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Junho/2020 Sessões de 1º de junho a 1º de julho de 2020 100 número

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Page 1: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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Junho/2020

Sessões de 1º de junho a 1º de julho de 2020

100

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número

Page 2: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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Junho de 2020

Compilação dos Informativos nos 980 a 984

Data de divulgação 7 de agosto de 2020

O Informativo por Temas apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo

Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por

assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Agentes Públicos

Servidor aposentado pelo RGPS e reintegração sem concurso

Servidores Públicos

ADI e “Reforma Constitucional da Previdência” – 7

Direito Constitucional

Advocacia Pública

Cargo técnico com formação em Direito: autarquia estadual e atribuições de procurador do

estado

Controle de Constitucionalidade

Ultra-atividade das convenções e acordos coletivos de trabalho e CF/1988 – 2

Lei de Responsabilidade Fiscal

ADI: órgão de segurança pública e repristinação – 3

Crimes contra o patrimônio

Roubo forjado e classificação jurídica

Direitos e Garantias fundamentais

Trabalhadores avulsos e direito ao adicional de risco portuário – 3

Inquérito para investigar “Fake News” e ameaças contra o STF: constitucionalidade – 2

Ato jurídico perfeito e retroatividade de índices de atualização de preços – 2

Expulsão

Estrangeiro e filho brasileiro nascido posteriormente à expulsão – 2

Ordem Social

Verbas destinadas à educação e bloqueio judicial

Organização dos Poderes

ADI: Poder Legislativo estadual e participação em nomeações – 2

Poder Judiciário

Tribunal de justiça: eleição de órgão diretivo

Precatório

Precatório: juros de mora e período compreendido entre a data da expedição e o efetivo

pagamento

Simetria Federativa

Tribunal de contas e autonomia municipal – 2

Direito Penal

Crimes contra a Administração Pública e Legislação Penal Especial

Corrupção passiva e danos morais coletivos

Reincidência

Comprovação da reincidência – Inexistência de forma específica

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Direito Processual Civil

Legitimidade

Procurador municipal e interposição de recurso extraordinário

Direito Processual Civil e do Trabalho Execução

Reclamação: Tema 253 da repercussão geral, Metrô-DF e execução

Direito Processual Penal

Habeas Corpus

Cabimento de habeas corpus e liberdade de ir e vir

Nulidades

Nulidade e inquirição de perguntas realizadas diretamente pelo juiz

Processos em espécie

Julgamento de promotor de justiça e interrogatório – 2

Direito Tributário Tributos

Compra de óleo básico e incidência de ICMS

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DIREITO ADMINISTRATIVO

Agentes Públicos

Servidor aposentado pelo RGPS e reintegração sem concurso

A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravos regimentais em recursos extraordinários

com agravo para julgar improcedentes pedidos formulados por servidores públicos municipais, que,

depois de se aposentarem voluntariamente, pretendiam ser reintegrados aos mesmos cargos que

ocupavam anteriormente.

Trata-se de servidores ocupantes de cargos de provimento efetivo, que requereram aposentadoria

perante o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pois o município não possui regime próprio de

previdência. Posteriormente, mediante ação judicial, postularam a aludida reintegração, ao fundamento de

que seria cabível a percepção simultânea de vencimentos de cargo público com proventos de

aposentadoria, pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

A Turma considerou inadmissível que o servidor efetivo, depois de aposentado regularmente, seja

reconduzido ao mesmo cargo sem a realização de concurso público, com o intuito de cumular

vencimentos e proventos de aposentadoria. Se o servidor é aposentado pelo RGPS, a vacância do cargo

respectivo não implica direito à reintegração ao mesmo cargo sem a realização de concurso.

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Rosa Weber, que negaram provimento aos

agravos ao fundamento de que a matéria implicaria análise de legislação infraconstitucional.

ARE 1234192 AgR/PR, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 16.6.2020. (ARE-1234192)

ARE 1250903 AgR/PR, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 16.6.2020. (ARE-1250903) (Informativo 982, Primeira Turma)

Servidores Públicos

ADI e “Reforma Constitucional da Previdência” – 7 O Plenário, por maioria e em conclusão de julgamento conjunto, considerou improcedentes os

pedidos formulados em três ações diretas de inconstitucionalidade no tocante: (i) ao art. 40, § 18, da

Constituição Federal (CF), na redação dada pelo art. 1º da Emenda Constitucional (EC) 41/2003 (1); e (ii)

ao art. 9º da EC 41/2003, deduzido apenas na ADI 3184 (Informativos 640 e 641).

Por unanimidade, reconheceu a perda superveniente dos objetos das ações quanto à impugnação

dos incisos I e II do § 7º do art. 40 da CF, na redação dada pelo art. 1º da EC 41/2003, reputada

improcedente em assentada anterior pela ministra Cármen Lúcia (relatora) e pelo ministro Luiz Fux.

Segundo o voto reajustado da relatora, acompanhado pelos demais ministros, houve alteração substancial

do § 7º do art. 40 em virtude da edição da EC 103/2019, o que tornou as ações prejudicadas nesse

particular.

De igual modo, o colegiado não conheceu do pleito formalizado na ADI 3143 no que atinente ao

art. 5º da EC 41/2003, por inobservância do que exigido no art. 3º, I, da Lei 9.868/1999 (3).

Além disso, consignou o prejuízo parcial de algumas pretensões apresentadas nos feitos, uma vez

que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI

3.105, ADI 3.128, ADI 3.138).

No mérito, a Corte julgou improcedentes pedidos de declaração de inconstitucionalidade do art.

40, § 18, da CF e do art. 9º da EC, este requerido apenas na ADI 3184.

Frisou que o STF, ao declarar a inconstitucionalidade dos percentuais estabelecidos nos incisos I e

II e no parágrafo único do art. 4º da EC 41/2003, afirmara o caráter geral do art. 40, § 18, da CF.

Consignou que a discriminação determinada pela norma, segundo a qual incidirá contribuição

previdenciária sobre os proventos de aposentadorias e pensões que excederem o limite máximo

estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social, configura situação justificadamente

favorável àqueles que já recebiam benefícios quando do advento da EC 41/2003, incluídos no rol dos

contribuintes.

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Se por um lado, a contribuição devida pelos servidores da ativa seria calculada com base na

totalidade dos vencimentos percebidos, por outro, inativos e pensionistas teriam o valor de sua

contribuição fixado sobre base de cálculo inferior, pois dela seria extraído valor equivalente ao teto dos

benefícios pagos no regime geral.

Desse modo, haveria proporcionalidade, visto que os inativos, por não poderem fruir do sistema da

mesma forma que os ativos, não seriam tributados com a mesma intensidade.

Vencido, no ponto, o ministro Marco Aurélio, que julgou o pedido procedente para declarar a

inconstitucionalidade do mencionado preceito. A seu ver, as situações assentadas segundo o regime

anterior não poderiam ser alcançadas pelo tributo. A previsão da incidência da contribuição somente em

relação a valores que superem os do regime geral não afastaria do cenário a incidência do dispositivo em

situações constituídas.

Noutro passo, o Plenário firmou a constitucionalidade do art. 9º da EC 41/2003, que se remete à

aplicação do art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (4).

Ao rejeitar a alegação da associação autora de que afrontaria cláusula pétrea referente ao direito

adquirido, esclareceu não ser este o dispositivo que autoriza a cobrança da contribuição previdenciária de

inativos e pensionistas. Registrou que a constitucionalidade da cobrança já foi reconhecida por este

Tribunal.

Agregou que o STF tem afirmado, reiteradamente, a inexistência de direito adquirido a não ser

tributado.

O ministro Gilmar Mendes aduziu haver risco na declaração de inconstitucionalidade, sem

restrições, do art. 9º, porque poderia sinalizar a possibilidade de questionamentos em relação ao teto

remuneratório constitucional e envolver dúvidas sobre sua sistemática. De acordo com o ministro, a

remissão ao preceito do ADCT não simbolizaria sua restauração pelo constituinte derivado. O art. 9º é

norma expletiva, a enfatizar a existência do limite imposto pelo art. 37, XI, da CF (6) e evitar que o teto

seja superado.

O ministro Edson Fachin reportou-se ao julgamento do RE 609.381 (Tema 480 da repercussão

geral) e do RE 606.358 (Tema 257 da repercussão geral), com o intuito de salientar a desnecessidade de

interpretação conforme. Assinalou que, na redação originária da CF, o teto remuneratório não poderia ser

ultrapassado. Não há que se falar em direito adquirido à percepção de verbas em desacordo com o texto

constitucional.

Vencidos, no ponto, os ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Celso de

Mello e Cezar Peluso, que julgaram a pretensão procedente. Compreenderam que o poder constituinte de

emenda não poderia ter determinado a aplicação do art. 17 do ADCT, que teria se exaurido, e

asseveraram a afronta ao art. 60, § 4º, IV, da CF (6). O ministro Cezar Peluso alertou haver perigo de a

Administração Pública utilizar o art. 17 do ADCT para desconhecer direitos adquiridos sob as garantias

constitucionais vigentes. Além disso, não entreviu risco na declaração de inconstitucionalidade,

porquanto o redutor incidiria por força de normas constitucionais permanentes vigentes, que não suscitam

dúvidas.

(1) CF: “Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo

e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados

critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. (...) § 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e

pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos

efetivos.”

(2) EC 41/2003: “Art. 9º Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e

fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de

mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.”

(3) Lei 9.868/1999: “Art. 3º A petição indicará: I – o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos

jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações;” (4) ADCT: “Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de

aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela

decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.” (5) “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e

dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte: (...) XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos

detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos

cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em

espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos

Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais

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e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e

vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder

Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;”

(6) CF: “Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: (...) § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (...) IV – os direitos e garantias individuais.”

ADI 3133/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 24.6.2020. (ADI-3133)

ADI 3143/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 24.6.2020. (ADI-3143)

ADI 3184/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 24.6.2020. (ADI-3184) (Informativo 983,

Plenário)

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Advocacia Pública

Cargo técnico com formação em Direito: autarquia estadual e atribuições de procurador do

estado O Plenário, por maioria, deu parcial provimento a embargos de declaração em ação direta de

inconstitucionalidade a fim de, resguardada a validade dos atos já praticados: (i) incluir na declaração de

inconstitucionalidade, ao lado dos trechos anteriormente excluídos, também as expressões “apresentar

recursos em qualquer instância”, “comparecer às audiências e outros atos para defender os direitos do

órgão” e “promover medidas administrativas e judiciais para proteção dos bens e patrimônio do

DETRAN-ES”, dispostas no Anexo Único da Lei Complementar (LC) 734/2013 e no Anexo IV da LC

890/2018, ambas do estado do Espírito Santo (ES); (ii) esclarecer que a declaração de

inconstitucionalidade parcial dos aludidos anexos alcança as atribuições jurídicas consultivas do cargo de

Técnico Superior – Formação Direito do Departamento Estadual de Trânsito do Estado do Espírito Santo

(DETRAN-ES) privativas de procurador do estado, de modo a conferir interpretação conforme o art. 132

da Constituição Federal (CF) (1) às atribuições de “elaborar estudos de pareceres sobre questões jurídicas

que envolvam as atividades do DETRAN-ES; elaborar editais, contratos, convênios, acordos e ajustes

celebrados pela autarquia, com a emissão de parecer”, constantes dos referidos anexos, que devem ser

exercidas sob supervisão de procurador do estado do Espírito Santo.

Os embargos foram opostos da decisão em que o colegiado julgara parcialmente procedente o

pedido para declarar a inconstitucionalidade das seguintes expressões dos anexos adversados:

“representar em juízo ou fora dele nas ações em que haja interesse da autarquia” e “bem como a prática

de todos os demais atos de natureza judicial ou contenciosa, devendo, para tanto, exercer as suas funções

profissionais e de responsabilidade técnica regidas pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB”. Na

ocasião, a validade dos atos já praticados foi igualmente assentada (Informativo 927).

Na espécie, a embargante alegava ser devida a integração do acórdão recorrido, com o objetivo de

incluir a declaração de inconstitucionalidade de todas as atribuições de representação judicial e

consultoria jurídica exclusivas dos procuradores do estado.

Ao dar parcial provimento aos embargos, o Tribunal compreendeu que as atividades de

representação judicial e extrajudicial atribuídas ao cargo de Técnico Superior – Formação Direito do

DETRAN-ES não podem ser omitidas da declaração de inconstitucionalidade. No caso, as atribuições

jurídicas consultivas de seus ocupantes devem ser exercidas sob a supervisão de procurador do estado,

máxime por ser esta a interpretação que melhor prestigia o art. 132 da CF e a jurisprudência desta Corte.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que não conheceu dos segundos embargos declaratórios, por

entender não ser o caso de admiti-los.

(1) CF: “Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso

dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases,

exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. Parágrafo único. Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os

órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.”

ADI 5109 ED-segundos/ES, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 4.6.2020. (ADI-5109)

(Informativo 980, Plenário)

Controle de Constitucionalidade

Ultra-atividade das convenções e acordos coletivos de trabalho e CF/1988 – 2

O Plenário, em conclusão e por maioria, julgou prejudicadas, por perda superveniente de objeto,

ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas em face do art. 19 da Medida Provisória 1.950-62/2000,

convertida no art. 18 da Lei 10.192/2001, na parte em que revogou os §§ 1º e 2º do art. 1º da Lei

8.542/1992 (1) (Informativo 848).

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O Tribunal afirmou que a Lei 13.497/2017 (Lei da Reforma Trabalhista) alterou o § 3º do art. 614

da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) (2) e vedou expressamente a ultra-atividade das normas

coletivas no ordenamento jurídico brasileiro.

A nova lei, portanto, determinou um regime jurídico completamente diferente do previsto no § 1º

do art. 1º da Lei 8.542/1992, que estabelecia a ultra-atividade e era o objeto das ações diretas. Assim,

ainda que se declarasse a inconstitucionalidade da lei revogadora, a lei revogada não poderia voltar a ter

vigência, em razão de norma expressa que é taxativa quanto à impossibilidade da ultra-atividade.

