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Notas de Aula ´ Algebra 2 Martino Garonzi Universidade de Bras´ ılia Primeiro semestre 2016 1

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Notas de Aula Algebra 2

Martino Garonzi

Universidade de Brasılia

Primeiro semestre 2016

1

Oft sprechen die Leute uber langweilige Sachen.

2

Conteudo

1 Grupos 41.1 Grupo simetrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51.2 Ordem de um elemento e grupos cıclicos . . . . . . . . . . . . . . 61.3 Subgrupos e teorema de Lagrange . . . . . . . . . . . . . . . . . 81.4 Subgrupos normais e grupos quociente . . . . . . . . . . . . . . . 111.5 O grupo alternado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141.6 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191.7 Homomorfismos, Teorema de Isomorfismo . . . . . . . . . . . . . 261.8 Sobre produtos diretos e grupos abelianos finitos . . . . . . . . . 321.9 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

2 Aneis comutativos unitarios 402.1 Ideais, quocientes, teorema de isomorfismo . . . . . . . . . . . . . 432.2 Polinomios, divisao com resto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 452.3 Ideais gerados por elementos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 472.4 Domınios Euclidianos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 492.5 Ideais de um anel quociente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 502.6 Mais sobre domınios Euclidianos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 522.7 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 542.8 Z[i] e Euclidiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 622.9 Fatoracao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 632.10 Domınios principais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 662.11 O teorema de Gauss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 702.12 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

3 Corpos 803.1 Construcao de corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 813.2 Os elementos irredutıveis de Z[i] . . . . . . . . . . . . . . . . . . 813.3 Um resultado de teoria dos numeros (algebrica) . . . . . . . . . . 833.4 Um corpo finito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 843.5 Polinomios irredutıveis em Z[X] e em Q[X] . . . . . . . . . . . . 853.6 Extensoes de corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 873.7 Formula do grau . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 903.8 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 923.9 Corpo de decomposicao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1003.10 Estrutura dos corpos finitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1023.11 Exercıcios resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

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1 Grupos

Definicao 1. Um conjunto G com uma operacao G × G → G, (a, b) 7→ a · b eum grupo se satisfaz as propriedades seguintes.

1. Associatividade: (a · b) · c = a · (b · c) para todo a, b, c ∈ G.

2. Elemento neutro: existe e ∈ G tal que a · e = a = e · a para todo a ∈ G.

3. Elemento inverso: para todo a ∈ G existe b ∈ G tal que a · b = e = b · a.

O grupo G e dito abeliano ou comutativo se ab = ba para todo a, b ∈ G.

A notacao formal de um grupo G com a sua operacao · e (G, ·). As vezessera usada a notacao ab em vez de a · b. Observe que se a, b, c ∈ G entao oproduto abc esta bem definido porque as duas interpretacoes possıveis, (ab)c ea(bc), sao iguais pela propriedade associativa.

Algumas consequencias imediatas:

• O elemento neutro e unico: se e, e′ sao dois elementos neutros entao e = ee′

sendo e′ um elemento neutro e ee′ = e′ sendo e um elemento neutro. Logoe = e′.

• O inverso e unico: se b, b′ sao inversos de a entao ab = e = ba e ab′ = e =b′a logo b = be = bab′ = eb′ = b′. Vamos denotar o (unico) inverso de apor a−1.

• Se a, b, x ∈ G e ax = bx entao a = b. De fato, multiplicando por x−1 adireita obtemos axx−1 = bxx−1 logo ae = be, isto e, a = b. Similarmente,se xa = xb entao a = b.

Alguns exemplos:

• (Z,+) e um grupo abeliano, onde Z denota o conjunto dos numeros intei-ros, Z = {. . . ,−2,−1, 0, 1, 2, . . .}. A operacao aqui e a soma, (a, b) 7→ a+b.O elemento neutro e 0 e o inverso de a e −a.

• (Q,+), (R,+) e (C,+) sao grupos tambem.

• (Q−{0}, ·), (R−{0}, ·) e (C−{0}, ·) sao grupos abelianos tambem. Aquio elemento neutro e 1 e o inverso de a e 1/a.

Como voces ja perceberam, tem duas notacoes que vamos utilizar.

1. Notacao multiplicativa: (a, b) 7→ a · b = ab. Nesse tipo de notacao oelemento neutro e indicado por 1 e o inverso de a e indicado por a−1.

2. Notacao aditiva: (a, b) 7→ a + b. Nesse tipo de notacao (mais usada paragrupos abelianos) o elemento neutro e indicado por 0 e o inverso de a eindicado por −a.

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Observamos tambem que existem operacoes nao associativas: por exemplo(a, b) 7→ a− b e uma operacao de Z que nao e associativa, porque (a− b)− c 6=a− (b− c) em geral: de fato (a− b)− c = a− b− c e a− (b− c) = a− b+ c saodiferentes se c 6= 0.

1.1 Grupo simetrico

Os exemplos dados ate agora sao de grupos abelianos. Vamos introduzir umexemplo importante de grupo nao abeliano.

Seja X um conjunto. Uma permutacao de X e uma bijecao X → X. Ogrupo simetrico de X e o conjunto G = Sym(X) de todas as permutacoes de Xcom a operacao de composicao. Lembre-se que a composicao entre f, g : X → Xe a funcao fg = f ◦ g definida assim: (f ◦ g)(x) := f(g(x)). O elemento neutronesse grupo e a identidade, idX , definida por idX(x) := x para todo x ∈ X. SeX = {1, . . . , n} vamos usar a notacao Sn para denotar Sym(X).

Por exemplo seja X = {1, 2, 3} assim G = S3. Para descrever uma per-mutacao f de X (isto e, um elemento de G = S3) precisamos escrever as ima-gens de 1, 2, 3, isto e, os elementos f(1), f(2), f(3). Uma notacao que vamosusar e (

1 2 3f(1) f(2) f(3)

).

Assim por exemplo a identidade e

(1 2 31 2 3

). Tem permutacoes que nao sao

a identidade, por exemplo(1 2 32 1 3

),

(1 2 33 2 1

),

(1 2 31 3 2

),

(1 2 32 3 1

),

(1 2 33 1 2

).

As permutacoes listadas sao todos os elementos de G = S3.Vamos introduzir uma notacao diferente para os elementos de G que vai

ser util, a notacao cıclica. Um ciclo e indicado por (12 . . .m), e significa oseguinte: 1 7→ 2 7→ 3 7→ . . . 7→ m 7→ 1. Os elementos que nao aparecem no ciclo(por exemplo m+1,m+2, . . .) sao elementos fixados pelo ciclo: m+1 7→ m+1,

m+ 2 7→ m+ 2, . . . Por exemplo a permutacao

(1 2 32 1 3

)escrita na notacao

cıclica e (12) (o elemento 3 nao aparece, isto significa que 3 7→ 3), a permutacao(1 2 32 3 1

)na notacao cıclica e (123). O elemento neutro nessa notacao e

indicado por 1. De maneira mais geral(1 2 31 2 3

)= 1,

(1 2 32 1 3

)= (12),

(1 2 33 2 1

)= (13),

(1 2 31 3 2

)= (23),

(1 2 32 3 1

)= (123),

(1 2 33 1 2

)= (132).

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Vamos calcular o produto fg onde f = (12) e g = (13). Para conhecer umapermutacao de X precisamos conhecer a imagem de todos os elementos de X,nesse caso 1, 2, 3. Em outras palavras, queremos calcular fg(1), fg(2), fg(3).Lembre-se que a definicao de fg e a seguinte: (fg)(x) := f(g(x)). Logo, comof(1) = 2, f(2) = 1, f(3) = 3, g(1) = 3, g(2) = 2 e g(3) = 1 temos

• (fg)(1) = f(g(1)) = f(3) = 3,

• (fg)(2) = f(g(2)) = f(2) = 1,

• (fg)(3) = f(g(3)) = f(1) = 2.

Em outras palavras fg = (132). Um calculo parecido mostra que gf = (123),logo fg 6= gf . Isso implica que S3 e um grupo nao abeliano.

Atencao: nao tem unica expressao na notacao cıclica: por exemplo (123) =(231) = (312) e (12) = (21). Por outro lado, tem uma unica expressao de umcıclo que comeca com um dado elemento: por exemplo (123) e a unica expressaodesse ciclo que comeca com 1.

Atencao: nem toda permutacao e um ciclo. Por outro lado, toda per-mutacao e um produto de ciclos. Por exemplo em S4 = Sym({1, 2, 3, 4}) o

elemento

(1 2 3 42 1 4 3

)= (12)(34) nao e um ciclo.

Em geral dado x ∈ X e dada f uma permutacao de um conjunto finitoX, o ciclo de f contendo x e (x, f(x), f(f(x)), . . . , fm(x)) onde fk(x) indicaa aplicacao de f k vezes e fm+1(x) = x. Por exemplo dada a permutacao

f =

(1 2 3 4 54 3 5 1 2

)o ciclo de f contendo 1 e (14) e o ciclo de f contendo

2 e (235), logo f = (14)(235). Esta e a maneira em que podemos escrever todapermutacao como produto de ciclos (disjuntos).

A ordem de um grupo G e a cardinalidade de G, indicada com |G|. SeG nao for finito dizemos que G tem ordem infinita. Observe que dado G =Sn = Sym({1, 2, . . . , n}), a ordem de G e n! = n(n − 1)(n − 2) · · · 3 · 2 · 1. Defato, para construir f ∈ G temos n escolhas para f(1), n− 1 escolhas para f(2)(como f e injetiva, deve ser f(2) 6= f(1)), n − 2 escolhas para f(3) (como fe injetiva, deve ser f(3) 6= f(1) e f(3) 6= f(2)) e assim por diante, logo temosn(n− 1)(n− 2) · · · 3 · 2 · 1 = n! escolhas para f .

Exercıcio: Escreva os elementos de S4 nas duas notacoes. Observe que|S4| = 4! = 24.

1.2 Ordem de um elemento e grupos cıclicos

Dado G um grupo e g ∈ G, a ordem de g, indicada por o(g), e o menor inteiropositivo n tal que gn = 1, onde por definicao gn = gg · · · g (n vezes) - essa

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escrita faz sentido gracas a propriedade associativa. Observe que em notacaoaditiva, a ordem de g e o menor inteiro positivo n tal que ng = 0. Se um talinteiro n nao existir dizemos que g tem ordem infinita.

Observamos que podemos falar tambem de potencias com exponente nega-tivo: se n e um inteiro negativo definimos gn := (g−1)−n. Isso faz sentido porquesabemos o que e g−1 e ja definimos potencias a exponente positivo (observe que−n e um numero inteiro positivo, pois n < 0). Tambem, definimos g0 = 1.

Proposicao 1. Seja g ∈ G. A ordem de g em G e igual a n se e somente segn = 1 e toda vez que m e um inteiro tal que gm = 1 entao n divide m.

Demonstracao. Seja n a ordem de g. E claro que se m = 0 entao gm = 1 e ndivide 0. Supomos m positivo. A divisao com resto de m por n da um quocienteq e um resto r tais que m = nq + r sendo que 0 ≤ r < n. Temos

1 = gm = gnq+r = gnqgr = (gn)qgr = 1qgr = gr,

logo gr = 1. Mas por definicao de ordem de um elemento, como o(g) = n e0 ≤ r < n, devemos ter r = 0. Isso implica que m = nq logo n divide m.

Supomos agora m negativo. Observe que o(g−1) = o(g) = n, de fato sek e um inteiro qualquer entao (g−1)k = (gk)−1 logo gk = 1 se e somente se(g−1)k = 1. Obtemos que 1 = gm = (g−1)−m e pelo caso anterior o(g−1) = ndivide −m, logo n divide m.

Vamos provar o reciproco. Seja n um inteiro positivo tal que toda vez quegm = 1, n divide m. Se o(g) = k entao gk = 1 logo n divide k, em particularn ≤ k. Como k e a ordem de g e gn = 1 devemos ter n = k (por minimalidadede k).

Um grupo G e dito ser cıclico se existir x ∈ G tal que G = {xm : m ∈ Z}.Escreveremos G = 〈x〉, e x e dito um gerador de G.

• (Z,+) e um grupo ciclico infinito. De fato, todo elemento de Z tem aforma 0 ou 1 + 1 + . . .+ 1 ou (−1) + (−1) + . . .+ (−1). Observe que umapotencia de 1 em notacao aditiva e simplesmente um multiplo de 1.

• (Z/nZ,+) e um grupo ciclico finito de ordem n. De fato, G = Z/nZ ={0, 1, 2, . . . , n−1} onde a operacao e a soma modulo n. G e ciclico porquetodo elemento e uma soma de uns: 2 = 1 + 1, 3 = 1 + 1 + 1, etcetera.

• O grupo cıclico de ordem n na notacao multiplicativa sera indicado porCn. Nesse sentido, existe x ∈ Cn tal que Cn = {1, x, x2, x3, . . . , xn−1}.Observe que xn = 1 e na verdade n = o(x).

Por exemplo C6 = 〈x〉 = {1, x, x2, x3, x4, x5}. Vamos calcular as ordens doselementos de C6. E claro que o(1) = 1 e o(x) = 6.

• o(x2) = 3. De fato (x2)2 = x4 6= 1 e (x2)3 = x6 = 1.

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• o(x3) = 2. De fato (x3)2 = x6 = 1.

• o(x4) = 3. De fato (x4)2 = x8 = x2 6= 1 e (x4)3 = x12 = x0 = 1.

• o(x5) = 6. De fato (x5)2 = x10 = x4, (x5)3 = x15 = x3, (x5)4 = x20 = x2,(x5)5 = x25 = x, (x5)6 = x30 = x0 = 1.

Logo C6 contem um elemento de ordem 1, um elemento de ordem 2, doiselementos de ordem 3 e dois elementos de ordem 6.

Um elemento y ∈ Cn tal que o(y) = n chama-se gerador de Cn. Neste caso,〈y〉 = Cn. Por exemplo os geradores do grupo C6 = 〈x〉 sao x e x5.

Proposicao 2. Seja G = Cn = 〈x〉. Seja k um inteiro positivo e seja (n, k) omaior divisor comum entre n e k.

1. o(xk) = n/(n, k).

2. 〈xk〉 = 〈x(n,k)〉.

Demonstracao. Seja m = o(xk). Logo (xk)m = 1, isto e, xkm = 1. Pelaproposicao 1, n divide km, logo n/d divide m, sendo d = (n, k). Por outro lado(xk)n/d = xkn/d = (xn)k/d = 1k/d = 1 sendo k/d um numero inteiro. Isso provaque m = n/d.

Agora vamos mostrar que 〈xk〉 = 〈x(n,k)〉. Pelo algoritmo de Euclide existema, b ∈ Z tais que d = (n, k) = na+ kb, logo xd = xna+kb = (xn)a(xk)b = (xk)b.Isso mostra que xd ∈ 〈xk, logo 〈xd〉 ⊆ 〈xk〉. Por outro lado como d divide k,e claro que xk ∈ 〈xd〉, isto e, 〈xk〉 ⊆ 〈xd〉. As duas inclusoes mostram que〈xk〉 = 〈xd〉.

Uma consequencia facil e que 〈x〉 = 〈xk〉 se e somente se (n, k) = 1, onden = o(x). Logo, o numero de geradores de Cn e igual ao numero dos inteirosk ∈ {1, 2, . . . , n − 1} tais que (n, k) = 1. Esse numero e indicado por ϕ(n) e ϕe chamada funcao de Euler. Por exemplo C6 = 〈x〉 tem ϕ(6) = 2 geradores,x e x5.

1.3 Subgrupos e teorema de Lagrange

Definicao 2 (Subgrupo). Um subconjunto H de um grupo G se chama sub-grupo de G se as seguintes condicoes valem.

• 1 ∈ H;

• se h ∈ H entao h−1 ∈ H;

• se h1, h2 ∈ H entao h1h2 ∈ H.

Se H e um subgrupo de G escrevemos H ≤ G.

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Em outras palavras, um subconjunto H e um subgrupo se e um grupo com amesma operacao de G e o mesmo elemento neutro 1. Observe que a propriedadeassociativa de H segue automaticamente daquela de G.

Por exemplo se Cn = 〈x〉 entao H = 〈x2〉 ≤ Cn. Lembre que temos H = Cnse e somente se (n, 2) = 1, isto e, n e impar.

Um outro exemplo e S3 = {1, (12), (13), (23), (123), (132)}. Aqui temos ossubgrupos

• 〈1〉 = {1};

• 〈(12)〉 = {1, (12)};

• 〈(13)〉 = {1, (13)};

• 〈(23)〉 = {1, (23)};

• 〈(123)〉 = {1, (123), (132)}.

Os subgrupos listados sao, na verdade, todos os subgrupos proprios de S3

(subgrupos diferentes de S3). Observe que S3 nao e um grupo abeliano (mos-tramos ja que (12)(13) 6= (13)(12)), em particular S3 nao e cıclico (porque todogrupo cıclico e abeliano).

Definicao 3 (Classe lateral). Seja H um subgrupo de um grupo G. Uma classelateral a esquerda de H e um conjunto da forma gH = {gh : h ∈ H} sendog ∈ G um elemento dado. Uma classe lateral a direita de H e um conjuntoda forma Hg = {hg : h ∈ H} onde g ∈ G e um elemento dado.

Entao por exemplo seja H = 〈(123)〉 = {1, (123), (132)} ≤ S3. A classelateral a esquerda (12)H de H e o conjunto

{(12)1, (12)(123), (12)(132)} = {(12), (23), (13)}.

A classe lateral a direita H(12) de H e o conjunto

{1(12), (123)(12), (132)(12)} = {(12), (13), (23)}.

Observe que H(12) = (12)H nesse caso.Seja K = 〈(12)〉 = {1, (12)} ≤ S3. Entao (123)H = {(123)1, (123)(12)} =

{(123), (13)} e H(123) = {1(123), (12)(123)} = {(123), (23)}. Observe que(123)H 6= H(123).

No que segue vamos trabalhar com classes laterais a esquerda.

Definicao 4. Seja H ≤ G, o ındice de H em G e o numero de classes lateraisa esquerda de H em G. O ındice de um subgrupo pode ser finito ou infinito, ee indicado por |G : H|.

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Observe que o numero de classes laterais a direita de H em G e tambemigual a |G : H|.

Teorema 1 (Lagrange). Seja G um grupo finito e seja H ≤ G. Entao |G :H| = |G|/|H|, em particular |H| divide |G|.

Demonstracao. Para mostrar esse teorema precisamos de algumas propriedadesdas classes laterais.

1.⋃g∈G gH = G. De fato a inclusao ⊆ e obvia e se g ∈ G entao g ∈ gH, e

isso mostra a inclusao ⊇.

2. Seja g ∈ G. Entao gH = H se e somente se g ∈ H. Para mostrar issomostramos as duas implicacoes. Se gH = H entao g = g ·1 ∈ gH = H logog ∈ H. Agora supomos g ∈ H. Entao se h ∈ H, h = g(g−1h) ∈ gH sendog−1h ∈ H, porque g, h ∈ H. Isso mostra que H ⊆ gH. Para mostrar aoutra inclusao gH ⊆ H basta observar que se h ∈ H entao gh ∈ H porqueg, h ∈ H.

3. Sejam x, y ∈ G. Entao xH = yH se e somente se y−1x ∈ H. De fato,multiplicando a esquerda por y−1, temos que xH = yH se e somente sey−1xH = H e pelo item anterior, isso e equivalente a y−1x ∈ H.

4. Seja g ∈ G. Entao a funcao H → gH que manda h em gh e bijetiva epor consequencia |gH| = |H|. Para mostrar isso basta construir a inversa:definimos f−1(x) := g−1x. Logo f(f−1(x)) = f(g−1x) = gg−1x = x ef−1(f(x)) = f−1(gx) = g−1gx = x. Isso mostra que f e bijetiva.

Agora observe que se xH e yH sao duas classes laterais entao ou xH = yHou xH ∩yH = ∅. De fato, se a intersecao xH ∩yH nao e vazia entao ela contemum elemento g. Temos g ∈ xH, logo x−1g ∈ H e sabemos que isso significagH = xH. Analogamente g ∈ yH, logo y−1g ∈ H e sabemos que isso significagH = yH. Logo xH = gH = yH.

Por consequencia, se g1H, g2H, . . ., gkH sao as classes laterais a esquerdade H em G, onde k = |G : H|, a uniao G = g1H ∪ . . . ∪ gkH e disjunta, e como|giH| = |H| para todo i, temos

|G| = |g1H ∪ . . . ∪ gkH| = |g1H|+ . . .+ |gkH| = |H|+ . . .+ |H| = k|H|.

Isso conclui a demonstracao do teorema de Lagrange.

Uma outra maneira de dizer que as classes laterais a esquerda de H em Gformam uma particao de G e o fato que a seguinte e uma relacao de equivalenciaem G (verifique!): x ∼ y se e somente se y−1x ∈ H.

Por exemplo seja G = C6 = 〈x〉 = {1, x, x2, x3, x4, x5}. Esse grupo temordem 6, o subgrupo 〈x2〉 tem ordem o(x2) = 3, o subgrupo 〈x3〉 tem ordemo(x3) = 2 e 2 e 3 dividem 6.

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Por exemplo seja G = S3 = {1, (12), (13), (23), (123), (132)}. Esse grupotem ordem 6, o subgrupo 〈(12)〉 tem ordem 2, o subgrupo 〈(123)〉 tem ordem 3e 2 e 3 dividem |G| = 3! = 6.

Uma primeira consequencia importante do teorema de Lagrange e a seguinte.

Proposicao 3. Seja G um grupo de ordem |G| = p, um numero primo. EntaoG e cıclico.

Demonstracao. Como |G| = p > 1 existe g ∈ G diferente de 1. Seja H := 〈g〉.Pelo teorema de Lagrange, como H e um subgrupo de G temos que |H| divide|G| = p. Como p e um numero primo, isso implica que |H| = 1 ou |H| = p. Mase claro que |H| 6= 1, pois H contem pelo menos dois elementos: 1 e g (lembre-seque g 6= 1). Logo |H| = p = |G|. Mas entao G e um conjunto finito com pelementos e H e um subconjunto de G com o mesmo numero de elementos. Issoimplica que H = G, logo G = H = 〈g〉 e cıclico.

1.4 Subgrupos normais e grupos quociente

Definicao 5. Seja H um subgrupo de G. O insieme quociente das classeslaterais a esquerda de H em G e G/H := {gH : g ∈ G}, o conjunto de todasas classes laterais de H em G.

Por definicao de indice, |G/H| = |G : H|. Observe que pelo teorema deLagrange, se G e finito entao |G/H| = |G|/|H|.

O que queremos fazer agora e tentar dar uma estrutura de grupo ao quocienteG/H. Para fazer isso precisamos definir uma operacao, e a operacao maisnatural e a seguinte:

(xH) · (yH) := (xy)H. (∗)

Mas observe que esse produto depende das escolhas de x e y, entao pode acon-tecer que nao seja bem definido. Queremos saber qual hipotese precisamos porsobre H para ter certeza que o produto acima seja bem definido.

Suponha que o produto (∗) seja bem definido, e seja g ∈ G. Se h ∈ H entaotemos gH = ghH, pois (gh)−1g = h−1g−1g = h−1 ∈ H. Podemos calcular oproduto (gH) · (g−1H) de duas formas diferentes:

(gH) · (g−1H) = (gg−1)H = 1H = H,

(ghH) · (g−1H) = (ghg−1)H.

Como o produto e bem definido por hipotese, o resultado dos dois calculos temque ser o mesmo, em outras palavras H = (ghg−1)H. Sabemos que isso significaghg−1 ∈ H. Entao essa condicao e o que precisamos para ter uma estrutura degrupo em G/H.

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Definicao 6 (Subgrupo normal, Grupo quociente). Um subgrupo H de umgrupo G e dito normal se ghg−1 ∈ H para todo g ∈ G, h ∈ H. EscrevemosH E G. Nesse caso, o quociente G/H = {gH : g ∈ G} e um grupo (grupoquociente) com a operacao

(xH) · (yH) := (xy)H,

o elemento neutro e 1H = H e o inverso de gH e g−1H.

Observe que se por exemplo G for abeliano entao todo subgrupo de G enormal: se H ≤ G e h ∈ H, g ∈ G entao ghg−1 = gg−1h = 1h = h ∈ H. LogoH EG.

Exemplo: Seja G = S3 = {1, (12), (13), (23), (123), (132)} e seja H =〈(12)〉 = {1, (12)} ≤ S3. Temos (13)−1 = (13) pois (13)(13) = 1, logo

(13)(12)(13)−1 = (13)(12)(13) = (23) 6∈ H.

Isso mostra que H nao e normal em G.

Seja agora K = 〈(123)〉 ≤ G = S3. Observe que 1−1 = 1, (12)−1 = (12),(13)−1 = (13), (23)−1 = (23), (123)−1 = (132) e (132)−1 = (123). Temos

1(123)1−1 = (123) ∈ K, (12)(123)(12)−1 = (132) ∈ K,

(13)(123)(13)−1 = (132) ∈ K, (23)(123)(23)−1 = (132) ∈ K,

(123)(123)(123)−1 = (123) ∈ K, (132)(123)(132)−1 = (123) ∈ K.

Isso mostra que gxg−1 ∈ K para todo g ∈ G, onde x = (123). Para concluirque K e normal em G precisamos mostrar isso para os outros elementos de K,que sao 1 e x2. Mas e claro que g1g−1 = gg−1 = 1 ∈ K, entao para mostrarque K EG basta mostrar que gx2g ∈ K para todo g ∈ G. Mas gx2g = gxxg =gxg−1gxg−1 = (gxg−1)2 ∈ K porque gxg−1 ∈ K, como mostrado acima. Issomostra que K EG.

Lembre-se que um subgrupo H de um grupo G e dito normal se a operacao

(xH) · (yH) := (xy)H

da ao insieme quociente G/H = {gH : g ∈ G} a estrutura de grupo (grupoquociente). Ja vimos que isso e equivalente a condicao ghg−1 ∈ H para todog ∈ G, h ∈ H. Se H e um subgrupo normal de G escrevemos H EG.

Proposicao 4. Seja H um subgrupo de G, g ∈ G e seja Hg = {hg : h ∈ H}(classe lateral a direita). Sao equivalentes

1. H e normal;

2. Hg = gH para todo g ∈ G;

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3. gHg−1 = H para todo g ∈ G.

Demonstracao. (1) implica (2). Suponha H normal, e vamos mostrar que seg ∈ G entao Hg = gH. Mostramos as duas inclusoes. (⊆): se hg ∈ Hg entaohg = gg−1hg ∈ gH pois g−1hg ∈ H (H e normal). (⊇): se gh ∈ gH entaogh = ghg−1g ∈ Hg pois ghg−1 ∈ H (H e normal).

(2) implica (3). Se Hg = gH multiplicando a direita por g−1 obtemosH = gHg−1.

(3) implica (1). Suponha gHg−1 = H. Se g ∈ G e h ∈ H entao ghg−1 ∈gHg−1 = H logo ghg−1 ∈ H.

O resultado acima implca que se H e normal em G entao nao precisamos dedistincoes entre classes laterais de H a esquerda e a direita, podemos simples-mente falar de classes laterais de H.

Observe que se G e um grupo abeliano entao todo subgrupo H de Ge normal: se g ∈ G e h ∈ H entao hg−1 = g−1h (porque G e abeliano), logoghg−1 = gg−1h = h ∈ H.

Observe que G = Cn = {1, x, x2, . . . , xn−1} = 〈x〉 e abeliano: se xa, xb saodois elementos de Cn entao

xaxb = xa+b = xb+a = xbxa.

Em particular, todo subgrupo de Cn e normal. Seja H um subgrupo de Cn.Vamos mostrar que

Proposicao 5. Cn/H e um grupo cıclico.

Demonstracao. Mostrar que Cn/H e um grupo cıclico significa construir umgerador, isto e, um elemento gH ∈ Cn/H tal que todo elemento de Cn/H euma potencia de gH. Vamos escolher como gerador o elemento xH. Precisamosmostrar que qualquer elemento de Cn/H e uma potencia de xH. Um elementoqualquer de Cn/H tem a forma gH para algum g ∈ Cn, que tem a forma g = xk,logo gH = xkH. Agora por definicao de produto no quociente (aH · bH :=(ab)H) temos

xkH = xk−1xH = xk−1H · xH = xk−2xHxH = xk−2H · xH · xH =

= . . . = xH · xH · · ·xH = (xH)k.

Logo gH = xkH = (xH)k, isto e, o elemento gH e uma potencia de xH.

Observe que se x ∈ G e G e finito, entao x|G| = 1. De fato, pelo teoremade Lagrange o(x) = |〈x〉| divide |G|, isto e, |G| = ab onde a = o(x) e b e umnumero inteiro. Logo, x|G| = xab = (xa)b = 1b = 1.

Proposicao 6. Se G = Cn = 〈x〉 = {1, x, x2, . . . , xn−1} e H ≤ G entao H =〈xd〉 para algum divisor d de n, em particular H e cıclico.

13

Demonstracao. Seja m = |H|. Pelo teorema de Lagrange m divide n. Alemdisso, H EG (sendo G abeliano), e ja vimos que |G/H| = |G : H| = |G|/|H| =n/m. xH pertence ao grupo G/H, e pela observacao acima, (xH)|G/H| = H,onde H e o elemento neutro do grupo quociente G/H. Logo H = (xH)|G/H| =(xH)n/m = xn/mH. Sabemos que isso significa exatamente xn/m ∈ H. Entaotodas as potencias de xn/m tambem pertencem a H (que e um subgrupo)logo 〈xn/m〉 ≤ H. Por outro lado |〈xn/m〉| = o(xn/m) = o(x)/(o(x), n/m) =n/(n, n/m) = n/(n/m) = m. Entao estamos na situacao seguinte: 〈xn/m〉 e umsubconjunto de H com m elementos e |H| = m. Isso implica que 〈xn/m〉 = H,em particular H e cıclico e podemos escolher d = n/m.

1.5 O grupo alternado

Agora vamos construir um exemplo de um subgrupo normal de um grupo naoabeliano.

Seja G = Sn o grupo simetrico de grau n. Por exemplo lembre-se que S3 ={1, (12), (13), (23), (123), (132)}. Temos que |Sn| = n!. Considere o polinomio

T :=∏

1≤i<j≤n

(Xi −Xj)

em variaveis comutantes: XaXb = XbXa. Os fatores desse polinomio sao Pij :=Xi −Xj com i < j. Seja P = {Pij : 1 ≤ i < j ≤ n}.

Fixamos σ ∈ G = Sn. Observe que em geral se i < j pode acontecer queσ(i) < σ(j) ou σ(j) < σ(i) (nao pode acontecer que σ(i) = σ(j), por que?),entao em geral Pσ(i),σ(j) 6∈ P . Podemos definir a funcao

ϕσ : P → P, ϕσ(Pij) :=

{Pσ(i),σ(j) se σ(i) < σ(j),Pσ(j),σ(i) se σ(i) > σ(j)

A funcao ϕσ : P → P e bijetiva: de fato, a inversa dela e ϕσ−1 . Para ver issoobserve que se i < j e σ(i) < σ(j) temos ϕσ−1(ϕσ(Pij)) = ϕσ−1(Pσ(i),σ(j)) =Pσ−1(σ(i)),σ−1(σ(j)) = Pij . Se i < j e σ(i) > σ(j) temos ϕσ−1(ϕσ(Pij)) =ϕσ−1(Pσ(j),σ(i)) = Pσ−1(σ(i)),σ−1(σ(j)) = Pij . Isso implica que ϕσ−1 ◦ ϕσ e aidentidade P → P . De forma analoga se mostra que ϕσ ◦ ϕσ−1 tambem e aidentidade P → P .

A permutacao σ ∈ Sn permuta os indices no polinomio T =∏

1≤i<j≤n(Xi−Xj) da forma seguinte:

Tσ :=∏

1≤i<j≤n

(Xσ(i) −Xσ(j)).

Como Xi −Xj = −(Xj −Xi), o fato que ϕσ e bijetiva implica que Tσ = ±T .

Definicao 7 (Sinal de uma permutacao). A permutacao σ ∈ Sn e dita par seTσ = T , e dita impar se Tσ = −T . O sinal de σ, indicado com sgn(σ), e 1 seσ e par e e −1 se σ e impar, assim Tσ = sgn(σ)T .

14

Por exemplo a identidade e sempre par: T1 = T . Vamos calcular o sinal de(12), (123) ∈ S3. Temos T = (X1 −X2)(X1 −X3)(X2 −X3).

• Seja σ = (12). Tσ = (X2 −X1)(X2 −X3)(X1 −X3) = −T . σ e impar.

• Seja σ = (123). Tσ = (X2 −X3)(X2 −X1)(X3 −X1) = T . σ e par.

Uma propriedade importante do sinal e a seguinte.

Proposicao 7. Sejam σ, τ ∈ Sn. Entao sgn(στ) = sgn(σ)sgn(τ).

Demonstracao. Temos Tστ =∏

1≤i<j≤n(Xστ(i) −Xστ(j)) e reordenando os in-dices obtemos que esse produto e igual a sgn(τ)

∏1≤i<j≤n(Xσ(i) − Xσ(j)) =

sgn(τ)sgn(σ)T . Por outro lado temos Tστ = sgn(στ)T logo sgn(σ)sgn(τ) =sgn(στ).

Uma consequencia e que se σ ∈ Sn entao sgn(σ) = sgn(σ−1), de fato 1 =sgn(1) = sgn(σσ−1) = sgn(σ)sgn(σ−1) e o fato que sgn(σ), sgn(σ−1) ∈ {1,−1}implica que sgn(σ) = sgn(σ−1).

Definicao 8. O grupo alternado de grau n e An := {σ ∈ Sn : sgn(σ) = 1}, oconjunto das permutacoes pares de Sn.

Proposicao 8. An e um subgrupo normal de Sn e |Sn : An| = 2.

Demonstracao. Ja observamos que sgn(1) = 1, logo 1 ∈ An. Se σ ∈ Sn entaosgn(σ−1) = sgn(σ) = 1, logo σ−1 ∈ An. Se σ, τ ∈ An entao sgn(στ) =sgn(σ)sgn(τ) = 1 · 1 = 1, logo στ ∈ An. Isso mostra que An ≤ Sn.

Agora sejam h ∈ An e g ∈ Sn. Temos sgn(ghg−1) = sgn(g)sgn(h)sgn(g−1) =sgn(g)2sgn(h) = sgn(h) = 1, logo ghg−1 ∈ An. Isso mostra que An e normalem Sn.

Para mostrar que |Sn : An| = 2 basta mostrar que Sn = An∪ (12)An. Bastamostrar que (12) e impar, porque nesse caso se g ∈ Sn−An entao sgn(g) = −1logo sgn((12)g) = sgn((12))sgn(g) = (−1)(−1) = 1 logo (12)g ∈ An entaog ∈ (12)−1An = (12)An.

Entao falta mostrar que σ = (12) e impar. Temos T =∏i<j(Xi −Xj) logo

Tσ = (X2 −X1)∏

1<j(X1 −Xj)∏

2<j(X2 −Xj)∏

2<i<j(Xi −Xj) = −T .

Observe que como |Sn : An| = 2 temos 2 = |Sn : An| = |Sn/An| =|Sn|/|An| = n!/|An| logo |An| = n!/2. Por exemplo |A3| = 3, |A4| = 12.

Observe que se (ij) ∈ Sn entao (ij) e impar. De fato, se i, j 6= 1, 2 sejag = (1i2j), se j = 2 seja g = (1i) e se i = 1 seja g = (2j). E facil ver queg(12)g−1 = (ij), logo sgn((ij)) = sgn(g)sgn((12))sgn(g−1) = −sgn(g)2 = −1.

Observe que se σ e um ciclo (a1 a2 . . . ak) entao o(σ) = k e sgn(σ) =−(−1)k. De fato,

(a1 a2 . . . ak) = (a1 ak)(a1 ak−1) · · · (a1 a2)

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e como sgn e multiplicativa e todo (ij) e impar, sgn(σ) = (−1)k−1 = −(−1)k.Logo um ciclo de comprimento par e uma permutacao impar, um ciclo de com-primento impar e uma permutacao par.

Exemplo. A3 = {1, (123), (132)}.

Exemplo. Os elementos de S4 sao 1, (12), (13), (14), (23), (24), (34),(123), (132), (124), (142), (134), (143), (234), (243), (1234), (1243), (1324),(1342), (1423), (1432), (12)(34), (13)(24), (14)(23). Logo os elementos de A4

sao 1, (123), (132), (124), (142), (134), (143), (234), (243), (12)(34), (13)(24),(14)(23).

Seja σ uma permutacao em Sn. Podemos escrever σ como produto de cıclosdisjuntos da forma (a σ(a) σ2(a) . . .) onde a ∈ {1, . . . , n} (comecando coma = 1). Por exemplo:

(14)(1423)(6241)(523)(3416) = (13)(2465).

Essa estrutura de produto de cıclos disjuntos e a mais natural. Por exemplo

S4 = {1, (12), (13), (14), (23), (24), (34),

(123), (132), (124), (142), (134), (143), (234), (243),

(1234), (1243), (1324), (1342), (1423), (1432),

(12)(34), (13)(24), (14)(23)}.Os elementos (12)(34), (13)(24), (14)(23) nao podem ser escritos em forma decıclos singulos.

Entao, toda permutacao pode ser escrita como produto de cıclos disjuntos.Se σ e produto de cıclos disjuntos de comprimentos c1, . . . , ct, dizemos que aestrutura cıclica de σ e (c1, . . . , ct). Por exemplo (12)(345) tem estrutura cıclica(2, 3).

Como toda permutacao e um produto de cıclos (disjuntos), e o sinal de umproduto de permutacoes e o produto dos sinais, para calcular o sinal precisamosso calcular o sinal dos cıclos.

Seja σ = (a1 . . . ak) um cıclo de comprimento k e seja g ∈ Sn. Observe que

gσg−1(g(ai)) = g(ai+1) ∀i = 1, . . . , k − 1, gσg−1(g(ak)) = g(a1).

Logogσg−1 = (g(a1) . . . g(ak)).

Se (b1 . . . bk) e um qualquer outro cıclo de comprimento k entao escolhendo umg ∈ Sn tal que g(ai) = bi para i = 1, . . . , k obtemos

g(a1, . . . , ak)g−1 = (g(a1), . . . , g(ak)) = (b1, . . . , bk).

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Logo todos os cıclos do mesmo comprimento sao conjugados (dois elementosx, y sao conjugados quando existe um elemento g tal que gxg−1 = y). Maisem geral, todos os elementos da mesma estrutura cıclica sao conjugados: seσ = c1 · · · cr e τ = d1 · · · dr onde ci, di tem o mesmo comprimento li para todoi = 1, . . . , r (assim, σ e τ tem estrutura cıclica (l1, . . . , lr)) entao σ e τ saoconjugados: se g ∈ Sn e uma permutacao que leva o j-esimo elemento do cıcloci no j-esimo elemento do cıclo di entao

gσg−1 = gc1 · · · crg−1 = gc1g−1gc2g

−1 · · · gcrg−1 = d1d2 · · · dr = τ.

Por exemplo se σ = (12)(374)(89), τ = (35)(294)(68) escolhemos g levando1 7→ 3, 2 7→ 5, 3 7→ 2, 4 7→ 4, 5 7→ 1, 6 7→ 7, 7 7→ 9, 8 7→ 6, 9 7→ 8, em outraspalavras g = (1325)(6798), e obtemos gσg−1 = τ .

E facil verificar que

(a1 . . . ak) = (a1ak)(a1ak−1) · · · (a1a2).

Logo sgn((a1, . . . , ak)) = sgn(a1ak) · · · sgn(a1a2) = sgn(12)k−1 = (−1)k−1.Isso nos permite calcular o sinal de uma qualquer permutacao. Por exemplo

sgn((1529)(381)(51382)(12)) = sgn(1529)sgn(381)sgn(51382)sgn(12) =

= (−1) · 1 · 1 · (−1) = 1.

Observe que a ordem de um cıclo e o comprimento de tal cıclo. Por exemplo(1245) tem ordem 4, (512694) tem ordem 6. A estrutura cıclica nos permite decalcular facilmente a ordem de uma permutacao. De fato, se σ e um produtode cıclos disjuntos c1 · · · ck, logo a ordem de σ e o menor multiplo comum entreos comprimentos dos cıclos c1, . . . , ck.

De fato, e facil observar que dois cıclos disjuntos comutam: se (a1, . . . , ak),(b1, . . . , bh) sao cıclos disjuntos entao

(a1, . . . , ak)(b1, . . . , bh) = (b1, . . . , bh)(a1, . . . , ak).

Isso implica que se c1, . . . , ct sao cıclos disjuntos entao (c1 · · · ct)n = cn1 · · · cnt .Logo a ordem de σ = c1 · · · ct e o menor n tal que cni = 1 para todo i =1, . . . , t, isto e, o menor multiplo comum entre os comprimentos de c1, . . . , ct.Por exemplo a ordem de (14)(238961) e 6, a ordem de (1, 2, 3, 4)(5, 6, 7, 8, 9, 10)e 12.

Por exemplo

A4 = {1, (123), (132), (124), (142), (134), (143), (234), (243),

(12)(34), (13)(24), (14)(23)}

e as ordens dos elementos de A4 sao 1, 2, 3. Tem 1 elemento de ordem 1, 8 deordem 3 e 3 de ordem 2.

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Ja observamos que o sinal respeita o produto: sgn(στ) = sgn(σ)sgn(τ).Observe que conjugar tambem respeita o produto: se x, y, g sao elementos deum grupo G entao

gxyg−1 = gxg−1 · gyg−1.

Veremos que funcoes com essa propriedade sao ditas homomorfismos. Lembre-se que um subgrupo H de um grupo G e normal se ghg−1 ∈ H para todo g ∈ G,h ∈ H, em outras palavras, se H contem os conjugados dos seus elementos.Logo, e importante entender os conjugados.

