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Ntetembwa Revista Académica do ISPT Ano I, Vol. 1, N.º 1, Julho/Dezembro 2017 CEICA/ISPT 2017

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Ntetembwa Revista Académica do ISPT

Ano I, Vol. 1, N.º 1, Julho/Dezembro 2017

CEICA/ISPT

2017

NtetembwaRevista Académica do ISPT

Ano I, Vol. 1, N.º 1, Julho/Dezembro 2017

CEICA/ISPT2017

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Ficha Técnica: Editor: Dr. Ñlandu Mia Veta André Revisão Técnica: Patrício Batsîkama Revisão linguística: Dulce Fernandes Impressão: IMPRIMARTE Artes e Paginação: IMPRIMARTE Edição: Outubro de 2017 Supervisão: Solwîdi, Lda. Depósito legal: 368/2017 CEICA – Centro de Estudo e Investigação Científica Aplicada do ISPT Complexo Missionário do INSJCM – os Tocoísta Rua Pedro de Castro Van-Dunem ―Loy‖, n.º Município do Kilamba Kiaxi | Luanda – Angola Email: [email protected] © 2017 CEICA/ISPT

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Conselho Científico Dr. Ñlandu Mia Veta André (UAN/ISPT) Dr. José Quimba Sofi (ISPT (ISPT) Dr. André Pedro (ISPT) Dr. Luís Soares Nobre Noronha e Pereira (Universidade do Algarve) Dr. João Filipe Almeida (ISPT) Dr. Mário de Carvalho (ISPT) Dr. Frandele Serafino (ISPT) Dr. Pedro André (ISPT) Dra. Ana Stela Cunha (ISCTE/UFMA) Dra. Marcia Melo Medeiro (USP) Dr. Patrício Batsîkama (Universidade Fernando Pessoa) Me. Moniz Bala Pedro (UTANGA/ISPT) Me. Santos Manuel João (ISPT) Me. Gunza Cavota (ISPT) Me. Ibony Simão (ISPT) Lic. Adelino Chingululo

Conselho Editorial Elsa Domingos Pedro, Eng.ª (ISPT) Ñlandu Mia Veta André, Me. (ISPT) Kezita Michingi, Me. (ISPT) Cristina Nogueira, Lic. (ISPT) Pedro André, Me (ISPT) José Quimba Sofi, Ph.D. (ISPT) Fuankenda Odi Pascoal, Me. (RNA, Angola) Nsambu Vicente, Me (Angola) Nvunda Tonet, Me (Angola) João Domingos, Me. (ESPKN, Angola) Zolana Avelino, Me. (ESPZ, Angola) Vanee Hein, Me (Musé de Tervuren, Bélgica) Judith Freitas, Ph.D. (UFP, Portugal) Álvaro Campelo, Ph.D. (UFP, Portugal) Washington dos Santos Nascimento, Ph.D. (UERJ, Brasil) Pierre Diasson, Ph.D. (Université Paris 8, França) Makisosila Mawete, Ph.D. (França) Carlos Serrano, Ph.D. (USP, Brasil) Samba Diakité, Ph.D. (Université Outtara, Canadá) John Thornton, Ph.D. (Boston University, E.U.A.) Linda Heewood, Ph.D. (Boston University, E.U.A.) Wyatt MacGaffey, Ph.D. (Haverford College, E.U.A.)

Conselho Científico Dr. Ñlandu Mia Veta André (UAN/ISPT) Dr. José Quimba Sofi (ISPT (ISPT) Dr. André Pedro (ISPT) Dr. Luís Soares Nobre Noronha e Pereira (Universidade do Algarve) Dr. João Filipe Almeida (ISPT) Dr. Mário de Carvalho (ISPT) Dr. Frandele Serafino (ISPT) Dr. Pedro André (ISPT) Dra. Ana Stela Cunha (ISCTE/UFMA) Dra. Marcia Melo Medeiro (USP) Dr. Patrício Batsîkama (Universidade Fernando Pessoa) Me. Moniz Bala Pedro (UTANGA/ISPT) Me. Santos Manuel João (ISPT) Me. Gunza Cavota (ISPT) Me. Ibony Simão (ISPT) Lic. Adelino Chingululo

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Sumário Apresentação Dossiê: Construir a Sociedade atraves da Educação

1. Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas – Soldados Mandingueiros na Angola Setecentista

Filipe Barreto Rangel, Me

2. Paz e transformações nas famílias angolanas: representações sociais (2002 – 2016)

António Guebe, Ph.D.

3. Estratégias de prevenção e combate à violência: estudo de caso nos centros de aconselhamento familiar e jurídico em Angola

Moniz Bala Pedro, Me

4. El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización educativa. Reto del Directivo Jefe

José Quimba Sofi, Ph.D.

5. Proposta de utilização das tecnologias educativas, concretamente dos assistentes matemáticos, na resolução de problemas matemáticos no ISPT de Angola

João Filipe Almeida, Ph.D.

6. As controvérsias da reforma educativa em Angola Kezita Mamuela Marcos, Me

7. Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí [Virgna

unguiculata (L.) Walp] de Angola y un grupo de germoplasma David António Ndengoloka, Me

8. Ética tokoista na construção do Homem novo

Patrício Batsîkama, Ph.D.

9. Só tem guerra, fome e tribos primitivas: representações homogéneas do

continente africano através das histórias em quadrinhos do fantasma, Tintin e soldado desconhecido

Ivaldo Marciano da França de Lima, Ph.D.

9-20

21-42

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Apresentação

Sua Santidade Simão Toko liderou em 1949 um conjunto de jovens inspirados para a Libertação do Homem oprimido [africano]. Nesta altura vaticinou a abertura de hospitais e escolas para que os angolanos consigam garantir a sua plena independência.

Importa salientar que o hospital simboliza o espaço da salvação perante as enfermidades e a escola simboliza a busca do conhecimento. África precisava em 1949 e ainda precisa em 2017 de salvar-se das suas enfermidades culturais, económicas, políticas e sociais, tanto quanto libertar-se da herança colonialista. A educação ocupa um lugar de urgente preocupação, de modo que o Instituto Superior Politécnico Tocoísta – ISPT tem como objectivo criar um espaço de Pesquisa e Ensino com rigor e inovação em busca de solução de múltiplos problemas existentes na sociedade angolana e não só.

Mais interessante ainda é a denominação desta Revista Académica: Ñtetembwa. O termo significa ―estrelas‖ em várias línguas angolanas (kikôngo, kimbûndu, por exemplo). Este símbolo astral é metáfora de um olhar para o futuro com fins de alcançar o desenvolvimento e iluminar o mundo diante das trevas.

As reflexões contidas nos artigos, rigorosamente escolhidos para esta edição, convergem no tema do Dossiê proposto: ―Construir a Sociedade através da Educação‖. Felicitamos os autores seleccionados e agradecemos os pareceristas pelo nível do profissionalismo e por ter trabalhado em tempo récord.

Os artigos elegidos reflectem sobre o valor da Educação e brindam-nos pela qualidade que, sobremaneira, prestigia a nossa Revista:

1. Garantiu-se aqui que a problemática da Educação em Angola data do século XVIII, e Filipe Rangel – professor na Universidade Estadual de Feira Santana, Brasil – traz uma discussão metodológica sobre o assunto num contexto histórico complexo.

2. Outro tema interessante é de António Guebe, docente na Universidade Agostinho Neto [Faculdade de Ciências Sociais]. Ele reflecte as transformações da família na Angola contemporânea: século XXI.

3. No que tange as questões de violência doméstica, Moniz Bala Pedro faz uma pesquisa de campo e propõe as possíveis soluções.

4. Caberia, na perspectiva de José Quimba Sofi, aos académicos cruzar as teorias gerais da educação e discuti-las no contexto angolano para alcançar resultados realistas e proveitosos no que diz respeito a Direcção escolar.

5. A reflexão que traz Kezita Marcos – que é o resultado de um trabalho de campo profícuo, útil e de grande interesse nacional – sobre a problemática da Reforma educativa em Angola suscita debates.

6. Logra-se ainda com a leitura que nos proporciona João Filipe Almeida com relação ao Ensino, escolhendo a disciplina de Matemática.

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7. Valeu a visão específica que David António Ndengoloka abre uma pesquisa interessante em agronomia, no caso específica de Angola.

8. Ética tokoista é a proposta de Patrício Batsîkama: teoriza e faculta um debate para a formação do homem novo.

9. Servimo-nos do texto de Ivaldo Marciano da França Lima – oriundo da Universidade Federal de Rio de Janeiro, Brasil – para encerrar este número: trata-se de um tema livre em relação ao proposto deste Dossiê.

Talvez nos seja útil realçar a sugestão de alguns livros para leitura: são as nossas recomendações aos leitores. Trata-se de textos úteis para aprendizagem e aperfeiçoamento de quem lê-los de forma assídua e inteligente.

Os temas abordados pelos autores – que são linhas de pesquisas de cada um – constituem um debate em si. Fortalecem o espírito dialógico de conflictuar as perspectivas com propósito de melhorar a situação que se vive.

Congregatulamos com os autores destes artigos que nos honram nesta edição. São textos de alguma qualidade científica que podem subsidiar outros pesquisadores interessados. Na ânsia de continuar a contar com eles nas próximas edições, desejamos boa leitura ao leitor.

Os nossos agradecimentos vão a todos que tornaram possível o número #1 desta Revista. Pensamos torna-la regular, dentro de espírito de rigor e inovação.

Equipa editorial

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Artigo #1 “Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas” –Soldados Mandingueiros na Angola Setecentista

Filipe Barreto Rangel, Me

Universidade Estadual de Feira de Santana - BA/BR [email protected]

Resumo

Os estudos sobre as práticas de magias de proteção setecentistas, documentados pela Inquisição portuguesa, desvelam elementos importantes sobre as vivências e mentalidades dos sujeitos envolvidos. Neste sentido, nos debruçamos sobre os registos acerca do soldado angolano Vicente de Morais, processado em 1716, sobre a construção e comercialização de bolsas de mandinga, atentos ao universo em que este sujeito estava imerso e suas interações com os militares do entorno, visando compreender como o quotidiano destes sujeitos moldavam as compreensões e elaborações mágicas.

Palavras-chave: Bolsas de mandinga, feitiçaria, Inquisição, Angola, século XVIII

Abstract

The studies on the practices of eighteenth – century protection magic, documented by the Portuguese Inquisition, reveal important elements about the experiences and mentalities of the subjects involved. In this sense, we look at the records about the Angolan soldier Vicente de Morais, processed in 1716, about the construction and commercialization of mandinga bags, attentive to the universe in which this subject was immersed and his interactions with the military of the surroundings, aiming to understand As the daily life of these subjects shaped the magical understandings and elaborations.

Keywords: Bags of mandinga, witchcraft, Inquisition, Angola, 18th century

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

No dia 29 de julho de 1715, perante o padre João Nunes Broa, o soldado

Antônio Francisco Sales, natural do Presídio de Muxima, em Angola, proferiu a

seguinte afirmação a um de seus companheiros de ofício:

sabia que o dito Vicente de Morais não só usava das ditas mandingas mas que também achara fazendo bolças para alguns de seus amigos como para uns pretos assistentes nas fazendas deste presídio ganhando nisto algum estipêndio como se fora ofício que tinha aprendido para ganhar o necessário‖. (ANTT – PIL 5477, fls. c0032. Grifo nosso).1

O fragmento chama a atenção pela forma como apresenta o gerenciamento de

um conhecimento mágico, as mandingas, seu porte e comércio, a pretos e/ou amigos,

caracterizando-o como um saber experenciado (aprendido como ofício ou não), e

utilizado, ainda, como possibilidade de sustento. Estas questões, inerentes ao papel da

experiência, frutificada em saberes, irão nortear nossas reflexões por estas linhas.

António Francisco Sales foi uma das testemunhas do processo inquisitorial

movido contra Vicente de Morais (ANTT – PIL 5477). Este último era um dos soldados

da Fortaleza e Presídio de Nossa Senhora da Conceição de Muxima, no Vale do rio

Cuanza, em Angola. Foi preso e processado pela Inquisição portuguesa, no início do

século XVIII, acusado de sacrilégio e feitiçaria, por ter feito e comercializado, segundo

testemunhas, bolsas de mandinga, com hóstias consagradas em seu interior (RANGEL,

2012).

As bolsas de mandinga eram amuletos de proteção corporal de origem africana,

feitas de pano ou couro, costuradas e recheadas com elementos de cunho mágico-

religioso. Suas finalidades eram bastante plásticas, destacando-se a proteção contra

ofensas de metais. Foram disseminadas por todo o Atlântico luso, e eram utilizadas por

todas as camadas sociais (SANTOS, 2008; CALAINHO, 2008; SOUZA, 2009).

Elementos cristãos - como cera de círios, hóstias, orações, cordões de relíquias, entre

outros - eram inseridos em seu interior, especialmente no setecentos (SANTOS, 2008).

Alguns pesquisadores atribuem o uso de amuletos, chamados de mandingas, a

um grupo específico de africanos islamizados – os malinkê ou mandingas. No entanto,

no Atlântico português, os usos de magias de proteção, chamadas também de

1 Para simplificar a leitura, iremos referenciar este documento apenas com a sigla ANTT – PIL 5477. Corresponde, respectivamente, a Arquivo Nacional da Torre do Tombo – Processo da Inquisição de Lisboa 5477. Atualizamos a grafia dos documentos para facilitar a compreensão.

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Filipe Barreto Range

mandingas, fossem feitas ou portadas por africanos, crioulos ou brancos, não estavam

necessariamente ligadas aos africanos mandingas do outro lado do Atlântico, e sim a

questões relacionadas ao universo religioso. A mandinga se referia a um conhecimento

mágico, e não necessariamente a uma procedência geográfica (SANTOS, 2012).

Em Massangano, Vicente recebeu a primeira bolsa, de chita cozida, e foi

aconselhado a usá-la contra as hostilidades dos caminhos. A segunda bolsa ele ganhou

na Fortaleza de Muxima. Uma terceira bolsa foi apontada pelas testemunhas, na qual o

acusado realizara testes acerca de suas virtudes. Ao ser aberta a bolsa que foi

confiscada, os religiosos descreveram os elementos existentes em seu interior: ossos,

pedaços de pedras e paus, cabelos humanos e de animais, um maço de orações, entre

outros. No maço de orações, os escritos foram compostos com palavras dos grandes

Evangelhos, da paixão e morte de Jesus Cristo, além de releituras de orações católicas,

contextualizadas à realidade do portador. Revelou-se um complexo mágico crioulo

(HEYWOOD, 2009) com elementos oriundos de diferentes culturas, conjugados e

ressignificados de acordo com as experiências de seu construtor.

Uma parte do registro das práticas de nosso soldado africano foi feita em terras

angolanas, e outra em Lisboa, nos cárceres do Santo Ofício. Foram arroladas 15

testemunhas, das quais todas eram homens, militares ou assistentes dos complexos da

região. A fala destas testemunhas permite uma visão panorâmica das atitudes culturais

dos militares dos complexos angolanos, especialmente na primeira metade do século

XVIII, com os devidos cuidados no trato documental (GINZBURG, 1991). No

desenrolar das falas, percebemos que Vicente de Morais era um dos pontos de uma rede

de feitura (RANGEL, 2016) de bolsinhas de proteção. Foi acusado de ser um ―mestre

mandingueiro‖, feitor e comercializador destes complexos mágicos entre os negros das

fazendas adjacentes à Fortaleza de Muxima, como dito.

O universo das práticas mágicas setecentistas estava intimamente ligado às

agruras cotidianas de seus feitores e portadores, estabelecendo-se através de estruturas

diversificadas de relações e sociabilidades (entre feitores de magias e seus respectivos

clientes), e pautada ainda na conjugação de conhecimentos ancestrais. Explorar um

destes microcosmos (VAINFAS, 2002), através de instrumentais micro-analíticos

(GINZBURG, 1987, 1989), coletando e interligando indícios presentes nas acobreadas

documentações inquisitoriais, figura entre nossas pretensões, apesar deste pequeno

espaço.

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

Apontamos ainda, neste início de conversa, outra fala do soldado Vicente de

Morais, em sua confissão de 1717, alguns anos após sua prisão, na qual ele disse que

―sabe que todos os soldados da sua terra tem trato e familiaridade com o demônio, e

usam de mandinga, por ser isso coisa muito frequente, e comum a sua terra‖ (ANTT –

PIL 5477: fl. m0101). Estas palavras indiciam o uso recorrente de mandingas entre os

militares da região, como forma de sanar possíveis debilidades instrumentais, sejam

materiais ou espirituais, nos trânsitos a que eram submetidos. Mas não podemos perder

de vista também que esta fala poderia apenas ter o objetivo de confundir os

inquisidores, no intuito de se livrar das garras da Inquisição.

A actuação da Inquisição2 portuguesa na África foi restrita, e se fez notar através

de religiosos incumbidos de investigar as práticas que fugiam às normas da cartilha

católica. No caso de Vicente de Morais, foi o próprio capelão da igreja local pertencente

ao presídio, o reverendo Félix Gouveia Leite, que se encarregou de desenrolar os

trâmites, perscrutando testemunhas, até que as acusações chegassem a Lisboa.

Na seara de pesquisas acerca da actuação inquisitorial na África, destacamos a

historiadora portuguesa Filipa Ribeiro da Silva (2002), com dissertação referente às

políticas de atuação da Inquisição nos arquipélagos de Cabo Verde, Guiné e São Tomé e

Príncipe; José da Silva Horta (1998), com estudo sobre um inquérito desenrolado nos

reinos do Congo e Angola em fins do século XVI; e, também, a historiadora brasileira

Selma Pantoja (2004), com discussões sobre as mestiçagens entre militares na Angola

setecentista. Estes autores contribuíram para a configuração de um campo de pesquisa

em constante crescimento, ao investigar as dinâmicas que envolviam as jurisdições

cristãs portuguesas em terras africanas.

Dentre suas primeiras confissões, Vicente de Morais afirmou que ao estar em

passagem pela Vila de Massangano, um dos pontos mais longínquos da presença

portuguesa nos interiores africanos, na casa do soldado auxiliar e preto forro Joseph de

Pina, foi advertido que andasse ―com grande cautela naquela vila porque facilmente se

tiraria a vida aos homens‖ (ANTT – PIL 5477, fl. 0063). O mesmo Joseph de Pina disse

2 O Tribunal do Santo Ofício português foi criado em 1536, através da bula Cum ad nil magis, promulgada pelo papa Paulo III. Existiram apenas quatro tribunais inquisitoriais portugueses – Lisboa, Évora, Coimbra e Goa (localizado na Índia – único fora da região metropolitana). Apesar de não existirem tribunais em todas as colônias, a Inquisição atuava através de uma grande rede de oficiais, regimentalmente norteados. O Tribunal de Lisboa era responsável pela região de Angola, América portuguesa, Guiné, Ilhas do Cabo Verde e São Tomé e Príncipe (BETHENCOURT, 2000; MARCOCCI, PAIVA, 2013).

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Filipe Barreto Range

que lhe daria uma ―solução‖ e ―lhe deu uma bolsa a qual era de xita cozida, dizendo que

lhe confiando a trouxesse consigo não seria ferido‖ (Idem).

A presença portuguesa em Angola (SILVA, 2002) foi pontilhada por conflitos,

alianças e guerras (FONSECA, 2010), que tinham como esteio principalmente a intensa

busca de negros escravizados. A cada avanço para o interior uma fortaleza era

construída com o intuito de manter a fixação do território. Alberto da Costa e Silva

(2002: 408) diz que, para Angola, ―Não se tratava mais de fundar feitorias nem de

repetir a política de aliança, catequese e cooperação desenvolvida no Congo, mas de

ocupar o reino do angola, para depois, de uma posição de força, convertê-lo‖.

Apesar dos poucos sucessos da evangelização na região centro africana, com o

tempo, as práticas cristãs foram enfraquecendo. Em carta a Dom Filipe II (1598 – 1621;

e III da Espanha), o bispo do Congo e Angola, Dom Frei Manuel Batista, em 1612, mais

de um século após os primeiros contatos com a região, disse que ―O Rei de Congo me

mostra boa vontade mas é tudo tão vazio que de uma ora para a outra se muda tudo‖

(ANTT – Carta n.o 136: fl. 0519). Acrescenta mais à frente que estava ―muito

descontente de achar estas partes e gentes tão incapazes de se poderem produzir nelas o

serviço de Deus e de Vossa Majestade‖ (idem), já que ―os vícios estão envelhecidos e a

barbaria é tão grande que não deixa melhorar‖ (idem).

A presença portuguesa em Angola teve características extremamente bélicas,

caracterizada pela formação de milícias de auxílio aos constantes conflitos. Vicente de

Morais era um preto forro, solteiro, músico e um dos soldados da Fortaleza de Muxima.

Natural e morador desta região, filho de Sebastião de Morais, capitão de artilharia do

presídio da dita fortaleza, e de Domingas Francisca. Ambos eram pretos forros, naturais

e moradores na fortaleza supracitada. Na sessão de Genealogia da documentação, na

qual se avaliava a origem familiar e seus comportamentos, consta que seu pai já era

falecido durante as investigações. Seus avós paternos também eram residentes na

região, e seu avô, Alexandre de Morais, era sargento deste mesmo corpo militar.

Deste modo, sua família era feita de militares negros, residentes no complexo

militar de Muxima. Os exércitos portugueses, em Angola, eram compostos por

pequenos grupos de europeus e um grande contingente de africanos aliados, além de

grupos de mercenários e regimentos de escravizados. A presença militar portuguesa

incorporou estratégias e organizações de guerra daquela região, como o uso de

escravizados como soldados – chamados de ―guerras pretas‖ (MATTOS, 2010;

PANTOJA, 2004; HEYWOOD, 2009: 117). Em nossos documentos este termo não

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

apareceu, o que nos levou a questionar estes enquadramentos. No entanto, visualizamos

a intensa participação de Vicente por entre as atividades militares da região, de forma

que se ele não era propriamente um ―guerra preta‖, poderia de algum modo manter

contacto com estes grupos de soldados escravizados.

O campo de tensão que o réu abriu, com suas práticas ou condição, pode ter

provocado sentimentos incómodos em seus pares, assim como nos religiosos locais,

desencadeando as denúncias e prisão. Não apenas o porte do amuleto e seu comércio

pode ter sido o problema, mas a dimensão pública criada em torno de suas

demonstrações coletivas das virtudes das bolsas. Todas as testemunhas afirmaram saber,

ou por ter visto ou por ter ouvido, das experiências públicas da eficácia das mandingas.

Das testemunhas, 11 eram soldados e os demais compreendiam a outros

postos, como sargentos, alferes e capitão, como pode ser visto na Tabela I. Todos

tinham ocupações ligadas à Fortaleza de Muxima. Estas testemunhas apresentam

nivelamentos diversos em seus discursos, alguns apresentando uma estrutura narrativa

básica, ao citar os mesmos fatos por entre detalhes diversos. De entre as testemunhas,

12 o distinguiram como ―público mandingueiro‖ e uma utilizou o termo ―Mestre

Mandingueiro‖ ao falar que ele fazia e comercializava os complexos de proteção.

Outras três apenas afirmaram saber que o acusado possuía uma bolsa.

Tabela I: Relação das Testemunhas3

NOME / TESTEMUNHA OCUPAÇÃO IDADE ESTADO CIVIL

1ª Martinho Mendes de Brito Soldado pago / Ajudante 27 anos Casado 2ª Joannes Mendes de Carvalho Capitão / Assistente 26 anos - 3ª Ivam Nogueira Soares Assistente 16 anos - 4ª Ivam Batista de Andrade Soldado / Assistente 20 anos - 5ª Manuel Dias Correia Ajudante / Assistente 35 anos - 6ª Manuel Nogueira de Morais Soldado pago / Ajudante 20 anos - 7ª Gaspar Dias de Carvalho Ajudante 31 anos - 8ª Miguel de Souza Soldado pago 26 anos Solteiro 9ª Antonio Martins Soldado pago/ Alferes 50 anos Solteiro 10ª Ivam Gomes Soldado pago 22 anos Solteiro 11ª Antonio Francisco Sales Soldado pago 39 anos Solteiro 12ª Manuel da Roza Camonis Soldado pago / Alferes 40 anos - 13ª Gaspar Nogueira Soares Soldado pago / Sargento 25 anos Solteiro 14ª Manuel Simons Palma Soldado pago / Sargento 36 anos - 15ª Manuel Pires da Costa Soldado pago / Alferes 35 anos Solteiro

Fonte: ANTT – PIL 5477.

3 Estas são as testemunhas do Auto Sumário realizado em Angola, iniciado em 24 de Julho de 1715 e concluído seis dias depois. Todas as testemunhas eram moradoras e/ou naturais da região do Presídio e Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição de Muxima; apenas a nona, o soldado António Martins, era natural da Ilha da Madeira, arquipélago da Madeira, no oceano Atlântico.

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Filipe Barreto Range

Sobre a publicidade de suas atividades, duas testemunhas, o Ivam Batista e

Gaspar Nogueira Soares, apontaram que Vicente fazia demonstrações públicas do poder

de suas mandingas. Neste sentido, as magias não só passaram a proteger, mas a criar

uma nova dimensão em que o simples soldado passara a controlar e ocupar um campo

de relações dotado de novas tensões sociais, a ponto de atrair os olhos inquisitoriais às

suas práticas. Não apenas possuía a proteção das mandingas, como as publicitava.

A posse de amuletos de proteção trazidos junto ao corpo era recorrente na África

central, como atestaram as testemunhas, pois quase todas souberam falar com detalhes

sobre conteúdos e usos. Existiam ainda outros objetos mágicos, que não aparecem em

nossos documentos, como as cinturas africanas - feitas com peles, pós e outros

ingredientes, colocadas em volta do corpo, produzidas pelos ngangas - sacerdotes

conhecedores de mistérios ocultos, responsáveis por realizar serviços de crença para

clientes particulares, curar doenças, predizer o futuro, em troca de algum pagamento

(PANTOJA, 2004: 127 e 130).

Vicente de Morais afirmou ser cristão católico, desconhecedor da atuação

diabólica de suas práticas. Consta que era batizado, frequentador dos cultos nas igrejas

da região, ouvindo missas, pregações, confessando e comungando. Soube dizer toda a

doutrina da fé além de orações perante os inquisidores. Estas informações, presentes nas

declarações de réus, apesar de comporem uma fórmula estereotipada, muitas vezes se

confundiam como um eco das perguntas dos inquisidores (GINZBURG, 1991). No

entanto, as testemunhas atestaram a frequente presença de Vicente de Morais nos ritos

cristãos. O que nos interessa é saber que o acusado participava de vivências tidas como

cristãs, compreendendo a um cristianismo africano (THORNTON, 2004; HEYWOOD,

2009; SWEET, 2007), fruto de uma intensa interpenetração religiosa atlântica.

Ainda durante a primeira confissão, datada de 1716, Vicente de Morais falou

que esteve em uma igreja na região de Matamba para auxiliar o frei Luiz da Conceição.

Conheceu João Gomes Batista que, antes de se iniciar a missa, chegou até ele e pediu

que colocasse um lenço no lugar do corporal para que o frei dissesse a Missa sobre ele.

Vicente fez como combinado e, ao término da cerimônia, o religioso o questionou sobre

o acontecido, já que a trama havia sido revelada. Ele respondeu que foi o dito João

Batista quem pediu e que ele mesmo temia que ―usasse dela para alguma coisa mal

feita‖ (ANTT – PIL 5477: fl. m0066). No entanto, entregou o lenço ao dito João e

―depois viu ele confidente que o dito João Gomes Batista trazia o lenço metido em uma

bolsa com uma oração latina, e lhe disse que a dita oração era boa pera livrar de

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

tempestades‖ (Idem). Segundo Vicente, o João Batista tinha costume de auxiliar os

sacerdotes da região nas celebrações eucarísticas, o que nos leva a crer que ele

aproveitava esta condição para ter contato com os paramentos rituais, utilizando-os em

suas magias sem que os religiosos percebessem.

O uso das bolsas de mandinga não era feito unicamente por africanos, mas

brancos e mestiços também as utilizavam. Numa das confissões, Vicente de Morais

disse que certa vez, na Fortaleza de Muxima, foi a sua casa um moço branco, chamado

de Martinez, transeunte de Luanda para Massangano, e lhe deu uma bolsa forrada de

damasco por dentro e por fora. Esta bolsa foi emprestada a um negro, chamado

Domingos, que não a devolveu a Vicente, alegando que a havia deixado cair em um rio.

Em outro momento, no presídio de Cambambe, Vicente fala que o soldado branco

Antonio Dias Pilarde, filho do capitão Leandro Dias Pilarde, deu a ele uma bolsa

forrada de camurça branca, a qual lhe defenderia de perigos. Com esta bolsa Vicente fez

uma experiência que se tornou pública em toda a Fortaleza de Muxima: amarrou-a no

pescoço de um cachorro e disparou tiros em sua direção. O cachorro saiu ileso,

―provando‖, assim, a virtude da bolsa. Nesta última bolsa, ao ser aberta por acidente em

uma briga entre Vicente e o sargento Manuel Pereira, existiam orações em latim,

fragmentos de Agnus Dei4 e objetos verdes não identificados, segundo as pessoas

presentes. Outros dois soldados brancos, Salvador da Rosa e Francisco Pereira, são

citados no processo por portarem bolsas de mandinga. Eles alegaram que fora Vicente

de Morais quem lhes havia dado.

Através desse uso de bolsas por diferentes camadas sociais, identificamos uma

sintonia no crédito a determinadas crenças, pois existiam questões no âmbito militar

daquela região que impeliam os indivíduos a lançarem mão dos instrumentos adequados

para sobreviver, atestadas, também, as precariedades instrumentais das corporações

militares portuguesas. As bolsas de mandinga protegiam de perigos, então eram mais

um instrumento a ser utilizado naquele inóspito contexto. Não foi à toa que Vicente de

Morais afirmou que todos os soldados da região utilizavam as magias de proteção.

Na bolsa de mandinga que fora aberta durante os registros da Inquisição, tendo a

descrição de seu interior anexada ao processo, o elemento especial encontrado foi um

4Agnus Dei é uma expressão em latim que significa ―Cordeiro de Deus‖ e representa o próprio Jesus Cristo, filho de Deus, que foi imolado enquanto um cordeiro pela salvação da Humanidade. O Agnus Dei também é um objeto cristão, um pingente metálico, utilizado para guardar relíquias. Neste sentido, se este era realmente o objeto ao qual se referiam, existia dentro da bolsa citada, além das orações em latim, e provavelmente de cunho cristão, o referido cordão de relíquias.

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Filipe Barreto Range

―gancho de espadas‖. A presença deste elemento pode ser compreendida através da

conjugação da finalidade protetora da bolsa com o contexto e atividades exercidas pelo

portador - as agressões de instrumentos bélicos. Foram encontrados também diversos

escritos e símbolos, com passagens dos grandes Evangelhos. Os símbolos eram

desenhos de armas de ferro, como espadas e facas, articulados com o conteúdo dos

escritos (RANGEL, 2012; 2012a; 2014). Estes elementos reforçam a ideia de proteção

contextual atrelada à existência do próprio ―gancho de espadas‖ do interior de uma das

bolsas.

A existência das bolsas de mandinga, independente se era Vicente de Morais

quem as fazia, comercializando-as ou não, conferiram a este soldado uma dupla

identidade. Reconhecida pelos religiosos como um ―soldado feiticeiro‖, enquanto que

para seus pares ele era um ―mestre mandingueiro‖. O termo ―feitiçaria‖, apresentado

nos cabeçalhos dos registros do processo, traz uma carga interpretativa diabólica às

atividades de Vicente, uma vez que, segundo os religiosos, era o próprio demônio quem

o auxiliava. Os militares, seus pares, o acusaram de fazer mandingas. Relataram que as

viam como um mal perante a fé cristã, mas talvez também as entendessem como

necessárias. Porém, não podemos perder de vista que depuseram perante representantes

da Inquisição de forma que seus discursos poderiam estar sendo permeados pelo medo

de também caírem na alçada de suas repressões.

Vicente foi preso e enviado a Lisboa, onde o processo foi iniciado e concluído.

Recebeu a sentença de excomunhão, confisco de todos os seus bens, entre outras penas.

Como se apresentou arrependido e pediu pela misericórdia de Deus, a sentença foi

reduzida ao açoite pelas ruas da capital lusa, usando o hábito penitencial – o sambenito

–, degredo para as galés reais por cinco anos, além de instruções sobre os mistérios da

fé. Não sabemos quais rumos o ―soldado mandingueiro‖ tomou, após o que lhe fora

prescrito como punição. Será que ele abandonou seu antigo ofício de mandingueiro?

O acusado irritou as instâncias eclesiásticas locais, fomentando um poder

paralelo ao poder da Igreja. De um lado, estava a esfera religiosa com todo um

instrumental evangelizador e repressor. Por outro, Vicente de Morais figurara

manifestando a resistência das crenças locais, construindo complexos mágico-

religiosos. As interpenetrações aconteceram, unindo saberes diversos. E ele, enquanto

portador e disseminador de um novo saber, oriundo do contato cultural entre os povos

atlânticos, corresponde a um dos indivíduos multifacetados, forjados no âmbito destas

trocas e adaptações de saberes, posturas, sociabilidades e identidades.

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

Considerações finais

O caso de Vicente de Morais põe em xeque algumas abordagens da diáspora

atlântica, ao mostrar que as mestiçagens se processaram também na própria África. Na

lógica das magias, a ideia de agregar para potencializar, foi bastante fértil. Vicente não

atravessou a kalunga para entender profundamente as lógicas de poder que perpassavam

as instâncias sagradas cristãs cultuadas nas franjas atlânticas, mas foi atravessado pelas

dimensões circulares de gentes e saberes em séculos de travessias. Além do mais, à sua

maneira, compartilhou com seus colegas de ofício os frutos de suas vivências, os

saberes das magias/mandingas.

O nosso soldado se apropriou de uma série de conhecimentos espirituais do

lastro extremamente plástico das magias setecentistas, manipulando ―sagrados‖,

colocando-os a serviço de suas necessidades. Não posso deixar de citar aqui um trecho

da música Yayá Massemba5, composta pelos baianos Roberto Mendes e Capinam, e

interpretada por Maria Bethânia, que toca de forma bastante pertinente nestes registros

das vivências de nosso ―mestre mandingueiro‖ Vicente de Morais. Para além de todos

os elementos diaspóricos que a composição musical evoca, entre as problemáticas das

travessias atlânticas, o luar de Luanda, retalhos de vivências e sentimentos poéticos, ela

encerra dizendo ―Vou aprender a ler, pra ensinar os meus camaradas!‖ Se nos

permitirem dizer, Vicente de Morais aprendeu a ler e ensinou aos seus camaradas!

Fontes primárias:

ARQUIVO NACIONAL DA TORRE DO TOMBO (ANTT), Processo da Inquisição de Lisboa, número 5477, contra Vicente de Morais, Lisboa, Portugal, 1716. (<http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=2305504>, acessado em 10/10/2011).

ARQUIVO NACIONAL DA TORRE DO TOMBO (ANTT), Carta de Frei Manuel Batista, Bispo do Congo e Angola, a dar conta ao Rei estar a gente daquela terra incapaz de servirem a Deus e que o Rei do Congo se lhe mostrava muito afecto mas que tudo era ideia, entre outros assuntos. Lisboa, Portugal. Corpo Cronológico, Parte I, Maço. 115, no. 136, 1612. (<http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=3782825>, acessado em 07/02/2011).

5 Yayá Massemba – composição de Roberto Mendes e Capinam, 2003. Cd Brasileirinho – Maria Bethânia, 2003, faixa 2. (<http://letras.mus.br/maria-bethania/164730/>, acessado em 04/10/2013).

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Filipe Barreto Range

Música Yayá Massemba – composição de Roberto Mendes e Capinam, 2003. Cd Brasileirinho – Maria Bethânia, 2003, faixa 2. (<http://letras.mus.br/maria-bethania/164730/>, acessado em 04/10/2013).

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CALAINHO, Daniela Buono. Metrópole das Mandingas: religiosidade negra e inquisição portuguesa no antigo regime. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.

FONSECA, Mariana. B. Rainha Nzinga Mbandi, imbangalas e portugueses: as guerras nos kilombos de Angolano século XVII. Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v. 23, n. 2, pp. 391 - 415, 2010.

GINZBURG, Carlo. O Queijo e os Vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido pela Inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

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____________. O Inquisidor como Antropólogo. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. I, n. 21, pp. 09 – 20, 1990/1991.

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Vou aprender a ler, para ensinar a meus camaradas

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____________. O desenho nas magias setecentistas. Anais do X Seminário do Programa de Pós-graduação em Desenho, Cultura e Interatividade & V Colóquio Internacional sobre Desenho - UEFS. Feira de Santana, UEFS, 15 a 17/10/2014.

____________. O Império português e o soldado feiticeiro: traduções religiosas na Angola setecentista. Itaberaba, 2012. (Monografia de Graduação em História – UNEB).

SANTOS, Vanicléia Silva. As bolsas de mandinga no espaço Atlântico: século XVIII. São Paulo, 2008. (Tese de Doutorado em História Social, FFLCH – USP)

____________. Mandingueiro não é Mandinga: o debate entre nação, etnia e outras denominações atribuídas aos africanos no contexto do tráfico. In: PAIVA, Eduardo França; SANTOS, Vanicléia Silva. (org) África e Brasil no Mundo Moderno. São Paulo: Annablume, pp. 11 - 27, 2012.

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SOUZA, Laura de Mello e. O Diabo e a Terra de Santa Cruz: religiosidade e feitiçaria popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

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THORNTON, John K. A África e os africanos na formação do mundo Atlântico, 1400-1800. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

VAINFAS, Ronaldo. Os protagonistas anônimos da história: micro-história. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

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Artigo #2

Paz e transformações nas famílias angolanas: representações sociais (2002 – 2016). 6

António Guebe, Ph.D.

Universidade Agostinho Neto Investigador no IUL/ISCTE

[email protected]

Resumo

A comunicação com o título ―Paz e transformações nas famílias angolanas: representações sociais (2002 – 2016) ‖, visa, por um lado, lembrar que o longo conflito armado interno pós-Independência que Angola viveu, desestruturou e, em alguns casos, destruiu a família angolana. E, por outro lado, enaltecer que com o alcance da Paz, em 2002, dirigentes políticos, igrejas (em homilias), sociedade civil e académicos trabalham para o reencontro e a reconciliação nacional. Destacam a luta pela unidade, solidariedade para com o Outro, ou seja, o resgate dos valores sociais, morais e culturais. Onde a família, quer no sentido restrito (pai, mãe e filhos), também conhecida como família nuclear, como no sentido alargado (família nuclear, avôs, avós, tios, tias, vizinhos e outros parentes), como pilares da sociedade, jogam papel preponderante. Daí, a necessidade da sua preservação. O estudo, efectuado com o recurso à técnica de recolha de dados (inquérito por questionário), considera ainda incipiente o nível das dinâmicas das transformações na família angolana, admitindo duas tendências opostas: uma para o progresso e a outra para o retrocesso.

Palavras-chave: representações sociais, paz, família, conflito armado, sociedade civil.

6 Artigo apresentado como comunicação ao VI Colóquio da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto, que decorreu sob o lema: ―Os desafios da sociedade angolana no séc. XXI. População, Dinâmicas Sociais e Fluxos Migratórios‖, realizado em Luanda nos dias 25 e 26 de Outubro de 2016.

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Paz e transformações nas famílias angolanas

Abstract

The communication entitled "Peace and transformations in the Angolan families: social representations (2002 - 2016)" aims at remembering that the long internal armed conflict after Independence that Angola has lived in, has disorganized and in some cases, destroyed the Angolan family. Ontheotherhand, it underlines that as we reached Peace, in 2002, political leaders, churches (in homilies), civil society and academics, have been working for a reencounter and national reconciliation. They highlight the struggle for unity, solidarity with the Other, that is, the rescue of social, moral and cultural values. Where the family, either in the narrow sense (father, mother and children), also known as nuclear family, as in the broad sense (nuclear family, grandparents, grandparents, uncles, aunts, neighbors and other relatives), as pillars of society, play a preponderant role. Hence, the need for its preservation. The study using the data collection technique (questionnaire survey) still considers the level of dynamics of transformation in the Angolan family to be incipient, admitting two opposite tendencies: one for progress and the other for regression.

Keywords: social representation, peace, family, armed conflict, civil society.

Introdução

É utopia falar de transformações no seio de qualquer família sem se falar da

condicionante paz, por existir uma relação intrínseca e de interdependência entre os dois

termos. Pois a paz é invisível, e, sem a componente transformação, é uma expressão no

sentido figurado, isto é, sem representação. A transformação é, neste caso, a parte

visível da paz. Daí que, esta abordagem assenta na comunicação com o título ―Paz e

transformações nas famílias angolanas: representações sociais (2002 – 2016) ‖.

Os propósitos da apresentação da referida comunicação prendem-se com o facto

de através das representações sociais de alguns representantes das famílias angolanas

saber que metamorfoses se operaram no seio da família angolana, desde a conquista da

paz aos dias de hoje.

O estudo privilegia o método quantitativo que permite o raciocínio lógico,

partindo do particular para o geral, e a técnica de recolha de dados, o inquérito por

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António Guebe

questionário. Foi possível inquirir 26 pessoas, o equivalente a 86,6 por cento das 30

previstas inicialmente. Desta amostra, 4 inquiridos, que correspondem a 13,4 por cento,

não responderam ao inquérito. A faixa etária dos inquiridos varia entre 23 a 67 anos,

sendo 19 masculinos e 7 femininos, com um nível de escolaridade variável entre a 9ª

classe e a licenciatura: 1 com a 9ª classe; 1 com 10ª classe; 6 com 12ª classe; 2 com 13ª

classe; 1 bacharel; 6 a frequentarem o ensino superior; 8 com licenciatura; e 1 iletrado.

As ocupações dos inquiridos distribuem-se da seguinte maneira: 15 professores

maioritariamente reformados; 3 funcionários públicos; 2 privados; 1 engenheiro

informático; 1 técnico de justiça; 1 agricultor; 1 pastor da igreja; 1 estudante; e, 1

desempregado. As residências dos inqueridos repartem-se por 10 no município do

Cubal, Província de Benguela; 6 na cidade de Benguela; 5 no município do Chongoroi,

Província de Benguela; 4 em Luanda; e 1 no Lubango, Província da Huíla.

Os inquéritos por questionário realizados à unidade de análise acima referida

permitiram conhecer com propriedade as representações sociais dos mesmos sobre a paz

e as transformações na família angolana.

O contexto Paz e Família em Angola

2.1 – A Paz na realidade angolana

―Paz‖, palavra curta formada apenas por três alfabetos, sendo duas consoante e

uma vogal (p, z e a). De uma dimensão incontornável na esfera do crescimento e do

desenvolvimento humano e indispensável à vida de todos os seres vivos, sejam eles

animais ou plantas. Mas, para se continuar a falar dela, precisa-se saber de que tipo de

paz queremo-nos referir, daí, a necessidade da sua teorização.

O termo ―paz‖ pode representar a ausência de guerra ou de conflito, podendo por

isso ser repartida, segundo Bobbio (2004), em duas componentes, sendo a componente

interna e a componente externa. A primeira componente da paz interna insere-se no fim

do conflito ocorrido no procedimento ou na conduta do indivíduo, citando como

exemplos, a desarmonia entre dois deveres; entre o dever e o prazer, entre razão e

paixão, entre o interesse próprio e o interesse de outrem. A segunda componente da paz

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Paz e transformações nas famílias angolanas

externa cinge-se, igualmente, na ausência do conflito, desta feita entre um indivíduo e

outro indivíduo, ou ainda entre grupos diversos.

A paz traduzida na realidade angolana passa, necessariamente, por recordar os

momentos difíceis de conflito armado7 interno ou guerra interna8 e/ou guerra civil9,

como às vezes se denomina, que durou décadas e que, inicialmente, envolveu os três

movimentos que lutaram contra o colonialismo português, nomeadamente a FNLA10, o

MPLA11 e a UNITA12 e, posteriormente, se confinara apenas entre dois movimentos, o

MPLA e a UNITA. O seu desfecho só foi possível em 22 de Fevereiro de 2002, com a

morte em combate de Jonas Malheiro Savimbi.

Enquanto durou o referido conflito armado interno não foi possível saborear a

paz, embora os partidos políticos, as igrejas e a sociedade civil13 se tenham e continuem

empenhados na busca da paz, fazendo apelos, organizando conferências e outras

intervenções públicas, incluindo as homilias, de forma a pôr termo à causadora de

mortes, do sofrimento e de destruições patrimoniais. A sociedade civil, por exemplo,

que é vista, segundo Khilnani (2001:49) como espaço político interno actuando

7 O conceito de conflito pode ser entendido, segundo PASQUINO (2004:225) como a maneira do relacionamento entre indivíduos, grupos, organizações e colectividades que envolve a presença de choques entre si que visem o alcance e a partilha de diminutos recursos. Tais recursos estão presumivelmente imanados no poder, na riqueza e no prestígio. Torna-se um conflito armado quando na sua prossecução envolve armas ou outros meios letais diversos. 8 GORI (2004:572) considera a guerra como uma espécie de conflito, uma espécie de violência, um fenómeno de psicologia social, uma situação jurídica excepcional e, finalmente, um processo de coesão interna, podendo ser, do ponto de vista intencional ou psicológico dos promotores a ofensiva, defensiva e/ou de nervos. E quanto ao material bélico a Guerra pode ser convencional ou nuclear. A Guerra representa para Descola e Izard (1991:313) ―uma via sangrenta colectiva de resolução do conflito, onde uma parte beligerante opõe-se as unidades políticas independentes situadas num determinado território que pode ser (comunidade local, clãs ou classes de idade, tribo ou reino, estado-nação)‖. 9 Guerra civil, um dos tipos de guerra para além da guerra internacional e guerra colonial, se levada a cabo por elementos de um mesmo grupo, organizado, ou seja, cidadãos do mesmo Estado como defendem Bobbio, Matteucci e Pasquino (2004). Não se aplica ao presente estudo, devido aos contornos que lhe caracterizam, ou seja, o combate entre cidadão do mesmo país no caso concreto de Angola, decorre desde a guerra colonial, logo, é mais extensa do que as vezes se pensa. Daí, a opção pelo conceito de conflito armado interno. 10 Frente Nacional de Libertação de Angola 1111 Movimento Popular de libertação de Angola 12 União Nacional para a Independência Total de Angola 13 Das abordagens sobre o conceito de Sociedade civil fica retida a definição avançada por Bpbbio (2004:1210) como ―[…] a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos, entre classes sociais, que se desenvolvem à margem das relações de poder que caracterizam as instituições estatais. [Melhor dito], Sociedade civil é representada como o terreno dos conflitos económicos, ideológicos sociais e religiosos que o Estado tem a seu cargo resolver, intervindo como mediador ou suprimindo-os; como a base da qual partem as solicitações às quais o sistema político está chamado a responder; como o campo das várias formas de mobilização, de associação e de organização das forças sociais que impelem à conquista do poder político‖. Para Khilnani (2001:46) Sociedade civil é determinante para a sobrevivência de qualquer ordem liberal democrática.

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António Guebe

privilegiadamente em algumas instituições (mercados, movimentos sociais, culturas),

cujas existências são amplamente estabelecidas pelas conjunturas locais, jogou e

continua a jogar papel fundamental nos apelos em busca da paz.

Aliás, o empenho das instituições acima referidas, incluindo os partidos políticos

mereceu a atenção do Presidente da República de Angola, ao afirmar:

―A paz consolida-se todos os dias graças ao espírito de tolerância, reconciliação e perdão de todos angolanos […]. Os partidos políticos, a sociedade civil e as igrejas promovem campanhas de consciencialização e educação para a paz e a democracia, baseadas nos valores da liberdade, do respeito mútuo e de opinião alheia, tolerância, harmonia social, fraternidade e solidariedade‖.14

De sublinhar que, durante o conflito armado interno, esforços tendentes a

alcançar a paz foram desenvolvidos pelas partes beligerantes. Justifica a afirmação a

celebração dos acordos de Mombaça - Quénia, realizados em 5 de Janeiro de 1975; do

Alvor - Portugal, realizados de 10 a 15 de Janeiro de 1975; de Bicesse - Portugal,

ocorrido a 31 de Maio de 1991; o Protocolo de Luzaka - Zâmbia, em 20 de Novembro

de 1994; e, finalmente, o Acordo de Entendimento do Luena, assinado a 4 de Abril de

2002, que trouxe a paz definitiva. E, só com esse último acordo foi possível trazer a paz

definitiva que permitiu a livre circulação de pessoas e bens, o regresso das pessoas para

as suas aldeias, o programa de desminagem dos caminhos e das aldeias, das fontes de

água, dos campos, etc. Só para se ter uma ideia àcerca da implantação de minas em

Angola durante o conflito, o Presidente da República diria:

―Quando terminou a guerra em 2002, Angola e o Camboja eram os países do mundo que tinham mais minas anti-pessoais e anti-tanque. Falou-se na altura em cerca de dois milhões de minas implantadas. Estavam minados os acessos aos campos agrícolas, as três principais linhas de caminho-de-ferro e respectivas pontes, as zonas adjacentes às torres de transporte de energia eléctrica e às centrais e condutas de água‖.15

14 Mensagem sobre o Estado da Nação de Sua Excelência José Eduardo dos Santos, Presidente da República de Angola, 2014, p. 1. Disponível em http://www.mission-angola.ch/discursos/pt/20141015 presidente.pf (acessado em 19/10/2016). 15 Mensagem do Presidente da República sobre o Estado da Nação. ―Estamos habituados a lutar contra as adversidades‖. In Jornal de Angola, 14189 (18 de Outubro de 2016, pp. 4-5)

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Paz e transformações nas famílias angolanas

Daí, o reencontro entre as famílias já se ter constituído numa realidade. Pois só

com a paz genuína foi possível dar passos seguros em toda a vida política, económica,

social, cultural e religiosa. Porém, há que lutar para a sua conservação, através do

diálogo entre as pessoas, pois, É preciso manter o país em paz e com estabilidade,

consolidar a democracia e as instituições do Estado e garantir a liberdade de criação e

expressão, para que a construção do (bem-estar) social seja obra de todos‖.16

2.2 A família Angolana

Etimologicamente, a palavra f amília‖ deriva do vocábulo latino que significa

servo ou escravo. Traduz a noção das relações familiares que se circunscrevem à posse

e à obediência, de tal maneira que a mulher devia obedecer ao marido como seu dono e

os filhos seriam entendidos como pertença dos pais, a quem devam obediência e a vida.

Ao propósito, os pais achavam-se no direito totalitário sobre os filhos procriados.

Portanto, é na ideia de posse e de poder que reside a proveniência e metamorfoses da

família.17

O conceito de família nutriu de subsídios de diversos ramos do saber, destaque

para a sociologia e a antropologia. Na variante sociológica são bem patentes os

contributos de Johnson (1997) e de Étienne et al (1998). Johnson(1997:107), por

exemplo, toma como ponto de partida a constituição social da família a partir das

funções que deve cumprir, nomeadamente a reprodução e escolarização dos jovens, o

regulamento do comportamento social, acção como grande centro de trabalho produtivo,

proteção aos filhos, e disponibilização de apoio emocional aos adultos. São funções

básicas e universais.

Por seu turno, Étienne et al (1998) consideram a família como uma organização

sempre presente em todas as sociedades humanas, portanto, um fenómeno

fundamentalmente cultural. Partilham o conceito de família avançado pelo etnólogo

Robert Murdock (1949) que considera a família como um grupo caracterizado pela

residência comum e pela cooperação de adultos dos dois sexos e dos filhos que eles

16 Mensagem de Ano Novo do Presidente da República. É preciso manter o país em paz e com estabilidade‖. In Jornal de Angola, 13884 (19 de Dezembro de 2015, p. 5) 17 Pedro Prudente, ― F a mília‖, disponível em http://slideplayer.com.br/slide/1642481/ , (acessado em 6 de Outubro de 2016).

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António Guebe

geraram ou adoptaram‖. Na verdade, a família é, segundo os mesmos autores, a união

de pessoas adultas de sexos opostos de que se espera o exercício de seguintes funções:

reprodutora que tem a ver com a multiplicação das famílias; produtora de bens materiais

e de consumo; da socialização dos filhos; e outras (ÉTIENNE, 1998:164-167).

Para a variante antropológica valiosos são os contributos de Riviére (2000) e de

Augé (2003). Enquanto Riviére (2000) considera a família como o conjunto de

semelhantes partilhando o mesmo tecto, apresentando-se de formas diversas. Augé [dir.]

(2003) vai mais além ao considerar a família como um grupo social que, no mínimo é

representado por um homem e uma mulher agregados pelos laços socialmente

ratificados e mais ou menos duradouros que tomam a designação de casamento, em

convivência com o filho ou filhos resultantes dessa união ou adoptados, cujas funções

(RIVIÈRE, 2000:77) incluem reprodução, educação e socialização, económica, jurídica

e religiosa.

À partida, ambas as correntes (sociológica e antropológica) são unânimes em

reconhecer na família como sistema social, a existência da família nuclear ou restrita

e/ou complementar, composta de pai, mãe e filhos gerados ou adoptados, partilhando o

mesmo espaço residencial. A família nuclear caracteriza-se por um casamento

monogâmico que, segundo o sociólogo Emile Durkheim e Étienne et al (1998:164)

diferencia-se em monogamia muito disseminada em determinadas sociedades

consideradas primitivas, por razões económicas, e em monogamia de direito, típica das

sociedades dos países ocidentais contemporâneos, segundo as quais é juridicamente

proibido contrair matrimónio simultaneamente com várias pessoas.

A família nuclear é considerada pelas correntes referidas anteriormente como o

pilar da sociedade. Como enaltece Altuna (2006:115), ―Sem família nuclear, faltaria a

base para as estruturas sociais e políticas que se inauguram a partir da

consanguinidade‖.

Em ambas as correntes (sociológica e antropológica) reconhece-se, também, a

existência da família extensa ou alargada, composta de pais, mãe, filhos, tios, tias, avôs,

avôs, outros parentes, enfim, inclui diversas gerações (ascendentes descendentes e

colaterais) que partilham o mesmo tecto. A família extensa fundamenta-se no casamento

poligâmico nas suas variantes poliginia (o homem a coabitar com duas ou mais

mulheres).

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Paz e transformações nas famílias angolanas

A constituição das famílias poligínicas, segundo Riviere (2000:77), cumpre ―As

finalidades das estratégias matrimoniais […] de ordem: demográfica; económica;

política; religiosa; psicossocial; psicossociológica‖.

Vista no contexto bantu, ―a família alargada consolida o valor mais estimado e

desejável, pois que engendra a solidariedade e fundamenta esse humanismo tão sadio. O

banto compreendeu que o homem só pode realizar-se pela comunidade e na

comunidade‖ (ALTUNA, 2006:117).

A família no contexto angolano insere-se num conjunto de populações,

maioritariamente bantu, de diversidades etnias, línguas, manifestações culturais e outras

diferenças. A sua preservação esteve e estará sempre no centro das atenções do Governo

angolano, fundamentada no parentesco, no casamento, na união de facto e na afinidade.

