novos caminhos

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL MESTRADO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL TICIANO RICARDO PALUDO RECONFIGURAÇÕES MUSICAIS: OS NOVOS CAMINHOS DA MÚSICA NA ERA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL Porto Alegre, março de 2010

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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE COMUNICAO SOCIAL PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM COMUNICAO SOCIAL MESTRADO EM COMUNICAO SOCIAL

TICIANO RICARDO PALUDO

RECONFIGURAES MUSICAIS: OS NOVOS CAMINHOS DA MSICA NA ERA DA COMUNICAO DIGITAL

Porto Alegre, maro de 2010

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)P184r Paludo, Ticiano Ricardo Reconfiguraes musicais: os novos caminhos da msica na era da comunicao digital. / Ticiano Ricardo Paludo. Porto Alegre, 2010. 308 f. : il. Dissertao (Mestrado em Comunicao Social) Faculdade de Comunicao Social, PUCRS. Orientao: Prof. Dr. Carlos Gerbase. 1. Comunicao Social. 2. Produo Musical. 3. Cibercultura. 4. Comunicao e Tecnologia. I. Gerbase, Carlos. II. Ttulo. CDD 301.243 780.07Ficha elaborada pela bibliotecria Cntia Borges Greff CRB 10/1437

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TICIANO RICARDO PALUDO

RECONFIGURAES MUSICAIS: OS NOVOS CAMINHOS DA MSICA NA ERA DA COMUNICAO DIGITAL

Dissertao apresentada como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Comunicao Social, pelo Programa de Ps-graduao em Comunicao Social da Faculdade de Comunicao Social da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.

Orientador: Prof. Dr. CARLOS GERBASE

Porto Alegre, maro de 2010

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RESUMO DO TRABALHO A presente dissertao pretende investigar como os avanos tecnolgicos esto influenciando a criao, produo e circulao no campo musical. Este estudo tem como base uma anlise desenvolvida atravs de resgates efetuados por meio de recortes histricos do sculo XX e XXI no que se refere aos processos de produo musical que se utilizaram e se utilizam de instrumentos eletrnicos (principalmente o computador) e de que forma esses processos se relacionam com a comunicao social e a cibercultura. O trabalho ser desenvolvido sob o ponto de vista do pesquisador insider (HODKINSON, 2005). PALAVRAS-CHAVE: produo musical ; comunicao social ; cibercultura.

ABSTRACT This study explores how the technology actuates into professional music market creation, production and, distribution. It will be grounded using some history clippings of XX and XXI centuries. The author draws some thoughts mixing music, marketing, bios, media and cyberculture approaches. The work will be developed under inside research concept (HODKINSON, 2005). KEYWORDS: musical production ; media ; cyberculture.

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TICIANO RICARDO PALUDO

RECONFIGURAES MUSICAIS: OS NOVOS CAMINHOS DA MSICA NA ERA DA COMUNICAO DIGITAL

Dissertao apresentada como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Comunicao Social, pelo Programa de Ps-graduao em Comunicao Social da Faculdade de Comunicao Social da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.

Aprovada pela Banca Examinadora em 19 de Maro de 2010.

BANCA EXAMINADORA:

___________________________ Prof. Dr. CARLOS GERBASE

______________________________ Prof. Dr. ADRIANA AMARAL

______________________________ Prof. Dr. JOO GUILHERME BARONE

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AGRADECIMENTOS E DEDICATRIADepois de inmeras xcaras de caf e maos de Marlboro, discusses, reflexes, tenses, leituras, alegrias, congressos e viagens, chegou a hora de comemorar. Comemorar um crescimento pessoal e intelectual recompensador. Foram muitas as pessoas importantes nesse processo. Agradecer cada uma em particular ocuparia uma centena de pginas. Porm, algumas precisam ser citadas aqui.

Em primeiro lugar, agradeo aos professores do programa de ps-graduao da PUCRS/FAMECOS (em ordem de disciplinas cursadas): 2007/1 Carlos Gerbase (meu orientador, amigo e exemplo que seguirei sempre); 2008/1 Juremir Machado da Silva (uma das pessoas mais incrveis que j conheci, e que me fez deixar de ser um intelectual burgus); Cludia Moura (pelo carinho e companheirismo); 2008/2 Mgda Rodrigues da Cunha (obrigado por sempre acreditar nos meus projetos mirabolantes); Francisco Rdiger (que me chama de bom selvagem); Antonio Hohlfeldt (quando crescer, quero ser como tu); 2009/1 Eduardo Pellanda (meu amigo querido, o cara mais tecnolgico que conheo); 2009/2 Bia Rahde (a criatura mais doce que me deu aula na ps da Famecos; te adoro de paixo; obrigado pelos papos sensacionais sobre arte e comunicao).

Um agradecimento aos colegas docentes e amigos do peito: Andria Mallmann, Alberto Raguenet, Andr Pase, Cssio Grinberg, Cristiane Finger, Cristina Lima, lson Semp, Fabian Chelkanoff, Ilton Teitelbaum, Luciano Klckner, Marcelo Trsel, Neka Machado, Roberto Tietzmann, Srgio Stosch, Silvana Sandini, Souvenir Dornelles, Vanessa Purper e Vtor Necchi (adoro vocs todos).

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Obrigado aos tcnicos do estdio de udio da FAMECOS: Z Carlos, Fabrcio, Anderson e Alencar.

Obrigado a PUCRS que me concedeu uma bolsa de estudos para a realizao do mestrado.

Obrigado minha famlia que sempre me apoiou em tudo: meu pai (Antonio), minha me (Laura) e minha irm (Carla). Obrigado aos meus cunhados Felipe e Flvio. No poderia esquecer, tambm, da Elisa (corao), ngela (Ampam), Teca, Miguel, Nani, Beth, Guto, Jonas, Ismael, Cora e Davi. Um agradecimento especial a meu primo rio Fraga (que me apresentou os Beatles e o violo).

Obrigado aos meus bichinhos de estimao que sempre me fizeram companhia nas madrugadas enquanto eu escrevia: u-us para Melissa e miados para Alxia, Jlia, Alex, Sophia e Sebastian (meu assistente de produo musical).

Quem tem amigos, tem tudo: obrigado Luciana Martins, Gustavo Demarchi, Camila Testa, Rick & Lene, Elaine (loiro), Carolho, Simone & Plets, Dani Schmitz, MC Aquino, Sandra Montardo, Simone S, Cntia Carvalho, Paula Puhl, DJ Gorpo, Juliana Tonin, Rodrigo Valente, Vera Broilo e Mateus Werb. Tambm ao Nelson Cardoso e toda a equipe da Revista Backstage.

Obrigado aos amigos e doutores da banca: Adriana Amaral (minha amiga do peito e companheira de perucagens) e Joo Guilherme Barone (super guitar hero).

Obrigado aos meus alunos da graduao que sempre me ensinam muito.

Obrigado FAMECOS (minha segunda casa).

E por fim, um obrigado especial minha esposa, amiga e companheira Luciana Queiroga (te amo mais que tudo!), a quem dedico este estudo.

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SUMRIO AGRADECIMENTOS E DEDICATRIA [6] INTRODUO [11]- O Problema de Pesquisa [12] - Os Objetivos da Pesquisa [12] - Justiticativa [13] - Hipteses [13] - Estratgias Metodolgicas [14]

LISTA DE FIGURAS [20]

LISTA DE QUADROS E TABELAS [23]

CAPTULO I: CONFIGURAES (1900 1980)1. O Produtor Musical [25] 1.1 Produo Musical: o incio da profisso [25] 1.2 Produzindo [27] 1.3 O Produtor e a Gravadora [29] 1.4 Os tipos de Produtor Musical (categorizao) [31] 1.5 Os custos de Produo [32] 1.6 O Produtor e o Mercado de Produo [33] 1.7 O Produtor e o Produto [34] 1.8 Etapas de Produo [45] 1.8.1 Pr-Produo [45] 1.8.2 Produo [47] 1.8.3 Ps-Produo [51] 1.9 Gravadoras e Selos Musicais [53] 1.10 Como os Produtores se tornam Produtores [58] 1.11 Classic Albums [61] 1.12 Fluxograma da Produo Musical [63]

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2. Msica Eletroacstica / Msica Concreta os DJs primitivos da Cibermsica [65] 2.1 A Arte do Rudo [65] 2.2 Msica Eletrnica, Eletroacstica ou Concreta? [72] 2.3 O Rudo como Elemento Construtor [76] 2.4 A Msica Eletrnica e sua origem [80] 2.5 Reflexos da/na Msica Eletrnica [86] 3. Contracultura(s): Movimente o Movimento [89] 3.1 Fundamentos da Contracultura [90] 3.2 O Dadasmo e Marcel Duchamp: Are You Ready Made? [93] 3.3 A Pop Art e Andy Warhol [97] 3.4 O Movimento Punk [104] 4. Sgt. Peppers: traos contemporneos e narrativa musical [117] 4.1 Contexto Histrico [118] 4.2 Beatles e avatares [120] 4.3 Beatles e a atualidade [124] 4.4 Processos de Simulao [125] 4.5 Beatles, narrativa e as trs matrizes [127] 4.6 Outras consideraes sobre a obra [136]

CAPTULO II: RECONFIGURAES (1980 2010)1. Reconfigurando I... [143] 1.1 Reconfigurando a Produo [143] 1.2 Reconfigurando o Estdio [148] 1.3 Reconfigurando o Produtor [157] 1.4 Reconfigurando os Instrumentos Musicais [158] 1.5 Reconfigurando os Msicos [160] 1.6 Reconfigurando a Msica [162] 2. Walter Benjamin Remixado:A Aura Musical na Era da Cibercultura e da Arte Atual [163] 2.1 Benjamin e a aura [163] 2.2 A aura e o Artista [172] 2.3 Pensando o aqui e agora [173] 2.4 A aura e o mercado [175] 2.5 Os neo-marchands da aura [178] 2.6 Remixando... [186] 3. Cyberhoods e a Emisso Musical Contempornea [188] 3.1 Mudanas no Plo Emissor [188] 3.2 Novas Ferramentas para Novos Tempos [190] 3.3 As Mu(Danas) no Espetculo [193] 3.4 Nasce o Cyberhood [201] 3.5 Desdobramentos em Conexo [205] 9

4. Reconfigurando II... [207] 4.1 Reconfigurando a Produo Coletiva [208] 4.2 Reconfigurando a Vitrine [219] 4.3 Reconfigurando a Distribuio [234] 4.4 Reconfigurando as Relaes [241]

5. Transmsica: Narrativas Transmiditicas para Msica em Movimento [250] 5.1 TESARAC vista [250] 5.2 Interfaces [251] 5.3 Digital Natives [252] 5.4 Narrativas Transmiditicas para a Juventude [256] 5.5 Aplicaes prticas de cases de Narrativas Transmiditicas [261]

ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE ALGUMAS COISAS [272] REFERNCIAS [275] RELAO DOS ANEXOS DIGITAIS [286] GLOSSRIO [291]

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INTRODUO

A presente dissertao pretende esclarecer como os avanos tecnolgicos esto influenciando a criao, produo e circulao no campo musical. Este estudo tem como base uma anlise desenvolvida atravs de resgates efetuados por meio de recortes histricos do sculo XX e XXI no que se refere aos processos de produo musical que se utilizaram e se utilizam de instrumentos eletrnicos (principalmente o computador) e de que forma esses processos se relacionam com a comunicao social e a cibercultura. O trabalho ser desenvolvido sob o ponto de vista do pesquisador insider (HODKINSON, 2005).