Sabemos que

g(1 2 . . . k)g−1 = (g(1) g(2) . . . g(k)).

Logo, por exemplo, se σ = (123)(47)(986) e g = (142)(3987) logo

gσg−1 = (g(1) g(2) g(3))(g(4) g(7))(g(9) g(8) g(6)) = (419)(23)(876).

Observe que duas permutacoes conjugadas tem a mesma estrutura como pro-duto de cıclos disjuntos (estrutura cıclica). Isto e, escritas como produtosde cıclos disjuntos tem o mesmo numero de cıclos e os ciclos tem os mesmoscomprimentos. Na verdade essa condicao e necessaria e suficiente (no grupo si-metrico): se duas permutacoes tiver a mesma estrutura como produtos de ciclosdisjuntos entao elas sao conjugadas. Por exemplo sejam σ = (123)(47)(986),τ = (419)(85)(637). Queremos construir g ∈ Sn tal que gσg−1 = τ . Podemosconstruir g da seguinte maneira: primeiro, escrevemos σ e τ um abaixo do outroincluindo os ciclos de comprimento 1, como segue:

σ = (123)(47)(986)(5)

τ = (419)(85)(637)(2)

Agora definimos g levando todo elemento para aquele que fica abaixo dele:1 7→ 4, 2 7→ 1, 3 7→ 9, 4 7→ 8, 7 7→ 5, 9 7→ 6, 8 7→ 3, 6 7→ 7, 5 7→ 2. Emoutras palavras g = (148396752). De fato, temos gσg−1 = τ , o que pode serverificado tambem calculando

gσg−1 = (148396752)(123)(47)(986)(125769384) = (419)(85)(637) = τ.

Em outras palavras, no grupo simetrico conjugar σ com g (isto e, fazer gσg−1)significa aplicar g aos elementos dos ciclos disjuntos que aparecem em σ.

Por exemplo, no grupo S5 os elementos de estrutura (∗ ∗ ∗)(∗ ∗) sao todosconjugados. Vamos contar tais elementos. Temos

(53

)escolhas para os elementos

do ciclo de comprimento 3 e com tais elementos conseguimos construir doisciclos, e dado o 3-ciclo (ciclo de comprimento 3) temos so uma escolha para o 2-ciclo (ciclo de comprimento 2). Logo temos 2 ·

(53

)= 20 tais elementos. Observe

que todos os elementos com estrutura (∗ ∗ ∗)(∗ ∗) tem ordem 6.

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Em geral, no grupo simetrico Sn tem exatamente (n− 1)! ciclos de compri-mento n (n-ciclos). De fato, escolhido o primeiro elemento do ciclo (por exemplo1) podemos permutar os outros em todas as maneiras possıveis. Por exemploos ciclos de comprimento 4 em S4 sao 3! = 6,

(1234), (1243), (1324), (1342), (1423), (1432).

1.6 Exercıcios resolvidos

1. Escreva os elementos de S4 nas duas notacoes. Observe que |S4| = 4! = 24.

Os elementos de S4 tem a forma 1 7→ a, 2 7→ b, 3 7→ c, 4 7→ d onde asequencia abcd e uma das seguintes:

1234, 1243, 1324, 1342, 1423, 1432, 2134, 2143, 2314, 2341, 2413, 2431,

3124, 3142, 3214, 3241, 3412, 3421, 4123, 4132, 4213, 4231, 4312, 4321.

Na notacao cıclica, tais permutacoes se escrevem da forma seguinte:

1, (34), (23), (234), (243), (24),

(12), (12)(34), (123), (1234), (1243), (124),

(132), (1342), (13), (134), (13)(24), (1324),

(1432), (134), (13)(24), (1324), (1423), (14)(23).

2. Calcular as ordens dos elementos de C15.

TemosC15 = {1, x, x2, . . . , x14} = 〈x〉.

Sabemos que o(xk) = o(x)/(k, o(x)), e aplicando essa formula obtemoso(xk) = o(x) = 15 quando (k, 15) = 1, isto e, o(xk) = o(x) = 15 quandok = 1, 2, 4, 7, 8, 11, 13, 14. Alem disso, o(x3) = 15/3 = 5, o(x5) = 15/5 =3, o(x6) = 15/3 = 5, o(x9) = 15/3 = 5, o(x10) = 15/5 = 3, o(x12) =15/3 = 5.

3. Mostrar que todo grupo cıclico e abeliano. Mostrar que (Q,+) e abelianomas nao e cıclico.

Todo grupo cıclico e abeliano pois em um grupo cıclico 〈x〉 todo elementotem a forma xn para algum inteiro n e temos xnxm = xn+m = xm+n =xmxn. O grupo (Q,+) nao e cıclico: se fosse cıclico existiria x ∈ Q tal quetodo elemento de Q tem a forma nx (potencia aditiva e multiplo!) paraalgum n ∈ Z. Em particular como x/2 ∈ Q temos x/2 = nx para algumn ∈ Z, o que implica x = 2nx, logo x(1 − 2n) = 0 e como x 6= 0 (pois eclaro que Q 6= 〈0〉 = {0}) isso implica 2n = 1 que e uma contradicao.

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4. Escreva os elementos da classe lateral x〈x2〉 onde 〈x〉 = C12.

Os elementos de 〈x2〉 sao as potencias de x2, logo

〈x2〉 = {1, x2, x4, x6, x8, x10}, x〈x〉 = {x, x3, x5, x7, x9, x11}.

5. Seja H um subgrupo de S3 e suponha que H contenha (12) e (123). Mostreque H = S3.

Observe que 〈(12)〉 ≤ H, 〈(123)〉 ≤ H. Pelo teorema de Lagrange, 2 =o((12)) = |〈(12)〉| e 3 = o((123)) = |〈(123)〉| dividem |H|. Temos entaoque 2 e 3 dividem |H|, logo 6 divide |H| (em geral se dois inteiros a, bdividem n entao o menor multiplo comum entre a, b tambem divide n).Mas entaoH e um subconjunto de S3 com 6 elemento e S3 tem 6 elementos,e deduzimos que H = S3.

6. Escreva os elementos de S3/〈(123)〉.

Primeiro, observe que H = 〈(123)〉 = {1, (123), (132)} e normal em S3

porque os conjugados de x = (123) sao

1(123)1−1 = (123) ∈ H,

(12)(123)(12)−1 = (12)(123)(12) = (132) ∈ H,

(13)(123)(13)−1 = (13)(123)(13) = (132) ∈ H,

(23)(123)(23)−1 = (23)(123)(23) = (132) ∈ H,

(123)(123)(123)−1 = (123)(123)(132) = (123) ∈ H,

(132)(123)(132)−1 = (132)(123)(123) = (123) ∈ H.

Isso mostra que gxg−1 ∈ S3 para todo g ∈ S3, logo

gx2g−1 = gxxg−1 = gxg−1gxg−1 ∈ S3

para todo g ∈ S3. Como 〈x〉 = {1, x, x2} temos que 〈x〉E S3.

Agora, H tem indice 2 pois |H| = 3 e |G : H| = |G|/|H| = 6/3 = 2, logoH tem duas classes laterais, elas sao H e

(12)H = {(12), (12)(123), (12)(132)} = {(12), (23), (13)}.

Logo o grupo quociente S3/H = {H, (12)H} e um grupo cıclico de ordem2 gerado por (12)H.

20

7. Encontre todos os subgrupos normais de S3.

Ja conhecemos tres subgrupos normais de S3: {1}, S3 e 〈(123)〉. SeH ≤ S3

entao |H| divide |S3| = 6, e se |H| = 1 entao H = {1}, e se |H| = 6 entaoH = S3. Os subgrupos de S3 diferentes de {1} e de S3 tem que terordem 2 ou 3, em particular eles tem ordem prima, logo sao cıclicos. Issomostra que todos os subgrupos de S3 diferentes de S3 sao cıclicos, entaoos subgrupos de S3 sao

{1}, 〈(123)〉, 〈(12)〉, 〈(13)〉, 〈(23)〉, S3.

E facil ver que os subgrupos de ordem 2 nao sao normais. Por exemploobserve que (13)(12)(13)−1 = (13)(12)(13) = (23) 6∈ 〈(12)〉.Para resumir, os subgrupos normais de S3 sao {1}, 〈(123)〉 e S3.

8. Diga se 〈(1234)〉E S4.

Nao e, pois 〈(1234)〉 = {1, (1234), (13)(24), (1432)} logo

(12)(1234)(12)−1 = (12)(1234)(12) = (1342) 6∈ 〈(1234)〉.

9. Se H ≤ G e g ∈ G defina gHg−1 := {ghg−1 : g ∈ G}. Prove quegHg−1 ≤ G.

E claro que 1 ∈ gHg−1 pois 1 = g1g−1. Se x = ghg−1 ∈ gHg−1 logox−1 = gh−1g−1 ∈ gHg−1 pois h−1 ∈ H. Se h, k ∈ H, x = ghg−1, y =gkg−1 ∈ gHg−1 entao xy = ghg−1gkg−1 = ghkg−1 ∈ gHg−1 pois hk ∈ H.

10. Se H ≤ G entao⋂g∈G gHg

−1 e um subgrupo normal de G.

Em geral uma intersecao de subgrupos e um subgrupo: se A,B sao sub-grupos de G e H = A ∩B entao 1 ∈ H pois 1 ∈ A e 1 ∈ B, e se h, k ∈ Hentao h, k ∈ A e h, k ∈ B, logo hk ∈ A e hk ∈ B sendo A,B subgrupos,logo hk ∈ A ∩ B = H. Alem disso, h−1 ∈ A e h−1 ∈ B sendo A e Bsubgrupos, entao h−1 ∈ A ∩ B = H. Isso mostra que H ≤ G. Mais emgeral, o mesmo argomento mostra que uma qualquer intersecao de umafamılia de subgrupos e um subgrupo. Aplicando isso no nosso caso, temosque todo gHg−1 ≤ G (pelo exercıcio anterior) logo

⋂g∈G gHg

−1 ≤ G.

Falta mostrar que N =⋂g∈G gHg

−1 e normal em G. Seja n ∈ N e seja

x ∈ G. Precisamos mostrar que xnx−1 ∈ N , isto e, xnx−1 ∈ gHg−1 paratodo g ∈ G, em outras palavras n ∈ x−1gHg−1x para todo g ∈ G. Masx−1gHg−1x = x−1gH(x−1g)−1 e um conjugado de H, logo ele contem npor definicao de N .

21

11. Sejam H ≤ G, N EG. Prove que H ∩N EH.

Ja observamos no exercıcio anterior que uma intersecao de subgrupos eum subgrupo. Falta mostrar que H ∩N e normal em H. Se x ∈ H ∩N eh ∈ H entao hxh−1 ∈ H pois h, x ∈ H e hxh−1 ∈ N pois N e normal emG. Isso implica que hxh−1 ∈ H ∩N .

12. Sejam H ≤ G, N E G e seja HN := {hn : h ∈ H, n ∈ N}. Prove queHN ≤ G. Prove que se H tambem e normal entao HN EG.

E claro que 1 ∈ HN pois 1 = 1 ·1 e 1 ∈ H, 1 ∈ N . Se x ∈ HN escrevemosx = hn com h ∈ H, n ∈ N , e temos (hn)−1 = n−1h−1 = h−1hnh−1 ∈ HNpois h−1 ∈ H e hnh−1 ∈ N (N e normal em G). Se h, k ∈ H e n,m ∈ Nentao (hn)(km) = hkk−1nkm ∈ HN pois h, k ∈ H e k−1nk,m ∈ N .

13. Seja G um grupo abeliano e H ≤ G. Mostre que G/H e abeliano.

Se aH, bH ∈ G/H entao (aH)(bH) = abH = baH = (bH)(aH).

14. Seja H EG e seja xH ∈ G/H. Mostre que (xH)|G/H| = H.

Ja vimos que se x ∈ G entao x|G| = 1. Aplicando esse resultado ao grupoG/H, que tem ordem |G/H| e elemento neutro H, obtemos exatamente(xH)|G/H| = H.

15. Mostre que |A5| = 60.

Sabemos que |S5 : A5| = 2, logo 2 = |S5 : A5| = |S5/A5| = |S5|/|A5| =5!/|A5| logo |A5| = 5!/2 = 120/2 = 60.

16. Conte os elementos de A5 de ordens 1, 2, 3, 5.

Os elementos de A5 diferentes de 1 sao ciclos de comprimento 3 ou 5 ouproduto de dois ciclos disjuntos de comprimento 2 (os elementos de tipo(∗ ∗ ∗)(∗ ∗) e (∗ ∗ ∗ ∗) nao pertencem a A5 porque sao permutacoesimpares). Para construir um ciclo de comprimento 3 precisamos de treselementos de {1, 2, 3, 4, 5} com os quais podemos construir dois ciclos (porexemplo com os elementos 1, 2, 3 podemos construir os ciclos (123) e (132)),logo no grupo A5 temos

(53

)2 = 20 ciclos de comprimento 3. Para construir

um ciclo de comprimento 5 basta contar as possibilidades escrevendo umtal ciclo na forma (1 ∗ ∗ ∗ ∗). Tem 4! = 24 possibilidades. Para construirum produto de dois ciclos disjuntos de comprimento 2 precisamos escolherum elemento fixo (tem 5 possibilidades) e escolher a imagem de um dos 4

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elementos nao fixados (por exemplo fixando 3 e escolhendo 1 7→ 5 obtemoso elemento (15)(24)). Logo A5 contem 5 · 3 = 15 elementos de ordem 2.

Observe que 1 + 20 + 24 + 15 = 60 = |A5|.

17. Seja H := {σ ∈ Sn : σ(1) = 1}. Mostre que H ≤ Sn e que HAn = Sn sen > 2.

Sejam σ, τ ∈ H. Temos 1 ∈ H pois 1(1) = 1, e σ−1(1) = σ−1(σ(1)) = 1logo σ ∈ H. Alem disso, στ(1) = σ(τ(1)) = σ(1) = 1 logo στ ∈ H. Issomostra que H ≤ Sn. Em particular, HAn ≤ Sn pois H ≤ Sn e An E Sn.Agora seja g ∈ Sn e mostramos que g ∈ HAn. Observe que como An enormal, HAn = AnH logo basta mostrar que g ∈ AnH. Se g ∈ An oug ∈ H entao e claro que g = 1 · g = g · 1 ∈ AnH logo supomos agoraque g 6∈ An e que g 6∈ H. Seja k = g(1) 6= 1 e seja h ∈ {1, . . . , n} com1 6= h 6= k (isto e possıvel pois n > 2). Entao ((1hk)g)(1) = 1 logo(1hk)g ∈ H, o que implica g ∈ (1hk)−1H ⊆ AnH.

18. Seja G um grupo e seja

Z = Z(G) := {x ∈ G : gx = xg ∀g ∈ G},

o centro de G, o conjunto dos elementos de G que comutam com todosos elementos de G. Prove que Z e um subgrupo normal de G e mostreque Z = G se e somente se G e abeliano.

E claro que 1 ∈ Z pois 1 · g = g · 1 = g para todo g ∈ G. Se x, y ∈ Ze g ∈ G entao (xy)g = xyg = xgy = gxy = g(xy) entao xy comutacom todo g ∈ G, isto e, xy ∈ Z. Alem disso, se x ∈ Z e g ∈ G entaox−1g = (g−1x)−1 = (xg−1)−1 = gx−1, logo x−1 comuta com todo g ∈ G,isto e, x−1 ∈ Z. Isso mostra que Z ≤ G. Z e normal pois se x ∈ Z eg ∈ G entao gxg−1 = gg−1x = x ∈ Z. E claro que Z = G se e somentese G e abeliano, pois dizer Z = G e equivalente a dizer que todo elementode G comuta com todo elemento de G.

19. Mostre que Z(S3) = {1}, Z(A3) = A3, Z(S4) = {1}, Z(A4) = {1}.

Observe que (12)(13) = (132) e (13)(12) = (123), logo (12) 6∈ Z(S3) e(13) 6∈ Z(S3); (123)(23) = (12) e (23)(123) = (13) logo (123) 6∈ Z(S3)e (23) 6∈ Z(S3); (12)(132) = (13), (132)(12) = (23) logo (132) 6∈ Z(S3).Isso mostra que Z(S3) = {1}. A3 = {1, (123), (132)} = 〈(123)〉 e ciclico,logo e abeliano e Z(A3) = A3 (cf. o exercıcio anterior). Observe que asimetria dos calculos implica que se no grupo simetrico Sn conseguimosmostrar que (12) 6∈ Z(Sn) entao todos os ciclos de comprimento 2 naopertencem ao centro de Sn, e assim para as outras estruturas. Entao ofato que (12)(123) 6= (123)(12) implica que os ciclos de comprimentos 2 e 3

23

nao pertencem a Z(S4), e (12)(34)(1234) 6= (1234)(12)(34) implica que osciclos de comprimento 4 e os produtos de dois ciclos disjuntos de compri-mento 2 nao pertencem a Z(S4), logo Z(S4) = {1}. Agora, os elementosde A4 diferentes de 1 sao ciclos de comprimento 3 ou produtos de doisciclos disjuntos de comprimento 2, e como (123)(12)(34) 6= (12)(34)(123)eles nao pertencem a Z(A4), logo Z(A4) = {1}.

20. Mostre que o indice |G : Z(G)| nao pode ser igual a 2. [Dica: se |G : Z| = 2entao G/Z = {Z, xZ} para algum x ∈ G logo todo elemento fora de Ztem a forma xz para algum z ∈ Z - tente mostrar que isso implica que Ge abeliano.]

Sejam a, b ∈ G. Mostramos que ab = ba. E claro que se um entre a, bpertence a Z(G) entao ab = ba, agora supomos que a, b 6∈ Z(G), assim(seguindo a dica) a = xz, b = xz′ para alguns z, z′ ∈ Z. Temos ab =xzxz′ = xxz′z = xz′xz = ba.

Isso mostra que G e abeliano, logo G = Z(G), uma contradicao (Z(G) ediferente de G, pois ele tem indice 2).

21. (Herstein problema 3 secao 2.10). Escreva

(123)(45)(16789)(15), (12)(123)(12)

como produtos de ciclos disjuntos.

(123)(45)(16789)(15) = (145678923),

(12)(123)(12) = (132)

22. (Herstein problema 4 secao 2.10). Mostre que

(1, 2, . . . , n)−1 = (n, n− 1, . . . , 1).

Basta observar que (1, 2, . . . , n)(n, n− 1, . . . , 1) = 1.

23. (Herstein problema 5 secao 2.10). Encontre a estrutura cıclica das oitopotencias de σ = (1 . . . 8). Por exemplo (12345678)4 = (15)(26)(37)(48)tem estrutura cıclica (2, 2, 2, 2).

Temos σ2 = (1357)(2468) (estrutura cıclica (4, 4)), σ3 = (14725836) (es-trutura cıclica (8)), σ4 = (15)(26)(37)(48) (estrutura cıclica (2, 2, 2, 2)),σ5 = (16385274) (estrutura cıclica (8)), σ6 = (1753)(2864) (estruturacıclica (4, 4)), σ7 = (18765432) (estrutura cıclica (8)), σ8 = 1.

24. (Herstein problema 7 secao 2.10). Calcule aba−1 onde (1) a = (135)(12),b = (1579) e (2) a = (579), b = (123).

No caso (1), aba−1 = (3179), no caso (2) aba−1 = (123).

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25. (Herstein problema 10 secao 2.10). Calcule o sinal das permutacoes

(123)(12), (12345)(123)(45), (12)(13)(14)(25).

Usando a propriedade sgn(xy) = sgn(x)sgn(y) obtemos

sgn((123)(12)) = sgn((123))sgn((12)) = −1,

sgn((12345)(123)(45)) = sgn((12345))sgn((123))sgn((45)) = −1,

sgn((12)(13)(14)(25)) = sgn((12))sgn((13))sgn((14))sgn((25)) = (−1)4 = 1.

26. (Herstein problema 2 secao 2.6). Seja H um subgrupo de G com |G : H| =2. Prove que HEG. [Dica: tem exatamente duas classes a esquerda H,xHe exatamente duas classes a direita H,Hy, logo xH = G−H = Hy.]

Seguindo a dica, como xH = Hy temos x = x ·1 ∈ Hy logo Hy = Hx e asduas classes a direita de H sao H e Hx, em particular xH = G−H = Hx,que implica xHx−1 = H. Sejam h ∈ H e g ∈ G e mostramos que ghg−1 ∈H. Se g ∈ H isto e obvio, entao suponha g 6∈ H. Entao g ∈ xH logoexiste k ∈ H com g = xk e temos ghg−1 = (xk)h(xk)−1 = xkhk−1x−1 ∈xHx−1 = H.

27. (Herstein problema 9 secao 2.6). Seja G um grupo finito e seja H o unicosubgrupo de G de ordem |H|. Prove que H E G. [Dica: dado g ∈ Gconsidere gHg−1 ≤ G.]

Observe que gHg−1 ≤ G (como visto em um exercıcio anterior) e |gHg−1| =|H| (pois a funcao H → gHg−1 que leva h para ghg−1 e bijetiva, com in-versa x 7→ g−1xg), e como H e o unico subgrupo de G de ordem |H|devemos ter gHg−1 = H. Como isso vale para todo g ∈ G, H e normal.

28. (Herstein problema 15 secao 2.6). Seja G um grupo finito e sejam N EG,g ∈ G. Mostre que a ordem de gN no quociente G/N divide a ordem deg em G.

Seja n a ordem de g em G, entao (gN)n = gnN = 1N = N logo a ordemde gN em G/N divide n.

29. Conjugar σ = (135)(2498) ∈ S9 em τ = (2941)(683) ∈ S9. Isto e, encon-trar g ∈ S9 tal que gσg−1 = τ .

Escrevemos os elementos um abaixo do outro incluindo os ciclos de com-primento 1:

σ = (135)(2498)(6)(7)

25

τ = (683)(2941)(5)(7)

Logo um g tal que gσg−1 = τ age da forma seguinte: 1 7→ 6, 3 7→ 8,5 7→ 3, 2 7→ 2, 4 7→ 9, 9 7→ 4, 8 7→ 1, 6 7→ 5, 7 7→ 7. Em outras palavrasg = (16538)(49).

30. Qual e a maxima ordem de um elemento de S6? E de S7? E de S8?[Lembre-se que a ordem de um elemento depende so da sua estruturacomo produto de cıclos disjuntos, e o menor multiplo comum entre oscomprimentos.]

As estruturas dos elementos de S6 como produtos de ciclos disjuntos sao 1(ordem 1), (∗∗) (ordem 2), (∗ ∗ ∗) (ordem 3), (∗ ∗ ∗∗) (ordem 4), (∗ ∗ ∗ ∗ ∗)(ordem 5), (∗∗∗∗∗∗) (ordem 6), (∗∗)(∗∗∗) (ordem 6), (∗∗)(∗∗∗∗) (ordem4), (∗∗)(∗∗)(∗∗) (ordem 2), (∗∗∗)(∗∗∗) (ordem 3). Logo a maxima ordemde um elemento de S6 e 6.

Para semplificar a notacao escrevemos a estrutura do produto em ciclosdisjuntos de uma permutacao σ como (l1, l2, . . . , lt), que significa que naestrutura de σ tem t ciclos de comprimentos l1, l2, . . . , lt. Por exemplo(14)(236)(59) tem estrutura (2, 2, 3). As estruturas dos elementos de S7

sao 1 (ordem 1), (2) (ordem 2), (3) (ordem 3), (4) (ordem 4), (5) (ordem5), (2, 2) (ordem 2), (2, 3) (ordem 6), (2, 4) (ordem 4), (2, 5) (ordem 10),(2, 2, 2) (ordem 2), (2, 2, 3) (ordem 6), (3, 3) (ordem 3), (3, 4) (ordem 12).Logo a maxima ordem de um elemento de S7 e 12.

Fazendo a mesma coisa com S8 encontramos que a maxima ordem nessecaso e 15, que corresponde a estrutura (3, 5).

31. Contar os elementos de S6 de ordem 5.

Os elementos de S6 de ordem 5 sao exatamente os ciclos de comprimento5, e para construir um tal ciclo precisamos escolher o elemento fixado econstruir um ciclo com os outros cinco. Temos entao 6 ·4! = 144 elementosde ordem 5.

1.7 Homomorfismos, Teorema de Isomorfismo

Uma funcao f : A → B entre dois grupos A,B (em notacao multiplicativa) edita homomorfismo se

f(xy) = f(x)f(y) ∀x, y ∈ A.

Ja vimos exemplos de uma tal funcao:

1. A identidade G→ G (isto e, a funcao que leva x em x, para todo x ∈ G)e um homomorfismo de grupos.

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2. Se G e um grupo e g ∈ G entao a funcao γg : G → G definida porγg(x) := gxg−1 e um homomorfismo de grupos pois γg(xy) = gxyg−1 =gxg−1gyg−1 = γg(x)γg(y). Observe que γ1 e a identidade G→ G.

3. A funcao sinal sgn : Sn → {1,−1} e um homomorfismo pois se σ, τ saoduas permutacoes, sgn(στ) = sgn(σ)sgn(τ).

4. Se N E G a funcao π : G → G/N definida por π(g) := gN (projecaocanonica) e um homomorfismo de grupos por definicao de produto nogrupo quociente: f(xy) = xyN = xNyN = f(x)f(y).

Seja f : A→ B um homomorfismo. Observe que:

• f(1) = 1. De fato, f(1) = f(1 · 1) = f(1)f(1) logo multiplicando a direitapor f(1)−1 obtemos 1 = f(1).

• f(x−1) = f(x)−1. De fato temos f(x−1)f(x) = f(x−1x) = f(1) = 1 ef(x)f(x−1) = f(xx−1) = f(1) = 1.

O homomorfismo f : A→ B e dito ISOMORFISMO se e bijetivo, isto e, see injetivo e sobrejetivo. Se existe um isomorfismo f : A→ B escrevemos

A ∼= B.

Por exemplo considere os dois grupos (Z/nZ,+) e (Cn, ·) = 〈x〉, e considere

f : Z/nZ→ Cn, f(k) := xk,

onde k := k + nZ. Observe que k e uma classe lateral de nZ ≤ Z (notacaoaditiva!) e que por definicao de grupo quociente, k + h = k + h + nZ = k +nZ + h+ nZ = k + h.

Para mostrar que f e um isomorfismo, precisamos mostrar as coisas seguin-tes.

1. f e uma funcao bem definida. Em outras palavras, se k = h entao f(k) =f(h). Observe que k = h significa que k+nZ = h+nZ, em outras palavrasn divide k−h, assim xk−h = 1 (pois x tem ordem n em Cn) logo xk = xh,isto e, f(k) = f(h).

2. f e um homomorfismo. Temos

f(k + h) = f(k + h) = xk+h = xkxh = f(k)f(h).

Logo f e um homomorfismo.

3. f e sobrejetivo. Isso e claro, pois se g = xk e um qualquer elemento deCn entao g = f(k).

4. f e injetivo. Suponha f(k) = f(h) e mostramos que k = h. Temosxk = xh, isto e, xk−h = 1. Isso implica que n (a ordem de x) divide k−h,em outras palavras k + nZ = h+ nZ, isto e, k = h.

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Dado um homomorfismo f : A→ B, considere os conjuntos seguintes:

ker(f) := {a ∈ A : f(a) = 1} NUCLEO de f,

Im(f) = f(A) := {f(a) : a ∈ A} IMAGEM de f.

Observe que ker(f) ⊆ A (o nucleo de f e um subconjunto de A) e Im(f) ⊆ B (aimagem de f e um subconjunto de B). Na verdade, o que acontece e o seguinte.

1. ker(f) E A. 1 ∈ ker(f) pois f(1) = 1, se x ∈ ker(f) entao f(x−1) =f(x)−1 = 1−1 = 1 logo x−1 ∈ ker(f) e se x, y ∈ ker(f) entao f(xy) =f(x)f(y) = 1 · 1 = 1 logo xy ∈ ker(f). Isso mostra que ker(f) ≤ A. Paramostrar que e normal, pegamos x ∈ ker(f) (assim f(x) = 1) e a ∈ Ae mostramos que axa−1 ∈ ker(f): como f(x) = 1 temos f(axa−1) =f(a)f(x)f(a−1) = f(a) · 1 · f(a)−1 = 1.

2. Im(f) ≤ B. 1 ∈ Im(f) pois f(1) = 1, se x ∈ Im(f) escrevemos x = f(a)com a ∈ A e temos x−1 = f(a)−1 = f(a−1) ∈ Im(f) pois a−1 ∈ A, ese x, y ∈ Im(f) escrevemos x = f(a), y = f(b) com a, b ∈ A e temosxy = f(a)f(b) = f(ab) ∈ Im(f) pois ab ∈ A. Isso mostra que Im(f) ≤ B.

Logo, ker(f) e um subgrupo normal de A e Im(f) e um subgrupo de B (queem geral nao e normal).

Proposicao 9. Seja f : A → B um homomorfismo. Entao f e injetivo se esomente se ker(f) = {1}.

Demonstracao. Suponha f injetivo e mostramos que ker(f) = {1}. Seja x ∈ker(f), assim f(x) = 1. Como 1 = f(1), temos f(x) = f(1), e como f e injetivotemos x = 1.

Suponha ker(f) = {1} e mostramos que f e injetivo. Sejam x, y ∈ A taisque f(x) = f(y) e mostramos que x = y. Multiplicando a direita por f(y)−1

obtemos 1 = f(x)f(y)−1 = f(x)f(y−1) = f(xy−1) logo xy−1 ∈ ker(f). Comoker(f) = {1} obtemos xy−1 = 1, isto e, multiplicando a direita por y, x = y.

Uma consequencia e que f : A → B e um isomorfismo se e somente seker(f) = {1} e Im(f) = B. Logo, conhecendo ker(f) e Im(f) sabemos se f eou nao e um isomorfismo.

O resultado seguinte mostra que todo subgrupo normal de um grupo G e onucleo de algum homomorfismo de domınio G. Em outras palavras, os nucleosdos homomorfismos sao exatamente os subgrupos normais.

Proposicao 10. Seja N um subgrupo normal de um grupo G. Entao N e onucleo de um homomorfismo G→ B.

Demonstracao. Seja B o grupo quociente G/N e seja π : G → G/N definidapor π(g) := gN (projecao canonica). Ja vimos que π e um homomorfismo. Onucleo de π consiste dos elementos g ∈ G tais que gN = N , isto e, g ∈ N . Logoker(f) = N .

28

Sabemos que o grupo alternado An e um subgrupo normal do grupo simetricoSn. O nucleo do homomorfismo sinal sgn : Sn → {1,−1} e exatamente An (pordefinicao de An), em outras palavras ker(sgn) = An.

Teorema 2 (Teorema de Isomorfismo). Seja f : A→ B um homomorfismo degrupos. Entao A/ ker(f) ∼= Im(f).

Demonstracao. Seja N := ker(f) e seja

f : A/N → Im(f), f(xN) := f(x).

Mostramos que f e um isomorfismo de grupos.

• f e uma funcao bem definida. De fato, se xN = yN entao y−1x ∈ N =ker(f), isto e, f(y−1x) = 1, que pode ser escrito f(y)−1f(x) = 1 e mul-tiplicando a esquerda por f(y) obtemos f(x) = f(y), em outras palavrasf(xN) = f(yN).

• f e um homomorfismo. Se xN, yN ∈ A/N temos

f(xNyN) = f(xyN) = f(xy) = f(x)f(y) = f(xN)f(yN).

• f e sobrejetivo. Se b ∈ Im(f) entao b = f(x) para algum x ∈ A logob = f(x) = f(xN).

• f e injetivo. Se f(xN) = 1 entao f(x) = 1, isto e, x ∈ ker(f) = N ,em outras palavras xN = N . Isso mostra que ker(f) = {N}, em outraspalavras f e injetivo.

Isso conclui a demostracao.

Por exemplo considere os grupos A = R − {0} = R∗ e B = R>0. A e ogrupo dos numeros reais nao nulos com a operacao de multiplicacao, B e ogrupo dos numeros reais positivos com a operacao de multiplicacao. Se tratade grupos abelianos! Seja f : A → B definida por f(x) := x2. Se trata de umhomomorfismo pois B e abeliano, de fato

f(xy) = (xy)2 = xyxy = xxyy = x2y2.

O nucleo de f e dado pelos elementos x ∈ A tais que f(x) = 1, isto e, x2 = 1, logoker(f) = {1,−1}. Alem disso, f e sobrejetiva pois se b ∈ B entao b = f(

√b),

logo Im(f) = B. O teorema de isomorfismo implica que A/{−1, 1} ∼= B, emoutras palavras

R∗/{−1, 1} ∼= R>0.

A interpretacao intuitiva e que {1,−1} representa o sinal de um numero e “senao tivesse o sinal todos os numeros seriam positivos” (em algum sentido).Quocientar com o sinal significa, em algum sentido, abolir o sinal, assim “tudofica positıvo”.

Alguns exemplos de aplicacao do teorema de isomorfismo.

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1. O sinal sgn : Sn → {1,−1} e um homomorfismo cujo nucleo e An, o grupoalternado. Como existem permutacoes pares e impares, sgn e sobrejetivo,logo, pelo teorema de isomorfismo, Sn/An ∼= {1,−1} ∼= C2. Observe que{1,−1} e isomorfo a C2 = {1, x} (sendo x2 = 1) porque C2 → {1,−1}que leva xk para (−1)k e um isomorfismo (em geral se 〈x〉 e 〈y〉 sao doisgrupos cıclicos da mesma ordem entao a funcao 〈x〉 → 〈y〉 que leva xk

para yk e um isomorfismo).

2. Seja K um corpo e seja G o conjunto de todas as matrizes inversıveis n×ncom coeficientes em K. G e um grupo com a operacao de multiplicacaousual entre matrizes. O determinante induz um homomorfismo G →K∗ = K − {0}, pois se A,B sao duas matrizes n × n entao det(AB) =det(A) det(B). Seja N o nucleo de det : G → K∗, N e o grupo dasmatrizes A de determinante 1: det(A) = 1. Como N e um nucleo de umhomomorfismo de domınio G, temos que N E G. Alem disso, Im(det) =K∗ (em outras palavras, det e sobrejetivo) pois se α ∈ K∗ entao

det

1 0 . . . 0 00 1 . . . 0 0...

.... . .

......

0 0 . . . 1 00 0 . . . 0 α

= α.

Pelo teorema de isomorfismo G/N ∼= K∗.

Alguns exercıcios resolvidos:

1. Seja G o conjunto das funcoes R → R. G e um grupo com a operacaoseguinte: se f, g ∈ G define

(f + g)(x) := f(x) + g(x) ∀x ∈ R.

Com essa operacao, G e um grupo abeliano. O elemento neutro e a funcaoconstante 0 e o inverso de f e −f definido por (−f)(x) := −f(x) paratodo x ∈ R. Seja

N := {g ∈ G : g(1) = 0}.

Mostramos que N e um subgrupo normal de G e que G/N ∼= R (sendoque R e visto como grupo aditivo). Para fazer isso, queremos construir umhomomorfismo sobrejetivo ϕ : G→ R com a propriedade que ker(ϕ) = N .A definicao de N sugere o seguinte: definimos ϕ : G→ R por ϕ(g) := g(1).Se trata de um homomorfismo de grupos:

ϕ(g1 + g2) = (g1 + g2)(1) = g1(1) + g2(1) = ϕ(g1) + ϕ(g2).

O nucleo de ϕ e igual a N . Alem disso, ϕ e sobrejetivo: se α ∈ R entao afuncao constante g(x) = α pertence a G, e ϕ(g) = g(1) = α. Pelo teoremade isomorfismo temos entao G/N ∼= R.

30

2. Seja C o corpo dos numeros complexos e seja

S1 := {a+ ib ∈ C : a2 + b2 = 1}

o cırculo de centro 0 que passa por 1 = 1 + i0. Observe que se f(a+ ib) =a2 + b2 entao para x = a+ ib, y = c+ id temos f(xy) = f(x)f(y), de fato

f(xy) = f((a+ ib)(c+ id)) = (ac− bd)2 + (ad+ bc)2,

f(x)f(y) = (a2 + b2)(c2 + d2)

sao iguais. Isso mostra que f respeita o produto entao escolhendo bemo domınio e o codomınio de f conseguimos um homomorfismo de gruposmultiplicativos. Seja

f : C∗ → R>0, f(a+ ib) := a2 + b2,

sendo C∗ o grupo multiplicativo dos numeros complexos nao nulos e R>0 eo grupo multiplicativo dos numeros reais positivos. Observe que ker(f) =S1. Alem disso, f e sobrejetivo pois se α ∈ R>0 entao f(

√α) = (

√α)2 =

α. Pelo teorema de isomorfismo C∗/S1 ∼= R>0.

A ideia geometrica e que dado g ∈ C∗ e N = S1, a classe lateral gNe o cırculo de centro 0 e que passa por g, e entender o grupo quocienteC∗/S1 significa escolher de forma inteligente um representante de cadaclasse lateral. Tem um unico numero real positivo r que pertence a gN :escolhendo tal r como representante, rN = gN e o conjunto dos r formaexatamente R>0. Essa e a ideia geometrica do grupo quociente.

Agora queremos fazer uma famılia de exemplos importantes. Sejam A,B doisgrupos (notacao multiplicativa), e seja A×B (produto cartesiano) o conjunto dospares ordenados (a, b) sendo que a ∈ A e b ∈ B. A×B e um grupo (dito produtodireto entre A e B) com a operacao (a, b)(c, d) := (ac, bd). O elemento neutro e(1, 1) e o inverso de (a, b) e (a−1, b−1). Observe que A×{1} = {(a, 1) : a ∈ A}e um subgrupo de A×B. Vamos mostrar que ele e normal e que

A×BA× {1}

∼= B.

Para fazer isso queremos construir um homomorfismo sobrejetivo A × B → Bcujo nucleo seja H = A× {1}. Seja

f : A×B → B, (a, b) 7→ b.

Se trata de um homomorfismo pois

f((a, b)(c, d)) = f((ac, bd)) = bd = f(a, b)f(c, d).

Ele e sobrejetivo pois se b ∈ B logo f((1, b)) = b. E claro que ker(f) = H.Obtemos entao pelo teorema de isomorfismo que A×B

A×{1}∼= B.

31

Mais uma aplicacao do teorema de isomorfismo

Sejam G um grupo, H um subgrupo de G e N um subgrupo normal deG. Seja HN = {hn : h ∈ H, n ∈ N}. Entao HN ≤ G, H ∩ N E H eH/H ∩N ∼= HN/N .

Primeiro vamos mostrar que HN ≤ G. E claro que 1 ∈ HN pois 1 = 1 · 1e 1 ∈ H e 1 ∈ N . Sejam h1n1, h2n2 ∈ HN (sendo h1, h2 ∈ H e n1, n2 ∈ N).Mostramos que h1n1h2n2 ∈ HN . Temos

h1n1h2n2 = h1h2(h−12 n1h2)n2 ∈ HN

pois h1h2 ∈ H e h−12 n1h2 ∈ N (sendo N normal). Agora seja hn ∈ HN emostramos que (hn)−1 ∈ HN . Temos

(hn)−1 = n−1h−1 = h−1hn−1h−1 ∈ HN

pois h−1 ∈ H e hn−1h−1 ∈ N .Agora mostramos que H/H∩N ∼= HN/N usando o teorema de isomorfismo.

Seja H → HN/N a funcao definida por f(h) := hN . Observe que hN ∈ HN/Npois h ∈ HN (de fato, h = h · 1 e h ∈ H, 1 ∈ N), logo f e bem definida.Mostramos que e um homomorfismo sobrejetivo e que ker(f) = H ∩N .

• f e um homomorfismo: por definicao de produto no grupo quociente,f(h1h2) = h1h2N = h1Nh2N = f(h1)f(h2).

• f e sobrejetivo: se hnN e um qualquer elemento de HN/N (sendo h ∈ He n ∈ N) entao como nN = N (pois n ∈ N) temos hnN = hN logohnN = f(h).

• ker(f) = H∩N : O nucleo de f consiste dos h ∈ H tais que f(h) = N , istoe, hN = N , isto e, h ∈ N . Entao ker(f) = {h ∈ H : h ∈ N} = H ∩N .

1.8 Sobre produtos diretos e grupos abelianos finitos

Lembre-se que se A e B sao dois grupos o produto direto de A e B e o produtocartesiano A × B (o conjunto dos pares ordenados (a, b) com a ∈ A e b ∈ B)com a operacao seguinte:

(a, b)(c, d) := (ac, bd).

Observe que voce definiu da mesma forma a soma entre vetores: se a operacaofor a soma, (a, b) + (c, d) = (a+ c, b+ d).

Por exemplo dado C2 = {1, x} = 〈x〉 temos

C2 × C2 = {(1, 1), (1, x), (x, 1), (x, x)}.

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Observe que C2 ×C2 tem quatro elementos. Mais em geral, |A×B| = |A| · |B|,pois para construir um par (a, b) temos |A| escolhas para a e |B| escolhas parab. Alem disso, C2×C2 e abeliano, e mais em geral, se A e B sao abelianos entaoA×B e abeliano: de fato, se (a, b), (c, d) ∈ A×B entao (a, b)(c, d) = (ac, bd) =(ca, db) = (c, d)(a, b).

Vamos mostrar que a ordem do elemento (a, b) e mmc(o(a), o(b)), o menormultiplo comum entre o(a) e o(b). De fato, (a, b)n = (an, bn) por definicao deoperacao em A × B, logo (a, b)n = (1, 1) se e somente se an = 1 e bn = 1,isto e, n e dividido por o(a) e o(b) (por uma das propriedades da ordem de umelemento). Entao o((a, b)) (a ordem de (a, b), isto e, o menor inteiro positivo ntal que (a, b)n = (1, 1)) e o menor inteiro positivo n tal que o(a) e o(b) dividemn, em outras palavras, o((a, b)) = mmc(o(a), o(b)).

