à qualidade e agilidade do processo deci-sório (no caso de holding controladora); e não ter adequado nível de mo-tivação nos diversos níveis hierárquicos, pela perda de responsabilidade.

Aspectos legais: dificuldades em operacionalizar os tratamentos diferen-ciados dos diversos setores da economia; e ter problemas em operaciona-lizar as diversas situações provocadas pelas diferenças regionais.

55 Aqui se refere às holdings de forma genérica e não apenas as patrimoniais/familiares, às quais, inclusive, nem se aplicam algumas das desvantagens sobreditas.

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Aspectos societários: consolidação do tratamento dos aspectos familia-res “entre quatro paredes”, criando uma situação irreversível e altamente problemática.56

cONclUSÃO

O presente trabalho buscou abordar, de forma interdisciplinar – sob as concepções jurídica e da Law and Economics –, o planejamento sucessório no Brasil. Verificou-se, inicialmente, que alterações legisla-tivas de natureza tributária vêm criando significativos incentivos para a adoção de ferramentas de planejamento sucessório.

A análise dos incentivos e desincentivos à promoção do planeja-mento sucessório, bem como o sopesamento entre os custos e benefícios de cada uma das alternativas viáveis, constitui-se, assim, em típico fe-nômeno da análise econômica do direito, o qual auxilia – e muito – na compreensão das razões que levam a sociedade a lançar mão do ferra-mental do planejamento sucessório.

Como principais causas, verifica-se: (1) aversão à morosidade de ações judiciais de inventário; (2) instabilidade jurisprudencial no âmbi-to do Direito Sucessório brasileiro (cujos julgados têm se demonstrado substancialmente colidentes no que tange às regras de quem herda e quanto herda – sobretudo no que tange às distintas regras entre a su-cessão do cônjuge e do companheiro); (3) custas judiciais expressivas; e, ainda, (4) litígios entre os herdeiros, os quais, como é sabido, podem culminar na desestruturação de núcleos familiares.

No âmbito do planejamento sucessório, têm havido destaque à eleição das Holdings Familiares Patrimoniais como alternativa. Desta forma, ao longo deste trabalho se pôde perceber que o desenvolvimento de uma holding familiar possibilita a sobrevivência de um patrimônio familiar, trazendo benefícios significativos tanto no plano sucessório (eliminando custos) quanto tributário (sendo uma boa forma de elisão fiscal).

Outrossim, sociedades deste tipo possibilitam uma melhor admi-nistração ao permitirem que o processo sucessório ocorra por meio de

56 CARDOSO, Flávia Martins D. Varoto. Holding familiar. Contagem: GCONT, 2014. p. 5, apud OLIVEIRA.

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decisões esclarecidas e participativas, minimizando riscos e conflitos fu-turos, afinal, será a pessoa jurídica que tomará as decisões após a morte do(a) patriarca/matriarca, na forma constante do contrato social, pois, e não as pessoas físicas imbuídas por grande emoção. Ademais, o quinhão de cada participante já fica definido previamente (seja por doação, seja por testamento), evitando ansiedades ou brigas por parte da linha suces-sória.

As holdings familiares têm outra vantagem: funcionam como blin-dagem patrimonial, evitando que o patrimônio seja atingido por variá-veis financeiras ou judiciais, das quais ninguém está livre.

Da mesma forma, impedem que o patrimônio seja dilapidado ao término de relacionamentos amorosos mal sucedidos, já que os bens transferidos para a pessoa jurídica não mais pertencerão ao(s) cônjuge(s).

Não por outra razão, as holdings familiares estão cada vez mais presentes no âmbito empresarial, se fazendo uma alternativa bastante válida e eficaz de planejamento do patrimônio da pessoa física. Esta-mos convencidas de que as vantagens superam as desvantagens e que a criação da holding familiar não se trata de meio de se beneficiar finan-ceiramente por meio de ilegalidades, mas sim por meio de planejamen-tos estratégicos legais, que podem gerar consequências positivas para a família e para a empresa.

Porém, cumpre grifar que o sucesso da holding dependerá da ado-ção de recursos estratégicos compatíveis ao caso concreto, mediante apurado planejamento, estabelecimento de padrões e metas, preocupa-ção com os resultados das empresas operacionais e, sobretudo, perma-nência do affectio societatis no grupo familiar, o que possibilitará a boa gestão empresarial e geração dos frutos esperados.

ReFeRÊNcIaS

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Parte Geral – Doutrina

O Cônjuge que Comete Homicídio Doloso e a Possibilidade de Afastamento da Meação por meio da Declaração de Indignidade

Spouse that Commit Intentional Homicide and Removal of the Possibility of Sharecropping Through the Declaration of Unworthiness

CLáuDIA mARA DE ALmEIDA RABELO vIEGASProfessora de Direito da PUC-Minas e Faculdades Del Rey – Uniesp, Doutoranda e Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Tutora do Conselho Na-cional de Justiça – CNJ, Servidora Pública Federal do TRT-MG – Assistente do Desembargador Dr. Sércio da Silva Peçanha, Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho, Especialista em Educação à distância pela PUC-Minas, Especialista em Direito Público – Ciências Criminais pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus, Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade Fumec.

nATáLIA DE SOuzA PAuLABacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

RESUMO: O presente trabalho tem o escopo de discutir a possibilidade de afastamento da meação do cônjuge considerado indigno, a partir da conduta prevista no âmbito sucessório, inserido do Direito Civil brasileiro. Pretende-se analisar a previsão legal, que conduz à interpretação de que o cônjuge indigno deixa de herdar, contudo, erroneamente, recebe a sua meação, em observância do Regime de Bens adotado pelo casal. Realizar-se-á uma pesquisa bibliográfica, abordando leis, jurisprudências e a doutrina especializada, além do estudo de um julgado, o qual contraria a interpretação dominante acerca do tema. Quer se mostrar a existência de fundamento capaz de contrariar a interpretação literal da lei, impondo novos efeitos à atitude indigna, de forma a alcançar a meação. A fim de se evitar injustiças e até mesmo a motivação para condutas atentatórias contra os autores da herança e seus herdeiros, defende-se como imperiosa uma interpretação legal à luz de princípios de justiça, a qual justificará o afastamento do cônjuge da meação, quando este der causa a ato contra a vida do autor da herança.

PALAVRAS-CHAVE: Indignidade; herança; meação; cônjuge.

ABSTRACT: This study has the scope to discuss the possibility of the removal of sharecropping consi-dered unworthy spouse, from the conduct required under succession, entered the Brazilian civil law. It intends to analyze the legal provision, which leads to the interpretation that the unworthy spouse ceases to inherit, however, mistakenly receives its sharecropping, in observance of Goods Scheme adopted by the couple. It will perform a literature search, covering laws, jurisprudence and doctrine specialized in addition to the study of a trial, which contradicts the dominant interpretation of the theme. Wants to show the existence of grounds capable of preventing the literal interpretation of the law, imposing new effects to the unworthy attitude in order to achieve sharecropping. In order to

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avoid injustices and even the motivation for prejudicial conduct against the perpetrators of heritage and their heirs, it is argued as an overriding legal interpretation in the light of the principles of justice, which justify the expulsion of the spouse of sharecropping, when this gives cause to act against the life of the author of the inheritance.

KEYWORDS: Unworthiness; heritage; sharecropping; spouse.

SUMÁRIO: Considerações iniciais; 1 A sucessão; 1.2 Espécies de sucessão e de sucessores; 1.3 Abertura da sucessão – Princípio de saisine; 2 Herança; 3 Meação; 4 Diferença entre meação e herança; 5 A exclusão sucessória; 5.1 Indignidade: conceito; 5.2 O reconhecimento judicial na decretação da indignidade sucessória; 5.3 Efeitos da indignidade; 5.4 Reabilitação do indigno; 5.5 Di-ferença entre indignidade e deserdação; 6 O cônjuge que comete homicídio doloso e a possibilidade de afastamento da meação por meio da declaração de indignidade: sugestão de alteração legislativa; Considerações finais; Referências.

cONSIDeRaÇÕeS INIcIaIS

O tema da indignidade certamente causa um sentimento de re-pulsa a qualquer um que dele toma conhecimento. No ordenamento jurídico pátrio, o assunto está inserido no Direito Sucessório, e sua ca-racterização exige a observância de condutas específicas, que, se com-provadas, acarretam como principal efeito o afastamento do direito do herdeiro de receber seu quinhão hereditário.

O presente trabalho, portanto, propõe-se a avaliar a possibilidade da aplicação analógica das consequências da decretação da indignidade como fundamento para afastar o cônjuge indigno do seu direito à heran-ça, bem como à meação, quando o meio para obtenção destes direitos sobrevier de atos ilícitos.

Para tanto, utiliza-se como metodologia a revisão bibliográfica, apresentando o entendimento doutrinário, as leis e as jurisprudências que tratam do tema, a fim de proporcionar um novo olhar sobre a indig-nidade do cônjuge.

O tema mostra-se de grande relevância, haja vista a possibilidade, diante da aplicação da letra fria da lei, da concretização de verdadeiras injustiças, “premiando” aquele que se casa e atenta contra a vida de outrem, com o único objetivo de acrescer a meação ao seu patrimônio.

Antes de adentrar no tema central, cumpre abordar, brevemente, os institutos da sucessão, herança, meação e indignidade, para, em se-

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guida, perquirir a possibilidade de afastamento da meação, em caso ato ilícito praticado contra o titular da herança.

Mostra-se de grande valor o estudo, pois o propósito é de propor o caminho para a concretização da verdadeira justiça.

1 a SUceSSÃO

Suceder é substituir, transmitir direitos e obrigações. A sucessão pode ser inter vivos, como exemplo a compra e venda de um imóvel; ou causa mortis, quando alguém titular de um patrimônio falece, transmi-tindo desde logo como herança aos seus herdeiros ou legatários os bens, incluindo direitos e deveres (Venosa, 2010).

A fundamentação da sucessão se deu originalmente por ordem re-ligiosa. A família era governada pelo varão mais velho, descendente di-reto dos deuses domésticos, incumbindo a ele administrar o patrimônio familiar e dirigir a vida religiosa e doméstica. A sucessão era transmitida ao homem, por ele ser sacerdote da religião doméstica, o que explicava a transmissão da herança ao primogênito varão.

Consoante Caio Mario Pereira (2015), a sucessão causa mortis, mas sim apenas em culto dos antepassados, no qual o elo entre o chefe de família e o culto era habitual, sendo permitido somente o culto aos homens. À mulher não era permitido o comando ao culto dos antepas-sados. Ao se casar, ela saía do poder familiar do pai para ingressar no do cônjuge e, com o casamento, a filha renunciaria à religião de sua família para integrar a do marido. A prevalência do homem na chefia do culto era tão relevante que, se na linha da sucessão só tivessem mulheres, uma das filhas tinha que dar um neto para a continuação dos cultos.

A intenção era de manter poderosa a família, coibindo a divisão patrimonial.

Concentrava-se a herança nas mãos de um único herdeiro do sexo masculino e a fundamentação da sucessão era pautada na religiosidade ou na família, ou seja, a partilha não era de forma igualitária, mas sim de forma desigual.

Com o decorrer do tempo, inovou-se a noção de que riqueza social é uma consequência da riqueza individual: tanto mais abasta-

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do e poderoso um agrupamento, mais ricos os indivíduos componentes (Hironaka, 2007). Assim, a manutenção e a transmissão hereditária inte-ressavam tanto ao ser quanto à sociedade.

No ordenamento jurídico brasileiro, o direito à herança é assegu-rado constitucionalmente, como direito fundamental, no art. 5º, inciso XXX: “É garantido o direito à herança” (Brasil, 1988).

1.2 EspéciEs dE sucEssão E dE sucEssorEs

A sucessão a ser abordada no presente artigo é a sucessão em sentido estrito, ou seja, decorrente da morte de alguém, sucessão causa mortis, na qual ocorre a transferência, total ou parcial, de herança a um ou mais herdeiros devido à morte de alguém.

As espécies de sucessão classificam-se em face dos efeitos que produz e da fonte da qual se origina. Esta pode ser legítima (ab intestato) ou testamentária, na forma do art. 1.786 do CC/2002: “A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade” (Brasil, 2002). A sucessão por lei é a sucessão legítima, já a sucessão por disposição de última von-tade é a sucessão testamentária.

Já a classificação da sucessão em face dos efeitos que produz pode ser a título universal ou a título singular.

1.2.1 Sucessão a título universal

A sucessão a título universal, assim como preconiza Maria Helena Diniz (2002, p. 20) dá-se “quando houver transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança, tanto no seu ativo como no seu passivo, para o herdeiro do de cujus”.

Haverá instituição de herdeiro, se o testador deixar ao beneficiário a totalidade de seu patrimônio ou uma porção abstrata de seus bens: meação, porção disponível, 1/3, 1/4, 1/5 etc., todos os móveis ou imó-veis existentes em certo município etc. O herdeiro é, portanto, chamado a suceder no todo ou em uma quota-parte do patrimônio do de cujus, sub-rogando-se, abstratamente, na posição do falecido, como titular da totalidade ou de parte ideal daquele patrimônio no que concerne ao ativo, e assumindo a responsabilidade relativamente ao passivo (Diniz, 2002, p. 20).

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A sucessão a título universal somente é admitida causa mortis, ou seja, o sucessor avoca a posição jurídico-econômica do autor da heran-ça, ingressando-se na totalidade dos direitos que lhe pertenciam e que foram transmitidos em face do falecimento do titular.

Transmite-se como um todo ao seu sucessor o patrimônio do mor-to, compreendendo o ativo e o passivo; sendo débitos, créditos, obri-gações, deveres e direitos, na proporção da herança herdada, salvo os direitos personalíssimos que não se transferem.

É denominado herdeiro o sucessor a título universal, sucedendo na totalidade ou em parte da herança.

1.2.2 Sucessão a título singular

Na sucessão a título singular, o autor da herança pode escolher seus herdeiros, destinando-lhes os bens na integralidade ou parcialmen-te, sendo os bens certos e determinados. Ao bem certo e determinado, ou individualizado, denomina-se legado. Maria Helena Diniz (2002) corrobora com este entendimento:

A título singular, quando o testador transfere ao beneficiário apenas ob-jetos certos e determinados, p. ex.: uma joia, um cavalo, uma determi-nada casa na Rua “X” etc. Nessa espécie de sucessão é o legatário que sucede ao de cujus em bens ou direitos determinados ou individuados, ou em fração do patrimônio devidamente individuada, sub-rogando-se, de modo concreto, na titularidade jurídica de determinada relação de direito, sem representar o falecido, pois não responde pelas dívidas e encargos da herança, já que sucede apenas in rem aliquam singularem. Portanto, se o testador contemplar alguém com uma coisa concreta, de-finida, singular, ter-se-á a nomeação do legatário. (Diniz, 2002, p. 20)

No vigente Código Civil brasileiro, em seus arts. 1.857, 2.014 e 2.018, pode-se verificar a sucessão a título singular. Cabe ressaltar que, em se tratando do art. 2.018 do CC, o testador pode fazer a partilha em vida, ainda que esta seja levada a efeito por testamento.

Na sucessão a titular universal, o sucessor é o herdeiro; já na su-cessão a título singular, o sucessor é o legatário. Somente existe a figura do legatário no testamento em que os bens são caracterizados como le-gado. Não tendo o falecido deixado um testamento válido e eficaz, não

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existirá legado. As diferenças entre herdeiro e legatário nas palavras de Sílvio de Salvo Venosa (2010):

[...] Basta dizer, a princípio, que o legatário não tem a posse que detém o herdeiro com a abertura da sucessão. Como regra geral, o legatário precisa pedir ao herdeiro a entrega da coisa legada.

O legatário, salvo disposição expressa do testador, não responde pelo pagamento das dívidas do espólio, atribuição dos herdeiros. O herdei-ro responde pelas dívidas do de cujus, na proporção do seu quinhão. (Venosa, 2010, p. 8)

A diferença entre a herança e o legado é que este é a “doação” feita em testamento, disposição testamentária a título particular, de bem certo e determinado integrante da herança. Só existe se houver testa-mento, o legatário é o último a receber.

Já a herança é o conjunto de bens ou o patrimônio deixado por uma pessoa que morreu, é o monte-mor menos a meação do cônjuge sobrevivente, é uma universalidade de bens e direitos que permanecem íntegros e indivisos até a sua individuação pela partilha.

1.2.3 Sucessão legítima

A sucessão, quanto à fonte da qual se origina, pode ser legítima (ab intestato) e/ou sucessão testamentária.

O atual direito das sucessões é resultado da fusão do Direito roma-no e do Direito germânico; o primeiro, com sua absoluta liberdade de testar, abrangendo todo o patrimônio do de cujus, e o Direito germânico ignorando o testamento, e, por isso, atribuindo a herança aos herdeiros legítimos do falecido.

A sucessão será legítima quando não houver testamento (ab intestato), quando ocorre ausência, anulabilidade ou caducidade (quan-do faltar o bem-objeto ou destinatário) do testamento. Nesse tipo de sucessão, a lei determina que se deva seguir a ordem de vocação heredi-tária; quando o testamento for nulo, for revogado ou não englobar todos os bens, podendo assim ocorrer duas espécies de sucessão, e quando houver herdeiros necessários, como descendentes, ascendentes e cônju-ge. Seguindo esse entendimento assevera Cezar Fiúza (2014):

[...] a sucessão legítima se dá em quatro momentos:

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a) quando o de cujus morrer sem testamento;

b) quando o testamento for anulado ou caducar;

c) quando o testador não dispuser da totalidade da herança; deixando parte sem destinação no testamento;

d) quando houver herdeiros necessários, que restrinjam a liberdade de testar à parte disponível. Havendo descendentes, ascendentes ou côn-juge supérstite, ou seja, havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade de seu patrimônio. A outra metade deverá obrigatoriamente ser deixada para os herdeiros necessários. (Fiuza, 2014, p. 1.252)

A sucessão legítima é tratada principalmente nos arts. 1.786, 1.788, 1.789, 1.790, 1.829, 1.845 e 1.846 do Código Civil vigente.

Na sucessão legítima, o grande referencial é a ordem da vocação hereditária estabelecida no art. 1.829 do Código Civil de 2002. Cui-da-se da distribuição em classes preferenciais das pessoas chamadas a suceder.

Antes da edição do Código Civil brasileiro de 1916, a vocação he-reditária seguia a seguinte ordem: descendentes, ascendentes, colaterais até o décimo grau, cônjuge supérstite e Fisco. Com a Lei nº 1.839/1907, houve a alteração na ordem hereditária, trazendo o cônjuge para o ter-ceiro lugar na linha sucessória e limitando a sucessão dos colaterais ao sexto grau.

Sob a égide do Código Civil de 1916, o cônjuge integrava a ordem de vocação hereditária, ocupando o terceiro lugar, depois dos descen-dentes e ascendentes, não sendo, todavia, considerado herdeiro neces-sário, de forma que poderia ser excluído da sucessão pela via testamen-tária.

No atual Código Civil de 2002, por sua vez, apesar de o cônjuge permanecer em terceiro lugar na ordem de vocação, foi elevado à con-dição de herdeiro necessário (art. 1.845 do CC), sendo-lhe, portanto, assegurado a legítima. O cônjuge passou a ter participação concorrente com os herdeiros de primeira classe – descendentes –, dependendo do regime de bens adotado no casamento, e também com os herdeiros de segunda classe – ascendentes –, independente do regime de bens.

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O cônjuge sobrevivente somente poderá participar da herança se não estava separado judicialmente do falecido ou, então, se estava sepa-rado de fato há menos de dois anos.

O direito de o marido ou de a mulher participar na herança do que morrer não deve ser confundido com regime de bens do casamento. No direito das sucessões, a participação do cônjuge na herança nasce da qualidade de consorte, enquanto que as ressalvas feitas na lei são conse-quência do regime de bens escolhido pelos cônjuges.

No regime de comunhão universal, tanto os bens que as pessoas tinham antes de casar quanto os adquiridos durante o casamento passam a pertencer ao marido e a mulher. No regime de comunhão parcial, com exceção dos bens recebidos por doação e por herança, apenas os bens adquiridos por qualquer dos cônjuges durante o casamento passam a pertencer a ambos.

Vigorando, portanto, ao tempo da morte de um cônjuge o regime de comunhão universal ou de comunhão parcial, o outro cônjuge terá direito à parte dos bens comuns que pertencia ao casal.

1.2.4 Sucessão testamentária

A sucessão testamentária é a sucessão que ocorre de acordo com o ato de última vontade, ou seja, de testamento ou codicilo, válido e eficaz. O titular de um patrimônio pode dispor sobre a destinação de seus bens mortis causa, desde que respeitada a parte indisponível se lhe houver herdeiros necessários. A sucessão testamentária pode ser tanto a título universal quanto a título singular.

Arnaldo Rizzardo (1996, p. 203) descreve sobre a origem da pa-lavra testamento: “[...] tem sua origem no verbo latino testari, com o significado de testemunhar. Foi acrescentado o sufixo mentum, do que derivou o substantivo”.

Como já mencionado anteriormente, predomina no ordenamento jurídico brasileiro a sucessão legítima, sendo a sucessão testamentária uma exceção.

A sucessão testamentária é limitada pela sucessão legítima. Pre-ceitua Washington de Barros Monteiro (2003, p. 10) “[...] que absoluta não é a liberdade de testar, como outrora sucedia no primitivo Direito

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romano”. Atualmente, pelo direito pátrio, se o testador tem herdeiros necessários, ou seja, descendentes, ascendentes e cônjuge (art. 1.845 do CC/2002), poderá dispor somente da metade de seus bens (art. 1.789 do CC/2002).

Havendo, destarte, herdeiros em linha reta, descendente ou ascendente, ou cônjuge sobrevivente, denominados herdeiros necessários, divide-se o universum jus defuncti em duas partes iguais; a legítima, que, de direi-to, cabe aos referidos herdeiros, e a porção disponível, da qual o testador pode livremente dispor, ou para outorgá-la ao cônjuge sobrevivente, ou a qualquer de seus herdeiros, ou a estranhos. As únicas restrições exis-tentes são ditas pelos arts. 1.801 e 1.802 do Código Civil, que regulam a incapacidade testamentária passiva. (Monteiro, 2003, p. 10)

A sucessão só é permitida por lei ou por testamento, ou seja, no direito sucessório brasileiro não se admite a sucessão contratual. Com fulcro ao art. 426 do CC/2002, são proibidos os pactos sucessórios, se-guindo a lógica de que “não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva” (Brasil, 2002).

Nesse entendimento aduz Washington de Barros Monteiro (2003):

A lei pátria, em tal questão, mostrou-se fiel à tradição romana; quer se trate de pacto aquisitivo (de sucedendo), impondo-se sua condenação, porque nele se pode lobrigar um votum captandae mortis, que fere a sen-sibilidade e repugna à consciência jurídica nacional. A expressiva deno-minação, que outrora se lhes atribuiu pacta corvina, evidencia a repulsa provocada por semelhante estipulação. (Monteiro, 2003, p. 13)

A proibição da sucessão contratual, conforme preceitua o referido art. 426 do CC/2002, é taxativa, porém a doutrina aponta duas exceções, como Diniz (2002) relata:

1) o contrato antenupcial, em que os nubentes podem dispor a respeito da recíproca e futura sucessão, desde que não excedam a metade dos bens (CC, arts. 1.668, IV, 1.655 e 546) e; 2) partilha de bens, entre os descendentes, feita pelos pais por ato inter vivos, pode ser considerada como exceção à norma do art. 426, por corresponder a uma sucessão antecipada, embora apresente inconvenientes, porquanto apenas pode abranger bens presentes. (Diniz, 2002, p. 19)

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No extinto Código Civil de 1916, no art. 314, admitia-se a estipu-lação, no pacto antenupcial, de doações para depois da morte do doa-dor, o que, no atual Código Civil, não é mais permitido.

1.3 AbErturA dA sucEssão – princípio dE sAisinE

Abre-se imediatamente a sucessão com o fim da existência da vida, conforme o art. 6º do CC/2002, “a existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva”.

Assim, devolução ou delação é o oferecimento da herança aos herdeiros ou legatários. É a possibilidade de aceitação da herança no momento em que passa à disposição dos herdeiros estabelecidos em lei ou em testamento.

O princípio da saisine sustenta-se na ideia de que o próprio de cujus transmite ao sucessor o domínio e a posse da herança (le mort saisit le vif). Acolhido no art. 1.784 do Código Civil de 2002, tal princí-pio harmoniza-se com o art. 1.207 do mesmo diploma, pelo qual o su-cessor universal continua detentor do direito à posse do seu antecessor, (art. 1.206 do CC/2002) (Gonçalves, 2010).

Droit de saisine significa “Direito da posse”, transmissão da he-rança dos herdeiros ou legatários. Em consonância ao principio saisine, verifica-se a capacidade sucessória dos herdeiros e legatários de acordo com a lei em vigor na data da morte do de cujus (Hironaka, 2007, p. 7).

A posse e o domínio da herança são transmitidos aos herdeiros compulsoriamente sem formalidades, não importando o fato de os her-deiros terem ou não conhecimento da morte do de cujus, ou o fato de eles estarem em local incerto. Todo o acervo hereditário, tanto ativo como passivo, é transferido aos herdeiros.

Com efeito, Silvio Rodrigues, citado por Rizzardo (1996), prele-ciona que

[...] o herdeiro se sub-roga, no que diz respeito à posse da herança, na própria situação que o finado desfrutava. Se era ele titular de uma posse justa e de boa fé, o herdeiro adquirirá uma posse justa e de boa fé, se-não, for injusta a posse do de cujus, a posse de seu sucessor terá igual efeito, pois ninguém pode transmitir mais direitos do que tem. É verdade,

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entretanto, que se a posse for violenta ou clandestina, pode ela conva-lescer desses vícios, após transcurso de ano e dia a contar da cessação da violência ou da clandestinidade. (Rodrigues apud Arnaldo Rizzardo, 1996, p. 34)

Os herdeiros se tornam titulares dos direitos, mas também das obrigações que pertenciam ao de cujus, porém, conforme o art. 1.792 do CC/20021, limitando-se a responsabilidade pelas dívidas ao ativo he-reditário.

2 HeRaNÇa

Do latim haerintia, pertences. Posteriormente, herdança, resul-tando a contração herança. Universalidade dos bens deixados pelo de cujus. Patrimônio ativo e passivo deixado pelo defunto (Acquaviva, 2008, p. 256).

A herança é o objeto da sucessão causa mortis e compreende todo o patrimônio do de cujus, sendo direitos, obrigações, ativo, passivo, e outros, com exceção dos direitos personalíssimos.

Nos termos do art. 1.791 do CC/2002, a herança é uma universa-lidade de direitos indivisíveis até sua efetiva partilha, ficando em condo-mínio, ou seja, existindo mais de um herdeiro ou legatário, ou ambos, o direito de cada um permanecerá indivisível até que sejam os bens partilhados.

3 meaÇÃO

Meação é a parte que cabe a cada cônjuge sobre os bens que in-tegram o patrimônio do casal. Marcus Cláudio Acquaviva (2008) define meação:

[...] No Direito de Família, mais precisamente no regime de comunhão universal de bens (arts. 1.667 a 1.671 do CC), sendo a propriedade dos bens comum aos cônjuges, havendo separação judicial extingue-se o re-gime de bens (art. 1.576, caput, do CC), recebendo, cada cônjuge, sua

1 “Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrando o valor dos bens herdados.” (Brasil, 2002)

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meação ou, em caso de morte deste, seus herdeiros. No Direito das Su-cessões, meação é a parte que cabe ao cônjuge supérstite (sobrevivente), parte esta que compreende a metade dos bens do acervo. CC: arts. 1.575 e 1.576, caput. (Acquaviva, 2008, p. 315)

Para Gustavo Rene Nicolau (2007),

o substantivo meação (derivado do verbo mear) nada mais é do que a simples atribuição dos bens a cada um dos cônjuges que unidos traba-lharam (em planos diferentes) para construir o patrimônio que – por oca-sião da dissolução da sociedade conjugal – (divórcio, separação judicial, morte e anulação), deverá ser partido ao meio, meado. (Nicolau, 2007, p. 49)

Portanto, conforme o regime de bens adotado pelo casal, no casa-mento existirá ou não a meação. A meação é um direito de família e um direito patrimonial, e não um direito sucessório, pois o que se discute é a divisão dos bens com a dissolução do casamento.

No regime da comunhão universal de bens, a meação do patrimô-nio de cada cônjuge inclui todos os bens constituídos pelo casal, tanto na constância do casamento quanto também aqueles que eram particu-lares de cada um antes do matrimônio. Não existindo bens particulares, tornam-se bens comuns aqueles adquiridos antes e durante a união.

A meação existirá também no regime da comunhão parcial de bens e na participação final dos aquestos, quando consistirá no direito à propriedade da metade dos bens adquiridos de forma onerosa durante o casamento.

Nos regimes da separação total de bens e separação obrigatória (legal), não há meação entre os cônjuges, pois os patrimônios não se confundem. Os bens são particulares ao homem e à mulher.

Porém, existe exceção à regra, com a aplicabilidade da Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal, que determina: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento” (Brasil, 1964).

A súmula foi editada no tempo em que estava em vigor o Código Civil de 1916, mas, com o novo Código Civil de 2002, a aplicabilidade da referida Súmula ainda ocorre.

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4 DIFeReNÇa eNTRe meaÇÃO e HeRaNÇa

Como já conceituado, herança é todo o patrimônio, direitos e obrigações, deixados pelo de cujus, que caberão aos seus herdeiros; so-mente a herança será objeto de transmissão causa mortis. A meação, a seu turno, é a divisão dos bens dos cônjuges, quando existe comunica-ção patrimonial.

Para análise dos casos em que o cônjuge terá direito à herança ou à meação, é necessário verificar o regime de bens adotados quando do casamento. No extinto Código Civil brasileiro de 1916, o direito suces-sório do cônjuge sobrevivente independia do regime de bens.

Conforme já dito, no vigente Código Civil pátrio, o direito do côn-juge sobrevivente à meação e à herança é avaliado conforme o regime de bens que regulava o casamento. Quando um dos consortes vem a falecer, ocorre a dissolução do matrimônio e, dependendo do regime de bens, uma parte do patrimônio do de cujus é do sobrevivente por direito próprio e não por direito sucessório.

5 a eXclUSÃO SUceSSóRIa

5.1 indignidAdE: concEito

A indignidade é uma pena civil que afasta do direito à herança não só o herdeiro, mas também o legatário que cometeu atos criminosos ou reprováveis contra o autor da herança ou a membros de sua família (Diniz, 2002).

Na definição de Clóvis Beviláqua (1958), citado por Paulo Nader (2010, p. 89), “indignidade é a privação do direito, cominada por lei, a quem cometeu certos atos ofensivos à pessoa ou interesse do heredi-tando”.

Para que o herdeiro ou legatário venha ser condenado à indigni-dade, depende do enquadramento da conduta imputada em uma das causas elencadas no Código Civil de 2002, in verbis:

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

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II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou com-panheiro;

III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses ca-sos de indignidade, será declarada por sentença.

Parágrafo único. O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou le-gatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão. (Brasil, 2002)

No Código Civil de 1916, a pena da indignidade atingia quem atentasse contra a vida do autor da herança, porém, no Código Civil de 2002, o legislador achou por bem estender a pena também àqueles que atentassem contra os parentes em linha reta, o cônjuge e o companheiro do de cujus.

A indignidade ocorre com o trânsito em julgado da sentença decla-ratória, sendo seus efeitos retroativos ao momento da abertura da suces-são. Logo, o indigno não deverá colher qualquer benefício na herança. Os frutos e rendimentos que dos bens da herança houver eventualmente auferidos devem ser devolvidos ao espólio, resguardado o direito do in-digno a ser indenizado das despesas com a conservação do patrimônio (art. 1.817, parágrafo único, do CC/2002).

5.2 o rEconhEcimEnto judiciAl nA dEcrEtAção dA indignidAdE sucEssóriA

A indignidade exposta na lei não opera automaticamente; seu pro-nunciamento deve se dar por sentença transitada em julgado em ação ordinária. A avaliação da conduta do herdeiro não se faz nos autos do inventário, mas em ação declaratória, no procedimento ordinário.

É parte legítima para a propositura da ação de declaração da in-dignidade qualquer um dos herdeiros a quem a aplicação da pena bene-ficie. Na ação de declaração de indignidade, o acusado tem a oportuni-dade de apresentação da defesa, prevalecendo o princípio da presunção de inocência enquanto não ocorre a sentença definitiva (Nader, 2010).

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Como já referenciado, a ação de declaração de indignidade não é espontânea, é necessário que seja provocado o Poder Judiciário. O pra-zo decadencial para seu ajuizamento é de quatro anos, contados a partir da abertura da sucessão (art. 1.815, parágrafo único).

Há de se ressaltar que existe um Projeto de Lei nº 7.806/2010, pro-posto pela Senadora Serys Slhessarenko, que torna espontânea a exclu-são de herdeiro ou legatário indigno que seja condenado por sentença penal transitada em julgado. O fato de a indignidade não ser automática acaba possibilitando ao herdeiro indigno acessar a herança caso outro herdeiro não se manifeste para a propositura da ação declaratória de indignidade.

Assim, se nenhum interessado pleiteasse a exclusão do indigno, não ocorreria a exclusão do herdeiro, ainda que a sua culpa seja pelo homicídio do autor da herança.

Para evitar tal injustiça, defende-se a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento da ação de indignidade. A esse respeito im-porta registrar que foi aprovado na I Jornada de Direito Civil o Enunciado nº 116, reconhecendo ao Ministério Público legitimidade para propor ação declaratória de indignidade, desde que presente o interesse público (Nader, 2010).

Não há como ignorar que o Estado pode ser interessado na heran-ça quando não houver demais herdeiros, ou até mesmo quando aquele que poderia ajuizar ação de declaração de indignidade não tem capaci-dade civil dentro do prazo da propositura da ação.

O Ministério Público, portanto, não só pode como deve intervir em caso de indignidade, de forma a garantir a defesa da ordem jurídica e os interesses sociais e individuais indisponíveis, na forma do art. 127 da CR/1988. Isso porque, se assim não o fizer, poderá deixar impune aquele que, de forma ilícita, herdou patrimônio por meio do homicídio do autor da herança.

5.3 EfEitos dA indignidAdE

Os efeitos da exclusão sucessória são pessoais, não passam de uma pessoa para outra. Os descendentes do herdeiro excluído sucedem por representação ou por estirpe, como se ele morto fosse antes mesmo da

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abertura da sucessão (art. 1.816 do CC/2002). Se ocorrer a premoriência dos representantes do indigno, este ficará excluído da sucessão dos bens adquiridos por representação.

O indigno não aproveitará nem eventualmente aqueles bens de que ele foi excluído (art. 1.816, parágrafo único, do CC/2002).

O ajuizamento da ação de exclusão sucessória independe da pré-via condenação penal, existindo a possibilidade de a prova da indigni-dade ser produzida no juízo cível. Porém, se o indigno for absolvido na esfera criminal por não existir a materialidade do crime ou pela exclu-dente de ilicitude, não será possível a apreciação no juízo civil.

A primeira consequência da decretação da sentença declaratória de indignidade transitada em julgado é a perda do direito sucessório. Com a abertura da sucessão, automaticamente é transmitido o direito de propriedade e posse indireta aos herdeiros (art. 1.784 do CC/2002), depois se tem o direito de aceitação ou renúncia da herança (arts. 1.804 e seguintes do CC/2002). A transmissão da herança com a abertura da sucessão se dá a todos os herdeiros, inclusive o indigno, que perderá o seu direito com a sentença que assim o declara.

Se o indigno recebeu algum bem em vida pelo autor da herança, considera-se adiantamento da herança e tal liberalidade não é revogada com a indignação. Assim, “[...] O art. 2008 do Código Civil não deixa margem de dúvida, pois apenas exige a conferência das doações, a fim de se apurar eventual excesso em relação à parte disponível da herança e devolução do valor sobejante” (Nader, 2010, p. 102).

Como já mencionado, o herdeiro declarado indigno por sentença é obrigado a devolver os frutos e rendimentos da herança que recebeu. Por força do efeito ex tunc da sentença da declaração de indignidade, a devolução deverá ser feita desde abertura da sucessão, resguardado o di-reito de reembolso das despesas a conservação dos frutos e rendimentos auferidos (art. 1.817, parágrafo único, do CC/2002).

Será herdeiro aparente aquele que ainda não foi julgado como herdeiro indigno, sendo permitido o exercício dos direitos que lhe são atribuídos, inclusive o direito de alienações onerosas do patrimônio he-reditário a terceiros de boa-fé.

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Os atos de administração e alienações feitas pelo indigno antes da sentença da indignidade são válidos. Porém, diante de eventuais prejuí-zos causados aos herdeiros, deverá o indigno ressarci-los. Comprovado o ato ilícito, com todos os seus elementos, caberá às vítimas o direito de demandar-lhe perdas e danos (art. 1.817, caput, do CC/2002).

Os efeitos da pena de indignidade são personalíssimos, cabendo somente a exclusão do direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança (art. 1.816, parágrafo úni-co). O indigno não deixará de ter direito ao usufruto legal, à adminis-tração ou o direito à eventual herança diversa de seus descendentes, relativos ao patrimônio hereditário que não se tratam da exclusão e que pertençam a seus herdeiros a título diverso (Venosa, 2010).

A propósito, se o herdeiro indigno tiver matado o próprio pai ou a mãe, sendo o indigno único filho, os filhos deste herdarão por direito próprio e não por representação. Porém, se o de cujus tiver outros fi-lhos além do indigno, os filhos deste herdarão por representação (Nader, 2010).

Um caso de grande repercussão e repúdio da sociedade foi o crime de parricídio e matricídio cometido por Suzane Loise Von Richthofen. No dia 31 de outubro de 2002, ela, seu namorado, Daniel Cravinhos de Paula e Silva, e o irmão deste, Cristian Cravinhos de Paula e Silva, exe-cutaram friamente os pais de Suzane (Castro, 2015).

Os pais de Suzane tinham outro filho além dela, Andreas Albert Von Richthofen, que, na ocasião, ajuizou uma ação de exclusão de he-rança para que a irmã não lograsse êxito em ficar com a herança fruto do assassinato dos próprios pais.

Em 2015, Suzane Loise Von Richthofen foi considerada indigna, por sentença transitada em julgado, tendo sido excluída da herança de seus pais Manfred e Marísia Von Richthofen, e, como não tem filhos para herdar por representação, o patrimônio hereditário ficou para Andreas Albert Von Richthofen, irmão de Suzane.

5.4 rEAbilitAção do indigno

A reabilitação do indigno ocorrerá se o autor da herança o perdoar por ato autêntico (escritura pública), ou por testamento (art. 1.818, da CC/2002).

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Sobre o assunto, Paulo Nader (2010) aduz:

Nada justifica o desvio de conduta do indigno. Qualquer que tenha sido a sua prática, esta é condenável nas esferas da Moral e do Direito. A deslealdade, a agressão física, o ataque à honra provocam a revolta da vítima e a repulsa de quem tem sensibilidade ética. Somente os espíri-tos nobres possuem a capacidade para o perdão. Isto ocorreu com Sua Santidade o Papa João Paulo II ao perdoar Mehmet Ali Agca, que tentou matá-lo em 1981. (Nader, 2010, p. 105)

Se o autor da herança perdoou o indigno, significa que ele não de-seja a efetivação da aplicação da pena de exclusão sucessória. A senten-ça da indignidade exclui o herdeiro da sucessão e o perdão o reabilita, de forma que exclui os efeitos da pena que lhe foi apregoada em juízo.

De par com isso, se aquele que tem interesse legítimo na sucessão não propor ação declaratória de indignidade no prazo decadencial de quatro anos, presume-se perdoado o indigno, contudo, não há se falar em reabilitação nesse caso, pois não houve a condenação com a pena civil de indignidade.

O ato de perdoar, gerando a reabilitação do indigno, é direito pri-vativo e formal do ofendido. Este, além de ser titular do patrimônio, é o que pode avaliar o grau da ofensa e o mérito do perdão.

Segundo Diniz, “não havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em testamento do ofendido, quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no limite da dispo-sição testamentária (art. 1.818, parágrafo único, do CC/2002)” (2002, p. 53). A autora ainda conceitua o referido artigo: “Trata-se da reabilita-ção de indigno tácita, por ser curial que o está perdoando [...]” (Diniz, 2002, p. 53).

Paulo Nader (2010) entende que não existe a reabilitação tácita, e ainda leciona que caracterizar o art. 1.818, parágrafo único, do CC/2002 como existência de tal reabilitação é uma forma equivocada de interpre-tação. Leia-se:

Inexiste a reabilitação tácita. Ainda que o ofendido, por suas atitudes, revele haver perdoado o indigno, tal comportamento não poderá ser interpretado juridicamente como reabilitação, pois esta somente se ca-racteriza quando expressa. A hipótese prevista no parágrafo único do

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art. 1.818 não a configura, apenas garante os efeitos da cláusula testamen-tária em que o hereditando, ciente da causa de indignidade, beneficia o indigno. Não obstante, Pires de Lima e Antunes Varela nomeiam esta iniciativa do hereditando por reabilitação limitada, tácita ou indireta, ter-minologia imprópria e com potencial de gerar dúvidas. Casati e Russo in-cidem, igualmente, no equívoco. (Casati; Russo, 1950 apud Nader, 2010, p. 107, grifos do autor)

Washington de Barros Monteiro (2003) posiciona-se sobre o as-sunto de forma categórica: “Não existe perdão tácito ou presumido, nem pode ser concedido oralmente, ou por instrumento particular despido de autenticidade” (Monteiro, 2003, p. 68). Entre os autores pesquisados no presente trabalho, a maioria absoluta leciona de forma a existir a reabi-litação tácita, configurada no art. 1.818, parágrafo único, do CC/2002.

No entanto, como o próprio caput do mencionado artigo determi-na, a reabilitação deve se dar de forma expressa em testamento ou em outro ato autêntico. Ressalta-se que não existe reabilitação diversa da expressa e nem existe o perdão tácito por parte do ofendido. Se o autor da herança já conhecia a causa da indignidade e ainda sim contem-pla em testamento o indigno, não significa que o ofendido o perdoou, significa apenas que o indigno está autorizado a suceder no limite que permite a disposição testamentária.

A reabilitação é irretratável, porém, se comprovado que o autor da herança praticou o ato do perdão alheio a sua vontade, de forma que foi coagido, será passível de anulação. Se o testamento for revogado e con-tiver a cláusula de reabilitação, esta será conservada. Esse entendimento não é taxativo, existe opinião diversa sobre o assunto (Pereira, 2015).

5.5 difErEnçA EntrE indignidAdE E dEsErdAção

Não obstante às diferenças existentes entre indignidade e deserda-ção, em ambos os casos surge a quebra do dever de gratidão, acarretan-do a perda do direito à sucessão. São sanções civis aplicáveis àqueles que não se comportaram bem com o autor da herança.

A deserdação é o ato pelo qual o titular da herança exclui da su-cessão o herdeiro necessário, mediante testamento com expressa decla-

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ração da causa, privando-o de sua legítima por ter praticado qualquer ato enumerado nos arts. 1.814, 1.962 e 1.963 do Código Civil de 20022.

A indignidade não se confunde com a deserdação, embora ambas tenham a mesma finalidade, qual seja punir com a exclusão o herdeiro ou o legatário que praticar atos contra o autor da herança.

Enquanto a indignidade é ato reconhecido mediante uma ação de indignidade, nos termos do art. 1.185 do Código Civil, a deserdação se manifesta, exclusivamente, por ato de vontade do autor da herança (testamento). Qualquer sucessor (legítimo ou testamentário) pode ser in-digno; contudo, somente o herdeiro necessário pode ser deserdado.

A indignidade é solicitada por terceiros interessados ou pelo Mi-nistério Público, quando há interesse público, no prazo de quatro anos da abertura da sucessão, e decretada mediante sentença transitada em julgado.

A deserdação é feita somente por testamento e após a abertura da sucessão, logo, impossível deserdar algum herdeiro antes da morte do autor da herança, conforme determina o Código Civil brasileiro de 2002.

2 “Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

[...]