Sustenta a presente afirmação a aprovação pela então Assembleia do Povo e publicação

da Lei nº 1/88, de 20 de Fevereiro, que abona o Código da Família, ainda em vigor, em

cujos princípios fundamentais se podem observar a protecção da família, Artigo 1º e a

harmonia e responsabilidade no seio da família, Artigo 2º, com os seguinte conteúdos:

Artº 1º, 1.- A família, como núcleo fundamental da organização da sociedade, é objecto de protecção do Estado, quer se fundamente em casamento, quer em união do facto. 2. O casamento e a união de facto só produzirão efeitos jurídicos quando celebrados ou reconhecidos nos termos da lei. Artº 2º, 1. A família deve contribuir para a educação de todos os seus membros no espírito do amor ao trabalho, do respeito pelos valores culturais e do combate às concepções ultrapassadas no seio do Povo, da luta contra a exploração e a opressão e da fidelidade à Pátria e à Revolução. 2. A família deve contribuir para o desenvolvimento harmonioso e equilibrado de todos os seus membros, [para] que cada um possa realizar plenamente a sua personalidade e as suas aptidões, no interesse de toda a sociedade.

A produção dos demais instrumentos jurídicos, como o Decreto Presidencial nº

8/11, de 7 de Janeiro, que aborda a atenção a ter sobre a família, mediante o

regulamento do regime jurídico de prestações familiares, integrado pelo subsídio de

maternidade, subsídio de aleitamento, abono de família e subsídio de funeral; a Lei nº

25/11, de 14 de Julho, em alteração, contra a violência doméstica que estabelece o

regime jurídico de prevenção da violência doméstica, de protecção e de assistência às

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António Guebe

vítimas; a Lei nº 25/12, de 22 de Agosto; o Decreto Presidencial nº 26/13, de 8 de Maio

que aprova o Plano Executivo contra a Violência Doméstica e o respectivo cronograma

de Acções; o Decreto Presidencial nº 155/16 de 9 de Agosto que aprova o Regime

Jurídico do Trabalho Doméstico e de Protecção Social do Trabalhador de Serviço

Doméstico; a Lei nº 12/16, de 12 de Agosto que estabelece as normas sobre a

constituição, organização e do procedimento de mediação e conciliação, enquanto

mecanismos de resolução alternativos de conflitos; e, finalmente, a Constituição

Angolana que consagra a família como ―o núcleo fundamental da organização da

sociedade e é objecto de especial protecção do Estado, quer se funde em casamento,

quer em união de facto, entre homem e mulher‖ (CONSTITUIÇÃO, 2010:16). Estes

instrumentos legais são provas evidentes do engajamento do Governo Angolano na

protecção e transformações da família angolana.

No contexto global, a família interpreta o lugar de socialização, onde são gizadas

em colectividade as estratégias de sobrevivência, assim como da prática da cidadania,

com vista ao alcance do progresso individual e colectivo de seus membros (CARTER &

MCGOLDRIECK, 1995).

2.3 Paz e família em Angola. Que relação?

Partindo do pressuposto segundo o qual a paz é um bem indispensável à vida dos

seres vivos, incluindo as plantas, considera-se que esta constitui o elemento

determinante da existência, da sobrevivência e do desenvolvimento das espécies. Está

provado que sem a paz não há união, não há solidariedade, não há amor. Tal como se

referiu o Presidente da República ao afirmar:

―Todas as conquistas se devem em primeiro lugar ao clima de paz que se instalou de forma definitiva no nosso país desde 2002 e que é obra de todos os angolanos. Foi a paz que devolveu ao nosso povo a esperança num futuro melhor, num quadro de liberdade, justiça e inclusão social. Conscientes disso, temos de continuar a esforçar-nos para que a paz se venha a tornar na principal força identitária entre os angolanos de todas as origens, convicções políticas ou crenças religiosas e para que se mantenha

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Paz e transformações nas famílias angolanas

entre nós o espírito de união, de tolerância e de respeito pela diferença e pelos valores em que assenta a democracia‖.18

O pronunciamento acima, do Presidente da República, revela o quão foi

importante a conquista da paz e o quanto é importante a sua consolidação e preservação,

para que a família angolana possa obter o progresso multifacetado.

O conflito armado interno submeteu, também, a família à separação forçada, à

dispersão, à imigração forçada para terras longínquas, incluindo o cimo das montanhas

em busca de segurança. O Presidente da República e Presidente do MPLA, no seu

discurso de abertura do VII Congresso destacou o seguinte:

―[O conflito armado interno] não destruiu apenas pontes, escolas, hospitais, campos agrícolas, caminhos-de-ferro e infra-estruturas no domínio da indústria, energia e águas. Destruiu sobretudo vidas, levou à morte centenas de milhares de pessoas e ao adiamento do sonho das nossas crianças, jovens e mulheres e de todo o nosso povo‖ (JORNAL DE ANGOLA, 2016:4).

Do que acima foi dito pode-se aferir que, quer a família que recorreu às

montanhas, como a que recorreu aos centros urbanos, suburbanos e periferias, não se

dispuseram de condições para continuarem a operar transformações positivas no seu

seio. Porque os lugares habituais para a transmissão de conhecimentos ficaram nas

zonas de partida e as dinâmicas dos novos lugares não permitiram o seu exercício. Os

velhos portadores de conhecimentos sobre os valores ancestrais sucumbiram sem puder

partilhar com as novas gerações.

O reino animal não escapou às matanças generalizadas, originando a redução

considerável das espécies, levando-as, em alguns casos, à beira da extinção quase

completa, como aconteceu com a palanca negra gigante, espécie rara que habita as

terras angolanas da Província de Malange.

A dada altura, isto é, antes e pós abertura política de 1992-2002, a sociedade

angolana, com destaque para a sociedade civil (nacional e internacional) e a igreja,

desdobram-se em campanhas apelando à paz e à reconciliação nacional, designados

por Comerford (2005:153) como ―apelos de paz‖. Segundo o mesmo autor, estes apelos 18 Mensagem do Presidente da República sobre o Estado da Nação. ―Estamos habituados a lutar contra as adversidades‖. In. Jornal de Angola (de 18 de Outubro de 2016, p. 4-5).

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António Guebe

começam com o documento intitulado ―Manifesto para a Paz em Angola‖ de 1999,

seguindo-se lhe o chamado ―paz pela via do diálogo‖ pertencente ao GARP (Grupo

Angolano de Reflexão para a Paz) e o Manifesto pela Paz em Angola ou simplesmente

Manifesto que ―assinado por mais de cento e vinte indivíduos, incluindo jornalistas,

sociólogos, docentes universitários, advogados, sindicalistas, pastores, pessoal de

ONGs, músicos e escritores. Vários deputados parlamentares e membros de partidos

políticos também assinaram o manifesto (COMERFORD, 2005:154).

A par da sociedade civil, do lado das Igrejas vieram também os apelos à paz. A

CEAST (Conferência Episcopal de Angola e São Tomé), através da Rádio Eclésia,

afecta à Igreja Católica, fez vários apelos para o alcance da paz. Desses apelos, a título

de exemplo, sublinhamos o de 17 de Junho de 2000 que refere o seguinte: ―A Igreja

mais uma vez expressou, em nome dos angolanos, o desejo da paz que Angola

necessita. […] a paz por via de conversações, é quanto a nós, a mais realista, […]‖

(COMERFORD, 2005:91).

Aos esforços de CEAST na busca da paz juntou-se também outra organização

eclesiástica, a CICA (Conferência das Igrejas Cristãs em Angola), que aplaudiu as

iniciativas. Como se pode imaginar, várias são as vozes que se fizeram ouvir em busca

da paz, como elemento sin qua non do progresso e do bem-estar social das famílias,

referência para as transformações positivas.

Tal só se concretiza com a morte em combate de Jonas Malheiro Savimbi, líder

da UNITA, em 22 de Fevereiro de 2002.

Terminado o conflito armado interno uma parte significativa da família que se

acolheu aos centros urbanos, suburbanos e periferias não regressou às zonas de origem

(rurais) e uma parte das famílias que se refugiaram para o cimo das montanhas afluíram

os centros urbanos, suburbano e periferias ao encontro dos familiares e parentes. Esta

realidade influenciou em grande medida as assimetrias verificadas entre a população

urbana e a população rural. De acordo com os resultados definitivos do recenseamento

geral da população e da habitação de Angola 2014, a população geral é de 25 789 024, o

correspondente a 100 por cento, destes, 16 153 987, o equivalente a 62,6 por cento

pertencem ao meio urbano e 9 635 037, estimado em 37,4 por cento, pertencem ao meio

rural (INE, 2016:31).

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Paz e transformações nas famílias angolanas

3. Representações sociais sobre transformação na família angolana

3.1 Representações sociais

A necessidade de conhecer o mundo de objectos, de pessoas, de acontecimentos

ou ideias, à nossa volta, compartilhando com os outros, tanto na convergência como na

divergência para poder compreender o outro, levou ao surgimento e desenvolvimento do

conceito de representações sociais entre sociólogos e psicólogos sociais, destacando-se

Moscovici (1984), Jodelet (1984) e Vala e Monteiro (2013). O conceito de

representações sociais desenvolvido por estes autores é uma emanação das

representações colectivas, cuja criação se atribui ao sociólogo Émile Durkheim (1898).

O conceito de representações sociais é de extrema importância para as ciências

humanas e sociais. Jodelet (1984) considera que as representações sociais patenteiam a

maneira de interpretar e pensar sobre a realidade quotidiana, logo, são uma forma de

conhecimento social. Traduzem a maneira como apreendemos os acontecimentos do

dia-a-dia, os elementos do meio ambiente em que vivemos, informações sobre as

pessoas mais próximas ou distanciadas. As relações sociais assentam num

conhecimento ―espontâneo‖, ―ingénuo‖, conhecimento de senso comum ou pensamento

natural, baseado em experiências, em padrões adquiridos e transmitidos por tradição,

por educação, pela comunicação social, etc., conhecimento que em alguns casos é

oposto ao conhecimento científico. As representações sociais são, portanto, a

reprodução daquilo que se pensa sobre uma determinada realidade.

3.2 As transformações das famílias nas representações sociais dos angolanos

O conceito de família nas representações sociais dos inquiridos não se distancia

grandemente das teorias representadas anteriormente, sendo: grupo de pessoas unidas

ou não por laços sanguíneos; o conjunto de pessoas que vive sob o mesmo tecto (pai,

mãe, filhos, como família restrita e tios, tias, primos, avós e netos como família

alargada); elemento básico e estrutural de uma sociedade; pilar da sociedade; unidade

básica da sociedade, formada por indivíduos com ancestrais em comum e ligados por

laços afectivos.

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António Guebe

A importância da família é enaltecida pelos inquiridos como o meio pelo qual se

transmitem os primeiros hábitos e costumes, valores cívicos e morais, religiosos e

culturais com vista a moldagem do indivíduo na sociedade em que se encontra inserido.

É o conjunto de famílias que perfazem uma sociedade. Não é possível falar de

sociedade sem ter em conta a existência das famílias. É na família que são apreendidos

os valores, atitudes e comportamentos para a vida da sociedade.

Ainda sobre a importância da família, o Presidente da República e do partido

MPLA, diria no encerramento do seu VII Congresso Ordinário o seguinte: ―[a família é

verdadeiramente uma importante base de apoio e não basta declarar que ela é o pilar da

sociedade. É preciso definir políticas públicas e adoptar medidas concretas para

reforçar o seu papel e proteger as mais frágeis e carenciadas‖19.

O inquirido Fernando Cussulala valoriza a família na sociedade da seguinte

maneira: ―Educação dos filhos e filhas. A família devia ser um viveiro bom. Uma planta

bem tratada no viveiro não encontra problemas ao transplantá-la. Um filho, uma filha

mal-educado ou mal-educada encontra muitos problemas na sociedade‖.

Sobre a questão que consiste em saber se a família angolana se encontra bem

estruturada, os pronunciamentos dos inquiridos repartem-se entre o sim, sim/não e não.

Os inquiridos que defendem que a família angolana esteja bem estruturada apresentam

os seguintes argumentos: por basear-se no princípio de família africana com tendência

para a forma alargada, ou seja, pelo facto de permitir a poligamia.

Os argumentos dos inquiridos que defendem o sim/não da estruturação da

família angolana resumem-se no seguinte: sim por basear-se no abalo que a família

angolana sofreu ao longo do tempo, e ainda ser possível encontrar alguma família bem

estruturada, mantendo a estrutura familiar (pai, mãe e filhos) e não pelo facto de

persistirem ainda nalgumas famílias problemas de extrema pobreza, o desemprego, a

fuga à paternidade, fazendo com que os filhos cresçam sem conhecer os pais

progenitores, violência doméstica e outras práticas anti-sociais.

E, finalmente, os que defendem que a família angolana não está bem estruturada

e esgrimem os seus argumentos da seguinte maneira: o profundo nível de desagregação

19 Discurso de Encerramento do VII Congresso do MPLA, Proferido pelo Presidente da República e Presidente do MPLA, realizado em Luanda, de 17 a 20 de Agosto de 2016. In Jornal de Angola, 14131 (21 de Agosto de 2016), p. 5.

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Paz e transformações nas famílias angolanas

da maioria das famílias devido ao conflito armado, à poligamia, à poliandria, à

aculturação e outros. Devido às constantes notificações de casos de fuga à paternidade

e à maternidade, o abandono dos idosos, o registo de casos de acusações de práticas de

feitiçaria às crianças de menor idade, as separações e os divórcios.

São ainda motivos que levam a considerar de desestruturada a família angolana,

a fuga das pessoas do seu habitat para outros lugares, incluindo o estrangeiro, por causa

do conflito armado interno, o não acatamento dos conselhos dos mais velhos pela

juventude, preferindo os ―ensinamentos de rua‖, a existência de ―viúvas (os) com

maridos e esposas vivas (os)‖, ―órfãs e órfãos com pais e mães vivas‖, o desemprego de

pais jovens que acabam por renunciar à sua condição de pais, passando a

responsabilidade da criação dos seus filhos aos pais já velhos a quem geralmente as

crianças passam a chamar pai, admitido como sendo pai social em detrimento do pai

biológico.

Outro motivo de desestruturação da família tem a ver com a ausência dos pais

em casa, sobretudo os da cidade de Luanda, que não convivem com os filhos de

segunda a sexta-feira, daí, a falta de comunicação entre os membros da família. Pois se

ausentam muito cedo para o trabalho e regressam bastante tarde a casa, melhor dito,

deixam os filhos a dormirem e voltam a encontrá-los a dormirem, as vezes com

abrangência aos Sábados. E, porque não admitir também os Domingos? Associa-se a

esta realidade a falta de amor por parte de alguns chefes de famílias (maridos e pais) ao

apresentarem um mau comportamento na relação do dia-a-dia com a família, a partir

dos seguintes exemplos:

―[…] a mulher quer falar com ele, diz sempre não quero saber! O filho quer falar com ele, não quero saber! Mas afinal mudou de nome? Agora mudou de nome e passou a chamar-se não quero saber?20 E ―Famílias que insistem no internamento de familiares doentes no Hospital Psiquiátrico, como forma de descartar dos mesmos, ainda que o seu estado de saúde não exige, não o requeira‖21.

Alguns inquiridos vão mais além ao considerarem a família angolana portadora

de visões destorcidas, por conseguinte, sem amor, não acredita nas pessoas, não respeita 20 Rev. Tito Antunes Mussolonela, ―Nunca é tarda de mais‖, durante o culto Metodista de 15/10/16, 09H00, programa TPA – Televisão Pública de Angola. 21 Drº Albertina quando falava sobre a família angolana num dos programas da TPA.

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Jul/Dez 2017 | 35

António Guebe

o ser humano, uma sociedade desonesta, egoísta, individualista, que emprega todos os

meios para alcançar os seus objectivos.

Sobre a existência ou não de transformações na família angolana, os

pronunciamentos dos inquiridos recaem para o sim e para o não. Fundamentam a sua

afirmação com os seguintes elementos positivos e negativos:

a. Elementos positivos: (i) a diminuição dos índices do analfabetismo no seio das famílias; (ii) a preocupação constante das famílias em reencontrarem-se; (iii) a passagem da família tradicional para a família mais aberta ao mundo; (iv) unidade na família rural; (v) o papel da igreja na clarificação da herança de pai para filho ao invés de pai para sobrinho como defende a tradição; (vi) por alguns pais se terem apercebido que os problemas do lar passam pelo diálogo e participam na vida activa dos filhos;

b. Elementos negativos: (i) os efeitos da globalização com forte interferência nos

aspectos culturais, politico, socioeconómico, religiosos, migratório e outros; (ii) a falta de solidariedade entre as famílias; (iii) a diminuição do verdadeiro papel dos pais para com os filhos; (iv) incentivo a prática de prostituição em troca de valores com realce para os monetários; (v) a não observância das tradições, exemplo, a casa de tinta ou puberdade; (vi) a separação dos casais jovens devido a pouca ou quase nenhuma intervenção dos pais na escolha da futura mulher ou do futuro marido de ambos os lados, rapaz e rapariga, debilitando-se as benevolências e oferecendo perigosos incentivos à infidelidade; (vii) assiste-se na família angolana ao ―faço o que bem entendo‖ e ao ―proibido proibir‖, numa liberdade individual sem limites que remete a família para uma crise extrema. Comportamento resultante do processo de degradação cultural e moral, cujos reflexos são: a) o aumento do egoísmo, luxúria, o adultério, o divórcio, o aborto, a contracepção educação sexual, crise de autoridade paterna e outros; b) fragilidade no seio da família devido a influência de culturas externas; c) a pouca ou inexistência de transmissão de valores culturais nacionais e dos valores morais e cívicos, o desprezo dos mais velhos carenciados; d) a invasão da globalização com a comunicação social a fazer passar programas que nada têm contribuído para bom senso da família, fomentando divisões; e) a entrada da mulher no mundo do emprego, deixa um vazio no lar e a comunicação social assume o papel de educador reservado aos pais; perca de valores, sobretudo os de casamento que para além de precoce não cumpre com os procedimentos adequados; f) a falta de bons valores (respeito, humildade, amor ao próximo, carinho, etc.,), estimulada pela globalização; g) na terminologia da tradição do parentesco, irmão do pai é pai e irmã da mãe é mãe. Na regra ocidental seguida pelas famílias em Angola, irmão do pai é tio e irmã da mãe é tia, enquanto causa do distanciamento das famílias.

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36 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Paz e transformações nas famílias angolanas

É fundamental que se perceba do tipo de transformações se almejam para a

família angolana. Neste neste contexto, os inquiridos responderam: (i) diálogo

doméstico entre pai, mãe, e filhos, partilhar refeições juntas à mesma mesa; (ii)

celebrações socioculturais; (iii) controlo dos conteúdos técnico, material, tecnológico

consumidos pelos filhos e seus companheiros; valorizar a nossa cultura, o respeito pelas

hierarquias com destaque a árvore genealógica; (iv) assegurar a continuidade dos

valores já transmitidos pelos ancestrais; (vi) a passagem de informações sobre a

educação sexual aos filhos, convertendo-se os pais no modelo a seguir; (vi) a eliminação

de casos de fuga a paternidade; (vii) eleger um mais velho nas famílias para dirimir

conflitos familiares; (viii) eleger o estilo autocrático permissivo como o modelo a

aplicar na gestão familiar; acabar ou reduzir a poligamia para uma boa gestão educativa

dos pais para com os filhos e por ser uma conduta anti-bíblica; (ix) reactivar o ocoto22

para a partir dele direcionar melhor a educação dos filhos, contrapondo as novelas

nocivas à boa educação; incutir na mente da juventude os padrões de boa conduta,

sendo a árvore genealógica como uma árvore qualquer que dá frutos à sociedade.

A necessidade do resgate dos valores em Angola é uma preocupação de todos os

angolanos com destaque para os governantes, a sociedade civil e a Igreja. Às vezes pode

se dar o caso de querer resgatar o que não se conhece, daí, a necessidade de saber junto

dos inquiridos que valores se pensa resgatar, tendo estes respondido que se trata de entre

outros, os seguintes: a) a circuncisão no modelo tradicional aperfeiçoado; b) o amor ao

próximo; c) a compreensão mútua; d) a humildade; a honestidade; e) a atenção e

responsabilidade; f) a solidariedade; a decência; g) a identidade cultural; a justiça; h) a

felicidade; i) a confiança; j) a dignidade; l) a verdade e a fé; m) o respeito pelos mais

velhos; n) a redução ou supressão das novelas amorosas na televisão e filmes

pornográficos; o) a integridade; a fidelidade; a compaixão; a pureza; p) a verdadeira fé

em Deus e a participação religiosa; q) o respeito pela hierarquia da família e a

interligação entre os membros da família; r) o pudor; a valorização os lugares de

educação tradicional como o onjango23 e o ocoto, substituídos pela televisão; s) o

22 Lugar sagrado, ao ar livre identificando-se nele a lareira, situado no centro da aldeia que é, também, usado pelos Vahanya para o jantar, serão e educação das crianças e dos adultos e de transmissão de conhecimentos (GUEBE, 2003:34-35). 23 Lugar sagrado, fechado, feito de pau-a-pique, em forma circular, coberto de capim, servindo de albergue para as refeições e de descanso durante o dia (GUEBE, 2003:34-35).

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carinho; t) a simplicidade; u) guardar castidade nos rapazes e virgindade nas raparigas;

v) a unidade, perdão e reconciliação entre famílias.

Os inquiridos solicitados a pronunciarem-se com relação ao que foi feito pelo

governo em prol da protecção e das transformações da família angolana, em resposta

destacaram: a criação de estrutura para salvaguardar a integridade da família (Ministério

da Família e Promoção da Mulher); dos instrumentos jurídicos e procedimentos (código

da família, lei de combate à fuga à paternidade e à maternidade, da lei contra a

violência doméstica e outros instrumentos); do registo civil gratuito; do combate à

pobreza nas famílias e ao analfabetismo; da construção de escolas; de hospitais de

estradas e da implementação dos programas água para todos e energia; da realização de

palestras e sua transmissão pelas mídias, apelando para a boa conduta dos membros

familiares; e, dos constantes apelos do Presidente da República para o resgate de valores

morais e cívicos.

Quando se perguntou aos inquiridos se os instrumentos jurídicos até aqui

produzidos pela Assembleia Nacional e pelo governo têm contribuído para a

transformação na família angolana, os pronunciamentos obtidos apontam para o

seguinte: como regulamentos do comportamento da família satisfazem. No entanto, há

que exigir maior rigor na aplicação daqueles instrumentos jurídicos que têm a ver com a

punição de casos de fuga à paternidade, abandono de filhos, abusos sexuais a menores,

acusações de feitiçarias, sobretudo naquelas em que as crianças são principais vítimas; a

Lei nº 25/11, de 14 de Julho, em alteração, contra a violência doméstica, em vez de estar

mais virada para a defesa da mulher deveria ser extensiva às crianças, aos idosos que

mais sofrem e, porque não abranger o próprio homem que também tem sido vítima?; os

instrumentos jurídicos vigentes sobre a protecção da família satisfazem, embora com

tendências de castigar mais os homens, protegendo a mulher, muitas vezes a

provocadora do conflito, também falta rigor na sua aplicação; os instrumentos jurídicos

produzidos em defesa da família satisfazem, contudo não são do domínio de todos

devido à sua pouca publicação; não satisfazem na medida em que não conta com a

sociedade civil em geral e nem com as autoridades tradicionais (sobas) e coordenadores

de bairro e, até porque deveria ser administrada no seio da família e nas escolas.

O ponto de vista dos inquiridos que defendem que os instrumentos jurídicos em

vigor não satisfazem, encontra sustentação nos pronunciamentos do Presidente da

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Paz e transformações nas famílias angolanas

República e dos dirigentes do sistema de justiça do país. O Presidente da República, nas

vestes de Presidente do partido MPLA, por exemplo, afirmou no discurso de

encerramento do VII Congresso, referindo-se à necessidade da existência de

instrumentos capazes de combater a violência doméstica e a fuga à paternidade, o

seguinte: ―Precisa-se do amparo da justiça para que tenhamos leis e regulamentos que

permitam ajudar a resolver estes graves problemas‖24. Rui Mangueira, Ministro da

Justiça de Angola, agindo de conformidade ao discurso do Presidente da República

revelou que ―o país está a criar instrumentos jurídicos necessários para responder, de

forma eficaz à questão da fuga a paternidade‖25. E, Rui Araújo, coordenador da

Comissão de Reforma da Justiça e do Direito afirmou:

―[…] que um dos grandes problemas com que os tribunais se deparam é a fuga à responsabilidade na prestação de alimentos e também a fuga à paternidade […]. […] a Comissão da Reforma da Justiça e do Direito entendeu fazer uma reforma mais leve do Código da Família aprovado em 1988, para adequa-lo à Constituição de 2010 e tomar como base algumas das experiências recolhidas)‖26.

Para além dos aspectos colocados e respondidos prontamente pelos inquiridos,

há a destacar o acréscimo dos aspectos por eles achados como relevantes, destacando-se

os seguintes: antigamente havia mais solidariedade entre as pessoas o que não se

verifica na actualidade. Por exemplo, em caso de óbito são os familiares, vizinhos e

amigos que, movidos pelos sentimentos fraternos, organizam e custeiam maior parte das

despesas; as cerimónias de casamento eram feitas com base na harmonia das duas

famílias (do noivo e da noiva), a jovem procurava em primeiro lugar conquistar a

família do noivo, ajudando a sogra a fazer alguns trabalhos domésticos e só depois se

envolvia com o futuro marido, vezes havia em que o envolvimento só se verificava no

dia de casamento sob a avaliação dos mais velhos. Por isso, eram unidos por afinidade e

os casamentos eram duráveis; o exercício da autoridade paternal na promoção da moral,

24 Discurso de encerramento do VII Congresso do MPLA, proferido pelo Presidente da República e do MPLA, realizado em Luanda, de 17 a 20 de Agosto de 2016. In Jornal de Angola, 14131 (21 de Agosto de 2016), p. 5. 25 Pronunciamentos do Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos (Rui Mangueira) referindo-se ao Ante-Projecto da alteração do Código da Família, ao 21 de Agosto de 2016. In Jornal de Angola, 14132 (22 de Agosto de 2016), p. 2. 26 Pronunciamentos do Juiz Conselheiro (Rui Araújo) referindo-se ao Ante-Projecto da alteração do Código da Família, ao 21 de Agosto de 2016. In Jornal de Angola, 14132 (22 de Agosto de 2016), p. 2.

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António Guebe

da educação, da instrução, do amor ao trabalho, do respeito pelos valores culturais e a

atenção ao desenvolvimento da personalidade e aptidões dos filhos está posta em causa

devido a incompatibilidade do horário laboral dos pais, isto é, mais ausentes do que

presentes nos lares (deixam os filhos a dormir e os encontram a dormir).

Conclusão

A paz é um bem indispensável à vida de qualquer espécie (humana, animal ou

planta). Se por um lado é da paz que depende toda a esfera do progresso, no caso

humano as esferas política, económica, social cultural e religiosa dependem também da

existência da paz. Por outro lado, a paz é invisível e é representada por essas esferas.

A família é o núcleo fundamental e o oxigénio de qualquer sociedade. As

transformações no seu seio, neste caso na família angolana, dependem e continuarão a

depender sempre da existência da paz, daí a razão da sua envolvência na abordagem do

tema já identificado, tendo como referência o período de 2002 à 2016, quer dizer, do

início à actualidade.

Portanto, a paz e as transformações mantém uma relação intrínseca e

condicionante, ou seja, não se pode falar numa sem se tocar noutra.

São ainda incipientes as transformações ocorridas no seio da família angolana a

julgar pelos resultados da pesquisa, parte dos quais defendem que enquanto existirem

viúvas e viúvos com maridos e esposas vivas e órfãos e órfãs com pais vivos não se

pode dizer que há transformações, no sentido positivo, nas famílias angolanas. A julgar

também pelos pronunciamentos dos dirigentes do país, da sociedade civil, das igrejas e

da ineficácia dos instrumentos jurídicos vigentes reguladores dos procedimentos que, no

entender dos inquiridos, sai quase sempre em defesa da mulher. Por isso, muito ainda há

por ser feito em prol da família angolana, exigindo-se para tal o empenho de todos os

actores.

Remete-se para a reflexão as seguintes frases:

A. Na sociedade de hoje, onde o pai e a mãe exigem aos filhos que os tratem por mano e mana com vergonha de serem pai e mãe; o avô e a avó exigem aos netos que os tratem por pai e por mãe com vergonha de serem velhos.

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Paz e transformações nas famílias angolanas

Conclusão: uma família sem avôs, com a existência duma escola que às vezes se torna num lugar onde só se perde do que se trouxe.

B. Quanto tempo nos resta afinal para voltar a alcançar aquela sociedade? Onde todo o velhinho ou velhinha é avô ou avó! Todo o mais velho ou mais velha é tio ou tia! Os irmãos do pai são pais e as irmãs da mãe são mães! O nome do pai e da mãe não eram vulgarizados quase que desconhecidos! A educação das crianças não era tarefa só dos pais, mais também dos vizinhos e de todos os adultos da sociedade!

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Jul/Dez 2017 | 41

António Guebe

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Paz e transformações nas famílias angolanas

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Artigo #3 Estratégia de prevenção e combate à violência doméstica:estudo de caso nos centros de aconselhamento familiar e jurídico em Angola

Moniz Bala Pedro, Me UTANGA/ISPT

Resumo

A pesquisa visa analisar o papel dos centros de aconselhamento familiar na prevenção e combate da violência doméstica em Luanda, capital da República de Angola. É uma pesquisa descritiva de focalização qualitativa, para prevenir e mitigar a violência doméstica e apresentar estratégias de aconselhamento das vítimas e sensibilização da população sobre os efeitos nefastos da violência no lar. Do ponto de vista teórico, o estudo insere-se no campo da Psicologia, com destaque para a abordagem dos conceitos e teorias psicológicas, bem como os factores culturais e legais que interferem no aumentos de agressões no seio das famílias e, fundamentalmente, enfatizar o papel do psicólogo na resolução de conflitos intrafamiliares. Os dados foram recolhidos mediante entrevistas semi-estruturadas, com o guião de entrevistas adaptado às respostas dos entrevistados. Quanto à população-alvo, a pesquisa foi realizada em quatro centros de aconselhamento familiar e jurídico em Luanda. Nesta pesquisa foram entrevistados 20 conselheiros e 30 vítimas. Para o estudo em questão, foram consultados igualmente documentos utilizados na resolução dos casos, tais como fichas de registo de ocorrências, convocatórias, convites, manual de habilidades jurídicas no aconselhamento, cartazes expostos nas salas de aconselhamento, bem como instrumentos jurídicos que definem a violência doméstica como crime público, com particular destaque para a lei nº 25/11 de 14 de Julho ( lei contra a violência), principal instrumento que orienta a actividade dos conselheiros. O estudo demonstrou que o aconselhamento familiar e jurídico é uma estratégia extremamente importante na prevenção e combate à violência doméstica, sobretudo um recurso adequado que tem permitido desafogar os tribunais sobrecarregados com muitos processos por resolver, com a vantagem de o aconselhamento familiar e jurídico ser um processo célere que não implica custos em termos financeiros, pelo que os serviços de aconselhamento são fundamentais na resolução dos casos de violência doméstica.

Palavras-chave: Aconselhamento familiar, frustração e violência simbólica.

Abstract This research aims to analyze the role of family counseling centers in preventing and combating domestic violence in Luanda, capital of the Republic of Angola. It is a descriptive research of qualitative focus, to prevent and mitigate domestic violence and to present strategies of counseling of the victims and sensitization of the population on the harmful effects of violence in the home. From the theoretical point of view, the study is part of the field of Psychology, with emphasis on the approach to psychological

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Estratégias de prevenção e combate à violência

concepts and theories, as well as the cultural and legal factors that interfere in the increase of aggressions within the families and, fundamentally, emphasize the role of the psychologist in resolving intrafamilial conflicts. Data were collected through semi-structured interviews, with the interview script adapted to respondents' responses. As for the target population, the research was carried out in four family and legal counseling centers in Luanda. In this research, 20 counselors and 30 victims were interviewed. For the study in question, documents used in the resolution of cases were also consulted, such as fact sheets, conventions, invitations, legal skills manual in counseling, posters displayed in counseling rooms, as well as legal instruments that define violence domestic violence as a public crime, in particular Law No. 25/11 of July 14 (Law against violence), the main instrument that guides the activity of counselors. The study has shown that family and legal counseling is an extremely important strategy in preventing and combating domestic violence, especially an adequate resource that has allowed unbridled courts to deal with many unresolved cases, with the advantage that family and legal counseling is a a rapid process that does not entail costs in financial terms, so that counseling services are crucial in resolving cases of domestic violence. Keywords: Family counseling, frustration and symbolic violence

Introdução

A violência doméstica é um fenómeno presente em todas as sociedades. Contudo, as causas deste problema variam em função da realidade de cada contexto social. Em Angola, os problemas decorrentes da violência doméstica começam a ganhar nos últimos tempos contornos alarmantes e a adquirir maior visibilidade nos órgãos de comunicação social, com reportagens de casos de violência que terminam em tragédia, principalmente no que se refere aos actos de violência conjugal.

A pesquisa objectivou analisar os procedimentos de atendimentos às vítimas de violência no seio familiar, identificar as actividades realizadas junto das comunidades para prevenir a ocorrência de novos casos, bem como descrever as percepções dos conselheiros sobre os factores que influenciam a violência doméstica em Luanda. O estudo pretende ampliar e divulgar o conhecimento existente sobre esta temática e fornecer subsídios para a elaboração e execução de políticas de intervenção que pautem pela persuasão dos agressores para incutir atitudes positivas em relação à violência doméstica.

Muito já foi escrito acerca de violência doméstica em Angola. Contudo, pouco se publicou no que se refere ao papel dos centros de aconselhamento familiar e jurídico na mediação dos conflitos no lar.

O problema da violência doméstica diz-nos respeito a todos, porque afecta toda a sociedade, directa ou indirectamente, com graves consequências psicológicas sobre as vítimas, que podem deixar traumas para a toda a vida. Assim sendo, a luta contra este

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Moniz Bala Pedro

mal deve ser de todos nós e cada a um a seu nível deve dar o seu contributo, denunciando os agressores para que sejam responsabilizados pelos seus actos.

O estudo apresenta informações sobre a actuação dos centros de aconselhamento familiar e jurídico da polícia, em pareceria com outros organismos do Estado. Os dados recolhidos dão conta de que o aconselhamento familiar e jurídico, na perspectiva de prevenção e mediação de conflitos familiares tem oferecido subsídios que ajudam as famílias a superar vários problemas. Do igual modo, as igrejas têm desempenhado um papel fundamental na mediação dos conflitos familiares.

É inegável o papel dos centros de aconselhamento familiar no combate e prevenção dos casos de violência doméstica. Os entrevistados são unânimes em reconhecer que quando um indivíduo é acusado de prática de violência doméstica, diminui a probabilidade de reincidir nas suas acções. A mediação de conflitos oferece inúmeras vantagens, nomeadamente a celeridade, informalidade, sigilo de decisão, intervenção dos familiares e partes em conflitos e a possibilidade de os litígios serem apreciados por profissionais competentes sem custos financeiros.

A violência intra-familiar atinge indivíduos de ambos os sexos, mas incide fundamentalmente sobre as mulheres, crianças e idosos, pela sua condição de dependência económica e psicológica. A violência doméstica é um fenómeno presente em todas as sociedades, mas obviamente as causas variam em função da realidade social de cada contexto.

A escassez de estudos sobre a violência doméstica em Angola é, por um lado, reflexo do surgimento tardio de cursos superiores na área de ciências humanas e sociais. Por outro, está relacionada com as dificuldades de acesso às fontes oficiais, aliadas ao fraco domínio de metodologias de investigação por parte dos estudantes que realizam estudos que têm como foco a família.

Nos últimos anos têm sido produzidos alguns trabalhos de fim de curso com temas, directa ou indirectamente, relacionados com a violência doméstica. Porém, após a sua defesa académica, os mesmos transformam-se em letras mortas, uma vez que os resultados não são publicados em livros, artigos científicos ou nos órgãos de comunicação social, para servirem de fonte de consulta dos interessados em aprofundar os seus conhecimentos sobre os problemas familiares. No fundo, esses trabalhos não passam de meros requisitos para a obtenção do título de licenciado.

A falta de publicação de estudos prende-se igualmente com a deficiente articulação entre as universidades e as instituições afins. Assim sendo, os trabalhos académicos dificilmente podem servir de fontes de consulta para a população e, principalmente, para os profissionais que lidam com as vítimas. Na prática, nota-se que alguns membros da família e, também, das Igrejas, vão exercendo a tarefa de aconselhamento com base nas experiências pessoais, sem a requerida base científica nas áreas de Psicologia, Sociologia e Direito.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

O combate à violência doméstica exige recursos humanos e materiais para tratar com a devida atenção os problemas que chegam aos centros de aconselhamento. O trabalho de aconselhamento não se limita a intervenções em casos denunciados, pelo que passa pela educação da população através de palestras, distribuição de panfletos, inclusão de programas que abordam a questão da violência doméstica como comportamento desviante e sensibilizar a população sobre as formas de resolução pacífica de conflitos no lar.

As alterações no plano jurídico-legal com destaque para a lei nº 25/11 (lei contra a violência doméstica), foram determinantes para dotar os profissionais de instrumentos legais para resolverem os casos e sensibilizaram a população para recorrer aos centros de aconselhamento e à polícia, a fim de denunciarem os casos de violência que ocorrem nas famílias.

É imperioso romper o pacto de silêncio junto das comunidades, pois muitas situações de violência doméstica não chegam ao conhecimento das autoridades por cumplicidade das pessoas mais próximas das vítimas, como parentes, amigos, vizinhos ou colegas de trabalho, que, por vergonha, medo de represálias do agressor e/ou receio de serem acusados de interferência na vida privada, têm constituído obstáculo às denúncias junto das autoridades.

Do ponto de vista teórico, o estudo insere-se no campo da Psicologia Social, tendo como pano de fundo as estratégias de resolução de conflitos, atitudes sociais, tipos de influência social e representações sociais do género.

Num trabalho de investigação as perguntas de partida e objectivos são instrumentos fundamentais para orientar o processo de recolha, análise e interpretação dos resultados, e como tal, diante das constatações feitas nos centros de aconselhamento familiar e jurídico, parece-nos fundamental durante a pesquisa responder à seguinte questão geral de partida: Que estratégias são adaptadas pelos centros de aconselhamento familiar e jurídico na prevenção e combate à violência doméstica em Luanda?

Quanto as questões específicas propomo-nos saber:

1. Que estratégias têm sido adoptadas pelos colaboradores dos centros de aconselhamento familiar e jurídico no atendimento das vítimas de violência doméstica Luanda?

2. Qual é o grau de implementação das resoluções da lei nº 25/11 de 14 de Julho de 2014 (Lei Contra a violência Doméstica), relativamente à organização dos serviços, protecção, acolhimento, tratamento, orientação e capacitação dos profissionais no apoio às vítimas de violência doméstica?

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Moniz Bala Pedro

3. Quais são as percepções dos funcionários dos centros de aconselhamento relativamente aos factores que contribuem para o aumento da violência doméstica?

4. Que medidas preventivas têm sido adoptadas para sensibilizar a população sobre as formas de prevenção e combate dos casos de violência doméstica?

A mediação, enquanto processo para reconciliar de forma pacífica as partes em conflitos e dirimir efeitos psicológicos da violência nas vítimas, constitui a principal estratégia dos centros de aconselhamento familiar e jurídico na prevenção e combate à violência em Luanda, com vantagem deste mecanismo de resolução de conflitos ser célere e não implicar custos financeiros na tramitação dos processos.

Em função das perguntas formuladas, o nosso objectivo geral passa por analisar o papel dos centros de aconselhamento familiar e jurídico na prevenção e combate à violência doméstica em Luanda, sendo que os objectivos específicos visam:

1. Descrever as técnicas de atendimento psicológico às vítimas no processo de resolução dos casos de violência doméstica;

2. Avaliar a actuação dos psicológicos no processo de reflexão, socialização, consciencialização e recuperação das vitimas;

3. Interpretar as percepções dos colaboradores de centros de aconselhamento familiar sobre os factores psicológicos que estão na base do aumento dos casos de violência doméstica em Luanda;

4. Comparar as medidas preventivas e formas de atendimento psicológico às vítimas de violência doméstica entre os centros de aconselhamento familiar e jurídico; e

5. Propor procedimentos e técnicas de actuação dos psicólogos na prevenção e combate à violência doméstica em Luanda.

A violência doméstica em Angola é um assunto actual e recorrente a nível da comunicação social e da sociedade em geral. Diariamente são reportados pelos media casos de violência nas famílias que terminam em tragédia. Porém, do ponto de vista da ciência, existem poucos estudos que possam contribuir para a identificação das causas e sensibilização da população sobre as formas de prevenção e combate deste problema que assola muitas famílias. A escolha do tema resultou dessa necessidade.

Justificativa

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Estratégias de prevenção e combate à violência

As razões da escolha deste tema prendem-se também com o facto de ser recorrente, nos últimos tempos, os media reportarem casos de violência doméstica extrema, com pessoas vítimas de familiares, filhos que matam os pais, mortes de cônjuges, crianças abandonadas nas ruas pelos pais, na pior das situações nos contentores de lixo, aumento exponencial do número de idosos no Beiral, e tantos outros males que ocorrem nas famílias que podiam ser evitados se as pessoas procurassem conselhos junto de pessoas idóneas a fim de resolver o conflito de forma pacífica.

Neste sentido, tornar público os serviços prestados nos centros de aconselhamento familiar e os procedimentos para denunciar os agressores contribuirá, por um lado, para informar as pessoas sobre quais as instituições a que devem recorrer em caso de violência e, por outro, apelar às autoridades a melhoria dos serviços prestados nos centros de aconselhamento familiar e dar a conhecer as dificuldades enfrentadas pelos colaboradores no exercício das suas funções.

Os resultados obtidos na monografia apresentada no Instituto Superior das Ciências da Educação (ISCED) sobre o abandono parental, enquanto forma de violência doméstica contra as crianças, demonstraram que a pobreza das famílias, a crise dos valores morais e cívicos, o desconhecimento dos instrumentos jurídicos e das instituições que trabalham em prol da protecção da criança entre outros, são factores que influenciam a conduta dos pais que se recusam a assumir os filhos.

As conclusões a que chegou o estudo inicial serviram de suporte para o presente trabalho, no que diz respeito à violência doméstica contra a criança em Angola. A análise global feita neste estudo servirá de paradigma para descobrir variáveis que, de alguma forma, contribuem para o aumento da violência doméstica em Luanda e descrever outras questões relacionadas com a violência intra-familiar, que não foram desenvolvidas, por não estarem suficientemente aprofundadas.

Durante a pesquisa, mormente nas palestras proferidas, informações divulgadas pelos media, visitas aos lares de acolhimento de menores e centros de aconselhamento familiar e jurídico, têm surgido novos contornos da violência doméstica que carecem de um estudo pormenorizado. A descoberta de novos elementos para enriquecer as abordagens anteriores suscitaram a vontade de prosseguir com o tema numa perspectiva mais ampla, que privilegiasse os seus aspectos psico-sociais. Este novo estudo redefiniu a população e o tema, mas manteve alguns elementos relevantes do estudo inicial e enquadrou-os nos objectivos que o presente estudo se propôs alcançar.

O fenómeno de violência doméstica é um assunto transversal. Resulta em parte dos problemas que a sociedade angolana viveu, com particular destaque para a guerra civil que assolou o país, devastou-o em sentido material e social. É um problema que tem várias implicações a nível familiar e social, provoca baixa auto-estima nas vítimas, dificuldade de aprendizagem na escola, delinquência juvenil, transtornos de

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Moniz Bala Pedro

comportamento, absentismo escolar, baixa produtividade, depressão e tantos outros males.

Os centros de aconselhamento familiar foram criados para prevenir e mediar os conflitos familiares. A OMA foi a instituição pioneira a prestar os serviços de aconselhamento e ocupou-se durante muito tempo da concepção de políticas de combate à violência doméstica. Actualmente, o Ministério da Família e Promoção da Mulher (MINFAMU) é o órgão que se encarrega de definir e executar a política nacional para a defesa e garantia dos direitos da mulher. Perante o aumento de casos de violência doméstica foram criados os centros de aconselhamento familiar e jurídico para orientação, mediação e resolução de todas formas desse tipo de violência.

As informações divulgadas sobre a delinquência juvenil em Angola dão conta de que muitos menores envolvidos em actos criminosos não vivem com os pais. Em alguns destes casos a autoridade parental é exercida apenas pela mãe. Ora, os problemas que afectam os jovens têm a ver com a desestruturação familiar, não só do ponto de vista da separação física dos membros que integram a família, mas sobretudo da desestruturação moral, ou seja, a ausência do sentimento de pertença à mesma família e progressivo enfraquecimento de valores como solidariedade, afecto e amor, os quais são pilares da convivência em família. Deste modo, o lar deixa de ser um lugar por excelência para as relações harmoniosas entre os membros, perde esta função porque os membros trabalham e estudam fora de casa e o domicilio transforma-se numa ―hospedaria‖, sem relações íntimas entre os membros que compõem a estrutura familiar.

Constata-se em Luanda um individualismo exacerbado, membros que partilham o mesmo domicílio e não têm um momento de diálogo porque as novelas, smartphones (telefones multifuncionais), manutenção do carro, jogos, internet, cursos, cuidado com a higiene e outros afazeres lúdicos, ocupam o tempo que era suposto ser dedicado à convivência familiar.

Esta realidade justifica este novo estudo, que tem suporte na monografia editada em livro e baseada em teorias sociológicas, O presente trabalho visa desmistificar crenças e informar as pessoas sobre o papel das instituições do Estado no combate à violência doméstica, um fenómeno que deixa nas crianças sequelas para toda a vida. A motivação para a elaboração deste trabalho resulta também de observações e de relatos nos órgãos de comunicação social sobre vítimas mortais de violência doméstica, o que nos últimos tempos tem tomado proporções alarmantes.

Diariamente, são reportados casos de crianças e idosos abandonados, assuntos que exigem uma reflexão profunda, principalmente o abandono das crianças, que constitui um problema para o futuro deste segmento social, pois a infância é uma das fases mais delicadas da vida do ser humano e é um período em que as crianças precisam de grandes cuidados para o seu desenvolvimento harmonioso.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

Trabalhar em temas relacionados com a família tornou-se um desafio académico e, ao mesmo tempo, um compromisso com a sociedade, no sentido de preencher uma lacuna na produção e sistematização de conhecimentos acerca desta temática na sociedade angolana. No levantamento bibliográfico que fizemos ficou patente a escassa literatura que aborda a questão da violência doméstica em Angola, criando as bases de futuros debates, críticas e contribuições.

Perante as constatações feitas no terreno, o presente estudo afigura-se como um contributo valioso. Informa a sociedade sobre o papel dos centros de aconselhamento familiar no combate aos casos de abandono parental e explica, a partir das percepções dos profissionais que trabalham nos centros de aconselhamento familiar, os factores que contribuem para o elevado índice de violência doméstica em Luanda e as estratégias que têm sido adoptadas para reverter o quadro actual.

Violência doméstica

Entende-se por violência doméstica toda a forma de violência que ocorre no seio familiar, ou seja, toda a violência que inclui maus-tratos físicos ou psicológicos que atentam ao bem-estar dos membros da familiar. A violência doméstica abarca quaisquer acções ou omissões que resultam em danos morais ou físicos.

A violência doméstica tem, como principais alvos, as crianças, as mulheres e os idosos, devido à sua condição de dependência física e económica. A violência doméstica designa agressões físicas ou psicológicas infligidas a qualquer membro no seio familiar. Em alguns casos emprega-se exclusivamente o termo de violência conjugal como sinónimo de violência doméstica. Porém, esta é uma interpretação redutora, porque a violência doméstica não se resume à violência entre os cônjuges, e é, pelo contrário, um conceito extensivo a quaisquer actos ou omissões que ocorrem nas relações familiares entre pais e filhos, irmãos, avós e netos, tios e sobrinhos, etc.

Tipos de violência doméstica

A violência conjugal é difícil de ser identificada e combatida pela subtileza com que se manifesta e pelo silêncio a que as vítimas se remetem. Em geral, pode manifestar-se sob quatro aspectos:

a) violência física (uso da força física com ou sem recurso a arma de fogo, arma branca e outros objectos corte-perfurantes);

b) violência psicológica (compreende uma série de condutas verbais, tais como insultos, ameaças, gritos, injúria, calúnias, difamação, etc.);

c) violência sexual ( ter relações sexuais contra a vontade do parceiro);

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d) violência patrimonial (gastos egoístas dos rendimentos em detrimento do bem-estar da família, privar o parceiro de recursos indispensáveis para a sua sobrevivência, má distribuição da renda por parte de um dos cônjuges ou fuga às responsabilidade de apoiar financeiramente o lar).

Enquadramento legal da violência doméstica em Angola

A legislação angolana prevê e pune a violência doméstica como um crime público, em conformidade com o preceituado no art. nº 3 da lei nº 25/11 de 14 de Julho), entende-se como violência doméstica:

―toda a acção ou omissão que cause lesão ou deformação física e dano psicológico temporário ou permanente que atente contra a pessoa humana no âmbito das relações previstas no artigo nº 2‖.

Como se pode observar, do ponto de vista legal a violência doméstica está tipificada como crime público, que abrange abandono familiar ou quaisquer actos que comprometam o desenvolvimento integral dos membros no seio familiar. Do ponto de vista psico-social, a violência doméstica é um comportamento desviante que pode resultar de transtornos de personalidade e condições sociais.

Teorias psicológicas explicativas da violência doméstica

A partir do momento em que a violência doméstica passou a ser encarada como um flagelo social, várias foram as explicações que diferentes disciplinas de estudo desenvolveram para a descrever o contexto, a personalidade da vítima e do agressor.

De acordo com Monteiro (2003), cedo se desenvolveram teorias no âmbito da Psicologia no sentido de perceber as causas da violência doméstica. Estas podem organizar-se em quatro grandes grupos: as teorias intra-individuais, as teorias psicossociais e teorias de didáticas-familiares e as teorias socioculturais.

Teorias intra-individuais

As teorias intra-individuais assentam numa explicação da violência doméstica, baseada, sobretudo, nas características individuais dos agressores e das vítimas, operando a um micro-nível ou numa perspectiva individual. Estas teorias centram-se no perfil dos agressores, dando menor atenção às características das vítimas, embora estudem também as características psicológicas das vítimas que permanecem em relações abusivas. Os defensores destas teorias defendem, apesar disso, o alcance

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Estratégias de prevenção e combate à violência

explicativo do conhecimento dos comportamentos do agressor, designadamente no que diz respeito à motivação que os levará a agredir.

Como vimos, nesta perspectiva, a atenção está direccionada sobretudo para as características psicopatológicas do agressor, consideradas como as causadoras dos ―comportamentos anormais‖, designadamente os actos violentos.

Monteiro (2003), refere algumas das causas que, segundo estas teorias, explicariam o comportamento dos agressores: as perturbações psicológicas (psicopatia, depressão), stress, baixa auto estima, dificuldades na empatia, na comunicação e no auto controlo, bem como pobres competências sociais. Para além destas características, outros autores enumeraram vários factores de risco, tais como o estilo de personalidade agressiva e hostil, a irritabilidade, elevada, ansiedade, depressão e queixas somáticas.

Teorias psicossociais

As teorias psicossociais, de entre as quais se destaca a teoria da aprendizagem social, relacionam o comportamento do agressor com a socialização e a aprendizagem directa, social e familiar, da violência, ou ainda com a sua aprendizagem indirecta ou vicariante, seguindo o conceito de Modelagem de Bandura. A teoria da aprendizagem social recorre também às teorias comportamentais psicológicas e aos conceitos do condicionamento clássico e condicionamento operante.

Em termos gerais, pode afirmar-se que, segundo as teorias da aprendizagem social, indivíduos que experienciaram ou foram testemunhas de violência na família, realizaram uma aprendizagem em que a violência acaba por ser considerada uma forma apropriada de relacionamento e de resolução de problemas, o que os leva a repetir este padrão de comportamento violento nas suas relações futuras.

Teorias socioculturais

Ao nível das abordagens socioculturais, destacam-se alguns estudos que referem que a transmissão de comportamentos violentos entre gerações é produto da socialização dos elementos culturais que orientam a maneira de ser e estar das pessoas. De acordo com Bandura (apud Martinez, 2006, p.87), demonstrou que a aprendizagem do comportamento se pode verificar pela observação de um modelo, independentemente das consequências da sua execução, e a isto chamou modelagem.

Com base no modelo sociocultural acima apresentado, podemos afirmar a exposição à violência familiar na infância ou na vida adulta é um factor de elevado risco, existindo uma forte probabilidade de as crianças vítimas directas ou indirectas se tornarem adultos com comportamentos igualmente violentos, ou seja, agressores. As

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crenças enraizadas nas mentes mulheres vítimas de violências e nos homens que as agridem de que o esposo tem direito de bater na esposa, como se a mulher fosse objecto do homem, por exemplo, pode contribuir para o aumento de casos de violência contra a mulher.

Percebe-se, pelo que afirmamos anteriormente, que a noção de ―transmissão inter-geracional da violência‖ na sociedade angolana se refere ao acervo cultural com suporte dos usos e costumes que serve de base para perpetuação da violência contra a mulher e não só. Por outro lado, assistimos à emergência de instrumentos legais, instituições e organizações da sociedade civil que assumem a tarefa de reverter o quadro da violência extrema em que muitos membros de família se encontram.

Diante das três abordagens acima apresentadas podemos terminar este item, afirmando que através da exploração de vários níveis de compreensão e diversas perspectivas desta realidade, concluem que a violência doméstica é um problema complexo, multidimensional e multi-contextual, e que exigem explicações complexas e multidimensionais. De entre os vários modelos teóricos actualmente existentes, destacando aspectos individuais, psicossociais e socio-culturais, sem desprimor a dimensão jurídica deste problema que afecta muitas famílias angolanas.

Teorias de Didáticas-familiares

A teoria de didáticas-familiares parte de pressupostos de que a violência doméstica e a explicação dos comportamentos, resulta de problemas de relações interpessoais estabelecidas entre os membros. Neste sentido, Borin (2007) salienta que referem que estas abordagens englobam algumas teorias sócio-psicológicas, tais como a teoria da frustração-agressão, a teoria da interacção simbólica, a teoria da troca e a teoria das atribuições.

O referido autor direcciona o foco da atenção para a teoria inter-geracional da violência, em que a experiência da vitimização na infância favorece a sua perpetração. Contudo, esta teoria tem implícita a noção de aprendizagem social, sugerindo que o comportamento do indivíduo é determinado pelo ambiente social, e mais especificamente pelos membros da sua família, através de mecanismos de reforço, modelagem ou coação.

Deste modo, a família é vista como uma entidade de ensino, onde, por imitação ou modelagem do comportamento, cada membro pode adquirir comportamentos violentos, cuja implementação é determinada por processos de punição ou reforço.

Relativamente à vítima, Tenório (2012), partilha da opinião de que quanto mais a mulher tiver sido maltratada pelos pais, mais provável será a aceitação de um parceiro predisposto ao uso de violência, tendo demonstrado igualmente que o risco de vitimização da mulher adulta aumenta quando há uma exposição à violência parental na

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Estratégias de prevenção e combate à violência

infância, uma vez que esta conduz a uma baixa autoestima, para além de que a vítima pode aprender padrões em que o amor legitima a violência do seu companheiro ou que a levem a aceitar o uso da violência no cumprimento das expectativas do seu papel.