Por exemplo se C2 = {1, x} = 〈x〉 entao o((1, 1)) = 1, o((1, x)) = mmc(1, 2) =2, o((x, 1)) = mmc(2, 1) = 2 e o((x, x)) = mmc(2, 2) = 2. Em particular C2×C2

e um grupo de ordem |C2 × C2| = |C2| · |C2| = 2 · 2 = 4 que nao tem elementosde ordem 4. Se agora C6 = 〈y〉 = {1, y, y2, y3, y4, y5} entao no grupo C2 × C6

temos por exemplo o((x, y2)) = mmc(2, 3) = 6, o(x, y3) = mmc(2, 2) = 2. Oselementos de C2 × C6 sao (1, 1), (1, y), (1, y2), (1, y3), (1, y4), (1, y5), (x, 1),(x, y), (x, y2), (x, y3), (x, y4), (x, y5). As ordens sao 1, 6, 3, 2, 3, 6, 2, 6, 6, 2, 6, 6.Em particular, C2×C6 e um grupo de ordem |C2×C6| = |C2| · |C6| = 2 ·6 = 12que nao tem elementos de ordem 12.

Logo, C2×C2 e C2×C6 sao exemplos de grupos de ordem n que nao contemelementos de ordem n. Entao eles nao sao grupos cıclicos (observe que um grupocıclico de ordem n sempre contem elementos de ordem n, pois se Cn = 〈x〉 entaox tem ordem n).

Para repetir: C2 ×C2 e C2 ×C6 sao grupos abelianos nao cıclicos. Observeque e a primeira vez que encontramos grupos finitos abelianos nao cıclicos. Umapergunta natural e a seguinte: Cn × Cm pode ser cıclico? A resposta e sim:

Proposicao 11. Cn × Cm e cıclico se e somente se n,m sao coprimos.

Demonstracao. Suponha n,m coprimos, e Cn = 〈x〉, Cm = 〈y〉. Assim o(x) = ne o(y) = m. A ordem do elemento (x, y) e o((x, y)) = mmc(o(x), o(y)) =mmc(n,m) = nm pois n,m sao coprimos. Entao Cn × Cm e um grupo deordem nm que contem elementos de ordem nm, logo Cn × Cm e cıclico, emoutras palavras, Cn × Cm ∼= Cnm (dois grupos cıclicos da mesma ordem saoisomorfos).

Agora suponha Cn×Cm cıclico e por contradicao suponha n,m nao coprimos,em outras palavras, existe um numero primo p que divide n e m. Seja r = nm/p.Se (a, b) ∈ Cn×Cm entao an = 1 e bm = 1 (ja vimos que se g ∈ G entao g|G| = 1em geral). Como p divide n em, temos que n em dividem r, logo ar = 1 e br = 1,entao (a, b)r = (ar, br) = (1, 1). Isso implica que o((a, b)) divide r = nm/p, em

33

particular o((a, b)) < nm. Como isso vale para todo elemento (a, b) de Cn×Cm,obtemos que Cn × Cm nao tem elementos de ordem nm, logo nao e cıclico.

Podemos construir produtos diretos com mais fatores: se A1, . . . , Ak saogrupos, podemos construir o produto direto

A1 ×A2 × · · · ×Ak = {(a1, . . . , ak) : a1 ∈ A1, . . . , ak ∈ Ak}.

A operacao e(a1, . . . , ak)(b1, . . . , bk) = (a1b1, . . . , akbk).

O elemento neutro e (1, 1, . . . , 1) e o inverso de (a1, . . . , ak) e (a−11 , . . . , a−1k ).Assim podemos construir outros grupos abelianos, por exemplo

C2 × C2 × C4 × C5 × C18.

Agora uma pergunta natural e a seguinte: e verdade que todo grupo abelianofinito e um produto direto de grupos cıclicos? A resposta e sim:

Teorema 3 (Teorema fundamental dos grupos abelianos finitos). Todo grupoabeliano finito e um produto direto de grupos cıclicos finitos.

Antes de mostrar esse teorema, vamos ver algumas consequencias.

Observe que A × B ∼= B × A. Mais em geral se σ e uma permutacao de{1, . . . , k} entao Aσ(1) × · · · ×Aσ(k) ∼= A1 × · · · ×Ak.

• Quantos grupos abelianos tem de ordem 12? Como 12 = 22 · 3 e |A1 ×· · · × Ak| = |A1| · · · |Ak|, as possibilidades sao C12, C2 × C6, C4 × C3 eC2×C2×C3. Mas observe que como vimos acima, C4×C3

∼= C4·3 = C12

e C2 × C3∼= C2·3 = C6, logo C2 × C2 × C3

∼= C2 × C6. Isso implica quena verdade todo grupo abeliano de ordem 12 e isomorfo a um entre C12 eC2 × C2 × C3.

• Quantos grupos abelianos tem de ordem 70? Como 70 = 2·5·7 e |A1×· · ·×Ak| = |A1| · · · |Ak|, a unica possibilidade e C2×C5×C7

∼= C10×C7∼= C70.

Em outras palavras, todo grupo abeliano de ordem 70 e cıclico.

• Quantos grupos abelianos tem de ordem 36? Como 36 = 22 · 32 e |A1 ×· · ·×Ak| = |A1| · · · |Ak|, as possibilidades sao C4×C9

∼= C36, C2×C2×C9,C4×C3×C3 e C2×C2×C3×C3. Isso e tudo pois por exemplo C2×C18

∼=C2 × C2 × C9.

Demonstracao do teorema fundamental

Vamos precisar do lema geral seguinte.

Lema 1 (Produto direto interno). Sejam A,B subgrupos normais de um grupoG tais que AB = G e A ∩B = {1}. Entao G ∼= A×B.

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Demonstracao. Seja f : A × B → G = AB definida por f((a, b)) = ab. Vamosmostrar que se trata de um isomorfismo de grupos. E claro que f e sobrejetiva.Agora,

f((a, b)(c, d)) = f((ac, bd)) = acbd, f((a, b))f((c, d)) = abcd.

Entao para mostrar que f e um homomorfismo precisamos mostrar que se a, c ∈A e b, d ∈ B entao acbd = abcd (observe que isso e obvio se G e abeliano).Temos abcd = ac(c−1bcb−1)bd logo basta mostrar que c−1bcb−1 = 1. Masc ∈ A, b ∈ B e A,B sao subgrupos normais, logo c−1bc ∈ B e bcb−1 ∈ A, logoc−1bcb−1 ∈ A ∩B. Mas por hipotese A ∩B = {1} logo c−1bcb−1 = 1.

Falta mostrar que f e injetivo, isto e, que ker(f) = {(1, 1)}. Seja (a, b) ∈ker(f) e mostramos que (a, b) = (1, 1). Temos f((a, b)) = 1, isto e, ab = 1,entao b = a−1. Mas B 3 b = a−1 ∈ A, logo b = a−1 ∈ A ∩ B = {1}, isto e,b = a−1 = 1 e isso implica (a, b) = (1, 1).

Agora vamos mostrar o teorema.

Lema 2. Seja G um grupo abeliano finito e seja p um divisor primo de |G|.Entao G tem elementos de ordem p.

Demonstracao. Inducao sobre |G|. Se |G| = 1 o enunciado e obvio, agora su-ponha |G| > 1. Se 1 6= g ∈ G tem ordem mp para algum inteiro m entaoo(gm) = p, entao agora supomos que p nao divida k = o(g), assim p divideo indice |G : 〈g〉| = |G/〈g〉|, e por inducao, como |G/〈g〉| = |G|/k < |G|,existe x〈g〉 ∈ G/〈g〉 de ordem p no quociente, assim pondo h = o(x) temos(x〈g〉)h = 〈g〉 entao p divide h e o(xh/p) = p.

Seja G um grupo abeliano finito, e para d um qualquer divisor de |G| seja

G[d] := {g ∈ G : gd = 1}.

Observe que G[d] ≤ G: de fato 1d = 1 logo 1 ∈ G[d] e se x, y ∈ G[d] entao(xy)d = xdyd = 1 · 1 = 1 (a igualdade (xy)d = xdyd vale so porque G eabeliano).

Suponha que |G| = nm para inteiros n,m coprimos. Usando o lema 1, vamosmostrar que

G ∼= G[n]×G[m].

E claro que G[n] e G[m] sao subgrupos normais de G (em um grupo abelianotodo subgrupo e normal). Como n,m sao coprimos existem inteiros a, b tais quena+mb = 1.

Mostramos que G[n]∩G[m] = {1}. Se x ∈ G[n]∩G[m] entao xn = 1 = xm,logo x = x1 = xna+mb = (xn)a(xm)b = 1a1b = 1.

Mostramos que G[n]G[m] = G. Se g ∈ G entao g = g1 = gmb+na =(gm)b(gn)a e o fato que gnm = g|G| = 1 implica que gm ∈ G[n] e gn ∈ G[m],logo tambem (gm)b ∈ G[n] e (gn)a ∈ G[m].

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Entao temos G[n]×G[m] ∼= G. Alem disso, se m > 1 e n > 1 entao G[m] 6= Ge G[n] 6= G pois por exemplo se o primo p divide n e nao divide m (tal primoexiste pois n e m sao coprimos) entao G tem um elemento x de ordem p pelolema 2, e xm 6= 1 (pois p nao divide m) implica que x 6∈ G[m]. Isso mostra queG 6= G[m] e analogamente G 6= G[n].

Iterando o processo de decomposicao de G obtemos que G e um produtodireto de subgrupos de ordem potencias de primos (porque um numero inteiroque nao pode ser escrito como produto de dois inteiros coprimos maiores de 1e exatamente uma potencia de um primo), logo estamos reduzidos a mostrar oteorema no caso em que |G| = pt, sendo p um primo.

Supomos entao que G seja um grupo abeliano finito de ordem pt, com pprimo. Vamos mostrar que G e um produto direto de grupos cıclicos, porinducao. Se t = 1 entao |G| = p logo G e cıclico (entao ele e um produtodireto de grupos cıclicos). Agora supomos t > 1. Seja g um elemento de ordemmaxima em G, seja

F := {H ≤ G : H ∩ 〈g〉 = {1}}

e seja M um elemento maximal de F (isto e, se H ∈ F e M ≤ H entao M = H:um tal M existe pois F e uma famılia finita). Se G = M〈g〉 entao o lema1 implica que G ∼= M × 〈g〉 e |M | < |G| logo o resultado segue por inducao.Supomos entao que G 6= M〈g〉 e seja x ∈ G −M〈g〉 de ordem mınima. Temoso(x) = pk com k ≤ t (pelo teorema de Lagrange), entao temos xp ∈M〈g〉 (senaoxp seria um elemento de G−M〈g〉 de ordem pk−1, menor que o(x) = pk), logoxp = ygl com y ∈ M e l inteiro positivo. Pelo teorema de Lagrange todoelemento de G tem ordem uma potencia de p logo o(g) = pn e lembre-se que ge um elemento de G de ordem maxima, logo xp

n

= 1 (senao, x teria ordem ph

maior que pn). Temos

1 = xpn

= (xp)pn−1

= (ygl)pn−1

= ypn−1

glpn−1

,

logo glpn−1 ∈ M ∩ 〈g〉 = {1}, entao pn = o(g) divide lpn−1, isto e, p divide l.

Escreva l = pj, assim (xg−j)p = y ∈ M , e xg−j 6∈ M pois x 6∈ M〈g〉. Observeque 〈xg−j〉M ≤ G (pois e um produto de subgrupos normais), entao como Me maximal em F , 〈xg−j〉M ∩ 〈g〉 6= {1}. Temos entao 1 6= gk = (xg−j)uy′

para k, u ∈ Z e y′ ∈ M . Obtemos xu = gkgjuy′−1 ∈ M〈g〉. Suponha p|u.Como (xg−j)p ∈ M temos (xg−j)u ∈ M logo gk = 1, logo p nao divide u eexistem inteiros a, b ∈ Z com pa+ub = 1. Mas xp e xu pertencem a M〈g〉, logox = x1 = xpa+ub = (xp)a(xu)b ∈M〈g〉. Contradicao.

1.9 Exercıcios resolvidos

1. Seja f : (R,+) → (R>0, ·) definida por f(x) := ex. Mostre que f e umisomorfismo de grupos.

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(a) f e homomorfismo: f(x+ y) = ex+y = exey = f(x)f(y).

(b) f e injetivo: se f(x) = 1 entao ex = 1, logo x = 0. Isso mostra queker(f) = {0}, logo f e injetivo.

(c) f e sobrejetivo: se y ∈ R>0 seja x := loge(x). Entao f(x) = ex = y.

2. Seja n ∈ Z, n 6= 0 e seja f : Z → Z definida por f(z) := nz. Mostreque f e um homomorfismo injetivo. Calcule a imagem de f . f pode sersobrejetivo?

f e homomorfismo pois f(x+ y) = n(x+ y) = nx+ ny = f(x) + f(y). fe injetivo pois se nz = 0 entao z = 0 (pois n 6= 0), logo ker(f) = {0}. Aimagem de f e {nz : z ∈ Z} = nZ ≤ Z. f e sobrejetivo se e somente sen = ±1.

3. Sejam X,Y conjuntos e seja f : X → Y uma funcao bijetiva. Mostre queSym(X) ∼= Sym(Y ).

Sym(X) e o grupo das funccoes bijetivas X → X. Vamos definir umisomorfismo ϕ : Sym(X)→ Sym(Y ) levando σ para f ◦ σ ◦ f−1. E claroque essa funcao e bem definida (composicao de bijecoes e uma bijecao).Vamos mostrar que se trata de um isomorfismo de grupos.

(a) ϕ e um homomorfismo: ϕ(στ) = fστf−1 = fσf−1fτf−1 = ϕ(σ)ϕ(τ).

(b) ϕ e injetivo: se ϕ(σ) = 1 entao fσf−1 = 1 e multiplicando a esquerdapor f−1 e a direita por f obtemos σ = f−1f = 1. Isso mostra queker(ϕ) = {1}, logo ϕ e injetivo.

(c) ϕ e sobrejetivo. Seja τ ∈ Sym(Y ), entao τ = f(f−1τf)f−1 =ϕ(f−1τf).

4. Considere R como grupo aditivo (abeliano) e Z ≤ R. Mostre que

R/Z ∼= S1 = {a+ ib ∈ C : a2 + b2 = 1}.

Considere a funcao f : R→ S1 que leva t para e2πit = cos(2πt)+i sin(2πt).Se trata de um homomorfismo pois f(t + s) = e2πi(t+s) = e2πit+2πis =e2πite2πis = f(t)f(s). O nucleo e dado pelos t ∈ R tais que e2πit = 1,isto e, t ∈ Z, logo ker(f) = Z. Como f e sobrejetivo (pois se a2 + b2 = 1existe um numero real t tal que cos(t) = a e sin(t) = b), temos entao peloteorema de isomorfismo que R/Z ∼= S1.

5. Seja G = C∗ = C−{0} (grupo multiplicativo dos numeros complexos naonulos) e seja N = {a + ib ∈ C∗ : a2 + b2 = 1}. Mostre que G/N ∼= R>0

(grupo multiplicativo dos numeros reais positivos).

Primeiro, vamos mostrar que f(a + ib) := a2 + b2 define um homomor-fismo de grupos multiplicativos C∗ → R>0 sendo C∗ o grupo dos numeroscomplexos nao nulos e R>0 e o grupo dos numeros reais positivos. Temosque

f((a+ ib)(c+ id)) = f(ac− bd+ i(ad+ bc)) = (ac− bd)2 + (ad+ bc)2

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f(a+ ib)f(c+ id) = (a2 + b2)(c2 + d2)

sao iguais. Logo, f e um homomorfismo, e ker(f) = N . Como f e sobre-jetivo (pois se α ∈ R>0 entao α = f(

√α)) pelo teorema de isomorfismo

G/N ∼= R>0.

6. Seja G um grupo abeliano finito. Mostre que f : G→ G, f(x) := x2 e umhomomorfismo. Mostre que se |G| e impar entao f e um isomorfismo.

f e homomorfismo pois f(xy) = (xy)2 = xyxy = xxyy = x2y2 = f(x)f(y)(sendo G abeliano). Suponha |G| impar, e mostramos que f e isomorfismo,isto e, que f e bijetivo. Pelo princıpio da casa dos pombos (se A,B saoconjuntos finitos da mesma cardinalidade, uma funcao A → B e injetivase e somente se e sobrejetiva), basta mostrar que f e injetivo, isto e,ker(f) = {1}. Seja x ∈ ker(f) e suponha por contradicao x 6= 1. Temosf(x) = x2 = 1, logo o(x) = 2 (pois x 6= 1). Pelo teorema de Lagrange,|〈x〉| = o(x) = 2 divide |G|, absurdo (|G| e impar).

7. Dado um primo p e Fp = Z/pZ, calcular a cardinalidade de S = {x2 :x ∈ Fp}.Considere o grupo multiplicativo G := F∗p = Fp − {0}. Como ja vimosno exercıcio anterior, f : G → G que leva x para x2 e um homomorfismopois G e um grupo abeliano finito. Sendo Fp um corpo, a equacao x2 = 1tem duas solucoes: 1 e −1, que sao diferentes se p 6= 2. Nesse caso temosentao que ker(f) = {−1, 1} tem ordem 2. Alem disso, a imagem de f eC = {x2 : x ∈ G} e pelo teorema de isomorfismo C ∼= G/ ker(f), entao

|C| = |G/ ker(f)| = |G|/| ker(f)| = (p− 1)/2.

Obtemos que |S| = |C ∪ {0}| = |C| + 1 = (p + 1)/2. Se p = 2 entaoFp = {0, 1} = S logo |S| = 2.

8. Mostre que A×B{1}×B

∼= A.

Se trata de mostrar que a funcao A × B → A que leva (a, b) para a eum homomorfismo sobrejetivo de nucleo {1} × B e aplicar o teorema deisomorfismo.

9. Sejam n um inteiro positivo e m um divisor positivo de n. Seja Cn =〈x〉 = {1, x, x2, . . . , xn−1}. Mostre que Cn/〈xm〉 ∼= Cm.

Considere f : Cn → Cm = 〈xn/m〉 definida por f(xk) := xkn/m. Se tratade um homomorfismo sobrejetivo de nucleo 〈xm〉, logo o resultado seguedo teorema de isomorfismo.

10. Seja H um subgrupo de Sn contendo permutacoes impares. Mostre que|H ∩An| = 1

2 |H|.Ja vimos em um outro exercıcio que se H ≤ G e N E G entao HN/N ∼=H/H∩N . Vamos aplicar esse resultado ao caso G = Sn e N = An. Vamosmostrar que HAn = Sn. Sendo obvio que HAn ⊆ Sn, vamos mostrar a

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outra inclusao: Sn ⊆ HAn. Seja entao g ∈ Sn. Se g ∈ An entao g = 1 ·g ∈HAn, agora suponha g 6∈ An, assim sgn(g) = −1. Por hipotese, existeh ∈ H com sgn(h) = −1, logo sgn(hg) = sgn(h)sgn(g) = (−1)(−1) = 1,assim hg ∈ An e obtemos g = h−1(hg) ∈ HAn.

Agora temos C2∼= Sn/An = HAn/An ∼= H/H ∩ An entao 2 = |H/H ∩

An| = |H|/|H ∩An| logo |H ∩An| = 12 |H|.

11. Conte os grupos abelianos de ordem 72.

Temos 72 = 2332 e pelo teorema fundamental dos grupos abelianos finitostemos 3 grupos abelianos de ordem 8 (C8, C2 × C4 e C2 × C2 × C2) e 2grupos abelianos de ordem 9 (C9 e C3 ×C3). Logo temos 3 · 2 = 6 gruposabelianos de ordem 72, eles sao C8×C9

∼= C72, C8×C3×C3, C2×C4×C9,C2 × C4 × C3 × C3, C2 × C2 × C2 × C9, C2 × C2 × C2 × C3 × C3.

12. Sejam C12 = 〈a〉, C16 = 〈b〉. Calcule a ordem de (a10, b12) no produtodireto G = C12 × C16.

A ordem de (a10, b12) e igual ao mmc entre o(a10) e o(b12). Temos

o(a10) = o(a)/(10, o(a)) = 12/(10, 12) = 12/2 = 6

o(b12) = o(b)/(12, o(b)) = 16/(12, 16) = 16/4 = 4.

Logo a ordem de (a10, b12) vale mmc(6, 4) = 12.

13. Conte os elementos de C6 × C12 de ordem 6.

Um elemento de ordem 6 tem a forma (x, y) sendo que as ordens de x e ypodem ser: 1, 6 ou 2, 3 ou 2, 6 ou 3, 2 ou 3, 6 ou 6, 1 ou 6, 2 ou 6, 3 ou 6, 4ou 6, 6. Em total temos 24 tais elementos.

Mais exercıcios.

1. Seja A um grupo e seja G = A3 = A×A×A. Mostre que G/(A× {1} ×{1}) ∼= A×A.

2. Mostre que N = {1, (12)(34), (13)(24), (14)(23)} e um subgrupo normalde S4.

3. Sejam A,B dois subgrupos normais de um grupo G, com A ⊆ B. Mostreque f : G/A → G/B definida por gA 7→ gB e um bem definido homo-morfismo sobrejetivo de grupos e ker(f) = B/A. Usando o teorema de

isomorfismo mostre que G/AB/A

∼= G/B.

4. Seja L um subgrupo de G/N . Mostre que existe H ≤ G tal que H ⊇ N eL ∼= H/N . [Dica: define H := {g ∈ G : gN ∈ L}.]

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2 Aneis comutativos unitarios

Um anel unitario e um conjunto A que tem duas operacoes binarias + e · taisque

• (A,+) e um grupo abeliano com elemento neutro 0 e o inverso de a e −a.

• (A, ·) e um monoide, isto e, · e associativa e existe um elemento neutro1 6= 0.

• Propriedade distributiva (compatibilidade entre soma e produto):a(b+ c) = ab+ ac e (a+ b)c = ac+ bc para todo a, b, c ∈ A.

Um anel A e dito comutativo se · e comutativa, isto e, se ab = ba para todoa, b ∈ A.

Por exemplo Z, Q, R, C sao aneis comutativos com as operacoes usuais. Umoutro exemplo importante de anel e o seguinte: o anel dos polinomios A[X] comsoma e produto usuais, sendo A um anel comutativo. Um elemento generico deA[X] e um polinomio a0 + a1X + a2X

2 + . . .+ akXk sendo a0, a1, . . . , ak ∈ A.

Existem aneis nao comutativos, por exemplo o conjunto Mn×n(k) das ma-trizes n× n sobre um dado anel k, com as operacoes de soma e produto usuaisentre matrizes, sendo 0 a matriz nula e 1 e a matriz identidade. Como em geralse A,B sao duas matrizes temos AB 6= BA, o anel Mn×n(k) nao e comutativose n > 1.

Nessa parte do curso vamos falar so de aneis comutativos. Entao nuncavamos ter problemas de especificar se estamos multiplicando a esquerda ou adireita e podemos sempre multiplicar os elementos na ordem que queremos.Alem disso, todos os aneis e os subaneis considerados serao unitarios (existe1 ∈ A e 1 6= 0).

Um anel comutativo A e dito corpo se todo elemento a ∈ A diferente de zeroadmite inverso multiplicativo a−1. Por exemplo Z nao e um corpo (pois porexemplo 2 ∈ Z mas 1/2 6∈ Z) mas Q, R e C sao corpos.

Observe que se A e um corpo vale a regra de cancelacao: se a, b ∈ A eab = 0 entao a = 0 ou b = 0, de fato se a 6= 0 multiplicando por a−1 obtemosb = aba−1 = 0a−1 = 0 logo b = 0. Por outro lado, essa propriedade vale tambemem Z apesar do fato que Z nao seja um corpo (se n,m ∈ Z e nm = 0 entaon = 0 ou m = 0). Um anel com essa propriedade e dito domınio de integridade.

Um domınio de integridade e um anel comutativo A tal que se a, b ∈ A eab = 0 entao a = 0 ou b = 0.

Para entender melhor os domınios de integridade vamos introduzir maisconceitos. Se A e um anel unitario, um subanel unitario de A e um subconjunto

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B de A tal que B e um anel unitario (contendo 1) com as mesmas operacoes +e · de A. Escrevemos B ≤ A. Por exemplo temos Z ≤ Q ≤ R ≤ C.

Vamos mostrar o resultado seguinte.

Teorema 4. Seja A um anel comutativo. Entao A e um domınio de integridadese e somente se A e um subanel de um corpo.

Demonstracao. Seja A um subanel de um corpo K e sejam a, b ∈ A tais queab = 0. Mostraremos que a = 0 ou b = 0, em outras palavras, mostraremos quese a 6= 0 entao b = 0. Se a 6= 0 entao existe a−1 ∈ K (pois K e um corpo) logomultiplicando os dois lados de ab = 0 por a−1 obtemos b = aba−1 = 0a−1 = 0.

Agora vamos mostrar a outra implicacao, isto e, que se A e um domınio deintegridade entao A e um subanel de um corpo. Seja R := {(a, b) : a, b ∈A, b 6= 0}. Vamos definir uma relacao ∼ em R da forma seguinte:

(a, b) ∼ (c, d) ⇔ ad = bc.

Se trata de uma relacao de equivalencia:

1. Propriedade reflexiva. Se (a, b) ∈ R entao (a, b) ∼ (a, b) pois ab = ba (A ecomutativo).

2. Propriedade simetrica. Se (a, b) ∼ (c, d) entao (c, d) ∼ (a, b). De fato,(a, b) ∼ (c, d) significa ad = bc, que implica da = cb (A sendo comutativo)logo (c, d) ∼ (a, b).

3. Propriedade transitiva. Suponha (a, b) ∼ (c, d) ∼ (e, f), e vamos mostrarque (a, b) ∼ (e, f), isto e, que af = be. Temos ad = bc e cf = de.Multiplicando os dois lados de ad = bc por e temos ade = bce e usandocf = de obtemos acf = bce, isto e, caf − cbe = 0 (A e comutativo).Isolando c temos c(af − be) = 0 (propriedade distributiva) logo se c 6= 0entao af = be, o que queremos (pois A e um domınio de integridade).Agora suponha c = 0. Precisamos mostrar que se ad = 0 e de = 0 entaoaf = be. Como d 6= 0 e A e um domınio de integridade, ad = 0 e de = 0implicam a = e = 0 logo af = be vale.

As classes de equivalencia de ∼ sao [(a, b)]∼ := {(x, y) ∈ R : (x, y) ∼ (a, b)}.O conjunto quociente e

K := R/ ∼ = {[(a, b)]∼ : (a, b) ∈ R}.

Queremos dar a K estrutura de corpo contendo uma copia do anel A.

A primeira coisa para fazer e usar uma notacao menos complicada para aclasse de equivalencia [(a, b)]∼, vamos por

a

b:= [(a, b)]∼.

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Com essa notacao, lembrando que o que acontece em Q e

a

b+c

d=ad+ bc

bd,

a

b

c

d:=

ac

bd

e natural pegar essas igualdades como definicao de soma e produto em K, emoutras palavras (mais formais)

[(a, b)]∼ + [(c, d)]∼ := [(ad+ bc, bd)]∼, [(a, b)]∼ · [(c, d)]∼ := [(ac, bd)]∼.

Agora precisamos verificar que + e · fazem de K um corpo. No que seguelembre-se que por definicao de classe de equivalencia, [(a, b)]∼ = [(c, d)]∼ se esomente se (a, b) ∼ (c, d), isto e, ab = c

d se e somente se ad = bc.

1. + e bem definida. Se ab = x

y (isto e, ay = bx) e cd = z

w (isto e, cw = dz)

precisamos mostrar que ab + c

d = xy + z

w , isto e, ad+bcbd = xw+yz

yw , isto e,

(ad + bc)yw = bd(xw + yz), que segue das propriedades comutativa doproduto e distributiva e do fato que ay = bx e cw = dz.

2. · e bem definida. Se Se ab = x

y (isto e, ay = bx) e cd = z

w (isto e, cw = dz)precisamos mostrar que a

b ·cd = x

y ·zw , isto e, acbd = xz

yw , em outras palavrasacyw = bdxz, o que segue da propriedade comutativa do produto e do fatoque ay = bx e cw = dz.

3. (K,+) e um grupo abeliano com elemento neutro 01 e o inverso de a

b e −ab(em outras palavras, −ab e por definicao −ab ).

A operacao + e associativa pois

(a

b+c

d) +

e

f=ad+ bc

bd+e

f=

(ad+ bc)f + bde

bdf

a

b+ (

c

d+e

f) =

a

b+cf + de

df=adf + (cf + de)b

bdf

sao iguais pois (ad + bc)f + bde = adf + (cf + de) pelas propriedadescomutativa e distributiva de A.

4. (K, ·) e um monoide comutativo com elemento neutro 11 . A operacao · e

associativa pois

a

b· ( cd· ef

) =a

b· cedf

=ace

bdf=ac

bd· ef

= (a

b· cd

) · ef.

E comutativa pois ab ·

cd = ac

bd = cadb = c

d ·ab , sendo A comutativo.

5. A propriedade distributiva, isto e, o fato que ab · (

cd + e

f ) = ab ·

cd + a

b ·ef

(podemos verificar so essa pois · e comutativo). De fato, temos ab ·(

cd+ e

f ) =ab ·

cf+dedf = a(cf+de)

bdf e ab ·

cd + a

b ·ef = ac

bd + aebf = acbf+bdae

bdbf sao iguais pois

a(cf+de)(bdbf) = bdf(acbf+bdae) (definicao de igualdade entre fracoes).

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6. Todo elemento diferente de zero tem inverso. De fato, se ab ∈ K e a

b 6=0 = 0

1 , isto significa que a · 1 6= b · 0, isto e, a 6= 0, logo ba ∈ K. Temos

ab ·

ba = ab

ba = 11 sendo ab = ba.

Isso mostra que K e um corpo. Agora, observe que A pode ser identificadocom A := {a1 : a ∈ A}, que e um subanel de K, sendo a

1 + b1 = a+b

1 ea1 ·

b1 = ab

1 .

O corpo K construido na prova acima e dito corpo de fracoes de A e indicadocomK(A). Por exemploK(Z) = Q. Um outro exemplo e dado pelos polinomios:

K(Z[X]) = Q(X), sendo Q(X) o anel (na verdade, corpo) das fracoes P (X)Q(X)

sendo P (X), Q(X) polinomios de Q[X] e Q(X) 6= 0.

2.1 Ideais, quocientes, teorema de isomorfismo

Seja A um anel comutativo unitario. Em particular A e um grupo abeliano com+; seja I um subgrupo aditivo de A. Como visto no primeiro modulo, sabemosfazer o quociente A/I = {a+ I : a ∈ A} e sabemos que se trata de um grupoaditivo abeliano com elemento neutro I = 0 + I. Observe que como visto noprimeiro modulo, x + I = y + I se e somente se x − y ∈ I (lembre-se que emnotacao multiplicativa, xN = yN se e somente se y−1xN = N , se e somentese y−1x ∈ N). Queremos indagar as propriedades que I precisa ter para poderdar uma estrutura natural de anel a A/I. Ja temos uma operacao de soma emA/I, aquela do grupo quociente: (a + I) + (b + I) := (a + b) + I. A definicaonatural de produto e (a+ I)(b+ I) := ab+ I.

Imagine que A/I seja um anel bem definido com as operacoes definidasacima. Lembre-se que sendo A/I um anel com zero igual a 0 + I = I, temos(a+I)(0+I) = 0+I para todo a ∈ A (pois r ·0 = 0 para todo r ∈ R, se R e umqualquer anel - de fato, pela propriedade distributiva, r·0 = r(1−1) = r−r = 0).Por outro lado x+ I = 0 + I para todo x ∈ I, logo temos (a+ I)(x+ I) = 0 + Ipara todo a ∈ A, x ∈ I, em outras palavras ax+ I = I para todo a ∈ A, x ∈ I,isto e, ax ∈ I para todo a ∈ A, x ∈ I.

Definicao 9. Um ideal de um anel A e um subgrupo aditivo I de A tal queax ∈ I para todo a ∈ A, x ∈ I. Se I e um ideal de A escrevemos I EA.

Por exemplo, e facil mostrar que {0} e A sao ideais de A.

Vamos mostrar que se I e um ideal de A entao as operacoes (a+I)+(b+I) =(a+ b) + I, (a+ I)(b+ I) = ab+ I fazem de A/I um anel comutativo unitariocom elemento neutro da soma 0 + I = I e elemento neutro do produto 1 + I.Vamos mostrar isso.

• O produto e bem definido. Sejam a + I = c + I (isto e, a − c ∈ I),b + I = d + I (isto e, b − d ∈ I) elementos de A/I. Queremos mostrarque (a+ I)(b+ I) = (c+ I)(d+ I), isto e, que o produto nao depende do

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representante escolhido. Mas (a+I)(b+I) = ab+I e (c+I)(d+I) = cd+I,logo temos que mostrar que ab + I = cd + I, isto e, ab − cd ∈ I. Temosab− cd = a(b− d) + d(a− c) ∈ I pois I e um ideal (em particular, grupocom +) e b − d, a − c ∈ I e a, d ∈ A. Observe que aqui usamos as duaspropriedades que definem um ideal.

• O produto e associativo:

(a+ I)((b+ I)(c+ I)) = (a+ I)(bc+ I) = a(bc) + I = (ab)c+ I =

= (ab+ I)(c+ I) = ((a+ I)(b+ I))(c+ I).

• Propriedade distributiva:

(a+I)((b+I)+(c+I)) = (a+I)((b+c)+I) = a(b+c)+I = ab+ac+I =

= (ab+ I) + (ac+ I) = (a+ I)(b+ I) + (a+ I)(c+ I).

Um homomorfismo de aneis A,B e um homomorfismo de grupos aditivosf : A → B com as duas propriedades seguintes: f(xy) = f(x)f(y) para todox, y ∈ A e f(1) = 1. Observe que a primeira dessas duas propriedades em geralnao implica a segunda pois f(1) = f(1 · 1) = f(1)f(1) nao implica f(1) = 1se f(1) nao tem inverso em A (lembre que a operacao de produto em um anelnao e uma operacao de grupo). Um isomorfismo de aneis e um homomorfismobijetivo. Se existe um isomorfismo A→ B escrevemos A ∼= B.

O nucleo de f e ker(f) := {a ∈ A : f(a) = 0} e a imagem de f eIm(f) := {f(a) : a ∈ A}. Ja sabemos que f e injetivo se e somente se einjetivo como homomorfismo de grupos aditivos, e isso vale se e somente seker(f) = {0}.

• ker(f) e um ideal de A. De fato ja sabemos que ker(f) e um subgrupoaditivo de A, e se a ∈ A e x ∈ ker(f) logo f(ax) = f(a)f(x) = f(a)0 = 0entao ax ∈ ker(f).

• Im(f) e um subanel de B. De fato 1 = f(1) ∈ Im(f) e se b1, b2 ∈ Im(f)existem a1, a2 ∈ A com f(a1) = b1 e f(a2) = b2 e b1b2 = f(a1)f(a2) =f(a1a2) ∈ Im(f).

Por exemplo a funcao π : A → A/I (projecao canonica) definida porπ(a) := a+I e um homomorfismo sobrejetivo de aneis e ker(π) = I. Ja vimos noprimeiro modulo que π e um homomorfismo de grupos aditivos e que ker(π) = I,falta mostrar que π respeita o produto e que leva 1 para 1: π(ab) = ab + I =(a+ I)(b+ I) = π(a)π(b) e π(1) = 1 + I.

Teorema 5 (Teorema de isomorfismo). Seja f : A→ B um homomorfismo deaneis. Entao A/ ker(f) ∼= Im(f) (isomorfismo de aneis!).

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Demonstracao. Seja I := ker(f). Ja sabemos que ϕ : A/I → Im(f) definidapor ϕ(a + I) := f(a) e um isomorfismo de grupos aditivos (pelo teorema deisomorfismo visto no primeiro modulo). Falta mostrar que e um homomorfismode aneis: temos

ϕ((a+ I)(b+ I)) = ϕ(ab+ I) = f(ab) = f(a)f(b) = ϕ(a+ I)ϕ(b+ I)

e ϕ(1 + I) = f(1) = 1.

2.2 Polinomios, divisao com resto

Seja A um anel comutativo unitario. Seja N o conjunto dos numeros naturaisincluindo o zero, N = {0, 1, 2, 3, . . .}. Um polinomio a coeficientes em A e umafuncao f : N→ A tal que o conjunto {n ∈ N : f(n) 6= 0} e finito.

A forma comum de indicar um polinomio e como soma formal

P (X) = a0 + a1X + a2X2 + . . .+ anX

n =

n∑i=0

aiXi.

Tal polinomio corresponde a funcao f : N → A definida por f(i) = ai parai = 0, 1, . . . , n e f(i) = 0 para todo i > n (observe que realmente o conjunto {n ∈N : f(n) 6= 0} e finito). O sentido da definicao e o seguinte: dois polinomiossao iguais se e somente se eles tem os mesmos coeficientes correspondentes asmesmas potencias de X: em outras palavras os dois polinomios a0 + a1X +a2X

2 + . . .+anXn e b0 + b1X+ b2X

2 + . . .+ bmXm (com an, bm 6= 0) sao iguais

se e somente se n = m e ai = bi para todo i = 1, . . . , n.Isso pode parecer obvio mas nao e. Por exemplo considere o anel A = F2 =

Z/2Z e o polinomio P (X) = X + X2 ∈ A[X]. A notacao P (X) da vontade depensar a P como a uma funcao, e P (0) = 0 + 02 = 0, P (1) = 1 + 12 = 2 = 0deixa pensar que P (X) = 0, mas isso e falso. P (X) nao e uma funcao de X, e ofato que P (a) = 0 para todo a ∈ A nao implica que P (X) = 0. Simplesmente,P (X) = X + X2 corresponde a funcao f : N → A definida por f(0) = 0,f(1) = 1, f(2) = 1, f(n) = 0 para todo n ≥ 3. Por outro lado, o polinomio nulo0 corresponde a funcao nula f : N→ A (a funcao que leva tudo para 0).

Seja A[X] o conjunto de todos os polinomios a coeficientes em A. Se tratade um anel (anel dos polinomios) com as operacoes seguintes.

• A soma e dada por∑ni=0 aiX

i +∑ni=0 biX

i :=∑ni=0(ai + bi)X

i. Observeque escolhi o mesmo n pois posso sempre adicionar coeficientes nulos. Oelemento neutro de + e o polinomio nulo 0.

• O produto e dado por (aXh)(bXk) := abXh+k impondo a propriedade dis-tributiva. Resulta que (

∑ni=0 aiX

i)(∑ni=0 biX

i) :=∑nk=0(

∑i+j=k aibj)X

k.O elemento neutro de · e o polinomio constante 1.

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O grau de um polinomio nao nulo f : N → A e o maximo n ∈ N talque f(n) 6= 0 (tal n existe por definicao de polinomio), em outras palavrasse P (X) =

∑ni=0 aiX

i e an 6= 0 entao P (X) tem grau n. Por exemplo sea0, a1, a2, . . . ∈ A, entao se a0 6= 0, a0 e um polinomio de grau zero; se a1 6= 0,a0+a1X e um polinomio de grau um, se a2 6= 0, a0+a1X+a2X

2 e um polinomiode grau dois, etcetera. Observe que o grau do polinomio nulo nao e definido.

Seja C um anel comutativo unitario e sejam A(X) = a0 + a1X + . . . +anX

n um polinomio de grau n em C[X], B(X) = b0 + b1X + . . . + bmXm um

polinomio de grau m em C[X]. Suponha bm invertıvel, isto e, existe c ∈ C combmc = 1 (isto e, c = b−1m ). Nesse caso e possıvel fazer a divisao com resto deA(X) por B(X), que significa que e possıvel encontrar dois polinomios Q(X),R(X) (quociente e resto) tais que A(X) = Q(X)B(X) +R(X) e grau(R(X)) <grau(B(X)) ou R(X) = 0. Vamos ver como fazer isso.

Primeiro escreva A(X) = anXn +A′(X), B(X) = bmX

m +B′(X). Defina

Q1(X) := (an/bm)Xn−m (primeiro quociente),R1(X) := A(X)−Q1(X)B(X) (primeiro resto).

Observe que o grau de R1 e menor do grau de A pois R1(X) = A′(X) −(an/bm)Xn−mB′(X) e grau(A′(X)) < n e grau(B′(X)) < m.

Temos Q1(X)B(X) +R1(X) = A(X).Agora a mesma coisa aplicada a R1 no lugar de A fornece Q2 (segundo

quociente), R2 (segundo resto) com R1 = Q2B+R2 logo (Q1+Q2)B+R2 = A, eo grau de R2 e menor do grau de R1. Continuando dessa forma (com R2 no lugarde A, depois com R3 no lugar de A, etcetera) obtemos sequencias de quocientesQ1, . . . , Qk e de restos R1, . . . , Rk com grau(Rk) < grau(B) ou Rk = 0 (comoo grau de Ri decresce, um tal k existe). Defina Q(X) := Q1(X) + . . .+Qk(X)(quociente) e R(X) := Rk(X) (resto). Temos Q(X)B(X) +R(X) = A(X).

Vamos fazer um exemplo em Z[X] (i.e. C = Z). SejamA(X) := 2X5 +X4 −X3 + 2X2 −X + 3,B(X) := X2 −X + 1.O coeficiente de X2 em B(X) e 1, em particular e invertıvel, logo podemos

fazer a divisao com resto. Podemos sintetizar o algoritmo na tabela seguinte.