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:

I – ofensa física;

II – injúria grave;

III – relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;

IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos ascendentes pelos descendentes:

I – ofensa física;

II – injúria grave;

III – relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta;

IV – desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.” (Brasil, 2002)

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Outro aspecto importante é que a reabilitação do indigno ocorrerá se o autor da herança o perdoar por ato autêntico (escritura pública), ou por testamento (art. 1.818 da CC/2002). Na deserdação, o testador só poderá perdoar o deserdado por meio de revogação testamentária.

Por fim, nem todos os motivos de deserdação configuram indig-nidade. A revogação da deserdação em caso de perdão do testador ao deserdado acontece por meio da revogação testamentária.

6 O cÔNjUge QUe cOmeTe HOmIcÍDIO DOlOSO e a pOSSIbIlIDaDe De aFaSTameNTO Da meaÇÃO pOR meIO Da DeclaRaÇÃO De INDIgNIDaDe: SUgeSTÃO De alTeRaÇÃO legISlaTIva

Conforme já referenciado, meação não se confunde com herança. Esta é decorrente do direito sucessório, em que o patrimônio do de cujus é transmitido aos seus herdeiros legítimos ou testamentários, ao passo que a meação é proveniente do direito de família e decorre da partilha dos bens que compõem o conjunto patrimonial comunicável, quando da dissolução do casamento.

A indignidade é uma pena civil. Mesmo que o cônjuge ofensor tenha que arcar com as sanções penais advindas de sua condenação, também deverá ser aplicada a penalidade civil, quando presente a com-provação de algum ato que dê causa a sua indignidade.

Os crimes que dão causa à indignidade são: a atuação do herdei-ro como autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, compa-nheiro, ascendente ou descendente; a ação do herdeiro no sentido de acusar caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro; a conduta do herdeiro que, por violência ou meios fraudulentos, inibir ou obstar o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade (art. 1.814 do CC/2002). Entre todos esses crimes, o que causa maior repulsa na sociedade é o crime doloso.

A regra, no Brasil, é que a indignidade exclui o direito à heran-ça e não a meação. Conforme a jurisprudência brasileira, o art. 1.814 CC/2002 é rol taxativo:

EMENTA: DIREITO DE SUCESSÕES – EXCLUSÃO DA SUCESSÃO – HERDEIRO – HOMICÍDIO DOLOSO PRATICADO CONTRA CÔNJUGE

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– POSSIBILIDADE – EXCLUSÃO DA MEAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – 1. Podem ser excluídos da sucessão por indignidade os herdeiros e lega-tários, ex vi do art. 1.814 do Código Civil. 2. A meação pertence ao côn-juge por direito próprio, sendo inviável, portanto, a extensão da pena de exclusão do cônjuge herdeiro, em razão de indignidade (art. 1.814, inc. I, do Código Civil), ao direito do réu, decorrente do regime de bens ado-tado no casamento. 3. Recurso parcialmente provido. TJMG. 9572648-72.2008.8.13.0024. (Rel. Des. Edgard Penna Amorim, Rel. p/ Ac. Des. Edgard Penna Amorim, J. 22.07.2010, Publ. 29.10.2010)

Contudo, o entendimento de que não cabe a exclusão do cônjuge indigno da meação, na realidade, gera injustiças e até motivação para a prática do crime de homicídio doloso contra o cônjuge. O que se vê, na realidade, é que a doutrina, em uma visão simplista, analisa normalmen-te se o cônjuge é meeiro ou herdeiro, não levando em consideração se o cônjuge indigno acresceu ao seu patrimônio a meação, unicamente, porque praticou homicídio contra o autor da herança.

Por mais que a maioria dos juristas, nesses casos, analise taxati-vamente o que é determinado em lei, sem considerar o caso concreto, entende-se que há possibilidade de aplicação da analogia, dos costumes e o princípio da justiça, como forma de evitar a disseminação de condu-tas homicidas em busca da meação, senão vejamos:

EMENTA: MEAÇÃO – DIVÓRCIO – INDIGNIDADE – QUEM MATOU O AUTOR DA HERANÇA FICA EXCLUÍDO DA SUCESSÃO – Este é o princípio consagrado no inc. I do art. 1.595 do Cc, que revela a repulsa do legislador em contemplar com direito sucessório quem atenta contra a vida de alguém, rejeitando a possibilidade de que, quem assim age, venha a ser beneficiado com seu ato. Esta norma jurídica de elevado teor moral deve ser respeitada ainda que o autor do delito não seja herdeiro legítimo. Tendo o genro assassinado o sogro, não faz jus ao acervo patri-monial decorrente da abertura da sucessão. Mesmo quando do divórcio, e ainda que o regime do casamento seja o da comunhão de bens, não pode o varão receber a meação constituída dos bens percebidos por he-rança. Apelo provido por maioria, vencido o relator. (Segredo de justiça). (TJRS, Apelação Cível nº 70005798004, Sétima Câmara Cível, Rel. Luiz Felipe Brasil Santos, J. 09.04.2003 – grifo nosso)

Utilizando de subsídio a decisão da apelação citada, serão ana-lisados os fundamentos doutrinários e jurisprudenciais que serviram de

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embasamento para o voto de cada desembargador, com ênfase na pos-sibilidade de afastamento da meação, por meio da declaração de in-dignidade do cônjuge que comete homicídio doloso contra o autor da herança, ou um familiar deste. Analisa-se:

Voto do Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos (Relator)

[...] Ocorre que o fundamento da apelante para ver seu ex-marido exclu-ído da partilha na ação de divórcio (Processo nº 11488 – autos em apen-so) não encontra respaldo legal, eis que pretende aplicar, por analogia, o art. 1.595, inc. I, do CC.

Como bem afirmou o decisum, “[...] Os bens devem ser partilhados entre os cônjuges, pois casados sob o regime da comunhão universal de bens (art. 262 do Código Civil), não estando a hipótese dos autos (homicídio do sogro) elencadas no art. 263 do Código Civil, que estabelece os casos de exclusão da comunhão. Também não há como acolher eventual apli-cação analógica do art. 1.595, inciso I, do diploma legal supramencio-nado, porque o referido não é herdeiro da vítima do homicídio, como já reconhecido em sentenças anteriores, faltando o requisito da semelhança essencial dos casos postos em análise. Ademais, não se admite analogia para restringir direitos ou quando a enumeração legal é taxativa. Nesse sentido, a lição de Carlos Maximiliano na obra Hermenêutica e Aplica-ção do Direito (12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 213): “Quando o texto contém uma enumeração de casos, cumpre distinguir: se ela é taxa-tiva, não há lugar para o processo analógico; se exemplificativa apenas, dá-se o contrário, não se presume restringida a faculdade do aplicador do Direito”.

Ademais, cabe frisar que a doutrina estrangeira trazida pela ape-lante em sua inicial com o fito de utilizar-se do direito comparado nos remete aos casos específicos de herdeiros excluídos da partilha, pois atentaram contra a vida do autor da herança.

A legislação ora sob foco traz uma sanção – exclusão da herança – aos que tentaram ou participaram de tentativa contra a vida daqueles de cuja sucessão se tratar. Em outros termos, como frisou o Ministério Público (fls. 543/549), quis a lei que a regra da indignidade recaísse tão-só na-queles possuidores de laços de sangue e/ou de extrema afeição com o autor da herança, a ponto de serem penalizados por atos atentatórios a sua vida, honra ou liberdade.

Neste sentido, desprovejo o apelo. (Santos, 2003, grifo do autor)

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Vê-se, pois, que, ainda que o cônjuge indigno não seja herdeiro necessário e nem testamentário do sogro, com a prática do crime de homicídio doloso contra este, o indigno há de se beneficiar, de forma ilícita, com a dissolução do seu casamento. O mesmo se dá se a herdeira vier a falecer e não tiver descendentes e nem ascendentes, o cônjuge sobrevivente herdará todo o patrimônio se este não for sentenciado com a pena de indignidade.

O Código Civil de 2002 estendeu a pena da exclusão por indigni-dade a hipóteses de homicídio doloso, consumado ou tentado, não só contra o autor da herança, mas também contra o cônjuge, companheiro, descendente ou ascendente do mesmo.

O voto do Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, já citado, só considerou a lei de forma categórica, sem ponderar os princípios e os costumes. Se ele decidisse em desfavor do indigno, o desembargador não iria contra o que determina a lei, pois o direito à meação é lícito, mas o recebimento do patrimônio, fruto do homicídio do próprio sogro, pelo indigno não o é.

A questão da indignidade é pautada na moral, na ética, na equida-de e nos princípios, logo, há de se repugnar aquele que extrai vantagem ao patrimônio de pessoa a quem ofendeu.

Sobre o último julgado que foi citado, passa-se a analisar o voto da Desembargadora Maria Berenice Dias:

DESª MARIA BERENICE DIAS – PRESIDENTA – Concordo com o eminen-te Relator quando diz que o Código Civil de 1916 não previu, entre as hipóteses de exclusão elencadas no art. 1.595, a situação ora vertida nos autos, uma vez que excluiu da sucessão, exclusivamente, os herdeiros.

No entanto, não vejo como se possa afastar o princípio que regeu a edi-ção dessa regra jurídica de elevado teor moral; no momento em que o legislador revelou a repulsa em contemplar com direito sucessório quem atentar contra a vida do autor da herança, a ponto de excluir o herdeiro da sucessão, nitidamente, rejeitou a possibilidade de, quem assim age, ser beneficiado com seu ato.

Houve uma omissão do legislador em não prever que tal ato, praticado por outrem, mas que direta ou indiretamente poderia se beneficiar do acervo patrimonial do de cujus, estaria o mesmo sujeito à mesma sanção. No entanto, ao contrário do posto no parecer ministerial, não vejo que a

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referência exclusivamente ao herdeiro vise punir só quem tivesse laços de sangue ou laços de afinidade com a pessoa contra quem atentou. Não. O legislador quis punir o autor do ato criminoso não lhe dando a herança, ou seja, lhe subtraindo o patrimônio que poderia vir a fazer jus.

Não se pode olvidar que não há plenitude do ordenamento jurídico, pro-va disso é que, modo expresso, tanto o art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil quanto o art. 126 do Código de Processo Civil determinam que a Justiça aprecie todas as questões que lhe são postas. Em havendo omissão da lei, por evidente que a solução não é negar a pretensão, pois a própria lei dá o caminho: analogia, costumes e princípios gerais do direito. A lei não permite que seja premiado com a herança quem age contra a vida de alguém, tanto que o pune com a exclusa do direito su-cessório. Ora, o fato de o ora apelado não ser herdeiro, mas marido da herdeira, bem como não se estar em sede de sucessão mas frente a ação de divórcio, não se pode afastar a diretriz do legislador e impedir que quem deu ensejo à abertura da sucessão seja contemplado com os bens do de cujus que passou a integrar o patrimônio do casal.

Esta omissão do legislador não se verifica no novo Código, que, no art. 1.814, amplia as hipóteses de exclusão, ao dizer que são excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários que houverem sido autores, co--autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa desta, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente.

Ainda que in casu não se possa aplicar o novo Código, cabível atentar que essa ampliação do dispositivo revela a aceitação da diretriz sinaliza-da pela doutrina.

Confesso que tenho enorme dificuldade em fazer distinguir nos elencos legais se o rol é enumerativo, taxativo ou exemplificativo. No momento em que a lei prevê hipóteses – ainda que hipóteses de exclusão – nunca se pode ter o mesmo como exaustivo, porque, às vezes a imaginação – ou a crueldade do ser humano, como no caso – vai além da previsão do legislador.

No entanto, se há omissões na identificação das pessoas integrantes do suporte fático, de tal omissão não se recentem os princípios, que devem sempre ser identificados para serem invocados quando se verifica uma lacuna na lei. Assim, se há omissão de norma legal, deve sempre que prevalecer o princípio consagrado pelo legislador que, indiscutivelmen-te, é o de não permitir a quem atenta contra a vida de outrem possa dele receber alguma coisa, seja como sucessor, seja como cônjuge ou compa-

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nheiro do sucessor. Essa é a intenção do legislador e a função da Justiça é exatamente fazer incidir a orientação ditada pela lei. Aliás, para isso é que somos juízes, para fazer justiça segundo os princípios que regem o sistema jurídico. Não somos, como dizia Montesquieu: la bouche de la loi, juízes que simplesmente se limitam a repetir e aplicar a norma con-tida no elenco legal, permitindo que se conviva com a injustiça. Somos Juízes de Direito, integramos um Tribunal de Justiça.

Confesso que fere meu senso de justiça fazer uma injustiça dessa ordem. No dia em que tomei posse como magistrada, jurei fazer justiça, não apli-car a lei de forma mecânica e casuísta. Se para isso, quem sabe, tiver que afrontar a lei, a dar ensejo talvez de ser acusada de ter me tornado adepto da nominada “justiça alternativa”, paciência. Se for esse o qualificativo que mereço, vou aceitar, mas não posso permitir é o locupletamento de alguém com a própria torpeza.

Rogando vênia ao eminente Relator, voto pelo acolhimento do recurso com a inversão dos encargos sucumbenciais para afastar a possibilidade de o apelado se beneficiar da meação que é integrada pela herança da pessoa que ele matou. (Dias, 2003, grifo nosso)

Como se observa, ainda que exista lei que autorize a perda do direito à meação do cônjuge indigno, o inteligente posicionamento da desembargadora fez com que a aplicação da lei não se mostrasse um direito engessado e meramente posto.

Considerando-se que o sistema jurídico não é completo, mas sim recheado de lacunas, imperiosa se mostra a interpretação de acordo com a juridicidade, ou seja, a observância dos princípios constantes no ordenamento brasileiro.

Nesse contexto, não se olvida que a lei garante o direito à meação, assim como o direito à vida e à dignidade da pessoa humana. Todavia, se aquele que se utiliza de meios criminosos para obter qualquer tipo de bem patrimonial for responsabilizado apenas criminalmente, a justiça não será de fato aplicada. Ora, nem tudo que é lícito é justo ou honesto.

Existe, in casu, a problemática envolvendo a dúvida se o direito à meação deve subsistir à decretação da indignidade, independentemen-te do meio que foi utilizado para receber esses direitos, ou se deve ser punido aquele que se enriquece de forma ilícita. Aceitar isso é o mesmo que dizer que é crime matar alguém, mas beneficiar-se desse ato não é.

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Está-se, então, diante de uma antinomia quando se percebe que coexis-tem, ao mesmo tempo, no mesmo sistema jurídico, uma norma proibi-tória de um determinado comportamento quanto àquela que permite o mesmo ato que foi proibido.

A inexistência de norma legal que determine a perda do direito à meação, diante da prática do homicídio doloso do seu consorte ou um familiar do mesmo, não pode obstar que o juiz julgue sob a luz da analo-gia, dos costumes e princípios gerais do Direito. Tem-se, então, que não é correto afirmar que o art. 1.814 do CC/2002 traz um rol taxativo, pois nele não se encerram todas as possibilidades da aplicação da indignida-de no caso concreto.

O dogma da completude, ou seja, aquele princípio de que o or-denamento jurídico é completo para fornecer ao juiz uma solução para cada caso, sem a necessidade de buscar os princípios, os usos e cos-tumes, a analogia e a equidade, não tem prevalência nas leis pátrias, certamente por existir lacunas no Direito.

Sobre esse entendimento, Norberto Bobbio (2007) aduz que,

[...] não só nos parece impossível excluir as lacunas, em contraste com a teoria da norma geral exclusiva, mas o próprio conceito de lacuna foi se tornando preciso: a lacuna se verifica não pela ausência de uma nor-ma expressa para a regulamentação de um determinado caso, mas pela ausência de um critério para a escolha de qual das duas regras gerais, aquela exclusiva e aquela inclusiva, deve ser aplicada. (Bobbio, 2007, p. 279, grifos do autor)

A ausência de um ordenamento jurídico completo sempre vai existir, mas o que não pode existir é a falta da aplicação da lei ou a ine-ficácia dela.

Em estudo do último voto do desembargador sobre a apelação do pedido de indignidade e da exclusão da meação, diante do crime co-metido pelo genro que matou o sogro para aumentar o seu patrimônio, leia-se:

DES. JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS

[...] Considerando que se trata de uma longa causa, que há tempo se debate, e estando já decidido, a mim também instigou, desde o início,

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a injustiça dessa situação. É verdade que as hipóteses de indignidade, como também ocorre com as hipóteses de deserdação, são estritamente nominadas no Código Civil, tanto no Código de 1916, como no Código em vigor. É que o legislador, como disse a eminente Revisora e eminente Presidente, não pode cogitar de todas as hipóteses e, portanto, o deci-sor, na sua tomada de posição, deve considerar, naqueles casos omissos, os aspectos éticos, relevantes, morais, juntamente com os fundamentos legais. [...]

Não há por que, lá como aqui, deixar-se de divisar, no caso concreto, a aplicação do princípio ético, do princípio do senso comum, do prin-cípio da equidade, ancorado nos princípios gerais do Direito, já que a aplicação da analogia é dificultada, podendo-se utilizar os princípios do Direito e dos costumes.

Na obra de Orlando Gomes, arrola-se que, entre as hipóteses de indig-nidade, está o fato de o herdeiro ser o autor ou coautor de homicídio. Arnaldo Rizzardo, em sua obra Direito das Sucessões, traz uma citação do doutrinador Argentino Horacio e Cejas, afirmando que seria contrário a todo o princípio da justiça que aquele que ofendeu gravemente o cau-sante ou sua memória, que tentou contra sua vida ou terminou com ela, pudesse a vir beneficiar-se com seus bens.

Então, é o sentido que adoto, aceitando a tese sustentada da tribuna de que o meeiro não deixa de ser um legatário ex legis; portanto, aplicando--se também a indignidade no caso da sucessão legítima, pode-se cons-truir uma nova hipótese de que ali se incluem também outras pessoas que, aproveitando-se diretamente do resultado do seu inexplicável gesto, venham a matar os autores da herança.

Observe-se que já houve até trânsito em julgado da sentença condena-tória, tanto que a pena está sendo cumprida; poderia prever-se que a família ajuizasse ação de indenização baseada na sentença trânsita em julgado e que no final pudesse até, quem sabe, haver-se da penhora des-ses bens, mas isso ofende o senso comum, a moral do cidadão e a justiça.

Daí rogo vênia ao eminente Relator para dissentir de seu voto e, como a eminente Presidente, estou dando também provimento à apelação. (Giorgis, 2003, grifos nossos)

Diante da inexistência de uma legislação completa sobre a exclu-são sucessória e a perda do direito à meação do cônjuge indigno, a lei deve ser aplicada a fim de conformar-se a cada caso concreto. A indig-

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nidade, em primeiro momento, não exclui o direito à meação, pois este se trata de um direito próprio. Contudo, há de se verificar se a meação é fruto de um ato criminoso e se realmente o cônjuge faz jus a ela.

Outra rara exceção é o julgado a seguir, em que o próprio autor da herança, que vivia em união estável, ajuizou uma ação declaratória de indignidade contra a ex- companheira:

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE SUCESSÕES – AÇÃO DE INDIGNI-DADE – EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL ENTRE O AUTOR E A RÉ – EX-COMPANHEIRA – AUSÊNCIA DE HERDEIROS NECESSÁRIOS – LACUNA LEGISLATIVA – POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – RE-CURSO PROVIDO – SENTENÇA ANULADA. (TJ-MS, Rel. Des. Dorival Renato Pavan, 5ª Turma Cível, J. 11.09.2008)

Ciente da inexistência de lei específica para cada caso concreto, ao juiz cumpre proferir uma sentença, a fim de garantir o cumprimento da ordem social e o interesse coletivo e individual, ainda que contrária à lei

Com a alteração do conceito de família, que recebeu a proteção constitucional, em qualquer de suas formas, os direitos das famílias e das sucessões, na sua forma positivada, tornaram-se, em muitos pontos, obsoletos.

A sociedade contemporânea é complexa, mutante, e, nessa toada, proferir decisões jurídicas baseadas somente em leis retrógradas significa ignorar as mutações da cultura e das necessidades sociais. Manter-se inerte diante de tantas transformações acarreta o colapso na segurança jurídica, provocando, de forma irresponsável, a incompatibilidade da atividade jurisdicional, que está atrelada em solucionar os litígios exis-tentes.

Em sendo assim, a fim de preencher tantas lacunas no direito su-cessório, defende-se a aplicação do princípio de justiça como forma de excluir do cônjuge indigno o direito à meação, sempre que restar com-provado o crime de homicídio doloso ou a tentativa deste, contra o autor da herança, ou contra o seu descendente ou ascendente.

Diante do exposto, mostra-se imperiosa a alteração legislativa para reconhecer a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação de-

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claratória de indignidade, bem como para determinar que o cônjuge indigno seja excluído da sucessão e da meação, quando comprovado homicídio doloso ou tentativa contra o titular da herança.

cONSIDeRaÇÕeS FINaIS

O artigo que aqui se encerra buscou tratar da indignidade do her-deiro, assunto inserido no Direito Sucessório brasileiro, tão presente na realidade do País.

Avaliou-se a possibilidade da aplicação, analógica, das consequên-cias da decretação da indignidade como forma de afastar o cônjuge in-digno do seu direito à meação, quando aquele atentar contra a vida do autor da herança a fim de ver acrescido seu patrimônio.

Observou-se que meação e herança são institutos distintos, sendo o primeiro atinente ao regime de casamento escolhido pelo casal e o segundo, do âmbito sucessório.

Detalhou-se que, desde o advento do Código Civil de 2002, o cônjuge foi elevado à condição de herdeiro necessário, o que dificulta sua deserdação, uma vez que esta depende da manifestação expressa do autor da herança, e os testamentos não são instrumentos comuns no direito sucessório brasileiro.

Verificou-se que o caminho para afastar o cônjuge sobrevivente da herança seria a decretação de sua indignidade, diante da constatação de alguma das condutas previstas na lei. Contudo, tal circunstância, se analisada exclusivamente à luz da norma positivada, não se propõe a atender o propósito de afastamento do cônjuge indigno da meação.

Por certo, o posicionamento dos juristas, em sua maioria, é de obediência cega à lei, afastando da herança o cônjuge indigno, mas não da meação. Todavia, não se podem negar as possíveis injustiças advin-das desse entendimento, podendo até mesmo motivar a prática de atos atentatórios contra o cônjuge autor da herança.

Defende-se que a lei não pode ser analisada e aplicada na sua frie-za, sobretudo porque ninguém pode se beneficiar do sofrimento alheio.

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Analisou-se a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, pela qual se aplicou, analogicamente, as conse-quências da indignidade como forma de afastamento da meação, a fim de evitar o locupletamento de alguém pela sua própria torpeza.

Ante aos fundamentos analisados, conclui-se que o cônjuge que atenta contra a vida do autor da herança, além de não ter direito ao quinhão hereditário, por decretação de sua indignidade, não pode ter acesso à meação, sobretudo como forma de não beneficiar aquele que cometeu ato ilícito como forma de adquirir patrimônio.

O estudo aqui realizado mostrou-se muito interessante, uma vez que a descoberta de uma possibilidade de efetivação da justiça, contra-riando a aplicação fria da lei, que pode, às vezes, ser tirana e injusta, é um fator que faz valer a pena a escolha da profissão do advogado, no cumprimento do propósito de construir um mundo melhor para todos.

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Parte Geral – Doutrina

As Formas Coercitivas para Compelir o Devedor de Alimentos a Adimplir com sua Obrigação: Avanços Perpetrados pela Jurisprudência e Abarcados pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13�105/2015)

The New Forms of Coercion to Compel the Alimony Debtor to Satisfy His Obligation: Advances Implemented by Jurisprudence and Incorpored by the New Civil Procedure Code (Law nº 13�105/2015)

LEOnARDO ALvES DE OLIvEIRAServidor Público Estadual do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Pós-Graduando em Direito Administrativo e em Direito Constitucional; Assessor de Gabinete da 1ª Vara de Família e Sucessões de Rondonópolis/MT.

RESUMO: O presente trabalho busca, à luz do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), bem como sob o prisma da jurisprudência moderna, analisar as modalidades de coerção do devedor de alimentos e as inovações constantes do novo diploma processual, no afã de melhor compreender quais os meios possíveis e mais eficazes para compelir o alimentante que se esquiva a cumprir sua obrigação alimentícia.

PALAVRAS-CHAVE: Direito das famílias; novo Código de Processo Civil; pensão alimentícia; devedor de alimentos; formas de coerção.

ABSTRACT: This scientific paper intent to, under the light of the new Civil Procedure Code (Law n. 13.105/2015) and through the prism of modern jurisprudence, examine the alimony debtor’s coercion modalities and the innovation of the new procedural law, to understand what are the possi-ble and most effective means to compel the debtor that evades serving his alimony obligation.

KEYWORDS: Family rights; new Civil Procedure Code; alimony; debtor pension; coercion forms.

SUMÁRIO: 1 Introdução; 1.2 Prolegômenos acerca dos alimentos: conceituação do instituto; 2 De-senvolvimento e análise do tema; 2.1 A tradicional e polêmica coerção física: prisão civil do devedor de alimentos; 2.2 Penhora online dos ativos financeiros do devedor; 2.3 Penhora do bem de família do devedor; 2.4 Penhora do FGTS do devedor; 2.5 Inovação legal do novo CPC: inscrição do devedor no rol dos maus pagadores, SPC e Serasa; 2.6 Inovação legal do novo CPC: protesto extrajudicial contradevedor de alimentos; 3 Conclusão; Referências.

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1 INTRODUÇÃO

Não se pode negar que as ações judiciais envolvendo matéria de Direito de Família são, por natureza, deveras sensíveis, pois em sua maioria tratam de uma questão afetiva/sentimental e ao mesmo tempo patrimonial. Originam-se, na maior parte das vezes, por uma incompa-tibilidade de gênios dentro da família ou pela insuportabilidade da vida em comum de um casal, o que causa uma mágoa intensa e profunda nos envolvidos.

Voltando os olhos para as liças de caráter alimentício, é certo que as ações envolvendo pensão alimentícia são as que têm maior incidência de entrada no Judiciário brasileiro dentro das Varas de Família1 (nas suas várias espécies de ações de conhecimento e de execução de alimentos).

Dito isso, no que toca às demandas de execução de alimentos, pode-se aferir que estas se acumulam nas prateleiras dos gabinetes de magistrados, que, apesar dos esforços engendrados para prestar a efetiva tutela jurisdicional, acabam tendo dificuldades para encerrar os proce-dimentos quase sempre por impossibilidade de encontrar meios de satis-fazer o débito existente.

Sob este enfoque, o presente trabalho busca, à luz do novo Códi-go de Processo Civil (Lei n.º 13.105/2015), bem como sob o prisma da jurisprudência moderna, analisar as modalidades de coerção do devedor de alimentos e as inovações constantes do novo diploma processual, no afã de melhor compreender quais os meios possíveis e mais eficazes para compelir o alimentante que se esquiva a cumprir sua obrigação alimentícia.

1.2 prolEgômEnos AcErcA dos AlimEntos: concEituAção do instituto

Alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. Têm por finalidade fornecer a um parente, cônjuge ou companheiro o necessário à sua subsistência2.

1 Disponível em: <http://new.d24am.com/noticias/amazonas/acoes-pensao-alimenticia-guarda-filhos-lideram-varas-familia/83005>. Acesso em: 25 jan. 2016.

2 GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 427.

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Hodiernamente, a tendência é impor ao Estado a obrigação de socorrer os necessitados, tarefa que ele se desincumbe (ou deveria desin-cumbir-se) por meio de sua prestação assistencial (arts. 6º, 23, II, 194 e 203, todos da Magna Carta). Contudo, no intuito de aliviar-se desse en-cargo, ou frente à inviabilidade/impossibilidade de cumpri-lo, o Estado, por meio do Poder Legislativo, por determinação legal, transfere-o aos parentes, cônjuges ou companheiro do necessitado, toda vez que estes possam atender a tal incumbência3.

Diante dessa proteção máxima da pessoa humana, em uma pers-pectiva civil-constitucional, nota-se que o art. 6º da Lex Fundamentallis serve como uma luva para preencher o conceito atual dos alimentos. Esse dispositivo do Texto Maior traz como conteúdo os direitos sociais que devem ser oferecidos pelo Estado, quais sejam: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desam-parados4.

Deste modo, a pessoa que não pode prover o seu sustento com o próprio labor não pode ser deixada à própria sorte, sendo obrigação da sociedade propiciar-lhe sobrevivência através de meios e órgãos estatais ou entidades particulares. Nesse diapasão, o Direito não descura o fato da vinculação da pessoa ao seu próprio organismo familiar, impondo, então, aos parentes do necessitado, ou pessoa a ela ligada por um elo civil/afetivo, o dever de promover-lhe as condições mínimas de sobrevi-vência, não como favor ou generosidade, mas como obrigação judicial-mente exigível5.

O dever de prestar alimentos funda-se na solidariedade humana e econômica que deve existir naturalmente entre os membros da família e parentes. Há um dever legal de mútuo auxílio familiar, transformado em norma ou mandamento jurídico pelo legislador civilista. Originaria-mente, nada mais era do que um dever moral, um comprometimento ético, que no Direito romano se expressava pela equidade, chamado de officium pietatis, ou caritas. Todavia, as razões que obrigam a sustentar

3 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 28 ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2004. p. 373.

4 TARTUCE, Flávio. Direito civil. 9. ed. São Paulo: Método, v. 5, 2014. p. 1.016.

5 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2012. p. 527.

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os parentes, a prole e a dar assistência ao cônjuge transpassam as justi-ficativas morais ou sentimentais, encontrando sua origem no próprio di-reito natural. É inata na pessoa a inclinação para prestar auxílio, socorrer e dar sustento6, sobretudo quando quem necessita se trata de um familiar ou, principalmente, de um filho ainda menor.

Neste atual cenário econômico capitalista, em que há incidência de crises periódicas, a família e seus integrantes naturalmente necessi-tam de auxílio, em especial os enfermos, idoso, as crianças e os ado-lescentes, que, a priori, não possuem meios próprios para prover o seu sustento, sendo que, além da inerente função assistencialista, a família provê o sustento, educação, lazer e cultura de seus membros compatí-veis com a sua condição econômica7.

Assim, o titular do direito de postular os alimentos chama-se ali-mentado, e o devedor, aquele que pagará a pensão alimentícia, é deno-minado alimentante.

Todavia, quando os laços afetivos são insuficientes para assegu-rar o auxílio que o necessitado precisa de sua família, a lei obriga que alguém com possibilidades o faça por meio do instituto jurídico deno-minado alimentos. De acordo com o art. 1.694 do Código Civil, “po-dem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social”.

Dessarte, conforme já explanado, constituem os alimentos uma forma de assistência cogente, normativamente obrigatória, de ministrar os recursos necessários à subsistência, à conservação da vida, tanto fí-sica como moral e social do indivíduo necessitado, sendo, portanto, a obrigação alimentar, le devoir imposé juridiquement à une personne d’assurer la subsistance d’une autre personne8.

O vocábulo “alimentos” possui, entretanto, conotação muito mais ampla do que na linguagem comum, não se limitando apenas ao ne-cessário para o sustento e nutrição de uma pessoa. Nele se compreende

6 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 717.

7 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, v. 5, 2012. p. 431-432.

8 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 16. Apud JOSSERAND, Cours de droit civil positif, I, n. 1.138, p. 590.

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não só o dever de prestá-los, mas também o conteúdo da obrigação a ser prestada. Juridicamente, a referida expressão tem uma acepção téc-nica de abrangência prolixa, compreendendo não só o indispensável ao sustento, como também o necessário à manutenção da condição social e moral do alimentando. Isto é, os alimentos compreendem o indispen-sável ao sustento, vestuário, habitação, assistência médica, instrução e educação, conforme disposição dos arts. 1.694 e 1.920, ambos do Di-ploma Civilista9.

Conclui-se, portanto, que os alimentos, em sentido lato, abrangem todo o necessário ao sustento, morada, vestuário, saúde e educação do ser humano. Atualmente, em especial quando se trata o necessitado de criança ou adolescente, costuma-se acrescentar a este rol o lazer, con-siderado essencial para o desenvolvimento sadio e equilibrado de todo indivíduo10.

2 DeSeNvOlvImeNTO e aNálISe DO Tema

Tecidas as considerações supra, compreendidos os pormenores conceituais acerca do instituto dos alimentos, devemos adentrar ao cer-ne temático da presente investigação que é a prestação alimentícia entre familiares, sobretudo entre os genitores e sua prole, alimentante e ali-mentado.

No ordenamento pátrio, há inúmeras formas de persecução patri-monial do devedor de alimentos. Desconto diretamente em folha de pa-gamento, desconto em frutos civis, rendimentos, alugueis e até descon-sideração inversa da personalidade jurídica para buscar no ente moral recursos para quitar débitos alimentares de seu representante.

Apenas fazendo um parêntese, a título de comparação, no Direi-to argentino há algumas formas interessantes de coação do executado, como a fixação de uma multa pelo atraso no pagamento da pensão (além do valor mensal devido a título de alimentos), bem como a possibilidade de inclusão do nome daquele que deve alimentos em um cadastro públi-

9 GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de direito civil brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2012. p. 432.

10 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 5. ed. Salvador: Juspodivm, v. 5, 2013. p. 715.

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co, que o impede de ingressar em serviço público e até de obter carteira de motorista11.

Pormenorizemos, entretanto, mais detalhadamente, as formas corriqueiramente utilizadas em ações de execução de alimentos para compelir o alimentante devedor a proceder com o cumprimento de sua obrigação perante o alimentado, além de divagar pontualmente sobre o posicionamento jurisprudencial e inovações do novo Código de Proces-so Civil neste ponto.

2.1 A trAdicionAl E polêmicA coErção físicA: prisão civil do dEvEdor dE AlimEntos

O rito da prisão civil do devedor é o meio mais gravoso de coer-ção, pois atinge não diretamente o patrimônio do executado, mas sua liberdade. Porém, é também, justamente por ser a modalidade mais rí-gida, a forma mais eficaz para constranger aquele que se esquiva das obrigações de alimentante. Considerando que a prisão civil assim como a prisão penal cerceia o direito fundamental do ser humano à liberdade, certamente a adoção desta medida judicial para cobrar pensão alimen-tícia causa um maior temor e maior respeitabilidade no alimentante, conduzindo-o ao adimplemento das parcelas em atraso.

Originalmente, a Constituição brasileira de 1988 previu que não haveria prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimple-mento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do deposi-tário infiel, conforme ressai da interpretação filológica do Texto Consti-tucional.

Por meio do Decreto Presidencial nº 678, de 1992, que promul-gou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, de 1969), passaram a vigorar no ordenamento jurídico brasileiro as disposições do referido pacto, vedando, assim, a prisão do depositário infiel, ou seja, nos dias atuais, a única modalidade civil de cerceamento da liberdade é a do devedor de alimentos.

Durante a vigência do CPC de Buzaid, a prisão civil do executado era disciplinada pelo § 1º do art. 733. Na execução de sentença ou de decisão, que fixava os alimentos provisionais, o juiz mandava citar o

11 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: famílias. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 6, 2013. p. 900.

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devedor para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. Caso o devedor não pagasse, nem se escusasse, o juiz lhe decretaria a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses e o cumprimento da pena não eximia o devedor do paga-mento das prestações já vencidas e das vincendas.

Acertadamente, o novo Codex de Processo Civil manteve a prisão civil como sendo um dos meios de coerção do devedor a cumprir com sua obrigação, reproduzindo as disposições suprarreferidas no art. 528, caput e § 2º. Note-se que o mero pagamento parcial da dívida exequen-da não exime o devedor de sofrer o cerceamento de sua liberdade.

Todavia, se o inadimplemento do alimentante for involuntário e justificável, não poderá haver a decretação de sua prisão, como, por exemplo, no caso de ser o devedor pessoa que labora como autônomo e vive de seu próprio trabalho/produção, que ficou comprometida em razão de um grave acidente que o deixou hospitalizado e, consequen-temente, prejudicou seus rendimentos. Importante recordar que a prisão deve ser decretada com parcimônia e prudência pelo juiz, de modo que não agrave ainda mais as condições do devedor, em prejuízo ao próprio necessitado, bem como que a prisão civil é cumprida em regime espe-cial, em separado dos demais presos por ilícitos penais12, disposições legais já existentes no CPC/1973, que foram corretamente mantidas na nova Lei Processual Civil.

2.2 pEnhorA onlinE dos Ativos finAncEiros do dEvEdor

A penhora online das contas bancárias do executado é também um meio bastante eficaz para sanar o débito alimentar, haja vista que surpreende o devedor e bloqueia diretamente os ativos financeiros exis-tentes em favor do alimentante junto a qualquer entidade bancária na qual este possua conta.

Nessa senda, não se pode olvidar que o sigilo bancário (e fiscal) tem por escopo a proteção das informações relativas às operações prati-cadas por todos aqueles que possuem atividades ou movimentações de natureza econômica ou fiscal, seja pessoa física ou entidade abstrata,

12 LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 394/396.

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sendo que tal sigilo só pode vir a ser quebrado em casos especificados pela legislação pertinente.

É bem verdade, entretanto, que não se pode atribuir um caráter absoluto à proteção legal sobre a inviolabilidade do sigilo bancário (e fiscal), sob pena de se estar condenando um grande número de proces-sos ao insucesso, em razão dos vários artifícios ou ardis utilizados pelos devedores, para não saldar os seus débitos.

De outro lado, a tentativa de localização de bens e do endereço do devedor por intermédio de instituições bancárias e órgãos públicos deve ser prestigiada, pela sua utilidade e para emprestar efetividade ao processo de execução.

Na redação original do Código de Ritos de 1973, logicamente, não havia previsão legal acerca da penhora na modalidade online, dada a precariedade tecnológica até então no campo da informática. A inova-ção veio ser implementada em 2006, dando origem ao sistema conheci-do como Bacen-Jud, administrado pelo Banco Central e utilizado pelos magistrados em todo Brasil.

Considerando que o Direito acompanha a evolução da sociedade, sendo certo que os avanços tecnológicos principalmente no ramo da informática devem ser prestigiados na medida em que proporcionam a efetividade e celeridade do processo de execução e da própria presta-ção jurisdicional, e tendo em linha de estima a racionalização de que o Sistema Bacen-Jud possibilita, em função de permitir o cumprimen-to de ordens judiciais com grande agilidade, consagrando os princípios da economia e celeridade processuais, ante as disposições ínsitas do art. 655, I, c/c art. 655-A do CPC/1973 (com a redação que lhes deu a Lei nº 11.382/2006), o bloqueio dos ativos financeiros do devedor de alimentos foi importante inovação para o direito das famílias.

O novo Diploma Adjetivo Civil, Lei nº 13.105/2015, como não poderia deixar de ser, manteve em seu corpo as balizas normativas que respaldam a penhora online. Consoante dicção do art. 854, para possi-bilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras que, por meio de sis-tema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro

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nacional, torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado.

2.3 pEnhorA do bEm dE fAmíliA do dEvEdor

O chamado bem de família é uma expressão da garantia constitu-cional do direito à moradia, visando também proteger o próprio núcleo familiar e preservar um patrimônio mínimo que ressalve sua dignidade. Há duas espécies do instituto do bem de família tuteladas pelo orde-namento jurídico pátrio, que existem para impedir a penhora do único bem imóvel da entidade familiar, sendo a forma voluntária (art. 1.712 do Código Civil c/c arts. 260 a 265 da Lei nº 6.015/1973), instituída por vontade própria dos cônjuges ou da família sobre um bem imóvel, e a forma legal (Lei nº 8.009/1990), que independe de manifestação dos interessados e resguarda um bem predial como sendo bem de família13.

Isso posto, apesar de o bem de família ser em regra coisa impe-nhorável, oponível em face de inúmeros tipos de credores, quando se fala de dívida oriunda de obrigação alimentícia, cai por terra a alegação da impenhorabilidade do bem de família, caso em que, por exemplo, o único bem imóvel de propriedade do devedor de alimentos pode ser penhorado, avaliado e alienado judicialmente para satisfazer prestações de pensão alimentícia em atraso.

2.4 pEnhorA do fgts do dEvEdor

Paira grande controvérsia quanto à possibilidade de penhora do saldo de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) do devedor de alimentos, com o intuito de satisfazer a obrigação alimentar em mora. Tanto na doutrina quanto na jurisprudência há divergência acerca do tema.

O FGTS trata-se de uma verba indisponível ao seu titular, que não pode levantar tal valor quando bem entender, mas somente em situa-ções previstas por lei. Assim, por expressa disposição legal do Digesto Processual Civil de 1973, no art. 649, I, que foi mantida no novo Código Processual (art. 833, I), assim como por força dos art. 1º, § 2º, e art. 20,

13 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2012. p. 395-396.

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§ 8º, ambos da Lei nº 8.036/1990, que disciplina a matéria, é o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, em regra, verba impenhorável.

Porém, ainda que se considere a vedação à penhora supracitada e as divergências de julgados e entendimentos doutrinários, é inegável a larga disseminação referente à aplicabilidade da penhora das contas de FGTS do devedor de alimentos no panorama do direito das famílias moderno. Privilegia-se e homenageia-se, sobremaneira, a condição de necessitado em que o infante está inserido.

Assim, volvendo os artigos do novel Diploma Processual Civi-lista, é possível notar que o legislador manteve as disposições ínsitas no Código de Ritos de 1973, art. 461, § 5º, facultando ao juiz a ado-ção das mais variadas medidas que reputar necessárias à obtenção do resultado prático almejado. Consta do art. 536 do novo CPC que, no cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à sa-tisfação do exequente.

Ademais, preconiza, ainda, o § 1º do referido dispositivo, que, para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre ou-tras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial, ou seja, denota-se que será possível a adoção de qualquer medida que o magistrado entenda cabível e necessária, ainda que não haja previsão legal, devendo o juiz pautar-se tão somente na equidade, razoabilidade e proporcionalidade.

Acerca das disparidades jurisprudenciais, cumpre-nos destacar que a liça já chegou ao Superior Tribunal de Justiça que entendeu ser possível a penhora de conta vinculada do FGTS (e do PIS) no caso de execução de alimentos, sendo que, em casos tais, há mitigação do rol taxativo previsto no art. 20 da Lei nº 8.036/1990, dada a incidência dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da dignidade da pes-soa humana em favor do necessitado. A orientação jurisprudencial da Corte Superior é na vertente de se admitir o bloqueio da conta relativa

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ao FGTS para a garantia do pagamento da obrigação alimentar, segundo as peculiaridades do caso concreto14.

Dito isso, vislumbra-se que mesmo a lei afirmando que as contas do FGTS são absolutamente impenhoráveis especificando as hipóteses de seu levantamento, os tribunais permitem a penhora e o levantamento do numerário em se tratando de dívida alimentar15, entendimento que também é majoritário em sede doutrinária.

2.5 inovAção lEgAl do novo cpc: inscrição do dEvEdor no rol dos mAus pAgAdorEs, spc E sErAsA

No que se refere à possibilidade de determinação judicial para inclusão do nome do devedor de alimentos nos órgãos de proteção de crédito, verifica-se que não havia nenhuma previsão legal neste sen- tido.

Todavia, já ecoava no cenário jurídico vasto posicionamento ju-risprudencial admitindo a adoção de medidas coercitivas mais drásticas, ainda que carentes de previsão legislativa, para efetivação da tutela ju-risdicional, bem como para buscar garantir ao necessitado o pagamento dos alimentos postulados.

A obrigação alimentícia é um direito, ao mesmo tempo em que também é um dever fundamental. O princípio da máxima eficácia dos direitos fundamentais, aliado aos princípios insculpidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, impõe ao Poder Judiciário a tarefa de esqua-drinhar todas as formas possíveis para a efetivação do comando consti-tucional (art. 227 da CF/1988). Dessarte, a inclusão do nome do devedor de alimentos nos registros da Serasa e do SPC é medida possível e ade-quada, necessária e proporcional ao atendimento do direito aos alimen-tos. Na aplicação das normas constitucionais, deve-se perseguir, entre outros, os princípios da supremacia e da unidade da Constituição, bem como o da máxima efetividade das normas constitucionais, sendo que tal medida é condizente com a urgência e gravidade do bem jurídico tutelado. A falta de previsão infraconstitucional não pode ser suficiente para impedir a efetivação de um direito fundamental16.

14 STJ, AgRg-Ag 1034295, Terceira Turma, Rel. Min. Vasco Della Giustina, DJ 15.092009.

15 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 621.