Vencidos o ministro Edson Fachin, que julgou procedentes os pedidos formulados nas ações

diretas, para declarar a inconstitucionalidade do art. 18 da Lei 10.192/2001, e, em menor extensão, o

ministro Teori Zavascki.

Os ministros Roberto Barroso, Marco Aurélio e Cármen Lúcia (relatora) reajustaram os seus

respectivos votos.

(1) Lei 8.542/1992: “Art. 1º A política nacional de salários, respeitado o princípio da irredutibilidade, tem por fundamento

a livre negociação coletiva e reger-se-á pelas normas estabelecidas nesta lei. § 1º As cláusulas dos acordos, convenções ou contratos

coletivos de trabalho integram os contratos individuais de trabalho e somente poderão ser reduzidas ou suprimidas por posterior

acordo, convenção ou contrato coletivo de trabalho. § 2º As condições de trabalho, bem como as cláusulas salariais, inclusive os aumentos reais, ganhos de produtividade do trabalho e pisos salariais proporcionais à extensão e à complexidade do trabalho, serão

fixados em contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho, laudo arbitral ou sentença normativa, observados, dentre outros

fatores, a produtividade e a lucratividade do setor ou da empresa.” (2) CLT: “Art. 614 - Os Sindicatos convenentes ou as empresas acordantes promoverão, conjunta ou separadamente, dentro

de 8 (oito) dias da assinatura da Convenção ou Acordo, o depósito de uma via do mesmo, para fins de registro e arquivo, no Departamento Nacional do Trabalho, em se tratando de instrumento de caráter nacional ou interestadual, ou nos órgãos regionais do

Ministério do Trabalho e Previdência Social, nos demais casos. (...) § 3º Não será permitido estipular duração de convenção coletiva

ou acordo coletivo de trabalho superior a dois anos, sendo vedada a ultratividade.”

ADI 2200/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 4.6.2020. (ADI-2200)

ADI 2288/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 4.6.2020. (ADI-2288) (Informativo 980,

Plenário)

Lei de Responsabilidade Fiscal O Plenário, em conclusão, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta de

inconstitucionalidade ajuizada contra diversos dispositivos da Lei Complementar (LC) 101/2000 (Lei de

Responsabilidade Fiscal - LRF), que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a

responsabilidade na gestão fiscal, e da Medida Provisória 1980-18/2000, que dispõe sobre as relações

financeiras entre a União e o Banco Central do Brasil.

Preliminarmente, o colegiado não conheceu da ação quanto aos arts. 7º, §§ 2º e 3º, da LRF e aos

arts. 3º, II, e 4º da Medida Provisória 1980-18/2000. Asseverou a total ausência de paradigma

constitucional invocado. Além disso, observou que a medida provisória impugnada foi reeditada diversas

vezes, sem que as novas edições houvessem sido acompanhadas de pedido de aditamento da petição

inicial. Não conheceu da ação também quanto ao art. 15 da LRF, por ausência de impugnação de todo o

complexo normativo necessário. Julgou a ação prejudicada quanto aos arts. 30, I, e 72 da LRF, por

exaurimento da eficácia das normas. Reforçou motivos já apresentados no julgamento da medida cautelar

(Informativos 204, 206, 218, 267, 297 e 475).

No que tange ao mérito, a Corte julgou improcedente a alegação da inconstitucionalidade formal

da LRF. Isso porque houve respeito ao devido processo legislativo. Além disso, o fato de ter se referido à

lei complementar no singular, e não no plural, não significa que todas as matérias elencadas nos incisos

do art. 163 da Constituição Federal (CF) devessem ser disciplinadas por um mesmo diploma legislativo,

mas sim a imposição constitucional de uma espécie normativa específica para regulamentar as matérias

previstas nesse artigo.

O Tribunal julgou improcedente, também, a apontada inconstitucionalidade material dos arts. 4º, §

2º, II, e § 4º; 7º, caput e § 1º; 11, parágrafo único; 14, II; 17, §§ 1º a 7º; 18, § 1º; 20; 24; 26, § 1º; 28, § 2º;

29, I, e § 2º; 39; 59, § 1º, IV; 60 e 68, caput, da LRF. Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Rosa

Weber apenas no tocante à alínea d do inciso I do art. 20.

Afirmou que a exigência prevista no art. 4º, § 2º, II, em relação aos entes subnacionais, de

demonstração de sincronia entre diretrizes orçamentárias e metas e previsões fiscais macroeconômicas

definidas pela União não esvazia a autonomia daqueles, mas é absolutamente consentânea com as normas

da Constituição Federal e com o fortalecimento do federalismo fiscal responsável. Da mesma forma, a

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exigência adicional do processo legislativo orçamentário estipulada no art. 4º, § 4º, não implica nenhum

risco de descumprimento do art. 165, § 2º, da CF.

Afastou a apontada violação ao art. 167, VII, da CF pelo art. 7º, caput e § 1º. A previsão de

transferência de resultados do Banco Central do Brasil (BCB) para o Tesouro Nacional é uma dinâmica

que encontra previsão em outros dispositivos estranhos à LRF (arts. 4º, XXVII; e 8º, parágrafo único, da

Lei 4.595/1964; e art. 6º, II, da Lei 11.803/2008). O dispositivo em questão não concede crédito algum,

apenas determina uma consignação obrigatória a ser feita na lei orçamentária de cada ano, o que está

longe de significar autorização para gastos ilimitados. Além disso, a norma não trata de despesas de

funcionalismo ou de custeio do BCB. Essas são registradas no orçamento geral da União como as de

qualquer outra autarquia, como decorre do art. 5º, § 6º, da própria LRF. O que justifica a transmissão de

resultados do BCB diretamente para o Tesouro Nacional não são essas despesas, mas aquelas decorrentes

da atuação institucional dessa autarquia especial na sua atividade-fim, que corresponde à execução das

políticas monetária e cambial (art. 164 da CF).

Já a mensagem normativa do parágrafo único do art. 11, de instigação ao exercício pleno das

competências impositivas fiscais tributárias dos entes locais, não conflita com a Constituição Federal, mas

traduz-se como fundamento de subsidiariedade, que é congruente com o princípio federativo, e

desincentiva a dependência de transferências voluntárias. Com efeito, não é saudável para a Federação

que determinadas entidades federativas não exerçam suas competências constitucionais tributárias,

aguardando compensações não obrigatórias da União.

Compreendeu que o art. 14 se destina a organizar estratégia, dentro do processo legislativo, de tal

modo que os impactos fiscais de projetos de concessão de benefícios tributários sejam melhor

quantificados, avaliados e assimilados em termos orçamentários. A democratização do processo de

criação de gastos tributários pelo incremento da transparência constitui forma de reforço do papel de

estados e municípios e da cidadania fiscal. O inciso II do art. 14 funciona como uma cláusula de incentivo

à conciliação entre as deliberações gerais do processo orçamentário e aquelas relativas à criação de novos

benefícios fiscais. Não é possível extrair do seu comando qualquer atentado à autonomia federativa.

Nessa mesma linha, os arts. 17, e parágrafos, e 24 representam atenção ao equilíbrio fiscal. A

rigidez e a permanência das despesas obrigatórias de caráter continuado as tornam fenômeno financeiro

público diferenciado, devendo ser consideradas de modo destacado pelos instrumentos de planejamento

estatal. A internalização de medidas compensatórias, conforme enunciadas pelos dispositivos, no

processo legislativo é parte de projeto de amadurecimento fiscal do Estado, de superação da cultura do

desaviso e da inconsequência fiscal, administrativa e gerencial. A prudência fiscal é um objetivo

expressamente consagrado pelo art. 165, § 2º, da CF.

Frisou que o art. 18, § 1º, ao se referir a contratos de terceirização de mão de obra, não sugere

qualquer burla aos postulados da licitação e do concurso público. Impede apenas expedientes de

substituição de servidores via contratação terceirizada em contorno ao teto de gastos com pessoal.

No que diz respeito ao art. 20, reputou que a definição de um teto de gastos particularizado,

segundo os respectivos Poderes ou órgãos afetados, não representa intromissão na autonomia financeira

dos entes subnacionais. Reforça, antes, a autoridade jurídica da norma do art. 169 da CF, no propósito,

federativamente legítimo, de afastar dinâmicas de relacionamento predatório entre os entes componentes

da Federação. Rejeitou, em seguida, a alegação de que a autonomia do Ministério Público da União

(MPU) teria sido afetada pela estipulação, na alínea c do inciso I do art. 20, de limite diferenciado para

gastos com pessoal na esfera do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT).

Asseverou que a LRF seguiu o modelo orçamentário tradicional para o MPDFT, estabelecendo os limites

de despesa com seu pessoal de maneira especial, de modo a se ajustar a uma realidade de financiamento

atípica, criada pela própria Constituição Federal, cujo art. 21, XIII, atribui à União o encargo de manter o

MPDFT. Manteve-se, portanto, o vínculo orçamentário desse órgão com o Poder Executivo federal, não

sobrecarregando e tampouco comprometendo a chefia do MPU no encaminhamento de seu próprio

orçamento, respeitado o respectivo limite global relativo a todos os demais ramos. No ponto, divergiram

os ministros Edson Fachin e a ministra Rosa Weber. Para eles, o MPDFT encontra-se abarcado pelo

limite de gastos com pessoal do MPU, nos termos do art. 20, I, d, da LRF.

Relativamente aos arts. 26, § 1º; 28, § 2º; 29, I, e § 2º; 39, reiterou a fundamentação utilizada

quando da análise da constitucionalidade formal da LRF, uma vez que a inconstitucionalidade formal

arguida pelos requerentes se confunde com a inconstitucionalidade material.

O Tribunal também entendeu ser constitucional o art. 59, § 1º, IV. O art. 169, caput, da CF

encomenda à legislação complementar os limites de despesa com pessoal ativo e inativo. A norma apenas

estipula um mecanismo de articulação administrativa, informando Poderes e órgãos autônomos sobre uma

situação presumidamente temerária.

Page 10: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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Quanto ao art. 60, considerou que a possibilidade de fixação por estados e municípios de limites de

endividamento abaixo daqueles nacionalmente exigíveis não compromete competências do Senado

Federal. Ao contrário, materializa prerrogativa que decorre naturalmente da autonomia política e

financeira de cada ente federado.

Rejeitou, ainda, a alegada inconstitucionalidade do art. 68. O art. 250 da CF não exige que a

criação do fundo por ele mencionado seja necessariamente veiculada em lei ordinária, nem impede que os

recursos constitutivos sejam provenientes de imposição tributária.

O Plenário julgou o pedido procedente com relação aos arts. 9º, § 3º (1); 56, caput (2); 57, caput

(3); parcialmente procedente para dar interpretação conforme, com relação aos arts. 12, § 2º (4), e 21, II

(5); e procedente para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do parágrafo 1º do

art. 23, e a inconstitucionalidade do parágrafo 2º do mesmo artigo (6), todos da LRF.

Relativamente ao parágrafo 3º do art. 9º, entendeu, por maioria, que a norma prevista não guarda

pertinência com o modelo de freios e contrapesos estabelecido constitucionalmente para assegurar o

exercício responsável da autonomia financeira por parte dos Poderes Legislativo e Judiciário e do

Ministério Público. Isso porque o dispositivo estabelece inconstitucional hierarquização subserviente em

relação ao Executivo, permitindo que, unilateralmente, limite os valores financeiros segundo os critérios

fixados pela Lei de Diretrizes Orçamentárias no caso daqueles outros dois Poderes e instituição não

promoverem a limitação no prazo fixado no caput. A defesa de um Estado Democrático de Direito exige

o afastamento de normas legais que repudiam o sistema de organização liberal, em especial, na presente

hipótese, o desrespeito à separação das funções do Poder e suas autonomias constitucionais. Ficaram

vencidos, no ponto, os Ministros Dias Toffoli (presidente), Edson Fachin, Roberto Barroso, Gilmar

Mendes e Marco Aurélio, que julgaram o pleito parcialmente procedente para fixar interpretação

conforme no sentido de que a limitação dos valores financeiros pelo Executivo dar-se-á no limite do

orçamento realizado no ente federativo respectivo e observada a exigência de desconto linear e uniforme

da Receita Corrente Líquida prevista na lei orçamentária, com a possibilidade de arresto nas contas do

ente federativo respectivo no caso de desrespeito à regra prevista no art. 168 da CF (repasse até o dia 20

de cada mês).

Quanto aos arts. 56, caput, e 57, caput, o Tribunal, também por votação majoritária, considerou

que houve um desvirtuamento do modelo previsto nos arts. 71 e seguintes da CF. A Constituição

determina que as contas do Poder Executivo englobarão todas as contas, receberão um parecer conjunto

do Tribunal de Contas, e serão julgadas pelo Congresso. No caso do Judiciário, do Ministério Público e

do Legislativo, o Tribunal de Contas julga as contas, e não dá um parecer prévio. Vencido o Ministro

Marco Aurélio, que, em relação ao art. 56, deu interpretação conforme no sentido de que as contas,

submetidas ao Congresso, são as do Executivo, e não as do Ministério Público, do Poder Judiciário e do

Poder Legislativo; e, quanto ao art. 57, julgou improcedente a ação.

O colegiado deu interpretação conforme ao art. 12, § 2º, para o fim de explicitar que a proibição de

que trata o artigo não abrange operações de crédito autorizadas mediante créditos suplementares ou

especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta. A previsão de

limite textualmente diverso da regra do art. 167, III, da CF enseja interpretações distorcidas do teto a ser

aplicado às receitas decorrentes de operações de crédito.

De igual modo, deu interpretação conforme ao art. 21, II, no sentido de que se entenda como limite

legal nele citado o previsto em lei complementar. Observou que o art. 169, caput, da CF remete à

legislação complementar a definição de limites de despesa com pessoal ativo e inativo.