A(X) = 2X5 +X4 −X3 + 2X2 −X + 3 B(X) = X2 −X + 1Q1(X)B(X) = 2X5 − 2X4 + 2X3 Q1(X) = 2X3

R1(X) = 3X4 − 3X3 + 2X2 −X + 3Q2(X)B(X) = 3X4 − 3X3 + 3X2 Q2(X) = 3X2

R2(X) = −X2 −X + 3Q3(X)B(X) = −X2 +X − 1 Q3(X) = −1R(X) = R3(X) = −2X + 4

Logo R(X) = −2X+ 4 e Q(X) = 2X3 + 3X2−1. Temos Q(X)B(X) +R(X) =A(X).

46

2.3 Ideais gerados por elementos.

Seja A um anel comutativo unitario e sejam a1, . . . , an elementos de A. Defini-mos

(a1, . . . , an) := {a1x1 + . . .+ anxn : x1, . . . , xn ∈ A}.Se trata de um ideal de A, dito ideal de A gerado por a1, . . . , an. De fato, sejaI := (a1, . . . , an). Entao:

1. Se a1x1 + . . .+ anxn ∈ I e a1y1 + . . .+ anyn ∈ I entao

(a1x1+. . .+anxn)+(a1y1+. . .+anyn) = a1(x1+y1)+. . .+an(xn+yn) ∈ I.

2. Se a1x1 + . . .+ anxn ∈ I entao

−(a1x1 + . . .+ anxn) = a1(−x1) + . . .+ an(−xn) ∈ I.

3. 0 = a10 + . . .+ an0 ∈ I.

4. Se a1x1 + . . .+ anxn ∈ I e a ∈ A entao

a(a1x1 + . . .+ anxn) = a1(x1a) + . . .+ an(xna) ∈ I.

Vamos considerar o caso mais simples: n = 1. Pondo a1 = a temos (a) ={ax : x ∈ A}. Um ideal desse tipo e dito principal.

Definicao 10. Um ideal I de A e dito principal se existe a ∈ A tal que I = (a).

Por exemplo (0) = {0x : x ∈ A} = {0} (ideal nulo) e (1) = {1x : x ∈A} = A. Os ideais (0) e (1) sao ditos ideais triviais de A.

Se A = Z e n ∈ Z, o ideal (n) e o conjunto dos multiplos inteiros de n, emoutras palavras (n) = nZ. O anel quociente Z/(n) = Z/nZ e o anel dos inteirosmodulo n, com as operacoes de anel quociente (a+nZ)+(b+nZ) = (a+b)+nZe (a+nZ)(b+nZ) = ab+nZ. Os elementos neutros sao 0+nZ e 1+nZ. Observeque a+ nZ = b+ nZ se e somente se a− b ∈ nZ, isto e, a ≡ b modulo n.

Sejam n,m ∈ Z. Queremos entender o ideal (n,m) = {nx+my : x, y ∈ Z},o ideal gerado por n e m.

Proposicao 12. Se n,m ∈ Z entao (n,m) e principal gerado por MDC(n,m):(n,m) = (MDC(n,m)).

Demonstracao. Seja d = MDC(n,m) e seja I = (n,m). Mostraremos queI = (d) mostrando as duas inclusoes.

I ⊆ (d). Seja nx+my ∈ I. Como d divide n e m, existem inteiros a, b taisque n = da e m = db. Logo nx+my = dax+ dby = d(ax+ by) ∈ (d).

(d) ⊆ I. Como I e um ideal, basta mostrar que d ∈ I, pois se d ∈ I entaodx ∈ I para todo x ∈ Z, em outras palavras (d) ⊆ I. Agora, pelo algoritmo deEuclide existem α, β ∈ Z tais que d = αn+ βm e por definicao de ideal geradoαn+ βm ∈ (n,m).

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Agora descrevemos como funciona o algoritmo de Euclide. Dados inteirosn,m ∈ Z queremos encontrar inteiros x, y tais que nx + my = MDC(n,m).Para fazer isso construimos uma tabela cujas primeiras duas linhas sao

n m1 0 n0 1 m

Adicionamos linhas a essa tabela seguindo o processo seguinte.

n m1 0 n0 1 m...

......

a1 b1 c1a2 b2 c2a3 b3 c3

As linhas tem que ser lidas da maneira seguinte: ain+ bim = ci. Se a1, a2, b1,b2, c1, c2 sao dados, a3, b3, c3 sao determinados da maneira seguinte. Se faz adivisao com resto entre c1 e c2 obtendo c1 = c2q+ r, com q, r ∈ Z e 0 ≤ r < c2.Escolha a3 = a1 − qa2, b3 = b1 − qb2 e c3 = r. O algoritmo termina quando seencontra um resto igual a zero, e o resto anterior sera igual a MDC(n,m).

Por exemplo, encontramos x, y ∈ Z tais que 2013x+367y = MDC(2013, 367).

2013 3671 0 20130 1 3671 −5 178−2 11 1133 −181 2−167 916 1

Obtemos entao que MDC(2013, 367) = 1 (em outras palavras, 2013 e 367 saocoprimos) e −167 · 2013 + 916 · 367 = 1. Observe que reduzindo modulo 2013 emodulo 367 obtemos que o inverso de 2013 modulo 367 e −167 e o inverso de367 modulo 2013 e 916.

Mais em geral, suponha de ter an + bm = 1. Entao bm − 1 ∈ nZ, logo noanel Z/nZ temos (b + nZ)(m + nZ) = 1 + nZ. Nesse sentido “b e o inversode m modulo n”. Analogamente, a e o inverso de n modulo m. Logo, noanel Z/nZ os elementos invertıveis sao exatamente os elementos m + nZ (comm ∈ {0, 1, . . . , n − 1}) tais que m e n sao coprimos. Logo Z/nZ tem ϕ(n)elementos invertıveis (sendo ϕ a funcao de Euler). Vamos ver uma aplicacaosimples (e bem conhecida) desse fato.

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Teorema 6 (Teorema de Euler). Sejam n,m inteiros positivos coprimos. Entaomϕ(n) ≡ 1 mod n.

Demonstracao. Seja U o conjunto dos elementos invertıveis do anel Z/nZ. Comovisto, |U | = ϕ(n), e m+ nZ ∈ U pois n e m sao coprimos. U e um grupo mul-tiplicativo pois todo elemento de U tem inverso em U (por definicao), e comovisto no primeiro modulo, isso implica que se g ∈ U entao g|U | = 1. Escolhendog = m+nZ temos (m+nZ)ϕ(n) = 1, que por definicao de produto no quocientesignifica mϕ(n) + nZ = 1 + nZ, isto e, mϕ(n) ≡ 1 mod n.

Observe que na proposicao acima escolhendo como n um numero primoobtemos o pequeno teorema de Fermat.

Tudo isso implica que se podemos fazer a divisao com resto entao podemosaplicar o algoritmo de Euclide, e mostra a importancia de saber fazer a divisaocom resto.

2.4 Domınios Euclidianos

Queremos dar um nome aos aneis em que conseguimos fazer a divisao com resto(e por consequencia aplicar o algoritmo de Euclide).

Definicao 11 (Domınio Euclidiano). Um Domınio Euclidiano e um domıniode integridade D que admite uma funcao ϕ : D − {0} → N = {0, 1, 2, . . .} talque

1. Para todo a, b ∈ D, com b 6= 0, existem q, r ∈ D tais que a = bq + r comϕ(r) < ϕ(b) ou r = 0.

2. ϕ(a) ≤ ϕ(ab) para todo a, b ∈ D − {0}.

A segunda condicao e puramente tecnica, ela vai permitir simplificar as pro-vas dos teoremas. E possıvel mostrar que se existe uma funcao ϕ que satisfaz (1)entao existe tambem uma funcao ϕ1 que satisfaz (1) e (2) (cf. o livro “Elementosde algebra” de Arnaldo Garcia e Yves Lequain).

Ja temos um exemplo de domınio euclidiano: o anel Z. Nesse caso a funcaoϕ e dada pelo valor absoluto: ϕ(n) := |n|.

Agora vamos mostrar que um outro exemplo de Domınio Euclidiano e o aneldos polinomios K[X] sendo K um corpo.

Primeiro, observe queK[X] e um domınio de integridade: de fato, se P (X) =anX

n + P ′(X) (com an 6= 0) e Q(X) = bmXm + Q′(X) (com bm 6= 0) com

grau(P ′) < grau(P ) e grau(Q′) < grau(Q) (e sempre possıvel escrever umpolinomio dessa forma, por exemplo se P (X) = 6X2 − X − 3 entao n = 2,an = 6, P ′(X) = −X−3) entao P (X)Q(X) = anbmX

n+m+R(X) com R(X) =anX

nQ′(X) +P ′(X)bmXm +P ′(X)Q′(X) e observe que grau(R(X)) < n+m.

Logo, o coeficiente de grau maximo de P (X)Q(X) e anbm sendo anbm 6= 0,

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pois an, bm 6= 0 e K e um corpo (em particular, um domınio de integridade).De fato, se anbm fosse zero entao pelo menos um entre an e bm teria que serzero (por definicao de domınio de integridade). Na verdade o que isso mostra eque se A e um domınio de integridade entao A[X] e um domınio de integridadetambem e grau(P (X)Q(X)) = grau(P (X)) + grau(Q(X)).

O domınio K[X] e Euclidiano pois como ja visto e possıvel fazer a divisaocom resto entre dois polinomios A(X), B(X) 6= 0 quando o coeficiente de graumaximo de B(X) for invertıvel, mas isso e automatico se 0 6= B(X) ∈ K[X] poisK e um corpo. Isso mostra que a condicao (1) da definicao de Domınio Euclidi-ano vale no anel K[X]. A condicao (2) vale tambem pois grau(P (X)Q(X)) =grau(P (X)) + grau(Q(X)) ≥ grau(P (X)).

Proposicao 13. Se D e um Domınio Euclidiano, todo ideal de D e principal.

Demonstracao. Seja I um ideal de D. Precisamos mostrar que I e principal, istoe, que existe a ∈ I tal que I = (a). Se I = {0} isso e obvio pois I = (0). Agorasuponha I 6= (0), e seja a 6= 0 um elemento de I tal que ϕ(a) = min{ϕ(x) :x ∈ I, x 6= 0}. Um tal a existe pois {ϕ(x) : x ∈ I, x 6= 0} e um conjuntode numeros naturais (isto e, um subconjunto de N). Mostraremos que I = (a)mostrando as duas inclusoes. Como I e um ideal contendo a, se x ∈ A entaoax ∈ I. Logo (a) ⊆ I. Mostraremos I ⊆ (a). Seja x ∈ I um elemento qualquerde I e mostraremos que x ∈ (a). Fazendo a divisao com resto de x por a obtemosq, r ∈ D com x = aq + r e ϕ(r) < ϕ(a) ou r = 0. Por outro lado x = aq + rimplica r = x − aq e como x ∈ I e a ∈ I obtemos r = x − aq ∈ I pois I e umideal. Mas entao r ∈ I e ϕ(r) < ϕ(a), e por definicao de a obtemos r = 0, assimx = aq ∈ (a).

Como no caso dos subgrupos normais, um ideal de um anel comutativounitario A e exatamente o nucleo de um homomorfismo de aneis f : A → B(para algum anel B), ker(f) = {a ∈ A : f(a) = 0}. De fato, se I E A entao aprojecao canonica π : A → A/I, a funcao definida por π(a) := a + I, e umhomomorfismo (sobrejetivo) de aneis e ker(π) = I.

O exemplo mais simples de ideal e dado pelos ideais principais. Se a ∈ A oideal principal gerado por a, como ja visto, e (a) = {ax : x ∈ A}. Observeque em geral (a) 6= 〈a〉, sendo que 〈a〉 indica o subgrupo aditivo gerado pora. De fato, (a) = {ax : x ∈ A} e 〈a〉 = {na : n ∈ Z}. Por exemplo seA = R[X] e a = X, temos X2 ∈ (X) = {XP (X) : P (X) ∈ R[X]} masX2 6∈ 〈X〉 = {. . . ,−2X,−X, 0, X, 2X, . . .}.

2.5 Ideais de um anel quociente

Conhecer os ideais de um anel nos permite saber se esse anel e um corpo:

Proposicao 14. Seja A um anel comutativo unitario. Entao A e um corpo see somente se os unicos ideais de A sao (0) = {0} e (1) = A.

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Demonstracao. Suponha A corpo e seja I um ideal de A com I 6= (0). Sejax ∈ I com x 6= 0. Como A e um corpo, x−1 ∈ A, logo xx−1 ∈ I pois I e ideal,assim 1 ∈ I. Mas se a ∈ A entao a = a · 1 ∈ I pois I e ideal e 1 ∈ I. Isso mostraque A ⊆ I, logo A = I.

Suponha que os unicos ideais de A sejam (0) = {0} e (1) = A. Seja x ∈ Acom x 6= 0 e vamos mostrar que x tem inverso em A. Como x 6= 0, o idealprincipal (x) = {ax : a ∈ A} e um ideal nao nulo de A. Como os unicos ideaisde A sao (0) e (1), temos (x) = (1), em particular 1 ∈ (x), logo existe a ∈ A talque ax = 1, assim a e o inverso de x.

Logo A e um corpo se e somente se A tem exatamente dois ideais, (0) e (1).

Teorema 7 (Teorema de correspondencia). Seja I um ideal de um anel comu-tativo unitario A. Existe uma bijecao (canonica) A → B entre o conjunto Ados ideais de A que contem I e o conjunto B dos ideais de A/I.

Demonstracao. Defina ϕ : A → B por ϕ(J) := J/I e ψ : B → A por ψ(T ) :={a ∈ A : a+ I ∈ T}. Primeiro, mostraremos que ϕ e ψ sao bem definidas, istoe, que se J ∈ A entao ϕ(J) e um ideal de A/I e que se T ∈ B entao ψ(T ) e umideal de A contendo I.

• Um elemento de J/I tem a forma x+ I sendo x ∈ J . Se x+ I, y+ I ∈ J/Ientao (x + I) + (y + I) = x + y + I ∈ J/I pois x + y ∈ J sendo J umideal de A. Alem disso, −(x + I) = −x + I ∈ J/I pois −x ∈ J sendo Jum ideal de A. Se a+ I ∈ A/I entao (a+ I)(x+ I) = ax+ I ∈ J/I poisax ∈ J sendo J um ideal de A. Isso mostra que J/I EA/I.

• Sejam x, y ∈ ψ(T ), assim x + I, y + I ∈ T . Temos x + y + I = (x + I) +(y + I) ∈ T pois x+ I, y + I ∈ T e T e um ideal de A/I; isso mostra quex + y ∈ ψ(T ). Alem disso, −x + I = −(x + I) ∈ T pois x + I ∈ T e T eum ideal de A/I; isso mostra que −x ∈ ψ(T ). Se x ∈ ψ(T ) e a ∈ A entaoax + I = (a + I)(x + I) ∈ T pois T e um ideal de A/I; isso mostra queax ∈ ψ(T ). Isso mostra que ψ(T )EA. ψ(T ) contem I pois se x ∈ I entaox+ I = I = 0 + I ∈ T pois T e um ideal de A/I.

Vamos mostrar que para todo J ∈ A, T ∈ B temos ψ(ϕ(J)) = J e ϕ(ψ(T )) = T .

• Temos ψ(ϕ(J)) = ψ(J/I) = {a ∈ A : a+ I ∈ J/I}. a+ I ∈ J/I significaque existe j ∈ J tal que a + I = j + I, isto e, a − j = i ∈ I, assima = i + j ∈ J sendo J ⊇ I. Por outro lado e claro que se a ∈ J entaoa + I ∈ J/I. Isso mostra que a + I ∈ J/I e equivalente a a ∈ J , logoψ(ϕ(J)) = {a ∈ A : a ∈ J} = J .

• Temos ϕ(ψ(T )) = {a ∈ A : a+I ∈ T}/I. Vamos mostrar que ϕ(ψ(T )) =T mostrando as duas inclusoes. Se x + I ∈ ϕ(ψ(T )) entao x + I = a + Icom a + I ∈ T logo x + I ∈ T ; isso mostra (⊆). Se t = a + I ∈ T entaoa ∈ ψ(T ) logo t = a+ I ∈ ϕ(ψ(T )); isso mostra (⊇).

Logo ϕ e ψ sao bijecoes (uma a inversa da outra).

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Por exemplo, isso implica que se I EA, o anel A/I e um corpo se e somentese I e um ideal maximal de A, isto e, os unicos ideais de A que contem I sao Ie A. De fato, como visto acima A/I e um corpo se e somente se os unicos ideaisde A/I sao os ideais triviais, I/I e A/I. Pelo teorema de correspondencia, issosignifica que os unicos ideais de A contendo I sao I e A.

Para fazer mais exemplos precisamos do seguinte. Dados dois elementosa, b ∈ A, dizemos que a divide b se existe c ∈ A tal que ac = b.

Lema 3. Sejam a, b ∈ A. Entao (a) ⊇ (b) se e somente se a divide b. Emparticular, (a) = (b) se e somente se a divide b e b divide a.

Demonstracao. Se (a) ⊇ (b) entao b ∈ (a) logo b = ac para algum c ∈ A (pordefinicao de ideal principal), isto e, a divide b. Viceversa se a divide b existec ∈ A com b = ac e se x ∈ A entao bx = acx ∈ (a), isso mostra que (b) ⊆ (a).

Vamos fazer dois exemplos importantes.

1. Vamos contar os ideais de A = Z/6Z. O ideal 6Z de Z e o ideal principalgerado por 6, que na nossa notacao e (6). Pelo teorema de correspondencia,queremos entender os ideais I de Z que contem (6). Como Z e um domınioEuclidiano (com a funcao ϕ(n) = |n|), todos os ideais de Z sao principais(como mostrado na aula passada), logo I = (a) para algum a ∈ Z. Comovisto no lema acima, I = (a) contem (6) se e somente se a divide 6, entaoas possibilidades para a sao 1, 2, 3, 6,−1,−2,−3,−6 (os divisores de 6 emZ). Por outro lado se x ∈ {1, 2, 3, 6} entao x divide −x (pois−x = (−1)x)e −x divide x (pois x = (−x)(−1)), logo pelo lema (x) = (−x). Issoimplica que as possibilidades para I = (a) sao (1), (2), (3) e (6). Logo Atem exatamente 4 ideais.

2. Vamos contar os ideais de A = R[X]/(X2 − 1). Como R e um corpo,R[X] e um dominio Euclidiano (com a funcao grau) logo todos os ideaisde R[X] sao principais. Se I e um ideal de R[X] que contem (X2 − 1)entao I = (P (X)) e tal que P (X) divide X2 − 1 = (X − 1)(X + 1). Logoas unicas possibilidades para P (X) sao cQ(X) sendo Q(X) ∈ {1, X2 −1, X − 1, X + 1} e sendo c um numero real nao nulo (isto e, um elementoinvertıvel de R[X]). Observe que Q(X) divide cQ(X) (claro) e cQ(X)divide Q(X) (pois Q(X) = (cQ(X))(1/c)), logo (Q(X)) = (cQ(X)), issomostra que as unicas possibilidades para I = (P (X)) sao (1), (X − 1),(X + 1) e (X2 − 1), logo A tem exatamente 4 ideais.

Falaremos desse tipo de exemplos mais cuidadosamente quando falaremosde domınios de fatoracao unica.

2.6 Mais sobre domınios Euclidianos

Observe que se A e um domınio de integridade entao (notas de aula do 28de abril) se P (X), Q(X) ∈ A[X], o grau do produto P (X)Q(X) e igual a

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grau(P (X)) + grau(Q(X)). Isso mostra em particular que A[X] e um domıniode integridade. Por exemplo, Z[X] e um domınio de integridade. Vamos mos-trar que Z[X] nao e um domınio Euclidiano. Ja sabemos que Z[X] nao eEuclidiano com a funcao grau, pois por exemplo nao pode se fazer a divisao comresto de X por 2 (com a funcao grau), mas isso nao basta. Para mostrar queZ[X] nao e um domınio Euclidiano precisamos mostrar que nao existe nenhumafuncao ϕ : Z[X]− {0} → N que faz de Z[X] um domınio Euclidiano.

Na verdade, o que vamos fazer e mostrar que Z[X] contem ideais naoprincipais. Como em um domınio Euclidiano todos os ideais sao principais, issomostra que Z[X] nao e um domınio Euclidiano. Seja I := (2, X) = {2A(X) +XB(X) : A(X), B(X) ∈ Z[X]}. Vamos mostrar que I nao e principal. Supo-nha por contradicao que (2, X) = (P (X)) para algum P (X) ∈ Z[X], entao como2 e X pertencem a (P (X)) existem polinomios C(X), D(X) ∈ Z[X] tais queP (X)C(X) = 2 e P (X)D(X) = X. Como o grau de um produto e a soma dosgraus (sendo Z domınio de integridade) e 2 tem grau 0, P (X)C(X) = 2 implicaque P (X) tem grau 0, P (X) = α ∈ Z, assim P (X)D(X) = X implica que D(X)tem grau 1, D(X) = aX + b. Logo X = P (X)D(X) = α(aX + b) = αaX + αb,assim αa = 1 por definicao de polinomio. Entao α e um inteiro invertıvel,assim α = ±1, e I = (2, X) = (P (X)) = (α) = (±1) = Z[X], em particular1 ∈ I = (2, X). Logo existemA(X), B(X) ∈ Z[X] tais que 2A(X)+XB(X) = 1,e substituindo X = 0 obtemos 2A(0) = 1, absurdo (pois A(0) ∈ Z).

O que fizemos no final do argomento anterior e uma substituicao, X = 0.Mais em geral, se A e B sao aneis com A ≤ B (A subanel de B) e b ∈ B podemosconsiderar

vb : A[X]→ B, vb(a0 + a1X + . . .+ anXn) := a0 + a1b+ . . .+ anb

n,

em outras palavras vb(P (X)) := P (b). Se trata de um homomorfismo de aneis(homomorfismo de substituicao), pois e claro que vb(1) = 1 e vb(P (X) +Q(X)) = P (b) +Q(b) = vb(P (X)) + vb(Q(X)) e vb(P (X)Q(X)) = P (b)Q(b) =vb(P (X))vb(Q(X)). A imagem de vb e indicada com A[b]: Im(vb) = A[b].Observe que A[b] nao e um anel de polinomios: se trata do subanel de B seguinte:

A[b] := {a0 + a1b+ . . .+ anbn : n ∈ N, a0, a1, . . . , an ∈ A} ≤ B.

Por exemplo considere o caso A = R, B = C, b = i (assim i2 = −1). Nessecaso vi : R[X]→ C e dado por vi(P (X)) := P (i). Observe que vi e sobrejetiva,de fato se a + ib e um elemento qualquer de C entao vi(a + bX) = a + ib. Einteressante estudar o nucleo de vi, I = ker(vi). Como I e um ideal de R[X],que e um domınio Euclidiano (pois R e corpo), I e principal, isto e, I = (P (X))para algum P (X) ∈ R[X]. Pela demonstracao do fato que todos os ideaisde um domınio Euclidiano sao principais, P (X) e um polinomio de I de graumınimo entre os polinomios de I, em outras palavras, P (X) e um polinomio degrau mınimo entre os polinomios A(X) com a propriedade que A(i) = 0. LogoI = (P (X)) = (X2 + 1), em outras palavras X2 + 1 tem essa propriedade de

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minimalidade (nao estou dizendo que necessariamente P (X) = X2 + 1, poispoderia escolher tambem P (X) = c(X2 + 1) com c um qualquer numero realnao nulo, pois (c(X2 + 1)) = (X2 + 1) nesse caso). Seguindo a demonstracao,podemos mostrar que ker(vi) = (X2 + 1) da forma seguinte.

• (⊇). Um elemento qualquer de (X2 + 1) tem a forma A(X)(X2 + 1)para A(X) ∈ R[X] e ele pertence a ker(vi) pois vi(A(X)(X2 + 1)) =A(i)(i2 + 1) = 0 sendo i2 = −1.

• (⊆). Seja A(X) ∈ ker(vi). Pela divisao com resto no domınio EuclidianoR[X], existem Q(X), R(X) ∈ R[X] tais que A(X) = Q(X)(X2+1)+R(X)com grau(R(X)) < 2 ou R(X) = 0. Se R(X) 6= 0 entao grau(R(X)) < 2logoR(X) = a+bX com a, b ∈ R, assimR(i) = A(i)−Q(i)(i2+1) = 0 (poisA(X) ∈ ker(vi)) implica que 0 = R(i) = a+ bi. Se b = 0 entao a+ bi = 0implica a = 0 assim R(X) = 0, o que e falso, entao b 6= 0 e a + bi = 0implica i = −a/b ∈ R, contradicao. Logo A(X) = Q(X)(X2 + 1) ∈(X2 + 1).

Observe que pelo teorema de isomorfismo obtemos que R[X]/(X2 + 1) ∼= C.

O anel dos inteiros gaussianos e o anel Z[i], a imagem do homomorfismode substituicao vi : Z[X] → C. Se trata do conjunto dos elementos de C quetem a forma a+ ib com a, b ∈ Z. Observe que Z[i] e um subanel de C, que e umcorpo, logo Z[i] e um domınio de integridade. Veremos que Z[i] e um domınioEuclidiano com a funcao ϕ(a+ ib) = N(a+ ib) = a2 + b2.

2.7 Exercıcios resolvidos

1. Seja G um grupo abeliano aditivo e seja R = End(G) o conjunto doshomomorfismos de grupo G → G (os endomorfismos de G). Mostre queR e um anel (em geral nao comutativo) com as operacoes +, ◦ definidaspor (f +g)(x) := f(x)+g(x) e (f ◦g)(x) := f(g(x)) (soma e composicao).

A soma e associativa pois ((f + g) + h)(x) = (f + g)(x) + h(x) = (f(x) +g(x)) +h(x) = f(x) + (g(x) +h(x)) = f(x) + (g+h)(x) = (f + (g+h))(x)para todo x ∈ G, logo (f +g)+h = f +(g+h). O elemento neutro de + ea funcao nula, f(x) = 0 para todo x ∈ G. O oposto de f e −f definido por(−f)(x) := −f(x). Se trata de endomorfismos de G. A composicao ◦ eassociativa pois ((f ◦g)◦h)(x) = (f ◦g)(h(x)) = f(g(h(x))) = f(g◦h(x)) =(f ◦ (g ◦ h))(x). O elemento neutro de ◦ e a funcao identidade, f(x) = xpara todo x ∈ G (e um endomorfismo de G). Propriedades distributivas:

• (f◦(g+h))(x) = f((g+h)(x)) = f(g(x)+h(x)) = f(g(x))+f(h(x)) =(f ◦ g)(x) + (f ◦ h)(x), logo f ◦ (g + h) = f ◦ g + f ◦ h. Observe queusamos o fato que f respeita a operacao de G.

• ((f+g)◦h)(x) = (f+g)(h(x)) = f(h(x))+g(h(x)) = (f ◦h+g◦h)(x),logo (f+g)◦h = f ◦h+g◦h. Observe que aqui usamos simplesmentea definicao de soma em R.

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2. Seja G o grupo aditivo cıclico Z/nZ = {0, 1, 2, . . . , n − 1}. Mostre queEnd(G) (definido no exercıcio acima) e um anel comutativo.

Sabemos pelo exercıcio anterior que End(G) e um anel com + e ◦. Sef ∈ End(G) e m + nZ ∈ G entao m e uma soma 1 + 1 + . . . + 1 logo(identificando m com a classe m + nZ) f(m) = f(1 + 1 + . . . + 1) =f(1) + f(1) + . . .+ f(1) = mf(1), assim f e completamente determinadopela imagem de 1, f(1) (observe que mf(1) e um produto em Z/nZ vistocomo anel). Se f, g ∈ End(G) entao f ◦ g(m) = f(g(m)) = f(mg(1)) =mg(1)f(1), e g ◦ f(m) = g(f(m)) = g(mf(1)) = mf(1)g(1), entao comog(1)f(1) = f(1)g(1) (pois Z/nZ, visto como anel, e comutativo) obtemosf ◦ g = g ◦ f . Isso mostra que End(G) e um anel comutativo.

Observe tambem que End(Z/nZ) (o anel dos endomorfismo do grupo adi-tivo Z/nZ) e isomorfo a Z/nZ (o anel quociente Z/nZ) via o isomorfismoϕ : End(Z/nZ)→ Z/nZ definido por ϕ(f) := f(1).

3. Mostre que Z/nZ com as operacoes (x+ nZ) + (y + nZ) := (x+ y) + nZe (x+ nZ) · (y+ nZ) := xy+ nZ e um anel comutativo. E um domınio deintegridade?

Ja vimos em sala de aula que Z/nZ e um anel quociente comutativo.Observe que se n nao e primo entao existem a, b inteiros maiores de 1 taisque ab = n, assim no quociente (a+nZ)(b+nZ) = n+nZ = 0, logo Z/nZnao e um domınio de integridade. Por outro lado se n = p e primo entaoZ/nZ e um domınio de integridade, pois um produto (a + pZ)(b + pZ) eigual a zero se e somente se ab ∈ pZ, isto e, p divide ab. Mas como p eprimo, e divide ab, p divide um entre a e b, logo uma das classes a + pZe b + pZ e zero. Isso mostra que Z/nZ e um domınio de integridade see somente se n e um numero primo (e nesse caso se trata de um corpopois um domınio de integridade finito e sempre um corpo: veja o proximoexercıcio).

4. Seja A um domınio de integridade de cardinalidade finita. Mostre que A eum corpo. [Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere a funcao A→ Adada pela multiplicacao por a.]

Dado a ∈ A diferente de zero, queremos mostrar que a tem inverso em A,em outras palavras, que existe b ∈ A tal que ab = 1. Considere a funcaof : A→ A dada por f(x) := ax. Ela e injetiva pois se f(x) = f(y) entaoax = ay logo a(x− y) = 0 e como a 6= 0 e A e um domınio de integridade,obtemos x − y = 0, isto e, x = y. Isso mostra que f e injetiva. ComoA e um conjunto finito, o princıpio da casa dos pombos mostra que f esobrejetiva, assim existe b ∈ A tal que f(b) = 1, isto e, ab = 1.

5. Sejam A,B aneis e seja A×B o produto direto de A e B, com as operacoes(a, b) + (c, d) = (a + c, b + d) e (a, b)(c, d) = (ac, bd), elementos neutros(0, 0) e (1, 1). Mostre que A × B e um anel e que nao e um domınio deintegridade.

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A verifica que A × B e um anel e facil. Nao e um domınio pois (1, 0) 6=(0, 0), (0, 1) 6= (0, 0) mas (1, 0)(0, 1) = (0, 0).

6. Dado um domınio de integridade A, mostre que f : A → K(A), a 7→ a1 e

um homomorfismo injetivo de aneis.

Temos f(1) = 1/1, f(a + b) = a/1 + b/1 = (a + b)/1 e f(ab) = ab/1 =(a/1)(b/1), logo f e homomorfismo de aneis. E injetivo pois ker(f) = {0},de fato se f(a) = 0 entao a/1 = 0, isto e, a · 1 = 1 · 0 logo a = 0.

7. Seja f : A→ B um homomorfismo de aneis e seja J um ideal de B. Mostreque f−1(J) = {a ∈ A : f(a) ∈ J} e um ideal de A. E verdade que se I eum ideal de A entao f(I) e um ideal de B?

Seja I := f−1(J). E claro que 0 ∈ I pois f(0) = 0 ∈ J . Se x, y ∈ J entaof(x+ y) = f(x) + f(y) ∈ J pois f(x), f(y) ∈ J logo x+ y ∈ I, e se x ∈ Ie a ∈ A entao f(ax) = f(a)f(x) ∈ J pois f(a) ∈ B, f(x) ∈ J e J e umideal de B, logo ax ∈ I. Em particular escolhendo a = −1 obtemos quese x ∈ I, −x ∈ I. Isso mostra que I e um ideal. Se I e um ideal qualquerde A entao em geral f(I) nao e um ideal de B, por exemplo considere ainclusao f : Z → Q, f(z) := z. E claro que Z e ideal de Z mas f(Z) = Znao e ideal de Q (pois os unicos ideais de Q sao (0) e Q, sendo Q umcorpo).

8. Seja f : A[X]→ A a funcao definida por f(P (X)) := P (0). Mostre que fe um homomorfismo de aneis e que

I = ker(f) = {XP (X) : P (X) ∈ A[X]}.

Mostre que A[X]/I ∼= A.

f e homomorfismo de aneis pois f(0) = 0, f(1) = 1 e f(P (X) +Q(X)) =P (0) + Q(0) = f(P (X)) + f(Q(X)) e f(P (X)Q(X)) = P (0)Q(0) =f(P (X))f(Q(X)). f e sobrejetivo pois se a ∈ A entao visto a comopolinomio (constante) temos f(a) = a. Vamos mostrar que I = ker(f) ={XP (X) : P (X) ∈ A[X]}. A inclusao ⊇ e facil pois f(XP (X)) =0P (0) = 0, vamos mostrar a inclusao ⊆. Seja F (X) ∈ I = ker(f) (istoe, F (0) = 0), escrevemos F (X) = a0 + a1X + a2X

2 + . . . + anXn, assim

F (0) = 0 significa a0 = 0, logo F (X) = a1X+a2X2+. . .+anX

n = X(a1+a2X + . . .+ anX

n−1). Logo escolhendo P (X) = a1 + a2X + . . .+ anXn−1

obtemos que F (X) pertence a {XP (X) : P (X) ∈ A[X]}. O fato queA[X]/I ∼= A segue do teorema de isomorfismo.

9. Sejam A(X) = 6X4 + X2 + 1, B(X) = X2 − 2 em Z[X]. Faca a divisaocom resto de A(X) por B(X).

6X4 +X2 + 1 X2 − 26X4 − 12X2 6X2 + 13

13X2 + 113X2 − 26

27

56

Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) + R(X) sendo Q(X) = 6X2 + 13(quociente) e R(X) = 27 (resto).

10. Sejam A(X) = −2X5 − 2X4 − 6X3 −X2 −X − 3, B(X) = −X2 −X − 3em Z[X]. Faca a divisao com resto de A(X) por B(X).

−2X5 − 2X4 − 6X3 −X2 −X − 3 −X2 −X − 3−2X5 − 2X4 − 6X3 2X3 + 1−X2 −X − 3−X2 −X − 3

0

Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) + R(X) sendo Q(X) = 2X3 + 1 eR(X) = 0. Em outras palavras B(X) divide A(X).

11. Seja A um domınio de integridade e sejam P (X), Q(X) ∈ A[X]. Mostreque o grau(P (X)Q(X)) = grau(P (X)) + grau(Q(X)).

Escrevemos P (X) = anXn + P ′(X) e Q(X) = bmX

m + Q′(X) comgrau(P ) = n, grau(Q) = m assim an 6= 0, bm 6= 0 e grau(P ′) < n,grau(Q′) < m. Fazendo o produto P (X)Q(X) obtemos anbmX

n+m +R(X) com grau(R(X)) < n+m, e como A e um domınio de integridadee an 6= 0, bm 6= 0, obtemos anbm 6= 0 logo grau(P (X)Q(X)) = n+m.

12. Escreva e demonstre o teorema de isomorfismo para espacos vetoriais sobreR. Se V e um espaco vetorial e W e um subespaco, V/W = {v + W :v ∈ V } e um espaco vetorial com a multiplicacao por escalar dada pora(v + W ) := av + W (para todo a ∈ R, v ∈ V ). Consegue calculardim(V/W )?

Um homomorfismo de espacos vetoriais (sobre um corpo k) e uma funcaolinear f : V → U entre espacos vetoriais V,U . Seja W = ker(f). V/W ={v+W : v ∈ V } e um espaco vetorial com multiplicacao por escalar dadapor a(v + W ) := av + W (observe que para definir V/W nao precisamosde nenhuma condicao ulterior em W , basta que W seja um subespaco).Temos que ϕ : V/W → U dada por ϕ(v + W ) := f(v) e um isomorfismode espacos vetoriais: de fato, e um isomorfismo de grupos aditivos peloteorema de isomorfismo de grupos, e e k-linear pois ϕ(a(v+W )) = ϕ(av+W ) = f(av) = af(v) = aϕ(v +W ). Logo V/W ∼= Im(f). Lembre-se quedim(V ) = dim(ker(f)) + dim(Im(f)) e ker(f) = W , logo dim(V/W ) =dim(Im(f)) = dim(V )− dim(W ).

13. Usando o algoritmo de Euclide encontre um gerador do ideal (360, 12705)de Z (ideal gerado).

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12705 3601 0 127050 1 3601 −35 105−3 106 457 −247 15

Os quocientes sao 35, 3, 2. O algoritmo terminou pois o proximo restoseria zero (15 divide 45). Obtemos que

12705 · 7 + 360 · (−247) = 15 = MDC(12705, 360).

14. Usando o algoritmo de Euclide encontre um gerador do ideal (X5 +2X3 +X2 +1, X2 +X−2) de Q[X] (ideal gerado). Em outras palavras, encontreo maior divisor comum dos dois geradores.

X5 + 2X3 +X2 + 1 X2 +X − 21 0 X5 + 2X3 +X2 + 10 1 X2 +X − 21 −X3 +X2 − 5X −6X2 + 10X + 116 − 1

6X3 + 1

6X2 − 5

6X + 1 83X −

116

A(X) B(X) 1935/384

sendo A(X) = 1− 16 (− 9

4X + 14164 ) e B(X) = −X3 +X2 − 5X − (− 1

6X3 +

16X

2 − 56X + 1)(− 9

4X + 14164 ).

Observe tambem (mesmo que nao seja pedido do exercıcio) que 3841935A(X)

e o inverso de X5 + 2X3 +X2 + 1 no anel Q[X]/(X2 +X− 2) e 3841935B(X)

e o inverso de X2 +X − 2 no anel Q[X]/(X5 + 2X3 +X2 + 1). O maiordivisor comum entre X5 + 2X3 +X2 + 1 e X2 +X − 2 e 1 (observe que omaior divisor comum e definido a menos de multiplicar por um elementoinvertıvel, isto e, uma constante nao nula). Eles sao polinomios coprimos.Isso implica que (X5 + 2X3 +X2 + 1, X2 +X − 2) = (1) = Q[X].

15. Seja A um anel (comutativo unitario) e seja f : A[X] → A a funcaodefinida por f(P (X)) := P (0), isto e, f(a0 + a1X + . . . + anX

n) := a0.Usando o teorema de isomorfismo, mostre que A[X]/(X) ∼= A (sendo (X)o ideal principal gerado por X).

Se trata do exercıcio 8, pois (X) = {XP (X) : P (X) ∈ A[X]}. A unicacoisa diferente e a notacao (X).

16. Seja B um anel (comutativo unitario) e seja A um subanel de B. Dadob ∈ B considere a funcao vb : A[X]→ B definida por vb(P (X)) := P (b):

vb(a0 + a1X + . . .+ anXn) := a0 + a1b+ . . .+ anb

n.

Mostre que se trata de um homomorfismo de aneis. Considere agora ocaso A = R e B = C, b = i (assim i2 = −1). Mostre que ker(vi) e o ideal

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principal gerado por X2 + 1 (Dica: dado P (X) ∈ ker(vi) faca a divisaocom resto de P (X) por X2+1). Usando o teorema de isomorfismo, deduzaque

C ∼= R[X]/(X2 + 1).

Esse exercıcio foi resolvido em sala de aula (notas de aula do dia 3 demaio).

17. Qual e o nucleo de vi : Z[X] → C, P (X) 7→ P (i)? Aplique o teorema deisomorfismo para escrever Z[i] como quociente de Z[X].

Vamos mostrar que ker(vi) = (X2 + 1). Para fazer isso mostraremosas duas inclusoes. Se P (X) ∈ (X2 + 1) entao P (X) = (X2 + 1)A(X)com A(X) ∈ Z[X] e vi(P (X)) = vi((X

2 + 1)A(X)) = (i2 + 1)A(i) = 0pois i2 = −1. Isso mostra ⊇. Agora mostraremos a inclusao ⊆. SejaP (X) ∈ ker(vi), e fazemos a divisao com resto de P (X) por X2 + 1(pode ser feita, embora Z[X] nao seja um domınio Euclidiano, pois ocoeficiente de grau maximo de X2 +1 e 1, que e invertıvel em Z!), obtendoP (X) = Q(X)(X2 + 1) + R(X) com R(X) = 0 ou grau(R(X)) < 2. SeR(X) 6= 0 entao grau(R(X)) < 2 logo R(X) = a + bX com a, b ∈ Z,assim R(i) = P (i) − Q(i)(i2 + 1) = 0 (pois P (X) ∈ ker(vi)) implica que0 = R(i) = a+bi. Se b = 0 entao a+bi = 0 implica a = 0 assim R(X) = 0,o que e falso, entao b 6= 0 e a+ bi = 0 implica i = −a/b ∈ Q, contradicao.Logo R(X) = 0 e P (X) = Q(X)(X2 + 1) ∈ (X2 + 1).

Isso mostra que ker(vi) = (X2 + 1), logo pelo teorema de isomorfismoZ[i] = Im(vi) ∼= Z[X]/(X2 + 1).

18. Calcule o nucleo de vi+1 : Q[X]→ C, vi+1(P (X)) := P (i+ 1).

Seja α := i + 1. Observe que (α − 1)2 = −1, logo α e raiz do polinomio(X−1)2+1 = X2−2X+2. Por outro lado, α nao e raiz de um polinomio degrau 1 pois se aX+b ∈ Q[X] tem α como raiz, aα+b = 0 implica que α =−b/a ∈ Q, contradicao. Logo X2−2X+2 e um polinomio de grau mınimoentre os polinomios que tem i+1 como raiz, logo ker(vi+1) = (X2−2X+2)(veja a demonstracao do fato que os ideais de um domınio Euclidianosao principais, notas de aula do dia 28 de abril). Pode-se mostrar queker(vi+1) = (X2 − 2X + 2) tambem mostrando as duas inclusoes comofeito no exercıcio anterior.