16 TJMT, Agravo de Instrumento nº 106768/2011, 1ª C.Cív., Rel. Marcos Machado, DJ 18.01.2012.

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Se o procedimento de execução de alimentos prevê medida ainda mais gravosa para coerção do devedor à adimplir com as prestações em atraso (qual seja: a prisão civil), é razoável se admitir a inscrição do nome do devedor em órgãos de proteção ao crédito por dívida alimen-tar, sobretudo por se tratar de medida coercitiva que visa imprimir maior efetividade à tutela jurisdicional17.

Outrossim, importante ressaltar a inovação inserta no ordenamen-to jurídico pátrio pela Lei nº 13.105/2015, que institui o novo Código de Processo Civil. Conforme inteligência do art. 782, § 2º, do aludido Código, agora há expressamente a possibilidade de o juiz determinar, a requerimento da parte interessada, a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes.

Portanto, doravante, é correto afirmar que o devedor de alimentos pode ter seu nome incluído no rol dos maus pagadores, o que configu-ra novidade deveras proveitosa ao necessitado/alimentado, sendo mais uma forma de coerção do devedor de alimentos.

2.6 inovAção lEgAl do novo cpc: protEsto ExtrAjudiciAl contrA dEvEdor dE AlimEntos

Inegável que um dos problemas mais devastadores do Direito das Famílias contemporâneo concerne às dificuldades práticas para assegu-rar efetivamente o cumprimento do dever alimentar por aquele que fora condenado a pagar pensão. Além de assegurarem a própria subsistência do ser, os alimentos são desmembramentos do próprio princípio consti-tucional da dignidade da pessoa humana. Daí a necessidade de se criar mecanismos e sistemas céleres, eficazes, efetivos e ágeis para garantia do adimplemento das obrigações alimentícias18. A verba alimentar tem caráter vital para as manutenções básicas do necessitado, sendo impe-rioso que as prestações sejam realizadas corretamente, sob pena de se impor ao credor, que na maioria das vezes possui tenra idade e não pode prover o próprio sustento, uma situação degradável e desumana.

Tendo como norte essa linha de intelecção e considerando a farta gama jurisprudencial que já existia19, de forma brilhante, o novo Códi-

17 TJSP, Agravo de instrumento nº 20562941920158260000, 9ª CDPriv., Rel. José Aparício Coelho Prado Neto, DJ 24.11.2015.

18 FARIAS; ROSENVALD. Op. cit., p. 897-898.

19 Por exemplo: TJSC, Agravo de Instrumento nº 20130067976, 2ª CDCiv., Rel. Trindade dos Santos, DJ 14.08.2013.

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go Instrumental Civil inovou neste ponto e colocou uma pá de cal em qualquer divergência até então existente acerca da validade ou não do protesto extrajudicial do devedor de alimentos.

De agora em diante, por expressa determinação do art. 528, § 1º, c/c art. 517, ambos do novo Código de Ritos, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial caso o devedor não se manifeste, não apre-sente justificativa ou não prove que já efetuou o pagamento do débito alimentar, no prazo de 3 (três) dias. A certidão de teor da decisão deverá ser fornecida também no prazo de 3 (três) dias e indicará o nome e a qualificação do exequente e do executado, o número do processo, o valor da dívida e a data de decurso do prazo para pagamento voluntário.

Note-se, ainda, que não se trata de uma faculdade conferida ao juiz, mas sim um dever que o legislador lhe atribuiu. Sem prejuízo de adoção das demais medidas previstas (e estudadas alhures), o juiz de imediato e ex officio mandará que a dívida seja registrada em cartório extrajudicial, mediante protesto.

Trata-se de outra inovação franqueada pelo novo CPC, ou seja, é mais uma forma expressamente prevista como meio de constranger aquele que está inadimplente com suas obrigações. Novamente, cami-nhou bem o legislador processual civilista incluindo a possibilidade de protesto das decisões, sobretudo, nestes casos envolvendo alimentos, já que o que está em jogo é a vida de um necessitado que depende do pensionamento.

3 cONclUSÃO

Pelo exposto, depois de realizado um estudo pormenorizado do tema, já se pode seguramente afirmar que o novo Diploma de Processo Civil brasileiro, instituído pela Lei nº 13.105/2015, em vigor a partir de março do ano de 2016, trouxe inovações substanciais na corrida pelo adimplemento das prestações alimentícias, além de manter e melhorar os demais modos de coerção já existentes na legislação processualista anterior.

As novidades trazidas pela jurisprudência de forma gradativa tra-duzem a dinamização e evolução da sociedade. Nada mais correto do que o legislador atentar-se para tal e providenciar as mudanças necessá-rias para garantir a boa prestação da tutela judicial. Os avanços ora alu-

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didos abrem precedentes para, quem sabe, futuramente, serem criadas ainda mais formas de coagir o devedor de alimentos, quiçá, em breve, expressamente prever o bloqueio das contas do FGTS ou desenvolver um cadastro de devedores de alimentos com escopo de os impedir de postular créditos bancários, constituir empresas, participar de licitações, até que saldem suas dívidas.

Como dito em linhas pretéritas, a pensão alimentícia é meio de garantia da subsistência da pessoa que dela necessita. O tema está um-bilicalmente ligado a princípios constitucionalmente consagrados como o da dignidade da pessoa humana, o direito à vida, à saúde e à alimenta-ção, explícitos e implícitos em diversos artigos da Lei Maior, sendo que a esquiva injustificada do alimentante em cumprir a obrigação alimen-tícia a si imposta (legal e moralmente) não pode ser tolerada, haja vista que acabrunha e atenta contra os fundamentos de todo ordenamento jurídico.

Por tais razões, a função do legislador infraconstitucional ordiná-rio é criar formas e mecanismos para garantir que as disposições conti-das na Constituição sejam asseguradas e cumpridas.

Neste sentido, andou muito bem o novo Código de Processo Civil ao abarcar progressos e inovações já aplicados em sede jurisprudencial no que tange à execução de alimentos e os meios para cobrar as pres-tações em atraso. A possibilidade de inclusão do devedor de alimentos nos órgãos de proteção de crédito, bem como o protesto extrajudicial do débito envolvendo alimentos, agora expressamente previstas, dirimem qualquer debate antes existente em sede de doutrina e de julgados.

Quanto mais meios de coerção do devedor de alimentos existirem, maior será a homenagem aos mandamentos constitucionais, no sentido de emprestar celeridade ao processo e meios hábeis a atingir a tutela postulada, além de garantir maiores chances de quitação da obrigação alimentícia e, por consequência, entregar àquele necessitado que bate às portas do Judiciário uma maior eficiência na prestação jurisdicional.

ReFeRÊNcIaS

CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

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COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, v. 5, 2012.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 5, 2013.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: famílias. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 6, 2013.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direi-to civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2012.

GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de direito civil brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2012.

LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2012.

RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2004.

TARTUCE, Flávio. Direito civil. 9. ed. São Paulo: Método, v. 5, 2014.

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Parte Geral – Doutrina

Cônjuge Concorrendo com Ascendentes e o Cálculo da sua Legítima

Spouse Competing Against Ascendants and the Calculation of Legitimacy

RODRIGO ALvES zAPAROLIMestrando em Direito Civil Comparado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Especialista em Direito Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

RESUMO: O presente trabalho se prestará a discorrer sobre a sucessão do cônjuge concorrendo com ascendentes e o cálculo da sua legítima. Durante o estudo elencaremos questões inerentes à aplicação das normas de direito internacional privado, bem como sobre semelhanças e diferenças existentes entre as legislações brasileira, mexicana e argentina.

Com o objetivo de facilitar a compreensão do tema, a problemática descrita será abordada por meio de casos práticos, que exigirão a ampla discussão das questões propostas.

Sendo assim, a dissertação ofertada analisará por meio de casos práticos os questionamentos atre-lados à sucessão do cônjuge concorrendo com ascendentes e o cálculo da sua legítima.

PALAVRAS-CHAVE: Sucessão; cônjuge; ascendentes; cálculo da legítima; estudo comparado.

ABSTRACT: This paper aims to discourse about the succession of the spouse competing against ascendants and the calculation of legitimacy. During the study, we will bring questions inherent to the application of the private international law rules, as well as similarities and differences between the Brazilian, Mexican and Argentine law.

With the intension of facilitating the understanding of the theme, the problems described will be treated through some practical examples that will require a wide discussion of the questions that were proposed.

Therefore, the present article will analyze through practical cases, the issues associated with the succession of the spouse competing against ascendants and the calculation of legitimacy.

KEYWORDS: Succession; spouse; ascendants; calculation of legitimacy; comparative law.

SUMÁRIO: Introdução; A sucessão do cônjuge concorrendo com ascendentes e o cálculo da sua legítima; Conclusão, Referências.

INTRODUÇÃO

Por meio do estudo proposto analisaremos de maneira pormenori-zada os principais questionamentos inerentes à sucessão do cônjuge que

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concorre com ascendentes do falecido, ocasião em que discorreremos também sobre o cálculo da sua legítima.

Tendo em vista a dificuldade que muitos operadores do Direito possuem para entender a matéria, julgamos relevante abordá-la por meio da apresentação de casos práticos, que, além de se prestarem à análise da sucessão do cônjuge concorrendo com ascendentes, tratarão de questões polêmicas.

Cumpre esclarecer que o primeiro questionamento polêmico a ser analisado compreenderá a aplicação das normas de direito internacional privado, que se demonstram relevantes por serem as responsáveis por sanar o conflito de leis no âmbito do direito das sucessões.

Por sua vez, a outra polêmica a ser debatida e sanada reside no de-senvolvimento do estudo comparado envolvendo as legislações mexica-na e argentina, que, no tocante à concorrência sucessória entre cônjuge e ascendentes, possui uma série de diferenças em relação à lei brasileira.

Assim, por meio do estudo proposto abordaremos com uso de ca-sos práticos as principais questões vinculadas à sucessão do cônjuge que concorre com ascendentes do de cujus, ocasião em que analisaremos também a maneira como se realizará o cálculo da legítima.

Por fim, reiteramos que o estudo supracitado levará em conside-ração a aplicação das normas de direito internacional privado inerentes à matéria, bem como se atentará às disposições fornecidas pelas legis-lações mexicana e argentina com o escopo de proporcionar o estudo comparado almejado.

a SUceSSÃO DO cÔNjUge cONcORReNDO cOm aSceNDeNTeS e O cálcUlO Da SUa legÍTIma

De acordo com o que fora informado durante a introdução, nossa abordagem será desenvolvida com a análise de um caso prático a ser proposto.

Assim, iniciaremos nosso estudo com a criação da seguinte hi-pótese: Juan, mexicano, veio ao Brasil passar férias e conheceu Maria, brasileira, residente e domiciliada na cidade de São Paulo.

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Após alguns meses de namoro ambos ficaram noivos e se casaram no Brasil, tendo os pais de Juan, também mexicanos, como padrinhos. Casados, ambos adotaram o costume de investir no mercado imobiliário brasileiro, vez que nos últimos anos tal segmento passou por grande valorização, circunstância que fez com que o casal adquirisse vasto pa-trimônio no Brasil.

Ocorre que, no início do ano de 2015, Juan acabou sendo vítima de um acidente e faleceu enquanto viajava a trabalho pelo interior da cidade de São Paulo.

Tendo em vista que Juan era mexicano, casado com brasileira (Maria), bem como que possuía pais vivos no México e vasto patrimônio no Brasil, questiona-se como se procederá a sucessão do cônjuge con-correndo com ascendentes e o cálculo da sua legítima.

Ao analisarmos o caso proposto, precisamos definir em primeiro lugar qual será a legislação aplicável, haja vista que o falecido era mexi-cano, casado com brasileira e possuía patrimônio no Brasil.

Dessa forma, resta evidente que estamos diante de um conflito de leis no âmbito do direito das sucessões, circunstância que nos faz recorrer ao sistema adotado pela legislação brasileira para a resolução do conflito descrito.

Vale ressaltar que o Brasil adotou para a resolução do conflito de normas no direito sucessório o sistema da unidade sucessória, que, se-gundo leciona Maria Helena Diniz, determina que:

[...] só uma lei deve reger a transmissão causa mortis, determinando os herdeiros, a ordem de vocação hereditária, a quantia da legítima, a forma de concorrência, a maneira de colacionar entre co-herdeiros, a validade formal intrínseca do testamento. Tal lei pode ser a da nacionalidade ou a do domicílio do falecido.1

Ante as considerações citadas, constatamos que o conflito exis-tente deverá ser solucionado apenas pela eleição e aplicação de uma legislação, circunstância que nos faz recorrer à Lei de Introdução às Nor-

1 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao Código Civil brasileiro interpretada. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 313.

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mas do Direito Brasileiro – LINDB, que, segundo lecionam André Borges de Carvalho Barros e João Ricardo Brandão Aguirre, consiste em “um conjunto de normas que disciplinam a aplicação e a interpretação das próprias normas jurídicas”2, logo, será a LINDB a responsável por nos auxiliar na solução do conflito existente.

Portanto, constatamos que as normas de direito internacional pri-vado não se prestam a reger as relações internacionais, mas sim a apon-tar os critérios de escolha da legislação aplicável, ou seja, o direito in-ternacional privado se revela como um ramo do direito público interno, que, de acordo com o que ensina Maria Helena Diniz, “contém normas de direito interno de cada país, que autorizam o juiz nacional a apli-car ao fato interjurisdicional a norma a ele adequada, mesmo que seja alienígena”3.

Sendo assim, concluímos que as normas de direito internacional privado almejam solucionar conflitos de leis no espaço por meio da in-dicação da legislação a ser aplicável, mediante a análise dos elementos de conexão.

Com o escopo de conceituarmos de maneira adequada o que se-riam os elementos de conexão, valeremo-nos dos ensinamentos presta-dos por Luiz Olavo Baptista, que os conceitua como

aspectos de fato de uma relação jurídica que estabelecem uma ligação com o foro. Há vários elementos de conexão. Os mais conhecidos são a nacionalidade das partes de um contrato, seu domicílio, sede ou residên-cia, o local onde o contrato foi celebrado, ou aquele onde se fez a oferta ou deu-se a aceitação da proposta, ou, ainda, o local onde a obrigação principal deve cumprir-se, ou onde se encontra o bem objeto do contra-to. Por vezes combina-se mais de um elemento de conexão.4

Necessário se faz informar que a qualificação do elemento de co-nexão apenas poderá ser constatada por meio da lex fori, ou seja, quan-do o magistrado se deparar a um caso de conflito entre legislações in-

2 AGUIRRE, João Ricardo Brandão; BARROS, André Borges de Carvalho. Elementos do direito. 2. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2009. p. 21.

3 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução..., p. 21.

4 BAPTISTA, Luiz Olavo. Contratos internacionais. São Paulo: Lex, 2010. p. 33.

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ternacionais, deverá o julgador consultar a lex fori, logo, o juiz não está autorizado a dirigir-se imediatamente à legislação estrangeira.

Realizadas as considerações essenciais sobre o direito internacio-nal privado, julgamos necessário retomar a abordagem acerca da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, que, de acordo com o que fora ventilado, se revela como uma legislação essencial à resolução do caso proposto.

Ao discorrer sobre as principais funções da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, Maria Helena Diniz as arrola da seguinte maneira:

[...] regular a vigência e a eficácia das normas jurídicas (arts. 1º e 2º), apresentando soluções ao conflito de normas no tempo (art. 6º) e no espa-ço (arts. 7º a 19); fornecer critérios de hermenêutica (art. 5º); estabelecer mecanismos de integração de normas, quando houver lacunas (art. 4º); garantir não só a eficácia global da ordem jurídica, não admitindo o erro de direito (art. 3º) que a comprometeria, mas também a certeza, seguran-ça e estabilidade do ordenamento, preservando as situações consolida-das em que o interesse individual prevalece (art. 6º).5

Assim, após analisarmos as principais funções atreladas à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, constatamos que devemos nos debruçar sobre as previsões expressas por meio do caput e parágra-fos do art. 10, que se apresentam como o dispositivo aplicável à matéria.

Insta salientar que, ao interpretarmos o § 1º do art. 10 da LINDB, constatamos que “a sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus”.

Ao tecer comentários sobre o art. 10 da LINDB, Maria Helena Di-niz informa que o dispositivo descrito “não só abrange a sucessão causa mortis, seja ela legítima, imposta por lei, por não haver testamento, seja

5 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito. 30. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2013. p. 74.

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ela testamentária, se existir disposição de última vontade, como também alcança a sucessão por ausência”6.

Cumpre esclarecer que a previsão legislativa descrita também pos-sui amparo no Texto Constitucional, que acaba por estabelecer, em seu art. 5º, inciso XXXI, que “a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus”.

Sendo assim, diante do que resta previsto pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, bem como pela Constituição Federal, observamos que será necessário apurar pormenorizadamente o que de-termina a legislação brasileira e a legislação mexicana, pois o art. 10, § 1º, da LINDB e o art. 5º, inciso XXXI, da Constituição Federal acabam por permitir que se consolide a alteração da ordem de vocação here-ditária expressa no art. 1.829 do Código Civil brasileiro na hipótese de se tratar de patrimônio existente em território nacional que pertença a estrangeiro casado ou que tenha descendentes com brasileira, hipótese esta de inversão que será consumada quando a lei nacional do falecido for mais benéfica ao cônjuge ou descendente do que a própria legislação brasileira.

Por sua vez, com o escopo de conceituarmos o instituto jurídico da ordem de vocação hereditária mencionado no parágrafo anterior, nos valeremos das lições prestadas por Silvio Rodrigues, que define o institu-to como sendo a “relação preferencial, estabelecida pela lei, das pessoas que são chamadas a suceder o finado”7.

Salientamos que a ordem de vocação no Direito brasileiro ocorre por classes, ou seja, serão convocados a suceder herdeiros classificados em descendentes, ascendentes, cônjuges e colaterais, sem nos olvidar-mos da existência de sucessores regulares (companheiros) e irregulares (Município, Distrito Federal e União), que em situações específicas serão aptos a receber (CC, art. 1.844).

6 DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução..., p. 314.

7 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das sucessões. 26. ed. rev. e atual. Zeno Veloso; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, v. 7, 2006. p. 94.

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Entre as classes narradas, o legislador pátrio elencou como herdei-ros necessários os descendentes e ascendentes, desde que não tenham sido excluídos da sucessão por indignidade ou deserdação, bem como o cônjuge (CC, art. 1.845).

Destacamos que herdeiros necessários (CC, art. 1.845) diferem de herdeiros legítimos (CC, art. 1.829), vez que todos os herdeiros ne-cessários serão legítimos, porém nem todo herdeiro legítimo será ne-cessário.

Ao discorrer sobre o tema, Carlos Roberto Gonçalves afirma que “entendem-se por herdeiros necessários aqueles que não podem ser afastados da sucessão pela simples vontade do sucedido, senão apenas na hipótese de praticarem, comprovadamente, ato de ingratidão contra o autor da herança”8.

Vale ressaltar que, de acordo com o que leciona Sílvio de Salvo Venosa, a “chamada dos herdeiros é sucessiva e excludente, isto é, só serão chamados os ascendentes na ausência de descendentes, só será chamado o cônjuge sobrevivente isoladamente, na ausência de ascen-dentes, e assim por diante”9.

Superada a questão inerente à conceituação do instituto, bem como à análise da forma como os herdeiros serão chamados a suceder, julgamos relevante apresentar qual é a ordem de vocação prevista pela legislação pátria.

Insta salientar que a ordem de vocação hereditária é arrolada ex-pressamente por meio dos incisos do art. 1.829 do Código Civil, que estabelece que, na sucessão legítima, a ordem de vocação ocorrerá na seguinte ordem: aos descendentes, em concorrência com o cônjuge so-brevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens; ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particu-lares (inciso I); aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge (inciso II); ao cônjuge sobrevivente (inciso III); aos colaterais (inciso IV).

8 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das sucessões. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 7, 2014. p. 207.

9 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 14. ed. São Paulo: Atlas, v. 7, 2014. p. 125.

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Portanto, no caso proposto, pelo fato de o falecido (Juan) ter dei-xado uma viúva (Maria) e ascendentes vivos, podemos afirmar que pela legislação brasileira deverá ser observada a concorrência entre os as-cendentes e o cônjuge sobrevivente (CC, arts. 1.829, inciso II, 1.836), sempre nos atentando se o herdeiro possui capacidade para suceder, capacidade esta que será regulada pela lei do domicílio do herdeiro ou legatário, nos moldes do que determina o § 2º do art. 10 da LINDB.

Apenas com o escopo de complementar a informação prestada no tocante à capacidade para suceder, julgamos relevante informar que tal matéria é tratada pelo Código Civil brasileiro por meio dos arts. 1.787, 1.798 a 1.803.

Consolidada a informação de que no caso proposto o cônjuge so-brevivente poderá receber quinhão da herança, passaremos a analisar se foram preenchidos os requisitos legais para que tal pessoa venha a herdar.

As exigências citadas fundamentam-se pela previsão fornecida pelo art. 1.830 do Código Civil, que acaba por estipular que

somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

Dessa maneira, no caso proposto constatamos que, por ter estado casada com Juan na ocasião do falecimento, bem como pelo fato de ser maior e absolutamente capaz, não existem impedimentos para que Maria não venha a ser considerada uma das herdeiras do de cujus.

Reconhecida a capacidade de Maria, bem como a dos pais de Juan para figurarem como herdeiros, julgamos relevante discorrer sobre os regramentos inerentes à sucessão em que concorrem ascendentes com cônjuge sobrevivente.

Quanto às regras atreladas à sucessão entre ascendentes e o cônju-ge sobrevivente, relevantes se demonstram as lições prestadas por Maria Helena Diniz, que leciona:

Se o de cujus for casado e tiver apenas ascendente, o cônjuge sobrevi-vente, qualquer que seja o regime de bens, concorrerá com ele. E, se con-

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correr com ascendentes em primeiro grau (pais), terá direito a um terço da herança, mas, se concorrer com um só ascendente (pai ou mãe do fa-lecido), ou se maior for aquele grau, por concorrer com avô ou bisavô do de cujus, caber-lhe-á a metade do acervo hereditário (CC, art. 1.837).10

Assim, ao analisarmos o que estabelece o Código Civil brasileiro, podemos afirmar que, no caso proposto, pelo fato de Juan ter pai e mãe vivos, Maria teria direito a receber 1/3 do patrimônio deixado pelo de cujus, enquanto que os outros 2/3 seriam repartidos igualmente entre o pai e a mãe do falecido, ascendentes estes que receberiam individual-mente 1/3 da herança deixada por seu filho.

Desse modo, de acordo com o que fora exposto, observamos que, pelo fato de inexistirem herdeiros pertencentes à classe dos descenden-tes, que seriam os herdeiros de grau mais próximo, deverão ser convo-cados à sucessão os ascendentes do de cujus em concorrência com o cônjuge sobrevivente, independentemente do seu regime de bens.

Salientamos que a questão atrelada ao regime de bens se revela importante apenas para avaliar se deverá se operar a meação inerente ao viúvo, vez que, na hipótese de o casal ter se casado sob o regime da comunhão parcial de bens, será destacada a meação vinculada ao côn-juge sobrevivente, passando a ser alvo da herança os bens particulares do de cujus, bem como a metade dos adquiridos onerosamente por ele na constância do casamento.

Por outro lado, julgamos pertinente informar que, na hipótese de o viúvo não ser meeiro, haja vista o regime de bens escolhido no momento do casamento, a herança se operará em face dos bens particulares do fa-lecido independentemente de esse patrimônio ter sido constituído antes ou depois do matrimônio.

Assim, devemos nos atentar sempre à questão da meação, que, nos moldes do que fora descrito, não pode ser confundida com a herança, principalmente pelo fato de que a meação se trata de instituto vinculado ao direito de família, enquanto que a herança possui fundamentação no direito das sucessões.

10 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro..., 27. ed., p. 138.

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Ao discorrer sobre o instituto jurídico da meação, Maria Helena Diniz ensina que “a meação se fará sempre que o vínculo conjugal for desfeito, cessando a comunhão e o condomínio. O viúvo terá direito à sua metade do patrimônio comum”11.

Portanto, resta aclarado que, no caso proposto, ao seguirmos o que preceitua a legislação brasileira, deveria ser consolidada a concor-rência do cônjuge sobrevivente com os ascendentes do de cujus.

Todavia, nos moldes do que fora exposto no início do trabalho, precisamos avaliar como o assunto atrelado à herança é abordado pela legislação mexicana.

Vale ressaltar que o Código Civil mexicano, a partir do art. 1.599, passa a dispor sobre a sucessão legítima, discorrendo especificamente acerca da sucessão do cônjuge por meio dos arts. 1.624 e seguintes da codificação.

Insta salientar que, do ponto de vista da ordem de vocação heredi-tária, a legislação mexicana adota posicionamento similar ao brasileiro, pois se faz presente a classe de herdeiros a serem convocados.

Além da divisão em classes, a codificação mexicana também ado-ta o regramento de que o grau mais próximo de parentesco excluirá o grau mais remoto (art. 1.604 do Código Civil mexicano), excetuando-se as disposições elencadas nos arts. 1.60912 e 1.63213.

Necessário se faz declarar ainda que, para os mexicanos, nos mol-des do que preceitua o art. 1.602, inciso I, de seu Código Civil, terão direito a herdar por sucessão legítima os descendentes, cônjuges, as-cendentes, colaterais até o quarto grau, além da concubina, esta que herdará quando satisfeitos os requisitos expressos no art. 1.63514 da co-dificação mexicana.

11 Idem, p. 148.

12 “Artículo 1609 – Si quedaren hijos y descendientes de ulterior grado, los primeros heredarán por cabeza y los segundos por estirpes. Lo mismo se observará tratándose de descendientes de hijos premuertos, incapaces de heredar o que hubieren renunciado la herencia.”

13 “Artículo 1632 – Si concurren hermanos con sobrinos, hijos de hermanos o de medios hermanos premuertos, que sean incapaces de heredar o que hayan renunciado la herencia, los primeros heredarán por cabeza y los segundos por estirpes, teniendo en cuenta lo dispuesto en el artículo anterior.”

14 “Artículo 1635 – La concubina y el concubinario tienen derecho a heredarse recíprocamente, aplicándose las disposiciones relativas a la sucesión del cónyuge, siempre que hayan vivido juntos como si fueran

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Assim, diante do que fora ventilado até o momento, resta justi-ficada a existência da concorrência entre o cônjuge sobrevivente e os ascendentes do de cujus na legislação mexicana.

Após localizarmos quais os dispositivos legais que tratam do as-sunto, julgamos relevante informar que o art. 1.626 do Código Civil me-xicano versa especificamente sobre a porcentagem do patrimônio dei-xado pelo de cujus, que deverá ser transmitida aos herdeiros nos casos em que concorrerem cônjuge sobrevivente e os ascendentes do falecido.

Cumpre esclarecer que o dispositivo citado estipula que, quan-do concorrerem cônjuge sobrevivente com ascendentes, a herança será dividida em duas partes iguais, sendo que uma delas será entregue ao viúvo, enquanto que a remanescente pertencerá aos ascendentes.

Portanto, ao analisarmos a previsão fornecida pela legislação me-xicana e a aplicarmos ao caso proposto, constatamos que metade do quinhão hereditário deixado por Juan caberá a Maria, enquanto que a outra metade será destinada aos pais do falecido.

Logo, a norma mexicana se revela mais benéfica que a brasileira, vez que, de acordo com o que fora abordado, o Código Civil brasi-leiro faculta ao cônjuge sobrevivente o recebimento de apenas 1/3 do quinhão hereditário deixado pelo de cujus, enquanto que os outros 2/3 restantes deveriam ser divididos igualmente e entregues na proporção de 1/3 para o pai e 1/3 à mãe do falecido.

Diante das considerações ofertadas constatamos que a legislação mexicana acaba por se revelar mais benéfica ao cônjuge sobrevivente do que a própria lei brasileira, circunstância que nos faz concluir que, no caso em tela, deverá ser aplicada a legislação mexicana, justamente pelo fato de a norma descrita gerar maior benefício à viúva brasileira.

Superada a questão inerente ao estudo de qual seria a legislação aplicável ao caso prático proposto, julgamos necessário avaliar como se procederá o cálculo da legítima com base na legislação mexicana.

cónyuges durante los cinco años que precedieron inmediatamente a su muerte o cuando hayan tenido hijos en común, siempre que ambos hayan permanecido libres de matrimonio durante el concubinato.

Si al morir el autor de la herencia le sobreviven varias concubinas o concubinarios en las condiciones mencionadas al principio de este artículo, ninguno de ellos heredará.”

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Vale ressaltar que o Código Civil do México discorre sobre o cál-culo da legítima por meio dos arts. 1.753 e seguintes da codificação.

Insta salientar que, para realizar o cálculo da legítima, a legislação mexicana determina que sejam em primeiro lugar adimplidas todas as despesas funerárias inerentes ao de cujus, bem como aquelas contraídas por força da enfermidade vivenciada, quantias estas que serão satisfeitas por intermédio da massa patrimonial hereditária (arts. 1.754 a 1.756 do Código Civil mexicano).

Resolvidas as despesas anteriormente relacionadas, determina o Código Civil mexicano, por meio do art. 1.757, que serão adimplidas as despesas provenientes da conservação e administração da herança deixada pelo falecido, bem como de possíveis créditos alimentícios que poderão existir.

Cumpre esclarecer que, para efetuar o pagamento dos valores an-teriormente relacionados, o executor do inventário poderá alienar os bens provenientes da herança, desde que cumpra com as solenidades estipuladas pela legislação competente (art. 1.758 do Código Civil do México).

Posteriormente, serão satisfeitas as dívidas hereditárias que forem exigíveis, nos moldes do que prevê o art. 1.759 da legislação mexicana.

Destaca-se inclusive que, na hipótese de existir concurso de cre-dores, o executor do inventário deverá satisfazer as importâncias devi-das apenas após a sentença que estipular a graduação dos credores, de acordo com o que determina a codificação mexicana em seu art. 1.761.

Por sua vez, na hipótese de não restar evidenciado o concurso de credores, estes serão pagos seguindo a ordem em que se apresentarem, destacando-se que, se entre tais credores existir algum considerado pre-ferencial, se exigirá a prestação de caução por parte daqueles que já foram indenizados, com o escopo de satisfazer posteriormente todos os credores que possuam preferência no recebimento (art. 1.762 do Código Civil mexicano).

Ante o exposto, observamos que não existem grandes diferenças entre o cálculo da legítima previsto pelas legislações brasileira e mexica-na, vez que em ambas o legislador se preocupou com o adimplemento

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dos débitos deixados em aberto pelo de cujus, dividendos estes que se-rão pagos pelos herdeiros até o limite do patrimônio a ser herdado.

Apenas com o escopo de proporcionar maior abrangência ao es-tudo proposto, vez que, de acordo com o que restou comprovado no caso em tela, será aplicada a legislação mexicana, julgamos relevante informar de maneira resumida como seria o cálculo da legítima do her-deiro necessário para a legislação brasileira. Para tanto, valeremo-nos das lições prestadas por Silvio Rodrigues, que sobre o tema dispõe:

Para calcular a metade disponível, abatem-se do monte-mor as dívidas do de cujus e as despesas de funeral. Isso constitui o passivo da herança e, como é natural, dela deve ser deduzido. Após tal dedução, reparte-se ao meio o espólio, e a metade encontrada constitui a quota disponível, ou seja, a porção do patrimônio do finado de que pode ele dispor, por testamento [...].

A outra metade, em rigor, deveria constituir a reserva dos herdeiros ne-cessários. Mas é possível que o testador, em vida, haja gratificado al-guns descendentes com liberalidades, de modo que o legislador, com o propósito de alcançar a maior igualdade, impõe aos descendentes que houverem recebido do de cujus durante sua vida doações o dever de conferir tais liberalidades (CC, art. 2.002). A esse ato de conferência dá--se o nome colação.15

Sendo assim, ao analisarmos o caso proposto, bem como as legis-lações aplicáveis, podemos afirmar que a sucessão no caso envolvendo Juan, Maria e os pais do de cujus deverá se desenvolver sob a égide da lei mexicana.

Necessário se faz esclarecer que o método de resolução do caso narrado, que acabou por envolver a análise da legislação brasileira, bem como da codificação estrangeira, revela-se adequado, pois apenas dessa maneira será possível observar qual lei será a mais benéfica ao cônjuge ou descendente brasileiro, circunstância que nos permitirá acatar ao que determina a Constituição Federal, bem como a Lei de Introdução às Nor-mas do Direito Brasileiro.

15 RODRIGUES, Silvio. Op. cit., p. 124-125.

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Destacamos que a informação citada, além de possuir amparo le-gislativo e doutrinário, apresenta vasta fundamentação jurisprudencial, nos moldes do que atesta o julgado a seguir transcrito:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INVENTÁRIO – DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO – IRRESIGNAÇÃO EM FACE DA DECI-SÃO QUE DETERMINOU A APLICAÇÃO DA LEI BRASILEIRA PARA REGULAR A ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA SOBRE BENS DE ESTRANGEIRO SITUADOS NO BRASIL – RESGUARDO DO DIREITO DOS HERDEIROS BRASILEIROS – COMPARAÇÃO ENTRE AS LEIS NA-CIONAL E ALIENÍGENA – LEGISLAÇÃO BRASILEIRA MAIS BENÉFICA – ART. 5º, XXXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E ART. 10, § 1º, DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO – Nos termos do art. 5º, XXXI, da Constituição Federal, “a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus”. (TJSC, Agravo de Instrumento nº 2009.016250-3, Comarca de Blumenau, Rel. Des. Eduardo Mattos Gallo Júnior, J. 04.11.2014)

Diante do exposto, resta devidamente justificada por meio da le-gislação, doutrina e jurisprudência a resposta ofertada à situação prática formulada.

Superada a questão inerente ao conflito existente entre as legisla-ções mexicana e brasileira, passaremos a expor como seria solucionado o mesmo caso na hipótese de Juan ser argentino, que possui pais tam-bém argentinos vivos, sendo Juan casado com a brasileira Maria.

Com o escopo de mantermos a fidelidade ao caso anterior, iremos propor a mesma hipótese, ou seja, Juan e Maria são casados e consti-tuíram vasto patrimônio no Brasil, sendo que infelizmente Juan veio a falecer enquanto fazia uma viagem a trabalho pelo interior da cidade de São Paulo.

Salientamos que, para viabilizar a análise do caso proposto, de-vemos nos atentar às mesmas previsões legislativas inerentes à Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, bem como à Constituição Federal, que se revelaram como as normas aptas a sanar a controvérsia existente no tocante a qual seria a legislação aplicável quando se presen-cia um conflito entre a lei nacional e outra estrangeira.

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Além do mais, a aplicação das disposições inerentes à LINDB e à Constituição Federal nos permite concluir que, para sanarmos o ques-tionamento proposto, necessário será analisar de forma pormenorizada a legislação brasileira, bem como a argentina, pois apenas dessa forma poderemos constatar se precisaremos nos valer da exceção legal exis-tente, que acaba por facultar que a aplicação da lei brasileira venha a ser mitigada pelo fato de a legislação estrangeira ser mais favorável ao cônjuge sobrevivente, ou ainda, ao herdeiro, ambos brasileiros.

Dessa forma, passaremos a analisar de que maneira a legislação argentina versa sobre o assunto. Para tanto, nos valeremos da análise e interpretação do Código Civil argentino, que acaba por abordar a maté-ria por meio dos arts. 3.545 e seguintes.

Vale ressaltar que o dispositivo citado traça diretrizes gerais sobre a sucessão intestada na legislação argentina, esta que acaba por estabe-lecer que a sucessão atingirá os descendentes legítimos e naturais, os ascendentes legítimos e naturais, o cônjuge sobrevivente e os colaterais até o quarto grau.

Destacamos, ainda, que o Código Civil argentino, de modo simi-lar à legislação brasileira acaba por determinar que o parente de grau mais próximo exclua da sucessão aquele que é detentor de grau mais remoto; logo, a codificação argentina, de modo parecido à brasileira, cria classes na ordem de vocação hereditária, sendo que tal convocação de herdeiros também se apresenta como sendo sucessiva e excludente (art. 3.546 do Código Civil da Argentina), excetuando-se a hipótese em que a chamada se concretiza por direito de representação, este que é tratado por meio dos arts. 3.549 e seguintes da legislação argentina.

Portanto, ao menos do ponto de vista da ordem de vocação here-ditária, passamos a observar certa semelhança com o instituto existente no Direito brasileiro, vez que para os argentinos também é possível se falar em concorrência entre o cônjuge sobrevivente e os ascendentes do falecido.

Reiteramos inclusive que a codificação argentina estabelece que a classe dos ascendentes encontra-se em segundo lugar para efeitos de concorrência, ou seja, apenas serão convocados a herdar os ascendentes

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em concorrência com o cônjuge sobrevivente caso o de cujus não tenha deixado nenhum descendente (art. 3.567 do Código Civil argentino).

Tendo em vista a exposição das normas gerais relacionadas à su-cessão no Direito argentino, julgamos relevante tratar de modo específi-co sobre o percentual que caberá a cada herdeiro quando for constatada a hipótese de concorrência entre o cônjuge sobrevivente e o ascendente do de cujus.

Insta salientar que o Código Civil da Argentina discorre sobre a matéria por meio do art. 3.571, estipulando que, nos casos em que for configurada a concorrência entre o ascendente e o cônjuge sobreviven-te, este herdará metade dos bens particulares do falecido, bem como me-tade da parte dos benefícios que correspondam ao de cujus, enquanto que aos ascendentes caberá a outra metade, nos moldes do que atesta a transcrição a seguir: “Art. 3.571. Si han quedado ascendientes y cónyuge supérstite, heredará éste la mitad de los bienes propios del causante y también la mitad de la parte de gananciales que corresponda al fallecido. La otra mitad la recibirán los ascendientes”.

Assim, ante o exposto, resta claro que, no Direito argentino, o côn-juge sobrevivente concorrerá com os ascendentes em partes iguais, tanto em relação aos bens particulares como nos gananciais.

Desse modo, ao aplicarmos o conhecimento adquirido durante o estudo da legislação argentina ao caso proposto, constatamos que cabe-rá a Maria metade do patrimônio deixado por Juan, enquanto que aos pais do de cujus competirá a outra metade da massa hereditária.

Superada a análise inerente à legislação argentina, necessário se faz recorrer novamente de maneira célere ao que dispõe o art. 10, § 1º, da LINDB e o art. 5º, inciso XXXI, da Constituição Federal, dispositivos estes que acabam por permitir com que seja mitigada a aplicação da le-gislação brasileira nos casos em que a lei nacional do falecido se revela mais benéfica ao cônjuge ou descendente brasileiros.

Logo, ao constatarmos que pela legislação brasileira Maria teria direito a receber 1/3 do patrimônio deixado pelo de cujus, enquanto que os outros 2/3 seriam repartidos igualmente entre o pai e a mãe do falecido, podemos afirmar que a legislação mais favorável ao cônjuge

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sobrevivente acaba sendo a vinculada à lei nacional do falecido, que, no segundo caso proposto, será a argentina.

Portanto, resta devidamente comprovada a aplicação da legisla-ção argentina ao caso em tela, circunstância que nos permite avançar ao estudo do cálculo da legítima sob a égide da codificação eleita para fins de estudo comparado.

Cumpre esclarecer que, pela legislação argentina, o cálculo da legítima será iniciado com a arrecadação de todos os bens que foram deixados pelo de cujus ao tempo de seu óbito.

Além da arrecadação dos bens citados, deverão ser apuradas quais foram todas as doações realizadas em vida pelo falecido, ocasião em que constatamos a presença na legislação argentina do instituto jurídico da colación (arts. 3.476 e seguintes do Código Civil argentino), que se revela similar ao instituto da colação existente na codificação brasileira.

Desenvolvidas as operações descritas, serão deduzidas da massa patrimonial todas as dívidas inerentes ao de cujus, débitos estes que serão subtraídos da herança, mas não das doações, nos moldes do que determina o art. 3.602 do Código Civil da Argentina, que, ao discorrer sobre o cálculo da legítima, estipula:

Art. 3.602. Para fijar la legítima se atenderá al valor de los bienes queda-dos por muerte del testador. Al valor líquido de los bienes hereditarios se agregará el que tenían las donaciones, aplicando las normas del artículo 347716. No se llegará a las donaciones mientras pueda cubrirse la legí-tima reduciendo a prorrata o dejando sin efecto, si fuere necesario, las disposiciones testamentarias.

Diante do exposto, foi possível constatar que, sob a égide do Códi-go Civil argentino, arrecadados os bens líquidos deixados pelo falecido, total este que deverá ser acrescido das doações realizadas em vida, ob-teremos o patrimônio sobre o qual deverá ser calculada a legítima.

Sendo assim, tendo em vista as previsões legislativas abordadas (brasileira, mexicana e argentina), resta comprovado que nos dois casos

16 “Artículo – 3.477. Los ascendientes y descendientes, sean unos y otros legítimos o naturales, que hubiesen aceptado la herencia con beneficio de inventario o sin él, deben reunir a la masa hereditaria los valores dados en vida por el difunto.”

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propostos, a legislação estrangeira será a aplicável, vez que tais disposi-ções se revelaram mais benéficas ao cônjuge brasileiro sobrevivente do que a própria lei brasileira.

cONclUSÃO

Por meio do presente trabalho foi possível discorrer a respeito de dois casos práticos sobre a sucessão do cônjuge concorrendo com her-deiro necessário, que, nas hipóteses elencadas, envolveu os ascendentes do de cujus.

Além do mais, por meio dos casos propostos, foi possível anali-sar qual seria a legislação aplicável quando o falecido não é brasileiro, circunstância que fez com que o estudo desenvolvido também levasse em consideração as previsões fornecidas pela Lei de Introdução às Nor-mas de Direito Brasileiro – LINDB, pelo Código Civil, pela Constituição Federal, bem como pelas legislações mexicana e argentina, que foram as eleitas para proporcionar o estudo comparado almejado no início do trabalho.

Destacamos, ainda, que, além de nos valermos das normas des-critas para eleger a legislação a ser aplicada, pelo fato de termos cons-tatado que aos casos propostos a legislação estrangeira seria a eficaz a ser utilizada, pautamo-nos nas previsões fornecidas pelo Código Civil argentino, bem como pelo Código Civil mexicano, para desenvolver um estudo abrangente sobre o cálculo da legítima, sob a égide das codifica-ções eleitas.

Portanto, observamos que o presente artigo se revelou eficaz a proporcionar um estudo prático acerca da sucessão que envolve a con-corrência do cônjuge sobrevivente com os ascendentes do de cujus, levando-se em consideração inclusive o cálculo da legítima e a análise da legislação apta a ser aplicada, estudo este que fez com que não nos reportássemos apenas ao Código Civil brasileiro e à Constituição Fede-ral, mas também às normas de direito internacional privado, bem como às legislações eleitas a título de estudo comparado.

ReFeRÊNcIaS

AGUIRRE, João Ricardo Brandão; BARROS, André Borges de Carvalho. Ele-mentos do direito. 2. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2009.

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BAPTISTA, Luiz Olavo. Contratos internacionais. São Paulo: Lex, 2010.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito. 30. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2013.

______. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. 27. ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2013.

______. Lei de introdução ao Código Civil brasileiro interpretada. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das sucessões. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 7, 2014.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das sucessões. 26. ed. rev. e atual. Zeno Veloso; de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, v. 7, 2006.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 14. ed. São Paulo: Atlas, v. 7, 2014.

<http://www.codigocivilonline.com.ar/>. Acesso em: 24 maio 2015.

<http://www.diputados.gob.mx/LeyesBiblio/pdf/2_241213.pdf>. Acesso em: 24 maio 2015.

<http://www.tjsc.jus.br/> Acesso em: 25 maio 2015.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

7668

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.373.965 – MS (2013/0074102‑1)Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas CuevaAgravante: C. B.Advogados: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul

Leonardo Lorea Mattar – Defensor PúblicoAgravado: D. C. B. e outroRepr. por: R. F. de A.Advogado: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul

EmEntA

agRavO RegImeNTal NO RecURSO eSpecIal – aÇÃO RevISIONal De alImeNTOS – DecISÃO eXTRa peTITa – OcORRÊNcIa – eXONeRaÇÃO – alImeNTOS – ImpOSSIbIlIDaDe

1. A orientação do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a decisão deve guardar congruência com o pedido consignado na exordial, sob pena de ocorrer julgamento extra petita, nos termos dos arts. 128 e 460 do CPC.