A Corte, por maioria, nos termos do voto do ministro Edson Fachin, declarou a

inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 23, § 1º, de modo a obstar interpretação

segundo a qual é possível reduzir valores de função ou cargo que estiver provido. Quanto ao parágrafo 2º

do art. 23, declarou a sua inconstitucionalidade, ratificando a medida cautelar. Salientou que, por mais

inquietante e urgente que seja a necessidade de realização de ajustes nas contas públicas estaduais, a

ordem constitucional vincula a todos, independentemente dos ânimos econômicos ou políticos. Portanto,

caso se considere conveniente e oportuna a redução das despesas com folha salarial no funcionalismo

público como legítima política de gestão da Administração Pública, deve-se observar o que está fixado na

Constituição (art. 169, §§ 3º e 4º). Não cabe flexibilizar mandamento constitucional para gerar

alternativas menos onerosas, do ponto de vista político, aos líderes públicos eleitos. De acordo com a

jurisprudência do Tribunal, o art. 37, XV, da CF impossibilita que a retenção salarial seja utilizada como

meio de redução de gastos com pessoal com a finalidade de adequação aos limites legais ou

constitucionais. A irredutibilidade do estipêndio funcional é garantia constitucional voltada a qualificar

prerrogativa de caráter jurídico-social instituída em favor dos agentes públicos. A redução da jornada de

trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária é medida inconstitucional. Aduziu, por

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fim, que a irredutibilidade de vencimentos dos servidores também alcança aqueles que não possuem

vínculo efetivo com a Administração Pública. No que se refere aos parágrafos 1º e 2º do art. 23, ficaram

vencidos integralmente os Ministros Alexandre de Moraes (relator), Roberto Barroso e Gilmar Mendes,

que julgaram improcedente a ação, com a cassação da medida cautelar concedida. Segundo eles, em

suma, não seria razoável afastar a possibilidade de temporariamente o servidor público estável ter

relativizada sua irredutibilidade de vencimentos, com diminuição proporcional às horas trabalhadas, com

a finalidade de preservar seu cargo e a própria estabilidade. A temporariedade da medida destinada a

auxiliar o ajuste fiscal e a recuperação das finanças públicas, a proporcionalidade da redução

remuneratória com a consequente diminuição das horas trabalhadas e a finalidade maior de preservação

do cargo, com a manutenção da estabilidade do servidor estariam em absoluta consonância com o

princípio da razoabilidade e da eficiência, pois, ao preservar o interesse maior do servidor na manutenção

de seu cargo, também se evitaria a cessação da prestação de eventuais serviços públicos. No ponto, a

Ministra Cármen Lúcia ficou vencida parcialmente, por divergir do ministro Edson Fachin apenas em

relação à locução “quanto pela redução dos valores a eles atribuídos”. Para ela, é possível a redução da

jornada, mas não dos valores. Vencido parcialmente, ainda, o presidente, que acompanhou o relator

quanto ao parágrafo 1º do art. 23 e, quanto ao parágrafo 2º, julgou parcialmente procedente a ação para

fixar interpretação conforme no sentido de que o referido dispositivo deve observar a gradação

constitucional estabelecida no art. 169, § 3º, da CF, de modo que somente será passível de aplicação

quando já adotadas as medidas exigidas pelo art. 169, § 3º, I, da CF, e a utilização da faculdade nele

prevista se fará primeiramente aos servidores não estáveis e, somente se persistir a necessidade de

adequação ao limite com despesas de pessoal, a faculdade se apresentará relativamente ao servidor

estável.

(1) LC 101/2000: “Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o

cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério

Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e

movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias. (...) § 3º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público não promoverem a limitação no prazo estabelecido no caput, é o Poder Executivo

autorizado a limitar os valores financeiros segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.”

(2) LC 101/2000: “Art. 56. As contas prestadas pelos Chefes do Poder Executivo incluirão, além das suas próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público, referidos no art. 20, as quais

receberão parecer prévio, separadamente, do respectivo Tribunal de Contas.”

(3) LC 101/2000: “Art. 57. Os Tribunais de Contas emitirão parecer prévio conclusivo sobre as contas no prazo de sessenta dias do recebimento, se outro não estiver estabelecido nas constituições estaduais ou nas leis orgânicas municipais.”

(4) LC 101/2000: “Art. 12. As previsões de receita observarão as normas técnicas e legais, considerarão os efeitos das

alterações na legislação, da variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção para os dois seguintes àquele a que se referirem,

e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas. § 2º O montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser

superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.” (5) LC 101/2000: “Art. 21. É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda: II – o

limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo.”

(6) LC 101/2000: “Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual excedente terá de ser eliminado nos dois

quadrimestres seguintes, sendo pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as providências previstas nos §§ 3º e 4º

do art. 169 da Constituição. § 1º No caso do inciso I do § 3º do art. 169 da Constituição, o objetivo poderá ser alcançado tanto pela extinção de cargos e funções quanto pela redução dos valores a eles atribuídos. § 2º É facultada a redução temporária da jornada de

trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.”

ADI 2238/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 24.6.2020. (ADI-2238)

(Informativo 983, Plenário)

ADI: órgão de segurança pública e repristinação – 3 Em conclusão de julgamento, o Plenário julgou prejudicado pedido formulado em ação direta de

inconstitucionalidade (ADI) ajuizada em relação à Emenda Constitucional (EC) 10/2001 à Constituição

do estado do Paraná, que, ao alterar o art. 46 (1) da referida Constituição, inseriu a Polícia Científica no

rol dos órgãos de segurança pública. Na sequência, por maioria, julgou parcialmente procedente a ADI

para conferir interpretação conforme à expressão “Polícia Científica”, contida na redação originária do

art. 50 da referida Constituição estadual (2), tão somente para afastar qualquer interpretação que confira

ao referido órgão o caráter de órgão de segurança pública (Informativo 768).

Quanto ao pedido de declaração de inconstitucionalidade da EC 10/2001, na parte em que alterou

os arts. 46 e 50 da aludida Constituição estadual, o Tribunal reconheceu a perda superveniente de objeto

da ADI no ponto, em razão da declaração de inconstitucionalidade da emenda no julgamento ADI 2.616.

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No que se refere à constitucionalidade da redação originária do art. 50 da Constituição paranaense,

o colegiado adotou o entendimento firmado no julgamento da ADI 2.827, no sentido de que o rol de

órgãos encarregados do exercício da segurança pública, previsto no art. 144, I a V, da CF, é taxativo e de

que esse modelo federal deve ser observado pelos estados-membros e pelo Distrito Federal.

Destacou, ainda, que nada impede que a Polícia Científica, órgão responsável pelas perícias,

continue a existir e a desempenhar suas funções, sem estar, necessariamente, vinculada à Polícia Civil,

razão pela qual afastou a alegada inconstitucionalidade da redação originária do art. 50 da Constituição

paranaense. Contudo, reputou necessário, com vistas a evitar confusão pelo uso do termo “Polícia

Científica”, conferir-lhe interpretação conforme, para afastar qualquer interpretação que lhe outorgue

caráter de órgão de segurança pública.

Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux, que julgaram integralmente procedente o

pedido remanescente. O ministro Roberto Barroso afirmou que a Polícia Científica pode e deve ser

autônoma, porém, dentro da estrutura da Polícia Civil.

Já para o ministro Luiz Fux, a redação originária do referido artigo padece de

inconstitucionalidade material, por violar o art. 144, I a V, § 4º, da Constituição Federal. Segundo ele, a

Polícia Científica não pode ostentar natureza de órgão autônomo de segurança pública e tampouco estar

fora da estrutura da Polícia Civil.

Vencidos, também, os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio, que julgaram totalmente

improcedente o pedido. O ministro Edson Fachin pontuou que não há como se declarar a

inconstitucionalidade da norma, nem mesmo se fazer interpretação conforme, pois os estados podem

garantir autonomia aos seus institutos de criminalística e podem integrá-los aos demais órgãos de

segurança pública, sem que isso importe ofensa material à Constituição, garantindo-se a autonomia das

perícias.

Para o ministro Marco Aurélio, a não integração da Polícia Científica na segurança pública, já

ocorreu no julgamento da ADI 2.616 e não se coloca em dúvida esse pronunciamento. Ressaltou, por fim,

que para se declarar, principalmente no tocante à Constituição de um estado, um vício, a pecha de

inconstitucional, considerada a Constituição Federal, é preciso que se tenha conflito evidente e, no caso,

não há conflito.

(1) Constituição do estado do Paraná: “Art. 46 – A Segurança Pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos

é exercida para a preservação da ordem pública e incolumidade das pessoas e do patrimônio, pelos seguintes órgãos: I – Polícia

Civil; II – Polícia Militar; III – Polícia Científica. Parágrafo único – O Corpo de Bombeiros é integrante da Polícia Militar”. (2) Constituição do estado do Paraná: “Art. 50 – A Polícia Científica, com estrutura própria, incumbida das perícias de

criminalísticas e médico-legais, e de outras atividades técnicas congêneres, será dirigida por peritos de carreira da classe mais

elevada, na forma da lei”.

ADI 2575/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 24.6.2020. (ADI-2575) (Informativo 983, Plenário)

Crimes contra o patrimônio

Roubo forjado e classificação jurídica A Primeira Turma, por maioria, indeferiu a ordem em habeas corpus impetrado em favor de

condenado pela prática do crime de roubo em concurso de agentes. No caso, o paciente, funcionário de

uma empresa, tinha a atribuição de movimentar quantias em dinheiro. O corréu, mediante grave ameaça,

simulando portar arma de fogo, exigiu a entrega dos valores que estavam em seu poder e no de outra

pessoa, na ocasião, e o paciente, fingindo ser vítima, previamente ajustado com o suposto assaltante,

entregou a quantia.

A defesa alegou nulidade processual, consistente em suposto desrespeito ao art. 402 do Código de

Processo Penal (CPP) (1), pois não teve a oportunidade de requerer diligências ao término da instrução.

Ademais, considerou inadequada a classificação jurídica dos fatos, que consubstanciariam estelionato e

não roubo.

A Turma, inicialmente, afastou a suposta nulidade. Afirmou que a falta de abertura de prazo, após

o encerramento da instrução, para manifestação das partes acerca do interesse na feitura de diligências

complementares constitui nulidade relativa, cujo reconhecimento pressupõe seja o inconformismo

veiculado em momento oportuno, ou seja, quando da apresentação de alegações finais. No caso, a defesa

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deixou de se insurgir nas alegações finais e nas razões de apelação. Além disso, a impetração sequer

apontou quais diligências seriam requeridas.

Ademais, o enquadramento dos fatos no tipo penal alusivo ao roubo mostrou-se adequado. Trata-

se de crime complexo, cuja estrutura típica exige a realização da subtração patrimonial mediante violência

ou grave ameaça à pessoa.

O fato de o assalto envolver situação forjada entre o paciente e o corréu não viabiliza a ocorrência

de estelionato, pois a caracterização do roubo não pressupõe a efetiva intenção do agente de realizar o mal

prometido. Basta que a forma utilizada para a subtração da coisa alheia móvel seja revestida de aptidão a

causar fundado temor ao ofendido. Nesse sentido, a ameaça praticada pela simulação do porte de arma de

fogo constitui meio idôneo a aterrorizar.

Por sua vez, a circunstância de não ter o paciente feito grave ameaça contra a vítima não é

relevante, porquanto a vinculação subjetiva com o corréu, a configurar o concurso de agentes, legitima

sejam os fatos, em relação a ambos os acusados, enquadrados no tipo de penal de roubo, observado o art.

29 do Código Penal (CP) (2).

Vencido o ministro Luiz Fux, que deferiu a ordem.

(1) CPP/1941: “Art. 402. Produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a

seguir, o acusado poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução.”

(2) CP/1940: “Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.”

HC 147584/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 2.6.2020. (HC-147584) (Informativo 980,

Primeira Turma)

Direitos e Garantias fundamentais

Trabalhadores avulsos e direito ao adicional de risco portuário – 3 Sempre que for pago ao trabalhador com vínculo permanente, o adicional de riscos é devido, nos

mesmos termos, ao trabalhador portuário avulso. Com esse entendimento, o Plenário, em conclusão e por

maioria, ao apreciar o Tema 222 da repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário em que

discutida a possibilidade de estender aos trabalhadores portuários avulsos o adicional de riscos, previsto

no art. 14 da Lei 4.860/1965 (1) e pago aos trabalhadores portuários com vínculo permanente

(Informativos 923 e 924).

O colegiado entendeu que a regulação da atividade portuária por meio de legislação específica se

deu para garantir aos trabalhadores que prestam serviços nas instalações portuárias direitos inerentes ao

exercício de atividades notoriamente peculiares. Até 1990, havia, basicamente, duas formas de prestação

de trabalho na área portuária: os serviços de capatazia eram realizados por servidores públicos vinculados

às Companhias Docas; e as demais atividades, pelos trabalhadores avulsos.

A Constituição de 1988 trouxe importante regulação das relações de trabalho em geral e, no inciso

XXXIV do art. 7º, previu “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício

permanente e o trabalhador avulso”. Constata-se que essa cláusula de isonomia se sagrou reforçada com o

advento da Lei 8.630/1993, quando novos atores sociais foram expressamente incorporados às relações

portuárias, entre os quais se destacam os órgãos gestores de mão de obra — entidades com finalidade

pública, sem fins lucrativos, cujo objetivo principal é centralizar e administrar a prestação de serviços nos

portos organizados do Brasil —; os operadores portuários; e os trabalhadores portuários, ainda

distinguidos entre contratados com vínculo permanente (servidores e empregados) e avulsos.

A mudança levada a efeito pela Lei 8.630/1993 não se restringiu à seara legislativa, uma vez que

inaugurou modelo regulatório das relações de trabalho no campo portuário muito diferente daquele

vigente até então, mas mantendo algumas normas do regime anterior. Prova disso são os arts. 75 e 76 da

Lei 8.630/1993. Apesar de terem revogado diversas normas esparsas, optaram por não revogar aquela que

previa o direito a adicional de riscos para os trabalhadores portuários. O argumento pela impossibilidade

de se estender o mencionado direito tem como fundamento interpretação equivocada de que o art. 19 da

Lei 4.860/1965 excluiria os trabalhadores avulsos do seu âmbito de incidência normativa.

