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Bolshoi reabre restaurado País quer elevar nível educacional Depois de seis anos e muitos milhões de euros Reforma deve livrar Rús- sia de herança autoritária Página 03 Página 08 Planos frustrados de concorrência Aeroflot se expande com aquisições Página 06 SEGUNDA-FEIRA, 27 DE JUNHO DE 2011 NOTAS Um juiz da região sudoeste de Moscou de- terminou, no começo do mês, que o ativista de direitos humanos Oleg Orlov é inocente no caso de calúnia e difamação aberto por Ramzan Kadirov, presidente da República Russa da Tchetchênia. Orlov, que é presidente do grupo de direi- tos humanos Memorial, foi acusado de di- famação em julho do ano passado, depois de afirmar publicamente que Kadirov es- tava por trás da morte da ativista tchetche- na Natália Estemírova, ocorrida em 2009. Kadirov nega as acusações. Estemírova, 51, foi sequestrada em julho de 2009, em Grózni, capital da Tchetchênia. Seu corpo foi encontrado na vizinha Repú- blica da Inguchétia. Estemírova registrou centenas de casos de supostos abusos con- tra civis pela milícia sob controle de Kadirov. Orlov afirma que a decisão do tribunal re- presenta uma vitória da liberdade de ex- pressão. “Não é apenas uma vitória minha, é uma vitória para todos, para os jornalis- tas e para toda a sociedade civil, porque eu defendi no tribunal o direito de liberdade de expressão”, comemorou. Ria Nóvosti Presidente da Tchetchênia perde em caso de difamação Justiça Comissão independente inocenta advogado Em investigação histórica sobre a morte do advogado moscovita Serguêi Magnítski, comissão especial criada pelo Kremlin deve incriminar membros do Ministério do Interior e do FSB. Acusações contra Serguêi Magnítski foram fabricadas A reunião da Comissão Bra- sileiro-Russa de Alto Nível de Cooperação não foi das mais tranquilas. Realizada em Moscou no dia 17 de maio, a discussão girou fun- damentalmente em torno do endurecimento do Kremlin sobre as importações de carne brasileira. Desde 15 de junho, as im- portações de produtos de origem animal de 85 frigo- ríficos, dos Estados do Mato Grosso, Paraná e Rio Gran- Exportação Mais de 80 fornecedores brasileiros tiveram negócios com a Rússia suspensos desde 15 de junho Inovação Nos arredores de Moscou, centro reunirá pesquisa, educação e empresas de tecnologia Prazo dado pela Rússia para que frigoríficos brasileiros se regularizassem venceu em maio. A medida, entretanto, pode ser política, visando a um estímulo para a produção interna de carne. de do Sul foram suspensas por autoridadades russas. De acordo com o secretário do Rosselkhoznadzor (Ser- viço Federal de Vigilância Veterinária e Fitossanitária Carne brasileira sofre embargo Reunião de representan- tes dos paí- ses em maio não resolveu impasse VLADISLAV KUZMITCHOV GAZETA RUSSA acusações apresentadas foram fabricadas e de que funcioná- rios do Ministério do Interior e do FSB (Serviço de Segu- rança Federal da Rússia) foram, no mínimo, parcial- mente responsáveis pela morte de Magnítski na prisão de Bu- tirka, em Moscou, em novem- bro de 2009. O advogado representava a empresa britânica de fundo de investimentos Hermitage Capital em uma acusação de sonegação fiscal quando des- da Rússia), Aleksêi Aleksê- ienko, os brasileiros deve- riam ter resolvido, até o dia 20 de maio, irregularidades apontadas anteriormente pelo governo russo na pro- ção Mundial de Saúde (OMS). Em 2003, a Rússia introdu- ziu um sistema de cotas para países de fora da Comuni- dade dos Estados Indepen- dentes que define diferentes limites aos países exportadores. Para resolver o impasse, o chefe do Serviço Federal de Vigilância Sanitária e Ve- terinária da Rússia, Serguêi Dankvert, e o secretário de Defesa Agropecuária do Mi- nistério da Agricultura do Brasil, Francisco Sérgio Ferreira Jardim, reuniram- se no final de maio e deci- diram que o governo brasi- leiro conduzirá inspeções em todas as empresas bra- sileiras fornecedores de carne à Rússia. Advogado morreu na prisão depois de descobrir esquema de corrupção CONTINUA NA PÁGINA 5 A comissão independente for- mada para investigar o caso do advogado Serguêi Mag- nítski deu sinais de que as CONTINUA NA PÁGINA 5 para o projeto em fevereiro de 2010. “Não acho que de- vamos olhar para a moder- nização nos guiando por rí- gidos padrões de tempo”, disse o presidente à imprensa. ENTREVISTA NÔMADES Marcos Pontes Nenets Astronauta brasileiro volta à Rússia depois de cinco anos Tribo do norte do país pode estar com dias contados de- vido ao avanço da Gazprom ULTRANACIONALISMO Mortes em Moscou Quase dois anos depois, as- sassino de advogado e jorna- lista é condenado PÁGINA 2 PÁGINA 3 PÁGINA 4 GALINA MASTEROVA VLADÍMIR RUVINSKI GAZETA RUSSA CONTINUA NA PÁGINA 2 cobriu uma fraude de resti- tuição de imposto de US$ 230 milhões realizada, segundo ele, por um grupo corrupto de policiais e funcionários da ad- ministração pública russa. Depois da denúncia, ele mesmo foi acusado do crime, assim como outros seis advo- gados escalados pela Hermitage. Magnítski desenvolveu uma grave doença no pâncreas en- quanto esteve sob custódia, mas teve tratamento negado Mais de 800 jornalistas russos e es- trangeiros participaram da entrevista ALEKSANDR VOSTROV DMÍTRI RODIONOV ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Boa parte do centro de inovação de Skôlkovo ainda não saiu do papel, mas o “Vale do Silício russo” ainda é a menina dos olhos do presidente Medvedev. NESTA EDIÇÃO Skôlkovo, a cidade do futuro Durante os últimos meses, a palavra Skôlkovo tem sido o principal chavão na maioria das conversas sobre o progra- ma de modernização do Kre- mlin. Contudo, à parte a re- cém-inaugurada Faculdade de Administração de Moscou no local, grande parte do pro- jeto ainda não passa de um rascunho. Mas Rússia está le- vando a sério sua vontade de abrir as asas, e pretende am- pliar seu tradicional papel global de exportadora de ma- téria-prima e energia, tor- nando-se também um centro de desenvolvimento de alta tecnologia. dução e no manuseio da carne exportada para o país. De 2010 a 2011 foram des- cobertos 31 casos de impor- tação irregular do Brasil para a Rússia envolvendo problemas de documentação e uso de substâncias proibi- das no país. Além disso, os fornecedores deveriam apresentar à vigi- lância sanitária local garan- tias de cumprimento das normas. Os documentos, porém, não chegaram ao país no prazo estipulado, de acordo com o secretário. Durante a reunião, os repre- sentantes brasileiros decla- raram não concordar com o sistema de cotas de impor- tação de carne no país, prin- cipalmente por considerarem tais medidas contraditórias aos princípios da Organiza- Em um pequeno vilarejo cha- mado Skôlkovo, situado 20 quilômetros a oeste de Mos- cou, está sendo construído o que para alguns representa um grande salto tecnológico, uma releitura russa do Vale do Silício, na Califórnia. “Espero que o mundo intei- ro conheça esta marca não apenas como um local onde investidores devem aplicar dinheiro, mas pela força desse empreendimento no desen- volvimento”, disse o presiden- te russo Dmítri Medvedev em meados de maio, quando lá realizou um coletiva para mais de 800 jornalistas. Espera-se que mais de 40 mil pessoas vivam e trabalhem nos 3,6 quilômetros quadra- dos da “Innograd” (uma abre- viação russa para o termo “Cidade da Inovação”), que concentrará uma grande quantidade de empresas de alta tecnologia russas e, es- pera-se, multinacionais. Medvedev deu sinal verde apesar das constantes solici- tações po parte de seus advo- gados. Pai de dois filhos, ele morreu aos 37 anos, depois de passar 358 dias em prisão preventiva. No início, sua morte foi atri- buída a uma “ruptura da membrana abdominal” e, de- pois, a um ataque cardíaco. O ativista Oleg Orlov: inocente Publicado e distribuído com The New York Times (EUA), The Washington Post (EUA), The Daily Telegraph (Reino Unido), Le Figaro (França), La Repubblica (Itália), El País (Espanha), Folha de S.Paulo (Brasil), The Economic Times (Índia), Clarín (Argentina), Süddeutsche Zeitung (Alemanha), The Yomiuri Shimbun (Japão) e outros grandes diários internacionais ITAR-TASS WWW.SUKHOI.ORG RUSLAN SUKHUSHIN RIA NOVOSTI RIA NOVOSTI ALAMY/PHOTAS AP/FOTOLINK AP/FOTOLINK REUTERS/VOSTOCK-PHOTO

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Page 1: notas skôlkovo, a cidade do futuroe do FSB (Serviço de Segu-rança Federal da Rússia) foram, no mínimo, parcial - mente responsáveis pela morte de Magnítski na prisão de Bu

Bolshoi reabre restaurado

País quer elevar nível educacional

Depois de seis anos e muitos milhões de euros

Reforma deve livrar Rús-sia de herança autoritáriaPágina 03 Página 08

Planos frustrados de concorrênciaAeroflot se expande com aquisiçõesPágina 06

segunda-feira, 27 de junho de 2011

notas

Um juiz da região sudoeste de Moscou de-terminou, no começo do mês, que o ativista de direitos humanos Oleg Orlov é inocente no caso de calúnia e difamação aberto por Ramzan Kadirov, presidente da República Russa da Tchetchênia.Orlov, que é presidente do grupo de direi-tos humanos Memorial, foi acusado de di-famação em julho do ano passado, depois de afirmar publicamente que Kadirov es-tava por trás da morte da ativista tchetche-na Natália Estemírova, ocorrida em 2009. Kadirov nega as acusações. Estemírova, 51, foi sequestrada em julho de 2009, em Grózni, capital da Tchetchênia. Seu corpo foi encontrado na vizinha Repú-blica da Inguchétia. Estemírova registrou centenas de casos de supostos abusos con-tra civis pela milícia sob controle de Kadirov.Orlov afirma que a decisão do tribunal re-presenta uma vitória da liberdade de ex-pressão. “Não é apenas uma vitória minha, é uma vitória para todos, para os jornalis-tas e para toda a sociedade civil, porque eu defendi no tribunal o direito de liberdade de expressão”, comemorou.

ria nóvosti

Presidente da tchetchênia perde em caso de difamação

Justiça Comissão independente inocenta advogado

em investigação histórica sobre a morte do advogado moscovita serguêi Magnítski, comissão especial criada pelo Kremlin deve incriminar membros do Ministério do interior e do fsB.

Acusações contra Serguêi Magnítski foram fabricadas

A reunião da Comissão Bra-sileiro-Russa de Alto Nível de Cooperação não foi das mais tranquilas. Realizada em Moscou no dia 17 de maio, a discussão girou fun-damentalmente em torno do endurecimento do Kremlin sobre as importações de carne brasileira. Desde 15 de junho, as im-portações de produtos de origem animal de 85 frigo-ríficos, dos Estados do Mato Grosso, Paraná e Rio Gran-

exportação Mais de 80 fornecedores brasileiros tiveram negócios com a Rússia suspensos desde 15 de junho

inovação Nos arredores de Moscou, centro reunirá pesquisa, educação e empresas de tecnologia

Prazo dado pela rússia para que frigoríficos brasileiros se regularizassem venceu em maio. a medida, entretanto, pode ser política, visando a um estímulo para a produção interna de carne.

de do Sul foram suspensas por autoridadades russas. De acordo com o secretário do Rosselkhoznadzor (Ser-viço Federal de Vigilância Veterinária e Fitossanitária

Carne brasileira sofre embargo

reunião de representan-tes dos paí-ses em maio não resolveu impasse

vladislav KuzMitchovgazeta Russa

acusações apresentadas foram fabricadas e de que funcioná-rios do Ministério do Interior e do FSB (Serviço de Segu-rança Federal da Rússia) foram, no mínimo, parcial-mente responsáveis pela morte de Magnítski na prisão de Bu-tirka, em Moscou, em novem-bro de 2009.O advogado representava a empresa britânica de fundo de investimentos Hermitage Capital em uma acusação de sonegação fiscal quando des-

da Rússia), Aleksêi Aleksê-ienko, os brasileiros deve-riam ter resolvido, até o dia 20 de maio, irregularidades apontadas anteriormente pelo governo russo na pro-

ção Mundial de Saúde (OMS). Em 2003, a Rússia introdu-ziu um sistema de cotas para países de fora da Comuni-dade dos Estados Indepen-dentes que define diferentes l i m i t e s a o s p a í s e s exportadores.Para resolver o impasse, o chefe do Serviço Federal de Vigilância Sanitária e Ve-terinária da Rússia, Serguêi Dankvert, e o secretário de Defesa Agropecuária do Mi-nistério da Agricultura do Brasil, Francisco Sérgio Ferreira Jardim, reuniram-se no final de maio e deci-diram que o governo brasi-leiro conduzirá inspeções em todas as empresas bra-sileiras fornecedores de carne à Rússia.

advogado morreu na prisão depois de descobrir esquema de corrupção

continua na Página 5

A comissão independente for-mada para investigar o caso do advogado Serguêi Mag-nítski deu sinais de que as

continua na Página 5

para o projeto em fevereiro de 2010. “Não acho que de-vamos olhar para a moder-nização nos guiando por rí-gidos padrões de tempo”, d i s s e o pr e s id e nt e à imprensa.

entrevista

nôMades

Marcos Pontes

nenets

Astronauta brasileiro volta à Rússia depois de cinco anos

Tribo do norte do país pode estar com dias contados de-vido ao avanço da Gazprom

ultranacionalisMo

Mortes em MoscouQuase dois anos depois, as-sassino de advogado e jorna-lista é condenado