2. É vedada a exoneração automática do alimentante sem possibi-litar ao alimentado, que atinge a maioridade, a oportunidade para se manifestar e comprovar, se for o caso, a impossibilidade de prover a própria subsistência. Precedentes.

3. Agravo regimental não provido.

Acórdão

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indi-cadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 08 de março de 2016 (data do Julgamento).

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Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva Relator

rElAtório

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator): Trata--se de agravo regimental interposto contra decisão que deu provimento ao recurso especial para que o tribunal de origem proferisse novo jul-gamento nos limites do pedido, o qual foi no sentido de diminuição do valor da pensão alimentícia.

Sustenta o agravante que a exoneração dos alimentos se deu por-que não havia notícias nos autos de que sua filha estivesse estudando ou necessitando da ajuda paterna.

Requer a reconsideração da decisão agravada ou a submissão des-te recurso à Turma julgadora.

Impugnação não apresentada (fl. 283, e-STJ).

É o relatório.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator): O recur-so não merece prosperar.

Os argumentos expendidos nas razões do regimental são insufi-cientes para autorizar a reforma da decisão agravada, de modo que esta merece ser mantida por seus próprios fundamentos:

“Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul assim ementado:

‘APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS – BINÔ-MIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE COMPRO-VAÇÃO DE ALTERAÇÃO DAS POSSIBILIDADES FINANCEIRAS DO ALIMENTANTE – MAIORIDADE – IRRELEVÂNCIA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO [...]’ (fl. 167, e-STJ).

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Os recorrentes sustentam que houve afronta aos arts. 2º, 128, 460, 515 e 535 do Código de Processo Civil, pois o Tribunal de origem, ao exonerar o autor da prestação alimentícia, teria proferido decisão extra petita, haja vista o pedido da exordial ter sido somente para que fosse reduzido o valor em questão.

Contrarrazões apresentadas às fls. 224-235 (e-STJ).

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso (fls. 257-264, e-STJ).

É o relatório.

Decido.

O recurso merece prosperar.

Com efeito, a orientação do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, conforme o ‘previsto nos arts. 128 e 460 do CPC, deve o decisório guardar congruência com o pedido consignado na petição inicial, sob pena de ocorrer julgamento extra petita’ (AgRg-REsp 1.463.385/RN, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 22.10.2015).

No caso em apreço, essa congruência não ocorreu, pois o pedido da petição inicial da ação revisional de alimentos foi pela diminuição do valor pago aos filhos do autor, consoante se nota do seguinte excerto da exordial:

‘[...]

5. A procedência do pedido da presente revisão das pensões alimen-tícias devida pelo autor ao (sic) requeridos, diminuindo o percentual devido de 50% (cinquenta por cento) do salário mínimo e fixando-se em 30% (trinta por cento) de um salário mínimo para cada um dos Requeridos, atualmente em R$ 124,50 (cento e vinte e quatro e cin-quenta centavos) e condenando estes, ainda, no ônus da sucumbên-cia, cujos honorários deverão ser revertidos em favor da Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul’ (fl. 5, e-STJ).

Ademais, vale anotar a jurisprudência desta Corte no sentido de que ‘com a maioridade extingue-se o poder familiar, mas não cessa o dever de prestar alimentos, a partir de então fundado no parentesco. É vedada a exoneração automática do alimentante, sem possibilitar ao alimentado a oportunidade para se manifestar e comprovar, se for o caso, a impossi-bilidade de prover a própria subsistência’ (REsp 608.371/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 09.05.2005).

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Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para que o Tribunal de origem profira novo julgamento nos limites do pedido” (fls. 266-267, e-STJ).

Assim, não prosperam as alegações postas no regimental, incapa-zes de alterar os fundamentos da decisão impugnada.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É o voto.

cErtidão dE julgAmEnto tErcEirA turmA

Número Registro: 2013/0074102-1 AgRg-REsp 1.373.965/MS

Números Origem: 00046934820098120019 19090046933 20120030567000000 201300741021 46934820098120019

Em Mesa Julgado: 08.03.2016

Segredo de Justiça

Relator: Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAção

Recorrente: D. C. B. e outro

Repr. por: R. F. de A.

Advogado: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul

Recorrido: C. B.

Advogados: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul Leonardo Lorea Mattar – Defensor Público

Assunto: Direito civil – Família – Alimentos – Revisão

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AgrAvo rEgimEntAl

Agravante: C. B.

Advogados: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul Leonardo Lorea Mattar – Defensor Público

Agravado: D. C. B. e outro

Repr. por: R. F. de A.

Advogado: Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul

cErtidão

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

7669

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.568.650 – RS (2015/0296493‑1)Relator: Ministro Marco Aurélio BellizzeAgravante: M. A. de A. C.Advogados: Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul

Rafael Raphaelli – Defensor PúblicoAgravado: G. F. C.Advogado: Defensoria Publica do Estado do Rio Grande do Sul

EmEntA

agRavO RegImeNTal NO RecURSO eSpecIal – aÇÃO De DIvóRcIO – paRTIlHa – cRÉDITO TRabalHISTa – cOmUNIcabIlIDaDe – DIvISÃO DO bem DeTeRmINaDa pela SeNTeNÇa e NÃO mODIFIcaDa pelO acóRDÃO – FalTa De INTeReSSe RecURSal – agRavO RegImeNTal ImpROvIDO

1. A jurisprudência desta Corte é assente em afirmar que as verbas de natureza trabalhista adquiridas na constância da união comuni-cam-se entre os cônjuges e, portanto, devem ser partilhadas.

2. No caso, todavia, há uma peculiaridade a ser observada. Muito embora a instância ordinária tenha afirmado que o crédito decor-rente de reclamatória trabalhista não se comunica, não reformou a sentença que julgou procedente o pedido e determinou que a ora recorrente partilhasse com o recorrido o valor que lhe fora anteci-pado. Nesse contexto, nota-se que a partilha da verba de natureza trabalhista já foi realizada, não havendo, no caso, interesse recur-sal da recorrente, pelo que o recurso não deve prosperar.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provi-mento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

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Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presi-dente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 23 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Marco Aurélio Bellizze, Relator

rElAtório

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze:

Trata-se de agravo regimental interposto por M. A. de A. C. contra decisão de minha relatoria que negou seguimento a recurso especial (e-STJ, fls. 193-195) assim sumariada (e-STJ, fl. 193):

RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE DIVÓRCIO – PARTILHA – CRÉDITO TRABALHISTA – COMUNICABILIDADE – PRECEDENTES – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL COMPROVADO – DIVISÃO DO BEM DETERMI-NADA PELA SENTENÇA E NÃO MODIFICADA PELO ACÓRDÃO – FAL-TA DE INTERESSE RECURSAL – RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA SEGUIMENTO

Em suas razões, a agravante sustenta que “embora efetivamente tenha o agravado repassado R$ 12.000,00 (doze mil reais) à agravante, e postula-do apenas a metade do referido valor, em realidade, como se observa da sentença, o crédito trabalhista recebido foi de R$ 30.900,00 (trinta mil e novecentos reais), sendo que os repasse procedidos, R$ 12.000,00 (doze mil reais), mais R$ 3.350,00 (três mil trezentos e cinquenta reais), valor esse divido em 3 parcelas, correspondem a pouco menos que a metade que caberia à recorrente, de modo que injustificada a determinação de devolução de R$ 6.000,00 (seis mil reais) corrigido desde 20.11.2009, acrescido de juros de 2% ao mês desde a data da sentença, prolatada em 24.11.2014” (e-STJ, fl. 200).

Assim, pleiteia a reforma da decisão para que seja julgado provido o recurso especial.

É o relatório.

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voto

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze (Relator):

Verte dos autos que o ora recorrido ajuizou ação de divórcio con-tra a recorrida, aduzindo que eram casados sob o regime de comunhão universal de bens, desde 19.10.1985 e que estão separados de fato des-de novembro de 2009. Alegou na inicial que “na constância da união construíram uma casa no terreno do seu irmão, em Gravataí, bem como passou à requerida o valor de R$ 12.000,00, em 20.11.2009, referente a um acordo em ação trabalhista” (e-STJ, fl. 119), razão pela qual pleiteou a partilha do referido valor e do bem imóvel.

Na sentença, o Juiz da causa homologou o acordo referente ao bem imóvel e julgou procedente o pedido da meação do crédito tra-balhista, acrescentando que “os valores percebidos pelo autor a títu-lo de indenizatória trabalhista não se comunicam com a ré, motivo pelo qual não devem fazer parte da partilha. No entanto, consideran-do que o requerente postulou fosse devolvida apenas sua meação dos R$ 12.000,00 alcançados à requerida em 20.11.2009, tal pedido deve ser acolhido, devendo a ré, devolver ao autor, portanto, R$ 6.000,00” (e-STJ, fls. 121-122).

Irresignada a ré apelou, tendo a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, à unanimidade de votos, negado provi-mento ao recurso, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 150):

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO CIVIL – FAMÍLIA – AÇÃO DE DIVÓRCIO – PARTILHA – INDENIZATÓRIA – TRABALHISTA

Os créditos decorrentes de reclamatória trabalhista não se comunicam, porque decorrentes do trabalho pessoal de um dos cônjuges (art. 1.659, VI, do CCB).

Recurso desprovido.

No especial, a recorrente alega que a decisão deve ser reformada “a fim de determinar-se a partilha dos valores recebidos pelo recorrido referentes a créditos trabalhistas, uma vez que se tratam de bens comu-nicáveis” (e-STJ, fl. 163).

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Nada obstante, assentei na decisão agravada que a jurisprudência desta Corte é assente em afirmar que as verbas de natureza trabalhista adquiridas na constância da união comunicam-se entre os cônjuges e, portanto, devem ser partilhadas.

Destacam-se os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE SOBRE-PARTILHA – REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS – VERBA TRABALHISTA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO – IRRESIGNAÇÃO DO CÔNJUGE VARÃO

1. A indenização trabalhista recebida por um dos ex-cônjuges após a dissolução do vínculo conjugal, mas correspondente a direitos adquiri-dos na constância do casamento celebrado sob o regime da comunhão universal de bens, integra o patrimônio comum do casal e, portanto, deve ser objeto da partilha. Precedentes.

2. Agravo regimental desprovido. (AgRg-REsp 1467151/RS, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., DJe de 23.04.2015)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – CIVIL – DIREITO DE FAMÍLIA – REGIME DE BENS DO CASAMENTO – COMUNHÃO PAR-CIAL DE BENS – CRÉDITOS TRABALHISTAS ORIGINADOS NA CONS-TÂNCIA DO CASAMENTO – COMUNICABILIDADE

1. A jurisprudência da Terceira Turma é firme no sentido de que integra a comunhão a indenização trabalhista correspondente a direitos adquiri-dos na constância do casamento.

2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg-REsp 1250046/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., DJe de 13.11.2012)

No caso, todavia, há uma peculiaridade a ser observada. Muito embora a instância ordinária tenha afirmado que o crédito decorrente de reclamatória trabalhista não se comunica, não reformou a sentença que julgou procedente o pedido e determinou que a ora recorrente parti-lhasse com o recorrido o valor que lhe fora antecipado. Nesse contexto, nota-se que a partilha da verba de natureza trabalhista já foi realizada, não havendo, no caso, interesse recursal da recorrente, pelo que o recur-so não deve prosperar.

Diante dessas considerações, mantenho a decisão agravada e nego provimento ao agravo regimental.

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É como voto.

cErtidão dE julgAmEnto tErcEirA turmA

Número Registro: 2015/0296493-1 AgRg-REsp 1.568.650 / RS

Números Origem: 01511200075198 02523167420158217000 1511200075198 2523167420158217000 70064559842 70065669384

Em Mesa Julgado: 23.02.2016

Segredo de Justiça

Relator: Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Alpino Bigonha

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAção

Recorrente: M. A. de A. C.

Advogados: Rafael Raphaelli – Defensor Público Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul

Recorrido: G. F. C.

Advogado: Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul

Assunto: Direito civil – Família – Casamento – Dissolução

AgrAvo rEgimEntAl

Agravante: M. A. de A. C.

Advogados: Rafael Raphaelli – Defensor Público Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul

Agravado: G. F. C.

Advogado: Defensoria Publica do Estado do Rio Grande do Sul

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cErtidão

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presi-dente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

7670

Superior Tribunal de JustiçaAgRg nos EDcl no Recurso Especial nº 1.160.080 – MG (2009/0186232‑8)

Relator: Ministro Antonio Carlos Ferreira

Agravante: J. dos R. F. e outro

Advogado: Cantinila Bezerra de Carvalho

Agravado: M. A. da C. G.

Advogados: Emanuelle Silveira dos Santos Boscardin e outro(s) Geraldo Amazan de Araújo

EmEntA

cIvIl – aÇÃO De INveSTIgaÇÃO De paTeRNIDaDe – RegISTRO em NOme De TeRceIRO – RelaÇÃO SOcIOaFeTIva – aRT. 232 DO cc/2002 e SÚmUla Nº 301 DO STj – DNa – pReSUNÇÃO Da paTeRNIDaDe – pROva TeSTemUNHal – INDÍcIOS

1. Na linha da jurisprudência desta Corte, a relação socioafetiva estabelecida com o pai registral não impede a ação de investiga-ção de paternidade proposta pelo filho, que tem o direito persona-líssimo de esclarecer sua paternidade biológica.

2. Segundo estabelece a Súmula nº 301 do STJ, “em ação investi-gatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”.

3. No caso concreto, apesar de a única prova testemunhal não ser conclusiva a respeito da efetiva paternidade, serve como prova indiciária, capaz de viabilizar sobremaneira o acolhimento da pre-sunção de paternidade com fundamento da Súmula nº 301 do STJ. Assim, seja com base na aplicação literal do art. 232 do CC/2002 e da Súmula nº 301 do STJ, seja com fundamento na orientação de que deve haver indício suplementar acerca dos fatos da causa, a paternidade reconhecida na sentença e no acórdão que julgou os embargos infringentes deve ser mantida.

4. Agravo regimental desprovido.

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Acórdão

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília/DF, 08 de março de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Antonio Carlos Ferreira Relator

rElAtório

O Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira: Trata-se de agra-vo regimental interposto por J. dos R. F. e por I. T. contra a decisão de fls. 508/518 (e-STJ), que negou provimento ao recurso especial interpos-to pelos ora agravantes. Os respectivos embargos de declaração foram rejeitados (e-STJ, fls. 559/570).

Sustentam os agravantes que “a paternidade não pode ser reco-nhecida unicamente em razão da negativa na realização do exame de DNA como está a ocorrer no presente caso” (e-STJ, fl. 574). Afirmam que a “existência de paternidade sócio-afetiva [...] impede a presunção da paternidade biológica meramente em razão da recusa na realização do exame de DNA” (e-STJ, fl. 574). Argumentam, para tanto, que:

“Permissa venia, mas segundo se infere da simples leitura da Súmula nº 301 deste Colendo Tribunal Superior a recusa na realização do exame de DNA somente induz presunção juris tantum de paternidade, sendo, portanto, necessário que a Agravada tivesse produzido provas robustas e convincentes dos fatos por ela alegados.

Ocorre que, o que se percebe no presente caso é uma subversão da sú-mula em questão. Conforme vastamente citado em acórdãos e decisões de todos os tipos que analisaram e emitiram julgamento sobre o presente caso ‘[...] o único depoimento testemunhal colhido não se mostra de todo esclarecedor’.

Ademais, restou reproduzido tanto na decisão monocrática, emitida pelo I. Ministro Antônio Carlos Ferreira, que negou seguimento a este apelo extraordinário quanto naquela que analisou os Embargos de Declaração

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trecho do voto conduto da Apelação que assim constatou: ‘Com efeito, analisando a única prova produzida pela apelada, qual seja, o depoi-mento de uma testemunha, é flagrante a percepção de inconsistência e desconhecimento da intimidade das supostas relações havidas entre o suposto pai e a mãe da apelada’.

É pedindo redobrada venia, mas a Súmula nº 301, do STJ ao determi-nar que a recusa da realização do exame de DNA gera presunção juris tantum não permite que somente uma prova indiciária, e diga-se indi-ciária porque sequer há a confirmação de que o pai e a mãe da Agravada ativeram algum tipo de relacionamento, permita tratar de assunto que se refira a direito personalíssimo e estado da pessoa.

[...]

Desse modo, conforme já dimensionado na r. decisão recorrida, não se trata da análise da veracidade do depoimento prestado nos autos, mas sim de se considerar tal depoimento como insuficiente a determinar que o filho dos Agravantes são pais da ora Agravada, vez que sem qualquer outra prova ou fundamentação plausível.

[...]

Assim, sendo patente a violação à Súmula nº 301, deste Colendo Tribu-nal Superior vez que a presunção de veracidade é somente juris tantum sendo necessária prova cabal da relação entre os pais da Agravada, o que data venia, não ocorre, sendo a reforma da decisão ora atacada medida que se impõe” (e-STJ, fls. 576/579).

Pedem o provimento do recurso “para que possa prevalecer o en-tendimento de que a presunção contida no art. 232, do CC é relativa, e que a paternidade biológica, não pode prevalecer sobre a paternidade sócio-afetiva” (e-STJ, fl. 579).

Opina o Dr. Humberto Jacques de Medeiros, ilustrado Subprocu-rador-Geral da República, pelo desprovimento do agravo regimental. Destaca que, “tal como asseverado pelo Ministro Relator, a prova teste-munhal colhida nos autos não se mostra conclusiva acerca a paternida-de. No entanto, não pode ser desprezada, especialmente considerando--se a negativa injustificada dos pais do investigando em se submeteram à perícia genética” (e-STJ, fl. 590). Acrescenta que, atualmente, “as duas Turmas de Direito Privado do STJ compartilham do entendimento de que a presunção da Súmula nº 301/STJ é aplicável inclusive aos herdeiros

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que se negam a participar do exame pericial de DNA” (e-STJ, fl. 591). Conclui assim o parecer:

“22. O fato é que um simples exame de DNA poderia solucionar o litígio, que se arrasta, diga-se de passagem, há praticamente 13 (treze) anos, já que a ação foi proposta originalmente em 2003!

23. Se os herdeiros do investigado optam, por livre e espontânea vonta-de, em não se submeter ao exame de DNA, e além disso não conseguem demonstrar a impossibilidade do vínculo genético, a solução que resta é o reconhecimento da paternidade em razão da presunção estabelecida na Súmula nº 301/STJ e no art. 232 do Código Civil.

24. Diante de tais considerações, há de ser mantida a decisão ora agra-vada e, consequentemente, o acórdão proferido pelo Tribunal de origem em sede de embargos infringentes” (e-STJ, fls. 591/592).

É o relatório.

EmEntA

cIvIl – aÇÃO De INveSTIgaÇÃO De paTeRNIDaDe – RegISTRO em NOme De TeRceIRO – RelaÇÃO SOcIOaFeTIva – aRT. 232 DO cc/2002 e SÚmUla Nº 301 DO STj – DNa – pReSUNÇÃO Da paTeRNIDaDe – pROva TeSTemUNHal – INDÍcIOS

1. Na linha da jurisprudência desta Corte, a relação socioafaetiva estabelecida com o pai registral não impede a ação de investiga-ção de paternidade proposta pelo filho, que tem o direito persona-líssimo de esclarecer sua paternidade biológica.

2. Segundo estabelece a Súmula nº 301 do STJ, “em ação investi-gatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade”.

3. No caso concreto, apesar de a única prova testemunhal não ser conclusiva a respeito da efetiva paternidade, serve como prova indiciária, capaz de viabilizar sobremaneira o acolhimento da pre-sunção de paternidade com fundamento da Súmula nº 301 do STJ. Assim, seja com base na aplicação literal do art. 232 do CC/2002 e da Súmula nº 301 do STJ, seja com fundamento na orientação de que deve haver indício suplementar acerca dos fatos da causa, a

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paternidade reconhecida na sentença e no acórdão que julgou os embargos infringentes deve ser mantida.

4. Agravo regimental desprovido.

voto

O exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira (relator): O presente agravo regimental não merece acolhimento, devendo-se manter a deci-são agravada pelos seus próprios fundamentos, in verbis:

“Trata-se de recurso especial interposto por J. dos. R. F. e por I. T., réus, contra os acórdãos de fls. 435/440 e 467/469 (e-STJ), do TJMG, assim ementados:

‘PROCESSUAL CIVIL – FAMÍLIA – PERQUIRIÇÃO DA PATERNIDA-DE – RECUSA INJUSTIFICADA DOS RÉUS EM SE SUBMETEREM AO EXAME DE DNA – PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE DOS FATOS ALEGADOS PELOS AUTORES – Na perquirição da paterni-dade, a recusa injustificada do réu em submeter-se à realização de exame de DNA gera, contra ele, a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados pelos autores’ (e-STJ, fl. 435).

‘EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO – CONTRADIÇÃO – OBSCURIDADE – NÃO-OCORRÊNCIA – REJEIÇÃO – Os embargos declaratórios opostos sob a alegação da ocorrência de omissão de-vem ser rejeitados, quando a fundamentação da decisão embargada é adequada e não contém os defeitos suscitados pelo recorrente’ (e-STJ, fl. 467).

Nas razões do recurso especial, interposto com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF, os recorrentes alegam que o Tribunal de origem teria violado o art. 535 do Código de Processo Civil ao rejeitar os embargos de declaração sem enfrentar, adequadamente, a tese de que a paternidade socioafetiva, estabelecida em relação ao pai registral, impediria a aplica-ção do princípio da presunção previsto no art. 232 do CC/2002 quanto ao alegado pai biológico.

Sustentam que a recusa da parte em se submeter ao exame de DNA não implica presunção absoluta de paternidade e que o Tribunal de origem, entendendo de modo diverso, teria violado os arts. 232 do CC/2002 e 333, I, do CPC. Ressaltam que, no caso dos autos, não existe nem mesmo

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um início de prova do relacionamento amoroso entre a mãe da autora e do filho dos recorrentes. Apontam dissídio jurisprudencial.

Alegam que a pretensão de reconhecimento da paternidade biológica não poderia prosperar, tendo em vista a existência de paternidade-afetiva estabelecida em relação ao pai registral ao longo de trinta e três anos. A propósito do tema, suscitam divergência jurisprudencial, destacando, ainda, que ‘não há nos autos um indício sequer de que a mãe da recor-rida tenha tido um relacionamento íntimo com o filho dos recorrentes. Não se sabe sequer se esse relacionamento alegado pela recorrida coin-cidiu com a época da sua concepção’ (e-STJ, fls. 493/494).

Transcorreu in albis o prazo para contrarrazões (e-STJ, fl. 554), e o recur-so especial foi admitido na origem (e-STJ, fls. 557/558).

É o relatório.

Decido.

Na origem, trata-se de ‘ação de investigação de paternidade c/c petição de herança e anulação de registro civil’ proposta por M. A. da C. G. con-tra J. dos R. F. e I. T. ‘e ainda, em forma litisconsorcial, de W. S. da C.’, autora e réus maiores.

A autora, registrada como filha do ‘litisconsorte passivo’ W. S. da C., busca cancelar o registro de nascimento, ser reconhecida como filha de G. G. DOS R. – falecido em 16.7.2003 e filho dos corréus J. dos R. F. e I. T. – e declarada única herdeira dos bens deixados pelo de cujus.

A ação foi julgada procedente em primeiro grau para se declarar ‘Nulo o registro civil da autora, no que tange a sua paternidade’ e se reconhecer que M. A. da C. G. é filha de G. G. dos R., estando apta a habilitar-se no processo de inventário’ (e-STJ, fl. 275). Eis a motivação da sentença:

‘Os irmãos da autora, bem como o Sr. W. S. da C., não contestaram a ação.

A revelia dos mesmos, faz-me concluir que concordam com os pedi-dos formulados pela autora.

Ademais, a autora juntou aos autos o exame de DNA, realizado ex-trajudicialmente, que demonstra que o Sr. W. S. da C. não é o seu pai biológico.

Assim, o pedido de anulação de registro civil deve ser julgado proce-dente, tendo em vista que a prova pericial excluiu a paternidade de W. sobre M.

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[...] A testemunha ouvida afirma ‘...que quando M. ficou grávida, a depoente era sua vizinha; que M. era casada com W., mas encontra-va com M. em outros lugares e G. frequentava a casa de M.; que G. frequentava a casa de M. como amigo de todos daquela casa [...], [...] que era de conhecimento de todos em Inhaúma o relacionamento do falecido G. com a mãe da autora; que quando G. faleceu M. já era adulta; que G. e a autora tiveram pouco relacionamento; que já ouviu do próprio irmão de G. dizer que G. era pai da autora [...]’ .

Os réus não permitiram a realização do exame de DNA; tal prova po-deria afastar todas as dúvidas acerca da paternidade. A recusa injusti-ficada dos réus favorece as alegações da autora. Ademais, o art. 232 do CC diz que ‘a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá supri a prova que se pretendia obter com o exame’ .

[...] Entendo que a recusa dos réus em fazer o exame de DNA e as afir-mações da testemunha, constituem provas suficientes para declarar a paternidade ora pretendida’ (e-STJ, fls. 273/275).

Em segundo grau, a apelação dos réus, genitores do falecido, foi provida, por maioria, para julgar improcedentes os pedidos, estando o acórdão assim ementado:

‘INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C PETIÇÃO DE HERANÇA E ANULAÇÃO DE REGISTRO PÚBLICO – MODIFICAÇÃO DE ESTA-DO DE PESSOA NATURAL – DIREITO PERSONALÍSSIMO – RECUSA AO EXAME DE DNA – INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO ABSOLUTA – ART. 232 DO CÓDIGO CIVIL E SÚMULA Nº 301 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – Nas ações em que se busca a modificação de estado de pessoas naturais – direito personalíssimo e indisponível – as provas produzidas nos autos devem ser convincentes e conclusi-vas, permitindo ao julgador, segundo princípio da persuasão racional, a plena convicção acerca do direito invocado pelas partes. A recusa ao exame de DNA não pode ser tomada como uma presunção abso-luta de veracidade, pois ele é apenas um dentre os vários meios de prova à disposição do Juízo. O artigo 232 do Código Civil e a Súmula nº 301 do Superior Tribunal de Justiça não autorizam a conclusão de que o reconhecimento da paternidade e uma consequência lógica da recusa à submissão ao teste de DNA. Recurso conhecido e provido.

V.V.

FAMÍLIA – APELAÇÃO – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDA-DE C/C PETIÇÃO DE HERANÇA E ANULAÇÃO DE REGISTRO PÚ-

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BLICO – ILEGITIMIDADE PASSIVA DOS HERDEIROS DO SUPOSTO PAI – INEXISTÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – INOCORRÊNCIA – PRESUNÇÃO PATER IS EST E IRREVOGABILI-DADE DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – IRRELEVÂNCIA – PRO-VA DA PATERNIDADE DO INVESTIGADO – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO – Em sede de ação de investigação de paternidade, ainda que cumulada com petição de herança, os herdeiros do suposto pai falecido são partes passivas legítimas para o feito, não havendo que se cogitar de inclusão do espólio. – Não há impossibilidade jurídica do pedido por ausência de prévia interposição de ação anulatória de registro público, pois o pleito de reconhecimento de paternidade diversa daquela constante do registro já traz, por si só, como conse-quência inarredável de seu acolhimento, a anulação do respectivo documento. – O filho pode ajuizar ação investigatória de paternidade para ver reconhecido quem é seu verdadeiro pai, fazendo-se irrele-vantes a incidência da presunção pater is est ou a irrevogabilidade da paternidade socioafetiva, porquanto estas se destinam apenas a garantir a filiação já reconhecida, aplicando-se em sede de ação ne-gatória de paternidade, e não em ação investigatória, mormente se o autor é maior e se há aquiescência do pai registral com o pedido ini-cial. – Não se desconhece que o exame de DNA é a prova soberana a ser produzida nas ações de investigação de paternidade, sendo ce-diço que o seu grau de acerto é quase de 100%, porquanto realizada mediante a comparação de material genético das partes. – Todavia, não realizado o exame por negativa dos réus em se submeter a ele, aplica-se a regra do art. 232 do novel Código Civil, pela qual a aludi-da recusa supre a prova que se pretendia obter. – Ainda que assim não fosse, o juiz não fica adido à prova técnica, sendo-lhe lícito formar a sua convicção após a análise do conjunto fático-probatório inserto nos autos. – Forçoso é reconhecer a paternidade quando há indícios suficientes de que a mãe do investigante manteve relações íntimas com o investigado, mormente se afastada a paternidade daquele cujo nome consta do registro de nascimento do autor’ (e-STJ, fl. 353).

Rejeitados os respectivos embargos de declaração, a autora interpôs em-bargos infringentes, providos, por maioria, pelo Tribunal de origem para restabelecer a procedência da ação, exarando-se a seguinte ementa:

‘PROCESSUAL CIVIL – FAMÍLIA – PERQUIRIÇÃO DA PATERNIDA-DE – RECUSA INJUSTIFICADA DOS RÉUS EM SE SUBMETEREM AO EXAME DE DNA – PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE DOS FATOS ALEGADOS PELOS AUTORES – Na perquirição da paterni-

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dade, a recusa injustificada do réu em submeter-se à realização de exame de DNA gera, contra ele, a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados pelos autores’ (e-STJ, fl. 435).

Passando ao exame do mérito recursal, o recurso não merece acolhi-mento.

I – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

A alegação de ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil não pros-pera. O Tribunal a quo decidiu a matéria controvertida de forma funda-mentada, ainda que contrariamente aos interesses da parte. Confira-se, a propósito, a seguinte passagem do acórdão dos embargos de declaração, em que há pronunciamento expresso a respeito da paternidade socioafe-tiva (e-STJ, fl. 468):

‘Ademais, a alegada paternidade sócio-afetiva não pode prevalecer sobre a verdade real, quando assim não deseja a parte interessada, por se tratar de um atributo da personalidade’.

II – PATERNIDADE SOCIOAFETIVA NA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – ART. 232 DO CC/2002 E DIVERGÊNCIA JURISPRU-DENCIAL

O posicionamento do acórdão recorrido deve ser mantido. Com efeito, na linha da jurisprudência desta Corte, a paternidade socioafetiva não pode ser invocada pelos réus nos autos de ação de investigação de pater-nidade proposta pelo filho, que tem o direito personalíssimo de esclare-cer sua paternidade biológica. Nesse sentido:

‘AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA – JULGAMENTO MONOCRÁTICO – ART. 557 DO CPC – EVENTUAL OFENSA – POSTERIOR DECISÃO DO ÓRGÃO COLEGIADO – SUPERAÇÃO – PATERNIDADE SOCIO-AFETIVA – IMPEDIMENTO PARA O RECONHECIMENTO DA PA-TERNIDADE BIOLÓGICA – NÃO OCORRÊNCIA – AÇÃO PROPOS-TA PELA FILHA – AGRAVO NÃO PROVIDO

[...] 3. A existência de relação socioafetiva com o pai registral não impede o reconhecimento dos vínculos biológicos quando a inves-tigação de paternidade é demandada por iniciativa da própria filha, uma vez que a pretensão deduzida fundamenta-se no direito perso-nalíssimo, indisponível e imprescritível de conhecimento do estado

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biológico de filiação, consubstanciado no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Precedentes.

4. Agravo regimental a que se nega provimento’. (AgRg-AREsp 347.160/GO, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe de 03.08.2015)

‘AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA – PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – IMPEDI-MENTO PARA O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE BIOLÓ-GICA – NÃO OCORRÊNCIA – AÇÃO PROPOSTA PELO FILHO – AGRAVO NÃO PROVIDO

[...] 2. A existência de relação socioafetiva com o pai registral não impede o reconhecimento dos vínculos biológicos quando a inves-tigação de paternidade é demandada por iniciativa do próprio filho, uma vez que a pretensão deduzida fundamenta-se no direito perso-nalíssimo, indisponível e imprescritível de conhecimento do estado biológico de filiação, consubstanciado no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Precedentes.

3. Agravo regimental a que se nega provimento’. (AgRg-AREsp 678.600/SP, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe de 24.06.2015)

‘FAMÍLIA – INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – IMPEDIMENTO DO RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE BIOLÓGICA ANTE A EXISTÊNCIA DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA – INVIABILIDADE – DIREITO AO CONHECIMENTO DA ORIGEM GENÉTICA – ENTEN-DIMENTO CONTRÁRIO À JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPE-RIOR – NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO QUADRO FÁTICO--PROBATÓRIO – SÚMULA Nº 7 DO STJ – RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO ESPECIAL PROVIDO

1. Os precedentes desta Corte que privilegiam a paternidade socio-afetiva em detrimento da biológica o fazem de forma a proteger os interesses daquele registrado como filho.

2. Hipótese em que a demanda foi promovida pelo filho que apenas adulto soube de sua real origem genética.

3. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que a existência de vínculo socioafetivo com o pai registral não impede o acolhimento de pedido investigatório promovido contra o pai biológico. Precedentes.

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4. O conhecimento da filiação biológica é direito da personalidade, indisponível, imprescritível e afeto ao princípio constitucional da dig-nidade da pessoa humana.

[...] 6. Recurso especial provido’. (REsp 1.458.696/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª T., DJe de 20.02.2015)

‘AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME DE DNA – REE-XAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS – SÚ-MULA Nº 7/STJ – EXISTÊNCIA DE FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA – RE-CONHECIMENTO DA ANCESTRALIDADE BIOLÓGICA – DIREITO DA PERSONALIDADE

[...] 2. É consectário do princípio da dignidade humana o reconhe-cimento da ancestralidade biológica como direito da personalidade, podendo a ação de investigação de paternidade e de nulidade de registro ser julgada procedente mesmo que tenha sido construída uma relação socioafetiva entre o filho e o pai registral.

3. Agravo regimental não provido’. (AgRg-EDcl-AREsp 236.958/CE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., DJe de 05.03.2014)

‘DIREITO DE FAMÍLIA – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO INVESTIGA-TÓRIA DE PATERNIDADE E MATERNIDADE AJUIZADA PELA FILHA – OCORRÊNCIA DA CHAMADA “ADOÇÃO À BRASILEIRA” – ROM-PIMENTO DOS VÍNCULOS CIVIS DECORRENTES DA FILIAÇÃO BIOLÓGICA – NÃO OCORRÊNCIA – PATERNIDADE E MATERNI-DADE RECONHECIDOS

1. A tese segundo a qual a paternidade socioafetiva sempre prevale-ce sobre a biológica deve ser analisada com bastante ponderação, e depende sempre do exame do caso concreto. É que, em diversos precedentes desta Corte, a prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica foi proclamada em um contexto de ação negatória de paternidade ajuizada pelo pai registral (ou por terceiros), situação bem diversa da que ocorre quando o filho registral é quem busca sua paternidade biológica, sobretudo no cenário da chamada “adoção à brasileira”.

2. De fato, é de prevalecer a paternidade socioafetiva sobre a biológi-ca para garantir direitos aos filhos, na esteira do princípio do melhor interesse da prole, sem que, necessariamente, a assertiva seja verda-

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deira quando é o filho que busca a paternidade biológica em detri-mento da socioafetiva. No caso de ser o filho – o maior interessado na manutenção do vínculo civil resultante do liame socioafetivo – quem vindica estado contrário ao que consta no registro civil, socorre-lhe a existência de ‘erro ou falsidade’ (art. 1.604 do CC/02) para os quais não contribuiu. Afastar a possibilidade de o filho pleitear o reconhe-cimento da paternidade biológica, no caso de ‘adoção à brasileira’, significa impor-lhe que se conforme com essa situação criada à sua revelia e à margem da lei.

3. A paternidade biológica gera, necessariamente, uma responsabi-lidade não evanescente e que não se desfaz com a prática ilícita da chamada “adoção à brasileira”, independentemente da nobreza dos desígnios que a motivaram. E, do mesmo modo, a filiação socioafeti-va desenvolvida com os pais registrais não afasta os direitos da filha resultantes da filiação biológica, não podendo, no caso, haver equi-paração entre a adoção regular e a chamada “adoção à brasileira”.

4. Recurso especial provido para julgar procedente o pedido dedu-zido pela autora relativamente ao reconhecimento da paternidade e maternidade, com todos os consectários legais, determinando-se tam-bém a anulação do registro de nascimento para que figurem os réus como pais da requerente’. (REsp 1.167.993/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 15.03.2013)

‘Direito civil. Família. Recurso especial. Ação de investigação de pa-ternidade e maternidade. Vínculo biológico. Vínculo sócio-afetivo. Peculiaridades. [...]. Dessa forma, conquanto tenha a investigante sido acolhida em lar ‘adotivo’ e usufruído de uma relação sócio-afe-tiva, nada lhe retira o direito, em havendo sua insurgência ao tomar conhecimento de sua real história, de ter acesso à sua verdade bio-lógica que lhe foi usurpada, desde o nascimento até a idade madura. Presente o dissenso, portanto, prevalecerá o direito ao reconhecimen-to do vínculo biológico.

[...] Recurso especial provido’. (REsp 833.712/RS, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., DJ 04.06.2007)

Assim, ficam afastadas, nesse ponto, a violação do art. 232 do CC/2002 e a divergência jurisprudencial, incidindo a vedação contida na Súmula nº 83 do STJ.

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III – PRESUNÇÃO DECORRENTE DA NEGATIVA DE SUBMISSÃO AO EXAME DE DNA – ARTS. 232 DO CC/2002 E 333 DO CPC E DIVERGÊN-CIA JURISPRUDENCIAL

Com efeito, dispõe o art. 232 do CC/2002 que ‘a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame’. Em sentido semelhante, a Segunda Seção aprovou a Súmula nº 301 do STJ, segundo a qual, ‘em ação investigatória, a recusa do su-posto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade’.

Seguindo a literalidade do dispositivo legal e, sobretudo, do enunciado jurisprudencial referidos, a presunção que se estabelece nesses casos não é absoluta, mas relativa, admitindo-se prova em contrário. Nesse contex-to específico, inexistindo tal prova, desconstitutiva da pretensão autoral, a demanda deve, em tese, ser julgada procedente, independentemente da presença de outros elementos que corroborem os pedidos deduzidos na demanda.

Em julgamento nesta Quarta Turma, entretanto, por maioria, no voto condutor do respectivo aresto, do em. Ministro Luis Felipe Salomão, sob o enfoque do direito à produção de outras provas, conferiu-se ao art. 232 do CC/2002 e à Súmula nº 301 do STJ interpretação menos literal, miti-gando a força da presunção da paternidade.

Nesse voto, exigiu-se que tal presunção, quando não realizado o exame de DNA por recusa injustificada do réu na ação investigatória, esteja acompanhada por elementos outros que demonstrem minimamente os fatos. Tais elementos, indícios ou provas subsidiárias ou complementa-res, evidentemente, não precisam ser conclusivos quanto à paternidade, mas devem justificar o ajuizamento da ação e conferir importância à realização da perícia. Eis a ementa do aludido precedente:

‘PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – RECURSO ESPECIAL – DIREITO DE FAMÍLIA – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – SENTEN-ÇA QUE SE FUNDA UNICAMENTE NA RECUSA A EXAME DE DNA PARA JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO – INEXISTÊNCIA DE PRO-DUÇÃO PROBATÓRIA

1. A questão jurídica principal em exame é saber se a recusa ao exa-me de DNA acarreta, por si só, a paternidade postulada.

2. As ações de investigação de paternidade são de estado e versam sobre direitos indisponíveis, com profundas consequências na vida

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de ambas as partes envolvidas, por isso que o princípio processual da eventualidade sofre mitigações em casos desse jaez.

3. No caso ora em julgamento, inexistiu notícia alguma acerca de provas adicionais produzidas em todo o curso do processo, seja por parte do autor, do réu ou mesmo de ofício, pelo juízo. O fundamento da sentença para negar a produção de prova testemunhal residiu uni-camente no fato de que esta não possuía ‘força de afastar a presunção criada por força de lei, cujas consequências, aliás, foram expressa-mente cientificadas por este juízo’.

4. A Súmula nº 301/STJ prevê expressamente que a presunção decor-rente da recusa ao exame de DNA é relativa, nos seguintes termos: ‘Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade’.

5. A prova a ser produzida nos autos pelo autor não se mostra impos-sível.

Isso porque não é necessário demonstrar o relacionamento amoroso decorrente de encontros esporádicos ou clandestinos, mas os fatos casuais, como os que decorrem do relacionamento de amizade, tra-balho, faculdade, dentre outros. Precedente.

6. Não se pode atribuir à recusa ao teste de DNA consequência mais drástica que a própria revelia do réu – situação em que o pedido não pode ser julgado procedente de plano –, cabendo ao autor a prova mínima dos fatos alegados.

7. Por outro lado, não há como afirmar, antecipadamente, que a pro-va testemunhal a ser produzida pelo réu seria inútil ou desnecessária, antevendo-se quais seriam os argumentos de defesa eventualmente trazidos em audiência e emitindo-se juízo de valor com base em me-ras ilações, o que caracteriza cerceamento de defesa.

8. ‘Diante do cada vez maior sentido publicista que se tem atribuído ao processo contemporâneo, o juiz deixou de ser mero espectador inerte da batalha judicial, passando a assumir posição ativa, que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de pro-vas, desde que o faça com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório’. (REsp 192.681/PR, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., J. 02.03.2000, DJ 24.03.2003, p. 223)

9. Se, de um lado, não pode prejudicar o réu o fato de o juízo ter in-deferido a prova testemunhal e decidido pela procedência do pedido

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do autor com base unicamente na recusa em submeter-se ao exame de DNA, de outro lado, com muito mais razão, não há como ser afe-tado de plano o direito material do autor, julgando-se improcedente o pedido formulado na inicial, na qual também se protestou por todos os demais meios de prova admitidos em direito.

10. Nos termos do art. 2º-A, parágrafo único, da Lei nº 12.004/2009 e dos reiterados precedentes desta Corte, a presunção de paternidade deve ser apreciada dentro do contexto probatório coligido nos autos. No entanto, essa premissa só se concretiza, na medida em que se atribui ao réu o ônus da prova, quando se lhe viabilizam meios para exercer tal mister.

11. Verifica-se, no caso, a necessidade de as instâncias ordinárias avaliarem com mais precisão a situação posta nos autos, que é ex-tremamente delicada. Evidente que poderá o Tribunal, se for o caso, aplicar o enunciado da Súmula nº 301/STJ, após o necessário cotejo da prova produzida.

12. Recurso especial parcialmente provido, a fim de se acolher o pedido alternativo, anulando-se o processo desde a sentença e rea-brindo-se a instrução probatória’. (REsp 1.281.664/SP, Rel. originário Min. Marco Buzzi, Rel. p/ Ac. Min. Luis Felipe Salomão, 3ª T., DJe de 05.02.2015)

Confiram-se as seguintes passagens do voto proferido pelo em. Ministro Luis Felipe Salomão:

‘Se é verdade que mesmo ocorrendo a revelia, os fatos alegados na inicial não podem ser tidos como verdadeiros, cabendo ao autor a prova mínima daqueles alegados, por óbvio que o tratamento em caso de recusa ao exame de DNA não poderá ser mais gravoso, por simetria, e também deve o autor provar minimamente os fatos apon-tados na inicial.

Máxime quando a prova oral pleiteada pelas partes foi admitida, em alguma medida, pelo Juízo (fl. 150), havendo até que se cogitar de preclusão.

5. A meu juízo, importante destacar que não se trata de prova impos-sível, como sustenta o douto Relator.

Consoante bem analisado no precedente acima, a prova do relacio-namento amoroso não é condição sine qua non para a declaração de paternidade, e, com muito mais razão, a prova do relacionamento

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sexual decorrente de atos clandestinos ou esporádicos. Mas a prova indireta, do relacionamento casual, consistente em indícios, deve ser, sim, produzida.

[...] Não se pode atribuir à recusa ao teste de DNA consequência mais drástica que a própria revelia do réu – situação em que o pedido não pode ser julgado procedente de plano –, cabendo ao autor a prova mínima dos fatos alegados.’