Ademais, a leitura adequada da legislação a respeito, considerados os paradigmas constitucionais,

é a de que não calha como excludente o fato de os trabalhadores avulsos sujeitarem-se a regime

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diferenciado daqueles com vínculo permanente. Implementadas as condições legais específicas, é devido

o adicional de riscos, previsto no art. 14 da Lei 4.860/1965, ao trabalhador portuário avulso.

A disposição constitucional tem nítido caráter protetivo da igualdade material. Se há o pagamento

do adicional de riscos como direito do trabalhador portuário com vínculo permanente que labora em

condições adversas, essa previsão também deve ser reconhecida aos trabalhadores portuários avulsos

submetidos às mesmas condições.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao recurso.

(1) Lei 4.860/1965: “Art 14. A fim de remunerar os riscos relativos à insalubridade, periculosidade e outros porventura

existentes, fica instituído o ‘adicional de riscos’ de 40% (quarenta por cento) que incidirá sobre o valor do salário-hora ordinário do período diurno e substituirá todos aqueles que, com sentido ou caráter idêntico, vinham sendo pagos.”

RE 597124/PR, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 3.6.2020. (RE-597124) (Informativo 980,

Plenário)

Inquérito para investigar “Fake News” e ameaças contra o STF: constitucionalidade – 2

O Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em arguição de descumprimento

de preceito fundamental (ADPF), em que se discutia a constitucionalidade da instauração de inquérito

pelo Supremo Tribunal Federal (STF), realizada com o intuito de apurar a existência de notícias

fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e atos que podem configurar crimes contra a

honra e atingir a honorabilidade e a segurança do STF, de seus membros e familiares. Por conseguinte, a

Corte declarou a constitucionalidade da Portaria GP 69/2019, que instaurou o referido inquérito, e a

constitucionalidade do art. 43 (1) do Regimento Interno do STF (RISTF), que lhe serviu de fundamento

legal (Informativo 981).

Preliminarmente, o Tribunal conheceu da ADPF e converteu o julgamento da medida acauteladora

em julgamento definitivo de mérito.

Quanto ao mérito, assentou condicionantes no sentido de que o procedimento investigatório: (a)

seja acompanhado pelo Ministério Público (MP); (b) seja integralmente observado o Enunciado 14 da

Súmula Vinculante; (c) limite o objeto do inquérito a manifestações que, denotando risco efetivo à

independência do Poder Judiciário (CF, art. 2º), pela via da ameaça aos membros do STF e a seus

familiares, atentam contra os Poderes instituídos, contra o Estado de Direito e contra a democracia; e (d)

observe a proteção da liberdade de expressão e de imprensa nos termos da Constituição, excluindo do

escopo do inquérito matérias jornalísticas e postagens, compartilhamentos ou outras manifestações

(inclusive pessoais) na internet, feitas anonimamente ou não, desde que não integrem esquemas de

financiamento e divulgação em massa nas redes sociais.

Nesse contexto, o colegiado afirmou que o art. 43 do RISTF pode dar ensejo à abertura de

inquérito, contudo, não é e nem pode ser uma espécie de salvo conduto genérico, tornando-se necessário

delimitar seu significado. Isso porque a referida regra regimental trata de hipótese de investigação, e deve

ser lida sob o prisma do devido processo legal; da dignidade da pessoa humana; da prevalência dos

direitos humanos; da submissão à lei; e da impossibilidade de existir juiz ou tribunal de exceção. Além

disso, deve ser observado o princípio da separação de Poderes, uma vez que, via de regra, aquele que

julga não deve investigar ou acusar. Ao fazê-lo, como permite a norma regimental, esse exercício

excepcional submete-se a um elevado grau de justificação e a condições de possibilidade sem as quais

não se sustenta.

A Corte rememorou, ainda, o sentido do Enunciado 14 da Súmula Vinculante. Explicou que, num

Estado de Direito, a total transparência dos atos do poder público é a regra. Restrições pontuais à

publicidade devem estar fundadas na defesa da intimidade e do interesse social. O referido verbete tem o

objetivo de equilibrar esses valores.

Em seguida, enumerou diversos dispositivos constitucionais e de direito internacional voltados à

proteção da liberdade de expressão e concluiu que seu regime jurídico garante, por um lado, a

impossibilidade de censura prévia, e, por outro, a possibilidade de responsabilização civil e penal

posterior.

Além disso, a jurisprudência do STF é farta sobre o tema e contempla decisões que protegem a

livre circulação de ideias e de manifestações. O STF reconhece que a liberdade de expressão compreende

o direito de informar, de buscar informação, de opinar e de criticar.

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15

Ressaltou que, atualmente, existe o problema relativo às fake news, disseminadas especialmente

pelas mídias sociais. Nesse contexto, não há mais propriamente sujeitos de direito, mas algoritmos que

espalham algum tipo de informação. Portanto, mesmo com a preponderância que a liberdade de expressão

assume, e de sua posição preferencial, seu uso em casos concretos pode se tornar abusivo. É por essa

razão que o exercício legítimo da liberdade de expressão pode estar agregado a alguns condicionantes que

balizam a aferição de responsabilidades civis e penais.

A esse respeito, a restrição à liberdade de expressão deve ser permeada por alguns subprincípios.

Assim, por exemplo, esse direito pode ser limitado se o agente dele se utilizar para o cometimento de

crimes ou para a disseminação dolosa de informação falsa.

Especificamente no que diz respeito à ameaça, exige-se seriedade, gravidade e verossimilhança,

sendo indispensável que o ofendido se sinta ameaçado e acredite que algo de mal lhe pode acontecer.

Quando a vítima é agente público, essa exigência é mais rigorosa, pois a submissão à crítica é inerente à

sua atividade. A liberdade de expressão, nesse contexto, atua como exercício de direitos políticos e de

controle da coisa pública. Isso porque não pode haver privilégios ou tratamentos desiguais com o escopo

de beneficiar agentes públicos que exercem o poder em nome do povo. A proibição do dissenso equivale

a impor um mandado de conformidade, condicionando a sociedade à informação oficial, ou um efeito

dissuasório, culminando com a aniquilação do próprio ato individual de reflexão.

Portanto, as exceções à liberdade de expressão são restritas, e seus limites estão na alteridade e na

democracia. Nesse sentido, são vedados discursos racistas, de ódio, supressores de direitos e tendentes a

excluir determinadas pessoas da sociedade.

O Tribunal teceu considerações acerca do sistema investigatório. Ordinariamente, compete ao MP

promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei. Dentro do sistema constitucional, a regra

é: a autoridade policial investiga, o MP acusa e o juiz julga, e nesse ambiente interagem a advocacia e as

defensorias como funções essenciais.

O MP não tem exclusividade na investigação preliminar. Em regra, é a polícia judiciária quem

conduz a investigação, acompanhada pelo MP, titular da acusação. Segundo a Lei 8.038/1990, o MP

oferecerá denúncia ou pedirá arquivamento do inquérito ou das peças informativas.

O Plenário discorreu, ainda, sobre a proteção do Estado de Direito e dos Poderes instituídos. Sob

esse aspecto, nenhuma disposição constitucional pode ser interpretada ou praticada no sentido de permitir

a grupos ou pessoas suprimirem o exercício dos direitos e garantias fundamentais. Assim, por exemplo,

um partido político, cujos líderes incitam a violência, defendem políticas que não respeitam a democracia

e tentam destruí-la, não pode invocar a proteção contra penalidades impostas por atos praticados com

essas finalidades.

Não há ordem democrática sem respeito a decisões judiciais. Não há direito que justifique o

descumprimento de uma decisão da última instância do Poder Judiciário. Afinal, é o Poder Judiciário o

órgão responsável por afastar, mesmo contra maiorias, medidas que suprimam os direitos constitucionais.

São inadmissíveis, portanto, a defesa da ditadura, do fechamento do Congresso ou do STF. Não há

liberdade de expressão que ampare a defesa desses atos.

Por essa razão, o equilíbrio e a estabilidade entre os Poderes e a preservação da supremacia da

Constituição estão ameaçados. Nesse contexto, ausente a atuação dos órgãos de controle com o fim de

apurar o intuito de lesar ou expor a perigo de lesão a independência do Judiciário e o Estado de Direito,

incide o art. 43 do RISTF.

Esse dispositivo é regra excepcional que confere ao Judiciário função atípica na seara da

investigação, de modo que seu emprego depende de rígido escrutínio. É um instrumento de defesa da

própria Constituição, utilizado se houver inércia ou omissão dos órgãos de controle. Ainda que sentidos e

práticas à luz desse artigo possam ser inconstitucionais, há uma interpretação constitucional.

Nesse quadro, a apuração inaugurada com fundamento nesse dispositivo regimental destina-se a

reunir elementos que subsidiarão a representação ou encaminhamento ao MP. Os elementos reunidos pelo

STF justificam a propositura da ação penal mediante o encaminhamento ao MP dos elementos

necessários para essa finalidade. As informações equivalem às que são coligidas em um inquérito. Como

as ofensas são em massa e difusas, o inquérito se justifica para coligir esses elementos.

Ademais, o STF pode, diante da ciência da ocorrência em tese de um crime, determinar a

instauração de inquérito, mesmo que não envolva autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição. Muito

embora o dispositivo regimental exija que os fatos apurados ocorram na sede ou dependência do próprio

STF, o caráter difuso dos crimes cometidos por meio da internet permite estender o conceito de “sede”,

uma vez que o STF exerce jurisdição em todo o território nacional. Logo, os crimes objeto do inquérito,

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contra a honra e, portanto, formais, cometidos em ambiente virtual, podem ser considerados como

cometidos na sede ou dependência do STF.

A instauração do inquérito justifica-se, desse modo, para preservar a etapa de coleta de provas,

evitando que matérias próprias do STF sejam submetidas a jurisdições incompetentes; e para impedir que

suas ordens, autoridade e honorabilidade sejam desobedecidas ou ignoradas.

Por sua vez, é imprescindível a obediência ao juiz natural. De acordo com a regra regimental, o

ministro competente para presidir o inquérito é o presidente da Corte, ou seu delegatário. Nesse caso, a

delegação pode afastar a distribuição por sorteio, embora esta também seja uma via legítima.

No tocante aos atos já praticados no curso do inquérito, sua eficácia deve ser preservada até a data

desse julgamento. Ao MP competirá, derradeiramente, diante dos elementos colhidos, propor eventual

ação penal ou promover o arquivamento respectivo.

O colegiado concluiu no sentido de que as investigações não têm como objeto qualquer ofensa ao

agente público, mas devem se limitar às manifestações que denotam risco efetivo à independência do

Judiciário, pela via da ameaça a seus membros e, assim, risco aos Poderes instituídos, ao Estado de

Direito e à democracia. Atos atentatórios contra o STF, que incitem seu fechamento, a morte e a prisão de

seus membros, a desobediência a seus atos, o vazamento de informações sigilosas, não são manifestações

protegidas pela liberdade de expressão. O dissenso intolerável é aquele que visa a impor com violência o

consenso.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que julgou procedente o pedido formulado na ADPF para

fulminar o inquérito. Segundo o ministro, o inquérito resultou de ato individual do presidente do STF e

não passou pelo crivo do colegiado. Além disso, o relator do inquérito foi escolhido a dedo, sem a

observância do sistema democrático de distribuição. Ademais, a portaria foi editada com base no art. 43

do RISTF. Ocorre que a Constituição Federal de 1988, ao consagrar sistema acusatório, não recepcionou

o referido artigo do RISTF. Pontuou que, em Direito, o meio justifica o fim, jamais o fim justifica o meio

utilizado.

(1) RISTF: “Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito,

se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro.”

ADPF 572 MC/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 17 e 18.6.2020. (ADPF-572)

(Informativo 982, Plenário)

Parte 1 -

Parte 2 -

Ato jurídico perfeito e retroatividade de índices de atualização de preços – 2

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, julgou procedente ação direta de

inconstitucionalidade (ADI), ajuizada em face do art. 26 da Lei 8.177/1991, que determina que as

operações de crédito rural, contratadas junto a instituições financeiras, com recursos oriundos de

depósitos à vista e com cláusula de atualização pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC), sejam

atualizadas pela Taxa Referencial de Juros (TR) (Informativo 934).

O Tribunal entendeu que o dispositivo impugnado, ao permitir a incidência da TR em substituição

ao IPC nos contratos celebrados antes do início de sua vigência, se afigura incompatível com a garantia

fundamental de proteção ao ato jurídico perfeito, previsto no inciso XXXVI do art. 5º da Constituição

Federal (CF) (1).

Observou, ademais, que o fato de o Banco Central do Brasil (BCB) ter admitido não aplicar o

dispositivo retroativamente, e de a Advocacia-Geral da União ter-se manifestado pela

inconstitucionalidade da aplicação retroativa da norma não implicam na prejudicialidade da ADI.

Vencido o ministro Roberto Barroso, que considerou que a revisão judicial de índices de correção

monetária editados pelo legislador requer uma postura de autocontenção judicial, seja em respeito à

investidura popular que caracteriza o Poder Legislativo, seja em respeito à complexidade técnica inerente

ao tema. Isso porque o Poder Judiciário não tem capacidade institucional para avaliar os efeitos de

eventuais mudanças dos índices de correção monetária na economia.