19. Seja A um domınio de integridade e sejam a, b ∈ A. Mostre que (a) = (b)se e somente se existe um elemento invertıvel u ∈ A tal que b = au.

Suponha (a) = (b), assim a divide b e b divide a. Escrevemos b = ac ea = bd, assim a = bd = acd logo a(1 − cd) = 0. Como A e um domıniode integridade, isso implica que tem dois casos: a = 0 ou 1− cd = 0. Noprimeiro caso a = 0 assim (a) = (0) = {0} e (a) = (b) implica que b = 0logo b = a · 1 (pois a = b = 0) e podemos escolher u = 1. Suponha agoraque a 6= 0, assim estamos no segundo caso, 1− cd = 0, assim cd = 1, logoc e invertıvel. Como b = ac, podemos escolher u = c.

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Agora suponha que b = au com u invertıvel. Para mostrar que (a) = (b)basta mostrar que a divide b e b divide a. Como b = au, e claro que adivide b. Por outro lado como u e invertıvel a = bu−1 logo b divide a.

20. Conte os ideais de Z/12Z.

Pelo teorema de correspondencia, os ideais de Z/12Z = Z/(12) correspon-dem aos ideais de Z que contem (12), e como os ideais de Z sao principais(sendo Z um domınio Euclidiano), um ideal que contem (12) tem a forma(a) sendo a um divisor de 12, isto e, a ∈ {±1,±2,±3,±4,±6,±12}. Como1 e −1 sao invertıveis, pelo exercıcio anterior (a) = (−a) logo as possibili-dades para (a) sao (1), (2), (3), (4), (6), (12), assim Z/12Z tem 6 ideais.O mesmo argomento mostra que o numero de ideais de Z/nZ e igual aonumero de divisores positivos de n (isso e razoavel pois no caso de Z/nZtodos os subgrupos aditivos sao ideais, e o numero de subgrupos de umgrupo cıclico Cn e o numero de divisores positıvos de n).

21. Mostre que Z/nZ e um corpo se e somente se n e um numero primo.

Veja o exercıcio 3 acima.

22. Mostre que se n > 1 e um inteiro, (n,X)EZ[X] nao e um ideal principal.

Suponha por contradicao que (n,X) seja principal, (n,X) = (P (X)) paraalgum P (X) ∈ Z[X]. Em particular P (X) divide n e X, logo a unicapossibilidade e P (X) = 1 (como no caso ja visto de n = 2), em particular(n,X) = (P (X)) = (1) = Z[X], logo existem A(X), B(X) ∈ Z[X] taisque nA(X) + XB(X) = 1. Substituindo X = 0 obtemos nA(0) = 1,contradicao pois n e um inteiro maior doque 1 e A(0) e um inteiro (osunicos inteiros invertıveis sao 1 e −1).

23. Mostre que (X) e um ideal maximal de Q[X] (considere v0).

Usando v0 (o homomorfismo de substituicao v0(P (X)) := P (0)), ja vimosque Q[X]/(X) ∼= Q (nos exercıcios 8 e 15). Logo Q[X]/(X) e um corpo(sendo um anel isomorfo a Q, que e um corpo), entao (X) e um idealmaximal de Q[X] (lembre-se que A/I e um corpo se e somente se I e umideal maximal).

24. Mostre que (X2−1) nao e um ideal maximal de Q[X] (quantos ideais temo quociente?).

Como visto em sala de aula, o quociente Q[X]/(X2−1) tem quatro ideais(correspondentes aos divisores 1, X − 1, X + 1, X2 − 1 de X2 − 1), logonao e um corpo (um corpo tem somente dois ideais, os dois ideais triviais(0) e (1)), logo (X2−1) nao e um ideal maximal (lembre-se que A/I e umcorpo se e somente se I e um ideal maximal).

25. Seja a ∈ R. Mostre que R[X]/(X − a) ∼= R.

Queremos aplicar o teorema de isomorfismo. Para fazer isso, considereva : R[X] → R, o homomorfismo de substituicao va(P (X)) := P (a). Ele

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e sobrejetivo pois se r ∈ R entao r e um polinomio constante e va(r) = r.Para deduzir que R[X]/(X−a) ∼= R usando o teorema de isomorfismo faltamostrar que ker(va) = (X − a). Vamos mostrar isso mostrando as duasinclusoes. Se P (X) ∈ (X − a) entao P (X) = Q(X)(X − a) para algumQ(X) ∈ R[X] logo va(P (X)) = va(Q(X)(X−a)) = Q(a)(a−a) = 0, assimP (X) ∈ ker(va). Isso mostra que (X − a) ⊆ ker(va). Mostraremos agoraque ker(va) ⊆ (X − a), seja entao P (X) ∈ ker(va). Queremos mostrarque X − a divide P (X), e para fazer isso fazemos a divisao com restode P (X) por X − a (no domınio Euclidiano R[X] - lembre-se que se k eum corpo, k[X] e um domınio Euclidiano) esperando que o resto seja 0.Sejam entao Q(X), R(X) in R[X] tais que P (X) = (X−a)Q(X)+R(X) egrau(R(X)) < 1 ou R(X) = 0. Temos entao R(X) = P (X)−(X−a)Q(X)logo R(a) = P (a)− (a− a)Q(a) = P (a) = 0 pois P (X) ∈ ker(va). Mas seR(X) 6= 0 entao como grau(R(X)) < 1, R(X) e um polinomio constantenao nulo com a como raiz, o que nao e possıvel. Isso mostra que R(X) = 0assim P (X) = (X − a)Q(X) pertence ao ideal principal (X − a).

26. Encontre o inverso de 691 + I no anel Z/I, sendo I = (1039).

Aplicando o algoritmo de Euclide temos

1039 6911 0 10390 1 6911 −1 348−1 2 3432 −3 5−137 206 3139 −209 2−276 415 1

Os quocientes sao 1, 1, 1, 68, 1, 1. Logo −276 · 1039 + 415 · 691 = 1, assimo inverso de 691 + I no anel Z/I e 415. De maneira analoga, se J = (691)o inverso de 1039 + J em Z/J e −276 + J .

27. Encontre o inverso de X5 − 3 + I no anel Q[X]/I, sendo I = (X2 + 2).

Aplicando o algoritmo de Euclide temos

X5 − 3 X2 + 21 0 X5 − 30 1 X2 + 21 −X3 + 2X 4X − 3

−(X/4 + 3/16) 1 + (X/4 + 3/16)(X3 − 2X) 41/16

Os quocientes sao X3 − 2X, X/4 + 3/16. O algoritmo termina aqui poiso proximo resto seria zero, de fato 4X − 3 = 41

16 ·1641 (4X − 3) (observe que

u = 41/16 e invertıvel em Q[X], entao ele divide todo polinomio). Logo

61

−(X/4 + 3/16)(X5 − 3) + (1 + (X/4 + 3/16)(X3 − 2X))(X2 + 2) = 41/16assim reduzindo modulo X2 + 2 obtemos que −(X/4 + 3/16)(X5 − 3) ≡41/16 modulo X2 + 2. Multiplicando pelo inverso de 41/16 obtemos que− 16

41 (X/4 + 3/16)(X5 − 3) ≡ 1 modulo X2 + 2 (na verdade seria modulo1641 (X2 + 2), mas observe que os ideais ( 16

41 (X2 + 2)) e (X2 + 2) sao iguaispois 16

41 e invertıvel - veja o exercıcio 19 acima). Logo o inverso de X5−3+Ino anel Q[X]/I e − 16

41 (X/4 + 3/16) + I.

2.8 Z[i] e Euclidiano

Proposicao 15. O anel Z[i] = {a+ ib : a, b ∈ Z} e Euclidiano com a funcaoϕ(a+ ib) = N(a+ ib) = a2 + b2.

Em particular, todos os ideais de Z[i] sao principais.A funcao N e dita norma.

Demonstracao. Observe que 0 ≤ N(α) ∈ Z para todo α ∈ Z[i], e se a + ib 6= 0entao N(a + ib) ≥ 1 pois a, b ∈ Z, em particular N(α) = 0 se e somente seα = 0. Logo N(αβ) = N(α)N(β) ≥ N(α) se β 6= 0. Como Z[i] e um subanelde C, que e um corpo, Z[i] e um domınio de integridade. Falta mostrar quepodemos fazer a divisao com resto. Sejam α = a + ib, β = c + id em Z[i] comβ 6= 0. Procuramos q, r ∈ Z[i] com α = βq+r e N(r) < N(β) (o caso r = 0 estaincluso nessa condicao). Observe que r = α− βt, assim a condicao que temos e

N(β) > N(r) = N(α− βt) = N(β(α

β− t)) = N(β)N(

α

β− t),

logo temos que encontrar q tal que N(αβ − q) < 1. Escrevemos

α

β=a+ ib

c+ id=

(a+ ib)(c− id)

(c+ id)(c− id)=ac+ bd

c2 + d2+ i

bc− adc2 + d2

= x+ iy

e observe que x, y ∈ Q. Logo existem e, f ∈ Z tais que |x − e|, |y − f | ≤ 1/2,assim escolhendo q = e+ if temos

N(α

β− q) = N(x+ iy − (e+ if)) = N((x− e) + i(y − f)) =

= (x− e)2 + (y − f)2 = |x− e|2 + |y − f |2 ≤ (1/2)2 + (1/2)2 = 1/2 < 1.

A demonstracao e terminada.

Por exemplo seja

I := {α ∈ Z[i] : N(α) e par},

o conjunto dos elementos de norma par. Se trata de um ideal pois se α = a+ ib,β = c+ id tem norma par entao

N(α+β) = N(a+ c+ i(b+d)) = (a+ c)2 + (b+d)2 = N(α) +N(β) + 2(ac+ bd)

62

e par, e se γ ∈ Z[i] entao N(αγ) = N(α)N(γ) e par pois N(α) e par e N(γ) ∈ Z.Como Z[i] e Euclidiano, o ideal I e principal, e sabemos que um gerador de I edado por um elemento de I de norma mınima, como por exemplo 1 + i. Temosentao I = (1 + i). Observe que I e o nucleo do homomorfismo sobrejetivo deaneis seguinte: Z[i] → Z/2Z, α 7→ N(α) + 2Z. Pelo teorema de isomorfismotemos entao

Z[i]/(1 + i) ∼= Z/2Z.

Em particular (1 + i) e um ideal maximal de Z[i].

2.9 Fatoracao

Seja A um domınio de integridade e sejam a, b, u ∈ A.Lembre que se a ∈ A, (a) = {ax : x ∈ A} (ideal principal gerado por a).

1. a divide b se existe c ∈ A com ac = b. Em outras palavras, (a) ⊇ (b).

2. u e dito invertıvel (ou unidade) se existe c ∈ A com uc = 1. Em outraspalavras, u divide 1, isto e, (u) ⊇ (1). Como (1) = A, temos que u einvertıvel se e somente se (u) = A. O conjunto dos elementos invertıveis(as unidades) de A e indicado por U(A): observe que se trata de um grupomultiplicativo.

3. a, b sao ditos associados se existe c ∈ A invertıvel tal que b = ac. Sea, b sao associados escrevemos a ∼ b. Observe que ∼ e uma relacao deequivalencia em A, e que a ∼ b se e somente se (a) = (b) (logo as classesde equivalencia de ∼ sao os ideais principais!).

4. a ∈ A diferente de zero e dito irredutıvel se

• a nao e invertıvel e

• cada vez que a = xy com x, y ∈ A, um entre x e y e invertıvel.

E facil mostrar que se a, b sao associados, a e irredutıvel se e somente seb e irredutıvel.

5. x ∈ A e dito primo se x 6= 0 e toda vez que x divide um produto ab, xdivide pelo menos um entre a e b.

Antes de fazer exemplos vamos mostrar o seguinte.

Proposicao 16. Seja A um domınio Euclidiano com a funcao ϕ. Entao

U(A) = {a ∈ A− {0} : ϕ(a) = ϕ(1)}.

Demonstracao. Mostramos ⊆. Seja a ∈ A invertıvel, assim existe b ∈ A tal queab = 1. Logo,

ϕ(1) = ϕ(ab) ≥ ϕ(a) = ϕ(a · 1) ≥ ϕ(1)

implica que ϕ(a) = ϕ(1).

63

Mostramos ⊇. Seja a ∈ A diferente de zero tal que ϕ(a) = ϕ(1). Fazendo adivisao com resto de 1 por a obtemos q, r ∈ A com 1 = aq+ r e ϕ(r) < ϕ(a) our = 0. Por outro lado se fosse ϕ(r) < ϕ(a) entao

ϕ(1) = ϕ(a) > ϕ(r) = ϕ(r · 1) ≥ ϕ(1),

absurdo. Isso implica que r = 0 logo 1 = aq.

Alguns exemplos de calculo de U(A).

1. Z e um domınio Euclidiano com ϕ(x) = |x|. Como |1| = 1, U(Z) = {a ∈Z : |a| = 1} = {1,−1}. Se trata de um grupo multiplicativo cıclico,{1,−1} = 〈−1〉.

2. Seja k um corpo. k[X] e um domınio Euclidiano com ϕ = grau. Comograu(1) = 0, U(k[X]) = {P (X) ∈ k[X] : grau(P (X)) = 0} = k∗.k∗ e o conjunto dos elementos nao nulos de k. Se trata de um grupomultiplicativo (em geral nao cıclico) pois k e um corpo.

3. Z[i] e um domınio Euclidiano com ϕ = N , N(a + ib) = a2 + b2 (norma).Como N(1) = 1, U(Z[i]) = {a+ ib ∈ Z[i] : a2+b2 = 1} = {1,−1, i,−i} =〈i〉. Se trata de um grupo multiplicativo cıclico de ordem 4.

4. Seja A um domınio de integridade. Um polinomio P (X) ∈ A[X] e in-vertıvel se e somente se P (X) e um polinomio constante P (X) = a ea ∈ U(A). De fato, P (X)Q(X) = 1 implica que

0 = grau(1) = grau(P (X)Q(X)) = grau(P (X)) + grau(Q(X))

logo grau(P (X)) = 0 = grau(Q(X)) assim P (X) = a ∈ A, Q(X) = b ∈ Ae ab = 1 implica a ∈ U(A). Por exemplo U(Z[X]) = U(Z) = {1,−1}.

5. Seja k um corpo e seja P (X) ∈ k[X]. Um elemento F (X) + (P (X)) ∈k[X]/(P (X)) e invertıvel se e somente se F (X) e P (X) sao coprimos! Defato, se trata de aplicar o algoritmo de Euclide.

Alguns exemplos de calculo dos elementos irredutıveis.

1. Os elementos irredutıveis de Z sao os elementos da forma ±p sendo p unnumero primo. Observe que se trata tambem de elementos primos de Z(cf. a definicao de elemento primo acima).

2. Os elementos irredutıveis de C[X] sao os polinomios de grau 1, aX+b coma 6= 0. De fato, C e algebricamente fechado. Isto significa que todo po-linomio de C[X] e produto de polinomios de grau 1 (que sao irredutıveispois um fator proprio deles teria que ter grau 0, i.e. teria que ser in-vertıvel).

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3. Os elementos irredutıveis de R[X] sao os polinomios de grau 1, aX+b coma 6= 0, e os polinomios de grau 2 com discriminante negativo, aX2+bX+ccom b2− 4ac < 0. De fato, todo polinomio de R[X] admite uma fatoracaoem C[X] do tipo seguinte

(X − λ1)(X − λ1) · · · (X − λn)(X − λn)(X − µ1) · · · (X − µm)

sendo λi ∈ C−R e µi ∈ R - sendo que se λ = a+ib, λ = a−ib, o conjugadode λ - de fato, lembre-se que se λ e raiz de P (X) ∈ R[X] entao λ e tambemraiz de P (X). Por outro lado, (X−λ)(X−λ) = X2−(λ+λ)X+λλ ∈ R[X]pois se λ = a + ib entao λ + λ = 2a e λλ = a2 + b2. Por exemplo,X3−X2 +X−1 = (X−1)(X+ i)(X− i) = (X−1)(X2 + 1). Isso mostraque todo polinomio irredutıvel de R[X] tem grau 1 ou 2.

4. O que acontece em Q[X] e em Z[X]? Boa pergunta.

Definicao 12 (UFD). Um domınio D e dito domınio de fatoracao unica(ou domınio fatorial, ou UFD) se todo elemento nao nulo e nao invertıvelde D se escreve de “maneira unica” como produto de elementos irredutıveis deD, i.e.

1. Todo elemento nao nulo e nao invertıvel de D e um produto finito defatores irredutıveis.

2. Se p1, . . . , ps, q1, . . . , qt sao elementos irredutıveis e p1 · · · ps = q1 · · · qtentao s = t e existe uma bijecao σ : {1, . . . , s} → {1, . . . , t = s} tal que pie associado a qσ(i) para todo i = 1, . . . , s.

Por exemplo 12 = 2 · 2 · 3 = (−2) · (−3) · 2, nesse caso observe que 2 eassociado a −2 e 3 e associado a −3. Os elementos 2, 3, −2, −3 sao irredutıveise o numero de fatores irredutıveis e o mesmo, s = t = 3.

Um outro exemplo e X2 − 1 = (X − 1)(X + 1) = (2(X − 1))( 12 (X + 1)) em

Q[X], de fato observe que X − 1 e associado a 2(X − 1) e X + 1 e associado a12 (X + 1) pois 2 e 1

2 sao invertıveis em Q[X] (um o inverso do outro).

Agora vamos ver que em um domınio de fatoracao unica, um elementoe primo se e somente se e irredutıvel.

Proposicao 17. Seja D um domınio. Entao todo elemento primo de D eirredutıvel. Se D e UFD, todo elemento irredutıvel de D e primo.

Demonstracao. Seja x um elemento primo de D e mostramos que x e irredutıvel.Suponha que x = ab e mostramos que um entre a e b e invertıvel. Como x dividex (pois x = x · 1) e x = ab, x divide ab logo x divide a ou x divide b (pois x eum elemento primo). Suponha que x divida a (o outro caso e analogo), assima = xy e x = ab = xyb logo x(1− yb) = 0. Como x e primo, x 6= 0 assim 1 = ybpois D e domınio. Isso mostra que b e invertıvel.

Agora seja D um UFD, seja x ∈ D irredutıvel e mostramos que x e primo.Suponha entao que x divida um produto ab, assim existe y ∈ D tal que xy = ab,

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e mostramos que x divide pelo menos um entre a e b. Escreva y, a, b como pro-duto de irredutıveis: y = y1 · · · yt, a = a1 · · · an, b = b1 · · · bm. Entao podemosescrever xy = ab da seguinte forma (lembrando que x e irredutıvel):

xy1 · · · yt = a1 · · · anb1 · · · bm.

Como D e UFD, pela unicidade da fatoracao x tem que ser associado a um aiou a um bi, suponha que x seja associado a ai (o outro caso e analogo). Entaox = aiu com u invertıvel, logo x divide a (pois ai divide a e u e invertıvel).

Isso nos permite dar uma caracterizacao dos domınios fatoriais.

Proposicao 18. Seja D um domınio. Entao D e UFD se e somente se todoelemento nao nulo e nao invertıvel de D e um produto finito de elementos irre-dutıveis e todo elemento irredutıvel de D e primo.

Demonstracao. A implicacao ⇒ foi mostrada acima. Mostramos ⇐. Suponhaque todo elemento nao nulo e nao invertıvel de D seja um produto finito deelementos irredutıveis e que todo elemento irredutıvel de D seja primo. Paramostrar que D e UFD temos apenas que mostrar a unicidade da fatoracao.Suponha entao que p1 · · · ps = q1 · · · qr com os pi e qi irredutıveis, e mostramoso resultado por inducao sobre s. Se s = 1 entao r = 1 pois p1 e irredutıvel ep1 = q1 - isso mostra a base da inducao. Agora suponha s > 1. Por hipotese ospi sao primos (sendo eles irredutıveis). Agora p1 divide q1 · · · qr, assim p1 divideum qj pois p1 e primo, e podemos supor que j = 1 (a menos de reordenar osfatores). Logo q1 = u1p1 com u1 ∈ A, e como q1 e irredutıvel u1 tem que serinvertıvel, assim p1 e q1 sao associados. Agora p1 · · · ps = q1 · · · qr = u1p1q2 · · · qrimplica que p1(p2 · · · ps − u1q2 · · · qr) = 0 logo p2 · · · ps = u1q2 · · · qr pois p1 6= 0e D e um dominio. q′2 = u1q2 e irredutıvel e p2 · · · ps = q′2q3 · · · qr, e por hipotesede inducao s − 1 = r − 1 (assim s = r) e existe uma bijecao σ′ : {2, . . . , s} →{2, . . . , r = s} tal que pi e associado a qσ′(i) para todo i = 2, . . . , s. Definindoσ : {1, 2, . . . , s} → {1, . . . , r = s} por σ(1) = 1 e σ(i) = σ′(i) para 2 ≤ i ≤ sobtemos que pi e associado a qσ(i) para todo i = 1, . . . , s.

2.10 Domınios principais

Um domınio D e dito domınio principal ou DIP (domınio de ideais princi-pais) se todo ideal de D e principal. Por exemplo, ja vimos que todo domınioEuclidiano e principal.

Uma propriedade importante dos domınios principais e a seguinte.

Lema 4. Seja D um domınio principal. Nao existe nenhuma cadeia infinita deideais I1 ⊂ I2 ⊂ I3 ⊂ . . . sendo cada inclusao propria (isto e, Ii 6= Ii+1 paratodo i ≥ 1). [Um anel com essa propriedade e dito noetheriano.]

Demonstracao. Suponha por contradicao que exista uma cadeia infinita I1 ⊂I2 ⊂ I3 ⊂ . . . com Ii 6= Ii+1 para todo i ≥ 1. Seja I :=

⋃i≥1 Ii. E facil mostrar

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que I e um ideal de D, de fato se a, b ∈ I e x ∈ A entao existem dois indicesi, j tais que a ∈ Ii e b ∈ Ij , e por hipotese temos Ii ⊆ Ij ou Ij ⊆ Ii (os ideaisIi formam uma cadeia), por exemplo suponha Ii ⊆ Ij (o outro caso e analogo).Assim a ∈ Ii ⊆ Ij e b ∈ Ij , logo a + b ∈ Ij pois Ij e um ideal. Como Ij ⊆ I,temos a + b ∈ I. Analogamente, ax ∈ Ij pois Ij e um ideal e Ij ⊆ I implicaax ∈ I. Isso mostra que I e um ideal. Cuidado: uma uniao de ideais em geralnao e um ideal (pense em um exemplo).

Como D e DIP, existe ai ∈ D com Ii = (ai). Como I e um ideal, I e principal(pois D e DIP) logo I = (z) com z ∈ D. Por outro lado z ∈ (z) = I =

⋃i(ai),

logo existe um indice k tal que z ∈ (ak), assim (z) ⊆ (ak), e podemos escrever

(a1) ⊆ (a2) ⊆ (a3) ⊆ . . . ⊆ (ak) ⊆ (ak+1) ⊆ . . . ⊆ (z) ⊆ (ak)

assim todas as inclusoes depois de (ak) na verdade sao igualdades: (ak) =(ak+1) = . . ., e isso contradiz o fato que a cadeia e infinita.

Teorema 8. Todo domınio principal e UFD.

Demonstracao. Seja D um domınio principal. Para mostrar que D e UFD, comovisto na aula passada, basta mostrar que existe a fatoracao em irredutıveis eque todo elemento irredutıvel e primo.

Primeiro, mostramos a existencia da fatoracao em irredutıveis. Seja x ∈ Dnao nulo e nao invertıvel.

Vamos mostrar que x possui um divisor irredutıvel. Suponha por contradicaoque x nao possua divisores irredutıvel. Entao x nao e irredutıvel (se nao, ele seriaum divisor irredutıvel de si mesmo), logo x = a1b1 com a1, b2 nao invertıveis,assim (x) ⊆ (a1). Na verdade, essa inclusao e estrita: (x) 6= (a1). De fato, sefosse (x) = (a1) entao x e a1 seriam associados, assim x = a1u com u invertıvele a1b1 = x = a1u implica a1(b1 − u) = 0 assim b1 = u (pois a1 6= 0 e D e umdomınio), contradicao (b1 nao e invertıvel). Agora, se a1 e irredutıvel entao e umdivisor irredutıvel de x, contradicao, logo a1 = a2b2 com a2, b2 nao invertıveis,assim pelo mesmo argumento (a1) ⊂ (a2) e essa inclusao e estrita. Continuandodessa forma, encontramos uma cadeia infinita (a1) ⊂ (a2) ⊂ (a3) ⊂ . . . e issocontradiz o lema.

Vamos mostrar que x e um produto de irredutıveis. Se x e irredutıvel entaox e um produto de fatores irredutıveis. Suponha x nao irredutıvel. Sabemosque x possui um divisor irredutıvel p1, assim x = p1b1 com b1 nao invertıvel.Isso implica (x) ⊂ (b1) e realmente (x) 6= (b1) pois se fosse (x) = (b1) entao x eb1 seriam associados, isto e x = ub1 com u invertıvel, e p1b1 = x = ub1 implica(p1 − u)b1 = 0 assim p1 = u pois b1 6= 0 e D e um domınio - assim p1 = ue invertıvel, contradicao. Se b1 e irredutıvel entao x = p1b1 e um produto deirredutıveis, logo suponha b1 nao irredutıvel. Entao pelo argumento anterior b1possui um divisor irredutıvel p2 e b1 = p2b2 com b2 nao invertıvel, e x = p1p2b2.Continuando dessa forma, se esse processo nao acabar entao encontramos umacadeia (x) ⊂ (b1) ⊂ (b2) ⊂ . . . com inclusoes proprias, e isso contradiz o lema.Logo existe um bk irredutıvel, assim x = p1p2 · · · pkbk e produto de irredutıveis.

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Agora vamos mostrar que todo elemento irredutıvel de D e primo. Seja xum elemento irredutıvel de D, e suponha que x divida um produto ab e quex nao divida a. Precisamos mostrar que x divide b. Como D e um DIP, oideal (x, a) = {αx + βa : α, β ∈ D} e principal, assim existe d ∈ D tal que(x, a) = (d), em particular d divide x e d divide a. Escrevemos x = dy e a = dzcom y, z ∈ D. Como x e irredutıvel, tem dois casos possıveis: y e invertıvelou d e invertıvel. Se y e invertıvel entao d = xy−1 assim a = dz = xy−1z logox divide a, contradicao. Isso mostra que d e invertıvel, assim (d) = D = (1),em particular 1 ∈ (d) = (x, a) logo existem α, β ∈ D tais que 1 = αx + βa, emultiplicando por b obtemos b = αxb+βab, assim x divide b (pois x divide αxbe x divide ab).

Obtemos entao que EUCLIDIANO⇒ DIP⇒ UFD. A tabela seguinte revisaalguns exemplos. Seja k um corpo.

DOMINIO CORPO DIP UFD EUCLIDIANOk V V V V VZ V X V V V

k[X] V X V V VZ[X] V X X V XZ[i] V X V V V

Z[ 12 (1 + i√

19)] V X V V X

Z[i√

5] V X X X X

Em particular Z[ 12 (1 + i√

19)] e un DIP nao Euclidiano (resultado que naovamos demonstrar), Z[X] e um UFD nao principal (esse resultado e o teoremade Gauss, o conteudo da proxima aula) e Z[i

√5] nao e UFD (como mostrado

abaixo). k e Euclidiano com a funcao ϕ(x) = 0, em particular k e principal (osunicos ideais de k sao (0) e (1), sao principais).

Vamos mostrar que Z[i√

5] nao e UFD. Temos que

Z[i√

5] = {a+ i√

5b : a, b ∈ Z}

e um subanel de C, em particular e um domınio. Observe que

2 · 3 = 6 = (1 + i√

5)(1− i√

5).

Para mostrar que essas duas fatoracoes sao realmente diferentes (no sentido quenao sao iguais a menos de permutar e associar os fatores) temos que mostrarque 2, 3, 1+i

√5 e i−

√5 sao irredutıveis e 2 nao e associado a 1+i

√5 e 1−i

√5.

Para fazer isso vamos usar a funcao norma

N(x+ iy) := (x+ iy)(x− iy) = x2 + y2

(definida para todo x + iy ∈ C) lembrando que se trata de uma funcao mul-tiplicativa: N(αβ) = N(α)N(β). Primeiro, vamos calcular U(Z[i

√5]). Se

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(a+ bi√

5)(c+ di√

5) = 1 entao como N(1) = 1,

1 = N((a+ bi√

5)(c+di√

5)) = N(a+ bi√

5)N(c+di√

5) = (a2 +5b2)(c2 +5d2).

Como a, b, c, d sao inteiros, isso implica que b = d = 0 e a2c2 = 1, assima, c = ±1, logo U(Z[i

√5]) = {1,−1}. Observe que isso mostra que os associados

de 2 sao 2 e −2, logo 2 nao e associado a 1 + i√

5 e nem a 1− i√

5.Agora mostramos que 2, 3, 1+i

√5, 1−i

√5 sao irredutıveis. Seja γ um deles.

Escrevamos γ = αβ com α = a + bi√

5 e β = c + di√

5 e vamos mostrar queum entre α e β e invertıvel. Temos N(γ) = N(α)N(β) = (a2 + 5b2)(c2 + 5d2).Lembrando que a, b, c, d sao inteiros, temos o seguinte.

1. Se γ = 2 entao (a2 + 5b2)(c2 + 5d2) = N(2) = 4 logo b = d = 0 assima2c2 = 4 logo a = ±1 ou c = ±1, entao um entre a + bi

√5 = a e

c+ di√

5 = c e invertıvel.

2. Se γ = 3 entao (a2 + 5b2)(c2 + 5d2) = N(3) = 9 assim um entre b ed e zero, por exemplo suponha b = 0 (o outro caso e analogo) - entaoa2(c2 + 5d2) = 9 e se d = 0 entao (ac)2 = 9 assim ac = ±3 e um entre a ec e ±1, se d 6= 0 entao d = ±1 (pois 5d2 ≥ 20 se |d| > 1) e a2(c2 + 5) = 9implica a = ±1 e c = ±2, logo a+ bi

√5 = ±1 e invertıvel.

3. Se γ = 1 ± i√

5 entao (a2 + 5b2)(c2 + 5d2) = N(1 ± i√

5) = 6 assim umentre b e d e zero, por exemplo suponha b = 0 (o outro caso e analogo) -entao a2(c2 + 5d2) = 6 logo d 6= 0 (pois 6 nao e um quadrado: 6 6= (ac)2)assim d = ±1 (pois 5d2 ≥ 20 se |d| > 1) e a2(c2 + 5) = 6 entao a = ±1 ec = ±1, em particular a± i

√5b = a = ±1 e invertıvel.

Seja D um domınio. Um MDC (maior divisor comum) de a1, . . . , an ∈ De um elemento d ∈ D com as seguintes propriedades.

1. d divide a1, . . . , an.

2. Se x ∈ D divide a1, . . . , an entao x divide d.

Proposicao 19. Seja D um domınio principal e sejam a1, . . . , an ∈ D. Entaoexiste um MDC de a1, . . . , an e dois MDC quaisquer de a1, . . . , an sao associa-dos.

Demonstracao. Seja d um gerador do ideal (a1, . . . , an), em outras palavras(a1, . . . , an) = (d) (um tal d existe pois D e principal). Assim, e claro qued divide a1, . . . , an, pois a1, . . . , an ∈ (d). Se x ∈ D divide a1, . . . , an entaoa1, . . . , an ∈ (x) logo (d) = (a1, . . . , an) ⊆ (x), assim x divide d. Agora sejamd1, d2 dois MDC de a1, . . . , an, em particular pela propriedade (2) da definicaode MDC, d1 divide d2 e d2 divide d1. Sabemos que isso significa que d1 e d2 saoassociados.

Uma curiosidade: se n ≥ 3 e um produto de numeros primos distintos, oanel Z[i

√n] nao e UFD.

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2.11 O teorema de Gauss

Teorema 9 (Gauss). Se D e UFD, entao D[X] e UFD.

Entao por exemplo Z[X] e UFD (e um exemplo de um UFD nao principal,pois como ja visto o ideal (2, X) de Z[X] nao e principal). Um outro exemploimportante e o seguinte: se k e um corpo k[X] e UFD (sendo Euclidiano) logok[X][Y ] = k[X,Y ] e UFD pelo teorema de Gauss. Mais em geral k[X1, . . . , Xn](o anel dos polinomios em n variaveis) e UFD (e nao e principal se n ≥ 2, porexemplo o ideal (X1, X2) nao e principal). Na demonstracao seguinte lembre-sesempre do caso arquetıpico D = Z, K = Q.

Para mostrar o teorema de Gauss vamos precisar da nocao de MDC (maiordivisor comum). Dados a1, . . . , an elementos de D, um MDC de a1, . . . , an emD e um elemento d ∈ D tal que

• d divide a1, . . . , an;

• se x ∈ D divide a1, . . . , an entao x divide d.

Se D e UFD, o MDC de a1, . . . , an existe e e unico a menos de associados.A unicidade a menos de associados e facil (se d1, d2 sao dois MDC de a1, . . . , anentao por definicao de MDC d1 divide d2 e d2 divide d1, logo d1 e d2 saoassociados). Para provar a existencia definimos d como o produto das potenciasde irredutıveis distintos pm com a propriedade que pm divide a1, . . . , an e pm+1

nao divide ai para algum i (por exemplo no caso de a1 = 2233, a2 = 25325,a3 = 273652 temos d = 2232). Escrevendo as fatoracoes de cada ai fica claro qued divide todo ai. Se x divide todo ai entao na fatoracao de x em irredutıveiso expoente da potencia de um irredutıvel p nao pode ser maior da potenciamaxima de p que divide d - por definicao de d - em outras palavras x divide d.

Como o MDC e unico a menos de associados, se d1, d2 sao dois MDC dea1, . . . , an escrevemos d1 ∼ d2. Por exemplo o MDC de 6 e 15 em Z e 3 ou −3,e escrevemos MDC(6, 15) ∼ 3. O MDC de X(X − 1) e X(X + 1) em Q[X] eassociado a X e escrevemos MDC(X(X − 1), X(X + 1)) ∼ X (observe que cXe um MDC de X(X − 1) e X(X + 1) para todo c ∈ Q∗).

Seja f(X) = a0 + a1X + . . . + anXn ∈ D[X]. O conteudo de f(X) e

c(f) = MDC(a0, . . . , an), o maior divisor comum dos coeficientes de f (definidoa menos de associados). f(X) e dito primitivo se c(f) ∼ 1, isto e, c(f) einvertıvel (i.e. nao existe nenhum elemento irredutıvel de D que divide todosos coeficientes a0, a1, . . ., an).

Algumas observacoes faceis. Seja K o corpo de fracoes de D, K = {ab :a, b ∈ D, b 6= 0} (no caso D = Z temos K = Q). Como no caso de Z e Q,podemos pensar aD como a um subanel deK identificandoD com {a1 : a ∈ D}.

• Se f ∈ D[X] entao f = c(f)f1 com f1 ∈ D[X] primitivo (se trata de isolarc(f)).

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• Se f ∈ D[X] e d ∈ D entao c(df) = d · c(f) (se trata de isolar d).

• Se f ∈ K[X] existem a, b ∈ D com b 6= 0 e f = ab f1 e f1 ∈ D[X]

primitivo (se trata de isolar os denominadores e todos os divisores comunsdos coeficientes).

Observe tambem que U(D[X]) = U(D) pois se P (X), Q(X) ∈ D[X] sao taisque P (X)Q(X) = 1 entao P (X) e Q(X) tem grau zero, assim P (X) = a ∈ D eQ(X) = b ∈ D e ab = 1 implica a ∈ U(D). Isso mostra a inclusao U(D[X]) ⊆U(D), a outra inclusao e obvia. Aplicando esse mesmo argumento a K (que eum corpo) obtemos U(K[X]) = U(K) = K∗.

Lema 5 (Gauss). Seja D um UFD e seja K = K(D) o corpo de fracoes de D.

1. Se f, g ∈ D[X] entao c(fg) = c(f)c(g).

2. Se g ∈ D[X] tem grau ≥ 1 entao g e irredutıvel em D[X] se e somente seg e primitivo em D[X] e irredutıvel em K[X].

3. Se g, h sao primitivos em D[X] entao g, h sao associados em D[X] se esomente se g, h sao associados em K[X].

Demonstracao. Vamos mostrar (1). Sejam d = c(f) e d′ = c(g), f = df1, g =d′g1 com f1, g1 ∈ D[X] primitivos. Logo fg = dd′f1g1 e c(fg) ∼ c(dd′f1g1) ∼dd′c(f1g1) assim basta mostrar que c(f1g1) ∼ 1. Em outras palavras, podemossupor f = f1 e g = g1, isto e, que f e g sao primitivos. Vamos mostrar que fg eprimitivo. Escreva f = a0+a1X+. . .+anX

n e g = b0+b1X+. . .+bmXm (assim

ai = 0 se i > n e bi = 0 se i > m). Entao fg = c0+c1X+. . .+cn+mXn+m sendo

ck = a0bk + a1bk−1 + . . .+ ak−1b1 + akb0. Seja p um elemento irredutıvel de D.Precisamos mostrar que existe k tal que p nao divide ck (e isso que significa quefg e primitivo). Como f e g sao primitivos existem os primeiros coeficientes as,br tais que p nao divide as e p nao divide br (assim, p divide a0, a1, . . ., as−1,b0, b1, . . ., br−1 mas nao divide as, br). Observe que

cr+s = a0br+s + a1br+s−1 + . . .+ as−1br+1 + asbr + as+1br−1 + . . .+ ar+sb0.

Logo p divide todos os adendos dessa soma exceto asbr, logo p nao divide cr+s.Vamos mostrar (2). A implicacao⇐ e facil observando que uma fatoracao em

D[X] e em particular uma fatoracao em K[X] (pois D ⊆ K). Vamos mostrar⇒. Suponha g ∈ D[X] irredutıvel em D[X], e por contradicao g = hl comh, l ∈ K[X] de grau ≥ 1. Escreva h = (a/b)h1 e l = (a′/b′)l1 com h1, l1 ∈ D[X]primitivos de grau ≥ 1, assim g = (aa′/(bb′))h1l1 e bb′g = aa′h1l1, assim (comoc(h1l1) ∼ 1 pelo ponto 1)

bb′c(g) ∼ c(bb′g) ∼ c(aa′h1l1) ∼ aa′c(h1l1) ∼ aa′

logo existe u ∈ U(D) com aa′ = ubb′ logo (em K) temos aa′/(bb′) = u ∈ D.Isso implica que (aa′/(bb′))h1 ∈ D[X] logo g = (aa′/(bb′))h1 · l1 e uma fatoracaoem D[X] cujos fatores tem grau ≥ 1, contradicao.

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Vamos mostrar (3). Se g, h ∈ D[X] sao primitivos e associados em D[X] eobvio que eles sao associados em K[X] (pois U(D[X]) ⊆ U(K[X])). Isso mostra⇒. Agora mostramos ⇐. Suponha g, h primitivos em D[X] e associados emK[X], assim g = εh com ε ∈ U(K[X]) = K∗, assim ε = a/b com a, b ∈ De b 6= 0, logo bg = ah e calculando o conteudo, e lembrando que g e h saoprimitivos, temos b ∼ c(bg) ∼ c(ah) ∼ a. Entao existe u ∈ U(D) com a = ub eε = a/b = u ∈ U(D). Logo g = εh = uh e g, h sao associados em D[X].

Agora vamos mostrar o teorema de Gauss. Seja f ∈ D[X] um polinomio degrau ≥ 1. A ideia e construir a fatoracao unica de f usando os fatos (que jasabemos) que D e UFD (por hipotese) e K[X] e UFD (sendo ele Euclidiano -pois K e corpo).

1. Existencia da fatoracao. Escreva f = df1 com d = c(f) e f1 ∈ D[X]primitivo. No UFD D temos d = p1 · · · pt (fatoracao em irredutıveis) assimcada pi e irredutıvel em D[X] tambem. Como f1 ∈ D[X] ⊆ K[X] e K[X]e UFD (sendo Euclidiano) temos f1 = q1 · · · qr com qi ∈ K[X] irredutıvelem K[X] para todo i. Escreva qi = (ai/bi)q

′i com ai, bi ∈ D e bi 6= 0, q′i ∈

D[X] primitivo. Como qi e irredutıvel em K[X], q′i tambem e irredutıvelem K[X] (pois ai/bi ∈ K∗ = U(K[X])), logo pelo ponto 2 do lema q′i eirredutıvel em D[X]. Temos f1 = q1 · · · qr = (a1 · · · ar/(b1 · · · br))q′1 · · · q′rlogo b1 · · · brf1 = a1 · · · arq′1 · · · q′r e calculando o conteudo, usando o ponto1 do lema e lembrando que os q′i e f1 sao primitivos obtemos que b1 · · · br ∼a1 · · · ar, assim existe u ∈ U(D) com a1 · · · ar = ub1 · · · br, logo f =up1 · · · ptq′1 · · · q′r e uma fatoracao em D[X].

2. Unicidade da fatoracao. Suponha de ter um produto de irredutıveisem duas maneiras diferentes, p1 · · · ptq1 · · · qr = u1 · · ·ut′v1 · · · vr′ comp1, . . . , pt, u1, . . . , ut′ irredutıveis de D e q1, . . . , qr, v1, . . . , vr′ irredutıveisde D[X] de grau ≥ 1. Olhando ao conteudo obtemos p1 · · · pt = εu1 · · ·ut′com ε ∈ U(D). Pela unicidade da fatoracao em D temos t = t′ e a menosde reordenar os indices pi ∼ ui para todo i (associados em D, em particu-lar em D[X]). Logo obtemos εq1 · · · qr = v1 · · · vr′ e qi, vi sao irredutıveisem D[X], em particular em K[X], logo pela unicidade da fatoracao emK[X] temos r = r′ e a menos de reordenar os indices qi ∼ vi (associadosem K[X]), logo pelo ponto 3 do lema, sendo qi, vi irredutıveis em D[X] -em particular primitivos, qi, vi sao associados em D[X].