Destaco, ainda, que o entendimento adotado na fundamentação do voto de S. Exa., acima reproduzido, não foi acolhido de modo uniforme pela maioria do colegiado. Em tal julgamento, as demais orientações firmadas foram nos seguintes sentidos:

(i) O em. Ministro Marco Buzzi, Relator originário, concluiu que, ‘na dicção da lei (art. 232 do Código Civil), a oposição do demandado em se submeter ao exame médico pode suprir, substituir a prova de pater-nidade que se pretendia por meio daquele produzir. Somente não terá esta consequência jurídica – e por isso o dispositivo legal utiliza a ex-pressão ‘pode’ – caso o investigado se desonere do ônus de demonstrar, por outros meios, que não é o pai’. Ademais, ‘nas hipóteses em que a concepção é fruto de relacionamento clandestino e/ou esporádico, não se pode exigir a juntada de prova indiciária, pois o investigante encontra--se materialmente impossibilitado de fazê-lo, dado a natureza do envol-vimento estabelecido entre os seus alegados genitores’;

(ii) acompanhei o em. Ministro Luis Felipe Salomão, asseverando em meu voto que ‘tal presunção não pode servir como único fundamento para a prolação de sentença de mérito, sendo necessário o cotejo dessa presunção com outras provas’;

(iii) a em. Ministra Maria Isabel Gallotti deu provimento ao recurso espe-cial ‘em menor extensão, apenas para que, na instância de origem, seja facultado ao recorrente, mais uma vez, se submeter ao exame de DNA, e, em caso de nova recusa, já ciente da interpretação da Súmula nº 301, se opere a presunção de paternidade’. Para tanto, preocupando-se, sobre-tudo, com as hipóteses de ‘relacionamento clandestino, de uma noite só, do qual não há nenhuma fotografia, um bilhete, nem testemunha’, ressal-tou que: (a) ‘presunção relativa é aquela presunção que admite prova em contrário – prova em contrário a cargo daquele que se recusou a fazer a prova pericial. Portanto, mesmo que o autor não faça prova alguma, se aquele contra quem é invertido o ônus da prova em face da recusa injus-tificada, se recusar de fato a fazer a prova, e se não houver nada nos autos

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que evidencie a inverossimilhança das alegações do autor, a procedência da investigatória se impõe.

Não é necessário, ao meu sentir, ao autor fazer outra prova além da re-cusa do pai, do investigado, de submeter ao DNA e da ausência de prova em contrário feita pelo investigado’; (b) diverge do ‘precedente da Minis-tra Nancy Andrighi, o REsp 692.242, em que S. Exa. extraiu essa inter-pretação da súmula [...] de que o fato de a presunção ser relativa implica que o autor, além da recusa, ainda tenha que fazer uma outra prova’; (c) votaria no sentido de aderir ao voto do em. Ministro Marco Buzzi, no entanto, ‘dada a controvérsia que há neste Tribunal a propósito da inter-pretação da Súmula nº 301, desde esse precedente da Ministra Nancy Andrighi, que foi adotado como fundamento no precedente do Minis-tro Honildo Amaral, e também considerando os votos do Ministro Luis Felipe Salomão e de V. Exa., que emprestam verossimilhança à com-preensão que o recorrente tinha na época, de que ele podia não fazer essa prova sem atrair a si a consequência da presunção de paternidade, voto no sentido de prover em parte o recurso especial, não para reabrir amplamente a instrução, determinando uma audiência, que, a meu ver, é desprovida de qualquer utilidade, mas para que se permita ao recor-rente, uma única nova vez, fazer o DNA’; (iv) o em. Ministro Raul Araújo acompanhou a divergência apenas salientando que, ‘se no processo de investigação de paternidade em que há recusa do réu em se submeter ao exame de DNA, o juiz estabelece que dessa recusa resultará a pronta procedência, a imediata, a automática procedência da ação, não se está dando cumprimento a essa súmula do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece ser a presunção juris tantum . Esta significa que se dispensa o promovente da ação de produzir provas em seu favor, ainda que indici-árias’.

No caso concreto, de qualquer modo, tal elemento de natureza proba-tória existe. A propósito, a sentença de primeiro grau julgou procedente a ação com fundamento, também, em depoimento de testemunha. Eis a motivação da sentença:

‘Os irmãos da autora, bem como o Sr. W. S. da C., não contestaram a ação.

A revelia dos mesmos, faz-me concluir que concordam com os pedi-dos formulados pela autora.

Ademais, a autora juntou aos autos o exame de DNA, realizado ex-trajudicialmente, que demonstra que o Sr. W. S. da C. não é o seu pai biológico.

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Assim, o pedido de anulação de registro civil deve ser julgado proce-dente, tendo em vista que a prova pericial excluiu a paternidade de W. sobre M.

[...] A testemunha ouvida afirma ‘...que quando M. ficou grávida, a depoente era sua vizinha; que M. era casada com W., mas encontra-va com M. em outros lugares e G. frequentava a casa de M.; que G. frequentava a casa de M. como amigo de todos daquela casa [...], [...] que era de conhecimento de todos em Inhaúma o relacionamento do falecido G. com a mãe da autora; que quando G. faleceu M. já era adulta; que G. e a autora tiveram pouco relacionamento; que já ouviu do próprio irmão de G. dizer que G. era pai da autora...’.

Os réus não permitiram a realização do exame de DNA; tal prova po-deria afastar todas as dúvidas acerca da paternidade. A recusa injusti-ficada dos réus favorece as alegações da autora. Ademais, o art. 232 do CC diz que ‘a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá supri a prova que se pretendia obter com o exame’.

[...] Entendo que a recusa dos réus em fazer o exame de DNA e as afir-mações da testemunha, constituem provas suficientes para declarar a paternidade ora pretendida’ (e-STJ, fls. 273/275).

Também o voto condutor do acórdão da apelação, que julgou improce-dente o pedido, proferido pela em. Desembargadora Albergaria Costa, fez menção ao referido depoimento. Apenas concluiu que tal declaração não comprovaria, por si, a paternidade, sendo inconsistente para esse fim. Eis o que disse a referida magistrada:

‘Na sentença de primeiro grau, o Juiz utilizou-se da prerrogativa de suprimento de prova a que alude o art. 232 do Código Civil, bem como da única prova testemunhal produzida, para reconhecer a pa-ternidade e julgar procedente o pedido.

[...] Portanto, o art. 232 do Código Civil e a Súmula nº 301 do Su-perior Tribunal de Justiça não autorizam a conclusão de que o reco-nhecimento da paternidade é uma consequência lógica da recusa à submissão ao teste de DNA.

Ao contrário, é indispensável a existência de outras provas que cor-roborem a presunção legal, sob pena de o julgamento de um direito indisponível transformar-se em uma ficção jurídica, esvaziando a pos-sibilidade de justa solução da crise de direito material.

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[...] Com efeito, analisando a única prova produzida pela apelada, qual seja, o depoimento de uma testemunha, é flagrante a percepção de inconsistência e desconhecimento da intimidade das supostas re-lações havidas entre o suposto pai e a mãe da apelada.

Veja-se que a testemunha afirma textualmente ‘[...] que nunca viu M. em companhia do G. [...]’ para logo em seguida narrar ‘[...] que quando M. ficou grávida a depoente era sua vizinha; que M. era casada com Wilson, mas encontrava com M. em outros luga-res e G. frequentava a casa de M. [...]’ (destaques opostos)’ (e-STJ, fls. 374/377).

Por último, no julgamento dos embargos infringentes, providos, o Tribu-nal de origem julgou com base na presunção de que trata o art. 232 do CC/2002, mas tendo antes assinalado a insuficiência das provas coligidas aos autos acerca da efetiva paternidade do falecido. Confira-se (e-STJ, fls. 436/437):

‘Da detida análise dos autos, depreende-se que o único depoimento testemunhal colhido não se mostra de todo esclarecedor.

Isso porque, ao mesmo tempo em que afirma “que nunca viu M. (ge-nitora da autora, já falecida) em companhia de G.”, aduz que “já ouviu do próprio irmão de G. dizer ser ele pai da autora”.

Assim, a verdade real buscada nos autos não pode, através do referido depoimento, ser alcançada, o que se daria, facilmente com a reali-zação do exame do DNA, que tem grau máximo de probabilidade quanto à veracidade do conteúdo que expressa ao qual, como dito, negaram-se os réus veementemente a realizar’ (e-STJ, fls. 436/437).

Em resumo, em segundo grau, apesar de entender a Corte local que a prova testemunhal não seria conclusiva acerca da paternidade, asseve-rou não ser possível descartá-la como, no mínimo, prova indiciária, ca-paz de justificar o ajuizamento da ação e de viabilizar o acolhimento da presunção de paternidade. Veja-se que, no acórdão da apelação, foi reproduzido trecho do depoimento em que a testemunha afirma que o falecido frequentava a casa da genitora da ora recorrida, autora da ação investigatória. No julgamento dos embargos de divergência, por sua vez, cita-se passagem em que a mesma testemunha afirma que ‘ouviu do pró-prio irmão de G. dizer ser ele pai da autora’.

Aliás, destaco que na sentença, mediante a transcrição de uma parte maior do mesmo depoimento, consta também que a depoente era vizi-nha da mãe da autora, que o suposto pai frequentava a casa como amigo

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de todos e que era do conhecimento de ‘todos em Inhaúma o relaciona-mento do falecido G. com a mãe da autora’.

Com efeito, sem examinar o grau de veracidade do testemunho prestado e sem ferir a vedação contida na Súmula nº 7 do STJ, é possível consi-derar tal depoimento, ao menos, como peça indiciária, não conclusiva quanto à efetiva paternidade, podendo-se, então, aplicar a presunção ju-ris tantum imposta na Súmula nº 301 do STJ, sendo oportuno reiterar que é incontroverso o fato de a autora não ser filha biológica do pai registral, W. S. da C.

Assim, seja com base na aplicação literal do art. 232 e da Súmula nº 301 do STJ, seja com fundamento na orientação de que deve haver in-dício suplementar acerca dos fatos da causa, a paternidade reconhecida na sentença e no acórdão que julgou os embargos infringentes deve ser mantida.

Ante o exposto, nos termos do art. 557 do CPC, nego provimento ao re-curso especial” (e-STJ, fls. 508/518 – grifei).

Com efeito, o presente agravo regimental não consegue ultra-passar os fundamentos apresentados na decisão agravada, sendo certo que, em suma: (i) “a paternidade socioafaetiva não pode ser invocada pelos réus nos autos de ação de investigação de paternidade proposta pelo filho, que tem o direito personalíssimo de esclarecer sua paterni-dade biológica” (e-STJ, fl. 511); (ii) “a Segunda Seção aprovou a Súmula nº 301 do STJ, segundo a qual, ‘em ação investigatória, a recusa do su-posto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade” (e-STJ, fl. 514); (iii) a Quarta Turma, no julgamento do REsp 1.281.664/SP, Rel. originário Ministro Marco Buzzi, Rel. para acór-dão Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de 05.02.2015, ficou dividida a respeito da aplicação literal da Súmula nº 301 do STJ, tendo sido profe-ridos dois votos a favor da literalidade, dois apontando a necessidade de haver indícios acerca da paternidade e um voto que se limitou a reco-nhecer o direito de o réu produzir provas no caso concreto; (iv) nestes autos, de qualquer forma, apesar de a prova testemunhal não ser conclu-siva a respeito da efetiva paternidade, serve como “prova indiciária, ca-paz de justificar o ajuizamento da ação e de viabilizar o acolhimento da presunção de paternidade” (e-STJ, fl. 518), na forma da aludida súmula.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

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É como voto.

cErtidão dE julgAmEnto QuArtA turmA

AgRg-EDcl-REsp 1.160.080/MG

Número Registro: 2009/0186232-8 Processo Eletrônico

Números Origem: 10672031212984001 10672031212984005

Em Mesa Julgado: 08.03.2016

Segredo de Justiça

Relator: Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Rogério de Paiva Navarro

Secretária: Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

AutuAção

Recorrente: J. dos R. F. e outro

Advogado: Cantinila Bezerra de Carvalho

Recorrido: M. A. da C. G.

Advogados: Geraldo Amazan de Araújo Emanuelle Silveira dos Santos Boscardin e outro(s)

Assunto: Direito Civil – Família – Relações de parentesco – Investigação de paternidade

AgrAvo rEgimEntAl

Agravante: J. dos R. F. e outro

Advogado: Cantinila Bezerra de Carvalho

Agravado: M. A. da C. G.

Advogados: Geraldo Amazan de Araújo Emanuelle Silveira dos Santos Boscardin e outro(s)

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cErtidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regi-mental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de GoiásAgravo de Instrumento nº 367317‑91.2015.8.09.0000(201593673175)Comarca de GoiâniaAgravante: J. C. R.Agravada: A. T. S. R.Relator: Dr. M. da C. F.Juiz de Direito Substituto em 2º Grau

agRavO De INSTRUmeNTO – aÇÃO De DIvóRcIO – cOmpeTÊNcIa – pReveNÇÃO – aÇÃO caUTelaR De SepaRaÇÃO De cORpOS – peRpeTUaTIO jURISDIcTIONIS – meDIDa pROTeTIva – leI Nº 11.340/2006 – peDIDO De alImeNTOS

1. Nos termos do art. 87 do Código de Processo Civil, a competên-cia é estabelecida no instante do ajuizamento da ação, mostrando--se irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente. 2. O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher somente cumula a apreciação de medidas protetivas tanto de natureza cível como criminal, não se confun-dindo com as questões atinentes à Vara da Família. 3. Tratando-se de medida urgente, devem ser mantidos os alimentos fixados pelo juízo diverso, até posterior análise pelo juízo competente. Agravo conhecido e provido.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Agravo de Ins-trumento nº 367317-91, acordam os integrantes da 3ª Turma Julgadora da 6ª Câmara Cível, a unanimidade, em conhecer e prover o agravo, nos termos do voto do Relator.

Presidiu a sessão a Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis.

Votaram com o relator os Desembargadores Jeová Sardinha de Moraes e Fausto Moreira Diniz.

A Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis impedida.

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Esteve presente à sessão a ilustre Procuradora de Justiça Dra. Márcia de Oliveira Santos.

Goiânia, 16 de fevereiro de 2016.

Marcus da Costa Ferreira Juiz de Direito Substituto em 2º Grau Relator

rElAtório E voto

Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de Efeito Suspen-sivo interposto por José Carlos Rampelotti contra a decisão do Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, Dr. William Fabian, em sede de Exceção de Incompetência proposta nos autos da Ação de Divórcio ajuizada por Alessandra Torres Severo Rampelotti.

Extrai-se do decisum agravado que o magistrado a quo declarou-se competente para o processamento e julgamento da demanda principal – Ação de Divórcio –, determinando seu normal prosseguimento.

Em suas razões, o agravante faz um breve relato dos fatos, infor-mando que a competência do juízo da comarca de Catalão teria sido firmada em julgamento de outro agravo instrumental, para o feito da Medida Cautelar de Separação de Corpos.

Adiante, salienta que teria ingressado com a ação principal no pra-zo legal e, ressalta que a agravada estaria morando em Catalão, como comprovado pela certidão do oficial de justiça quando da tentativa de sua citação na Ação de Divórcio.

Aponta os requisitos necessários à concessão de efeito suspensivo recursal.

É com base nestes termos que requer o provimento deste agravo de instrumento, com a reforma da decisão agravada, para que seja firmada a competência do juízo da Comarca de Catalão para o processamento e julgamento da demanda principal, conforme estabelecido por esta Casa Recursal.

Junta documentos às fls. 13/348.

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O preparo é visto à fl. 26.

Distribuídos os presentes autos à Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis, esta declarou-se suspeita para oficiar no recurso, por mo-tivo de foro íntimo – fl. 350.

Redistribuído o presente agravo instrumental e concluso a esta re-latoria.

Às fls. 352/356 o efeito suspensivo recursal foi deferido.

Contrarrazões apresentadas às fls. 359/369, ocasião em que a par-te agravada salienta que teria ingressado com medida protetiva no juízo de Goiânia, anteriormente ao ajuizamento da Ação Cautelar de Sepa-ração de Corpos na comarca de Catalão, o que geraria a prevenção da ação principal naquele juízo – Goiânia.

Sem informações do juízo singular – certidão de fl. 374. Instada a se manifestar, a i. Procuradoria Geral de Justiça absteve-se de o fazer – fls. 376/382.

É o relatório.

Passo ao voto.

Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, dele conheço.

Conforme relatado, trata-se de Agravo de Instrumento interposto por J. C. R. contra a decisão na qual, em sede de Exceção de Incom-petência, o magistrado da 3ª Vara de Família da Comarca de Goiânia declarou-se competente para o processamento e julgamento da Ação de Divórcio manejada por A. T. S. R., mesmo após o julgamento de Medida Cautelar de Separação de Corpos na Comarca de Catalão.

Pois bem.

Da análise dos documentos juntados aos presentes autos, enten-do que, ante a ocorrência do instituto da perpetuatio jurisdictionis, nos termos do art. 87 da Lei Processual Civil, a competência para o proces-samento e julgamento da Ação de Divórcio da espécie é do juízo da Comarca de Catalão, mesmo com a alteração da residência da mulher. Nesse sentido:

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“AGRAVO REGIMENTAL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA – PERPETUATIO JURISDICIONIS – AUSÊNCIA DE FATOS NOVOS A JUSTIFICAR O PEDIDO DE RECON-SIDERAÇÃO – I – Segundo o princípio da perpetuatio jurisdictionis, a competência deve ser fixada no momento da propositura da ação, com finalidade de proteger as partes, evitando a mudança do lugar do pro-cesso, toda vez que houver modificações supervenientes, de fato ou de direito. […].

Agravo regimental conhecido, mas improvido.” (TJGO, 1ª C.Cív., AR 207248-85, Dr. Roberto Horácio de Rezende, DJ 1875, de 23.09.2015)

Ora, tal entendimento firma-se, ainda, na disposição contida no art. 100, inciso I do Código de Processo Civil, pois à época do ajui-zamento da Ação Cautelar de Separação de Corpos pelo agravante, o domicílio da mulher (agravada) era o da Comarca de Catalão tendo, inclusive, tal matéria, sido objeto de julgamento de outro Agravo Instru-mental (nº 108330-46.2015.8.09.0000).

Nesse compasso, obedecida a prevenção gerada pelo firmamento da Comarca de Catalão para o julgamento da medida preparatória, a de-manda principal, digo a Ação de Divórcio, deve também ser processada e julgada no mencionada juízo – Catalão.

No que tange à alegação de prévio pedido de Medida Protetiva baseada na Lei nº 11.340/2006 no juízo de Goiânia, o que ocasionaria a prevenção da ação principal a este, ressalvo que a competência do jui-zado, mesmo em matéria cível, previsto em tal lei especial, se restringe a medidas de urgência. A ação principal deve ser ajuizada perante a Vara de Família, não se confundindo essas competências, eis que o juizado somente cumula a apreciação de medidas protetivas tanto de natureza cível como criminal. É o entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos:

“RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE DIVÓRCIO DISTRIBUÍDA POR DE-PENDÊNCIA À MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI Nº 11.340/2006 (LEI MARIA DA PENHA) – 1 COMPETÊNCIA HÍBRIDA E CUMULATIVA (CRIMINAL E CIVIL) DO ‘JUIZADO’ ESPECIALIZA-DO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – AÇÃO CIVIL ADVINDA DO CONSTRANGIMENTO FÍSICO E MORAL SUPORTADO PELA MULHER NO ÂMBITO FAMILIAR E DOMÉSTICO

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– 2 POSTERIOR EXTINÇÃO DA MEDIDA PROTETIVA – IRRELEVÂNCIA PARA EFEITO DE MODIFICAÇÃO DA COMPETÊNCIA – 3 RECURSO ESPECIAL PROVIDO – [...]. 1.2 Para o estabelecimento da competên-cia da Vara Especializada da Violência Doméstica ou Familiar Contra a Mulher nas ações de natureza civil (notadamente, as relacionadas ao Direito de Família), imprescindível que a correlata ação decorra (tenha por fundamento) da prática de violência doméstica ou familiar contra a mulher, não se limitando, por conseguinte, apenas às medidas protetivas de urgência previstas nos arts. 22, incisos II, IV e V; 23, incisos III e IV; e 24, que assumem natureza civil. Tem-se, por relevante, ainda, para tal es-copo, que, no momento do ajuizamento da ação de natureza cível, seja atual a situação de violência doméstica e familiar a que a demandante se encontre submetida, a ensejar, potencialmente, a adoção das medidas protetivas expressamente previstas na Lei nº 11.340/2006, sob pena de banalizar a competência das Varas Especializadas. […]. 3. Recurso Espe-cial provido.” (STJ, REsp 1496030/MT, Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª T., DJe 19.10.2015)

De outro turno, observo que a parte agravada, em sua resposta recursal pleiteia a manutenção de parte da decisão exarada pelo juízo da 3ª Vara de Família da Comarca de Goiânia, notadamente a concessão de alimentos.

Nesse ponto, entendo prudente o atendimento ao pedido, uma vez tratar-se de medida de urgência – inaudita altera pars – bem como por estar inserta na demanda principal, podendo a posteriori, no caso de reconhecimento da competência do juízo da Comarca de Catalão, ser livremente analisada e/ou alterada segundo o alvedrio do julgador deste foro.

Nessa confluência, já conhecido o Agravo de Instrumento, dou--lhe provimento, para reformar a decisão do juízo da 3ª Vara de Família da Comarca de Goiânia, quando declarou-se competente para o julga-mento da Ação de Divórcio em destaque, determinando a remessa dos autos ao juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Catalão.

No mais, conforme os princípios da economia e da efetividade processual, mantenho os alimentos fixados pelo juiz da 3ª Vara de Famí-lia da Comarca de Goiânia até sua posterior análise pelo magistrado da 1ª Vara Cível da Comarca de Catalão.

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É como voto.

Goiânia,

Dr. Marcus da Costa Ferreira Juiz de Direito Substituto em 2º Grau

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de Minas GeraisNúmero: 1.0074.10.001488‑0/001 Numeração 0014880

Relator: Des.(a) Fernando de Vasconcelos Lins (JD Convocado)

Relator do Acordão: Des.(a) Fernando de Vasconcelos Lins (JD Convocado)

Data do Julgamento: 25.02.2016

Data da Publicação: 08.03.2016

Apelação Cível/Reex. Necessário nº 1.0074.10.001488‑0/001

Comarca de Bom Despacho

Remetente: JD 1ª V. CV CR Inf. Juv. Comarca Bom Despacho

1º Apelante: G. H. dos S.

2º Apelante: Instituto de Previdência dos Servidores Militares de MG

Apelado(a)(s): M. A. T.

EmEntA

ReeXame NeceSSáRIO – apelaÇÃO cÍvel – aÇÃO De peNSÃO pOR mORTe – UNIÃO eSTável cONcOmITaNTe – DISSÍDIO jURISpRUDeNcIal e DOUTRINáRIO – pOSSIbIlIDaDe – peNSÃO RaTeaDa – cONFIRmaR SeNTeNÇa

O reconhecimento da união estável propriamente dita, definida como “convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de fa-mília”, há de estar alicerçada em prova hígida.

A r. sentença que declarou a união estável entre a Autora e o fa-lecido, trata-se uma prova a ser valorada no caso dos autos, não podendo ser absoluta, já que os ora Requeridos não participaram daquele processo.

Comprovada a qualidade de companheira da parte autora e pre-sumida a sua dependência em relação ao ex-segurado, manifesto o direito de ser incluída como dependente para fins de prestação beneficiária junto ao IPSM.

Possibilidade de reconhecimento de uniões estáveis simultâneas.

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Acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julga-mentos, em confirmar a sentença, no reexame necessário, julgar preju-dicado os recursos voluntários.

Des. Fernando de Vasconcelos Lins (JD Convocado) Relator

voto

Trata-se de Recursos de Apelação em face da sentença profe-rida pela MMª Juíza de Direito Sônia Helena Tavares de Azevedo às fls. 342/345-TJ, que, nos autos da Ação de Pensão por Morte, em des-favor do Instituto de Previdência dos Servidores Militares do Estado de Minas Gerais (IPSM) e G. H. dos S., julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, para reconhecer o direto da requerente ao benefício de pensão por morte em concorrência com a companheira G. H. T. (rateado em partes iguais), condenando o IPSM a inscrever a autora também como dependente do segurado F. V. de S. Fixou honorários ad-vocatícios em R$ 800,00, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC.

Nas razões de fls. 347/360-TJ, G. H. dos S. sustenta que restou comprovado que o de cujus viveu exclusivamente e durante os muitos anos que antecederam sua morte com a ora Apelante, restando ainda comprovado, que o falecido nunca estabeleceu um convício duradouro com a Apelada. Afirma que a Apelada nunca dependeu economicamen-te do de cujus. Pugna pela reforma da r. sentença, julgando improceden-te o pedido inicial.

Recurso do Instituto de Previdência dos Servidores Militares do Estado de Minas Gerais – IPSM às fls. 361/366-TJ, suscitando, prelimi-narmente, que não houve a inscrição da autora junto ao IPSM, portanto, a prestação previdenciária é devida a beneficiário previamente inscrito, nos termos do art. 11 da Lei nº 10.366/1990. No mérito, aduz que não participou da Ação Declaratória de União Estável, portanto, não exer-ceu o direito ao contraditório e a ampla defesa. Argumenta que não há

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nos autos comprovação da união estável da autora e o ex-segurado, na época de seu falecimento.

Contrarrazões às fls. 368/372.

É o relatório.

Conheço do reexame necessário e do recurso voluntário, eis que atendidos os pressupostos de admissibilidade.

Observo que a preliminar suscitada pelo ente público em seu re-curso de apelação, de que não houve a inscrição da autora junto ao IPSM, razão pela qual não lhe seria devido o benefício previdenciário, se confunde com o mérito do recurso e com ele será analisado.

Cinge-se a questão em apreço, em suma, na busca da autora pela concessão do benefício de pensão por morte na qualidade de compa-nheira do segurado F. V. de S., falecido em 25.07.2006.

A digna Sentenciante considerou que “A união estável é fato, ao qual a norma atribui consequências jurídicas. Ao contrário do matri-mônio, e embora não seja a regra, pode ocorrer mais de uma união estável, com formação de mais de um núcleo familiar, em torno de uma só pessoa, varão ou mulher, embora seja rara esta última hipótese. Con-figurada tal hipótese, comprovada a dupla união estável, caberá dividir a pensão entre as companheiras concorrentes, como ocorre quando ao mesmo benefício concorrem a esposa e a companheira do beneficiário”.

Antes de se analisar a possibilidade de dupla união estável, para fins de divisão da pensão por morte, cabe verificar se a Autora, de fato, vivia em união estável com o ex-segurado, falecido em 25.07.2006.

O reconhecimento da união estável propriamente dita, definida como “convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família”, há de estar alicerçada em prova hígida. O namoro firme ou o mero noivado não induz a existência de tal convivência, mas representa um período de prova, antes do enlace final.

A situação dos autos apresenta certas particularidades, uma vez que a Autora, antes do ajuizamento da presente Ação de concessão de pensão por morte, ajuizou uma Ação Declaratória de União Estável (vo-

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lume I dos autos em apenso), tendo obtido r. sentença declarando “a existência da união estável havida entre M. A. T. e F. V. de S., que per-durou 25 anos e foi dissolvida em 25.07.2006 com o falecimento do companheiro, para todos os fins de direito” (fls. 43/44).

De fato, a Autora dispõe de uma r. sentença declarando sua con-dição de companheira do falecido, com trânsito em julgado, não sendo possível sua desconstituição na presente via. Contudo, também é fato que o IPSM, bem como a Sra. G. H. dos S., outra suposta companheira do ex-segurado, não participaram daquele feito.

Este egrégio Tribunal de Justiça já se manifestou em hipótese se-melhante à dos autos, in verbis:

[...] A sentença judicial transitada em julgado que reconhece e declara união estável não produz efeitos em relação a terceiros se não foi obser-vado o disposto no art. 472 do CPC quanto à citação de todos os interes-sados, em litisconsórcio necessário. A decisão judicial que reconheceu a união estável serve como prova da sua configuração, embora passível de impugnação pelo IPSM que não participou do processo em que foi profe-rido. [...] (TJMG, Ap. Cível/Reex. Necessário nº 1.0024.09.692088-9/001, Relª Desª Heloisa Combat, 4ª C.Cív., J. 31.03.2011, p. 18.04.2011)

Portanto, a r. sentença que declarou a união estável entre a Autora e o falecido, trata-se uma prova a ser valorada no caso dos autos, não podendo ser absoluta, já que os ora Requeridos não participaram daque-le processo.

Sendo assim, passo a analisar as demais provas produzidas no pre-sente processo, a fim de verificar se ficou provado que a Autora, de fato, conviveu em união estável com o falecido.

No caso dos autos, conforme dito, há uma situação peculiar, já que, da análise das provas, ficou comprovado que o ex-segurado convi-veu com duas mulheres em união estável, em cidades diferentes.

Sua condição de Militar, sendo destacado para atuar em cidades diferentes, contribuiu para o convívio com duas mulheres, uma em Bom Despacho e outra em Mateus Leme.

Neste sentido, as provas testemunhais produzidas em Juízo, e va-loradas na r. sentença de origem, atestam:

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[...] que conheceu a requerente quando esta trabalhava como enfermei-ra na Santa Casa, por volta do ano de 1975; que o depoente conhecia F., sendo que era vizinho da mãe do mesmo; que F. dava assistência a mãe, mas morava em companhia da requerente sabendo informar que já moraram no bairro São José e na Vila Gontijo; que o depoente tinha a requerente e F. como se fossem casados; que sabe que F. trabalhava “em destacamentos” em outras cidades, se recordando de Paineiras e outra cidade próxima a Pará de Minas, não se recordando o nome; que sempre via a requerente na casa da mãe de Francisco; que nunca viu F. levar outras mulheres na casa da mãe; que não sabe informar teve outros relacionamentos com outras mulheres; que quando F. faleceu a mais ou menos 4 anos, estava morando em companhia da requerente. [...] que o depoente sempre via a requerente na companhia de F.; que nunca viu a requerente na companhia de outro homem. [...] que parece que a cidade que não se recorda o nome trata-se A.; que quando estava trabalhando em destacamentos, F. vinha em Bom Despacho, mas não era todos os dias; que não chegou a visitar F. quando este estava doente na casa da requerente ou na mãe. (Antônio Martins dos Santos, fl. 173).

[...] que conhece a requerente desde 1974, uma vez que ela trabalhava com o irmão da depoente no horto Florestal; que também conheceu F. sendo que este era militar e os irmãos da depoente também; que uns 2 anos depois passou a ver a requerente e o F. juntos passeando e indo ao cinema; que no ano de 1976 ou 1977 a depoente e a requerente passa-ram a trabalhar juntas no hospital e na santa Casa; que se lembra de F. levar e buscar a requerente no trabalho; que a depoente sempre teve a requerente e F. como casados; que somente tomou conhecimento de que não eram casados após o falecimento de F.; que sempre via a requerente e F. saindo e voltando para casa juntos; que não frequentava a casa da requerente; que acreditava que M. A. e F. tiveram uma filha; que somen-te tomou conhecimento que C. não era filha da requerente quando ela já estava com 15 anos; que foi a própria requerente que contou para a depoente que C. não era sua filha biológica; que a requerente nunca co-mentou com a depoente se F. teria outra mulher; que a requerente dizia apenas que F. “passeava muito”. [...] que não sabe informar se F. já levou alguma namorada para a casa da mãe do mesmo. [...] que a requerente deve estar aposentada; que não sabe informar possui algum imóvel. [...] que já viu F. entrando e saindo da casa da requerente, mas não com a mesma regularidade que os via passarem juntos de fronte a sua residên-cia (da requerente); que sabe que F. tinha ficado doente através da reque-

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rente; que não sabe informar sobre o tratamento realizado por F., nem o local. (Diva Geacaiaba Azevedo, fl.174).

Embora a coabitação seja indicativo significativo da união com objetivo de constituir família, não é indispensável à caracterização do concubinato, como ficou consolidado pela Súmula nº 382 do STF.

Não obstante, também restou comprovada a existência de união estável entre a Requerida G. H. dos S., conforme depoimentos testemu-nhais e uma séria de documentos anexados pela ora Apelante em sua contestação:

[...] que conhece G. H. a aproximadamente 16 anos; que conheceu F. V. porque ele andava na companhia de G.; que para a depoente G. e F. eram casados; que sempre via os dois juntos de mãos dadas fazendo compras [...] (Nivalda Luiza de Oliveira, fl. 314).

[...] que conhece G. à aproximadamente 20 anos. Que conheceu tam-bém F. por aproximadamente 12 anos; que eles conviviam um com ou-tro; que F. foi inquilino do depoente e morou no seu imóvel por apro-ximadamente 05 anos; que F. conviveu com G. aproximadamente 20 anos; que F. não trabalhava aqui; que G. trabalhava na Prefeitura; que F. é quem pagava o aluguel; [...] (Eder Geraldo Martins, fl. 315).

De acordo com o culto autor Rodrigo da Cunha Pereira:

“O delineamento do conceito de união estável deve ser feito buscando os elementos caracterizadores de um ‘núcleo familiar’. É preciso saber se daquela relação nasceu uma entidade familiar. Os ingredientes são aqueles já demarcados principalmente pela jurisprudência e doutrina na pós-constituição de 1988: durabilidade, estabilidade, convivência sob o mesmo teto, prole, relação de dependência econômica.

Entretanto, se faltar um desses elementos, não significa que esteja des-caracterizada a união estável. É o conjunto de determinados elementos que ajuda a objetivar e a formatar o conceito de família. O essencial é que se tenha formado com aquela relação afetiva e amorosa uma família, repita-se.

Os elementos intrínsecos e extrínsecos, objetivos e subjetivos, em cada caso concreto, são os que nos ajudarão a responder se ali está caracte-rizada, ou não, uma união estável.” (Direito de Família e o Novo Códi-

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go Civil. Coord. Maria Berenice Dias, Rodrigo da Cunha Pereira. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 209/210)

Portanto, da prova produzida nos autos, entendendo, conforme fundamentou a i. Sentenciante, ter sido comprovada a união estável en-tre a Requerente e o falecido, bem como com a Requerida G. H. dos S.

O reconhecimento da união estável exige prudência do julgador, tendo em vista os reflexos, inclusive patrimoniais, que a sua declaração acarreta, e a prova coligida se mostra suficiente ao acolhimento da pre-tensão exordial.

Deve-se ressaltar que existe uma sentença reconhecendo a união estável entre a Autora e o falecido, que, em que pese a falta de citação de outros interessados, continua em vigor, não tendo sido anulada. Ade-mais, a Requerida G. H. dos S. já gozava da situação de dependente do ex-segurado, recebendo o benefício previdenciário, não podendo ser alijada no recebimento da pensão.

Trata-se, à evidência, de um caso excepcional, que não pode ser ignorado pelo Judiciário.

Portanto, a divisão do benefício previdenciário mostra-se como a decisão mais justa a ser tomada, conforme decidiu a r. sentença.

Aliás, já havia sido reconhecido pelo extinto Tribunal Federal de Recursos por meio de sua antiga Súmula nº 159, que assim rezava:

“É legítima a divisão da pensão previdenciária entre a esposa e a compa-nheira, atendidos os requisitos exigidos.”

Vale citar passagem do Professor Fábio Zambitte Ibrahim, para quem:

“Qualquer manual de direito previdenciário, ao tratar dos dependentes, os define como pessoas que dependem economicamente do segurado, de modo que o sistema protetivo possa garantir um mínimo de sobrevi-vência a tais indivíduos. Para tanto, a lei, ao disciplinar o tema, assume, por comodidade, conceitos de uso contínuo, como o de companheiro(a), mas sem necessariamente impor uma submissão plena aos preceitos ci-vilistas da matéria.

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Na seara protetiva, uma companheira ou companheiro é pessoa que pos-sui animus de convivência com o segurado, dividindo vida em comum e buscando uma sociedade conjugal, por afinidade de espírito e busca da plena realização. Se são impedidos, por lei, de contrair núpcias, é tema de total desimportância no meio previdenciário. Nunca é demais lembrar da possibilidade de criar conceitos próprios para fins previdenciários – como a figura do equiparado ao filho – ou mesmo adaptar alguns já existentes, como o(a) de companheiro(a).

[...]

Deste modo, não há impedimento legal expresso à concessão de be-nefício à cônjuge e “companheira(o)” do segurado(a) (sic). Embora tal situação, pela lei civil, seja de mero concubinato (art. 1.727, CC), a nor-matização previdenciária, específica em matéria previdenciária, admite a possibilidade, sem escapar a seu sentido literal possível.” (BRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 16. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. 940 p.)

Sobre o tema, a eminente Ministra Nancy Andrighi assim se ma-nifestou:

“[...] 2ª: adotada pela grande maioria dos doutrinadores – entre eles: Álvaro Villaça de Azevedo, Rodrigo da Cunha Pereira, Francisco José Cahali, Zeno Veloso, Euclides de Oliveira, Flávio Tartuce e José Fernando Simão –, funda-se na boa-fé e no emprego da analogia concer-nente ao casamento putativo, no sentido de que se um dos parceiros es-tiver convicto de que integra uma entidade familiar conforme os ditames legais, sem o conhecimento de que o outro é casado ou mantém união diversa, subsistirão – para o companheiro de boa-fé os efeitos assegura-dos por lei à caracterização da união estável, sem prejuízo dos danos morais; 3ª: representada por Maria Berenice Dias, admite como entida-des familiares quaisquer uniões paralelas, independentemente da boa-fé, deixando desconsiderar o dever de fidelidade como requisito essencial à caracterização da união estável.

[...] Ao analisar as lides que apresentam paralelismo afetivo, deve o juiz, atento às peculiaridades multifacetadas apresentadas em cada caso, de-cidir com base na dignidade da pessoa humana, na solidariedade, na afe-tividade, na busca da felicidade, na liberdade, na igualdade, bem assim, com redobrada atenção ao primado da monogamia, com os pés fincados no princípio da eticidade. (REsp 1157273/RN, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., Julgado em 18.05.2010, DJe 07.06.2010)

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Outros Tribunais de Justiça já se manifestaram pela possibilidade de reconhecimento de uniões estáveis simultâneas, in verbis:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÕES DECLARATÓRIAS CONEXAS RELATIVAS A UNIÕES ESTÁVEIS SIMULTÂNEAS – COMPANHEIRO FALECIDO

Evidenciado, a partir do conjunto probatório, que ambas as autoras man-tiveram união estável com o de cujos, inclusive com prole e com todos os contornos que lhe são peculiares convivência pública, contínua e du-radoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família a pro-cedência das duas demandas mostra-se inafastável, impondo-se, pois, re-conhecer a existência de relações paralelas caracterizando ambas união estável, como definido em lei. Negaram provimento a todos os recur-sos. (TJRS, Apelação Cível nº 70024427676, 8ª C.Cív., Rel. Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 16.10.2008)

DIREITO DE FAMÍLIA – RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE DU-PLA UNIÃO ESTÁVEL – MORTE DO COMPANHEIRO – PRETENSÃO SECUNDÁRIA DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS JUNTO AO INSS – UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA – PROVA ORAL E DO-CUMENTAL QUE EVIDENCIA A EXISTÊNCIA DE DUPLICIDADE DE UNIÕES – COMPANHEIRAS QUE, MUTUAMENTE, DESCONHECEM ESSA REALIDADE – BOA-FÉ CONFIGURADA – PUTATIVIDADE QUE IMPLICA A PROTEÇÃO JURÍDICA DE AMBOS OS RELACIONAMEN-TOS – DIVISÃO IGUALITÁRIA DA PENSÃO DEIXADA PELO VARÃO (ART. 226, § 3º DA CF E ARTS. 1.723 E 1.561 DO CC) – RECURSOS IMPROVIDOS – 1. A união estável é reconhecida como entidade fa-miliar consubstanciada na convivência pública, contínua e duradoura com o fito de constituição de família, competindo à parte interessada demonstrá-la adequada e concretamente, seja por elementos de prova oral ou documental. 2. Embora seja predominante, no âmbito do direito de família, o entendimento da inadmissibilidade de se reconhecer a du-alidade de uniões estáveis concomitantes, é de se dar proteção jurídica a ambas as companheiras em comprovado o estado de recíproca puta-tividade quanto ao duplo convívio com o mesmo varão, mostrando-se justa a solução que alvitra a divisão da pensão derivada do falecimento dele e da terceira mulher com quem fora casado. (TJSC, Apelação Cível nº 2009.041434-7, de Lages, Rel. Des. Eládio Torret Rocha, J. 10.11.2011)

Não se desconhece a discussão jurisprudencial e doutrinária do caso, tendo que o Excelso Pretório reconhecido a repercussão geral do tema, acerca de uniões estáveis concomitantes, contudo, ainda não foi

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julgado, não podendo o Judiciário se desincumbir de sua função pacifi-cadora:

EMENTA: CONSTITUCIONAL – CIVIL – PREVIDENCIÁRIO – UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA – UNIÕES ESTÁVEIS CONCOMITANTES – PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL DAS QUESTÕES CONSTITU-CIONAIS DISCUTIDAS – Possuem repercussão geral as questões cons-titucionais alusivas à possibilidade de reconhecimento jurídico de união estável homoafetiva e à possibilidade de reconhecimento jurídico de uniões estáveis concomitantes. (ARE 656298-RG, Relator(a): Min. Ayres Britto, Julgado em 08.03.2012, Acórdão Eletrônico DJe-084 Divulg. 30.04.2012, Public. 02.05.2012, RT v. 101, n. 922, 2012, p. 742-746)

Por fim, quanto ao fato levantado pelo Instituto de Previdência, de que a autora não teria sido inscrita como dependente do ex-segurado em seu cadastro, não se olvide que o art. 11, da Lei nº 10.366/1990 estabelece que “a prestação previdenciária é devida a beneficiário pre-viamente inscrito”.

No entanto, a Deliberação nº 02/2002-CA (Dispõe sobre as for-malidades e os critérios para a inscrição de dependentes de segurado) prevê, expressamente, a possibilidade de a inscrição de dependente ser promovida por interessado ou por seu representante legal, na hipótese de falecimento do segurado.

A propósito:

O Conselho Administrativo do Instituto de Previdência dos Servidores Militares do Estado de Minas Gerais (IPSM), no uso da competência que lhe é conferida pelo art. 5º, inciso V, da Lei nº 11.406, de 28 de janeiro de 1994, e de acordo com o art. 10, da Lei nº 10.366, de 28 de dezembro de 1990, resolve estabelecer as seguintes formalidades e critérios para inscrição de dependentes de segurados:

Art. 1º A inscrição de dependente é ato de vontade do segurado, poden-do, ainda, ser promovida pelo interessado ou por seu representante legal, nas seguintes hipóteses:

I – falecimento do segurado;

[...]

Art. 7º A inscrição de companheiro será precedida da realização de sindicância para a comprovação de convivência duradoura, pública e

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contínua de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1º Considera-se a convivência estabelecida no caput do artigo, aquela verificada nos termos da Lei federal nº 9.278, de 10 de maio de 1.996, que regulamentou o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 2º Na comprovação de união estável, não será admitida prova ex-clusivamente testemunhal, sendo obrigatória a apresentação de provas materiais, e o interessado deverá apresentar documento de identidade, certidão de casamento com averbação de separação judicial ou divórcio, quando um dos companheiros ou ambos já tiverem sido casados, ou de óbito, se viúvos.

§ 3º Quando falecido o segurado, a inscrição poderá ser requerida pelo companheiro, mediante a comprovação de convivência em união está-vel, na forma dos §§ 1º e 2º, anteriores, até a data do falecimento, ou por meio de Justificação ou Declaração Judicial, em processo ajuizado para este fim e do qual o IPSM tenha sido parte.

§ 4º O segurado casado não poderá realizar a inscrição de com panheiro.”

Comprovada a qualidade de companheira da parte autora e presu-mida sua dependência em relação ao ex-segurado F. V. de S., manifesto o direito de ser incluída com dependente para fins de prestação benefi-ciária junto ao IPSM.

Pelo exposto, em reexame necessário, confirmo a r. sentença de origem. Julgo prejudicados os recursos voluntários.

Custas, ex lege.

Des. Versiani Penna (Revisor) – De acordo com o(a) Relator(a).

Desª Áurea Brasil – De acordo com o(a) Relator(a).

Súmula: “Em reexame necessário, confirmaram a sentença. Julga-ram prejudicados os recursos voluntários.”

