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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 1788 NOTAS SOBRE POSITIVISMO E EDUCAÇÃO EM MINAS GERAIS, ENTRE O IMPÉRIO E A REPÚBLICA 1 Maysa Gomes 2 Introdução Esta comunicação objetiva discutir a relação política entre positivismo e educação em Minas Gerais no final do século XIX, a partir das manifestações de grupos e do envolvimento de professores e estudantes nos movimentos abolicionista e republicano, identificando seus atores e verificando como esta relação repercutiu nos processos políticos e educacionais. Autores como João Camilo de Oliveira Torres (1943) e Ivan Lins (1967) afirmaram a pouca influência das ideias de Augusto Comte neste estado, o que problematizamos a partir das fontes desta pesquisa. Nossa hipótese é de que a presença de um grupo com matizes positivistas atuou politicamente no estado neste período, fato que permite analisar o processo político e a história republicana mineira, estabelecendo as relações do positivismo com o campo educacional por meio de seus atores e suas ações. É isso que pretendemos demonstrar. Neste contexto, a história da educação e suas fontes se tornam interlocutoras privilegiadas para a abordagem da presença do positivismo e de seus desdobramentos em Minas. As fontes utilizadas nesta pesquisa foram: jornais mineiros, Fundo João Pinheiro do acervo do Arquivo Público Mineiro (APM), publicações do Apostolado e da Igreja Positivista do Brasil (APB e IPB), obras da historiografia sobre o positivismo publicadas ao longo dos séculos XIX, XX e XXI, bem como as obras do próprio Augusto Comte. As ideias educacionais de Comte no Brasil O positivismo no Brasil, cuja maior influência foi do positivismo comtiano, erigido em objeto de estudos de distintas áreas do pensamento social, apresenta em seu conjunto manifestações em diferentes aspectos, quais sejam, político, social, filosófico, religioso e educacional. Alfredo Bosi, por exemplo, aborda temas importantes relacionados ao positivismo e suas realizações no Brasil. Em O positivismo no Brasil: uma ideologia de longa 1 Este trabalho apresenta resultados da pesquisa de pós doutorado, realizado na FaE - UFMG 2 Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora Adjunta da Universidade FUMEC, Belo Horizonte. E-Mail: <[email protected]>.

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 1788

NOTAS SOBRE POSITIVISMO E EDUCAÇÃO EM MINAS GERAIS, ENTRE O IMPÉRIO E A REPÚBLICA1

Maysa Gomes2

Introdução

Esta comunicação objetiva discutir a relação política entre positivismo e educação em

Minas Gerais no final do século XIX, a partir das manifestações de grupos e do envolvimento

de professores e estudantes nos movimentos abolicionista e republicano, identificando seus

atores e verificando como esta relação repercutiu nos processos políticos e educacionais.

Autores como João Camilo de Oliveira Torres (1943) e Ivan Lins (1967) afirmaram a pouca

influência das ideias de Augusto Comte neste estado, o que problematizamos a partir das

fontes desta pesquisa. Nossa hipótese é de que a presença de um grupo com matizes

positivistas atuou politicamente no estado neste período, fato que permite analisar o processo

político e a história republicana mineira, estabelecendo as relações do positivismo com o

campo educacional por meio de seus atores e suas ações. É isso que pretendemos

demonstrar. Neste contexto, a história da educação e suas fontes se tornam interlocutoras

privilegiadas para a abordagem da presença do positivismo e de seus desdobramentos em

Minas. As fontes utilizadas nesta pesquisa foram: jornais mineiros, Fundo João Pinheiro do

acervo do Arquivo Público Mineiro (APM), publicações do Apostolado e da Igreja Positivista

do Brasil (APB e IPB), obras da historiografia sobre o positivismo publicadas ao longo dos

séculos XIX, XX e XXI, bem como as obras do próprio Augusto Comte.

As ideias educacionais de Comte no Brasil

O positivismo no Brasil, cuja maior influência foi do positivismo comtiano, erigido em

objeto de estudos de distintas áreas do pensamento social, apresenta em seu conjunto

manifestações em diferentes aspectos, quais sejam, político, social, filosófico, religioso e

educacional. Alfredo Bosi, por exemplo, aborda temas importantes relacionados ao

positivismo e suas realizações no Brasil. Em O positivismo no Brasil: uma ideologia de longa

1 Este trabalho apresenta resultados da pesquisa de pós doutorado, realizado na FaE - UFMG 2 Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora Adjunta da Universidade FUMEC,

Belo Horizonte. E-Mail: <[email protected]>.

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duração (2004) apresenta a fundação do APB, enfatizando várias das propostas de A. Comte

ganharam visibilidade no Brasil e afirma:

Impõe-se ao historiador uma triagem. Constam entre os efeitos salutares da militância ortodoxa algumas iniciativas que, em várias conjunturas, se opuseram ao pesado conformismo social de nossas oligarquias liberais desde o fim do Império até o ocaso da República Velha. Pertence ao saldo positivo: o pensamento antropológico anti-racista; a precoce adesão à campanha abolicionista mais radical; a luta pelo Estado republicano leigo com a consequente instituição do casamento civil; do registro obrigatório e da laicização dos cemitérios; a exigência sempre reiterada da austeridade financeira no trato da coisa pública; enfim, o interesse pela humanização das condições de trabalho operário, que resultou, tanto na França da Terceira República como no Brasil, em propostas de leis trabalhistas, afinal implementadas quando políticos gaúchos de formação positivista ascenderam ao poder central em 1930. (BOSI, 2004, p. 22)

Ivan Lins, em opúsculo intitulado Decimalia (1959), indica que desde 1868 Benjamim

Constant havia fundado no Rio de Janeiro uma sociedade para o estudo do positivismo e em

1876, uma sociedade para o estudo da obra matemática de Comte. A fundação da Sociedade

Positivista do Rio de Janeiro em 1881, teve à frente Miguel Lemos, Raimundo Teixeira

Mendes e o próprio Benjamim Constant e nesta trajetória, consta também a fundação da IPB

e do APB, bem como do Templo da Humanidade.

O positivismo comtiano foi eminentemente pedagógico em sua finalidade de educar

para a ação política com vistas à regeneração social. O percurso do sistema de ideias

instituído por Comte revela e consolida tais características como sua base de sustentação,

atribuindo à Religião da Humanidade a missão de formar seus adeptos e difundir o

pensamento positivista. Neste contexto, destaca-se o papel da IPB e do APB comandados por

Miguel Lemos e R. Teixeira Mendes3, a quem se deveu grande parte da sistematização e

divulgação do positivismo comtiano no Brasil.