Mesmo que de maneira discreta, j no sculo XI a comunicao caminhava de mos dadas com a msica (quando a msica escrita comea a se desenvolver, caracterizando-se como uma mensagem, elaborada por um ou mais emissor musical que tem como alvo um receptor ouvinte). Esse processo cresceu tanto na ltima dcada que dissociar a comunicao da produo musical tornou-se impossvel. O estudo abordar recortes que permitam compreender a passagem da msica oral msica escrita, msica gravada e, finalmente, msica digitalizada. Atualmente, a internet e os computadores pessoais desempenham um papel decisivo nos processos produtivos e circulatrios, tornando-se ferramentas que permitem que msicos ao redor do mundo possam compartilhar experincias e fomentar as suas carreiras.

Atualmente, o msico deixa de ser apenas msico. Ele agora precisa utilizar todos os recursos tcnicos e tecnolgicos disponveis para auxili-lo a seduzir o pblico. Sites pessoais, blogs, MP3, You Tube, iPod, sites de redes sociais diversas (em franca expanso e proliferao), comunicadores instantneos, ubiquidade, mobilidade e uma vasta gama de novidades e facilidades tecnolgicas surgiram para transformar radicalmente a maneira como as obras so produzidas, divulgadas e comercializadas. O presente estudo pretende percorrer este caminho para entender a produo musical

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como processo, cuja base do que se v hoje comea a ser moldada no incio do sculo XX.

A dissertao no pretende apontar uma soluo nica para a crise enfrentada pelo paradigma tradicional da Indstria do Disco (pois atualmente nada definitivo e receitas de bolo se mostram utpicas e irreais), mas sim promover uma reflexo analtica baseada no resgate de flashes histricos, referenciais bibliogrficas, anlise de materiais em udio e vdeo, matrias jornalsticas, histrias de vida, dados quantitativos e pesquisa em contedos digitais encontrados na internet. Alm disso, o estudo ter como fonte de apoio, dilogos com msicos e produtores e uma reflexo calcada na prpria experincia de mercado de mais de duas dcadas que possuo, atuando como comunicador social, msico e produtor musical.

O PROBLEMA DA PESQUISA A questo norteadora visa responder seguinte pergunta: De que forma a produo, a circulao e o consumo de msica reconfiguraram-se a partir das tecnologias digitais de comunicao social e como elas esto relacionadas com a promoo e visibilidade dos artistas no contexto da cultura digital?

OS OBJETIVOS DA PESQUISA Atravs de recortes histricos, procurarei compreender a produo musical como um processo evolutivo que foi influenciado por fatores tecnolgicos (tecnologia disponvel para produo e circulao), culturais (movimentos contraculturais) e comunicacionais (recursos utilizados para a produo de sentido e emisso de mensagens).

Identificar de que modo as mudanas comportamentais influenciadas pelo crescente acesso s ferramentas digitais de produo e circulao musical (cada vez mais acessveis e com maior poder de processamento) contriburam ou no para o 12

desenvolvimento da Indstria Fonogrfica, e como os artistas tem se articulado frente s tenses provenientes da massificao do compartilhamento ilegal de arquivos digitais de som, mudana do paradigma base da comunicao (UM-TODOS para TODOSTODOS) e ampla utilizao da internet e da informtica.

JUSTIFICATIVA Tendo em vista a relevncia sobre o tema proposto, o presente trabalho visa contribuir com os estudos referentes produo musical contempornea e importncia da comunicao nesta esfera, atravs de uma anlise calcada em recortes histricos que pretende apresentar algumas explicaes para a importncia da comunicao que se mostra hoje vital para a Indstria Fonogrfica na Era da Cibercultura (tambm denominada de Era Digital). Alm de ser um instrumento funcional que poder auxiliar msicos na tomada de decises sobre a conduo de suas carreiras, o trabalho mostra mais um dos inmeros caminhos possveis de serem seguidos para aqueles que trabalham com comunicao social, fugindo dos esteretipos tradicionais de que o comunicador social limita-se a trabalhar nica e exclusivamente em agncias de propaganda, veculos miditicos ou empresas de marketing. Em resumo, trata-se de um trabalho de cincias sociais aplicadas ao campo musical.

HIPTESES A utilizao de prticas comunicacionais pode auxiliar os futuros artistas a se artiularem de modo eficaz para a construo e consolidao de suas carreiras artsticas. As novas tecnologias serviram para democratizar o mercado fonogrfico em todas as suas esferas, desde o artista at o publico consumidor. A msica contempornea baseia-se na mistura equilibrada entre elementos orgnicos e sintticos.

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O mercado musical precisa se reinventar. Nunca se consumiu tanta msica como atualmente, porm, quando se fala em consumo, devemos entend-lo no como um ato de simples compra, mas sim de incluso social, participao e entretenimento.

ESTRATGIAS METODOLGICAS O ponto de partida deste estudo foi um misto de paixo e desafio. Leciono (em nvel de graduao) as disciplinas de udio publicitrio na PUCRS/FAMECOS e FACCAT/RS. Meus primeiros contatos em nvel profissional com a msica se deram h mais de duas dcadas. Alm das atividades acadmicas descritas anteriormente, trabalho ativamente no mercado como produtor musical, sound designer, sound colocator, remixer e pesquisador e consultor na rea de cibermsica (que mescla estudos interdisciplinares entre msica, comunicao social, arte, novas tecnologias, cibercultura e antropologia)1

. Aps ingresso como professor na PUCRS/FAMECOS,

implantei e consolidei (em 2007) o Curso de Extenso em Produo Musical. Meu trabalho de produo musical internacionalmente reconhecido, j tendo conquistado um nmero considervel de premiaes locais, regionais, nacionais e internacionais. Quando chegou o momento de escrever a minha monografia ao final do curso de Publicidade e Propaganda (1998 PUCRS/FAMECOS), fiz uma analise da carreira do grupo musical Kiss, procurando entender j naquela ocasio como funcionava a articulao estratgica entre a comunicao social e a msica. Este trabalho (atualmente disponvel online2

) ainda serve de fonte de consulta para vrios alunos da graduao

que demonstram curiosidade e interesse pelo tema. Em 2007, julguei necessrio seguir meus estudos, partindo da mesma paixo pela msica que me motivou a escrever a monografia, agora em um nvel mais aprofundado: a presente dissertao de mestrado.

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Os conceitos de produtor musical, sound designer, sound colocator e remixer podem ser encontrados no Glossrio desta dissertao. 2 Disponvel em

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Portanto, como exposto, a paixo pela msica sempre presente na minha vida foi a motivao principal para a realizao desse estudo (alm da obvia qualificao docente e profissional que um mestrado proporciona). Mas, e o desafio? O primeiro e talvez o ponto alto a ser enfrentado foi deixar que a paixo no contaminasse a pesquisa. Isso necessrio, pois o que pronho analisar, no s a prtica dos profissionais que atuam como produtores musicais no mercado fonogrfico, como a minha prpria prtica, aliando meus conhecimentos de mercado musical e comunicao social. Assim, um distanciamento racional se fez necessrio. Observando o problema de pesquisa, os objetivos e hipteses apresentados anteriormente, a possibilidade de se encontrar aquilo que se desejava encontrar e no o que de fato pareceu-me uma armadilha tentadora, passvel de seduo que sempre ronda os pesquisadores, podendo ofuscar uma viso centrada e realista. A soluo encontrada foi uma extensa reflexo e estudo procurando sempre deixar a paixo presente (pois ela saudvel e nos move constantemente), mas sem esquecer que qualquer descuido que contaminasse o resultado final deixaria o trabalho frgil e ineficiente. Assim, partindo da proposta metodolgica do pesquisador insider levantada por HODKINSON (2005), baseado no conceito do pesquisador que estuda um cenrio no qual encontra-se inserido e atuante, optei por realizar o estudo sob um ponto de vista qualitativo (reviso bibliogrfica, observao, coleta de dados e histria de vida). Uma vez definido o foco metodolgico, parti em busca de fontes tericas e histricas para a construo do trabalho, levando em conta os prazos para a realizao do estudo e os objetivos e hipteses da pesquisa. Paralelamente, analisei as disciplinas oferecidas pelo programa de ps-graduao da PUCRS/FAMECOS e elenquei aquelas que serviriam ao propsito do tema do estudo. medida que as disciplinas foram cursadas, os conhecimentos adquiridos em cada uma foram gradualmente sendo aplicados ao texto da dissertao. medida em que o tempo passava, a dissertao ia evoluindo, pois como grande parte das disciplinas exigia a produo de um artigo relacionando os contedos apresentados em sala de aula, aproveitei a oportunidade para aplic-los de acordo com o objeto e foco deste estudo. Para que isso funcionasse bem, anteriormente defini dentro do amplo espectro de recortes possveis, quais seriam funcionais para minhas analises e reflexes, contribuindo para que, ao final, pudesse dar conta do que o trabalho se propunha.

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O estudo ficou estruturado da seguinte forma: Introduo (aonde so apresentados o objeto de estudo, o problema da pesquisa, as hipteses e a metodologia utilizada); Captulo I (qua trata das configuraes, utilizando uma linha de tempo didtica que inicia em 1900 e vai at o ano de 1980); Capitulo II (referente s reconfiguraes, tambm utilizando uma linha de tempo nos mesmos moldes do Captulo I, indo de 1980 at o presente momento); e Consideraes Finais (resgatando os conceitos, recortes e idias apresentadas anteriormente e confrontando-os com a proposta de trabalho apresentada na Introduo). Os captulos foram divididos em subcaptulos. Adotei a utilizao de palavras-chave (tags, que significa etiquetas) como recurso funcional (partindo-se da observao de como as informaes so organizadas no ciberespao) para auxiliar a leitura do trabalho. Tambm elaborei um Glossrio contendo termos pertinentes ao estudo proposto. Parte do material utilizado na pesquisa foi includo em formato de anexo digital (arquivos de texto, udio e vdeo disponibilizados em CD-R). Para evitar a repetio do termo disponvel nos anexos digitais da presente dissertao, propus a adoo do smbolo (o). Deste modo, sempre que este smbolo aparecer no decorrer do texto, fica subentendido que existe um arquivo digital complementar que pode ser acessado nos anexos digitais da dissertao. O Glossrio foi tratado da mesma forma. Sempre que o smbolo (G) for encontrado no texto, significa que o Glossrio pode ser acessado como fonte complementar. O estudo inclui, ainda, Listagem de Figuras, Listagem de Quadros, Grficos e Tabelas e Relao dos Anexos Digitais (com citao de suas respectivas fontes).

No primeiro captulo, abordarei os seguintes recortes: inicialmente, ser apresentado um panorama geral da profisso de produtor musical, incluindo categorizaes, apresentao de nomenclatura tcnica utilizada neste contexto, histrico da profisso e demais informaes pertinentes ao estudo. Em um segundo momento, apresentarei um levantamento referente Msica Eletroacstica, suas origens e desdobramentos contemporneos. Na sequncia, uma conceituao sobre os movimentos de contracultura, dos quais, sero pinados, posteriormente, os movimentos Dadasmo, Pop Art e Movimento Punk. Em sequencia, apresento um estudo sobre o lbum Sgt. Peppers Lonely Heart Club Band (1967) da banda britnica Beatles e sua importnca histrica para a profisso de produtor musical.