Discussão dos Resultados

Feita a recolha dos dados através das entrevistas semi-estruturadas, neste capitulo procede-se à análise e descrição das informações recolhidas. Optou-se por apresentar as informações recolhidas em tabelas e sob a forma de texto. A análise e intepretação dos resultados obedeceu à seguinte ordem: interpretação dos dados recolhidos no centro de aconselhamento do MINFAMU, do INAC, da OMA e por último descrição das informações recolhidas junto dos agentes da polícia.

Fez-se uma triagem das informações e tomou-se como conteúdo válido as constatações e respostas adequadas aos objectivos que o estudo visa alcançar, ou seja, foram consideradas as respostas frequentes a que por comparação á inferência estatística seriam consideradas de frequência absoluta. Os principais aspectos analisados estão relacionados com as percepções dos profissionais sobre os factores que influenciam a violência doméstica, medidas preventivas e combate, formas de resolução dos casos, instrumentos jurídicos utilizados e as formas de atendimento das vítimas.

Aconselhamento nos centros do MINFAMU

O Ministério da Família e Promoção da Mulher (MINFAMU) é o órgão que se encarrega de definir e executar a política nacional para a defesa e garantia dos direitos da mulher de modo particular e da família em geral. Perante o problema da violência doméstica, o Ministério da Família e Promoção da Mulher (MINFAMU) criou salas de aconselhamento familiar para atender as vítimas de violência doméstica e pessoas que precisam de orientação familiar.

O Centro de aconselhamento familiar é um espaço constituído por especialistas para o atendimento das vítimas de violência doméstica e de aconselhamento às famílias. O aconselhamento permite que sejam os próprios membros implicados a encontrar a solução que mais convém às partes envolvidas, função essa que antigamente era desempenhada pela família em caso de desarmonia no lar, todos familiares se empenhavam para prevenir e combater a violência intra-familiar.

A estratégia do MINFAMU passa igualmente pela inclusão na grelha de programação dos órgãos de comunicação social de matérias relacionadas com a violência doméstica, com a participação de especialistas, como sociólogos, psicólogos e juristas, que possam esclarecer o fenómeno e as motivações dos agressores propondo soluções para a redução dos casos. A criação dos centros de aconselhamento familiar

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visa combater e prevenir deste modo e disponibilizar serviços directos às vítimas, assim como prevê estratégias de sensibilização da população para prevenir a violência no seio das famílias.

Os centros de aconselhamento familiar têm registado um número elevado de casos de abandono parental e a falta de prestação de alimentos. Outras formas de maus-tratos às crianças estão associadas a acusações de feitiçaria e violência sexual. Os centros trabalham em colaboração com a polícia, Ministério da Saúde, INAC e com a Ordem dos Advogados de Angola, nos casos que requerem a intervenção de outros parceiros.

A resolução dos casos de violência doméstica, começa pela queixa da vítima que se dirige a um centro e expõe o caso à recepcionista. Em seguida é recebida pelas conselheiras, que fazem anotações das informações da vítima, para depois preencher a ficha de atendimento com a data, hora, nome da vítima e do agressor, situação, ou seja, resolução interna do caso e instituição a que a vítima possa ser encaminhada em função da ocorrência.

Feita a denúncia, o/a queixoso recebe um pedido de comparência para o parceiro ou parceira, indicando, endereço, a data e hora em que deve comparecer no centro. O suposto agressor, após ter recebido a notificação, deverá comparecer no centro sob pena de incorrer no crime de desobediência ao abrigo do artigo nº 29 da lei nº 25/11, segundo o qual

―Aquele que for, legalmente, notificado pela autoridade competente e não comparecer, por facto que lhe seja imputável, responde pelo crime de desobediência, punível nos termos da lei‖.

Há várias formas para se fazer chegar o pedido de comparência ao agressor. Por exemplo, o queixoso pode levá-lo ou o centro faz chegar a notificação até ao seu local de trabalho. Na conversa com o casal, cada um expõe o seu problema. À medida que se desenrolam os depoimentos, desmistificam-se muitas situações, razão pela qual, o conselheiro tem de saber dirigir as perguntas para obter as informações necessárias que lhe permitirão decidir com segurança.

Denúncia dos casos de violência doméstica

Recentemente, o Ministério da Família e Promoção da Mulher criou a linha telefónica com o número ―15020‖ que funciona 24 sobre 24 horas para denunciar os casos de violência doméstica, quer pela vítima ou por qualquer pessoa do circulo social da vítima. A ligação pode ser feita em qualquer parte do país. Um dos objectivos gerais deste serviço de utilidade pública, gratuito e confidencial, é de estabelecer um espaço

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Estratégias de prevenção e combate à violência

para denúncias de casos da violência doméstica, dando ajuda e auxílio no monitoramento na rede de atendimento às vítimas.

Em termos de especificidade da lei, avançou que o mesmo pretende dar resposta imediata às denúncias dos casos de conflito familiar, apoio às mulheres e homens em situação de risco, ou que sejam vítimas desse flagelo, caracterizar a tipologia praticada no seio das famílias, analisar a real dimensão do fenómeno através de dados estatísticos desagregados por géneros.

Com a criação desta linha espera-se atingir uma maior seriedade no atendimento às vítimas de violência, servindo esta linha "SOS" para identificar os problemas que originam esta prática por parte dos agressores e para promover uma população informada e sensibilizada. Após a denúncia telefónica, o Ministério da Família e Promoção da Mulher (MINFAMU) actuará em coordenação com os diferentes sectores (Ministério do Interior, Ministério da Saúde, Ministério da Justiça).

Aconselhamento psicológico dos pais no INAC

O INAC tem a sua sede em Luanda, é uma instituição tutelada pelo Ministério da Reinserção Social (MINARS) e tem como objecto social a resolução de conflitos familiares que envolvem as crianças e os respectivos pais, enquanto instituição que trabalha em prol dos direitos da criança. Foi criado em 1991, através do Decreto nº 08/91 de 16 de Março. Actualmente as actividades desenvolvidas têm como pano de fundo os 11 compromissos da criança27, assumindo a tarefa de fiscalizar o cumprimentos dos compromissos assumidos pelo Estado angolano para protecção dos direitos dos menores.

As actividades desenvolvidas nos Centros de aconselhamento familiar do INAC resumem-se à sensibilização dos pais; orientação jurídica das pessoas implicadas; apoio psicológico e terapia familiar. A actuação do INAC, que visa combater os maus-tratos de que as crianças são vítimas no seio familiar, inclui as seguintes tarefas:

1. combate a todas as formas de violências contra as crianças;

2. educação e mobilização da sociedade sobre os problemas das crianças em Angola;

3. comemoração das efemérides marcantes dos cuidados da crianças;

4. estabelecimento de parcerias com instituições estatais e privadas, visando dar apoio às crianças em situação de risco;

27 É um instrumento jurídico muito importante na vida das crianças em Angola, pois convida-nos a reflectir com profundidade sobre as situações que assolam as crianças e permite a criação de mecanismos conducentes à realização plena dos seus direitos.

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5. sensibilização dos pais sobre os seus direitos e deveres.

Os dados recolhidos a partir dos centro de aconselhamento jurídico do INAC e dos outros centros de aconselhamento familiar de um modo geral permitem afirmar que o abandono parental e outras formas de violência doméstica são problemas reais. Todavia, os dados que estes Centros dispõem não espelham a verdadeira dimensão dos problemas reais, pois em muitas famílias as vítimas mostram-se relutantes em denunciar os agressores.

O INAC tem desenvolvido várias acções para promover o bem-estar das crianças e consequentemente sensibilizar os pais que se furtam às suas responsabilidades. É uma instituição de intervenção, legitimando-se como um elemento de suporte, aconselhamento e mobilização da sociedade no que concerne aos direitos das crianças.

O INAC recorre a várias estratégias de actuação, aproveitando as diferentes efemérides dedicadas à família e à criança em especial, para promover workshops, palestras, debates nos órgãos de comunicação social com temas sobre os direitos da crianças, violência, educação, lazer, alimentação, saúde e trabalho infantil.

Aconselhamento das famílias nos centros da OMA

A Organização da Mulher Angolana (OMA), criada no dia 2 de Março de 1962 como ala feminina do Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), teve um papel decisivo na luta de libertação nacional. No contexto da guerra contra o colonialismo português destacaram-se várias figuras, nomeadamente Teresa Afonso, Lucrécia Paim, Deolinda Rodrigues e Irene Cohen, entre outras.

Na entrevista concedida ao Jornal de Angola de 12 de Julho de 2012 a sua Secretária Geral refere que a organização surgiu como proposta do MPLA. O grupo foi constituído inicialmente por mulheres que faziam trabalho de sensibilização entre os refugiados, nas fronteiras entre o Congo Democrático e o Congo Brazzaville, educando-os sobre aspectos da política, com o objectivo de incutir-lhes espírito patriótico na luta clandestina.

As actividades desenvolvidas nos centros de aconselhamento jurídico da OMA são semelhantes às dos outros centros na mediação dos conflitos familiares. Trata-se de um serviço de assistência jurídica prestada à população de forma gratuita, em parceria com a polícia, o tribunal de família, o INAC, o MINFAMU e outras instituições, em função da tipologia dos casos apresentados. O trabalho de aconselhamento é constituído por uma equipa multidisciplinar, com psicólogos e juristas disponíveis para orientar as pessoas que acorrem aos centros para pedirem auxílio para os seus problemas.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

Atendimento das vítimas de violência doméstica nas esquadras policiais

A polícia é um órgão que tem instrumentos repressivos e de persuasão para dar uma resposta efectiva ao problema da violência doméstica, fundamentalmente quando se trata de agressões físicas. A Constituição da República de Angola reconhece o papel da polícia na manutenção da ordem e tranquilidade públicas, tal como estabelece no seu Art. 210º:

“A Polícia Nacional é uma instituição permanente, regular e apartidária, organizada na base da hierarquia e da disciplina, incumbida da protecção e asseguramento policial do país, no estrito respeito pela Constituição e pelas leis, bem como pelas convenções internacionais de que Angola seja parte”.

A polícia tem um papel importante no combate à violência doméstica, podendo adoptar para o efeito a estratégia do policiamento de proximidade para envolver a população na denúncia dos casos de violência nas famílias. A polícia é a primeira instância a que as pessoas recorrem quando confrontadas com violência física extrema, mas raras vezes recorrem à polícia quando há casos de violência psicológica, por ser difícil de identificar e de combater como tal.

A Polícia Nacional dispõe de um serviço de emergência 113 que funciona 24/24 horas. Estão disponíveis para dar uma resposta imediata em casos de denúncia, apesar de se reconhecer que há uma certa relutância da parte dos cidadãos em denunciar os agressores.

Como referiu um nosso entrevistado, para que a polícia faça o seu trabalho é importante que a população colabore, denuncie os agressores sempre que se aperceba de um caso de violência doméstica, porque a polícia enquanto órgão de segurança garante a ordem e tranquilidade públicas.

As estruturas policiais estão distribuídas em todas as zonas geográficas da cidade de Luanda, próximas da comunidade, o que torna os seus serviços mais visíveis junto da população. Outrossim, quando necessário, a polícia recorre aos meios coercivos para impor a ordem e a tranquilidade, o que confere eficácia no atendimento às vítimas de violência doméstica.

Uma actuação policial exemplar diante de casos de violência doméstica será determinante para inibir a ocorrência de novos e moldar atitudes positivas junto da comunidade. Se, pelo contrário, a intervenção policial se revelar insuficiente, vai criar um mau precedente, propiciando a prática de novos crimes e também desmotivando as vítimas a procurar ajuda.

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Considerações finais

O presente trabalho de investigação, estabeleceu como objectivo geral analisar o papel dos centros de aconselhamento familiar e jurídico na prevenção e combate à violência doméstica. O objectivo geral foi alcançado, uma vez que a pesquisa demonstrou que o aconselhamento psicológico na perspectiva de prevenção e combate à violência doméstica é uma estratégia adequada de mediação de conflito, susceptível de diminuir o elevado índice de violência no seio de muitas famílias em Luanda. Este é sobretudo um serviço que tem um papel relevante no apoio psicológico das vítimas para evitar a ocorrência de traumas, depressões, fobia e outros transtornos que possam deixar sequelas para toda vida.

Os centros de aconselhamento familiar são instituições sociais e espaços constituídos por especialistas, para o atendimento psicológico das vítimas de violência doméstica, de modo a que o processo de Aconselhamento Psicológico permita ao paciente ser um sujeito activo, sendo este responsável pela sua melhoria, na medida em que potencializa o indivíduo na busca de soluções para resolver os problemas apresentados.

Os profissionais entrevistados realçaram que as sequelas psicológicas da violência são ainda mais graves que os seus efeitos físicos. A experiência da violência, destrói a auto-estima da mulher, expondo-a a um risco mais elevado de sofrer de distúrbios psíquicos como depressão, fobia, stress pós-traumático, tendência ao suicídio e consumo abusivo de álcool e drogas.

Apuramos que o aconselhamento psicológico é um instrumento que se propõe facilitar o resgate de uma visão mais integrada do utente. É um diálogo confidencial entre o paciente e o conselheiro, cuja finalidade é contribuir para que o primeiro supere o seu estado de stress e tome decisões saudáveis.

As informações recolhidas durante a pesquisa demonstraram que o aconselhamento familiar e jurídico é uma estratégia extremamente importante que permite mediar conflitos intra-familiares. Trata-se de acções que têm permitido reduzir o elevado número de processos nos tribunais, com a vantagem de os mecanismos informais de mediação dos conflitos nos lares, serem céleres e não implicarem custos financeiros.

Os centros de aconselhamento desempenham um papel fundamental na resolução dos casos de violência doméstica em Luanda. Muitas vítimas recorrem aos centros de aconselhamento familiar em vez dos tribunais, devido à crença de que o recurso aos centros de aconselhamento é uma forma pacífica de resolver os conflitos familiares.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

Em determinadas situações, não se pretende que o agressor seja rotulado de criminoso. O desejado apenas é que se mude o comportamento do mesmo, chamando-o à razão sobre os seus actos. Relativamente às medidas de prevenção da violência doméstica, os centros de aconselhamento recorrem à divulgação de informações nos órgãos de comunicação social, nas escolas, empresas, organização da sociedade civil, distribuição de panfletos, flyers, outdoors e instrumentos jurídicos que retratam a violência doméstica como crime público. Apurámos também que os serviços de aconselhamento às famílias utilizam várias estratégias de sensibilização da população para divulgar matérias relacionadas com a violência doméstica, propondo que os órgãos de comunicação social incluam na grelha da programação conteúdos que retratam a violência intra-familiar como crime e desvio das regras básicas de convivência em família.

Os objectivos específicos foram igualmente alcançados. Quanto ao objectivo específico nº 1, relacionado com a descrição das formas de atendimento das vítimas de violência nos centros aconselhamento familiar e jurídico, constatámos que o aconselhamento começa pela denúncia feita pela vítima ou pessoas próximas do círculo social da vítima, que se dirige ao centro e expõe o caso à recepcionista. Em seguida é recebida pelos conselheiros, que fazem anotações sobre os pormenores mais importantes da ocorrência. Em seguida preenche-se a ficha de atendimento com a data, hora, nome da vítima e do agressor, situação e resolução interna do caso e instituição a que a vítima possa ser encaminhada em função do tipo de violência. A denúncia à polícia pode ser feita através do terminal telefónico 113 que funciona 24/24 horas. Depois da denúncia a polícia acciona os mecanismos para deter o agressor.

Feita a denúncia, o/a queixoso recebe um pedido de comparência para o parente, parceiro ou parceira, indicando o endereço, a data e hora em que deve comparecer no centro. Em função do pedido de comparência, o suposto agressor deverá comparecer no centro sob pena de incorrer no crime de desobediência ao abrigo do Art. nº 29º da lei nº 25/11 ( lei contra a violência doméstica), segundo o qual:

“Aquele que for, legalmente, notificado pela autoridade competente e não comparecer, por facto que lhe seja imputável, responde pelo crime de desobediência, punível nos termos da lei”.

Há várias formas para se fazer chegar o pedido de comparência ao agressor: o queixoso pode levá-lo ou o centro faz chegar o convite ou pedido de comparência ao local de trabalho do suposto agressor.

No que diz respeito às formas de atendimento, a vítima é recebida na sala de espera e se as conselheiras estiverem disponíveis entra imediatamente para a sala de atendimento. As pessoas são atendidas por ordem de chegada, salvo se houver gestantes, idosos ou vítimas com agressões físicas que se possam considerar

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constrangedoras perante outras pessoas. Todas as pessoas que se encontram nas condições referidas têm atendimento prioritário. Um dado importante a reter prende-se com o facto de nas salas estarem expostas nas paredes cartazes com o conteúdo apelativo que retrata a violência doméstica em banda desenhada.

O estudo demonstrou que inicialmente, quando ocorre violência doméstica, as pessoas procuram resolver o conflito por meios próprios. Noutros casos envolvem os demais parentes que integram a estrutura familiar alargada e aconselham-se junto dos amigos, colegas de trabalho e padrinhos, havendo situações em que encontram pessoas idóneas. Por azar, podem encontrar também pessoas irresponsáveis ou mal-intencionadas que podem dar maus conselhos, a julgar pelo seu estilo de vida cheio de maus exemplos, o que pode influenciar negativamente as partes em conflito.

Depois de esgotadas todas as tentativas de reconciliação e recorrendo às alternativas acima referidas, é que uma das partes, geralmente a parte mais interessada na resolução do problema, procura os serviços de aconselhamento familiar especializados. Normalmente são as próprias vítimas que vão fazer a denúncia. Raramente há denúncia de pessoas próximas à vítima como vizinhos, amigos ou parentes, o que revela falta de colaboração da população.

No que concerne ao objectivo específico nº 2, as informações recolhidas tendo em consideração a implementação da lei contra a violência doméstica relativamente à organização dos serviços, protecção das vítimas e capacitação das vítimas dos profissionais no atendimento das vítimas, apurou-se que no âmbito da lei 25/11 de 14 de Julho (Lei Contra a Violência Doméstica), a vítima pode dirigir-se a qualquer posto de saúde em caso de agressões físicas, a fim de solicitar o apoio médico e psicológico, e posteriormente à esquadra policial mais próxima ou aos centros de aconselhamento familiar para denunciar o agressor.

Os serviços de aconselhamento abarcam especialistas de diferentes áreas do saber, tais como juristas, psicólogos, jornalistas (assessores de imprensa) e sociólogos. A formação dos técnicos é um elemento extremamente importante para que possam ter as ferramentas necessárias no atendimento às vítimas e aos agressores. Neste sentido, têm sido levadas a cabo acções formativas, envolvendo técnicos de diferentes instituições para o intercâmbio de experiências e para unir sinergias para o combate de todas as formas de violência doméstica.

As esquadras policiais, à luz da lei contra a violência doméstica, estão capacitadas para receber as denúncias de casos de violência familiar. Durante o atendimento, a vítima reporta o caso ao oficial de piquete, que posteriormente encaminhe a denúncia ao Departamento de Investigação Criminal do Comando de Divisão para instauração do processo criminal. As vítimas, ou pessoas que tenham conhecimento de algum caso de violência doméstica, podem recorrer à polícia, e, em caso de agressões físicas, encaminhar a vítima ao posto de saúde para tratamento médico.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

As vítimas que não têm meios financeiros para constituir um advogado, podem dirigir-se à Ordem dos Advogados de Angola (OAA) para solicitar assistência judiciária, mediante apresentação de um atestado de pobreza que pode ser adquirido nas administrações comunais ou municipais.

Quanto ao objectivo específico nº 3, relacionado com as percepções dos entrevistados sobre os factores que contribuem para o aumento dos casos de violência doméstica em Luanda. Os entrevistados, referiram os seguintes factores como causas do elevado número de casos de violência doméstica: consumo de bebidas alcoólicas; ciúmes; degradação dos valores morais e cívicos; desemprego; diferenças no género culturalmente impostas que durante muito tempo justificavam a submissão da mulher ao homem, como que de sua propriedade se tratasse; falta de diálogo no seio das famílias; vergonha; medo de ver o agressor a ser responsabilizado criminalmente; impunidade e a dependência económica das vítimas em relação aos agressores.

No cumprimento do objectivo nº 4, compararam-se as formas de atendimento das vítimas de violência doméstica nos diferentes centros alvos da pesquisa, designadamente no Centro de Aconselhamento Familiar do MINFAMU, no Centro de Aconselhamento Jurídico da OMA, no Centro da Aconselhamento do INAC e na Esquadra Policial de Ingombota. As informações recolhidas junto dos entrevistados e as constatações feitas durante a pesquisa demonstraram que cada instituição tem procedimentos diferentes na resolução dos casos que se lhe apresentam, como ficou evidente na interpretação dos dados obtidos. Apesar das formas de atendimento variarem em função dos objectivos que cada centro se propõe atingir, todas as actividades de aconselhamento familiar e jurídico têm a lei contra a violência doméstica como instrumento jurídico de referência no atendimento das vítimas.

O estudo comparativo das diferenças de procedimentos e competências atribuídas a cada instituição na prevenção e combate à violência doméstica permitiu-nos ter uma visão ampla sobre as parcerias em diferentes sectores, formas de resolução, pontos fortes e fracos na abordagem das vítimas de violência doméstica. Deste modo, não se pode conceber as instituições estudadas como entidades estanques. Antes pelo contrário, elas são instituições que desenvolvem actividades interdependentes.

O papel do Instituto Nacional da Criança (INAC) consiste na procura da resolução de conflitos familiares que envolvem as crianças e os respectivos pais. Enquanto essa instituição protege os direitos da criança, procura-se mediar conflitos de forma pacífica, apelando ao bom senso das partes desavindas. Caso a situação seja de difícil resolução e que transcenda as atribuições do INAC, o processo é encaminhado para o Tribunal de Família.

As actividades desenvolvidas no Centro de Aconselhamento Jurídico da OMA, tal como nos outros centros na mediação de conflitos familiares, são um serviço de assistência jurídica prestada à população de forma gratuita em parceria com a Polícia Nacional, Tribunal de Família, INAC, MINFAMU e outras instituições, em função da

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tipologia dos casos apresentados. O trabalho de aconselhamento envolve uma equipa multi-disciplinar, com psicólogos e juristas com disponibilidade para orientar as pessoas que acorrem aos centro a pedir auxílio para resolver os seus problemas.

A Polícia Nacional é a primeira instância a que as pessoas recorrem quando confrontadas com violência física extrema. Raras vezes recorrem à polícia quando há casos de violência psicológica, por ser difícil de ser identificada e combatida como tal. As estruturas policiais estão distribuídas em todas as zonas geográficas da cidade de Luanda, mais próximas da comunidade, o que torna os seus serviços mais visíveis junto da população. Outrossim, quando necessário, a polícia recorre aos meios coercivos para impor a ordem e a tranquilidade públicas, o que confere eficácia no atendimento às vítimas de violência doméstica. Uma actuação policial exemplar diante de casos de violência doméstica será determinante para inibir a ocorrência de novos casos e para moldar atitudes positivas em relação à violência doméstica. Pelo contrário, se a intervenção policial se revelar insuficiente, vai criar um mau precedente que pode incentivar a prática de novos crimes.

Tendo em consideração o objecto específico nº 5, que tem a ver com a proposta de estratégias de prevenção e combate a violência doméstica e com base na pesquisa feita nos centros de aconselhamento familiar e jurídico, sugeriram-se estratégias de prevenção e combate à violência doméstica em Luanda.

Numa análise global, ficou patente que a ausência de infra-estruturas físicas e a escassez de recursos humanos qualificados e em quantidade suficiente para atender à demanda, fundamentalmente espaço físicos para acolhimento e protecção das vítimas contra o agressor, são algumas dificuldades enfrentadas pelas conselheiras no exercício das suas funções.

O processo de mediação de conflitos intra-familiares não se pode reduzir aos aspectos jurídicos, relegando para segundo plano os aspectos psicológicos, antropológicos e sociais, que são fundamentais na orientação das partes em conflito, pelo que uma abordagem multidisciplinar das vítimas será determinante no combate à violência doméstica. Conciliar as estratégias de mediação por terceira pessoa e a negociação, na qual os profissionais de aconselhamento tenham uma postura neutra e imparcial perante as partes em conflito, é um procedimento correcto para se chegar a soluções que satisfaçam as partes.

O estudo concluiu que os centros de aconselhamento carecem de instalações condignas e recursos humanos em quantidade e qualidade suficiente para atender o elevado número de vítimas que a eles recorrem. Urge construir abrigos em todos os municípios para albergar e proteger as vítimas dos agressores, como estabelece a alínea a) do Art. nº 11 da lei 25/11 de 14 de Julho de 2011 relativamente ao ―acesso aos espaços de abrigo‖.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

A protecção das vítimas de violência doméstica passa igualmente pela promoção de políticas de inserção familiar e laboral das vítimas economicamente dependentes dos agressores. A persistência de iniciativas para denunciar o agressor por parte das vítimas e a capacidade de persuasão, empatia, domínio da legislação sobre a matéria e conhecimento de recursos existentes por parte dos conselheiros, são factores determinantes para combater a violência doméstica.

Dadas as conclusões pertinentes a que o estudo chegou, estão lançadas as bases para futuras investigações sobre as formas de prevenção e combate à violência doméstica, podendo os resultados apresentados ajudar na definição de políticas públicas e actualização ou implementação da legislação em matéria de violência doméstica, qualificação dos recursos humanos e a construção de infra-estruturas capazes de atenderem ao elevado número de pessoas que chegam aos centros.

Em função das constatações feitas durante a pesquisa, ficou evidente que muitos casos de violência conjugal perpetrados contra as mulheres estão relacionados com ciúmes, violência sexual, violência patrimonial, a fuga à paternidade, ou seja, têm a ver com o facto de as mulheres exigirem que os homens assumam as suas responsabilidades.

As constatações feitas dão conta da existência de lacunas na divulgação dos serviços de aconselhamento junto da população, devido à escassez de recursos humanos e de meios financeiros para desenvolver actividades de sensibilização. Além disso, muitos cidadãos e as próprias autoridades desconhecem o impacto das acções de aconselhamento jurídico e familiar a nível individual e a sua repercussão social para inibir a ocorrência de novos casos de violência doméstica.

É difícil estimar a incidência da violência doméstica em Luanda, porque é um fenómeno largamente encoberto pelas vítimas e pessoas que fazem parte do círculo familiar e social das mesmas, que temem que a denúncia ponha em risco a integridade e a honra da família.

Os dados estatísticos sobre a violência doméstica não revelam a dimensão real do problema devido à resistência das vítimas em denunciarem os agressores. Os dados obtidos através de registos de ocorrência nos centros de aconselhamento familiar e jurídico, nas esquadras policiais e nos hospitais, não reflectem a magnitude do problema, pois em alguns conflitos familiares as vítimas remetem-se ao silêncio, escondem a verdadeira origem dos ferimentos quando recorrem aos hospitais, ou resolvem os conflitos no seio da família com a intervenção dos membros que integram a estrutura familiar alargada.

Para terminar, importa referir que as informações recolhidas durante a pesquisa e as conclusões a que este trabalho chegou são ferramentas extremamente importantes para os profissionais que trabalham nos centros de aconselhamento e também para a população em geral, na medida em que não se pode combater um problema que não se

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conhece. Assim sendo, as tomadas de decisão e consciencialização da população passa pela publicação de estudos que possam servir de base para análise do problema. De outro modo será um trabalho inútil.

Não queríamos concluir este trabalho, sem expressar o nosso desejo de ver esta temática ser objecto de estudo para seu aprofundamento e extensão a nível do país.

Algumas recomendações

Tendo em consideração a pesquisa feita e as conclusões a que chegamos, sugerimos o seguinte:

Aos conselheiros dos centros de aconselhamento familiar e jurídico: 1. Promover palestras, conferências e sessões de sensibilização nos

locais públicos para divulgar informações sobre as medidas de prevenção e combate à violência doméstica;

2. Combater os preconceitos, estereótipos, mitos e todas as formas de discriminação no género, no seio das famílias relacionadas e na divisão de tarefas com base no sexo;

3. Estabelecer parcerias com os órgãos de comunicação social, no sentido de incluir na gelha de programação matérias que retratam a violência doméstica como crime público e afronta às regras de boa convivência familiar;

4. Divulgar matérias nos espaços públicas, outdoors, spot publicitários, jornais com informações sobre o papel dos centros de aconselhamento familiar no combate a violência doméstica;

5. Distribuir gratuitamente informação sobre a lei contra a violência doméstica às vítimas, para as sensibilizar quanto aos seus direitos;

6. Dotar os centros de aconselhamento familiar de instalações físicas e aumentar recursos humanos qualificados para atender o elevado número de vítimas que chegam aos centros;

7. Estimular o intercâmbio entre os colaboradores dos centros de aconselhamento, agentes da polícia, advogados, magistrados, juristas sociólogos e psicólogos no que concerne os procedimentos e as parcerias estabelecidas entre as instituições que trabalham na resolução de casos de violência doméstica;

8. Após o aconselhamento, certificar junto das vítimas se os agressores cumprem as resoluções aplicadas;

9. Incluir no currículo escolar matérias em banda desenhada, texto e imagem, relacionadas com a igualdade no género e conteúdos que ilustram formas pacíficas de resolução de conflitos na família;

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Estratégias de prevenção e combate à violência

10. Distinguir com menção honrosa as instituições públicas ou privadas que, no âmbito da responsabilidade social das mesmas, desenvolvem acções de prevenção e combate à violência doméstica;

11. Promover acções intersectoriais de formação contínua dos colaboradores dos centros de aconselhamento familiar com o propósito de dotá-los de conhecimentos específicos do enquadramento legal e social da violência doméstica;

12. Realizar pesquisas de opinião junto das comunidades em estreita colaboração com os parceiros sociais, investigadores em ciências humanas para obter dados sobre as percepções da população relativamente às causas, consequências, procedimentos para resolver os casos e medidas de prevenção e combate a este fenómeno;

13. Implementar o preceituado no artigo n º11 na alínea a) da lei nº 25/11 de 14 de Julho de 2011 que defende o ― acesso aos espaços de abrigo‖, ou seja, defender a criação de abrigos para proteger as vítimas de violência doméstica;

14. Criar estratégias de inserção social e profissional das vítimas de violência doméstica dependentes economicamente, no sentido de desenvolver uma actividade que as torne independentes do agressor;

15. Nas sessões de atendimento às vítimas, deve-se criar empatia e um clima ameno que permita à vítima expor os seus problemas sem constrangimento;

16. Facultar à vítima informações e recursos existentes a que possa recorrer para resolver o seu problema;

17. Romper a cultura de silêncio através de acções de sensibilização que incentivam a denúncia de casos de violência doméstica;

18. Criar uma base de dados comum de partilha de informação entre os centros de aconselhamento familiar e jurídico com referência aos tipos de violência (conjugal, contra a criança, idoso e outras), às moradas das vítimas, formas de resolução (resolvido no centro ou encaminhado para o tribunal), estado civil dos agressor, profissão, etc.

19. Angariar sinergias e meios para os centros de aconselhamento familiar da OMA e do MINFAMU criarem bibliotecas, à semelhança do que acontece no INAC, no sentido de disponibilização de informações sobre as actividades, despachos, leis, regulamentos internos, dados estatísticos que possam servir de fonte de obtenção de dados, por parte dos investigadores;

Às vítimas de violência doméstica

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1. Em caso de agressão físicas e psicológicas, não ripostar, desafiar ou manter-se no local; deve informar a polícia para deter o agressor;

2. No caso de quaisquer dúvidas sobre um problema no lar deve pedir esclarecimentos junto das esquadras policiais e dos centros de aconselhamento familiar;

3. Consultar regularmente os instrumentos jurídicos, fundamentalmente a lei contra a violência doméstica para ser informado sobre os seus direitos;

4. Participar em actividades de prevenção e combate à violência doméstica, promovidas pelas instituições do Estado, sociedade civil e órgãos de comunicação social, com matérias relacionadas com a violência doméstica.

À população em geral

1. Considerando que a violência doméstica está tipificada como crime público implica que qualquer indivíduo que tenha conhecimento deste fenómeno deve denunciar o caso às autoridades para elas procederem ao devido tratamento;

2. Informar e dirigir as vítimas às instituições do Estado vocacionadas para o combate à violência doméstica;

3. Orientar e aconselhar as partes em conflito sobre as formas pacíficas de resolução de conflitos no seio familiar.

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Estratégias de prevenção e combate à violência

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Moniz Bala Pedro

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Artigo #4 El vínculo teoria-Prática en el Proceso de Dirección en la Organización educativa. Reto del Directivo Jefe

José Quimba Sofi, Ph.D. ISPT

[email protected]

Resumo

Alcançar novos objetivos no limiar do novo milênio, onde as transformações e as mudanças estão se movendo a um ritmo vertiginoso, influenciando positivamente o desenvolvimento da sociedade, é a chave para continuar a aprofundar a busca de alternativas no campo da educação e desta forma para obter um executivo-chefe que esteja dentro do processo de gestão e em todas as suas atuações um ativo, crítico, reflexivo, independente e protagonista em seu desempenho, de acordo com o propósito e objetivos da educação.

Palavras-chave: Organização educativa, paradigma educativo alternativo, didáctica

Sintesis Alcanzar nuevas metas a las puertas del nuevo milenio, en el que las

transformaciones y los cambios avanzan a pasos vertiginosos influyendo positivamente

en el desarrollo de la sociedad, es la clave para seguir profundizando en la búsqueda de

alternativas en el campo de la educación y de esta forma lograr obtener un directivo

jefe que sea dentro del proceso de dirección y en todo su desempeño un sujeto activo,

crítico, reflexivo, independiente y protagónico en su actuación, en correspondencia con

el fin y objetivos de la educación.

Palabras-clave: Organización educativa, paradigma educativo alternativo, didactica

Introducción

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El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización ...

La organización educativa en las instituciones tiene entre sus elementos y

referentes esenciales el vínculo teoría-práctica, que adquiere su máxima expresión en el

vínculo estudio-trabajo, esta concepción tiene sus raíces en el pensamiento pedagógico

de avanzada del siglo XIX, en el que se destacó Martí J, quien consideraba que el

trabajo prepara al hombre para la vida. ―En la escuela se ha de aprender el manejo de las

fuerzas con que en la vida se ha de luchar. Escuelas no debía decirse, sino talleres, y la

pluma debía manejarse por la tarde en las escuelas; pero por la mañana la azada‖

(MARTÍ, 1975. p.53).

En las actividades que se realizan en el proceso de dirección se alcanzan los

objetivos de la formación que a la vez incluye el desarrollo, por ser esta el medio idóneo

para establecer la relación teórico-práctica, expresión máxima para el logro del

aprendizaje y consolidación de conocimientos y habilidades del estudiante. Se utiliza el

método científico como base para los procedimientos, se aplican formas de pensar

inductivas o deductivas, donde la observación y la entrevista se convierten en el recurso

que sitúa al directivo jefe en contacto con la realidad. Es factible establecer la esencia del

proceso pedagógico, en el cual se integran como una unidad los procesos que ocurren en la

institución educativa.

En el desempeño del directivo ocupa un lugar principal el trabajo metodológico,

por la función de regulación que tiene y que sobresale en todas las fases y contextos de

la dirección del proceso. Su propósito es el mejoramiento del trabajo del claustro en la

formación de los estudiantes en correspondencia con las exigencias y necesidades de la

preparación de los docentes para alcanzar los objetivos establecidos en los planes de

estudio de las carreras.

DESARROLLO

El directivo jefe es aquel docente que tiene una categoría elemental que combina

la docencia con el propio proceso de dirección, se caracteriza por el desarrollo de sus

habilidades prácticas y su participación en la formación de los estudiantes, lo cual

favorece fundamentalmente el aprendizaje de estos. Su función se destaca en la

conducción de la educación en el trabajo, por ser la figura que más estrechamente debe

controlar los avances de cada estudiante en el marco de esta, al ser encargado de

establecer una continuidad entre el proceso pedagógico que tiene lugar en el escenario

docente tradicional; es decir, el aula y el que se lleva a cabo en los escenarios docentes

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José Quimba Sofi

empleados para la educación en el trabajo; por ello, es de especial significación el

mejoramiento de su desempeño en la educación en el trabajo, a partir de su preparación.

Aunque estos procesos y las actividades que ellos conducen están estrechamente

relacionados, presentan diferencias significativas en cuanto a sus objetivos, métodos,

evaluación y modos de ejecución; a pesar de ello, la necesidad de mejoramiento del

desempeño en la educación en el trabajo no ha sido percibida como un problema hasta

épocas muy recientes, persistiendo en la actualidad mucha polémica en su práctica.

Es evidente que en las últimas décadas, se han gestado tendencias de preparación

dirigidas a desarrollar habilidades y conocimientos en los directivos de modo de

hacerlos más activos y que estos sean capaces de analizar las condiciones históricas en

que se desarrollan y en función de estas no sólo de conocer, de describir el mundo que

lo rodea sino también de transformarlo.

Es evidente que en materia de desarrollo, de preparación se encuentra el

desempeño de directivos jefes de las instituciones educativas en la búsqueda de

herramientas para lograr la integración de conocimientos, sus experiencias, sus

habilidades; manifiesta en la interrelación dialéctica entre saber, saber hacer, saber ser y

saber transformarse. Su deber como directivo debe estar encaminado a la preparación

con la certeza de la necesidad de promoción de los jóvenes.

En el propio proceso de dirección el directivo jefe en la organización de su

institución debe tener presente la necesidad imperiosa de la actividad trabajo donde El

trabajo ha de tener un verdadero valor social, debe estar pedagógicamente estructurado

y su organización motivará al educando. El estudio-trabajo acorta el tiempo que media

entre la adquisición de los conocimientos y habilidades y su empleo en las tareas

propias del futuro profesional, con lo que se va conformando su modo de actuación, al

mismo tiempo que mientras el educando aprende trabajando, participa en la

consolidación o transformación del estado de salud de la comunidad, la familia y el

individuo (FERNÁNDEZ, 2013, pp. 239-248).28

En este orden de ideas es esencial para el directivo jefe el tratamiento a la

autosuperación y a su desarrollo.

La autosuperación es una tecnología de la Educación Avanzada. Se trata de la

preparación general que se realiza por sí mismo, partiendo de una determinada

formación, sin tutor o guía para acometer las nuevas tareas. Puede tener carácter libre

28 Disponible en: http://www.scielo.sld.cu/scielo. (Consultado Julio 01, 2013).

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El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización ...

cuando el interesado decide lo que va a estudiar o dirigida cuando las instancias

superiores son las que determinan los contenidos y los objetivos, constituye una de las

formas organizativas de superación (AÑORGA et all, 2000. p.61).

La autosuperación es considerada básica en la labor del directivo jefe. Del

mantenimiento de la disciplina y el rigor en su realización dependerá, en gran medida, el

tratamiento a las particularidades individuales de los docentes y el claustro que este

dirige.

La autosuperación es una vía importante en el desarrollo de la preparación. Esta

puede partir de las actividades que se realicen en el entrenamiento y los talleres, lo que

permitirá enriquecer conocimientos y perfeccionar habilidades. Se empleará para cada

sujeto su propio plan de autosuperación.

En la autosuperación se enfatizará en:

El vínculo estudio-trabajo.

Los contenidos del plan de estudio y su tratamiento metodológico.

Métodos que conduzcan a la participación activa de los estudiantes en el proceso

pedagógico.

El uso de los medios de enseñanza, especialmente las Tecnologías de la

Información y las Comunicaciones.

El desarrollo del proceso pedagógico, considerando las diferencias individuales.

Las formas de planificar, orientar, controlar y evaluar el trabajo independiente.

La educación en valores.

Paralelamente se enfatiza en los postulados de la teoría histórico-cultural

(VIGOTSKI LS, LEONTIEV; LURIA, 1989). De ellos, el directivo jefe considera

como fundamentos básicos los siguientes:

El hombre deviene personalidad en la actividad y la comunicación.

Divisar como punto de partida la zona de desarrollo actual para acceder a la zona

de desarrollo próximo y el papel de la enseñanza en su conducción.

Adoptar la concepción psicológica y pedagógica del aprendizaje, desde una

posición histórico-cultural significa: colocar el aprendizaje como centro de atención, a

partir del cual se debe proyectar la actividad pedagógica. Ello implica utilizar todo

recurso disponible en el sistema de relaciones más cercano al estudiante, para propiciar

su interés y un mayor grado de participación e implicación personal en las actividades

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propias de la educación en el trabajo. El profesor controla la actuación de los alumnos,

ofrece atención diferenciada en correspondencia con los niveles de desarrollo alcanzado

por cada estudiante, corrige modos de actuar y estimula manifestaciones afectivas

positivas, busca las relaciones interdisciplinarias apoyándose en los conocimientos de

otras asignaturas.

Implica además de las tareas, qué es capaz de cumplir una persona bajo la

dirección de otra y en colaboración con esta, potencian su zona de desarrollo próximo y

podrá luego realizarlas, de forma completamente independiente. De esta concepción se

deriva la connotación del papel del profesor, profundizando en el proceso como criterio

esencial y resaltando la importancia de la función orientadora del profesor con un

enfoque de esencialidad de los contenidos que deben ser asimilados, lo que se

constituye en un sólido instrumento para el estudiante en la solución de aquellas

actividades docentes, relacionadas con su futura actividad profesional, camino este, que

tiene que recorrer para formar y desarrollar competencias que le permitan un desempeño

exitoso en su futura esfera de trabajo.

Desde un enfoque psicológico se centra en el desarrollo integral de la

personalidad, sin desconocer el componente biológico del individuo, lo concibe como

un ser social. Se manifiesta en el enfoque histórico-cultural, la unidad de lo afectivo y lo

cognitivo. La unidad de la actividad y la comunicación, al propiciar la organización

educativa en la institución en sus relaciones interpersonales.

A decir de Añorga Morales (Fig. 1). El fundamento sociológico tiene que ver en

primera instancia con las relaciones entre la educación y las diferentes esferas de la

sociedad.

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El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización ...

Fig. 1. Relación educación-esferas de la sociedad.

A partir de este núcleo teórico se evidencia la propuesta:

Concepto social del desarrollo-vivencias-dialéctica de lo cognitivo y afectivo.

ZDP: nivel de ayuda.

Intercambio de las personas con los demás.

Actividad de comunicación.

Al concebir en la institución educativa el componente pedagógico en el vínculo

teoría – práctica Sierra R, en el año 2005, manifiesta ―La dirección pedagógica de la

transformación del estado real al estado deseado del objeto que condiciona todo el

Concepto social de desarrollo

ZPD Niveles

de Ayuda

Intercambio de las personas con

los demás

Actividad comunicación

Vivencias Capas o sedimentos en la mente

Persona intercalada en el sistema de

relaciones

Dialéctica de lo interno y extremo

Dialéctica de lo cognitivo y

afectivo

Apropiarse de conocimientos

No hay dos personas iguales ni

uno es el mismo desarrollo

Mediación de la cultura entre los seres humanos

Interiorización reflejos de la realidad por la impronta personal

Concientización

Enraizado en su cultura

Argumentación con la palabra

Significado en el pensamiento abstracto

ENFOQUE HISTÓRICO-CULTURAL (Desarrollo humano)

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Jul/Dez 2017 | 77

José Quimba Sofi

sistema de acciones entre el subsistema dirigente y el subsistema dirigido para alcanzar

los objetivos de máximo nivel‖ (SIERRA, 2005, p.37).

Sierra R incluye como la concepción teórico-práctica de la dirección del proceso

pedagógico durante la transformación del estado real al estado deseado, en la formación

y desarrollo de la personalidad de los sujetos de la educación que condiciona el sistema

de acciones para alcanzar los objetivos; tanto en lo personal, lo grupal, como en la

institución escolar (SIERRA, 2002).

Se analiza la concepción de Barbón OG, quien en el año 2014, manifiesta la

necesidad de ―…un sistema de acciones pedagógicas, científicamente fundamentadas,

que tienen como punto de partida las necesidades educativas de los sujetos en

determinado contexto, en el cual la misión y los objetivos que se trazan tienen carácter

rector del proceso a transformar del estado actual al deseado mediante el desarrollo de

fases o etapas estrechamente interrelacionadas‖ (BARBÓN, et all, 2014), esta autora le

otorga gran valor a la cientificidad del estudio del componente pedagógico, se enfatiza

en el contexto, las necesidades educativas de los sujetos, el carácter de sistema; así

como en los componentes que deben integrarla y las relaciones entre estos.

A continuación el autor se adentra en elementos los cuales considera esenciales

en el proceso de dirección.

En este proceso se debe:

Propiciar el interés y un mayor grado de participación e implicación del claustro.

Concebir una atención diferenciada en correspondencia con los niveles de

desarrollo alcanzado por cada subordinado

Potenciar la función orientadora.

Garantizar el grado de satisfacción del subordinado durante su actividad en las

diferentes tareas que ejecuta en la institución educativa.

Garantizar la conexión del conocimiento precedente y el nuevo del claustro.

Garantizar la atención individualizada del subordinado en el proceso de

dirección.

Propiciar que el subordinado adopte una actitud consciente y crítica de su

respectivo papel en el proceso y de la realidad en que están inmerso.

Velar por la organización del proceso pedagógico, concibiendo la educación en

el trabajo como principio y forma organizativa principal del proceso pedagógico.

Facilitar la preparación del claustro para la formación de valores.

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El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización ...

Las premisas para la consecución del vínculo teoría –práctica en la institución

educativa se plantean:

La precisión de los fundamentos, conceptos y procedimientos generalizadores,

elemento que le va a ofrecer al directivo jefe una guía para el análisis de las

posibilidades que brinda su contexto actual de desempeño.

El reconocimiento de la educación en el trabajo como elemento rector en la

organización educativa y no solo como forma organizativa de enseñanza, en

función de las posibilidades reales de los estudiantes (planificación de la

atención a las diferencias individuales, desde el estudiante promedio hasta el

talento, lo cual presupone la puesta en práctica de la creatividad), la composición

del equipo de trabajo en la institución incluyendo al psicopedagogo y las

adecuaciones curriculares correspondientes.

La identificación del directivo jefe, como sujeto responsabilizado con la

planificación, coordinación, regulación, control y evaluación de las actividades

en la institución educativa realizando la conexión teoría –práctica y educación

en el trabajo.

El tratamiento a las particularidades individuales del subordinado, sin perder de

vista los objetivos, pero que respondan a las exigencias de la educación en el

trabajo, las nuevas tendencias educativas y las prioridades del Sistema Nacional

de Educación.

La premisa del desarrollo del trabajo pedagógico-educativo, por medio del

equipo de trabajo: profesores (de diferentes categorías docentes), especialistas,

profesionales, psicopedagogos, técnicos, internos y demás estudiantes; hay que

organizarlo siguiendo el principio del ―trabajo en cascada‖, donde cada uno tiene

la obligación de enseñar y controlar a los compañeros del escalón inmediato

precedente, en una dinámica en que todos aprenden de todos, tomando como eje

la problematización de las propias situaciones reales existentes y las prioridades

de la institución educativa.

El reconocimiento del principal objetivo de la educación en el trabajo: contribuir

a la formación de las habilidades y hábitos prácticos que caracterizan las

actividades profesionales; la adquisición de los métodos más avanzados de

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José Quimba Sofi

trabajo y la formación de los rasgos que conforman la personalidad en la

sociedad.

Conclusión Se reconoce con el trabajo realizado que contribuye, además, a consolidar,

ampliar y aplicar los conocimientos adquiridos durante el desarrollo del proceso de

dirección las siguientes cualidades que lo distinguen:

1. Sistémica. Resume un sistema de acciones pedagógicas, científicamente

fundamentadas que en diferentes niveles de jerarquía o complementación se

articulan para el logro de los objetivos propuestos.

2. Flexible. La forma en que se concibe el proceso de dirección permite que se

adapte al contexto donde se aplica, mediante la ejecución de acciones que

estarán de acuerdo con las características de los subordinados y el contexto en el

que se interviene.

3. Humanista. Tiene como fin el mejoramiento del desempeño profesional y

humano del claustro; además, contribuye al logro de una sensibilización de la

influencia en el autoaprendizaje del directivo jefe y del personal que con él se

relacionen.

4. Interdisciplinaria. En su concepción del vínculo teoría – práctica, la educación

en el trabajo, la entiende como principio y como forma organizativa principal

del proceso pedagógico, así como de la integración de los procesos múltiples

que ocurren en la institución educativa. Por otra parte, incorpora en la esencia de

la educación en el trabajo no solo el desarrollo de habilidades y hábitos, sino

también contempla la formación de valores, en la preparación del claustro.

5. Participativa. Favorece el desarrollo de relaciones humanas solidarias, alejadas

del autoritarismo y donde el sujeto que participa quede comprometido con su

propia formación.

6. Transformadora. Tiene como punto de partida las necesidades educativas de

los sujetos-subordinados para la transformación cualitativa de su desempeño y

esta transformación positiva es el resultado de un proceso de mejoramiento, que

ocurre el claustro y que favorece su desempeño, por tanto la organización

educativa.

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El vínculo teoria-prática en el processo de dirección en la organización ...

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Artigo #5 Proposta de utilização das tecnologias educativas, concretamente dos assistentes matemáticos, na resolução de problemas matemáticos no ISPT de Angola

João Filipe de Almeida, Ph.D. ISPT

[email protected] Resumo Neste trabalho trataremos de uma proposta de utilização das Tecnologias Educativas, concretamente dos Assistentes Matemáticos, na resolução de problemas matemáticos que leva à perfeição dentro do processo docente-educativo, colocando o estudante no centro da mesma através do uso dos métodos e técnicas participativas. A introdução dos Assistentes Matemáticos como ferramenta de trabalho da disciplina de Matemática actuará como um novo elemento didático integrador no Instituto Superior Politécnico Tocoísta. O seu uso na resolução de problemas foi crescendo e actualmente se converteu num elemento necessário dentro do processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: tecnologia educativa, assistentes matemáticos, resolução de problemas, Descarte, Geogebra. Abstract In this work we will deal with the use of Educational Technologies specifically for Mathematics Assistants in solving mathematical problems that leads to perfection within the teaching-educational process, putting the student in its center, through the use of participatory methods and techniques. The introduction of Mathematical Assistants as a working tool of the Mathematics discipline will act as a new integrating didactic element in the Tokoist Superior Political Institute. Its use in solving problems has been growing and has now become a necessary element in the teaching-learning process. Keywords: educational technology, mathematical assistants, problem solving, Descarte, Geogebra.

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Proposta de utilização das tecnologias educativas ....

Introdução O Instituto Superior Politécnico Tocoísta (adiante, ISPT) é uma instituição de

ensino superior de direito privado, criada à luz do Decreto Presidencial Nº 83/16, de 18 de Abril (Diário da República I Série Nº 61), propriedade da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo no Mundo - Os Tokoistas, de matriz cristã e vocação tecnológica. Orientado para a criação, transmissão e difusão da ciência e da tecnologia através da articulação do estudo, da investigação e do desenvolvimento experimental baseado no exercício da liberdade intelectual e no respeito pela ética académica, no reconhecimento do mérito, no estímulo à inovação e à competitividade e no compromisso com a modernização da sociedade.

A proposta de utilização das Tecnologias Educativas, concretamente dos Assistentes Matemáticos, na resolução de problemas matemáticos que leva à perfeição dentro do processo docente-educativo, que colocam o estudante no centro da mesma, através do uso dos métodos e técnicas participativas, e na qual o estudante se sente emerso no desenvolvimento da mesma. A introdução dos Assistentes Matemáticos como ferramenta de trabalho da disciplina de Matemática actuará como um novo elemento didático integrador no Instituto Superior Politécnico Tocoísta. O seu uso na resolução de problemas foi crescendo e actualmente se converteu num elemento necessário dentro do processo de ensino-aprendizagem. Desenvolvimento

A proposta do uso das Tecnologias Educativa, concretamente dos Assistentes Matemáticos no Instituto Superior Politécnico Tocoísta, permite tornar mais acessível para o estudante a compreensão dos conceitos, teoremas e axiomas, de forma a favorecer a interiorização dos conceitos e procedimentos. O seu carácter interativo permite uma retroalimentação de maneira imediata, ampliando a manipulação possível e as possibilidades de visualização, enquanto a sua capacidade gráfica facilita a integração de diversas imagens conceituais.

Neste trabalho se propõem o uso dos Assistentes Matemáticos como ferramenta importante para a solução dos problemas Matemáticos no Instituto Superior Politécnico Tocoísta, o que contribui para o desenvolvimento do pensamento produtivo e criativo.

A incorporação dos Assistentes Matemáticos no ensino da Matemática deve ser visto não só como meio didático, mas também deve significar uma inovação importante que conduzirá a uma profunda troca de objectivos, conteúdos e métodos de ensino, sem deixar de ter em conta a influência positiva e negativa.

A apresentação e a introdução dos problemas devem significar um recto, que apela à complexidade e oferece a via de solução. O tratamento dos problemas deve se realizar em actividade em grupo, sob orientação do docente.

Para desenvolver a aula, o docente deve prestar atenção aos métodos, conceitos e formas de raciocínios matemáticos que levam à formulação e à resolução de problemas. As tarefas não podem ser meras repetições da aplicação do visto na sala de aula. Devem sim ser exercícios mais complexos que fazem com que os estudantes se aplicam em novos trabalhos em grupo. Se trata de uma estratégia integradora.

O Descarte e Geogebra são ferramentas matemáticas para a resolução de problemas matemáticos no ISPT. A integração das TIC, e particularmente dos Assistentes Matemáticos, na disciplina de Matemática no Ensino Superior, permite

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João Filipe Almeida

alcançar uma sólida preparação para enfrentar os diferentes problemas na vida profissional. A utilização do Assistente Matemático Geogebra e Descarte com fins didáticos Entre as vantagens se pode mencionar:

Ajuda a elevar o pensamento a níveis superior. Facilita a integração de diferentes imagens dos conceitos, através da sua

capacidade gráfica, que produz um obstáculo para a aprendizagem. Ampliar a facilidade de manipulações possíveis de visualização. Favorecer a interiorização dos conceitos e procedimentos, de forma a que estes

permaneçam a mais longo prazo. Propiciar a investigação e a descoberta. Facilitar a resolução de problemas na medida em que se permite a experiência

com rapidez e seguridade. Provocar uma realimentação a medida do seu carácter interativo. (GUTIÉRREZ,

A. (2005). É necessário recordar que a computação no ensino superior pode levar a certos inconvenientes. Estes recursos educativos informáticos podem contribuir de forma integrada e com a metodologia adequada, a melhor qualidade de ensino, tanto para melhorar a aprendizagem, como enquanto ferramenta com a qual os estudantes devem familiarizar-se para uma adequada formação superior. Algumas desvantagens da utilização da Tecnologia Educativa “Assistente Matemático” no processo docente-educativo

As desvantagens são: Que o programa se converte em sujeito em lugar da Matemática. Que confie na interação entre estudante e o computador em vez do processo

docente. Que percam destrezas básicas para interpretar um modelo de resposta a um

problema. Que se assumam resposta não esperadas. Que as dificuldades na aprendizagem de um programa dado não cheguem a ser

um obstáculo para a aprendizagem da Matemática. Que se produza uma excessiva dependência dos Assistentes Matemáticos.

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Proposta de utilização das tecnologias educativas ....

Desta maneira as TIC não oferecem somente uma nova ferramenta para realizar uma nova estratégia das tarefas, senão que podem transformar a natureza em um problema que se coloca.