O ministro ponderou, ainda, que, ao utilizar a TR como critério de correção, o legislador curvou-se

à dinâmica do mercado, o que constitui uma escolha que a ele cabe e que se mostra legítima. Como

decidido na ADI 493, a TR reflete, com propriedade, a dinâmica presente no mercado do dinheiro e as

Page 17: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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suas peculiaridades, sendo muito mais apropriada para a operação de crédito rural do que qualquer índice

de preços que mensure o fenômeno inflacionário. É razoável que se exija do Estado a correção de suas

dívidas por índice oficial de preços, uma vez que o sistema de pagamento por precatórios é obrigatório e

regulamenta a forma de pagamento dos débitos da Fazenda com seus cidadãos. No entanto, a situação é

distinta em operações de crédito rural, nas quais as partes, voluntariamente, aderem às condições de

financiamento impostas pela lei e demais regulações dos órgãos administrativos, como o BCB.

(1) CF: “Art. 5º (...): XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

ADI 3005/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 1.7.2020. (ADI-3005)

(Informativo 984, Plenário)

Expulsão

Estrangeiro e filho brasileiro nascido posteriormente à expulsão – 2 O § 1º do art. 75 da Lei 6.815/1980 (1) não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988

(CF), sendo vedada a expulsão de estrangeiro cujo filho brasileiro foi reconhecido ou adotado

posteriormente ao fato ensejador do ato expulsório, uma vez comprovado estar a criança sob a guarda do

estrangeiro e deste depender economicamente.

Com essa tese de repercussão geral (Tema 373), o Plenário, em conclusão de julgamento, negou

provimento a recurso extraordinário interposto de acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferido

em sede de habeas corpus (Informativo 924).

Na decisão recorrida, o STJ assentou que a proibição de expulsão de estrangeiro quando tiver prole

brasileira objetiva proteger os interesses da criança à assistência material, à garantia dos direitos à

identidade, à convivência familiar e à assistência pelos pais.

A União sustentava que, coexistentes a proteção dos direitos da família e da criança e a defesa da

soberania e do território nacional, a Lei 6.815/1980 previa a impossibilidade de expulsão somente quando

a prole brasileira fosse anterior ao fato motivador da expulsão. Aludia ao poder discricionário, conferido

ao chefe do Poder Executivo pelo art. 66 do referido diploma legal (2), de expulsar estrangeiro com

conduta nociva aos interesses nacionais.

O colegiado, por maioria, rejeitou a preliminar de ilegitimidade da recorrente. Entendeu ser caso

de superação da preliminar ante a relevância da tese e o fato de estar-se em discussão não só o direito de

ir e vir do paciente, mas também prerrogativa do chefe do Poder Executivo. Ademais, esta seria a única

possibilidade de a União contestar a decisão do STJ e discutir a matéria.

Vencido, no ponto, o ministro Marco Aurélio (relator). O ministro salientou que a União não foi

parte na ação apreciada no STJ. Ademais, por ser o habeas corpus via impugnativa exclusiva da defesa,

descabe a sua utilização para tutela de interesse da acusação ou de terceiros.

No mérito, prevaleceu o voto do relator, segundo o qual o § 1º do art. 75 da Lei 6.815/1980 não foi

recepcionado pela CF, sendo vedada a expulsão, uma vez comprovado estar a criança sob a guarda do

estrangeiro e deste depender economicamente.

O ministro registrou a presença de valores constitucionais como a soberania nacional, com a

manutenção de estrangeiro no País, e a proteção à família, ante a existência de filho brasileiro.

Lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF), diversas vezes, decidiu no sentido de que a

existência de filhos nascidos após o fato criminoso não seria oponível à expulsão. No entanto, as questões

relativas aos requisitos para expulsão foram reiteradamente examinadas somente com fulcro na

interpretação isolada do art. 75 da Lei 6.815/1980.

Assim, compreendeu ser necessário aprofundar a evolução no tratamento da matéria, atentando

para a CF, que define a família como base da sociedade e estabelece o direito da criança à convivência

familiar [arts. 226, caput, e 227, caput, (3)].

Esclareceu que a CF de 1988 inaugurou nova quadra no tocante ao patamar e à intensidade da

tutela da família e da criança, assegurando-lhes cuidado especial, concretizado, pelo legislador, na edição

do Estatuto da Criança e do Adolescente. O sistema foi direcionado para a absoluta prioridade dos

menores e adolescentes, como pressuposto inafastável de sociedade livre, justa e solidária.

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Por isso, é impróprio articular com a noção de interesse nacional inerente à expulsão de

estrangeiro quando essa atuação estatal alcança a situação da criança, sob os ângulos econômico e

psicossocial. O § 1º do art. 75 da Lei 6.815/1980 encerra a quebra da relação familiar, independentemente

da situação econômica do menor e dos vínculos socioafetivos desenvolvidos. A família, respaldo maior

da sociedade e da criança, é colocada em segundo plano, superada pelo interesse coletivo em retirar do

convívio nacional estrangeiro nocivo, embora muitas vezes ressocializado.

A seu ver, priva-se perpetuamente a criança do convívio familiar, da conformação da identidade.

Dificulta-se o acesso aos meios necessários à subsistência, haja vista os obstáculos que decorrem da

cobrança de pensão alimentícia de indivíduo domiciliado ou residente em outro País. Dessa maneira,

impõe-se à criança ruptura e desamparo, cujos efeitos repercutem nos mais diversos planos da existência,

em colisão não apenas com a proteção especial conferida a ela, mas também com o âmago do princípio da

proteção à dignidade da pessoa humana.

Além disso, o preceito da Lei 6.815/1980 afronta o princípio da isonomia, ao estabelecer

tratamento discriminatório entre filhos havidos antes e após o fato ensejador da expulsão.

O relator ressaltou que os prejuízos associados à expulsão de genitor independem da data do

nascimento ou da adoção, muito menos do marco aleatório representado pela prática da conduta

motivadora da expulsão. Se o interesse da criança deve ser priorizado, é de menor importância o

momento da adoção ou da concepção.

Esse entendimento não esvazia a soberania nacional. O estrangeiro continua obrigado a comprovar

ter filho brasileiro sob a própria guarda e dependente economicamente. Ou seja, exige-se do estrangeiro a

demonstração de vínculo qualificado com o País, apto a autorizar, dentro das balizas legais, a sua

permanência em território nacional.

Por fim, o ministro observou que a Lei 6.815/1980, regedora da espécie, foi suplantada pela nova

Lei de Migração (Lei 13.445/2017), que não repetiu o contido no preceito em debate.

(1) Lei 6.815/1980: “Art. 75. Não se procederá à expulsão: (...) § 1º Não constituem impedimento à expulsão a adoção ou o

reconhecimento de filho brasileiro supervenientes ao fato que o motivar.” (2) Lei 6.815/1980: “Art. 66. Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a

oportunidade da expulsão ou de sua revogação. Parágrafo único. A medida expulsória ou a sua revogação far-se-á por decreto.”

(3) CF: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e

comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

RE 608898/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 25.6.2020. (RE-608898) (Informativo

983, Plenário)

Ordem Social

Verbas destinadas à educação e bloqueio judicial O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em arguição de

descumprimento de preceito fundamental (ADPF) para declarar a inconstitucionalidade de quaisquer

medidas de constrição judicial que recaiam sobre verbas destinadas à educação, bem como para afastar a

submissão ao regime de precatório das Caixas Escolares ou Unidades Descentralizadas de Educação

(UDEs), em razão da sua natureza jurídica de direito privado, de não integrar a Administração Pública, de

não compor o orçamento público e da ratio que inspira a gestão descentralizada da coisa pública. Na

ADPF, questionava-se a constitucionalidade de decisões da justiça trabalhista que determinaram o

bloqueio de verbas destinadas ao custeio de merenda escolar, transporte de alunos e manutenção das

escolas públicas do estado do Amapá.

Inicialmente, o colegiado explicou que as Caixas Escolares consistem em Unidades Executoras

Próprias (UEx), que recebem recursos públicos destinados à educação, via transferência, para a melhoria

da infraestrutura física e pedagógica, o reforço da autogestão escolar e a elevação dos índices de

desempenho da educação básica, por meio da gestão descentralizada.

Encontram-se inseridas em uma política de descentralização dos recursos destinados às escolas,

intitulada Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), que presta assistência financeira às escolas

públicas da educação básica das redes estaduais, municipais e do Distrito Federal e às escolas privadas de

educação especial mantidas por entidades sem fins lucrativos. Os recursos do programa são transferidos

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de acordo com o número de alunos e com o censo escolar do ano anterior ao do repasse. Por sua vez, a

assistência financeira a ser concedida a cada estabelecimento de ensino é admitida via repasse

diretamente à unidade executora ou à entidade representativa da comunidade escolar.

As unidades executoras das escolas instituídas e mantidas pelo Poder Público consistem em

sociedades civis com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, que têm por finalidade

receber e gerenciar os recursos destinados às escolas, inclusive aqueles recebidos do Fundo Nacional de

Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Estabeleceu-se, desse modo, a possibilidade de os recursos destinados à educação serem

repassados a associações privadas sem fins lucrativos, às quais cabe geri-los em benefício da escola. A

inovação do programa reside justamente na descentralização da gestão financeira de recursos da educação

para a sociedade civil.

Vê-se, assim, que as Caixas Escolares, enquanto unidades executoras próprias, foram criadas para

viabilizar o repasse de verbas públicas diretamente às escolas, conferindo-lhes maior autonomia na

aplicação dos recursos de acordo com as necessidades particulares de cada localidade. A ratio é a

descentralização da gestão da educação para maior agilidade e eficiência.

Assim, é preciso identificar o que é constitucionalmente exigido de forma invariável e diferenciar

daquilo que é constitucionalmente deixado à escolha das maiorias políticas prevalecentes, para que

possam moldar a intervenção do Estado nos domínios sociais à luz da vontade coletiva legitimamente

predominante.

Nesse sentido, as UEx funcionam por meio de repasses de verbas para associações privadas sem

fins lucrativos. Essa medida de descentralização da gestão financeira na prestação de serviços

educacionais configura escolha de alocação de recursos plenamente legítima, inserida na margem de

conformação das decisões de agentes políticos.

Não encontra óbice na Constituição, que, ao contrário, estabelece, em seu art. 205, que “a

educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a

colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da

cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Portanto, o experimentalismo do administrador público caminha no sentido da descentralização da

execução, mantido o controle normativo e fiscalizador dos entes públicos. No caso, ao se estabelecer a

transferência direta de recursos para as escolas, pretende-se atingir ganhos de agilidade e eficiência, além

de democratizar a administração da escola.

Como o recurso é público, entretanto, há forte fiscalização, responsabilização e submissão aos

princípios gerais da administração pública e ao controle do Tribunal de Contas da União (TCU). O âmbito

constitucionalmente definido para o controle a ser exercido pelo TCU e pelo Ministério Público não é de

qualquer forma restringido em relação a essas entidades.

A Constituição proíbe a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma

categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa,

mandamento esse que também vincula o Judiciário.

Nesse sentido, as regras sobre aprovação e gestão orçamentárias consagram mecanismos de freios

e contrapesos essenciais ao regular o funcionamento das instituições republicanas e democráticas e à

concretização do princípio da separação dos poderes.

Assim, os princípios da separação dos poderes e do fomento à educação são violados por decisões

judiciais que gerem bloqueio, penhora ou sequestro, para fins de quitação de débitos trabalhistas, de

verbas públicas destinadas à merenda, ao transporte de alunos e à manutenção das escolas públicas.

O direito social à educação, bem como a prioridade absoluta de proteção às crianças e aos

adolescentes, em respeito à condição peculiar de pessoas em desenvolvimento que são, justificam a

especial proteção constitucional dos valores necessários à aplicação efetiva dos recursos públicos

destinados à concretização dos efetivos direitos.

No caso, a destinação específica das verbas bloqueadas em juízo para aplicação em educação se

verifica no manual de orientação para as UEx, que exige que a entidade, quando da formalização do

cadastro, deve indicar o banco e a agência de sua preferência para abertura pelo FNDE de conta corrente

específica para o programa, e que a conta é exclusiva, sendo vedada a movimentação de recursos próprios

por meio de depósito, transferência, doação ou saque em espécie.

Em caso de descumprimento, o FNDE fica autorizado a suspender o repasse dos recursos, assim

como em caso de omissão na prestação de contas ou rejeição da prestação de contas. Ademais, qualquer

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irregularidade identificada na aplicação dos recursos destinados à execução do PDDE pode ser

denunciada ao FNDE, ao TCU, aos órgãos de controle interno do Poder Executivo da União e ao

Ministério Público, a quem cabe o controle da prestação de contas.

Quanto ao pagamento de verbas trabalhistas, os atos judiciais impugnados acarretaram o

indesejado comprometimento do equilíbrio e da harmonia entre os Poderes, além de prejuízo à

continuidade dos serviços públicos, em ofensa ao direito social à educação, transporte e alimentação

escolar, preceitos fundamentais agasalhados na Constituição.

A impenhorabilidade dos valores se impõe, in casu, sob a ratio de que estão afetados a finalidades

públicas e à realização das atividades e serviços públicos decorrentes do exercício obrigatório da função

administrativa.

Quanto à possibilidade de as Caixas Escolares pagarem suas dívidas por precatório, note-se que

elas recebem doações particulares, e assumem obrigações outras. Em relação a essas obrigações, calcadas

em patrimônio decorrente de doações privadas, não é razoável que devam ser pagas por precatório.

Destaque-se que essas Caixas têm personalidade jurídica de direito privado.

Assim, embora as Caixas Escolares do Amapá sejam entidades voltadas diretamente à prestação de

serviços de educação e recebam recursos públicos via conta específica, já não se pode afirmar que

dependem totalmente de recursos públicos e atuam em regime de exclusividade na gestão de recursos

públicos destinados à educação.

As Caixas Escolares contam com recursos provenientes do próprio do estado do Amapá e dos

municípios, bem como com rendas decorrentes de atividades realizadas no ambiente escolar e auxílios

financeiros de particulares. Essas verbas privadas não estão imunes aos atos de constrição judicial.

Dessa forma, considerando-se que as Caixas Escolares consistem em sociedades civis com

personalidade jurídica de direito privado, bem como que tais entidades não possuem os qualificativos

necessários para serem enquadradas no regime especial de pagamento de débitos por precatórios,

sabidamente diante da possibilidade de gerirem recursos privados, elas não se sujeitam ao regime referido

independentemente da natureza dos recursos submetidos à execução judicial.