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No segundo captulo, iniciarei examinando uma srie de reconfiguraes que ocorreram a partir da dcada de 1980 relacionadas ao campo da produo musical, enfocando o tema produo. Aps, analisarei o conceito de lbum musical e sua transformao no momento da passagem da msica gravada para a msica digitalizada. Posto isso, voltarei a analisar outras reconfiguraes, desta vez enfocando o tema circulao. Ento, passarei a demonstrar como o conceito de narrativa transmiditica (JENKINS, 2008) pode ser til para a produo musical contempornea. Por fim, selecionei dez exemplos de reconfiguraes atuais que obtiveram sucesso em sua realizao. Durante o processo de pesquisa (que iniciou em 2007/2 e foi finalizado em 2010/1), fui confirmando algumas idias prvias, descobrindo outras novas e ajustando o foco no objeto pesquisado, isto , a produo e circulao da msica e sua relao com a tecnologia e a comunicao social. Para citar um nico exemplo, o Twitter (servio de microblogging) ainda no havia atingido a popularidade e relevncia que tem hoje quando o trabalho iniciou em 2007/2. Assim, dentro dos recortes, alguns elementos foram abandonados, outros revistos e outros acrescentados. Para atuar de forna satisfatria em um mundo que se transforma cada vez mais rpido, o pesquisador deve estar atento e pronto para ajustes e novas articulaes que fortaleam a sua pesquisa. medida que o tempo foi passando, as camadas do texto foram se equalizando, sofrendo vrias revises, at chegar-se ao resultado que voc ler a seguir. Procurei variar as fontes de dados para dar conta do tema. Assim, utilizei reviso bibliogrfica terica do campo da comunicao (para explanaes terico-conceituais), busca de informaes complementares extradas de textos de mdia de massa para auxiliar a compreenso de fatos histricos (jornais, biografias e revistas), arquivos digitais para exemplificar as prticas (colhidos na internet, como textos, imagens, vdeos e udios), literatura tcnica, histrias de vida e mdias sonoras e audiovisuais (LPs, CDs, DVDs). As consultas foram calcadas em uma metodologia hbrida de fontes online e offline. Pesquisei fontes cientficas, tcnicas e empricas. Dados recentes de pesquisa tambm do suporte ao raciocnio. Como dito anteriormente, a minha experincia tambm foi levada em conta, incluindo a, observao de minhas prticas cotidianas em um trabalho autonetnogrfico e autoetnogrfico (AMARAL, 2009).

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Para enriquecer o estudo, durante o processo de pesquisa, elaborei e apliquei um questionrio contendo questes referentes ao tema da minha dissertao. O questionrio foi aplicado entre 2007 e 2009, via e-mail, utilizando como amostra um nmero expressivo de atores sociais (msicos, produtores, artistas e membros de gravadoras) e tericos suficientes para qualificarem o trabalho e coerentes para evitar redundncia. A amostra (em torno de 100 entrevistados) foi considerada relevante para dar conta do mercado musical, tendo em vista que o foco da pesquisa qualitativo. A solicitao de participao foi realizada atravs do prprio e-mail e tambm pelo site de rede social com foco em msica Myspace3

. Fora isso, gravei (utilizando um pen drive

dispositivo de armazenamento digital de dados que capta sons e os converte-os para o formato de udio digital comprimido MP3) pequenas entrevistas (realizadas in loco) com autores reconhecidos e consolidados que trabalham com o tema msica e cibercultura. Citando alguns exemplos: Adriana Amaral, Andr Lemos, Lcia Santaella e Raquel Recuero. Por fim, realizei uma entrevista em profundidade com um proprietrio de uma loja de discos de vinil de Porto Alegre / RS que comprovou que ainda vive bem da venda deste suporte que muitos julgam como falecido. Ao final do perodo curricular de mestrado, julguei que o texto da dissertao j apresentava elementos suficientes para embasar o estudo. Em funo da falta de tempo para tabular e analisar os dados colhidos anteriormente de forma profunda e satisfatria, a pesquisa citada foi deixada em espera, e no est includa nesta dissertao. Passado o perodo de defesa e feitas as correes solicitadas pela banca de defesa, retomarei esta pesquisa, realizando todos os procedimentos corretos, para que a mesma seja transoformada em artigo cientfico, submetida publicao, e aps o efetivo aceite e publicao, disponibilizada comunidade acadmica. Embora eu entenda que elementos como o vdeo-clipe e as apresentaes ao vivo so de vital importncia para o mercado musical, estas facetas no fazem parte do recorte proposto. Eventualmente podero aparecer menes a estes elementos, mas a sua ausncia foi uma escolha minha. O presente estudo pretende sistematizar e analisar a prtica do emissor musical (produtor musical) enfatizando os aspectos referentes gravao, edio, comercializao e circulao do udio gravado (fonograma) ou conjunto dele (lbuns musicais), que pode ser entendido como mensagem musical. As

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questes referentes ao direito autoral, ainda que apaream de forma discreta, tambm no fazem parte do foco principal trabalhado. Outra questo diz respeito s citaes: ainda que se saiba que citaes diretas devem ser utilizadas com moderao (no ultrapassando dez linhas), em alguns momentos da dissertao julguei pertinente trazer algumas passagens mais extensas por tratar-se de testemunhos histricos (histrias de vida) de atores sociais que vivenciaram intensamente determinadas situaes e perodos, sendo que estas citaes axuliaro a compreenso dos leitores deste trabalho. Ou ainda, quando certos conceitos tericos deveriam ser apresentados em um recorte mais extenso para dar conta da compreenso acerca dos mesmos. Por fim, a metodologia emprica adotada nesta pesquisa pode ser encarada como um espelho do que ocorre com o mundo da comunicao atual, suas construes e apropriaes. Ela foi sendo moldada no decorrer do processo, utilizou recursos tradicionais e no-convencionais, exigiu dedicao, foco e empenho. Mostrou-se eficiente para promover o dilogo entre todos os dados apresentados nesta ciranda do conhecimento: autores, msicos, revistas, livros, CDs, lbuns de vinil, lbuns digitais, sons, textos e imagens, tudo para ajudar a compreender o que est ocorrendo na Era Ps-MP3 e na Era da Comunicao Digital. E assim, estamos aptos a comear a nossa jornada pelo mundo da produo musical.

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LISTA DE FIGURASFig. 1 George Martin e Peter Sellers no estdio Abbey Road [28] Fig. 2 Primeiro Overdubbing: Mary Ford e Les Paul [35] Fig. 3 Estdio #1 Abbey Road (Londres) [36] Fig. 4 George Martin com os Beatles no Abbey Road (1967) [37] Fig. 5 Produtor Eddie Kramer no Electric Lady Studios NYC em 1970 [37] Fig. 6 Electric Lady Studios NYC (atualmente) [38] Fig. 7 Enrico De Paoli (um dos mais respeitados masterizadores do Brasil) [52] Fig. 8 Produtor Carlos Eduardo Miranda [60] Fig. 9 Luigi Russolo (1916) [68] Fig. 10 Telharmonium pioneiro dos teclados modernos (1906) [81] Fig. 11 Theremin produzido por Robert Moog (dcada de 1950) [82] Fig. 12 Lon Theremin e seu invento (1924) [82] Fig. 13 Marcel Duchamp [94] Fig. 14 A Fonte. Marcel Duchamp (1917) [95] Fig. 15 Monalisa. Leonardo da Vinci (1503-6) [96] Fig. 16 Monalisa. Marcel Duchamp (1913) [96] Fig. 17 Andy Warhol [98] Fig. 18 Garrafas Verdes de Coca-Cola. Andy Warhol (1962) [101] Fig. 19 192 Notas de Um Dlar. Andy Warhol (1962) [102] Fig. 20 Monalisa. Andy Warhol (1962) [103] Fig. 21 Esttica Punk [107] Fig. 22 New York Dolls: androgenia e fria [110] Fig. 23 Capa do LP Restos do Nada (reproduo) [111] Fig. 24 The Wall (1982): crtica do Pink Floyd ao status quo. [112] Fig. 25 Capa do lbum Never Mind The Bollocks (1977) dos Sex Pistols. Reproduo. [113] Fig. 26 punks [113] Fig. 27 George Martin [117] Fig. 28 Sgt. Peppers (logotipo) [117] Fig. 29 Beatles: avatares de si mesmos? [120] Fig. 30 Beatles e a costumizao: seja voc mesmo um integrante da Banda dos Coraes Solitrios [124]

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Fig. 31 Beatles e George Martin durante as gravaes do lbum [126] Fig. 32 Arte frontal: Sgt. Peppers. Reproduo. [134] Fig. 33 Contra-capa do lbum Sgt. Peppers. Reproduo. [136] Fig. 34 Beatles em happening fechado para convidados exclusivos no dia do lanamento do lbum [138] Fig. 35 Diagrama de influncia entre Beatles e Beach Boys (dcada de 1960) [139] Fig. 36 lbum Machine Head (1972) do Deep Purple: encarte mostra fotos da gravao que utilizou estdio porttil. Reproduo. [149] Fig. 37 lbum McCartney II (1980) de Paul McCartney: encarte apresenta texto e foto que comprovam gravao realizada em estdio domstico. Reproduo. [150] Fig. 38 Imagem do vdeo promocional da faixa Coming Up: McCartney contracena consigo tocando todos os instrumentos. [151] Fig. 39 Placa de udio Profissional Audiophile 2496. Fabricante: M-Audio. Tipo de Conexo: PCI. [152] Fig. 40 Placa de udio Profissional Fast Track Pro. Fabricante: M-Audio. Tipo de Conexo: USB. [152] Fig. 41 Amplificador Fender (analgico) [155] Fig. 42 Plug-in Guitar Rig (Native Instruments) [155] Fig. 43 Sintetizador Yamaha DX7 [159] Fig. 44 Plug-in FM7 (Native Instruments) [159] Fig. 45 Pen Drive SONY WALKMAN [160] Fig. 46 Theda Bara [169] Fig. 47 Madonna [169] Fig. 48 Capa do lbum da banda U2 The Best of 1980-1990. Reproduo. [177] Fig. 49 Printscreen Surrealistic Pillow (Jefferson Airplane). Edio CD. [185] Fig. 50 Printscreen Surrealistic Pillow (Jefferson Airplane). Edio Vinil. [185] Fig. 51 Feudalismo Musical [198] Fig. 52 Printscreen blog Durango-95 [201] Fig. 53 Processo AD/DA [209] Fig. 54 Printscreen Napster [211] Fig. 55 Printscreen Audiogalaxy [212] Fig. 56 Sistema Tradicional / Sistema P2P [213] Fig. 57 Printscreen Reverbnation diversas funcionalidades disponveis. [221]

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Fig. 58 Printscreen Reverbnation: ferramenta para selos, empresrios, artistas, casas de espetculos e fs. [222] Fig. 59 Printscreens Orkut [224] Fig. 60 Printscreen Release Promo: ferramenta promocional para dance music. [225] Fig. 61 Printscreen blog DJ Z Pedro [227] Fig. 62 Printscreen blog Nau Pyrata [228] Fig. 63 Printscreen blog Nau Pyrata [229] Fig. 64 Printscreen blog Nau Pyrata [229] Fig. 65 Printscreen Megaupload (tabela de custos) [231] Fig. 66 Printscreen Megaupload (vantagens para associados) [231] Fig. 67 Printscreen lbum Get! (128 Kbps) disponvel na Juno. [239] Fig. 68 Printscreen Juno: relatrio de vendas em tempo real. [240] Fig. 69 Pesquisa Billboard Brasil 2010. Reproduo. [244] Fig. 70 Pesquisa Billboard Brasil 2010. Reproduo. [245] Fig. 71 Nokia: expanso de negcios e aposta na venda de fonogramas digitais. Reproduo. [246] Fig. 72 Printscreen: Box Set do Dream Theater permite remixagem. [261] Fig. 73 Printscreen Ritchie: Integrao entre os sites de rede social. [262] Fig. 74 Printscreen Leoni: utilizao do telefone celular para compartilhar o camarim com os fs. [263] Fig. 75 Printscreen banda Its All Red: reallity show no You Tube. [264] Fig. 76 Printscreen Rammstein: vdeo ousado, pornografia e rock pesado. [265] Fig. 77 Printscreen Paludo e Ritchie: negociao de remix via Twitter. [266] Fig. 78 Mallu Magalhes DIY de resutados. [267] Fig. 79 Beatles Rock Band: atualizao da Banda dos Coraes Solitrios [268] Fig. 80 Capa do lbum do Radiohead In Rainbows (2007). Reproduo. [269] Fig. 81 Kisscomics: Kiss utilizou o sangue dos integrantes da banda misturado tinta de impresso na dcada de 1970. [270]

