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Editado por Murillo de Aragão e Cristiano Noronha
nº 103
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Há uma nova relação entre os poderes, destaca Murillo de Aragão ................................................ 1
Thiago de Aragão comenta crise política ........................................................................................ 2
Lucas de Aragão fala da reforma política possível .......................................................................... 2
O PT convive mal com o ajuste....................................................................................................... 3
Autoengano ameaça o futuro do PT ............................................................................................... 4
Já passou da hora de o governo olhar para os negócios ................................................................ 6
O novo federalismo ........................................................................................................................ 7
O mais independente Congresso da história .................................................................................. 9
Congresso de Salvador: a culpa é das estrelas ............................................................................ 10
O Estado sequestrado .................................................................................................................. 12
Os desafios de Michel Temer ........................................................................................................ 14
O poder transformador do petrolão .............................................................................................. 15
Nova realidade institucional ......................................................................................................... 16
Há uma nova relação entre os poderes, destaca Murillo de Aragão GloboNews Painel
27/06/2015
A última edição do programa GloboNews Painel, apresentado pelo jornalista William Waack, desafiou o
cientista político Murillo de Aragão, o sociológo Bolívar Lamounier e o professor de Ciência Política da
USP, José Álvaro Moisés, a responderem se a crise e a Operação Lava Jato já trouxeram alguma
mudança para o Brasil.
Segundo Aragão, uma nova institucionalidade vigora no país. O Executivo perdeu hegemonia ao longo do
primeiro mandato de Dilma Rousseff e há uma nova relação entre os poderes nunca antes vista na
história do Brasil. "Essa nova realidade institucional causa e provoca perplexidade, tendo como pano de
fundo a crise econômica e a Operação Lava Jato, que é absolutamente desestabilizadora. Nunca nada
será igual como antes", observou o cientista político.
Para ele, a reserva de poder do governo diminuiu muito, a ponto de a Presidência não ter qualquer
controle sobre a agenda do Congresso. E deu como exemplo a tramitação e aprovação da PEC da
Bengala, que ampliou de 70 para 75 anos a idade para aposentadoria compulsória de ministros de
tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU).
Socialismo de contracheque - O enfraquecimento do governo coincide, disse o cientista político, com o
fracasso do projeto de esquerda, que produziu um "socialismo de contracheque", e com a fragilidade da
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oposição. "A nossa oposição é lenta, devagar, inconsistente. Ela tem que ter a grandeza de reconhecer
quando a medida do governo trafega na direção certa", comentou.
A respeito da Lava Jato, ele afirmou que a operação já repercute em diversos setores, com destaque
para o empresarial. "A relação do setor privado com o governo muda de patamar. Os instrumentos
tradicionais desse relacionamento não vigoram mais", disse Aragão.
Thiago de Aragão comenta crise política
O diretor da Arko Advice, Thiago Aragão, analisou a situação interna do Brasil e a viagem da presidente
Dilma Rousseff aos Estados Unidos para o site International Business Times (ibetimes.co.uk). “No
encontro com o presidente Obama, Dilma tentará incrementar as relações entre os dois países e entre as
empresas para assim voltar para o Brasil com boas notícias”, afirmou o sociólogo antes da vista. “Seria
muito importante para a presidente que está com um nível de aprovação muito baixo”.
Thiago de Aragão explicou que uma recente pesquisa mostrou que apenas 9% dos eleitores acreditam
que a presidente Dilma está fazendo um bom trabalho. A avaliação é inferior à do ex-presidente Fernando
Collor que tinha 11% de aprovação, mas foi cassado em 1992.
Thiago também falou sobre a Operação Lava Jato comentando recentes prisões determinadas pela
Justiça. “Está em uma fase muito importante. Muitos empresários, incluindo um dos maiores empreiteiros
do Brasil, foram presos esta semana, mostrando que a investigação está caminhando”, afirmou Thiago ao
ibetimes.co.uk. Ele explicou que as investigações revelam irregularidades na relação entre parte da
comunidade empresarial e o Partido dos Trabalhadores (PT) cujo obtivo é a obtenção de recursos para
financiamento de campanha.
Lucas de Aragão fala da reforma política possível
O diretor da Arko Advice, Lucas de Aragão, disse ao programa “Bom Dia Amazônia”, da Rede Globo, que
mesmo sem ser ideal, a reforma política votada pela Câmara dos Deputados, em primeiro turno,
significou certo avanço político, pois abordou temas relevantes do atual debate político.
“Mesmo que a maioria dos partidos continue tendo acesso ao fundo partidário, a aprovação desta medida
coloca um obstáculo a mais para aqueles que veem na criação de uma legenda a oportunidade de usar a
política como balcão de negócios”, disse Lucas.
A entrevista abordou os principais pontos da reforma, na Câmara dos Deputados, capitaneada pelo
presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Lucas explicou os diferentes passos na tramitação das
propostas e comentou o posicionamento do Senado referente à reforma.
Lucas de Aragão também falou sobre as consequências práticas da reforma para o sistema político. Na
opinião do cientista político, uma das boas medidas aprovadas no primeiro turno foi a cláusula de
desempenho.
“A reforma está longe de ser a ideal. Muito barulho foi feito, mas grandes temas foram deixados de lado
ou debatidos de maneira superficial, como o financiamento de campanha”, finalizou.