Página 2

Página 3

Página 4

galina Masterova vladÍMir ruvinsKigazeta Russa

continua na Página 2

cobriu uma fraude de resti-tuição de imposto de US$ 230 milhões realizada, segundo ele, por um grupo corrupto de policiais e funcionários da ad-ministração pública russa. Depois da denúncia, ele mesmo foi acusado do crime, assim como outros seis advo-gado s e sc a lado s pe la Hermitage.Magnítski desenvolveu uma grave doença no pâncreas en-quanto esteve sob custódia, mas teve tratamento negado

Mais de 800 jornalistas russos e es-trangeiros participaram da entrevista

aleKsandr vostrov dMÍtri rodionovespeCial paRa gazeta Russa

Boa parte do centro de inovação de skôlkovo ainda não saiu do papel, mas o “vale do silício russo” ainda é a menina dos olhos do presidente Medvedev.

nesta edição

skôlkovo, a cidade do futuro

Durante os últimos meses, a palavra Skôlkovo tem sido o principal chavão na maioria das conversas sobre o progra-ma de modernização do Kre-mlin. Contudo, à parte a re-cém-inaugurada Faculdade

de Administração de Moscou no local, grande parte do pro-jeto ainda não passa de um rascunho. Mas Rússia está le-vando a sério sua vontade de abrir as asas, e pretende am-pliar seu tradicional papel

global de exportadora de ma-téria-prima e energia, tor-nando-se também um centro de desenvolvimento de alta tecnologia.

dução e no manuseio da carne exportada para o país. De 2010 a 2011 foram des-cobertos 31 casos de impor-tação irregular do Brasil para a Rússia envolvendo problemas de documentação e uso de substâncias proibi-das no país. Além disso, os fornecedores deveriam apresentar à vigi-lância sanitária local garan-tias de cumprimento das normas. Os documentos, porém, não chegaram ao país no prazo estipulado, de acordo com o secretário.Durante a reunião, os repre-sentantes brasileiros decla-raram não concordar com o sistema de cotas de impor-tação de carne no país, prin-cipalmente por considerarem tais medidas contraditórias aos princípios da Organiza-

Em um pequeno vilarejo cha-mado Skôlkovo, situado 20 quilômetros a oeste de Mos-cou, está sendo construído o que para alguns representa um grande salto tecnológico, uma releitura russa do Vale do Silício, na Califórnia. “Espero que o mundo intei-ro conheça esta marca não apenas como um local onde investidores devem aplicar dinheiro, mas pela força desse empreendimento no desen-volvimento”, disse o presiden-te russo Dmítri Medvedev em meados de maio, quando lá realizou um coletiva para mais de 800 jornalistas.Espera-se que mais de 40 mil pessoas vivam e trabalhem nos 3,6 quilômetros quadra-dos da “Innograd” (uma abre-viação russa para o termo “Cidade da Inovação”), que concentrará uma grande quantidade de empresas de alta tecnologia russas e, es-pera-se, multinacionais. Medvedev deu sinal verde

apesar das constantes solici-tações po parte de seus advo-gados. Pai de dois filhos, ele morreu aos 37 anos, depois de passar 358 dias em prisão preventiva.

No início, sua morte foi atri-buída a uma “ruptura da membrana abdominal” e, de-pois, a um ataque cardíaco.

o ativista oleg orlov: inocente

Publicado e distribuído com The New York Times (EUA), The Washington Post (EUA), The Daily Telegraph (Reino Unido), Le Figaro (França), La Repubblica (Itália), El País (Espanha), Folha de S.Paulo (Brasil), The Economic Times (Índia), Clarín (Argentina), Süddeutsche Zeitung (Alemanha), The Yomiuri Shimbun (Japão) e outros grandes diários internacionais

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Gazeta Russawww.gazetarussa.com.brPolítica e sociedade

Pouco a pouco, as eleições de 2011-2012 na Rússia entram na pauta do dia. Nas últimas semanas, tanto o presidente Dmítri Medvedev quanto o primeiro-ministro Vladímir Pútin fizeram aparições pú-blicas que foram descritas por observadores políticos como os primeiros indícios da cam-panha eleitoral. No início de maio, durante um congresso do partido gover-nista Rússia Unida, Pútin anunciou a criação da Frente Popular da Rússia. Compos-ta por uniões de comércio, as-sociações empresariais, gru-pos juvenis e organizações não-governamentais – porém partidárias do Kremlin –, a organização tem o objetivo de aumentar a popularidade do partido, ampliando seu con-tato com a população.Logo após o anúncio do pri-meiro-ministro, Medvedev deu aos observadores motivos para acreditar em uma dis-córdia entre liberais e buro-cratas. “Entendo os motivos de um partido que queira

sucessão 2012 Partido Rússia Unida irá se definir entre presidente e primeiro-ministro para concorrer às eleições

enquanto outros partidos têm participação quase nula nas eleições, divergências recentes de medvedev e Pútin dão indícios de que a campanha já começou.

manter sua influência sobre a nação”, disse, recusando-se a apoiar a ideia. Medvedev também sugeriu que seu partido Rússia Unida não deve contar com uma vi-tória esmagadora em dezem-bro nas eleições da Duma (a câmara dos deputados da Rús-sia). “Nenhuma força política pode se considerar dominan-te. Pelo contrário, todas devem se esforçar para serem bem-sucedidas”, disse.

entrevistaMedvedev concedeu sua pri-meira grande entrevista co-letiva à imprensa em três anos de governo no dia 18 de maio, em Skôlkovo – a cidade nos arredores de Moscou apelida-da de “Vale do Silício russo” devido aos recentes projetos de inovação ali engendrados pelo presidente. Mais de 800 jornalistas com-pareceram ao evento, levan-tando questões que variaram da modernização econômica às eleições governamentais. Suas respostas foram no geral previsíveis, mas ele mostrou estar confortável e seguro.A coletiva aconteceu depois de uma reunião com oficiais da justiça em que o presiden-te mais uma vez ressaltou a necessidade de reformas e do fortalecimento do sistema ju-

diciário. Ele ainda anunciou um polêmico plano para li-vrar o governo e as empresas estatais de burocratas.

DistanciamentoAs ações de Medvedev são vistas como um distancia-mento de Pútin. Esse proces-so começou com críticas do presidente aos comentários do primeiro-ministro sobre as sentenças de prisão dos empresários Mikhail Kho-dorkóvski e Platon Lêbedev e depois ficou mais evidente nas divergências em relação à intervenção da Otan (Or-ganização do Tratado do Atlântico Norte) na Líbia.Segundo o analista Dmítri Orêchkin, o distanciamento das duas figuras é essencial para o desenvolvimento do país. “Esse é um acontecimen-to importante, que marca um passo de independência de Medvedev”, disse Orêchkin. Para aqueles que acreditam na divisão da bancada, a fren-te de Pútin seria sua tática para voltar à presidência. “Se eles criarem esse novo grupo, e não há motivos para pen-sarmos que não irão fazê-lo, então podemos dizer que Vla-dímir Pútin acabará nomea-do por essa ‘frente popular’, isto é, por todos os russos que desejam uma vida melhor”,

te Dmítri Medvedev poderá usá-la também. A nova plataforma tornará possível que ambos os candi-datos declarem ter apoio de uma parcela considerável da população, não somente de um partido e de seus eleitores”, disse Svanidze ao canal esta-tal Russia Today.Quem quer que sejam os can-didatos à presidência da Rús-sia, em 2012 os políticos de-verão dar mais atenção à sociedade do que nunca. De acordo com uma pesquisa de abril do Centro Levada, 75% dos russos se interessam por política. No entanto, 83% dos entrevistados acreditam que os políticos trabalham apenas em prol de seus próprios in-teresses, ignorando as neces-sidades dos eleitores.

acredita o cientista político Grigóri Gólosov. Para o editor-chefe da esta-ção de rádio Ekho-Moskvi, Aleksêi Venediktov, a criação da frente é uma afirmação da vontade política do primeiro-ministro. “Essa história nos mostra mais uma vez que Pútin certamente não recusa um terceiro mandado presi-dencial”, disse ele à BBC. Há também os que acreditam na união do partido e afir-mam que as recentes decla-

rações dão a Pútin e a Med-vedev a opor tun idade de reiterar suas personalida-de s d i s t i nt a s , p or é m complementares. Sob esse prisma, Medvedev seria o “modernista” e Pútin o “tradicional” – e juntos eles poderiam atrair os votos de uma população russa cada vez mais dividida.“Como antes, Pútin e Med-vedev tendem a ocupar dife-rentes nichos políticos”, disse o analista independente Sta-

nislav Belkôvski à agência de notícias Interfax. “Ambos continuam em busca de uma causa comum”, afirma.O político de oposição Vla-dímir Rijkov chegou a suge-rir que a iniciativa da Fren-te Popular tinha, na verdade, a intenção de cercar a ban-cada. “Ele [Pútin] está ten-tando minar o apoio da ban-cada e do ‘partido no poder’”, escreveu Rijkov em um arti-go opinativo no diário russo The Moscow Times.Para o comentarista televisi-vo Nikolai Svanidze, isso não significa necessariamente que Pútin irá se eleger no próxi-mo ano. “Acredito que a ban-cada ainda não decidiu quem irá concorrer nas eleições pre-sidenciais e, se essa frente for constituída, o atual presiden-

medvedev ou Pútin. Quem é o candidato?

com personalidades distintas, medvedev (o moderno) e Pútin (o tradicional) podem atrair eleitores de perfis distintos

Das agências De notícias

Recentes divergências podem ser mostras de atrito ou reiteração de papéis diferentes

Frente criada por Pútin une ONGs e associações para ampliar base de apoio ao partido

Durante sua audiência no Tribunal de Moscou, Nikita Tíkhonov, 30 anos, e Evguê-nia Khassis, 25, estavam de mãos dadas e sorriam. Mas o clima tranquilo deles não condizia com a sentença.Tíkhonov foi condenado à prisão perpétua pelo assas-sinato do advogado Stanis-lav Markelov e da jornalista Anastassia Babúrova, da Nôvaia Gazeta. Khassis, como cúmplice, deve ficar na prisão por 18 anos. A sen-tença foi decretada dois meses após o início da investigação.Markelov e Babúrova foram mortos a tiros no centro de Moscou no dia 19 de janeiro de 2009. Na última década, Markelov tinha aberto ações judiciais contra diversas pessoas in f luentes de diferentes regiões da Rússia, incluindo a República da Tchetchênia. A versão da acusação é que os criminosos, partidários de um grupo de extrema direi-ta, atuaram por convicção.

Justiça Ultranacionalista é condenato por autoria dos disparos contra Anastassia Babúrova e o advogado Stanislav Markelov

Jornalista e advogado foram executados no centro de moscou em janeiro de 2009, em plena luz do dia. apesar das evidências, dupla de autores nega culpa.

Na sentença, o juiz afirmou que os casal cometeu crime de ódio e que os dois estavam confiantes de “sua própria superioridade”. Tanto Tíkho-nov quanto Khassis negaram participação no caso.De acordo com os investiga-dores, Khassis teria mantido as vítimas na calçada, ao mesmo tempo em que fazia sinais a Tíkhonov para que se aproximasse. O parceiro teria dado dois tiros na nuca de Markelov. Babúrova, que aparentemente tentou impe-dir a fuga do assassino, levou um tiro no rosto.Enquanto a imprensa e or-ganizações de defesa dos di-reitos humanos justificavam a morte de Markelov como uma possível vingança, a in-vestigação se voltou às orga-nizações nacionalistas. Em 2006, Markelov se enga-jou em um caso de assassi-nato de um antifascista no qual Tíkhonov figurava como um dos suspeitos.

nacionalismoAinda universitário, voltan-do de uma viagem pela Sér-via, Tíkhonov fundou, com o colega Iliá Goriatchev, a re-vista Rúski Obraz. Em 2007, a publicação trans-formou-se em uma das mais bem-sucedidas organizações nacionalistas do país, com

Prisão perpétua para assassino de jornalista

moscovitas pedem justiça pela morte da jornalista babúrova e do advogado markelov tíkhonov e a cúmplice Khassis sorriem durante a audiência

tino KünzeleSPeciAl PARA GAzetA RUSSA

As descobertas feitas pela co-missão independente criada pelo presidente russo Dmítri Medvedev foram divulgadas em um relatório preliminar que vazou no jornal Vedomos-ti, e depois foram confirma-das por membros da própria comissão.Kirill Kabanov, chefe do Co-mitê Nacional Anticorrupção, afirma que a pressão tem sido implacável. “Muitos oficiais bastante conhecidos na polí-tica declararam abertamente não dar a mínima para nossa

Advogado apontou policiais como corruptoscontinuação Da Página 1

cerca de 2 mil afiliados. Já como membro da organiza-ção, ele vivia do comércio ile-gal de armas.Em outubro de 2009, depois-de ser monitorado por seis meses pelo serviço de segu-rança, o casal foi preso no apartamento em que mora-va. Ali também foi encontra-da a arma do crime.Radicais de ultradireita deram declarações contra Tíkhonov, testemunhas o identificaram como o assas-sino e e ele por fim confessou o crime. Mais tarde, porém, a pedido dos advogados de defesa, disse que fora força-do a escrever sua confissão.

comentário

crime nacionalista foi ideológico, não racial

A sentença decretada aos na-cionalistas no assassinato de Markelov e Babúrova cria-rá um precedente em alguns casos: na Rússia, crimes com motivos nacionalistas não são raros. Mas esse assassinato, especi-ficamente, virou um caso raro,

liudmila aleksêievadeFeNSORA

dOS diReitOS hUMANOS

já que nacionalistas mataram russos por questões puramen-te ideológicas, e não raciais, como é de praxe.Markelov foi defensor dos di-reitos humanos, e não um ad-vogado de direitos humanos: ele era mais ativista que ad-vogado, e assim aceitava al-guns casos sem requerer ho-norários.A investigação da morte de Markelov e Babúrova ocorreu

investigação”, diz Kabanov. “O serviço de segurança não está pronto para entregar seus funcionários, em parte por-que eles sabem demais e po-deriam comprometer diversas pessoas. Além de haver muito dinheiro em jogo.”