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LISTA DE QUADROS, GRFICOS E TABELASQUADRO 1: Esquema Funcional de uma gravadora [30] QUADRO 2: Categoria de produtores segundo Burguess (2002) [31] QUADRO 3: Custos de produo de lbuns [32] PEQUENA GALERIA de Produtores Musicais [39] QUADRO 4: Nomenclatura adotada pela Indstria Fonogrfica para classificao de lanamentos musicais [44] GRFICO ESQUEMTICO da Imagem Estreo do Som [49] QUADRO 5: Evoluo dos canais / pistas de gravao de 1950 a 2010 [50] TABELA ESQUEMTICA: Etapas de Produo [53] QUADRO 6: Majors x Indies [55] TRINGULO DE ATRIBUTOS desejveis em um Produtor Musical [58] QUADRO 7: Classic Albums [62] FLUXOGRAMA ESQUEMTICO da Produo Musical [64] ILUSTRAO: Influncia do Punk 1970-2010 [115] QUADRO 8: Listagem dos programas de computador mais utilizados atualmente que emulam estdios de gravao (DAW) [153] QUADRO 9: Evoluo do Estdio ao Home Studio [156] TABELA: Programas de computador utilizados por msicos e DJs [161] QUADRO 10: Formatos populares de arquivos de udio encontrados na internet [210] QUADRO 11: Evoluo da portabilidade musical (1970-2000) [215] QUADRO 12: Linha do Tempo Vinil / CD / MP3 [216] QUADRO 13: Atualizao da Distribuio [234] QUADRO 14: Lojas Digitais de Venda de Msica pelo mundo [237] QUADRO 15: Sculo XX e Sculo XXI em xeque [274]

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CAPTULO I: CONFIGURAES (1900-1980)

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1. O PRODUTOR MUSICALtags: produtor musical, indstria fonogrfica, histria da produo musical

Comeamos o nosso estudo apresentando alguns conceitos bsicos sobre o papel do produtor musical e demais nomenclaturas importantes dentro do universo da Indstria Fonogrfica. Os autores base deste sub-captulo sero Richard Burgess (2002) e George Martin (2002).

Indstria Fonogrfica pode ser entendida como o conjunto de atores sociais que atuam em todos os processos que envolvem a criao, gravao, circulao, comercializao e promoo do material musical. Nesse contexto, at a dcada de 1960, o papel do produtor musical era nebuloso e pouco se falava a respeito.

1.1 PRODUO MUSICAL: O INCIO DA PROFISSO

Um dos primeiros produtores musicais a despontar e ficar mundialmente famoso foi George Martin, responsvel pela produo da obra dos Beatles (lembrando que eles comearam a lanar seu material s a partir de 1963, embora Martin j produzisse materiais antes disso). Richard Burgess, produtor internacionalmente reconhecido, que j atuou com nomes tais como Spandau Ballet, Adam Ant e Kim Wilde, comenta:

Um artista como Prince teria sido quase inconcebvel nos anos 1950. Era inadmissvel que um artista pudesse ter to variadas habilidades, de compositor a arranjador, alm de tocar todos ou a maioria dos instrumentos... e ainda por cima compeender e controlar as tcnicas de produo de udio. (BURGESS, 2002, p. 249)

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O prprio britnico George Martin parece confirmar os apontamentos de Burgess: Nos obscuros dias ps-Segunda Guerra Mundial, quando o rocknroll estava apenas comeando, o termo produtor de discos nunca era usado e, caso tivesse sido, ele no se teria aplicado a mais de meia dzia de pessoas no meu pas. (MARTIN, 2002, p. 332 grifo do autor)

A maioria das pessoas comuns desconhece o tema. Muitas bandas iniciantes confundem o papel do produtor musical com a do manager/empresrio. Quem agencia shows o empresrio. Produtor musical produz msica. Esta distoro de percepo encontra como principal causa os prprios produtores que nunca se importaram em promover o seu trabalho e torn-lo conhecido do grande pblico. Prova disso que at bem pouco tempo atrs, apenas alguns possuam seu prprio site, por exemplo.

Um bom produtor musical pode fazer toda a diferena na elaborao de um disco (ou lbum que a maneira correta de se referir dentro do mercado fonogrfico). O produtor eficiente aquele que sabe ouvir o artista, entender a sua proposta artstica e musical e sugerir os melhores caminhos para que se chegue a um resultado satisfatrio, resultado esse que consiste em equacionar os desejos do artista e do mercado que ser atingido por esse trabalho, a sonoridade escolhida e a compatibilidade disso tudo com o oramento que se tem para fazer o trabalho dentro de prazos pr-estabelecidos. Trata-se de um campo que exige competncias multidisciplinares envolvendo slidos conhecimentos de msica, histria da arte, esttica, marketing, promoo e planejamento, alm de conhecimentos tcnicos de gravao, equipamentos e estdio (G). Conforme Martin (2002), em resumo, o produtor musical ser responsvel pelo som final de um lbum lanado no mercado. Ele refora, tambm, que vital que o produtor acredite no trabalho do artista e tenha prazer em produz-lo.

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1.2 PRODUZINDO

O primeiro passo para a produo de um artista saber identificar se este artista possui verdade artstica (G). Isso significa detectar se o artista verdadeiro naquilo que se prope a fazer. A histria mostra que carreiras forjadas nunca conseguiram se solidificar em longo prazo. Citando um exemplo, um artista que a vida toda ouviu rock, que possua todo o potencial para este estilo decide produzir um lbum de reggae porque este estilo est na moda. Em grande parte, o resultado ser desastroso. Por outro lado, artistas genunos que acreditaram na sua arte independente de modismos ou tendncias e seguiram fiis sua verdade conseguiram, em grande parte, alcanar o sucesso. Deixaremos para falar sobre o conceito de sucesso no Captulo II que tratar das Reconfiguraes. Uma vez identificada a existncia legtima da verdade artstica hora de planejar todo o projeto. Como relata Burgess (2002), embora algumas gravadoras tivessem em seus quadros de funcionrios fixos produtores musicais, a maioria trabalha em formato de free lancer, sendo contratada trabalho a trabalho. Ao iniciar-se o projeto de um lbum, a gravadora disponibiliza ao artista uma verba especfica referente produo da matriz do lbum. Esta matriz ir conter o material sonoro que ser, posteriormente, prensado / replicado, isto , copiado em tiragem prdeterminada para posterior circulao, promoo e comercializao. O planejamento vai envolver a definio de etapas, metas, oramento e prazos.

O tempo de produo de um lbum pode variar de algumas semanas at anos. Como aponta Martin,

Lembro-me de ter gravado o primeiro lbum dos Beatles em um s dia. Hoje em dia as pessoas passam meses criando um lbum e, se um projeto concludo em trs semanas, h suspeita de algo errado. Ouo aquelas primeiras gravaes e pergunto: ser que ns realmente progredimos muito? (MARTIN, 2002, p. 346)

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Fig. 1 George Martin e Peter Sellers no estdio Abbey Road 4

Nos modelos tradicionais de produo (que perduraram do incio de 1950 at o incio dos anos 2000), embora em alguns casos a escolha do produtor sofresse influncia do artista, na maioria das vezes quem definia o produtor era o profissional de A&R (G). A&R uma sigla utilizada na Indstria Fonogrfica para denominar Artista & Repertrio. Este profissional (do qual no exigido conhecimento musical como premissa indispensvel, mas grande conhecimento de mercado) aquele que vai moldar tudo o que se refere esttica do trabalho. Nessa esfera, esto includos figurino, atitude (G) (como o artista se comportar perante os demais artistas, pblico e mdia), escolha de quais canes5

faro parte do lbum dentre as inmeras que o artista possui,

definio de referncias sonoras e visuais e, como j foi dito, escolha do produtor responsvel pelo trabalho.

Em muitos casos, o A&R acompanha todo o processo de elaborao de um lbum. Em outros, aps a definio dos itens anteriormente citados, a gravadora entrega a verba ao produtor musical que dever administr-la adequadamente dentro dos prazos, para, em data e local estabelecidos, apresentar a matriz do lbum ao profissional de A&R. comum que o produtor musical muitas vezes assuma algumas funes de A&R, e em determinados casos, assuma duplamente as duas funes (A&R e produtor).4 5

Fonte: acesso em 19/01/2010. Entenda-se por cano aquela criao musical que possui obrigatoriamente e simultaneamente trs elementos bsicos: harmonia (sequencia de acordes), melodia (notas musicais que ancoram a letra) e letra (o texto cantado). (nota do autor)

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Existem ainda certos casos em que os prprios artistas acabam por assumir estes dois papeis, o que desaconselhado por grande parte dos profissionais do mercado musical. Essa ressalva existe, pois, tomando como exemplo uma banda de rock, uma vez que A&R e produtor no faam parte do grupo musical, existir um distanciamento emocional saudvel ao processo de produo. Assim, egos e vaidades so mais facilmente controlados. O produtor deve, sempre, privilegiar o melhor resultado para a obra artstica como um todo e jamais beneficiar este ou aquele integrante. O mesmo vale para a escolha do repertrio. O artista pode (por questes emocionais e falta de distanciamento e imaturidade) julgar que determinada cano dever ser gravada e outra no, quando, na verdade, ouvidos experientes e isentos podem apontar um caminho completamente diferente que trar melhores resultados. Como ressalta Martin, o criador nem sempre o melhor crtico do seu prprio material. (MARTIN, 2002, p. 332) Na pagina seguinte, encontra-se um esquema explicativo que ilustra os profissionais e suas respectivas funes dentro de uma gravadora.

1.3 O PRODUTOR E A GRAVADORA

O modelo tradicional de gravadora adotado entre 1950 e o incio dos anos 2000 (algumas ainda seguem este modelo) era constitudo segundo o quadro a seguir (elaborado por mim com base em minha atuao de mercado):

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QUADRO 1: ESQUEMA FUNCIONAL DE UMA GRAVADORA Profissional CAST FunoGrupo de artistas (cantores solo, duos, bandas, etc) contratados, gerenciados, promovidos e produzidos pela gravadora. Responsvel por questes envolvendo planejamento estratgico, custos, marketing, comercializao, circulao, promoo, publicidade e propaganda, merchandising e contratos (entre o artista e gravadora e entre a gravadora representando o artista e o mercado). Responsvel pelas questes que envolvem registro das obras gravadas e gerao de ISRC (International Standard Recording Code similar ao CPF, identifica de forma nica no mundo cada obra gravada e por processos de produo para comercializao. As obras gravadas recebem o nome de fonograma). Cuida das questes que envolvem planejamento estratgico, escolha de repertrio, produtor musical, esttica e atitude perante pblico e mdia.Busca novos artistas para o cast. Gerencia as questes referentes esttica, planejamento operacional, gravaes, direo musical, arranjo e composio. Funciona, tambm, como caa-talentos para a gravadora. Tem como funo promover o artista nos meios de comunicao social de massa, principalmente o rdio. Responsvel pela produo e circulao de notcias sobre a gravadora e seu cast.

PRODUTOR EXECUTIVO

PRODUTOR FONOGRFICO

A&R (artista e repertrio) tambm conhecido como DIRETOR ARTSTICO

PRODUTOR MUSICAL

DIVULGADOR

ASSESSOR DE IMPRENSA

EDITOR MUSICAL

Responsvel por cuidar da remunerao dos artistas, garantindo pagamento de direitos referentes venda e execuo pblica das obras.