Com a introdução do Descarte e Geogebra é possível aumentar o número de experiências pessoais dos estudantes no processo de ensino-aprendizagem, já que este pode resolver individualmente uma maior quantidade de problemas e aprofundar o seu estudo e interpretação.

Na maioria das Teorias Pedagógicas, os conhecimentos são adquiridos através das experiências pessoais. O aumento destas facilitará a aquisição dos conhecimentos por parte dos estudantes. Esta experiência está sustentada pelo método de descobrimento desenvolvido por David Ausubel, o “qual consiste em que o docente deve incentivar o estudante a alcançar um aprendizado através dos descobrimento de conhecimentos, quer dizer o docente deve orientar o estudante para que se descubra progressivamente através das experiências investigações, ensaios, erros, reflexões, discernimentos, etc.‖. Este tipo de técnica pretende que o docente se converta em agente da sua própria formação, através da investigação pessoal, e o contacto com a realidade objectiva do estudo e da experiência do grupo de trabalho.

Com esta proposta da utilização das Tecnologias Educativas ou Recursos Educativos com Assistentes Matemáticos, os docentes podem obter uma melhoria no processo de ensino-aprendizagem das Matemáticas.

O problema se faz de forma mas acessível: A parte do problema que tem a ver com o docente não inclui os cálculos, agora realizados pelo Assistente Matemático, levando a que o estudante se aplique mais na parte física do problema.

A confiança nos cálculos: Maior segurança nos cálculos que se realizam com o Assistente Matemático, tanto pelo estudante como pelo docente.

A prática: A possibilidade de resolver mais exercícios e problemas com uso de Descarte e Geogebra será muito maior. Portanto, haverá um aumento significativo do número de experiências pessoais e problemas resolvidos.

Com o fim de evitar que se produzam dificuldades adicionais que interrompam o bom desenvolvimento do processo se deve considerar os seguintes aspectos:

Os problemas devem ser eleitos cuidadosamente, para que possam ser resolvidos sem grandes dificuldades com ajuda de Descarte e Geogebra, para facilitar o raciocínio lógico e os cálculos de forma que interessam ao estudante.

O docente deve ter o domínio da Informática e do Descarte e Geogebra. O Descarte e Geogebra são ferramentas fáceis de manejar e devem ser utilizadas

cuidadosamente. O Descarte e Geogebra permitem a construção de simuladores relacionados com

a solução do problema. O Descarte e Geogebra permitem trocar os parâmetros gráficos em 2D e 3D,

mover as figuras e realizar os cálculos matemáticos. O Descarte e Geogebra permitem visualizar, movimentar e realizar a

experimentação numérica, contribuindo para a perfeição do processo docente-educativo.

Se deve ensinar ao estudante como utilizar o Descarte e Geogebra .

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João Filipe Almeida

O que é o Descarte?

Descarte 4 e Descarte Web 2.0 são applets configuráveis. O que são applets?Significa que podem ser inseridos em páginas web. O que são configuráveis? Significa que cada aplicação ou configuração pode ter um aspecto diferente.

Os docentes podem criar uma cena de Descarte 4 e Unidades de Descarte Web 2.0. modificando outras que já existem ou criando configurações novas. Podem inserir as cenas em páginas web para criar lições ou unidades didácticas interativas e colocá-las em servidores na internet ou em disco fixo de um computador, em CD ou em DVD ROM.

Para resolver problemas com Descarte se necessita seguir a seguinte metodologia de trabalho:

1. Realizar um diagnóstico do problema. Logo depois de uma leitura detalhada da situação colocada ao estudante, deve decidir que teoria ou técnica matemática a utilizar.

2. Desenhar tarefas para dar solução ao problema. As tarefas atribuídas aos estudantes devem apresentar um formulário matemático o mais realista possível para colocar e determinar um algoritmo de trabalho a seguir.

3. Executar o processo de solução do problema com ajuda do Assistente Matemático Descarte. O estudante deve introduzir correctamente os dados e auxiliar com os ficheiros que já existem ou fazer uma programação sensível que lhe permita solucionar ao problema.

4. Avaliar os resultados. Logo após a obtenção do resultado o estudante deve dar uma resposta ao problema, com a devida interpretação dos resultados, assim produzindo a integração dos conhecimentos referidos nas diferentes disciplinas.

O Que é Geogebra?

Geogebra é um software interativo de Matemática que reúne dinamicamente geometria, álgebra e cálculo. Foi elaborado por Markus Hohenwarter junto de uma equipa internacional de desenvolvimento, para o ensino da matemática escolar.

Geogebra é uma ferramenta multi-plataforma destinada principalmente para a educação, a qual permite interatuar dinamicamente com a Matemática num âmbito do que se reune em geometria, álgebra e análise de cálculo. Metodologia e exemplos de resolução de problemas matemáticos resolvidos através do Assistente Matemático Descarte e Geogebra

Realizámos no ISPT um estudo de caso desde a perspectiva qualitativa-interpretativa. Observámos e analisámos os comportamentos de um grupo de estudantes, selecionados de forma aleatória, durante a resolução de problemas de Geometria Analítica. Estes estudantes trabalham diversos temas de Geometria elementar, com uma metodologia em que predomina a resolução de problema. Entre as diferentes opções com Assistentes Matemáticos se sugere o uso de Descarte e Geogebra.

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Proposta de utilização das tecnologias educativas ....

Problema de circunferência: Uma circunferência passa pelos pontos P = (1,-1), Q = (3,5) e o seu centro pertence à recta de equação x+y+2 = 0. Achar o seu centro e o raio.

Problema de rombo:

Um rombo tem dois vértices P = (-2,1) e Q = (0,-3) que formam uma diagonal do rombo. O perímetro é de 20 cm. Achar os vértices restantes e a área do rombo.

O estudante deve levar a cabo uma análise preliminar dos problemas para determinar o espaço básico de cada um e os meios para os resolver (papel, lápis e Geogebra). Consideramos o espaço de um problema como um conjunto de possibilidades. O espaço básico depende, entre outros factores, dos conhecimentos que os estudantes dispõem e da utilização do programa na resolução do problema, assim como a sua capacidade para o identificar. O espaço de um problema resolvido por um estudante não é o mesmo que de um perito, o que denominamos espaço básico do problema (Cobo, 1998).

A partir da construção do espaço básico de resolução são identificados os meios analisados dos conteúdos conceituais e procedimentos implicados na sua resolução, assim como a ferramenta de Geogebra, necessária para as distintas resoluções.

Para a recolha principal dos dados, utilizámos dois questionários:

Questionário A (Relativamente à resolução com lápis e papel): 1. No geral, encontraste um problema fácil ou difícil? Porquê? 2. O que foi mais difícil? Porquê? 3. Fizeste uma representação gráfica?

a) Sim, com eixos de coordenadas. b) Sim, sem representar eixos de coordenadas. c) Não, não fiz representação gráfica.

1. No caso afirmativo, foi útil a representação gráfica. Porquê? 2. No caso negativo, porque não fez a representação gráfica? 3. Consideras que, depois de resolveres o problema, és capaz de visualizar as

relações geométricas deste problema sem necessidade de fazer uma representação gráfica? Porquê?

Concretizamos os objectivos das perguntas formuladas no questionário A. O

objectivo das perguntas 1 e 2 é de obter mais informações sobre o grau de dificuldades que os estudantes tiveram na resolução de problemas com circunferência e assim comparar estas dificuldades com dificuldades que têm a ver com a resolução com Geogebra.

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João Filipe Almeida

O objectivo das perguntas 3, 4 e 5 é obter informações sobre a opinião dos estudantes a respeito das representações gráficas, sem eixos de coordenadas.

Finalmente o objectivo da pergunta 6 é obter informação sobre as dificuldades de visualização quando se trabalha com lápis e papel e assim comparar as dificuldades em ambos os meios. Questionário B (Relativa à resolução com Geogebra)

1. Indica as ferramentas utilizadas e os passos de construção que fizeste na resolução de problema.

2. Podias resolver o problema de uma nova forma? 3. Em que te ajuda e em que não te ajuda o Geogebra? Que dificuldades tiveram? 4. No que crês que a tua forma de resolução de problema é diferente da que usas

normalmente na aula? 5. Marca a opção que te parece mais adequada e justifica a resposta:

a) A solução me convence. b) A solução poderia convencer aos meus colegas. c) A solução poderia convencer o docente. d) A solução poderia convencer uma pessoa que não está familiarizada com

estes tipos de problemas.

O objectivo da pergunta 1 é obter um protocolo de construção completo realizado pelo estudante. Esta informação se completa com o protocolo de construção gravado no arquivo.

O objectivo da pergunta 2 é determinar as técnicas de instrumentos utilizados pelo estudante.

O objectivo da pergunta 3 é conhecer as dificuldades que encontrou o estudante durante a resolução de problemas com Geogebra (obstáculos técnicos, obstáculos cognitivos já existente transladado ao software (Drijvers, 2002), assim como a opinião dos estudantes sobre as vantagens da utilização de Geogebra, para resolução dos problemas propostos.

A pergunta 4 também está relacionado com as técnicas instrumentais. Finalmente, o objectivo da 5 pergunta é observar o valor que o estudante atribui

à resolução de problemas com ajuda de Geogebra. Com respeito ao cenário da investigação, concretizamos a continuação como se

leva a cabo as secções de aula. O cenário da investigação ocupa quatro secções de aula.

Primeira secção (2 horas): Se introduze o uso de Geogebra. Se trabalha em grupo com ajuda do docente,

alguns exemplos e problemas de construção com o objectivo de familiarizar o estudante com a ferramenta necessária para as secções seguintes (construção de um quadrado dados um vértice e o seu centro, construção de uma recta de Euler, teorema de Varignom, teorema de Viviani).

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Proposta de utilização das tecnologias educativas ....

Segunda secção (1 hora):

Se inicia a experiência com a resolução de problema da circunferência só com lápis e papel. Posteriormente se realiza o questionário A, sobre a resolução de problema da circunferência em lápis e papel (individualmente).

Terceira secção (1 hora):

Se propõem ao estudante a resolução com Geogebra, (individualmente mais respeitando a proposta de distribuição do estudante na secção de lápis e papel) do problema da circunferência e seguidamente se propõem a resolução do problema do rombo com Geogebra.

Os estudantes, ao mesmo tempo que avançam na resolução de problema, vão escrevendo as notas, comentando a sua actividade, isto é, escrevendo o Auto protocolo (Gutierrez, 2005). Posteriormente se realiza o questionário B sobre o uso de Geogebra.

As figura 1 e 4 mostram a possibilidade de resolução e visualização dos Assistentes Matemáticos.

Figura 1. Figura 2. Circunferência por três pontos Construção do rombo, estratégia construída com GEOGEBRA dinâmica

Figura 3 (Instrumental) Figura 4 - Estratégia visual para Intersecção das circunferências, de raio 5u, obter a área do rombo. centradas no vértices dados P e Q.

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João Filipe Almeida

Conclusão

A proposta da utilização dos recursos educativos ou tecnologia educativa com Assistentes Matemáticos Geogebra e Descarte, no Instituto Superior Politécnico Tocoísta em Angola, permite que:

1. O problema a resolver seja mas acessível para o estudante; que o estudante adquira maior confiança em si, devido aos cálculos que realiza, assim como ao aumento do número de experiências pessoais na resolução de problemas.

2. Que os estudantes conheçam mais profundamente os algoritmos, se sintam mais motivados para o estudo da Matemática, devido à maior aproximação na resolução de problemas matemáticos relacionados com o seu perfil profissional, com menos quantidade de cálculos manuais rotineiros.

3. Que o estudante possa ampliar, organizar, visualizar e realizar múltiplas representações do conhecimento que se colocam à sua disposição e que possam contribuir para melhor compreensão dos conceitos e problemas matemáticos .

Bibliografia PROYECTO DESCARTE ―Comunidad Europea‖ 2007. España. MIYAR, I.; LEGAÑOA, M. ―Empleo de los Asistentes Matemáticos para la asimilación conceptual del álgebra universitaria‖. [En red]. Abril 2007. AÑORGA, J. (1995). "Teoría de los sistemas de superación". La Habana. ARTIGUE, M. (2002). Learning Mathematics in a CAS environment: The genesis of a reflection about instrumentation and the dialectics between technical and conceptual work, Internacional Journal of Computers for Mathematical Learning, 7, pp. 245-274. COBO, P. (1998). Análisis de los procesos cognitivos y de las interacciones sociales entre alumnos (16-17) en la resolución de problemas que comparan áreas de superficies planas. Un estudio de casos. Tesis doctoral. Universitat Autònoma de Barcelona. DRIJVERS, P. (2003). Learning algebra in a computer algebra environment: design research on the understanding of the concept of parameter. Doctoral dissertation. Universiteit Utrecht. GUTIÉRREZ, A. (2005). Aspectos metodológicos de la investigación sobre aprendizaje de la demostración mediante exploraciones con software de geometría dinámica, en Maz, A., Gómez, B. y Torralbo, M. (eds.). Actas del 9.º Simposio de la Sociedad Española de Investigación en Educación Matemática (SEIEM), pp. 27-44. HOHENWARTER, M. y PREINER, J. (2007). Dynamic mathematics with GeoGebra. Journal of Online Mathematics and its Aplications. ID1448, vol. 7. HOLLEBRANDS, K. (2007). The Role of a Dynamic Software Program for Geometry in the Strategies High School Mathematics Students Employ. Journal for Research in Mathematics Education, 38(2), pp. 164-192.

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Artigo #6 As controvérsias da reforma educativa em Angola

Kezita Manuela Marcos ISPT

[email protected]

RESUMO

O presente trabalho tem como principal enfoque o processo da reforma educativa em curso em Angola. Para um país como Angola, que saiu de um conflito armado que durou mais de 20 anos, o qual destruiu o tecido social e económico, e que precisa de promover o crescimento económico, modernizar o sistema social e político e fazer dos seus cidadãos membros participativos, críticos e responsáveis da sociedade, a Educação aparece como elemento-chave nas medidas a tomar. Deste modo, irão ser analisadas as percepções dos professores e directores de escola face à reforma educativa e respectiva funcionalidade no que concerne à prática educativa do subsistema de ensino geral no contexto angolano. O objectivo central é analisar e compreender a centralidade das controvérsias no plano da reforma educativa e da mono-docência no 5º e 6º anos de escolaridade do sistema educativo angolano. O estudo baseou-se numa metodologia essencialmente qualitativa. A entrevista foi escolhida como método de recolha central de informação, tendo como principal instrumento de diagnóstico a análise de conteúdo. Deste modo, o estudo apoia-se nos depoimentos de uma amostra de 16 professores do ensino primário que leccionam o 5º e 6º anos e quatro directores de escola. Os resultados deste estudo apontam para a revisão da política de qualificação e profissionalização dos professores do ensino básico em Angola. Mas antes disso, para a discussão dos benefícios da mono-docência no 5º e 6º anos.

Palavras-chave: Política Educativa, Reforma Educativa, Mono-docência

ABSTRACT

The present work has as its main focus the process of educational reform underway in Angola. For a country like Angola that is coming out of an armed conflict that has lasted over 20 years, which destroyed the social and economic needs and promote

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

economic growth, modernize the social and political system or to participating members of their citizens, critical and responsible members of society, education appears as a key element in action. Thus, will be analyzed the perceptions of teachers and school principals face the educational reform and its functionality with regard to educational practice Subsystem general education in the Angolan context. The central objective is to analyze and understand the centrality of controversy in terms of educational reform and the single teacher in 5th and 6th grade of the Angolan education system. The study was based on qualitative methodology, the main tool for analyzing the content analysis. The study shows a random sample of 16 primary school teachers who teach the 5th and 6th year and four school directors. The interview was chosen as the method of gathering information. The results of this study point to review the policy for training and professional development of primary school teachers in Angola.

Keywords: Education Policy, Education Reform, A Single Teacher

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Kezita Mamuela Marcos

INTRODUÇÃO

A análise da política educativa (ou de educação) é um campo complexo em permanente

construção e expansão. Neste sentido, Teodoro (1994) explica que a análise da política educativa

exige do investigador um grande equilíbrio, no sentido de diferenciar os discursos sobre política.

Gordon (1977, p.28), citado por Codd (1988), explica que a análise da política educativa

pode ter duas formas: a) análise que determina a construção da política pública (oficial) e os

efeitos de tais políticas em vários grupos; e b) análise de conteúdo da política - examinando-se os

valores, pretensões e ideologias subjacentes ao processo político. A centralidade deste estudo vai

ao encontro do primeiro ponto.

O Sistema Educativo em Angola soma sete reformas educativas: a de 1845 (oficialização

do ensino em Angola); 1906 (após a conferência de Berlim); a de 1927 (fim da primeira

república portuguesa e o surgimento do Estado Novo); a de 1933 (na sequência da nova

constituição da República Portuguesa); a de 1967 (decreto-lei de 9 de Julho de 1964, em que o

ensino primário passou a abranger o ciclo elementar, de 1ª à 4ª classe e o ciclo complementar,

envolvendo a 5ª e 6ª classes); a de 1978 (a primeira do pós-independência, decorrente da 3ª

revisão constitucional); e a de 2001 (após a promulgação da Lei de Bases do Sistema de

Educação) (ZAU, 2012, p.143). Esta última, pela sua actualidade e impacto no sistema educativo

angolano, constitui o foco do presente estudo.

Importante será dizer que o surgimento do Estado democrático, a alteração da política

económica e o relatório de balanço do Grupo de Prognóstico do Ministério da Educação, são

alguns dos elementos que influenciaram, em grande medida, o surgimento da actual reforma em

curso no sistema educativo angolano. Ngaba (2012, p.248) dá conta que esta reforma está

fortemente marcada pelas políticas da CPLP e das agências ou organizações internacionais como

a UNESCO, a UNICEF e o Banco Mundial.

A actual reforma educativa em Angola tem como objectivos: a expansão da rede escolar;

a melhoria da qualidade de ensino; reforço da eficácia do sistema de educação e por fim a

equidade do sistema de educação (Zau, in ―Jornal de Angola‖, 10 de Maio de 2011).

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Importa referir que a análise temporal da Reforma do Sistema Educativo de Angola neste

estudo é a partir de 2001, data de aprovação do decreto-lei nº 13/01. Assim, a presente

investigação inscreve-se nas lógicas expostas em ―Controvérsias da Reforma Educativa em

Angola: Uma Análise Crítica do Iº Ciclo do Ensino Primário‖ (2001), tendo como enfoque o

processo da reforma educativa em curso em Angola. Para isso, será realizada a análise à

percepção dos professores e directores de escola face à reforma educativa e respectiva

funcionalidade na prática educativa do subsistema de ensino geral. O objectivo central é analisar

e compreender a centralidade das controvérsias no plano da reforma educativa e da mono-

docência na 5ª e 6ª classes, respectivamente, do sistema educativo angolano.

Tendo por referência estas questões, pretende-se contribuir para o debate substantivo das

políticas educativas, ao nível das ciências sociais e das ciências da educação em Angola.

O problema de pesquisa orienta-se em torno da percepção dos efeitos da reforma educativa

na prática docente na relação com os alunos do subsistema de ensino geral no contexto angolano.

Com este problema de pesquisa procura-se atingir os seguintes objectivos:

Compreender os fundamentos políticos relativamente à passagem da pluri-docência

para a mono-docência no ensino primário unificado, concretamente a 5ª e 6ª classes

respectivamente;

Identificar as dificuldades funcionais da reforma educativa no contexto angolano;

Analisar, do ponto de vista educativo e profissional, a adaptação dos professores ao

processo de unificação do ensino primário;

Identificar as estratégias usadas pelas escolas e pelos professores face à reforma

curricular no subsistema do ensino geral.

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Kezita Mamuela Marcos

1. Um Olhar sobre o Sistema Educativo Angolano

1.1. O Sistema de Educação e Ensino Pós-independência (1976-1991): Da Desconstrução à Construção do Estado Angolano

As décadas de 70 e 90 do século XX constituíram um período de grandes mudanças políticas

e económicas para o Estado angolano. Essas mudanças influenciaram a redefinição do sistema

educativo e consequentemente as respectivas políticas públicas. Em qualquer Estado, Estado-

nação ou Estado-Providência, um dos princípios para a sua efectivação passa necessariamente

por um sistema sducativo capaz de responder e veicular os objectivos desse mesmo Estado.

A construção de um Estado angolano independente começou a ser edificado a 11 de

Novembro de 1975. O ordenamento institucional e a transferência do poder foram estabelecidos

pelo Acordo de Alvor, assinado a 15 de Janeiro de 1975, pelos representantes dos três

movimentos de libertação de Angola: a União Nacional para Independência Total de Angola

(UNITA); o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA); e a Frente Nacional de

Libertação de Angola (FNLA), sob a presidência de Portugal (cf. Nguluve, 2010:35).

Importa referir que o Acordo de Alvor não foi respeitado pelos líderes dos três movimentos,

vindo a fracassar nas suas premissas essenciais. Dessa forma, no dia 11 de Novembro de 1975 o

MPLA proclamava a independência, em Luanda, da República Popular de Angola (RPA), a

UNITA, proclamava a independência na província do Huambo, e a FNLA na República

Democrática de Angola (RDA) (NGULUVE, 2010, p.37). Assiste-se, neste período, a um

processo de transição para conflito armado. As suas causas deixam de ser exógenas, e passam a

ser endógenas. Mas o processo de construção e edificação do Estado angolano efectivou-se com

o MPLA.

Assim, impondo-se aos outros movimentos de libertação anticoloniais, o MPLA no seu Iº

Congresso, realizado em 1977, oficializou a sua ideologia nas premissas do socialismo científico

(Ministério da Educação, 1978, p.29). Na visão de Cosme, o ―MPLA adoptou um esquema

marxista-leninista para modelar a indispensável unidade nacional de Angola (…), era necessário

estabelecer uma ideologia para consolidação do país, a partir do zero político (VIEIRA, 2007,

p.94, apud COSME,1978, p.82)‖.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Com a finalidade de fortalecer os seus objectivos políticos, o MPLA, estendeu toda a sua base

ideológica no seio da população através de células do partido que funcionavam em quase todas

as empresas do Estado (VIEIRA, 2007, p.:99).

Segundo Vieira (2007), com a proclamação da independência de Angola pelo Movimento

Popular de Libertação de Angola (MPLA), os objectivos imediatos do novo regime consistiram

no fim da herança colonial e na construção imediata de um novo país, com alteração em diversas

áreas da vida social. Como indica Teodoro (1994), o Estado confronta-se com a resolução de três

problemas básicos: a legitimação, o controlo social e a acumulação. Para o caso angolano, estes

problemas relacionavam-se com a questão dos conflitos existentes entre as outras formações

políticas, nomeadamente a UNITA e FNLA.

Vieira (2007) explicita que uma das primeiras medidas a ser implementada a nível nacional

foi o combate ao analfabetismo. Citando os dados do Ministério da Educação publicados na

Revista Novembro (Ano 6, nº 59, 1982), os indicadores revelaram que 85 por cento da população

angolana era analfabeta, muito poucos possuíam qualquer qualificação e só uma minoria possuía

formação profissional.

Na visão de Zau (2002), a nova política educativa procurava, fundamentalmente,

corresponder aos anseios e às necessidades da consolidação da independência. Para Nguluve

(2010, p.55) a organização do sistema de educação do período em causa, ― partiu da necessidade

de mudança do sistema de educação que Angola herdou do Estado colonial, classificado como

ineficiente, limitado e culturalmente voltado para a cultura portuguesa‖.

1.2. Reformulação do Sistema de Ensino na República Popular de Angola

A reformulação do Sistema Educativo em 1975 assenta no que Teodoro (2002) refere como

sendo ―a construção das políticas de educação e de formação é um acto político, no sentido forte

do termo…as políticas de educação e formação expressam o modo como uma sociedade se pensa

a ela própria, se afirma e projecta no futuro. Exprime também, as relações de força numa

sociedade - a dominação socioeconómica e paralelamente a dominação simbólica e cultural.

(TEODORO, 2002, p.14 apud, CHAELOT; BEILLEROT, 1995, p.13)‖.

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Kezita Mamuela Marcos

Vieira (2007, p.103) salienta que algumas referências sugerem que o governo da República

Popular de Angola compreendia ―claramente a importância do sector educativo como essencial

para o desenvolvimento do país e que este constituía um mecanismo para a elevação do nível de

vida das populações‖. É neste quadro que foi promulgada a Lei nº 4/75 de 9 de Dezembro de

1975, um mês à seguir à independência, ―que consagrava a nacionalização do ensino‖ (VIEIRA,

apud, HANDERSON,1990, p.397).

Os objectivos dessa lei ―assentavam no monopólio de todo o ensino vigente e estabelecia

novos princípios‖, formulados da 3ª Reunião Plenária do Comité Central do MPLA, realizado

em Luanda de 23 a 39 de Outubro de 1976, em que foi definido que ―a escola deve ser uma base

revolucionária forte onde se forje o Homem Novo― (VIEIRA, 2007, p.105). Esta lei é marcada

essencialmente pelos princípios de ―igualdade de oportunidades, gratuidade e laicidade do

ensino‖. Princípios que foram aprovados em 1977 e implementados em 1978.

No período entre 1975 a 2001, o sistema educativo é caracterizado essencialmente pela

massificação do ensino: aumento de oportunidades educativas, gratuidade do ensino de base,

obrigatoriedade de frequência das quatro primeiras classes e aperfeiçoamento do pessoal

docente. Os objectivos e os princípios educativos estavam direccionados para a recuperação da

dignidade e unidade do povo angolano (ESPIRITO SANTO, 2000, p.156)29.

O novo sistema educativo tentou reajustar o ensino tendo em atenção as necessidades de um

país independente. Este novo sistema de educação e ensino organizava-se em quatro

subsistemas: ―a) subsistema de Ensino de Base Regular (formação regular), com três níveis de

ensino nomeadamente: Iº nível do ensino de base (comporta quatro anos de escolaridade), IIº

nível 5ª e 6ª classes, IIIº Nível 7ª E 8ª classes. b) Subsistema de Ensino Médio e Pré-

Universitário, c) Subsistema de formação de Adultos, d) Subsistema de Ensino Técnico

Profissional e o Subsistema de Ensino Superior‖ (idem).

Neste novo sistema de ensino, assiste-se a um aumento significativo dos efectivos escolares.

A título de exemplo, em 1876 o ensino em Luanda era exercido por seis professores habilitados

29 Francisca de Espírito Santo, antiga vice-ministra da Educação em Angola, na apresentação dos dados do seu ministério na semana social nacional de 23 a 28 de Novembro de 1999.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

em sete escolas oficiais, em que a população estudantil contava com 153 alunos (Zau, in ―Jornal

de Angola‖ 2011:12). Depois de 1975 este número passa para 1,8 milhões de alunos.

O processo de massificação neste período trouxe consigo algumas consequências, incluindo

―turmas com elevada concentração de crianças; capacidade insuficiente da rede escolar; grandes

complicações no desenvolvimento do processo docente-educativo que se repercutiu no elevado

índice de reprovação; elevada taxa de abandono escolar; ineficácia do sistema educativo,

baixando automaticamente o nível de qualidade; corpo docente com dificuldades acrescidas e

com baixo nível de escolaridade, sem uma Lei geral de escolaridade que definisse regra e

estabelecesse objectivos claros de formação e de desenvolvimento do país‖ (ESPÍRITO SANTO,

2000, p.157)30.

1.3. Caracterização do Sistema Educativo de Angola de 1978/1992

De acordo com Vieira (2007), neste período, a política educativa é marcada fortemente

pelos princípios de ―igualdade de oportunidades no acesso à escola e continuação dos estudos,

um ensino gratuito31 e laicidade do Ensino‖ (VIEIRA, 2007, p.105, apud Ministério da Educação

1997, p.2). Esses princípios ajudaram a transformar a escola. Assim, a mesma passou a ser um

―espaço aberto a todas as comunidades32, deixando de ser monopólio de alguns e passando a ser

a ―Escola do Povo‖, segundo os discursos políticos da época (VIEIRA, 2007, p.106).

Os objectivos do Sistema de Educação e Ensino (VIEIRA, 2007, p.108) visavam:

a) ―Formar as novas gerações e todo o povo trabalhador sob a base da ideologia marxista-

leninista;

b) Desenvolver as capacidades físicas e intelectuais para que todo o povo possa participar na

construção da nova sociedade; 30O período de massificação do ensino de 1980. Neste período Angola assistiu ao colidir do conflito armado que durou 22 anos. 31 Em que os familiares não tinham quaisquer despesas com a educação no ensino obrigatório, incluindo com o material didáctico, que era gratuito (VIEIRA, 2007, p.105). 32 Em Angola existem nove comunidades etnolinguísticas de origem Bantu: a comunidade etnolinguística Bakongo, Ambundu, Ovimbundu, Nhaneka Khumbi, Herero, Lunda Tchokwé, Nganguela, Owambo e Oxindonga. Existem em Angola outras comunidades não Bantu como os Koi e os San, os Vatwas – resultantes de miscigenação entre brancos e negros.

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c) Desenvolver a consciência nacional e o respeito pelos valores tradicionais;

d) Desenvolver o amor ao estudo e o trabalho colectivo e o respeito pelos bens que

constituem a propriedade do povo angolano;

e) Desenvolver a unidade nacional;

f) Garantir o desenvolvimento económico e social e a elevação do nível de vida da

população‖.

Em suma, a reforma educativa implementada em 1978, regeu-se pelo prisma de Estado-nação

e da escolarização das massas, à luz dos princípios do Marxismo-leninismo, revelando uma das

expressões do ―Estado educador‖ (VIEIRA, 2007; NGABA, 2012). Esta é uma política educativa

assente em princípios socialistas. Tal como explicitam os princípios de base para a reformulação

do sistema de educação e ensino na República Popular de Angola: ―a política educativa deve ter

como base de orientação as ideias do programa combativo do MPLA‖ (Ministério da Educação,

1978, p.22).

1.3.1. Organização do Sistema de Educação e Ensino

As referências teóricas facultam um enquadramento à luz do qual é possível interpretar a

organização do Sistema de Educação aprovado em 1977 e em vigor desde 1978, através do

decreto nº 40 /80 de 14 de Maio, em três subsistemas (VIEIRA, 2007; NGLUVE, 2010;

ESPÍRITO SANTO, 2000; INIDE, 2009):

O Subsistema de Ensino Geral

O Subsistema de Ensino Técnico-Profissional

O Subsistema de Ensino Superior

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Tabela 1 - Estrutura do Sistema Educativo implementado em 1978.

Educação Pré-Escolar

Ensino de Base (Regular, Adultos e Especial)

Ensino Médio e Pré-Universitário

Ensino Superior

Creche 1º Nível - 1ª à 4ª classes (obrigatória)

Médio Normal de Educação (9ª à 12ª classes)

Jardim-de-infância 2º Nível -5ª à 6ª classes (Formação Profissional)33

Médio Técnico (9ª à 12ª classes)

1º Nível (Bacharelato de 3 anos)

Iniciação 3.º Nível - 7ª à 8ª classes (Formação Profissional)

Pré-Universitário (9ª à 11ª classes)

2º Nível (Licenciatura, do 4º e 5º Ano)

Fonte: Adaptado de Nguluve, 2010:67.

Relativamente ao modelo organizativo, ―o sector apresentava um modelo de organização e

gestão centralizado. As estruturas funcionavam sob dependência nas províncias, Municípios e

Comunas‖. (ESPÍRITO SANTO, 2000, p.158).

1.3.2. Estatísticas dos Efectivos Escolares

Os efectivos escolares, entre 1990 e 1998 (período que antecede ao contemplado por este

estudo), demonstram uma certa variabilidade nesta população. Entre 1990 e 1992, o quadro não

apresenta uma variação significativa, mas para o ano lectivo de 92/93 denota-se uma descida

significativa porque neste período assiste-se em Angola à transição política, isto é, de mono-

partidarismo ao multipartidarismo, ou seja assistiu-se em Angola ao nascer de uma república

democrática com as primeiras eleições gerais. Posteriormente, com a reabertura de uma guerra

fria entre o MPLA (partido vencedor das primeiras eleições) e a UNITA (partido que perdeu as

primeiras eleições), Angola vivia momentos de instabilidade política, afectando a educação, tal

como outros sectores da vida pública.

33 Junto ao ensino normal, o segundo e o terceiro nível, recebiam formação profissional (para adultos e jovens) (NGULUVE,2010, p.67). São exemplos os cursos de professores, técnicos de Laboratório e Enfermagem

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Kezita Mamuela Marcos

Tabela 2 - População estudantil entre 1990 e 1998

90/91 91/92 92/93 93/94 94/95 95/96 96/97 97/98

Iniciação 164141 188710 109917 168675 100778 109265 ? 157493

I Nível 990155 989443 697486 907480 966622 835760 ? 853658

II Nível 124873 147047 107412 132496 131278 129879 ? 132336

III Nível 34626 42290 41339 50077 61025 63002 ? 69797

Total 1313795 1367490 956154 1258728 1259703 1137906 ? 1213284

Fonte: Conjimbi, 2000:173

Os dois primeiros anos lectivos apresentam-se estáveis, enquanto que no ano de

1992/1993 o número de população estudantil tende a baixar. Voltando acrescer o número de

alunos até 94/95 e regredindo em 1996. Em 97/98 apresenta um relativo crescimento.

Tabela 3 - Ensino Médio

Ano Curso 9ª 10ª 11ª 12ª Total/curso TOTAL/geral

90-91 Técnico-

Pedagógico

5045

3516

2879

2560

1973

1892

1037

1408

10934

9376

20310

91-92 Técnico-

Pedagógico

4589

3524

4169

2978

2367

2509

?

1716

11125

10727

21852

92-93 Técnico

Pedagógico

2588

1212

2541

851

1630

646

904

602

7663

3317

10980

93-94 Técnico

Pedagógico

5828

3761

3565

1582

2217

1346

1385

1190

12995

7879

20874

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

94-95 Técnico

Pedagógico

5983

4050

4111

2062

3780

1499

1868

985

15742

8596

24338

1996 Técnico

Pedagógico

7134

7168

5555

4705

3403

2284

2342

1667

18434

15842

34276

97/98 Técnico

Pedagógico

9640

5924

6510

3851

4578

2785

2719

1660

23447

14220

37667

Fonte: Conjimbi, 2000:180.

Verifica-se algum crescimento nos anos lectivos de 1994 a 1996. Este crescimento foi

influenciado pelo aumento da rede escolar do Ensino Médio (Normal de formação de

professores) por todas as províncias de Angola (Conjimbi, 2000:181)

Tabela 4 - Ensino Superior (1997/98)

Faculdade Homens Mulheres Total %

Ciências 397 268 665 8.4

Ciências Agrárias 190 110 300 3.8

Direito 589 302 891 11.3

Economia 670 445 1115 14.1

Engenharia 486 135 821 7.8

Medicina 242 262 506 6.4

ISCED* 2241 1577 3818 48.2

Benguela 327 219 546 6.9

Huambo 381 248 629 7.9

Luanda 891 814 1705 21.5

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Huíla 642 296 938 11.8

Total 4817 3099 7816 100.0

Fonte: Canjimbi, 2000:184.

Instituto Superior de Ciências da Educação

No período de 1997/1998, Angola tinha apenas uma universidade estatal (Universidade

Agostinho Neto) com sete faculdades aglomeradas: Ciências, Ciências Agrárias, Direito,

Economia, Engenharia, e Medicina. Luanda alberga o maior número de faculdades existentes em

Angola. O mesmo período regista um reduzido número de efectivos escolares, ou seja, um rácio

muito baixo de alunos na universidade.

Do Fracasso à Tentativa de Edificação de Sistema Educativo Eficiente Rumo à Modernização do Ensino em Angola

O fracasso da primeira Reforma Educativa teve a ver, em primeiro lugar, com o conflito

armado; as consequências desse conflito para a educação vão desde destruição de infra-estruturas

escolares a uma grande instabilidade vivida pela população. Em segundo lugar, teve a ver com a

capacidade limitada do Sistema Educativo em encontrar respostas para resolver a questão

referente à elevada concentração de crianças numa só turma (o número variava entre 60/70

crianças por sala de aula). Outros dos problemas que causaram o insucesso da Reforma

Educativa foram: ―a rede escolar não conseguir cobrir todas as necessidades educativas; uma

elevada taxa de reprovação; uma elevada percentagem de abandono escolar; um corpo docente

de baixo nível académico; um fraco investimento no sector educativo, sem uma Lei Geral de

escolaridade que estabelecesse as regras e estabelecesse objectivos claros de formação e de

desenvolvimento do país‖ (SANTO, 2000, p.157). O Sistema Educativo com todos esses défices

fracassou e tornou-se ineficaz, baixando consideravelmente de qualidade.

A segunda Reforma Educativa, segundo o Ministério da Educação e Cultura (2001), surge no

âmbito de um diagnóstico feito pelo Ministério da Educação, do sistema educativo em todos os

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

seus subsistemas de ensino, no sentido de ―formular medidas e acções estratégicas no âmbito da

estratégia global para saída da crise adoptada pelo governo de Angola em 1999‖ (2001, p.9).

O diagnóstico em causa chegou às seguintes conclusões (Ministério da Educação e Cultura,

2004, 107):

―Uma taxa de escolarização muito baixa (55% no Iº Nível,1 6,5% no IIº e IIIº Níveis,

5% no ensino Médio e 0,7% no ensino Superior);

Elevadas taxas de abandono escolar superior em média de 30%;34

Baixa taxa de promoção35, 52% no ensino de Base Regular;

Elevadas taxas de Reprovação, superior a 35% ―.

Segundo o mesmo organismo, a ineficácia do Sistema de Ensino tornou-se evidente

devido à baixa qualidade de ensino e à inadequação entre o nível de investimentos feitos no

sector e as necessidades reais do sistema.

É com base nos pressupostos acima referidos que se criou a Lei nº 13/01, de 31 de

Dezembro. Com base no documento em causa pode deduzir-se que a actual reforma nasce da

transição da economia de orientação socialista para uma economia de mercado. Neste sentido, a

Assembleia Nacional aprovou a referida lei com o objectivo central de ―preparar o indivíduo

para as exigências da vida política, económica e social do país, rumo à modernização de

Angola‖.

Como indica Afonso (1998), as ―reformas são projectos mais circunscritos que têm em

vista renovar, melhorar ou redireccionar as instituições educativas sem preocupação de promover

mudanças radicais‖.

34 O referido diagnóstico não indica o nível de ensino. Aborda o assunto de forma geral a todos os subsistemas e níveis de ensino. 35 Trata-se da desvantagem que as raparigas têm em relação aos rapazes no acesso à escola. Em cada 100 alunos matriculados, 54 são rapazes e 46 são raparigas (Ministério da Educação e Cultura, 2001:29).

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O Sistema Educativo Angolano a partir do ano 2004

A Lei nº 13/01 de Bases do Sistema Educativo constitui o fundamento principal das

actividades da reforma em curso em Angola. Entender a mesma significa compreender as

alterações feitas em todos os níveis de ensino, não deixando de lado as mudanças efectuadas nos

conteúdos de ensino, currículos e reorganização do corpo docente.

Segundo a Lei de Bases do Sistema Educativo, no seu Capítulo III, organização do Sistema

de Educação, Secção I, ART.10 Estrutura do Sistema de Educação, a educação realiza-se através

de um sistema unificado, constituído pelos seguintes subsistemas de ensino(Lei de Base do

Sistema de Educação, 2001, p.5):

a) Subsistema de educação pré-escolar;

b) Subsistema de ensino geral;

c) Subsistema de ensino técnico-profissional;

d) Subsistema de formação de professores;

e) Subsistema de educação de adultos;

f) Subsistema de ensino superior.

O Sistema de educação em referência estrutura-se em três níveis (idem, 2001:5):

a) Ensino Primário

b) Ensino Secundário

c) Ensino Superior.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Tabela 5 - Estrutura do Sistema Educativo implementado em 2004.

Educação Pré-Escolar

Ensino primário (Ensino geral, Educação regular e de adultos)

Ensino secundário Ensino Superior

Creche 1º Nível -1ª à 6ª Classe (unificado e obrigatória)

1º Ciclo de formação básica 7.ª a 9ª. Classe

Graduação (Bacharelato inclui 3 anos)

Jardim-de-infância

Ensino geral Educação regular e de adultos vai da 7.ª a 9.ª

(Licenciatura, do 4º e 6º Ano)

Iniciação Formação profissional básica Vai igualmente da 7.ª a 9.ª classe

Mestrado 2 a 3 anos

2º Ciclo Formação média normal 10.ª a 13.ª

Doutoramento 5 Anos

Ensino geral Educação regular de adultos 10.ª a 12.ª

Formação média técnica 10.ª a 13.ª

Fonte: Adaptado do Diário da República série nº 6 de 14 de Janeiro de 2005.

O novo organigrama engloba também a Educação extra-escolar, a Educação especial e a

Educação à distância. As alterações efectuadas pela reforma em curso residem na requalificação

do ensino secundário, dividido em dois ciclos, de quatro classes a seis classes passa o ensino

primário; ou seja, a obrigatoriedade do ensino passa a ser de seis anos de escolaridade. Este

prolongamento permitiu alterar a carreira docente para o ensino primário.

Relativamente à 5.ª e 6.ª classes, onde as disciplinas anteriormente eram leccionadas por

vários professores, tendo sempre em atenção a formação profissional do docente, passam a ser

leccionadas apenas por um docente – mono-docência.

Para o ensino superior, a novidade reside nos graus de mestrado e doutoramento. Outros

dados chamam também a nossa atenção nesta reforma, concretamente a expansão da rede escolar

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e expansão universitária, que passa de uma a sete universidades públicas, transformadas em sete

regiões académicas respectivamente36.

Segundo o relatório social da Universidade Católica (universidade privada) de 2012, o

número de alunos no ensino superior público em 2011 é de 61,625, correspondendo a 52,75 por

cento do universo total da população estudantil universitária do país cifrada em 116.805

estudantes universitários (Relatório Social da Universidade Católica, 2012:101).

Tabela 6 - Alunos por níveis de ensino entre 2002-2008

Níveis 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Alfabetização 321.000 404.000 323.470 334.220 366.200 389.637 502.350

Iniciação 278.347 537.378 678.780 895.245 842.361 938.389 893.661

Primário 1.733.549 2.492.274 3.022.461 3.119.184 3.370.079 3.558.605 3.757.677

Iº Ciclo Secundário

115.47 164.654 197.735 233.698 270.662 316.664 370.485

IIº Ciclo Secundário

109.62 117.853 159.341 171.882 179.249 194.933 212.347

Geral 24.283 26.030 30.397 34.442 37.676 41.945 46.698

Técnico Profissional

53.018 56.833 67.328 74.235 76.363 85.903 96.635

Formação profissional

32.461 34.990 61.616 63.185 65.210 67.085 69.014

Total 2.558.136 3.716.159 4.381.787 4.754.129 5.028.551 5.398.228 5.736.520

Fonte: Ministério da Educação, Reflexões sobre a evolução do Sistema de Educação de Angola ao longo

dos 35 anos de Independência, 2010:10.

36As regiões académicas são: 11 de Novembro, KimpaVita, Agostinho Neto, José Eduardo dos Santos, Katiavala Buila, LuijiA´Konde e Mandumeya Ndemufayo. Em suma a rede pública tem sete universidades e dezanove instituições autónomas.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Centrando a abordagem ao objecto de estudo desta pesquisa, constata-se que para o

ensino primário o número de efectivos passou de 1,8 milhões de alunos em 2002, para 3,8

milhões de alunos em 2008.

Em suma, assiste-se a um crescimento da população de alunos do ensino primário acima

dos 100 por cento, o que demonstra um aumento progressivo da capacidade de absorção das

crianças em idade escolar obrigatória. Importa referir que este crescimento deve-se, por um lado,

à estabilidade política (paz efectiva em Angola em 2002), e, por outro, ao aumento, em termos

físicos, das salas de aulas em todo território nacional.

Os dados acima indicam uma explosão dos efectivos escolares numa taxa média de

crescimento anual de 15,18 por cento, taxa acumulada de 91,07 por cento e taxa de crescimento

de 124.25 por cento no período analisado (Ministério da Educação, 2010, p.11).

Para o ano de 2011, o ensino primário registou 4.875.868 matrículas, correspondendo

81,9 por cento ao conjunto de alunos matriculados nos três subsistemas da educação nacional.

Para este ano a taxa bruta de escolaridade, no ensino primário a nível nacional é de 140,5 por

cento (Relatório Social da Universidade Católica, 2012:93).

2.Procedimentos Metodológicos

Para alcançar os objectivos propostos foi efectuada uma abordagem essencialmente qualitativa. Quando se envolve uma abordagem deste tipo, tenta-se entender, ou interpretar, os fenómenos em termos dos significados que as pessoas lhes conferem (DENZIN; LINCOLN, et all, 2006, p. 17).

Neste caso, trata-se de um estudo exploratório de análise das políticas educativas num contexto nacional particular, com um enfoque reforçado sobre as percepções dos professores sobre o processo de reforma educativa em Angola.

Para recolha de dados, recorreu-se à entrevista semiestruturada, aplicada a partir de um pequeno número de perguntas abertas (HAGUETTE, 2003, p.89, apud THIOLLENT, 1980, p.35). Para tal, construiu-se um guião de entrevista, baseado nos objectivos do estudo que foram traduzidos em questões e que serviram de suporte para a definição de dimensões para a análise de conteúdo das mesmas.

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Assim, a entrevista foi estruturada em duas partes: uma relativa às características pessoais e profissionais dos docentes e a segunda referente às percepções do processo de reforma em curso.

Relativamente ao tratamento e análise das entrevistas, foi possível construir três tipos de perfis de professores face às suas percepções sobre a reforma educativa em Angola a partir da análise de conteúdo: os voluntaristas, os indefinidos e os críticos.

As entrevistas foram realizadas entre Agosto e Outubro de 2012 com autorização prévia dos directores das escolas e com respectiva marcação do dia e hora das mesmas. Importante será referir que o período de realização das entrevistas coincidiu com o período eleitoral em Angola.

Complementarmente, foram utilizados, para uma análise mais de tipo extensivo, informação institucional para a caracterização do sistema educativo angolano e da sua população inscrita.

Tabela 7–Dimensões de análise segundo as questões que servem de base ás entrevistas.

Dimensões Questões 1 O papel da escola no desenvolvimento de Angola

Como vê o papel da escola, nos últimos anos, para o desenvolvimento de Angola?

2. Passagem para um regime de mono-docência

Como você vê a mudança do professor (a) de pluri-docente para mono-docente?

3. Ensino unificado em seis classes e em regime de mono-docência

O que você pensa do ensino unificado?

4. Expectativas escolares dos alunos em relação ao ensino unificado

Quais julga ser as expectativas dos alunos em relação a este ensino unificado?

5. Adaptação e dificuldades face a nova realidade profissional

Do seu ponto de vista os professores estão a adaptar-se a esta nova realidade profissional? E quais são a maiores dificuldades que os professores enfrentam?

6. Estratégias da escola em relação aos professores sem formação pedagógica

Que estratégia a sua escola utiliza face a reforma curricular no ensino unificado, para aqueles professores que não possuem formação académica para o ensino unificado?

Foram entrevistados 16 professores que leccionavam a 5ª e 6ª classe e 4 diretores de escolas, perfazendo assim, um total de 20 entrevistas. A decisão de entrevistar só professores que leccionam a 5ª e a 6ª classes foi por se ter constatado in locu que é um dos grupos em que foi mais notório algumas das transformações profissionais na sequência do que processo de reforma educativa em curso em Angola.

As entrevistas foram realizadas em 12 escolas do ensino primário da província de Luanda, distribuídas por 6 municípios (KilambaKiaxi, Maianga, Samba, Cazenga, Viana e

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Ingombota). Esta distribuição permitiu investigar o objecto de estudo numa boa parte da extensão da província de Luanda. Os únicos municípios que não estão incluídos no presente estudo são Sambizanga, Cacuaco e Rangel.

A caracterização dos 16 professores que constituem a amostra dos inquiridos fez-se a partir das seguintes variáveis: sexo, idade, tempo de serviço, habilitação académica e situação profissional.

Tabela 8 - Caracterização da amostra.

Sexo

Feminino 06

Masculino 10

Idade

Menos de 30 05

De 30 a anos 45 08

Mais de 45 anos 03

Tempo de serviço

1-10 anos 10

11-20 anos 02

Mais de 21 anos 04

Habilitações Académicas

Licenciatura 02

Frequência da licenciatura 04

Secundário 09

Frequência do secundário 01

Situação profissional Quadro de nomeações definitiva 16

Através da análise do quadro referente à caracterização constata-se que dos 16 professores entrevistados, 6 são do sexo feminino e 10 do sexo masculino. De igual forma, a maioria dos entrevistados têm mais de 30 anos de idade (11), sendo que 5 têm menos de 30 anos e 3 mais de 45 anos de idade.

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Quanto ao tempo de serviço, 10 professores possuem de até 10 anos de serviço, enquanto 4 têm mais de 21 anos, e apenas 2 possuem de 11 a 20 anos de tempo de serviço.

A maioria dos entrevistados possui o ensino secundário (9); apenas 1 frequenta o mesmo; 4 frequentam a licenciatura e 2 detêm licenciatura.

Quanto à situação profissional, todos (16) pertencem ao quadro de nomeações definitivas. Em suma, é uma amostra onde predomina o sexo masculino e em que na sua maioria têm o ensino secundário e uma situação estabilizada do ponto de vista do vínculo ao ensino.

Relativamente aos directores de escolas, 2 são do sexo masculino e 2 do sexo feminino, todos têm mais de 30 anos e detêm licenciatura.

Quanto ao tempo de serviço a maioria (3) tem mais de 21 anos de trabalho; tendo apenas 1 deles 10 anos de tempo de serviço.

Numa investigação os dados recolhidos necessitam de ser organizados e analisados de acordo com as dimensões anteriormente traçadas. Para o efeito, recorreu-se à análise de conteúdo. Esta técnica constitui um recurso eficaz para a sistematização da informação recolhida e criação de perfis. Uma vez transcritas as entrevistas, procedeu-se ao tratamento dos dados e organização dos perfis com que apresentam maior relação.

3. Percepção dos professores sobre o processo da última reforma

No presente capítulo proceder-se-á à apresentação e discussão dos resultados obtidos tendo por base a informação recolhida através do instrumento utilizado para recolha de dados na investigação. Os resultados obtidos permitiram encontrar três tipos de perfis de professores os voluntaristas, indefinidos e críticos. As características predominantes dos perfis: os voluntaristas são todos do sexo masculino e têm mais de 30 anos; para os indefinidos, predomina o sexo masculino num total de 5, sendo 4 do sexo feminino, são 5 os inquiridos com mais de 35 anos, sendo 4 com menos de 30 anos, pode-se considerar um perfil heterogéneo na sua composição; para os críticos é predominante o sexo feminino (total de 2), sendo apenas 1 do sexo masculino e por sinal o mais jovem com menos de trinta anos. Estes perfis foram construídos a partir de uma análise categorial das percepções dos professores da 5ª e 6ª classes sobre o processo de reforma educativa em curso em Angola. Importa referir, que as diferenças entre os perfis são ténues e que a maior parte tem uma posição pouco mobilizada em relação aos processos de reforma que terminou em 2015.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Tabela 8 – Grelha Relativa às Características dos Entrevistados nas Categorias de Professores de Escolas em Luanda.

Idade Sexo Nível de escolaridade

Classe que lecciona

Disciplinas Município Tempo se serviço

E1 52 M Secundário 5ª classe Todas Kilamba Kiaxi 32 Anos

E2 38 M Secundário 6ª classe Todas Kilamba Kiaxi 17 Anos

E3 23 M Superior 5ª classe Todas Maianga 2 Anos

E4 30 M Superior 5ª Classe Todas Samba 7 Anos

E5 33 M Superior 6ª Classe Todas Cazenga 8 Anos

E6 45 F Superior 6ª Classe Todas Viana 15 Anos

E7 46 M Secundário 6ª Classe Todas Ingombota 24 Anos

E8 26 M Superior 6ª Classe Matemática Samba 6 Anos

E9 54 F Secundário 5ª Classe Todas Ingombota 35 Anos

E10 43 M Secundário 5ª Classe Todas Maianga 23 Anos

E11 37 F Superior 6ª Classe Todas Ingombota 8 Anos

E12 36 F Secundário 6ª Classe Todas Ingombota 3 Anos

E13 26 F Secundário 5ª Classe Todas Samba 4 Anos

E14 26 M Secundário 6ª Classe Todas Samba 8 Anos

E15 39 F Secundário 6ª Classe Todas Samba 8 Anos

E16 26 M Secundário 6ª Classe Todas Viana 5 Anos

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Tabela 9 - Perfis sobre as percepções dos professores sobre o processo de reforma educativa.

Perfis de relação e percepção sobre a reforma

Voluntaristas (E1,E2,E4,E5,)

Indefinidos (E6,E7,E8,E10,E12,E13,E14,E15,E16)

Críticos (E3,E9,E11,)

A importância da escola no desenvolvimento de Angola

Positiva, sobretudo para a qualificação das pessoas

Sublinha a importância da diminuição do analfabetismo

Baseia-se na ideia de um declínio, porque há mais crianças que não sabem ler nem escrever

A passagem à mono-docência

É mais trabalhoso, exige mais qualificação do professor, face as inúmeras disciplinas que lecciona

Há muita dificuldade, sobre tudo em disciplinas onde é necessário um maior nível especialização. Os professores não possuem requisitos para leccionar todas as disciplinas

Há uma obrigatoriedade em dar disciplinas cujo professor não encontra-se em condições de leccionar.

Ensino unificado

Um sistema de ensino unificado passa necessariamente pela formação e preparação do capital humano

Existência de muitas dúvidas sobre o ensino unificado, apesar de algumas vantagens deste ensino

Há variedade de opiniões: para um deveria ser como no anterior sistema educativo, para outro o importante é que o aluno aprenda e para o último só os professores não especializados é que apresentam queixas

Expectativas escolares dos alunos

Desconhecimento total das expectativas dos alunos

Desconhecimento total das expectativas dos alunos

Desconhecimento total das expectativas dos alunos

Adaptação e dificuldades face á nova realidade profissional

Os professores estão a adaptar-se. As dificuldades estão nas disciplinas de Educação Manual e Plástica, Educação Física, Educação Musical, matemática e também dos meios de ensino

A adaptação está a ser lenta. As dificuldades estão: disciplinas de Educação Manual e Plástica, Educação Física, Educação Musical, matemática, Língua Portuguesa e também dos meios de ensino

Os professores não estão adaptar-se. Os professores são incentivados a procurar outros professores com mais capacidade para transmissão dos conteúdos. Disciplinas de Educação Manual e Plástica, Educação Física, Educação Musical, matemática e também dos meios de ensino

Estratégias da escola

Seminários de capacitação

Seminários de capacitação Seminários de capacitação

O papel da escola, nos últimos anos, para o desenvolvimento de Angola

Relativamente aos professores, é evidenciada uma certa ambiguidade em relação ao que é a importância da escola para o desenvolvimento, em geral, e para Angola, em particular. Através das suas declarações, os professores parecem não reflectir ou discutir sobre o que é a escola, que escola querem, qual o papel do professor para a melhoria da própria escola. A educação aparece

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

sempre ligada às políticas que o próprio Estado traça para ela. Os professores apresentam-se mais como espectadores e cumpridores das medidas tomadas pelo Estado.