Demissão de carcereiros“Quando Serguêi Magnítski testemunhou contra os poli-ciais, os mesmos oficiais esti-pularam sua prisão preventi-va, o torturam e mataram”, disse de Londres à Gazeta Russa o diretor-executivo do Hermitage Capital, William

Browder, em entrevista por telefone. Os funcionários da peniten-ciária Butirka foram demiti-dos. Porém, não houve prisões ou investigação policial dire-ta dos funcionários acusados de corrupção. A companhia gastou enormes quantias numa investigação dos funcionários envolvidos na suposta fraude fiscal, e pu-blicou uma série de vídeos do-cumentando as compras mi-lionárias de uma funcionária cujo salário, somado ao do ma-rido, não ultrapassava US$ 38 mil ao ano.

Alguns dias depois do vaza-mento do relatório encomen-dado pelo governo, o tribunal decretou a prisão do executi-vo-sênior do Hermitage, Ivan Tcherkasov.Em maio de 2011, o advogado Tcherkasov acusou o investi-gador do caso, o tenente-co-ronel Oleg Síltchenko, de fa-bricar acusações contra Magnítski. Em resposta, foi condenado por evasão de US$ 73 milhões em impostos. Exi-lado na Inglaterra, o executi-vo não assistiu à sentença e declarou não pretender cum-prir a pena.

como se desenrolou o caso magnítski-Hermitagenovembro de 2005. William Browder, diretor-executivo do fundo de investimentos britâni-co Hermitage Capital, tem sua entrada negada na Rússia e é deportado.Junho de 2007. As companhias afiliadas à Hermitage Capital são acusadas de evasão fiscal e no mesmo dia é realizada uma busca no escritório russo da companhia britânica.outubro de 2007. O Hermitage

Capital escala Serguei Magnítski, do Firestone Duncan, e outros seis advogados de diferentes es-critórios para defender o caso.novembro de 2007. O Hermita-ge é condenado por um supos-to desvio de 500 milhões de ru-blos (R$ 28,5 milhões). outubro de 2008. Depois de-descobrir uma fraude de res-tituição de imposto de 5,4 bilhões de rublos (R$ 307 mi-lhões) perpetrada por altos ofi-

ciais do governo, Magnítski é detido preventivamente. Os ou-tros seis advogados designados pelo Hermitage se exilam na In-glaterra. Magnítski passa 358 dias na prisão, onde faz 450 queixas formais. Seus pedidos de tra-tamento médicos são nega-dos pelo investigador Oleg Síl-tchenko- e Magnítski morre, aos 37 anos, em novembro de 2009.

de modo muito profissional. Foi feito um grande traba-lho e o júri condenou os in-fratores com o máximo rigor da lei. No entanto, o assassinato não foi político, mas ideológico. A maioria dos assassinatos contra ativistas dos direitos humanos e jornalistas na Rús-sia é cometida por criminosos iniciados em um nível político mais elevado, como mostrado

por numerosas investigações, entre elas algumas da Nôvaia Gazeta, jornal em que Ba-búrova trabalhava. Há pelo menos uma mudança para melhor: o assassinato do advogado e da jornalista pro-vocou uma enorme censura popular e desaprovação. Agora as autoridades já estão bastante cautelosas devido à posição mais ativa da popula-ção na sociedade.

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Gazeta Russawww.gazetarussa.com.br Política e sociedade

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notas

O Serviço Federal de Vigi-lância Veterinária e Fitos-sanitária da Rússia introdu-ziu restrições temporárias à importação de produtos agrí-colas de produtores locali-zados em 14 países, a maio-ria europeus.Um anúncio no site do órgão alertava: “Como resultado do monitoramento do pri-meiro semestre de 2011, foi intensificado o controle de negociações com 64 empre-sas, localizadas em 21 paí-ses do mundo. Proibiu-se temporariamente as impor-tações para Rússia de dez empresas alemãs, cinco bel-gas, duas espanholas, uma holandesa e uma sueca”. Até o fechamento desta edi-ção, 37 pessoas haviam mor-rido vítimas da bactéria Es-cherichia coli em países da União Europeia.

Kommersant

A Microsoft será patrocina-dora oficial dos Jogos Olím-picos de Inverno de 2014, que vão acontecer na cidade de Sôtchi, sul da Rússia. A em-presa apresentou ao comitê um pacote completo de softwares de programação, serviço de suporte e acesso ao centro tecnológico da companhia. “O acordo é par-ticularmente valioso porque a Microsoft teve uma expe-riência única na colaboração com o Comitê de Organiza-ção dos Jogos em Pequim”, disse Dmítri Tchernitchenko, presidente do Comitê de Or-ganização Sôtchi-2014. O acordo foi assinado em 16 de junho.

ria-nóvosti

rússia veta importação de alimentos de 14 países

microsoft vai patrocinar as olimpíadas de Inverno 2014

Dois mini-submarinos rus-sos tripulados, o Mir-1 e o Mir-2, fizeram em meados desse mês a primeira incur-são ao fundo do lago de Ge-nebra (Suíça), o segundo maior da Europa Central. Em suas margens, vivem 1,5 milhão de pessoas, metade das quais retira de lá sua água potável.O cientista russo Anatóli Sa-galevitch, o mergulhador americano Don Walsh e o ba-lonista suíço Bertrand Pic-card ocuparam o Mir-1, en-quanto o Mir-2 foi controlado por Evguêni Tcherniaev. O vice-presidente da Socie-dade Geográfica Russa e de-putado estadual da Duma (a Câmara dos Deputados russa) Artur Tchilingarov e o cônsul honorário da Rús-sia em Lausanne, Frederik Paulsen, também estavam na tripulação. Os veículos devem realizar estudos cien-tíficos, colher amostras de solo para análises químicas e biológicas, identificar con-taminações. Novo mergulho deve ocorrer em agosto. Itar-tass

submarinos mir descem ao fundo do lago de genebra

como é sua relação com os cosmonautas? Eu tive um contato muito bom com eles, e, de forma geral, com todos na Rússia. Aliás, eu tive a impressão, na época em que eu estava lá, de que fui mais bem tratado que qualquer astronauta de outra nacionalidade ali. Foi muito bom esse contato. Eu estudei um pouquinho de russo, o necessário para ver os checklists, o painel, enten-der o controle. E isso me aju-dou a ter contato com o pes-soal de forma geral, tanto no centro de preparação quanto com as pessoas que o visita-vam. Fazia questão de estar ali com eles em todo momen-to livre que eu tinha.

Você já retornou à rússia?Só recentemente, cinco anos depois. Eu fui para lá convi-dado pela Roscosmos (Agên-cia Espacial Federal Russa) para as comemorações dos 50 anos do voo de Iúri Gagárin.Participei de dois dias de eventos, e foi muito bom rever o pessoal. Eu tenho, para falar a verdade, uma sauda-de muito grande.

como foi o reencontro com a equipe que viajou com você em 1996 [o cosmonauta Pável Vinogradov e o astronauta Jeffrey williams]?Tenho contato com Jeffrey em Houston [nos Estados Unidos]. Também tinha encontrado o Pável aqui no Brasil, quando ele veio em 2007.Lá de cima, a gente olhava o Brasil passando, eu ficava fa-

lando: “lá é tal lugar, lá é tal lugar!” Eles ficaram curiosos. Então, quando todos voltaram da missão, liguei para eles e perguntei: “E aí, querem co-nhecer o Brasil agora?” O Pável e o [cosmonauta] Oleg [Kotov] vieram. Foram a São Paulo, a Bauru, que é minha terra, a Pirassununga, a São José dos Campos, ao Rio de Janeiro.

agora que você está baseado em Houston, como seu traba-lho será afetado pela freada que os estados unidos deram no programa espacial?O programa continua. O que está parando agora em julho, ou um pouco depois, são os voos de ônibus espacial. O Discovery já parou, o En-devour fez a última missão esse mês, o Atlantis voa em

julho e aí para. O programa da Lua, pelo que fui informa-do, também foi cancelado. Mas os outros programas con-tinuam. A Nasa, o programa Constelação, que envolve a fa-bricação de dois foguetes, a operação da estação espacial, a exploração de Marte conti-nuam. Minha função é ficar à disposição do programa es-pacial brasileiro para outras missões.Eu gostaria que me escalas-sem rápido, mas com a para-da dos ônibus espaciais as pro-babilidades diminuem. Ao mesmo tempo, eu também tenho que observar o que acontece no projeto espacial americano e ficar de olho no que pode aparecer de interes-sante, tanto no setor público, quanto no privado, para as empresas brasileiras.

Você considera isso uma oportunidade para estreitar os laços entre cosmonautas e astronautas?Acho que é uma comprovação desses laços, que foram estrei-tados a partir a década de 1970, quando começou a haver esses contatos no espaço. A estação espacial, aliás, é uma demonstração clara de que a gente tem capacidade de trabalhar com culturas di-

ferentes. Muitas vezes, lá do espaço quando você olha para a Terra, fica imaginando que aqui tem tanta discriminação, tanta divisão... Um país aqui, um país ali. Tem fronteiras, tem guerra, tem tudo isso. E, ali em cima, a gente consegue trabalhar com culturas dife-rentes e ideias diferentes. Todos juntos, trabalhando pela solução dos mesmos problemas.

Estação espacial é prova de amizade entre nações

Pontes visitou moscou no cinquentenário do voo de gagárin

marIna darmarosGazeta russa

entreVIsta Marcos Pontes

PriMeiro astronauta brasileiro volta à rússia 5 anos dePois

Uma incrível versão da ori-gem do homem tirada de um livro recentemente aprovado para alunos da 5ª série levou alguns pais a escreverem uma carta ao presidente Dmítri Medvedev, reclaman-do da incompetência do Mi-nistério da Educação na Rússia.O texto dizia: “Ao longo dos anos, os macacos se aventu-raram na água cada vez mais e mais, cada vez mais longe da praia e aprenderam como nadar e mergulhar atrás de comida. Eles desenvolveram uma postura ereta. Por algu-ma razão ainda desconheci-da, alguns macacos continu-aram seus meios de vida na terra, enquanto outros se tor-naram tão adaptados à vida no mar que permaneceram lá

reforma Metas incluem novo currículo e salário melhor

para sempre e se transforma-ram em golfinhos.”O episódio chocou pais e pro-fessores, mas não chegou a surpreender. Além da idade avançada dos professores, a falta de recursos está contri-buindo para a deterioração das escolas russas. “Alguns temas dúbios foram incluídos recentemente no currículo, e essa baboseira toma tempo das disciplinas principais. Não é nenhum as-sombro que a qualidade da educação esteja caindo”, la-menta o professor de língua russa Serguei Ráiski. Ráiski, de 41 anos, é conside-rado jovem entre seus colegas, cuja média de idade é de 48 anos. Um em cada cinco pro-fessores já passou da hora de se aposentar, e devido aos bai-xos salários, em torno de R$ 770 por mês, os jovens não querem enveredar pela profissão.O sistema de ensino de lín-guas estrangeiras também está ultrapassado. Na maio-ria das escolas públicas, os

alunos estudam uma língua, geralmente o inglês e ocasio-nalmente o alemão, duas vezes por semana, e só aprendem decorando. A conversação, se-gundo os críticos, é deixada de lado. “Nos últimos anos, nossas escolas têm oferecido apenas conhecimento, e não educação”, diz o conselheiro para assuntos educacionais Aleksandr Kondakov. Os exames do Programa In-ternacional de Avaliação dos Alunos (Pisa), consequente-mente, colocaram a Rússia, um território antes conheci-do por suas façanhas educa-cionais, em 43º lugar entre os 65 países de todo o mundo avaliados. Aplicado a cada três anos e divulgado pela Orga-nização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OECD), o exame de 2009 dei-xou o Brasil em 53º na lista.

mudanças futurasOs pais russos sabem bem que as crianças em escolas priva-das levam muita vantagem sobre aquelas que frequentam

escolas públicas sem recursos, assim como acontece no Bra-sil. Para tentar diminuir um pouco esse abismo, o governo pretende introduzir práticas das escolas particulares na rede do Estado e prepara uma reforma escolar em grande es-cala, visando ao aprendizado individual. As reformas nas escolas do en-sino fundamental estão pre-vistas para começar em se-tembro. Algumas aulas, por exemplo, serão realizadas fora da sala, em dez horas sema-nais de passeios, caminhadas e trabalhos criativos em es-paços culturais. Além disso,

o governo prometeu um au-mento de 30% nos salários dos professores já para este ano. As reformas no ensino médio, porém, ainda estão em fase de elaboração. “A escola terá mais poder de decisão para formar seu pró-prio currículo de acordo com o desejo dos estudantes”, afir-ma Irina Abânkina, diretora do Instituto de Estudos Edu-cacionais da Universidade de Pesquisa Nacional Russa.O estudante, que poderá es-colher seis temas adicionais e decidir se quer estudá-los em um nível básico ou profissio-nal, precisará passar em pelo

menos quatro matérias no Exame Unificado Estadual, que foi introduzido em 2009 para definir as admissões universitárias.