Miguel Lemos, em Resumo Histórico do Movimento Positivista no Brasil (1881;1981),

descreveu a síntese do movimento e expôs as necessidades a serem atendidas, quais sejam,

"formar crentes e modificar a opinião pública por uma intervenção oportuna;” e para isso,

cumpria:

3 Notas sobre Miguel Lemos e Raimundo Teixeira Mendes: Miguel Lemos - nascido em Niterói a 25/11/1854. Frequentou a Escola Central, converteu-se ao positivismo ortodoxo, em seu sentido religioso. Em 1881 assumiu a direção da Sociedade Positivista do Rio de Janeiro transformando-a na Igreja Positivista do Brasil. Dirigiu a Igreja e o Apostolado Positivista até o ano de sua morte (1916). (http://www.cdpb.org.br/dic_bio_bibliografico_lemosmiguel.html). Raimundo Teixeira Mendes - nascido em Caxias, Maranhão a 5/01/1855. Estudou na Escola Politécnica, onde foi contemporâneo de Miguel Lemos. Converteu-se ao positivismo comtiano, tornando-se liderança do APB e sobressaindo como seu principal escritor, expositor e grande polemista. Faleceu em 28/08/1927. (http://www.cdpb.org.br/dic_bio_bibliografico_mendesraimundo.html)

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“1º - Desenvolver o culto. 2º - Organizar o ensino. 3º - Intervir oportunamente nos

negócios públicos.” (p. 21), revelando assim a importância do processo educacional e da ação

política no rol das necessidades estratégicas do movimento positivista.

O ideário do positivismo comtiano foi oficialmente divulgado e praticado pelas

publicações e ações da IPB e do APB. Sua disseminação se fez nas escolas e na sociedade por

meio de estudantes, professores, intelectuais e grupos políticos, de jornais, revistas,

manifestos, estudos, reuniões, clubes abolicionistas, positivistas, enfim, por uma rede tecida

socialmente por interesses diversos.4 No dizer de Carvalho (1998), os positivistas vinculados

à IPB e ao APB, “tinham um objetivo político muito claro e uma estratégia política bem

definida. Em função deste objetivo e desta estratégia é que enfatizavam a disciplina e a

liturgia. A rigidez era meio e não fim.” (p. 189). Ou seja, a ação e a interpretação da sociedade

pelo positivismo comtiano “eram indicadores de sua visão da sociedade brasileira e da

estratégia política que lhes parecia mais eficaz para acelerar a marcha histórica.” (p. 189).

Para estatuir o sistema positivista de ensino, R. Teixeira Mendes escreveu a obra

Ensino Positivista no Brasil, uma exposição popular do dogma positivista para um curso de

quatro anos. Este curso objetivava preparar novos positivistas por meio de um programa

próprio de ensino com vistas a intervenção social, ou o que Mendes denominou de “revolução

moderna”. (1892;1936, p.3-4). Nesta obra é apresentada a proposição do plano de curso

(adaptado) que partia da Apreciação da Filosofia Primeira (estudo geral da ordem universal)

e se desenvolvia por meio da Exposição Enciclopédica, que abrangia as matérias: Lógica

(Cálculo e Geometria), Física (Astronomia e Física), Química, Moral, Biologia, Sociologia,

Moral teórica e prática, reproduzindo as propostas educacionais do Curso de Filosofia

Positiva desenvolvido por Comte.

Mendes (1892;1936) ainda ressalta o Regime de Liberdade Espiritual5, aspecto

fundamental no positivismo comtiano, e sua vinculação ao ensino positivista. Ensino este,

que previa, além da abolição dos privilégios teóricos e técnicos, o ensino público e gratuito;

escolas positivistas anexas aos Templos da Humanidade, naquela que seria a 2a fase da

transição orgânica da implantação do positivismo.6 Os templos positivistas eram

considerados como espaço de socialização da infância, preparação para a convivência no

espaço público, formação da identidade e realização das solenidades sociolátricas - uma

4 Em sua obra História do Positivismo no Brasil, LINS (1967) oferece vários relatos sobre o tema. 5 A Liberdade Espiritual consistia na separação Igreja e Estado, a partir do entendimento do Estado laico, ou seja,

o poder político não deve interferir sobre as crenças dos indivíduos, que são de ordem subjetiva. Separação entre Poder Material e Poder Espiritual.

6 Consideravam que o Brasil estava na 1a fase da transição orgânica e por isso a adaptação do plano de ensino.

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iniciação fora dos hábitos acadêmicos. Deste conjunto de condições dependia a eficácia

política e moral do ensino positivista, de contribuir para a regeneração da humanidade, pois

seus cursos públicos que não se separavam do conjunto de ações do Apostolado. (p.6-8)

Antes mesmo do APB e da IPB, tanto intelectuais quanto políticos divulgaram as ideias

educacionais e as interpretações positivistas de uma nova sociedade, contribuindo para sua

circulação e para a constituição de propostas e ações também no âmbito educacional.7

Manifestações do positivismo em Minas Gerais

Embora Lins (1967) ambiguamente falasse da repercussão do positivismo em Minas

Gerais e Torres (1943) negasse essa repercussão, as fontes desta pesquisa revelaram que o

positivismo se fez presente na história mineira e teve importante repercussão. No período

imperial, diversas agremiações, alunos, professores e imprensa foram os principais atores

positivistas e propagandistas republicanos na então capital da província mineira, Ouro Preto.

No ano de 1881, o jornal A Província de Minas, órgão do Partido Conservador, já condenava

a “onda do positivismo, do materialismo, do liberalismo quimérico, contraditório ou

funesto” (A PROVÍNCIA de Minas, 29 mai.1881, p.2). Nessa mesma direção, Andrade

Figueira, deputado conservador, em 1882, expressou em discurso que tanto a Escola de

Minas de Ouro Preto (EMOP) como a Politécnica do Rio de Janeiro eram viveiros de

positivistas, o que Lins julgou como exagero, para depois admitir ter havido um “surto

positivista" entre os lentes da EMOP, dentre os quais citou: “Domingos Rocha, Leônidas

Damázio, Antônio Olinto e Domingos Porto.” (1967, p. 216). Estes episódios ilustram que o

positivismo esteve na pauta dos acontecimentos na capital da província mineira neste

período.

Em estudo sobre as escolas e os professores de Ouro Preto, em fins do século XIX,

Martins (2010) salienta que a fundação da Escola Normal, da Escola de Minas e do Liceu

Mineiro, constituiu-se em um dos elementos responsáveis por uma nova dinâmica dos

espaços e da vida pública em Ouro Preto. Credita a isso o surgimento de novas redes de

sociabilidade formadas por professores e alunos destas escolas criando associações sobretudo

depois de 1880. “Assim, eles criaram associações abolicionistas, organizaram meetings e

fundaram jornais, criando um novo espaço para expressar suas insatisfações com relação ao

governo imperial.” (p. 19).

7 Neste sentido, cf. LINS (1967, p. 263-253), que descreve a presença e a atuação de positivistas em diversas escolas da Corte.

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O compartilhamento dos espaços físicos das instituições de ensino foi também um elo

importante na atividade de tais movimentos, propiciando a articulação de uma sociabilidade

política e educacional, pois a instalação das principais escolas da antiga capital revelam que o

prédio da Escola de Farmácia de Ouro Preto recebeu em seu espaço em 1871 o Liceu Mineiro

e a Escola Normal de Ouro Preto; em 1876, a Escola de Minas; e o Liceu de Artes e Ofícios,

em 1884, este último criado por Crockatt de Sá e Archias Medrado.