Dentro dos perfis traçados, os voluntaristas respondem que tem sido positivo o papel da escola no desenvolvimento de Angola, mas no entanto não indicam muitos argumentos que justifiquem essa posição, como se observa nos seguintes trechos:

- ―O papel da escola nos últimos anos deu um desenvolvimento satisfatório (E2).‖

- ―A escola tem desempenhado um papel fundamental, visto que tem a responsabilidade de formar os quadros desde a base até ao topo. Acho que houve melhorias, antes havia poucas escolas, o acesso era limitado agora com mais escolas as pessoas têm mais acesso, houve mudanças, não só a nível do currículo, mas também a nível do Ministério, construíram-se mais escolas, reformou-se o ensino tem caminhado a bons passos apesar das dificuldades (E4) ‖;

- ―A escola tem uma função principal, é através da instrução que nós vamos capacitar as pessoas para fazerem de Angola um país Desenvolvido (E5) ‖.

Denota-se, que nos indefinidos, a escola se baseia na diminuição do analfabetismo e

como um lugar de integração que anteriormente não era possível:

- ―A escola hoje desempenha um grande papel, procura hoje suprir, o analfabetismo que era de maior dimensão no nosso país” (E7).

- ―Nos últimos anos a escola tem desempenhado um papel decisivo na capacitação, formação, bem como na integração das pessoas na sociedade angolana. Portanto hoje vimos também que o índice de analfabetismo vai baixando fruto daquilo que tem sido os investimentos no âmbito da educação que o nosso Estado tem oferecido aos professores‖(E8).

- ―Nestes últimos anos a escola desempenha um papel fundamental, apesar de varias dificuldades que tem e enfrentado, penso que tem estado a lutar bastante no sentido de estancar as dificuldades que as pessoas têm principalmente da camada juvenil, de uma certa forma tem contribuído para acabar com índice alto de analfabetismo” (E14).

- ―É muito importante, porque a escola é o lugar onde cada um vem buscar as ferramentas para inserir-se na sociedade” (E10).

No fundo, a escola para os indefinidos é um espaço que serve para capacitar, formar, e

integrar os indivíduos na sociedade.

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Quanto ao ponto de vista por parte dos críticos, o papel da escola está em declínio. A

reforma em curso permite que haja transição automática de uma classe para a outra, sem se

importar no entanto com grau de conhecimento ou de competências que o aluno deve adquirir

nas várias matérias do plano curricular em que se encontra. Segundo os entrevistados a passagem

automática prejudica em grande medida o próprio aluno.

- ―Tenho notado uma certa dificuldade por parte dos alunos, visto que os estudantes da 4ªclasse que apresentam dificuldades no acto de leitura, não sabem escrever, isso no tempo que fiz a 4ªclasse não se admitia (…) da 1ª,3ª e 5ªclasses são classes de transição e 2ª, 4ª e 6ªclasses são classes de reprovação, isso por mim contribui mais para o índice de crianças que não sabem ler nem escrever, o nome disso é reforma, por mim teria outro nome: deforma - os alunos em vez de aprender prejudica mais os alunos (…) O aluno que não sabe ler nem escrever está na 1ªclasse passa automaticamente para 2ªclasse, já na 2ªclasse se temos 30 alunos que não saibam ler, e 20 saibam ler, na 2ªclasse os 30 não vão reprovar, passam 20 e 10 ou 5, aqueles também vão para 3ªclasse de transição automática, vão ter que passar mesmo não sabendo ler nem escrever, na 4ªclasse, nem todos vão reprovar vão ter que passar alguns e reprovar outros. Então na 5ª classe eles passam automaticamente, quer dizer o ensino para mim mesmo, vejo que em vez de melhorar, está mesmo a declinar; tem casos até de alunos que saem do ensino primário com dificuldades de ler e escrever e isso o ensino em vez de melhorar está a piorar (…)‖ (E3).

- ―Houve muitas transformações, o aluno do antigamente não é o aluno de hoje, o professor da antigamente não é o professor de agora. Ainda precisa trabalhar mais, para aquilo que se precisa para Angola. Os valores precisam ser reconstruídos novamente, hoje vimos que muita gente perdeu os valores, nesse sentido não haverá um bom ensino porque os valores têm que estar ligados ao ensino” (E9).

A partir das declarações acima citadas, denota-se que há representação de transformação

da escola de hoje em Angola em dois sentidos: em primeiro lugar, tem a ver com a qualidade do

aluno que a escola forma e em segundo lugar tem a ver com os valores que a própria escola

veicula. Podemos deduzir que a escola não tem conseguido desenvolver competências de forma

sustentada nos alunos e o seu exercício de cidadania. Embora devesse, porque se trata de

objectivos específicos do ensino primário segundo a Lei de Base nº 13 de 2001:

a) Desenvolver e aperfeiçoar o domínio da comunicação e da expressão;

b) Aperfeiçoar hábitos e atitudes tendentes a socialização;

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

c) Proporcionar conhecimentos e capacidades de desenvolvimento das faculdades mentais;

d) Estimular o espírito estético com vista ao desenvolvimento da criação artística;

e) Garantir a prática sistemática de educação física e de actividades gimnodesportivas para o

aperfeiçoamento das habilidades psicomotoras

O cumprimento desses objectivos pressupõe um corpo docente forte, capaz de operacionalizar tais objectivos. Em suma, o papel da escola para o desenvolvimento de Angola deve ser da responsabilidade de todos os agentes que participam no processo educativo. Só assim é possível falar em mudanças significativas.

A passagem do professor(a) de pluri-docente para mono-docente

Entende-se por mono-docência o regime de ensino em que um professor assegura todas

as áreas curriculares. Se a Lei de Bases, na subsecção II - Definição e Objectivos do Ensino

Primário Art. 17º, refere que o ensino primário é unificado por seis classes, (respeitantes aos

primeiros seis anos de escolaridade), constituindo a base do ensino geral, tanto para a educação

regular como a educação de adultos e é o ponto de partida para os estudos a nível secundário. As

dúvidas e omissões que a Lei de Bases tem suscitado são resolvidas pela Assembleia Nacional.

Ou seja, não existe nenhum artigo na Lei nº 13/01 que explica a funcionalidade da mono-

docência.

O regime de mono-docência no ensino primário sempre existiu, mas só nas primeiras

quatro classes. Ou seja da 1ª à 4ª classes a mono-docência existiu desde 1961 com os chamados

monitores escolares (não professores)37 (ZAU, 2012, p.143); e esses monitores possuíam

habilitações literárias até à 4ª classe e uma formação pedagógica básica. Os mesmos conseguiam

seguir à risca o programa, ensinando ainda canções escolares e jogos que faziam parte das

disciplinas de Música e Educação Física. No entanto, as políticas educativas actuais existentes

37 Sem nenhuma qualificação.

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Jul/Dez 2017 | 119

Kezita Mamuela Marcos

em Angola são fortemente influenciadas por organismos internacionais e imprimiram outro tipo

de exigência aos processos educativos 38

O centro da discussão em causa é o regime de mono-docência na 5ª e 6ª classes, que no

sistema educativo anterior faziam parte do segundo nível de ensino. Segundo os nossos

entrevistados tanto os voluntaristas, os indefinidos e os críticos, dizem que é muito difícil a

aplicação do regime de mono-docência devido ao número de disciplinas e às especializações que

cada um possui para leccionar até ao sexto ano. Tendo por base as suas declarações, conclui-se

que é necessária mais qualificação para o próprio professor, porque o nível de ensino assim o

exige.

- ―Também essa da mono-docência, há professores que não estão aptos para dar todas cadeiras e dão, há outros que têm outras formações como electricidade, informática, mas vêem-se a dar aulas no ensino primário. E isso assusta-me quando vejo professores que não têm formação pedagógica a darem aulas As pessoas que não têm capacidade para darem todas disciplinas, que exigem pessoas capacitadas como é o caso da Educação Musical, Educação Manual Plástica. Temos exemplos de professores, isso também é o meu caso, que não têm capacidade de dar a Educação Musical, somos obrigados a dar só os conceitos aos alunos e eles vão se virando como podem. E isso prejudica Educação Musical, também é arte. Tinha-se que ensinar com qualidade nos nossos estudantes. Se eu não tenho capacidade de dar essas disciplinas, vou tentando dar a disciplina á minha maneira, então quando estou a dar também à minha maneira em parte estou a prejudicar aos alunos. Por isso eu defendo que tem que se pôr as pessoas nos lugares certos. Então, essas disciplinas como Educação Musical e Educação Manual e Plástica no meu ponto de vista, deviam ter pessoas especializadas para dar essas disciplinas”. (E3)‖ Entrevistado crítico

- ―É um trabalho árduo que exige muita paciência do próprio professor, mono-docência requer que o professor dê todas as disciplinas, embora em algumas disciplinas exige pessoal especializado. São os casos das disciplinas de Educação Manual Plástica e Educação Física, é um trabalho árduo que exige muita paciência do próprio professor. A mono-docência é cansativa mesmo” (E4). Entrevistado voluntarista

- ―Eu considero uma mudança brusca (…), com a mudança da pluri-docência para mono-docência, com a extensão do ensino primeiro da iniciação até a 6ª classe, agora temos um professor para todas as disciplinas. É importante salientar que a partir da 5ª e 6ª classe os conteúdos são mais fortes, os

38 A pesquisa desenvolvida por Ngaba (2012:248) concluiu que Angola aderiu a modelos e padrões internacionais como a UNESCO e a UNICEF, e também a CPLP, onde Portugal ocupa um lugar hegemónico.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

professores têm encarado muitas dificuldades porque muitos deles não dominam os conteúdos principalmente de Matemática e de Língua Portuguesa, então é caso para dizer há muitas dificuldades‖(E5). Entrevistado voluntarista

- ―Tem vantagens e desvantagens. Tem vantagens para o aluno, que começa da 1ª até a 6ª classe com o mesmo professor. Lá o aluno conhece algumas debilidades do professor, sabe aquilo que o professor quer e aquilo que não quer mas para o professor é desvantajoso porque tem muito trabalho e nem sempre o professor está capacitado para dar as disciplinas todas” (E6). Entrevistado indefinido

- ―Não a vejo com bons olhos, na medida que sempre existiu a questão da especialização. Nos últimos anos não foram formados docentes da transição pluri-docência para mono-docência. Neste novo sistema não há professorescapacitados para leccionar todas disciplinas. Há professores que só dominam a Matemática, não dominam a Língua Portuguesa, aqueles que só dominam Ciências e não dominam a Matemática, História. Em função disso dever-se-ia antecipadamente, formar docentes de modo que não teríamos lacunas que hoje estamos a verificar. As escolas principalmente as estatais estão a primar muito pela essa mono-docência e os nossos educando estão a ser completamente atropelados daquilo que é a formação como tal” (E8). Entrevistado indefinido

Deste modo, é legítimo afirmar que os professores que leccionam nesse nível de ensino

devem ou deveriam possuir algumas competências tais como: ―Organizar e animar situações de

aprendizagem, administrar a progressão das aprendizagens, conceber e fazer evoluir dispositivos

de diferenciação e comprometer os alunos com a sua aprendizagem e seu trabalho, trabalhar em

equipa, participar na gestão da escola, informar e inserir os pais, usar tecnologia, enfrentar os

deveres e os dilemas éticos da profissão administrar sua própria formação continuada‖

(PERRENOUD,1999, p.16). Em suma, verifica-se que para leccionar todas as áreas curriculares

da 5ª e 6ª classes é necessário um leque de competências que por vezes os professores não detêm,

o que faz com estes tenham as suas capacidades de ensino limitadas, factor que está intimamente

ligado à questão das especializações dos professores, visto que para leccionar as classes em

causa exige-se maior conhecimento de conteúdos e metodologias de ensino.

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Ensino unificado

No novo sistema educativo, através do decreto-lei nº 13/01, o ensino primário foi

estabelecido em seis classes em regime de mono-docência. Sobre o ensino unificado, os

voluntaristas afirmam que este regime pode ser subsidiário de boas ideias, mas é exigente no que

respeita à formação do capital humano.

- “As ideias são boas, enquadrar todas essas classes num só nível, mas tudo isso passa por uma preparação dos técnicos, dos quadros. É necessário que as pessoas que trabalham neste sistema de ensino unificado dominem, aquilo que vão ensinar, que tenham formação suficiente, capacidade, competências acima de tudo para poder lidar com o ensino unificado. Porque não é fácil…”(E5).

Quanto aos indefinidos, estes referem ter muitas dúvidas sobre este ensino e dizem existir algumas vantagens.

- ―Tem vantagens e algumas desvantagens, é como considerar uma faca de dois gumes. Há alguns professores com capacidade de leccionar neste ensino unificado e há outros que não estão capacitados para o efeito. Uma das vantagens deste ensino é que já se consegue pôr os alunos a estudar informática que anteriormente não existia. Há maiores vantagens porque a criança está mais tempo” (E7).

- ―Olho com algumas reticências, em função de algumas políticas que foram implementadas no âmbito daquilo que é a própria mono-docência. Por exemplo a questão de transição automática, onde o aluno sabendo ou não passa, já são algumas debilidades. Hoje temos alunos da 6ª classe que não sabem escrever em condições, questões que em outros momentos não aconteciam. São questões que deveriam ser revistas” (E8).

- ―Tem vantagem e desvantagem, um professor não domina todas as disciplinas, as vezes têm-se mais habilidades para umas e para outras não. Por isso a unificação esta um pouco duvidosa no meu ver ―(E10).

Mesmo dentro do perfil dos indefinidos, em relação a esta matéria, há quem tenha uma

posição bem definida de oposição a esta medida. Como se vê no seguinte trecho:

- ―Na minha opinião não deveria existir. Seria da 1ª até a 4ª classe, conforme estava anteriormente, porque como já disse é muito trabalhoso e o professor não está capacitado para dar até a 6ª classe como exige a reforma educativa” (E6).

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

Em relação aos críticos deparamo-nos com três tipos de críticas: enquanto um dos entrevistados afirma que as 5ª e 6ª classe deveriam ser como no sistema educativo anterior, faziam parte do IIº nível do subsistema de ensino de base regular, o segundo afirma que os professores não especializados são os que mais se queixam do ensino unificado e o terceiro afirma que o importante é que o aluno tenha bases.

- ―Não tenho muito a dizer sobre o ensino unificado. Na minha opinião a 5ª e 6ª classe deveriam ser mesmo outro ciclo” (E3).

- ―Os professores não especializados queixam-se disso…‖ (E11).

-― A junção dessas classes não influi em nada. O que se pretende é a preparação do aluno tem que ter base‖ (E9)

Em linhas gerais, as opiniões sobre o ensino unificado não são tão críticas como face à

mono-docência, apesar disso ser variável dependendo do perfil.

As expectativas escolares dos alunos em relação ao ensino unificado

Relativamente às expectativas dos alunos face ao ensino unificado, todos declararam

desconhecimento total sobre as expectativas dos alunos em relação ao ensino unificado. A

análise das respostas permitiu concluir que os nossos entrevistados não atribuem grande

importância à participação dos alunos no processo pedagógico, talvez por considerarem que são

um elemento passivo das práticas pedagógicas. Paralelamente, e de acordo com algumas

percepções de professores, é possível inferir que os alunos têm uma participação pouco activa

em todo processo.

Adaptação e dificuldades face à nova realidade profissional

De uma forma global, e segundo os voluntaristas, é possível afirmar que os professores se

estão a adaptar à nova realidade profissional. As dificuldades apontadas residem nas disciplinas

de Educação Manual e Plástica, Educação Física, Educação Musical, matemática e também dos

meios de ensino:

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- ―Com algumas dificuldades. Os professores enfrentam dificuldades nas disciplinas de Educação Manual e Plástica, Educação Musical e Educação Física, por falta de alguns conhecimentos de formação e o material adequado para as mesmas disciplinas” (E1).

- ―Eu penso que nós estamos a adaptar a esta nova realidade porque é a realidade que foi introduzida pelo nosso governo. No princípio víamos um sistema como bicho-de-sete-cabeças mas com os seminários que temos recebido por parte das nossas escolas, do governo temos superado esta mesma reforma, estamos a nos enquadrar. Do meu ponto de vista, é o que eu já ressalvei há bem pouco tempo, no meu caso, tem a ver com as disciplinas de Educação Física, Educação Manual Plástica, são as dificuldades que eu tenho visto. Não posso generalizar a todos. Há alguns colegas que têm dificuldades nas disciplinas de Matemática mas com os seminários que temos recebido, estamos a tentar superar isso‖(E4).

Para os indefinidos, a adaptação está a ser lenta. Quanto às dificuldades, são as mesmas

com uma ou outra reclamação:

- ―Para ser sincero e honesto não esta ser fácil. Actualmente com a mono-docência o professor tem que leccionar todas disciplinas. A grande dificuldade actualmente que os professores encontram na 5ª e 6ª classe é leccionar as disciplinas de Educação Manual Plástica e Educação Musical, considero que estas duas cadeiras estão a ser leccionadas com muitas dificuldades mesmo. As dificuldades são muitas começando pelo material didáctico dos alunos…” (E7).

- ―Vão se adaptando paulatinamente, esta a ser muito lenta adaptação dos docentes(…) Por exemplo eu não sou formado em desenho não sei como funciona as técnicas de desenho. Logo não posso leccionar esta disciplina. Alguns manuais têm muitos erros ortográficos (…)” (E8).

- “Estamos a nos adaptar com alguns subsultos, com os empurros, no meu ponto de vista seria melhor recuarmos no sistema anterior. Encontramos dificuldades nas disciplinas que não tivemos na nossa formação. Por exemplo não somos formados em Educação Musical, como é possível leccionar Educação Musical, não somos formados em Educação Moral e Cívica, Educação Manual Plástica”(E15).

Os críticos afirmam que os professores não estão adaptar-se a nova realidade profissional:

- ―Não estão adaptar-se. O que nos faz mesmo confusão são só as três disciplinas, porque nós não temos especialização nessas disciplinas (…)” (E11).

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

- ―Tem sido difícil na elaboração das disciplinas, elaboração das provas (…) (E9).‖.

De uma maneira geral os professores consideram que se leccionassem as disciplinas para

as quais detêm uma especialização, seria muito mais adequado.

Estratégias da escola

Para superar as debilidades dos professores, nas disciplinas que segundo eles deveria

haver professores especializados, as escolas organizam seminários de capacitação.

Os seminários são uma orientação do Ministério da Educação, com o intuito de diminuir

as dificuldades que os professores apresentam. Importa salientar que sempre houve seminários.

Antes do início do ano lectivo todas as escolas são orientadas a realizar seminários, para num

primeiro momento elucidar os professores das medidas tomadas pelo Estado; e num segundo

momento, proceder-se à discussão de, metodologias de ensino, a forma de avaliação dos alunos,

etc.

O que fica em aberto é como a escola trabalha com as questões que os próprios

professores apresentam, mesmo com os seminários não diminui as dificuldades dos professores.

Em conversas informais com os entrevistados, estes afirmaram que os seminários não resolvem o

problema em causa. Há outros problemas que os seminários não resolvem tais como a carga

horária, a planificação das aulas, a avaliação e fundamentalmente a qualificação do professor.

A partir da análise das entrevistas, inferiu-se que as escolas não possuem estratégias em

relação aos professores sem formação pedagógica em algumas unidades curriculares. Para

elucidar melhor o assunto, foram entrevistados quatro directores de escola:

- ―Eu não falaria da estratégia da escola como tal. Na nossa realidade as coisas funcionam ainda muito vertical, as orientações vêem de cima a escola só cumpriu. A escola não tem aquela autonomia de por si só por exemplo traçar estratégias. Não, as estratégias vêem de cima. Para os professores sem formação pedagógica o próprio sistema em si viu esses casos. Eu me lembro quando cheguei à escola ainda havia professores com 8ª classe, nós mesmos fizemos

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Kezita Mamuela Marcos

algumas solicitações, nos Institutos Médios Normal de Educação, para dar prioridade a esses professores para eles não ficarem ultrapassados. Na recomendação da reforma o professor tinha que ter o ensino médio concluído no mínimo, magistério ou IMNE. O que nós fizemos foi tirar esses professores da docência e passámos para administração e ao mesmo tempo eles estudavam e só depois de concluir, voltaram outra vez para a docência. Aqueles que no ensino médio não fez o IMNE, estão a fazê-lo agora no ensino superior. Neste período eles tiveram seminários, outros fizeram superação pedagógica no Sefojor e outros fizeram no Don Bosco. Na minha experiência muitos professores fizeram IMIL, IMEL39, tinham ensino médio mas não tinham agregação pedagógica. A esses professores eu mesma aconselhei a frequentar o curso de agregação pedagógica de dois anos e meio na escola Católica Dom Bosco. Ainda a planificação que fizemos semanalmente, os refrescamentos no fim de cada trimestre. E vamos gerindo aquelas situações que ainda gerem dúvidas dos professores” (E3).

- ―Temos seminários de capacitação, que acontece no início do ano lectivo e nas pausas pedagógicas também. Nesta escola todos professores têm formação pedagógica”(E4).

- ―Uma das estratégias é o refrescamento, seminários de capacitação, convidamos elementos da educação da repartição, pedimos um ou dois convidados para quando tivermos debates, dúvidas que não estamos a conseguir superar com os professores pedimos a um técnico para superar essas lacunas. No meu caso a escola que eu estou a dirigir, muito deles são novos e fizeram o pré-universitário, não têm formação pedagógica. Quando eles são admitidos, participam em três dias de seminários e todas as sexta-feira os professores enumeram as dificuldades e depois tratamos” (E2).

Desta forma, é possível deduzir que as estratégias que as escolas utilizam são definidas e

orientadas pelo Estado. Ou seja, seminários ou ―refrescamentos‖ são propostas pelo próprio

Estado para tentar diminuir as dificuldades dos professores que trabalham com a 5ª e a 6ª classe

face à monodocência.

Estes testemunhos permitem concluir que existe uma autonomia muito reduzida nas

escolas em angolanas. Parafraseando Ball (Teodoro, 2002:13, apud Ball, 1990:s/p), a política é

uma questão de fixação autoritária de valores, construindo-se em contextos sociais bem

determinados e pretendendo projectar imagens de um ideal de sociedade. E a escola é um desses

contextos sociais. Neste sentido como afirmam alguns actores ―a construção das políticas de

39 IMIL-Instituto Médio Industrial de Luanda e IMEL- Instituto Médio de Economia de Luanda e o Sefojor.

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

educação e de formação é bem um acto político, no sentido forte do termo… dizem o modo

como uma sociedade se pensa e ela própria, se afirma, se projecta no futuro‖ (TEODORO, apud

CHARLOT; BEILLEROT, 1995, p.:13). E em Angola, a escola cumpre com as orientações do

Estado sem alteração de conteúdo e de forma. Como diz Akkari (2011, p.12), as políticas

educativas estão intimamente relacionadas como o sistema de governo.

É notória, a tentativa do Estado angolano em reformar o ensino, dentro dos parâmetros

internacionais. No entanto constata-se um problema de adaptação dos seus profissionais e de

alargamento e democratização da escola. O sector da educação ainda hoje assenta num modelo

de gestão centralizado a par da inalterabilidade do governo desde de 1975 até aos dias de hoje.

CONCLUSÃO

Relativamente aos fundamentos políticos na passagem da pluri-docência para a mono-

docência no ensino primário unificado, concretamente na 5ª e 6ª classes, respectivamente, não foi

possível encontrar fundamentos na Lei de Bases nº 13/01 do sistema de educação, pois esta

demonstrou ser totalmente omissa sobre o assunto. De acordo com Popkewitz (apud Afonso,

1988, p.81), a reforma é um ―conceito normativo que remete para compromissos particulares

com dinâmicas da vida contemporânea‖, que a transformam na ―prática social de um ritual e de

uma retórica que nos faz acreditar que as instituições estão, como se espera, a responder às

pressões da modernização e a criar condições para o progresso social e económico‖.

Apesar de Angola tentar modernizar o sistema educativo, fruto de influências

internacionais, ainda se debate com muitos problemas. Como indica Ngaba (2012, p.255) no seu

estudo, a falta de comunicação entre ―as escolas e os níveis superiores; a elaboração arbitrária de

directrizes que visam a organização do sistema educativo; a carência de quadros; a falta de infra-

estruturas que constituam uma rede escolar credível; baixos orçamentos destinados à educação e

as condições sociais dos alunos‖ são factores que contribuem para inúmeras dificuldades.

Considerou-se também que não há uma articulação entre os pressupostos da política

educativa e a prática pedagógica. Ou seja, há muitas incongruências. A primeira reside na

preparação do quadro docente; a segunda reside na avaliação dos alunos, ou seja, na tentativa de

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Jul/Dez 2017 | 127

Kezita Mamuela Marcos

diminuir o fracasso escolar que se estabeleceu no ensino primário, criou-se uma alternativa

denominada de transição automática; não havendo mecanismos de apoio a alunos que não

conseguem ter um aproveitamento razoável; terceira, reside nos meios de ensino disponíveis, os

que existem apresentam muitos erros e outros não existem.

Relativamente às dificuldades funcionais da reforma educativa no contexto angolano, este

estudo concluiu que uma das principais adversidades diz respeito ao quadro docente. Ou seja,

não há articulação entre a mono-docência de seis classes e um quadro docente qualificado e

especializado, para leccionar a 5ª e a 6ª classes. Para um ensino que se pretende de qualidade é

necessário que haja capital humano adequado.

Os professores consideram que é muito crítico e difícil trabalhar em regime de mono-

docência face ao número de disciplinas e de especializações que necessitam de obter. Ou seja, a

maioria é habilitado para leccionar o 1º Ciclo de formação básica, do ensino secundário. Isto

corresponde à 7ª a 9ª classes do ensino secundário na reforma em curso. Tendo por base as suas

declarações, é necessária mais qualificação para o próprio professor, porque o nível de ensino

assim o exige.

Para diminuir as limitações do corpo docente que lecciona a 5ª e a 6ª classes na actual

reforma, seria pertinente adoptar o modelo de mono-docência-coadjuvada e apostar na formação

contínua. Para o primeiro caso, o professor da turma trabalharia com outro professor especialista

nas matérias que aquele não dominasse. Para o segundo caso, o Estado, em parceria com

instituições de ensino superior (Escolas Pedagógicas e Institutos superiores de Educação),

mobilizaria recursos no sentido de Perrenoud (1999, p.15): ―fazer com que as ofertas de

formação se voltem rapidamente para a reforma; dirigir-se às escolas e encontrar uma via de

mediação dentre formas clássicas de reagrupamento e acompanhamento de projectos, a partir da

análise das práticas e necessidade‖. P. Perrenoud (1999) expressa que é importante que os

formadores e as instituições de formação continuada, sempre que possível, associados à génese

das reformas, a possam antecipar nos seus planos de formação.

No entanto, para o caso angolano, é necessário pensar na natureza das formações dos

professores do ensino primário, fundamentalmente os que trabalham com a 5ª e a 6ª classes para

tornar exequível a actual reforma por um lado e por outro, fazer da ―formação continuada um

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As controvérsias da reforma educativa em Angola

vector de profissionalização mais do que um simples portador de conhecimentos, de métodos ou

de novas tecnologias‖ (PERRENOUD, 1999, p.18).

De uma maneira geral, a adaptação dos professores e a unificação do ensino primário em

seis classes, está intimamente ligado com as dificuldades funcionais da reforma sendo que o

ponto de ligação é a formação e especialização dos professores.

O estudo põe em evidência a dificuldade das escolas se desenvolverem face à reforma

curricular no subsistema do ensino geral. As mesmas são definidas e orientadas pelo Estado. Ou

seja, seminários ou acções de formação são estratégias do próprio Estado para tentar diminuir as

dificuldades dos professores que trabalham com a 5ª e a 6ª classes no regime de mono-docência.

Desta forma, conclui-se que existe uma autonomia muito limitada nas escolas em Angola.

Como afirma Ngaba (2012, p.249), Angola preserva um modelo de ensino elitista e

centralizado, modelo típico do ensino herdado da educação socialista.

Uma pergunta fica em aberto: Será que o sistema de ensino angolano está preparado para

um ensino unificado de seis classes?

No entanto, ao terminar esta dissertação seria interessante equacionar alguns dos seus

condicionalismos ou limites. Este estudo carece de dados estatísticos com validade sobre a

formação de professores primários em regime de mono-docência em seis classes, assim como o

plano de formação do mesmo. No que concerne a aspectos burocráticos, não foi possível

entrevistar os responsáveis do Ministério da Educação que actuam no processo de reforma

educativa. Perguntas como: ―Quais são os critérios utilizados para recrutar um professor para

leccionar a 5ª e a 6ª classes?‖ e ―Como tencionam implementar o ensino unificado em seis

classes?‖ são questões às quais são necessárias respostas e neste estudo não foi possível obtê-las.

Outra limitação encontrada, reside no contexto em que foram realizadas as entrevistas – período

eleitoral – gerando dificuldades em que os professores prestassem relatos de forma descontraída,

isenta de pressões e imparcialidade sobre o assunto em causa.

Fica em aberto para próximos estudos perceber quais as estratégias das escolas face à

mono-docência em seis classes, assim como a questão da profissionalização do professor

primário no contexto Angolano.

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Kezita Mamuela Marcos

A questão do reduzido aproveitamento e abandono escolar em Angola, merecem também

um grande interesse e deve ser foco de estudo.

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Artigo #7 Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí [Vigna unguiculata (L.) Walp.] de Angola y un grupo de germoplasma que representa otras regiones del mundo.

David António N. Ndengoloka Instituto de Investigação Agronómica-EEA-Mazozo-Luanda

[email protected]

Abstract

A study of the phenotypic diversity of cowpea [Vigna unguiculata (L.) Walp.] was conducted at the University of Puerto Rico and the USDA-ARS Tropical Agriculture Research Station during 2010 and 2011. The field experiments planted at the Isabela Substation consisted of an evaluation of 16 lines of cowpea from the National Center for Genetic Resources of Angola, and 26 lines from the University of California Riverside and the University of Puerto Rico that represented cowpea germplasm from other regions in the world. The study of the phenotypic diversity of Angolan cowpea germplasm from other regions of the world was accomplished by comparing phenotypic characteristics such as general adaptation, phenology, growth habit, yield components, and seed characteristics. The seed color of most of the cowpea varieties was brown with the exception of the varieties from California which had cream-colored seed with black hilums. Almost all of the cowpea germplasm had a rhomboid shape. Angolan cowpea germplasm had an indeterminate growth habit whereas most of the germplasm from California, West Africa and Puerto Rico had a determinate growth habit. The average number of days to maturity of the Angolan germplasm was 76 days with a range of 67 to 82 days in the March 2010 planting. This compares with an average days to maturity of 70 days for the germplasm from other regions. The average number of days to maturity of the Angolan germplasm was 89 days with a range of 81 to 93 days in the December 2010 planting. This compares with an average days to maturity of 86 days for the the germplasm from other regions. In addition to consumption of cowpea seed in Angola, leaves of the plants are collected for human consumption and the straw is often used for forage; these factors may favor later maturing, indeterminate cowpea varieties that produce more biomass. Four cowpea varieties from Angola produced mean yields > 1,000 kg/ha during both planting seasons. These yields are significantly greater than the average seed yield in Angola (250 kg/ha). PI 441917 produced mean yields > 1,600 kg/ha during both growing seasons. Leaf samples of Angolan cowpea germplasm had an average of 33% protein with a range of 28 to 34% in the March 2010 planting. The West African cowpea germplasm 58-57 had the highest % leaf protein (39%). Mean % seed protein of Angolan cowpea germplasm was 26% with a range

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

from 25 to 28% in the March 2010 planting and 24% with a range of 22 to 26% in the December 2010 planting. These values are similar to mean % seed protein from other regions. Mean Fe in the seed of Angolan cowpea germplasm was 56 ppm with a range from 44 to 73 ppm in the March 2010 planting and 64 ppm with a range of 55 to 79 ppm in the December 2010 planting. Mean Zn in the seed of Angolan cowpea germplasm was 42 ppm with a range from 32-56 ppm in the March 2010 planting, and a mean of 43 ppm with a range of 39 to 47 ppm in the December 2010 planting. The mean seed Fe of the Angolan germplasm 124/1731-4 was 73 ppm for the March 2010 planting and 79 ppm for the December 2010 planting. The mean seed Zn of the Angolan germplasm 124/1731-4 was 53 ppm for the March 2010 planting and 41 ppm for the December 2010 planting. This Angolan variety had the highest seed Fe and among the highest seed Zn concentration. This study was successful in identifying cowpea germplasm with traits of potential value to breeding program in Angola and other regions of the world.

Key words: Cowpea, germplasm, phenotypic diversity, macroelements, microelements.

Resumen

Un estudio de la diversidad fenotípica de caupí [Vigna unguiculata (L.) Walp.] se realizó en la Subestación de Isabela, de la Universidad de Puerto Rico y en USD-ARS, durante los años de 2010 y 2011. El experimento de campo consistió en la evaluación de 16 líneas de caupí originarias del Centro Nacional de Recursos Fitogenéticos de Angola, y 26 líneas de la Universidad de California Riverside y la Universidad de Puerto Rico representando diversas regiones de producción de caupí en el mundo. El objetivo del estudio fue comparar la diversidad fenotípica del germoplasma de Angola con la diversidad de la colección de otras regiones del mundo, utilizando las características fenotípicas: adaptación general, fenología, hábito de crecimiento, componentes del rendimiento, y las características de la semilla de caupí. Marrón fue el color de grano que predominó en todos los germoplasmas, excepto el germoplasma de California que tiene el color crema con un hilo negro. La forma de la semilla romboide se pudo encontrar en todos los germoplasmas. El hábito de crecimiento indeterminado caracterizó el germoplasma de Angola, mientras que el tipo de crecimiento determinado predominó en el germoplasma de California, África Occidental y de Puerto Rico. El promedio general de días a madurez de germoplasma de Angola fue de 71 días en la siembra de marzo de 2010 con el intervalo de 67 a 82 comparado con un promedio de 70 días de madurez de germoplasma de otras regiones. El promedio de días de madurez de germoplasma de Angola sembrando en diciembre 2010 fue de 89 días con un intervalo de 81 a 93 días comparado con el promedio de 86 días de madurez con germoplasma de otras regiones. Además de consumo de semillas de caupí en Angola, también las hojas sirven para consumo humano y la paja es utilizada para la producción de forraje. Estos factores pueden favorecer la maduración tardía y el hábito de crecimiento indeterminado de caupí que producen más biomasa. Cuatro variedades de caupí de Angola produjeron rendimientos > 1,000 kg/ha en ambas épocas de siembra. Estas cifras son significativamente mayores que el rendimiento promedio actual de Angola (250 kg/ha). PI 441917 produjo rendimientos con un promedio de > 1600 kg/ha en ambas épocas de siembras. Las muestras de hojas de germoplasma de caupí de Angola tuvieron un promedio de 33% de

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David António Ndengoloka

proteína con un intervalo de 28 a 34% en la siembra de marzo 2010. El germoplasma de caupí de África Occidental 58-57 tenía el porciento de proteína más alto en la hoja (39%). El promedio de proteína de germoplasma de Angola fue de 26% con un intervalo de 25 a 28% en marzo de 2010 y 24 % con un intervalo de 22 a 26% en la siembra de diciembre 2010. Estos valores son similares a las medias de porciento de proteína de otras regiones. La media de Fe en la semilla de caupí de Angola fue 56 ppm con un intervalo de 44 a 73 ppm en la siembra de marzo de 2010 y 64 ppm con un intervalo de 55 a 79 ppm en la siembra de diciembre de 2010. El promedio de zinc en la semilla del germoplasma de Angola fue de 42 ppm con un intervalo de 32 a 56 ppm en la siembra de de marzo de 2010 y 43 ppm con un intervalo de 39 a 47 ppm en la siembra de diciembre de 2010. El promedio de hierro en la semilla del germoplasma de Angola 124/1731-4 fue de 73 ppm para la siembra de marzo de 2010 y 79 ppm en la siembra de diciembre de 2010. El promedio de Zn en semilla de germoplasma de Angola 124/1731-4 fue de 53 ppm para la siembra de marzo de 2010 y 41 ppm para la siembra de diciembre de 2010. Esta variedad de Angola tuvo el mayor valor de hierro y entre los más altos en la concentración de Zn. Este estudio fue exitoso en la identificación de germoplasma de caupí con características de valor potencial para los programas de mejoramiento en Angola y otras regiones del mundo. Palabras clave: Caupí, germoplasma, diversidad fenotípica, macroelementos, microelementos.

Introducción

El Caupí [Vigna unguiculata (L.) Walp.] constituye una excelente fuente de proteína en la

dieta de muchas familias en las zonas rurales de países en vías de desarrollo. Por lo tanto, su

composición química, rica en contenido de proteínas, carbohidratos y minerales, le permite ser

utilizado como sustituto de carne, por considerarse muy costoso (Fall et al., 2003). Por esta razón

muchos autores lo denominan como la carne de los pobres.

En Angola, el caupí es utilizado como alimento por la población rural y urbana, en

combinación con cereales y raíces o tubérculos. El cultivo es consumido como grano seco, hojas

y vainas verdes como vegetal, y en forma de forraje para rumiantes. Por esta razón, surge la

necesidad de prestar más importancia en este cultivo para la producción comercial, así como

producir una fuente de ingreso para agricultores y sus familias.

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

El caupí es cultivado en casi todo territorio angolano, pero es concentrado más en las

zonas norte y centro-sur del país. El rendimiento promedio de caupí es de aproximadamente de

250 kg/ha. El cultivo es producido mayormente por los pequeños agricultores, para la

subsistencia de sus familias y para la alimentación del ganado vacuno. Las áreas de siembras de

caupí son normalmente ≤ 1 hectárea. Se siembra en asociación con maíz (Zea mays L.), yuca

(Manihot esculenta) y sorgo (Sorghum spp.). La mayoría de la siembra es realizada durante los

meses de octubre y noviembre, época que corresponde al inicio del año agrícola de Angola, y

durante los meses de febrero y mayo, la segunda época de cultivo. La mayoría de los campos

utilizados para la producción de caupí tienen suelos desde fersialiticos tropicales, calcáreos

pardos, paraferralíticos y ferralíticos (Diniz, 2006). Las temperaturas oscilan de 20o a 30o C

durante el desarrollo del cultivo.

Actualmente, los agricultores angolanos siembran variedades criollas de caupí. Estas

variedades fueron desarrolladas por métodos de selección tradicional basada en la experiencia de

los agricultores adquirida por varias generaciones. Esta selección realizada por los agricultores

en ambientes específicos ha producido germoplasma de caupí con alto potencial genético de

adaptarse en suelos áridos y en condiciones de climas diversos.

Por eso, existe un compromiso social y moral de conocer en lo más profundo el cultivo y

su diversidad genética porque es importante identificar germoplasma que tiene potencial para ser

utilizado por los programas de mejoramiento genético. Además el caupí es uno de los alimentos

básicos de Angola que el gobierno de Angola y otras instituciones desean promover. Los

agricultores necesitan variedades de caupí mejoradas con mayor capacidad de rendimiento y

adaptable a condiciones extremas de sequía y altas temperaturas.

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Jul/Dez 2017 | 137

David António Ndengoloka

Todavía existe poca información sobre el cultivo de caupí en Angola. La falta de

información urge la necesidad de crear bases de datos sólidos para futuros programas de

mejoramiento genético. Pretendemos empezar con un estudio de las variedades conocidas y

cultivadas por los agricultores en Angola y que también fueron caracterizados por el Centro

Nacional de Recursos Fitogenéticos de Angola. Existe una diversidad de variedades criollas de

Angola que varían en su ciclo, hábito de crecimiento, reacción al estrés abiótico, biótico, forma,

tamaño y valor nutricional de los granos. Esta diversidad genética clama por su potencial y la

necesidad de conservación. Debido a las limitaciones de información sobre el caupí en Angola,

este trabajo tiene el potencial de abrir un nuevo capítulo en el conocimiento de la diversidad de

germoplasma de caupí de Angola con relación a otros grupos de germoplasma. Abre así las

posibilidades de fomentar mayor interés en el cultivo, no sólo como alimentación básica de los

agricultores, o bien decir cultivo de subsistencia, pero también como un cultivo comercial, donde

familias podrían vivir de las recetas financieras proveniente de este cultivo. Un desafío es

invertir suficientes recursos en estudios de diversidad para conocer y utilizar las potencialidades

genéticas del cultivo.

Este objetivo requiere la creación de programas de mejoramiento enfocados en las

variedades tradicionales o que puedan tener potencial para contribuir en otros estudios

fitogenéticos. Con este trabajo y otros estudios realizados por investigadores angolanos, se

comenzará una nueva etapa de la divulgación del cultivo de caupí en Angola que brinda

información útil que servirá como base para futuros trabajos de investigación.

Con la gran diversidad de variedades criollas que se encuentra en la agroecología

angolana, suscita la necesidad de evaluar este material genético que el país posee. Un mejor

entendimiento de esta diversidad genética juega un papel esencial para los programas de

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

mejoramiento genético y los bancos genéticos que se dedican a la conservación de especies. El

uso de diversidad genética es un componente importante para el desarrollo de sistemas

sostenibles de producción agrícola.

El objetivo del trabajo es estudiar y comparar la diversidad fenotípica de variedades criollas de

caupí de Angola con una colección de germoplasma de California y Puerto Rico que representa

otras regiones de producción del mundo. El estudio se basa en evaluación de términos

agronómicos, la composición elemental de la hoja y semilla.

Materiales y Métodos

El trabajo consistió en un estudio de la diversidad fenotípica de una colección de caupí,

entre ellas se encuentran 16 variedades criollas de Angola, 22 variedades de California

representando una colección del germoplasma de otras regiones de producción de caupí del

mundo, incluyendo variedades ‗Gorda‘, PI 441918, ‗Red River‘ y ‗Iron Clay‘obtenidos en

Puerto Rico.

El CNRF tiene una colección de aproximadamente 313 accesiones provenientes de la

región norte, centro-sur y la zona costera (Fig. 1) de Angola. De este grupo, 20 accesiones fueron

parte de este estudio de diversidad fenotípica. En este estudio, las accesiones representan tres

zonas de adaptación: 124/1859 (zona norte); 030714, 124/2636, 124/2110, 2115, 124/2124, y

1261 (zona centro-sur); 030174,124/1731,124/1764, 124/1454, 124/1375, y 124/2469 (zona

costera).

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David António Ndengoloka

Fig. 1 Sitios de colección de caupí en Angola por el CNRF.

Fonte: (PEDRO, 2007).

El presente trabajo se inició a partir de una selección de plantas individuales de 20

variedades criollas de Angola. Debido a la variabilidad fenotípica dentro de las variedades

criollas se obtuvieron 16 líneas de germoplasma de caupí de Angola provenientes del Centro

Nacional de Recursos Fitogenéticos de Angola. También obtuvimos 26 accesiones de

germoplasma provenientes de California y Puerto Rico que representan la colección de resto del

mundo.

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Las variedades de caupí de Angola en este estudio son originarias de cuatro regiones

agrícolas de Angola según la clasificación de Diniz (2006): zona agrícola 3, cafeícola Dembos-

Uíge; zona agrícola 7/8, Litoral de Luanda; zona agrícola 15, Litoral – Sul do Kuanza; y zona

agrícola 24, Planalto Central.

La accesión 124/1859 es originaria de la zona agrícola 3, cafeícola Dembos-Uíge, norte

del país en la provincia de Uíge, considerada región de clima tropical húmedo, latitud 60 48‘ – 90

35‘ Sur , longitud 130 26‘ – 150 42‘ Este, con dos estaciones bien definidas: lluviosa de 7 a 8

meses (Septiembre – Mayo) con valores pluviométricos entre 900 mm en el límite oeste hasta

los 1500 mm en la periferia interior. Las mayores precipitaciones se concentran en los meses de

noviembre y abril. La temperatura promedio anual más baja es de 25oC y 22oC en el interior en

las zonas de mayor altitud. En esta zona predomina los suelos tipo-paraferrálicos amarillos y

francamente ferralíticos.

Las accesiones 124/1731 y 124/1764 son originarias de la zona costera, litoral de Luanda,

latitud 60 55‘ – 90 47‘ Sur, 120 50‘ – 150 10‘ Este. La estación lluviosa es entre septiembre y

mayo, con precipitaciones de 350 mm en el litoral y 700 mm en el interior. La temperatura media

anual oscila entre los 25oC a 26oC. Las accesiones 124/1454, 124/1375 se cultivan en la zona

litoral sur del Kuanza, latitud entre 90 10‘ y 120 00‘ Sur – longitud entre 130 8‘ y 140 40‘, en un

clima tropical semiárido. Las época lluviosa es de aproximadamente 6 meses (noviembre –

abril), con precipitaciones que varían de 400 mm en el litoral hasta un poco menos de 1000 mm

en la periferia del interior, con marzo siendo el mes más lluvioso. Las temperaturas medias anual

oscilan aproximadamente entre 26oC a 27oC. Los suelos predominantes son fersialíticos y

calcáríos pardos.

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David António Ndengoloka

Las accesiones 030174, 124/2469,124/2636, 124/2110, 2115, 124/2124 y 1261 son

originarias de la zona centro-sur de Angola, situada en gran parte a más de 1500 m de altitud,

entre latitud de 100 27‘—14 16‘ Sur , longitud entre 140 14‘ – y 170 37‘ Este.

Esta área es considerada zona tropical de alternancia de climas húmedos y secos. La estación

lluviosa tiene duración de aproximadamente de 7 meses (de septiembre hasta abril) con valores

de precipitación que oscilan de 1100 mm hasta 1400 mm. La temperatura media anual varía entre

19oC a 20oC y los suelos predominantes son ferralíticos y paraferralíticos.

La accesión 124/1731 es de la región litoral, provincia de Bengo. Se caracteriza por

presentar el hábito de crecimiento indeterminado trepador. La semilla es reniforme, de color

marrón. La flor es de color lilá-rosa. Tiene un promedio de 7 nódulos en el tallo principal, 2

vainas por pedúnculo y 18 lóculos por vaina.

La accesión 124/1764 es de la región litoral, provincia de Bengo. La accesión tiene un

hábito de crecimiento indeterminado semi-erecto. La forma de la semilla es reniforme de color

marrón y la flor color lilá-rosa. Tiene un promedio de 7 nódulos en el tallo principal, 2 vainas por

pedúnculo y 16 lóculos por vaina.

La accesión 124/1454 es de la región litoral, provincia de Kwanza Sul. Es una variedad

con hábito de crecimiento indeterminado trepador. Su forma de semilla es cuboide con color

marrón o gris. Su órgano floral es de color lilá-rosa. El número promedio de nódulos en el tallo

principal es 7, mientras que el número de vainas por pedúnculo es 2 y hay 18 lóculos por vaina.

La accesión 124/1375 es una variedad con hábito de crecimiento determinado erecto, con

semilla de forma globosa, color marrón claro. Presenta una flor de color lilá-rosa, mientras que

tiene un promedio de 6 nódulos, 2 vainas por pedúnculo y 15 lóculos por vaina.

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142 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

El accesión 030714 es una variedad con hábito de crecimiento indeterminado semi-recto.

Su forma de semilla es ovoide con color marrón claro. El color de la flor es lilá-rosa. Tiene un

promedio de 6 nódulos en el tallo principal y 2 vainas por pedúnculo, mientras el número de

lóculos por vaina es de 15.

La accesión 124/2469 es originaria de la región sur. Presenta el hábito de crecimiento

determinado, y la forma de la semilla es globosa de color marrón o gris. Tiene un promedio de 7

nódulos en el tallo principal, 2 vainas por pedúnculo, y 19 lóculos por vaina.

Los experimentos de campo fueron realizados durante los años de 2010 y 2011 en la

Subestación de Isabela de la Universidad de Puerto Rico, que se localiza en la región noroeste

de Puerto Rico a una longitud de 67.3o oeste, una latitud de 18.3o norte y a una altitud de 128 m

sobre el nivel del mar. La temperatura promedio anual de la zona es 29.3oC, con una

precipitación promedia anual de 1524 mm (Junta de Planificación, 2006). El suelo pertenece a la

serie Coto (very-fine, Kaolinitic isohyperthermic Typic Eutrustox), suelo profundo, de buen

drenaje ligeramente ácido y moderadamente permeable (Gierbolini, 1975). Se sembraron 16

variedades criollas de caupí del banco de germoplasma de Angola, 26 variedades de caupí

provenientes de la Universidad de California, Riverside y la Universidad de Puerto Rico que

representan la colección de germplasma de caupí del resto del mundo (Tabla 1).

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Jul/Dez 2017 | 143

David António Ndengoloka

Tabla 1. Lista de germoplasmas por origen geográfico.

Nombre de accesión

Origen Institución Ciclo biológico Genotipo

Angola 030714-1 Angola CNRF Medio-temprano Criollo 030714-4 Angola CNRF Medio-temprano Criollo 124/1375-3 Angola CNRF Temprano Criollo 124/1454-4 Angola CNRF Medio-temprano Criollo 124/1454-5 Angola CNRF Temprano Criollo 124/1731-1 Angola CNRF Temprano Criollo 124/1731-4 Angola CNRF Temprano Criollo 124/1764-2 Angola CNRF Medio-temprano Criollo 124/1859-2 Angola CNRF Medio-tardío Criollo 124/2122-3 Angola CNRF Medio-temprano Criollo 124/2469-1 Angola CNRF Temprano Criollo 124/2783-1 Angola CNRF Temprano Criollo 124/2783-4 Angola CNRF Temprano Criollo 2870-1 Angola CNRF Temprano Criollo 2870-5 Angola CNRF Temprano Criollo 124/2983-5 Angola CNRF Medio-tardío Criollo California 524B California UCR Temprano Mejorado CB 27 California UCR Temprano Mejorado CB 46 California UCD Temprano Mejorado África Occidental Apagbaala Ghana SARI Temprano Mejorado Bambey 21 Senegal ISRA Temprano Mejorado Ife Brown Nigeria - Temprano Mejorado IT82E-18 Nigeria IITA Temprano Mejorado IT84S-2049 Nigeria IITA Temprano Mejorado IT90K-284-2 Nigeria IITA Temprano Mejorado IT95K-1491 Nigeria IITA Temprano Mejorado IT97-499-39 Nigeria IITA Temprano Mejorado Melakh Senegal ISRA Temprano Mejorado Mouride Senegal ISRA Temprano Mejorado Yacine Senegal ISRA Temprano Mejorado 58-53 Senegal ISRA Medio-temprano Criollo 58-57 Senegal ISRA Medio- temprano Criollo IT98K-555-1 Nigeria IITA Temprano Mejorado KVx403-P-20-T B. Faso INERA Temprano Mejorado KVx525 B. Faso INERA Temprano Mejorado

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Su Vita2 B. Faso INERA Temprano Criollo Nombre de accesión

Origen Institución Ciclo biológico Genotipo

África Occidental UCR288(Tvx1948) Nigeria IITA Temprano Mejorado Tvu 7778 Nigeria - Temprano Criollo Puerto Rico Gorda Puerto Rico

Medio-temprano Criollo

PI 441917 Brasil TARS-ARS Temprano Criollo Red River USA - - - Iron Clay USA - - -

Burkina Faso= B. Faso

El diseño experimental utilizado fue de bloques completos aleatorizados con tres repeticiones

para el primer experimento y 4 repeticiones para el segundo experimento. Los tratamientos

fueron las 42 líneas y variedades de caupí. La unidad experimental fue 1 surco de 2 m en la

primera siembra, mientras que en la segunda siembra fue de 1 surco de 4 m. Las distancias de

siembra para los dos experimentos fueron de 1.33 m y 2 m entre surcos por 0.50 m entre plantas

dentro de los surcos. Tres semillas fueron sembradas por hoyo. En la siembra se aplicaron la

dosis de 60 kg/ha de la fórmula completa (N-P-K) y el riego realizado fue por aspersión. Los

parámetros evaluados fueron de acuerdo con el objetivo del estudio y las escalas usadas fueron

según el descriptor de caupí (Bioversity International, 2007), como a continuación se describe:

Color del grano: (clasificado en marrón, marrón con mancha, crema, violeta y rojo).

Forma del grano: 1=reniforme, 2=ovoide, 3=truncada, 4=globosa y 5=romboide

Vigor de la planta: se usó la escala donde: 3= no vigoroso (altura menor que 37 cm y

ancho menor que 75 cm); 5=Intermedio (altura mayor que 37 cm o ancho mayor que 75

cm); 7=vigoroso (altura mayor que 37 cm y ancho mayor que 75 cm); 9= muy vigoroso

(altura mayor que 50 cm y largura mayor que 1m).

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Jul/Dez 2017 | 145

David António Ndengoloka

Hábito de crecimiento: se usó la escala donde, 1=determinado; 2=indeterminado

arbustivo; 3=indeterminado, con ramificación erecta abierta: 4=indeterminado, trepador;

y 5=otros.

Edad inicio de la floración: la edad cuando 50% de las plantas tienen por lo menos 1 flor.

Edad de madurez: la edad cuando 90% de las vainas están secas

Número de vainas por planta: promedio de tres plantas por surco.

Número de semillas por vaina: promedio de 3 vainas por surco.

Peso de 100 semillas y color de la semilla.

Rendimiento (kg/ha).

En el caso de la evaluación de la composición elemental química de las hojas, se

recolectaron las muestras a los 35-40 días después de la siembra, tomando 20 g de la masa foliar

de cada unidad experimental en las 3 repeticiones. Para determinar las características químicas

de la hoja, primeramente se tomó el peso fresco y después se colocó las muestras en el horno a

70o C por lo menos con 24 horas o hasta alcanzar el peso constante, y se volvió a pesar para

hallar el peso seco de la muestra.

Para la caracterización de la composición elemental de la semilla y de la parte foliar, se

determinó la composición de 11 elementos químicos: Fósforo (P), Potasio (K), Calcio (Ca),

Magnesio (Mg), Hierro, (Fe), Manganeso (Mn), Cinc (Zn), Boro (B), Molibdeno (Mo), Aluminio

(Al), y Cobre (Cu), usando el método de ceniza seca (Perkin-Elmer, 1994). Se tomaron muestras

de semillas de las 3 repeticiones y se secó en el horno a 70o C hasta alcanzar el peso constante.

Después de secar la muestras y alcanzado el peso constante, se realizó la maceración de las

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146 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

muestras. En las muestras de semilla macerada e incinerada se añadieron 20 ml de 33% HCl en

el crisol, y se calentó hasta que el volumen disminuyó aproximadamente 10 mL.

Después de completar la digestión, cada muestra de la solución del crisol fue transferida a

un matraz volumétrico de 100 mL con agua doble destilada caliente a través de papel filtro

Whatman No.541. Después de enfriar la solución en el matraz volumétrico, se añadió agua doble

destilada para completar el volumen a 100 ml, que fue usado para la determinación de la

composición elemental usando espectroscopia de emisión óptica con fuente de plasma de

acoplamiento (ICP-OS) (PERKIN, 1994).

Para la concentración de nitrógeno con objetivo de determinar proteína, se utilizó el

método de microkjeldahl (Foss, 2002). Para este propósito se pesaron 0.2 g de la muestra de la

semilla u hoja y este fue transferido al tubo de digestión. Se añadieron 3 bolas de cristal y una

pastilla del catalizador (mezcla de 1.5g K2SO4 y 1.5g CuSO4) dentro del tubo de digestión. En el

siguiente paso se añadieron 5 mL de H2SO4 concentrado para destruir la materia orgánica y se

adicionó 3 mL de H2O2 al 30% y se agitó en el vortex. Las muestras fueron digeridas en el

bloque de digestión por 2 horas a una temperatura de 3800C.

