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Polícia VITÓRIA, ES, DOMINGO, 04 DE MAIO DE 2014 ATRIBUNA 27 PERÍCIA CRIMINAL Novo teste para desvendar crimes Técnica consegue identificar mais substâncias deixadas nas mãos de criminosos após disparo de uma arma de fogo FERNANDO RIBEIRO/AT PESQUISADOR Zanata Brandão ajudou na criação de nova técnica: mais resíduos deixados por uma arma de fogo nas mãos dos criminosos são identificados Mariana Spelta A polícia capixaba vai poder contar com uma técnica fo- rense mais precisa para identificar quem usou a arma de fogo em um crime. Em uma parceria entre a Supe- rintendência de Polícia Técnico- Científica do Estado com estudan- tes da pós-graduação de Química da Universidade Federal do Espí- rito Santo (Ufes), foi criado um no- vo teste que identifica mais resí- duos deixados por uma arma de fogo nas mãos dos criminosos. “O tiro deixa resíduos químicos na mão de quem realiza o dispa- ro”, explicou a perita criminal Ca- line Destéfani. E a principal substância deixada pelo disparo de uma arma de fogo é o chumbo. Se na análise das amostras coletadas nas mãos do acusado for encontrado o metal, isso significa que pode ter aconte- cido o disparo. “O problema é que o chumbo pode ser encontrado em vários produtos que são comuns no dia a dia, como tintura de cabelo ou ba- teria de carro. Antes, não tinha co- mo afirmamos se o chumbo era proveniente do disparo de uma ar- ma”, disse Caline. Por isso, segundo a perita, havia a necessidade da elaboração de uma técnica que fosse mais con- clusiva. E após dois anos de pes- quisas realizadas em conjunto com os estudantes da Ufes, um no- vo método foi criado para a perícia forense. O professor Wanderson Romão, que é orientador do projeto e espe- cialista em Química Forense, disse que depois que as amostras dos re- síduos são coletadas, elas são dis- solvidas em uma solução ácida e, em seguida, colocadas em uma máquina, que também é usada na análise de solos e de petróleo. A máquina faz o elemento ácido evaporar e o que sobra são as subs- tâncias encontradas nas mãos do acusado. Se um disparo foi feito, serão encontradas três metais: chumbo, bário e antimônio. Logo depois, um computador faz a contagem desses elementos e isso pode ajudar a identificar quantos tiros foram efetuados e ainda qual a arma que foi usada. “Essa técnica consegue identifi- car esses elementos mesmo se a gente tiver uma quantidade muito pequena de amostra. Então, mes- mo se o criminoso lavar as mãos, é possível obter esses metais”, expli- cou o professor. Agora, o desafio é adaptar a téc- nica ao dia a dia dos peritos. “A no- va metodologia vai nos dar mais informações, o que ajuda na solu- ção dos crimes”, explicou a perita criminal Caline Destéfani. Técnica atual é incompleta O teste residuográfico – que atualmente é realizado para des- cobrir se alguém fez uso de arma de fogo em um crime – é feito de forma rápida, mas é incompleto. A perita criminal da Polícia Civil do Estado Caline Destéfani expli- cou que, primeiramente, é coleta- da uma amostra de resíduos das mãos do acusado com uma fita. Em seguida é colocada sobre essa amostra um reagente de rodizona- to de sódio. “Se no material apare- cer manchas de cor violeta, isso quer dizer que existe chumbo na amostra”, explicou a perita. Ela afirmou ainda que o chumbo é uma das substâncias que são ex- pelidas de uma arma de fogo de- pois que o tiro é efetuado. Segundo Destéfani, como a pre- sença de chumbo não significa que o metal seja proveniente de uma arma, o teste era ineficiente. “Precisamos dar a maior quanti- dade de informações possíveis. Por isso, buscamos a ajuda da Ufes para criar uma nova técnica com uma máquina que nós já tínhamos aqui no laboratório”, ressaltou. A pesquisa, da qual o estudante de Mestrado Zanata Brandão par- ticipa, ainda não acabou. “Precisamos ver como essa téc- nica age em uma situação real, pois ela só foi realizada até agora em condições criadas em labora- tório”, afirmou Caline. O delegado José Lopes, chefe da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), contou que a no- va técnica vai ajudar muito nas in- vestigações dos assassinatos. “A gente tinha dificuldade pois os laudos técnicos emitidos pelos peritos não eram completos. Na investigação, nós usamos esses laudos como mais uma prova do crime e se essa técnica for melho- rada, vai ajudar o nosso trabalho”, afirmou o delegado. Lopes disse ainda que a antiga técnica podia até atrapalhar as in- vestigações. “Já teve caso de todos os indícios apontarem para um suspeito que sempre negava o crime e o laudo dos peritos ser negativo. Ainda bem que podemos ouvir testemu- nhas e também outros tipos de tes- tes para anexar ao inquérito”, dis- se o delegado. ARQUIVO/AT SAIBA MAIS Como funciona a nova técnica > COLETA: primeiro é coletada uma amostra das mãos do suspeito de um crime com uma fita especial ou um cotonete. > SOLUÇÃO: a amostra é dissolvida em uma solução ácida e levada para uma máquina. > EVAPORAÇÃO: o recipiente com a amostra fica na máquina por até quatro minutos. Ela faz com que a solução ácida se evapore e o que so- bra são as substâncias que estavam nas mãos do acusado. > ANÁLISE: as substâncias são conta- bilizadas e analisadas por um com- putador. AS NOVIDADES QUE VÊM POR AÍ Convênio para mais pesquisas > MARCADOR DE MUNIÇÕES: o marca- dor vai ser uma substância química produzida em laboratório que vai ser colocada com a pólvora na criação da munição de uma arma de fogo. > NO LOCAL do crime ou nas mãos do acusado, esse marcador vai emitir uma cor quando for exposto por uma lâmpada que emite radiação ultra- violeta. > ANÁLISE DE DOCUMENTOS: com o desenvolvimento de uma nova técni- ca, será possível descobrir, apenas pela tinta existente no documento, se ele é falso ou não. > DROGAS: será desenvolvido um per- fil químico de drogas, principalmente a cocaína, que são apreendidas no Espírito Santo. > IDENTIFICAÇÃO: será ela- borado um teste para a identificação de drogas sintéticas. > PARCERIAS: a perícia cri- minal do Estado está pro- curando outras faculdades inte- ressadas em formar convênios para pesquisas na área forense. Os laudos técnicos emitidos pelos peritos não eram completos. Se essa técnica for melhorada, vai ajudar o nosso trabalho Delegado José Lopes, titular da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa POLÍCIA CIVIL PERITA Caline Destéfani