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do ParanáApelação nº 21026‑66.2014.8.16.01888ª Vara de Família e Sucessões do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de CuritibaApelantes: S. B. M. por si e em representação a M. V. M.Relator: Des. Luiz Cezar NicolauSegredo de Justiça: NãoRelator(a): Luiz Cezar NicolauÓrgão Julgador: 12ª Câmara CívelComarca: CuritibaData do Julgamento: 30.03.2016 00:00:00Fonte/Data da Publicação: 01.04.2016

EmEntA

RegISTRO De DISpOSIÇÃO De ÚlTIma vONTaDe – cODIcIlO – ImpROceDÊNcIa DO peDIDO – INSURgÊNcIa DaS INTeReSSaDaS – DeclaRaÇÃO emITIDa QUe NÃO aTeNDe OS ReQUISITOS legaIS – INTelIgÊNcIa DO aRT. 1.881 DO cóDIgO cIvIl – ObjeTO SUbSTaNcIalmeNTe INcOmpaTÍvel cOm O INSTITUTO (TRaNSmISSÃO Da paRTe DISpONÍvel Da HeRaNÇa e De USUFRUTO De bem Imóvel) – móveIS e UTeNSÍlIOS INeReNTeS À aTIvIDaDe pROFISSIONal DO FalecIDO – eScRITóRIO De aDvOcacIa – NeceSSIDaDe De avalIaÇÃO DOS DemaIS beNS QUe cOmpÕem O aceRvO HeReDITáRIO, paRa, eNTÃO, aFeRIR Se cONSISTem em beNS De “pOUcO valOR” – cONceITO SUbjeTIvO – DIlIgÊNcIa a SeR RealIZaDa NOS aUTOS De INveNTáRIO – SeNTeNÇa eScORReITa – RecURSO NÃO pROvIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos nº 21026-66.2014. 8.16.0188, de Apelação, em que são apelantes S. B. M. por si e em re-presentação a M. V. M.

1 rElAtório

Trata-se de recurso de apelação interposto pelas interessadas con-tra sentença que julgou improcedente o pedido de registro de declaração de última vontade, declarando-o nulo “por não se revestir das formalida-des legais” (mov. 20.1), complementada por ocasião do julgamento dos embargos de declaração para “indeferir o pedido de reconhecimento

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da disposição da parte disponível da herança como codicilo e remeter a análise do pleito de reconhecimento da disposição quanto aos demais bens/direitos descritos no documento de seq. 1.8 à demanda de inven-tário em apenso” (sic).

Sustentam, em síntese, que: (a) a declaração de última vontade deixada pelo de cujus dispõe sobre a destinação de bens de pequena monta e resguarda à filha incapaz o direito de permanecer residindo no bem imóvel, sobretudo em razão da fragilidade e necessidades especiais desta; (b) o documento em análise atende todas as formalidades legais para ser considerado codicilo, uma vez que é escrito, datado e assina-do pelo testador e, ainda, por prescindir de assinaturas de testemunhas; (c) as outras duas herdeiras, que também residiam no bem, “aceitaram o codicilo e concordam plenamente com a moradia da irmã incapaz no imóvel em questão”; (d) a garantia estabelecida no art. 6º da Constituição Federal assegura o direito real de habitação e moradia a herdeira inca-paz, além de se sobrepor ao direito de obrigação dos demais herdeiros.

Pedem, assim, a reforma da sentença recorrida e o provimento do recurso para “que seja realizado o registro da declaração de última vontade, vez que o documento está revestido das formalidades legais (escrito, datado e assinado) e dispõe sobre o direito de habitação e bens de pequena monta, devendo, deste modo, ser analisado e declarado na forma de codicilo” (sic, mov. 41.1).

O apelo foi recebido apenas em ambos os efeitos (mov. 44.1), com o encaminhamento dos autos a este Tribunal.

A Procuradoria de Justiça se manifestou pelo não acolhimento da insurgência (mov. 7.1-TJ).

2 fundAmEntAção E voto

2.1 cONHeÇO DO RecURSO pORQUe aDeQUaDO, TempeSTIvO e ISeNTO De pRepaRO aNTe a cONceSSÃO DOS beNeFÍcIOS Da gRaTUIDaDe

2.2 É certo que a sucessão se dá por lei ou por disposição de úl-tima vontade (CC, art. 1.786) e, neste segundo caso, toda pessoa capaz

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pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte (CC, art. 1.857).

Ainda que as apelantes também figurem como herdeiras necessá-rias do falecido W. M. J. (autos nº 12950-53.2014.8.16.0188 de inventá-rio), que também tramita perante o juízo de origem, deve ser observado que o art. 1.881 do Código Civil é claro ao estabelecer que “toda pessoa capaz de testar poderá, mediante escrito particular seu, datado e assi-nado, fazer disposições especiais sobre o seu enterro, sobre esmolas de pouca monta a certas e determinadas pessoas, ou, indeterminadamente, aos pobres de certo lugar, assim como legar móveis, roupas ou jóias, de pouco valor, de seu uso pessoal”.

Embora o documento de mov. 1.8 esteja intitulado como “decla-ração de última vontade que faz W. M. J.”, observa-se que a parte subs-tancial de seu objeto é evidentemente incompatível com o instituto do codicilo, uma vez que o falecido almejou transmitir à apelante M. V. a parte disponível de sua herança, o usufruto de determinado bem imóvel e “todos os móveis, utensílios, biblioteca e demais pertences” de seu escritório de advocacia.

Na lição de Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes “codicilo é o ato de disposição de última von-tade em que o outorgante determina providências sobre seu enterro, faz esmolas de pouca monta, lega bens de pequeno valor, nomeia ou subs-titui testamenteiros [...] A lei, portanto, restringe o objeto do codicilo, servindo este, ainda, para outras finalidades, tais como reservar parcelas do monte para sufrágios da alma do disponente [...]” (Código Civil inter-pretado conforme a Constituição da República, v. 04, p. 710).

Como adequadamente observado pelo Procurador de Justiça Rogério Moreira Orrutea “como é possível verificar da leitura da decla-ração citada, o de cujus não se restringiu a selecionar pequenos bens de pouca valia para beneficiar terceiros ou a filha, mas sim dispôs de mais da metade do seu patrimônio por um instrumento que não se reveste das formalidades para tanto”.

Não obstante as apelantes equipararem os institutos do usufruto e do direito de habitação, cumpre esclarecer que, embora ambos sejam direitos reais, o primeiro consiste no direito de usar, fruir, administrar e

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perceber frutos de coisa alheia (Código Civil, art. 1.394 e seguintes), e o segundo é o direito personalíssimo de apenas habitar gratuitamente casa alheia (Código Civil, arts. 1.414 a 1.416), sem possibilidade de cessão.

Assim, há que se observar que a declaração emitida pelo falecido é expressa no sentido de se conceder o usufruto relativo ao “bem imóvel sito à Rua São Januário nº 626, Jardim Botânico, em Curitiba” (sic), o que também não se enquadra na hipótese de codicilo, bem como que even-tual direito de habitação se restringe ao cônjuge supérstite se restarem preenchidos os requisitos do art. 1.831 do Código Civil.

E com relação aos últimos bens supracitados (móveis e utensílios inerentes à atividade profissional do falecido), que, em tese, seriam Es-tado do Paraná passíveis de transmissão pela via codicilar, o juízo de origem acertadamente ponderou que a lei civil não delimitou de forma objetiva os conceitos de bens de “pouca monta” ou de “pouco valor” e que, portanto, afigura-se adequada a avaliação dos demais bens que compõem o monte-mor para então se estabelecer se os mesmos se ade-quam a tais requisitos.

Em razão da ausência dos requisitos legais para o reconhecimento da validade de codicilo e, cingindo-se a insurgência apenas a tal ques-tão, a manutenção da sentença e a improcedência do pedido é medida de rigor.

2.3 Diante do exposto, voto no sentido de negar provimento a apelação e manter a sentença.

3 dispositivo

Acordam os Magistrados integrantes da 12ª Câmara Cível, à unani-midade de votos, em não prover o recurso e ratificar a decisão atacada.

Participaram do julgamento os Desembargadores Mário Helton Jorge e Joeci Machado Camargo.

Curitiba 30 março 2016.

Des. Luiz Cezar Nicolau, Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio de JaneiroDécima Sexta Câmara CívelEmbargos de Declaração no Agravo Interno no Agravo de Instrumento nº 0066229‑15.2015.8.19.0000Embargantes: M. J. C. C. B. e outrosEmbargada: B. F. de A.Relator: Desembargador Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto

Embargos de Declaração no Agravo Interno no Agravo de Instru-mento. Direito das Sucessões. Pedido de Registro e cumprimento de testamento público formulado pela legatária. Herdeiros do tes-tador que impugnam a capacidade do de cujus quando da mani-festação de última vontade. Propositura de ação de anulação de testamento. Decisão agravada que indefere o pedido de suspensão do processo de cumprimento. Inconformismo que não prospera. Cognição, nestes autos, que se limita à análise da existência de vícios externos no testamento. Impossibilidade de apreciação dos requisitos intrínsecos ao ato, como a vontade e a capacidade do testador à época da lavratura. Dicção clara do art. 1.126 do Códi-go de Processo Civil. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. Negativa de seguimento ao recurso. Decisão monocrática que se mantém por seus próprios fundamentos. Agravo desprovido. Em-bargos de declaração com caráter nitidamente infringente. Inexis-tência dos vícios contidos no art. 535 do CPC. “Mesmo com o escopo de prequestionamento, os embargos declaratórios devem obedecer aos ditames traçados no art. 535 do CPC, ou seja, só serão cabíveis caso haja no decisório embargado omissão, contra-dição e/ou obscuridade.” (REsp 1225369/RJ) Inconformismo que deve ser manifestado pela via adequada. Embargos conhecidos e desprovidos.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos dos Embargos de De-claração no Agravo Interno no Agravo de Instrumento nº 0066229-

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15.2015.8.19.0000, em que são embargantes M. J. C. C. B. e outros e embargada B. F. de A.

Acordam os Desembargadores da Décima Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em negar provimento ao recurso, na forma do voto do Relator.

rElAtório

Trata-se de agravo de instrumento interposto por M. J. C. C. B. e outros contra decisão proferida pelo Juízo da 11ª Vara de Órfãos e Sucessões da Comarca da Capital que, nos autos de pedido de registro e cumprimento de testamento público lavrado pelo falecido E. C. B., determinou o prosseguimento regular do feito, acolhendo as seguintes razões do Ministério Público:

“No processo de registro, abertura e cumprimento de testamento o que se requer ao juiz, conforme a jurisprudência, é a inspeção, para verificar se o instrumento apresenta as formalidades extrínsecas essenciais. Qualquer outra nulidade (intrín3seca) terá que ser arguida em ação própria e não no processo de cumprimento que é de cognição superficial.”

Em suas razões recursais, os agravantes reiteram a necessidade de suspensão do processo de cumprimento do testamento, considerando que o referido ato foi impugnado por ação anulatória, cujos argumentos são a ausência de capacidade do testador e a existência de vício formal na sua lavratura.

Em apreciação monocrática, às fls. 21/23, foi negado seguimento ao recurso e mantida, por isso, a decisão agravada. A decisão foi manti-da quando do julgado do recurso de agravo interno (fls. 25/31), confor-me aresto de fls. 63/67.

Ainda inconformados com o acórdão, os agravantes, ora embar-gantes, manejam os embargos de declaração de fls. 69/74, a fim de ver aclarado o julgado em questões fáticas, sobretudo aquela que trata da vacância do tabelionato.

É o relatório.

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voto

O acórdão está bem fundamentado, sem contradições ou omis-sões, daí porque ausentes quaisquer dos vícios que dão ensejo à interpo-sição de embargos de declaração. O que a parte pretende, de verdade, é fazer prequestionamento de matéria exclusivamente de fato já há muito esclarecida no aresto embargado.

Oportuno esclarecer, nesse particular, que mesmo para fins de prequestionamento, objetivando recurso para Tribunal Superior, ainda assim devem ser observados os limites traçados no artigo 535 do Có-digo de Processo Civil: “Não houve a alegada ofensa ao art. 535, II, do CPC. O acórdão recorrido está claro e contém suficiente fundamentação para decidir integralmente a controvérsia. O que houve, na verdade, foi mera tentativa de rejulgamento da causa, sob o enfoque desejado pela parte, o que sabidamente não tem lugar entre as hipóteses de cabimento dos embargos declaratórios. Vale lembrar que, mesmo com o escopo de prequestionamento, os embargos declaratórios devem obedecer aos ditames traçados no art. 535 do CPC, ou seja, só serão cabíveis caso haja no decisório embargado omissão, contradição e/ou obscuridade.” (REsp 1225369/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 17.02.2011, DJe 10.03.2011)

Aqui, vê-se claramente que os embargantes tentam a reapreciação das razões de decidir do acórdão recorrido, já que se limitam a questio-nar matéria de fato suficientemente refutada no aresto combatido, sem apontar em que momento o aresto foi omisso, obscuro ou contraditório.

De se ter em conta que o não acolhimento das teses contidas no recurso não implica omissão, obscuridade ou contradição, pois ao jul-gador cabe apreciar a questão conforme o que ele entender relevante à lide. Não está o tribunal obrigado a julgar a matéria posta a seu exa-me nos termos pleiteados pelas partes, mas sim com o seu livre con-vencimento, consoante dispõe o art. 131 do Código de Processo Civil. Constata-se, em verdade, a irresignação dos recorrentes e a tentativa de emprestar aos embargos de declaração efeitos infringentes, o que não se mostra viável no contexto do art. 535 do Código de Processo Civil.

No mais, quanto à apreciação das provas, veja-se que sobre os fundamentos da decisão, fundamentos fáticos e jurídicos, não há nada

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que permita o debate nesta via recursal, sendo evidente o mero incon-formismo dos embargantes com o resultado que lhe foi desfavorável. Eventuais incorreções na apreciação dos fatos ou na aplicação do direito devem ser atacadas através dos recursos adequados.

E se um ou outro ponto não foi mais bem esmiuçado no acórdão, isso não basta para se justificar a interposição de embargos de declara-ção, pois já é pacífico nesta Corte de Justiça e no Superior Tribunal de Justiça que o julgador não está obrigado a se manifestar expressamente sobre todos os argumentos trazidos pelas partes, desde que tenha encon-trado razões suficientes para fundamentar sua convicção.

Sem mais, meu voto é no sentido de conhecer dos embargos de declaração para lhes negar provimento.

Rio de Janeiro, 1º de março de 2016.

Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto Desembargador Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do SulAgravo de Instrumento nº 70 067 355 388CNJ: 0420916‑58.2015.8.21.7000Sétima Câmara CívelComarca de Porto AlegreAgravante: Espólio de M. de L. P. A., representado pela inventariante R. P. A. P.Agravado: R. M. P. A. P.

agRavO De INSTRUmeNTO – INveNTáRIO – TeSTameNTO – paRTIlHa

1. Como a testadora dispôs apenas que determinado bem imóvel por ela referido deveria integrar obrigatoriamente o quinhão he-reditário da filha, estava se referindo evidentemente ao quinhão legitimário da filha, não se tratando de legado (sucessão a título singular) nem de instituição de herdeira testamentária em relação à parte disponível, pois inexiste tal referência. 2. Como a falecida não dispôs especificamente da parte disponível, a rigor cada filha herdaria em partes iguais, mas não foge do razoável a interpreta-ção da disposição testamentária dada pelo julgador a quo, de que a parte daquele bem referido, que ultrapassasse o quinhão legiti-mário constituiria um legado, mormente quando a outra herdeira necessária assentiu com tal interpretação. Recurso desprovido.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Se-nhoras Desª Liselena Schifino Robles Ribeiro e Desª Sandra Brisolara Medeiros.

Porto Alegre, 16 de março de 2016.

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Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Relator

rElAtório

Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (Relator):

Trata-se da irresignação do R. P. A. P., inventariante, com a r. de-cisão que determinou a correção do cálculo de liquidação e o plano de partilha, para o fim dela receber 25% a título de legítima, 5,787% a título de legado e 22,1065% a título de participação na parte disponível, e R. M. P. A. P. receber 25% a título de legítima e 22,1065% a título de participação na parte disponível, nos autos do inventário dos bens dei-xados por morte de M. L. P. A.

Sustenta a recorrente que a decisão do juízo a quo não observou que nos autos ocorrem a sucessão legítima, que é a parte devida aos herdeiros necessários, e a sucessão testamentária, que é a parte de livre disposição do titular. Alega que o imóvel testado é considerado um lega-do, o que somente existe em se tratando de sucessão testamentária. As-severa que, quando a testadora disse que o imóvel legado deve integrar o seu quinhão, significa que esta porção não está sujeita à conferência. Diz que o juízo a quo não tem competência para limitar a liberalidade do testador. Ressalta que residiu com a mãe no imóvel legado, estando sempre presente e prestando auxílio a ela. Aduz que é legatária e herdei-ra necessária do imóvel da Rua Visconde do Herval, nº 789, em Porto Alegre, pois esta foi a última vontade efetuada por sua mãe. Esclarece que, com a concordância da outra parte e do juízo, optou por solução a venda do imóvel legado, resultando o valor de R$ 560.000,00. Conta que desse valor, R$ 400.975,84 ficou a título de legado a ela, além de R$ 200.487,92, relativo à legítima. Pretende seja determinado o recebi-mento da parte disponível, e, forma de legado, decidido por sua mãe em testamento, bem como a parte legítima que compete a qualquer herdeiro necessário. Pede o provimento do recurso.

Intimada, R. M. P. A. P. apresentou contrarrazões, aduzindo que não há referência que o imóvel deveria ser integralmente da parte dis-ponível do patrimônio, mas sim que o quinhão hereditário deveria ser composto por esse bem. Ressalta que a partilha deve ser feita 50% para

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cada herdeira, constando no quinhão hereditário da recorrente o imóvel na Rua Visconde do Herval na parte em que não exceder a legítima. Considera que reformar a decisão agravada significaria que a recorrente receberia seu quinhão em valor muito superior à legítima que lhe cabe, desrespeitando a igualdade entre quinhões e a indisponibilidade da legí-tima. Pugna pelo desprovimento do recurso.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça lançou pare-cer opinando pelo conhecimento e pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

votos

Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (Relator):

Estou confirmando a decisão recorrida pelos seus próprios e jurí-dicos fundamentos.

Com efeito, no testamento deixado pela de cujus M. L. P. A. cons-tou que o prédio de nº 789 da Rua Visconde do Herval, em Porto Alegre, obrigatoriamente deveria integrar o quinhão hereditário de sua filha R. P. A. P. Ou seja, resta claro que a testadora apenas dispôs que o bem em questão integrasse obrigatoriamente o quinhão hereditário da filha, não tendo feito uso de sua parte disponível para testar em favor da filha, como pretende a recorrente.

Ou seja, quando a testadora dispôs que o bem imóvel por ela re-ferido deveria integrar obrigatoriamente o quinhão hereditário da filha, estava se referindo evidentemente ao quinhão legitimário da filha, isto é, não se tratava de um legado (sucessão a título singular) nem de ins-tituição de herdeira testamentária em relação à parte disponível, pois inexiste tal referência.

Portanto, como a falecida não dispôs especificamente da parte dis-ponível, a rigor cada filha herdaria em partes iguais, mas não foge do razoável a interpretação da disposição testamentária dada pelo julgador a quo, de que a parte daquele bem referido, que ultrapassasse o quinhão legitimário constituiria um legado, mormente quando a outra herdeira necessária assentiu com tal interpretação.

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Dessa forma, é flagrantemente descabido o pleito da recorrente que pretende receber a parte disponível, na qualidade de herdeira tes-tamentária, mais o quinhão hereditário na qualidade de herdeira neces-sária.

Com tal enfoque, estou acolhendo o parecer ministerial de lavra da ilustre Procuradora de Justiça Marcia Leal Zanotto Farina, que peço vênia para transcrever, in verbis:

Não merece provimento a inconformidade recursal.

Cuida-se do inventário dos bens deixados pelo falecimento de M. de L., ocorrido em 14.08.2007 (fl. 34), figurando como herdeiras as filhas R. e R.

Por testamento público lavrado em 09.05.2007 (fl. 28), a inventariada determinou “que integre obrigatoriamente o quinhão hereditário de sua filha R. P. A. P., o prédio de nº 789 e respectivo terreno, sitos na rua Vis-conde do Herval, nesta capital”.

O imóvel foi avaliado pela Fazenda em 17.01.2011, no valor de R$ 130.000,00, quando o Espólio totalizava R$ 422.256,20 (ut informa-ção fiscal, fl. 44), e foi vendido por R$ 560.000,00 em 16.12.2014 (ut escritura pública, fls. 58/60).

Em 30.06.2015, a inventariante R. apresentou o plano de partilha das fls. 61/65, o qual foi impugnado pela herdeira R., sob o fundamento de que o imóvel doado à agravante tratou-se de adiantamento de legítima e, portanto, deve ser trazido à colação para igualar as legítimas (fls. 67/68).

Assim dispôs a decisão recorrida (fl. 14):

“Insurge-se a herdeira R. contra o plano de partilha apresentado pela inventariante, uma vez que entende que o bem sito na rua Visconde do Herval, nº 789, e respectivo terreno, deixado em testamento pela de cujus à R., trata-se de adiantamento de legítima e, portanto, a her-deira deve trazer o bem à colação para igualar as legítimas.

Assiste razão a impugnante.

Com efeito, o testamento assim dispõe:

“[...] que integre obrigatoriamente o quinhão hereditário de sua filha R. P. A.

P. o prédio de número setecentos e oitenta e nove (789) e respectivo terreno

da Rua Visconde do Herval, nesta capital.”

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Em nenhum momento há referência que o bem deveria sair integral-mente da parte disponível do patrimônio, mas sim que o quinhão hereditário deveria ser composto por este bem.

Nesse norte, verifica-se que o testamento define tão somente que o bem em questão apenas integrará o quinhão hereditário de R., não saindo todo da parte disponível do patrimônio do espólio.

Assim, corrija-se o cálculo de liquidação e o plano de partilha para que os quinhões fiquem compostos da seguinte forma: R. receberá 25% a título de legítima, 5,787% a título de legado e 22,1065% a tí-tulo de participação na parte disponível, e R. M. receberá 25% a título de legítima e 22,1065% a título de participação na parte disponível.

[...]”

É de ser mantida a r. decisão.

Na dicção do art. 1.899 do Código Civil, “quando a cláusula testamen-tária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador”.

No caso, o testamento deixado por M. de L. apenas determinou que o imóvel da Rua Visconde do Herval integrasse, obrigatoriamente, o qui-nhão hereditário que seria destinado a R.

Conforme sinalou a representante do Ministério Público na origem (fl. 70v), “não há referência que tal bem devesse sair integralmente da parte disponível do patrimônio, mas sim que o quinhão hereditário deve-ria ser composto por este bem”.

Há de se atentar, ainda, ao fato de o “prédio de número setecentos e oitenta e nove (789) e respectivo terreno da Rua Visconde do Herval”, que, nos exatos termos em que redigido o testamento, deveria integrar o quinhão hereditário de R., foi alienado antes da elaboração do plano de partilha.

Assim, tomando-se como parâmetro a avaliação do monte mor efetiva-da pela Fazenda Pública em 2011 (total de R$ 422.256,20 – fl. 44, dos quais R$ 211.128,10 representam a parte disponível da inventariada), depreende-se que o imóvel avaliado em R$ 130.000,00 excedeu em R$ 24.435,95 a legítima de cada herdeira, arbitrada em R$ 105.564,05.

Outrossim, concorda-se com a representante do Ministério Público, na origem, no sentido de que a divisão da herança por percentuais permite maior clareza na verificação dos quinhões (fl. 70v).

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Observe-se que, na fl. 71, foi apurado que os R$ 24.435,95 excedentes à legítima e provenientes da parte disponível do patrimônio da de cujus, representam 5,787% do monte-mor e equivalem ao legado deixado em favor de R.

Neste contexto delineado, não merece reparos a decisão que determinou a correção do cálculo de liquidação e do plano de partilha para que os quinhões de R. e R. fossem compostos na forma explicitada no verso da fl. 14 do instrumento.

Pelo exposto, pelo conhecimento e não provimento do recurso, nos ter-mos deste parecer.

Isto posto, nego provimento ao recurso.

Desª Liselena Schifino Robles Ribeiro – De acordo com o(a) Relator(a).

Desª Sandra Brisolara Medeiros – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Jorge Luís Dall’Agnol – Presidente – Agravo de Instrumento nº 70067355388, Comarca de Porto Alegre:

“Negaram provimento. Unânime.”

Julgador(a) de 1º Grau: Oyama Assis Brasil de Moraes

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de Santa CatarinaMandado de Segurança nº 2015.033667‑1, de São Lourenço do OesteRelatora: Desª Hildemar Meneguzzi de Carvalho

maNDaDO De SegURaNÇa – HabIlITaÇÃO paRa O caSameNTO e SUpReSSÃO DO paTRONÍmIcO maTeRNO – SeNTeNÇa De ImpROceDÊNcIa – À lUZ Da INTeRpReTaÇÃO DO aRT. 1.565, § 1º, DO cóDIgO cIvIl, veRIFIca-Se TÃO SOmeNTe a pOSSIbIlIDaDe De acRÉScImO – INeXISTÊNcIa De mOTIvO jUSTO a eNSejaR a mODIFIcaÇÃO pReTeNDIDa – SeNTeNÇa cONFIRmaDa – ORDem DeNegaDa

I – Da leitura do art. 1.565, § 1º, do Código Civil, denota-se que não pairam dúvidas a respeito da possibilidade de acréscimo do sobrenome do outro nubente. Contudo, nada consta sobre a pos-sibilidade de supressão de qualquer sobrenome.

II – A retificação de registro civil não pode ser banalizada para a simples adequação do nome, em manifesto desrespeito à Lei de Registros Públicos.

“[...] A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabi-lidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro de gra-fia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública. Assim, o pedido de retificação de registro civil que não se funda em qualquer dessas hipóteses, não pode ser deferido.” (TJSC, Apelação Cível nº 2009.003897-2, de Caçador, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, J. 17.03.2009)

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Mandado de Segu-rança nº 2015.033667-1, da comarca de São Lourenço do Oeste (Vara Única), em que são impetrante P. P. e outro, e impetrado Juiz de Direito da Comarca de São Lourenco do Oeste:

A Câmara Especial Regional de Chapecó decidiu, por unanimidade, de-negar a ordem. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentís-simo Senhor Desembargador Raulino Jacó Brünning, com voto, e dele

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participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Felipe Siegert Schuch.

Funcionou como representante do Ministério Público, o Excelen-tíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Narcísio Geraldino Rodrigues.

Chapecó, 7 de dezembro de 2015.

Hildemar Meneguzzi de Carvalho Relatora

rElAtório

Perante o Juízo da Vara Única da Comarca de São Lourenço do Oeste, sobreveio sentença da lavra do Juiz de Direito Daniel Victor Gonçalves Emendörfer, cujo relatório adoto (fls. 49-50), por retratar fiel-mente os fatos trazidos aos autos:

O Sr. Oficial do Registro de Pessoas Naturais desta comarca traz a este juízo o litígio instaurado por conta de impugnação oposta pelo Ministério Público à habilitação para o casamento dos nubentes P. P. e P. Z. P.

Os nubentes formularam requerimento de habilitação para o ca-samento em que a mulher pretende a alteração de seu nome de solteira, com a inclusão de sobrenome do esposo, mas a exclusão de seu sobre-nome materno. Assim, de P. Z. P., pretende passar a chamar-se P. P. P.

O Ministério Público impugnou a habilitação, ao argumento de ser indevida a supressão do sobrenome materno.

Por sua vez, o oficial defende a possibilidade da pretensão dos nu-bentes pela interpretação do art. 555 do Código de Normas da CGJ-SC.

Os nubentes, cientes da impugnação, apresentaram contestação às fls. 33-37, onde também defendem a possibilidade de supressão par-cial do sobrenome de solteiro, com base na mesma legislação.

É o relatório.

Processado o feito, sobreveio a sentença que acolheu a impugna-ção à habilitação para o casamento de P. P. e P. Z. P. e negou a homo-logação da habilitação para o casamento.

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Irresignados com a decisão, P. P. e P. Z. P. interpuseram mandado de segurança, com pedido liminar, contra a decisão que julgou proce-dente a impugnação à habilitação de casamento apresentada pelo Mi-nistério Público e negou a homologação nos moldes em que requerida pelos impetrantes.

Sustentaram que é possível os nubentes optem pela supressão do sobrenome de origem a fim de acrescentar o sobrenome do futuro côn-juge. Ao final, pugnaram pela concessão da ordem para que seja homo-logada a habilitação para o seu casamento com a consequente autori-zação para a impetrante suprimir o sobrenome materno e acrescentar o patronímico do futuro para chamar-se P. P. P.

Às fls. 84-86 o ilustre Relator concedeu a gratuidade judiciária e indeferiu a liminar pleiteada.

Autoridade impetrada prestou informações à fl. 94.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Mário Gemin, que opinou pela denegação da ordem.

Este é o relatório.

voto

Trata-se de mandado de segurança impetrado por P. P. e P. Z. P. Contra decisão do Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de São Lourenço do Oeste, o qual indeferiu pedido de habilitação para o casa-mento dos nubentes.

Preambularmente destaca-se que não cabe recurso da decisão proferida nos autos de impugnação à habilitação de casamento, a teor do art. 68, § 2º, da Lei nº 6.015/1973:

Art. 68. Na habilitação para o casamento, os interessados, apresentando os documentos exigidos pela lei civil, requererão ao oficial do registro do distrito de residência de um dos nubentes, que lhes expeça certidão de que se acham habilitados para se casarem.

§ 1º Autuada a petição com os documentos, o oficial mandará afixar pro-clamas de casamento em lugar ostensivo de seu cartório e fará publicá--los na imprensa local, se houver; em seguida abrirá vista dos autos ao ór-

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gão do Ministério Público, para manifestar-se sobre o pedido e requerer o que for necessário à sua regularidade, podendo exigir a apresentação de atestado de residência firmado por autoridade policial.

§ 2º Se o órgão do Ministério Público impugnar o pedido ou a documen-tação, os autos serão encaminhados ao Juiz, que decidirá sem recurso.

[...]

Nessa toada, verifica-se que os nubentes insistem na existência de direito líquido e certo para suprimir o patronímico paterno para acrescer o patronímico do noivo, e, na hipótese de inexistência de recurso, per-feitamente possível o manejo da ação mandamental.

No mérito, com a devida vênia, embora os argumentos lançados pelos impetrantes, não se verifica a existência de direito líquido e certo.

Dispõe o art. 1.565, § 1º, do Código Civil:

Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.

§ 1º Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobre-nome do outro.

Da leitura do aludido preceito legal, denota-se que não pairam dúvidas a respeito da possibilidade de acréscimo do sobrenome do outro nubente. Contudo, nada consta sobre a possibilidade de supressão de qualquer sobrenome.

Por outro lado, os arts. 57 e 58 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973), preconizam:

Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motiva-damente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sen-tença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei.

[...]

Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substitui-ção por apelidos públicos notórios.

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Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em ra-zão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público.

Nesta senda, apesar de vigorar o princípio da imutabilidade do nome, admite-se a alteração em situações excepcionais, como erro grá-fico, exposição ao ridículo, justificada preferência por apelidos públicos notórios e também fundada em ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime.

Entretanto, não é o que se vislumbra na espécie, pois o sobrenome materno não expõe a impetrante ao ridículo, muito menos causa-lhe constrangimento.

Além disso, a retificação de registro civil não pode ser banalizada para a simples adequação do nome, em manifesto desrespeito à Lei de Registros Públicos.

Nesse sentido, extrai-se da promoção ministerial (fl. 99):

E, considerando que essa possibilidade de alteração prevista no art. 1.565, § 1º, do CC, é exceção à regra da imutabilidade do nome (arts. 57 e 58 da Lei de Registros Públicos – Lei nº 6.015/1973), deve ela ser aplicada de forma restritiva.

Desse modo, embora não se desconheça os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais em sentido diverso, entende-se que a supressão de so-brenome não é possível, mas tão somente o acréscimo.

Sobre o assunto, há precedentes:

APELAÇÃO – RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL – SUPRESSÃO DO SOBRENOME MATERNO – IMPOSSIBILIDADE – A possibilidade de al-teração de nome no casamento constitui exceção dentro da regra geral de imutabilidade e, sendo exceção, deve ser interpretada restritivamente. Recurso desprovido. (TJRS, Apelação Cível nº 70066918384, 7ª C.Cív., Relª Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 26.10.2015)

E ainda:

DIREITO CIVIL – AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL – PRE-TENDIDA A SUPRESSÃO DO PRENOME PELO AGNOME – IMPOSSIBI-

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LIDADE – PRENOME QUE NÃO EXPÕE O AUTOR AO RIDÍCULO OU LHE ACARRETE CONSTRANGIMENTO – ALTERAÇÃO DESNECESSÁ-RIA NA HIPÓTESE – INTELIGÊNCIA DO ART. 58 DA LEI Nº 6.015/1973 – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVI-DO – A regra geral no ordenamento jurídico pátrio é o da imutabilidade do nome. A exceção só se admite nos casos de erro de grafia, exposição ao ridículo ou se houver relevante razão de ordem pública. Assim, o pedido de retificação de registro civil que não se funda em qualquer dessas hi-póteses, não pode ser deferido. (TJSC, Apelação Cível nº 2009.003897-2, de Caçador, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, J. 17.03.2009)

Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça já julgou:

REGISTRO CIVIL – ALTERAÇÃO DO NOME, MEDIANTE SUPRESSÃO, EM PARTE, DO REEXAME E DO PATRONÍMICO MATERNO – INVIA-BILIDADE – APÓS O DECURSO DO PRIMEIRO ANO DA MAIORI-DADE, SÓ SE ADMITEM MODIFICAÇÕES DO NOME EM CARÁTER EXCEPCIONAL E MEDIANTE COMPROVAÇÃO DE JUSTO MOTIVO – NÃO SE JUSTIFICA A ALTERAÇÃO DO NOME O SIMPLES FATO DE SER O INTERESSADO CONHECIDO PROFISSIONALMENTE PELA SUA FORMA ABREVIADA – RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. (REsp 33.855/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, 4ª T., Julgado em 22.11.1994, DJ 13.03.1995, p. 5300)

Desta feita, não lograram êxito os impetrantes em demonstrar mo-tivo justo a ensejar a retificação do registro civil da nubente, razão pela qual deve prevalecer a regra da imutabilidade do nome.

Ante o exposto, o voto é pela denegação da ordem.

Este é o voto.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de São PauloVoto nº 15162AI 2233803‑34.2015.8.26.0000Registro: 2016.0000201945Comarca: São PauloAgte.: C. R. C.Agdos.: N. R. O. O. (inventariante) e outroInt.: I. O. de O.

agRavO De INSTRUmeNTO – DecISÃO INTeRlOcUTóRIa QUe INDeFeRIU O peDIDO De TUTela aNTecIpaDa paRa gaRaNTIR DIReITO Real De HabITaÇÃO SObRe Imóvel De eX-cOmpaNHeIRO em aÇÃO De INveNTáRIO – peDIDO a SeR apRecIaDO pelO jUÍZO ONDe TRamITa a aÇÃO De RecONHecImeNTO De UNIÃO HOmOaFeTIva pOST mORTem – NegaDO pROvImeNTO aO RecURSO.

O agravante insurge-se contra decisão interlocutória à fl. 202 do instrumento, que indeferiu o pedido de tutela antecipada para garantir--lhe direito real de habitação sobre imóvel de ex-companheiro, filho dos agravados, por entender que a matéria deveria ser apreciada nos autos da ação de reconhecimento de união homoafetiva post mortem, pen-dente de julgamento.

Alega que juntou farta documentação que comprova a convivên-cia em união estável com Fabio no período de agosto de 1999 até a data do óbito, em 22 de julho de 2014.

Entende que não deveria prevalecer a limitação prevista no caput do art. 1790 do Código Civil, devendo ser reconhecido seu direito à he-rança sobre a totalidade dos bens deixados pelo de cujus, bem como o direito real de habitação do imóvel.

Indeferido o pedido de efeito suspensivo.

Dispensadas a contraminuta e informações.

É o relatório.

O agravante requer o reconhecimento do direito real de habitação do único imóvel objeto de inventário dos bens deixados por F. O. de O.

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Relata que ajuizou ação de reconhecimento de união homoafeti-va, pendente de julgamento.

O de cujus é detentor da nua-propriedade do imóvel objeto do pedido, cujo usufruto foi instituído em favor de seus pais, ora agravados, em 28 de julho de 2002.

Os pedidos de inclusão do companheiro na sucessão dos bens do de cujus e consequentemente o reconhecimento do direito real de habi-tação somente poderão ser apreciados após o reconhecimento de união homoafetiva, que se processa em ação própria, pendente de julgamento.

Por ora, o agravante não dispõe de qualquer título jurídico oponí-vel ao direito dos agravados, a justificar sua permanência, uso, disponi-bilidade e fruição do imóvel em litígio.

Assim, mantenho a decisão agravada.

Para que não se alegue omissão, menciono que o Novo Código de Processo Civil, ao estabelecer parâmetros inéditos para arbitramento de honorários de advogado, criou direito material.

Assim, as relações pretéritas não podem ser atingidas. Os honorá-rios de advogado segundo a lei nova devem, em tese, ser arbitrados em primeira instância para ações ajuizadas a partir de 18 de março de 2016, data de sua entrada em vigor, e os honorários recursais, para recursos interpostos contra sentenças publicadas a partir dessa mesma data.

Pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

Lucila Toledo Relatora

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2233803-34.2015.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante C. R. C., são agravados N. R. O. de O. (Inventariante) e F. O. de O. (Espólio).

Acordam, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao re-

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curso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Alexandre Lazzarini (Presidente sem voto), José Aparício Coelho Prado Neto e Angela Lopes.

São Paulo, 29 de março de 2016.

Lucila Toledo Relatora Assinatura eletrônica

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência

7678 – Ação de indenização – abandono afetivo – não ocorrência – ato ilícito

“Recurso especial. Civil. Direito de família. Ação de indenização. Abandono afetivo. Não ocorrência. Ato ilícito. Não configuração. Art. 186 do Código Civil. Ausência de demonstração da configuração do nexo causal. Súmula nº 7/STJ. Incidência. Pacta corvina. Venire contra factum proprium. Vedação. Ausência de prequestionamento. Dis-sídio jurisprudencial. Não caracterizado. Matéria constitucional. 1. A possibilidade de compensação pecuniária a título de danos morais e materiais por abandono afetivo exige detalhada demonstração do ilícito civil (art. 186 do Código Civil) cujas especificidades ultrapassem, sobremaneira, o mero dissabor, para que os sentimentos não sejam mercan-tilizados e para que não se fomente a propositura de ações judiciais motivadas unicamen-te pelo interesse econômico-financeiro. 2. Em regra, ao pai pode ser imposto o dever de registrar e sustentar financeiramente eventual prole, por meio da ação de alimentos com-binada com investigação de paternidade, desde que demonstrada a necessidade concre-ta do auxílio material. 3. É insindicável, nesta instância especial, revolver o nexo causal entre o suposto abandono afetivo e o alegado dano ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 4. O ordenamento pátrio veda o pacta corvina e o venire contra factum proprium. 5. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, não provido.” (STJ – REsp 1.493.125 – (2014/0131352-4) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 01.03.2016 – p. 1525)

7679 – Alimentos – citação – retroação

“Agravo regimental no recurso especial. Ação de alimentos. Aplicação do art. 13, § 2º, da Lei nº 5.478/1968. Retroação à data da citação. Agravo regimental improvido. 1. No julgamento do EREsp 1.181.119/RJ, a Segunda Seção desta Corte firmou orientação no sentido de que os efeitos da sentença proferida em ação de revisão de alimentos, inde-pendentemente de referir-se a aumento, redução ou exoneração, retroage à data da cita-ção. 2. Se a parte agravante não apresenta argumentos hábeis a infirmar os fundamentos da decisão regimentalmente agravada, deve ela ser mantida por seus próprios funda-mentos. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.502.691 – (2014/0322958-6) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 01.04.2016 – p. 1159)

7680 – Alimentos – execução – devedor – inscrição em cadastros de restrição ao crédito – possibilidade

“Recurso especial. Direito de família. Processual civil. Alimentos. Execução. Devedor. Inscrição em cadastros de restrição ao crédito. Inscrição. Possibilidade. Direito à vida digna. Ausência de impedimento legal. Coerção indireta. Melhor interesse do alimentan-do. Inovação legislativa. Arts. 528 e 782 do novo Código de Processo Civil. 1. É possível, à luz do melhor interesse do alimentando, na execução de alimentos de filho menor, o protesto e a inscrição do nome do devedor de alimentos nos cadastros de proteção ao crédito. 2. Não há impedimento legal para que se determine a negativação do nome de contumaz devedor de alimentos no ordenamento pátrio. 3. O mecanismo de prote-ção que visa salvaguardar interesses bancários e empresariais em geral (art. 43 da Lei nº 8.078/1990) pode garantir direito ainda mais essencial relacionado ao risco de vida, que violenta a própria dignidade da pessoa humana e compromete valores superiores à mera higidez das atividades comerciais. 4. O legislador ordinário incluiu a previsão

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de tal mecanismo no Novo Código de Processo Civil, como se afere da literalidade dos arts. 528 e 782. 5. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.469.102 – (2014/0167348-7) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 15.03.2016 – p. 2819)

7681 – Alimentos – execução – penhora dos valores decorrentes da aposentadoria por invalidez

“Agravo de instrumento. Execução de alimentos. Penhora dos valores decorrentes da aposentadoria por invalidez. Reforma da decisão. Levantamento da penhora autorizado. Considerando a existência de valores pagos e não contabilizados pela Contadoria que, somados, demonstram o adimplemento da dívida, de ser deferido o levantamento da constrição. Agravo de instrumento provido.” (TJRS – AI 70066334384 – 7ª C.Cív. – Rel. Des. Jorge Luís Dall’Agnol – J. 16.12.2015)

7682 – Alimentos – fixação de pensão complementar – avós paternos – possibilidade

“Agravo regimental. Recurso especial. Alimentos. Fixação de pensão complementar. Avós paternos. Possibilidade. Complementação. 1. ‘A responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos não é apenas sucessiva, mas também complementar, quando demonstrada a insuficiência de recursos do genitor’ (REsp 579.385/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, DJ de 04.10.2004). 2. Na hipótese, entender sobre a desnecessidade de com-plementação alimentar pelos avós, haja vista o acordo judicial do pai em ação revisio-nal de alimentos, demandaria a revisão do contexto fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.358.420 – (2011/0284906-4) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 21.03.2016 – p. 1103)

Comentário Editorial SÍnTESECuida-se de agravo regimental em face da decisão monocrática assim ementada:

“RECURSO ESPECIAL – ALIMENTOS – FIXAÇÃO DE PENSÃO COMPLEMENTAR – AVÓS PATERNOS – POSSIBILIDADE – COMPLEMENTAÇÃO

1. ‘A responsabilidade dos avós de prestar alimentos aos netos não é apenas sucessiva, mas também complementar, quando demonstrada a insuficiência de recursos do genitor’ (REsp 579.385/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, DJ de 04.10.2004).

2. Na hipótese, entender sobre a desnecessidade de complementação alimentar pelos avós, haja vista o acordo judicial do pai em ação revisional de alimentos, demandaria a revisão do contexto fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ.

3. Recurso especial não provido.”

Aduziu que é possível a incursão sobre o conjunto fático-jurídico em sede de recurso espe-cial no tocante à “desnecessidade de complementação alimentar pelos avós”.

Salientou que “os agravantes se encontram, atualmente, na casa dos 80 (oitenta anos) e vêm pagando, há mais de oito de oito anos pensão alimentícia complementar àquela, que o pai destina às suas filhas, no importe de três salários mínimos para cada uma delas. Filhas e netas estas que, pelo padrão de vida proporcionado por sua mãe, em nada, abso-lutamente nada, necessitam de complementação alimentar”.

Sustentou que o teria havido prequestionamento implícito dos arts. 1.698 e 1.703 do CC.

Repisou os fundamentos de que a obrigação alimentar é sucessiva, havendo de ser cum-prida, em primeiro lugar, pelos pais, advindo a obrigação avoenga apenas na falta da-

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queles, sendo esta última subsidiária e complementar e assim, na hipótese, “apesar de provada a circunstância de que o pai vem cumprindo a sua parte no pagamento dos alimentos, enquanto a mãe goza de um elevado padrão de vida a lhe ofertar possibilidade plena de complementar, com sua parte, os alimentos devidos às filhas, veio a condenar os avós no pagamento de alimentos, em divergência evidente com o acórdão paradigma posto em confronto”.