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ARTIGOS DE MURILLO DE ARAGÃO
O PT convive mal com o ajuste O Tempo – 27/05/15
Nas últimas semanas, aumentou a contestação ao governo Dilma Rousseff por parte de lideranças do
PT, o que deve acirrar os debates no quinto congresso da legenda, a ser realizado entre os dias 11 e 13
de junho, em Salvador (BA). Considerado nome preferencial do partido na disputa presidencial de 2018,
Lula criou um “conselhão”, integrado por Alexandre Padilha, Antonio Palocci e Fernando Haddad, entre
outros, para debater temas da agenda política.
Integrante da Mensagem do Partido, corrente de oposição à Construindo um Novo Brasil (CNB), o ex-
governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro mudou-se para o Rio. Ele critica o ajuste fiscal e defende
a formação de uma “nova frente de esquerda” visando às próximas eleições.
O plano de Tarso é afastar o PT dos peemedebistas do Rio de Janeiro, Estado em que o aliado tem
criado mais problemas ao governo no Congresso. Mesmo que não tenha força para inviabilizar a
dobradinha das duas legendas em 2016, o ex-governador conseguiu dar amplitude nacional à bandeira
de contestação ao partido do governador Pezão e do prefeito Eduardo Paes.
A escolha do momento atual, feita pelo PT, para brincar de “jogo da verdade”, é ruim para o Palácio do
Planalto. O prazo de vigência das MPs do ajuste fiscal termina no fim da semana, a rusga entre o ministro
Levy e o grupo mais próximo da presidente abala a credibilidade de todos, dificultando, além de sua
natureza já espinhosa, a tarefa de arrebanhar apoio político para a receita amarga do ajuste. E não é
tudo.
Após a votação das MPs 664/2014, 665/2014 e 668/2015, todas do ajuste fiscal, outras medidas
provisórias entrarão em cena e manterão o clima de batalha e de intensa negociação no Congresso. Na
apreciação da MP 670/2015, que ajusta a tabela do Imposto de Renda de forma escalonada, deputados
do PT tentarão aprovar emenda que tributa o lucro das empresas.
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Também há emendas que podem aumentar os gastos públicos. Algumas tentam garantir o reajuste anual
da tabela do IR. Outras, impedir que os repasses do Fundo de Participação de Estados e Municípios
sofram reduções.
O senador Paulo Paim (PT-RS), por exemplo, apresentou emenda estendendo a todos os aposentados
do INSS a atual regra de reajuste do salário mínimo até 2019 (inflação, mais a variação do PIB de dois
anos antes), prorrogada pela MP 672/2015. Para não perderem validade, a MP 670 precisa ser votada
até o dia 8 de julho, e a 672, até o dia 17 de julho. É difícil imaginar como o governo fará isso sem contar
com a adesão integral do PT a seus objetivos.
No congresso do partido, temas como a aliança com o PMDB e o ajuste fiscal prometem acirrar o debate
interno. Uma pequena demonstração disso pode ser observada nas votações das MPs do ajuste na
Câmara, durante as quais importantes lideranças petistas têm criticado o pacote, chegando inclusive a
divulgar um manifesto cobrando mudanças na política econômica.
Na pauta da reunião em Salvador, a discussão de novas formas de eleição de sua direção dará a Tarso a
oportunidade de angariar apoios à tentativa de contestar o domínio exercido pela CNB. O PT ensaia um
“afastamento” de Dilma, da mesma forma que Lula já faz pensando em 2018. Para amenizar a crise com
o desgaste de sua imagem, a legenda poderá operar mais como partido e menos como governo,
principalmente se a CNB for derrotada no debate interno. O que colheu até aqui, no entanto, não encoraja
expectativas positivas.
Autoengano ameaça o futuro do PT Blog do Noblat – 28/05/2015
Nas últimas semanas, aumentou a contestação ao governo Dilma Rousseff por parte de lideranças do
PT, o que deve acirrar os debates no quinto congresso da legenda, a ser realizado entre 11 e 13 de
junho, em Salvador (BA).
Considerado nome preferencial do partido na disputa presidencial de 2018, Lula criou um “Conselhão”,
integrado por Alexandre Padilha, Antonio Palocci e Fernando Haddad, entre outros, para debater temas
da agenda política.
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Integrante da Mensagem do Partido, corrente de oposição a Construindo um Novo Brasil (CNB), o ex-
governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro mudou-se para o Rio. Ele critica o ajuste fiscal e defende
a formação de uma “nova frente de esquerda” visando às próximas eleições.
O plano de Tarso é afastar o PT dos peemedebistas do Rio de Janeiro, estado em que o aliado tem
criado mais problemas ao governo no Congresso. Mesmo que não tenha força para inviabilizar a
dobradinha dos dois partidos em 2016, o ex-governador conseguiu dar amplitude nacional à bandeira de
contestação ao partido do governador Pezão e do prefeito Eduardo Paes.
No congresso do PT, temas como a aliança com o PMDB e o ajuste fiscal prometem acirrar o debate
interno. Um exemplo disso tem sido observado nas votações das MPs do ajuste, durante as quais
importantes lideranças petistas têm criticado o pacote, chegando inclusive a divulgar um manifesto
cobrando mudanças na política econômica.
Na pauta da reunião em Salvador, a discussão de novas formas de eleição de sua direção dará a Tarso a
oportunidade de angariar apoios à tentativa de contestar o domínio exercido pela CNB. Não deve dar
certo. Mas o partido deverá sair dividido.