Después, se preparó el destilador Kjeltec 2100 FOSS y añadieron 40 ml de NaOH (40%)

dentro del tubo de digestión, para destilar aproximadamente 150 ml en el frasco de Erlenmeyer

por 5 minutos. Se realizó la titulación de la muestra destilada con HCl 0.2N estandarizada para

determinar nitrógeno total. Finalmente, se calculó la concentración del nitrógeno con la siguiente

fórmula: %N = ml (HCl muestra) – ml (HCl de blanco) x Factor N/g muestra x 10, % [ %

Proteína = % N x 6.25]

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Jul/Dez 2017 | 147

David António Ndengoloka

Los datos de campo y del laboratorio fueron procesados a través del programa estadístico

Infostat, donde se realizó un análisis de varianza y las medias fueron comparadas por la prueba

de DMS con 5 % de probabilidad.

Resultados y Discusión

Los análisis estadísticos realizados en este estudio demuestran diferencias significativas

entre los genotipos de caupí para la mayoría de los parámetros cuantitativos evaluados. Los

genotipos de Angola presentaron una gran variabilidad en el color de grano que varió de marrón,

marrón con mancha, violeta oscuro y rojo. Pero, el color que predominó fue el color marrón

(Tabla 2). En contraste, las variedades mejoradas de California presentaron el color crema con

hilo negro en sus granos. El germoplasma de África Occidental representa varios países tales

como: Senegal, Nigeria, Ghana y Burkina Faso donde el color de grano mostró gran variabilidad

desde crema con hilos negros, a marrón y marrón con manchas.

Se observó la forma de grano romboide en la mayoría de los genotipos de germoplasma

de Angola, excepto 124/1764-2, 124/1222-3 y 2870-1 que fueron reniformes. La forma del grano

del germoplasma de California varió de reniforme a romboide, pero predominó la forma

reniforme representado por los genotipos 524B, y CB27 (Tabla 2). Las formas romboide y

reniforme del grano fueron las más notorias en el germoplasma de África Occidental, excepto el

genotipo UCR 288(Tvx1948). Los hallazgos encontrados sobre la forma del grano de los

genotipos de África Occidental son similares a los de germoplasma de Angola. Esto puede

justificarse por el hecho de que ambos grupos son originarios del mismo centro de origen

(VAVILOV, 1926; PASQUET, 2000). Todo el germoplasma de Puerto Rico mostró la forma

romboide.

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148 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

El hábito de crecimiento indeterminado y postrado se evidenció en todos los genotipos

del germoplasma de Angola en las dos siembras, con excepción de los genotipos 12/2783-1 y

124/2783-4, que tuvieron crecimiento determinado arbustivo.

Las variedades criollas de Angola no son mejoradas y además han sido cultivadas durante

años por los agricultores para alimentar a sus familias. Su interés en la comida angolana le brinda

cierta importancia para la seguridad alimentaria, ya que las hojas, granos verdes y secos son

parte de la dieta. Todo el germoplasma de California presentó hábito de crecimiento determinado

arbustivo en las dos siembras, porque son utilizados con fin comercial y se hace la cosecha

mecanizada. Lo mismo se observa en los genotipos del germoplasma de África Occidental que

tienen los hábitos de crecimiento determinado arbustivo y postrado, con excepción del genotipo

IT 98K-555-1 (Tabla 2). También en las líneas de Puerto Rico se manifestaron hábitos de

crecimiento determinado.

El vigor de la planta es una característica importante para la selección de genotipos con

buena adaptación. Se encontraron diferencias significativas entre los genotipos para lecturas de

vigor en ambas siembras (Tabla 2). La media de las lecturas de vigor del germoplasma de

Angola para la siembra de diciembre de 2010 (5) fue superior al promedio de vigor de la siembra

de marzo de 2010 (4). Para el germoplasma de California, el promedio de las lecturas de vigor de

la planta fue 5 en las dos siembras, considerado intermedio según el descriptor de caupí

(Bioversity International, 2007). Con relación al germoplasma de África Occidental, las dos

siembras de 2010 tuvieron medias de 4 para las lecturas de vigor. Esto defiere del germoplasma

de California que alcanzó la media de 5 en las dos siembras. Se pudo observar que las medias del

vigor de los genotipos fueron similares al germoplasma de Angola en las dos siembras. El

germoplasma de California mostró medias superiores entre todos los germoplasmas.

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Jul/Dez 2017 | 149

David António Ndengoloka

La floración de caupí es afectada por la interacción de fotoperiodo y la temperatura

(WIEN; SUMMERFIELD, 1980; LINNEMAN et al., 1994). El germoplasma de Angola tuvo un

intervalo de días para 50% de floración que fue de 42 a 65 días, con una media de 53 días,

mientras que la siembra de diciembre 2010 fue de 50 a 61 días, con una media de 54 días. Todas

las líneas de California florecieron a los 40 días en la siembra de marzo de 2010. El intervalo en

la siembra de diciembre 2010 fue de 46 a 47 días, con la media de 47 días. Esta diferencia fue

notable con relación a la primera siembra, esto corrobora con lo dicho anterior, sobre la

interacción de fotoperiodo y temperatura. A pesar de esta diferencia entre las dos siembras, las

medias de floración fueron inferiores si comparamos con el germoplasma de Angola. Se pudo

constatar la misma situación para el germoplasma de África Occidental en la primera siembra de

marzo de 2010. El intervalo fluctuó entre 39 a 50 días, con una media de 43 días, mientras que

la siembra de diciembre 2010 tuvo el intervalo de 48 a 55 días, con una media de 51. Como se

demostró anteriormente, casos similares de diferencias entre siembras acontecieron en los

diferentes germoplasmas, el de África Occidental tuvo un mayor número de días de floración

con relación al germoplasma de California y menor días de floración comparado con el

germoplasma de Angola (Tabla 2). Las líneas de Puerto Rico tuvieron un intervalo de días para

floración de 41 a 46 días con la media de 44 días para la siembra de marzo de 2010 y de 46 a 53

días en la siembra de diciembre de 2010 que alcanzó una media de 50 días. El germoplasma de

California floreció antes que los otros grupos de germoplasma.

Los días a la maduración variaron de 67 a 82 entre los todos los genotipos de los grupos

de germoplasmas con una media de 71 días en la siembra de marzo 2010 (Tabla 2). Esto sería

clasificado como maduración medio-temprana (FREIRE FILHO et al., 2001). Por lo general, el

germoplasma de Angola en la siembra de marzo 2010, fue más tardío que el germoplasma de

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150 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

otras regiones del mundo (Tabla 2). El promedio de días a la madurez fue 76 para los genotipos

de Angola, 68 días para las líneas de California, 71 para el germoplasma de África Occidental y

70 para los testigos. Sin embargo, tres líneas de Angola maduraron en ≤ 70 días después la

siembra. El germoplasma de Angola en la siembra de diciembre 2010 el intervalo fue de 81 a 93

días, con la media de 89 días.

Sería importante determinar por qué los agricultores en Angola han seleccionado

variedades indeterminadas y tardías. Variedades tardías producirían una mayor cantidad de

biomasa que sería ventajoso para la producción de forraje o para la cosecha de hojas para

consumo humano.

El conocimiento de las características morfo-agronómicas tiene gran implicación en los

trabajos de selección porque permite a los programas de mejoramiento genético tomar decisiones

informadas. Los genotipos 124/2783-1, 124/2169-1 y 2870-1 de Angola mostraron

características útiles como el color del grano comercial, buen vigor de la planta, en comparación

del resto de los genotipos. Del mismo modo, dentro del germoplasma de California se puede

destacar las líneas 524B, CB27, CB46 porque tienen el hábito de crecimiento determinado y

madurez temprana. Se pueden utilizar estas líneas como progenitores en cruzamientos con

germoplasma de Angola. Ife Brown, IT82E-18, IT90K-284-2 y IT84S-2049 son germoplasmas

de África Occidental que se destacan por su forma de grano y madurez temprana. Las líneas de

Puerto Rico sobresalientes fueron Gorda, PI 441917 y Red River por su color del grano y

madurez temprana.

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Tabla 2. Características morfo-agronómicas de germoplasma de caupí de Angola, California y África Occidental sembrada en Isabela, Puerto Rico en marzo y diciembre de 2010.

Genotipo

Color de

grano Forma de

grano Hábito de crecimiento

Vigor de la planta1

_________________

Días _50% floración

_________________

Días de maduración _______________

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

Angola 030714-1 Marrón (M.) Romboide I. arbustivo 4 5 50 51 75 81 030714-4 M. con mancha Romboide I. postrado 4 6 52 56 78 93 124/1375-3 Marrón Romboide I. postrado 4 5 48 51 69 90 124/1454-4 Violeta oscuro Romboide I. postrado 5 5 60 58 82 93 124/1454-5 Marrón Romboide I. postrado 5 5 63 57 74 93 124/1731-1 M. con mancha Romboide I. postrado 5 6 55 54 78 90 124/1731-4 M. con mancha Romboide I. postrado 5 4 62 57 78 89 124/1764-2 Marrón Reniforme I. arbustivo 5 4 43 61 82 93 124/1859-2 Marrón Romboide I. postrado 4 . 64 . 82 . 124/2122-3 Marrón Reniforme I. postrado 4 . 58 . 72 . 124/2169-1 Marrón Romboide I. arbustivo 5 5 45 51 71 86 124/2783-1 Marrón Romboide I. postrado 3 4 45 50 67 86 124/2783-4 Marrón Romboide I. postrado 4 5 42 50 78 85 2870-1 Marrón Reniforme I. postrado 4 5 51 54 75 93 2870-5 Rojo Romboide I. arbustivo 4 4 45 56 70 87 124/2983-5 Marrón Romboide I. postrado 4 . 65 . 82 . Rango 3-5 4-6 42-65 50-61 67-82 81-93 Media 4 5 53 54 76 89

1 Basada en una escala de 3 a 9, donde 3=no vigoroso; 5=intermedio; 7=vigoroso; 9=muy vigoroso M=marrón=Indeterminado

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Tabla 2. Continuación

Genotipo Color de grano

Forma de grano

Hábito de crecimiento

Vigor de la planta1 Días _50% floración Días de maduración

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

California 524B Crema Reniforme D. arbustivo 5 5 40 47 68 83 CB 27 Crema Reniforme D. arbustivo 5 5 40 47 68 86 CB 46 Crema Romboide D. arbustivo 5 6 40 46 68 81 Rango 5 5-6 40 46-47 68 81-86 Media 5 5 40 47 68 83 África Occidental Apagbaala Crema Romboide D. arbustivo 3 3 44 53 68 88 Bambey 21 Crema Reniforme D. arbustivo 5 4 42 48 70 86 Ife Brown Marrón Romboide D. arbustivo 5 4 41 51 67 90 IT82E-18 M. con mancha Romboide D. arbustivo 4 3 43 52 67 90 IT84S-2049 Marrón Reniforme D. arbustivo 5 4 39 48 67 85 IT90K-284-2 M. con mancha Romboide D. postrado 5 5 43 52 68 88 IT95K-1491 Crema Romboide D. arbustivo 4 5 41 52 70 90 IT97-499-39 Marrón Romboide D. arbustivo 4 3 41 51 68 85 Melakh Blanco Reniforme D. arbustivo 5 5 41 48 69 86 Mouride Marrón Romboide D. arbustivo 4 4 45 52 76 88 Yacine Marrón Reniforme D.postrado 4 5 44 50 70 81 58-57 Crema Reniforme D. postrado 4 4 47 53 82 90

1 Basada en una escala de 3 a 9, donde 3=no vigoroso; 5=intermedio; 7=vigoroso; 9= muy vigoroso M=marrón; D=determinado

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Jul/Dez 2017 | 153

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Tabla 2. Continuación Genotipo Color de

grano Forma de

grano Hábito de

crecimiento Vigor de la planta1

Días _ 50% floración

Días de maduración

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

África ocidental IT98K-555-1 Marrón Romboide I. postrado 5 5 45 51 75 88 KVx403-P-20-T Marrón Romboide D. postrado 3 4 45 52 75 85 KVX525 Blanco Romboide D. arbustivo 3 4 42 52 74 88 SuVita 2 Marrón Reniforme D. postrado 4 4 43 49 74 83 UCR 288(TVx1948) Marrón Ovoide D. arbustivo 4 4 50 55 70 86 Tvu 7778 Marrón Reniforme D. postrado 3 3 44 50 67 83 Rango 3-5 3-5 39-50 48-55 67-82 81-90 Media 4 4 43 51 71 87 Puerto Rico Gorda Crema Romboide D. arbustivo 3 5 41 46 70 88 PI 441917 M. con mancha Romboide D. postrado. 5 6 46 51 70 89 Red River Romboide D. postrado . 4 . 50 . 88 Iron Clay C. Romboide D. arbustivo 4 53 82 Rango . 4-6 41-46 46-53 . 82-89 Media 4 5 44 50 70 87 Rango general 3-5 3-6 39-65 46-61 67-82 81-93 Media general 4 5 47 52 71 87 DMS(0.05) 1.4 0.5 5.2 3.8 6.9 NS CV(%) 21.1 29.0 6.5 5.1 5.8 7.9

1 Basada en una escala de 3 a 9, donde 3=no vigoroso; 5=intermedio; 7=vigoroso; 9=muy vigoroso M=marrón; I=Indeterminado; África O=África Occidental

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Se encontraron diferencias significativas entre los genotipos de caupí para rendimiento de

semilla y sus componentes (Tabla 3). El número de vainas por planta de germoplasma de

Angola variaron de 4 a 22 en la siembra de marzo de 2010 con una media de 10 vainas por

planta, mientras que en la siembra realizado en diciembre 2010 hubo un rango de 13 a 29 vainas

por planta con una media de 20 vainas por planta. Esto demuestra el efecto de la interacción de

fotoperiodo y temperatura en el desarrollo fenológico de la planta, ya que la siembra de marzo

2010 coincidió con días largos y calurosos. Cabe señalar, sin embargo, que la diferencia en

fotoperiodo entre siembras de diciembre y marzo es apenas dos horas. Resultados similares

fueron encontrados por Craufurd et al, (1996) donde hicieron estudios de efecto de temperatura

de las variedades criollas de África Occidental. El crecimiento y desarrollo de los genotipos

124/1375-3, 124/2169-1, 124/2783-4 de Angola fueron menos afectados por el factor climático

de verano e invierno. Todos estas líneas produjeron por lo menos 17 vainas por planta durante

ambas fechas de siembra.

El germoplasma de California en la siembra de marzo de 2010 variaron de 19 a 31 vainas

por planta con una media de 26 vainas (Tabla 3). Los genotipos durante la siembra de diciembre

de 2010 produjeron un rango de 20 a 26 vainas por planta alcanzando una media de 23 vainas.

Dentro de cada línea de California hubo poca diferencia entre fechas de siembra para el número

de vainas por planta.

Los promedios de número de vainas por planta del germoplasma de África Occidental

fluctuaron de 9 a 34 vainas por planta, con una media de 19 vainas; y entre 17 a 32 vainas por

planta, con una media de 22 plantas para siembra en diciembre 2010. La mayoría de las líneas de

África Occidental produjeron por lo menos 17 vainas por planta, esto indica que este grupo

tiende a tener mejor adaptación a los días más largos y temperaturas cálidas. Es interesante notar

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Jul/Dez 2017 | 155

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que Apagbaala, Bambey 21, Ife Brown y IT 82E-18 produjeron un mayor número de vainas por

planta durante la siembra de marzo 2010.

Estos resultados indican la posibilidad de seleccionar genotipos de caupí con adaptación a

días largos y a altas temperaturas. Ehlers y Hall (1996) demostraron que hay tres clasificaciones

de genotipos con relación al fotoperiodo que son: días cortos, largos y neutral. Las líneas

PI 441917 y Gorda produjeron un número similar de vainas por planta durante las dos fechas de

siembra. Haciendo una comparación, las medias de África Occidental son similares con las

medias del germoplasma de Puerto Rico en las dos siembras, 19 y 22 vainas, mientras que son

diferente para la siembra de marzo 2010 en el germoplasma de Angola y California (Tabla 3)

Para el número de semillas por vaina en la siembra de marzo 2010 de germoplasma de

Angola variaron de 10 a 16 semillas con media de 13 semillas, mientras que 13 a 18 semillas

con media de 16 semillas fue para la siembra de diciembre 2010, una diferencia de tres semillas.

En el caso del germoplasma de California, la media fue de 9 semillas con un intervalo de 8 a 10

semillas por vaina en la siembra de marzo 2010, y sigue la siembra de diciembre con un intervalo

de 13 a 14 semillas con media de 14 semillas, superior a la siembra anterior. Se puede verificar

que hubo un aumento de vainas en la siembra de diciembre de 2010 en los dos grupos de

germoplasmas (Angola y California) y se apreció mayor número de semillas por vainas en el

grupo de Angola. Con relación al germoplasma de África Occidental los valores de las semillas

por vaina fluctuaron entre 7 a 15 semillas con media de 11 semillas en la siembra de marzo 2010

y 13 semillas como media en la siembra de diciembre 2010 en un intervalo de 9 a 17 semillas por

vaina. Estos resultados no se difieren significativamente con los valores encontrados en el

germoplasma de California pero sí con el germoplasma de Angola. A seguir el germoplasma de

Puerto Rico tuvo un intervalo de 13 a 16 semillas por vaina con la media de 15 semillas por

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

vaina en la siembra de diciembre de 2010, mientras que en la siembra de marzo 2010 la media

fue de 14 semillas por vaina. En cuanto al número de semillas por vaina el germoplasma de

Angola mostró mayor promedio, seguido del germoplasma de Puerto Rico y el germoplasma de

California, y las de África Occidental fueron las que presentaron menor promedio.

El intervalo de peso de 100 semillas para germoplasma de Angola en la siembra de marzo

2010 osciló entre 8 a 14 gramos, con una media 10 g, mientras que en la siembra de diciembre

de 2010 el intervalo fue de 11 a 17 g con media de 14 g. Para el germoplasma de California, el

intervalo de peso de 100 semillas fue entre 15 g y 18 g con media de 16 g en la siembra de marzo

2010. Sin embargo para la siembra de diciembre de 2010, el intervalo osciló 18 a 19 g con una

media de 18 g, superior comparando con las dos siembras de germoplasma de Angola. Estas

variedades también tienen granos grandes, lo que justifica el gramo promedio de la semilla si lo

comparamos con el germoplasma de Angola que tiene granos pequeños, medianos y grandes.

Para el germoplasma de África Occidental el intervalo fue de 8 a 17 g por 100 semillas con

media de 13 g en la siembra de marzo 2010, mientras que la siembra de diciembre 2010 el

intervalo fue de 11 a 19 g con una media de 15 g. Las medias de las dos siembras de

germoplasma de África Occidental son inferiores si comparamos con las medias de las dos

siembras de germoplasma de California (16 g y 18 g) y superior a las medias de las dos siembras

de germoplasma de Angola (10 g y 14 g). Para el germoplasma de Puerto Rico en la siembra de

marzo 2010 el intervalo fue de 12 a 19 g con media de 16 gramos, mientras que la siembra de

diciembre de 2010 el intervalo fue de 11 a 21 g con media de 14 g. Los germoplasmas de

California y Puerto Rico presentaron las medias de peso de 100 semillas superior en la siembra

de marzo de 2010, pero para la siembra de diciembre de 2010 los que tuvieron las medias altas

fueron los germoplasmas de África Occidental y California.

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Con relación al rendimiento, el intervalo de germoplasma de Angola en la siembra de

marzo 2010 fue de 27 a 1,217 kg/ha con media de 453 kg/ha. Los genotipos 124/1375-3,

124/2169-1, 124/2783-4 y 2870-5 presentaron rendimientos superiores de 1000 kg/ha. Un

rendimiento de 1000 kg/ha es cuatro veces mayor el promedio de rendimiento de caupí en

Angola. La siembra de diciembre 2010 el intervalo fue de 792 a 1293 kg /ha con una media de

1,025 kg/ha, superior a la siembra anterior. Pero si lo comparamos con el germoplasma de

California, en la siembra de marzo 2010 los valores de rendimiento oscilaron entre 1,172 a 1,515

kg por ha con la media de 1,356 kg/ha, y para la siembra de diciembre 2010 el intervalo fue de

517 a 779 kg/ha con una media de 676 kg/ha. Los genotipos de germoplasma de California

tuvieron rendimientos muy elevados si lo comparamos con la media de germoplasma de Angola

en la siembra de marzo 2010, pero en la siembra de diciembre 2010 fue lo contrario. Para el

germoplasma de África Occidental en la siembra de marzo 2010, el intervalo osciló 62 a 1,687

kg por hectárea con la media 844 kg/ha, mientras que en la siembra de diciembre de 2010 el

intervalo fue de 230 a 1,073 kg/ha con media de 654 kg/ha. Los genotipos Bambey 21, Ife

Brown, IT82E-18, IT97-499-39, IT98K-555-1, UCR 288(TVx1948) alcanzaron medias superior

de 1000 kg/ha en la siembra de marzo de 2010. Con relación a las líneas de Puerto Rico, para la

siembra de marzo de 2010, el intervalo fue de 987 a 1,639 kg/ha con media 1,313 kg/ha, lo cual

fue superior a los germoplasmas de Angola y África Occidental, pero inferior a la media de

California. Sin embargo, en la siembra de diciembre de 2010, el intervalo fue de 589 a 1,683

kg/ha con una media de 976 kg/ha, superior al de todos los germoplasmas. En cuantos a los

genotipos, la media mayor fue de Ife Brown, 1,687 kg/ha en la siembra de marzo de 2010,

mientras para la siembra de diciembre de 2010 el genotipo PI 441917 tuvo la media de 1,683

kg/ha, la mayor entre todos los genotipos.

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Tabla 3. Rendimiento y sus componentes de germoplasma de caupí de Angola, California y África Occidental sembrada en Isabela, Puerto Rico en marzo de 2010 y diciembre 2010.

Genotipo # de vainas por planta

__________________

# de semillas por vaina

_________________

Peso de 100 semillas (g)

_______________

Rendimiento (kg/ha)

_________________

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2011

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

Angola030714-1 4 21 15 15 8 11 157 949 030714-4 9 19 10 14 8 11 238 1117 124/1375-3 22 22 14 17 8 12 1096 1181 124/1454-4 6 19 12 16 11 17 124 941 124/1454-5 7 18 13 16 11 14 247 1073 124/1731-1 8 20 13 15 11 16 261 957 124/1731-4 11 15 13 17 11 14 589 1026 124/1764-2 6 13 13 13 12 17 82 792 124/1859-2 4 . 12 . 14 . 97 . 124/2122-3 4 . 12 . 8 . 49 . 124/2169-1 19 19 16 16 10 14 1040 1030 124/2783-1 18 29 12 17 9 13 870 1091 124/2783-4 17 22 14 16 9 12 1028 1053 2870-1 11 19 15 18 9 13 121 823 2870-5 14 21 15 15 10 12 1217 1293 124/2983-5 4 . 11 . 8 . 27 . Rango 4-22 13-29 10-16 13-18 8-14 11-17 27-1217 792-1293 Media 10 20 13 16 10 14 453 1025

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Tabla 3. Continuación

Genotipo # de vainas por planta # de semillas por vaina Peso de 100 semillas(g) Rendimiento (kg/ha)

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

California 524B 31 26 9 13 18 19 1515 779 CB 27 19 20 8 14 15 18 1172 517 CB 46 27 24 10 14 16 18 1380 732 Rango 19-31 20-26 8-10 13-14 15-18 18-19 1172-1515 517 Media 26 23 9 14 16 18 1356 676 África Occidental Apagbaala 24 19 7 9 11 14 553 644 Bambey 21 34 22 12 13 14 13 1127 468 Ife Brown 28 18 11 11 11 13 1687 1051 IT82E-18 29 18 15 17 14 17 1152 405 IT84S-2049 17 32 12 13 10 12 702 1028 IT90K-284-2 15 26 13 14 15 18 974 603 IT95K-1491 19 28 8 12 16 19 315 245 IT97-499-39 19 23 11 15 13 18 1373 960 Melakh 18 20 11 12 17 18 671 533 Mouride 21 23 11 14 14 15 862 473 Yacine 18 25 11 12 16 18 684 721 58-53 9 . 12 . 9 . 62 . 58-57 9 17 10 13 9 11 101 230

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Tabla 3. Continuación Genotipo # de vainas por planta # de semillas por vaina Peso de 100semillas(g) Rendimiento

(kg/ha)

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

marzo 2010

diciembre 2010

África Occidental IT98K-555-1 19 21 11 12 13 17 1044 1073 KVx403-P-20-T 21 20 10 13 13 14 1343 710 KVX525 15 22 10 12 13 15 667 628 SuVita 2 17 27 9 12 15 16 657 337 UCR 288(TVx1948) 17 21 11 15 9 13 1202 946 Tvu 7778 20 19 15 15 8 11 858 725 Rango 9-34 17-32 7-15 9-17 8-17 11-19 62-1687 230-1073 Media 19 22 11 13 13 15 844 654 Puerto Rico Gorda 21 19 14 16 12 14 987 614 PI 441917 16 19 14 16 19 21 1639 1683 Red River . 25 . 13 . 11 . 589 Iron Clay C. . 23 . 14 . 11 . 1018 Rango. 16-21 19-25 14 13-16 12-19 11-21 987-1639 589-1683 Media. 19 22 14 15 16 14 1313 976 Rango general 4-34 13-32 7-16 9-18 8-19 11-21 27-1687 230-1683 Media general 16 21 12 14 12 15 749 817 DMS(0.05)general 39.1 10 3 3 2 3 778 426.1 CV(%) general 11.4 28.9 14.6 12.4 7.6 9.0 48.8 37.0

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Jul/Dez 2017 | 161

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La tabla 4 enseña las medias de los macronutrientes de la siembra de marzo 2010 y

diciembre 2010. De acuerdo con el análisis estadístico se encontraron diferencias significativas

entre los genotipos de caupí para todos los elementos, con excepción del calcio en la siembra de

diciembre 2010. Con relación a proteína, no se encontraron diferencia entre todos grupos de

germoplasmas.

Para el germoplasma de Angola, el porciento de fósforo en la siembra de marzo de 2010

tuvo intervalo de 0.45 a 0.55%, con una media de 0.49%, mientras que la siembra de diciembre

de 2010 el intervalo osciló de 0.44 a 0.59 %, con una media de 0.53 %, superior a la siembra de

marzo 2010. El germoplasma de California tuvo un intervalo de 0.50 a 0.53 % de fósforo, con

media de 0.51 %, comparando con la siembra de diciembre de 2010 obtuvo un intervalo 0.43 a

0.57 % con una media de 0.52 %, que no difirió significativamente de la siembra de marzo de

2010. Por lo tanto comparando las medias de porciento de fósforo de las dos siembras de

germoplasma de Angola (0.49 y 0.53), difiere de las siembras de germoplasma de California

(0.51 y 0.53 %). Las líneas de África Occidental en la siembra de marzo de 2010 presentó un

intervalo de 0.42 a 0.54 % de fósforo con una media de 0.50 %, sin embargo en la siembra de

diciembre de 2010 tuvo un intervalo de 0.39 a 0.65 %, con media de 0.50 %. No hubo

diferencias entre ambas siembras. Analizando los datos de fósforo de germoplasma de África

Occidental en las dos siembras (0.50 y 0.50%) no fueron superiores a los datos de germoplasma

de California (0.51 y 0.53 %) ni a los datos de germoplasma de Angola con la excepción en

primera siembra (0.49 y 0.53 %). Para el germoplasma de Puerto Rico, en la siembra de marzo

de 2010 el intervalo fue de 0.48 a 0.56 %, con media de 0.52 %, pero para la siembra de

diciembre 2010 presentó un intervalo de 0.49 a 0.56% con la media de 0.53%, superior a la

anterior. El germoplasma de Puerto Rico en la primera siembra presentó la media de fósforo

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

(0.52%) superior de todos los grupos, sin embargo en la siembra de diciembre fue similar al

germoplasma de Angola (0.53%) y germoplasma de California (0.53%), pero diferente al del

germoplasma de África Occidental (0.50%).

Las medias de potasio del germoplasma de Angola en la siembra de marzo de 2010

variaron de 1.20 a 1.69 % con la media de 1.48 %, y en la siembra de diciembre de 2010 el

intervalo fue de 1.14 a 1.78 % con la media de 1.28 %, inferior a la media anterior.

Para el germoplasma de California, el intervalo de porciento de potasio en la siembra de marzo

de 2010 fue de 1.21 a 1.27 % con una media de 1.25 %, sin embargo en la siembra de diciembre

de 2010 el intervalo fue de 0.98 a 1.03 % con la media de 1.01%, inferior a la siembra anterior.

En las dos siembras las medias (1.25% y 1.01%) de germoplasma de California fueron inferior a

las medias de las dos siembras de germoplasma de Angola (1.48% y 1.28%). Con relación al

germoplasma de África Occidental, el porciento de potasio en la siembra de marzo de 2010 tuvo

el intervalo de 1.12 a 1.50 %, con media de 1.29 %, y para la siembra de diciembre de 2010 el

intervalo fue de 0.88 a 1.22 % con la media de 1.02 % de inferior a la siembra anterior. Las

medias de las siembras de germoplasma de África Occidental (1.29% y 1.01%) fueron similar al

de la media de la siembra de diciembre 2010 (1.01 %) del germoplasma de California, pero

diferente en la siembra de marzo de 2010 (1.25%). En base a los datos de la media de

germoplasma de Puerto Rico, el porciento de potasio en la siembra de marzo 2010 tuvo el

intervalo de 1.31 a 1.36 %, con la media de 1.34%, mientras que la siembra de diciembre el

intervalo fue de 1.05 a 1.17 % con la media de 1.11 %, inferior a la siembra de marzo de 2010.

Las medias en porciento de potasio de germoplasma de Puerto Rico (1.34% y 1.11 %), en las dos

siembras demostraron ser superior a las medias de las siembras de germoplasma de California

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(1.25% y 1.01%) y África Occidental (1.29% y 1.01%). Sin embargo fueron inferior a las medias

de las siembras de germoplasma de Angola (1.48% y 1.28%).

Para el porciento de calcio, el germoplasma de Angola en la siembra de marzo 2010 tuvo

el intervalo de 0.008 a 0.07 %, con una media 0.04 % y para la en la siembra de diciembre 2010

no se encontraron diferencias estadísticas significativas, pero el intervalo fue de 0.07 a 0.13%

con una media de 0.09 %, superior al de la siembra anterior. El germoplasma de California en la

siembra de marzo de 2010 tuvieron de 0.04 a 0.05 % de calcio con una media 0.04 %, mientras

que en la siembra de diciembre de 2010 no se encontraron diferencias estadísticas significativas

entre las líneas con una media de 0.07 %, superior al de la siembra de marzo 2010. El porciento

de calcio para el germoplasma de África Occidental en la siembra de marzo de 2010 tuvo un

intervalo de 0.02 a 0.07 % con una media de 0.05 %, y para la siembra de diciembre de 2010 el

intervalo fue 0.05 a 0.24% con una media de 0.08%, superior al de la siembra de marzo de 2010.

Por lo tanto las medias de porciento de calcio de las siembras de germoplasma de África

Occidental (0.05% y 0.08%) fueron diferentes con relación a los germoplasmas de Angola

(0.008% y 0.09%) y California (0.04% y 0.07%). Las líneas de Puerto Rico en la siembra de

marzo 2010 tuvieron un intervalo de 0.02 a 0.05% de calcio con una media de 0.04% y para la

siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue de 0.05 a 0.07%, con una media de 0.07 %

superior de la media anterior. Las medias de porciento de calcio de germoplasma de Puerto Rico

(0.04% y 0.07%) fueron similares a las medias de porciento de calcio de germoplasma de

California, sin embargo diferentes a las medias de calcio de germoplasma de África Occidental

(0.05% y 0.08%) y el del germoplasma de Angola (0.008% y 0.09%).

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

El porciento de magnesio del germoplasma de Angola en la siembra de marzo de 2010

tuvo un intervalo de 0.17 a 0.20 % con una media de 0.19, y en la siembra de diciembre de 2010

el intervalo fue de 0.23 a 0.26 con la media de 0.24 %, superior a la siembra anterior.

Para el germoplasma de California, el porciento de magnesio en la siembra de marzo de

2010 tuvo un intervalo de 0.19 a 0.21% con una media de 0.20 %, mientras que en la siembra de

diciembre de 2010 el intervalo fue de 0.21 a 0.23 % con una media de 0.22%, superior a la

siembra de marzo 2010. La media de germoplasma de California en la siembra de marzo de 2010

(0.20%) fue superior que la media de germoplasma de Angola en la siembra de marzo 2010

(0.19%), sin embargo la media de la siembra de diciembre 2010 de germoplasma de California

(0.22 %) fue inferior en comparación a la media de germoplasma de Angola (0.24%) en la

misma siembra.

En base los datos de media de porciento de magnesio, el germoplasma de África

Occidental en la siembra de marzo de 2010 tuvo un intervalo de 0.1 a 0.2 % con una media 0.18

% y para la siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue de 0.10 a 0.24% con una media de

0.19%, superior al de la media anterior. Las medias de las dos siembras de germoplasma de

África Occidental (0.18 % y 0.19%) fueron inferior a las medias de porciento de magnesio de

germoplasma de Angola (0.19% y 0.24%) y germoplasma de California (0.20% y 0.22%).

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Tabla 4. Composición de los elementos en la semilla de germoplasma de caupí de Angola, California y África Occidental sembrada en Isabela, Puerto Rico en marzo y diciembre de 2010.

Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg % PT % N % P % K % Ca % Mg marzo 2010 diciembre 2010

Angola 030714-1 25 4.08 0.45 1.46 0.034 0.19 24 3.84 0.57 1.33 0.07 0.25

030714-4 25 3.97 0.47 1.46 0.041 0.19

23 3.68 0.52

1.14 0.08 0.25 124/1375-3 26 4.21 0.52 1.51 0.067 0.19 24 3.89 0.55 1.78 0.13 0.23 124/1454-4 28 4.52 0.50 1.69 0.025 0.22 25 4.01 0.44 1.25 0.08 0.26 124/1454-5 26 4.16 0.51 1.2 0.025 0.18 24 3.81 0.50 1.16 0.08 0.23 124/1731-1 27 4.27 0.52 1.57 0.034 0.17 25 4.01 0.55 1.23 0.07 0.25 124/1731-4 27 4.35 0.55 1.51 0.033 0.21 24 4.01 0.50 1.16 0.08 0.23 124/1764-2 26 4.11 0.46 1.6 0.032 0.19 24 3.84 0.51 1.23 0.09 0.23 124/1859-2 26 4.23 0.51 1.44 0.04 0.21 . . . . . . 124/2122-3 27 4.36 0.46 1.56 0.011 0.18 . . . . . . 124/2469-1 27 4.3 0.54 1.43 0.046 0.19 25 3.92 0.54 1.19 0.09 0.24 124/2783-1 26 4.24 0.47 1.44 0.045 0.19 24 3.80 0.59 1.34 0.07 0.25 124/2783-4 26 4.08 0.51 1.47 0.048 0.19 23 3.67 0.59 1.28 0.10 0.25 2870-1 26 4.21 0.49 1.41 0.04 0.17 26 4.13 0.49 1.21 0.10 0.23 2870-5 25 4.03 0.46 1.42 0.048 0.19 22 3.45 0.52 1.30 0.09 0.26 124/2983-5 28 4.45 0.45 1.56 0.008 0.18 . . . .

Rango 25-28 4-5 0.4-0.5 1.4-1.6 0-0.07 0.17-0.20 22-26

3.45-4.13

0.44-.59

1.14-1.78

0.07-0.13

0.23-0.26

Media 26 4 0.49 1.48 0.04 0.19 24 3.85 .53 1.28 0.09 0.24 P.T=Proteína

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Tabla 4. Continuación Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg % PT % N % P % K % Ca % Mg marzo 2010 diciembre 2010 California 524B 24 3.89 0.53 1.27 0.04 0.21 23 3.66 0.43 0.98 0.07 0.21 CB 27 25 3.96 0.50 1.21 0.04 0.19 23 3.67 0.57 1.03 0.07 0.22 CB 46 24 3.79 0.51 1.26 0.05 0.20 22 3.55 0.57 1.01 0.08 0.23

Rango 24-25 3.7-

3.9 0.50-0.53

1.2-1.2

0.04-0.05

0.19-0.21

22-23 3.55-3.67

0.43-0.57 0.98-1.03

0.07-0.08

0.21-0.23

Media 24 4 0.51 1.25 0.04 0.2 23 3.63 0.52 1.01 0.07 0.22 África Occidental Apagbaala 26 4.21 0.54 1.26 0.07 0.19 26 4.04 0.52 0.99 0.09 0.1 Bambey 21 24 3.89 0.51 1.19 0.06 0.19 26 4.12 0.58 1.01 0.10 0.21 Ife Brown 24 3.87 0.50 1.29 0.05 0.17 25 3.94 0.43 0.95 0.24 0.17 IT82E-18 24 3.80 0.47 1.34 0.02 0.19 24 3.76 0.49 1.09 0.05 0.22 IT84S-2049 26 4.17 0.54 1.44 0.05 0.20 25 3.96 0.65 1.22 0.08 0.23 IT90K-284-2 26 4.15 0.52 1.39 0.04 0.18 24 3.82 0.53 1.09 0.06 0.19 IT95K-1491 23 3.65 0.49 1.26 0.04 0.18 22 3.48 0.44 0.97 0.06 0.1 IT97-499-39 25 4.00 0.51 1.24 0.05 0.18 24 3.86 0.48 0.98 0.07 0.20 Melakh 25 3.96 0.51 1.26 0.04 0.16 23 3.73 0.39 0.99 0.08 0.18 Mouride 23 3.76 0.47 1.20 0.05 0.18 22 3.57 0.42 1.01 0.08 0.20 Yacine 25 3.95 0.51 1.29 0.03 0.17 24 3.84 0.62 1.07 0.07 0.20 58-57 27 4.33 0.52 1.29 0.05 0.19 26 4.17 0.48 0.98 0.09 0.23 IT98K-555-1 26 4.21 0.52 1.36 0.03 0.18 25 3.92 0.62 1.09 0.07 0.24

P.T=Proteína

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David António Ndengoloka

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Tabla 4. Continuación Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg % PT % N % P % K % Ca % Mg marzo 2010 diciembre 2010 África ocidental KVx403-P-20-T 21 3.42 0.42 1.12 0.057 0.146 22 3.46 0.44 0.88 0.08 0.16 KVX525 23 3.74 0.45 1.19 0.046 0.170 22 3.58 0.46 0.88 0.07 0.20 SuVita 2 23 3.74 0.43 1.23 0.044 0.162 23 3.72 0.51 1.00 0.07 0.20 UCR 288(TVx1948) 26 4.15 0.50 1.5 0.041 0.195 24 3.91 0.43 1.20 0.08 0.23 Tvu 7778 27 4.29 0.55 1.35 0.044 0.218 24 3.90 0.47 0.91 0.07 0.24

Rango 21-27 3.4-4.3

0.4-0.5

1.1-1.5 0-0.07

0.1-0.2

22-26 3.46-4.17

0.39-0.65

0.88-1.22

0.05-0.24

0.10-0.24

Media 25 3.96 0.50 1.29 0.05 0.18 24 3.82 0.50 1.02 0.08 0.19 Puerto Rico Gorda 25 3.97 0.56 1.31 0.05 0.20 25 3.96 0.50 1.05 0.07 0.22 PI 441917 25 3.97 0.48 1.36 0.02 0.12 23 3.67 0.55 1.17 0.05 0.22 Red River 24 3.81 0.49 1.11 0.07 0.27 Iron Clay C. 23 3.71 0.56 1.10 0.07 0.24

Rango 25 3.97 0.4-0.5

1.31-1.36

0.02-0.05

0.12-0.20 23-25

3.67-3.96

0.49-0.56

1.05-1.17

0.05-0.07

0.22-0.27

Media 25 3.97 0.52 1.34 0.04 0.16 24 3.79 0.53 1.11 0.07 0.24

Rango general 21-28 3.4-4.5

0.4-0.5

1.1-1.6

0.01-0.07

0.1-0.2 22-26

3.45-4.17

0.39-0.65

0.88-4.42

0.05-2.40

0.10-0.27

Media general 25 4 0.5 1.37 0.04 0.19 24 3.81 0.51 1.20 0.14 0.22 DMS 2 0.35 0.04 0.19 0.01 0.03 1.3 0.2 0.1 0.2 NS 0.04 CV(%) 5.2 4.9 5.5 8.0 16.4 9.3 3.4 3.4 16.5 10.1 457.7 9.8

P.T=Proteína

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Se encontraron diferencias significativas entre las líneas de caupí en concentración de

hierro (Fe), boro (B) y cobre en las semillas (Tabla 5). Los datos hallados en este análisis de los

macrolementos y microelementos se ajustan según los intervalos reportados para el cultivo de

caupi (MILLS et al., 1996).

El hierro tiene gran influencia en la formación de hemoglobina de la sangre. Para el

micronutriente hierro en la siembra de marzo de 2010, el germoplasma de Angola tuvo un

intervalo de 44 ppm a 73 ppm con una media de 56 ppm, mientras que en la siembra de

diciembre de 2010 el intervalo fue de 55 ppm a 79 ppm con la media de 64 superior a la anterior.

El germoplasma de California en la siembra de marzo de 2010 alcanzó el intervalo de 41ppm a

43 ppm de hierro con la media de 42 ppm y en la siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue

39 ppm a 62 ppm con la media de 51 ppm. La media de parte por millón de hierro en el

germoplasma de California (42 ppm y 51 ppm) en las dos siembras fue inferior a las medias de

las dos siembras de germoplasma de Angola (56 ppm y 64 ppm). El germoplasma de África

Occidental en la siembra de marzo de 2010 tuvo el intervalo de 38 ppm a 62 ppm de hierro con

una media de 49 ppm y en la siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue de 40 ppm a 68 ppm

con la media de 55 ppm, superior al de la siembra anterior. El germoplasma de África Occidental

con la medias de 49 ppm y 55 ppm de hierro en las dos siembras fue inferior al germoplasma de

Angola, mayores medias de hierro fueron 56 ppm y 64 ppm. Sin embargo fue superior al

germoplasma de California (42 ppm y 51ppm). Las líneas de Puerto Rico en la siembra de marzo

de 2010 tuvieron un intervalo de 35 ppm a 40 ppm con la media de 40 ppm y en la siembra de

diciembre de 2010 el intervalo fue de 59 ppm a 63 ppm con una media de 61ppm. La media de

ppm de hierro de germoplasma de Puerto Rico (40) fue inferior a la media de hierro en la

siembra de marzo de 2010 de los germoplasmas de California y África Occidental, sin embargo

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David António Ndengoloka

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superó los mismos grupos en la siembra de diciembre de 2010. El germoplasma de Angola tuvo

la media alta en comparación a todos los germoplasmas.

No sé encontraron diferencias estadísticas significativas en la siembra de marzo 2010

para manganeso, pero el germoplasma Puerto Rico tuvo la media (21 ppm) que fue la más alta

con relación a los otros grupos de germoplasmas. Por consiguiente, en la siembra de diciembre

de 2010 el intervalo de manganeso en el germoplasma de Angola fue de 13 ppm a 19 ppm con

una media de 15 ppm. El germoplasma de California el intervalo fue de 12 ppm a 13 ppm con

una media de 13 ppm, inferior del germoplasma de Angola. Con relación el germoplasma de

África Occidental, el intervalo de ppm de manganeso en la siembra de diciembre 2010 fue de 8

ppm a 20 ppm con la media de 14 ppm, superior a la media de manganeso de la siembra de

diciembre de germoplasma de California (13 ppm) e inferior al germoplasma de Angola (15

ppm). Para el germoplasma de Puerto Rico, el manganeso en la siembra de diciembre de 2010 el

intervalo fue de 11ppm a 18 ppm con una media de 16 ppm, superior a todos los grupos de

germoplasma.

No se encontraron diferencias estadísticas significativas entre los genotipos para

concentraciones de cinc para las siembras de marzo de 2010 y diciembre de 2010 (Tabla 5). Los

promedios de cinc fueron 42 ppm para las siembras de marzo de 2010 y 45 ppm para la siembra

de diciembre de 2010

El boro en la siembra de marzo de 2010 de germoplasma de Angola tuvo un intervalo de

13 ppm a 20 ppm con una media de 16 ppm, pero el germoplasma de California presentó un

intervalo de 17 ppm a 18 ppm con una media de 17 ppm que es un valor superior al del

germoplasma de Angola. Para el germoplasma de África Occidental el boro tuvo un intervalo de

13 ppm a 20 ppm con una media de 16 ppm, similar al del germoplasma de Angola en la siembra

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

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de marzo 2010, pero diferente al germoplasma de California (17 ppm). Las líneas de Puerto Rico

en la siembra de marzo de 2010 tuvieron un intervalo de 16 ppm a 25 ppm de boro con una

media de 21 ppm superior al de todos los grupos de germoplasma.

No se encontró diferencias estadísticas significativas entre las líneas en la siembra de

marzo de 2010 la para concentración de Mo y Al. Igualmente en la siembra de diciembre de

2010 no se encontraron diferencias estadísticas significativas entre los germoplasmas. Los

promedios de Mo fueron 3 ppm para las siembras de marzo de 2010 y 1 ppm para la siembra de

diciembre de 2010. Los promedios de Al fueron 13 ppm para las siembras de marzo de 2010 y

23 ppm para la siembra de diciembre de 2010

En la siembra de marzo de 2010, el germoplasma de Angola tuvo un intervalo de 4 ppm a

9 ppm con la media de 7 ppm de cobre y en la siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue de 6

ppm a 13 ppm con una media de 13 ppm, superior a la siembra de marzo 2010. El germoplasma

de California en la siembra de marzo de 2010 tuvo un intervalo de 11 ppm a 13 ppm de Cu, con

media 12 ppm para la siembra de diciembre 2010 el intervalo fue de 10 ppm a 13 ppm, con

media de 12 ppm, similar a la siembra de marzo de 2010. Las medias de cobre de germoplasma

de California en las dos siembras fueron superiores a las dos siembras de germoplasma de

Angola (7 ppm y 13 ppm).

Por otro lado, para el germoplasma de África Occidental, el cobre en la siembra de marzo

de 2010 tuvo un intervalo de 7 ppm a 12 ppm con una media de 9 ppm, mientras que la siembra

de diciembre de 2010 el intervalo fue de 7 ppm a 13 ppm con la media de 9 ppm similar de la

siembra de marzo de 2010. Las medias de germoplasma de África Occidental (9 ppm y 9 ppm)

fueron inferior a las medias de las dos siembras de germoplasma de California (12ppm y 12

ppm), pero superior a la media de la siembra de germoplasma de Angola (7ppm), con excepción

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Jul/Dez 2017 | 171

David António Ndengoloka

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de la siembra de diciembre de 2010. En la siembra de marzo de 2010 las líneas de Puerto Rico

tuvieron un intervalo de 10 ppm a 17 ppm con una media de 14 ppm de cobre, mientras que en

la siembra de diciembre de 2010 el intervalo fue de 7 ppm a 13 ppm con la media de 9 ppm de

cobre, inferior al de la siembra de marzo 2010. La media de la siembra de marzo 2010 de

germoplasma de Puerto Rico fue de 14 ppm, superior con relación a todos los germoplasmas, sin

embargo la siembra de diciembre de 2010 fue inferior a la media de siembra de diciembre 2010

de germoplasma de Angola (13 ppm) y el germoplasma de California (12 ppm), con excepción

de África Occidental, que fueron similares.

Las siguientes variedades tuvieron medias superiores en proteína, hierro y aluminio:

030714-1, 124/1454-5, 124/1731-1, 124/1731-4 (Angola); CB 46 (California); Apagbaala,

IT82E-18, IT84S-2049, Mouride, 58-57 y Kvx525 (África Occidental) y PI 441917 (Puerto

Rico).

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Tablas 5. Composición de los macroelementos en la semilla de germoplasma de caupí de Angola, California y África Occidental sembrada en Isabela, Puerto Rico en marzo y diciembre de 2010 en ppm.

Genotipo Fe

Mn

Zn

B

Mo

Al

Cu

Fe

Mn Zn B

Mo

Al

Cu

marzo 2010 diciembre 2010 Angola 030714-1 62 14 39 14 2 24 6 63 14 43 27 1 19 9 030714-4 62 14 45 18 3 12 7 60 15 43 27 2 16 7 124/1375-3 57 17 45 16 1 13 9 79 18 40 28 2 18 13 124/1454-4 62 13 56 14 1 17 6 67 14 39 24 1 23 7 124/1454-5 65 13 46 13 2 10 7 66 13 47 25 1 22 7 124/1731-1 59 14 50 15 2 12 8 66 15 47 27 2 19 8 124/1731-4 73 15 53 17 2 9 8 79 16 41 29 2 43 13 124/1764-2 59 16 36 16 3 18 5 64 15 40 26 1 18 7 124/1859-2 49 12 32 17 1 12 5 . . . . . . . 124/2122-3 44 14 46 20 0.02 21 5 . . . . . . . 124/2469-1 52 18 40 16 2 10 8 57 15 45 28 2 22 6 124/2783-1 48 17 39 16 1 18 8 58 16 46 27 1 24 7 124/2783-4 44 16 40 16 2 15 7 63 17 40 28 1 19 8 2870-1 60 14 39 16 2 12 6 59 19 42 28 1 35 8 2870-5 46 16 34 14 1 12 7 55 14 43 26 1 34 8 124/2983-5 51 16 37 18 1 12 4 . . . . . . .

Rango 44-73 12-18 32-56 13-20 0-3 9-24 4-9 55-79 13-19

39-47 24-29 1-2 16-43 6-13

Media 56 15 42 16 2 14 7 64 15 43 27 1 24 13

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Jul/Dez 2017 | 173

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Tabla 5. Continuación Genotipo Fe Mn Zn B Mo Al Cu Fe Mn Zn B Mo Al Cu

marzo 2010

diciembre 2010

California 524B 43 15 50 17 3 11 13 53 13 37 24 0.4 17 10 CB 27 41 13 44 18 2 17 13 62 12 53 31 1 19 13 CB 46 42 15 42 17 2 10 11 39 13 45 28 1 18 12

Rango 41-43 13-15 42-50 17-

18 2-3 10-17 11-13 39-

62 12-13

37-53 24-

31 0.4-1 17-19 10-13

Media 42 14 45 17 2 13 12 51 13 45 28 0.8 18 12 África occidental

Apagbaala 54 14 42 16 4 15 8 58 13 39 25 1 25 8 Bambey 21 48 15 42 17 3 10 7 62 20 42 31 1 17 9 Ife Brown 44 14 61 17 4 13 8 59 14 38 27 1 27 8 IT82E-18 44 13 54 13 4 11 8 49 14 43 25 1 14 7 IT84S-2049 59 13 42 15 3 8 12 55 14 47 29 1 25 13 IT90K-284-2 47 10 39 17 2 12 8 43 8 41 30 1 18 10 IT95K-1491 48 15 49 16 11 12 7 58 15 45 26 1 17 8 IT97-499-39 49 14 40 15 2 12 12 57 12 36 26 1 17 9 Melakh 47 12 42 15 3 10 10 40 13 44 26 1 20 8 Mouride 38 13 32 16 4 10 10 51 13 37 25 1 20 12 Yacine 45 15 40 20 4 10 9 57 13 60 32 1 21 10 58-57 59 17 45 18 4 10 9 68 17 46 24 1 45 10 IT98K-555-1 53 14 21 17 2 12 7 55 14 41 31 1 29 8

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174 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

79

Tabla 5. Continuación Genotipo Fe

Mn Zn B

Mo Al Cu Fe

Mn Zn B

Mo

Al

Cu

marzo 2010 diciembre 2010

África Occidental

KVx403-P-20-T 45 11 45 15 2 11 9 51 12 46 22 1 17 10 KVX525 47 13 46 16 2 10 7 61 14 65 26 1 18 7 SuVita 2 42 14 42 16 3 8 9 53 13 46 26 1 20 12 UCR288(TVx1948) 48 13 44 17 2 10 8 53 12 38 27 1 24 7 Tvu 7778 62 15 39 18 3 14 9 59 15 42 24 1 20 10

Rango 38-62 10-17 21-61 13-20 2-11 8-15 7-12

40-68 8-20 36-65 22-32

1-1 14-45 7-13

Media 49 14 43 16 3 11 9 55 14 48 27 1 22 9 Puerto Rico Gorda 45 17 45 16 3 10 11

59 16 37 27 1 17 12

PI 441917 35 25 33 25 8 17 6 63 11 42 29 1 22 9 Red River 61 17 39 24 1 34 7 Iron Clay 62 18 36 27 1 41 9

Rango 35-40 17-25 33-45 16-25 3-8 10-17 6-11 59-63

11-18 36-42 24-29 1-1 17-41 7-12

Media 40 21 39 21 6 14 9 61 16 39 27 1 29 9

Rango general 35-73 10-25 21-61 13-25 0.02-11 8-24 4-13

39-79 8-20 36-65

22-32 0.4-2 14-45 6-13

Media general 51 15 42 16 3 13 8 58 45 27 1.1 23 9 DMS 16.0 NS NS 4.9 NS NS 2.5 14.3 3.1 NS NS NS NS 4.3 CV(%) 14.3 29 21.2 16.6 93.1 11.3 16.7 15.2 13.2 37.5 12.8 63.3 61.1 28.9

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Jul/Dez 2017 | 175

David António Ndengoloka

El porciento de proteína de las hojas de las líneas de caupí fue evaluada para la siembra

de diciembre de 2010. No se encontraron diferencias significativas entre las líneas en %

de proteína de las hojas aunque hubo un intervalo de 28 a 39 % (Tabla 6). El promedio del

porciento de proteína de las hojas (34%) es muy superior a los promedios de porciento de

proteína de la semilla. Estos resultados son similares a los encontrados por Bittenbender et al.

(1984) y Barret, (1994) que afirman que las hojas de caupí contienen más proteína y hierro que la

semilla. Esto confirma lo reportado previamente por Berry (1981) e Imbamba (1973) que el

porcentaje de proteína en la hoja tiene un intervalo de 29% a 43%, aunque el porciento de

proteína en las hojas puede variar durante el desarrollo del cultivo. Los valores de proteína en la

semilla variaron entre 21 y 33%.

Se encontraron diferencias significativas entre las líneas en la concentración de potasio

(K), calcio (Ca) y magnesio (Mg) en las hojas de caupí (Tabla 6). Las hojas del germoplasma de

Angola tuvieron un intervalo de 2.02 a 2.82 % para contenido de potasio, con una media de 2.38

% inferior si lo comparamos con el germoplasma de California, cuyo intervalo fue de 2.42 a

2.69% con media de 2.55%. Sin embargo el germoplasma de África Occidental tuvo un intervalo

de 2.19 a 3.31% con media de 2.57%, superior al de los dos germoplasma anteriormente

mencionados. Asimismo para el germoplasma de Puerto Rico el intervalo fue de 2.35 a 2.94%

con media de 2.55%, similar al del germoplasma de California, pero diferente a los

germoplasmas de Angola (2.38%) y de África Occidental (2.57%), la media superior de todos los

germoplasmas.