Além disso, as referências ao positivismo em Ouro Preto no período imperial estiveram

associadas à luta abolicionista, que foi também uma das principais bandeiras positivistas8 e à

participação de professores da EMOP neste movimento. Como noticiou o jornal O Liberal

Mineiro, de 16 de janeiro de1884 sobre o festival do Club Abolicionista Visconde de Rio

Branco, realizado no dia 05 de janeiro do mesmo ano, e que reuniu a “elite da sociedade

ouro-pretana” para uma grande festa musical. Como descreveu:

Na entrada do edifício a banda de música do corpo de polícia fazia os prelúdios do festival. O salão fora decorado com singeleza e capricho. Na parede do fundo destacava-se sob um dossel de veludo verde o estandarte do Club Abolicionista elegantemente bordado com esta insígnia que lhe sintetiza as tendências positivistas: ORDEM E PROGRESSO. Irradiava à sombra dele a efígie do brasileiro imortal [Tiradentes], cuja memória é a legenda dos combates da liberdade. (O LIBERAL Mineiro,16 jan.1884, p. 4.)9

No evento, registrou-se a presença de vários professores e foram ressaltadas as “ideias

filantrópicas dos senhores Joaquim Francisco de Paula e Coronel José Egydio da Silva

Campos”, o grande destaque do festival, pois estes senhores concederam a dois escravos

cartas de alforria entregues pelo presidente do clube Dr. Crockatt de Sá, durante a

solenidade.

Outra manifestação, ocorrida no dia 25 de março de 1884, foi noticiada no jornal A

Província de Minas (27 mar.1884. p. 3).10 Esta festividade foi promovida pelas sociedades

Libertadora Mineira presidida por Archias Medrado, e a Abolicionista Visconde de Rio

Branco, presidida por Crockatt de Sá, "engenheiro distinto, positivista”. Tanto Medrado

quanto Sá eram professores da EMOP.

A descrição do estandarte da sociedade A Libertadora Mineira revelou uma veneração à

mulher e sua representação como “imagem do progresso” que designa o progresso moral

8 A abolição da escravidão no Brasil foi uma das bandeiras da IPB e do APB e a província do Ceará aboliu a escravidão em seu território em 25 de março de 1884. Data deste mesmo ano a primeira edição da publicação “O positivismo e a escravidão moderna”. Este opúsculo apresenta uma introdução de Miguel Lemos, trechos extraídos das obras de Comte e documentos positivistas relativos à escravidão no Brasil.

9 Grifos do autor 10 Existem elementos nesta publicação que nos levam a inferir que a matéria não foi escrita pelos redatores do

jornal.

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como guia da humanidade, e sua associação ao positivismo ficou evidente na descrição da

participação das mulheres na festividade. 11

Representantes da moral na família, entes sensíveis por excelência, saudando a marcha cívica em honra ao Ceará, como que sentiam em si todo o horror que inspira essa palavra - escravo - túmulo frio e sinistro da personalidade humana. É que os grandes pensamentos vêm do coração, como diz Vauvenargues12, e a mulher, conjunto de sentimentos afetivos, não podia por certo deixar de abraçar essa causa humanitária(…). (A PROVÍNCIA de Minas, 27 mar.1884. p. 3.)

É importante destacar também que sociedade Abolicionista Visconde de Rio Branco,

tinha em seu estandarte um losango com a inscrição da divisa positivista - ordem e progresso

que foi incorporada posteriormente à bandeira nacional. Ressaltamos ainda a participação de

diversas autoridades e professores, dentre eles o Dr. José Ignácio Guimarães (Juiz de

Direito), Dr. Leônidas (Damázio, positivista, lente da EMOP); Josephino Pires (advogado,

positivista, autor de livro Ensaios Filosóficos, natural do Serro, filho de Joaquim Felício dos

Santos 13).

A leitura do tema na ótica da história da educação, encontrou ainda no trabalho de Lins

(1967) a indicação de atores políticos e educacionais ligados ao pensamento positivista em

Minas Gerais. O principal elo neste processo foi a trajetória de João Pinheiro da Silva14, da

EMOP à Faculdade de Direito de São Paulo. Na relação entre os planos político e educacional

circularam as evidências de que o positivismo permeou pensamentos, ações e debates

anteriores à República e também em sua consolidação no estado.

O positivismo e a organização republicana em Minas: da EMOP à Faculdade de Direito de São Paulo

Na medida em que identificamos o envolvimento de professores da EMOP no

movimento abolicionista e a relação destes com o positivismo, evidenciada na historiografia e

nas manifestações públicas descritas anteriormente, tornou-se necessário pensar em como

esta escola conviveu com as ideias de Comte.

11 Comte designa a Mulher como parte essencial no plano da regeneração da sociedade. Para ele, a Mulher é capaz de influenciar na regeneração moral por seus atributos específicos e pelo seu papel na família, base de todo desenvolvimento social e moral. COMTE, 1940, p. 58).

12 A referência feita ao filósofo Vauvenargues nos oferece mais uma relação. Este autor é tema de obra constante da Biblioteca Positivista proposta por Augusto Comte n'Os Pensamentos de Pascal, seguidos pelos de Vauvenargues e dos Conselhos de u’a mãe, de Mme. de Lambert. (Cf. VOLUMES da Biblioteca Positivista...)

13 Cf. RODRIGUES (1986) 14 João Pinheiro da Silva, natural do Serro (MG), bacharel pela Faculdade de Direito de São Paulo, Secretário de

governo e vice-presidente do Estado de Minas Gerais,1889, Presidente do Estado de Minas Gerais, 1890 e 1906. Fonte: http://www.mg.gov.br/governador/joao-pinheiro-da-silva. Lins (1967), afirma a filiação positivista de João Pinheiro, que quando governador do Estado não deixava de “transparecer suas arraigadas convicções positivistas.” (p.212)

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As formulações de A. Comte para o Curso de Filosofia Positiva e seu aperfeiçoamento

em um sistema que é, ao mesmo tempo, social, educacional e político, configuraram os

desígnios educativo e político do positivismo. Esta designação se encontra na base do

processo de desenvolvimento de todo o sistema comtiano, cuja proposta contemplou uma

organização curricular em disciplinas específicas para tal formação. Tais propostas

circularam pelas escolas brasileiras, antes mesmo de serem sistematizadas pela IPB e APB.

Neste contexto, a EMOP se sobressaiu, não apenas como a mais importante escola da

província mineira no período, como também pela identidade positivista de alguns de seus

professores, dentre os quais ressaltamos Leônidas Damásio preparador/repetidor de Física e

Química.

A existência de dois cadernos de João Pinheiro no acervo do APM, nos levou a buscar

suas referências, pois continham anotações de lições de Física que reproduziam a proposta

comtiana de ensino, embora não registrassem data e local onde tais apontamentos foram

feitos. Segundo Barbosa (1980, p. 21) João Pinheiro iniciou seus estudos na EMOP em 1881,

tendo deixado esta escola antes de se matricular no 3º ano. Isso significa que ele cursou dois

anos do curso preparatório (ou inferior), no período em que já vigorava o Decreto n. 7628, de

14 de fevereiro de 1880.15 Daí procede a identificação dos dois cadernos de anotações de João

Pinheiro que, embora não apresentem registro de datas, podem ser atribuídos aos estudos

realizados na Escola de Minas.16 Como as lições eram de Física, as fontes indicaram que

foram ministradas pelo professor Leônidas Damázio.