É assim que a proteção constitucional a direitos individuais e a garantias fundamentais, inclusive

de ordem trabalhista, convive com o princípio da impenhorabilidade dos recursos públicos recebidos por

instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que considerou inadequada a via eleita e, quanto ao mérito,

julgou o pedido improcedente.

ADPF 484/AP, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 4.6.2020. (ADPF-484) (Informativo 980,

Plenário)

Organização dos Poderes

ADI: Poder Legislativo estadual e participação em nomeações – 2 O Plenário, por maioria, em conclusão de julgamento de ação direta ajuizada contra dispositivos

da Constituição do estado de Roraima, assentou o prejuízo da ação no que atine ao § 3º do art. 46, e,

quanto aos preceitos remanescentes, julgou parcialmente procedente a pretensão para declarar: (i) a

inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, do inciso XVIII do art. 33, retirando o trecho

controvertido e permanecendo em vigor a parte em que se mantém a escolha de 2/3 (dois terços) dos

membros do Tribunal de Contas estadual pela Assembleia Legislativa; (ii) a inconstitucionalidade do

parágrafo único do art. 62; e (iii) a nulidade parcial, com redução de texto, do art. 103, excluindo a

expressão questionada. As disposições impugnadas versam sobre indicações de conselheiros do tribunal

de contas estadual e exigência de arguição e aprovação de certas autoridade pelo Poder Legislativo

regional antes de serem nomeadas pelo chefe do Poder Executivo (Informativo 919).

Na espécie, a ação foi proposta contra: (i) o trecho “e Sétima” do § 3º do art. 46; (ii) a primeira

parte do inciso XVIII do art. 33 (“antes da nomeação, arguir os Titulares da Defensoria Pública, da

Procuradoria-Geral do Estado, das Fundações Públicas, das Autarquias, os Presidentes das Empresas de

Economia Mista”); (iii) o parágrafo único do art. 62; (iv) e a expressão “após arguição pelo Poder

Legislativo” do art. 103, todos da Constituição roraimense, com redação dada ou incluída pela Emenda

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Constitucional (EC) 7/1999 daquele estado. Em 2018, houve aditamento à inicial, a fim de que as mesmas

disposições, com as alterações havidas, passassem a ser objeto da ação.

De início, o colegiado lembrou que alguns dispositivos foram alterados por emendas

constitucionais posteriores ao ajuizamento do feito.

Ato contínuo, consignou a perda superveniente do objeto relativo à composição do tribunal de

contas. Isso porque o § 3º do art. 46 foi alterado pela EC 16/2005, que adequou a norma à Constituição

Federal (CF).

A esse respeito, o ministro Roberto Barroso explicitou caber ao governador escolher três

conselheiros do tribunal de contas do estado: um dentre os auditores e outro dentre os membros do

Ministério Público, alternadamente, e um terceiro a seu critério.

No mais, a Corte compreendeu ser vedado à legislação estadual submeter à aprovação prévia da

Assembleia Legislativa a nomeação de dirigentes das autarquias e das fundações públicas, de presidentes

das empresas de economia mista e assemelhados, de interventores de municípios, bem assim dos titulares

da Defensoria Pública e da Procuradoria-Geral do Estado.

Além de não ser possível submeter à arguição do Legislativo a nomeação de titulares de fundações

e autarquias, é ilegítima a intervenção parlamentar no processo de preenchimento da direção das

entidades privadas da Administração indireta dos estados. A escolha dos dirigentes dessas empresas é

matéria inserida no âmbito do regime estrutural de cada uma delas.

Relativamente aos interventores, considerou que a CF estabelece a análise do decreto de

intervenção para serem averiguadas as condições, hipóteses, extensão, legalidade, e não para o

Legislativo verificar, mesmo a posteriori, o nome do interventor. Tanto a intervenção federal nos estados

quanto a estadual nos municípios são atos do chefe do Poder Executivo. O interventor é de sua escolha e

confiança. Essa é a divisão entre o Executivo e o Legislativo no tema.

Logo, afronta a CF a inserção da necessidade de sabatina dos interventores de municípios na

Constituição estadual. Permitir a rejeição do nome de interventor resulta, na verdade, na escolha dele pela

Assembleia Legislativa, porquanto poderá recusar sucessivamente as indicações do governador até ser

chamado alguém de seu interesse. Ademais, se entender ser questão política, o Legislativo pode rejeitar a

intervenção, o que pode caracterizar crime de responsabilidade do chefe do Executivo.

No tocante a defensor público-geral do estado, asseverou a inconstitucionalidade da exigência de

prévia sabatina. A CF atribuiu à lei complementar a competência para prescrever normas gerais das

defensorias públicas dos estados (art. 134, § 1º). A LC 80/1994 adveio e preceituou a obrigatoriedade de

aprovação do titular da Defensoria Pública da União pela maioria absoluta do Senado Federal. Não

estipulou essa necessidade aos estados, porque seguiu o mesmo modelo dos ministérios públicos, a fim de

evitar a politização da defensoria.

Consignou a inconstitucionalidade da arguição pela Assembleia Legislativa do procurador-geral

do estado, por afetar a separação dos Poderes e interferir diretamente na estrutura hierárquica do Poder

Executivo. Ela transfere ao Legislativo o controle sobre agente público, que, conforme lei orgânica,

integra o gabinete do chefe do Executivo como secretário de governo.

O ministro Roberto Barroso aduziu caber a submissão ao Legislativo, em âmbito estadual, apenas

daquilo que consta do modelo constitucional federal, sob pena de afronta à reserva de administração,

corolário da separação dos Poderes e das competências privativas do chefe do Executivo de dirigir a

Administração Pública.

Ao excluir da sabatina prévia os dirigentes das autarquias, ressalvou a situação dos membros de

agências reguladoras, que são autarquias especiais. Pela legislação, os conselheiros, no modelo federal,

são submetidos à aprovação do Poder Legislativo.

Por sua vez, a ministra Cármen Lúcia acentuou que a pequena isenção de alguns à sabatina

também obedece ao princípio da reserva de administração.

Vencidos, em parte, os ministros Ricardo Lewandowski (relator) e Edson Fachin, que declararam a

inconstitucionalidade (i) das expressões “da Procuradoria-Geral do Estado” e “dos Presidentes das

Empresas de Economia Mista, órgãos equivalentes ou assemelhados”, contidas no inciso XVIII do art. 33;

e (ii) do texto “e da Procuradoria-Geral do Estado” constante do parágrafo único do art. 62, ambos da

Constituição roraimense. De um lado, consideraram inconstitucionais os dispositivos relativos à arguição

prévia das indicações para procurador-geral do estado e de dirigentes das sociedades de economia mista e

de órgão equivalentes ou assemelhados. Do outro, reputaram ser constitucional a prévia sabatina pela

Assembleia Legislativa das nomeações do Executivo para ocupar os cargos de direção das autarquias e

das fundações públicas, bem como dos interventores nos municípios e do defensor público-geral.

Page 22: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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Vencido, em maior extensão, o ministro Marco Aurélio, que se reportou ao voto proferido quando

do exame da medida acauteladora. Assim, avaliou não caber a submissão ao Legislativo dos dirigentes

das empresas de economia mista e dos interventores. Depreendeu que, no entanto, seria possível submeter

a escolha de titulares de outros cargos, além das indicações ligadas a autarquias, fundações públicas,

defensoria e procuradoria do estado.

ADI 2167/RR, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 3.6.2020. (ADI-2167) (Informativo 980, Plenário)

Poder Judiciário

Tribunal de justiça: eleição de órgão diretivo

O Plenário, em julgamento conjunto, conheceu em parte de ação direta de inconstitucionalidade

(ADI), e, na parte conhecida, julgou procedente o pedido nela formulado para declarar a

inconstitucionalidade do art. 62 da Constituição do estado de São Paulo (1). Declarou, ainda, a não

recepção, pela Constituição Federal (CF), do art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura – Loman (LC

35/1979) (2), de modo que não subsista interpretação segundo a qual apenas os desembargadores mais

antigos possam concorrer aos cargos diretivos dos tribunais, devendo a matéria, em razão da autonomia

consagrada nos arts. 96, I, a, e 99 da CF (3) (4), ser remetida à disciplina regimental de cada tribunal. Na

mesma assentada, a Corte concedeu a ordem em mandado de segurança, para cassar decisão proferida

pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nos autos de Pedido de Providências, e restabelecer a eficácia

da Resolução 606/2013 do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Na ADI, pretendia-se a declaração de inconstitucionalidade do art. 27, § 2º, do Regimento Interno

do TJSP e do art. 1º, § 1º, da Resolução 395/2007 desse tribunal, bem como do art. 62, da Constituição do

estado de São Paulo.

Na ação mandamental, impugnava-se a decisão do CNJ que determinou que o TJSP se abstivesse

de dar abertura ao procedimento eleitoral para os seus cargos diretivos com fundamento na Resolução

606/2013, em razão de aparente contrariedade com o disposto no art. 102 da Loman.

O colegiado, em razão da revogação expressa do art. 27, § 2º, do Regimento Interno do TJSP, e do

disposto no art. 1º, § 1º, da Resolução 395/2007, não conheceu, no ponto, da ADI.

Quanto ao mérito, afirmou que a eleição para os cargos de cúpula dos tribunais, após a edição da

EC 45/2004, é regida pelos respectivos regimentos internos, não mais subsistindo a remissão à Loman.

Entendeu, ademais, que, a partir da promulgação da Constituição de 1988, houve uma alteração

substancial no regramento da matéria, homenageando a autonomia dos tribunais e, em última análise, uma

visão mais consentânea do federalismo, ensejando uma postura do Poder Judiciário deferente à

competência normativa dos entes federados.

Afirmou que a leitura combinada dos arts. 99 e 102 da Loman permitia concluir que os cargos de

cúpula dos tribunais somente poderiam ser ocupados por desembargadores eleitos dentre os mais antigos,

os quais, a seu turno, compunham o órgão especial. A disciplina inserida na CF, após a edição da EC

45/2004, todavia, inaugura uma nova lógica, que não tem na antiguidade critério exclusivo. A

composição do órgão especial passa a ser ditada não apenas pela antiguidade, mas também pela eleição

dentre os pares do plenário das cortes. Não há, no texto da CF, distinção praticada entre os integrantes do

órgão especial e os demais componentes da corte que justifique impedimento a que estes últimos

concorram aos cargos de cúpula.

Ao restringir o universo dos possíveis candidatos aos órgãos de cúpula do TJSP aos integrantes de

seu órgão especial, a Constituição do estado de São Paulo desrespeitou a autonomia administrativa dos

tribunais, consagrada nos arts. 96, I, a, e no art. 99 da CF.

(1) Constituição do estado de São Paulo: “Art. 62 – O Presidente e o 1º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça e o

Corregedor Geral da Justiça, eleitos, a cada biênio, pela totalidade dos Desembargadores, dentre os integrantes do órgão especial,

comporão o Conselho Superior da Magistratura.”

(2) LC 35/1979: “Art. 102 – Os Tribunais, pela maioria dos seus membros efetivos, por votação secreta, elegerão dentre seus Juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos,

proibida a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais entre

os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antiguidade. É obrigatória a aceitação do cargo, salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição. Parágrafo único – O disposto neste artigo não se aplica ao Juiz eleito, para completar.”

Page 23: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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(3) CF: “Art. 96. Compete privativamente: I – aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos

internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o

funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos.”

(4) CF: “Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira.”

ADI 3976/SP, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 25.6.2020. (ADI-3976)

MS 32451/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 25.6.2020. (MS-32451) (Informativo 983,

Plenário)

Precatório

Precatório: juros de mora e período compreendido entre a data da expedição e o efetivo

pagamento Durante o período previsto no § 1º do art. 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre

os precatórios que nele sejam pagos.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, deu provimento a embargos de

divergência para, reformando o acórdão embargado, dar provimento ao recurso extraordinário.

O colegiado afirmou que não incidem juros de mora no período compreendido entre a data da

expedição do precatório e seu efetivo pagamento, desde que realizado no prazo estipulado

constitucionalmente. Esclareceu, ademais, que a tese foi enunciada no Verbete 17 da Súmula Vinculante

do Supremo Tribunal Federal (STF).

Vencidos os ministros Marco Aurélio, Edson Fachin e Rosa Weber que negaram provimento aos

embargos de divergência. O ministro Marco Aurélio pontuou que a Constituição é explícita ao revelar

que, muito embora se tenha o prazo dilatado de 18 meses para a liquidação do débito, esse débito deve ser

satisfeito tal como se contém, ou seja, atualizado, para não ser diminuído pelos efeitos da inflação, e

também acrescido dos juros da mora.

RE 594892 AgR-ED-EDv/RS, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 1.7.2020. (RE-594892)

(Informativo 984, Plenário)

Simetria Federativa

Tribunal de contas e autonomia municipal – 2 O Plenário, em conclusão e por maioria, julgou improcedente pedido formulado em duas ações

diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra o art. 151, caput e parágrafo único, da Constituição do

estado de São Paulo, que estabelece que o Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM-SP) será

composto por cinco conselheiros, aos quais deverão ser aplicadas as normas pertinentes aos conselheiros

do Tribunal de Contas estadual (Informativo 871).

Inicialmente, o colegiado apontou particularidades entre os Tribunais de Contas dos Municípios,

previsto no art. 31, § 1º, da Constituição Federal (CF) (1), e os Tribunais de Contas do Município, apenas

existentes nos municípios de São Paulo e Rio de Janeiro. Os primeiros são órgãos estaduais criados por

deliberação autônoma dos respectivos estados-membros, com a finalidade de auxiliar as Câmaras

Municipais na atribuição de exercer o controle externo, sendo estes órgãos do Tribunal de Contas

estadual. Já o Tribunal de Contas do Município (de São Paulo e do Rio de Janeiro) é órgão independente

e autônomo, pertencente à estrutura da esfera municipal, com a função de auxiliar a Câmara Municipal no

controle externo da fiscalização financeira e orçamentária do respectivo município.