O movimento de Tarso Genro e a rebeldia de senadores do partido, como Paulo Paim e Lindberg Farias,
colocam a possibilidade de um racha no partido no horizonte. Marta Suplicy já saiu. Outros podem seguir
o mesmo rumo.
O sucesso do PT existiu quando ele conseguiu liderar uma ampla coalizão de centro-esquerda e centro-
direita em favor da governabilidade. Foi a fórmula do sucesso que é rejeitada agora em favor de uma
tática de confronto. A tolerância de agregar postos e a habilidade de construir consensos foi o grande
trunfo do passado.
Agora, em meio aos dilemas da governabilidade, setores do partido atacam moinhos de vento e apontam
conspirações imaginárias. Não fazem a devida crítica dos erros cometidos. Ao comprar briga com a
“direita”, o partido fica mais isolado e afastado da parcela do eleitorado que votou com o PT nas últimas
eleições, mas não é identificada como “petista de carteirinha”.
O certo em meio ao mar de dilemas é o fato de que o partido vive um longo inferno astral que não tem
fim. Outra certeza é a de que as respostas aos desafios do momento dividem mais do que agregam e
quase nunca convencem além dos arraiais partidários. O partido vive um grave processo de auto-engano.
Mais do que nunca o PT precisa da união de seus membros em torno do governo. Não é o que parece
que vai acontecer. Precisaria também ter elevadas doses de autocrítica. Tampouco parece que irá
acontecer. Dois graves equívocos que podem ameaçar o futuro do partido.
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Já passou da hora de o governo olhar para os negócios 03/06/15 – O Tempo
Não há limites para a criatividade, assim como não há limites para a mediocridade. Recentemente, a
presidente Dilma Rousseff afirmou que o governo esgotou seu arsenal de iniciativas para combater a
crise econômica. O país teria chegado ao limite de sua “capacidade contracíclica”, que seria a habilidade
de o governo atuar para evitar os efeitos de uma recessão.
A afirmação de Dilma se deu em um evento do aliado PCdoB, um ambiente em que ela tinha de justificar
as medidas de austeridade tomadas por sua atual equipe econômica. Evidentemente, a plateia não
gostou. O PCdoB, por ideologia e por interesse, gostaria de ver uma Dilma 2 protagonista,
intervencionista e fiscalmente generosa. Não é o que vai acontecer.
Como sempre se disse no Brasil, o espírito animal do empreendedor não foi suficientemente estimulado.
Por quê? Porque não foram adotadas medidas que estimulem o investimento privado. O governo sempre
se achou o grande motor do investimento. É óbvio que, em um país como o nosso, onde o Estado é mais
poderoso que a sociedade, o investimento estatal é essencial. Mas não é suficiente.
Existem alguns obstáculos básicos, como a dificuldade para investir e os privilégios de poucos. Os
normais, sem os privilégios, não vivem em um ambiente propício ao investimento. Os que se aventuram
sem a proteção das benesses sofrem. Muitos quebram. Desistem.
O Brasil ainda é um país sem crédito para o empreendedorismo, apesar do extraordinário avanço obtido
nos últimos tempos. Porém, poucos têm muito crédito. A maioria investe sem apoio e sem crédito. Para
piorar, temos dois graves problemas que trabalham contra o progresso humano, social e econômico: a
legislação tributária e a legislação trabalhista. Ambas matam o trabalho quando pensam que protegem o
emprego.
Para mudar esse ambiente e praticar políticas contracíclicas, o governo Dilma precisa mostrar mais
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coragem, além de ter de fazer esforço fiscal. As regras de concessões e parcerias público-privadas
devem ser amplamente favoráveis aos investidores. As agências reguladoras devem voltar a ser
verdadeiramente reguladoras, controladas por técnicos e longe da influência política.
As regras para investimento e abertura de empresas no país, longamente trabalhadas e não colocadas
em prática, devem vigorar imediatamente. A burocracia deve acabar. As licenças ambientais devem ser
concedidas ou negadas rapidamente. Não podemos permitir o uso do campo burocrático para as disputas
políticas.
A carga tributária deveria cair. Porém, ninguém pode se iludir com uma redução imediata. E seria muito
bem-vinda uma dramática simplificação da administração do pagamento de tributos. O sistema tributário
brasileiro é um dos mais caros e complexos do mundo: são mais de 80 tributos, com milhares de normas.
São consumidas centenas de horas de trabalho para uma empresa manter seus impostos em dia. O
custo da legalidade de se pagarem impostos deve ser reduzido drasticamente.
Enfim, já passou da hora de o governo olhar para o ambiente de negócios no Brasil. Somos
vergonhosamente o 120º país no ranking de ambiente de negócios e investimento no mundo. O ranking é
elaborado anualmente pelo Banco Mundial. Os dados são do ano passado. O governo deveria se impor
como meta ganhar posições no ranking. Seria um desafio à criatividade e, ao mesmo tempo, daria um
basta na mediocridade.
O novo federalismo Blog do Noblat – 04/06/2015
O problema federalista no país é complexo e antigo. Nossa federação, como poucas no mundo, é trina,
pois é composta de União, estados e municípios. Tal fato não teria maiores repercussões ou distorções
se a hierarquia de competências e repartição de receitas fosse rigorosamente estabelecida e cumprida.
Não é o caso. A União, como já disse, segura a maior parte das receitas e intervém diretamente em
municípios com verbas discricionárias. Responsabilidades são empurradas de lado a lado e quem sofre é
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o cidadão, com um Estado caro e ineficiente.