Fonte: PALUDO, 2010.

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1.4 OS TIPOS DE PRODUTOR MUSICAL (CATEGORIZAO)

Tomando outra tabela como exemplo, Burguess (2002), prope uma categorizao para os tipos de produtores musicais existentes conforme o quadro que segue (sistematizado por mim com base na obra referida):

QUADRO 2: CATEGORIAS DE PRODUTORES SEGUNDO BURGUESS (2002)Tipo de Produtor Caractersticas do Produtor Tipo de Artista que contratarIndicado para artistas em carreira Atua como compositor, interprete, multisolo, que ou no compe, ou precisam de um co-autor, ou

O SABE TUDO FAZ TUDO MANDA CHUVA

instrumentista, tcnico de gravao; possue reconhecimento como produtor de hits de sucesso. Dono de selo musical ou gravadora.

precisam de uma cano de sucesso. Interpretes sem banda de apoio. Indicado para atores e modelos aspirantes a cantores.

Atua como co-autor, discutindo idias com o artista. Executa tarefas das quais o artista no quer se ocupar ou para as quais no tem habilidade ou Indicado para artistas que tem forte senso de viso e direo (foco artstico); artistas autoconfiantes que sabem bem o que querem, mas precisam de um brao-direito;

O HUMILDE CRIADO

conhecimento,

principalmente

aspectos

administrativos e tcnico-musicais do processo de produo. Possui facilidade de adaptao ao estilo de trabalho do artista. Estabelece relao

duradoura com o artista, participando de vrios projetos e lbuns. A maioria dos produtores se enquadram nesta categoria. Freqentemente so integrantes (ou exintegrantes) de bandas, como baixistas ou Indicado para artistas seguros que gostam de ter ouvidos experientes por perto para troca de informaes e opinies (e que valorizam pontos de vista diferentes, mesmo que em oposio aos seus).

O COLABORADOR

bateristas.

Flexibilidade

a

principal

caractersica. Disposio para encontrar o que h de valioso nas idias alheias. Tem o mesmo poder de opinar que o artista que est sendo produzido. Seu lema: o todo maior que a soma das partes. Atalha caminhos e utiliza sua experincia para evitar desperdcios de tempo e dinheiro. Participa pouco do processo, encontrando-se com o artista raramente durante as gravaes. Detentor

Indicado para artistas solidamente consagrados e com grande verba disponvel.

MERLIM, O MAGO

de

uma

aura

mstica

(mito),

talento

eminentemente reconhecido por todos e aura mgica. Fala pouco e quando fala produz grande impacto. mais voltado ao todo do que aos detalhes. Conquista grande lealdade do artista e da gravadora. Atua como A&R.

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1.5 OS CUSTOS DE PRODUO

Um dado que muitas vezes choca os artistas iniciantes o de que, embora a msica seja compreendida pela sociedade como um bem cultural e simblico, no mercado da Indstria Fonogrfica ela vista antes de tudo como negcio. Como o prprio George Martin relata, A maioria das grandes gravadoras se liga fixamente em uma coisa e somente uma coisa: o bsico. Os lucros devem ser tudo e o fim de tudo. Elas vem o trabalho de um artista como um produto para ser vendido, como qualquer outro. (MARTIN, 1995, p. 79) Os custos de produo de um lbum so bem variveis, podendo ir de alguns reais a milhares de dlares. Abaixo, trs exemplos de lbuns de sucesso, seus anos de lanamento e valor investido em produo e um exemplo atual produzido por mim:

QUADRO 3: CUSTOS DE PRODUO DE LBUNSANO DE LANAMENTO

ARTISTA

LBUM

CUSTO DE PRODUO 25 mil libras

FONTE

Beatles

Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band

1967

1

Michael Jackson

Invincible

1982

30 milhes de dlares

2

Legio Urbana

O Descobrimento do Brasil Jornada da Transformao

1993

70 mil dlares

3

Os Caminhantes do CuFontes:

2006

20 mil reais

4

(1) Martin, George. Paz, Amor e Sgt. Pepper. Rio de Janeiro: Relume-Dumar, 1995 Este dado, embora apresentado pelo produtor, duvidoso. Segundo Jeff Russell (2009), o valor seria 50 mil libras. (nota do autor) (2) acesso em 20/01/2010 (3) RENATO RUSSO: A Entrevista MTV. DVD. So Paulo: Deckdisc, 2007. (4) PALUDO, 2010.

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1.6 O PRODUTOR E O MERCADO DE PRODUO No uma tarefa muito fcil ter acesso aos custos de produo da maioria dos lbuns. Os quatro exemplos anteriores, guardadas as propores de cada poca (no caso especfico dos Beatles, o valor representava uma soma bastante alta para a poca, como aponta o produtor Martin (1995)), ao menos nos mostram que estes custos so extremamente variveis, e, em ltima anlise, exigem um investimento considervel. O cantor Renato Russo (DVD, 2007) comenta que a verba de produo circula de um artista para o outro. Isto significa que a gravadora distribui parte da sua receita global para cobrir os custos operacionais totais (marketing, promoo, gravao, circulao, etc) de cada trabalho. Dessa forma, artistas que vendem muito acabam indiretamente fornecendo subsdios para a produo de artistas menores. A construo artstica (que vai alm da gravao e lanamento dos lbuns no mercado) inclui um rduo trabalho de A&R com a finalidade de posicionar os artistas em destaque na mdia, contribuindo para a elaborao e manuteno de seu status. Este misto de prestgio e poder de seduo perante a sociedade pode tambm ser chamado de aura artstica (G) ou imagem mtica. Quanto maior for essa varivel, mais valioso para a gravadora ser o artista e, consequentemente, maiores investimentos sero direcionados a ele.

Segundo Burgess (2002), ainda que atualmente a profisso de produtor musical seja mais reconhecida do que na dcada de 1950, os ouvintes dificilmente compram um lbum porque foi produzido pelo produtor X ou Y. O foco de ateno est sempre voltado para o artista. Ainda assim, a profisso vista de forma ingnua por muitos aspirantes que a percebem como sendo um passaporte para festas badaladas, fama e fortuna. O produtor dos Beatles mostra que existe um outro lado no to excitante e fcil quanto pode parecer a olhares mais desatentos. Diz ele: Ela no a profisso maravilhosa que parece ser. um trabalho que exige ateno aos detalhes, que preocupante, demorado e, s vezes, at mesmo montono. (MARTIN, 2002, p. 332) A remunerao do produtor pode ser paga em forma de cach (faixa faixa ou pelo projeto como um todo), mediante percentual proveniente de vendas e promoo, ou uma combinao de percentual e cach. O produtor pode, ainda, investir e custear toda a produo do prprio bolso e vender o produto final para a gravadora. Existe ainda um caso mais raro, no qual um investidor externo custeia a produo: pode tratar-se de um

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empresrio de um ramo alheio msica que investe no mercado musical como forma de expanso de seus negcios, por acreditar que o artista ser rentvel. possvel encontrar um caso ainda mais raro (mas existente) de um investidor que custeia o projeto por amor incondicional msica e/ou ao artista, espcie de mecenas contemporneo.

1.7 O PRODUTOR E O PRODUTO

Os lbuns musicais so gravados nos chamados estdios de gravao. Estes estdios podem ocupar de uma simples sala at um prdio inteiro. Neles, existe uma srie de equipamentos desenvolvidos para captao, tratamento e manipulao do som gravado. At o final da dcada de 1940, as gravaes eram feitas com microfones que captavam o que os artistas tocavam e cantavam. As gravaes eram realizadas ao vivo. No havia possibilidade de edies e correes posteriores. Isso implicava em um perfeccionismo indispensvel no que se refere execuo ao vivo para que o resultado da gravao pudesse ser aproveitado. Como lembra George Martin,A gravao ideal era aquela que reproduzia o som original com maior fidelidade, portanto o produtor se concentrava em conseguir o melhor arranjo da banda e a melhor apresentao dos vocais. O engenheiro tinha que conseguir o melhor equilbrio possvel do conjunto inteiro em uma nica tentativa. (MARTIN, 2002, p. 340)

Porm, o guitarrista americano Les Paul (nascido em 1915 falecido em 2009) desenvolveu uma tcnica que mudaria completamente o modo como as gravaes eram feitas. Segundo Burgess,

Les Paul foi o pioneiro do conceito de overdubbing (processo de gravao pelo qual novos sons so adicionados a outros j gravados) no fim da dcada de 1940 e incio da de 1950, na revolucionria gravao de How High The Moon6. Naquela gravao ele tocou todas as partes de guitarra e Mary Ford fez todos os vocais. (BURGESS, 2002, p. 1-2 grifos do autor)

6

(o) Disponvel para audio nos anexos digitais dessa dissertao.

34

Fig 2. Primeiro Overdubbing: Mary Ford e Les Paul 7

Como pode ser observado, a inovao de Les Paul permitiu que um mesmo msico pudesse atuar em diferentes momentos da gravao, tocando variaes de seu instrumento ou at mais de um instrumento. Embora este avano tenha sido revolucionrio, at a proliferao dos estdios caseiros que utilizam o computador como catalisador e facilitador deste processo que s comeou a se popularizar de fato no incio dos anos 2000, o acesso aos estdios de gravao era uma exclusividade quase que absoluta de artistas que conseguiam ser contratados por uma gravadora. No Brasil, o acesso facilitado aos estdios comea de forma tmida no incio dos anos 1990. Renato Russo (DVD, 2007) aponta que a partir da dcada de 1990 o termo independente comea a ser empregado para designar gravadoras menores que trabalhavam com artistas no contratados por grandes gravadoras. George Martin (2002) ressalta pontos positivos e negativos do sistema de gravao multipista (G). Como vantagens, diz que este sistema [...] d a oportunidade de superpor um mesmo som vrias vezes, de modo que teoricamente voc poderia produzir uma orquestra sinfnica com base em um quarteto de cordas. (MARTIN, 2002, p. 344-345) O ponto negativo que esta captao em separado pode comprometer o lado emocional da gravao. Segundo o produtor, Engenheiros e msicos mais jovens esto chegando concluso de que a qualidade de uma gravao ao vivo com vrios instrumentos juntos acrescenta tenso e emoo ao som, ainda que seja mais difcil lidar com ela. (MARTIN, 2002, p. 341 grifos do autor). Martin complementa a idia afirmando que

7

Fonte: acesso em 20/01/2010

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truques modernos podem at conferir brilho produo, mas que a composio e a interpretao so supremas.

Como o momento da gravao um momento de tenso, quanto mais o artista se sentir confortvel no estdio, melhor ser o resultado de sua performance. Nesse aspecto, o produtor acaba muitas vezes assumindo o papel de psiclogo, pai e amigo. Diz-se isso, pois o artista pode estar passando por problemas pessoais e o produtor dever acalmar os nimos, manter o foco do artista no trabalho e auxilia-lo a manter a sua auto-estima e confiana. comum que artistas consagrados estabeleam slidos laos afetivos, no s com produtores, mas com tcnicos de gravao. Dentre os estdios musicais existentes, dois dos mais conhecidos e venerados so o americano Electric Lady Studios (localizado na cidade de Nova Iorque / Estados Unidos) e o britnico Abbey Road (localizado na cidade de Londres / Inglaterra). A seguir, apresento algumas imagens dos estdios citados 8.

Fig. 3 Estdio #1 Abbey Road (Londres) 9

Mais informaes podem ser obtidas nos sites dos estdios. Abbey Road: acesso em 19/01/2010 Electric Lady Studios: acesso em 19/01/2010. 9 Fonte: acesso em 19/01/2010

8

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Fig. 4 George Martin com os Beatles no Abbey Road (1967) 10

Fig. 5 Produtor Eddie Kramer no Electric Lady Studios NYC em 1970 11

10

Fonte: acesso em 19/01/2010 11 Fonte: acesso em 19/01/2010 / NYC = cidade de Nova Iorque.