Estas evidências demonstraram algumas das articulações do positivismo comtiano na

configuração de seus desígnios educativos para fins políticos, pelo envolvimento de

professores e alunos dentro e fora da sala de aula. O que indicou a existência de atores

positivistas articuladores de diversas ações em Ouro Preto, inclusive, e principalmente, na

EMOP. Tais atores, talvez um grupo, foram responsáveis pela disseminação da doutrina de

Comte, da educação para a ação política com o objetivo da transformação social, pelas ações

do movimento abolicionista e republicano. A partir destes dados, se torna necessário

repensar a organização da República em Minas, estabelecendo suas relações a partir do

estudo da atuação do Club Republicano Mineiro, formado por alunos da Faculdade de Direito

em São Paulo e do qual fez parte João Pinheiro. Assim, a trajetória educacional de Pinheiro

permitiu a compreender algumas articulações históricas fundamentais.

15 Este decreto definiu o curso preparatório de dois anos e o conteúdo do programa a ser ensinado no primeiro e no segundo ano, para a EMOP, bem como indicou a qualificação dos lentes que seriam responsáveis pelas disciplinas.

16 Neste sentido, ver também COSTA (2006).

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O Almanak Republicano Brasileiro para o ano de 1890 divulgou dados relativos ao

movimento republicano nos estados brasileiros, registrando seus representantes no

parlamento e nas assembléias provinciais, os jornais e os clubs republicanos existentes até 31

de dezembro de 1888. Nas informações relativas aos Clubes Republicanos, consta que estes

estiveram presentes nas 20 províncias, contabilizando 5 Centros Republicanos e 240 clubes.

Minas Gerais registrou a existência de um Centro Republicano (Barbacena) e 57 clubes na

província, sendo o estado com o maior número de clubes. Além destes, registrou-se ainda o

Club Republicano Mineiro fundado na província de São Paulo por estudantes mineiros. Estes

dados demonstraram a importância tanto de Minas Gerais quanto dos clubes no processo de

propaganda e articulação política na constituição e sustentação da República, pois, se as

comissões partidárias do Partido Republicano estavam presentes em apenas 8 províncias, os

clubes fincaram bandeira em todas elas.

Estudos realizados sobre Minas Gerais, por autores como Wirth (1982), Resende (1982)

e Viscardi (1999, 2013), abrangeram contextos importantes do processo político republicano

mineiro, demonstrando as dificuldades de um estado territorialmente extenso e populoso, e

de um ideal republicano entrecortado por diferentes concepções ideológicas sob um mesmo

abrigo chamado República. Nestes estudos pouca ou nenhuma referência existe sobre o

chamado Club Republicano Mineiro, fundado em São Paulo em 1883. No entanto, este clube

é peça fundamental para o entendimento da organização política mineira no período, pois

nele teve origem um processo de articulação republicana com vários municípios ao longo da

década de 1880. Nas atas deste Club, no relato das atitudes de alguns de seus membros e de

algumas discussões, encontramos indícios que se aproximam de concepções e ações

positivistas.

Pela análise da constituição do movimento republicano em Minas Gerais é possível

afirmar a existência de um republicanismo à mineira, que estabeleceu articulações entre

República, positivismo e educação, na medida a formação de lideranças, as trajetórias e

percursos de estudantes, políticos e professores resguardaram em seus caminhos as marcas

do positivismo e de suas propostas. As fontes e parte da própria historiografia, de modo

fragmentado, indicaram que o positivismo e os positivistas em Minas foram atuantes,

organizados, companheiros e leais aos seus princípios. Neste sentido, é necessário considerar

os vínculos sociais e culturais que um grupo da elite política manteve ao longo do tempo,

vínculos esses, partilhados pela história comum de formação e ativismo político, dos clubes

abolicionistas de Ouro Preto, da EMOP ao Club Republicano formado por estudantes

mineiros da Faculdade de Direito de São Paulo.

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O Club Republicano Mineiro reuniu republicanos de diferentes cidades de Minas Gerais

que estudavam na capital paulista, aos quais se agregou, em 1884, João Pinheiro da Silva. A

existência deste clube e as ações empreendidas por seus membros construíram uma rede no

estado em conexão com os articuladores e fundadores do Partido Republicano Mineiro

(PRM) em 1888. As atas das reuniões revelam parte das discussões realizadas pelo grupo, as

posturas e as tendências de seus sócios e, mais que isso, uma estratégia para implantar a

República por meio de ações, dentre as quais, as filiações de cidadãos mineiros ao Club.

Criou-se assim um vínculo e um ponto de apoio em diferentes cidades no estado natal. Da

leitura das atas observamos que: vigorava na agremiação uma tendência positivista; havia um

grupo que se organizava em torno desta tendência; as discussões e ações pautadas pelo

positivismo aparecem algumas vezes nos registros; não era um grupamento homogêneo, ou

seja, não podemos classifica-lo em princípio como um grupo positivista, no entanto, havia ali

um grupo positivista em ação ao qual João Pinheiro se integrou.

Figura I - CLUBE REPUBLICANO MINEIRO, 1883. Fonte: APM, Notação: PE-117, Coleção: Personalidades.

Quando parte da historiografia mineira, José (1960), Barbosa (1980), Wirth (1982),

Resende (1982), Viscardi (1999, 2013) e Chacon (2005), credita como tardia a fundação do

PRM em 1888, na verdade, não considera que esta foi o resultado de uma articulação iniciada

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pelo menos cinco anos antes, o que a tornou possível, apesar das divergências internas. Esta é

uma releitura necessária, a de reconhecer a fundação do PRM como um esforço,

principalmente, do Club Republicano Mineiro, de seus positivistas e daqueles que com eles se

articularam nesta ação, como registraram as atas do Club.

Matizes positivistas da República em Minas

A primeira ata disponível no acervo data de 20 de junho de 1883 e nela se discute a

notícia veiculada pelo jornal A Província de São Paulo sobre o surgimento do Club, os

estatutos e a elaboração de um regimento interno. O Expediente constava de um convite feito

aos membros do clube para uma missa em intenção do falecido Dr. Galvão. O presidente

nomeou a comissão do clube para ir ao evento, da qual faziam parte o Sr. Geraldino

Campista17 e Gervásio Monteiro. Nessa reunião, levantou-se também a necessidade de dirigir

um manifesto do clube ao povo mineiro, o que foi secundado pela eleição da comissão para

sua elaboração.