Herança autoritáriaAs inovações foram desenvol-vidas para levar à Rússia um sistema educacional na linha do modelo europeu. Mas nem todos os pais aprovaram. Houve quem se indignasse com as mudanças temendo o fim da educação clássica. Em dezembro, um grupo de na-cionalistas chegou a ir ao cen-tro de Moscou para encenar um protesto contra a reforma na educação.Segundo o conselheiro Kon-dakov, após o colapso da União Soviética um novo pen-samento foi adotado, mas o sistema de ensino permane-ceu: alunos ouvem palestras, não discordam dos professo-res e qualquer tipo de debate dentro da sala de aula é visto como rude. “A escola é menos autoritária que a soviética, mas não existe um modelo de parceria de ensino, de igual-dade entre professor e aluno. O professor perdeu autorida-de e tenta usar da severida-de”, ressalta. “Ainda temos muito a aprender sobre como organizar um trabalho de equipe na sala de aula, no qual o interesse no aprendizado e no ensino seja recíproco.”

educação tenta se livrar dos métodos soviéticos

alunos russos não são incentivados a debater em sala de aula

com resultados ruins no exame internacional de ensino, a rússia quer se livrar de herança autoritária e elevar o nível da educação.

alesIa lonsKaIaesPecial Para Gazeta russa

como funciona o ensino na rússia a lista de espera do jardim de infânciaPor lei, as escolas e o material escolar são gratuitos na Rús-sia. Os pais devem pagar ape-nas pelo uniforme e pelas re-feições. Isso se aplica a 48.809 escolas regidas pelo Estado – as privadas somam um número muito menor, totalizando 665. As crianças começam a estu-dar aos 7 anos de idade e o ano escolar vai de 1º de setem-bro a maio do ano seguinte, com férias curtas no inverno, no outono e na primavera, e durante todo o verão. Para passarem de ano, os alu-nos fazem testes e, após o 1º

Russos que planejem ter filhos já deviam inscrevê-los na pré-escola agora mesmo.A queda da taxa de natalidade em quase 50% nos anos 1990 levou ao fechamento de mais de 600 jardins de infância no país. Agora, quando os prédios escolares estão sendo vendi-dos ou repassados a outros ór-gãos estatais, a taxa de natali-dade voltou a crescer.Como resultado, não há vagas nas pré-escolas públicas para mais de 1 milhão de crianças, mesmo que a educação primá-ria seja direito de todos. Para

ano de ensino médio, são sub-metidos ao Exame Unificado Estadual, com provas de ma-temática e duas matérias a es-colher, cujos resultados são utilizados para definir sua ad-missão na universidade.

inscrever uma criança na pré-escola, os pais são forçados a pagar matrículas que variam de R$ 2,3 mil a R$ 5,7 mil.Das crianças de 2 a 6 anos de idade, 60% estão matriculadas em um total de 45,3 mil pré-escolas mantidas pelo Estado.De acordo com a lei russa, os jardins de infância são separa-dos das escolas, e a participa-ção não é obrigatória. O número de pré-escolas pri-vadas é desconhecido devi-do à incerteza gerada em tor-no de seu status legal: existem jardins de infância familiares,

criados quando um grupo de pais organiza uma cooperação não comercial, e existem os empreendedores privados, que agora podem se organizar sem obter uma licença. Em algumas regiões, os pais que não conseguiram matri-cular seus filhos na pré-esco-la recebem uma compensação mensal. Na região de Perm, por exemplo, o valor é de R$ 303. É claro que isso não é o suficiente para pagar uma escola privada, cujas mensali-dades custam em média R$ 980 por mês.

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GAZETA RUSSAWWW.GAZETARUSSA.COM.BRPolítica e Sociedade

Imigração Em constante queda demográfica, Rússia precisa cada vez mais de mão de obra imigrante para os postos de trabalho

Cidadãos provenientes das ex-repúblicas soviéticas na Ásia Central devem ter situação legalizada mais facilmente no país.

O Serviço de Imigração Fe-deral (SIF) estima que cerca de 1,7 milhão de estrangeiros entrarão na Rússia para tra-balhar legalmente em 2011, e que pelo menos outros três ou quatro milhões já estão tra-balhando no país sem docu-mentos o� ciais. Não é difícil achar esses novos imigrantes. Eles são jovens que tiram a neve das ruas ou recolhem o lixo, constroem os novos e mo-dernos arranha-céus ou ven-dem produtos no mercado, limpam banheiros públicos e calçadas e empurram carri-nhos de comida nos parques das cidades.Bakhid Asilbekulu, 21, veio de Osh, no Quirquistão, para trabalhar como faxineiro em um mercado de Moscou por 15 mil rublos (R$ 852) men-sais. Ele divide um quarto com mais de uma dúzia de com-patriotas em um albergue pró-

ximo ao local onde trabalha. Bakhid, que em russo se au-tointitulou Boria, planeja re-tornar para o Quirquistão em dezembro e, se o dinheiro que acumular até lá não for su� -ciente, já tem planos de voltar à capital russa.O boom da emigração nas ex-repúblicas soviéticas, espe-cialmente na Ásia Central, co-meça com a pobreza que assola essas regiões, mas ganha força com a enorme atratividade do

crescente mercado russo, que demanda cada vez mais tra-balho, especialmente nos grandes centros urbanos como Moscou.Os imigrantes vindos das ex-repúblicas não precisam de visto para trabalhar na Rús-sia, mas disputam com mi-lhões um trabalho no país, seja legal ou ilegal. Mesmo assim, a necessidade de mão de obra

não deve acabar tão cedo e até as grandes empresas russas correram para garantir parte desses trabalhadores. “Todos os anos, a Rússia perde um milhão de cidadãos economi-camente ativos”, ressalta Lidia Gráfova, defensora de direi-tos humanos e conselheira de uma comissão do governo que trata de assuntos ligados à imigração.Segundo Viatcheslav Postav-nin, ex-vice-diretor do SIF e atual presidente do Fundo de Imigração Século 21, um grupo de defesa dos imigran-tes, a economia russa vai pre-cisar de mais 30 milhões de imigrantes até 2030.No ano passado, o presidente russo Dmítri Medvedev já havia alterado as regras de visto do país para permitir que pro� ssionais altamente quali� cados e suas famílias entrem na Rússia com mais facilidade. Mesmo assim, os o� ciais estimam que a medi-da irá atrair apenas cerca de metade dos emigrantes qua-li� cados necessários.Agora, o SIF anunciou que planeja facilitar o processo de imigração, aumentar o núme-

ro de residentes legais e abrir o caminho para cidadania àqueles que quiserem ter a Rússia como lar. O diretor da agência de imi-gração, Konstantin Romodá-novski, também a� rmou que quer acabar com a corrupção, já que os imigrantes são ge-ralmente forçados a pagar su-bornos para conseguir driblar o burocrático processo de le-

galização no país. “Hoje, é di-fícil dar continuidade ao pro-cesso sem pagar propina”, ressaltou Gráfova. Outra medida que vem sendo considerada é a abertura do serviço de concessão de vis-tos na estação Kazánski de Moscou, por onde chegam os trens vindo da Ásia Central. Ali, os imigrantes poderiam imediatamente obter a per-

Nova classe trabalhadora do país é estrangeira

GALINA MASTEROVAESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

" Não temos deputados para falar em nosso nome, nenhum oligarca

que nos dê dinheiro.”

FRASE

LenaSartetoREPRESENTANTE

DO POVO NENETS

Nenets Últimas famílias de grupo nômade do norte da Rússia temem sedentarização enquanto Gazprom inicia operações em seu território

As mãos ásperas e inchadas de Lena Sarteto revelam um turbilhão de atividades. En-quanto a água ferve sobre o fogo no centro de sua tenda, ela cozinha um banquete para sua família e para os convi-dados. Sarteto está com pres-sa. Em poucas horas, seu pe-queno grupo nômade do oeste da Sibéria, constituído por aproximadamente dez famí-lias da população indígena dos nenets, irá se locomover em direção ao norte.É o início do verão polar e, aproveitando a luz quase con-tínua, a chamada Brigada Nú-mero 5, título o� cial recebido pelo grupo durante os tempos soviéticos, levará o rebanho de 3 mil renas até as margens do mar de Kara. O plano é chegar ao Círculo Ártico em agosto. Depois, quando fugi-rem do frio cortante e retor-narem ao oeste, os nenets tra-rão novamente suas renas à grama e ao musgo da aque-cedora tundra.É um ciclo antigo, que vem sendo cada vez mais ameaça-do pelo avanço da Gazprom sobre a península de Iamal. À medida que a gigante russa da energia e maior exporta-dora de gás natural do mundo

se aproxima da península com suas estradas, ferrovias, ga-sodutos e poços de explora-ção, vai transformando a pai-sagem da tundra russa.Fica cada vez mais evidente o perigo que ela representa para a terra dos nenets. “Os peixes têm um sabor forte, sentimos enjoo após tomar-mos água dos lagos. Nossas renas � cam enroscadas nos arames e pulam os gasodutos, quebram as pernas e morrem”, conta Sarteto. “Somos a últi-ma geração a levar uma vida nômade. Nossos � lhos vive-rão em cidades, sem a tundra em suas vidas”, lamenta.

Campo de gásNa península de Iamal, en-contra-se o campo de gás Bo-vanénkovo, uma vasta área com quase 5 trilhões de me-tros cúbicos de gás natural que a Gazprom deve começar a bombear no próximo ano. Torres de perfuração come-çaram a pontuar o horizonte e, para ajudar na exploração das fontes de gás, uma nova ferrovia de 520 quilômetros de extensão foi inaugurada no ano passado.Para muitos dos 13 mil nôma-des que ainda vivem na pe-nínsula de Iamal, a grande ameaça é serem forçados a � car em assentamentos per-manentes, uma mudança no estilo de vida do grupo que vem sendo estimulada pelo governo do país. Essa não é a primeira amea-

ça ao modo de vida dos ne-nets. Na época da União So-viética, eles foram obrigados a exercer uma espécie de cria-ção coletiva. As tribos foram divididas em brigadas e for-çadas a pagar impostos pela carne de rena. Milhares se mu-daram para cidades da Sibé-ria, e os nenets precisaram lutar para manter as suas tradições. “Somos um povo pequeno”, diz Iezingi Hatiako, 61 anos.

“Não temos deputados para falar em nosso nome no par-lamento, nenhum oligarca que nos dê dinheiro para nossa de-fesa legal”, completa.Para Andrêi Tepliakov, por-ta-voz da Gazprom para a operação de Iamal, é difícil entender essa postura. “Não importa o quanto tentamos ajudá-los – oferecendo trans-porte, pagando salários pelo que historicamente � zeram de graça, construindo pontes

sobre os gasodutos ou escolas e creches para os seus � lhos – os nenets reclamam do mesmo jeito”, diz.Lena e seu marido, por exem-plo, recebem aproximadamen-te US$ 2,5 mil por mês, uma quantia bastante razoável nessa região da Rússia. Todo verão, os helicópteros da Gazprom sobrevoam os acam-pamentos nômades para bus-car mais de 2 mil crianças ne-nets e levá-las a colégios

Cerca de 13 mil representantes da etnia ainda mantêm os hábitos tradicionais e a criação de renas no Oeste siberiano

Perfurando poços e abrindo estradas para a exploração de gás no Iamal, a gigante russa Gazprom ameaça as últimas famílias de nenets.

ANNA NEMTSOVAESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Criadores de rena, eles se deslocam segundo as estações

Criança nenets na península de Iamal (destaque no alto)

Um helicóptero sobrevoa a planície vazia da tundra. Quando ele pousa, a para-médica Irina desce, cumpri-menta os presentes, joga as cortinas de uma barraca para trás e se espreme em seu in-terior. Ela examina uma criança com habilidade e lhe dá uma injeção. Tudo prati-camente na penumbra. Fica decidido que a criança será levada ao hospital por causa da febre, e sua mãe irá junto. O helicóptero decola. A mãe

Tribo desconfia de médicos oferecidos pelo Estado e evita deslocamentos, o que leva operação custosa a ser vista com ressalvas.

do garoto não quer respon-der a nenhuma pergunta e tem suas razões para descon-� ar dos médicos. É de praxe que as mulheres de Iamal tenham muitos � -lhos, em média entre cinco a sete. Geralmente, as mães só vão ao hospital no último mo-mento e, logo após o nasci-mento, voltam para a tundra, onde outras crianças e muitas tarefas as esperam. Para au-mentar a assistência, os mé-dicos russos adotaram uma estratégia de transferir a mu-lher da maternidade para um hospital regional, em vez de dar alta de� nitiva. Assim, os médicos tentam manter as mães no hospital até que o bebê tenha pelo menos um mês de idade.

Resistência nenets é incompreendida

ÍGOR NAIDENOVRÚSSKI REPORTIOR

internos em Iar-Sale, a capi-tal da população da tundra. No entanto, Lena Sarteto diz que viveria sem esse dinhei-ro se pudesse ter a tundra sem interferências, apenas com a família ao seu redor.Ela se vira para a imagem de madeira de sua divindade e repete suas preces, ainda que pareça uma atitude inútil: “Permita que a Gazprom vá embora logo e Iamal seja nossa novamente.”

Manter um helicóptero voan-do por uma hora custa, apro-ximadamente, 80 mil rublos (R$ 4,5 mil). Nesse caso, foram necessárias quase três horas para transportar a criança com suspeita de bronquite. Por isso, manter o estilo de vida tradicional das populações minoritárias no norte da Rús-sia está custando caro para o governo e aqueles que moram em outras partes do país se ressentem da forma como as autoridades parecem roman-tizar a vida na tundra e criar uma cultura de dependência e n t r e a s p o p u l a ç õ e s indígenas. O doutor Ivanov é um dos mé-dicos que atendem à popula-ção de nenets. Ele conta que certa vez foi chamado para

atender um caso no povoado de Paiuta, onde deveria en-contrar um guia para levá-los até uma mulher que daria à luz. No local, se depararam não com um, mas quatro guias. “Cada um tinha con-sigo uma lata de óleo de gi-rassol, duas caixas de carne em conserva e um pacote de macarrão. O piloto do helicóp-tero queria que eles saíssem, porque tornavam o helicóp-tero muito pesado. Então eles disseram: ‘Você não pode fazer isso, nós somos indígenas, somos uma minoria’.”Segundo o médico, quando � -nalmente encontraram a pa-ciente, ela � cou inquieta por-que a levar iam a uma maternidade em Salekhard, quando queria ir para Aksa-

rka. “Ela começou a gritar, dizendo que ia reclamar para o presidente da Assembleia Legislativa de IaNAO [Distri-to Autônomo de Iamalo-Ne-nets]. Dissemos que a ambu-lância aérea não era um táxi”. Ivanov diz que casos do gê-nero são recorrentes. “Vou ad-mitir que o que eu estou fa-lando é, de certo modo, subversivo, mas isso não está nos levando a lugar algum. Não vejo futuro nesse estilo de vida. Entendo que o povo local tem sua própria menta-lidade, mas imagine o que aconteceria se todas as pes-soas usassem sapatos de � bra natural e deixássemos as bar-bas crescer como vassouras. Que tipo de país seríamos assim?”

missão de que necessitam, em um ambiente especí� co para isso e longe de problemas.Os incentivos, porém, dividem a população. Apesar da crise demográ� ca, existe uma am-bivalência generalizada sobre a imigração no país. Uma pes-quisa da agência Politex re-velou que 86% dos entrevis-tados acham que o Estado deve instituir controles seve-

A civilização (e o gás)ameaçam a tribo

Cargos ocupados por imigrantes Permissões de trabalho por região

Moscou estima que a economia russa vai precisar de mais de 30 milhões de imigrantes até 2030

ros de imigração, enquanto 57% da mostra a� rmam que Moscou precisa de trabalha-dores estrangeiros.Gráfova ressalta ainda que a atual pressão do governo por uma política de imigração mais liberal aparece em um contexto de graves con� itos étnicos e diante de um desejo de conter a crescente onda de xenofobia no país.