37

Fig. 6 Electric Lady Studios NYC (atualmente) 12

Como veremos ainda neste captulo (quando eu falar sobre o lbum Sgt. Peppers dos Beatles), a arte grfica dos lbuns possua limitaes de espao fsico para que dados tcnicos fossem includos na obra. Quando assistimos a um filme no cinema ou no DVD, ao final da obra, so exibidos os chamados crditos. Trata-se de uma ficha tcnica (G) detalhada envolvendo o nome de todos os participantes da obra e suas funes (direo, cmera, figurino, trilha sonora, etc). Na dcada de 1970, este espao fsico nos lbuns para a impresso de fichas tcnicas foi ampliado (principalmente aps Peppers apresentar uma capa dupla). Nos anos 2000, com a proliferao dos sistemas digitais, podemos observar que o espao voltou ao formato original, tornando-se reduzido. Em 2005, Robert Dimery lana o livro 1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer. Nesta obra, o autor faz um apanhado de 1001 lbuns musicais lanados entre as dcadas de 1950 e 2000. Mesmo que no apresente fichas tcnicas detalhadas, indica o nome do produtor de cada lbum selecionado. Os estilos predominantes adotados so referentes a lbuns de rock e msica pop. Um dado importante que surge atravs dessa leitura que vrios destes lbuns analisados foram produzidos por mais de um produtor. Isso significa que o produtor pode contribuir em faixas isoladas ou ainda dividir a produo com outros colegas de profisso. Baseado na analise da obra referida, elaborei uma pequena galeria de produtores musicais, indicando o nome do produtor, sua origem, foto do produtor (as fontes de cada foto encontram-se em nota de rodap) e um ou dois lbuns importantes produzidos por estes produtores. Assim, o leitor pode

12

Fonte: acesso em 19/01/2010

38

conhecer alguns dos nomes mais expressivos do mercado que produziram obras musicais consagradas internacionalmente.

PEQUENA GALERIA DE PRODUTORES MUSICAISBob Ezrin (Canada) Kiss Destroyer (1976) Peter Gabriel Peter Gabriel I (1977)

13

Brian Wilson (Estados Unidos) The Beach Boys The Beach Boys Today (1965) The Beach Boys Pet Sounds (1966)

14

13 14

Fonte: acesso em 23/01/2010 Fonte: acesso em 23/01/2010

39

Butch Vig (Estados Unidos) Nirvana Nevermind (1991)

15

Chas Chandler (Inglaterra) The Jimi Hendrix Experience Are You Experienced (1967) The Jimi Hendrix Experience Axis: Bold As Love (1967)

16

Flood (Inglaterra) Depeche Mode Violator (1990) lNine Inch Nails The Downward Spiral (1994)

17

15

Fonte: acesso em 23/01/2010 16 Fonte: acesso em 23/01/2010 17 Fonte: acesso em 23/01/2010

40

George Martin (Inglaterra) The Beatles Revolver (1966) The Beatles Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band (1967)

18

Jack Endino (Estados Unidos) Mudhoney Superfuzz Bigmuff (1988)

19

Jaques Lu Cont (Inglaterra) Les Rythmes Digitales Darkdancer (1999)

20

18 19

Fonte: acesso em 23/01/2010 Fonte: acesso em 23/01/2010 20 Fonte: acesso em 23/01/2010

41

Norman Smith (Inglaterra) Pink Floyd The Piper At The Gates of Dawn (1967)

21

Phil Spector (Estados Unidos) John Lennon Plastic Ono Band (1970)

22

Prince (Estados Unidos) Prince Prince (1982)

23

21 22

Fonte: acesso em 23/01/2010 Fonte: acesso em 23/01/2010 23 Fonte: acesso em 23/01/2010

42

Quincy Jones (Estados Unidos) - Michael Jackson Off The Wall (1979) - Michael Jackson Thriller (1982)

24

Alm dos nomes citados anteriormente que constam na obra de Dimery (2007), no Brasil podemos destacar alguns exemplos de produtores musicais: Apollo 9, Astronauta Pinguim, Carlos Eduardo Miranda, Carlos Trilha, Ezequiel Neves, John Ulhoa, Liminha, Marco Mazzola, Mario Caldato Jr., Nelson Motta, Rafael Ramos, Rick Bonadio, Rogrio Duprat e Tom Capone.

O produtor musical responsvel, como vimos at aqui, por auxiliar o artista a equacionar adequadamente aquilo que ele deseja expressar com o lado econmico, ou seja, a gravadora que o est contratando e financiando a produo da obra, e com o pblico que pagar para obter o material proveniente da produo. Este material que podemos chamar de produto final pode se apresentar em diversos formatos. Para entend-los, elaborei o quadro que segue 25:

24 25

Fonte: acesso em 23/01/2010 QUADRO 4: Fonte (PALUDO, 2010).

43

QUADRO 4: NOMENCLATURA ADOTADA PELA INDSTRIA FONOGRFICA PARA CLASSIFICAO DE LANAMENTOS MUSICAIS

PRODUTO FINAL (formato)

DESCRIO / OBJETIVOAbreviatura de demonstrao, normalmente em referncia a fitas e discos usados para marketing e testes. Serve, tambm, como demonstrao para que um produtor entenda aonde o artista quer chegar. Gravaes simples, com acabamento semi-profissional ou amador. Tambm conhecido como msica de trabalho (nos anos 1960 como compacto) contm duas faixas consideradas potencialmente vendveis. Utilizado, tambm, como material promocional pelos divulgadores da gravadora. Similar ao Hit Single. Porm, contm quatro faixas. Normalmente apresenta entre cinco e oito faixas. Espcie de LP reduzido. Formato predominante de lanamento das obras musicais, amplamente explorado nas dcadas de 1950 at 1993. Tambm conhecido como disco de vinil, comportava vinte minutos de gravao de cada lado (LADO A e LADO B), totalizando quarenta minutos. Nomenclatura que passa a ser adotada em definitivo aps o surgimento do CD (em 1993), substituindo o LP. Ainda assim, existem vrias referncias ao termo lbum na Era do LP. O CD comportava, inicialmente setenta e quatro minutos totais de durao, sendo ampliado para oitenta minutos nos anos 2000. Tambm conhecido no mercado musical como venda de catlogo, consiste em compilaes de hit singles e sucessos. J figurava na Era do LP e continua sendo uma modalidade existente at os dias atuais. Existem, tambm as chamadas Coletneas LADO B que apresentam faixas opostas aos hit singles, isto , que no figuraram em singles e no foram consideradas potencialmente comerciais pelas gravadoras. Lanado em suporte CD e/ou digital release, chamada de Edio de Luxo. Normalmente, composto de dois lbuns integrando um nico lanamento (lbum original remasterizado [vide adiante] + um lbum bnus com contedo similar ao do BOX SET (espcie de mini BOX SET). Edies luxuosas e caras, normalmente comemorativas (morte do artista, dcadas de lanamento da obra, etc). Incluem um projeto grfico sofisticado. Podem conter discografias reunidas, material indito, verses alternativas, remixes e sobras de estdio (como trechos de sesses de gravao no lanadas chamados de outtakes e rehearsal). Termo que ganha fora e comea a ser empregado a partir de 2007. Consiste no lanamento digital (arquivos em formato MP3 ou WAV). No existe limite mximo de faixas, porm, normalmente respeita as estruturas que o precederam, ou seja, de hit single a BOX SET.

DEMO

HIT SINGLE

PROMO EP (Extended Play)

LP (Long Play)

ALBUM

COLETNEA

DELUXE

BOX SET

DIGITAL RELEASE

44

1.8 AS ETAPAS DA PRODUO

As etapas de produo no costumam variar muito, independente do tipo de artista com os quais o produtor trabalha e do tipo de produto final que ser produzido. Basicamente, segue-se o modelo que trabalha embasado em trs grandes etapas. So elas Pr-Produo, Produo e Ps-Produo. A seguir, abordarei um pouco sobre cada uma destas etapas.

1.8.1 PR-PRODUO Nessa primeira etapa, o processo normalmente se d com o produtor e o artista realizando reunies bsicas de start. Entenda-se por start esse momento inicial no qual os esboos preliminares do trabalho sero traados. Cabe lembrar que tanto o artista pode procurar o produtor para trabalhar quanto o inverso, e ainda existe a modalidade na qual a apresentao entre eles se d, como j falei anteriormente, pelo A&R da gravadora. A etapa de Pr-Produo , de fato, a etapa de planejamento do trabalho. Estabelecem-se as metas, prazos e objetivos da produo, levando-se em conta os recursos e o oramento disponveis para produo. Embora no seja uma regra sem exceo, normalmente o produtor ser responsvel por fazer os contatos com os estdios de gravao para verificar a disponibilidade dos mesmos para a produo. Algumas gravadoras possuem seus prprios estdios. Outras locam estdios de terceiros. Atualmente, devido reduo de custos dos equipamentos de produo e a incluso massiva da informtica no processo produtivo, muitos artistas produzem parte ou at todo o material em seus prprios estdios.

Alm do planejamento comentado, audies e ensaios so primordiais nesse momento. As audies no se limitam s canes ou composies apresentadas pelo artista. Nesse meio, assim como ocorre na publicidade, por exemplo, trabalha-se muito com as chamadas referncias. Isso significa analisar obras de outros artistas, pesquisando sonoridades e questes estticas para adequao de acordo com os anseios do artista, gravadora, mercado e pblico. Muitas vezes o artista j chega ao produtor com as canes em estgio de pr-produo, realizadas de forma caseira, em estdio

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prprio. Como vimos antes, so as chamadas demos (G). A partir da audio de uma demo, o produtor pode compreender de forma mais clara o que o artista tem em mente. Unindo-se a demo s referncias, fica mais fcil projetar um esboo slido de como a produo dever ficar quando estiver concluda. Nem sempre fcil descrever idias, ainda mais em se tratando de msica. Como aponta Martin (2002) o papel do produtor o de traduzir idias em som. Portanto, tudo o que facilitar essa caminhada de grande importncia.

A etapa de Pr-Produo (planejamento) vital para minimizar perdas econmicas e frustraes emocionais. Confome relatos de Martin (2002), alguns artistas como os Beatles tinham oramento suficiente para entrar em estdio com poucas idias e gastar longas horas dentro dele testando possibilidades e criando. Atualmente, a maioria dos artistas novatos no pode se dar a esse luxo (exceto aqueles que utilizam estdios caseiros). Horas de estdio implicam em dinheiro. Horas de estdio mal aproveitadas significam dinheiro perdido. Para se ter uma idia aproximada do que isso representa nos dias atuais, tomando como base a cidade de Porto Alegre / RS, o custo mdio de locao de uma hora de estdio (pesquisa realizada por mim em 2009) de R$ 60,00 (sessenta reais). J vimos, anteriormente, que o tempo de produo de um lbum extremamente varivel. Seguindo no exemplo de Porto Alegre, o tempo mdio gasto em estdio para a produo de um lbum (conforme minha experincia) fica em torno de 150h (cento e cinquenta horas). Tomando o custo mdio apresentado e multiplicando-o pelas horas mdias necessrias para a produo de um lbum, podemos concluir que o valor investido em estdio equivalente a R$ 9.000,00 (nove mil reais). Este valor bastante elevado para uma banda que est comeando. Porm, se esta etapa for levada a srio, a prxima etapa (Produo) tende a ocorrer de forma tranquila e equilibrada.