Os indícios de que vigorava na agremiação uma tendência positivista e que havia um

grupo que se organizava em torno desta tendência, apareceram na ata da sessão

extraordinária de 04 de julho de 1883. Do Expediente fazia parte um convite dos estudantes

católicos ao Club para fazer apresentações em seus festejos e foi decidido não participar

destas comemorações. Ainda nesta sessão, os senhores Gervásio Monteiro e Geraldino

Campista informaram sobre a missa do falecimento do sr. Galvão: o primeiro cientificou ao

Club que não compareceu à missa, mas que enviou um representante; o segundo disse que

não foi a esse ato religioso, cumprindo dessa forma um dever.18

Na sessão extraordinária realizada no dia 9 de julho de 1883, foi proposta a discussão

de teses como uma das atividades do Club e estas seriam providas por meio do presidente da

17 Geraldino Campista, positivista, natural de Itajubá, lecionou na Escola Normal de São Paulo, bacharelou-se em Direito em 1886 (segundo a REVISTA da Faculdade de Direito de São Paulo, 1900, p. 241) e foi um dos fundadores do Club Republicano Mineiro (CLUBE REPUBLICANO MINEIRO, 1883. APM, Notação: PE-117, Coleção: Personalidades). Encontramos algumas referências sobre sua atuação como professor e secretário da diretoria da Escola Normal de São Paulo (CORREIO PAULISTANO, 03 dez. 1884) e como ex-diretor da Escola Neutralidade de São Paulo, capital (ROZANTE, 2013). A obra Correspondência de Machado de Assis, faz menção a Geraldino Campista e Cristiano Brasil como fundadores, juntamente com João Dalle Afflalo e Frederico Schumann Sobrinho, da primeira biblioteca de Itajubá denominada Biblioteca Machado de Assis, em janeiro de 1883, oferecendo aos sócios os livros que os quatro iniciadores possuíam. (ROUANET, 2009 ).

18 Sobre a rejeição do convite dos estudantes católicos, essa possivelmente se deu pelos vários embates entre positivistas e católicos, uma vez que a Igreja Católica se posicionava contra várias propostas de positivistas e republicanos, a exemplo a da laicidade do Estado. Destacamos aqui que o positivismo comtiano procede uma crítica histórica e contundente ao catolicismo em vários aspectos, inclusive filosófico e político, o que gerou uma animosidade entre ambos, especialmente no campo político, onde a histórica relação da Igreja Católica com as monarquias é combatida pela proposta positivista de separação entre Igreja e Estado, além da denúncia de conivência da Igreja Católica com a escravidão. Neste sentido ver COMTE, 1978, p.268 e também SANTOS, 1913, A igreja católica e a escravidão.

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casa. Deste modo, na sessão ordinária de 15 de julho de 1883, foi anunciada para a sessão

seguinte a discussão de quatro teses aceitas pela casa: "1- Qual a atitude do “Club

Republicano Mineiro”19 frente ao Elemento Servil? 2- Qual a atitude do mesmo em face ao

Catolicismo? 3- Se os Republicanos podem exercer cargos públicos? 4- Se nossas tradições

são republicanas?” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM)

A proposta destas teses chamaram a atenção, pois mesmo em se considerando que

estas questões e termos circulavam à época nos meios políticos e estudantis, eram conteúdos

caros ao positivismo.20 Some-se a isso a recusa ao convite para participar das comemorações

dos estudantes católicos e a atitude de dois dos sócios designados para representar o Club em

uma missa, à qual não compareceram. Gervásio Monteiro enviou representante e Geraldino

Campista “disse que não foi a esse ato religioso, cumprindo dessa forma um dever.” Ao que

indagamos: qual dever? Certamente o de um positivista.

Na reunião de 26 de julho de 1883, o sócio Pitaguary Terra apresentou a tese - Qual a

atitude do Club Republicano Mineiro frente ao Elemento Servil? e “defendeu que o Club deve

ser hostil ao Elemento Servil.”21 O registro da reunião seguinte, datada de 02 de agosto, expõe

o questionamento feito por Gervásio Monteiro que “não acha a Ata fiel no tópico referente ao

discurso do sr. Pitaguary, o qual achando-se presente afirma ter a ata reproduzido com

inteireza o que disse no seu discurso.” Ao que Waldomiro Guilherme contrapôs que “a ata é

fiel e que sente não ser esta a ocasião oportuna para externar sua opinião relativamente ao

Elemento Servil.” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM). O sócio Gervásio Monteiro declarou-se

abolicionista, revolucionário e pediu que inserisse na ata sua declaração, à qual aderiram os

sócios Luiz Lemos e Geraldino Campista.

19 Grifo do autor 20 As discussões sobre o “Elemento Servil”, a relação do club frente ao catolicismo, se os republicanos podem

“exercer cargos públicos” e se as “nossas tradições são republicanas” eram propostas relacionadas à ação positivista. Lembramos aqui que os positivistas no Brasil levantaram a bandeira de luta contra a escravidão por meio de publicações e ações pioneiras (cf. LEMOS, M. O positivismo e a escravidão moderna, 1884; 1934 ); ao questionar a relação do clube frente ao catolicismo, levantava-se uma polêmica presente nos escritos de Comte em relação ao catolicismo (Ver COMTE, 1978, p.268); a questão se deveriam ou não exercer cargos públicos, correspondia à orientação do APB de “não exercer cargos políticos durante a fase empírica da transição moderna tal como foi definida por Augusto Comte”(LEMOS,1899, p.5) e se as tradições eram republicanas, remete ao declarado republicanismo de A. Comte e sua exposição como uma tradição. (Comte, 1940, p.9).

21 Importante definir o termo "Elemento Servil” difundido nas décadas 1870-1880, cujo entendimento, a partir das fontes, é o instituto da escravidão. Alguns documentos da Camara e do Senado trataram do "Elemento Servil” nesta acepção, tais como o Parecer e projeto de lei sobre o elemento servil apresentados pela comissão especial … 1870, N. 200 disponível em: www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/227359; a obra de Theodoro Parker intitulada Elemento Servil, disponível em http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/174445; e além desses, a obra de Júlio de Castilhos: Positivismo, Abolição e República, p. 66-67, que fala das tentativas de promover "a extinção do elemento servil", disponível em: https://books.google.com.br; bem como Lemos (1881; 1891) que utilizou a designação "Elemento Servil” com o claro sentido de instituto da escravidão, ou seja, o termo não se refere ao indivíduo escravizado propriamente dito, mas à escravatura.

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O relato desta ata nos pareceu ambíguo, pois, entendendo Elemento Servil como o

instituto da escravidão - o clube se posicionaria contrário a esta, o que seria mais plausível a

um grupo republicano22. Ao mesmo tempo em que o questionamento feito indica uma

possível divergência entre o que foi tratado e o que foi registrado, prevalecendo a opção pela

ambiguidade da interpretação. Por outro lado, fica claro também que o Club não era um

agrupamento homogêneo pois divergências e tensões, apareceram em vários momentos.23

A importância destas atas também se refere a nossa hipótese sobre a relação do Club

Republicano Mineiro e a origem do PRM, bem como ao seu papel na articulação da República

em Minas. Na ata de 02 de agosto, ainda em 1883, “O sócio Waldomiro Guilherme apresenta

uma proposta assinada pelos sócios presentes pedindo que se nomeiem sócios honorários e

correspondentes.” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM). A proposta foi aceita, e nesta mesma

reunião iniciou-se a indicação de sócios honorários e correspondentes, que foram

apresentados pelos membros do clube. Na sessão foi também nomeada uma comissão para

elaborar um programa de propaganda para discussão. Da estratégia de nomeação de sócios

honorários e correspondentes nas diversas localidades de Minas, bem como da Comissão de

Propaganda, iniciadas nesta sessão, decorrem, a nosso ver, as bases locais do Partido

Republicano Mineiro, pois em 1888, Minas possuía um expressivo número de clubes

republicanos. A última ata do ano de 1883 confirma nossa suposição quando registra que

“Foi em seguida pelo Presidente nomeada a seguinte comissão para rever e publicar os

estatutos, que devem reger a fundação dos Clubs em Minas, composta dos cidadãos

Adalberto Ferraz e Francisco Salles.”24 (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM).