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Veja material mulitimídia em www.gazetarussa.com.br

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Gazeta Russawww.gazetarussa.com.br economia e mercado

No dia 7 de junho, em Mos-cou, oito fabricantes brasilei-ros de equipamentos médicos e mais de 30 empresas de dis-tribuição russas se reuniram no Hotel Ritz Carlton para dis-cutir oportunidades para os produtores brasileiros no mer-cado local. Como principais resultados da missão comercial, foram fechadas cerca de 60 rodadas de negócios entre as empre-sas russas e brasileiras, com uma expectativa de conclu-são de negócios da ordem de R$ 1,5 milhão para os próxi-mos 12 meses. Entre os prin-cipais produtos negociados,

“Isso permite que, caso haja um surto de alguma doen-ça no Brasil, as restrições de importação sejam váli-das apenas para os Estados e municípios que passam pelo problema, não para todo o país. Atualmente, essas medidas estão em vigor para a Paraíba, onde foi diagnosticada uma epi-demia suína; para o muni-cípio de Dourados, no Mato Grosso do Sul, vítima de um surto de pseudorraiva; e para Pernambuco, onde existe alta incidência de es-tomatite vesicular”, explica Aleksêienko.Desde o início de 2010, os ins-petores da vigilância sanitá-ria encontraram 31 violações durante as inspeções das car-gas enviadas pelo Brasil para a Rússia. Entre as irregula-ridades estão a falta de auto-rização russa para importa-ção e o envio de produtos omitidos da lista de envio. “Hoje, há restrições para a distribuição de itens pecuá-rios de 27 empresas brasilei-ras. Se compararmos com 2007, a diferença é grande: naquele ano, apenas sete vio-

destacam-se aparelhos eletro-médicos, dispositivos para neurologia, implantes ortopé-dicos, dispositivos respirató-rios, instrumentos cirúrgicos e mobiliário hospitalar, entre outros. O valor parece peque-no, mas pode ser classificado como um bom começo.

momento promissorO setor médico-hospitalar vive um momento promissor na Rússia. O governo comprome-teu-se a dedicar grandes in-vestimentos para a melhoria da infraestrutura e da quali-dade do atendimento à popu-lação, incluindo a compra de equipamentos médicos mais modernos. Trata-se de um programa de larga escala. O primeiro-mi-nistro russo Vladímir Pútin declarou que cerca de 30% das instalações médicas do país necessitam de refor-mas urgentes e de equipa-

lações foram detectadas”, afirma o secretário.Como resultado, apesar do au-mento do comércio entre os dois países, a distribuição de carne brasileira na Rússia so-freu uma queda nos últimos meses deste ano.Nos quatro primeiros meses de 2011, a importação do pro-duto caiu 17% em relação ao mesmo período de 2010 (168,3

mentos para atendimento adequado.Estão previstos para os pró-ximos dois anos investimen-tos da ordem de R$ 4,8 bilhões na compra de equipamentos, a maioria deles importado. Os equipamentos de fabricação russa respondem hoje apenas por cerca de 20% do mercado de saúde.Embora o mercado russo seja promissor em oportunidades de negócios, os desafios aos fornecedores são muito gran-des. As empresas que buscam o mercado russo precisam do apoio de distribuidores que cuidem de toda a burocracia da certificação dos produtos e, sobretudo, que viabilizem a participação dos equipa-mentos em processos de con-corrência pública – que defi-nem quase todas as vendas no país, pois o setor tem forte participação estatal.Segundo Almir Americo, di-

mil toneladas contra 139,1 mil toneladas). No mesmo perío-do, a participação brasileira nesse mercado, em volume, diminuiu de 30% para 23%.Em abril, os serviços de vi-gilância sanitária dos dois países conduziram uma vis-toria nas empresas brasilei-ras produtoras de carne in-teressadas na distribuição do produto na Rússia e em ou-

retor da Apex (Agência Bra-sileira de Promoção de Ex-portações e Investimentos) em Moscou, a iniciativa vai per-mitir o desenvolvimento do comércio com a Rússia, favo-recendo a negociação de pro-d u t o s d e a l t o v a l o r agregado.A Rússia é um grande parcei-ro comercial do Brasil. O co-mércio entre os dois países ul-trapassou R$ 9,6 bilhões em 2010. “A pauta comercial, en-tretanto, ainda está focada em produtos primários, por isso considero importantes os re-sultados dessa iniciativa. O au-mento da cooperação entre em-presas brasileiras e russas na área de produtos tecnológicos é uma meta que começamos a realizar”, afirma Americo.Segundo ele, o maior desafio da organização foi priorizar a qualidade das empresas rus-sas que participaram dos en-contros. “Encontrar um bom

tros países de sua união aduaneira.“Durante as inspeções, ficou claro que o Brasil estava fle-xibilizando a fiscalização. Identificou-se ainda uma piora substancial do sistema designado a garantir o cum-primento das regras”, afirma Aleksêienko. A ocorrência de doenças no gado russo, entretanto, tam-

distribuidor é a chave do su-cesso num mercado seletivo como o russo, em que o rela-cionamento com a esfera pú-blica é decisivo para as ven-das”, explica.

bém não é rara. De acordo com Anna Evanguelêieva, chefe de análise do site espe-cializado Meatinfo.ru, a situ-ação é especialmente compli-cada com a carne suína, já que os recorrentes surtos de peste africana no sul da Rús-sia refletiram no total da po-pulação animal. Em 2010, ocorreram no país 70 incidências da doença e nos

Equipamento médico brasileiro vai à Rússia

a guerra do bife

apenas 20% do equipamento médico e odontológico no mercado russo é fabricado no país.

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Brasileiros acreditam em “fator político”

A suspensão de frigoríficos brasileiros, em vigor desde o dia 15 de junho, certamente causará enormes prejuízos para as empresas brasileiras.

Para o ex-diretor executivo da Intel e colaborador de Skôlkovo Craig Barret, “o vín-culo entre negócios e pesqui-sa é a verdadeira chance da Rússia de dar um salto tecnológico”.“É preciso ter confiança na integridade de nossa causa, ainda que estejam faltando garantias”, afirma.Assim como o Vale do Silício passou a ser considerado a en-carnação da inovação, Skôlko-vo está querendo estimular a imaginação enquanto se es-força para se tornar a marca da qual o presidente fala. Para tanto, contratou até um diretor de cinema para rodar um seriado na estrutura do centro de inovações, de acor-do com Naumov.

Medvedev visitou o Vale do Silício original para verificar o que poderia funcionar na Rússia. Na verdade, a região se tornou o principal centro tecnológico dos Estados Uni-dos principalmente devido aos gastos com defesa (fundamen-talmente no combate à União Soviética) nos anos 70 e 80. No entanto, a versão russa está sendo projetada em um outra era, e Skôlkovo está prestes a

entrar em funcionamento em nível internacional. “Esse lugar tem um signifi-cado especial para mim, por-que é aqui que estamos de-senvolvendo nossa nova tecnologia; aqui fundamos a Universidade de Skôlkovo e a faculdade [de Administra-ção], e é aqui que será o nosso centro de inovação”, disse o presidente.

empurrãozinhoAlém de Medvedev, existe

uma lista de empresários e acadêmicos trabalhando pelo sucesso do projeto.O ex-diretor executivo da Intel, Craig Barrett, e o bilio-nário russo Víktor Vekselberg co-administram o conselho da fundação, que tem entre seus membros o presidente da Lukoil, Vaguit Alekperov, e Anatóli Tchubais, presidente da Rusnano (Corporação Russa de Nanotecnologia). Dois prêmios Nobel, de Físi-ca e Química, Jores Alfiorov

e Roger Komberg, dirigem o Conselho Científico de Skôlkovo. “Skôlkovo será o maestro de uma orquestra composta por start-ups e investidores”, disse à Gazeta Russa o vice-presi-dente da fundação, Stanislav Naumov. “Embora o Estado tenha feito um lobby pesado pela liberação do projeto, é exatamente o envolvimento com o governo que não é bem-vindo aqui ou, pelo menos, qualquer dependência finan-

ceira, já que o governo conce-deu dois terços da quantia total”, afirma Naumov. O vi-ve-presidente da fundação ressalta que o capital cedido para o projeto será devolvido em, no máximo, oito anos.

impulso à educaçãoUma premissa por trás de Skôlkovo é a necessidade de casar inovação com educação. A primeira leva de 40 estu-dantes do curso de MBA da Faculdade de Administração de Moscou, lá baseada, se for-mou no ano passado. A Uni-versidade Técnica de Skôlko-vo deve começar as inscrições para os cursos de pós-gradu-ação até 2014.Existem, naturalmente, algu-mas dúvidas e contradições em

torno do projeto. Mesmo que as start-ups (empresas, geral-mente recém-criadas, em fase de desenvolvimento e pesqui-sa de mercados) russas real-mente se instalem na Innograd e os cientistas internacionais as sigam, não se pode dizer que os pesquisadores farão o mesmo. “Desde 1990, houve 980 ten-tativas de criar tais centros de inovação, dos quais apenas 17 foram instituídos, e somen-te três atenderam às expec-tativas”, diz o arquiteto e membro da diretoria de pla-nejamento Grigóri Rêvzin. “Estatisticamente, a probabi-lidade de Skôlkovo ir por água abaixo é alta, mas isso não é motivo para acabar com os es-forços”, completa.

Com direção de peso, Skôlkovo busca independência

O evento foi realizado pela Apex em parceria com a As-sociação Brasileira da Indús-tria de Artigos e Equipamen-tos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laborató-

rios (Abimo). O Brasil, de acor-do com informações da Or-ganização Mundial de Saúde (OMS), é o 2º maior produtor de equipamentos médicos entre os países emergentes.

paraíba, mato grosso do sul e pernambuco são estados bra-sileiros que sofreram restrições por parte do governo russo

quatro primeiros meses deste ano foram diagnosticadas 22. Além disso, agora as ocorrên-cias se espalharam também para a região noroeste, com casos em Murmansk, Arkhan-guelsk, São Petersburgo e Nijni-Nóvgorod. Mas, ainda que provoque baixas no re-banho, o vírus não é perigo-so para humanos.

produção internaDe acordo com a imprensa local, as medidas da vigilân-cia sanitária russa visam, in-diretamente, a um aumento na produção interna. Além do embargo, no ano pas-sado, o Kremlin alterou os procedimentos de inclusão de novas empresas brasileiras na lista de fornecedores de carne e derivados para o país.Segundo o secretário do órgão, entretanto, a Rússia não tem condições de se estabelecer no setor, que foi abalado pela crise dos anos 90. “O interes-se russo em manter as impor-tações do Brasil continua, e só impomos uma condição, prevista por nossa legislação: a segurança do produto”, afir-ma Aleksêienko.Segundo especialistas, entre-tanto, há uma motivação po-lítica por parte do Kremlin para proteger a produção doméstica.“No ano passado, tivemos o conflito do frango ‘clorado’ americano. Naquele período, o volume de produto impor-tado era enorme e as empre-sas nacionais do setor tam-bém avançaram bastante. Mas era preciso impulsioná-las ainda mais, aumentar os

números – resultado que foi obtido após o embargo. Hoje, é exatamente este segmento que apresenta os melhores ín-dices no mercado local”, re-lembra Evanguelêieva.

dados do setorDe acordo com o site especia-lizado Meatinfo.ru, a produ-ção de frango na Rússia cres-ceu 11% em 2010 e sua importação caiu 31%. Segun-do Evanguelêieva, chefe de análise do site, neste ano a produção interna suprirá to-talmente a demanda do mer-cado doméstico. Ao mesmo tempo, observa-se uma tendência de crescimen-to nas exportações. Enquan-to o país exportou 4,4 mil to-neladas do produto entre janeiro a abril de 2010, no pe-ríodo equivalente de 2011 o índice registrado foi de 6,5 mil toneladas.Ainda de acordo com Evan-guelêieva, o Brasil lidera as remessas de carne bovina e suína para a Rússia, compre-endendo respectivamente 38% e 28% das importações. A venda do frango brasileiro re-presenta 27% das entradas, cifra superada apenas pelos EUA.A criação de suínos na Rús-sia também demonstra bons resultados: no ano passado, o crescimento foi de 7% e o vo-lume de importações dimi-nuiu 1%.Nesse setor, porém, a depen-dência das importações ainda é sentida. No que se refere à produção de carne bovina, os indicadores caíram e o volu-me das importações subiu.

fabricio yuriespecial para gazeta russa

para representantes dos produtores, exigências russas são forma de barrar produção brasileira e preparar a produção interna.

Para se ter uma ideia, em 2010 o Brasil faturou R$ 21,4 bi-lhões com exportação de carne para 150 países. A Rússia com-prou R$ 3,2 bilhões desse total.Para Luciano Vaccari, supe-rintendente da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), a medida foi uma enorme surpresa. Apesar da relação instável com os rus-sos – praticamente todo ano

há ao menos um embargo –, a nova posição do parceiro põe em xeque a imagem da pro-dução de carne e da pecuária brasileira. “Foi desastroso. Mas isso é re-sultado de uma dependência nossa. Toda vez que você tem uma concentração de venda em um comprador só, fica su-jeito a esse tipo de coisa”, acre-dita Vaccari.O superintendente da Acri-

mat reconhece que há uma deterioração na relação e que as novas críticas russas não foram bem aceitas. “Tem coi-sas que são antagônicas. O Brasil exporta para dezenas de países do mundo, para a União Europeia e Chile, os mais exigentes do mundo na questão de controle de qua-lidade. E aí a Rússia, que nem é tão exigente assim, vem falar de problemas de con-trole de qualidade? Não dá para entender”, lamenta Vaccari.Péricles Salazar, presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), adota tom mais cauteloso. Para ele, as exigências dos russos não fazem parte das normas de inspeção brasileiras e não se

adaptam a um país tropical. “Para nós, essa questão não é técnica, e sim de cunho polí-tico, que usa o posicionamen-to sanitário como argumen-to”, afirma Salazar. Segundo ele, a Rússia prepara merca-do para desenvolver sua in-dústria interna.Salazar, no entanto, crê numa solução política. Para ele, o comprometimento brasileiro de atender a certas exigências dos russos com relação ao apoio para a entrada na Or-ganização Mundial de Comér-cio (OMC) pode ser determi-nante para a resolução do impasse. “Quanto a suínos e aves, os russos podem se tornar au-tossuficientes num futuro pró-ximo, mas quanto aos bovi-

nos são completamente dependentes. Vão precisar sempre de importação e, con-sequentemente, do Brasil”, acredita Salazar.Enquanto uma solução polí-tica para o problema não apa-rece, uma missão brasileira, sob orientação do vice-presi-dente da República Michel Temer se prepara para visi-tar Moscou.Os brasileiros levam na ba-gagem, além das reclamações do setor produtivo, um impor-tante e determinante capital político: a força que a marca “Brasil” vem ganhando em âmbito mundial. Uma asso-ciação que pode ser crucial para as ambições russas no p l a n o d o c o m é r c i o internacional.