2.12 Exercıcios resolvidos

1. Seja A um domınio. Mostre que se A[X] e Euclidiano entao A e um corpo(considere o ideal (a,X) sendo a ∈ A− {0}).

Sabemos pela teoria que se A e um corpo entao A[X] e Euclidiano. Vamosmostrar o vice-versa. Suponha A[X] Euclidiano. Seja a ∈ A diferente dezero. Precisamos mostrar que a tem inverso multiplicativo. Como A[X]

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e Euclidiano, o ideal (a,X) de A[X] e principal, seja P (X) um geradordele: (a,X) = (P (X)). Entao P (X) divide a e X. Sejam F (X), G(X) emA[X] tais que P (X)F (X) = a e P (X)G(X) = X. Entao 0 = grau(a) =grau(P (X)F (X)) ≥ grau(P (X)) implica que P (X) tem grau zero, assimP (X) = b ∈ A, e 1 = grau(X) = grau(P (X)G(X)) ≥ grau(G(X))implica que G(X) = rX+s com r, s ∈ A, assim X = P (X)G(X) = b(rX+s) implica br = 1 (pela definicao de polinomio) assim P (X) = b e invertıvelem A[X] logo (P (X)) = A[X], em particular 1 ∈ (P (X)) = (a,X). Issoimplica que existem J(X),K(X) ∈ A[X] tais que aJ(X) + XK(X) = 1,e substituindo X = 0 obtemos aJ(0) = 1, e J(0) ∈ A, assim a e invertıvelem A.

2. Sejam I, J dois ideais de um anel comutativo unitario A, e defina

I + J := {i+ j : i ∈ I, j ∈ J}

IJ := {n∑k=1

ikjk : n ∈ N, i1, . . . , in ∈ I, j1, . . . , jn ∈ J}.

Mostre que I+J e IJ sao ideais de A. Os ideais I e J sao ditos coprimosse I + J = A. Mostre que se I, J sao coprimos entao IJ = I ∩ J . Usandoo teorema de isomorfismo mostre que se I, J sao coprimos entao A/IJ ∼=A/I ×A/J (teorema chines dos restos).

I + J e ideal pois se x = i+ j, y = i′ + j′ ∈ I + J com i, i′ ∈ I, j, j′ ∈ J ea, b ∈ A entao ax+by = a(i+j)+b(i′+j′) = (ai+bi′)+(aj+bj′) ∈ I+J . IJe ideal pois se

∑k ikjk,

∑h i′hj′h pertencem a IJ com ik, i

′h ∈ I e jk, j

′h ∈ J

e a, b ∈ A entao a∑k ikjk + b

∑h i′hj′h =

∑k(aik)jk +

∑h(bi′hj

′h) ∈ IJ .

Se I e J sao coprimos entao I + J = 1 logo existem i ∈ I, j ∈ J taisque i + j = 1. Observe que IJ ⊆ I ∩ J vale mesmo se I e J nao saocoprimos, de fato I ∩ J e um ideal (intersecao de ideais e ideal) e se i ∈ Ie j ∈ J entao ij ∈ I ∩ J (por definicao de ideal) logo qualquer soma deelementos de tipo ij pertence a I ∩ J . Agora mostramos que IJ ⊇ I ∩ Jse I e J sao coprimos. De fato, i+ j = 1 como acima e se x ∈ I ∩ J entaox = x · 1 = x(i+ j) = xi+ xj ∈ IJ .

Considere o homomorfismo de aneis f : A → A/I × A/J definido pora 7→ (a+ I, a+ J). O nucleo de f e I ∩ J , logo para concluir que A/IJ ∼=A/I ×A/J no caso I, J coprimos usando o teorema de isomorfismo bastamostrar que f e sobrejetiva. Seja entao (x + I, y + J) ∈ A/I × A/J , eprocuramos a ∈ A tal que a+ I = x+ I e a+J = y+J . Seja a := xj+yi.Assim

f(a) = (a+ I, a+ J) = (xj + yi+ I, xj + yi+ J) = (xj + I, yi+ J)

= (xj + xi+ I, yi+ yj + J) = (x+ I, y + J).

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3. Em Q[X], calcule o inverso de X6 − 2 modulo 2X3 + 1 e viceversa.

Aplicando o algoritmo de Euclide obtemos

X6 − 2 2X3 + 11 0 X6 − 20 1 2X3 + 11 −(X3/2− 1/4) −7/4

assim − 47 (X6−2)+ 1

7 (2X3−1)(2X3 +1) = 1, logo se I = (X6−2)EQ[X]e J = (2X3 + 1) EQ[X], o inverso de X6 − 2 + J em Q[X]/J e − 4

7 + J eo inverso de 2X3 + 1 + I em Q[X]/I e 1

7 (2X3 − 1) + I.

4. Seja vi : Q[X]→ C definido por vi(P (X)) := P (i). Mostre que Im(vi) =Q[i] e um corpo. Dica: escreva 1

a+ib = a−ib(a+ib)(a−ib) .

Seja a + ib ∈ Q[i] diferente de zero. Precisamos encontrar o inverso dea+ ib em Q[i]. Seguindo a dica temos

1

a+ ib=

a− ib(a+ ib)(a− ib)

=a− iba2 + b2

=a

a2 + b2+ i

−ba2 + b2

∈ Q[i].

Observe que isso faz sentido pois a2 + b2 6= 0 (sendo a+ ib 6= 0).

5. Seja I = {α ∈ Z[i] : N(α) e par}, o conjunto dos inteiros gaussianos denorma par (lembre-se que N(a + ib) := a2 + b2 e Z[i] e Euclidiano comϕ = N). Mostre que I E Z[i] e encontre um gerador de I (que e um idealprincipal pois Z[i] e Euclidiano).

I e um ideal de Z[i] pois se α = a+ ib, β = c+ id tem norma par entao

N(α+β) = N(a+c+i(b+d)) = (a+c)2+(b+d)2 = N(α)+N(β)+2(ac+bd)

e par, e se γ ∈ Z[i] entao N(αγ) = N(α)N(γ) e par pois N(α) e pare N(γ) ∈ Z. Como Z[i] e Euclidiano, o ideal I e principal, e sabemosque um gerador de I e dado por um elemento de I de norma mınima,como por exemplo 1 + i. Temos entao I = (1 + i). Observe que I eo nucleo do homomorfismo sobrejetivo de aneis seguinte: Z[i] → Z/2Z,α 7→ N(α) + 2Z. Pelo teorema de isomorfismo temos entao

Z[i]/(1 + i) ∼= Z/2Z.

Em particular (1 + i) e um ideal maximal de Z[i].

6. Mostre que (2) nao e um ideal maximal de Z[i] (Dica: 2 = (1 + i)(1− i)).

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Como Z[i] e um domınio Euclidiano, os ideais de Z[i] sao principais, entaose I = (α) E Z[i] dizer que I e maximal significa que α nao tem divisoresproprios (um ideal que contem I e principal e corresponde a um divisorde α), isto e, que α e irredutıvel. Mas 2 nao e irredutıvel em Z[i] pois2 = (1+ i)(1− i) e 1+ i e 1− i nao sao invertıveis (lembre-se que U(Z[i]) ={1,−1, i,−i}).

7. Seja f : A→ B um homomorfismo de aneis comutativos unitarios e supo-nha que A,B 6= {0}. Mostre que se A e um corpo entao f e injetiva.

Como f(1) = 1 6= 0 temos que f nao e a funcao nula entao ker(f) 6= A.Por outro lado se A e um corpo entao os unicos ideais de A sao (0) e A, ecomo ker(f) e um ideal de A devemos ter ker(f) = (0). Logo f e injetiva.

8. Seja f : C → C um homomorfismo de aneis tal que f(r) = r para todor ∈ R. Mostre que tem somente dois casos: f e a identidade ou f(a+ib) =a− ib. Dica: calcule f(i)2 + 1.

Temos f(i)2 + 1 = f(i2) + f(1) = f(i2 + 1) = f(0) = 0 assim f(i)2 = −1e como f(i) ∈ C as unicas possibilidades sao f(i) = i e f(i) = −i. Noprimeiro caso f(a + ib) = f(a) + f(i)f(b) = a + ib, no segundo casof(a+ ib) = f(a) + f(i)f(b) = a− ib.

9. Seja A 6= {0} um anel comutativo unitario tal que A/I e um domınio deintegridade para todo ideal I de A diferente de A. Mostre que A e umcorpo. Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere o ideal (a2).

Seja a ∈ A diferente de zero. Precisamos mostrar que a tem inversomultiplicativo em A. Seja I = (a2). Se I = A entao (a2) = I = A = (1)assim a2 e invertıvel em A, agora suponha I 6= A. Por hipotese A/I e umdomınio de integridade, por outro lado (a + I)(a + I) = a2 + I = I logoa+ I = I, assim a ∈ I = (a2), isto e, existe b ∈ A tal que a2b = a. Temosentao a(ab − 1) = 0. Aplicando a hipotese ao ideal J = (0) 6= A temosque A/(0) ∼= A e um domınio de integridade, logo um entre a e ab − 1 ezero. Mas por hipotese a 6= 0, assim ab = 1.

10. Sejam A um anel comutativo unitario, a, u ∈ A com u invertıvel e suponhaque a4 = 0. Mostre que u + a e invertıvel. [Dica: considere primeiro ocaso a2 = 0.]

Observe que (u+ a)(u− a) = u2 − a2 entao se a2 = 0, u+ a e invertıvel e(u+a)−1 = (u−a)u−2. Se a2 6= 0 mas a4 = 0 entao (u+a)(u−a)(u2+a2) =(u2 − a2)(u2 + a2) = u4 − a4 = u4 entao (u+ a)−1 = (u− a)(u2 + a2)u−4.

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11. Escreva a fatoracao dos polinomios seguintes em irredutıveis em R[X] eC[X]: X2 + 1, X3 − 1, X6 − 1, X4 + 1, X4 + 2.

Vamos escrever as fatoracoes.

• X2 + 1 = (X + i)(X − i). Esse polinomio e irredutıvel em R[X].

• X3−1 = (X−1)(X2 +X+1) = (X−1)(X− −1+i√3

2 )(X− −1−i√3

2 ).

• X6−1 = (X3−1)(X3+1) = (X−1)(X+1)(X2−X+1)(X2+X+1)

e a fatoracao em R[X], e em C[X] pondo α = 1+i√3

2 temos

X6 − 1 = (X − 1)(X + 1)(X − α)(X − α)(X + α)(X + α).

• Pondo α = 2−1/2(1 + i) (uma raiz de X4 + 1) temos X4 + 1 =(X − α)(X − α)(X + α)(X + α) logo em R[X] temos X4 + 1 =(X2 −

√2X + 1)(X2 +

√2X − 1).

• Pondo α = 2−1/4(1 + i) (uma raiz de X4 + 2) temos X4 + 2 =(X−α)(X−α)(X+α)(X+α) = (X2−23/4X+

√2)(X2+23/4X+

√2).

12. Seja A um domınio de integridade. Mostre que a ∈ A−{0} e um elementoprimo se e somente se o quociente A/(a) e um domınio de integridade.

Dizer que “se a divide um produto xy entao divide x ou y” e equivalentea dizer que “se (x+ (a))(y + (a)) e zero em A/(a) entao um entre x+ (a)e y + (a) e zero em A/(a)”, o que e equivalente a dizer que A/(a) e umdomınio de integridade.

13. Seja A um domınio Euclidiano. Mostre que a 6= 0 e um elemento primose e somente se o quociente A/(a) e um corpo.

Observe que A/(a) e um corpo se e somente se os unicos ideais de A/(a) sao(a)/(a) e A/(a), isto e, pelo teorema de correspondencia, os unicos ideaisde A que contem (a) sao (a) e A. Como os ideais de A sao principais (poisA e Euclidiano), isto significa que a nao admite divisores proprios, isto e,a e irredutıvel. O resultado segue do fato que em um domınio Euclidianotodo elemento irredutıvel e primo (pois todo domınio Euclidiano e UFD).

14. Mostre que o elemento 2+ i de Z[i] e irredutıvel. [Dica: Calcule N(2+ i).]

Temos N(2 + i) = 22 + 1 = 5. Suponha 2 + i = αβ com α, β ∈ Z[i].Logo 5 = N(2 + i) = N(αβ) = N(α)N(β) e N(α), N(β) ∈ N implica queN(α) = 1 ou N(β) = 1, assim um entre α e β e invertıvel em Z[i]. Issomostra que 2 + i e irredutıvel em Z[i].

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15. Seja k = Z/2Z o corpo com 2 elementos. Mostre que X3 − X + 1 eirredutıvel em k[X].

Se P (X) = X3 − X + 1 e redutıvel entao como grau(P (X)) = 3, P (X)deve admitir um fator de grau 1, aX + b, assim P (−b/a) = 0. Logo bastamostrar que P (X) nao tem raizes em F2. Mas isso e claro pois P (0) = 1e P (1) = 1.

16. Lembrando que R[X] e UFD, mostre que R[X]/(X2) tem um unico idealmaximal.

A fatoracao de X2 em R[X] e X2 = X · X, assim X2 tem exatamente3 divisores (a menos de associados), que sao 1, X e X2, logo os ideaisde R[X]/(X2) sao (X2)/(X2), (X)/(X2) e R[X]/(X2). Em particular(X)/(X2) e o unico ideal maximal de R[X]/(X2).

17. Mostre que nao existem homomorfismos de aneis C→ R, R→ Q, Q→ Ze Z/nZ→ Z.

Seja f : A → B homomorfismo de aneis. Se A = C e B = R entaof(i)2 = f(i2) = f(−1) = −1, contradicao. Se A = R e B = Q entao

f(√

2)2 = f(√

22) = f(2) = f(1+1) = f(1)+f(1) = 1+1 = 2, contradicao.

Se A = Q e B = Z entao 2f(1/2) = f(1/2) + f(1/2) = f(1/2 + 1/2) =f(1) = 1, contradicao. Se A = Z/nZ e B = Z entao pondo x = x + nZtemos 0 = f(0) = f(n) = f(1+. . .+1) = f(1)+. . .+f(1) = 1+. . .+1 = n,contradicao.

18. Mostre que se um domınio de integridade A tem so um numero finito deideais entao A e um corpo (em outras palavras, A tem so 2 ideais). [Dica:dado a ∈ A diferente de zero considere os ideais (an).]

Seja a ∈ A diferente de zero. Precisamos mostrar que a tem inversomultiplicativo. Por hipotese os ideais (an) com n > 0 sao um numerofinito, assim existem 0 < n < m tais que (an) = (am). Logo, existe umelemento invertıvel u ∈ A tal que anu = am, assim an(u − am−n) = 0.Como a 6= 0 e A e um domınio de integridade, obtemos u − am−n = 0assim am−n = u, logo a e invertıvel, a−1 = am−n−1u−1.

19. Seja P (X) ∈ Q[X] um polinomio de grau 2 ou 3. Mostre que P (X) eirredutıvel em Q[X] se e somente se P (a) 6= 0 para todo a ∈ Q. [Dica:faca a divisao com resto por X − a.]

Fazendo a divisao com resto por X−a obtemos P (X) = (X−a)Qa(X) +Ra(X), sendo que Ra(X) e nulo ou tem grau zero, assim Ra(X) = ra ∈ Q.

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Se existe a ∈ Q tal que P (a) = 0 entao substituindo X = a obtemos0 = P (a) = ra assim P (X) = (X − a)Q(X), logo P (X) e redutıvel. SeP (X) e redutıvel entao admite um fator de grau 1 (pois a soma dos grausdos fatores de P (X) e o grau de P (X), que e 2 ou 3), seja aX+b um fatorde grau 1 de P (X). Assim a 6= 0 e P (−b/a) = 0.

20. Escreva P (X) = X4 + 1 como produto de fatores irredutıveis em R[X] (eobserve que P (X) e um polinomio redutıvel sem raizes).

Como visto no exercıcio 11, (X2−√

2X+1)(X2 +√

2X+1) e a fatoracaode P (X) em irredutıveis em R[X]. Observe que P (X) nao admite raizesreais. Isso mostra que um polinomio sem raizes pode ser redutıvel.

21. Escreva a fatoracao de X6 − 1 e de X4 − 4 como produto de irredutıveisem Q[X].

X6− 1 = (X3− 1)(X3 + 1) = (X − 1)(X + 1)(X2−X + 1)(X2 +X + 1) eX4−4 = (X2−2)(X2+2) sao as fatoracoes em irredutıveis. Para mostrarque os fatores sao irredutıveis basta observar que um polinomio de grau 2e irredutıvel se e somente se nao tem raizes (exercıcio 19).

22. Lembrando que se k e um corpo k[X] e Euclidiano (em particular UFD)conte os ideais de R[X]/(X2 − 2) e de Q[X]/(X2 − 2).

Como ja visto, usando a fatoracao unica, se trata de contar os divisoresde X2 − 2, logo a resposta e 4 no primeiro caso, 2 no segundo. Observeque Q[X]/(X2 − 2) e um corpo (ele tem dois ideais).

23. Lembrando que R[X] e Euclidiano (em particular UFD), conte os ideaisde R[X]/(Xn), sendo n ∈ N.

Se trata de contar os divisores de Xn (a menos de associados), que saon+ 1: 1, X,X2, . . . , Xn.

24. Mostre que 2i+ 3 e irredutıvel em Z[i]. [Dica: considere N(2i+ 3).]

Temos N(2i+ 3) = 13, um numero primo. Veja o exercıcio 26.

25. Mostre que 3 e irredutıvel em Z[i] mas 5 nao e irredutıvel em Z[i].

5 = (2+i)(2−i) e 2+i, 2−i nao sao invertıveis pois U(Z[i]) = {1,−1, i,−i}.Logo 5 e redutıvel. 3 e irredutıvel pois se 3 = (a+ ib)(c+ id) com a+ ib,c+id na invertıveis entao 9 = N(3) = N(a+ib)N(c+id) = (a2+b2)(c2+d2)logo a2 + b2 = 3 = c2 + d2 e isso nao pode acontecer (a, b, c, d ∈ Z).

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26. Mostre que se α ∈ Z[i] e N(α) e um numero primo entao α e irredutıvelem Z[i]. Escreva 5 como produto de irredutıveis.

Se N(α) = p e um numero primo e α = xy com x, y ∈ Z[i] entao p =N(α) = N(xy) = N(x)N(y) assim um entre N(x) e N(y) e 1, isto e, umentre x e y e invertıvel.

27. Uma equacao diofantina: encontrar todas as solucoes inteiras da equacaoX2 +1 = Y 3. [Dica: seja (x, y) uma solucao inteira, x2 +1 = y3, entao emZ[i] temos y3 = (x+ i)(x− i), mostre que x+ i e x− i sao coprimos (istoe, os divisores comuns sao invertıveis) e observe que como Z[i] e UFD,y3 = (x+ i)(x− i) implica que x+ i e x− i sao cubos em Z[i].]

Seguindo a dica, seja (x, y) uma solucao inteira, x2 + 1 = y3, entao emZ[i] temos y3 = (x+ i)(x− i). Primeiro, observe que y e impar, de fato sey e par entao x2 = y3−1 ≡ 3 mod 4, contradicao. Mostramos que x+ i ex−i sao coprimos, em outras palavras, os divisores comuns sao invertıveis.Precisamos mostrar que nao existe nenhum elemento irredutıvel de Z[i]que divide x + i e x − i. Por contradicao seja α um elemento irredutıvelde Z[i] que divide x + i e x − i. Logo α divide (x + i) − (x − i) = 2i =(1 + i)(1 − i)i, assim α = u(1 ± i) com u invertıvel (pois Z[i] e UFDe 1 ± i e irredutıvel, sendo N(1 ± i) = 2 primo - veja o exercıcio 26).Observe que u ∈ U(Z[i]) = {1,−1, i,−i} assim α2 = ±2u2 = ±2 divide(x+i)(x−i) = x2+1 = y3, assim existe a+ib ∈ Z[i] tal que y3 = ±2(a+ib),logo y3 = ±2a, contradicao (y e impar).

Agora, como Z[i] e UFD, y3 = x2 + 1 = (x − i)(x + i) e x − i, x + i saocoprimos, x− i e x + i sao cubos em Z[i], em particular existem a, b ∈ Ztais que x+ i = (a+ ib)3. Obtemos

x+ i = (a+ ib)3 = a3 + 3a2b− 3ab2 − ib3

logo a3 − 3ab2 = x e 3a2b − b3 = 1. Essa segunda igualdade fala queb(3a2−b2) = 1, o que implica que b ∈ U(Z) = {1,−1}, assim 3a2−1 = ±1.Se 3a2 − 1 = 1 entao a2 = 2/3, contradicao, assim 3a2 − 1 = −1, isto e,a = 0. Logo x = a3 − 3ab2 = 0 e y = 1.

A unica solucao e (x, y) = (0, 1).

28. Seja D um domınio e seja P (X) ∈ D[X]. Mostre que se a ∈ D e talque P (a) = 0 entao a divide P (0) e X − a divide P (X). Mostre que segrau(P (X)) e 2 ou 3 e P (X) e redutıvel e monico (o coeficiente de graumaximo e 1) entao existe a ∈ D tal que P (a) = 0.

Escrevendo P (X) = a0 + a1X + . . . + anXn temos que P (a) = a0 +

a1a + . . . + anan entao se P (a) = 0, a(a1 + a2a + . . . + ana

n−1) = −a0,o que implica que a divide a0 = P (0). Suponha P (a) = 0. Fazendo adivisao com resto de P (X) com X−a (podemos pois o coeficiente de grau

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maximo de X − a e 1, invertıvel) obtemos P (X) = Q(X)(X − a) +R(X)com R(X) nulo ou de grau zero, assim R(X) = r ∈ D e P (a) = 0 implica0 = (a − a)Q(a) + r logo r = 0, assim X − a divide P (X). Se P (X)tem grau 2 ou 3 entao uma fatoracao propria de P (X) deve admitir umfator de grau 1, e como P (X) e monico olhando para o coeficiente de graumaximo obtemos que P (X) tem uma fatoracao do tipo (X−a)Q(X) comQ(X) de grau 1 ou 2 e a ∈ D, assim P (a) = 0.

29. Mostre que X3 − 3, X3 + 4, X3 + X2 + X + 18, 112X

3 − 34X + 1 sao

irredutıveis em Q[X] e que X2 + Y 2 e irredutıvel em Q[X,Y ].

Os primeiros tres polinomios estao em Z[X] e sao primitivos, logo pelolema de Gauss eles sao irredutıveis em Q[X] se e somente se eles saoirredutıveis em Z[X]. Como eles sao monicos, pelo exercıcio anterior setrata de mostrar que P (a) 6= 0 para todo a ∈ Z. Pelo exercıcio anterior, seP (a) = 0 entao a divide P (0), entao basta mostrar que P (a) 6= 0 para tododivisor a de P (0). No caso de P (X) = X3 − 3 os divisores de P (0) = −3sao −1, 1, −3, 3 e P (−1) = −4, P (1) = −2, P (−3) = −30, P (3) = 24. Nocaso de P (X) = X3 + 4 os divisores de P (0) = 4 sao −1, 1, −2, 2, −4, 4,e P (a) > 0 se a > 0, P (−1) = 3, P (−2) = −4, P (−4) = −60. No caso deP (X) = X3 +X2 +X+18 os divisores de P (0) = 18 sao −1, 1, −2, 2, −3,3, −6, 6, −9, 9, −18, 18, P (a) > 0 se a > 0 e P (−1) = 17, P (−2) = 12,P (−3) = −3, P (−6) = −188, P (−9) = −639, P (−18) = −5184. No casode P (X) = 1

12X3 − 3

4X + 1 = 112 (X3 − 9X + 12) um argumento analogo

(usando os divisores de 12) mostra que X3 − 9X + 12 e irredutıvel emZ[X], logo P (X) e irredutıvel em Q[X] pelo lema de Gauss.

Considere o polinomio P (X,Y ) = X2 + Y 2 ∈ Q[X,Y ]. Visto como po-linomio a coeficientes em Q[X], temos Q(Y ) = P (X,Y ) ∈ K[X][Y ] eQ(0) = X2. Os divisores de Q(0) = X2 sao c, cX, cX2 com c ∈ Q∗.Q(c) = X2 + c2 6= 0, Q(cX) = X2 + c2X2 6= 0 pois c ∈ Q, e Q(cX2) =X2 + c2X4 6= 0. Logo pelo exercıcio anterior, Q(Y ) = P (X,Y ) e irre-dutıvel sobre Q[X]. Pelo mesmo argumento, P (X,Y ) e irredutıvel sobreQ[Y ]. Como uma fatoracao de P (X,Y ) em K[X,Y ] tem que ser propriasobre K[X] ou K[Y ], obtemos que P (X,Y ) e irredutıvel em K[X,Y ].

3 Corpos

Um corpo e um anel comutativo unitario K tal que todo elemento x ∈ Kdiferente de zero e invertıvel, isto e, existe y ∈ K tal que xy = 1. Isso implicaque K∗ = K − {0} e um grupo multiplicativo (o grupo multiplicativo do corpoK), de fato K∗ = U(K) (o grupo das unidades de K). Exemplos de corpos saoQ, R, C, e Fp = Z/pZ (sendo p um numero primo). Observe que Q, R e C saocorpos infinitos e Fp e um corpo finito.

80

Uma observacao importante e que se K e um corpo e P (X) ∈ K[X] temgrau n, entao K contem no maximo n raizes de P (X), isto e, elementos α ∈ Ktais que P (α) = 0. De fato, P (α) = 0 significa que X − α divide P (X) (peloargumento usual de divisao com resto de P (X) por X − α) e se α e β saoduas raizes distintas de P (X) entao X − α e X − β sao divisores irredutıveisnao associados de P (X), logo (X − α)(X − β) divide P (X). Mais em geral seα1, . . . , αm sao as raizes de P (X) em K entao (X − α1) · · · (X − αm) divideP (X) logo m ≤ grau(P (X)) = n.

Lema 6. Seja K um corpo, e seja G um subgrupo multiplicativo de K∗. Se Ge finito entao G e cıclico.

Demonstracao. Pelo teorema de estrutura dos grupos abelianos finitos, G eisomorfo a um produto direto Cpa1

1× · · · × Cpam

msendo os pi numeros primos.

Observe que Cnm ∼= Cn×Cm se e somente se n e m sao coprimos (como visto noprimeiro modulo) logo G e cıclico se e somente se os primos pi sao distintos doisa dois. Em outras palavras se G nao e cıclico entao existem indices i, j tais quepi = pj , seja p = pi = pj . Tomando um subgrupo Cp de Cpai

ie um subgrupo

Cp de Cpajj

obtemos um subgrupo H ∼= Cp × Cp de G. Todo elemento g ∈ Hverifica gp = 1, logo G contem pelo menos p2 elementos x tais que xp = 1, umacontradicao (pois o polinomio Xp−1, que tem grau p, teria p2 > p raizes). LogoG e cıclico.

Entao por exemplo F∗7 e um grupo cıclico. Observe que F7 = {0, 1, 2, 3, 4, 5, 6}logo F∗7 = {1, 2, 3, 4, 5, 6}. As potencias de 2 sao 21 = 2, 22 = 4, 23 = 1, logo 2tem ordem 3: o(2) = 3. Em particular 2 nao e um gerador de F∗7: 〈2〉 6= F∗7. Aspotencias de 3 sao 31 = 3, 32 = 2, 33 = 2 · 3 = 6, 34 = 6 · 3 = 4, 35 = 4 · 3 = 5,36 = 5 · 3 = 1. Logo F∗7 = 〈3〉, em outras palavras o grupo cıclico F∗7 e geradopor 3. Em geral F∗p e um grupo multiplicativo cıclico de ordem p− 1.

3.1 Construcao de corpos

Lembre-se que se A e um anel (comutativo, unitario) e I e um ideal de A entaoA/I e um corpo se e somente se I e um ideal maximal de A. No caso do anelde polinomios A = K[X] (onde K e um corpo) todo ideal I de A e principal,digamos I = (P (X)) sendo P (X) um polinomio, e I e maximal se e somente seP (X) e irredutıvel. De fato se I e maximal entao P (X) nao pode ser redutıvelporque uma fatoracao propria P (X) = F (X)G(X) implicaria que I esta contidopropriamente no ideal (F (X)) 6= A. Reciprocamente, se P (X) e irredutıvelentao I = (P (X)) e maximal porque se I estivesse contido propriamente em umideal proprio (F (X)) de A entao F (X) seria um divisor proprio do polinomioP (X). Entao por exemplo R[X]/(X2 + 1) e um corpo.

3.2 Os elementos irredutıveis de Z[i]Vamos aplicar o lema acima para mostrar um resultado importante, que e oseguinte.

81

Teorema 10. Um elemento α ∈ Z[i] e irredutıvel se e somente se N(α) e umnumero primo ou α e associado a p sendo p ∈ N um numero primo congruentea 3 modulo 4.

Demonstracao. Ja vimos que se N(α) e um numero primo entao α e irredutıvel(se α = xy entao N(α) = N(x)N(y)). Agora suponha α irredutıvel e N(α)nao primo. Vamos mostrar que α e associado a p sendo p um numero primocongruente a 3 modulo 4.

Escreva α = a + ib e N(α) = nm com n,m inteiros maiores de 1. Logo(a + ib)(a − ib) = N(α) = nm. Como Z[i] e UFD, e acabamos de escreverduas fatoracoes de N(α), o numero de fatores irredutıveis de N(α) e 2 (poisa + ib = α e irredutıvel entao a − ib tambem - e facil mostrar isso usando aconjugacao complexa a+ib 7→ a−ib), logo n e m sao irredutıveis (pela unicidadeda fatoracao) e a + ib e associado a n ou a m, assim por exemplo a + ib = uncom u ∈ U(Z[i]) (o outro caso e analogo) e como U(Z[i]) = {1,−1, i,−i} temosque um entre a e b e zero. Logo α e associado a um numero inteiro positıvop. Como α e irredutıvel, p tem que ser um numero primo. Entao se trata deestudar a redutibilidade do numero primo p em Z[i].

Vamos mostrar que um numero primo p ∈ N e irredutıvel em Z[i] se esomente se p ≡ 3 mod 4. Como todo primo impar e congruente a 1 ou a 3modulo 4, e 2 = (1 + i)(1 − i) e redutıvel, se trata de mostrar que um primoimpar p e redutıvel em Z[i] se e somente se p ≡ 1 mod 4.

Seja p um numero primo impar. Considere ϕ : Z → Z/pZ = Fp o homo-morfismo canonico. Ele induz um homomorfismo de aneis f : Z[X] → Fp[X]definido por f(

∑i aiX

i) =∑i ϕ(ai)X

i (homomorfismo de reducao). Indicamos

f(P (X)) com P (X). Em outras palavras P (X) e obtido reduzindo os coefici-entes de P (X) modulo p. Observe que f e igual tambem ao homomorfismo deprojecao sobre o quociente Z[X]→ Z[X]/(p).

Considere os dois homomorfismos seguintes.

γ : Z[X]→ Z[i]/(p), γ(P (X)) := P (i) + (p),

δ : Z[X]→ Fp[X]/(X2 + 1), δ(P (X)) := P (X) + (X2 + 1).

Observe que γ e a composicao do homomorfismo de substituicao Z[X] → Z[i],P (X) 7→ P (i) com o homomorfismo de projecao Z[i] → Z[i]/(p), x 7→ x +(p), e δ e a composicao do homomorfismo de reducao Z[X] → Fp[X] com ohomomorfismo de projecao Fp[X]→ Fp[X]/(X2 + 1).

Observe que γ e δ sao sobrejetivos. Vamos mostrar que ker(γ) = ker(δ).

• ker(γ) ⊆ ker(δ). Seja P (X) ∈ ker(γ), isto e γ(P (X)) = 0, assim P (i) +(p) = (p), em outras palavras P (i) ∈ (p). Logo existe a + ib ∈ Z[i]

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tal que P (i) = (a + ib)p. Seja A(X) := P (X) − (a + bX)p. TemosA(i) = P (i)−(a+ib)p = 0, logo X2+1 divide A(X) (pelo argumento usualde divisao com resto de A(X) por X2 + 1), assim A(X) = Q(X)(X2 + 1),isto e P (X) = (a + bX)p + Q(X)(X2 + 1). Temos entao δ(P (X)) =δ((a+ bX)p+Q(X)(X2 + 1)) = 0. Logo P (X) ∈ ker(δ).

• ker(δ) ⊆ ker(γ). Seja P (X) ∈ ker(δ), isto e δ(P (X)) = 0, assim P (X) +(X2 + 1) = (X2 + 1), em outras palavras P (X) ∈ (X2 + 1), isto e existeQ(X) ∈ Z[X] tal que P (X) = (X2 + 1)Q(X) e isto significa que existeL(X) ∈ Z[X] tal que P (X) − (X2 + 1)Q(X) = pL(X). Logo γ(P (X)) =γ((X2 + 1)Q(X) + pL(X)) = 0. Logo P (X) ∈ ker(γ).

Pelo teorema de isomorfismo

Z[i]/(p) ∼= Z[X]/ ker(γ) = Z[X]/ ker(δ) ∼= Fp[X]/(X2 + 1).

Logo a irredutibilidade de p em Z[i] e equivalente a irredutibilidade de X2 + 1em Fp[X] (pois Z[i]/(p) ∼= Fp[X]/(X2 + 1), logo o primeiro e um corpo se esomente se o segundo e um corpo). Entao temos que estudar a irredutiblidadede X2 + 1 em Fp[X]. Vamos mostrar que X2 + 1 e redutıvel em Fp[X] se esomente se p ≡ 1 mod 4.

Suponha que X2 + 1 seja redutıvel em Fp[X]. Como X2 + 1 tem grau 2, issosignifica que X2 + 1 tem uma raiz a em Fp, assim a2 + 1 = 0, logo a2 = −1.Observe que como p e impar, −1 6= 1, logo a2 = −1 6= 1. Em particular a 6= 1.Tambem a2 = −1 6= 1, e a3 = a2a = −a 6= 1 (se fosse −a = 1 entao a = −1logo a2 = 1, absurdo), por outro lado a4 = (a2)2 = (−1)2 = 1. Isso mostra quea tem ordem 4 no grupo multiplicativo F∗p. Pelo teorema de Lagrange 4 dividep− 1, isto e, p ≡ 1 mod 4.

Suponha que p ≡ 1 mod 4, isto e, 4 divide p− 1. Como F∗p e cıclico, existeg ∈ F∗p de ordem 4 (se F∗p = 〈x〉 e p − 1 = 4m basta escolher g = xm). Emparticular g2 6= 1 e g4 = 1, logo g2 e raiz de X2 − 1 (pois (g2)2 = g4 = 1) eg 6= 1. As raizes de X2 − 1 em Fp (que e um corpo) sao 1 e −1, logo g2 = −1,assim g2 + 1 = 0 e g e raiz de X2 + 1. Logo X2 + 1 e redutıvel.

3.3 Um resultado de teoria dos numeros (algebrica)

Teorema 11. Um numero primo impar p e soma de dois quadrados a2 + b2

(com a, b ∈ Z) se e somente se p ≡ 1 mod 4.

Demonstracao. Se p = a2 + b2 entao um entre a e b e par e o outro e impar(se fossem ambos pares ou ambos impares entao a2 + b2 seria par), por exemplosuponha a par e b impar (o outro caso e analogo). Entao a2 ≡ 0 mod 4 e b ≡ 1ou 3 modulo 4, assim b2 ≡ 1 mod 4 entao a2 + b2 ≡ 1 mod 4.

Suponha agora que p ≡ 1 mod 4. Entao p e redutıvel em Z[i], assim existema + ib, c + id ∈ Z[i] tais que p = (a + ib)(c + id) logo tomando as normasp2 = N(p) = N((a + ib)(c + id)) = N(a + ib)N(c + id) = (a2 + b2)(c2 + d2).

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Como Z e UFD e p e irredutıvel em Z, e a2 + b2, c2 + d2 sao positıvos, devemoster a2 + b2 = p = c2 + d2.

Por exemplo 5 = 12 + 22, 13 = 22 + 32, 17 = 12 + 42, 29 = 22 + 52. Porexemplo 11, 19, 23 nao sao somas de dois quadrados.

3.4 Um corpo finito

O argumento principal da demonstracao da caracterizacao dos irredutıveis deZ[i] e o seguinte:

Fp[X]/(X2 + 1) ∼=Z[X]

(p,X2 + 1)∼= Z[i]/(p).

Se trata de observar que no calculo do quociente de Z[X] modulo (p,X2 + 1)(o ideal gerado por p e X2 + 1) podemos reduzir primeiro modulo p e depoismodulo (X2 + 1) o vice-versa (lembrando que Z[i] ∼= Z[X]/(X2 + 1)).

Agora queremos entender um pouco melhor o quociente Fp[X]/(X2+1), porexemplo estudamos o caso p = 3. Sabemos que X2 + 1 e irredutıvel em F3[X](pois 3 ≡ 3 mod 4, ou mais simplesmente, porque X2 + 1 e um polinomio degrau 2 sem raizes em F3: 02 + 1 = 1 6= 0, 11 + 1 = 2 6= 0, 22 + 1 = 2 6= 0). Logo

K := F3[X]/(X2 + 1)

e um corpo. Queremos entender melhor os elementos de K e as operacoes desoma e produto em K.

Um elemento generico de K e uma classe P (X)+(X2+1). Fazendo a divisaocom resto de P (X) por X2 + 1 obtemos P (X) = (X2 + 1)Q(X) + R(X) comR(X) de grau < 2 ou R(X) = 0, assim R(X) = aX + b com a, b ∈ F3. Observeque P (X)+(X2+1) = (X2+1)Q(X)+R(X)+(X2+1) = R(X)+(X2+1), logona verdade os elementos de K tem a forma aX + b+ (X2 + 1) (o que acabamosde mostrar e que existem representantes de grau < 2). Em particular podemoscontar os elementos de K: temos 3 possibilidades para a e 3 possibilidades parab (pois a, b ∈ F3) logo |K| = 32 = 9. K e um corpo com 9 elementos. Emparticular existem corpos com 9 elementos (K e um exemplo).

Agora queremos entender as operacoes em K. Seja α := X + (X2 + 1) ∈ K.Usar α simplifica muito a notacao pois aX + b+ (X2 + 1) = aα+ b. Logo

K = {0, 1, 2, α, α+ 1, α+ 2, 2α, 2α+ 1, 2α+ 2}.

A soma de dois elementos de K se faz da forma usual lembrando que 3 = 0,assim por exemplo (2α+ 1) + (2α+ 2) = 4α+ 3 = α. Entender a multiplicacaoe mais interessante. Observe que α e raiz do polinomio Y 2 + 1 ∈ K[Y ], de fatoα2+1 = (X+(X2+1))2+(1+(X2+1)) = X2+1+(X2+1) = (X2+1) = 0 ∈ K.

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Em outras palavras α2 = −1. Isso nos permite de multiplicar elementos de K,por exemplo

(2α+1)(α+2)(α+1) = (2α2+5α+2)(α+1) = (2α)(α+1) = 2α2+2α = 2α+1.

Agora podemos responder a uma outra pergunta interessante. Sabemos que Ke um corpo com 9 elementos, em particular

K∗ = K − {0} = {1, 2, α, α+ 1, α+ 2, 2α, 2α+ 1, 2α+ 2}

e um grupo multiplicativo finito. Sabemos que isso implica que K∗ e cıclico (eum subgrupo de K∗). Vamos agora encontrar um gerador de K∗. Para fazerisso calculamos as potencias dos elementos de K∗. Como |K∗| = 8, um geradorde K∗ e exatamente um elemento de K∗ de ordem 8. As potencias de 2 sao21 = 2 e 22 = 1, logo o(2) = 2 (2 tem ordem 2) e 2 nao e um gerador deK∗: 〈2〉 6= K∗. As potencias de α sao α1 = α, α2 = −1, α3 = −α, α4 = 1,logo o(α) = 4 (α tem ordem 4) e α nao e um gerador de K∗: 〈α〉 6= K∗.As potencias de α + 1 sao (α + 1)1 = α + 1, (α + 1)2 = α2 + 2α + 1 = 2α,(α+1)3 = 2α(α+1) = 2α2+2α = 2α+1, (α+1)4 = (α+1)(2α+1) = 2α2+1 = 2.Isso implica que o(α + 1) > 4. Por outro lado o(α + 1) divide |K∗| = 8 (peloteorema de Lagrange) logo o(α + 1) = 8. Isso mostra que α + 1 e um geradorde K∗: 〈α+ 1〉 = K∗.

Observe que como todo elemento deK tem a forma a·α+b·1 com a, b ∈ F3, Ke um espaco vetorial de dimensao 2 sobre F3: dimF3(K) = 2. Uma F3-base de Ke {1, α}. Nas proximas aulas veremos que mais em geral se P (X) e um polinomioirredutıvel de grau n de F [X] (com F corpo) entao K := F [X]/(P (X)) e umcorpo, dimF (K) = n e definido α = X + (P (X)), α e raiz de P (Y ) e uma basede K sobre F e {1, α, α2, . . . , αn−1}.

3.5 Polinomios irredutıveis em Z[X] e em Q[X]

Somos interessados em estudar corpos. Ja vimos que se K e um corpo entaoum quociente K[X]/(P (X)) e um corpo se e somente se P (X) e irredutıvel emK[X]. Queremos estudar alguns criterios de irredutibilidade no caso K = Q.