Ainda merece destaque a Sessão Extraordinária de 21 de abril em "comemoração da

data gloriosa em que subiu ao cadafalso Joaquim José da Silva Xavier, comumente conhecido

por Tiradentes”25, realizada na casa do sócio Geraldino Campista. Estiveram presentes João

Ribeiro, Adalberto Ferraz, Nelson Tobias, Geraldino Campista, Simplício Vianna, Francisco

de Salles, Arthur Ribeiro e Augusto Botelho. Nelson Tobias propôs que o Club se

congratulasse com o “Club Tiradentes” da Corte, por meio de um telegrama, comparticipando

22 Lembramos que grande parte dos republicanos paulistas não abraçaram esta causa de imediato, no entanto, não parece ser este o posicionamento da maioria dos membros do Club Republicano Mineiro.

23 Em um deles, a ata de 25 de abril de 1883, relata: “Ao final, falam Sanches de Lemos e Francisco Barcellos.” Não há relato do que foi falado. Apenas que houve muita discussão e reações, como registrou o secretário “A chuva de apartes, que caíam sobre os oradores produziram uma imensa balbúrdia, que foi abafada pela voz do Presidente suspendendo a sessão.” Assina o secretário João Ribeiro. Rodapé: “Aprovada. S. Paulo, 1º de maio de 84. O vice-presidente, Christiano Brazil. Também em 08 de agosto de 1883 o secretario relata que “É aberta a sessão que sendo agitada e tumultuosa e [foi] de pouco proveito (…)”(DOSSIÊ relativo ao PRM, APM)

24 (Grifo nosso) 25 Salientamos que a data comemorativa de Tiradentes era uma das datas de comemoração oficial da IPB e do

APB. Neste sentido ver Mendes, 1936, dentre outros.

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com ele na festa. Geraldino Campista e Francisco Salles propuseram: “1- que se lance na Acta

um voto de censura aos sócios que não compareceram; 2- que mandem publicar no [A]

Província - órgão republicano - o resultado da reunião, sendo ambas as propostas aceitas."

(DOSSIÊ relativo ao PRM, APM).

Para o ano de 1884, as sessões do Club foram retomadas juntamente com as propostas

para sócios, e as discussões sobre os estatutos retomam a pauta. Na reunião de 25 de maio de

1884, João Pinheiro foi apresentado por Adalberto Ferraz e aceito como sócio efetivo por

unanimidade. Nesta mesma sessão, além das propostas de sócios honorários e

correspondentes em diversas cidades, foi discutido o projeto dos estatutos, a questão do

jornal e aprovada a proposição de que qualquer sócio poderia propor tese política para

discussão, desde que aprovada pela diretoria.

Observamos na dinâmica das atas a retomada de questões presentes desde as primeiras

sessões do Club, como por exemplo a discussão de algumas teses e questões relativas a

publicações para a propaganda republicana em Minas. Elas perpassaram as sessões do clube

ao longo do tempo e suas soluções foram tardiamente efetivadas.

A partir da sessão de 30 de maio de 1884, inaugura-se o período de participação de

João Pinheiro no Club Republicano Mineiro e é proposta novamente, por Gervásio Monteiro,

a discussão da tese: São republicanas as nossas tradições históricas? Na reunião de 08 de

junho de 1884 Gervásio Monteiro apresentou a tese, conforme foi relatado: "o sr. Presidente

deu a palavra para o desenvolvimento da sua tese. O sr. Gervásio Monteiro, tomando a

palavra, desenvolveu a sua tese num discurso bem elaborado e bastante eloquente, o qual foi

por muitas vezes aplaudido, e cumprimentado por alguns dos srs. sócios.” (DOSSIÊ relativo

ao PRM, APM). Nesta mesma reunião ainda foram apresentadas propostas para sócios

efetivos e João Pinheiro propôs a discussão da tese: Meios de Propaganda, que foi aceita e

deveria ser apresentada na reunião seguinte e não o foi, por motivo de saúde, não havendo

relato de apresentação posterior.26

Em 24 de junho de 1884, há registro de uma carta do Dr. Antonio Augusto de Lima

dirigida ao Club, e da seguinte proposição:

O sócio Gervásio Monteiro propôs a seguinte tese: qual a atitude que deve ser tomada pelos republicanos mineiros ante o elemento servil? O sr. Gervásio Monteiro pediu a palavra para fazer a seguinte proposta: Proponho que o Club Republicano Mineiro se declare abolicionista. Posta em discussão, pediram a palavra os srs. Horácio de Carvalho e Constâncio da Silveira que

26 No entanto, no trabalho de Guilherme Meirelles da Costa (2006) sobre a formação política de João Pinheiro revela que parte deste estudo se encontra no IHGMG.

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falaram contra a mesma, a qual foi retirada pelo mesmo sr. Gervásio. (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM).

A ata desta sessão foi lida e discutida na sessão de 24 de agosto do mesmo ano e

fala sobre ela o sr. Gervasio, declarando que não havia proposto que o club se declarasse abolicionista; apenas defendera a tese - qual a atitude do Club a respeito do elemento servil? e que seus correligionários haviam se declarado abolicionistas na discussão da tese e mais que a sua proposta retirada fora a relativa à publicação do resumo da ata daquela sessão no A Prov. de S. Paulo. Em seguida, o sr. Gervásio Monteiro justifica uma proposta sua a fim de ser publicada a - República Federal - de A. Brasil27 e espalhada gratuitamente pela Província de Minas. Passou, tendo alguns votos contra. (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM).

A sessão do dia 02 de outubro de 1884 foi convocada para eleição e posse da nova

diretoria da casa, João Pinheiro foi eleito 2º Secretário e discutiu-se a proposição dos festejos

do 21 de abril. As duas últimas atas constantes no acervo datam de 1885 e em uma delas o

mês de realização da sessão está ilegível. No entanto, observamos alguns elementos que

permitem afirmar sua realização provável entre os meses de janeiro e março de 1885.28 Foi

feita a eleição e composta a comissão de festejos do 21 de abril; para orador foi eleito o sócio

Horácio de Carvalho; para redator do “Programa Republicano” foi eleito Nelson Tobias; e

para o estudo sobre a “Conjuração Mineira” foi eleito João Pinheiro. 29

E na última ata datada de 09 de agosto de 1885, além das propostas de sócios efetivos,

foi registrada a proposta de João Pinheiro e João Ribeiro “para que se nomeie uma comissão

para a revisão dos trabalhos dos anos anteriores e para apresentação de um plano de

propaganda no atual ano letivo.” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM). A comissão foi designada

pelo presidente composta pelos sócios João Pinheiro, João Ribeiro e João de Faria.