No federalismo ideal, vigoram os princípios de autonomia dos governos estaduais e municipais. Existe um
compartilhamento da legitimidade e do processo decisório entre os entes federativos. O objetivo é
compatibilizar o princípio de autonomia com o de interdependência entre as partes, resultando numa
divisão de funções e poderes entre os níveis de governo.
Nosso federalismo se inspirou no norte-americano. Porém, a raiz centralista do Império nunca deixou de
influenciar o modelo tupiniquim. A Primeira República buscou construir um modelo federal com autonomia
estadual e em benefício das oligarquias estaduais, à custa do enfraquecimento das municipalidades, das
práticas republicanas e do governo federal. Não funcionou.
Já na era Vargas, vivemos mais um surto centralista, com o Poder Executivo expandindo competências e
atuações por meio de políticas nacionais em várias áreas, inclusive na educação. Particularmente no
Estado Novo. No período democrático que vai de 1946 a 1964, ocorreram mudanças em favor da maior
democratização e federalização do país. O projeto foi interrompido pelo golpe militar de 1964, que adotou
novamente um modelo centralizador e tecnocrático de Estado.
Com a abertura e a redemocratização, o clientelismo e o fisiologismo nas práticas políticas apenas
reforçaram a centralização. A situação ficou pior com o robustecimento do sistema tributário a partir de
1994, quando a carga tributária começou a subir vertiginosamente. O aumento das contribuições
cobradas pela União e que não são repartidas com estados e municípios também reforçou o caixa do
governo central para que pudesse implementar seus programas sem a devida preocupação com o
sistema federal.
Neste momento, sob pressão de prefeitos e governadores, a Câmara dos Deputados debate um novo
pacto federativo. O Senado também anunciou a constituição de uma comissão com esse fim. Noto que a
mobilização dos prefeitos é mais intensa e mais organizada. Já os governadores estão ficando para trás
no debate. Eles não têm agenda comum nem uma posição sobre temas críticos, como as dívidas com a
União e a guerra fiscal, e não conseguem articular suas bancadas no Congresso.
Preocupa-me também a ênfase excessiva dada pelos políticos à repartição de receitas e à distribuição de
encargos. A pauta municipalista dá especial destaque à questão das receitas, nada mais natural em um
regime de centralização tributária como o que vivemos. O debate, porém, não deve ficar por aí.
O federalismo de que necessitamos deve ir além. Deve restabelecer a hierarquia entre os três entes
federados. Buscar solução para guerras fiscais, simplificar a carga tributária. Promover tratamento
adequado para regiões metropolitanas. Ter padrões nacionais para políticas de educação, saúde e
segurança pública. Bem como reforçar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei de
Acesso à Informação, entre outros desafios.
Evidente que em um momento de aperto fiscal, a discussão parece inoportuna. Mas não é. É imperioso
aprofundar a discussão sobre o novo pacto federativo.
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O mais independente Congresso da história O Tempo - 10/06/2015
Circula em Brasília informação que atribui ao ex-presidente Lula um conselho irônico dado ao presidente
da Câmara: Eduardo Cunha (PMDB) deveria erigir um busto em homenagem à presidente Dilma
Rousseff. Expressaria justa gratidão pelo modo como o governo tratou os parlamentares, no primeiro
mandato da presidente, que resultou no estímulo ao crescimento da liderança de Cunha no Congresso e
tudo o que ele representa hoje em matéria de poder político.
O fenômeno foi ampliado com os atropelos da campanha eleitoral e a completa e desastrada
coordenação política no início do Dilma 2. Além de reforçar o sentimento autonomista da Câmara, a nova
realidade gerou uma longa sequência de derrotas concretas para o Poder Executivo.
Para fechar a explicação, criou-se dentro do Congresso uma ojeriza ao PT que mistura mágoa da
campanha eleitoral com rejeição à arrogância no trato com aliados. Tais sentimentos estimulam
sistemáticas ações de autonomia e repulsa às políticas governamentais, gerando um processo de
retaliação que paralisa o Executivo. A situação só não é pior para o governo por causa do apoio
condicionado do PMDB ao Planalto. O PT no Congresso é uma força isolada que navega ao sabor dos
acontecimentos.
A partir da combinação dos vetores mencionados, o Congresso resolveu usar as emendas
constitucionais, que não dependem de veto presidencial, para emparedar o Poder Executivo. Foram
aprovadas duas que desagradaram bastante ao governo e reduziram de modo concreto o poder da
presidente: a PEC do Orçamento Impositivo para emendas parlamentares e a PEC da Bengala, sobre o
adiamento da aposentadoria compulsória de juízes de tribunais superiores.
Outras estão a caminho tratando sobre os mais variados temas. O Congresso discute seriamente como
influir na nomeação dos presidentes das estatais. Avança com a questão da terceirização e quer reduzir,
via emenda constitucional, o número de ministérios. Há propostas também com o objetivo de alterar o
pacto federativo de forma a socorrer a crise financeira de Estados e municípios. É uma nova etapa
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política que se caracteriza como semiparlamentarista, na qual o Executivo cedeu a iniciativa da
elaboração da agenda legislativa ao Congresso, fato inédito na recente experiência da redemocratização.