Con relación al calcio el germoplasma de Angola tuvo un intervalo de 2.27 a 3.07 % con

la media de 2.79, que fue superior el germoplasma de California que tuvo, un intervalo de 2.04 a

2.33% con la media de 2.18. El germoplasma de África Occidental tuvo un intervalo de 1.77 a

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

81

2.89% con media de 2.34%, superior al germoplasma de California (2.18%) e inferior al

germoplasma de Angola (2.79%). Para el germoplasma de Puerto Rico el intervalo fue de 1.97 a

2.73% con una media de 2.35 %, superior al germoplasma de California (2.18 %) y África

Occidental (2.34%). El germoplasma de Angola tuvo la media de 2.79% que fue superior

comparado con caupí de otras regiones.

Las hojas del germoplasma de Angola tuvieron un intervalo de magnesio que osciló entre

0.33 a 0.44% con una media de 0.38%, inferior se comparamos con el germoplasma de

California que tuvo la media de 0.40 a 0.50% con intervalo de 0.45%. Por otro lado el

germoplasma de África Occidental tuvo un intervalo de 0.39 a 0.58 con la media de 0.44 que fue

superior a la media de germoplasma de Angola (0.38 %) e inferior a la media de germoplasma de

California (0.45%). El germoplasma de Puerto Rico tuvo un intervalo de 0.37 a 0.52% con media

de 0.33% inferior entre todos los germoplasmas.

No se encontraron diferencias estadísticas significativas entre las líneas para

concentración de fósforo en las hojas. Sin embargo, el germoplasma de caupí alcanzó un

intervalo de 0.25 a 0.30% con media de 0.28%.

Los microelementos evaluados fueron hierro, boro, aluminio y cobre (Tabla 6). Las hojas

del germoplasma de Angola mostraron un intervalo de hierro que oscilaron entre 329 ppm a 723

ppm, con media de 491 ppm, superior al germoplasma de California que presentó una intervalo

de 352 ppm a 406 ppm con media de 388 ppm. Para el germoplasma de África Occidental el

intervalo fue 301 a 524 ppm con la media de 421 ppm, superior al del germoplasma de California

(388 ppm) e inferior al del germoplasma de Angola (491 ppm). El intervalo del germoplasma de

Puerto Rico fue de 415 ppm a 498 ppm con media de 445 ppm, que fue superior al del

germoplasma de California (388 ppm) y al germoplasma de África Occidental (421 ppm), con

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Jul/Dez 2017 | 177

David António Ndengoloka

82

excepción del germoplasma de Angola que tuvo la media de 491 ppm, superior entre todos los

grupos.

No se encontraron diferencias estadísticas significativas entre los genotipos para las

concentraciones de manganeso y cinc en las hojas. El germoplasma de Angola presentó una

media de 266 ppm de manganeso y 23 ppm de cinc.

Para el boro se constató que el germoplasma de Angola tuvo el intervalo de 25 ppm a 36

ppm con media de 30 ppm, inferior a la media del germoplasma de California que tuvo una

media de 29 ppm y un intervalo de 25 ppm a 33 ppm. El germoplasma de África Occidental

alcanzó el intervalo 25 ppm a 43 ppm con media de 33%, superior al del germoplasma de Angola

(30 ppm) y al germoplasma de California (29 ppm). El germoplasma de Puerto Rico tuvo el

intervalo de 27 ppm a 45 ppm con media de 36 ppm, superior al resto de los germoplasmas.

En el caso de la concentración de molibdeno en las hojas, no se encontraron diferencias

estadísticas significativas entre los genotipos de caupí. El germoplasma de Angola tuvo la

media de 0.66 ppm de molibdeno.

Las hojas del germoplasma de Angola tuvieron el intervalo de 240 ppm a 680 ppm de Al

con media de 413 ppm. El germoplasma de California que tuvo el intervalo de 277 ppm a 340

ppm con media de 319, inferior al de Angola. Para el germoplasma de África Occidental el

intervalo fue de 218 ppm a 485 ppm con media de 363 ppm, superior al del germoplasma de

California (319 ppm) e inferior al germoplasma de Angola (413 ppm). El germoplasma de Puerto

Rico alcanzó un intervalo de 319 ppm a 438 ppm con media de 392 ppm, superior a la media del

germoplasma de California (319 ppm) y el germoplasma de África Occidental (363 ppm). Por

consiguiente, las hojas del germoplasma de Angola presentaron las mayores concentraciones de

aluminio entre todos los germoplasmas.

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178 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

83

Las hojas del germoplasma de Angola tuvieron el intervalo de 10 ppm a 13 ppm para el

cobre con una media de 12 ppm. Este valor es inferior si comparamos con el germoplasma de

California que tuvo la media de 15 ppm a 16 ppm con media de 15 ppm. El germoplasma de

África Occidental tuvo un intervalo de 10 ppm a 23 ppm con media de 14 ppm, superior a la

media del germoplasma de Angola e inferior al germoplasma de California. En caso del

germoplasma de Puerto Rico, el intervalo fue de 10 ppm a 13 ppm con una media de 12 ppm,

similar a la media del germoplasma de Angola y diferente de los resto del germoplasmas. La

media de germoplasma de California (15 ppm ) fue superior al resto de los germoplasmas.

Caupí constituye un alimento importante en dietas de muchas familias con bajos recursos

en África y en algunas partes del mundo. En Angola muchas familias consumen el caupí en

forma fresca las vainas, hojas y granos secos. Entonces esto es un hallazgo muy importante para

los genotipos de Angola que los agricultores cultivan, e igualmente es importante conocer el

potencial de germoplasma de otras regiones del mundo que pueden ser introducidos a Angola

para su mejor aprovechamiento. Es importante entender cómo se ha seleccionado el

germoplasma en Angola para establecer los objetivos de fitomejoramiento de caupí en el futuro.

Igualmente es importante conocer el potencial del germoplasma de otras regiones del mundo que

pueden ser introducidos en Angola para su mejor aprovechamiento.

Además los resultados tienen gran implicación en la agricultura angolana, ya que

significa un paso dado para iniciar programas de mejoramiento de caupí con el objetivo de crear

nuevos genotipos que se adapten a las condiciones agrícolas y combinar características de

nutrición, agronómicas, y resistencia que permitan ofrecer mejores líneas a los agricultores y

contribuir para aumentar la seguridad alimentaria en Angola.

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Jul/Dez 2017 | 179

David António Ndengoloka

Tablas 6. Concentración de los macroelementos y microelementos ( ppm ) en la hoja de germoplasma de caupí de Angola, California y África Occidental sembrada en Isabela, Puerto Rico en marzo de 2010 y diciembre 2010.

Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg Fe Mn

Zn

B

Mo

Al

Cu

Angola

030714-1 34 5.50 0.28 2.54 2.90 0.42 434 237 30 30 0.24 276 11 030714-4 28 4.47 0.32 2.82 2.75 0.37 416 267 25 36 0.47 335 12 124/1375-3 33 5.22 0.24 2.11 2.81 0.37 416 300 25 32 0.66 388 13 124/1454-4 34 5.36 0.23 2.21 2.89 0.41 444 398 23 30 0.30 356 11 124/1454-5 34 5.36 0.22 2.57 2.84 0.36 447 289 21 30 0.40 375 11 124/1731-1 34 5.48 0.31 2.51 2.88 0.37 601 252 28 28 0.24 481 11 124/1731-4 33 5.36 0.25 2.40 2.96 0.39 723 313 20 31 0.41 597 11 124/1764-2 33 5.35 0.21 2.59 2.58 0.34 545 230 25 34 0.14 500 12 124/2469-1 33 5.32 0.26 2.29 2.47 0.36 510 204 21 34 0.55 465 12 124/2783-1 32 5.14 0.21 2.02 3.07 0.44 366 287 20 28 0.19 299 13 124/2783-4 32 5.13 0.27 2.09 2.93 0.39 720 218 21 25 0.43 680 13 2870-1 32 5.16 0.23 2.37 2.27 0.36 329 257 20 29 0.15 240 10 2870-5 31 4.89 0.21 2.47 2.94 0.33 426 207 23 28 0.33 379 10

Rango 28-34 4.47-5.50

0.21-0.32

2.02-2.82

2.27-3.07

0.33-0.44

329-723

204-398 20-30 25-36

0.14-0.66

240-680 10-13

Media 32.5 5.21 0.25 2.38 2.79 0.38 491 266 23 30 0.35 413 12 P.T=Proteína

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Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

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Tabla 6. Continuación Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg Fe

Mn

Zn

B

Mo

Al

Cu

California

524B 34 5.47 0.30 2.69 2.18 0.40 406 217 22 30 0.21 339 15 CB 27 35 5.64 0.25 2.53 2.33 0.50 406 215 25 33 0.05 340 15 CB 46 36 5.77 0.30 2.42 2.04 0.46 352 195 23 25 0.10 277 16

Rango 34-36 5.47-5.77

0.25-0.30

2.42-2.69

2.04-2.33

0.40-0.50 352-406

195-217 22-25 25-33

0.05-0.21

277-340 15-16

Media 35 5.63 0.28 2.55 2.18 0.45 388 209 23 29 0.12 319 15 África Occidental Apagbaala 38 6.12 0.26 2.44 2.10 0.39 392 181 20 31 0.19 309 13 Bambey 21 36 5.82 0.24 2.31 2.10 0.50 301 220 23 35 0.21 218 12 Ife Brown 36 5.79 0.27 3.02 2.27 0.40 505 266 21 36 0.33 439 13 IT82E-18 37 5.84 0.28 2.47 2.18 0.43 520 248 35 43 0.44 472 14 IT84S-2049 38 6.12 0.29 2.78 2.34 0.58 393 345 21 39 0.14 308 17 IT90K-284-2 33 5.24 0.26 2.20 2.89 0.43 485 260 32 36 0.17 412 12 IT95K-1491 34 5.38 0.21 2.72 2.63 0.45 524 235 20 29 0.21 432 10 IT97-499-39 35 5.55 0.28 3.31 2.60 0.42 358 182 25 31 0.14 293 16 Melakh 36 5.78 0.28 2.39 2.40 0.44 408 239 25 35 0.15 326 14 Mouride 37 5.99 0.26 2.70 2.32 0.47 459 267 25 30 0.20 372 17 Yacine 36 5.74 0.29 2.83 1.77 0.44 370 184 24 25 0.30 296 12 58-57 39 6.29 0.25 2.71 1.97 0.43 381 248 24 39 0.22 408 23 IT98K-555-1 31 5.01 0.23 2.60 2.71 0.39 417 251 18 32 0.10 378 10

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Jul/Dez 2017 | 181

David António Ndengoloka

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Tabla 6. Continuación Genotipo % PT % N % P % K % Ca % Mg Fe

Mn

Zn

B

Mo

Al

Cu

África ocidental KVx403-P-20-T 36 5.69 0.22 2.57 2.55 0.40 515 243 20 31 0.18 485 16 KVX525 37 5.88 0.19 2.22 2.29 0.43 374 267 20 30 0.19 320 13 SuVita 2 36 5.84 0.24 2.40 2.19 0.46 337 183 28 25 0.18 284 18 UCR288(TVx1948) 32 5.15 0.21 2.19 2.29 0.39 469 213 22 35 0.26 435 12 Tvu 7778 29 5.55 0.23 2.42 2.56 0.44 369 187 25 33 0.21 349 16

Rango 29-39 5.01-6.29

0.19-0.29

2.19-3.31

1.77-2.89

0.39-0.58

301-524

181-345 18-35 25-43

0.10-0.44

218-485 10-23

Media 35 5.71 0.25 2.57 2.34 0.44 421 234 24 33 0.21 363 14 Puerto Rico Gorda 33 5.35 0.29 2.35 2.23 0.52 498 336 27 27 0.16 416 13 PI 44 1719 34 5.43 0.27 2.53 2.73 0.42 415 295 24 36 0.18 319 11 Red River 33 5.26 0.22 2.94 1.97 0.44 416 230 25 45 0.40 394 12 Iron Clay C. 33 5.24 0.22 2.36 2.47 0.37 449 191 19 34 0.16 438 10

Rango 33-34 5.24-5.43

0.22-0.29

2.35-2.94

1.97-2.73

0.37-0.52

415-498

191-336 19-27 27-45

0.16-0.40

319-438 10-13

Media 33 5.32 0.25 2.55 2.35 0.44 445 263 24 36 0.23 392 12

Rango general 28-39 4.47-6.29

0.19-0.32

2.02-3.31

1.77-3.07

0.33-0.58

301-723

181-398 18-35 25-45

0.05-0.66 218 680

Media general 34 5.49 0.25 2.50 2.48 0.42 445 246 24 32 0.25 380 13 DMS(0.05) general NS NS NS 0.3 0.5 0.06 225.1 NS NS 5.7 NS 233.4 3.1 CV(%) 12.4 11.8 19.7 8.6 12.1 10.1 31.1 25.7 21.9 10.8 0.31 37.8 14.6

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182 | Ntetembwa - Revista Académica do ISPT

Estudio de la diversidad fenotípica de germoplasma de Caupí ...

Conclusiones

Se encontró diversidad fenotípica entre las líneas de germoplasma para rendimiento de semilla y características de valor agronómico, nutricional y económico.

Hubo diferencias de los caracteres agronómicos en las siembras de marzo y diciembre de 2010.

Se identificó el germoplasma de Angola que mostró alto potencial de rendimiento y otros que contienen mayores niveles de hierro y cinc en la semilla.

La composición elemental del porciento de proteína de la hoja fue muy superior a la composición del porciento de proteína en la semilla.

Los germoplasma de África Occidental y Angola mostraron mayor diversidad fenotípica en comparación el germoplasma de California y de Puerto Rico.

Los genotipos con combinación de características útil como vigor de la planta, madurez y rendimiento fueron seleccionados los siguientes: 124/1375-3, 124/1731-4, 124/1764-2, 124/2469-1, 124/2783-1, 124/2783-4 y 2870-5 (germoplasma de Angola); 524B, CB 27 y CB 46 (Germoplasma de California); Apagbaala, Bambey 21, Ife Brown, IT 82E-18, IT 90K-284-2, IT84S-2049, 58-57 y Tvu 7778 (germoplasma de África Occidental); PI 44 1917, Iron Clay y Red River (germoplasma de Puerto Rico).

Recomendaciones

Seguir evaluando el mismo germoplasma en Angola para tener una idea clara de su comportamiento y su potencial como progenitores para el programa de fitomejoramiento en Angola.

Estudiar la herencia del contenido de proteína y microelementos en la semilla y hojas de caupí.

Aumenta la diversidad fenotípica y genotípica del germoplasma de Puerto Rico, a través de cruzamiento con germoplasma de otras regiones del mundo.

Referências bibliográficas Barret, R.P.1990. Legume species as leaf vegetables. Pages 391-396 in Advances in new crops edited by J. Janick and J.E Simon, Timber Press, Portland, OR, USA. Berry, R.E. 1981. Tropical fruits and vegetables as potential protein sources . Food Technology 35(11): 45-49. Bittenbender, H.C., R.P, Barret, and B.M Indire-Lavusa. 1984. Beans and cowpea as leaf vegetable and grain legumes, occasional monograph series , No. I, Bean/Cowpea CRSP, Michigan State University, East Lansing, MI, USA.34pp.

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David António Ndengoloka

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Artigo #8 Ética Tokoista na construção do Homem novo

Patrício Batsîkama, Ph.D. [email protected]

Resumo Simão Toko é conhecido como profeta ético, e o tokoismo enquanto doutrina social. A Igreja do Nosso Senhor Jesus Cristo no Mundo – os Tokoístas apresenta uma estrutura religiosa fortemente hierarquizada e constrói o ―homem novo‖ na base da paz. Escolheu-se aqui explorar a ética tokoista na sua teorização, desconstruir a sua argumentação para melhor perceber-se do seu aporte. Palavras-chave: Tokoismo, Ética, Homem novo, Abstract Simão Toko est bien connu comme un prophète étique, et le tokoisme est sa doctrine sociale. L‘Église du Notre Segneur Jésus Christ au Monde – Os Tokoistes présente une structure réligeuse fortement hiérarchisée et construit l‘ « Homme nouveau » através de la paix. Nous avons choisi d‘exploiter ici l‘éthique tokoiste dans sa théorisation, déconstruir son argumentation pour meiux comprendre son apport. Mots-clé : Tokoisme, Éthique, Homme nouveau, Legado da ética no mundo contemporâneo

O mundo actual precisa de novas teologias. Aquelas que nortearam o surgimento do Estado-nação e da sociedade moderna – independentemente do diálogo propício que apresentam – ainda parecem reféns da ordem instituída pelas heranças gnosiológicas que pouco servem às exigências actuais. Jacques Derrida o mostra claramente nos seus seminários (2002) sobre La bête et le Souverain (que comentaremos brevemente adiante).

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Para situar melhor a ética tokoista, iremos lançar uma breve revisão nocional sobre a ética40 tal como foi produzida pelos filósofos, para depois debruçar-nos sobre a estrutura tokoista da ética primordial (a partir do termo ―toko‖), e enriquecê-la com as nossas humildes contribuições.

Derivado de ethos, que quer dizer ―bom costume‖, a ética foi tida como forma de regulação comportamental na base da razão que se fundamenta no eu/homem interior. Ora tida como filosofia prática, a sua teorização sobre o ―bem‖ e o ―mal‖ fez dela uma ciência normativa para indicar o caminho da conduta.

Da Grécia antiga, herdámos a ética aristotélica que é uma démarche empiricista e racionalista ao mesmo tempo. A Idade Média europeia desenvolveu a ―ética externa‖, moral. Justifica-se isto partindo do papel desempenhado pela Igreja Católica romana. Neste período, a Lógica aportou consideráveis transformações na ―ética moral‖, de modo que o Renascimento viu reforçado o poder da Igreja junto das instituições políticas. O Estado enquanto aparelho da gestão humana das questões cívicas precisava da Igreja para garantir a Moral social e paz dos espíritos. Ora, a Igreja era a solução.

Nos séculos das Luzes, os filósofos devolveram à ética o seu valor interno da razão. Para Immanuel Kant, a estrutura da Ética é um binómio: ―Eu absoluto‖ e ―Eu livre‖. A mesma postura é sustentada por René Descartes: ―Eu racional‖ e ―Eu egocêntrico‖. Kant fala de ―Eu a priori‖ ou ―Eu transcendental‖ que, antes de ser realmente racional, é absoluto e livre. Todo o ser humano realiza a experiência ontológica da sua existência e liberdade, mesmo antes de ser dotado da ―inteligência‖ que lhe permite reflectir e raciocinar. René Descartes opta pelo contrário: ―Penso, logo existo‖. A razão kantiana vem depois do absoluto/livre: o ―Eu livre‖ faz uso da razão, para depois realizar a consciência e optar por uma doutrina. René Descartes preferiu a auto-consciência (Hegel retomou essa discussão, da sua forma), que dá sequência à teoria ou ao dogma funcional. Estes dois integram a ética racionalista, fundada numa das premissas aristotélicas.

Há, ainda, Jean Jacques Rousseau que prefere o ―ser social‖. Isto é, na verdade, a compreensão sociológica do ―Eu livre‖ e ―Eu egocêntrico‖. Se é verdade que todas as pessoas nascem livres, também é verdade que, por compreender a existência a partir do seu ―Ego‖, todo o indivíduo é idiossincrático. Logo, torna-se um perigo que, tal como o sublinha Thomas Hobbes (Leviathan41), pela razão ou pela irracionalidade, ele abuse da sua própria liberdade pelo seu inelutável egoísmo, em detrimento da liberdade dos demais42. Por isso, é preciso regularizá-lo. Daí, o ―ser social‖, para Rousseau, simboliza

40 ―Historiquement, le mot éthique a été apliqué à la Morale sous toutes ses formes, soit comme science, soit comme art de diriger la conduite. L‘éthique politique a deux objects principaux : la culture de la nature intelligente, l‘institution du peule‖ (Didérot, Options des anciens philosophes): Lalande, 1993: 305. 41 Trata-se do modelo do Poder no século XVII (o livro foi lançado em 1651). Leviathan reporta-se em: (1) governo legítimo com o poder central para evitar o caos; (2) contrato social como garantia institucional para evitar a guerra civil. O título (Leviathan ou Leviatã) é a apelação da quimera bíblica, e reporta-se ao Poder de um Estado eclesiástico e civil. Esta questão é expressamente abordada no capítulo X. 42 O Ser Humano constituiu o perigo para a sua própria integridade física e harmonia social.

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o desejo de manter a ordem social e a harmonia contractual entre os integrantes egoístas de um espaço social bem delimitado.

Se a ética filosófica busca modalidades concretas pelas quais a razão organiza-se e simboliza a existência material, podemos ser levados a perguntar se uma possível Ética tokoista seria filosófica? Da mesma forma e partindo do mesmo pressuposto, Schleiermacher estruturou a ética cristã em cinco aspectos43 que, apesar de algumas críticas, continuam vigorar ainda em várias perspectivas. Esta ética cristã é funcionalmente uma ética valorativa.

É peremptório realçar aqui a teoria da desconstrução de Jacques Derrida antes de nos debruçarmos sobre a ética tokoista. As razões formuladas sobre a ética desde a Grécia antiga estão na própria significação da palavra e no discurso que emprega: ―bom costume‖, ethos. Aqui surgem as dúvidas: ―bom‖ para quem? Para x ou para y? Para a maioria ou a minoria? Para o interno ou o externo? Em que perspectiva, uma vez que o ―bom‖ indica a ―qualidade‖ e esta é variável e integra diferentes gostos? Aristóteles fez as mesmas perguntas na sua época, com uma visão relativamente diferente do mundo contemporâneo.

A divisão entre animal/besta e homem/soberano44 simboliza a relação entre Ir-Ratio e Ratio. A ética é especulativa e empirista, na medida em que o ―Eu‖ é absoluto/livre e racional/egocêntrico, simultaneamente. Ir-Ratio não se reverte sempre na falsidade, nem o Ratio na verdade. Associar a animalidade/falsidade e a irracionalidade obedece a uma relação empirista da ―produção dos factos‖. Derrida nega a uni-visão dessa ―produção dos factos‖ e busca a atitude de Soberano/racionalidade perante o inimigo que representa a ameaça à soberania. Sancionar o inimigo/rebelde com a morte45, por exemplo – ainda que a lei condenatória assim o estipule – associa o Soberano à animalidade ou irracionalidade. Como K. Jaspers, Derrida introduz aqui a ideia de uma ética analítica, admitindo que o ―Homem/soberano‖ é um ―animal racional‖. Quer com isso dizer que a racionalidade não é alheia à animalidade. Ele situa este conflito na existência do ―Eu‖46. Talvez se perceba por isto as razões que levam a não haver fronteiras epistemológicas entre animal/besta e homem/soberano, e a perceber-se petit-à-petit o ―Ser Social‖ enquanto relação gnosiológica de ―Eu absoluto livre‖ e ―Eu racional egocêntrico‖. Essa relação estabeleceu normas necessárias para gerir a natureza. Nessa senda, o nomos/lei e a

43 Estes aspectos são:

i. Uma metafísica da Personalidade e da individualidade; ii. Um ―socialismo invulnerável‖; iii. Uma ultrapassagem da falsa oposição entre desigualdade e igualitarismo; iv. A produtividade social da caridade; v. O carácter transcendente do reino de Deus como objecto e valor últimos da existência.

44 A crítica que Jacques Derrida faz nestes seminários é profunda. Limitamo-nos aqui apenas a questões básicas da ética e assumimos as nossas opiniões na comparação com o Tokoismo. 45 ―Chez certain, il y a même des lois pour exciter à ce genre de vertu ; em Chalceldoine, dit-on, on est décoré d‘autant d‘anneaux qu‘on fait de campagnes ; en Macedoine, autrefois, une loi imposait à celui qui n‘avait tué aucun ennemi de porter un licou ; chez les Scythes, dans les fêtes où la coupe circulait à la ronde, celui qui n‘avait pas tué ennemi n‘avait pas le droit d‘y boire…‖ (Aristóteles, Politique, liv. VII, chap 2, 1324 b – 1325 a 7). 46 ―Eu/matéria‖; ―Eu/não matéria‖. Acrescentamos: ―Eu/vontade‖.

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physis/natureza precisa dialogar na base dos factos e encontrar nesta experiência a revisão contínua da ordem. Esta assume uma definição organizacional e relacional de normos na manutenção de physis social.

É interessante citar Jacques Derrida aqui. A sua teoria da desconstrução vai ao encontro daquilo que se verificou, historicamente, em relação ao Tokoismo, que assumiu a desconstrução da colonização religiosa europeia em relação à figura central do Cristo. A reapreciação da salvação serviu de alavanca para que os tokoistas reclamassem e reconquistassem a sua liberdade em busca de salvação terrestre: bem-estar, educação, saúde, etc. Numa só palavra, libertação.

Estrutura tokoista da ética: Physis e Nomos

A estrutura da ética tokoista parte da natureza/physis ontológica, que foi estudada por Simão Toko em 1948 quando reflectia sobre a Morte47. O Physis/natureza do ―Eu‖ se subdivide-se em:

(1) ―Eu não matéria‖: a. Toko: sopro/Espírito de Deus (―Eu absoluto‖ e ―Eu livre‖); b. Toko: inteligência (―Eu racional‖).

(2) ―Eu matéria‖:

a. Toko: corpo santificado: ―Eu sacer‖; b. Toko: renovo/parto: ―Eu criativo‖; c. Toko: sacrifício redentor: ―Eu salvador‖.

(3) ―Eu alma‖:

a. Toko: música; harmonia: ―Eu concordância‖; b. Toko: Bem-estar, felicidade: ―Eu alegre‖; c. Toko: luz (Estrela de Alva); dar luz: ―Eu produtivo‖.

Sócrates contava com dois postulados: (1) ―‖ (gnoti santhon): conhece-te a ti mesmo, atribuído ao Apolo de Delfos48; (2) ―é melhor estar em desacordo com o mundo todo do que, sendo um, estar em desacordo comigo mesmo‖49. Os gregos subdividiam o indivíduo em sôna (Imago Dei), psyche (corpo), pneuma (homem interior, alma), nous (espírito) e suneidêsis (consciência: voz racional interior). Simão Toko sintetiza isto tudo em três entidades ontológicas. ―Ghoti santhon‖ implica as relações sincategoremáticas entre ―eu não matéria/Espírito‖, ―Eu matéria/Corpo‖ e ―Eu alma‖. Quer dizer, cada indivíduo deve vencer as suas dúvidas apriorísticas antes

47 Espírito, Corpo e Alma. Como podemos reparar, não difere da tradição filosófica da Grécia, que foi amplamente desenvolvida pelos filósofos ao longo dos tempos. Consideram o Espírito de ―Eu não matéria‖, o Corpo é ―Eu matéria‖ e, finalmente, a Alma é ―Eu alma‖. 48 É na verdade oriundo do Egipto, tal como os templos egípcios o testemunham. 49 Platão atribuiu estas palavras a Sócrates.

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de integrar-se plenamente na sociedade e manifestar a sua liberdade individual50. O sentido egípcio de santhon – claramente ligado a théeion/inteligência (espírito de Anton) – é duplo. Primeiro: consciência kantiana e auto-consciência cartesiana enquanto espírito primitivo. Segundo: entre o ―mundo individual‖ e o ―mundo social‖ o santhon é o espírito do bem sublime. Isto é, toko: beleza.

O ―Eu não matéria‖ tokoista é a base interior da ética, cujos subsídios são sincategoremáticos como já vimos: ―Eu livre/absoluto‖ não pode se separar de ―Eu racional‖. A relação que ambos assumem parte da sua natureza: toko, ―Eu belo‖. Há uma feliz coincidência desta trama semântica de toko em relação a Kant, Descartes e Rousseau51 que citámos anteriormente. O início do Tokoismo associa-se ao livro de Joel, 2: 28 e esclarece-nos o ―Eu absoluto/livre‖ com a descida de Espírito Santo. Podemos perceber esta questão com alguma originalidade nas pinturas em 1948 de Simão Toko, cujas explicações complementares foram feitas no dia 10/01/201752: o espírito (sopro ou Théeion) retoma o seu absolutismo e liberdade depois de se separar do corpo.

O ―Eu matéria‖ constrói-se na consciência/auto-consciência de se sacrificar para os outros porque ele é o resultado de desejos alheios e opostos. Existem em cada ser vivo o espírito criador e a consciência do sacrifício para a continuação da existência: a utilidade da existência alicerça-se na ânsia de salvaguardar a continuidade do Physis em conservar a pureza física.

Finalmente o ―Eu alma‖. A concordância é a ponte natural entre os dois primeiros ―Eu‖. Ela alberga as primeiras experiências empíricas internas, que são – curiosamente – um conflito ontológico: a avidez da auto-consciência se realiza na busca de concordância entre as partes. A vontade que veicula no ―Eu alma‖ materializa a existência através da experiência da alegria.

Na base do que precede, a ética tokoista pode-se resumir na beleza (―Eu belo‖: toko) e opera-se em cinco relações epistemológicas53:

(1) Amor/espírito: a origem do amor é o espírito, de maneira que toda a beleza retrata o amor sublime por derivar da inspiração (não matéria) e garante a liberdade individual.

(2) Verdade/razão: a subjectividade e a objectividade do ―Eu absoluto/livre‖ relacionam-se na auto-observação da liberdade enquanto ―valor empirista‖, como capital axiológico cuja expansão nas esferas da liberdade de Outro é dialéctica.

(3) Destreza/coragem: a destreza traduz a existência cuja continuação repousa na coragem. É preciso predisposição de vencer a preguiça para alcançar resultados concretos.

50 ―A ética religiosa da fraternidade situa-se em tensão dinâmica com qualquer comportamento consciente-racional que siga as suas próprias leis. Em proporções não menores, essa tensão também ocorre entre a ética religiosa e as forças de vida ―deste mundo‖, cujo caráter é essencialmente não-racional, ou basicamente anti-racional‖. (Weber, 1982: 390). 51 Tal como definido anteriormente. 52 Explicações interessantes foram apresentadas no dia 10/01/2017 na Catedral Tokoista, pelo Dirigente tokoista. 53 As escritas à volta da pintura são esclarecedoras, embora com poucas condições para facilitar a leitura.

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(4) Simetria/organização: a simetria que se fundamenta na equidade pode regular, por ―cânones ontológicos‖, as inegualidades que existem (pela Physis) entre os componentes de qualquer sistema social.

(5) Harmonia/diferença: a beleza é imperecível. Do modo geral, os corpos são animados pela pulcritude que ocasiona a sua autarcia, como interpretação material da pluri-perpetuidade do nomos justo.

É na base destas cinco relações que se pode perceber a ideia da Cidade projectada por Simão Toko, como espaço constituído por vários espaços54 que importar-nos-ia comparar aqui com três obras de Aristóteles55. Mayamona identificou em 1948 os povoadores da Cidade que são, na nossa humilde interpretação: (a) ―Eu urbano‖ cuja base é a família, leis e terras; (b) ―Eu político‖ que é intelecto, justo e vendedor de ideias; (c) ―não-Eu‖56.

Simão Toko deseja que todos os integrantes da sociedade sejam ―urbanos‖. Isto é, sejam criados numa família bem constituída (identificada) e segura de liberdade e autonomia simbólica57: ―onde há o Espírito de Deus, há liberdade‖58. O bem-estar de cada indivíduo é o desejo deste pastor59. A urbanidade é consequência da acção das leis, de modo que o indivíduo – pela auto-consciência: razão – é o seu garante empirista e o seu fiscalizador especulativo. Finalmente, a visão de Simão Toko sobre as terras é simbólica: pertença simbólica do espírito. Lembramos aqui o théeion/toko (sopro) que é o espírito que vivificou o pó/terra. A família é assegurada pelas relações de parentesco, de amizade e ascéticas; e as terras são asseguradas por um conjunto de sistemas de segurança e integridade. Em ambos casos convergem em ―ter leis‖: numa são ―leis naturais‖ e na outra são ―leis humanas‖.

O ―Eu político‖ é inevitável na organização humana e na gestão de qualquer sociedade. Aristóteles é de opinião que ―o justo, na sociedade civil, é a ordem; e a justiça é o discernimento do justo‖60. O ―Eu político‖ precisa de ser, antes, um ―Eu urbano‖ justo, corajoso, sábio e moderado, ciente de que a Cidade é “uma comunidade dos semelhantes e, tem como objectivo a vida, a melhor possível‖61. Pressupõe-se que o ―Eu político‖ seja racional, e saiba diferenciar a razão vegetativa da razão racional. A primeira razão parte de desejar e pode ser involuntária e inconsciente, ao passo que a razão racional parte de conhecer e é voluntária e consciente. Isto leva o ―Eu político‖ a resolver o conflito interno de ―desejar/conhecer‖: (i) será que o desejar é desejável? (ii)

54 Ver a sua pintura. 55 Politique, Ética à Nicómaco e De l’Âme. São obras clássicas, e mencionamo-las como referências bibliográficas. Por se tratar de obras infindáveis de noções e que nortearam todos os filósofos (até o próprio Jacques Derrida que citamos), faremos apenas uma síntese. 56 Aquele que é alheio, com direito de participar no concerto como ―convidado‖. 57 Referimos a ―autonomia financeira‖; ―autonomia política‖, ―autonomia social‖, ―autonomia cultural‖, etc. 58 Bíblia: 2 Corintos, 3: 17. 59 Habermans, 2004: 35, 61-63. 60 Aristóteles, Politique, liv. I., cap. 1, 1252 b 27. 61 Aristóteles, Politique, liv. VII, cap. 7, 1228 a 36.

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será que o conhecer é cognoscível? Com isso, o ―Eu político‖ percebe-se da sua qualidade de justo, sábio, moderado e disciplinado. Por consequente, ter-se-á uma Cidade onde os seus habitantes gozarão de bem-estar.

Ghoti santhon – ―conhece-te a ti mesmo‖ – é o primeiro pilar da política. Partindo do pressuposto que haja uma diversidade ontológica (matéria, não matéria e alma), tudo parte do respeito das normas que predefinem a relação dos ―a priori ontológicos‖. O conceito de polis remete-se em público/político62 tanto que caberá ao político ―não estar em desacordo consigo mesmo‖ antes de desempenhar suas funções na polis (como o entendiam os gregos). Hannah Arendt associa esta realidade à ética na sua reflexão sobre a dignidade da política. Ora, a estrutura da ética tokoista apresenta uma explicação sobre a base política.

(1) ―Eu não matéria‖: (i) lei colectiva; (ii) espaço comum. (2) ―Eu matéria‖: (i) corpo social discrepante; (ii) forças sociais concorrentes da

felicidade; (iii) integridade territorial e o espírito patriótico. (3) ―Eu alma‖: (i) instituições que convergem e eliminam as assimetrias entre as

pessoas; (ii) integridade social e bem-estar geral; (iii) desenvolvimento.

O ―Eu urbano‖ pressupõe que o indivíduo aceita e participa na elaboração da ―lei colectiva‖ e garanta o espaço que esta lei protege. Deverá aceitar as divergências sociais [como condição sine qua non da sociabilidade], uma vez que considera-se um concorrente livre de opções com fins de alcançar a sua felicidade, sem portanto desvirtuar-se do espírito patriótico e distanciar-se de todos os riscos e perigos conta a integridade da sua pátria63. Enquanto integrante social, as instituições (do Estado) garantem que haja este espaço, que se pauta pelo desenvolvimento, tal como o escreveu Hannah Arendt:

―[…] a melhor forma do governo seria um estado de coisas em que os filósofos tivessem o máximo de oportunidades para filosofar, e isso significa um Estado em que tudo se ajuste aos padrões que provavelmente forneçam as melhores condições para tal‖.

Jacques Derrida é de opinião que o ―não respeito‖ à lei ou, a ignorância da mesma, é um acto de animalidade que perigaria, de alguma forma, que haja ―oportunidades para filosofar‖. Trata-se de ―animalidade por rebeldia‖ e não por instinto. A dose da liberdade excedeu para o ―extremo mal‖ aristotélico, de maneira que ―desrespeitar a liberdade‖ de outro – para o profeta ético Simão Toko – tratar-se-ia da privação do espírito de Deus. Seria, neste caso, ―animalidade por er-Ratio‖, por causa do contraste da animalidade com o espaço comum (que parece ameaçado). O pastor

62 Arendt, 2002: 100. 63 Ressalvamos aqui a acepção de Sócrates sobre a pátria que deve ser protegida por todos (Platão, República).

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angolano partilha a visão segundo a qual o Espírito ―obedece às leis próprias‖64 (Eu não matéria), o que marginaliza toda a rebeldia para a ―Eu matéria‖ possuidor de théeion/sopro.

Finalmente há ―não-Eu‖. Não é urbano nem político sequer, mas integra esta comunidade das semelhanças à margem da sua realização. Não é livre nem é absoluto porque ele próprio desconhece-se. Pode, em parte, simbolizar toda a pessoa humilde e oprimível ou escravizável e sem liberdade. A colonização reduziu os angolanos (ou melhor os africanos) a colonizados, pessoas sem liberdade, sem identidade, sem ―sonhos‖. Os tokoistas, de modo igual, foram oprimidos e maltratados durante três décadas (ou mais), sem desistir da sua fé e da profecia sobre a libertação. Simão Toko preocupou-se em torná-los ―Eu urbano‖ desde os primórdios, em 1949: ―analfabetos pregavam o evangelho‖. O Tokoismo assumiu uma identidade de liberdade. Mas não era suficiente naquela altura, nem durante todo o tempo que durou a colonização, até concretizar-se a profecia quando, por um lado, reconheceu-se oficialmente a sua Igreja (INSJCM – os Tokoistas) e, por outro, a criação das escolas primárias e superiores tokoistas abriram as suas portas, já na época da independência. Daí, a importância da nossa pesquisa sobre a Ética tokoista.

Como acabámos de ver, existe uma estrutura ética partindo da trama semântica do hagiónimo Toko sempre concomitante com os factos ocorridos. Ela constituiu a Physis tokoista, de onde as normas apriorísticas esclarecem as correlações gnosiológicas. Isto é, cada indivíduo experimenta o conflito ontológico para a sua realização humana e para garantir o seu bem-estar e a manutenção de uma sociedade organizada e próspera. O Tokoismo prepara este indivíduo para realizar o seu ―Eu livre/absoluto‖, ―Eu racional‖ e ―Ser social‖. No ponto a seguir, veremos a funcionalidade desta estrutura, falando da moral tokoista em comparação à pobreza.

64 Importa referenciar aqui a visão gnoseológica de Simão Toko em relação ao empirismo que é a doutrina que, reconhecendo ou não os princípios natos do indivíduo, não admite que o espírito tenha as suas leis próprias, diferentes das coisas conhecidas e, consequentemente, só faz basear o conhecimento do verdadeiro na experiência fora da qual tudo seria hipotético‖ (Lalande, 1951: 281).

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Desenho de Simão Toko em 1948

Fonte: AHU, Lisboa

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Moral tokoista contra a pobreza A funcionalidade da estrutura da ética tokoista completa-se pela moral, desde que esta ―desperte as paixões, que produzam ou impeçam a acção‖. David Hume completa esta premissa dizendo que ―a razão é, em si, totalmente impotente neste domínio. As regras da moralidade não são as conclusões da nossa razão‖. Este filósofo é de opinião que as distinções morais originam da razão:

―Divide-se geralmente a filosofia em especulativa e prática, e visto que a moralidade está sempre colocada na segunda, supõe-se a partir daí que ela ultrapassa os julgamentos tranquilos e pacíficos do entendimento. A experiência corrente o confirme que nos informa que os homens são constantemente governados por seus deveres, afastem-se de algumas acções pela opinião segundo a qual são injustas e são levados a outras segunda a opinião que são obrigatórias‖65.

A moral deriva de mores (hábitos), mas difere da ética por ser um conjunto de proibições66, regras e valores oriundos de exterior do eu/homem interior67. Há uma relação epistemológica entre ética e moral, tal como nesta sapiente reflexão que David Hume nos expõe68:

―A razão é a descoberta do verdadeiro ou do falso. O verdadeiro ou o falso consistem em um acordo ou um de acordo, seja com as relações reais entre as ideias, seja com a existência e o facto reais. Por conseguinte, o que não é susceptível neste acordo ou desacordo não pode sequer ser verdade ou falso, e não pode nunca ser um objecto da nossa razão. Ora, é evidente que as nossas paixões, volições e acções não são susceptíveis de um tal acordo ou desacordo: elas são as realidades e os factos originais, completos em si mesmos, não implicando nenhuma referência a outras paixões, volições e acções. Então, não é impossível que possam ser declaradas verdadeiras ou falsas e que sejam contrárias ou conformes a razão‖.

Lembramos que Kant considera o ―sujeito moral‖ como todo o indivíduo ―obrigado a agir segundo determinadas regras externas‖, e não apenas com base na razão interna. São regras necessárias regidas pelo bem em si e que orientam o agir bem.

65 Hume, 1993 : 51. 66 ―Si la moralité n‘avait aucune influence naturelle sur les passions des hommes et sur leurs actions, il serait vain de prendre tant de peine à l‘inculquer et rien ne serait plus stérile que cette multiplicité de règles et de préceptes que prodiguent tous les moralistes‖. (Hume, 1993 : 51). 67 Geralmente, este conjunto de proibições, regras e valores são impostas por uma ideologia, filosofia, política ou religião. Levam o Homem a fazer uma análise racional do seu comportamento perante os integrantes da mesma comunidade. 68 Hume, 1993: 53.

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Émile Durkheim, ao estudar o sagrado, percebeu-se que ―agir bem é obedecer bem‖69. Este autor percebeu-se no sentimento sagrado a explicação sociológica do sentimento da obrigatoriedade. A religião desempenha uma função importante para a moral social, sem a qual a animalidade por rebeldia (agir contra o sagrado) proporcionará insegurança para a sociedade e perigaria as relações humanas e as instituições que garantem a manutenção da harmonia. No ―Contract Social‖, Jean Jacques Rousseau faz uma reapreciação destas instituições enquanto suportes sociais do bem-estar individual. Feita esta introdução, vamos reapreciar dois pontos iniciais: (1) vontade colectiva como o sagrado primitivo; (2) o sagrado enquanto lei colectiva. Como já havia avançado David Hume, a moral é especulativa e prática. Nestes dois pontos, podemos compreender a origem dualista da Moral na perspectiva de que a obrigação conduz-nos à prática (comportamento), e a consciência desta obrigação salvaguarda – pelo sentimento – as relações reais da sociedade. Logo, a moral desperta as paixões, produz ou impede a acção, o que a razão não consegue fazer70. Não podemos perder de vista que Simão Toko é um religioso. Por esta razão, importa partir aqui do conceito do sagrado nos pressupostos da religião. Tomaremos por conceito, o de religere ou religare que faz com que a religião almeja duas finalidades sociais primordiais (que na verdade revertem-se nos dois pontos acima citados). Regrar a vida individual na conservação da moral (religere) e respeitar as normas estabelecidas (pela Natureza ou pelo acordo entre os humanos) para conservar harmoniosa a vida colectiva (religare). Nas primeiras etapas, a ―Igreja de Ñzâmbi‘a Simão Toko‖ preocupou-se visivelmente em regrar/religere a conduta moral dos tokoistas e não só. A sua integração na sociedade era a primeira etapa para garantir o seu bem-estar. Era preciso ser higiénico e saber ler e escrever para ter acesso ao emprego, como garante do bem-estar. Depois, convinha ter uma escolaridade qualitativa, valorizando as suas culturas endógenas de modo a propiciar um diálogo frutífero com a cultura regente instaurada pelo colonizador. E, finalmente, fazer frente aos desafios sociais. O primeiro desafio que Simão Toko sempre indicou é a ―luta contra a pobreza‖. Há para este pastor três categorias de pobreza. A primeira é a pobreza espiritual. Trata-se de ausência da inteligência, do sopro de Deus (théeion). A segunda é a pobreza material, que é a ausência de capitais simbólicos na sua afirmação identitária e social. A terceira é a pobreza social. Quem não obedece às leis naturais ou jurídicas desobedece ao espírito da natureza e ao espírito da harmonia. Uma sociedade constituída por pessoas com estas características, ainda que a maioria tenha altas qualificações universitárias, constitui uma pobreza social por estar privadas da felicidade. Levy-Bruhl é de opinião que:

―... uma moral, mesmo quando quer ser teórica, é sempre normativa e, justamente porque é normativa, nunca é realmente teórica‖71.

69 Durkheim, 1974: 12. 70 Hume, 1993: 51. 71 Levy-Bruhl, 1974: 12.

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As primeiras regras tokoistas têm um propósito prático. Parte-se do princípio de ―agir bem é obedecer bem‖, como o entendeu E. Durkheim. Este autor encontra no sentimento sagrado a explicação sociológica do sentimento da obrigatoriedade. A religião desempenha uma função importante para a moral social através do sagrado que faz perceber o ser colectivo, antes do ser contractual. Percebe-se isto no Tokoismo, principalmente na libertação da pobreza simbólica72. O profeta ético manifestou-se constantemente contra a pobreza muito cedo e criou, em 1944, o Fundo da Solidariedade. O seu objectivo foi eliminar a miséria dos oprimidos/colonizados, de maneira que o contexto histórico apresentou este profeta ético como um autêntico desafiador do colonizador. As regras que impôs aos tokoistas e algumas das suas cartas mostram que Simão Toko percebeu-se que, ―as acções não são meritórias pela sua conformidade à razão, nem o seu desmérito resultaria do contrário‖73. Era fácil para ele perceber-se disto uma vez que no seu movimento havia iletrados e letrados. A apreciação da razão – na diferenciação de falso e verdadeiro – entre os tokoistas poderia resumir-se a praticar o bem e evitar o mal como ―algo verdadeiro‖. O falso foi associado ao pecado perante a lei sagrada, transgressão da leinatural e infracção da lei dos homens (para a sua harmonia)74. Max Weber nos faz perceber que:

―Aos vivos cabe o cumprimento rigoroso e exemplar dos mandamentos divinos positivos, e isto, por um lado, para obter para si mesmos pelo menos o máximo de oportunidade durante a vida, em virtude da benevolência divina, e, por outro, para conquistar … a participação no reino da salvação… O desejo de participação no reino messiânico leva a intensificação das actividades religiosas…‖75.

72 A colonização simbolizou, enquanto sistema, a pobreza simbólica (Batsîkama, 2016: 302-305). 73 Hume, 1993: 53. 74 ―… la raison ne peut jamais prevenir ou produire immédiatement une action en le contredisant ou en l‘approuvant, elle ne peut être l‘origine du bien et du mal en Morale, dont on s‘accroche à dire qu‘ils ont cette influence- les ctions ne peuvent être louables ou blâmables, mais ne peuvent être raisonnables ou deraisonnables : par conséquent, louable ou blâmable ne sont pas synonymes de raisonnable et deraisonnable. Le mérite et le démérite dês actions contredisent souvent et commandent parfois nos tendances naturelles‖. Hume, 1993 : 53 75 Weber, 2009: 352

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Regras tokoistas enunciadas em Julho de 1957

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Vamos partir aqui da estrutura acima citada, partindo do pressuposto que théeion/toko e theîos/toko que vivificam o homem signifiquem ―abundância‖76. Deus criou o homem e ofereceu-lhe o mundo, com recomendação de governá-lo. Logo, a pobreza seria o contrário de abundância por significar escassez. Homem foi criado no meio da abundância e foi-lhe ofertada esta abundância. Homem enquanto não matéria é um ―theîon ti‖ por excelência. Quer dizer, a sua inteligência seria remanescência da sua divindade, que precisa rentabilizar para produzir e não se limitar a consumir apenas. Aristóteles mencionou-a como as virtudes de discernimento77. Simão Toko estabeleceu regras para conduta social dos tokoistas desde 1949-1950 (ver adiante). Ter théeio/toko (sopro/inteligência) é o primeiro extremo que se resume no Homem e implica que este seja: livre/absoluto; (ii) inteligente/sábio; (iii) criador de riquezas. Justificar-se-ia, porém, a preocupação que Simão Toko manifestou em 1937-1938 em relação à formação de outros angolanos no Liceu Salvador Correia. Perceber-se-á, também, a sua petição de aumento salarial face ao seu novo capital académico e nas novas funções que lhe foram confiadas. E, finalmente, entender-se-á os factos que conduziram à sua expulsão do protestantismo78, o que lhe levou a expandir mais a liberdade como um direito inalienável. Outro extremo versa-se especificamente no: (i) toko/beleza; (ii) toko/força transformador/criador; (iii) toko/juventude. A beleza e a força relacionam-se com a juventude. A beleza é um valor ontológico que se associa ao bem aristotélico. Isto é, a Moral por um lado. Por outro, a ―cultura de justiça‖. Entre 1950 e 1957, Simão Toko estipulou várias leis correlacionadas com os ―Dez mandamentos de Deus‖. Estas leis, que foram bem conhecidas da PIDE-DGS, garantiam a moral dos tokoistas que preservavam uma ―cultura de justiça‖. A mesma postura continuou até à independência de Angola. A beleza traduz a disciplina, moral, bem-estar, auto-estima, alegria, honra, etc. Ora, a pobreza é praticamente o contrário: indisciplina, improbidade, mal-estar, depressão, frustração, humilhação, etc. Em relação à força transformadora, há três notas: (a) o tokoista não pode ser preguiçoso, pois é contra-senso; (b) ser tokoista implica trabalho, empreendedorismo; (c) o tokoista é estrela, pois do resultado do seu trabalho, ele contribui para a transformação do colectivo, dando-lhe novas cores. É justamente por essa razão que a pobreza é um factor anti-tokoista.

Depois de vermos a base epistemológica do toko, convém agora fazer uma releitura sociológica da pobreza. Se théeion/toko enquanto origem é abundância e produção, quais seriam então as causas da pobreza?

Vários estudiosos e a PNUD apontam três factores principais: (i) macro: relacionados com os modelos económicos, planos de desenvolvimento e globalização da economia; (ii) meso: que são locais ou sectoriais e relacionam-se com grupos sociais e os indivíduos no seu dia-dia face às suas capacidades de integrar a sociedade; (iii) micro: especificamente individuais ou familiares. 76 Aconselhamos a leitura bíblica, para facilitar a compreensão: Génesis, 1: 28. 77 Nas virtudes de carácter, há também esta presença. 78 AHU/MGM/GNP, Série 20, pt. 1, ―Relatório de viagem a Ponta Albina e Baía dos Tigres‖, Ofício nº. 55.01.03/2ª, Repartição, fl. 3.

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A nível individual, a pobreza pode ser herdada como também adquirida: reprodução da sociedade79. A escassez da educação é a principal causa da pobreza, de acordo com vários estudiosos de tema. O ―eu livre/absoluto‖ busca na razão (inteligência) os caminhos para a multi-verdade: a consciência desta liberdade não se limita apenas ao acesso à instrução, mas também na capacidade prática (know-how) que deve ser aproveitada no bem social: o emprego é altamente rentável quando se situa na área de formação do empregado. O termo toko inclui criar riqueza a partir da inteligência. E a riqueza na acepção tokoista tem como fim resolver os problemas dos necessitados80. Entre 1944 e 1946 o Coro de Kibokolo gozava de uma mínima autonomia financeira e o dinheiro arrecado servia para alimentar famílias necessitadas, subsidiar deslocações, adquirir materiais para estudo bíblicos, etc. Simão Toko fez questão de intensificar os estudos bíblicos, tanto como a educação financeira (ensinou as famílias a poupar, investir e planear o futuro). Esta é a beleza, o bem sublime eivado de Moral.

Cada indivíduo é uma força transformadora. Compreende-se que juventude/toko simbolizasse a capacidade física de modificar a natureza. É metáfora da força laboral, causa da metamorfose e participação do indivíduo na causa social da sociedade onde integra. Salienta-se aqui a deontologia81, tal como Simão Toko sempre o fez, estipulando a conduta moral entre os pastores tokoistas (estrelas pequenas).

O que significa a pobreza? Depois de tudo o que antecipadamente dissemos, como pode um tokoista definiria a pobreza?

A pobreza é a falta de capitais simbólicos no indivíduo que o precipitam na incapacidade de projectar o seu bem-estar e o privam de manifestar a sua plena liberdade na sociedade, na qual as exigências de concorrência expulsam-no e marginalizam-no das ofertas sociais, tais como prestígio social e cultura.

Qual seria a postura da moral tokoista perante a pobreza? Temos três fontes que podem ajudar-nos a responder a esta pergunta. A primeira

relaciona-se com as informações belgas e portuguesas, e neste aspecto os relatórios da PIDE-DGS podem auxiliar82: os tokoistas são tidos como rebeldes pacíficos, porque apesar de não interferirem efectivamente contra os ideais do colonialismo, professam uma fé que proclama a libertação. Manifestam uma conduta social exemplar e mesmo quando são contrariados não reagem de forma indisciplinada. Permanecem obedientes e produzem melhor nos espaços laborais. A segunda fonte consiste na documentação administrativa da Igreja tokoista. Apresenta uma burocracia funcional, entre paróquias e

79 Pierre Bourdieu aborda essa questão de maneira densa e teoricamente satisfatória. 80 Aconselhamos ver Ñkûtu’a ñsîmbani para melhor compreensão. 81 ―Deon‖, deveres; logos, ciência. Isto é, um grupo de profissionais regula o comportamento da classe, com previsões de sanções para aqueles que infringem as regras. Os pastores tokoistas foram os primeiros a beneficiarem da deontologia pastoral. 82 AHU/MU/GMGNP, Série 20, p. 1, Relatório de nº 10-C-950 do ag. adm. António A. Gonçalves de Mello do Concelho de Maquela do Zombo, 23 de Março de 1950; AHU/MU/GM/GNP, Série 20, pt. 1, Depoimentos de Daniel Finda anexado ao Ofício de nº. 9/956/ Uíge, 07 de Março de 1957; AHU/MU/MG, GNP, Série 20, Pt. 1, Ofício nº 4.596/57; AHU/MU/MG/GNP, Ofício nº 2.098; IANTT/PIDE/DGS, Proc. 731 SR, vol. 1, Doc. avulso, Luanda, 04 de Março de 1964; 222AHU/MU/GM/GNP, Pt. 2, cópia de carta anexada ao Ofício nº 3272, Secção Central nº 976-CI (2), Entrada nº 634, Lisboa, 25 de Junho de 1964.

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a direcção central. Os objectivos sociais desta igreja preservaram o respeito das normas. A última fonte é a liturgia tokoista, que é cristã: amar o seu próximo, o que pode ser bem verificado na Igreja.

Nestas três fontes, a pobreza é tratada de duas formas. Na primeira, a herança colonial precisava ser vencida pela conquista da independência cultural. Se a colonização menosprezou a cultura africana de Angola, a pobreza poderia ser combatida na rentabilização das heranças socioculturais. Se a colonização portuguesa marginalizou muitos angolanos do sistema escolar, a Igreja promoveria o espaço estudantil de modo a construir capitais académicos para erradicar a pobreza. Se, finalmente, não foi possível preparar uma elite africana em Angola para gerir a sua independência, a igreja se tinha tornado numa forja de cidadãos livres e urbanos para a conquista das riquezas, que eles pudessem partilhar com os demais povos angolanos com o fim de assegurar a independência efectiva. A segunda forma tem a ver com o espírito de sacrifício: cada um se sacrifica em favor do outro, para salvar a causa comum. A moral tokoista baseia-se na relação ontológica entre ―Eu matéria‖, ―Eu não matéria‖ e ―Eu alma‖. Cada tokoista percebe-se que a sua salvação começa individualmente, na conexão dos ―Eu‖ que integram este sistema. Presume-se ao nível social que o indivíduo tokoista perceba o valor de sacrifício, de amor ao próximo e respeito rigoroso das normas.