27 ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco de. Nasceu em São Gabriel, no Rio Grande do Sul, em 29/07/1857 e faleceu a 25/12/1938. Diplomou-se pela Faculdade de Direito de São Paulo, em 1882. Ainda estudante, influenciado pelo ambiente positivista, atuou no movimento republicano sendo redator de A República e A Evolução. Em 1881, publicou A República Federal. (http://www.cdpb.org.br/dic_bio_bibliografico_assis.html). É citado por ALONSO (2002) como Federalista e positivista, (p.346).

28 Presença de Gervásio Monteiro cujo falecimento foi comunicado na ata de 09 de ago.1885. Continuidade da organização da festividade de 21 de abril que foi proposta na reunião de 02 de out. de 1884. Ainda nesta reunião, Christiano Brazil propõe uma contribuição de cada sócio para os festejos - aprovada; João de Faria propõe que cada membro contribua para a publicação de “República Federal”, como acertado em reunião anterior - aprovada.

29 Os nomes de João Pinheiro e João Ribeiro aparecem associados em questões do clube referentes à propaganda republicana. A Revista Republicana 1885-1886 (existem quatro exemplares digitalizados na Hemeroteca BNDigital) circulou em São Paulo a partir de agosto de 1885 (data de publicação do primeiro número), e tem como Diretor João Ribeiro Júnior. João Pinheiro publicou um artigo intitulado 21 de Abril de 1792, na Revista Republicana, n. 2 e 3 (1885) que pode ser o trabalho apresentado no Club. Além deste artigo, outros são assinados ou se referem a membros do Club Republicano Mineiro, como Astolpho Dutra Nicacio, Arthur Ribeiro, Christiano Brazil, Alvaro Botelho.

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Estes são os excertos mais importantes das atas do Club Republicano Mineiro e neles

observamos elementos que sustentam nossa análise no que tange à existência de indícios de

que vigorava na agremiação uma tendência positivista, que havia um grupo que se organizava

em torno desta tendência e do qual fazia parte João Pinheiro.30 Ressalte-se ainda a difusão

da organização de clubes republicanos na província mineira a que o Club se dedicava e a

articulação das bases do PRM a partir destes clubes. Uma ação estratégica que culminou com

a fundação do partido em Minas Gerais.

Nesse contexto, entendemos que o jornal O Movimento, vinculado ao PRM foi parte da

estratégia pensada ao longo da existência do Club Republicano Mineiro e que se realizou com

o retorno de João Pinheiro à capital mineira, Ouro Preto, e a fundação do PRM. Uma breve

leitura das matérias deste jornal31 enuncia as relações estabelecidas com as cidades mineiras,

cidadãos, grupos, clubes, profissionais e escolas, além das adesões ao partido, as

conferências, as manifestações e os princípios norteadores da República imaginada. A

associação política destas relações se manifestaram ao longo das publicações, onde se revelou

a rede mineira de sustentação republicana.

Em seu número 01, no editorial, O Movimento foi apresentado como “a voz de um

partido que se eleva hoje na capital mineira para falar à província.” (O MOVIMENTO, 23

jan.1889, p.1). Ainda neste número, anuncia-se ter recebido “do Dr. Aristides de Araújo Maia

dois projetos, um da futura Constituição Federal dos Estados Brasileiros e outro da

constituição política do Estado Republicano Mineiro”, alertando que era um trabalho de

construção “que deve merecer o estudo de todos e que publicaremos oportunamente.” (O

MOVIMENTO, 23 jan. 1889, p.1). Esse fato evidencia mais uma preparação estratégica do

grupo republicano e positivista para a instalação do novo regime.32

João Pinheiro, principal Redator-Chefe do periódico, posteriormente foi sucedido por

outros como Edmundo Lins e Augusto de Lima que, neste contexto, se mostram ligados às

lideranças do grupo republicano e positivista mineiro. No número 68, datado de abril de

1890, no primeiro artigo intitulado “O Estado e a Igreja” foi apresentada a defesa da laicidade

do Estado decretada pelo governo provisório da República.

30 Observamos alguns elementos, embora poucos, traduziam-se às vezes por códigos, como por exemplo a forma com que Adalberto Ferraz se refere aos membros do clube em uma das sessões como os empregados do Club, “que todos os empregados que se retirarem de SP deveriam fazer ciente o Club de sua retirada.” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM).

31 O Movimento circulou no período de 23 de janeiro de 1889 a 1892. 32 Lembramos que Aristides Maia, diplomado em direito pela Faculdade de São Paulo em 1879, foi deputado

provincial e foi também, pelas suas ações, qualificado como adepto do positivismo por Ivan Lins (1967, p. 216)

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Já se tem demonstrado à saciedade, em toda longa discussão que precedeu a promulgação desta lei, que o Estado é incompetente para impor as crenças que devem ter os cidadãos. Essas devem ser incutidas pela educação familiar, pelo exemplo de seus sacerdotes, pela sublimidade de seus preceitos, que cimentarão de dia a dia a fé dos crentes, tornando-os verdadeiramente convencidos e tendo a consciência clara do que creem. (O MOVIMENTO, 03 abr. 1890, n. 68, p.1).

Ainda na defesa da laicidade do Estado, argumenta o artigo

O Estado não é ateu e nem perseguidor de crenças alheias. O que ele faz e o que lhe compete fazer é não obrigar ninguém a ter esta ou aquela crença. País extenso e rico como o nosso, que há de forçosamente abrigar filhos de todas as plagas do mundo, necessita ter aberta a senda para todas as liberdades, das quais são as mais nobres a liberdade de pensamento e a liberdade de crenças. (O MOVIMENTO, 03 abr. 1890, n. 68, p.1).

Outro artigo, assinado por Luiz Detsi33 e intitulado “A demonstração de princípios”,

explicita a relação entre a obra de Comte e o republicanismo mineiro.

Nos seus Opúsculos de filosofia social, Aug. Comte fez a separação entre os desejos e as opiniões. Quanto aos primeiros é competente a massa do povo: ele sente o mal e deseja portanto um estado melhor. É razoável, é natural, é necessário, segundo observa o eminente pensador, que todos os cidadãos tenham desejos políticos, porque todos têm interesse na marcha geral dos negócios públicos. É assim que diz mui judiciosamente o filósofo citado, que há muita gente que deseja sinceramente a liberdade e a paz, e que, ao mesmo tempo, tem uma ideia tão falsa sobre os meios próprios de alcança-los, que, se esses meios fossem postos em prática, trariam, ao contrário, a desordem e o arbítrio. (O MOVIMENTO, 03 abr.1890, n. 68, p.1).

O texto se desenvolve por meio de comparações, ressaltando os tipos de atitudes e

relacionando-as a matérias científicas. Por fim, fala sobre a República exortando a união dos

“bons republicanos” em nome da Pátria. Este artigo demonstrou os princípios morais

calcados no positivismo comtiano que orientou lideranças republicanas em Minas Gerais

ligadas ao Club Republicano Mineiro e a João Pinheiro. Além disso, o artigo reiterou a linha

editorial de O Movimento desde seu início, o que manifesta a anuência do grupo dirigente e

sua tendência positivista.