Como bem disse o jornalista José Casado, em artigo publicado em “O Globo”, na semana passada,
parece paradoxal que o Congresso, que está seriamente ameaçado pelas investigações do petrolão,
resolva peitar o Poder Executivo e dar tamanha demonstração de força, nunca vista desde a
redemocratização do país.
Tal fenômeno decorre da profunda inabilidade política ao longo do governo Dilma 1, época em que o
Congresso foi seguidamente desprezado pelo governo. Nunca houve, no Dilma 1, real vontade de fazer a
pequena política nem qualquer cuidado em checar se os caciques partidários estavam entregando o
prometido à base. O desprezo e a desatenção fomentaram, entre os parlamentares, um sentimento de
rebelião muito bem capitalizado por Eduardo Cunha.
No Senado, o sentimento era o mesmo, mas em menor proporção. Todas as lideranças do PMDB, que
controla a casa, foram atingidas por algum tipo de agravo vindo do Palácio do Planalto. A devolução, pelo
senador Renan Calheiros, de uma medida provisória que tratava das desonerações foi a abertura da
caixa de ferramentas. Outras virão e farão do Legislativo de hoje o mais independente em relação ao
governo da história política do país.
Congresso de Salvador: a culpa é das estrelas Blog do Noblat – 11/06/2015
A Carta de Salvador, documento da tendência CNB do PT, é, no mínimo, interessante. Não há limites
para se falar no máximo. Começa com a lenga-lenga de sempre de colocar a crise na conta da explosão
de Wall Street em 2008. Em decorrência dessa crise, os países hegemônicos estariam agravando o
conflito que opõe o imperialismo aos interesses dos trabalhadores. É uma forma elegante de dizer que a
culpa não é nossa. A culpa é das estrelas. De passagem, a Carta dá um tapa no “repertório neoliberal
rebatizado de austeridade fiscal”.
Prosseguindo, a CNB nos coloca ao lado de China, Rússia, Grécia, Argentina e Venezuela como
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“principais frentes de resistência a essa estratégia” dita “neoliberal”. Evidente que é uma “viagem na
maionese” estragada. Rússia e China não têm agenda de resistência comum com o Brasil. Nem a
Venezuela. Tanto Rússia quanto China acham que somos uns tontos. Uns completamente tontos, como a
Argentina e a Venezuela; outros, um pouco menos: nós.
Na sequência, a Carta de Salvador exalta o Mercosul, a Unasul e a Celac. Obviamente, não faz nenhuma
menção ao fato inconteste de que o Mercosul está paralisado e que faltam iniciativas concretas para
vitalizá-lo. O comércio entre o Brasil e a Argentina, por exemplo, caiu 31% no último ano. À parte o
discurso internacionalista de que somos latino-americanos e que unidos venceremos, não há qualquer
nota sobre questões graves que ocorrem na região. Em especial, na Venezuela.
Outro primor de autoengano é a acusação de que os Estados Unidos “valem-se da crise para
desencadear uma ofensiva contra as experiências latino-americanas, estimulando movimentos para a sua
derrocada e pressionando pela substituição do modelo, com o objetivo de, pelo acesso fácil aos
mercados e às riquezas naturais da região, acumular e concentrar mais capital”. Que pena, mas os
Estados Unidos não estão tão interessados na região a ponto de promoverem uma ofensiva comercial. Já
fizeram o que queriam: cooptar Cuba. Em breve, farão o mesmo com a Nicarágua.
A ofensiva vivida na América do Sul não é norte-americana. A invasão é chinesa, amparada na
abundante oferta de crédito. Na Argentina, o dinheiro está acompanhado da exigência de contratar
chineses. No Brasil, não chegamos a tanto. Enfim, nenhum pio sobre o “imperialismo” chinês na região.
Pulando para uma área mais favorecida, a Carta exalta os resultados sociais e econômicos “fortemente
positivos”. É verdade. Não há como negar que diversos indicadores sociais e econômicos tiveram
excepcional desempenho. No entanto, não se reconhece que o pragmatismo fiscal e econômico de Lula e
de Palocci foi o grande alicerce do sucesso econômico e social dos governos Lula. Nem que a política de
Palocci foi fortemente contestada por próceres do partido. Certamente alguém se lembra da conversa
mole do Plano B de 2004?
Dentro da litania do autoengano, há um abuso na reafirmação de que a culpa está lá fora. “É inegável,
porém, que a alteração do cenário internacional estabeleceu limites e impasses para o aprofundamento
desse modelo.” Não se reconhece que o governo passado abalou a credibilidade fiscal e econômica a
partir de gastos descontrolados e mágicas contábeis. E que agora, de forma penosa, o governo Dilma 2
empreende um retorno ao pragmatismo dos tempos de Lula.
No passado, Lula engabelou o PT e se deu bem. O PT se deixou docemente engabelar por conta do
sucesso. Quando a maré não ficou mais favorável, salve-se quem puder! Lula teve de acionar o extintor
de incêndio para não carbonizarem o ministro Joaquim Levy em Salvador.
Por fim, dentro do conjunto de propostas, a Carta de Salvador ainda propõe “a reinvenção do mercado,
tendo em vista o poder dos grandes grupos econômicos sobre o Estado”. Por favor, parem as máquinas!
Descobriram a pólvora.