Os agravantes recorreram, em síntese, ao fundamento de que não haveria responsabi-lidade dos avós, na hipótese, na prestação de alimentos aos netos, haja vista que não necessitariam, pois os pais são vivos, embora separados, e que os alimentandos possuem elevado padrão de vida.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Vale trazer trecho do voto do relator:

“Portanto, evidenciado está que os agravantes não trouxeram nenhum argumento capaz de infirmar a decisão ora hostilizada, pelo que entendo há de ser mantida por seus pró-prios fundamentos.

Por fim, quanto à alegação de que agora a agravada R. D. A. A. já contaria com 23 anos de idade, teria concluído o curso de Direito e estaria trabalhando no escritório de advoca-cia do padrasto, tal questão não pode ser apreciada nesse momento processual, mas tal fato pode dar azo à nova ação revisional ou exoneratória de alimentos pelos agravantes.”

O eminente Jurista Silvio de Salvo Venosa, ao comentar o dispositivo civil, assim elucida:

“Desse modo, atende-se processualmente ao princípio da divisibilidade da obrigação ali-mentícia, permitindo-se que, no mesmo processo, sejam outros alimentantes chamados a integrar a lide. A lei processual deve traçar normas concretas para possibilitar a eficiência do dispositivo.

De qualquer forma, são chamados a prestar alimentos, primeiramente, os parentes em linha reta, os mais próximos, excluindo os mais remotos. Assim, se o pai puder prestar alimentos, não se acionará o avô. O mesmo se diga do alimentando que pede alimentos ao neto, porque o filho não tem condições de pagar. Não havendo parentes em linha reta, ou estando estes impossibilitados de pensionar, são chamados para a assistência alimentícia os irmãos, tanto unilaterais como germanos. Apontemos que somente os irmãos estarão obrigados a alimentar na linha colateral. Os demais parentes e afins são excluídos dessa obrigação legal em nosso ordenamento. Não ficam excluídos, contudo, dentro do limite legal, os filhos ilegítimos e os adotivos, mormente depois que a Constituição de 1988, no art. 227, § 6º, equiparou os filhos de qualquer natureza. [...]” (Direito Civil: direito de família. São Paulo: Atlas, 2004. p. 396-397)

Interessa ao tema destacar os comentários de Maria Helena Diniz, em seu Curso de Direito Civil:

“Nada obsta, havendo pluralidade de obrigados do mesmo grau que se cumpra a obri-gação alimentar por concurso entre parentes, contribuindo cada um com a quota pro-porcional aos seus haveres; se a ação de alimentos for intentada contra um deles, os demais poderão ser chamados a integrar a lide (CC, art. 1.698) para contribuir com sua parte, distribuindo-se a dívida entre todos. Na sentença, o juiz rateará entre todos a soma arbitrada e proporcional às possibilidades econômicas de cada um, exceto aquele que se encontra financeiramente incapacitado, e assim cada qual será responsável pela sua parte. Se, por acaso, algum dos obrigados suportar o encargo, satisfazendo, totalmente, o necessitado, não há o que se exigir dos outros. Não há, portanto, solidariedade, por ser divisível a obrigação.” (Curso de Direito Civil brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 5, p. 471)

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7683 – Bem de família – compromisso de compra e venda de imóvel – penhorabili-dade

“Agravo regimental. Processo civil e civil. Execução de sentença. Compromisso de com-pra e venda de imóvel. Bem de família. Penhorabilidade. Dívida oriunda de negócio envolvendo o próprio imóvel. Aplicação, por analogia, da exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. 1. a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. Possibi-lidade de se penhorar bem de família. Deve ser estendida também aos casos em que o proprietário firma contrato de promessa de compra e venda do imóvel e, após receber parte do preço ajustado, se recusa a adimplir com as obrigações avençadas ou a restituir o numerário recebido, e não possui outro bem passível de assegurar o juízo da execução. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 806.099 – (2015/0279073-6) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 14.03.2016 – p. 2576)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento a agravo ante a deserção do recurso especial – ilegibilidade das guias de recolhimento das custas.

Em suas razões, alegaram os agravantes que a guia do preparo encontra-se perfeitamente legível atendendo, assim, todas as exigências processuais.

O agravo interposto foi contra decisão que inadmitiu recurso especial pelas razões se-guintes:

a) não demonstração da alegada ofensa de dispositivos legais apontados no recurso es-pecial;

b) incidência da Súmula nº 7/STJ;

c) não houve demonstração da divergência jurisprudencial nos moldes exigidos pela legis-lação processual civil; e

d) indispensabilidade da demonstração analítica entre a tese enunciada na súmula indica-da e a adotada no acórdão impugnado.

Alegou a parte agravante, em síntese, que o recurso especial atendeu aos requisitos de admissibilidade, razão pela qual requer o seu processamento.

O recurso especial foi interposto contra acórdão assim ementado:

“Contrato imobiliário. Rescisão por inadimplemento. Pretensão dos agravantes à não de-volução do bem relativo ao contrato rescindido, já que se trataria de bem de família, seria o único de que titulares e lá estabeleceram residência. Descabimento, a isenção legal não operando efeitos em hipótese dessa ordem. Agravo improvido, cassada a inicial suspensividade.”

Aduziu a parte recorrente violação do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, ao argumento de que o bem penhorado é bem de família. Requer, assim, a desconstituição da penhora feita sobre ele.

Aduziu que, ao caso não pode ser aplicado, por analogia, o art. 3º da Lei nº 8.009/1990.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

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No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenho-rabilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respec-tivos incisos, quais sejam:a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;c) crédito decorrente de pensão alimentícia;d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;f) aquisição do imóvel com produto de crime;g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civilista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanên-cia, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)A Desembargadora Fátima Nancy Andrighi nos ensina sobre o registro da penhora e a reforma do CPC:“Dentre as alterações introduzidas no Processo de Execução, uma das mais importantes e que, ao mesmo tempo, tem causado polêmica quanto à sua interpretação, é a contida no 4º do art. 659, cujo teor é o seguinte: ‘Art. 659. Se o devedor não pagar, nem fizer nomeação válida, o oficial de justiça penhorar-lhe-á tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal, juros, custas e honorários advocatícios.1º Efetuar-se-á a penhora onde quer que se encontrem os bens, ainda que em repartição pública; caso em que precederá requisição do juiz ao respectivo chefe. 2º Não se levará a efeito a penhora, quando evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução. 3º No caso do parágrafo anterior e bem assim quando não encontrar quaisquer bens penhoráveis, o oficial descreverá na certidão os que guarnecem a residência ou o estabe-lecimento do devedor.4º A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, e inscri-ção no respectivo registro.’Inegavelmente, a nova disposição legal vem contribuir para melhor disciplinar questão antiga em torno da alienação judicial de bem imóvel penhorado, quando este já não mais integra o patrimônio do devedor: fato que causa danos irreparáveis ao direito do cidadão e conduz ao desprestígio da Justiça. A exigência do registro da penhora justifica-se como meio de ser evitado que terceiro de boa-fé, na certeza de estar fazendo um bom negócio, invista os seus recursos na aquisição de um bem imóvel que poderá perder, isso por força de um processo cuja existência nem sempre tem condições de conhecer. É o que acontece, por exemplo, quando os atos de excussão da execução por quantia certa são realizados através de carta precatória. De outra parte, justifica-se a exigência do registro da penhora sob a óptica do credor, que tem a expectativa de, obedecendo rigorosamente aos trâmites processuais, vir a obter a satisfação do seu crédito após a realização da praça. Induvidosamente, a pretensão do credor não deverá violar direito de terceiro que não participa da relação processual e, tampouco, da relação de direito material de débito e crédito. Neste momento exsurge o valor, inestimável, do registro da penhora no álbum imobiliário.O registro da penhora atende aos princípios que nortearam a reforma processual. Visou, em primeiro plano, à efetividade da justiça, pois, não raras vezes, o credor realiza a hasta pública e, somente após a alienação judicial, vem constatar que o bem não mais pertence ao devedor, caso no qual, não restando caracterizada a fraude de execução, se torna necessário penhorar outros bens de propriedade do devedor e sobre eles processar

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novamente toda a arrematação (avaliação e hasta pública), o que redunda em contramar-cha do processo.

O registro da penhora atende, outrossim, à agilização do processo, evitando o ajuizamento de outra ação, mais especificamente os embargos de terceiro, opostos por aquele que – não sendo parte no processo de execução – sofra turbação ou esbulho na posse de seu bem imóvel; primando, também, por evitar a instalação de incidentes processuais, como o de reconhecimento de ineficácia do ato de alienação, na hipótese o incidente de fraude de execução, ou dos correspondentes recursos cabíveis na espécie.

[...]

O ato do registro da penhora visa a dar conhecimento, a terceiro, de estar aquele bem à disposição da Justiça, pendendo sobre ele gravame. Cumpre observar-se que a exigência imposta no § 4º do art. 659 há de ser cumprida antes da realização da hasta pública, isto é, da praça, com o fim de evitar que a Justiça se desprestigie procedendo à alienação de bem que não mais pertença ao devedor e evitando, ainda, que terceiros possam vir a alegar boa-fé na aquisição de bem sobre o qual pende gravame de penhora, propiciando seja presumida a fraude de execução iure et iure.

Com a nova regra, fica definida a fraude de execução, pois, conforme o disposto no art. 240 da Lei dos Registros Públicos, ‘o registro da penhora faz prova contra qual-quer transação posterior’. A adoção do entendimento pretoriano que presume a fraude de execução quando o ato de alienação, ou oneração, ocorra após a penhora, considerado atentatório à dignidade da Justiça, por tornar inócuos os seus atos, sem tecer maiores questionamentos, é passível de causar injustiças, pois a ausência do registro da penhora, ainda se a alienação ocorreu após o gravame, impossibilita que o adquirente tenha infor-mações seguras a respeito do desembaraço do imóvel.

[...]

Outra exegese não se pode conferir ao § 4º do art. 659, porque todas as demais preco-nizadas se antagonizam com os princípios que nortearam a reforma, quais sejam os da efetividade, agilização e simplificação dos atos processuais.

A hermenêutica empregada na compreensão dos dispositivos reformados não deverá ja-mais se distanciar dos referidos princípios, sob pena de negar-se a adequada utilização a esse instrumento idôneo de amoldamento da legislação processual civil, num esforço de modernização e de simplificação, às exigências dos novos tempos.” (O registro da penhora e a reforma do CPC. Disponível em: online.sintese.com. Acesso em: 24 maio 2013)

7684 – Bem de família – execução – constrição de imóvel de propriedade de socie-dade comercial utilizado como residência dos sócios – impenhorabilidade

“Embargos de declaração recebidos como agravo regimental no agravo em recurso es-pecial. Processual civil. Execução. Constrição de imóvel de propriedade de sociedade comercial utilizado como residência dos sócios. Bem de família. Impenhorabilidade reconhecida. Art. 1º da Lei nº 8.009/1990. Precedentes. Agravo não provido. 1. A ju-risprudência do STJ tem, de forma reiterada e inequívoca, pontuado que o benefício conferido pela Lei nº 8.009/1990 se trata de norma cogente, que contém princípio de ordem pública, e sua incidência somente é afastada se caracterizada alguma hipótese descrita no art. 3º da Lei nº 8.009/1990. 2. A jurisprudência desta egrégia Corte orienta--se no sentido de considerar que é ‘impenhorável a residência do casal, ainda que de propriedade de sociedade comercial’ (REsp 356.077/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., J. 30.08.2002, DJ de 14.10.2002, p. 226). Precedentes. 3. Embargos declaratórios recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.” (STJ – EDcl-Ag-RE 511.486 – (2014/0103291-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 10.03.2016 – p. 1238)

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7685 – Bem de família – penhora – embargos de terceiro – imóvel alienado em frau-de à execução

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Penhora. Embargos de terceiro. Imóvel alienado em fraude à execução. Bem de família. Reexame de prova. 1. Não se admite o recurso especial quando sua análise depende de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. ‘Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orien-tação do tribunal de firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula nº 83/STJ). No caso, em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior, o Tribunal de origem recusou a proteção da Lei nº 8.009/1990 com relação a imóvel alienado entre membros da família para fraudar execução. 3. Agravo regimental a que se nega provi-mento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 125.537 – (2011/0293432-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1046)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto por Danielle Rocha e João Vitor Rocha Ferro con-tra decisão mediante a qual neguei provimento a agravo em recurso especial, por aplicar ao caso as Súmulas nºs 7 e 83 do STJ.O acórdão recorrido, do TJRS, tem a seguinte ementa:APELAÇÕES CÍVEIS – RECURSO ADESIVO – EMBARGOS E TERCEIRO – ILEGITIMIDADE ATIVA – CERCEAMENTO DE DEFESA DO EXECUTADO – AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO DOS EMBARGANTES PARA INVOCÁ-LA – BEM DE FAMÍLIA – FRAUDE À EXECUÇÃO – EFEITOS – MEAÇÃO1. Patente a ilegitimidade ativa da embargante Rita para opor embargos em defesa de sua meação, já que doou o imóvel a sua filha e, consequentemente, não possui direito, patrimonial sobre o bem que reivindica.2. Inviabilidade de os apelantes alegarem cerceamento de defesa em nome do executado, devendo este, se for o caso, vir a juízo reclamar seus direitos.3. Fraude à execução já reconhecida em outro processo, cujos efeitos se estendem a este, pela indivisibilidade da situação jurídica. Tratando-se de ineficácia o ato, e não de invalidade, fica aquela restrita doação da parte do devedor, sem atingir a doação feita pela embargante Rita.4. Impossibilidade de se invocar a impenhorabilidade do imóvel, por se tratar de bem de família, quando tenha sido reconhecida a fraude à execução. Precedentes do STJ nesse sentido. Entendimento contrário poderia esvaziar os efeitos de eventual reconhecimento de fraude à execução relacionada a imóvel residencial.5. Impugnação à avaliação do imóvel rejeitada. Apelações e recurso adesivo desprovidos.A agravante alegou violação dos arts. 1º e 5º da Lei nº 8.009/1990, além de dissídio jurisprudencial. Sustentam que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de famí-lia, e a constrição do imóvel atinge outros integrantes da família, terceiros embargantes.Os agravantes afirmaram que não se aplicam ao caso as referidas Súmulas. Sustentaram que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de família.O STJ negou provimento ao agravo regimental.O relator afirmou que aplica-se ao caso a Súmula nº 83 do STJ e que o dissídio jurispru-dencial não ficou caracterizado, pois não destacadas as circunstâncias que assemelhas-sem os casos confrontados, o que seria mesmo inviável diante da incidência das súmulas citadas.Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

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O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenho-rabilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respec-tivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civilista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanên-cia, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

7686 – Bem de família – penhora – imóvel residencial – acervo hereditário – único bem – impenhorabilidade

“Recurso especial. Direito civil. Família e sucessões. Execução fiscal. Penhora. Imóvel residencial. Acervo hereditário. Único bem. Impenhorabilidade. Bem de família. Lei nº 8.009/1990. Direito constitucional à moradia. Dignidade da pessoa humana. Arts. 1º, III, e 6º da Constituição Federal. 1. A proteção instituída pela Lei nº 8.009/1990 impede a penhora sobre direitos hereditários no rosto do inventário do único bem de família que compõe o acervo sucessório. 2. A garantia constitucional de moradia realiza o princípio da dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III, e 6º da Constituição Federal). 3. A morte do devedor não faz cessar automaticamente a impenhorabilidade do imóvel caracterizado como bem de família nem o torna apto a ser penhorado para garantir pagamento futuro de seus credores. 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.271.277 – (2011/0128495-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 28.03.2016 – p. 1320)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais assim ementado:

“[...]

Porque visa proteger um direito reconhecido na CF como direito fundamental, qual seja, o direito à moradia (art. 6º) a impenhorabilidade do bem de família é considerada matéria de ordem pública, daí porque poderá ser analisada até mesmo de ofício, a qualquer tem-po, não havendo que se falar em intempestividade dos embargos.

A impenhorabilidade do imóvel destinado à residência familiar pode ser arguida por sim-ples petição no processo de execução ou mediante o ajuizamento da ação de embargos, sendo esta via a mais apropriada quando houver necessidade de produzir-se prova, eis que a execução, enquanto processo dialético, não tem sua índole voltada para o contraditório.

Em sendo realizada a penhora no rosto do inventário, não há como se garantir a proteção da Lei nº 8.009/1990, eis que nestes casos a penhora se faz sobre os direitos hereditá-

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rios, e não sobre determinado bem imóvel, não sendo aqueles garantidos pelas normas de impenhorabilidade previstas na legislação citada.”

Noticiam os autos que a viúva e filha do autor da herança, respectivamente, ajuizaram ação de embargos à penhora em execução fiscal movida pela Fazenda Pública do Es-tado de Minas Gerais contra Ubercaminhões Ltda. para cobrança de ICMS no valor de R$ 18.445,58 (dezoito mil quatrocentos e quarenta e cinco reais e cinquenta e oito cen-tavos) declarado pelo contribuinte, o de cujus, e não recolhido.

As requerentes afirmaram que a penhora determinada pelo Juízo fazendário, realizada em 16.10.2008 no rosto dos autos do inventário dos bens deixados pelo falecido, estaria atingindo bem de família, a saber, o imóvel em que residem, único a ser inventariado, razão pela qual, à luz do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, deveria ser considerado impe-nhorável.

Na inicial, a primeira requerente sustenta ter sido casada com o falecido em regime de comunhão parcial de bens motivo pelo qual metade do imóvel penhorado lhe pertenceria, nos termos do art. 1.660 do Código Civil, não podendo, “sob hipótese nenhuma, respon-der pela execução em tela”, especialmente porque nenhuma das requerentes figuraria no quadro societário da empresa executada. Ao final, ambas requerem a procedência do pedido para que a decretação da nulidade da penhora seja feita no rosto dos autos do processo da ação de inventário que tramita perante a 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Uberlândia/MG (nº 0702.05.227408-2).

O Estado de Minas Gerais, em impugnação, aduziu que o executado, a quem incumbe o ônus para tanto, não demonstrou que o imóvel teria natureza de bem de família.

O juízo de primeiro grau recebeu o feito como embargos de terceiro e julgou procedente o pedido, reconhecendo a condição de bem de família do imóvel descrito na exordial, assegurando sua impenhorabilidade à luz da Lei nº 8.009/1990, pois, “a despeito dos bens do de cujus responderem pelos débitos fiscais existentes em seu nome, constata-se que, no caso presente, restou comprovado que as embargantes, há vários anos, residem no imóvel em relação ao qual recaiu a constrição”, não havendo dúvida que “constitui bem de família, não sendo, portanto, passível de penhora”.

Inconformado, o Estado de Minas Gerais apresentou apelação.

Nas razões do especial (e-STJ fls. 140-145), as recorrentes sustentam violação do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, visto que a penhora sobre direitos hereditários no rosto do inventário não poderá prevalecer, sob pena de violação do direito à moradia, porquanto demonstrado que os direitos sucessórios se resumem ao imóvel objeto da constrição.

O STJ deu provimento ao recurso especial para restabelecer integralmente a sentença de procedência dos embargos à penhora.

Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenho-rabilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respec-tivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

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d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civilista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanên-cia, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

7687 – Compromisso de compra e venda de imóvel – bem de família – penhorabili-dade

“Agravo regimental. Processo civil e civil. Execução de sentença. Compromisso de com-pra e venda de imóvel. Bem de família. Penhorabilidade. Dívida oriunda de negócio envolvendo o próprio imóvel. Aplicação, por analogia, da exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. 1. a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. Possibi-lidade de se penhorar bem de família. Deve ser estendida também aos casos em que o proprietário firma contrato de promessa de compra e venda do imóvel e, após receber parte do preço ajustado, se recusa a adimplir com as obrigações avençadas ou a restituir o numerário recebido, e não possui outro bem passível de assegurar o juízo da execução. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 806.099 – (2015/0279073-6) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 14.03.2016 – p. 2576)

7688 – Curatela especial – honorários – inadmissibilidade

“Agravo regimental. Recurso especial. Defensoria pública. Curatela especial. Honorá-rios. Inadmissibilidade. Aplicação da Súmula nº 83/STJ. 1. Esta Corte Superior já pa-cificou o entendimento segundo o qual é função institucional da Defensoria Pública a atuação como curadora especial, nos termos do art. 4º, XVI, da Lei Complementar nº 80/1994, bem como é defeso receber honorários em razão de sua atribuição típica, conforme o art. 130, III, do mesmo Diploma. 2. Agravo regimental a que se nega provi-mento.” (STJ – AgRg-REsp 1.385.799 – (2013/0169458-7) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 16.03.2016 – p. 2119)

7689 – Divórcio – partilha – crédito trabalhista – comunicabilidade

“Agravo regimental no recurso especial. Ação de divórcio. Partilha. Crédito trabalhista. Comunicabilidade. Divisão do bem determinada pela sentença e não modificada pelo acórdão. Falta de interesse recursal. Agravo regimental improvido. 1. A jurisprudência desta Corte é assente em afirmar que as verbas de natureza trabalhista adquiridas na constância da união comunicam-se entre os cônjuges e, portanto, devem ser partilhadas. 2. No caso, todavia, há uma peculiaridade a ser observada. Muito embora a instância or-dinária tenha afirmado que o crédito decorrente de reclamatória trabalhista não se comu-nica, não reformou a sentença que julgou procedente o pedido e determinou que a ora recorrente partilhasse com o recorrido o valor que lhe fora antecipado. Nesse contexto, nota-se que a partilha da verba de natureza trabalhista já foi realizada, não havendo, no caso, interesse recursal da recorrente, pelo que o recurso não deve prosperar. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.568.650 – (2015/0296493-1) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 03.03.2016 – p. 720)

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7690 – Divórcio – partilha – existência e titularidade dos bens

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Divórcio. Partilha. Existência e titulari-dade dos bens. Reexame de prova. 1. Não se admite o recurso especial quando sua aná-lise depende de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 742.619 – (2015/0168262-0) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 03.03.2016 – p. 732)

7691 – Divórcio – partilha – instituições financeiras – expedição de ofício

“Agravo regimental. Recurso especial. Processual civil. Divórcio. Partilha. Expedição de ofício a instituições financeiras. Mera obtenção de informações. Questão nitidamente interlocutória. Retenção do recurso especial. Necessidade. Art. 542, § 3º, CPC. 1. Caráter meramente interlocutório da decisão que determina a expedição de ofício a instituições financeiras como medida instrutória no curso de processo de partilha que sucede de-cretação do divórcio. 2. Limitação constitucional da jurisdição desta Corte Superior ao julgamento de causas decididas (art. 105, inciso III, da Constituição Federal), admitindo--se, excepcionalmente, o conhecimento de questões interlocutórias quando evidente o risco de negativa de prestação jurisdicional ou de dano irreparável à parte, hipóteses não verificas na espécie. 3. Necessidade de retenção do recurso especial, nos termos do art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.494.314 – (2014/0032942-4) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 29.03.2016 – p. 493)

7692 – Divórcio – partilha – meação sobre automóvel devolvido ao credor fiduciário

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Divórcio. Partilha. Meação sobre au-tomóvel devolvido ao credor fiduciário. Reexame de prova. 1. Inviável a análise do recurso especial quando dependente de reexame de matéria fática da lide (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 629.102 – (2014/0317529-2) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 435)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão mediante a qual neguei provimen-to a agravo em recurso especial, dada a incidência da Súmula nº 7 do STJ e a ausência de demonstração do dissídio jurisprudencial.A agravante afirma que não é necessário o reexame de prova.Sustenta que a partilha de bens feita pelo Tribunal de origem não observou as regras do regime de comunhão universal de bens. Alega ter demonstrado o dissídio jurisprudencial.O acórdão recorrido, do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, tem a seguinte ementa:“Divórcio litigioso cumulado com guarda, alimentos e partilha de bens. Sentença de parcial procedência, determinando a partilha dos valores pagos pelo veículo adquirido durante o casamento, bem como das cotas sociais da empresa. Recurso do ex-marido. Preliminar de nulidade da sentença rechaçada. Não se configura extra petita a decisão que acolhe parcialmente o pedido. Automóvel, objeto de alienação fiduciária, entregue amigavelmente à instituição financeira ante a impossibilidade de pagamento das parcelas. Perda da posse e dos valores pagos. Situação que afasta o direito de meação da autora. Recurso conhecido e parcialmente provido.”O STJ negou provimento ao agravo.Assim disciplinou o relator:

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“Independentemente do regime de bens, portanto, fato é que o Tribunal de origem, com base nos elementos de convicção dos autos, concluiu pela ausência do bem sobre o qual a agravante pretende seja feita a partilha. Por isso aplicada ao caso a Súmula nº 7 desta Corte, o que inviabiliza também a caracterização da similitude dos casos trazidos para a demonstração de dissídio jurisprudencial.”

O ilustre Jurista Luiz Felipe Brasil assim disciplina sobre o divórcio:

“12. O parágrafo único do art. 1.579 (‘Novo casamento de qualquer dos pais, ou de am-bos, não poderá importar restrições aos direitos e deveres previstos neste artigo’) contém omissão, uma vez que deixa de referir expressamente que a união estável de qualquer dos pais também não acarreta restrições aos direitos e deveres em relação aos filhos. É evidente que deve ser compreendida a união estável também nessa hipótese, uma vez que não teria qualquer sentido que a formação fática de nova família por qualquer dos pais pudesse gerar efeitos que a formação jurídica, pelo casamento, não acarreta.

13. Tratando do divórcio por conversão, o art. 1.580 apresenta uma redação (‘Decorrido um ano do trânsito em julgado da sentença que houver decretado a separação judicial, ou da decisão concessiva da medida cautelar de separação de corpos, qualquer das partes poderá requerer sua conversão em divórcio’) que peca pela falta de clareza. É evidente que a conversão de separação judicial em divórcio pressupõe a prévia separação judicial. Entretanto, a dicção isolada do dispositivo – numa interpretação meramente gramatical, é certo – possibilita o entendimento de que seria viável converter a separação de corpos em divórcio. Felizmente a dubiedade resta afastada pelo § 1º, que não deixa margem à dúvida no sentido de que a conversão de que se trata é sempre de separação judicial em divórcio.

14. Inovou salutarmente o NCCB ao afastar, no caso de conversão da separação judicial em divórcio, a exigência adicional (art. 36, parágrafo único, inc. II, da Lei do Divórcio) de que o autor do pedido estivesse em dia com obrigações anteriormente assumidas, o que já vinha sendo tido como inconstitucional pela melhor doutrina (CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 8. ed., t. 2, p. 1196 e ss.), no entendimento de que o dispositivo da lei divorcista não foi recepcionado pelo art. 226, § 6º, da CF, cuja única exigência para o deferimento da conversão é o preenchimento do prazo de um ano de separação judicial. Assim também já se manifestara a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por sua 7ª Câmara Cível (AC 599314689, J. 23.06.1999, Rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis): ‘DIVÓRCIO POR CONVERSÃO – DESCUMPRIMENTO DAS OBRI-GAÇÕES ASSUMIDAS AO ENSEJO DA SEPARAÇÃO JUDICIAL – DERROGAÇÃO DO INC. II, PARÁGRAFO ÚNICO, DO ART. 36, DA LEI Nº 6.515/1977 – DERROGADO O INC. II DO ART. 36, DA LEI Nº 6.515/1977, PELO ART. 226, § 6º, DA CF, O DESCUMPRIMEN-TO DAS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS AO ENSEJO DA SEPARAÇÃO JUDICIAL NÃO MAIS REPRESENTA ÓBICE À SUA CONVERSÃO EM DIVÓRCIO – NEGARAM PROVIMENTO, POR MAIORIA’.

15. O divórcio direto mantém-se no § 2º do art. 1.580 na forma como se encontra na Lei nº 6.515/1977 (art. 40), exigindo unicamente o preenchimento do lapso temporal de dois anos de separação fática, tanto em sua forma litigiosa quanto consensual. Apenas baseado no ‘princípio da ruptura’, portanto, não se mostrando pertinente qualquer ques-tionamento acerca da culpa.

16. Como antes salientado, o art. 1.581, na linha do que já fora consagrado, quanto ao divórcio direto, pela Súmula nº 197, do STJ, dispensa a partilha de bens em qualquer das modalidades de divórcio. Assim, não é mais exigível a partilha mesmo no divórcio por conversão, o que vinha ocorrendo com fundamento nos arts. 31 e 43 da lei divorcista.

17. Em regra que abrange tanto a separação judicial quanto o divórcio, o art. 1.584 (‘De-cretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la’)

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manda que seja atendido o melhor interesse da criança, desvinculando a guarda dos filhos de qualquer consideração quanto à culpa.

É, sem dúvida, salutar o dispositivo, que se harmoniza, aliás, com a doutrina da pro-teção integral, consagrada no art. 227 da CF. Merece registro que mesmo sob a égi-de da lei divorcista que, na separação judicial com causa culposa (art. 5º, caput, Lei nº 6.515/1977), em princípio vinculava a guarda do menor à culpa do genitor (art. 10), a jurisprudência já vinha efetuando a aplicação da doutrina do melhor interesse da criança, invocando como fundamento, além do regramento constitucional, uma interpretação mais liberal do art. 13 da Lei nº 6.515/1977 que, de exceção que era, passou à condição de regra.

Agora, o art. 1.584, na linha de torrencial jurisprudência, expressamente determina que se observe, em qualquer hipótese, sempre aquilo que se mostrar mais conveniente para os filhos.

18. O art. 1.578 inova, ao trazer para o âmbito da separação judicial com fundamento em culpa (‘sanção’) a regra relativa ao nome, que hoje se aplica ao divórcio (art. 25, parágrafo único, Lei nº 6.515/1977).

A primeira inovação aqui está no que se relaciona ao fato de que – na medida em que agora qualquer dos cônjuges poderá acrescer aos seus o patronímico do outro (art. 1.565, § 1º) – tanto o homem quanto a mulher poderão, quando culpados, sofrer a sanção rela-tiva à perda do direito ao uso do sobrenome do outro.

A segunda decorre de que as hipóteses de manutenção do sobrenome do cônjuge (mesmo no caso de culpa reconhecida), que, pela lei divorcista, incidem quando do divórcio, pas-sam agora a ser aplicadas ao ensejo da separação judicial com causa culposa.

A terceira consiste em que, ao contrário do que ocorre no sistema da lei divorcista (onde perda do direito ao uso do sobrenome pela mulher é consequência necessária da declara-ção de culpa – art. 17) a sanção passa a admitir exceções, que reproduzem as hipóteses do art. 25 da Lei do Divórcio, a saber: (1) evidente prejuízo para a sua identificação; (2) manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissol-vida; (3) dano grave reconhecido na decisão judicial.

Quanto às demais modalidades de separação judicial – ou seja: a forma consensual e as formas litigiosas com fundamento em causa objetiva e na doença mental do outro cônjuge – o § 2º do art. 1.578 determina que ‘caberá a opção pela conservação do nome de ca-sado’. Assim, deixou de existir o apenamento imposto à mulher pelo art. 17, § 1º, da Lei nº 6.515/1977, que determinava que, sendo dela a iniciativa do pedido com fundamento em causa objetiva ou na doença mental do varão, deveria voltar a usar o nome de solteira.

19. Inovação de relevo há quanto ao tema alimentar. Pela sistemática da Lei nº 6.515/1977, em se tratando de separação judicial fundada em culpa, o art. 19 impõe apenas ao culpado o encargo de prestar alimentos ao inocente, caso este necessite. Em decorrência, doutrina e jurisprudência têm uniformemente afirmado que o cônjuge reco-nhecido culpado pela separação perde o direito a alimentos.

O NCCB trata dos alimentos a partir do art. 1.694, e o faz englobando a obrigação tanto proveniente do parentesco como originária do casamento e da união estável. O art. 1.702, tratando da obrigação alimentar na separação judicial, condiciona, inicialmente, seu sur-gimento à circunstância de ser o cônjuge ‘inocente’ e ‘desprovido de recursos’. Idêntica regra (em desnecessária redundância) situa-se no caput do art. 1.704. Portanto, sempre que não caracterizada a culpa, cabível será a estipulação de alimentos.

Entretanto – e aí se situa a inovação – a partir de agora mesmo o culpado poderá ser con-templado com alimentos. Dispõe o parágrafo único do art. 1.704: ‘Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los,

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nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência’.

Duas são as condições para que o culpado possa habilitar-se a receber alimentos do ino-cente: (1) não ter aptidão para o trabalho e (2) não ter parentes em condições de prestá--los. A primeira condição configura a ‘necessidade’. Mas não basta que o cônjuge culpado necessite dos alimentos. É necessário, além disso, que não tenha parentes (ascendentes, descendentes ou irmãos) em condições de prestá-los. Caso os tenha, deverá pedir os ali-mentos a esses parentes, não podendo, nestas condições, direcionar sua pretensão contra o cônjuge ‘inocente’.

Assim, a condição de ‘culpado’ ou de ‘inocente’ refletirá na própria ordem de precedência da obrigação alimentar entre cônjuges. Isto é: se culpado, o parente precede o cônjuge; se inocente, o cônjuge precede o parente.

Não fica aí, porém, a inovação relativa aos alimentos em razão do casamento. Ocorre que, preenchendo o cônjuge as condições postas em lei para que possa postular os alimentos, estes, na hipótese de ser o alimentado considerado culpado pela separação, serão fixados pelo juiz no montante estritamente ‘indispensável à sobrevivência’ (art. 1.704, parágrafo único).

Em contrapartida, ao cônjuge que não for considerado culpado pela separação (ou seja, o ‘inocente’) bastará provar sua necessidade (decorrente do fato de não possuir aptidão para o trabalho) e a possibilidade do potencial prestador para habilitar-se a receber pen-são alimentícia. Não fica, nesta hipótese, obrigado a demonstrar que não possui parentes em condições de prestá-los. E mais: o valor dos alimentos deverá corresponder ao que for necessário à preservação do padrão de vida que desfrutava durante o casamento, e não fica adstrito ao mínimo indispensável à sobrevivência. É o que decorre do art. 1.694, que estatui que os alimentos, como regra, devem corresponder ao que for necessário ‘para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessi-dades de sua educação’.

Em se tratando de divórcio direto, onde não cabe perquirição de culpa – baseando-se ex-clusivamente no princípio da ruptura (art. 1.580, § 2º) – os alimentos serão devidos desde que reste caracterizado exclusivamente o binômio possibilidade-necessidade (art. 1.695), descabendo qualquer outra averiguação. E, por decorrência, sempre deverão corresponder ao que for necessário à preservação do padrão de vida do beneficiário (art. 1.694).

No caso de divórcio por conversão da separação judicial (art. 1.580, caput), manter-se--á, quanto aos alimentos, o que houver sido estipulado ao ensejo da separação judicial.” (A separação judicial e o divórcio no novo Código Civil brasileiro. Disponível em: http://online.sintese.com.)

7693 – Divórcio direto consensual – audiência de ratificação – inexistência

“Recurso especial. Processual civil. Direito civil. Família. Ação de divórcio direto con-sensual. Inexistência de audiência de ratificação. Divórcio homologado de plano. Pos-sibilidade. Desprovimento do apelo extremo. Insurgência recursal do parquet estadual. Hipótese: Trata-se de ação de divórcio direto consensual, cujo acordo foi homologado de plano pelo juízo sentenciante, que considerou desnecessária a realização de audiên-cia de ratificação. 1. Esta Corte já decidiu inexistir obrigatoriedade de realização de audiên cia de ratificação, em caso de divórcio direto consensual, quando o juiz senten-ciante entender apta a sua concessão de imediato, tendo condições de aferir a firme disposição dos cônjuges em se divorciarem, bem como de atestar que as formalidades foram atendidas. Precedentes. 2. No caso em apreço, não se evidencia hipótese a justi-ficar a anulação do julgado diante da homologação de plano do divórcio direto consen-

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sual, sem realização de audiência de ratificação, tendo em vista que o juiz sentenciante teve condições de aferir a efetiva convergência de vontade das partes em dissolverem o vínculo conjugal, atestou, ainda, que as demais formalidades foram atendidas, bem como observado os interesses da menor. 3. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp 1.554.316 – (2012/0116826-6) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 21.03.2016 – p. 1115)

7694 – Doação – alimentos provisórios – ação anulatória

“Agravo regimental no recurso especial. Ação anulatória de doação cumulada com pe-dido de alimentos provisórios. Decisão monocrática que negou seguimento ao reclamo. Irresignação dos réus. 1. Razões do regimental que não impugnam especificamente os fundamentos invocados na deliberação monocrática. Em razão do princípio da dialeti-cidade, deve o agravante demonstrar de modo fundamentado o desacerto da decisão agravada. Incidência da Súmula nº 182/STJ. 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-REsp 1.454.196 – (2014/0113825-0) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 21.03.2016 – p. 1110)

7695 – Herança – habilitação de herdeiros – negativa da viúva em regularizar o polo ativo da demanda

“Previdenciário e processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Habilitação de herdeiros. Negativa da viúva em regularizar o polo ativo da demanda. Falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo. Extinção sem julgamento do mérito. Agravo regimental desprovido. 1. Compete à parte interes-sada o ônus de regularizar o polo ativo da demanda para fins de habilitação, sob pena de extinção sem julgamento do mérito, em decorrência da inviabilidade de seu regular desenvolvimento, nos termos do art. 267, IV do CPC. 2. No caso dos autos, com a morte do segurado, não houve interesse por parte dos herdeiros em providenciarem a devida habitação. Como consignado no acórdão recorrido, a viúva do autor não se desincum-biu de regularizar o polo ativo da demanda com a necessária habilitação dos sucessores, mesmo sendo intimada pessoalmente para fazê-lo. 4. Consignou, ainda, a Corte de ori-gem, que o advogado, que representava o segurado nos autos, peticionou informando a recusa e a falta de interesse da viúva em lhe fornecer a documentação necessária para a regularização da habilitação. 5. Por fim, o argumento apresentado pelo ora Agravante nas razões do Apelo Especial de que a procuração da filha do de cujus, nascida fora do casamento, não foi juntada aos autos por razões de foro íntimo, não é suficiente para desconstituir o acórdão recorrido. 6. Agravo Regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag--REsp 179.848 – (2012/0101587-6) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 03.03.2016 – p. 544)

7696 – Herança – ilegitimidade passiva da viúva – meação – ação universal

“Processual civil. Recurso especial. Ação de petição de herança. Ilegitimidade passiva da viúva. Meação invariável. Ação universal. Inexistência de alteração na situação fática dos bens. 1. A viúva-meeira não detém legitimidade para integrar o polo passivo de ação de petição de herança, visto que o exercício do direito reconhecido em investigatória de paternidade poderá alcançar tão somente o quinhão destinado aos herdeiros, perma-necendo invariável a fração ideal da meeira. 2. Por ser uma ação universal, a ação de petição de herança visa ao reconhecimento do direito sucessório e o recebimento de

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quota-parte pelo herdeiro, e não o recebimento de bens singularmente considerados, motivo pelo qual não haverá alteração na situação fática dos bens, que permanecerão em condomínio pro indiviso. 3. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.500.756 – (2014/0312647-2) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1128)

7697 – Inventário – incidente de remoção de inventariante dativo – desídia e retar-damento no andamento do feito

“Recurso especial. Direito civil e processual civil. Inventário. Incidente de remoção de inventariante dativo. Desídia e retardamento no andamento do feito. Perda do direito a honorários (CPC, art. 150). Compensação descabida (CC/1916, art. 1.010; CC/2002, art. 369). Ajuizamento de ação própria. Recurso provido.” (STJ – REsp 865.963 – (2006/0150753-9) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 10.03.2016 – p. 1291)

7698 – Inventário – intervenção – pessoa alheia à sucessão

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Inventário. Intervenção de pessoa alheia à sucessão. Pretensão que não encontra amparo no art. 82, I, do CPC que tra-ta das atribuições do Ministério Público. Fundamento inatacado. Agravo regimental não conhecido. 1. Observa-se que o agravante não se insurgiu contra o fundamento da decisão agravada, deixando-o incólume, circunstância que atrai a incidência do Enunciado nº 182 da Súmula desta Corte. 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 771.618 – (2015/0215006-8) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 01.04.2016 – p. 1134)

7699 – Investigação de paternidade – interesse moral – justo interesse da viúva

“Ação de investigação de paternidade. Interesse moral. Justo interesse da viúva, não herdeira, do suposto pai, para contestar. Arts. 365 do Código Civil de 1916 e 1.615 do Código Civil de 2002. 1. A ação de investigação de paternidade post mortem, em regra, é ajuizada em face dos herdeiros do suposto pai falecido. 2. Hipótese em que a viúva do suposto pai não ostenta a condição de herdeira, não sendo litisconsorte passiva necessária. Assiste-lhe, todavia, o direito de contestar a ação, uma vez que tem justo interesse moral, albergado pelos arts. 365 do Código Civil de 1916 e 1.615 do Código Civil de 2002, recebendo o processo no estado em que se encontrava quando requereu a intervenção. 3. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.466.423 – (2014/0165621-2) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1123)

7700 – Investigação de paternidade – petição de herança – decadência

“Agravo regimental no recurso especial. Civil e processual civil. Ação rescisória. Ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança. Decadência. Prazo final. Dia não útil. Prorrogação. Possibilidade. Precedentes. Inépcia da inicial. Preques-tionamento. Ausência. Súmula nº 282/STF. Razões recursais insuficientes para fazer alte-radas as conclusões da decisão agravada. 1. Segundo a orientação jurisprudencial desta Corte, consolidada por ocasião do julgamento pela Corte Especial do Recurso Especial Repetitivo nº 1112864/MG, da relatoria da e. Ministra Laurita Vaz, DJe 17.12.2014, ‘o termo final do prazo para o ajuizamento da ação rescisória, embora decadencial, prorroga-se para o primeiro dia útil subsequente, se recair em dia de não funcionamento da secretaria do Juízo competente’. 2. A existência de julgados do Supremo Tribunal

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em sentido contrário à orientação que há muito vem sendo reafirmada pelo Superior Tribunal de Justiça não se mostra suficiente para demonstrar o desacerto da decisão. 3. Impossibilidade, ante a ausência de prequestionamento, de conhecimento da alega-ção de inépcia da petição inicial da ação rescisória. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.426.981 – (2013/0417927-3) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 29.03.2016 – p. 486)

7701 – Investigação de paternidade – registro em nome de terceiro – relação socio-afetiva

“Civil. Ação de investigação de paternidade. Registro em nome de terceiro. Relação socioafetiva. Art. 232 do CC/2002 e Súmula nº 301 do STJ. DNA. Presunção da pater-nidade. Prova testemunhal. Indícios. 1. Na linha da jurisprudência desta Corte, a rela-ção socioafaetiva estabelecida com o pai registral não impede a ação de investigação de paternidade proposta pelo filho, que tem o direito personalíssimo de esclarecer sua paternidade biológica. 2. Segundo estabelece a Súmula nº 301, do STJ, ‘em ação investi-gatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade’. 3. No caso concreto, apesar de a única prova testemunhal não ser conclusiva a respeito da efetiva paternidade, serve como prova indiciária, capaz de viabilizar sobremaneira o acolhimento da presunção de paternidade com fundamento da Súmula nº 301, do STJ. Assim, seja com base na aplicação literal do art. 232 do CC/2002 e da Súmula nº 301, do STJ, seja com fundamento na orientação de que deve haver in-dício suplementar acerca dos fatos da causa, a paternidade reconhecida na sentença e no acórdão que julgou os embargos infringentes deve ser mantida. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-EDcl-REsp 1.160.080 – (2009/0186232-8) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 11.03.2016 – p. 3145)

7702 – Investigação de paternidade – retificação de registro civil – indenização por danos morais

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de investigação de pater-nidade c/c retificação de registro civil c/c indenização por danos morais. Súmulas nºs 282/STF e 211/STJ. Violação ao art. 535 do CPC. Inexistência. Incidência das Súmu-las nºs 7/STJ e 283/STF. Mera repetição dos argumentos do recurso especial nas razões recursais do agravo regimental. 1. A matéria referente aos arts. 362, 338, 348, 177, do CC/2016, 2º, 3º e 4º do ECA, e 1.614, 1.604, do CC/2002, tido por violados, não foi ob-jeto de discussão no acórdão recorrido, apesar da oposição de embargos de declaração, não se configurando o prequestionamento, o que impossibilita a sua apreciação na via especial (Súmulas nºs 282, do STF e 211, do STJ). 2. O acolhimento da pretensão recur-sal demandaria reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula nº 7, do STJ. 3. A subsistência de fundamento inatacado apto a manter a conclusão do aresto impugnado impõe o não conhecimento da pretensão recursal, a teor do entendi-mento disposto na Súmula nº 283/STF: ‘É inadmissível o recurso extraordinário quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.’ 4. Ao repisar os fundamentos do recurso especial, a parte agravante não trou-xe, nas razões do agravo regimental, argumentos aptos a modificar a decisão agravada, que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 828.841 – (2015/0310963-0) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 01.03.2016 – p. 1629)