Se os caminhos da República em Minas remontaram aos Inconfidentes, seu traçado foi

definido em São Paulo, nos meandros das articulações do Club Republicano Mineiro, e sua

realização teve como cenário a antiga capital de Minas, Ouro Preto. Nesta cidade, palco da

Inconfidência e da República Mineira, identificamos as trajetórias de republicanos e

33 Republicano da Zona da Mata, aparece em algumas listas de candidatos a deputado tanto no jornal O Movimento no período analisado, quanto no jornal Correio de Minas, n. 186, de dezembro de 1896, Juiz de Fora.

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positivistas que ali atuaram. Esta pesquisa expõe, assim, parte das articulações positivistas

levantadas a partir da passagem de João Pinheiro pela EMOP até a história do Club

Republicano Mineiro ao qual Pinheiro se filiou depois de sua fundação, quando as evidências

positivistas no clube já constavam nas atas. No entanto, outros aspectos merecem ser

destacados na trajetória de João Pinheiro da Silva.

No ano de 1883, depois de seus estudos na Escola de Minas de Ouro Preto, João

Pinheiro ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo e em 1884 tornou-se zelador e

preparador de física e química, disciplinas então regidas pelo positivista Cypriano Carvalho

na Escola Normal de São Paulo. Segundo Barbosa (1980, p. 16), a contratação de João

Pinheiro foi proposta pelo próprio C. Carvalho, professor titular da cadeira. Neste mesmo

ano, em 25 de maio, Pinheiro filiou-se ao Club Republicano Mineiro. Em maio de 1885 foi

nomeado professor da Escola Normal de São Paulo em substituição ao professor Geraldino

Campista. Sua inscrição no Club Republicano Mineiro, colocou-o entre pares como,

Francisco Salles34, Francisco Barcellos35, Geraldino Campista, dentre outros.

Segundo Barbosa (1980), depois de formado (1887) João Pinheiro retornou a Ouro

Preto (1888) onde atuou como advogado com Francisco Barcellos, e organizou, junto com

outras lideranças o Congresso Republicano e o PRM em Minas (dos quais participou o

professor Leônidas Damázio). Pinheiro foi candidato a deputado provincial em outubro de

1889 e, proclamada a República, foi nomeado primeiro vice-governador, assumindo o

governo em fevereiro de 1890, com a saída de Cesário Alvim. Neste período em que governou

o estado, modificou o decreto referente à estatística, mudou a denominação da freguesia de

Curral del Rey para Belo Horizonte, criou a guarda republicana no estado, modificou a

cobrança de impostos de exportação e reorganizou a Diretoria da Fazenda do Estado. Outros

dois de seus atos neste breve período, foram relativos à criação de uma exposição

permanente de produtos naturais, agrícolas e industriais e a criação de um laboratório de

análises de terras anexo à Escola de Minas de Ouro Preto.

34 Francisco Salles, natural de Lavras do Funil, estudou no Seminário de Mariana, e concluiu em Ouro Preto, em 1881, os conhecimentos secundários e preparatórios. Nesse mesmo ano, iniciou o curso de Direito em São Paulo. (https://www.mg.gov.br/governomg/portal/c/governomg) bacharelou-se em Direito em 1886 (segundo a REVISTA da Faculdade de Direito de São Paulo, 1900, p. 235) e foi um dos fundadores do Club Republicano Mineiro (CLUBE REPUBLICANO MINEIRO, 1883. APM, Notação: PE-117, Coleção: Personalidades), no qual compôs, juntamente com Adalberto Ferraz em 1883, a “comissão para rever e publicar os estatutos, que devem reger a fundação dos Clubs em Minas” (DOSSIÊ relativo ao PRM, APM). Governou o Estado de Minas no período 07/09/1902 a 07/09/1906.

35 Francisco Barcellos, natural de Ouro Preto, bacharelou-se em Direito em 1888 (segundo a REVISTA da Faculdade de Direito de São Paulo, 1900, p. 236) e foi um dos fundadores do Club Republicano Mineiro (CLUBE REPUBLICANO MINEIRO, 1883. APM, Notação: PE-117, Coleção: Personalidades). Segundo Lins (1967, p. 216), foi secretário de João Pinheiro na Presidência de Minas e também positivista.

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Fez parte da Comissão dos 21, composta para estudo e encaminhamento do primeiro

projeto constitucional da república brasileira. Atuou como agente executivo na cidade de

Caeté, onde inaugurou a primeira Feira Municipal. Em 1903 coordenou o Congresso

Agrícola, Industrial e Comercial, convocado pelo então governador Francisco Salles. Tornou-

se candidato ao senado em 1905 e em 1906 candidatou-se e se elegeu à presidência do Estado

de Minas Gerais, o qual governou até 25 de outubro de 1908, data de sua morte. (BARBOSA,

1980)

Neste percurso, alguns elementos demonstraram as relações e ações de um grupo que

além de republicano, era positivista e cujo principal líder político se chamou João Pinheiro da

Silva. Este grupo, embora tivesse divergências, sustentou as ações da política no estado nos

anos iniciais da República, participando ativamente do governo mineiro em diferentes

instâncias. Das ações sustentadas e defendidas, a construção da nova capital, Belo Horizonte,

uma cidade cientificamente planejada,36 materializou uma experiência positivista no coração

de Minas Gerais.

Conclusões

As manifestações do positivismo em Minas Gerais tiveram lugar na então capital da

província, Ouro Preto, principalmente por meio das sociedades abolicionistas e dos

professores da Escola de Minas de Ouro Preto. Neste contexto, estudantes e professores

foram seus principais agentes.

A passagem de João Pinheiro pela EMOP, onde cursou o preparatório, deixou registros

em seus apontamentos de que os ensinamentos de Augusto Comte fizeram parte do curso de

Física, ministrado pelo professor positivista Leônidas Damázio. Além disso, este mesmo

professor, em 1888, fez parte tanto do Congresso Republicano Mineiro, quanto do PRM,

juntamente com Pinheiro e outros membros.

As matérias do jornal O Movimento reiteraram a perspectiva positivista do grupo

republicano que foi o principal articulador dos clubes republicanos em Minas Gerais e maior

responsável pela construção política da República no estado, como demonstraram as atas do

Club Republicano Mineiro.

As relações positivismo e educação, fundamento da obra comtiana, foram estabelecidas

da EMOP à Faculdade de Direito de São Paulo, como formação e como atuação política.

36 Segundo Monte-Mór (1994), “A ideologia da ordem e progresso foi expressa na sua configuração urbana, nas linhas e esquinas retas, rigidamente delimitadas (...)” (p.14). A estreita relação entre o cientificismo positivista e a política no panejamento e construção da capital mineira, é contemplada por Veiga (2002).

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Neste quesito, o Club Republicano Mineiro não só viabilizou a disseminação dos ideais

republicanos, como também fez a ponte para a concretização da República em Minas, onde a

expressão maior da influência positivista foi a construção da nova capital mineira, Belo

Horizonte. Assim, entre o Império e a República, políticos, professores, estudantes, e entre

eles, João Pinheiro da Silva, foram os atores que permitiram esta interpretação e a

compreensão dos desdobramentos tanto políticos quanto educacionais do positivismo em

terras mineiras.

Referências

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