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O Estado sequestrado 20/06/15 – O Estado de S.Paulo
Há muito o Estado brasileiro está sequestrado. Antes, pelo regime militar. Agora, depois da
redemocratização, a cidadania perdeu o controle para os políticos, a burocracia e o aparelhamento de
cargos por apadrinhados políticos e sindicais. Cada um dos sequestradores opera de acordo com uma
lógica própria. Muitos políticos usam o Estado para se reeleger e se perpetuar no controle; outros, para
fazer negócios. Alguns, para ambos.
A prova está na sucessão de escândalos que envolvem políticos, partidos, estatais e obras públicas. A
burocracia sequestrou o Estado para ter acesso a ganhos econômicos na forma de salários e outros
benefícios. Os que aparelham o Estado estão lá para gerar negócios e poder político para seus
apadrinhados.
Em meio a um mar de lama e prejuízos bilionários, a Petrobrás nos dá uma prova da prevalência dos
interesses menores. Ela deixará de pagar dividendos a seus acionistas, mas pagará mais de R$ 1 bilhão
a seus funcionários a título de resultados, mesmo não tendo havido lucro.
Outra prova do sequestro está no fato de que mais da metade dos partidos políticos registrados no País
vive só dos cofres públicos. Não arrecadam um centavo sequer de seus militantes. Outros tantos,
inclusive com representantes no Congresso, tiveram 99% de suas despesas bancadas pelo Fundo
Partidário. Dos 32 partidos registrados, 17 tiveram mais de 90% de suas despesas pagas pelo fundo.
Pequenos partidos, grandes negócios.
Nenhum dos sequestradores opera com vista ao interesse da cidadania, apesar do discurso recheado de
palavras e intenções em favor do bem comum. Quase sempre operam em torno das próprias agendas. É
um bom acaso quando tais interesses coincidem com os da cidadania. Mas nem sempre isso acontece.
Em alguns lugares, quase nunca. Por exemplo, em 2014 o Brasil ocupava o vergonhoso 112.º lugar, entre
200 nações, em termos de saneamento! No mesmo ano, 45% dos municípios do País despejavam
resíduos sólidos em aterros não tratados. Sujeira na política e sujeira no meio ambiente estão mais que
relacionadas.
O mensalão e o petrolão são mais uma prova de como o esquema escravizou os cofres públicos para
financiar políticos e partidos. Ambos são esquemas que macularam o sistema político e fragilizaram o
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processo eleitoral de forma a favorecer alguns em detrimento da maioria. O abuso de poder econômico
no sistema eleitoral serviu para renovar periodicamente o sequestro da sociedade. Muitos dos
sequestradores consideram-se líderes de um povo que não sabe o que quer. Arvoram-se em condutores
de planos que não levam a lugar nenhum. E que encobrem o desejo de manter o Estado sequestrado,
longe da sociedade. Divorciado da cidadania. Querem manter um Estado patrocinador que decide tudo
sob o manto da opacidade.
A cidadania muitas vezes é tratada como gado, merecedora somente de migalhas de um governo
“gastão”, caro e ineficiente. Temos carga tributária europeia e serviços precários, com frequência
inexistentes. Estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário nos coloca como o pior país do
mundo na relação carga tributária-PIB-Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Somos a 7.ª economia
do planeta e estamos em 85.º no IDH. Somos, vergonhosamente, o 120.º melhor ambiente de negócios
no planeta!
Saneamento e ambiente de negócios não interessam ao mundo político. A diferença brutal entre os
rankings se dá pelo sequestro do Estado à sociedade. Esta é indesejada e indesejável quando se
expressa politicamente de forma aguda. Só é bem-vinda na época das eleições, para referendar o
sequestro e manter tudo como antes. As agendas operam em torno de um vetor: a manutenção do poder
a qualquer preço.
A dinâmica do sequestro do Estado é ditada pelo calendário eleitoral. A cada dois anos temos eleições.
Assim, o que importa é atender à agenda eleitoral. Por isso as obras são entregues às portas das
eleições. Por isso os gastos com publicidade aumentam. Trata-se do império do curto prazo e do imediato
atendimento do óbvio ululante para se manter no jogo. Enquanto isso, jogamos o nosso futuro para as
calendas.
Planos de longo prazo são engavetados. A Baía de Guanabara, por exemplo, está sendo despoluída há
décadas e isso não termina nunca. Nem a ocorrência da Olimpíada no Rio de Janeiro foi capaz de
resolver esse vexame. A Ferrovia Norte-Sul começou em 1988 e ainda não foi concluída. A ligação
expressa entre o Aeroporto de Confins e o centro de Belo Horizonte demorou 25 anos para ser concluída!
Os Rios Pinheiro e Tietê, na capital paulista, eram poluídos 50 anos atrás e continuam assim.
Continuarão assim por mais um par de décadas? Provavelmente, sim.
O futuro não importa para os sequestradores, desde que a cidadania continue aprisionada e financiando
a sua perpetuação no poder, com altos impostos, baixas cobranças e bovinamente pacífica ante a
corrupção e a incompetência. Um Estado operando com elevados graus de opacidade, como indica a
sucessão de escândalos, mostra que nossos impostos financiam nossa escravidão.
O Brasil é um país de imenso potencial. Com sua agricultura, por exemplo, alimenta mais de 800 milhões
de habitantes no planeta. Mas poderia ser muito melhor. O trabalho e o empreendedorismo no País são
punidos. Nossa infraestrutura e a logística de escoamento das safras são precárias. Os sequestradores
não querem o setor privado forte, mas a iniciativa privada cooptada por benesses.