Vladímir golenkoVespecial para gazeta russa

principal objetivo do evento foi apresentar fabricantes brasileiros a distribuidores russos. governo deve investir r$ 4,8 bilhões na compra de equipamentos até 2013.

exportação primeira rodada de negócios médico-hospitalares bilateral tem perspectiva de geração de r$ 1,5 milhão em negócios

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Page 6: notas skôlkovo, a cidade do futuroe do FSB (Serviço de Segu-rança Federal da Rússia) foram, no mínimo, parcial - mente responsáveis pela morte de Magnítski na prisão de Bu

Gazeta Russawww.gazetarussa.com.brespecial

concorrência Holding estatal criada para competir com a companhia não vinga e deve ser herdada pela empresa

crise de 2008 derrubou a russian airlines, e agora seis das empresas que formavam o projeto devem acabar adquiridas pela aeroflot.

A Aeroflot, maior companhia aérea da Rússia, pode am-pliar significativamente sua presença no mercado do país já nos próximos meses. Sob controle acionário estatal, a empresa logo deve incluir em sua estrutura seis novas com-panhias aéreas, agora sob controle do Estado, em nome da Rostekhnologii (Coorpo-ração Russa de Tecnologia do Estado).Engordarão a lista de ações da Aeroflot empresas como a STC Rossia, a KMV Avia, do Cáucaso, a Orenburg Air-lines, a Vladivostokavia, a Saratov Airlines e a SAT Air-lines. A Rostekhnologii ob-teve 3,61% na participação das ações da Aeroflot, que re-presentam cerca de 2,5 bi-lhões de rublos (R$ 142 milhões).De acordo com a Aeroflot, as novas ações já estão incluí-das no plano estratégico de

trutura existente. “Mas a Ae-roflot dificilmente iria se atrever a assumir uma tare-fa tão complexa como a ges-tão de seis companhias to-talmente diferentes”, diz Sinítski.Para ele, a experiência de aquisição da Nordavia mos-trou que a gestão da Aeroflot tem dificuldades com proje-tos semelhantes.“O mais provável é que a Ae-roflot, pela primeira vez, de-cida manter uma parte sig-nificativa da autonomia para as empresas regionais e só então inclua as companhias em sua estrutura, uma a uma”, acredita Gueórgi Ko-z lov, ed itor do jor na l Grajdânskaia Aviatsia (“Avia-ção Civil”, em russo).

“tumor” aéreo As ações foram parar nas mãos da Rostekhnologii com a crise de 2008. Naquele ano

surgiu a Russian Airlines, projeto criado para ser uma segunda Aeroflot – uma companhia estatal que pudesse competir com a líder da aviação russa.

Os planos, embora ambicio-sos, pareciam viáveis. A Rus-

sian Airlines foi criada por meio de uma aliança entre a AiRUnion e outras compa-nhias, e deveria ter o dobro do número de passageiros da Aeroflot em 2013. Mas o pro-jeto não sobreviveu – sua onda de azar começou muito antes de 2013. Como resultado, restou nas mãos da Rostekhnologii um conjunto de ações de empre-sas que não conseguiam so-breviver no mercado, muito menos derrubar a líder Aeroflot.A aliança de companhias aé-reas AiRUnion herdada pela Rostekhnologii estava sobre-carregada com dívidas con-sideráveis, assim como as ou-tras companhias aéreas que deveriam constituir a nova gigante da aviação. Algumas dessas empresas não foram incorporadas, mesmo depois de três anos, e existem até hoje sob a forma de negócios federais unitários.

eterna aeroflotA administração da Aeroflot originalmente pertencia a seu futuro rival. Ainda em ou-tubro de 2008, o então dire-tor-geral da empresa, Valéri

Okulov, chamou o projeto de “tumor”. Pouco a pouco, o go-verno também passou a par-tilhar de seu ceticismo. Como resultado, em 2009, o ministro dos Transportes da Federação Russa, Igor Leví-tin, defendeu juntar as ações da Rostekhnologii às da Ae-roflot. Já no início de 2010, o primeiro-ministro Vladímir Pútin aprovou oficialmente o fortalecimento da Aeroflot em detrimento das outras seis empresas.O ponto crucial desta vez foi o preço de emissão. Inicial-mente, foi acordado que a Rostekhnologii iria receber um pacote de bloqueio das ações da Aeroflot (25% mais uma ação) em troca das seis companhias aéreas regionais. No entanto, a gestão da Ae-roflot anunciou que a oferta do Estado não condizia com o valor real. No segundo semestre de 2010, a Aeroflot se disse disposta a entregar cerca de 6% das ações. No entanto, em feverei-ro de 2011, os resultados de uma avaliação independente das seis companhias estima-vam seu valor em 2,5% das ações da Aeroflot. Como re-

sultado, as partes permane-ceram no montante de 3,61% dos ativos.

Herança de dívidasEm março deste ano, a im-prensa noticiou que, em meio aos desententimentos entre a Aeroflot e a Rostekhnolo-gii, outras companhias aé-reas começaram a demons-trar interesse em formar uma holding a partir dessa fusão.Com isso, os ativos sem dono passaram a interessar não só a grandes players do merca-do, mas também às chefias de vários órgãos públicos. A administração do governo de Sakhalin, de Aleksandr Khoroshávin, mostrou inte-resse pela companhia local SAT Airlines. Também houve um interessado na Orenburg Airlines e a Transaero, um dos principais concorrentes da Aeroflot, virou foco das companhias aéreas. Segundo dados não oficiais, a diretora-geral da Transa-ero, Olga Pleshakova, teria pedido ao vice-premiê Ser-guêi Ivanov e ao ministro dos Transportes Igor Levítin para que considerassem a possibilidade de vender as ações a ela, e não ao líder do mercado russo de aviação.Mas, por enquanto, nenhum dos participantes das nego-ciações alternativas confir-mou oficialmente estar pron-to para competir com a Aeroflot pela sucessão da união de empresas aéreas.Por trás dessa informação, o mercado se pergunta mais uma vez se o líder do setor aéreo russo precisa de ativos sem donos, epecialmente con-siderando a dívida dessas em-presas. Especialistas esti-mam que a dívida total das seis companhias chegue a R$ 1,2 bilhão.

anton makHrovespecial para gazeta russa

estrutura do mercado de transporte aéreo

aeroflot

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12,5%utair13 %

15 %

receita da companhia aérea em 2010

O futuro imediato da indús-tria de aviação russa depen-de do destino do Sukhôi Su-perjet 100 e do Túpolev Tu-204, duas aeronaves com trajetórias bem diferentes. O Superjet, primeiro avião russo desenvolvido integral-mente depois do período so-viético e a usar grande nú-mero de componentes estrangeiros (inclusive um motor feito na França), co-memorou um importante marco no mês passado após completar com sucesso seu primeiro voo comercial pela companhia aérea Armavia. Já o Tu-204, que voou pela primeira vez em 1989 e se as-semelha ao Boeing 757, está tendo dificuldades de se rein-ventar, principalmente tendo em vista o fato de que ape-nas 69 exemplares foram construídos em 20 anos.

sucessos e decepçõesA operação comercial do Shukhôi Superjet provavel-

superjet lançado em abril, jato comercial russo gera desavença entre estatais

enquanto a túpolev amarga venda frustrada, sukhôi promete sucesso com novo jato, mas recebe críticas de sua maior cliente.

empresa, com 30 pedidos), depois de repetidos atrasos na entrega do Superjet. O mi-nistro também demonstrou frustração quanto ao peso acima do esperado e à baixa eficiência energética do mo-delo, cujo desenvolvimento consumiu largamente recur-sos federais.Segundo o especialista em transporte aéreo Maksim Piadushkin, a posição assu-mida pela Aeroflot, que é con-trolada pelo governo, “reduz o apelo do produto sob o ponto de vista de comprado-

res em potencial e pode fazer com que o dinheiro público tenha sido gasto em vão”. A Aeroflot, que previa rece-ber seu primeiro Superjet em maio, não iniciará voos co-merciais com o modelo da Sukhôi até o fim deste mês.No fórum, Pogossian expres-sou a esperança de que, com o apoio do programa do go-verno de estímulo à indústria aeronáutica, a Rússia possa deter 10% do mercado global de aviação civil até 2025. O programa do governo está focado em três aeronaves, a primeiro sendo a Superjet 100. A segunda, conhecida como MS-21, é um avião de médio alcance (com capaci-dade entre 150 e 210 passa-

geiros) hoje em elaboração, baseada parcialmente no Tu-204.Mas diversos conflitos sur-giram no decorrer do fórum em Uliánovski. O veterano da indústria Oleg Smirnov, por exemplo, fez comentá-rios ácidos criticando o di-retor-geral da Aeroflot, Vi-táli Saveliev, e Aleksandr Lêbedev, detentor de ações de diversas companhias.

resistir e competirA fábrica responsável pela montagem final do Superjet está localizada em Komso-molsk-on-Amur, 7 mil qui-lômetros a leste de Moscou, e essa concentração da pro-dução confronta com a po-lítica de distribuição de vagas de trabalho. Além disso, motivos financeiros impulsionam a compra de aviões estrangeiros, que têm um custo de operação bem mais baixo.O Estado, porém, perseguin-do sua meta de restabelecer a indústria nacional, parece que não deixará de lado as companhias russas para cair nas graças da Airbus e da B o e i n g n u m f u t u r o próximo. O real poder da estrutura aérea russa deve ser revela-do no 2011 Paris Air Show, o maior salão internacional de aeronáutica, já que, no iní-cio de junho iniciaram-se ru-mores sobre três grandes contratos estratégicos para aviões estrangeiros que po-deriam ser firmados no evento.

Sukhôi busca fatia da aviação comercial

aleksandr vostrovespecial para gazeta russa

tora da Sukhôi, ainda gozan-do do brilho do lançamento do Superjet, anunciou no 1º Fórum Internacional de Transporte Aéreo de Uliá-novski, em abril, a compra de 30 aviões pela Aeroflot em 2011 – sete a mais que a en-comenda feita em 2010. O clima em torno do lança-mento, no entanto, foi de algum modo encoberto pelos comentários feitos em abril pelo ministro dos Transpor-tes, Igor Levítin, quanto a uma possível compensação à Aeroflot (maior cliente da

desenvolvimento da compa-nhia e a empresa está se pre-parando para reforçar sig-nificativamente sua posição dentro do país.“Após as compras das ações do Estado, a Aeroflot pode receber um adicional de 15% do mercado russo de trans-porte aéreo. Agora, de acor-do com nossas estimati-vas, a fatia de mercado da Aeroflot está perto de 26%, e depois da fusão irá exceder apro-ximadamente 40%”, afirma o analista Andrei R o j k o v , d a I F C Metropol.

Pedra no caminhoRealizar esses pla-nos, entretanto, não será fácil. “Apa-rentemente, é por isso que a Aeroflot até hoje não anun-cia detalhes da fusão”, afirma o es-pecialista Aleksêi Si-nítski, da revista Rus-sia/CIS Observer. A opção mais atraente para a empresa é a integração si-multânea e completa de todos os novos ativos dentro da es-

a aeroflot se expande

Há rumores de que a companhia firme três grandes contratos até início de julho

mente irá permitir que com-pradores em potencial verifi-quem seu desempenho e gerem novos negócios para a com-panhia. Hoje, a Sukhôi tem 150 encomendas para aerona-ves comerciais de 100 lugares.