Cabe ainda ressaltar a importncia dos ensaios nesta etapa. Neles, o produtor pode sugerir mudanas no trabalho, acrescentando ou suprimindo partes harmnicas, meldicas, rtmicas e inclusive sugerindo alteraes em letras e ttulos das canes e composies. Como possvel comprovar atravs da leitura da obra de Martin (2002), na dcada de 1950, o produtor agia de forma mais contida. Com o passar dos anos (e Martin foi um dos pioneiros neste campo) o produtor passou a contribuir de forma mais direta e explcita no resultado final do trabalho, principalmente no que diz respeito aos 46

arranjos musicais (G). O arranjo compreende a escolha dos instrumentos que sero gravados, a sonoridade que cada um vai apresentar, o que cada msico tocar, como o msico tocar (como ser sua performance) e como as partes se encadeiam na composio. um trabalho de orquestrao que exige grande conhecimento musical, aprumo esttico e sensibilidade artstica e humana. O produtor deve saber reconhecer o limite dos msicos, exigindo que deem o mximo de si, mas sem extrapolar o nvel de exigncia. Falarei mais sobre isso na etapa que segue. Existe, ainda, a possibilidade de que msicos externos ao trabalho sejam recrutados para a gravao. Podem ser amigos do artista principal, ou ainda, msicos contratados especialmente para o trabalho. Estes msicos so chamados de msicos de estdio. Se uma banda de rock, por exemplo, deseja incluir um solo de sax em uma gravao e no possui um saxofonista pertencente ao grupo, levando em considerao que o produtor realmente julgue importante a introduo deste instrumento para contribuir de forma positiva ao resultado final, e partindo do pressuposto que a banda no tenha amizade ou admirao por nenhum saxofonista em especial, certamente um msico de estdio especializado neste instrumento musical seria recrutado. Este tipo de msico remunerado mediante cach, pago faixa a faixa, ou ainda, em custo fixo negociado, caso participe de mais de uma msica. Tem ainda assegurados direitos referentes a proventos relativos a direitos autorais por execuo pblica da obra gravada em meios de comunicao de massa26

.

Em resumo, na etapa de Pr-Produo determinado em que estdio o trabalho ser produzido e ps-produzido, quem sero os msicos e tcnicos de gravao envolvidos, que instrumentos sero utilizados, o que ser gravado, como sero os arranjos e, ainda, qual a verba e prazo disponveis para a realizao do projeto. A seguir, vem a etapa de Produo.

1.8.2 - PRODUO Se a etapa de Pr-Produo corresponde a de planejamento, a etapa de Produo corresponde execuo. Uma vez que foi tudo definido, hora de entrar no estdio e comear a gravar. At o surgimento da j descrita tcnica de overdubbing desenvolvida por Les Paul, a Produo era realizada em poucos dias. No entanto, com o passar do tempo, com a reduo dos custos de produo e acesso aos estdios cada vez mais26

Atualmente em Porto Alegre / RS, o valor mdio de cach pago a um msico de estdio por faixa gira em torno de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais). Fonte: PALUDO, 2010.

47

disponveis, esta etapa passou a ser mais demorada, algumas vezes levando mais de um ano. O overdubbing possibilitou no s que o mesmo msico gravasse mais de uma vez o seu instrumento (ou outros alm do seu), como que as partes da msica fossem gravadas em dias diferentes e at em estdios diferentes. Existem diversos casos em que a bateria e o baixo foram gravados no estdio X, as guitarras e violes no estdio Y e os vocais no estdio Z. Artistas que dispe de um oramento considervel de gravao costumam, inclusive, gravar partes das faixas em pases diferentes. Este tipo de conduta tem uma explicao: como vimos anteriormente, importante que o artista sinta-se confortvel ao gravar. Fora isso, existem estdios que apresentam uma sonoridade (e alm dos equipamentos, as instalaes fsicas so decisivas neste aspecto) muito boa para captao e gravao de bateria, mas no to boa para vocais.

Outro item importante no processo de produo refere-se gravao multipista (G). Inicialmente, at os anos de 1950 e descoberta de Les Paul, as gravaes ocorriam em mono (G), tudo em um nico canal. No havia possibilidade de edio ou separao entre os instrumentos gravados e a voz. Na dcada de 1960 j era possvel gravar-se utilizando duas pistas independentes, e estdios mais avanados contavam com gravadores de quatro e at oito pistas. A proliferao dos equipamentos estreo (G) comeou a tornar-se popular a partir da dcada de 1970. O estreo possibilitou uma espacializao do som. Mesmo utilizando dois canais bsicos (esquerdo e direito), criava-se uma sensao tridimensional durante a audio. Podemos traar uma analogia com a viso: dispomos de dois olhos, mas percebemos os objetos e as pessoas em trs dimenses. O mesmo ocorre com o som. Os canais possuam controles independentes de volume e equalizao (graves, mdios e agudos). O controle que comandava o som mais para a esquerda ou mais para a direita foi inicialmente chamado de balano. Atualmente, o termo utilizado em produo musical PAN (G) (que provm de PANorama). Assim, a soma dos comandos VOLUME, PAN e EQ (de EQualizador) permitem espacializar os sons dentro de uma gravao, criando camadas de som (music layers) e efeitos de profundidade. Vale lembrar que essas camadas devem ser apreendidas como um recurso explicativo didtico, uma vez que no existem camadas puras, pois os sons, ainda que espacializados, acabam involuntariamente invadindo camadas adjacentes em todas as direes ( frente, atrs, esquerda e direita, acima e abaixo). Quanto mais alto for o VOLUME, maior ser a sensao de proximidade. O EQ utilizado para atenuar ou acentuar determinadas frequncias. Isto importante, 48

pois atravs deste controle evitamos que ocorram os chamados choques de freqncia. Trazendo um exemplo ilustrativo, imaginemos o som de um bumbo de bateria bem grave. O EQ pode evitar que o som deste bumbo entre em choque com notas graves produzidas pelo baixo. Se este choque no for evitado, o som tende a se sobrepor e a diferenciao entre o som do baixo e do bumbo tende a desaparecer, confundindo o ouvinte. Isto chamado em produo musical de som embolado. possvel entender esta espacializao do som atravs do grfico tridimensional apresentado a seguir. A este equilbrio entre os sons gravados utilizando conjuntamente os comandos de VOLUME, PAN e EQ d-se o nome de equilbrio da imagem estreo do som (G).

GRFICO ESQUEMTICO DA IMAGEM ESTREO DO SOM 27

O equilbrio da imagem estreo do som comumente chamado de mixagem (G). Nos processos de gravao em quatro canais (assim foi gravado o lbum Sgt. Peppers dos Beatles em 1967), caso o artista deseje gravar mais do que quatro elementos sonoros distintos, dever estar apto a: em primeiro lugar, planejar muito bem

27

Fonte: (PALUDO, 2010).

49

a gravao; em segundo lugar, realizar uma espcie de malabarismo sonoro. Assim, exemplificando, no canal (tambm chamado de pista de gravao (G)) 1, poder gravar o baixo e a bateria. No canal 2, uma guitarra. No canal 3, vozes. No canal 4, rgo. Uma vez que o baixo e a bateria foram gravados juntos no canal 1 (portanto, devem ter sido tocados juntos, logicamente por pessoas distintas, pois o overdubbing s funciona em canais separados), os controles de VOLUME, PAN e EQ atuaro igualmente sobre toda a bateria e sobre o baixo. Assim, o sucesso do overdubbing estava diretamente ligado disponibilidade de canais de gravao. Utilizando-se dois gravadores simultneos de quatro canais, era possvel gastar os quatro canais disponveis do primeiro gravador e, depois, mixar e enviar o conjunto dos quatro canais mixados do gravador #1 para uma ou duas pistas do gravador #2. Assim, teramos quatro pistas gravadas, mixadas e enviadas a outras duas pistas de outro gravador. Este processo chamado em produo musical de reduo. At a proliferao dos estdios digitais nos anos 2000, isso acarretava em considervel perda de qualidade. Sucessivas redues significavam aumentos desagradveis de rudo ao resultado final. Como aponta Martin (2002), a tecnologia foi evoluindo aos poucos. Como as novidades tecnolgicas chegaram mais cedo em alguns pases como Inglaterra e Estados Unidos, elaborei um quadro aproximado procurando traar a evoluo entre a dcada de 1950 e o momento atual28

:

QUADRO 5: EVOLUO DOS CANAIS / PISTAS DE GRAVAO DE 1950 A 2010

DCADA 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010

NMERO DE CANAIS DISPONVEIS 1A2 4A8 8 A 16 16 A 24 24 A 32 48 A 64 128

RESULTADO FINAL MONO MONO ESTREO ESTREO ESTREO ESTREO ESTREO

28

Fonte: (PALUDO, 2010).

50

Observando a tabela acima, notamos que a disponibilidade de canais de gravao teve um incremento de aproximadamente 12.700% em 60 anos. Trata-se de um avano considervel.

Tomando como base os dias atuais, depois de gravado e mixado, o resultado final d origem a uma gravao final estreo. A esta gravao se d o nome de matriz ou fonograma (G). Aps todas as faixas do trabalho serem gravadas e mixadas, chegamos ltima etapa, a Ps-Produo.

1.8.3 PS-PRODUO A Ps-Produo a ltima etapa no processo de produo musical. Uma das principais tarefas executadas neste momento recebe o nome de masterizao (G). Salvo raros casos, a masterizao realizada por engenheiros ou tcnicos de som especializados nesta funo. Utilizando um misto de equipamentos analgicos e digitais (s vezes optando-se apenas pelo caminho analgico, noutras exclusivamente pelo digital, e no terceiro caso, um misto das duas modalidades), o masterizador (G) como conhecido este profissional vai procurar gerar uma uniformidade entre as faixas de um lbum. Esta uniformidade conhecida como equilbrio de presso sonora entre as faixas. Isso significa que, no momento da audio da obra, o ouvinte no ter a necessidade de aumentar o volume de seu aparelho reprodutor musical para ouvir melhor uma msica suave e nem precisar reduzir o volume para escutar uma msica de carter mais agressivo. Assim, a presso sonora (G) corresponde ao impacto gerado pelo som no momento da audio, principalmente no que diz respeito ao volume e textura do som. A textura engloba elementos subjetivos do som como aveludamento e compresso. O aumento de presso sonora implica na perda de nuncias entre os timbres/sons e aumento de volume. O aveludamento implica em riqueza de detalhes dos timbres/sons e perda de volume. Trata-se de uma escolha, acima de tudo, esttica. Existe, porm, um lado mercadolgico influente: principalmente no caso de bandas de rock, as rdios FM privilegiam gravaes com grande impacto e consequente presso sonora. Esta presso para a rdio comumente chamada de punch (G) (em ingls, significa soco). Normalmente, o masterizador utiliza-se dos seguintes perifricos (analgicos, digitais ou ambos) para masterizar: COMPRESSOR (G),

EQUALIZADOR (G) e PR-AMPLIFICADOR (G). Quando se adiciona punch (G) a 51

uma gravao, comum a utilizao de uma gria de produo musical para designar esse procedimento: aquecer o som (existem variaes como esquentar ou ferver o som). Como outros procedimentos j citados, os valores cobrados pela masterizao so bastante variveis. Um dos principais nomes do Brasil, o engenheiro de som (G) e masterizador Enrico de Paoli, cobra em torno de R$ 200,00 (duzentos reais) faixa.29

por

Fig. 7 Enrico De Paoli (um dos mais respeitados masterizadores do Brasil) 30

No se deve confundir o termo masterizao com outro muito comum nos dias atuais (principalmente em lanamentos do tipo BOX SET): trata-se do termo remasterizao (G). A remasterizao implica em uma nova mixagem e masterizao de obras j lanadas, com o intuito de promover uma melhora do som, normalmente implicando, tambm, em incremento de punch. Esse processo muito comum em datas comemorativas (10, 15 ou 20 anos de lanamento do material original, por exemplo). No ano de 2009, toda a obras dos Beatles foi relanada utilizando-se justamente a tcnica de remasterizao. Cabe ressaltar que, embora em grande parte dos casos a proposta esttica e guia geral de como os elementos foram mixados nas faixas sejam respeitados para preservar a integridade artstica da obra, tal recurso (s vezes pouco perceptvel para ouvidos leigos) implica na gerao de um nova obra, uma vez que, embora sejam utilizados os mesmos elementos base, teremos a gerao de novos fonogramas.