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Pol í c i a

VITÓRIA, ES, DOMINGO, 04 DE MAIO DE 2014 ATRIBUNA 27

PERÍCIA CRIMINAL

Novo teste para desvendar crimesTécnica consegueidentificar maissubstâncias deixadasnas mãos de criminososapós disparo de umaarma de fogo

FERNANDO RIBEIRO/AT

PESQUISADOR Zanata Brandão ajudou na criação de nova técnica: mais resíduos deixados por uma arma de fogo nas mãos dos criminosos são identificados

Mariana Spelta

A polícia capixaba vai podercontar com uma técnica fo-rense mais precisa para

identificar quem usou a arma defogo em um crime.

Em uma parceria entre a Supe-rintendência de Polícia Técnico-Científica do Estado com estudan-tes da pós-graduação de Químicada Universidade Federal do Espí-rito Santo (Ufes), foi criado um no-vo teste que identifica mais resí-duos deixados por uma arma defogo nas mãos dos criminosos.

“O tiro deixa resíduos químicosna mão de quem realiza o dispa-ro ”, explicou a perita criminal Ca-line Destéfani.

E a principal substância deixadapelo disparo de uma arma de fogoé o chumbo. Se na análise dasamostras coletadas nas mãos doacusado for encontrado o metal,isso significa que pode ter aconte-cido o disparo.

“O problema é que o chumbopode ser encontrado em váriosprodutos que são comuns no dia adia, como tintura de cabelo ou ba-teria de carro. Antes, não tinha co-mo afirmamos se o chumbo eraproveniente do disparo de uma ar-ma”, disse Caline.

Por isso, segundo a perita, haviaa necessidade da elaboração deuma técnica que fosse mais con-clusiva. E após dois anos de pes-quisas realizadas em conjuntocom os estudantes da Ufes, um no-vo método foi criado para a períciaf o re n s e.

O professor Wanderson Romão,que é orientador do projeto e espe-cialista em Química Forense, disseque depois que as amostras dos re-síduos são coletadas, elas são dis-solvidas em uma solução ácida e,em seguida, colocadas em umamáquina, que também é usada naanálise de solos e de petróleo.

A máquina faz o elemento ácidoevaporar e o que sobra são as subs-tâncias encontradas nas mãos doacusado. Se um disparo foi feito,serão encontradas três metais:chumbo, bário e antimônio.

Logo depois, um computadorfaz a contagem desses elementos eisso pode ajudar a identificarquantos tiros foram efetuados eainda qual a arma que foi usada.