Teorema 12 (Criterio de Eisenstein). Seja f(X) = anXn + . . .+ a1X + a0 um

polinomio de Z[X] de grau n ≥ 1. Se existe um numero primo p tal que p naodivide an, p divide a0, a1, . . . , an−1 e p2 nao divide a0 entao f(X) e irredutıvelem Q[X].

Demonstracao. Observe que podemos supor f(X) primitivo. De fato, f =c(f)f1 com f1 primitivo (c(f) e o conteudo de f , o maior divisor comum doscoeficientes de f) e p nao divide c(f) (pois p nao divide an), logo as hipotesessobre p e f valem tambem para p e f1. Alem disso c(f) e invertıvel em Q (poisc(f) 6= 0) logo a irredutibilidade de f e equivalente a irredutibilidade de f1.

Suponha entao f(X) primitivo. Pelo lema de Gauss a irredutibilidade de fem Q[X] e equivalente a irredutiblidade de f em Z[X]. Como f e primitivo,

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uma fatoracao propria de f consiste de fatores de grau ≥ 1. Suponha que ftenha uma tal fatoracao, assim f(X) = g(X)h(X) e igual a

(αsXs + αs−1X

s−1 + . . .+ α1X + α0) · (βtXt + βt−1Xt−1 + . . .+ β1X + β0).

Temos αs 6= 0, βt 6= 0, 1 ≤ t ≤ n− 1 e 1 ≤ s ≤ n− 1. g(X) tem grau s e h(X)tem grau t. Alem disso a0 = α0β0 e an = αsβt. Como p divide a0 e p2 naodivide a0, p divide um entre α0 e β0 e nao divide o outro, por exemplo suponhaque p divida α0 e que p nao divida β0 (o outro caso e analogo). Como p naodivide an = αsβt, p nao divide αs e p nao divide βt. Seja 1 ≤ u ≤ s ≤ n− 1 omenor inteiro tal que p nao divide αu (um tal u existe pois p divide α0 mas naodivide αs). Temos

au = α0βu + α1βu−1 + . . .+ αu−1β1 + αuβ0.

Como p divide αi para todo i = 0, 1, . . . , u − 1, existe um inteiro m tal queau = pm + αuβ0. Por outro lado p nao divide αuβ0 (pois p nao divide αu e pnao divide β0), logo como au−pm = αuβ0, p nao divide au. Como 1 ≤ u ≤ n−1,isso contradiz a hipotese (p divide a0, a1, . . . , an−1).

Entao por exemplo os polinomios seguintes sao irredutıveis em Z[X] e Q[X].A irredutibilidade em Q[X] segue do criterio de Eisenstein, a irredutibilidade emZ[X] segue do lema de Gauss observando que os polinomios dados sao primitivos.

• X4 + 45X + 15 (criterio de Eisenstein aplicado a p = 3 ou p = 5).

• Xn − 2 (criterio de Eisenstein aplicado a p = 2).

• Xn − 2X + 2 (criterio de Eisenstein aplicado a p = 2).

Vamos ver um caso em que o criterio de Eisenstein nao pode ser aplicado.Seja

f(X) = X4 −X2 − 3 ∈ Z[X].

Vamos mostrar que f(X) e irredutıvel em Z[X] e em Q[X]. Pelo lema de Gauss,como f(X) e primitivo, a irredutibilidade em Z[X] e equivalente a irredutibi-lidade em Q[X]. Vamos mostrar a irredutibilidade em Z[X]. Observe que sef(X) e redutıvel entao admite com certeza um fator de grau 1 ou 2.

Nao existencia de fatores de grau 1. Suponha de ter um fator de grau 1 def(X). Observe que f(X) e um polinomio monico, isto e, o coeficiente de graumaximo de f(X) e 1. Como os produtos dos coeficientes de grau maximo dosfatores e igual ao coeficiente de grau maximo de f(X), que e 1, os coeficientesde grau maximo dos fatores sao invertıveis, logo sao ±1, assim um fator de grau1 tem a forma ±(X − a), com a ∈ Z, assim f(a) = 0. Temos entao 0 = f(a) =a4 − a2 − 3 assim 3 = a4 − a2 = a(a3 − a) logo a divide 3. As possibilidadessao a ∈ {1,−1, 3,−3}. Por outro lado f(1) = −3 6= 0, f(−1) = −3 6= 0,f(3) = 69 6= 0, f(−3) = 69 6= 0. Logo f nao tem fatores de grau 1.

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Nao existencia de fatores de grau 2. Como f e monico, uma fatoracao emfatores de grau 2 tem a forma

X4 −X2 − 3 = f(X) = (X2 + aX + b)(X2 + cX + d)

sendo a, b, c, d ∈ Z. De fato, estamos trabalhando em Z[X], f e monico logo oscoeficientes de grau maximo dos fatores sao±1 e (−g(X))(−h(X)) = g(X)h(X).Fazendo o produto temos que f(X) = X4 −X2 − 3 e igual a

(X2 +aX+b)(X2 +cX+d) = X4 +(a+c)X3 +(d+ac+b)X2 +(ad+bc)X+bd

logo por definicao de polinomio temos a+ c = 0, d+ ac+ b = −1, ad+ bc = 0,bd = −3. Assim c = −a e a terceria equacao da a(d − b) = 0. Logo a = 0 oud − b = 0. No segundo caso d = b e −3 = bd = b2 e uma contradicao (poisb ∈ Z). Logo a = 0, c = −a = 0 e d + b = −1, bd = −3. Como b divide −3temos b ∈ {1,−1, 3,−3} assim d = −1 − b vale −2, 0, −4, 2 nos quatro casos.Em todo caso bd 6= −3, contradicao. Logo f nao tem fatores de grau 2.

3.6 Extensoes de corpos

Na aula passada estudamos K = F [X]/I, sendo F = F3 e I = (X2 + 1). Jamostramos que K e um corpo, e dito α = X + I, temos que K = {aα + b :a, b ∈ F3}, em particular |K| = 9. Na linguagem que vamos introduzir agora,K ∼= F [α] e uma extensao de F de grau 2 e o polinomio minimal de α sobre Fe X2 + 1.

No que segue lembre-se que em um corpo temos sempre 1 6= 0.

Uma extensao de corpos e, por definicao, dada por um corpo contendoum outro corpo como subanel: F ≤ E. A notacao que vamos usar e E/F(que nao significa quociente). Consideramos extensao de corpos tambem umhomomorfismo de aneis ϕ : F → E, sendo F e E corpos: um tal homomorfismotem que ser injetivo (pois o seu nucleo e um ideal do corpo F diferente de F ,sendo ϕ(1) = 1 6= 0) e identificamos F com a imagem ϕ(F ).

Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E. Considere o homomorfismode substituicao

vα : F [X]→ E, P (X) 7→ P (α).

Se trata de um homomorfismo de aneis. A imagem de vα e indicada por F [α],se trata de {P (α) : P (X) ∈ F [X]}. Indicamos por F (α) o corpo de fracoes deF [α], isto e, F (α) = {P (α)/Q(α) : P (X), Q(X) ∈ F [X], Q(α) 6= 0}. Observeque F (α) e um subcorpo de E. Temos F ≤ F [α] ≤ F (α) ≤ E (sendo que ≤significa subanel). Em geral F [α] 6= F (α), em outras palavras F [α] nao e umcorpo. Queremos entender quando F [α] e um corpo.

Definicao 13. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E. Seja vα :F [X]→ E o homomorfismo de substituicao, vα(P (X)) := P (α). α e dito

87

• algebrico sobre F se ker(vα) 6= {0};

• transcendente sobre F se ker(vα) = {0}.

Em outras palavras, α e algebrico se e somente se existe 0 6= A(X) ∈ ker(vα),isto e, se e somente se α e raiz de um polinomio nao nulo de F [X]. Nesse casoker(vα) e um ideal principal de F [X] (pois todos os ideais de F [X] sao principais,sendo F [X] um domınio Euclidiano), e nao nulo, logo e gerado por um polinomionao nulo.

Definicao 14. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E um elementoalgebrico sobre F . O polinomio minimal de α sobre F (as vezes indicadocom Irr(α, F )) e o unico gerador monico do ideal ker(vα) de F [X].

Comentario. Lembre-se que um polinomio e dito monico se o coeficiente degrau maximo e 1. Como os geradores de ker(vα) sao dois a dois associados (istoe, diferem pela multiplicacao por uma constante nao nula), existe um unicogerador monico de ker(vα), dito polinomio minimal de α sobre F .

Proposicao 20. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E algebricosobre F . Entao o polinomio minimal de α sobre F e o unico polinomio monicoirredutıvel contido em ker(vα).

Demonstracao. Seja P (X) o polinomio minimal de α sobre F . Primeiro observeque P (X) nao e o polinomio nulo (pois α e algebrico, i.e. ker(vα) 6= {0}) e P (X)nao e invertıvel (pois ker(vα) 6= F [X] sendo vα(1) = 1 6= 0). Suponha agoraP (X) = A(X)B(X) com A(X), B(X) ∈ F [X]. Entao 0 = P (α) = A(α)B(α)logo um entre A(α) e B(α) e zero (pois sao elementos de E, que e um corpo),por exemplo suponha A(α) = 0 (o outro caso e analogo). Assim A(X) ∈ker(vα) = (P (X)) logo P (X) divide A(X), Mas como A(X) divide P (X), segueque P (X) e A(X) sao associados: P (X) = cA(X) com c ∈ F uma constantenao nula. Assim cA(X) = P (X) = A(X)B(X) implica que B(X) = c logoB(X) e invertıvel.

Agora seja M(X) ∈ F [X] um polinomio monico irredutıvel tal que M(α) =0. Temos M(X) ∈ ker(vα) = (P (X)) logo P (X) divide M(X), e como M(X)e irredutıvel e P (X) nao e invertıvel, P (X) e M(X) sao associados. Como elessao ambos monicos, P (X) = M(X).

Pelo teorema de isomorfismo F [α] ∼= F [X]/(P (X)) e um corpo (sendo P (X)irredutıvel!). Isso mostra que se α e algebrico entao F [α] e um corpo. Por outrolado, observe que se α e transcendente entao ker(vα) = {0} logo F [α] ∼= F [X]nao e um corpo! Em outras palavras, α e algebrico sobre F se e somente seF [α] e um corpo (e nesse caso F [α] = F (α)), e α e transcendente sobre F se esomente se F [α] nao e um corpo. Exemplos de elementos de R transcendentessobre Q sao e e π. Em particular Q[π] ∼= Q[X].

Definicao 15 (Grau de uma extensao). Seja E/F uma extensao de corpos.Entao E e um espaco vetorial sobre F com as operacoes de soma e produto porescalar dadas pelas operacoes de soma e produto em E. A dimensao dimF (E)e chamada grau da extensao e e indicada com [E : F ].

88

Seja α ∈ E algebrico sobre F . Entao F [α] = F (α) e um corpo. Queremosentender o grau [F (α) : F ].

Proposicao 21. [F (α) : F ] e igual ao grau do polinomio minimal de α sobreF .

Demonstracao. Seja P (X) o polinomio minimal de α sobre F e seja n o grau deP (X). Vamos mostrar que B = {1, α, . . . , αn−1} e uma base de F [α] = F (α)sobre F (isto e, um conjunto gerador linearmente independente). Isso implica oresultado (pois a dimensao de um espaco vetorial e o numero de elementos deuma qualquer base dele).

Primeiro mostraremos que B e um conjunto gerador de F [α]. Um elementogenerico de F [α] e A(α) sendo A(X) um polinomio de F [X]. Fazendo a divisaocom resto de A(X) por P (X) temos A(X) = P (X)Q(X) + R(X) com R(X)de grau < n ou R(X) = 0, assim R(X) = a0 + a1X + . . . + an−1X

n−1 coma0, a1, . . . , an−1 ∈ F . Substituindo X = α temos A(α) = P (α)Q(α) + R(α) =R(α) = a0 + a1α+ . . .+ an−1α

n−1.Mostraremos agora que B e um conjunto linearmente independente. Supo-

nha que b0 +b1α+ . . .+bn−1αn−1 = 0 com b0, b1, . . . , bn−1 ∈ F . Queremos mos-

trar que b0 = 0, . . ., bn−1 = 0. Seja B(X) = b0 + b1X+ . . .+ bn−1Xn−1 ∈ F [X].

Entao B(α) = 0, logo B(X) ∈ ker(vα) = (P (X)) assim P (X) divide B(X). Masse B(X) nao e nulo, o grau de B(X) e menor que n (por definicao de B(X))entao P (X), que tem grau n, nao pode dividir B(X). Logo B(X) = 0, emoutras palavras b0 = 0, b1 = 0, . . ., bn−1 = 0.

Agora vamos fazer exemplos.

1. Sejam F = R, E = C, α = i. Como nao existem polinomios de grau 1em R[X] com i como raiz, o polinomio minimal de i sobre R e X2 + 1 eR[i] = {a + ib : a, b ∈ R} = C e uma extensao de R de grau 2 (poisX2 + 1 tem grau 2). Alem disso C = R[i] ∼= R[X]/(X2 + 1).

2. Sejam F = Q, E = C, α = i. Como nao existem polinomios de grau 1em Q[X] com i como raiz, o polinomio minimal de i sobre Q e X2 + 1 eQ[i] = {a + ib : a, b ∈ Q} e uma extensao de Q de grau 2 (pois X2 + 1tem grau 2). Alem disso Q[i] ∼= Q[X]/(X2 + 1).

3. Sejam F = Q, E = R, α = 4√

2. Temos α4 = 2, logo α e raiz de X4 −2, assim α e algebrico sobre Q (sendo raiz de um polinomio nao nulode Q[X]). O polinomio X4 − 2 e irredutıvel pelo criterio de Eisensteinaplicado a p = 2, logo X4−2 e o polinomio minimal de α sobre Q. TemosQ[α] = Q(α) e a extensao Q(α)/Q tem grau 4: [Q(α) : Q] = 4. TemosQ[α] ∼= Q[X]/(X4 − 2).

4. Sejam F = Q, E = C, α = i 6√

3. Temos α6 = −3, logo α e raiz deX6 + 3, em particular e algebrico sobre Q. O polinomio X6 + 3 ∈ Q[X]e irredutıvel pelo criterio de Eisenstein logo e o polinomio minimal de αsobre Q. Temos [Q(α) : Q] = 6 e Q(α) = Q[α] ∼= Q[X]/(X6 + 3).

89

5. Sejam F = Q, E = C, α = i√

2√

3− 3. Temos α2 = −(2√

3 − 3) logo(α2 − 3)2 = 12, assim α e raiz de P (X) = X4 − 6X2 − 3, que e umpolinomio irredutıvel pelo criterio de Eisenstein. Logo α e algebrico sobreQ e P (X) e o polinomio minimal de α sobre Q, o grau [Q(α) : Q] e iguala 4 e Q(α) = Q[α] ∼= Q[X]/(X4 − 6X2 − 3).

Por exemplo Q[i] = {a+ib : a, b ∈ Q} e um corpo, em particular ele contemos inversos dos seus elementos nao nulos. Seja a+ ib ∈ Q[i] nao nulo. Sabemosque entao o inverso dele pode ser expresso como c+ id com c, d ∈ Q. Temos

1

a+ ib=

a− ib(a+ ib)(a− ib)

=a− iba2 + b2

=a

a2 + b2+ i

−ba2 + b2

.

Logo c = aa2+b2 e d = −b

a2+b2 . Uma forma mais util de ver isso e a seguinte. Para

calcular o inverso de i + 1 aplicamos o algoritmo de Euclide a X2 + 1 e X + 1encontrando 1

2 (X2 + 1) − 12 (X − 1)(X + 1) = 1, e substituindo X = i temos

− 12 (i− 1)(i+ 1) = 1, assim o inverso de i+ 1 e − 1

2 (i− 1).Mais em geral, se E/F e uma extensao de corpos e α ∈ E e algebrico

sobre F com polinomio minimal P (X) ∈ F [X], dado L(α) ∈ F [α] com L(X) ∈F [X] de grau menor de n, L(X) e P (X) sao coprimos (pois P (X) e irredutıvelde grau maior do grau de L(X)) e aplicando o algoritmo de Euclide obtemosA(X), B(X) ∈ F [X] tais que A(X)P (X) + B(X)L(X) = 1. Como P (α) = 0,substituindo X = α obtemos B(α)L(α) = 1 logo B(α) e o inverso de L(α) emF [α].

3.7 Formula do grau

Lembre-se que se E/F e uma extensao de corpos, dado α ∈ E, F (α) ={P (α)/Q(α) : P (X), Q(X) ∈ F [X], Q(α) 6= 0}. Se trata de um corpo. Aextensao F (α)/F e dita extensao simples de F . O resultado seguinte nos da umcriterio para saber se um elemento α e algebrico em termo do grau da extensaoF (α)/F .

Proposicao 22. Seja E/F extensao de corpos, e seja α ∈ E. Entao α ealgebrico sobre F se e somente se o grau [F (α) : F ] e finito.

Demonstracao. Se α e algebrico sobre F entao F (α) = F [α] e o grau [F (α) : F ]e igual ao grau do polinomio minimal de α sobre F , em particular e finito.Agora suponha [F (α) : F ] finito, igual a n. Entao os elementos 1, α, α2, . . . , αn

sao linearmente dependentes sobre F (pois sao n + 1 elementos em um espacovetorial de dimensao n), assim existem a0, a1, . . . , an ∈ F nao todos nulos taisque a0+a1α+a2α

2+. . .+anαn = 0. Seja P (X) := a0+a1X+. . .+anX

n ∈ F [X].Se trata de um polinomio nao nulo e P (α) = 0, assim 0 6= P (X) ∈ ker(vα), logoker(vα) 6= {0}, em outras palavras α e algebrico.

A situacao e F ≤ F (α) ≤ E, logo temos tres extensoes: F (α)/F , E/F eE/F (α). Queremos entender a relacao entre os graus.

90

Teorema 13 (Formula do grau). Sejam F ≤ K ≤ E tres corpos. Entao ograu [E : F ] e finito se e somente se [E : K] e [K : F ] sao finitos e nesse caso[E : F ] = [E : K] · [K : F ].

Demonstracao. Suponha [E : F ] = dimF (E) finito, igual a n. Observe que K eum subespaco vetorial de E (sobre F ) logo [K : F ] = dimF (K) ≤ dimF (E) =[E : F ] = n, assim [K : F ] e finito. Alem disso, uma base de E sobre K eum conjunto gerador de E sobre F , logo tem no maximo n elementos. Assim[E : K] ≤ n tambem, em particular [E : K] e finito.

Suponha [E : K] e [K : F ] finitos, e vamos mostrar que [E : F ] = [E :K] · [K : F ] (em particular essa formula implica que [E : F ] e finito). Seja{v1, . . . , vn} uma base de K sobre F , e seja {w1, . . . , wm} uma base de E sobreK, sendo n = [K : F ] e m = [E : K]. Vamos mostrar que B = {viwj : 1 ≤ i ≤n, 1 ≤ j ≤ m} e uma base de E sobre F (isso implica que [E : F ] = nm que eo nosso resultado).

Vamos mostrar que B e linearmente independente. Suponha∑i,j aijviwj =

0 com aij ∈ F para todo i e j, e vamos mostrar que aij = 0 para todo i ej. Podemos re-escrever a soma como

∑j(∑i aijvi)wj = 0, o que implica que∑

i aijvi = 0 para todo j (de fato, w1, . . . , wm sao linearmente independentessobre K e

∑i aijvi ∈ K para todo j), logo aij = 0 para todo i e todo j (de fato,

v1, . . . , vn sao linearmente independentes sobre F e aij ∈ F ).Vamos mostrar que B e um conjunto gerador. Seja w ∈ E, assim exis-

tem bj ∈ K tais que w =∑j bjwj (pois {w1, . . . , wm} e um conjunto gerador

de E sobre K) e existem aij ∈ F tais que bj =∑i aijvi para todo j (pois

{v1, . . . , vn} e um conjunto gerador de K sobre F ). Logo w =∑j(∑i aijvi)wj =∑

i,j aijviwj .

Observe que se E/F e extensao de corpos, [E : F ] = 1 se e somente seE = F . De fato, se E = F entao E tem dimensao 1 sobre F = E, com base{1}. Se [E : F ] = 1 entao existe uma base {e} com um elemento, assim como1 ∈ E temos que existe f ∈ F com 1 = ef logo e = f−1 ∈ F . Em particulartodo elemento de E tem a forma ey com y ∈ F , assim pertence a F (pois e e ypertencem a F ). Logo E = F .

Corolario 1. Seja E/F uma extensao de corpos e suponha que [E : F ] = p sejaum numero primo. Entao E/F e uma extensao simples, isto e, existe α ∈ E talque E = F (α).

Demonstracao. Como [E : F ] = p > 1, temos E 6= F , logo existe α ∈ E − F .Assim [F (α) : F ] > 1 (se fosse [F (α) : F ] = 1 entao F (α) = F , em particularα ∈ F , absurdo) e pela formula do grau

p = [E : F ] = [E : F (α)] · [F (α) : F ].

Como p e primo devemos ter [E : F (α)] = 1 assim E = F (α).

Proposicao 23. Seja E/F uma extensao de corpos e seja A o conjunto doselementos de E algebricos sobre F . Entao A e um corpo: F ≤ A ≤ E.

91

Demonstracao. Sejam α, β ∈ A com α 6= 0. Precisamos mostrar que α+β, −α,α−1, αβ (que sao elementos de E) pertencem a A. Considere K := F (α)(β) =F (α, β). Vamos mostrar que [K : F ] e finito. Pela formula do grau isso acontecese e somente se [F (α, β) : F (α)] e [F (α) : F ] sao finitos e nesse caso [K : F ] =[F (α)(β) : F (α)] · [F (α) : F ]. Como [F (α) : F ] e finito (pois α e algebrico sobreF ) basta mostrar que [F (α)(β) : F (α)] e finito, em outras palavras, que β ealgebrico sobre F (α). Mas sabemos que β e algebrico sobre F , seja P (X) ∈ F [X]o polinomio minimal de β sobre F . Assim P (X) e um polinomio nao nulo deF [X] ⊆ F (α)[X] tal que P (β) = 0, logo β e algebrico sobre F (α).

Entao [F (α, β) : F ] e finito. Seja γ um entre α + β, −α, α−1, αβ. Observeque γ ∈ F (α, β), assim F (γ) ≤ F (α, β) (subcorpo, mas tambem subespacovetorial). Logo [F (γ) : F ] = dimF (F (γ)) ≤ dimF (F (α, β)) = [F (α, β) : F ] efinito, assim γ e algebrico sobre F .

Por exemplo seja E = Q(√

2,√

3) = Q(√

2)(√

3). Vamos calcular [E : Q].Observe que pela formula do grau

[E : Q] = [Q(√

2)(√

3) : Q(√

2)] · [Q(√

2) : Q].

Sabemos que [Q(√

2) : Q] = 2 (o polinomio minimal de√

2 sobre Q e X2 − 2),logo temos que calcular [Q(

√2)(√

3) : Q(√

2)], em outras palavras queremoscalcular o polinomio minimal de

√3 sobre Q(

√2). Sabemos que

√3 e raiz

do polinomio monico X2 − 3 ∈ Q(√

2)[X]. Queremos mostrar que X2 − 3e irredutıvel em Q(

√2)[X] (e nao somente em Q[X]). Como se trata de um

polinomio de grau 2 a redutibilidade e equivalente a existencia de raizes emQ(√

2), logo basta mostrar que√

3 6∈ Q(√

2) (pois as raizes de X2 − 3 sao√

3 e−√

3). Mas sabemos que

Q(√

2) = Q[√

2] = {a+ b√

2 : a, b ∈ Q},

assim precisamos mostrar que nao existem a, b ∈ Q tais que√

3 = a + b√

2.Suponha por contradicao que existam tais elementos a, b, entao elevando

√3 =

a+b√

2 ao quadrado nos dois lados obtemos 3 = a2+2b2+2ab√

2. Como√

2 6∈ Qdevemos ter ab = 0, assim a = 0 ou b = 0. No primeiro caso 3 = 2b2, no segundocaso 3 = a2. Nos dois casos obtemos uma contradicao pois

√3/2,√

3 6∈ Q.

Isso implica que [Q(√

2)(√

3) : Q(√

2)] = 2 logo [E : Q] = 2 · 2 = 4. Umabase de E sobre Q e dada por {1,

√2,√

3,√

2√

3 =√

6}.

3.8 Exercıcios resolvidos

1. Seja A um domınio de integridade. Mostre que todo subgrupo finito deU(A) e cıclico.

Seja K o corpo de fracoes de A. Entao A e um subanel de K (identificadocom {a1 : a ∈ A}), logo U(A) e um subgrupo multiplicativo de K∗. Logose G e um subgrupo multiplicativo finito de U(A) entao e tambem umsubgrupo multiplicativo de K∗, logo G e cıclico, pois K e um corpo.

92

2. Encontre um gerador do grupo cıclico F∗p para todo primo p < 20.

O grupo cıclico G = F∗p tem ordem p − 1, logo se trata de encontrar umelemento de ordem multiplicativa p − 1. Isso e feito da forma seguinte:calculam-se as potencia de todo elemento de G ate a potencia (p − 1)/2-esima lembrando que a ordem de um elemento de G divide |G| = p − 1(pelo teorema de Lagrange). Se as potencias sao diferentes de 1 ate a(p− 1)/2-esima entao o elemento considerado tem ordem p− 1.

p = 2. Um gerador de F∗p = {1} e 1. p = 3. Um gerador de F∗p = {1, 2}e 2. p = 5. Um gerador de F∗p = {1, 2, 3, 4} e 2, de fato 22 = 4, 23 = 3 e24 = 1 (logo o(2) = 4 = 5− 1). p = 7. Um gerador de F∗p e 3, de fato o(3)divide 7 − 1 = 6 e 32 = 2, 33 = 6 assim o(3) > 3 logo o(3) = 6. p = 11.Um gerador de F∗p e 2, de fato o(2) divide 11 − 1 = 10 e 22 = 4, 23 = 8,24 = 5, 25 = 10, assim o(2) > 5 logo o(2) = 10. p = 13. Um gerador deF∗p e 6, de fato o(6) divide 13− 1 = 12 e 62 = 10, 63 = 8, 64 = 9, 65 = 2,66 = 12, assim o(6) > 6 logo o(6) = 12. p = 17. Um gerador de F∗p e 3, defato o(3) divide 17 − 1 = 16 e 32 = 9, 33 = 10, 34 = 13, 35 = 5, 36 = 15,37 = 11, 38 = 16, assim o(3) > 8 logo o(3) = 16. p = 19. Um gerador deF∗p e 2, de fato o(2) divide 19− 1 = 18 e 22 = 4, 23 = 8, 24 = 16, 25 = 13,26 = 7, 27 = 14, 28 = 9, 29 = 18, assim o(2) > 9 logo o(2) = 18.

3. Escreva 13 e 52 como produto de irredutıveis em Z[i].

Temos 13 = 22 + 32 = (2 + 3i)(2 − 3i) e 2 + 3i, 2 − 3i sao irredutıveis(eles tem norma 13, que e um numero primo). Temos 52 = 2213 =((1 + i)(1 − i))2(2 + 3i)(2 − 3i) = (1 + i)2(1 − i)2(2 + 3i)(2 − 3i). Comoja observado 2 + 3i e 2− 3i sao irredutıveis. 1 + i e 1− i sao irredutıveistambem pois eles tem norma 2 (que e um numero primo).

4. Escreva 5−i como produto de irredutıveis em Z[i]. [Dica: escreva primeiroa fatoracao de N(5− i) em Z[i].]

Temos N(5 − i) = (5 − i)(5 + i), por outro lado N(5 − i) = 52 + 12 =26 = 2 · 13 = (1 + i)(1 − i)(2 + 3i)(2 − 3i), assim os fatores irredutıveisde 5 − i estao entre 1 + i, 1 − i, 2 + 3i, 2 − 3i. Por exemplo tentamosmultiplicar 1 + i e 2 + 3i: (1 + i)(2 + 3i) = 2 − 3 + 3i + 2i = −1 + 5i.Observe que (−i)(−1 + 5i) = 5 + i. Aplicando a conjugacao complexaobtemos 5− i = −i(−1 + 5i) = i(1 + i)(2 + 3i) = i(1− i)(2− 3i). Logo afatoracao de 5− i em irredutıveis e 5− i = i(1− i)(2−3i) = (1+ i)(2−3i).

5. Diga se 5 e redutıvel em Z[√

2]. [Dica: usando o argumento na prova daaula do 31/05, se trata de estudar a redutibilidade de X2 − 2 em F5[X].]

O argumento na prova da aula do dia 31/05 mostra que F5[X]/(X2−2) ∼=Z[√

2]/(5), logo se X2 − 2 e irredutıvel em F5[X] entao 5 e irredutıvel emZ[√

2]. X2− 2 e irredutıvel em F5[X] pois ele tem grau 2 e nao tem raizesem F5: 02 − 2 = 3, 12 − 2 = 4, 22 − 2 = 2, 32 − 2 = 2, 42 − 2 = 3. Logo 5e irredutıvel em Z[

√2].

93

6. Mostre que K = F3[X]/(X2 + 1) e um corpo, calcule |K| e encontre umgerador de K∗.

Seja α := X + I sendo I = (X2 + 1). Assim α2 + 1 = X2 + 1 + I = I logoα2 + 1 = 0 em K. Como mostrado em sala de aula (02/06) temos

K = {0, 1, 2, α, α+ 1, α+ 2, 2α, 2α+ 1, 2α+ 2}

logo |K| = 9 e as potencia de α sao α1 = α, α2 = 2, α3 = 2α, α4 = 1,assim o(α) = 4. As potencias de α + 1 sao (α + 1)1 = α + 1, (α +1)2 = α2 + 2α + 1 = 2α, (α + 1)3 = 2α(α + 1) = 2α2 + 2α = 2α + 1,(α+ 1)4 = (2α+ 1)(α+ 1) = 2α2 + 1 = 2. Logo o(α+ 1) divide 9− 1 = 8e e maior que 4, assim o(α + 1) = 8, isto e, α + 1 e um gerador de K∗:K∗ = 〈α+ 1〉.

7. Mostre que existem infinitos numeros primos congruentes a 1 modulo 4.[Dica: suponha por contradicao que tenha so um numero finito deles,p1, . . . , pk, e seja m := 2p1 . . . pk. Seja p um numero primo que dividem2 + 1. Mostre que m+ pZ ∈ Fp tem ordem 4 em F∗p e deduza que p ≡ 1mod 4 usando o teorema de Lagrange.]

Seguindo a dica, em Fp temos m 6= 0 (pois p nao divide m) m1 = m 6= 1(m2 = −1 6= 1 sendo p 6= 2), m2 = −1 6= 1 (sendo p 6= 2), m3 = −m 6= 1(pois se fosse −m = 1 entao m2 = 1, absurdo) e m4 = −m2 = 1, logo mtem ordem 4 em F∗p. Pelo teorema de Lagrange 4 divide |F∗p| = p− 1 logop ≡ 1 mod 4, assim p divide m (por definicao de m), absurdo (p dividem2 + 1, logo nao pode dividir m).

8. Seja K := F5[X]/(X2 + 2). Mostre que K e um corpo finito, calcule |K|e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

X2 + 2 e irredutıvel em F5[X] pois tem grau 2 e nao tem raizes em F5:02 + 2 = 2, 12 + 2 = 3, 22 + 2 = 1, 32 + 2 = 1, 42 + 2 = 3. Logo K e umcorpo. Dito α = X + I sendo I = (X2 + 2), α2 = −2 = 3 e os elementosde K sao a + bα sendo a, b ∈ F5, assim |K| = 52 = 25. Um gerador deG = K∗ tem ordem 25 − 1 = 24. Um elemento g de um grupo cıclicode ordem 24 = 23 · 3 tem ordem 24 se e somente se g12 6= 1 e g8 = 1(pois 24/2 = 12, 24/3 = 8 e 2, 3 sao todos os divisores primos de 24),logo para saber se g ∈ G gera G basta calcular g12 e g8. Observe que(α + 4)12 = (4 + 3α)6 = (3 + 4α)3 = 4 6= 1 e (α + 4)8 = (4 + 3α)4 =(3 + 4α)2 = 2 + 4α 6= 1. Logo α+ 4 e um gerador de G: G = 〈α+ 4〉.

9. Seja K := F2[X]/(X2 +X + 1). Mostre que K e um corpo finito, calcule|K| e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

X2 +X+1 e irredutıvel em F2[X] pois tem grau 2 e nao tem raizes em F2:02 + 0 + 1 = 1, 12 + 1 + 1 = 1. Logo K e um corpo. Dito α = X + I sendoI = (X2 +X + 1), α2 + α+ 1 = 0 - isto e, α2 = α+ 1 - e os elementos deK sao a + bα sendo a, b ∈ F2, assim |K| = 22 = 4. K = {0, 1, α, α + 1}.Logo G = K∗ = {1, α, α+ 1} e α e um gerador de G: α2 = α+ 1, α3 = 1.

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10. Seja K := F2[X]/(X3 +X + 1). Mostre que K e um corpo finito, calcule|K| e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

X3 +X+1 e irredutıvel em F2[X] pois tem grau 2 e nao tem raizes em F2:03 + 0 + 1 = 1, 13 + 1 + 1 = 1. Logo K e um corpo. Dito α = X + I sendoI = (X3 +X + 1), α3 + α+ 1 = 0 - isto e, α3 = α+ 1 - e os elementos deK sao a+ bα+ cα2 sendo a, b, c ∈ F2, assim |K| = 23 = 8.

K = {0, 1, α, α+ 1, α2, α2 + 1, α2 + α, α2 + α+ 1}.

Logo G = K∗ e um grupo cıclico de ordem 7 e α e um gerador de G (emum grupo cıclico de ordem 7 todo elemento nao trivial e um gerador, pois7 e primo!).

11. Seja K := F3[X]/(X3 + 2X + 1). Mostre que K e um corpo finito, calcule|K| e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

X3+2X+1 e irredutıvel em F3[X] pois tem grau 3 e nao tem raizes em F3:03+2·0+1 = 1, 13+2·1+1 = 1, 23+2·2+1 = 1. Logo K e um corpo. Ditoα = X+I sendo I = (X3 +2X+1), α3 +2α+1 = 0, isto e, α3 = α+2 - eos elementos de K sao a+bα+cα2 sendo a, b, c ∈ F3, assim |K| = 33 = 27.Logo G = K∗ e um grupo cıclico de ordem 26 = 2 · 13 e um gerador de Gtem ordem 26. Um elemento g ∈ G tem ordem 26 se e somente se g2 6= 1e g13 6= 1. Temos α2 6= 1 (pois se fosse α2 = 1 o polinomio minimal de αteria grau ≤ 2) e α3 = α+2 logo α12 = (α+2)4 = (α2 +4α+4)2 = α2 +2assim α13 = α(α2 + 2) = 2 6= 1. Entao α e um gerador de G: G = 〈α〉.

12. Mostre que 2X10 + 25X3 + 10X2 − 30 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].

Lema de Gauss e criterio de Eisenstein aplicado a p = 5.

13. Mostre que se p e um numero primo e n e um inteiro ≥ 1, o polinomioXn − p e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].

Lema de Gauss e criterio de Eisenstein aplicado a p.

14. Mostre que 3X5 + 18X2 + 24X + 6 e irredutıvel em Q[X]. E irredutıvelem Z[X]?

Se trata de 3(X5 + 6X2 + 8X + 2) e 3 e invertıvel, X5 + 6X2 + 8X +2 e primitıvo e irredutıvel em Q[X] pelo lema de Gauss e o criterio deEisenstein aplicado a p = 2. Nao e irredutıvel em Z[X] pois admite afatoracao 3(X5 + 6X2 + 8X + 2).

15. Mostre que X3 +X + 4 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].

Nao podemos aplicar o criterio de Eisenstein. Por outro lado P (X) =X3+X+4 tem grau 3 e e monico, logo para mostrar que P (X) e irredutıvelem Z[X] basta mostrar que os divisores de 4 nao sao raizes de P (X) (e sefor o caso o lema de Gauss implica a irredutibilidade em Q[X] tambem).Temos P (1) = 6, P (2) = 14, P (4) = 72, P (−1) = 2, P (−2) = −6,P (−4) = −64.

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16. Mostre que 7X3+12X2+3X+45 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X]. [Dica:considere a reducao modulo 2.]

Seja P (X) = 7X3 + 12X2 + 3X + 45. Se P (X) fosse redutıvel, reduzindomodulo 2 obteriamos uma fatoracao de P (X) modulo 2 (observe que ograu e preservado pois 2 nao divide 7). Logo basta mostrar que P (X) eirredutıvel modulo 2. O polinomio reduzido e P (X) = X3 +X + 1. Comose trata de um polinomio de grau 3, a irredutibilidade segue do fato queP (X) nao tem raizes em F2, e isso e claro pois 03+0+1 = 1, 13+1+1 = 1.

17. Mostre que X4 + 1 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].

Basta mostrar a irredutibilidade em Z[X], pois P (X) = X4+1 e primitivo(lema de Gauss). Como P (X) e monico, os fatores de grau 1 correspondema raizes em Z que sao divisores de P (0) = 1, e como P (1) = 2 e P (−1) = 2,P (X) nao tem fatores de grau 1. Uma fatoracao de P (X) = X4 + 1 emfatores de grau 2 deve ter a forma

(X2+aX+b)(X2+cX+d) = X4+(a+c)X3+(d+ac+b)X2+(ad+bc)X+bd

sendo a, b, c, d ∈ Z, assim a+ c = 0, d+ ac+ b = 0, ad+ bc = 0 e bd = 1.Temos c = −a logo a(d− b) = 0. Se a = 0 entao c = 0 e d+ b = 0, bd = 1,assim −b2 = 1 absurdo. Se d− b = 0 entao d = b, b2 = 1 logo b = d = ±1.Se b = d = 1 entao 2− a2 = 0 absurdo, se b = d = −1 entao −2− a2 = 0absurdo.

18. Mostre que se P (X) ∈ Z[X] e a ∈ Z entao P (X) e irredutıvel se e somentese P (X + a) e irredutıvel.

Segue facilmente do fato que se P (X + a) = A(X)B(X) entao P (X) =A(X − a)B(X − a), e se P (X) = A(X)B(X) entao P (X + a) = A(X +a)B(X + a) (e o grau de L(X) e de L(X + a) e de L(X − a) e o mesmo,para todo L(X) ∈ Z[X]).

19. Mostre que P (X) = X4 +1 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X] considerandoP (X + 1) (cf. o exercıcio anterior).

P (X + 1) = (X + 1)4 + 1 = X4 + 4X3 + 6X2 + 4X + 2 e irredutıvelpelo criterio de Eisenstein aplicado a p = 2, logo P (X) e irredutıvel peloexercıcio anterior.

20. Seja α = i√

2 ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau[Q(α) : Q]. Encontre o inverso de α e de α + 1 em Q[α]. [Dica: opolinomio minimal e X2 + 2. Para encontrar o inverso de α + 1 em Q[α]aplique o algoritmo de Euclide a X2 + 2 e X + 1 e substitua X = α.]

α2 = −2 logo α e raiz de X2 + 2 que e irredutıvel em Q[X] pelo criteriode Eisenstein aplicado a p = 2. Assim [Q(α) : Q] = 2. Temos α · α = −2logo α · (−α/2) = 1, assim α−1 = −α/2. Aplicar o algoritmo de Euclidea X2 + 2 e X + 1 neste caso e simples pois X2 + 2 = (X + 1)(X − 1) + 3assim 1

3 (X2 + 2)− 13 (X+ 1)(X− 1) = 1 logo substituindo X = α obtemos

que o inverso de α+ 1 em Q[α] e − 13 (α− 1).

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21. Seja α =√22 (1+ i) ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau

[Q(α) : Q]. Encontre o inverso de α+ 1 em Q[α].

α2 = i logo α4 = −1, assim α e raiz de X4 + 1 que e irredutıvel peloexercıcio 17 ou 19. Logo [Q(α) : Q] = 4. O algoritmo de Euclide aplicadoa X4 + 1 e X + 1 neste caso e simples pois X4 + 1 = X4 − 1 + 2 = (X −1)(X+1)(X2+1)+2 logo 1

2 (X4+1)− 12 (X−1)(X+1)(X2+1) = 1, assim

substituindo X = α obtemos que o inverso de α+ 1 e − 12 (α− 1)(α2 + 1).

22. Seja α =

√2−

√2−√

2 ∈ R. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule

o grau [Q(α) : Q]. Encontre o inverso de α2 em Q[α].

α2 = 2 −√

2−√

2 logo (α2 − 2)2 = 2 −√

2 logo ((α2 − 2)2 − 2)2 = 2,assim α e raiz de

((X2 − 2)2 − 2)2 − 2 = X8 − 8X6 + 20X4 − 16X2 + 2

que e irredutıvel pelo criterio de Eisenstein aplicado a p = 2, logo [Q(α) :Q] = 8 e α8−8α6 +20α4−16α2 +2 = 0 implica que α2(α6−8α4 +20α2−16) = −2, assim o inverso de α2 em Q[α] e − 1

2 (α6 − 8α4 + 20α2 − 16).

23. Seja α =√

2 − i ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q, calcule o grau[Q(α) : Q] e mostre que

√2 ∈ Q(α).