A situação é bem menos en-corajadora para o Tu-204, um avião de alcance médio com capacidade para até 210 passageiros. A empresa teria recebido uma encomenda de 44 aeronaves da companhia

Red Wings, mas o acordo está suspenso desde abril.

estatais em discórdiaA UAC (United Aircraft Corporation) liderada por Mikhail Pogossian e deten-

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Gazeta Russawww.gazetarussa.com.br opinião

expedientepresidente do conselho: aleksandr gorbenko (rossiyskaya Gazeta);diretor-Geral: pável negóitsa (rG); editor-chefe: vladislav Frónin (rG)endereÇo da sede: av. pravdY, 24, bloCo 4, 12º andar, MosCoU, rÚssia - 125993 WWW.rbtH.rU e-mail: [email protected] tel.: +7 (495) 775 3114 faX: +7 (495) 775 3114editor-chefe: evgUêni abov; editor-eXecutivo: pável golUb;

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escreva para a redação da

Gazeta russa em moscou:

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a primeira entrega do novíssimo jato co-mercial russo Sukhôi Superjet 100 a um

operador comercial em abril marcou um momento especial na reafirmação da indústria aeronáutica russa no merca-do de jatos comerciais e abriu perspectivas animadoras para que a indústria enfrente com sucesso os tradicionais fabri-cantes do Ocidente. Sob vários aspectos, o início da operação comercial do Su-perjet 100 foi a coroação de um programa que, ao ser ini-ciado menos de dez anos após o colapso da União Soviética, era visto por especialistas e analistas russos com grande ceticismo.Conhecida mundialmente como fabricante de jatos de combate, a Sukhôi nunca pro-duzira um grande avião co-mercial. Somando-se a isso, a KNAAPO (fábrica que sediou a produção da Sukhôi no Ex-tremo Oriente russo), até então produzira, em sua longa his-tória, apenas um tipo de avião

tanto, bastante promissor para a chegada de um novo jato co-mercial, de tecnologia avan-çada e fabricação nacional.A Sukhôi logo percebeu a ne-cessidade de construir alian-ças internacionais, sobretudo com parceiros do Ocidente, e assim o programa cresceu, so-mando um total de 30 empre-sas parceiras estrangeiras. Visando um novo padrão em baixo consumo de combustí-vel e mínima emissão de po-luentes, foi definido um motor de tecnologia totalmente nova, o SaM146, cujo desenvolvi-mento ficou por conta da Po-werJet, joint-venture entre a russa NPO Saturn e a fran-cesa Snécma. A também fran-cesa Thales foi selecionada como importante fornecedo-ra em 2005. No mesmo ano, a italiana Ale-nia Aeronautica firmou um acordo com a Sukhôi, do qual surgiu outra joint-venture, a SuperJet International (SJI), responsável não apenas por todo o marketing mundial do novo jato mas também pelo estratégico apoio pós-venda nessas regiões. Neste campo, ainda foi feita uma aliança com a alemã Luf-

thansa Technik, responsável por toda a cadeia logística de suprimentos do Superjet 100, para operadores em qualquer ponto do planeta.Os resultados dessas parce-rias já mostram bons dividen-dos. Em dezembro de 2008, a companhia Kartika Airlines, da Indonésia, fechou contra-to para 30 jatos; seguida em junho do ano seguinte pela húngara Malév (15, mais 15 opções). Em 2010, somaram-se aos clientes estrangeiros a Phongsavanh Airlines, do Laos (3, mais 6 opções); a tai-landesa Orient Thai Airlines (12, mais 12 opções) e as em-

presas de leasing Pearl Air-craft Corp. (30, mais 15 op-ções), com sede nas Bermu-das, e a norte-americana Willis Lease Finance (6, mais 4 opções). Em janeiro, a SJI assinou com a mexicana In-terJet um contrato de US$ 650 milhões para entrega de 15 Superjet 100, com opções para outros cinco com suporte pós-venda por 10 anos. O contrato fechado com a In-terJet revestiu-se de especial significado, pois com ele o Su-perjet 100 consagrou seu pri-meiro cliente no disputado (e atraente) mercado da aviação regional da América Latina

Superjet 100, da rúSSia para o Mundo

– além de o jato russo ter atin-gido 189 pedidos firmes, mais 74 opções.Apesar dos números e de um início de operação promissor, é muito cedo para dizer se o Superjet 100 será um concor-rente a colocar em cheque a atual liderança no mercado mundial de jatos regionais na faixa de 70 a 108 lugares, hoje nas mãos da brasileira Em-braer, com sua muito bem-su-cedida família E-Jet. Até abril, esses modernos e confiáveis jatos tinham alcan-çado 719 exemplares entre-gues, com 268 a entregar, e 705 opções. Apenas no primei-

ro trimestre de 2011, a Em-braer somou 44 novas enco-mendas de seus E-Jets. Entretanto, no mundo da avia-ção, não existe “monarquia”, de modo que, hoje, o Superjet 100 é visto como um oponen-te sério no mercado mundial, como o contrato com a Inter-Jet demonstrou muito bem. Um concorrente, portanto, a não ser ignorado não apenas pela Embraer, mas também por outros players, como a ca-nadense Bombardier e a ja-ponesa Mitsubishi.

claudio Lucchesi

Jornalista

Claudio Lucchesi é diretor da re-vista especializada Asas.

Gueôrgi Bovt é co-presidente do partido Causa Justa.

gueórgui bovt

historiador

aS intrigaS daS eleiçõeS parlaMentareS

na Rússia, o estilo de governo acaba sendo muito mais impor-tante do que o texto

das leis. O presidente Dmítri Medvedev, assim, tem ditado modas bastantes liberais, não dando sinais às elites regio-nais de que o Kremlin verá com bons olhos o uso exces-sivo de recursos públicos e de jogo sujo na política. Soma-se a isso o fato de que as eleições regionais de 2010-2011, embora não tenham passado sem infrações por parte dos “partidos gover-nistas”, estiveram longe do modelo autoritário da Bielor-rússia, por exemplo. Esses acontecimentos desper-taram nos partidos partici-pantes do processo eleitoral a esperança de que as elei-ções parlamentares de de-zembro de 2011 ocorram de

maneira mais democrática.Na cena política, como antes, existem dois importantes co-adjuvantes que há muitos anos obtêm os mesmos números. Liderado por Guennádi Ziu-ganov, o PCFR (Partido Co-munista da Federação Russa) deve receber aproximadamen-te 15% dos votos. Até recentemente, achava-se que o eleitorado tradicional do PCFR fosse formado por pensionistas – cuja parcela de entusiastas saudosistas da URSS diminui constantemen-te. Isso é parcialmente verda-deiro, mas a fatia de votos do partido se mantém estável de-vido ao apoio de pessoas de meia idade e mesmo jovens, que veem no PCFR uma forma de protesto. O número de elei-tores desse tipo, porém, não deve aumentar. Em primeiro lugar, porque Ziuganov tor-nou-se obsoleto, excessiva-mente moderado (para esses eleitores) e há muito já não propõe novas ideias.

escrever sobre traços do caráter nacional é sempre uma questão delicada, ainda mais

na Rússia. Em um país tão vasto é possível achar dúzias de casos que ilustrem qual-quer generalização. Assim, não irei discorrer sobre estereótipos culturais primitivos, como os que dizem que “os russos são uns beberrões” ou “preguiçosos”, afirmações que não são verdadeiras. Vamos nos deter em pontos mais complicados, como a democracia e a moral. Por que os russos se preocupam tão pouco com as eleições? Por que têm pouca confian-ça na justiça e evitam pro-cessos judiciais a todo custo?

A resposta é simples: porque as eleições não são totalmen-te transparentes e a inde-pendência judicial não é completa. Em nossa história, tivemos julgamentos honestos e elei-ções decentes em alguns pe-ríodos. Mas, mesmo no início dos anos 90, quando aconte-ceram as melhores eleições da história da Rússia e já era possível escolher entre par-tidos políticos, a maioria dos meus amigos não votava.Eu costumava me perguntar se eles não se preocupavam nem um pouco. Não. Quase todos eram pais cuidadosos, amigos fiéis e profissionais responsáveis. O que faz com que os russos duvidem das eleições é nossa tendência de buscar o absoluto – incluin-do liberdade absoluta. Lembro de um amigo que “desencanou” das eleições

veu sobre a Grã-Bretanha em seu livro Notas de um Viajan-te Russo: “Os oficiais locais não têm medo de reclamações, já que são mais independen-tes de seus superiores que seus correspondentes na Rússia. Quanto mais mesquinho for um oficial, maior será o poder dele sobre os demais.”Antecessor de Bukóvski, o emigrante político Aleksan-dr Herzen queixou-se duran-te o século 19 de uma “polí-cia interna”, à espreita, observando cada ocidental. Isso os tornou ainda menos livres que os russos, segun-do Herzen. Bukóvski tem uma obra re-cheada de exemplos de sua luta contra a burocracia oci-dental (escrevendo cartas ao secretário de Estado norte-americano em apoio aos emigrantes russos que tive-ram vistos negados etc.).

pelo direito ao Meio-terMo

Uma visão um tanto idea-lista, mas fundamentalmen-te russa.Existem muitos Bukóvskis vi-vendo na Rússia, alguns dos quais a imprensa ocidental transforma em heróis. Em muitos casos, isso é correto. O que está errado é a visão de que o mundo ocidental faz jus aos ideais bukovskonianos.

Sendo os mestres do meio-termo, os ocidentais deve-riam permitir algum aos rus-sos também, e parar de estabelecer um padrão dife-renciado, ainda que este tenha sido inventado por um de nossos idealistas.

Dmítri babitch

analista político

Dmítri Babitch é colunista da agência de notícias RIA Nóvosti.

presidenciais quando tinha 20 anos porque então só quem tinha mais de 35 anos podia se candidatar. Esse tipo de atitude pode pa-recer inconcebível para uma mente ocidental, que enxer-ga um indivíduo primeiro como eleitor e consumidor. Os russos estão preocupados com o indivíduo como um todo. É de se notar que até hoje nenhum juiz ou advo-gado tenha se tornado uma autoridade moral na Rússia (Lênin era advogado apenas por formação). No entanto, ao menos quatro escritores de ficção, sim: Tolstói, Tur-guienev, Dostoiévski e Sol-jenítsin. O motivo provavel-mente seja o fato de o escritor ver o ser humano como pes-soa, e não como cidadão. Claro que nem todo russo moderno almeja isso. Mas esse tipo tradicional ainda

existe. Essa busca do abso-luto é mais visível em revo-lucionários, incluindo dissi-dentes atuais.O ativista político Vladímir Bukóvski, que emigrou para os EUA nos anos 70, deu um passo tipicamente russo ao tentar prender Mikhail Gor-batchov em Londres duran-te a festa de aniversário de 80 anos do ex-presidente soviético. Para a mente pragmática do Ocidente, os feitos de Gor-batchov superam as brutais intervenções militares em Baku, Riga e Vilnius. Para Bukóvski, alguém sem ide-ais merece cadeia, e não um baile de aniversário. Mas a “lógica impiedosa da mente russa”, como diz uma expres-são do século 19, não fica atrás do comportamento ocidental. Foi isso que Bukóvski escre-

Algo semelhante ocorre com o PLDR (Partido Liberal De-mocrata), cujo líder Vladímir Jirinóvski parece também bastante ultrapassado. Seu antigo ardor nacionalista di-minuiu e ele já não é mais visto como um extremista, mas sim como um político completa-mente são e até mesmo de ideias construtivas, que vez por outra ainda brilham no horizonte bastante opaco e cinzento da política russa. Sendo o PLDR um partido de um homem só, de um só líder, a dúvida que resta é se ape-nas a força política de Jirinó-vski poderá conduzi-lo ao Congresso. Ainda é cedo para responder essa questão, mas as chances são boas.Ainda mais dúvidas suscitam as perspectivas do partido RJ (Rússia Justa), cujo líder Ser-guêi Mironov até recentemen-te ocupava o cargo de porta-voz do Conselho da Federação, a câmara super ior do Parlamento.

De acordo com pesquisas, as intenções de voto do RJ giram em torno de 4% a 5%. Para alcançar o Congresso são ne-cessários 7%, mas aqueles que obtiverem de 5% a 7% pode-rão contar com uma ou duas vagas, de acordo com a emen-da à legislação aprovada pelo presidente há dois anos. Porém, após Mironov ter dis-cutido com a governadora da região de São Petersburgo, Va-lentina Matvienko, o partido governista “Rússia Unida” de-cidiu destituí-lo do terceiro cargo mais importante do go-verno, no Conselho da Fede-ração. Pode parecer um pa-radoxo, mas isso pode ser de grande valia para o RJ. Mi-ronov assumirá o papel de “perseguido pelo poder” e o partido encontrará uma forma mais nítida de oposição, dan-do-lhe um posicionamento po-lítico mais claro. Mas, pelo menos até a conclu-são deste artigo, Mironov ainda não havia tirado da

manga o maior trunfo do Rus-sia Justa, Dmítri Rogózin. Representante permanente da Rússia na Otan, em Bru-xelas, Rogózin criou o par-tido nacionalista Pátria pouco antes das últimas elei-ções parlamentares e obteve, com bastante facilidade, 15% dos votos. O partido, porém, foi logo em seguida engolido pelo Rússia Justa, mas acre-dita-se que no último trimes-tre do ano Rogózin seja rein-tegrado ao RJ.Principal partido no Congres-so, o governista RU (Rússia Unida), encabeçado por Vla-dímir Pútin (que por sinal não é membro formal do partido, mas mesmo assim é o líder da bancada), pretende ir às pró-ximas eleições renovado. A direção do RU percebeu que o eleitor está cansado das ve-lhas caras e irritado porque o país não está se livrando da crise e dos diversos problemas sociais e econômicos com a ra-pidez esperada. Por isso, Pútin

anunciou a criação de uma frente nacional pré-eleitoral, uma coalizão com diversos candidatos formalmente independentes. A ala da direita também tem suas intrigas. O partido Causa Justa, cujas perspectivas nas eleições pareciam há pouco tempo bastante ruins, terá a partir do fim de junho um novo líder, o bilionário Mi-khail Prôkhorov, uma figura controversa mas de grande visibilidade. Além da evidente desvanta-gem de ter fama de playboy, afirma-se que Prôkhorov pre-tende aumentar a jornada se-manal de trabalho das atuais 40 horas para 60. Na realida-de, sua proposta visa a auto-rizar uma carga horária su-perior à de 40 horas àqueles que assim desejarem, o que é atualmente proibido pelas leis trabalhistas. Mas Prôkhorov tem suas van-tagens: é uma cara nova na política russa, desligado da

burocracia governista, caris-mático e se comporta bem nos programas de televisão. Além disso, há na Rússia um an-seio por um partido liberal de direita, um partido que expresse os interesses não dos parasitas, dos que esperam o tempo todo por um presen-tinho do governo, mas sim dos que não querem depen-der do governo e que dele es-peram apenas a liberação de suas possibilidades de reali-zação para os negócios e para os lucros.O mais interessante nesse qua-dro das eleições parlamenta-res de dezembro é que ele pra-ticamente não depende da resolução de uma outra im-portante questão da atual vida política do país: quem afinal será o candidato do partido da situação nas eleições pre-sidenciais de março de 2012? Medvedev ou Pútin?

de transporte. Entretanto, o ceticismo da época não levou em consideração o talento – não apenas empresarial, mas também político – e a lideran-ça do então novo presidente da Sukhôi, Mikhail Pogossian. Da mesma maneira, não se an-teviu a estabilização política que a Rússia alcançaria com a presidência de Vladímir Pútin e o realinhamento da economia, assim como a reor-ganização de setores estraté-gicos, como o aeroespacial. Isso teve reflexos diretos no transporte aéreo comercial russo – segmento que, com o fim da URSS, fragmentou -se desordenadamente, chegando a registrar cerca de 400 com-panhias aéreas nos anos 90, a maioria de estrutura total-mente precária, algumas ope-rando com “frotas” de apenas um ou dois velhos Túpolev ou Iliúshin. Em 2006, esse número havia caído para 185, e em 2007, mais da metade dos passagei-ros transportados na Rússia voava em aeronaves de ape-nas seis grandes companhias. Essas se fortaleceram, adqui-rindo estruturas eficientes e modernas. Um cenário, por-

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RECEITA

O fantástico Bolo de Leite de Pássaro

Um dos mais amados bolos russos possui uma história um tanto incomum: nós sabemos exatamente quem o inven-tou e quando. O Bolo de Leite de Pássaro foi criado em 1978 por Vladímir Guralnik, chef de uma confeitaria de Praga. O exótico bolo, que na fantasia traz o mágico ingrediente dos contos de fada russos, o “leite de pássaro”, na verdade ga-nhou fama por inverter a ha-bitual relação entre bolo e re-cheio. A saborosa confecção

de Guralnik alterna camadas grossas e leves de suflê com fi-nas camadas de bolo, tudo co-berto por um glacê de choco-late. Se você não pode viajar a Moscou só para deliciar-se com essa maravilha, veja a receita que Guralnik resolveu compar-tilhar, e a Gazeta Russa ajudou adap às cozinhas ocidentais. Aqui vai o truque do suflê: ágar-ágar, uma substância gelatinosa que resiste à alta temperatura necessária para produzir o xaro-pe de açúcar.