29

Dado pesquisado no site do produtor: acesso em 20/01/2010. 30 Fonte: acesso em 21/01/2010.

52

Muitas vezes, ocorrem algumas manipulaes do som entre o final do processo de Produo e o incio do processo de Ps-Produo. Tomando como base, podemos imaginar uma guitarra que foi gravada sem o efeito de eco e o mesmo aplicado nessa transio. A estas alteraes posteriores que ocorrem aps a gravao em estdio e antes da masterizao com o objetivo de gerar novos cdigos sonoros que tragam contribuio esttica o que logicamente influenciar o todo proponho cham-las de maquiagem sonora (G). Este termo sistematizado por mim foi publicado em 2009 na revista especializada em udio Backstage, uma das mais respeitadas publicaes de udio do Brasil, e j adotada por outros produtores musicais. Realizados os procedimentos descritos acima, o produtor est apto para entregar ao artista ou gravadora o produto final, que como vimos, pode ir desde uma faixa avulsa at um BOX SET.

Podemos, finalmente, resumir as etapas de produo conforme a tabela abaixo: TABELA ESQUEMTICA: ETAPAS DE PRODUO 31 Etapa PR-PRODUO PRODUO PS-PRODUO Sinnimo planejamento execuo finalizao

1.9 GRAVADORAS E SELOS MUSICAIS Uma gravadora deve ser entendida como uma empresa constituda (no caso do Brasil, que possua contrato registrado na junta comercial) e habilitada para trabalhar com produo, promoo e comercializao fonogrfica. Atualmente, o mercado est dividido em dois grupos distintos: majors (grandes gravadoras) e indies (pequenas gravadoras e pequenos selos) (G). Apenas quatro grandes grupos (vide tabela a seguir) figuram na categoria das majors no mundo todo. As indies (tambm conhecidas como selos fonogrficos) podem trabalhar de forma autnoma e independente ou, ainda, funcionarem como pequenos braos das majors. As majors possuem maior poder de penetrao nos meios de comunicao de massa. No entanto, seus maiores

31

Fonte: (PALUDO, 2010).

53

investimentos esto voltados aos artistas mais renomados e estabelecidos, os quais, por consequncia desta posio privilegiada, representam maiores rendimentos para as majors.

Os selos comearam a se multiplicar no Brasil e no mundo a partir d dcada de 1990. Se olharmos para sites especializados em comercializar digital releases como a britnica Juno32

(um dos maiores vendedores de msica eletrnica do mundo),

poderemos observar que o nmero de selos existentes hoje enorme. Se at a dcada de 1990 os A&Rs trabalhavam caando novos talentos para serem promovidos e comercializados pelas majors, com o surgimento das indies, mais artistas tiveram oportunidade de colocar o seu trabalho em exposio para venda. Porm, nos dias atuais, quem normalmente custeia a produo de um lbum independente de se tratar de um artista estabelecido ou iniciante o prprio artista. As gravadoras, sejam elas majors ou indies passaram a assumir o papel muito mais de promoo e comercializao do que de produo. Por isso, embora com a profuso do acesso s novas tecnologias, a reduo dos custos de produo e a pirataria digital (G), o produtor passou a ter mais importncia ainda no processo de construo artstica, uma vez que trabalhar sem ele (salvo raras excees de artistas que conseguem produzir bem seus projetos) implica em um voo cego e improdutivo. O quadro a seguir apresenta as quatro majors e alguns exemplos de selos no Brasil.

32

Vide Juno Records UK acesso em 12/12/2009.

54

QUADRO 6: MAJORS x INDIES 33

EMI (Inglaterra)

Majors

Warner (Estados Unidos)

Sony Music (Japo)

Universal Music (Estados Unidos)

Selos / Indies no BrasilBiscoito Fino, Lua Music, Fiber Records, MCD, MZA Music, ST2 Records, Tinitus, USA Discos, Trama, Yb, Wav Label, dentre outros.

No que tange a contrataes, uma major s vai contratar um artista no qual ela realmente perceba um real valor mercadolgico (isto , talento associado uma vendagem considervel). E quem vai receber os maiores investimentos em marketing so justamente os artistas que j esto no mainstream34

ou aqueles que so potenciais

candidatos a estarem no mainstream (G). Migraes entre mainstream e underground (G) existam. Mesmo assim, o caminho de migrao de um artista que est em uma indie (G) e acaba sendo contratado por uma major um caminho de mo dupla, isto , s vezes um artista que est numa major acaba migrando para uma indie. Um artista cair de pra-quedas diretamente e uma major caso raro e normalmente resulta em fracasso absoluto.33 34

Elaborao: (PALUDO, 2010). Mainstream a denominao utilizada no mercado musical para aqueles artistas top de linha, consagrados pelo pblico e que ocupam espao simblico constante e privilegiado na mdia. O oposto (aonde se encontra a maioria dos artistas, em especial os iniciantes) chamado de Underground.

55

Ao menos por enquanto, o poder de fogo das majors maior do que o das indies: elas detm o monoplio quase que total dos grandes veculos de comunicao, os melhores e mais destacados lugares nas prateleiras das lojas e uma distribuio muito eficiente (pois alm de colocar o produto nas lojas, elas ainda dispe de um outro elemento importantssimo chamado divulgador. O divulgador (G) a figura que vai estar fisicamente presente nas lojas, nas rdios e nos programas de TV fazendo o link entre o artista+produto e o seu destino, no caso, veculos, canais diretos de venda e pblico consumidor). No entanto, o nvel de exigncia em termos de vendagem infinitamente maior do que se o artista figurar o cast de uma indie. Dez mil cpias vendidas em uma major representam pouco ou quase nada. Em uma indie, esta vendagem encarada como um grande sucesso.

Existem prs e contras de figurar em uma major. Veja o que segue: Vantagens de se estar numa major: distribuio eficiente, grande poder de fogo (promoo, marketing, divulgao, construo de imagem), credibilidade no mercado (gera credibilidade ao artista por associar seu nome uma marca reconhecida pelo mercado consumidor, divulgador e distribuidor) e rapidez em termos de divulgao (o trabalho exposto simultaneamente em diversos veculos de comunicao e pontos de venda em um perodo quase instantneo). Desvantagens de se estar numa major: retrao do mercado (implicando em retrao de novas contrataes, principalmente de novos artistas emergentes), remunerao por vendas menor do que uma indie e altssimo nvel de exigncia. Voltando s indies e selos, podemos entend-los como mini gravadoras. As suas atribuies so as mesmas de uma gravadora major, isto , posicionar e lanar o produto e o artista no mercado, e consequentemente gerar vendas. Como os selos so empresas muito menores, o artista acaba recebendo um tratamento mais personalizado do que receberia em uma major. No entanto, o nvel de investimento de uma indie muito menor do que de uma major, pois seu oramento para promoo e marketing estritamente reduzido e seu poder de fogo de um modo geral bem menor. As indies fazem um trabalho de formiguinha entrando em brechas que existem e trabalhando com vendagens e promoo bem mais modestas. Dificilmente uma indie

56

vai bancar a gravao, finalizao e prensagem de um lbum majors, nas indies h prs e contras. So eles:

35

. Assim como nas

Vantagens de se estar em uma indie: ainda contratam artistas novos (diferente do que ocorre com as majors), fazem um trabalho mais personalizado com o artista, do um suporte igualmente personalizado e em eventuais casos custeiam parte do processo de produo, alm de oferecerem remuneraes melhores do que as majors (por lbum ou faixa vendidos). Desvantagens de se estar em uma indie: possuem poder de fogo reduzido (em termos de marketing, promoo e distribuio), trabalham com verbas modestas, tem pouco ou nenhum poder de penetrao nos grandes veculos (TV, radio, jornal) e pouca credibilidade de marca (normalmente no so marcas fortes).

Vale por fim ressaltar que as majors possuem sub-divises, isto , seus prprios selos (muitas vezes distribudos de acordo com o estilo musical, pblico alvo e proposta esttica do artista). Em alguns casos, pequenos selos independentes acabam trabalhando em conjunto com majors (para fins de distribuio, principalmente). No Brasil e no mundo, h uma gama considervel de artistas totalmente fora desse mercado que gravam, prensam pequenas quantidades de forma caseira (o prprio computador assume o papel da prensadora utilizando-se softwares simples de gravao que integram a compra de um gravador de CD como o programa Nero) e comercializam o material em suas apresentaes. Tambm fazem, sozinhos ou com o auxlio de amigos, uma divulgao e promoo de forma caseira ou amadora. Passaremos a seguir para a penltima parte desse sub-captulo. Nela, vou abordar como os produtores se tornam produtores.

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Prensagem o processo industrial de duplicao / replicao de um lbum. As tiragens mnimas no Brasil giram em torno de 1000 cpias. (dado consultado em acesso em 10/10/2009)

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1.10 COMO OS PRODUTORES SE TORNAM PRODUTORES

Em 2006 a revista Backstage publicou uma matria de capa intitulada Produtores Musicais36

. Nela, alguns produtores estabelecidos no mercado brasileiro

falaram sobre o trabalho e carreira de produtor musical. Esta matria ser uma das bases para este sub-tem. O produtor Mayrton Bahia atua de forma expressiva no mercado musical. Dentre suas produes, figuram artistas como Legio Urbana, Joo Gilberto e Cssia Eller. Bahia comenta que a funo do produtor sempre multidisciplinar (como j vimos no incio deste sub-captulo). Em sua fala (in: Backstage, 2006), ele sugere um tringulo didtico para explicar quais so os atributos desejados para aquele que pretende ingressar na profisso. Este tringulo possui trs vrtices de igual importncia. O produtor deve ter tino para negcios, conhecimentos e aperfeioamentos constantes em recursos tecnolgicos (sejam eles analgicos ou digitais) e possuir sensibilidade artstica. Elaborei graficamente o referido tringulo baseado na leitura da reportagem, haja visto que o mesmo no foi desenvolvido naquela oportunidade.

TRINGULO DE ATRIBUTOS DESEJVEIS EM UM PRODUTOR MUSICAL 37

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Revita Backstage. Ano 12, n 136 Maro/2006. Rio de Janeiro: HSheldon, 2006. Fonte: (PALUDO, 2010).

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Segundo Bahia, o nico curso superior [sic] existente no Brasil de Produo Musical (e mostrarei a seguir que este dado s era vlido na poca em que a matria foi publicada, isto , em 2006) era o oferecido pela Universidade Estcio de S, na cidade do Rio de Janeiro38

. Realizando uma pesquisa hoje, constatei que atualmente existem,

principalmente na cidade de So Paulo, uma srie de cursos oferecidos. Porm, so cursos no-acadmicos, em nvel tcnico, de curta durao (o curso da Estcio de S citado na matria do tipo tecnlogo) e, embora se intitulem Curso de Produo Musical, em sua maioria so focados na operao de softwares utilizados na processo produtivo e no no desenvolvimento das competncias necessrias carreira de produtor. Em nvel acadmico, a Universidade do Vale dos Sinos (UNISINOS), localizada na cidade de So Leopoldo / RS, lanou em 2006 o curso tecnlogo intitu