A Igreja enquanto corpo de Cristo corresponde a esta visão individual e ao espectro social do ―Eu‖. O aporte de salvação que a Igreja pode trazer é a garantia de um lar, de um abrigo, sendo a pobreza um mal social que martiriza as pessoas. Por essa razão, a segurança colonial teve sérias dificuldades em responsabilizar os tokoistas que terão participado na sublevação de Março de 1961. Se é verdade que milhares de tokoistas participaram nesta revolta – o que é impossível negar – difícil ficava provar que Simão Toko teria orientado os fiéis a rebelar-se. Foram, por exemplo, identificados vários grupos – inclusive os partidos políticos que se aproveitaram da mensagem da redenção dos tokoistas – para envolvê-los na luta armada. Milhares entre eles perderam a vida. A segurança colonial percebeu-se que a ―moral tokoista é contrária a agressão…‖ e que as actividades subversivas não beneficiaram do acordo do Toko, mas convém desconfiar sempre da sua docilidade83. Isto é, as virtudes tokoistas foram expressamente enaltecidas pela segurança colonial para domesticar os tokoistas. Mas, ao mesmo tempo, estas visavam a liberdade, o diálogo em pé de igualdade entre as pessoas, na base do respeito hierárquico e da defesa dos interesses de cada um. Inevitavelmente, estes propósitos levariam à independência. Por isto Simão Toko e os tokoistas eram amados e odiados ao mesmo tempo pela PIDE-DGS.

A questão da revolta de 15 de Março de 1961 levou muitas famílias a refugiarem-se nas matas e a administração colonial tinha dificuldade em repor a ordem e garantir a integridade física dos fugitivos. Também estes últimos teriam toda segurança caso voltarem para as suas casas. Muitos tokoistas perderam a vida e o facto foi comunicado a Simão Toko. Em seguida, ele quase foi responsabilizado pela sublevação, antes de se apurarem os factos. Numa entrevista lhe foi feita e

83 AHU/MU/GM/GNP, Série 20, Doc. 25; AHU/MU/GM/GNP, Série 20 Pt. 2, 2/65; IANTT/PIDE/DGS, Del Angola, Proc. 731 RS, vol. 1, Luanda, 05 de Outubro de 1961, p. 209.

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massivamente difundida na rádio e televisão, depois de repudiar veementemente a agressão, o profeta ético nascido no Norte de Angola disse: ―Viva Portugal!‖84.

Fonte: Torre do Tombo

Mas este ―Viva Portugal!‖ não significava que Simão Toko aprovava a colonização em Angola. Ele deixou claro que o Tokoismo é contra a agressão. Admitiu conhecer o seu amigo Agostinho Neto quando estudava no Liceu Salvador Correia. Ele não conhecia Holden Roberto naquela altura pois passou grande parte da vida dele de prisão em prisão. Deixou claro que ele era religioso e não compactuava com a guerra. Portugal simboliza a integridade territorial, a ordem, etc. e, como religioso ciente da sua missão, seria contra-senso que ele proferisse o contrário: ―Abaixo, Portugal!‖, como gostariam os independentistas angolanos. Por outro, a sua entrada em acção neste processo salvou milhares de famílias, de modo que para retomar a ordem Simão Toko efectuou viagens para assegurar a segurança das populações e pregou-lhes o evangelho e a sua fé. Nos arquivos são visíveis os valores que pautaram esta missão.

Vamos rever aqui a posição de Simão Toko dentro da ética tokoista.

84 Podem entender-se estes dizeres dentro das virtudes éticas de Simão Toko.

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Tratar-se-ia da liberdade relacional entre ―Eu não matéria‖ e ―Eu matéria‖ que se caracterizam pelas leis morais85. A vontade é autónoma, a razão é dependente das premissas ou dos factos. Assim sendo, a conduta ética define a relação entre os ―a priori‖ ontológicos: o bem de cada constituinte é tornar prático o ―eu‖. Immanuel Kant chamava a isso liberdade da vontade para separar a faculdade superior e a faculdade sensitiva. Para Simão Toko a ―boa conduta‖ emana da vontade, desde que ela actue livre das sensações inerentes à matéria e unicamente a favor do bem sublime (théeion). Ele orientou os tokoistas a não se vingarem dos maltratos dos colonizadores, nem a desobedecer às leis estipuladas por aqueles que os oprimiam. Simão Toko tomou a dianteira para apaziguar as partes e salvaguardar esta relação relacional entre colonizador e colonizado.

Simão Toko faz observar que a lei é natural antes de ser jurídica. O não-matéria é o espírito da lei e realiza-se na consciência da vida colectiva. Isto é, a ideia primordial da lei é nobre. A lei, por aspirar ao bem colectivo, não pode atentar contra a vida humana. Todo homem existe para viver bem e talvez seja por isto que o profeta ético mostrou a cara. As suas pretensões de ver os ―oprimidos‖ construírem as suas universidades e os seus hospitais têm dois propósitos: (i) construir capital académico: razão universal; (ii) preferir duelo intelectual do que guerra sanguinária. O fundo jurídico é percebido por Simão Toko como necessidade humana (da matéria) para imitar o ―a priori absoluto‖ de não-matéria. Era necessário regulamentar o comportamento colectivo, garantir artificialmente a moral social e o espírito da lei estava bem codificado no não-matéria. Não se estranhará assim que o dirigente dos tokoistas tenha tido razões para priorizar a vida humana, chamando a obediência e não a rebelião numa altura que a esperança de salvação pareceu evidente. A obediência em Simão Toko tem três interpretações: (i) executar com rigor, humildade e disciplina o que foi orientado; (ii) aprender com a prática, com propósito de melhorar e tirar proveito nas outras experiências posteriores; (iii) dialogar com as orientações e remetê-las à reapreciação colectiva, com a ajuda de espírito santo.

O bem do ―não-matéria‖ é a justiça, no campo prático. A lei jurídica é apenas um instrumento externo que a ―matéria‖ sistematiza. Ela foi representada pela administração colonial. Ora, Simão Toko é ―Juiz‖ da lei moral que busca aperfeiçoar o valor da liberdade. A sua compreensão em relação à lei jurídica – entre os indivíduos – é na utilidade da liberdade relacional. Nestas condições, ela fundamenta-se na ética. O vocábulo toko significa ―higiene‖ ou ―boa aparência pública‖ – o que é evidenciada pela vestimenta branca dos tokoistas – na espectativa de que a vontade não ceda à impureza a que a matéria está exposta. Com que cara Simão Toko voltaria em Luwânda em 1974 para falar de paz, caso tivesse compactuado com a guerra em 1961 e tivesse dito: ―Abaixo Portugal!‖? 85 Visto que o ser humano é um ser identitário por excelência, o Tokoismo busca devolver o ―eu a priori‖ a partir de duas posições. A primeira é o não-matéria ser considerado como base existencial. Pode fazer sentido pelo facto de o Tokoismo nascer nas aspirações religiosas. O não-matéria exprime várias liberdades em si. Além da sua independência funcional enquanto ―eu absoluto‖ no concerto humano, o espírito desempenha o papel de estrutura que o vivifica (tornando-o dinâmico). A segunda é a matéria tida como ―beleza referencial‖ e externa do não-matéria.

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Os hagiónimos ―Toko‖, ―Mayamona‖, ―Ntaya‖, Sadi Zulu Môngo, Na Mpêmba, já não teriam sentido algum caso ele optasse pela guerra. ―Dá a César o que é a César; a Deus o que é à Deus‖. ―César/Colono‖ significava guerra. E ―Deus/Colonizado-Colono‖ significaria diálogo relacional.

Para completar compreensões em relação à postura do profeta ético Simão Toko, interessa-nos ver as três leis da liberdade tokoista.

A primeira é a inviolabilidade dos ―a priori‖ ontológicos e, consequentemente, o espírito enquanto ―eu absoluto‖ do bem sublime. O ser humano está preso numa cultura cuja libertação parte da liberdade relacional entre os ―a priori‖ ontológicos constituintes.

A segunda lei versa-se na ―conduta moral‖ e a ética. A autonomia da vontade torna a liberdade limitada pela moral (traço do ―não-matéria‖), e estabelece dois pressupostos: (a) necessidade de convivência nas diferenças debita da ―unidade ontológica‖ do indivíduo, de modo que passa ser um exercício moral de todo ser humano na sociedade; (b) concorrência para o bem-estar é acautelada pela dinâmica que o eu exerce na compreensão das leis naturais que, por imitação, cria ética por força da consciência e leis intimidatórias por força da moral social.

A terceira: a lei cristalizou-se no costume e o ser humano aceita-o sem opção, até determinado ponto (identidade). A sua reapreciação racional, que foi inicialmente um exercício interno, conflictuou – de ponto de vista histórico – com o ―catolicismo romano‖ (1700/1703-1706) e com o ―protestantismo britânico‖ (1943/1946-1949). Desta experiência, o simbolismo tokoista determinou duas posições de apreciação: (a) a fé como uma verdade possível e primeira86; (b) a razão como uma verdade permissível e empírica. Simão Toko tentou conciliar as duas verdades num formato de preceitos que são codificadas na liturgia tokoista87.

Apesar de explicar epistemologicamente a posição de Simão Toko, vem-nos uma pergunta: como o dirigente tokoista planejava então a independência, se em 1949 foi ele o primeiro a profetizar sobre o assunto?

Pela honestidade científica, não podemos responder por ele. Não obstante a isto, os factos podem ser relativamente bem interpretados. Tentaremos encontrar uma explicação aceitável sobre a independência de Angola na perspectiva de Simão Toko, antes de ser realizada em 1975. Mas antes, importa ver as virtudes éticas tokoistas. Virtudes éticas tokoistas

Não faria sentido falar da ética tokoista sem nos debruçarmos sobre a questão das virtudes. Na visão de Aristóteles, a virtude é ―actividade da alma‖ e, visto que

86 As leis de Deus estão na natureza, assim como estruturam os valores consoante os domínios do ―bem‖ e do ―mal‖. Este entendimento cabe ao homem, através do qual ele estabelece as leis dos Homens. 87 Daí, o tokoista torna-se um cidadão completo à semelhança da Grécia ateniense: (i) isegoria: tomar a palavra na assembleia; (ii) parrhesia: dizer tudo com franqueza.

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Simão Toko é profeta ético e ―salvador das almas‖, pressupõe-se que tenha alguma definição sobre a virtude.

Nas suas cartas, homilias e reflexões individuais, Simão Toko mostra-nos que três extensões norteiam o seu discurso88, nomeadamente: homem normativo, coesão social e integridade simbólica.

O homem primitivo estruturou o mito. Ele contentou-se desta forma em saciar a sua curiosidade e organizar o seu mundo. Herdamos esta percepção como verdade primeira e a religião sistematizou-a enquanto verdade apriorística que, na Idade Média, ganhou o aspecto de dogma. É na base de dogma que temos o modelo estruturante do homem normativo na sociedade, sem o qual o caos reinaria entre nós. Pelo menos ainda pensamos assim. É verdade que a filosofia trouxe algumas luzes, mas elas são imperfeitas, embora necessárias para o conhecimento verificável na base de questionamentos constantes sobre a existência. O homem normativo busca preservar os valores. Ora, sabe-se que a ciência é consequente da filosofia, e esta nasceu da religião. É deste pressuposto que olhamos o racionalismo tokoista como a convergência relacional entre racionalismo platónico e racionalismo agostiniano89:

Divergência ConvergênciaMito Dogma Repú-

blica Teocracia Homem

normativo Coesão social

Integridade simbólica

Racionalismo platónico xxxx xxxxx xxxxxxx xxxxxxx xxxxxxx Racionalismo agostiniano

xxxxx xxxxxx xxxxxxx xxxxxxx xxxxxxx

Racionalismo tokoista

No homem normativo pressupõe-se que haja a harmonia ontológica, ao passo

que na coesão social a ideia fundamental é a aceitação das divergências. A integridade simbólica é consequente destas duas e pode ser percebida nas virtudes que Simão Toko definiu já entre 1943-1949.

Aristóteles é de opinião que existem virtudes de discernimento e virtudes de carácter. As primeiras são chamadas de virtudes de pensamento e precisam de treinos e experiências, ao passo que as segundas (também chamadas de virtudes morais/virtudes éticas) relacionam-se na maneira própria de ser uma pessoa e nascem de hábito/maneira/costume. Logo, as virtudes não são dádivas da natureza.

O racionalismo tokoista é um tema interessante por duas razões. A primeira situa-se no concerto religião/dogma e ciência/dúvida metódica. Acrescenta-se o valor artístico (centrado no belo) que redimensiona o amor enquanto projecção do bem. A segunda anima questões relacionadas com verdade empirista, comparação metódica, análise qualitativa e, sobretudo, a síntese que oferecem os resultados provisórios do precedente.

88 Consideramos aqui o discurso como a exposição metódica do pensamento ou ideias soltas. Reiteramos que pensamento é uma ―actividade mental‖ cujas linguagens específicas articulam-se consoante o juízo e exprimindo um raciocínio concreto. 89 Interessa-nos partir desta comparação para proporcionar um debate.

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Patrício Batsîkama

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O quadro que se segue versa-se nas virtudes de carácter que Aristóteles estabeleceu:

Quadro aristotélico de carácter virtuoso e vicioso Domínio Virtude Excesso Defeito

Emoções fundamentais

Medo e ousadia Coragem Temeridade Cobardia Prazer Moderação Deboche Insensibilidade

Cólera/fúria Sangue-frio Irascibilidade Não irascível Bens

exteriores Riquezas grandes Magnificência Ostentação Mesquinharia

Riquezas pequenas Liberalidade Prodigalidade Parcimónia Honras: grandes Grandeza Vaidade Humildade

Honras: pequenas (sem nome) Ávido de honra Indiferente à honra

Relações humanas

Verdade Verdade Jactância Reticência Satisfação no jogo Alegria/bom

humor Bufonaria/bobice Estupidez/grosseria

Satisfação na vida Amabilidade (Desinteressado) complacência

Mau humor

(Interessado) Adulação Sentimentos Pudor Reservado Tímido Imprudente

Prazer em relação a sorte do outro

Indignação Inveja/cobiça Belo maligno

As probidades tokoistas (virtudes éticas) são parcialmente aristotélicas, embora difiram endemicamente pela missão profética e o contexto histórico/cultural. A seguir o quadro das virtudes éticas tokoistas:

Quadro de virtudes éticas complementares do Tokoismo

Virtude ética Explicação complementarEmoções

fundamentais Liberdade Inteligência/toko quem pensa é livre (‖Eu não matéria‖) Firmeza Tokomba, quebrar: força interior

Tranquilidade Integridade ontológica: tokuka ou toka (ser purificado)

Bens exteriores

Beleza Integridade moral; bom comportamento; respeito Encanto Boa aparência; boa exposição pública

Grandeza Espírito empreendedor e visionário; produzir riqueza Jovialidade Renovo = ―Eu matéria‖

Relações humanas

Verdade Na Mpêmba, Santidade Fraternidade ―Eu alma‖: harmonia e alegria

Sacrifício e Paz ―Eu salvador‖, toko: busca da Tranquilidade colectiva Sentimentos Amor por si Construção da personalidade na felicidade interna

Amor ao próximo Construção do bem-estar no espaço comum

Voltamos ao ―homem normativo‖ que pode ser comparado com o ―bom selvagem‖ de Jean Jacques Rousseau. Destas virtudes, supõe-se que o tokoista respeita as instituições estabelecidas e, simultaneamente, não desrespeita a sua integridade simbólica90. Acontece que os dois espaços (instituições estabelecidas e os ―a priori‖) podem estar em conflito, como se tem verificado ao longo da História: (i) os tokoistas face ao colonialismo; (ii) o Tokoismo e o governo da República Popular de Angola; (iii) etc. A firmeza tokoista é uma convicção de paz que é, por si, uma construção

90 Esta postura é visível com Simão Toko já entre 1950-1976.

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Ética tokoista na construção do Homem novo

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permanente, independentemente da época, pouco importam as circunstâncias e as interferências dos actores históricos. O tokoista simboliza a paz interna pela sua temperança e linguagens expressas; nutre confiança no seu interlocutor pelo espírito da verdade e ensejo de sacrifício para com os outros91.

A coesão social é irrealizável sem antes que haja o homem normativo. Os textos clássicos92 confortam-nos uma vez que nos permitem perceber o que Simão Toko entende por ―coesão social‖93. Bibliografia Fontes primárias AHU MU/GM/020/Cx.1. ―Seita tocoista‖. Cartas e ofícios. AHU MU/GM/GNP/135/Cx.39, ―Passagem de Profetas‖: 29/07/1957, Rebelo Pinto – Administrador de Lobito. AHU/MU/GM/GNP/Série 20, Doc. Avulso, fl. 142, declarações de Simão Toko em Ponta Albina, 2 de Agosto de 1957, Pt.1. ANTT/PIDE/DGS, Proc. 15.45.A/NT 2105. Livros e artigos consultados ARENT, H., 2002, A promessa da política, Lisboa: Relógio d‘Água ARISTÓTELES, (1965), A Política, Lisboa: Editorial Presença. BATSÎKAMA, P., 2016, Nação, nacionalidade e nacionalismo em Angola, Luanda: Mayamba. DURKHEIM, E.,1974, As formas elementares da vida religiosa. O sistema totêmica na Austrália, São Paulo: Martins Fontes. GUIDENS, A., 1984, The construction of society. Outline of the Theory of Structuralism, Cambridge: Polity HABERMANS, 2004, A inclusão do outro: estudos de teoria política, São Paulo: Loyola (2.ª edição) HUME, D., 1993, La morale. Traité de la nature humaine. III, Paris: Flammarion. LEVY-BRUHL, 1974, La mentalité primitive, Paris : PUF. PLATÃO, 2011, Œuvres complètes, Paris : Flammarion WEBER, M., 1982, Ensaios de Sociologia, Rio de Janeiro: Zahar. WEBER, M., 2009, Economia e sociedade, Brasília: UnB.

91 Remetemos essa questão a Doutrina social do Tokoismo. 92 Platão, Rousseau, Hobbs, Hume, etc. 93 Guiddens, 1984.

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Artigo #9 Só tem guerra, fome e tribos primitivas: representações homogéneas do continente africano através das histórias em quadrinhos do fantasma, Tintin e soldado desconhecido94.

Ivaldo Marciano da França de Lima, Ph.D. 95

Universidade de Estado da Bahia [email protected]

Resumo

Ainda hoje as revistas em quadrinhos são vistas com certa desconfiança por muitos historiadores. Por razões diversas, atribuem-se as mesmas um estatuto de objeto infantil ou inútil para a pesquisa histórica. As revistas em quadrinhos possuem o poder de transmitir ideias e representações, construindo conceitos e preconceitos sobre seus temas, influindo na forma de pensar das pessoas. Fantasma é um herói que não possui superpoderes. Vive em ―algum lugar da África‖, mais precisamente na caverna da caveira, que é também o lugar em que moram os pigmeus bandar, temidos por suas flechas venenosas e ritos mágicos poderosos. As ―tribos‖ africanas acreditam que Fantasma vive há mais de quatrocentos anos, por isso é também conhecido como ―O Espírito que Anda‖. Tintim é um misto de repórter e detetive. Sempre as voltas com investigações diversas, suas viagens mostraram diferentes partes do mundo. A ―África‖ foi um dos muitos ―lugares‖ visitados por este personagem. Diferente de Fantasma, que tinha no continente africano o cenário da maior parte de suas histórias, Tintim teve apenas uma de suas aventuras neste ―lugar‖. O Soldado Desconhecido, personagem menos famoso do que Tintim e Fantasma, é na verdade um médico ugandense que se refugiou nos Estados Unidos quando criança, e retornou para sua terra natal com o objetivo de reconstruir o país. Perante um cenário de guerras e atrocidades diversas, é tomado por vozes que vieram em sua mente, e decide combater as tropas do Exército do Senhor (LRA), após desfigurar o próprio rosto, em meio a uma crise e angústia que foi tomado diante das mortes de crianças em Uganda. Ora retratado como palco de guerras, conforme as páginas do soldado desconhecido, ora como um lugar ―de homens e mulheres primitivos‖, conforme as páginas das revistas do Fantasma e Tintim, o continente africano foi representado através de estereotipias e clichês. Ao longo dos anos, desde o surgimento das revistas do Fantasma no Brasil, na década de 1940, os quadrinhos representaram o continente africano de diferentes maneiras. A maior parte destas histórias protagonizaram diferentes cenários em que os povos do continente africano apareciam de formas grotescas, em alguns casos, a exemplo de Fantasma e 94 Este artigo foi apresentado, numa versão resumida, no XXVII Simpósio Nacional de História da ANPUH, realizada em Natal/RN, em julho de 2013. 95 Coordenador do Programa de Pós Graduação (stricto sensu) em Estudos Africanos, Povos Indígenas e Culturas Negras – PPGEAFIN/ Universidade do Estado da Bahia – UNEB, e coordenador do Programa de Pós Graduação (lato sensu) em Estudos Africanos e Representações da África/ Universidade do Estado da Bahia – UNEB.

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Tintim, desenhados de modo que o leitor aceitasse as formas primitivas dos ―africanos‖. Nesse sentido, este trabalho, objetiva discutir algumas das representações existentes nestas revistas sobre o continente africano, buscando estabelecer liames com as ideias predominantes no senso comum. Palavras chave: Revistas em Quadrinhos, África, Representações.

Abstract Even today, comic books are viewed with some mistrust by many historians. For diverse reasons, they are assigned a status of childish or useless object for historical research. Comic magazines have the power to convey ideas and representations, constructing concepts and prejudices about their themes, influencing people's way of thinking. Ghost is a hero who has no superpowers. He lives ―somewhere in Africa‖ more precisely in the cave of the skull, which is also the place where Bandarian pygmies live, feared by their poisonous arrows and powerful magic rites. African ―tribes‖ believe that Phantom has lived for over four hundred years, so it is also known as ―The Spirit Who Walks‖. Tintin is a mix of reporter and detective. Whenever the laps with diverse investigations, their trips showed different parts of the world. ―Africa‖ was one of the many ―places‖ visited by this character. Unlike Phantom, who had on the African continent the scene of most of his stories, Tintin had only one of his adventures in this ―place‖. The Unknown Soldier, a less famous character than Tintin and Phantom, is actually a Ugandan doctor who took refuge in the United States as a child, and returned to his homeland with the goal of rebuilding the country. Faced with a scenario of wars and various atrocities, he is seized by voices that have come into his mind, and he decides to fight against the troops of the Lord‘s Army (LRA), after disfiguring his own face, in a crisis and anguish that was taken before the deaths in Uganda. Pictured as a stage of wars, according to the pages of the unknown soldier, now as a place "of primitive men and women," according to the pages of the Tintin and Phantom‘s magazines, the African continent was represented by stereotypies and clichés. Over the years, since the appearance of the Phantom magazines in Brazil in the 1940s, comics have represented the African continent in different ways. Most of these stories led to different scenarios in which the peoples of the African continent appeared in grotesque ways, in some cases like Phantom and Tintin, designed so that the reader would accept the primitive forms of Africans. In this sense, this paper aims to discuss some of the representations in these journals on the African continent, seeking to establish links with the ideas prevalent in common sense.

Keywords: Comics, Africa, Representations

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Longe de se constituirem em objetos de mera diversão, destituído de opiniões, posições políticas e representações diversas, as revistas em quadrinhos devem ser entendidas como resultados das sociedades que as produziram, e são, com certeza, muito mais do que ―coisa para criança‖96. Instrumentos poderosos na propagação de representações, durante muito tempo as Histórias em Quadrinhos foram relegadas ao lugar do inocente e pueril, como se não trouxessem consigo as marcas dos seus criadores97. Estes, como qualquer ser humano, possuem interesses, que são postos no processo de criação do desenho, ou do roteiro que irá nortear determinada história.98

Mediante as novas tendências nas Ciências Humanas de um modo geral, desde as mudanças de paradigmas em relação à apreensão do ―real‖, bem como as discussões e estudos em que o alargamento do conceito de fonte se constituiu em facto, sobretudo com o advento da Nova História Cultural, não há nenhuma dificuldade de carácter epistemológico, ou mesmo filosófico em se estabelecer as Histórias em Quadrinhos como fonte válida para o conhecimento histórico. São as Histórias em Quadrinhos, no dia a dia, em diversos espaços sociais, que constroem diferentes representações sobre os mais variados assuntos. Representar não é um ato inocente, destituído de posições políticas, conforme define Chartier:

(...) As percepções do social não são de forma alguma discursos neutros: produzem estratégias e práticas (sociais, escolares, políticas) que tendem a impor uma autoridade à custa de outros, por elas menosprezados, a legitimar um projeto reformador ou a justificar, para os próprios indivíduos, as suas escolhas e condutas. Por isso esta investigação sobre as representações supõe-nas como estando sempre colocadas num campo de concorrências e de competições cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação. As lutas de representação têm tanta importância como as lutas econômicas para compreender os mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor, a sua concepção do mundo social, os valores que são seus, e o seu domínio. Ocupar-se dos conflitos de classificações e delimitações não é, portanto, afastar-se do social – como julgou durante muito tempo uma história de vistas demasiado curtas - muito pelo contrário, consiste em localizar os pontos de afrontamento tanto mais decisivos quanto menos imediatamente materiais (CHARTIER, 1990, p. 15).

Nesse sentido, representar alguma coisa não deve ser visto como algo ingênuo. As representações constroem práticas, definem costumes e ideias, corroborando para que algo seja entendido conforme determinado veículo de comunicação, no caso, as Histórias em Quadrinhos. Entender as representações existentes nas mesmas, neste sentido, contribuirá para que compreendamos algumas das formas que popularizaram o

96 Sobre o debate em torno dos quadrinhos como fonte e objeto de estudo, ou mesmo como um meio para o ensino, ver: (VERGUEIRO, 2004; VERGUEIRO; RAMOS, 2009; SILVA, 2002). 97 Uma boa maneira de se refletir sobre a produção dos quadrinhos, confrontando-os com os interesse de seus autores pode ser vista em: (MOYA, 1986). 98 As histórias em quadrinhos devem ser vistas como resultado de um complexo processo do qual fazem parte diferentes etapas. É, antes de tudo, uma poderosa forma de se transmitir representações sobre as mais diferentes questões que digam respeito ao ser humano de modo geral. Sobre os quadrinhos, seus processos de criação, perspectivas de montagem e produção, bem como conceitos sobre sua definição, ver: (EISNER, 2010; MCCLOUD, 2006; 2008; S/D).

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continente africano como exótico, selvagem e primitivo. Em outras palavras, como e de que maneira as revistas em quadrinhos contribuíram para cristalizar a ideia de uma África inviável e caótica? O trabalho de Anderson Oliva nos permite entender como as grandes revistas semanais, a exemplo de Veja e Isto É, contribuíram para a retroalimentação desta representação negativa (OLIVA, 2007). Este trabalho, nesse sentido, reivindica para as Histórias em Quadrinhos o estatuto de fonte válida e relevante para os historiadores compreenderem as sociedades e os indivíduos que as produziram99.

Privilegiarei as revistas do Fantasma (coleção de cinco volumes da EBAL), Soldado Desconhecido (coleção de vinte e cinco volumes da Vertigo) e Tintim (volume único, públicado pela Cia das Letras) enquanto caminho para construir este entendimento. Muitas são as possibilidades neste campo, seja no sentido de entender as representações construídas sobre o continente africano, seja na perspectiva de confrontá-las com a historiografia existente sobre a África, produzida por historiadores africanos ou africanistas (ou mesmo ambos)100.

Independente das questões possíveis de serem levantadas, há que se considerar o facto de que este trabalho, por mais que tenha o continente africano como objecto, deve ser entendido como tendo o Brasil enquanto recorte espacial privilegiado, uma vez que objectiva entender como os leitores neste país recepcionaram as revistas em quadrinhos (acima citadas) que versaram directamente sobre o continente africano. Trata-se, nesse sentido, de um estudo sobre as representações do continente africano no Brasil, que deve ser visto como parte de uma área de estudos que objetiva estabelecer o diálogo entre a História do continente africano e a forma como este é representado fora dele. Para além de quaisquer considerações possíveis de serem tecidas sobre estas questões, ressalto o facto de que a História da África não deve e não pode ser confundida com a História dos negros e negras do Brasil. Não há por que manter uma naturalização de questões que são pertinentes ao campo da cultura.

Tintin, Fantasma e Soldado Desconhecido: qual África representaram?

O que há em comum entre um homem vestido com uma fantasia e mascarado, sempre acompanhado de seus fiéis animais (um cavalo que atende pelo nome de Herói, e um lobo, chamado Capeto), um jovem repórter que viaja pelo mundo desvendando mistérios e resolvendo problemas diversos e um acholi, recém chegado em seu país natal (Uganda), após ter crescido distante do mesmo, nos EUA? No geral, refiro-me a 99 As Histórias em Quadrinhos possuem mais de cem anos, desde o lançamento das primeiras tiras nos jornais norte americanos do final do século XIX. Há histórias sobre as mais diferentes situações e facetas possíveis de serem pensados nos mais diversos gêneros. Duas excelentes obras sobre as Histórias em Quadrinhos, que trazem informações sobre os personagens, autores e sociedades podem ser vistas em: (MOYA, 1977; GOIDANICH; KLEINERT, 2007). 100 Uma excelente indicação sobre a história da África, produzida por historiadores deste continente, pode ser vista em: (M´BOKOLO, 2007; 2009). Outra excelente indicação, produzida uma africanista, pode ser vista em: (HERNANDEZ, 2005).

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forma grosseira e estereotipada com que as histórias em quadrinhos destes personagens descreveram/representaram o continente africano nas páginas de suas revistas. Um aspecto em comum aos três personagens está no fato de que o continente africano é colocado como o lugar do outro, sempre dotado de problemas que negam sua viabilidade enquanto espaço possível para a constituição de civilizações autônomas. Algumas diferenças, entretanto, podem ser apontadas em suas histórias, seja sob a forma do desenho, roteiro, argumento ou cenário. Enquanto Fantasma e Tintim podem ser descritos como o elemento da ordem, a resposta do ocidente civilizado para o caos e a inviabilidade da selva, povoada por seus primitivos habitantes, tal qual outros personagens de Histórias em Quadrinhos, o Soldado Desconhecido deve ser entendido como um acholi que sai de Uganda e volta para ajudar seu país, depois de ter estudado e vivido nos Estados Unidos. Ainda assim o ocidente está presente como a resposta para os problemas da África, ―lugar‖ onde as pessoas não conseguem viver sem a intervenção salvadora dos estrangeiros.

As histórias do Soldado Desconhecido, assim como as do Fantasma, tiveram o continente africano como cenário privilegiado. Ressalte-se, entretanto, que no caso do Fantasma, há outros cenários em que o herói enfrenta bandidos e mal feitores de toda a ordem. Fantasma reside em um lugar descrito ora como África, ora Ásia, mas, grande parte de suas histórias possuem o continente africano como cenário central, sobretudo após os anos 1960. O Soldado Desconhecido possui como cenário privilegiado Uganda, país para onde Moses retorna após ter concluído seus estudos nos EUA. Tintim é um jornalista com ares de investigador. Ao contrário de Fantasma e do SoldadoDesconhecido, teve o continente africano como cenário em apenas uma de suas histórias, narradas em vinte e quatro volumes.

Tintim: o jornalista - herói sem poderes atuando na “África”.

Na revista Tintim no Congo (ou, Tintim na África, conforme a versão com que se esteja lidando) conhecemos um ―lugar‖ (o continente africano) habitado por homens e mulheres primitivos, desprovidos da capacidade de raciocinio e inteligência. 101 Os africanos, nesta revista, foram representados como seres que não conheciam a tecnologia do ocidente Leia-se Europa) e não possuiam a capacidade de se vestirem tal qual os seus colonizadores.

O título da aventura de Tintim, que teve o continente africano como cenário, já nos permite pensar em algumas questões relacionados com os problemas existentes na narrativa, bem como nos quadrinhos e nas representações trazidas pelos mesmos. Tintim na África foi publicado no Brasil em 1970 pela Record, ao passo que Tintim no Congo tem seu ano de publicação em 2008, pela Companhia das Letras. Certamente os efeitos da mudança no título indicam a necessidade de uma maior especialização quanto à informação sobre o ―local‖ que a aventura ocorre, além de zelo pela fidelidade ao 101 Sobre a História em Quadrinhos Tintim no Congo, ver: (PIEDADE FILHO, 2008; 2009)

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original. Além disso, certamente uma revista que tivesse ―Congo‖ como título não teria o mesmo apelo comercial perante a palavra ―África‖, isso, é claro, nos anos 1970. Devo insistir em afirmar que para o grande público a ideia de África como um ―lugar‖ não é algo de todo estranho, mesmo nos dias actuais. A contracapa da edição de 2008 nos diz muito em relação às representações predominantes na revista em questão. Um leão escondido nos matos, à espreita do Tintim caçador, com espingarda à mão e trajando roupa de safári. Uma representação do europeu colonizador, disposto a dominar a natureza selvagem existente no continente africano. Tintim é uma espécie de ―herói humano‖. Não possui superpoderes ou coisas do tipo. Está sempre às voltas com bandidos de toda a espécie. Seu criador, Hergê, é apontado como o ―Walt Disney europeu‖. Seu personagem viajou pelo mundo, indicando as representações existentes para diferentes povos, sempre em perspectivas não muito positivas. Nesta revista em questão, Tintim visita a antiga colônia belga na África, e entra em contato com os ―africanos‖.

Os ―africanos‖ foram desenhados de formas grotescas, sempre na cor preta, com boca e olhos descomunais e desproporcionais ao corpo e rosto, mal vestidos e caricaturizados. Trata-se de uma representação bastante grosseira, quando comparada com outras revistas, a exemplo do Fantasma, que mesmo trazendo os ―africanos‖ em desenhos toscos, não o fizeram com o tom indicado na história desenhada por Hergê, conforme o quadrinho abaixo:

(Tintin no Congo, 2008, p.29)

Neste quadrinho observamos a representação criada pelo desenhista, mostrando a afirmação feita pelo rei, sem camisa e com a espada quebrada, e seu exército ―equipado à europeia‖. Eis os soldados ―africanos‖, segundo as páginas desta História em Quadrinhos. Os homens deste continente são preguiçosos, místicos e dotados de um pensamento ―mágico‖, em que a religião estava diretamente associada à magia e ao poder de operar milagres no quotidiano. Dependiam sempre da intervenção do europeu para resolver todo e qualquer tipo de problema, desde uma simples doença, até uma contenda ou briga quotidiana, conforme as imagens abaixo:

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(Tintin au Congo, 2008, p.20)

Nesta sequência de quadrinhos, observa-se Tintim ―resolvendo‖ um problema criado por ele mesmo: o descarrilamento do trem. O herói nomeia o trem pelo barulho que este produz, indicando a forma infantilizadora com que o quadrinista constrói os diálogos entre os ―africanos‖ e o protagonista da história. Tintim os convoca para o trabalho. Um ―africano‖ refuta o herói, afirmando que está cansado. O trabalho é algo dado para os europeus, sempre dispostos, ao passo que os africanos são representados como preguiçosos. As roupas destes mostram que além de indolentes, os ―africanos‖ não conseguem se vestir tal qual seus colonizadores. Sua incapacidade é por demais exagerada na sequência abaixo, quando até um animal, no caso, Milu, o cachorro de Tintim, consegue ―pensar‖ e agir de modo ―racional‖, mostrando-se mais inteligente e disposto do que os ―africanos‖:

(Tintin au Congo, 2008, p.20)

Tintim, como bom europeu colonizador, lidera os africanos, organiza a resposta ao problema por ele causado e os convence a trabalhar. O quadrinho acima também nos mostra o quanto os africanos são dependentes dos seus colonizadores, além de incapazes, justificando os ideais consubstanciados no ―fardo do homem branco‖102. O quadrinho abaixo nos mostra outra mensagem que alude a inferioridade dos povos do

102 A expressão ―fardo do homem branco‖ foi bastante utilizada durante o período das invasões coloniais ao continente africano. De certa forma, serviu para justificá-las, encobrindo parte dos interesses que estavam por trás dos objetivos políticos e econômicos. Sobre estas questões, ver: (WESSELING, 1998; BOAHEN, 2010). Sobre a colonização belga no Congo, país visitado por Tintim, ver: (HOCHSCHILD, 1999).

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continente africano. Conforme a placa, onde se lê ―Proibido atravessar a linha sem autorização do chefe de estação‖, percebe-se que até para atravessarem os trilhos do trem os ―africanos‖ necessitam da ajuda de alguém treinado pelos europeus. Devem ficar condicionados às ordens do chefe de estação, o representante colonial do lugar. De forma sutil, há forte alusão aos mecanismos coloniais do governo colonial indireto, tomados como modelo pelos ingleses durante a colonização europeia no continente africano.

(Tintim no Congo, 2008, p.23) 103

As sequências abaixo nos indicam outras representações estereotipadas dos ―africanos‖:

(Tintim no Congo, 2008, p.27)

Após ter sido alçado ao lugar de soberano da ―tribo dos bakanas‖, Tintim inicia sua peregrinação entre seus ―súbditos‖. Com a ―tranquilidade típica‖ de um europeu, o herói vê uma briga entre dois ―primitivos‖ africanos. Sua intervenção para separar os dois contendores é seguida de outra sequência de quadrinhos que explica o motivo do conflito:

103 (Tintim no Congo, 2008, 23). A colonização dos belgas no Congo foi uma das mais sangrentas possíveis. Foi descrita em um romance por Conrad (1999), indicando parte das atrocidades cometidas em nome da civilização. A colonização belga no Congo foi feita de forma direta.

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(Tintin au Congo, 2008, p.20)

As diferenças entre os vários povos do continente africano são, desta forma, subtilmente assim retratadas nesta História em Quadrinhos. ―Quem começou a briga‖? Infantilizando os adversários, Tintim decide o conflito com a calma que lhe é peculiar: divide em duas partes o chapéu roto e estragado, objeto da discórdia entre os dois africanos, e entrega um pedaço do mesmo para cada. Ambos saem felizes e proclamam a justeza do herói, que resolveu a questão com a máxima serenidade possível. Os quadrinhos de Hergê o denunciam perante suas representações. Mas, em que sociedade vivia este escritor e desenhista? A Bélgica do final dos anos 1920, momento em que Hergê produz a história em questão, certamente não teria muitos motivos para retratar de forma positiva os diferentes povos do continente africano. Certamente, poucos eram os indivíduos que atribuíam humanidade plena para os congoleses, algo que se reflete nos desenhos de nosso autor. Estes mostram a forma grosseira, rude, caricaturizada e estereotipada com que homens e mulheres foram retratados. Esta História em Quadrinhos foi, inclusive, objeto de ação judicial nos tribunais, belgas, mostrando o quanto rendeu (e ainda rende) polêmicas no ―país natal‖ de Tintim. 104

Fantasma: o herói das selvas que não possui superpoderes.

Fantasma é o nome do personagem criado por Falk Lee e desenhado por Ray Moore em 1936. Na História em Quadrinhos, Fantasma é o herdeiro de uma linhagem em que sempre o primogênito toma o lugar do falecido, dando seguimento à promessa feita pelo primeiro Fantasma, que perante o crânio do assassino de seu pai jurou devotar à vida no combate a pirataria e ao crime, sendo seguido pelos seus descendentes. Seus feitos são repassados de geração em geração entre os homens e suas histórias sempre o

104 PESSOA Carlos. Tribunal belga decidiu que Hergé não era racista e “Tintin no Congo” continuará nas livrarias. 14/02/2012. http://www.publico.pt/cultura/noticia/tribunal-belga-decidiu-que-herge-nao-era-racista-e-tintin-no-congo-continuara-nas-livrarias-1533715, acessado em 20/03/2013.

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colocam como alguém que defende os mais fracos, bem como os animais das selvas, desde que estes não coloquem em risco a vida dos seres humanos105.

É um homem ―branco‖, descendente de europeus, que vive resolvendo as querelas e contendas das ―tribos‖ da África, sempre acompanhadas de seus fiéis animais e dos pigmeus bandar, temidos por suas flechas venenosas e únicos conhecedores do segredo de que Fantasma é um homem mortal106. Fantasma mora na Caverna da Caveira, localizada em Bangala (que em algumas revistas nos é apresentada como parte do continente africano, e em outras localiza-se na Ásia), tem filhos e uma esposa norte americana, chamada Diana Palmer.

É conhecido como ―O Espírito que Anda‖ pelo fato dos ―nativos‖ pertencentes as ―tribos‖ africanas acreditarem que se trata de um homem que vive há mais de quatrocentos anos. A lenda de Fantasma, nesse sentido, remonta a ideia de uma sucessão de pais e filhos que ao longo dos anos combatem o crime e os mal feitores. Fantasma foi concebido em um contexto no qual os povos do continente africano viviam sob o jugo da colonização europeia. Os desenhos existentes nas suas histórias, em geral, mostram os homens e as mulheres vestidos com poucas roupas, quase sempre trajando uma tanga, portando armas ―primitivas‖, a exemplo da lança, faca e arco e flecha. Suas religiões eram um misto de ―cultos primitivos‖, regados à magia, consideradas inúteis e selvagens por nosso personagem em várias de suas aventuras. Fantasma garantia a paz entre as ―tribos‖, impedia que recorressem à guerra para resolverem seus problemas e afiançava os acordos, bem como o cumprimento destes. Sem ele, os ―africanos‖ viveriam em meio às guerras e selvageria.

Os quadrinhos abaixo mostram a narrativa que deu origem ao herói Fantasma, o episódio do assassinato de seu pai e o juramento da caveira:

105 Tarzan também pode ser apontado como um defensor dos animais e da floresta. Esta relação entre floresta/paisagem natural e o continente africano pode ser compreendida a partir da ideia de que os colonizadores europeus, ao longo do século XIX, construíram representações que relegaram á África a condição de estado natural, conforme indicação de Hegel (1985), que, dentre outras questões, apontou para este continente a ausência de transformações. Tanto Tarzan, como Fantasma, Jim das Selvas, Lothar e Tintim são indicações de que o continente africano foi, durante muito tempo, representado como uma grande selva, habitada por povos que viviam no estado natural. Não é a toa que ainda hoje, em grande parte das salas de aula e nas ruas em geral, os povos africanos sejam retratados pelo conceito de ―tribos‖. Sobre Tarzan, ver: (RIBEIRO, 2008). 106 Para este trabalho estou tomando como objeto de análise as revistas do Fantasma existentes no site abaixo, disponível para download: http://guiaebal.com/albumfantasma.html

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O que salta aos olhos do leitor é a forma pela qual os homens ―africanos‖ foram desenhados. As Histórias em Quadrinhos do Fantasma, publicadas pela EBAL, RGE e Editora Globo tinham como marca registrada as representações dos homens e mulheres do continente africano dos modos mais grosseiros possíveis. Seus traços animalescos, além das suas vestes e armas, podem ser mais bem percebidos na sequência de quadrinhos abaixo, em que o filho do Fantasma, no momento em que está as vésperas de ir estudar no mundo ―civilizado‖, brinca o quanto pode com seu amigo de infância. Todos os personagens da história são desenhados conforme sua ―origem‖ e identificação racial. Os ―africanos‖ são representados de forma estereotipada, sem roupas e dotados de maus modos:

(http://guiaebal.com/albumfantasma.html Volume I, p. 8 – 9.)

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O futuro Fantasma precisa se educar, obter conhecimento e erudição. Para isso, deve viajar, não importando, a depender da versão que estejamos lendo, se para a Europa ou para os Estados Unidos. Observe o quanto o filho do Fantasma está impregnado da selvageria e incivilidade, conforme o quarto quadrinho da sequência acima. Ele não está acostumado com roupas, e é objeto de zombarias dos seus amigos ―africanos‖. A dinastia precisa ter a garantia de que irá continuar, e para isso, o futuro Fantasma deve ir à busca de educação, cultura e refinamento, algo inexistente no ambiente da selva em que mora. A África, nesta História em Quadrinhos, é a negação da civilização.

A sequência abaixo mostra o quanto os ―africanos‖ foram estereotipados nestes quadrinhos. Além da forma pela qual foram desenhados, suas falas lhes atribuem um pensamento primitivo, ingênuo em alguns casos, destituído dos saberes ocidentais, superiores em todos os aspectos. Por serem incivilizados e desconhecedores da ciência e do conhecimento existente no Ocidente, nada mais justo do que terem sido colonizados. Eis uma das muitas possibilidades de interpretação que um leitor destas revistas poderia chegar:

(http://guiaebal.com/albumfantasma.html Volume I, pp.8-9)

Em uma de suas muitas lutas contra os mal feitores, Fantasma ficou gravemente ferido. Necessitou da ajuda dos fiéis e inseparáveis pigmeus Bandar. E estes foram em seu socorro, guiados por Capeto, o lobo de Fantasma, para que seu dono fosse salvo. Após o resgate, prepararam um ―culto primitivo‖ para espantar os demônios e se entregaram ao êxtase do corpo, típico das religiões ―primitivas‖:

(http://guiaebal.com/albumfantasma.html Volume I, pp. 8-9.)

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O ―africano‖ toca o tambor e emite sons estranhos, como se estivesse fora de si. E os ―africanos‖ dançam de forma frenética, como se estivessem possuídos por espíritos. Estas representações certamente foram tomadas como semelhantes às que ainda hoje são atribuídas aos praticantes das religiões de terreiros no Brasil, dado as semelhanças sugeridas pela dança sob a forma de roda, além da alusão aos espíritos como causadores do mal. As representações estereotipadas das religiões existentes no continente africano são recorrentes não apenas nas Histórias em Quadrinhos do Fantasma, mas também nos filmes hollywoodianos, onde, na maioria das vezes, são associadas com o mal e a selvageria.

Estas imagens depreciativas das religiões existentes no continente africano foram uma constante nas edições das editoras já citadas. Quando nosso herói protagoniza alguma luta contra a ―ignorância‖ existente nestas religiões, o faz em nome da luta pelo progresso e contra as crendices. Estas religiões, por sinal, não são eficientes, conforme a sequência de quadrinhos abaixo, que mostram o feiticeiro tomando uma decisão difícil e ao mesmo tempo dura: usar o fogo no corpo do herói, de modo que este tenha os maus espíritos retirados de seu corpo. Capeto, o lobo ajudante de nosso herói, intervém contra o ―tratamento pouco científico‖ e é ameaçado pelas flechas dos primitivos pigmeus bandar. Fantasma, ao acordar, observa a situação e repreende os pigmeus por terem ameaçado Capeto. Pede que estes tragam um médico, posto que ele esteja precisando de ―magia branca‖ e exige que a cerimônia seja encerrada:

(http://guiaebal.com/albumfantasma.html Volume I, p.12)

Mais uma vez percebemos a forma pejorativa e estereotipada com que os povos do continente africano foram tratados. Aliás, grosso modo, mesmo em muitos trabalhos acadêmicos há também o apelo por algumas estereotipias, a exemplo da recorrência com que o continente africano é tratado com a perspectiva de lugar. A homogeneidade presente nos discursos que reduzem povos, línguas, costumes, práticas e religiões ao termo ―africano‖ revela que mesmo entre os estudiosos há a presença das representações eivadas de estereotipias. Em relação aos quadrinhos acima, chama a atenção as mensagens subtis, a exemplo da que coloca os homens, no caso os pigmeus, como inferiores a um animal, que percebeu o perigo que Fantasma estava correndo com o

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tratamento ―religioso‖ do fogo, como forma de ―expulsar os demônios‖ do corpo do herói107.

As revistas do Fantasma tiveram uma mudança significativa nos seus traços à medida que os tempos mudavam. As edições publicadas nos anos 1990 pela Editora Globo atestam tais modificações. Os traços ganharam maior aprimoramento nas revistas publicadas pela Opera Graphica, nos anos 2000, e suas histórias ganharam maior complexidade, refletindo os novos tempos em que vivemos. As revistas do Fantasma não estão sendo publicadas por nenhuma editora no Brasil. Talvez este seja um sinal de que as mudanças que existiram nas revistas deste personagem não foram suficientes para que continuasse atraindo o interesse do público em geral.

O Soldado Desconhecido: a guerra e a guerra no continente africano. A representação clássica de uma sociedade posta como superior, sem guerras e

conflitos é uma constante nos filmes hollywoodianos que possuem o continente africano como foco. O quadrinho acima tematiza essa questão, naturalizando uma realidade circunstancial, enfatizando o clichê de que os EUA são superiores em termos de civilização e economia, quando comparados com Uganda, lugar inviável e caótico. 108 Os clichês e as estereotipias estão presentes ao longo das páginas desta História em Quadrinhos. Além do desprezo que se atribui para a história do povos deste país, a revista sugere, de forma subtil, que o passado nada vale, e que o continente é um palco de sucessivas catástrofes:

(Soldado desconhecido, Vol06, p.17)

107 As religiões sempre objeto de controvérsias entre os estudiosos do continente africano. Independente dos seus significados deve ser entendida como fenômeno humano, e, em alguns casos, elemento aglutinador na manutenção dos valores e identidades, conforme nos mostra o romance de Achebe (2011), que narra a história de um sacerdote religioso, em meio aos conflitos da colonização europeia. 108 Um excelente trabalho sobre O Soldado Desconhecido pode ser visto em (TÁBATA. 2013). Em aos filmes hollywoodianos e o continente africano, ver: (SANTOS, 2013).

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(Soldado desconhecido, Vol06, p.17)

O Soldado Desconhecido é o nome do personagem de uma revista que foi publicada pelo selo Vertigo, originalmente entre os anos 2008 a 2010. Os roteiros foram escritos por Joshua Dysart e os desenhos são de autoria de Alberto Ponticelli. Posso afirmar, com alguma firmeza, que O Soldado Desconhecido pode ser definido como fruto das novas tendências das revistas em quadrinhos contemporâneas. Contrastando com os exemplos anteriores, os personagens das histórias destas revistas possuem seus traços melhor definidos, fugindo das representações animalescas, rudes ou toscas, atribuídos aos homens e mulheres do continente africano. Os autores destas revistas tiveram o cuidado de ir em busca das informações específicas sobre o contexto e a história do lugar que serve de cenário para a narrativa. Por mais que se apresentem críticas sobre as Histórias em Quadrinhos deste personagem, a exemplo de serem as mesmas o resultado de uma espécie de ―consciência de culpa‖ do ocidente, impotente em ―resolver os problemas dos africanos‖, devem ser ressaltadas as diferenças entre os desenhos e roteiros deste personagem e os que foram descritos anteriormente.

A história narra a vida de um homem, Moses Lwanga, que aos sete anos de idade foge de seu país, junto com seus pais, para os EUA, em virtude dos conflitos que Uganda enfrentava a época em que Idi Amin Dadá era o governante. Nos EUA Moses estuda medicina e vive uma vida ―normal‖, sem guerras e conflitos. Retorna para o seu país em fins dos anos 1990, casado com a também médica e ugandense Sera Lwanga. O propósito de ambos, conforme as palavras de Moses no primeiro número da revista, é a reconstrução do país, que ainda vive um conflito entre o exército nacional e o movimento rebelde denominado LRA (Exército de Resistência do Senhor). Joseph Kony, se intitula líder a serviço de Cristo, e luta para implantar um regime teocrático no país. Sua principal forma de recrutamento dos soldados para o seu exército é a captura de jovens e crianças. Este fato gerou fortes movimentos de oposição ao seu movimento em âmbito mundial, e tem chamado a atenção devido aos transtornos causados ao país ao longo dos anos 2000.

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Esta História em Quadrinhos tem como principal facto a transformação do médico Moses Lwanga no Soldado Desconhecido. Diante dos constantes atos de violência e assassinatos que presencia, Moses se vê em meio a um conflito entre sua consciência e uma voz interior, que lhe faz provocar o desfiguramento de seu rosto. A revista gira em torno da acção deste personagem, que vive em meio a guerra contra o LRA e as suas lembranças da época em que viveu nos Estados Unidos. No que tange ao facto das histórias terem grande número de informações sobre os povos e a região, há que se considerar alguns aspectos muito problemáticos, que fazem desta revista mais um instrumento eivado de representações negativas sobre o continente africano e os povos que o habitam. Por mais que seus autores tenham empreendido esforços no sentido de buscarem informações sobre os conflitos, bem como os povos que vivem em Uganda, alguns trechos das histórias apresentam, mesmo que de forma sutil, os norte americanos e os EUA como superiores ao ambiente descrito, conforme o quadrinho abaixo:

A representação clássica de uma sociedade posta como superior, sem guerras e conflitos é uma constante nos filmes hollywoodianos que possuem o continente africano como foco. O quadrinho acima tematiza essa questão, naturalizando uma realidade circunstancial, enfatizando o clichê de que os EUA são superiores em termos de civilização e economia, quando comparados com Uganda, lugar inviável e caótico109. Os clichês e as estereotipias estão presentes ao longo das páginas desta História em Quadrinhos. Além do desprezo que se atribui para a história do povos deste país, a revista sugere, de forma subtil, que o passado nada vale, e que o continente é um palco de sucessivas catástrofes:

109 Um excelente trabalho sobre O Soldado Desconhecido pode ser visto em (TÁBATA, 2013). Em aos filmes hollywoodianos e o continente africano, ver: (SANTOS, 2013).

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(Soldade desconhecido, Vol.06, p.17)

Os acontecimentos feitos pelos homens e mulheres deste continente, no período anterior à chegada dos europeus, não possui nenhum valor. A imagens recorrentes, que justificam a existência da revista e que garantem a venda continuam as mesmas: guerra, desastres, mortes, homens e crianças armadas... São reforçados os argumentos que apresentam os europeus e norte americanos como superiores aos africanos, isso em meio a uma trama e narrativas construídas em páginas dotadas de grande número de informações sobre o continente africano. O leitor dificilmente se questionará a respeito destas imagens, pois elas são verídicas, conforme as notícias dos jornais, os filmes, as revistas semanais... A África é uma grande desastre, inviável e caótica, eis algumas das representações possíveis para alguém que se vê diante das páginas desta revista:

(Soldado desconhecido, Vol06, p.7)

Guerra, sangue, mortes... Este é o cenário principal desta História em Quadrinhos. O Soldado Desconhecido tematizou a guerra em Uganda, como se o continente em que este país está inserido tivesse o conflito como algo natural. Mas, afinal de contas, o que justifica representar um continente sob as constantes estereotipias baseadas na guerra, doenças, fome e miséria? Ao que me parece, esta História em Quadrinhos se insere no contexto da consciência culpada do Ocidente, que se mostra ―interessada em ajudar a África‖, mas que não consegue empreender um esforço no sentido de melhor compreender os povos e suas histórias.

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Conclusão: História a partir das Histórias em Quadrinhos.

As Histórias em Quadrinhos possuem imenso poder no que diz respeito à propagação de representações. Sugerem cenários, opiniões, contextos e ―verdades‖ que nem sempre correspondem às realidades que descrevem. E formam consciências, uma vez que seus leitores reproduzem as informações que absorvem. Fantasma, Tintim e OSoldado Desconhecido são apenas alguns dos muitos exemplos de personagens que tiveram o continente africano como cenário de suas histórias e aventuras. A insistência nas representações estereotipadas deve servir como questão para pensar sobre a importância e as possibilidades das Histórias em Quadrinhos como fonte para os historiadores. Elas trazem diferentes marcas, o que me faz pensar em indagar sobre a existência de liames entre as histórias em quadrinhos e a forma como as pessoas pensam na atualidade.

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