“Essa técnica consegue identifi-car esses elementos mesmo se agente tiver uma quantidade muitopequena de amostra. Então, mes-mo se o criminoso lavar as mãos, épossível obter esses metais”, expli-cou o professor.

Agora, o desafio é adaptar a téc-nica ao dia a dia dos peritos. “A no-va metodologia vai nos dar maisinformações, o que ajuda na solu-ção dos crimes”, explicou a peritacriminal Caline Destéfani.

Técnica atual é incompletaO teste residuográfico – que

atualmente é realizado para des-cobrir se alguém fez uso de armade fogo em um crime – é feito deforma rápida, mas é incompleto.

A perita criminal da Polícia Civildo Estado Caline Destéfani expli-cou que, primeiramente, é coleta-da uma amostra de resíduos dasmãos do acusado com uma fita.Em seguida é colocada sobre essaamostra um reagente de rodizona-to de sódio. “Se no material apare-cer manchas de cor violeta, issoquer dizer que existe chumbo naa m o st ra ”, explicou a perita.

Ela afirmou ainda que o chumboé uma das substâncias que são ex-pelidas de uma arma de fogo de-pois que o tiro é efetuado.

Segundo Destéfani, como a pre-sença de chumbo não significa queo metal seja proveniente de umaarma, o teste era ineficiente.

“Precisamos dar a maior quanti-dade de informações possíveis. Porisso, buscamos a ajuda da Ufes paracriar uma nova técnica com umamáquina que nós já tínhamos aquino laboratório”, ressaltou.

A pesquisa, da qual o estudante

de Mestrado Zanata Brandão par-ticipa, ainda não acabou.

“Precisamos ver como essa téc-nica age em uma situação real,pois ela só foi realizada até agoraem condições criadas em labora-tório”, afirmou Caline.

O delegado José Lopes, chefe daDivisão de Homicídios e Proteçãoà Pessoa (DHPP), contou que a no-va técnica vai ajudar muito nas in-vestigações dos assassinatos.

“A gente tinha dificuldade poisos laudos técnicos emitidos pelosperitos não eram completos. Nainvestigação, nós usamos esseslaudos como mais uma prova docrime e se essa técnica for melho-rada, vai ajudar o nosso trabalho”,afirmou o delegado.

Lopes disse ainda que a antigatécnica podia até atrapalhar as in-ve st i g a ç õ e s.

“Já teve caso de todos os indíciosapontarem para um suspeito quesempre negava o crime e o laudodos peritos ser negativo. Aindabem que podemos ouvir testemu-nhas e também outros tipos de tes-tes para anexar ao inquérito”, dis-se o delegado.

A R Q U I VO / AT

SAIBA MAIS

Como funciona a nova técnica> COLETA: primeiro é coletada uma

amostra das mãos do suspeito de umcrime com uma fita especial ou umcotonete.

> SOLUÇÃO: a amostra é dissolvida emuma solução ácida e levada parauma máquina.

> EVAPORAÇÃO: o recipiente com a

amostra fica na máquina por atéquatro minutos. Ela faz com que asolução ácida se evapore e o que so-bra são as substâncias que estavamnas mãos do acusado.

> ANÁLISE: as substâncias são conta-bilizadas e analisadas por um com-p u ta d o r.

AS NOVIDADES QUE VÊM POR AÍ

Convênio para mais pesquisas> MARCADOR DE MUNIÇÕES: o marca -

dor vai ser uma substância químicaproduzida em laboratório que vai sercolocada com a pólvora na criaçãoda munição de uma arma de fogo.

> NO LOCAL do crime ou nas mãos doacusado, esse marcador vai emitiruma cor quando for exposto por umalâmpada que emite radiação ultra-v i o l e ta .

> ANÁLISE DE DOCUMENTOS: com odesenvolvimento de uma nova técni-ca, será possível descobrir, apenaspela tinta existente no documento,se ele é falso ou não.

> DROGAS: será desenvolvido um per-fil químico de drogas, principalmentea cocaína, que são apreendidas noEspírito Santo.

> IDENTIFICAÇÃO: será ela-borado um teste para aidentificação de drogassintéticas.

> PARCERIAS: a perícia cri-minal do Estado está pro-curando outras faculdades inte-ressadas em formar convênios parapesquisas na área forense.

“Os laudostécnicos emitidos

pelos peritos não eramcompletos. Se essatécnica for melhorada,vai ajudar o nossot ra b a l h o”Delegado José Lopes, titular da Divisãode Homicídios e Proteção à Pessoa

POLÍCIA CIVIL

PERITA Caline Destéfani