α2 = 1−2i√

2 logo (α2−1)2 = −8 assim α e raiz de P (X) = X4−2X2+9.Pelo lema de Gauss como P (X) e primitivo para mostrar a irredutibilidadeem Q[X] basta mostrar a irredutibilidade em Z[X]. P (X) nao tem fatoresde grau 1 pois P (1) = P (−1) = 8, P (3) = P (−3) = 72, P (9) = P (−9) =94 − 162 + 9 6= 0. Se P (X) tem fatores de grau 2 entao e igual a

(X2+aX+b)(X2+cX+d) = X4+(a+c)X3+(d+ac+b)X2+(ad+bc)X+bd

sendo a, b, c, d ∈ Z, assim a+ c = 0, d+ ac+ b = −2, ad+ bc = 0 e bd = 9.Temos c = −a logo a(d − b) = 0. Se a = 0 entao c = 0 e d + b = −2,bd = 9, assim b(−b − 2) = 9 absurdo (basta conferir os casos possıveis,b = ±1,±3,±9). Se a 6= 0 entao d − b = 0 logo d = b, b2 = 9 assimb = d = ±3. Se b = d = 3 entao 6 − a2 = −2 absurdo, se b = d = −3entao −6−a2 = −2 absurdo. Isso mostra que P (X) e irredutıvel em Q[X]logo e o polinomio minimal de α sobre Q e [Q(α) : Q] = 4. Agora vamosmostrar que

√2 ∈ K = Q(α). Temos α2 = 1− 2i

√2 logo i

√2 ∈ K. Logo

K 3 i√

2(√

2− i) = 2i+√

2 assim K 3 (2i+√

2) + 2(√

2− i) = 3√

2 logoK 3 (3

√2)/3 =

√2 sendo 3 ∈ Q ⊆ K.

24. Seja F um corpo e α ∈ F . Encontre o polinomio minimal de α sobre F .

O polinomio minimal de α sobre F e X − α. E irredutıvel (tem grau 1).

25. Seja F = F3, α = X + (X2 + 1) ∈ F [X]/(X2 + 1), E = F [α]. Encontreo polinomio minimal de α + 1 sobre F . Encontre o polinomio minimal

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de todo elemento de F [α] sobre F . [Dica: a unica coisa que voce precisasaber para fazer as contas e que α e raiz de X2 + 1.]

Seja β = 2α+1. Temos (2β−2)2 = α2 = −1 logo β e raiz de X2−2X+2,que e irredutıvel em F3[X] pois tem grau 2 e nao tem raizes em F3. Logoo polinomio minimal de β e X2 − 2X + 2. Os outros elementos se tratamde maneira analoga.

26. Seja P (X) ∈ Q[X] um polinomio de grau ≥ 1 e seja α ∈ C. Mostre que αe algebrico sobre Q se e somente se P (α) e algebrico sobre Q.

Se α e algebrico sobre Q entao P (α) e algebrico tambem pois e umacombinacao linear de potencias de α e os elementos algebricos formam umcorpo que contem Q. Se P (α) e algebrico entao e raiz de um polinomio naonulo Q(X) logo Q(P (α)) = 0 e α e raiz de Q(P (X)), assim α e algebricotambem.

27. Seja p um numero primo e seja E/Fp uma extensao de grau n. Mostreque |E| = pn.

E e um espaco vetorial de dimensao n sobre Fp, assim todo elementode E pode ser expresso com coordenadas com respeito a uma base de Esobre Fp. Como temos n coordenadas e p escolhas para cada coordenada,|E| = pn.

28. Mostre que [Q(i,√

2) : Q] = 4.

Pela formula do grau [Q(i,√

2) : Q] = [Q(√

2)(i) : Q(√

2)] · [Q(√

2) : Q].O segundo grau e 2 pois o polinomio minimal de

√2 sobre Q e X2 − 2.

O primeiro grau e no maximo 2 pois i e raiz de X2 + 1 (logo o polinomiominimal de i sobre Q(

√2) divide X2 + 1 !). Se o primeiro grau fosse 1

entao i ∈ Q(√

2), impossıvel (Q(√

2) esta contido em R mas i 6∈ R). Logoo segundo grau e 2 tambem e o resultado segue.

29. Mostre que Q ≤ Q(i√

3) ≤ Q(i +√

3). Calcule os graus das extensoesinvolvidas. [Dica: para mostrar que Q(α) ⊆ Q(β) basta mostrar queα ∈ Q(β).]

i√

3 pertence a Q(i +√

3) pois (i +√

3)2 = −1 + 3 + 2i√

3. Logo temosas inclusoes escritas. O grau de Q(i

√3) sobre Q e 2 pois o polinomio

minimal de i√

3 sobre Q e X2 + 3. Sejam α = i√

3, β = i +√

3. Comoβ2 = 2 + 2α, β e raiz de X2 − 2α − 2 ∈ Q(α)[X] logo o grau de β sobreQ(α) e no maximo 2 (cada vez que um elemento e raiz de um polinomiode grau m tal polinomio e divisıvel pelo polinomio minimal logo o graudo polinomio minimal e no maximo m). Se esse grau fosse 1 entao β teriagrau 2 sobre Q. Mas o grau de β sobre Q e 4 pois (β − 2)2 = −12 logo βe raiz de X4 − 4X2 + 16 que e irredutıvel em Q[X] (isso pode se mostrarexaminando os fatores de grau 1 e 2).

30. Mostre que [Q(√

2, 3√

2) : Q] = 6. [Cf. o exercıcio 35 abaixo.]

98

Seja d = [Q(√

2, 3√

2) : Q]. Pela formula do grau d e divisıvel por [Q(√

2) :Q] = 2 e por [Q( 3

√2) : Q] = 3 logo d e um multiplo de 6. Por outro lado

d = [Q(√

2)( 3√

2) : Q(√

2)] · [Q(√

2) : Q] e o primeiro grau dessa fatoracaoe no maximo 3 pois 3

√2 e raiz de X3 − 2. Logo d ≤ 6 e 6 divide d, assim

d = 6.

31. Mostre que Q(√

2,√

3) = Q(√

2 +√

3). [Dica: encontre o polinomio mini-mal de α =

√2 +√

3 sobre Q calculando α2 = . . ..]

Como mostrado em sala de aula, Q(√

2,√

3) tem grau 4 sobre Q. ComoQ(√

2 +√

3) e um Q-subespaco vetorial de Q(√

2,√

3), para mostrar queQ(√

2,√

3) = Q(√

2 +√

3) basta mostrar que [Q(√

2 +√

3) : Q] = 4. Sejaα =√

2 +√

3. Temos α2 = 5 + 2√

6 logo (α2− 5)2 = 24, assim α e raiz deX4−10X2+1. Se trata de um polinomio irredutıvel sobre Q (examinandoas fatoracoes) logo [Q(

√2 +√

3) : Q] = 4.

Uma outra maneira e mostrar as duas inclusoes. A inclusao ⊇ e clarapois α =

√2 +√

3 ∈ Q(√

2,√

3). Temos α2 = 5 + 2√

6 logo√

6 ∈ Q(α) eQ(α) 3

√6α = 2

√3+3√

2, assim Q(α) 3 (2√

3+3√

2)−2(√

2+√

3) =√

2,logo

√3 = α−

√2 ∈ Q(α) tambem e ⊆ segue.

32. Mostre que Q(√

2, i) = Q(√

2(1 + i)).

Seja α =√

2(1 + i). A inclusao ⊇ e clara pois α ∈ Q(√

2, i). Para mostrar⊆ observe que α2 = 4i logo i ∈ Q(α) logo

√2 = α/(1+ i) ∈ Q(α) tambem,

assim Q(√

2, i) ⊆ Q(α).

33. Seja α = i√

2√

3− 3 ∈ C. Mostre que Q ≤ Q(√

3) ≤ Q(α) e calcule osgraus das extensoes involvidas.

Mostrei em sala de aula (07/06) que α tem grau 4 sobre Q. Por outro lado[Q(√

3) : Q] = 2 logo pela formula do grau [Q(α) : Q(√

3)] = 2. O fatoque Q(

√3) ≤ Q(α) segue de α2 = −(2

√3− 3) (assim

√3 = (3− α2)/2).

34. Seja E/F extensao de corpos e α, β ∈ E com β algebrico sobre F . Mostreque β e algebrico sobre F (α) e que o polinomio minimal de β sobre F (α)divide o polinomio minimal de β sobre F . Deduza que [F (α, β) : F (α)] ≤[F (β) : F ].

Seja P (X) o polinomio minimal de β sobre F . Logo P (X) ∈ F (α)[X]entao β e algebrico sobre F (α). Seja Q(X) o polinomio minimal de βsobre F (α). Q(X) divide P (X) pois Q(X) divide todos os polinomiosde F (α)[X] que tem β como raiz (por definicao de polinomio minimal).Entao o grau de Q(X) e menor ou igual ao grau de P (X), em outraspalavras [F (α)(β) : F (α)] ≤ [F (β) : F ].

35. Seja E/F uma extensao de corpos, α, β ∈ E algebricos sobre F e suponhan = [F (α) : F ], m = [F (β) : F ] coprimos. Mostre que [F (α, β) : F ] = nm.[Dica: use o exercıcio anterior.]

Temos [F (α)(β) : F ] = [F (α)(β) : F (α)][F (α) : F ] = [F (α)(β) : F (α)]n.Pelo exercıcio anterior [F (α)(β) : F (α)] ≤ [F (β) : F ] = m logo [F (α)(β) :

99

F ] ≤ nm. Por outro lado n divide [F (α)(β) : F ] (pela igualdade acima)e m divide [F (α)(β) : F ] pois [F (α)(β) : F ] = [F (α)(β) : F (β)]m. Comom e n sao coprimos, e dividem [F (α)(β) : F ], mn divide [F (α)(β) : F ]tambem e como [F (α)(β) : F ] ≤ mn obtemos [F (α)(β) : F ] = mn.

36. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E. Mostre que se [F (α) : F ]e impar entao F (α) = F (α2).

α e raiz de X2 − α2 logo [F (α) : F (α2)] ≤ 2. Por outro lado [F (α) :F (α2)] divide [F (α) : F ] (pela formula do grau) que e impar assim [F (α) :F (α2)] = 1, isto e F (α) = F (α2).

37. Um corpo F e dito algebricamente fechado se todo polinomio de F [X]admite uma raiz em F . Mostre que F e algebricamente fechado se esomente se nao existem extensoes E/F de grau finito maior que 1.

Suponha F algebricamente fechado. Se existe E/F de grau finito maiorque 1 entao seja α ∈ E −F (existe pois E 6= F ). O polinomio minimal deα sobre F e um polinomio de F [X] sem raizes em F . Absurdo.

Suponha que nao existam extensoes de grau finito maior que 1. SejaP (X) ∈ F [X]. Seja Q(X) um fator irredutıvel de P (X). Vamos mostrarque Q(X) tem grau 1 (assim Q(X) = aX+b e −b/a e uma raiz de P (X)).Considere E = F [X]/(Q(X)). Se trata de uma extensao finita de F (degrau igual ao grau de Q(X)) e por hipotese devemos ter [E : F ] = 1. LogoQ(X) tem grau 1.

3.9 Corpo de decomposicao

Seja E/F uma extensao de corpos. Se α1, . . . , αn ∈ E podemos definir induti-vamente

F (α1, . . . , αn) = F (α1, . . . , αn−1)(αn).

Se trata do subcorpo de E gerado por F e por α1, . . . , αn, isto e, a intersecaodos subcorpos de E que contem F , α1, . . . , αn. Ja encontramos exemplos detais corpos, por exemplo Q(

√2,√

3). Observe que se os αi sao algebricos sobreF entao [F (α1, . . . , αn) : F ] ≤ d1 · · · dn, sendo di = [F (αi) : F ].

Definicao 16 (Corpo de decomposicao). Seja F um corpo e seja P (X) ∈ F [X]de grau ≥ 1. Um corpo M contendo F e dito corpo de decomposicao de P (X)sobre F se

1. M = F (u1, . . . , ur) sendo P (ui) = 0 para todo i = 1, . . . , r.

2. P (X) e fatoravel em M [X] em fatores de grau 1.

Em outras palavras um corpo de decomposicao de P (X) sobre F e umcorpo M contendo F e minimal com respeito a propriedade seguinte: se Q(X)e irredutıvel em M [X] e divide P (X) (em M [X]) entao Q(X) tem grau 1.

100

Por exemplo seja P (X) = X2+1 ∈ Q[X]. As raizes complexas de P (X) emC sao i e −i, logo um corpo de decomposicao de P (X) sobre Q e Q(i,−i) = Q(i).

Por exemplo seja P (X) = X3−2 ∈ Q[X]. As raizes complexas de P (X) sao

α, ρα e ρ2α sendo α = 3√

2 e ρ = − 12 +i

√32 (em outras palavras α e a raiz real de

P (X) e ρ e um elemento de C∗ de ordem 3). Logo um corpo de decomposicaode P (X) sobre Q e Q(α, ρα, ρ2α), que e igual a Q(α, ρ) (a inclusao ⊆ e facil,para mostrar a inclusao ⊇ observe que ρ = (ρα)α−1). Observe que entao o grau[Q(α, ρ) : Q] e 6 pois α tem grau 3, ρ tem grau 2 e 3 e 2 sao coprimos (veja oexercıcio 35 da ultima lista).

Vamos mostrar a existencia e a unicidade dos corpos de decomposicao.

Teorema 14. Seja P (X) ∈ F [X] de grau n ≥ 1. Existe um corpo de decom-posicao M de P (X) sobre F . Se K e um outro corpo de decomposicao de P (X)sobre F entao M e K sao isomorfos.

Demonstracao. Existencia. Inducao sobre n. Se n = 1 entao P (X) = aX +b ∈ F [X] logo um corpo de decomposicao de P (X) sobre F e F (−b/a) = F .Suponha n ≥ 2. Escreva P (X) = A(X)B(X) com A(X) irredutıvel em F [X].Seja E := F [X]/(A(X)) e seja u = X + I ∈ E sendo I = (A(X)). Temos entaoE = F (u). Alem disso A(u) = 0, de fato escrevendo A(Y ) =

∑i aiY

i temos

A(u) = A(X + I) =∑i

ai(X + I)i =∑i

aiXi + I = A(X) + I = I

sendo A(X) ∈ I, em outras palavras A(u) = 0 em E. Isso implica que P (X) =(X − u)H(X) para algum H(X) ∈ E[X] (pois E contem u). Como P (X) =A(X)B(X) = (X − u)H(X)B(X), por hipotese de inducao existe um corpo dedecomposicao de H(X)B(X) sobre E = F (u) (pois H(X)B(X) tem grau n−1),logo M e corpo de decomposicao de P (X) sobre F (ele contem E = F (u) e asoutras raizes).

Unicidade. Para mostrar a unicidade mostraremos o fato seguinte. Sejamϕ : F1 → F2 um isomorfismo de corpos, ϕ : F1[X] → F2[X] o isomorfismodefinido por ϕ(

∑i aiX

i) :=∑i ϕ(ai)X

i. Seja P1(X) ∈ F1[X] e seja P2(X) =ϕ(P1(X)) ∈ F2[X]. Para i = 1, 2 seja Mi um corpo de decomposicao para Pi(X)sobre Fi. Mostraremos que M1

∼= M2. Isso implica o resultado escolhendoF1 = F2 = F e ϕ a funcao identidade.

Mostraremos esse fato por inducao sobre m = [M1 : F1]. Se m = 1 entaoF1 = M1 logo F1 e corpo de decomposicao de P1(X) sobre F1, assim F2 e corpode decomposicao de P2(X) sobre F2 (pois F1

∼= F2 e P2(X) = ϕ(P1(X))) logoF2 = M2 e o isomorfismo M1

∼= M2 e exatamente ϕ. Suponha agora que m ≥ 2.Em particular P1(X) admite um fator irredutıvel de grau ≥ 2 (se nao, M1 =F1 contradicao) assim P1(X) = H1(X)L1(X) com H1(X) irredutıvel de grau≥ 2. Aplicando ϕ obtemos P2(X) = H2(X)L2(X) com H2(X) = ϕ(H1(X))irredutıvel de grau igual a grau(H1(X)) ≥ 2. Para i = 1, 2 seja αi uma raiz

101

de Hi(X) em Mi. Logo (Hi(X)) e exatamente o nucleo de vαi : Fi[X] → Mi,assim como F1

∼= F2 e H2(X) = ϕ(H1(X)) obtemos

F1(α1) ∼= F1[X]/(H1(X)) ∼= F2[X]/(H2(X)) ∼= F2(α2).

A situacao e a seguinte.

F1⊆ //

∼=��

F1(α1)⊆ //

∼=��

M1

F2⊆ // F2(α2)

⊆ // M2

Queremos completar o diagrama com um isomorfismo M1∼= M2.

Observe que para i = 1, 2 temos que Mi e corpo de decomposicao de P (X)sobre Fi logo tambem sobre Fi(αi). Alem disso, pela formula do grau

m = [M1 : F1] = [M1 : F1(α1)] · [F1(α1) : F1] ≥ 2[M1 : F1(α1)]

sendo [F1(α1) : F1] igual ao grau de H1(X). Assim [M1 : F1(α1)] ≤ m/2 < mlogo por hipotese de inducao M1

∼= M2.

3.10 Estrutura dos corpos finitos

Vamos usar a nocao de corpo de decomposicao para estudar a estrutura doscorpos finitos. Primeiro algumas observacoes.

Seja F um corpo finito. Existe um unico homomorfismo de aneis f : Z→ F ,de fato f(1) = 1, f(−1) = −1 e todo elemento de Z e uma soma de 1 ou umasoma de −1. Seja I o nucleo de f , I = ker(f)EZ. Assim existe um unico inteironao negativo m ≥ 0 tal que I = (m) = mZ. Esse inteiro e unico (de fato, osgeradores de (m) sao m e −m) e e chamado caracterıstica de F . Observe quem > 0 pois se m = 0 entao f e injetiva, absurdo (Z e infinito). Alem disso, me um numero primo p. De fato se m = ab com a, b inteiros maiores que 1 entao0 = f(m) = f(ab) = f(a)f(b) que e uma igualdade no corpo F assim um entref(a) e f(b) e zero, isto e, um entre a e b pertence a ker(f) = I = (m), assim mdivide um entre a e b, absurdo.

Temos entao que o nucleo de f : Z → F e (p) = pZ para algum numeroprimo p. Pelo teorema de isomorfismo Fp = Z/pZ ∼= Im(f) ≤ F . Isso implicaque F contem um subcorpo isomorfo a Fp, isto e, F e uma extensao de Fp.Seja n := [F : Fp] = dimFp

(F ). Como F e um conjunto de cardinalidadefinita, a dimensao n de F sobre Fp e finita. Se {v1, . . . , vn} e uma base de Fsobre Fp entao todo elemento de F pode ser escrito de maneira unica comoa1v1 + . . . + anvn com a1, . . . , an ∈ Fp. Tem p escolhas para todo ai, assim|F | = pn. Isso mostra em particular que a cardinalidade de um corpo finito esempre uma potencia de um primo. Em particular, por exemplo, nao existemcorpos de cardinalidade 12 (pois 12 nao e uma potencia de um primo).

102

A pergunta natural agora e a seguinte: dado um primo p e um inteiro posi-tivo n, quantos corpos de cardinalidade pn existem (a menos de isomorfismo)?Usando a nocao de corpo de decomposicao mostraremos que existe (a menosde isomorfismo) um unico corpo de cardinalidade dada. Antes disso, mais umanocao.

Seja F um corpo finito de caracterıstica p. Considere a funcao ϕ : F → Fdefinida por ϕ(a) := ap. Se trata de um isomorfismo de corpos (chamadoisomorfismo de Frobenius). De fato ϕ(1) = 1p = 1, ϕ(ab) = (ab)p = apbp =ϕ(a)ϕ(b). Na proxima conta os inteiros sao identificados com as imagens delesem F via o homomorfismo Z→ F . Temos

ϕ(a+ b) = (a+ b)p =

p∑i=0

(p

i

)aibp−i.

Observe que se 0 < i < p entao o inteiro(pi

)= p!

i!(p−i)! e divisıvel por p, de fato p

e primo logo e coprimo com i!(p− i)!. Assim todos os coeficientes consideradosem F sao nulos exceto os que correspondem a i = 0 e i = p, isto e, bp e ap. Issomostra que (a+ b)p = ap + bp em F . Assim ϕ e homomorfismo. E injetivo poisker(f) = {0} (ap = 0 implica a = 0) e e sobrejetivo pelo princıpio da casa dospombos (F e finito). Logo ϕ e um isomorfismo.

Seja E/F uma extensao de corpos e seja P (X) ∈ F [X]. Uma raiz α ∈ Ede P (X) e dita raiz multipla de P (X) se (X − α)2 divide P (X) em E[X]. Aderivada formal de P (X) =

∑ni=0 aiX

i e definida por P ′(X) =∑ni=1 iaiX

i−1.Os numeros iai sao elementos de F , em particular o fator a esquerda do produtoiai indica 1 + 1 + . . . + 1 (i vezes). Os expoentes i de Xi, por outro lado, saonumeros inteiros (nao sao elementos de F ). Observe que para a derivada formalvale a formula de derivacao de um produto, (A(X)B(X))′ = A(X)B′(X) +A′(X)B(X).

Proposicao 24. Seja E/F extensao de corpos. Seja P (X) ∈ F [X] e sejaα ∈ E. Entao α e uma raiz multipla de P (X) se e somente se P (α) = 0 eP ′(α) = 0.

Demonstracao. (⇒) Suponha P (X) = (X − α)2Q(X). Entao P ′(X) = 2(X −α)Q(X)+(X−α)2Q′(X), logo P ′(α) = 0. (⇐) Suponha P (α) = 0 e P ′(α) = 0.P (α) = 0 implica que P (X) = (X − α)Q(X) para algum Q(X) ∈ E[X], logoP ′(X) = Q(X) + (X − α)Q′(X). Agora P ′(α) = 0 implica Q(α) = 0 logoQ(X) = (X − α)H(X) assim P (X) = (X − α)Q(X) = (X − α)2H(X).

Corolario 2. Seja d um inteiro positivo e p um numero primo. O polinomio

Xpd −X ∈ Fp[X] nao tem raizes multiplas em nenhuma extensao de Fp.

Demonstracao. A derivada formal de Xpd − X e pdXpd−1 − 1 = −1 que naotem nenhuma raiz.

103

Como visto na aula passada, se F e um corpo finito de caracterıstica pentao Fp e um subcorpo de F , em outras palavras F e uma extensao de Fp.Em particular todo subcorpo de F e tambem uma extensao de Fp, em outraspalavras se K ≤ F entao Fp ≤ K ≤ F .

Teorema 15. Seja F um corpo finito, |F | = pn.

1. F e um corpo de decomposicao de Xpn −X sobre Fp.

2. Seja A o conjunto dos subcorpos de F e seja B o conjunto dos divisoresde n. A funcao ψ : A → B que leva K para [K : Fp] e uma bijecao. A

inversa dela e θ(d) := {a ∈ F : apd

= a}.

Demonstracao. Seja F ∗ o grupo multiplicativo dos elementos nao nulos de F .Se a ∈ F ∗ entao ap

n−1 = 1 (pois |F ∗| = pn − 1). Multiplicando por a obtemosap

n

= a. Essa igualdade vale tambem quando a = 0, assim F = {a ∈ F :ap

n

= a}. Isso implica que X − a divide Xpn −X para todo a ∈ F logo, como|F | = pn e igual ao grau de Xpn −X, obtemos que Xpn −X =

∏a∈F (X − a).

Assim F e corpo de decomposicao de Xpn −X sobre Fp.Mostraremos que se d divide n entao Kd = θ(d) = {a ∈ F : ap

d

= a} e umsubcorpo de F e que |Kd| = pd. O fato que Kd ≤ F segue do fato que elevar a pe um homomorfismo (isomorfismo de Frobenius, visto na aula passada), assim se

a, b ∈ Kd entao (ab)pd

= apd

bpd

= ab logo ab ∈ Kd, (a+ b)pd

= apd

+ bpd

= a+ b

logo a + b ∈ Kd, e se a 6= 0, (a−1)pd

= (apd

)−1 = a−1 logo a−1 ∈ Kd. Agora

mostraremos que |Kd| = pd. Como o polinomio Xpd−X tem raizes distintas (emoutras palavras, nao tem raizes multiplas em nenhuma extensao, pelo corolarioacima), e F e um corpo de decomposicao deXpn−X, para mostrar que |Kd| = pd

basta mostrar que Xpd − X divide Xpn − X. Se m e um inteiro positivo, opolinomio Y − 1 divide Y m− 1 (pois 1 e uma raiz de Y m− 1) logo substituindoY = pd e m = n/d obtemos que pd − 1 divide pn − 1. Substituindo entao

Y = Xpd−1−1, m = (pn−1)/(pd−1) obtemos que Xpd−1−1 divide Xpn−1−1

e multiplicando por X obtemos que Xpd −X divide Xpn −X.Agora vamos mostrar que ψ e θ sao uma a inversa da outra. Temos θ(ψ(K)) =

θ(d) = Kd sendo d = [K : Fp]. K e um corpo de cardinalidade pd, logo apd

= apara todo a ∈ K (como mostrado acima em geral para F ) assim K ⊆ Kd.Como K e Kd tem a mesma cardinalidade pd obtemos que K = Kd, assimθ(ψ(K)) = K. Temos ψ(θ(d)) = ψ(Kd) = [Kd : Fp] = d pois |Kd| = pd.

Agora podemos mostrar o teorema de existencia e unicidade dos corposfinitos.

Teorema 16. Sejam p um numero primo, n um inteiro positivo. Existe umcorpo F de cardinalidade pn e todos os corpos de cardinalidade pn sao isomorfos.

Demonstracao. Seja F um corpo de decomposicao de Xpn −X sobre Fp (existepelo teorema de existencia do corpo de decomposicao) e seja K = {a ∈ F :ap

n

= a}. Como mostrado na prova acima usando o isomorfismo de Frobenius,

104

K e um subcorpo de F . Alem disso K e gerado por raizes de Xpn − X (eleconsiste de raizes!) e Xpn −X e fatoravel em K[X] em fatores de grau 1 (poisisso vale em F [X] e todas as raizes pertencem a K). Como F e um corpode decomposicao de Xpn − X obtemos K = F . Como as raizes de Xpn − Xsao distintas, |F | = |K| = pn. Se E e um corpo de cardinalidade pn entaopelo teorema 2 E e um corpo de decomposicao de Xpn −X sobre Fp logo peloteorema de unicidade do corpo de decomposicao E ∼= F .

O ultimo resultado do curso e o seguinte. Seja F um corpo finito de cardina-lidade pn (ou seja, de caracterıstica p e de dimensao n sobre Fp). Ja conhecemosum isomorfismo F → F , o isomorfismo de Frobenius φ definido por φ(a) = ap.Considere o conjunto G de todos os isomorfismos F → F . Se trata de um grupocom respeito a composicao.

Teorema 17. G e cıclico de ordem n gerado por φ: G = 〈φ〉 ∼= Cn.

Demonstracao. Primeiro, observe que φ tem ordem n. De fato se a ∈ F entaoφn(a) = ap

n

= a, assim φn = 1, ou seja φn e a identidade F → F . Se d < n

e tal que φd = 1 entao φd(a) = a para todo a ∈ F , ou seja apd

= a para todo

a ∈ F . Mas o polinomio Xpd − X tem grau pd, logo |F | ≤ pd, absurdo (poisd < n e |F | = pn).

Se θ ∈ G temos um isomorfismo θ : F [X] → F [X], o unico que extendeθ, ou seja θ(

∑i aiX

i) =∑i θ(ai)X

i. Observe que se P (X) ∈ Fp[X] entaoθ(P (X)) = P (X), de fato se a ∈ Fp entao a e uma soma de uns e θ(1) = 1assim θ(a) = a. Por outro lado, considerando o isomorfismo φ (o isomorfismode Frobenius) temos que para esse particular isomorfismo vale o vice-versa: seφ(P (X)) = P (X) entao P (X) ∈ Fp. De fato φ(P (X)) = P (X) significa queφ(a) = a - isto e, ap = a - para todo coeficiente a de P (X). Mas os elementos ade F tais que ap = a sao exatamente os elementos do unico subcorpo de F decardinalidade p (pelo teorema 2), que e Fp. Logo P (X) ∈ Fp[X].

Seja θ ∈ G qualquer. Queremos mostrar que θ e uma potencia de φ. Seja αum gerador do grupo multiplicativo cıclico F ∗, assim F ∗ = 〈α〉. Considere

P (X) = (X − α)(X − φ(α)) · · · (X − φn−1(α)).

Aplicando φ e lembrando que φn(α) = α (pois φ tem ordem n) obtemosφ(P (X)) = (X − φ(α))(X − φ2(α)) · · · (X − α) = P (X). Assim P (X) ∈ Fp[X],logo θ(P (X)) = P (X) (pela observacao acima), por outro lado

θ(P (X)) = θ((X − α)(X − φ(α)) · · · (X − φn−1(α)))

= (X − θ(α))(X − θ(φ(α))) · · · (X − θ(φn−1(α)))

Como esse polinomio e igual a P (X), obtemos que θ(α) e uma raiz de P (X),assim θ(α) = φi(α) para algum i ∈ {0, 1, . . . , n − 1}. Assim θ(αk) = θ(α)k =φi(α)k = φi(αk) para todo inteiro k logo θ = φi (pois α e um gerador de F ∗).

O grupo G se chama grupo de Galois da extensao F/Fp.

105

3.11 Exercıcios resolvidos

Lembre-se que um corpo de decomposicao de P (X) ∈ Q[X] e dado porQ(u1, . . . , ur) sendo u1, . . . , ur todas as raizes complexas de P (X).

1. Calcule o grau de um corpo de decomposicao de

(a) X2 − 2 sobre Q. As raizes sao ±√

2 logo um corpo de decomposicaoe Q(√

2,−√

2) = Q(√

2) que tem grau 2 sobre Q.

(b) X3 − 1 sobre Q. Temos X3 − 1 = (X − 1)(X2 + X + 1). As raizescomplexas de X3 − 1 sao as raizes cubicas da unidade, isto e, 1, ρ =

− 12 + i

√32 e ρ = − 1

2 − i√32 . Assim um corpo de decomposicao e

Q(1, ρ, ρ2) = Q(ρ). Como o polinomio minimal de ρ sobre Q e X2 +X + 1, o grau de Q(ρ) sobre Q e 2.

(c) X3 + 1 sobre Q. Temos X3 + 1 = (X + 1)(X2 − X + 1). As raizes

complexas de X3 + 1 sao as raizes cubica de −1, isto e, α = 12 + i

√32 ,

α = 12 − i

√32 . Logo um corpo de decomposicao e Q(1, α, α) = Q(i

√3)

que tem grau 2 sobre Q.

(d) X4−2 sobre Q. As raizes complexas de X4−2 sao ± 4√

2 e ±i 4√

2, assimum corpo de decomposicao e Q( 4

√2, i 4√

2) = Q( 4√

2, i). Pela formulado grau [Q( 4

√2, i) : Q] = [Q( 4

√2)(i) : Q( 4

√2)] · [Q( 4

√2) : Q] = 4d

sendo d = [Q( 4√

2)(i) : Q( 4√

2)] (pois X4−2 e irredutıvel em Q[X] pelocriterio de Eisenstein). Como i e raiz de X2 + 1 e i 6∈ Q( 4

√2) obtemos

d = 2 logo o grau de um corpo de decomposicao de X4 − 2 sobre Q e4 · 2 = 8.

(e) X4 + 1 sobre Q. As raizes complexas de X4 + 1 sao√22 (±1± i) logo

um corpo de decomposicao e Q(√

2, i) que tem grau 4 sobre Q comovisto no exercıcio 28 da lista anterior.

(f) (X2 − 2)(X2 − 3) sobre Q. As raizes complexas de (X2 − 2)(X2 − 3)sao ±

√2 e ±

√3 logo um corpo de decomposicao e Q(

√2,√

3) que temgrau 4 sobre Q como visto na aula do 9 de junho.

2. Seja F um corpo finito e veja ele como extensao de Fp. Mostre que existeα ∈ F tal que F = Fp(α). [Dica: F ∗ e cıclico.]

Seja α um gerador do grupo multiplicativo cıclico F ∗, assim todo elementonao nulo de F e uma potencia de α. As potencias de α pertencem aFp(α) ⊆ F , logo Fp(α) = F .

3. Seja F um corpo finito. Mostre que existe um ideal I de Z[X] tal queZ[X]/I ∼= F . [Dica: Se trata de construir um homomorfismo sobrejetivoZ[X]→ F e aplicar o teorema de isomorfismo. Use o exercıcio anterior.]

Pelo exercıcio anterior F = Fp(α) para algum α ∈ F . Seja P (X) o po-linomio minimal de α sobre Fp. Sabemos que F = Fp(α) ∼= Fp[X]/(P (X)).A reducao modulo p da um homomorfismo sobrejetivo f : Z[X]→ Fp[X].A composicao dos homomorfismos sobrejetivos f e Fp[X]→ Fp[X]/(P (X))

106

(projecao canonica) e do isomorfismo Fp[X]/(P (X)) ∼= F da entao umhomomorfismo sobrejetivo g : Z[X] → F . Pelo teorema de isomorfismoZ[X]/I ∼= F sendo I = ker(g).

4. Um corpo F e dito algebricamente fechado se todo polinomio P (X) ∈F [X] admite uma raiz em F . Mostre que os corpos finitos nao sao alge-bricamente fechados.

Escreva F = {a1, . . . , an}. O polinomio (X − a1)(X − a2) · · · (X − an) + 1nao tem raizes em F .

5. Mostre que o isomorfismo de Frobenius Fp → Fp e a identidade.

Se trata do pequeno teorema de Fermat. Se a ∈ F∗p entao |F∗p| = p − 1assim ap−1 = 1 logo ap = a, que vale tambem quando a = 0. Logo ap = apara todo a ∈ Fp.

6. Mostre que F3 e um corpo de decomposicao de X3 −X sobre F3.

De fato, temos X3 −X = X(X − 1)(X + 1), as raizes sao 0, 1 e −1 e F3

e obviamente igual a F3(0, 1,−1).

7. Seja F = F2[X]/(X2 +X+1). Mostre que F e um corpo de decomposicaode Y 2 + Y + 1 sobre F2.

Seja α = X + I sendo I = (X2 + X + 1). Sabemos que α e raiz deY 2 + Y + 1. Fazendo a divisao com resto de Y 2 + Y + 1 por Y − αobtemos Y 2 + Y + 1 = (Y − α)(Y − (α + 1)) logo F = {0, 1, α, α + 1}(que e obviamente igual a F2(α, α + 1)) e um corpo de decomposicao deY 2 + Y + 1 sobre F2.

8. Seja F = F2[X]/(X2 +X + 1) = {0, 1, α, α + 1} sendo α = X + I, sendoI = (X2 + X + 1). F e um corpo com 4 = 22 elementos, e sabemos que∏a∈F (X − a) = X4 −X. Faca essa conta explicitamente.

Lembrando que α2 = α+1 temos X(X−1)(X−α)(X− (α+1)) = (X2−X)(X2−(α+1+α)X+α(α+1)) e igual a (X2−X)(X2−X+1) = X4−X.

9. Seja F = F2[X]/I sendo I = (X3 +X + 1) e seja α = X + I. Mostre que|F | = 8. Mostre que α e um gerador de F ∗ (lembrando que |F ∗| = 7 e umnumero primo). Mostre que (X − α)(X − α2)(X − α4) = X3 +X + 1.

F e um corpo pois X3+X+1 e irredutıvel (tem grau 3 e nao tem raizes emF2), a cardinalidade e 23 = 8 pois F tem caracterıstica 2 dimensao 3 sobreF2. O grupo cıclico F ∗ tem ordem 7 que e primo logo todo elemento deF ∗ diferente de 1 e um gerador de F ∗, em particular α. Temos α3 = α+1logo α4 = α3α = (α+ 1)α = α2 + α. Entao

(X − α)(X − α2)(X − α4) = (X2 − (α+ α2)X + α+ 1)(X − (α+ α2))

= X3 − (α+ α2 + α+ α2)X2 + ((α+ α2)2 + α+ 1)X − (α+ 1)(α+ α2)

= X3 +X + 1.

107

10. Escreva a fatoracao em irredutıveis de

(a) X7 −X em F7[X].

Pela teoria X7 −X =∏a∈F7

(X − a) logo

X7 −X = X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4)(X − 5)(X − 6).

(b) X4−X em F2[X]. TemosX4−X = X(X3−1) = X(X−1)(X2+X+1)e os fatores sao irredutıveis em F2[X].

(c) X9 −X em F3[X]. [Dica: se F e um corpo com 9 elementos e β ∈ Fentao o grau [F3(β) : F3] divide [F : F3] = 2, assim o polinomiominimal de β sobre F3 tem grau 1 ou 2, logo os fatores irredutıveisde X9 −X sao os polinomios monicos irredutıveis de grau 1 ou 2 emF3[X].]

Seguindo a dica (observe que pela teoria todo elemento de F e raiz deX9−X !), se trata de fazer a lista dos polinomios monicos irredutıveisde grau 1 e 2 em F3[X]. Os polinomios monicos irredutıveis de grau1 sao X, X − 1 e X − 2. Os polinomios monicos irredutıveis de grau2 sao X2 + 1, X2 +X + 2, X2 + 2X + 2. Logo

X9 −X = X(X − 1)(X − 2)(X2 + 1)(X2 +X + 2)(X2 + 2X + 2).

11. Conte os subcorpos de F2[X]/(X3 +X + 1).

Se trata de um corpo de cardinalidade 23, logo ele tem 2 subcorpos (pois3 tem dois divisores: 1 e 3).

12. Seja F um corpo de cardinalidade 64. Conte os subcorpos de F .

Como 64 = 26, o numero de subcorpos de F e igual ao numero de divisoresde 6, ou seja 4 (os divisores de 6 sao 1, 2, 3, 6).

13. Sejam p um numero primo e n um inteiro positivo. Mostre que existeP (X) ∈ Fp[X] irredutıvel de grau n. [Dica: sabemos que existe um corpoF de cardinalidade pn. Seja α um gerador do grupo cıclico F ∗. Observeque F = Fp(α) e considere o nucleo de vα : Fp[X] → F , vα(P (X)) =P (α).]

Seguindo a dica temos I = ker(vα) = (P (X)) para algum polinomio P (X)(que e o polinomio minimal de α sobre Fp) e pela teoria Fp[X]/I ∼= Fp(α) =F tem pn elementos, logo ele tem dimensao n sobre Fp. Assim P (X) eirredutıvel e tem grau n. Em outras palavras, como [Fp(α) : Fp] = n, opolinomio minimal de α sobre Fp tem grau n.

14. Sejam F corpo finito e P (X) = X5 + 4X3 +X2 + 2X + 4 ∈ F [X]. Mostreque 1 e raiz multipla de P (X) se e somente se F tem caracterıstica 3.

A derivada formal de P (X) e 5X4 + 12X2 + 2X + 2. 1 e raiz multipla deP (X) se e somente se e raiz de P (X) e de P ′(X), assim 0 = P (1) = 12 e0 = P ′(1) = 21, assim 3 = 2 · 12 − 21 = 0. Logo F tem caracterıstica 3.Vice-versa se 3 = 0 entao P (1) = 12 = 0 e P ′(1) = 21 = 0.

108

15. BONUS. Seja F um corpo, e seja P (X) ∈ F [X]. Defina fP : F → F ,fP (a) := P (a). fP e dita funcao polinomial associada a P . Seja C oconjunto de todas as funcoes F → F . Considere a funcao

ϕ : F [X]→ C, P 7→ fP .

Mostre que:

(a) ϕ e injetiva se e somente se F e infinito. [Dica: mostre que se F efinito de cardinalidade pn entao ϕ(Xpn −X) = 0.]

(b) ϕ e sobrejetiva se e somente se F e finito. [Dica: mostre que C e umanel com as operacoes (f + g)(x) = f(x) + g(x) e (fg)(x) = f(x)g(x),que ϕ e homomorfismo de aneis e que se F e finito de cardinalidadepn entao ker(ϕ) = (Xpn −X).]

(a) (⇒). Se ϕ e injetiva entao F e infinito. De fato se F e finito de cardi-nalidade pn entao ϕ(Xpn − X) e igual a funcao nula, pois ap

n

= a para todoa ∈ F . Assim ϕ(Xpn −X) = ϕ(0), por outro lado Xpn −X 6= 0. Logo ϕ nao einjetiva.

(a) (⇐). Se F e infinito entao ϕ e injetiva. De fato se ϕ(P (X)) = ϕ(Q(X))entao P (a) = Q(a) para todo a ∈ F , assim o polinomio H(X) = P (X)−Q(X)e tal que H(a) = 0 para todo a ∈ F . Se F e infinito entao H(X) tem infinitasraizes, logo H(X) = 0 (o numero maximo de raizes de um polinomio nao nuloe o grau do polinomio).

(b) (⇒). Se ϕ e sobrejetiva entao F e finito. De fato se F e infinito entao afuncao f : F → F definida por f(0) = 1 e f(x) = 0 para todo x ∈ F − {0} naoe uma funcao polinomial (e nao nula e admite infinitas raizes). Logo ϕ nao esobrejetiva (nao existe nenhum polinomio P (X) tal que ϕ(P (X)) = f).

(b) (⇐). Se F e finito entao ϕ e sobrejetiva. Suponha F finito. E facilmostrar que C e um anel (seguindo a dica) e que ϕ e um homomorfismo. SeP (X) ∈ ker(ϕ) entao em particular P (a) = 0 para todo a ∈ F , logo X − adivide P (X) para todo a ∈ F , assim

∏a∈F (X − a) = Xpn − X divide P (X).

Isso mostra que ker(ϕ) = (Xpn −X). Pelo teorema de isomorfismo a imagemde ϕ e isomorfa a F [X]/(Xpn −X), que e um espaco vetorial de dimensao pn

sobre F (uma base e dada pelos elementos Xk + I sendo I = (Xpn − X) ek = 0, . . . , pn − 1), logo |Im(ϕ)| = |F ||F |. Por outro lado |C| = |F ||F |, logoIm(ϕ) = C, ou seja ϕ e sobrejetiva.

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