Continuaremos sequestrados como cidadãos em nosso país? Submetidos a uma agenda de interesses
que nem sempre é o interesse da sociedade? Sim. Por um bom tempo. Avançamos nos últimos 30 anos,
estamos construindo uma sociedade multipolar em termos de exercício de poder, mas muito ainda tem de
ser feito. A luta da cidadania para construir um Estado democrático está só começando.
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Os desafios de Michel Temer Blog do Noblat – 18/06/2015
Desde que assumiu a coordenação política do governo, há dois meses, o vice-presidente Michel Temer
passou a atender uma agenda múltipla. Para cumpri-la, enfrenta pressões sistemáticas e tenta escapar
do fogo amigo alimentado pelo próprio Palácio,de onde despacha. É o número 2 de uma presidente
chamada Dilma Rousseff. A um vice tradicional, da escola de Marco Maciel, aconselha-se submersão
total. Porém, com Dilma é diferente, o que o obriga a atender demandas de uma intensa e vasta agenda
de contatos.
Nos últimos quatro anos, com o isolamento do Palácio, a Vice-Presidência tornou-se um desaguadouro
de mágoas. Uma espécie de Muro das Lamentações do Planalto Central. A antessala de Temer está
sempre cheia de políticos, empresários, representantes de entidades públicas suplicando atenção,
conversa, favores. Parece um comitê eleitoral.
Paralelamente à sua atuação como filtro político, Temer desempenha, há 14 anos, o papel de presidente
do PMDB. Mesmo licenciado, comanda um grêmio muito particular, que funciona como uma assembleia
geral de caciques hoje excitados com a sensação de poder em uma temporada turbulenta. Tanto por
causa do atritoso relacionamento com o governo quanto pela fragmentação gerada pelo estilo
personalista de Renan Calheiros e de Eduardo Cunha, presidentes, respectivamente, do Senado e da
Câmara. Não é fácil comandar o PMDB em tempos de paz. Em tempos de guerra é muito pior.
As missões anteriores equivalem a tempo livre dedicado ao lazer, diante da trabalhosa tarefa de
coordenador político do governo, a qual Temer exerce de forma compartilhada com dois ou três
abnegados. Um deles é o “biministro” Eliseu Padilha, que administra duas secretarias com funções
díspares: Aviação Civil, no terreno concreto da infraestrutura, e Assuntos Institucionais, no espaço
ambíguo da política que o ex-governador de Minas Magalhães Pinto comparava a uma nuvem. “Uma
hora, você olha e está de um jeito. Você olha de novo e está de outro”, dizia.
A partir do momento em que Temer assumiu a coordenação política, o desempenho do Executivo no
Congresso melhorou de forma substancial. Na Câmara, em março, o apoio ao governo foi de 38,34%.
Nos dois meses em que o vice já estava no comando, esse índice reagiu: passou para 40,11% em abril e
encerrou maio em 51,75%. No relacionamento com o PT, Temer atua “vestido com as roupas e as armas
de Jorge” (o santo da Capadócia, a quem se deve rezar), na música Jorge Ben: “Para que meus inimigos
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tenham pés, não me alcancem,/ Para que meus inimigos tenham mãos, não me peguem”.
Nesse front, o vice duela com inimigos e amigos, sendo que no PT os amigos são mais difíceis do que os
inimigos, reclamam seus parceiros. O perigo mora ao lado. Como diria um velho político, o pior tipo de
ciúme é aquele que homem sente de homem, fato corriqueiro na política.
Proteger o ministro Joaquim Levy é outra incumbência dada a Michel Temer pela presidente. Isso inclui
blindá-lo contra as escaramuças do Congresso durante os debates e as votações do ajuste fiscal e os
ataques dos aliados da base política. Em especial, do gosto de sangue que o PT traz na boca. Levy e
Temer se entendem bem, o que torna o ajuste minimamente viável no Congresso. Com um repertório de
desafios tão complexos, o quadro só não é pior porque tanto Lula quanto Dilma sabem que o sucesso de
ambos depende do sucesso de Temer. E de Levy.
O poder transformador do petrolão O Tempo – 24/06/2015
Uma das mais importantes transformações políticas do país está ocorrendo a partir da Justiça Federal em
Curitiba. A ponto de alguns, com uma ponta de ironia, apelidarem o juiz Sérgio Moro de a “Suprema Corte
de Curitiba”. A prisão dos presidentes das maiores construtoras do país, Norberto Odebrecht, Marcelo
Odebrecht, e Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, reforça essa perspectiva. Tanto em razão da relevância
da investigação a respeito das relações entre o mundo privado e o governo quanto em virtude do alcance
político da iniciativa do Poder Judiciário.
Os eventos da sexta-feira passada acrescentaram uma forte tensão ao mundo político, em Brasília, uma
vez que o início dos depoimentos dos 12 presos da 14ª fase da operação Lava Jato estava previsto para
a segunda-feira. As buscas realizadas em São Paulo no dia 19 entraram pela noite. Somente no sábado
a equipe da Polícia Federal retornou a Curitiba com o material recolhido. O executivo da Odebrecht
Alexandrino Alencar está entre os quatro presos temporários que serão ouvidos primeiro pela Justiça.
A situação jurídica e política posta pela operação Lava Jato coloca imensa pressão também sobre o
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Supremo Tribunal Federal. Em especial, para o ministro Luiz Edson Fachin, que recentemente tomou
posse na Corte. Sua chegada completa o quórum. Mas, além disso, abre condições para que o
julgamento daqueles que têm foro especial seja acelerado.