Michele A. Berdy

ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Ingredientes:Massa•¾ de xícara de açúcar; •¾ de xícara de margarina; •3 ovos; •1½ xícara de farinha peneirada; •½ colher de sopa de baunilha. Suflê•4 colheres de sopa de ágar-ágar; •1 ¾ xícara de água;•2 ½ xícaras de açúcar;•1 colher de sopa de suco de li-mão; •3 claras de ovo;•1 xícara de manteiga, em tem-peratura ambiente;•½ xícara de leite condensado. Glacê de chocolate•1 xícara de pedaços de choco-late amargo; •2 colheres de so-pa de manteiga.

Modo de preparo :1. Pré-aqueça o forno a 230 graus e unte duas assadeiras de bolo médias. 2. Prepare o bolo: Misture o açúcar com a manteiga. Depois, adicione os ovos, mexendo sem parar. Jun-te então a farinha e a baunilha. Despeje a massa em forminhas, fazendo camadas finas. Colo-que-as na parte superior do forno até que suas superfícies fiquem douradas (cerca de 10 minutos). Retire do forno e dei-xe esfriar. 3. Para o recheio: em uma panela pequena, misture o ágar-ágar com uma xícara de água e coloque em fogo bai-xo. Aqueça a mistura, mexendo sempre, até que o ágar se dis-solva. Em seguida, retire do fo-go. 4. Em uma panela grande, acrescente o açúcar e a água à mistura anterior. Leve ao fo-go até ferver. Depois, reduza o fogo e mexa sempre, até o xa-rope engrossar (cerca de 40 minutos). Pegue uma colher e teste a consistência do xarope -

se ao erguer a colher o fio não se quebrar, é porque o xarope está pronto. Adicione então o suco de limão e tire do fogo. Despeje em um recipiente de vidro e deixe esfriar à temperatura ambiente, mexendo de vez em quando. 5. Em um recipiente pequeno, bata a manteiga. Depois, misture o lei-te condensado e reserve. 6. Use uma batedeira para bater claras em neve com uma pitada de cre-me de tártaro. Com a batedei-ra em movimento, despeje aos poucos o xarope de ágar-ágar. A mistura final deve ser grossa e le-vemente brilhante. Reserve por 5 minutos. 7. Acrescente a mis-tura de manteiga e leite conden-sado aos demais ingredientes, mexendo devagar com as mãos, e depois com batedeira, até que forme uma massa homogênea. 8. Para montar o bolo: unte uma fôrma média com laterais remo-víveis. Coloque uma camada de bolo no fundo e cubra com me-tade da mistura do suflê. Colo-que então mais uma camada de bolo e novamente cubra-a com o restante do recheio. Deixe o bo-lo na geladeira por 15 minutos. 9. Para o glacê: derreta os peda-ços de chocolate e a manteiga em banho-maria, misturando-os bem. Retire o bolo da geladeira e use uma faca ou espátula pa-ra cobrir o bolo com o glacê de chocolate. Coloque na geladeira para esfriar. 10. Antes de servir, remova a lateral da fôrma. Pa-ra servir, aqueça uma faca com água quente, para cortar o glacê sem quebrá-lo. Dica: Assim que você terminar de usar as panelas com ágar-ágar e açúcar, coloque-as imediatamen-te em água quente para que não grudem nos recipientes.

CALENDÁRIO CULTURA E NEGÓCIOS

SEMANA DA LÍNGUA E DA CULTURA RUSSADE 4 A 8 DE JULHO, HORÁRIOS A CONFERIR, BIBLIOTECA MÁRIO DE ANDRADE, SÃO PAULOO Grupo Volga promove na biblioteca um ciclo de palestras e eventos para celebrar o nascimento do maior poeta russo, Aleksandr Púchkin.www.grupovolga.com.br

TORRE DE BABEL NO IBIRAPUERA9 DE JULHO, 15H, PLANETÁRIO DO IBIRAPUERA, SÃO PAULOA palestra organizada pelo Grupo Volga para discutir a língua russa dura 1h30 e será realizada no Auditório da Escola Municipal de Astrofísica Aristóteles Orsini. 100 vagas.

www.grupovolga.com.br ›

SONHO DE UM HOMEM RIDÍCULOATÉ 7 DE AGOSTO, AOS DOMINGOS, 19H, TEATRO ÁGORA, SÃO PAULOA peça é baseada no conto homônimo de Fiódor Dostoiévski. Homem amargurado decide se suicidar, mas menina lhe pede ajuda e muda seus planos. Dirigida por Roberto Lage.

www.agorateatro.com.br ›

BALÉ KIROVDE 24 A 28 DE AGOSTO (24 A 26 DE AGOSTO ÀS 21H, 27 E 28 DE AGOSTO ÀS 20H), TEATRO MUNICIPAL, SÃO PAULO (PARA RJ E MG, VER SITE)Um dos mais celebrados corpos de balé do mundo, composto por quase 200 bailarinos, o Kirov apresenta no Brasil o espetáculo O Lago dos Cisnes.www.dellarte.com.br

8º WASMA - WASTE MANAGEMENTDE 19 A 21 DE OUTUBRO, EKOTSENTR SOKÓLNIKI, MOSCOUOrganizada pela MVK-ITE Group, a feira chega a sua oitava edição apresentando equipamentos e tecnologias para um dos grandes problemas mundiais: o gerenciamento de resíduos. www.wasma.ru

CONFIRA MAISno calendário online www.gazetarussa.com.br

Restauração Trabalho, iniciado em 2005, chegou a envolver 3,2 mil pessoas ao mesmo tempo

" Existia um perigo real de o prédio desabar. Só quando tudo estiver

concluído, e todas as faturas pagas, nós saberemos o quan-to custou.”

FRASE

Mikhail SídorovREPRESENTANTE DA EMPREITEIRA

SUMMA CAPITAL

Entre as paredes do Teatro Bolshoi vive o coração da cul-tura russa. Ao longo de sua ilustre história, ali já se viu o balé de Maia Plisêtskaia, o canto lírico de Fiódor Chali-ápin e o discurso revolucio-nário de Vladímir Lênin. Hoje, as recém-reformadas co-lunas de calcário brilham ao sol e acendem a fachada do local, enquanto Apolo, senta-do, vigia todos do topo do pré-dio. Muitos moscovitas pas-sam por ali em seus intervalos de almoço e param no peque-no parque em frente ao tea-tro. Tem-se a impressão de que o Bolshoi já está aberto. Visitantes e moradores, porém, precisarão esperar mais um pouco para se juntarem no te-atro e ter o prazer de assistir à Dança dos Pequenos Cisnes, de Tchaikóvski. Depois de seis longos anos de trabalho de res-tauração, o mundialmente fa-moso espaço de ópera e balé irá reabrir em 28 de outubro deste ano com apresentações de Lago dos Cisnes, O Que-bra-nozes e Boris Godunov, de Mússorgski.Atualmente, dois trabalhado-res estão no topo de um guin-daste à esquerda das colunas, polindo e limpando uma placa na qual o nome “Lênin” apa-rece em letras garrafais. Foi aqui que, em 1922, o líder dos soviétios realizou seu último discurso antes de morrer. É

Após reforma complicada e marcada por denúncias de corrupção, Teatro Bolshoi finalmente reabre em outubro.

uma das poucas ligações do Bolshoi com as sete décadas de regime comunista. O tea-tro teve sua fase mais proe-minente no século 19.

História e acústica Fundado em 1776, o teatro passou por diversas modi� -cações ao longo das décadas seguintes. Em 1853, precisou ser completamente reconstru-ído após ser destruído por um incêndio. Mas a arquitetura clássica russa assinada pelo arquiteto ítalo-russo Alberto Camillo Cavos, que o mundo associa ao Bolshoi, ainda está ali. E faz toda a diferença.Filho de um compositor, Cavos ocupou uma posição impor-

tante na acústica da nova es-trutura. Ele não apenas re-vestiu as paredes com madeira de ressonância, mas também usou madeira no revestimen-to do teto e do chão. Orna-mentos, como, por exemplo, o Atlas, não foram construídos de gesso, mas sim de papel machê, para que não prejudi-cassem as ondas sonoras. O salão de ópera do teatro não só tem formato de violino, como também produziu por muitos anos um som tão puro como o desse instrumento.

Economia à soviéticaDurante os tempos soviéticos, nunca havia tempo su� ciente

para restaurar o edifício por completo, já que o teatro abri-gava não somente espetácu-los de ópera e balé, como tam-bém assembleias e congressos. Nessa época, muitos dos ma-teriais originais de altíssima qualidade foram substituídos por outros, mais baratos, e tais mudanças provocaram danos que foram além da acústica. “Havia enormes rachaduras, de até 30 centímetros de com-primento, nas paredes prin-cipais”, explica Mikhail Sído-rov, representante da Summa Capital, empreiteira respon-sável pelo projeto de restau-ração desde 2009. “Existia um perigo real de o prédio desa-bar”, conta.

A primeira fase da reconstru-ção, portanto, consistia na re-cuperação do edifício. Sete mil colunas de aço foram � nca-das na terra e, em seguida, a fundação antiga foi removi-da. “O edifício inteiro � cou então pairando no ar”, lem-bra Sídorov.A nova fundação não foi � -nalizada até setembro de 2009, quando os pilares de aço pu-deram ser removidos. Desde então, o canteiro de obras no centro de Moscou, a menos de cinco minutos a pé do Kre-mlin, transformou-se em um formigueiro. Três mil e du-zentas pessoas trabalharam no projeto ao mesmo tempo.

Enquanto alguns operários de uma empresa especializada cobriam os ornamentos da sa-cada com ouro, outros reins-talavam as tapeçarias de seda restauradas. Sob a terra, era um barulho só: uma novíssima sala de es-petáculos, que também pode ser usada para ensaios da or-questra e do coral, foi cons-truída. Outra novidade do teatro é o maior palco hidráu-lico da Europa. Construído pela empresa alemã Bosch Rexroth, ele abrange uma ex-tensa área de 21m2. Os lugares do fundo da or-questra também foram am-pliados e agora têm capaci-dade para 130 músicos. Dentro do teatro, a restaura-ção tentou recriar a atmosfe-ra dos tempos áureos do sé-culo 19. Os brasões soviéticos foram removidos e substituí-dos por emblemas tsaristas, o piso foi recoberto com car-valho, e o número de assentos do salão principal foi reduzi-do de 2,1 mil para 1,7 mil.

Símbolo russoA restauração do Bolshoi é o símbolo do renascimento da cultura russa, cerca de 20 anos depois. Simultaneamente, contudo, tornou-se o exemplo perfeito dos evidentes proble-mas associados ao sistema de poder vertical do hoje primei-ro-ministro Vladímir Pútin, no qual a maioria dos assun-tos e projetos só funciona bem quando há pressão de cima.Depois do fechamento do te-atro em 2005, o projeto de res-tauração chegou a um impas-se quando representantes do governo, o prefeito de Moscou e o arquiteto-chefe Nikita Shanguin se desentenderam sobre o projeto. Em 2008, Shanguin abandonou a refor-ma e previu que a restaura-ção não � caria pronta antes de 2013. Foi então que veio o empurrão do presidente. No

início de 2009, Dmítri Med-vedev confiou a um de seus assessores mais próximos a tarefa de garantir que o tea-tro � casse pronto até 2011. Processos judiciais foram abertos contras diversos gru-pos envolvidos na obra, acu-sados de pagar diversas vezes o mesmo fornecedor. O órgão de auditoria da Rússia acu-sou que os custos do projeto de restauração tinham ultra-passado mais de 16 vezes a estimativa inicial. Hoje, há quem diga que o custo da re-forma está em 1,5 bilhão de euros, mas o ministro da Cul-tura da Rússia divulgou re-centemente um valor de cerca de 500 milhões de euros. “Quando tudo estiver pronto e todas as contas estiverem pagas, nós saberemos o quan-to custou”, diz Sídorov.

MORITZ GATHMANNGAZETA RUSSA

Resquícios soviéticos foram substituídos por pompa tsarista, e o piso foi coberto com carvalho

Ministro da Cultura afirma que projeto do teatro custou 500 mi de euros, mas há quem fale em 1,5 bi

Bolshoi, seis anos depois

Um incêndio no arsenal militar russo nº102 pintou de verme-lho o céu da região de Malopurguínski, mil quilômetros a leste de Moscou. O fogo tomou 18 armazéns com munição e cerca de 150 edifícios, provocando diversas explosões das munições guardadas no local. Cerca de 28 mil pessoas foram evacuadas. FOTO: Konstantin Ivtchin, RIA Nóvosti

INCÊNDIOACIDENTE DEIXA UM MORTO E 28 MIL SÃO EVACUADOS

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