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7703 – ITCMD – apresentação de documentos ao fisco – arrolamento de bens – não cabimento

“Tributários e processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Imposto sobre Transmissão Causa Mortis (ITCMD). Apresentação de documentos ao fisco. Arrolamento de bens. Não cabimento. 1. A orientação da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que ‘a homologação da partilha não pressupõe atendimento a obrigações tributárias acessórias relativas ao imposto sobre transmissão ou à ratificação dos valores pelo Fisco estadual; somente após o trânsito em julgado da sentença homolo-gatória é que a Fazenda verificará a correção dos montantes recolhidos, como condição para a expedição e a entrega do formal de partilha e dos alvarás’ (AgRg-AREsp 270.270/SP, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., J. 20.08.2015, DJe 31.08.2015). 2. Agravo regi-mental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.444.860 – (2014/0067831-9) – 2ª T. – Relª Min. Diva Malerbi – DJe 21.03.2016 – p. 933)

7704 – Partilha de bens do casal – ação de reconhecimento e dissolução de socieda-de – cerceamento de defesa – inocorrência

“Agravo regimental no recurso especial. Ação de reconhecimento e dissolução de socie-dade. Pedido de nulidade da sentença ante o cerceamento de defesa. Inocorrência. Pre-juízos não configurados. Partilha de bens do casal. Alegação de sub-rogação de bem par-ticular. Ausência de comprovação. Juros e correção monetária. Atualização de valores devidos. Incidência desde a citação. Recurso especial parcialmente provido. Irresignação de R. S. do O. 1. Quanto à apontada violação do art. 535 do CPC, não assiste razão ao recorrente, porquanto clara e suficiente a fundamentação adotada pelo Tribunal de ori-gem para o deslinde da controvérsia, revelando-se desnecessário ao magistrado rebater cada um dos argumentos declinados pela parte. 2. Para a jurisprudência do STJ inexiste nulidade quando a parte deixa de suscitar o suposto vício processual no primeiro mo-mento em que teve oportunidade de fazê-lo. Precedentes: REsp 607.957/MT, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4ª T., J. 04.11.2004, DJ 22.11.2004, p. 361; REsp 1076496/AL, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ª T., J. 02.06.2011, DJe 14.06.2011; RMS 25.837/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., J. 21.10.2008, DJe 05.11.2008. 3. As verbas de natureza trabalhista nascidas e pleiteadas na constância da união estável comunicam-se entre os companheiros, razão pela qual não há como afastar o entendimento firmado na instância ordinária. Precedentes: REsp 1295991/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., J. 11.04.2013, DJe 17.04.2013; REsp 758.548/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., J. 03.10.2006, DJ 13.11.2006, p. 257. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg--REsp 1.063.533 – (2008/0123494-0) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 15.03.2016 – p. 2927)

7705 – Patronímico materno – inclusão ao final do nome filiação – ilegitimidade da parte que representa – direito personalíssimo

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Filiação. Inclusão do patronímico materno ao final do nome. 1. Ilegitimidade da parte que representa. Direito persona-líssimo. Precedentes. 2. Dissídio jurisprudencial não comprovado nos moldes legais. 3. Agravo improvido. 1. No caso concreto, a representante/genitora não possui legiti-midade para propor a alteração do nome do menor por se tratar de direito personalíssi-mo. Precedentes. 2. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o devi-do cotejo analítico entre as hipóteses apresentadas como divergentes, com transcrição

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dos trechos dos acórdãos confrontados, bem como menção das circunstâncias que os identifiquem ou assemelhem, nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag--REsp 798.500 – (2015/0252236-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 28.03.2016 – p. 1260)

7706 – Pensão por morte – dependência econômica superveniente de ex-cônjuge – prestação alimentícia – não recebimento

“Previdenciário e processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Pensão por morte. Dependência econômica superveniente de ex-cônjuge, sem recebi-mento de prestação alimentícia. Ausência de prequestionamento. Súmula nº 211/STJ. Reexame de conjunto fático-probatório. Não cabimento. Súmula nº 7/STJ. Agravo re-gimental improvido. I – O Recurso Especial é manifestamente inadmissível, por falta de prequestionamento, relativamente ao art. 76, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, pois o seu conteúdo normativo não foi objeto de discussão, nas instâncias ordinárias, sequer im-plicitamente, razão pela qual não há como afastar o óbice da Súmula nº 211/STJ. II – O Tribunal de origem decidiu, à luz das provas dos autos, ‘que a autora não comprovou a manutenção da alegada dependência econômica após a separação de fato, vez que os documentos acostados com a peça vestibular não consubstanciam razoável início de prova material’, asseverando que ‘não foi trazida aos autos prova material que demons-tre que o de cujus provia de alguma forma a subsistência da parte autora’, e, também, que ‘a prova oral colhida, por sua vez, se mostrou frágil diante das informações trazidas aos autos pelas testemunhas arroladas pela autora’. III – Nesse contexto, considerando a fundamentação do acórdão objeto do Recurso Especial, os argumentos da recorrente somente poderiam ser acolhidos mediante o necessário revolvimento dos aspectos con-cretos da causa, o que é obstado, no âmbito Especial, pela Súmula nº 7/STJ. IV – Agravo Regimental improvido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 800.463 – (2015/0270243-4) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 17.03.2016 – p. 1478)

7707 – Sentença estrangeira contestada – curadoria especial – divórcio consensual – cumprimento dos requisitos – citação por edital – nulidade – não ocorrência

“Sentença estrangeira contestada. Curadoria especial. Divórcio consensual. Cumprimen-to dos requisitos dos arts. 5º e 6º da Resolução STJ nº 9/2005. Citação por edital. Nulida-de. Não ocorrência. 1. Controvérsia que se cinge em apreciar pedido de homologação de sentença de dissolução consensual de vínculo matrimonial proferida pela Justiça dos Estados Unidos da América. 2. Este Tribunal exerce juízo meramente delibatório nas hipóteses de homologação de sentença estrangeira; vale dizer, cabe ao STJ, apenas, veri-ficar se a pretensão atende aos requisitos previstos no art. 5º da Resolução STJ nº 9/2005 e se não fere o disposto no art. 6º do mesmo ato normativo, bem como as disposições da LINDB. 3. Não se pode formular exigência descabida como condição para citação ficta, sob pena de se negar acesso à justiça. Conforme precedentes semelhantes ao caso sub judice, o divórcio foi consensual, sem bens a partilhar ou filhos menores a conside-rar, o que reforça a tese de que a citação editalícia se mostrou suficiente e regular. No caso, a dissolução do casamento das partes ocorreu em 2006, sendo razoável o alegado desconhecimento do endereço atual do ex-cônjuge, de forma a justificar a citação fic-ta. 4. Hipótese em que se reconhece a higidez da citação por edital e a autenticidade das peças apresentadas, bem como a observância dos requisitos legais. 5. Pedido que

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consiste, de fato, em mero requerimento de regularização, no Brasil. Precedentes espe-cíficos. 6. Pedido de homologação de sentença estrangeira deferido.” (STJ – SEC 11.826 – (2014/0098557-3) – C.Esp. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 17.03.2016 – p. 1040)

7708 – Sucessão – inventário – condição de herdeiro

“Civil. Embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial. Sucessão. Inventário. Condição de herdeiro. Omissão, obscuridade ou contradição. Ine-xistência. Pretensão de rejulgamento da causa. Impossibilidade. Embargos rejeitados. 1. Inexistentes as hipóteses do art. 535 do CPC, não merecem acolhida os embargos de declaração que têm nítido caráter infringente. 2. Os embargos de declaração não se pres-tam para sanar o inconformismo da parte com o resultado desfavorável no julgamento ou para reapreciar matéria já decidida. Precedentes. 3. Embargos declaratórios rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-Ag-REsp 515.134 – (2014/0109736-1) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.02.2016 – p. 360)

7709 – Sucessão – inventário – direitos sobre imóvel

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Sucessões. Inventário. Direitos sobre imóvel. 1. É inviável a análise do recurso especial quanto à alegação de suposta ofensa a normas não tratadas no acórdão recorrido, embora tenham sido opostos embargos de declaração (Súmula nº 211, do STJ). 2. É inviável o recurso especial quando suas razões não contém impugnação de fundamento suficiente para manter o acórdão recorrido. Aplicação da Súmula nº 283, do STF. 3. Agravo regimental a que se nega provimen-to.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 641.461 – (2014/0330115-3) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 04.03.2016 – p. 228)

7710 – Testamento particular – confirmação – requisitos essenciais – assinatura de três testemunhas idôneas

“Recurso especial. Testamento particular. Confirmação. Requisitos essenciais. Assinatura de três testemunhas idôneas. Leitura e assinatura na presença das testemunhas. Inobser-vância. Abrandamento. Impossibilidade. Vontade do testador. Controvérsia. Reexame de provas. Inviabilidade. Súmula nº 7/STJ. 1. Cuida-se de procedimento especial de juris-dição voluntária consubstanciado em pedido de confirmação de testamento particular. 2. Cinge-se a controvérsia a determinar se pode subsistir o testamento particular dati-lografado formalizado sem todos os requisitos exigidos pela legislação de regência, no caso, a assinatura de pelo menos três testemunhas idôneas e a leitura e a assinatura do documento pelo testador perante as testemunhas. 3. A jurisprudência desta Corte tem flexibilizado as formalidades prescritas em lei no tocante às testemunhas do testamento particular quando o documento tiver sido escrito e assinado pelo testador e as demais circunstâncias dos autos indicarem que o ato reflete a vontade do testador. 4. No caso em apreço, o Tribunal de origem, à luz da prova dos autos, concluiu que a verdadeira intenção do testador revela-se passível de questionamentos, não sendo possível, por-tanto, concluir, de modo seguro, que o testamento exprime a real vontade do testador. 5. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.432.291 – (2014/0014173-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 08.03.2016 – p. 1113)

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7711 – Testamento público – ação declaratória de nulidade – vício de forma – flexi-bilização

“Embargos de declaração no agravo regimental nos embargos de divergência em agravo em recurso especial. Processual civil. Ação declaratória de nulidade de testamento públi-co. Vício de forma. Flexibilização. Prevalência da real vontade do testador. Ausência de similitude fática. Acórdão embargado em consonância com a atual jurisprudência desta Corte superior. Súmula nº 168/STJ. Alegação de omissões no decisum. Não ocorrência. Advertência de multa. Embargos rejeitados. 1. Não sendo admitido o processamento dos embargos de divergência, por ausência de similitude fática entre os arestos confrontados, revela-se despiciendo o exame dos fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem, razão pela qual não há que se falar em omissão no acórdão embargado. 2. Advertência de que a oposição de novos embargos de declaração de cunho protelatório ensejará a aplicação de multa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil. 3. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-EDcl-Ag-REsp 365.011 – (2013/0209478-6) – 2ª S. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 02.03.2016 – p. 767)

7712 – União estável – ação de reconhecimento – homem casado – ocorrência de concubinato – separação de fato não provada

“Direito de família e processual civil. Recurso especial. Ação de reconhecimento de união estável. Homem casado. Ocorrência de concubinato. Separação de fato não pro-vada. Necessidade de reexame de prova. Súmula nº 7/STJ. Agravo não provido. 1. A jurisprudência do STJ e do STF é sólida em não reconhecer como união estável a relação concubinária não eventual, simultânea ao casamento, quando não estiver provada a separação de fato ou de direito do parceiro casado. 2. O Tribunal de origem estabele-ceu que o relacionamento entre a autora e o de cujus configura concubinato, uma vez que, conforme consignado no v. acórdão recorrido, as provas documental e testemunhal presentes nos autos não corroboram a versão de que o falecido estava separado de fato no período do alegado relacionamento. 3. A inversão do entendimento firmado nas ins-tâncias ordinárias, na forma pleiteada pela agravante, demandaria o reexame de provas, o que é defeso em sede de recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 748.452 – (2015/0176370-8) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.03.2016 – p. 4103)

7713 – União estável – ação de reconhecimento e dissolução – litigância de má-fé – reexame de prova

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ação de reconhecimento e dissolução de união estável. Litigância de má-fé. Reexame de prova. 1. É inviável a análise do re-curso especial quando dependente de reexame de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 785.066 – (2015/0234752-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 04.03.2016 – p. 240)

7714 – União estável – dissolução – bens – dívidas – divisão – alimentos – filho maior

“Família. União estável. Dissolução. Bens. Dívidas. Divisão. Alimentos. Filho maior. 1. A obrigação alimentar do pai em relação aos filhos cessa com o advento da maiori-dade, mas não automaticamente. Cessando a obrigação alimentar compulsória, subsiste o dever de assistência fundado no parentesco consanguíneo. 2. ‘O cancelamento de

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pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos’ (Súmula nº 358/STJ). 3. Visto que, com o advento da maioridade, o dever de prestar alimentos não se extingue de forma automática, deve-se dar ao alimentando oportunidade de comprovar a impossibilida-de de prover a própria subsistência ou a necessidade da pensão por frequentar curso técnico ou universitário. Contudo, essa providência, na hipótese tratada nos autos, é despicienda porquanto a postulação por alimentos para filho maior, já com 25 anos, foi fundamentada apenas na obrigação alimentar, desvinculada de eventual necessidade. 4. O instituto da meação nada mais é do que a atribuição dos bens a cada um dos cônjuges que, conjuntamente, trabalharam para construir o patrimônio. O art. 1.725 do Código Civil estabelece o regime de comunhão parcial de bens para as relações patrimoniais entre companheiros, de forma que o companheiro tem direito tanto à metade dos bens adquiridos na constância da união estável que se comunicam no regime de comunhão parcial quanto à metade dos bens adquiridos a título oneroso, ainda que só em nome de um deles. 5. A meação do companheiro, assim como a do cônjuge, responde pelas obrigações do outro quando contraídas em benefício da família, na forma estabelecida no art. 592, IV, do CPC e nos arts. 1.643 e 1.644 do CC. 6. Recurso especial conhecido parcialmente e provido em parte.” (STJ – REsp 1.292.537 – (2011/0258535-2) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 10.03.2016 – p. 1219)

7715 – União estável – reconhecimento post mortem – violação do art. 535 do CPC – não ocorrência

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. União estável. Reconhecimento post mortem. Violação do art. 535 do CPC. Não ocorrência. 1. Afasta-se a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado profe-rido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 804.209 – (2015/0265622-3) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 28.03.2016 – p. 1269)

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Seção Especial – Estudos Jurídicos

Socioafetividade Parental – Uma Análise Psicojurídica

ELIAnE LImOnGE DuRIPsicóloga Clínica há mais de 25 anos (CRP 06/37951-6), Advogada (OAB/SP 293.033) e Mes-tranda em Direitos Especiais pela Fadisp. Atua na área de Família e Sucessões, com ênfase em Conciliação e Mediação. Coordena o núcleo infanto-juvenil de uma Associação Benefi-cente, contribuindo com a comunidade local para um saudável desenvolvimento de vínculos afetivos pessoais e sociais.

RESUMO: Trata-se de análise técnica sobre o reconhecimento do cerne relacional que fundamenta o estabelecimento de um vínculo afetivo que justifique, com segurança galgada na seara jurídica aliada à psicologia científica, a declaração jurídica da existência da paternidade e/ou filiação socioafetivas.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Arcabouço originário quanto à afetividade parental; 2 Direito integrado com a psicologia; 3 A tutela estatal da afetividade parental; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A partir do pedido de um parecer psicojurídico, com a finalidade de compor base técnica para o Magistrado decidir questão de retirada do nome do pai do registro civil de criança cuja genitora induziu o deman-dante a erro, é que se realiza o presente trabalho.

Esta, entre tantas outras questões na seara do Direito Familiar que envolve relacionamento humano, é uma questão que requer um debru-çar no estudo da integração do Direito com as demais ciências, sobretu-do, neste tema, com as Ciências Psicológicas.

Ainda que sem a pretensão de esgotar o tema, buscou-se base fir-me no campo da Psicologia quanto à afetividade, que fosse capaz de proporcionar adequada interpretação jurídica para o real conceito da formação dos laços afetivos e, em decorrência, base científica para fun-damentar decisões que envolvam estes conceitos.

1 aRcabOUÇO ORIgINáRIO QUaNTO À aFeTIvIDaDe paReNTal

A base para se analisar tanto psicologicamente quanto juridica-mente o grau de afetividade capaz de estabelecer um vínculo real de parentalidade é a profundidade e a duração no tempo desta afetividade.

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Estes requisitos, quando sólidos e profundos, devem ser capazes de se sobrepor às adversidades que se apresentam como ameaças de desvin-culação da afetividade existente.

Afetividade pode ser definida como um conjunto de comportamentos e seus processos complexos subjacentes, que criam e sustentam as rela-ções sociais individuais, ligando entre si os membros de uma espécie. O termo afetividade implica que existam certos fatores comuns entre todos estes laços de afetividade social, mas também que cada uma destas afeti-vidades aja parcialmente segundo variáveis diferentes.1

Extraindo-se da leitura de René Zazzo sobre a obra de Henri Wallon2, a afetividade é gênero do qual emoção é espécie.

A emoção será a matéria dos sentimentos electivos, mas é também, e em primeiro lugar, sensibilidade sincrética, contágio, confusão.

[...]

No, entanto, a função inicial da emoção é a comunhão com outrem. Com efeito, à “emoção cabe o papel de unir indivíduos entre sí pelas suas reações mais orgânicas e mais íntimas, devendo esta confusão ter por consequência ulterior as oposições e os desdobramentos de onde poderão surgir gradualmente as estruturas de consciência” (6).

Desse modo, as influências afectivas do meio têm uma acção decisiva sobre a criança. (grifos pessoais)

O sentimento de afetividade não se confunde com atos oriundos de um conceito introjetado sobre o papel a ser desempenhado pela fi-gura de pai ou mãe, como, por exemplo, atos emotivos momentâneos. A conduta socialmente esperada de um pai, mãe ou filhos não transfor-ma os atos entre estes sujeitos em atos de amor ou consideração, como também não expressam a afetividade envolvida nos relacionamentos humanos.

Estas condutas despidas da afetividade são condutas que mera-mente atendem às expectativas pessoais e sociais do desempenho de cada um destes papéis.

1 KEITEL, Liane. Construção de vínculos inter-pessoais e construção de grupos. Disponível em: <http://www.pensamentobiocentrico.com.br/content/ed03_art02.php>. Acesso: 14 ago. 2015.

2 ZAZZO, René. Henri Wallon: psicologia e marxismo. Lisboa: Vega, 1978. p. 40-41.

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É possível desempenhar com primor social os papéis de pai, mãe ou filho, sem que haja nenhuma afetividade envolvida no desempenhar destas funções, bem como se pode ter condutas socialmente criticadas, mas que, por estarem carregadas de afetividade, justificam os resultados alcançados no convívio familiar.

O ponto essencial, que é comum a todo tipo de parentalidade e filiação, é o real e consciente sentimento, que brota da vontade de sentir afeto um pelo outro.

É um ato de decisão, consciente, natural, pessoal, próprio daquele que manifesta esta vontade de ter afeto, a despeito de qualquer imposi-ção ou interferência externa.

No caso específico da parentalidade afetiva, o estabelecimento do vínculo afetivo capaz de gerar força contra qualquer ameaça de desvin-culação é, necessariamente, bilateral.

Uma vez estabelecido o vínculo afetivo, fruto da vontade pessoal, sem interferência externa, de forma bilateral, tem-se o que se entende tanto na Psicologia quanto no Direito como a formação de uma relação socioafetiva.

A unilateralidade não define, por si só, uma relação, apenas apre-senta sentimentos de um único sujeito que são direcionados a outro su-jeito, que a estes sentimentos não corresponde, deixando, portanto, de se estabelecer uma ligação afetiva entre estes dois sujeitos.

É comum, dado o desejo do sujeito que nutre sentimentos pelo outro, entender os atos pelo outro praticados como sendo atos corres-pondentes aos sentimentos nutridos pelo primeiro sujeito. Porém, sem a ocorrência da reciprocidade, não há o estabelecimento de um vínculo afetivo.

O afastamento destes sujeitos é o caminho naturalmente percor-rido, seja pelo motivo de que o primeiro sujeito se cansa de nutrir sen-timentos por alguém que não lhe corresponde, seja porque o segundo sujeito se cansa de ser alvo de sentimentos pelos quais não deseja cor-responder.

Assim, o vínculo de afetividade somente se forma de maneira adequada psicologicamente quando há reciprocidade, do contrário, o

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sentimento afetivo carece de elementos essenciais para sua formação emocional saudável.

Uma vez desenvolvido um sentimento afetivo unilateral, é ine-vitável que, ao ocorrer o afastamento natural dos sujeitos, aquele que nutre o sentimento afetivo unilateralmente terá sua estrutura psicológica afetada e carecerá de acompanhamento terapêutico.

Entretanto, a tomada de consciência e a busca de superação serão mais benéficas ao longo do tempo do que a continuidade de um senti-mento afetivo não correspondido, apenas unilateral.

Para se declarar um concreto e saudável estabelecimento de vín-culo afetivo, tem-se que garantir que haja reciprocidade.

A afirmação é válida para todos os demais relacionamentos a que se queira atribuir o conceito de vínculo afetivo.

A forma como os demais relacionamentos serão formados depen-de de como se estabeleceram os vínculos afetivos primeiros, que são os vínculos afetivos parentais. Em razão disto, há na sociedade adolescen-tes, jovens e adultos em diferentes fases da vida, que repetem a forma saudável ou anômala de seus primeiros vínculos afetivos.

Se os relacionamentos de parentalidade e filiação foram desenvol-vidos em um convívio hostil, fundado em inverdades, com sentimentos nutridos unilateralmente, sem a concretude real do vínculo, esta será a base em que se desenvolverão os demais relacionamentos deste sujeito. Isto se não houver intervenção externa, profissional ou informal, que contribua para uma acomodação e a busca de equilíbrio que traga con-forto emocional para este sujeito.

Entretanto, quando os laços afetivos primeiros se formam em um ambiente em que o convívio entre os sujeitos envolvidos neste relacio-namento proporciona segurança de que há vontade mútua de convi-vência e participação da vida em comum, os vínculos afetivos que se formam serão saudáveis, trarão para a estrutura da personalidade um conforto emocional e serão capazes de superar mais rapidamente as ad-versidades e desafios do dia a dia.

Trazendo esclarecimentos técnicos que corroboram as elucida-ções pretendidas, de forma sucinta, tem-se o que segue:

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Vínculos afetivos

Definição: O termo vem do latim vinculu e significa tudo aquilo que ata, une; ligação. É o elemento psicológico que caracteriza e especifica a relação, seja ela interpessoal ou não. Histórico: As relações humanas se constituem a partir dos vínculos afetivos construídos entre as pessoas ou a partir dos interesses que as unem.

Ao estudar as relações interpessoais, que denomina relações objetais, a Psicanálise encontrou a existência de diferentes tipos de vínculos: diádi-co, edípico, de apego, simbiótico, fusional, de conhecimento, de raiva, de amor, de segurança. Alguns autores, como W. R. Bion (1897-1979) e Pichon Rivière (1907-1977), desenvolveram teorias próprias sobre os tipos de vínculos que existem nas relações pessoais.

Objeto de estudo da Psicanálise, os vínculos básicos começaram a ser estudados a partir de observações sobre as relações que se estabelecem entre os pais e seu bebê. Melanie Klein (1882-1960) foi a precursora do estudo da relação do bebê com sua mãe, e Jacques Lacan (1901-1981) iniciou o estudo sobre o papel psicológico do pai. A partir destes estudos é que se chegou a formular as atribuições psicológicas relativas a cada um dos genitores, conhecidas com os nomes de função materna e fun-ção paterna. Este tema foi amplamente desenvolvido por John Bowlby na trilogia Apego, Perda, Separação, (São Paulo: Martins Fontes) a partir do estudo sobre a conduta de apego.

Estes vínculos são fundamentais para se estabelecer e viver as situações de dependência e de confiança, para o desenvolvimento do sentimento de segurança e, no processo de separação, individuação, a construção da identidade e do traquejo social.3 (grifos próprios)

2 DIReITO INTegRaDO cOm a pSIcOlOgIa

Para o Legislador brasileiro chegar à opção de parentalidade e fi-liação fundados em afetividade para situações específicas, evidentemen-te não foi de maneira dissociada das Ciências Médicas e Psicológicas, ao contrário, muitos estudos foram e continuam sendo desenvolvidos para se prover cada vez mais a área jurídica com ferramentas para o empre-go deste conceito de forma a se chegar a uma melhor sistematização e

3 CENTRO de Medicina Psicossomática e Psicologia Médica HOSPITAL Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Vínculos Afetivos. 2015. Disponível em: <http://www.medicinapsicossomatica.com.br/glossario/vinculos_afetivos_basicos.htm>. Acesso em: 7 ago. 2015.

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hermenêutica que atenda o caso concreto e produza efetivamente uma pacificação social, sobretudo dentro do núcleo celular social de extrema importância que é o núcleo familiar.

Em movimento denominado “desbiologização da paternidade”, construiu-se os entendimentos de que “paternidade e ascendência ge-nética são conceitos que nem sempre se identificam no mesmo sujeito” (Luiz Edson Fachin, 2002, p. 64)4, e de que o pai, cujo exame hema-tológico o definiu como tal, por si só, não afirma a existência de laço parental, “porque a descendência genética é um mero dado, enquanto a filiação afetiva se constrói” (Eduardo Leite, 2002, p. 40)5.

Há que se realizar um esforço profissional-científico conjunto de transmissão deste conhecimento, assimilação e adequação aos casos que se apresentam, pois disto resultará um maior número de assertivas decisões, tanto do ponto de vista Psicológico quanto do ponto de vista Jurídico, como a que se apresenta na Decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça6, que a seguir se apresenta o excerto:

STJ-RECURSO ESPECIAL Nº 1.330.404 - RS (2012/0127951-1) EMBAR-GOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE – FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA – EMBARGOS INFRIN-GENTES ACOLHIDOS, POR MAIORIA – Brasília (DF), 05 de fevereiro de 2015.

Não obstante, o Tribunal de origem reconheceu a configuração de fi-liação socioafetiva entre pai e filho registrais, em que pese o primeiro ter incidido em vício de consentimento desde o nascedouro da relação afetiva estabelecida entre eles, e, assim permanecido, durante todo o de-senvolvimento desta (compreendida nos primeiros cinco anos de vida da criança).

Tal compreensão, entretanto, não encerra a melhor exegese sobre a efe-tiva conformação da filiação socioafetiva. A filiação socioativa, da qual

4 FACHIN, Luiz Edson. Paternidade e ascendência genética. In: LEITE, Eduardo de Oliveira. (Coord.). Grandes temas da atualidade – DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 164.

5 LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de Oliveira (Coord.). Grandes temas da atualidade – DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 40.

6 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Acórdão no Recurso Especial nº 1.330.404/RS, Rel. Marco Aurélio Belizze, DJe 19.02.2015, Doc. 1380133. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1380133&num_registro=201201279511&data=20150219&formato=PDF>. Acesso em: 14 ago. 2015.

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a denominada adoção à brasileira consubstancia espécie, detém integral respaldo do ordenamento jurídico nacional, a considerar a incumbência constitucional atribuída ao Estado de proteger toda e qualquer forma de entidade familiar, independentemente de sua origem (art. 227 da CF).

No ponto, oportuno anotar que o estabelecimento da filiação socioafe-tiva perpassa, necessariamente, pela vontade e, mesmo, pela voluntarie-dade do apontado pai, ao despender afeto, de ser reconhecido como tal. É dizer: as manifestações de afeto e carinho por parte de pessoa próxima à criança somente terão o condão de convolarem-se numa relação de filiação, se, além da caracterização do estado de posse de filho, houver, por parte daquele que despende o afeto, a clara e inequívoca intenção de ser concebido juridicamente como pai ou mãe daquela criança. [...]. Re-gistre-se, porque relevante: Encontrar-se-ia, inegavelmente, consolidada a filiação socioafetiva, se o demandante, mesmo após ter obtido ciência da verdade dos fatos, ou seja, de que não é pai biológico do requerido, mantivesse com este, voluntariamente, o vínculo de afetividade, sem o vício que o inquinava.

Em conclusão, é de se acolher a pretensão de desconstituição da paterni-dade registral, porquanto evidenciado: i) que o declarante, ao proceder o registro de nascimento, sob a presunção pater is est, foi induzido em erro; ii) que a relação de afeto então estabelecida entre pai e filho regis-trais, igualmente calcada no vício de consentimento originário, restou definitivamente rompida; e (iii) que não houve manifestação consciente e voluntária do apontado pai registral de ser reconhecido juridicamente como tal (pressuposto da configuração da filiação socioafetiva), após sa-ber que não é o genitor da criança. (grifos próprios)

Em conformidade com o que se encontra nas situações do coti-diano, e que de forma alguma pode ser dissociado do sistema jurídico vigente, mas que também não pode por este mesmo sistema jurídico ser transformado em meros fatos objetivos/subjetivos sem que a vontade não seja considerada, é que a decisão mencionada se afeiçoa com a melhor análise Psicossocial para os casos concretos que versem sobre vínculo socioafetivo parental.

3 a TUTela eSTaTal Da aFeTIvIDaDe paReNTal

Por meio de mecanismos legais, ainda que não explicitamente, o legislador prevê a tutela estatal da afetividade parental nos dispositivos:

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Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil brasileiro), Subtí-tulo II, Das Relações de Parentesco, Art. 1.593: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.”; Cons-tituição Federal do Brasil de 1988, arts. 226, §§ 4º e 7º, 227, §§ 5º e 6º.

O Estado tem o dever-poder de obrigar, segundo a lei, quando a paternidade tem origem biológica, econômica, adotiva, socioafetiva parental com expressa vontade das partes, alimentícia, sucessória, etc., mas não pode obrigar que um vínculo afetivo seja formado ou religado sem que haja a decisão, pela própria vontade dos sujeitos, de que esta ligação aconteça e seja fundamento de uma paternidade ou filiação so-cioafetiva que gera obrigações as quais não se tem expressa vontade de assunção.

O prejuízo emocional que o Estado causar nestes sujeitos pela surreal imposição de afetividade ao caso concreto se multiplicará e re-tornará contra o próprio Estado e contra a sociedade em outros tipos de demandas a partir destes sujeitos, em um círculo vicioso.

Obrigar a uma socioafetividade parental sem a expressa vontade das partes é fazer mau uso do conceito original de afetividade parental que se encontra na Psicologia. Este tem sido o entendimento de juristas como Christiano Cassetari, que em sua obra afirma: “[...] se não há reci-procidade, como iremos estabelecer uma parentalidade que não estará, nunca mais, calcada no afeto? Entendemos ser um verdadeiro absurdo a imposição de uma parentalidade se não há mais afeto entre pais e filhos”7.

cONclUSÃO

Um vínculo afetivo não se forma unilateralmente. Para que o vín-culo afetivo se forme, necessariamente, deverá existir reciprocidade.

Nenhum mecanismo externo ao indivíduo poderá obrigar ao esta-belecimento de um vínculo afetivo.

A vontade própria, livre e desimpedida dos sujeitos é que permitirá uma ligação afetiva estabelecida de forma adequada e saudável emocio-nalmente.

7 CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidade socioafetiva. São Paulo: Atlas, 2014. p. 67.

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Se o fundamento para atribuição de deveres e obrigações com re-lação à paternidade afetiva, ou socioafetiva, for a ligação afetiva estabe-lecida pelos sujeitos desta relação, e psicologicamente e juridicamente é este o fundamento, então o sentimento unilateral, ainda que expres-sado pela vontade unilateral, não torna concreta a relação socioafetiva, portanto, carece esta de elemento essencial para o seu reconhecimen-to como fundamento a ser aplicado aos casos que se encontram nesta seara.

ReFeRÊNcIaS

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Acórdão no Recurso Especial nº 1.330.404/RS, Rel. Marco Aurélio Belizze, DJe 19.02.2015, Doc. 1380133. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1380133&num_registro=201201279511&data=20150219&formato=PDF>. Acesso em: 14 ago. 2015.

CASSETTARI, Christiano. Multiparentalidade e parentalidade socioafetiva. São Paulo: Atlas, 2014.

CENTRO de Medicina Psicossomática e Psicologia Médica Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Vínculos Afetivos. 2015. Dispo-nível em: <http://www.medicinapsicossomatica.com.br/glossario/vinculos_afe-tivos_basicos.htm>. Acesso em: 7 ago. 2015.

FACHIN, Luiz Edson. Paternidade e ascendência genética. In: LEITE, Eduardo de Oliveira. (Coord.). Grandes temas da atualidade – DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 164.

KEITEL, Liane. Construção de vínculos inter-pessoais e construção de grupos. Disponível em: <http://www.pensamentobiocentrico.com.br/content/ed03_art02.php>. Acesso: 14 ago. 2015.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Exame de DNA, ou o limite entre o genitor e o pai. In: LEITE, Eduardo de Oliveira (Coord.). Grandes temas da atualidade – DNA como meio de prova da filiação. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 40.

ZAZZO, René. Henri Wallon: psicologia e marxismo. Lisboa: Vega, 1978.

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice por assunto especial

DOUTRINA

Assunto

Regime de Bens e o novo CPC

•Da Ação de Alteração de Regime de Bens no Novo CPC (Flávio Tartuce) ...............................9

Autor

Flávio taRtuCe

•Da Ação de Alteração de Regime de Bens noNovo CPC ........................................................9

Índice geral

DOUTRINAS

Assunto

alimentos

•As Formas Coercitivas para Compelir o Deve-dor de Alimentos a Adimplir com sua Obri-gação: Avanços Perpetrados pela Jurispru- dência e Abarcados pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) (Leonardo Alves de Oliveira) ..........................................74

meação

•O Cônjuge que Comete Homicídio Doloso e a Possibilidade de Afastamento da Mea-ção por meio da Declaração de Indignidade (Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas e Natália de Souza Paula) .................................41

PlaneJamento suCessóRio

•A Holding Patrimonial Familiar e seus Incen-tivos: uma Análise Juseconômica (Cristiana Sanchez Gomes Ferreira e Carolina FagundesLeitão) ............................................................21

suCessão

•Cônjuge Concorrendo com Ascendentes e o Cálculo da sua Legítima (Rodrigo Alves Zaparoli) ........................................................89

Autor

CaRolina Fagundes leitão e CRistiana sanChez gomes FeRReiRa

•A Holding Patrimonial Familiar e seus In-centivos: uma Análise Juseconômica .............21

Cláudia maRa de almeida RaBelo viegas e natália de souza Paula

•O Cônjuge que Comete Homicídio Doloso e a Possibilidade de Afastamento da Mea-ção por meio da Declaração de Indignidade ..41

CRistiana sanChez gomes FeRReiRa e CaRolina Fagundes leitão

•A Holding Patrimonial Familiar e seus In-centivos: uma Análise Juseconômica .............21

leonaRdo alves de oliveiRa

•As Formas Coercitivas para Compelir o De-vedor de Alimentos a Adimplir com sua Obrigação: Avanços Perpetrados pela Juris-prudência e Abarcados pelo Novo Código deProcesso Civil (Lei nº 13.105/2015) ...............74

natália de souza Paula e Cláudia maRa de almeida RaBelo viegas

•O Cônjuge que Comete Homicídio Doloso e a Possibilidade de Afastamento da Mea-ção por meio da Declaração de Indignidade ..41

RodRigo alves zaPaRoli

•Cônjuge Concorrendo com Ascendentes e o Cálculo da sua Legítima .................................89

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

alimentos

•Agravo regimental no recurso especial – Ação revisional de alimentos – Decisão extra petita – Ocorrência – Exoneração – Ali-mentos – Impossibilidade (STJ) ...........7668, 108

Casamento

•Mandado de segurança – Habilitação para o casamento e supressão do patronímico materno – Sentença de improcedência – À luz da interpretação do art. 1.565, § 1º, do Código Civil, verifica-se tão somente a possi- bilidade de acréscimo – Inexistência de mo-tivo justo a ensejar a modificação preten- dida – Sentença confirmada – Ordem de-negada (TJSC) .....................................7676, 172

divóRCio

•Agravo regimental no recurso especial – Ação de divórcio – Partilha – Crédito traba-lhista – Comunicabilidade – Divisão do bem determinada pela sentença e não modificada pelo acórdão – Falta de interesse recursal –Agravo regimental improvido (STJ) .....7669, 113

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RDF Nº 95 – Abr-Maio/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO���������������������������������������������������������������������������������������������������������������213

inventáRio

•Registro de disposição de última vontade – Codicilo – Improcedência do pedido – Insurgência das interessadas – Declaração emitida que não atende os requisitos legais – Inteligência do art. 1.881 do Código Civil – Objeto substancialmente incompatível com o instituto (transmissão da parte disponível da herança e de usufruto de bem imóvel) – Móveis e utensílios inerentes à atividade profissional do falecido – Escritório de ad-vocacia – Necessidade de avaliação dos demais bens que compõem o acervo here-ditário, para, então, aferir se consistem em bens de “pouco valor” – Conceito subjeti-vo – Diligência a ser realizada nos autos de inventário – sentença escorreita – Recursonão provido (TJPR) .............................7673, 158

investigação de PateRnidade

•Civil – Ação de investigação de paterni-dade – Registro em nome de terceiro – re-lação socioafetiva – Art. 232 do CC/2002 e Súmula nº 301 do STJ – DNA – Presun-ção da paternidade – Prova testemunhal – Indícios (STJ) ......................................7670, 119

sePaRação

•Agravo de instrumento – Ação de divórcio – Competência – Prevenção – Ação cau-telar de separação de corpos – Perpetuatio jurisdictionis – Medida protetiva – Lei nº 11.340/2006 – Pedido de alimentos(TJGO) ...............................................7671, 141

suCessão

•Embargos de Declaração no Agravo Interno no Agravo de Instrumento. Direito das Suces-sões. Pedido de Registro e cumprimento de testamento público formulado pela legatária. Herdeiros do testador que impugnam a capa-cidade do de cujus quando da manifestação de última vontade. Propositura de ação de anulação de testamento. Decisão agrava-da que indefere o pedido de suspensão do processo de cumprimento. Inconformismo que não prospera. Cognição, nestes autos, que se limita à análise da existência de ví-cios externos no testamento. Impossibilida-de de apreciação dos requisitos intrínsecos ao ato, como a vontade e a capacidade do testador à época da lavratura. Dicção clara do artigo 1.126 do Código de Processo Civil(TJRJ) ..................................................7674, 162

testamento

•Agravo de instrumento – Inventário – Testa-mento – Partilha (TJRS) .......................7675, 166

união estável

•Reexame necessário – Apelação cível – ação de pensão por morte – União estável conco-mitante – Dissídio jurisprudencial e doutriná-rio – Possibilidade – Pensão rateada – Confir-mar sentença (TJMG) .........................7672, 147

união homoaFetiva

•Agravo de instrumento – Decisão interlocu-tória que indeferiu o pedido de tutela anteci-pada para garantir direito real de habitação sobre imóvel de ex-companheiro em ação de inventário – Pedido a ser apreciado pelo ju-ízo onde tramita a ação de reconhecimento de união homoafetiva post mortem – Negado provimento ao recurso (TJSP) .............7677, 178

EMENTÁRIO

Assunto

ação de indenização

•Ação de indenização – abandono afetivo –não ocorrência – ato ilícito ................7678, 181

alimentos

•Alimentos – citação – retroação .........7679, 181

•Alimentos – execução – devedor – inscri-ção em cadastros de restrição ao crédito – possibilidade ..................................7680, 181

•Alimentos – execução – penhora dos valo-res decorrentes da aposentadoria por inva-lidez...................................................7681, 182

•Alimentos – fixação de pensão complemen-tar – avós paternos – possibilidade .....7682, 182

Bem de Família

•Bem de família – compromisso de comprae venda de imóvel – penhorabilidade . 7683, 184

•Bem de família – execução – constrição de imóvel de propriedade de sociedade comer-cial utilizado como residência dos sócios– impenhorabilidade ..........................7684, 186

•Bem de família – penhora – embargos de terceiro – imóvel alienado em fraude à exe-cução .................................................7685, 187

•Bem de família – penhora – imóvel resi-dencial – acervo hereditário – único bem – impenhorabilidade ..........................7686, 188

ComPRomisso de ComPRa e venda

•Compromisso de compra e venda de imó-vel – bem de família – penhorabilidade ..........................................................7687, 190

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214 ������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDF Nº 95 – Abr-Maio/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

CuRatela

•Curatela especial – honorários – inadmissi-bilidade..............................................7688, 190

divóRCio

•Divórcio – partilha – crédito trabalhista –comunicabilidade ..............................7689, 190

•Divórcio – partilha – existência e titularidade dos bens ............................................7690, 191

•Divórcio – partilha – instituições financeiras – expedição de ofício ........................7691, 191

•Divórcio – partilha – meação sobre automó-vel devolvido ao credor fiduciário .....7692, 191

•Divórcio direto consensual – audiência de ratificação – inexistência ....................7693, 194

doação

•Doação – alimentos provisórios – ação anu-latória ................................................7694, 195

heRança

•Herança – habilitação de herdeiros – ne-gativa da viúva em regularizar o polo ativo da demanda .......................................7695, 195

•Herança – ilegitimidade passiva da viúva –meação – ação universal ....................7696, 195

inventáRio

•Inventário – incidente de remoção de in-ventariante dativo – desídia e retardamento no andamento do feito .......................7697, 196

•Inventário – intervenção – pessoa alheia àsucessão ............................................7698, 196

investigação de PateRnidade

•Investigação de paternidade – interesse mo-ral – justo interesse da viúva ..............7699, 196

•Investigação de paternidade – petição deherança – decadência ........................7700, 196

•Investigação de paternidade – registro em nome de terceiro – relação socioafetiva ..........................................................7701, 197

•Investigação de paternidade – retificação de registro civil – indenização por danomorais ................................................7702, 197

itCmd

•ITCMD – apresentação de documentos ao fisco – arrolamento de bens – não cabi-mento ................................................7703, 198

PaRtilha

•Partilha de bens do casal – ação de reconhe-cimento e dissolução de sociedade – cer-ceamento de defesa – inocorrência ....7704, 198

PatRonímiCo

•Patronímico materno – inclusão ao final do nome filiação – ilegitimidade da parte querepresenta – direito personalíssimo ....7705, 198

Pensão PoR moRte

•Pensão por morte – dependência econômi-ca superveniente de ex-cônjuge – prestaçãoalimentícia – não recebimento ...........7706, 199

sentença estRangeiRa

•Sentença estrangeira contestada – curadoria especial – divórcio consensual – cumprimen-to dos requisitos – citação por edital – nuli-dade – não ocorrência .......................7707, 199

suCessão

•Sucessão – inventário – condição de herdeiro ..........................................................7708, 200

•Sucessão – inventário – direitos sobre imóvel ..........................................................7709, 200

testamento

•Testamento particular – confirmação – re-quisitos essenciais – assinatura de três testemunhas idôneas ..........................7710, 200

•Testamento público – ação declaratória de nulidade – vício de forma – flexibilização ..........................................................7711, 201

união estável

•União estável – ação de reconhecimento – homem casado – ocorrência de concubi-nato – separação de fato não provada ..7712, 201

•União estável – ação de reconhecimento e dissolução – litigância de má-fé – reexame de prova ............................................7713, 201

•União estável – dissolução – bens – dívidas– divisão – alimentos – filho maior .....7714, 201

•União estável – reconhecimento post mortem – violação do art. 535 do CPC – não ocor-rência.................................................7715, 202

Seção especialESTUDOS JURÍDICOS

Assunto

soCioaFetividade

•Socioafetividade Parental – Uma Análise Psi-cojurídica (Eliane Limonge Duri) ..................203

Autor

eliane limonge duRi

•Socioafetividade Parental – Uma Análise Psi-cojurídica ....................................................203