Para Sergio Lazzarini, autor de um dos mais importantes livros (“Capitalismo de Laços”, editora Elsever)
para entender o funcionamento das relações entre o mundo privado e o governo, “o rigor das punições
aos empreiteiros presos na operação Lava Jato determinará se o Brasil passará por um momento de
‘transformação’, em que o clientelismo público-privado oferecerá riscos a ponto de impedir novos
escândalos de corrupção como no caso da Petrobras”.
As transformações causadas pela operação Lava Jato já estão em curso e irão mudar, de forma
indelével, as relações entre o setor privado e o governo. Nada será como antes, já que o custo-benefício
de ações que ocorreriam ao arrepio da lei é muito grande.
Porém, fica uma ponderada advertência feita pelo vice-presidente da República, Michel Temer. As
empresas devem pagar por seus erros, mas precisam ser poupadas e sobreviver. Não podem
desaparecer. São importantes demais para a cadeia produtiva do país e para o desenvolvimento do
capitalismo brasileiro. Foi assim nos Estados Unidos e na Europa em outros escândalos de corrupção.
Na sexta-feira, 26, o Conselho de Administração da Petrobras se reúne para discutir o Plano de Negócios
2015-2019. Não há garantia de aprovação nesse encontro, conforme já antecipado pelo diretor de Gás e
Energia da empresa, Hugo Repsold.
O plano anterior previa investimentos de R$ 208 bilhões. Estima-se uma redução entre 20% e 30% desse
valor. Também é esperado que a empresa anuncie uma redução da meta de produção de petróleo para
cerca de 3 milhões de barris diários em 2020.
A Petrobras representa mais de 10% da formação bruta de capital no Brasil. No primeiro trimestre do ano,
os investimentos caíram 1,3% na comparação com o trimestre anterior. Foi o sétimo recuo consecutivo.
Portanto, o governo vê como fundamental o Plano de Negócios para estimular a economia. Mais: é uma
sinalização para a sociedade de que, apesar dos escândalos de corrupção, os investimentos da empresa
continuam robustos.
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Nova realidade institucional
O Globo – 29/06/2015
O ponto de inflexão foi o mensalão, que colocou o Executivo sob escrutínios nunca vistos. As eventuais
tentativas de domesticar o julgamento foram por água abaixo
O Brasil em 2015 é, definitivamente, um novo país em termos institucionais. As relações entre os poderes
mudaram radicalmente. O elemento detonador desse processo foi a insistência do Poder Executivo em
manter-se, no mandato passado, em uma posição de distanciamento e até alheamento frente aos demais
poderes.
A relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso foi dura e pontuada de momentos de crise e
insatisfação, que resultaram na retomada do processo de votação dos vetos presidenciais, na aprovação
do Orçamento Impositivo, na devolução da medida provisória da desoneração, entre outras iniciativas
percebidas como gestos de confronto.
A nova realidade institucional está se impondo pelo fato de o Congresso ter entendido que tem uma
ampla reserva de poderes, nunca utilizada de forma consciente e consistente. Seja por que estava
cooptado pelas benesses do fisiologismo. Seja porque não tinha plena consciência de seu poder. O fato é
que, por uma ou outra razão, ou por ambas, a situação mudou. E o Executivo terá de aprender a lidar
com ela.
Mas a nova realidade institucional também atingiu o relacionamento entre o Executivo e o Judiciário. O
ponto de inflexão foi o julgamento do mensalão, que colocou o Executivo sob escrutínios nunca vistos. As
eventuais tentativas de domesticar o julgamento foram por água abaixo.
No fim das contas, o julgamento do mensalão reafirmou uma tendência que se mantém agora, quando o
petrolão começa a avançar nas instâncias superiores. São tempos novos, que foram alimentados, entre
outras coisas, pela demora de se indicar o novo ministro do Supremo Tribunal Federal, cuja aprovação
foi, no mínimo, tormentosa. Como consequência, aprovou-se a PEC da Bengala, que retirou da
presidente Dilma Rousseff a possibilidade de indicar cinco novos ministros do STF.
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Outro vetor do reequilíbrio institucional está nas atitudes e decisões iniciais do Tribunal de Contas da
União com relação às “pedaladas fiscais” do primeiro mandato Dilma. Nunca antes na História do Brasil,
para usar um bordão conhecido, o TCU foi tão longe em questionar as contas de um governo. A ponto de
esse questionamento poder resultar em grave condenação.
Temos ainda uma discussão já evidente em torno do federalismo. Não cabe mais a antiga hegemonia do
Executivo federal sobre estados e municípios. A autonomia existente sobre parte expressiva da
arrecadação de contribuições deixará de existir. Uma nova repartição de receitas e responsabilidades
deve ocorrer nos próximos anos. Viveremos uma nova época federalista, que dará outra feição ao poder
antes hegemônico do Executivo federal sobre os demais entes federados.
Os fatos aqui mencionados impõem uma séria reflexão. O que devemos esperar dessa nova realidade?
Provavelmente, mais crises e mais confrontos, até que as placas tectônicas do novo modelo se
acomodem. São as dores de uma democracia nascente que vive um surto de fragmentação de poder
nunca antes visto no país. É uma nova realidade institucional num país em que o presidente da República
sempre foi “Sua Majestade”, como escreveu Ernest Hambloch nos anos 30.