Destacou que o art. 31, § 4º, da CF (2) veda que os municípios criem seus próprios tribunais,

conselhos ou órgãos de contas. Isso, entretanto, não implicou a extinção do TCM-SP e do TCM-RJ,

criados sob a égide de regime constitucional anterior.

Embora a autonomia municipal seja princípio constitucional, ela é limitada pelo poder constituinte

em inúmeros pontos, como, por exemplo, no que proíbe os municípios de criar suas Cortes de Contas.

Page 24: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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Nesse contexto, afirmou que a Constituição do estado de São Paulo não fere a autonomia municipal ao

dispor sobre o Tribunal de Contas do Município, mas, ao contrário, a prestigia.

Asseverou que a norma impugnada não faz menção à regra de equiparação de vencimentos dos

conselheiros do Tribunal de Contas do Município aos dos conselheiros do Tribunal de Contas do Estado.

Conforme a jurisprudência desta Corte, o art. 75 (3) da CF estabelece a imposição do modelo federal do

Tribunal de Contas da União. Entretanto, não se pode interpretar analogicamente que os conselheiros

municipais teriam seus vencimentos equiparados aos dos conselheiros estaduais. A fixação da

remuneração dos conselheiros cabe ao município (mesmo que em valor diverso do fixado para os

conselheiros estaduais), uma vez que ele dispõe de autonomia para deliberar sobre os vencimentos de

seus servidores.

Ademais, a Constituição estadual, ao fixar, de forma idêntica à Lei Orgânica do Município de São

Paulo, que o TCM-SP deve ser composto por cinco membros, não ofende o princípio da simetria. É

razoável que um tribunal de contas municipal tenha um número inferior de conselheiros ao dos tribunais

de contas dos estados.

Vencido o ministro Marco Aurélio que julgou as ações procedentes, por vislumbrar desrespeito à

autonomia municipal. De acordo com o ministro, inexiste, na CF, preceito que autorize o estado a fixar

regras para os Tribunais de Contas municipais. Um órgão municipal deve ser estruturado pelo respectivo

ente federado.

(1) CF: “Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e

pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 1º O controle externo da Câmara Municipal será

exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.”

(2) CF: “Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e

pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. (...) § 4º É vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais.”

(3) CF: “Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização

dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios”.

ADI 346/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 3.6.2020. (ADI-346)

ADI 4776/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 3.6.2020. (ADI-4776) (Informativo 980,

Plenário)

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DIREITO PENAL

Crimes contra a Administração Pública e Legislação Penal Especial

Corrupção passiva e danos morais coletivos A Segunda Turma, ao concluir exame de ação penal, julgou parcialmente procedente denúncia

recebida em desfavor de um ex-deputado federal e um engenheiro civil, cujos fatos se referem à

concretização de acordo extrajudicial sobre a remuneração de serviços de praticagem entre empresas de

praticagem atuantes em certa zona portuária e a Petrobrás S/A.

No mérito, os réus foram: (i) condenados, em votação majoritária, pela prática do delito de

corrupção passiva, com incidência de causa de aumento apenas na reprimenda do ex-parlamentar; e (ii)

condenados, em votação unânime, pelo cometimento do delito de lavagem de dinheiro por dezenove

vezes. Ambos foram absolvidos, por unanimidade, das imputações remanescentes.

Na sequência, as penas e os respectivos regimes de cumprimento foram fixados, declarada a

extinção da punibilidade do engenheiro quanto ao delito de corrupção passiva, em razão do

reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal.

Acerca de outros efeitos da condenação, a Turma, por maioria: (i) fixou valor mínimo

indenizatório para a reparação dos danos morais coletivos em quantia a ser adimplida de forma solidária

pelos sentenciados; e (ii) assentou o prejuízo do pedido de perda de mandato parlamentar. Ademais, por

unanimidade: (i) não acolheu a pretensão de danos materiais; (ii) decretou, em favor da União, a perda

dos bens, direitos e valores objeto da lavagem em relação a qual foram condenados, ressalvado o direito

do lesado ou de terceiro de boa-fé; (iii) decretou a interdição dos condenados para o exercício de cargo ou

função pública de qualquer natureza e de diretor, de membro de conselho de administração ou de gerência

das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da Lei 9.613/1998, pelo dobro do tempo da pena privativa de

liberdade a eles aplicada; (iv) condenou-os ao pagamento das custas processuais e determinou a

expedição de guia de execução das reprimendas cominadas tão logo esgotada a análise das insurgências

cognoscíveis que venham a ser interpostas contra esta decisão.

Ao tratar do crime de corrupção passiva cometido pelo ex-deputado, o colegiado afirmou que o

tipo exige a demonstração de que o favorecimento negociado pelo agente público se encontre no rol das

atribuições previstas para a função que exerce. As circunstâncias fáticas verificadas permitem essa

conclusão no caso concreto.

Depois de refletir acerca do “presidencialismo de coalização”, compreendeu que se confere aos

parlamentares um espectro de poder para além da mera deliberação de atos legislativos, tanto que a

participação efetiva deles nas decisões de governo se dá com a indicação de quadros para o

preenchimento de cargos no Poder Executivo. Entretanto, há evidente “mercadejamento” da função

parlamentar quando o poder de indicar alguém para determinado cargo ou de dar sustentação política para

nele permanecer é exercido de forma desviada, voltado à percepção de vantagens indevidas.

A singela assertiva de que não compete ao parlamentar nomear ou exonerar alguém de cargos

públicos vinculados ao Poder Executivo desconsidera a organização do sistema presidencialista brasileiro.

Não fosse isso, deve-se ter em mente que a Constituição Federal (CF), expressamente, atribui aos

parlamentares funções que vão além da tomada de decisões voltadas à produção de atos legislativos.

Logo, é plenamente viável a configuração do delito de corrupção passiva quando a vantagem

indevida é solicitada, recebida ou aceita pelo agente público, em troca da manifestação da força política

que este detém para a condução ou sustentação de determinado agente em cargo que demanda tal apoio.

O exercício do mandato eletivo se faz de forma concomitante e indissociável à atividade partidária.

Esse contexto não encaminha à criminalização da atividade político-partidária, apenas responsabiliza os

atos de pessoas que, na condição de parlamentares, transbordam os limites do exercício legítimo da

representação popular.

Vencidos, no ponto, os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que desclassificaram a

infração para o crime de tráfico de influência. Para eles, a vantagem indevida teria sido recebida a

pretexto de influir em ato praticado por funcionário público.

O ministro Ricardo Lewandowski entendeu que as vantagens auferidas não estavam vinculadas a

ato de ofício ou a conjunto de atribuições inerentes ao cargo parlamentar. Noutro ponto, ainda admitiu a

coexistência da prática do delito de tráfico de influência e de lavagem de dinheiro pelo mesmo agente,

desde que se comprove a realização de dolos distintos para cada um deles.

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Já, na compreensão do ministro Gilmar Mendes, os valores recebidos não estavam vinculados ao

exercício das funções de deputado federal. O fato determinante não foi o mandato ocupado, mas a relação

pessoal de suposta influência que possuía junto a determinado funcionário público e não teria a ver com a

manutenção do funcionário na empresa. Além disso, o ministro ponderou não caber a aplicação aos

titulares de mandatos eletivos do incremento de pena previsto em parágrafo próprio do preceito do delito

de corrupção passiva. Isso ocorre em virtude da impossibilidade do uso da interpretação extensiva. Viola

ainda a proibição de dupla punição pelo mesmo fato.

Em outro passo, a Turma não acolheu o pedido do Ministério Público quanto à fixação de danos

materiais. Considerou impassível de cognição na seara processual penal, pois os limites de conhecimento

definidos nos autos não se mostram adequados à mensuração do possível dano material advindo das

condutas dos imputados.

Assinalou que a prestação jurisdicional pode ficar eventualmente reservada ao juízo cível

competente, mediante instrumentos próprios de definição de responsabilidade civil.

Ao acolher a pretensão relativa aos danos coletivos, o colegiado entendeu que o ordenamento

jurídico também tutela, no âmbito da responsabilidade, o dano moral na esfera individual e na forma

coletiva, conforme o inciso X do art. 5º da Constituição Federal (CF) (1); o art. 186 do Código Civil

(CCv) (2); e, destacadamente, o inciso VIII do art. 1º da Lei 7.347/1985 (3).

Na tutela dos direitos coletivos em sentido amplo, a doutrina admite, de longa data, a configuração

da responsabilidade civil decorrente de dano moral coletivo com base na prática de ato ilícito. Considerou

ser nessa direção que o Poder Constituinte originário se postou à luz dos objetivos fundamentais

elencados no art. 3º (4) e declarados no preâmbulo da CF.

Por fim, avaliou estar presente o dever de indenizar nos termos do art. 927 do CCv (5).

O ministro Celso de Mello reputou ser legítima a condenação, especialmente ao se considerarem a

natureza e a finalidade resultantes do reconhecimento de que se revestem os danos morais coletivos cuja

metaindividualidade, caracterizada por sua índole difusa, atinge, de modo subjetivamente indeterminado,

uma gama extensa de pessoas, de grupos e de instituições.

Vencido, no ponto, o ministro Ricardo Lewandowski, que afastou a possibilidade de se processar a

condenação ao dano moral no próprio processo penal, no que foi acompanhado pelo ministro Gilmar

Mendes. Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, o processo coletivo situa-se em outro âmbito, no

qual não se leva em consideração o direito do indivíduo, e sim os direitos coletivos de pessoas que

pertençam a determinado grupo ou ao público em geral. Na espécie, inexiste ambiente processual

adequado para a análise de dano moral coletivo, o que recomenda o exame da querela em ação autônoma.

Sobre a proposta de perda do mandato eletivo, a Turma julgou ter havido a perda do objeto.

Com o término da Legislatura 2015-2019, encerrou-se o mandato político do denunciado. A

despeito de ter reassumido o mandato de deputado federal na Legislatura 2019-2023, na qualidade de

suplente, não mais se encontra no exercício desse cargo parlamentar.

No particular, vencido o ministro Ricardo Lewandowski, que não considerou prejudicado o pedido

e se manifestou contra a perda do mandato, no que foi seguido pelo ministro Gilmar Mendes. O ministro

Ricardo Lewandowski aduziu, ademais, que, apesar de o réu ter se afastado na legislatura em curso, nada

impede que ele retorne a qualquer momento. A sua posição de deputado suplente persiste integralmente.

(1) CF: “Art. 5º (...) X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito

a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”

(2) CCv: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

(3) Lei 7.347/1985: “Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de

responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (...) VIII – ao patrimônio público e social.” (4) CF: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre,

justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades

sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

(5) CCv: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo

único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

AP 1002/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 9.6.2020. (AP-1002) (Informativo 981,

Segunda Turma)

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Reincidência

Comprovação da reincidência – Inexistência de forma específica

A Primeira Turma negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão que indeferiu a

ordem de habeas corpus impetrado em face de acórdão do Superior Tribunal de Justiça.

Nas razões do agravo regimental, a defesa insistiu na existência de ilegalidade no reconhecimento

da reincidência em desfavor da paciente. Alegou que a reincidência foi reconhecida com base em

informações processuais extraídas dos sítios eletrônicos de tribunais — documentação precária e,

portanto, sem aptidão para comprovar o trânsito em julgado de condenações anteriores.

O colegiado considerou que, conforme jurisprudência da Corte, para fins de comprovação da

reincidência, é necessária documentação hábil que traduza o cometimento de novo crime depois de

transitar em julgado a sentença condenatória por crime anterior, mas não se exige, contudo, forma

específica para a comprovação [Código Penal (CP), art. 63] (1).

Nessa linha, não há ilegalidade no ato dito coator, no ponto em reconhecida a existência de

reincidência a partir do uso de informações processuais extraídas dos sítios eletrônicos de tribunais.

Ademais, a verossimilhança das informações que embasaram o reconhecimento da reincidência

não foi superada pela defesa, que apenas apontou ser precária a documentação que a lastreia. Ou seja, a

defesa repisa a inviabilidade da reincidência pela mera repulsa à forma pela qual essa agravante fora

reconhecida na origem, mas não traz prova pré-constituída apta a desconstituir seu conteúdo. Inviável,

dessa forma, concluir de forma diversa das instâncias ordinárias.

(1) CP: “Art. 63 – Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença

que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior.”

HC 162548 AgR/SP, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 16.6.2020. (HC-162548) (Informativo

982, Primeira Turma)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Legitimidade

Procurador municipal e interposição de recurso extraordinário Os procuradores públicos têm capacidade postulatória para interpor recursos extraordinários contra

acórdãos proferidos em sede de ação de controle concentrado de constitucionalidade, nas hipóteses em

que o legitimado para a causa outorgue poderes aos subscritores das peças recursais. Com base nesse

entendimento, o Plenário deu provimento a embargos de divergência, para admitir recurso extraordinário.

No caso, embora a petição de recurso extraordinário não tenha sido subscrita por prefeito

municipal, mas somente por dois procuradores, sendo um deles o chefe da procuradoria do município, há,

nos autos, documento com manifestação inequívoca do chefe do Poder Executivo, conferindo poderes

específicos aos procuradores para instaurar o processo de controle normativo abstrato de

constitucionalidade, bem como para recorrer das decisões proferidas nos autos.

Vencidos os ministros Edson Fachin, Luiz Fux e Celso de Mello, que negaram provimento aos

embargos de divergência. Pontuaram que tanto para a propositura de ação quanto para a interposição de

recursos, é necessária a presença da assinatura do legitimado para a causa.

RE 1068600 AgR-ED-EDv/RN, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 4.6.2020. (RE-

1068600) (Informativo 980, Plenário)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO

Execução

Reclamação: Tema 253 da repercussão geral, Metrô-DF e execução Em conclusão de julgamento, a Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental

para julgar improcedente reclamação deduzida pela Companhia do Metropolitano do Distrito Federal

(Metrô-DF), entendendo legítima a cobrança de dívida mediante fórmula que se fixa no pagamento

devido por qualquer entidade.

Na reclamação, o Metrô-DF sustentava que o ato reclamado não teria observado a autoridade de

pronunciamento do Supremo Tribunal Federal (STF) proferido, em sede de repercussão geral, no RE

599.628 (Tema 253) (1), bem como em outros julgados similares referentes à aplicação do rito da

Fazenda Pública a empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos

essenciais e em regime de monopólio.

O colegiado não vislumbrou aderência entre a decisão reclamada e o entendimento fixado no

Tema 253 da repercussão geral.

O ministro Roberto Barroso salientou que o Metrô-DF é empresa pública, regida pelo direito

privado. A seu ver, embora preste serviço de utilidade pública, a empresa não presta serviço público

essencial em sentido típico ou de caráter monopolístico.

Ademais, o Distrito Federal está em atraso com seus precatórios desde 2004. Logo, a determinação

de que seja paga a dívida por precatório significa pura e simplesmente que o credor sofrerá calote

inequívoco ou, no mínimo, se essa ordem continuar, que irá aguardar pouco mais de dezesseis anos para

receber seu crédito. Considerou isso negação de justiça.

De acordo com o ministro Marco Aurélio, não é possível tomar de empréstimo o que decidido no

mencionado tema para estender-se às pessoas jurídicas de direito privado.

O ministro enfatizou que o Metrô-DF tem contabilidade própria e seu orçamento não é alcançado

pelo art. 100 da Constituição Federal (CF) (2). A empresa é concessionária de serviço público e, como as

concessionárias em geral, responde pelos débitos trabalhistas e pelos débitos comuns.

Por sua vez, a ministra Rosa Weber explicitou que a reclamação foi ajuizada na vigência do

Código de Processo Civil de 2015, que admite o cabimento para garantir a observância de acórdão

proferido em repercussão geral reconhecida, desde que esgotadas as instâncias ordinárias. Em atenção à

finalidade do sistema de repercussão geral, decisões do STF ressaltam a excepcionalidade do cabimento

da reclamação nessa hipótese.

Esclareceu que, além do esgotamento das instâncias, constitui pressuposto de cabimento a

demonstração de teratologia na decisão reclamada quanto à subsunção do caso individual, representado

pela controvérsia objeto do recurso extraordinário, à decisão proferida em repercussão geral.

Acentuou que, na espécie, a admissibilidade do recurso extraordinário interposto pelo Metrô-DF

foi negada, tendo em vista o reconhecimento, na decisão reclamada, do desenvolvimento de atividade

econômica com a exploração comercial de marcas, patentes, tecnologia e serviços técnicos

especializados, com a distribuição de dividendos, o que permite a penhora de seus bens.

Nesse contexto, em que expressamente registrada a distribuição de lucros entre os acionistas da

empresa, não está demonstrada a teratologia na aplicação do entendimento do STF. Não há como concluir

numa teratologia que permita a solução da controvérsia em reclamação, mesmo que se esteie em

descumprimento contrario sensu do tema.

Em reforço, o fato de a matéria estar em exame na ADPF 524 MC-Ref, com voto do relator

propondo a conversão em julgamento definitivo e o não referendo da liminar, que ele próprio deferira,

quanto ao Metrô-DF (Informativo 934).

Vencidos os ministros Luiz Fux (relator) e Alexandre de Moraes, que deram parcial provimento ao

agravo para arbitrar novo valor da causa e, consectariamente, readequar a condenação em honorários

sucumbenciais, assentada no ato agravado. Para eles, o Metrô-DF deve ser submetido ao regime de

execução pela via dos precatórios, pois presta serviço público de natureza essencial, atua de maneira

deficitária e é custeado pela Fazenda Pública, dentre outros motivos. O ministro Alexandre de Moraes

avaliou que o Metrô não tem concorrência, porque os sistemas modais se complementam e não

concorrem entre si.

Page 30: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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(1) Tema 253 da repercussão geral: “Sociedades de economia mista que desenvolvem atividade econômica em regime

concorrencial não se beneficiam do regime de precatórios, previsto no art. 100 da Constituição da República.”

(2) CF: “Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude

de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este

fim.”

Rcl 29637 AgR/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em

30.6.2020. (Rcl-29637) (Informativo 984, Primeira Turma)

Page 31: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

Habeas Corpus

Cabimento de habeas corpus e liberdade de ir e vir A Primeira Turma, por maioria, indeferiu a ordem de habeas corpus impetrado em favor de

vereadora, denunciada pela prática do delito de peculato, em razão de, na qualidade de presidente da

Câmara Municipal, ter contratado servidora pública para realização de serviço de faxina, prestado na casa

de seu irmão.

No caso, o Ministério Público solicitou a prisão preventiva da paciente. O tribunal de justiça

indeferiu o pedido, mas determinou as seguintes medidas alternativas: a) afastamento do cargo de

vereadora e da função de presidente da Câmara dos vereadores; b) comparecimento bimestral em juízo; c)

proibição de acesso e frequência à câmara municipal; d) proibição de manter contato com testemunhas; e)

proibição de ausentar-se do estado e do País, com a entrega de passaporte; e f) obrigação de manter

atualizado, no tribunal, o endereço.

Na impetração, a paciente alegou a desproporcionalidade das medidas. Sublinhou inobservados os

princípios da não culpabilidade e do devido processo legal. Aduziu o excesso de prazo das cautelares.

Preliminarmente, a Turma, por maioria, conheceu do writ. Reputou-se que, descumprida a medida

alternativa, é possível o estabelecimento da custódia, alcançando-se o direito de ir e vir. Vencidos, no

ponto, os ministros Luiz Fux e Rosa Weber, que não conheceram da impetração por entenderem que o

cabimento de habeas corpus diz respeito exclusivamente à liberdade de ir e vir, que não se confunde com

a liberdade de exercício de uma atividade profissional.

Quanto ao mérito, a Turma não vislumbrou ilegalidade nas medidas alternativas decretadas pelo

tribunal de justiça. Vencido o ministro Marco Aurélio, que deferiu a ordem para viabilizar o exercício do

cargo de vereadora pela paciente, com o consequente acesso às dependências da casa legislativa. O

ministro salientou que, sem a formação da culpa, a constrição perdura por mais de um ano.

HC 170735/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em

30.6.2020. (HC-170735) (Informativo 984, Primeira Turma)

Nulidades

Nulidade e inquirição de perguntas realizadas diretamente pelo juiz A Primeira Turma, ante o empate na votação, concedeu a ordem de habeas corpus para assentar a

nulidade processual a partir da audiência de instrução e julgamento. Além disso, afastou a prisão

preventiva do paciente, por excesso de prazo, com extensão da medida aos demais corréus que se

encontram na mesma situação.

No caso, a defesa alegou nulidade processual por desrespeito ao art. 212 do Código de Processo

Penal (CPP) (1), por ter o juízo inquerido diretamente as testemunhas. A magistrada que presidia a

audiência reputou observados o contraditório e a ampla defesa, porque oportunizado aos defensores e ao

órgão acusador fazerem questionamentos e colocações no tocante aos depoimentos prestados.

Os ministros Marco Aurélio (relator) e Rosa Weber concederam a ordem. Consideraram que não

foi respeitada a aludida norma processual.

Por sua vez, os ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux concederam a ordem, em menor

extensão, para revogar a prisão preventiva em razão de o paciente ter cumprido mais da metade da pena

inicialmente imposta. Para eles, a alteração efetuada no art. 212 do CPP, ao permitir que as partes façam

diretamente perguntas às testemunhas, não retirou do juiz, como instrutor do processo, a possibilidade de

inquiri-las diretamente.

(1) CPP: “Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que

puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (Redação dada pela

Lei nº 11.690, de 2008); Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição.”

Page 32: número 100 0 - STF...que as matérias já foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em outras ações diretas (ADI 3.105, ADI 3.128, ADI 3.138). No mérito, a Corte julgou

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HC 161658/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 2.6.2020. (HC-161658) (Informativo 980,

Primeira Turma)

Processos em espécie

Julgamento de promotor de justiça e interrogatório – 2 A Turma, em conclusão, indeferiu, com ressalvas quanto ao cabimento, a ordem de habeas

corpus, impetrado em favor de promotor de justiça condenado, pelo respectivo tribunal, à pena de 1 ano e

9 meses de reclusão pela prática dos crimes de falsidade ideológica e advocacia administrativa

(Informativo 970).

De acordo com a defesa, o julgamento seria nulo por não ter observado o art. 400 do Código de

Processo Penal (CPP) (1), já que o interrogatório do acusado não foi o último ato da instrução.

O colegiado entendeu que a situação dos autos não se submete à regra geral do art. 400 do CPP.

Por se tratar de promotor de justiça, julgado perante o tribunal de justiça, a norma aplicável à espécie é a

do art. 7º da Lei 8.038/1990 (2), segundo a qual a audição do acusado é o primeiro ato do procedimento.

Em voto-vista, o ministro Alexandre de Moraes reputou não se verificar ilegalidade apta a

desconstituir o acórdão emanado do tribunal estadual, haja vista que, no caso, a defesa não indicou o

prejuízo sofrido pelo paciente nem de que modo a realização de novo interrogatório o beneficiaria. É

cediço que não haverá declaração de nulidade quando não demonstrado o efetivo prejuízo causado à parte

(pas de nullité sans grief).

(1) CPP: “Art. 400. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias,

proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta

ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado.”

(2) Lei 8.038/1990: “Art. 7º. Recebida a denúncia ou a queixa, o relator designará dia e hora para o interrogatório,

mandando citar o acusado ou querelado e intimar o órgão do Ministério Público, bem como o querelante ou o assistente, se for o caso.”

HC 178252/ES, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 2.6.2020. (HC-178252) (Informativo 980,

Primeira Turma)

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DIREITO TRIBUTÁRIO

Tributos

Compra de óleo básico e incidência de ICMS

A Primeira Turma, por maioria, negou provimento a agravo interno em recurso extraordinário em

que se alegava a não incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em

operações interestaduais com combustíveis, diante da imunidade prevista no art. 155, § 2º, X, b, da

Constituição Federal (CF) (1).

O colegiado entendeu incidirem, na hipótese, os Enunciados das Súmulas 279 e 280 do STF. Isso

porque o acórdão recorrido concluiu, com base no acervo probatório dos autos, que o estado reputou ser

fato gerador do imposto a aquisição interna da mercadoria “óleo básico”, ou seja, a aquisição desse óleo

dentro do estado, e não a operação interestadual de venda de lubrificantes. Além disso, a controvérsia não

foi decidida a partir da interpretação de dispositivos da Constituição, mas exclusivamente com apoio no

aludido acervo fático-probatório e na análise da legislação local (Resolução SEF 2900/1998).

Frisou, ademais, a inexistência, nos autos, de qualquer comprovação de eventual remessa

interestadual desse óleo básico adquirido no mercado interno e objeto da autuação, nem de recolhimento

do ICMS no estado de destino.

O ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator na conclusão, mas não na fundamentação.

De acordo com o ministro, é constitucional a análise do ciclo econômico, ou seja, a verificação se a

compra de óleo básico compõe, ou não, o ciclo econômico da produção de lubrificantes, para venda para

outro estado. É uma análise jurídica, porque senão não seria possível examinar se incide, ou não, durante

o ciclo de produção econômica, a imunidade constitucional. Considerou, entretanto, que, no caso, como

salientado pelo relator, não houve comprovação, nos autos do mandado de segurança impetrado pela

empresa recorrente, de que o óleo básico, pelo qual autuada, foi efetivamente utilizado na produção do

lubrificante vendido a outro estado.

Vencidos os ministros Luiz Fux e Marco Aurélio em diferentes extensões.

O ministro Luiz Fux proveu o agravo interno para conhecer do recurso extraordinário e reconhecer

a repercussão geral da questão nele discutida. Para ele, o que está em pauta é o debate acerca da

incidência de ICMS na atividade de comercialização de óleos lubrificantes, a partir da aquisição do óleo

básico como insumo para o produto final. A súmula 279 do STF não é aplicável aos casos de subsunção

da norma constitucional aos fatos incontroversos postos nos autos do processo. A aplicação, ou não, da

regra de imunidade do art. 155, § 2º, X da CF a determinadas operações não encerra discussão de matéria

infraconstitucional ou questão de aplicação de direito local. Sob o aspecto jurídico, cabe à Corte delimitar

o alcance da regra imunizante do art. 155, § 2º, X, b, da CF. Quanto aos aspectos políticos e sociais, a

imunidade constitucional do ICMS incidente nas operações que destinem a outros estados petróleo,

inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica assenta-se em

uma premissa de justiça entre os entes federados, de modo a evitar um favorecimento desproporcional dos

estados-membros detentores desses recursos naturais em detrimento de outros, que seriam, naturalmente,

consumidores desses recursos. Em relação ao aspecto econômico, tem-se discussão acerca da existência

de limite para o exercício da competência tributária pelos entes da Federação.

Por sua vez, o ministro Marco Aurélio proveu o agravo para, julgando de imediato o recurso

extraordinário, reformar o acórdão proferido pelo tribunal de origem e assentar que não se tem como

dividir, considerado o preço final do produto, partes componentes desse produto para dizer-se da

incidência, relativamente a este ou aquele insumo, do ICMS. A seu ver, há incidência da projeção no

tempo da cobrança do produto, presente o princípio alusivo ao destino da mercadoria, como previsto a

alínea b do inciso X do parágrafo 2º do art. 155 da CF.

(1) CF: “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II – operações relativas

à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (...) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...) X – não

incidirá: (...) b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos

dele derivados, e energia elétrica;”

RE 642564 AgR/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 30.6.2020. (RE-642564)

(Informativo 984, Primeira Turma)

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