“ninguÉm sabe quais sÃo os critÉrios da cert” · “ninguÉm sabe quais sÃo os ... por...

12
25 Dezembro 2000 Revista Adusp Entrevista DALMO DALLARI “NINGUÉM SABE QUAIS SÃO OS CRITÉRIOS DA CERT” Fotos: Daniel Garcia

Upload: vuongdan

Post on 05-Jan-2019

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

25

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

EEnntt rreevv ii ss ttaaDALMO DALLARI

“NINGUÉM SABEQUAIS SÃO OS

CRITÉRIOS DA CERT”

Fotos: Daniel Garcia

26

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp

Atualmente, a Comissão Especial de Regimes de Trabalho(CERT) está presa a modismos e a uma visão puramente

administrativa da atividade dos docentes. Supervaloriza apesquisa e a publicação de artigos no exterior, ao passo quedesconsidera a docência: “É como se dar aula não tivesse

importância. A experiência comprova que sem boas aulas nãohá bom pesquisador”. São convicções do professor DalmoDallari, membro da CERT no início da década de oitenta e ex-diretor da Faculdade de Direito da USP (1986-1990).

Dallari diz que é preciso haver um esclarecimento geral a respeito dos regimes especiais de trabalho. Afirma que

a inexistência de critérios de avaliação claros e uniformes abre caminho a decisões arbitrárias da CERT. Por isso,defende a rediscussão do papel dessa comissão central, dos critérios que aplica e da sua composição. Pede a

democratizaçãoda CERT. Chama atenção para o papeldecisivo dos departamentos na avaliação dos docentes.

Na sua opinião, a USP afundou no marasmo e enquadrou-sena “desordem nacional chamada de ordem”, traduzida pela imposição à vida universitária

de padrões meramente burocráticos, econômicos, produtivistas. “É preciso um pouco mais de rebeldia”, propõe.

A entrevista à Revista Adusp teve lugar na Faculdade de SaúdePública da USP e foi concedida a Lucília Daruiz Borsari, Marcos

Nascimento Magalhãese Pedro Estevam da Rocha Pomar.

27

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

Revista Adusp- Professor, qualé a sua área no Direito?

Dallari- Minha área acadêmicase chama Teoria Geral do Estado.Mas essa disciplina é consideradauma introdução ao Direito Consti-tucional. Então eu poderia dizerque minha área é o Direito Público,toda aquela parte do Direito queenvolve relações com o Estado.

Revista Adusp- O sr. é profes-sor titular?

Dallari- Sou professor titular,fiz o concurso em 1974, mas naverdade estou dentro da USP des-de 1953. Entrei através de vestibu-lar em 1953, terminada a gradua-ção não havia naquela ocasião cur-so de mestrado e doutorado mashavia um curso de especialização,e eu fiz algumas especializações. Elogo em seguida fiz a livre-docên-cia e nunca mais saí. Então na ver-dade estou dentro da USP desde1953. Já vi muita coisa.

Revista Adusp- Que cargos o sr.já exerceu?

Dallari- Entre outras coisas eufui diretor da Faculdade de Direi-to. Era um cargo que gostaria mui-to de exercer, exatamente porqueme considero intelectualmente umfilho daquela faculdade. Muitofrancamente, sempre achei que serdiretor da Faculdade de Direitoera mais importante do que ser rei-tor da USP. Não que eu menospre-ze o cargo de reitor, mas é que deDireito e de Faculdade de Direitoeu entendo, então achava que po-dia fazer alguma coisa no sentidode melhorar, de atualizar métodos,de dar condições melhores para os

professores, os alunos, e acreditoque tenha conseguido efetivamen-te isto. Só para exemplificar: comodiretor, e tendo o apoio do reitorGoldemberg, eu consegui verbapara construir um edifício anexoao prédio tradicional da Faculdadede Direito do Largo de São Fran-cisco. Na verdade, esse prédio con-tinha em si vários objetivos. Umdeles era o aumento de espaço,porque o prédio tradicional foiplanejado e construído em 1932. Onúmero de alunos de lá para cá au-mentou muito. Em 1932 não haviacurso noturno, a biblioteca eramuito menor, não existiam depar-tamentos. Assumi a diretoria em1986, as instalações eram insufi-cientes, inadequadas. Antigas salasde aula tinham se transformadoem departamentos. Na mesma salahavia a secretaria do departamen-to, a sala de reuniões e a bibliote-ca. Evidente que assim não davapara trabalhar, para fazer seminá-rios, e não havia na escola umaúnica sala para seminários, só paraconferências. Porque em 1932 aidéia de uma aula era uma confe-rência. Na verdade o que pretendifoi a ampliação de espaço, mascriar espaço adequado para a indu-ção de novos métodos de trabalhoe de ensino. Isso efetivamente pos-so afirmar que consegui. Consegui-mos colocar lá 21 salas para semi-nários, e o que verifico hoje é quemuitos professores estão usando,mudaram sua metodologia, e osprofessores novos que vêm che-gando já têm o seu espaço adequa-do. Além disso, no prédio antigonão havia uma única sala de traba-lho para o professor. Ficava estra-

nho isso: o professor em dedicaçãointegral e não tem uma sala de tra-balho? O professor era obrigado aatender alunos e outras pessoasnos corredores, ou atender nagrande sala dos professores, ondenos intervalos os professores sereúnem para conversar e tomar umcafezinho. Evidente que isso erainadequado também. Então achoque consegui ser diretor razoável.Além do mais, quando assumi nãohavia um único computador na Fa-culdade. Quando saí, tinha infor-matizado toda a administração e játinha iniciado a informatização dabiblioteca. Criei também uma vi-deoteca, achei que era importantetermos uma coletânea de palestras,de seminários, para que se faça adiscussão em torno disso. Traba-lhei muito no sentido de mudarmétodos, de dar um sentido maisdinâmico, crítico e com a partici-pação do estudante. Dessa manei-ra marquei minha passagem peladiretoria da Faculdade de Direito.

Revista Adusp- Professor, omotivo principal desta nossa con-versa é a CERT: são as atividadesque a CERT vem desempenhandoe que vêm provocando grande in-satisfação dos docentes pelos mé-todos que esse organismo vemadotando. Então, para começar, osr. deve ter recebido o parecer daassessoria jurídica da Adusp,gostaríamos de saber sua opiniãosobre as questões que esse pare-cer suscita.

Dallari- Eu mesmo já fui mem-bro da CERT, conheço algumascoisas que acontecem na CERT,como acontecem, e alguns pontos

precisariam ficar mais claros eatualmente não estão. Na verdade,a própria idéia de regime especialde trabalho, que justifica a existên-cia da CERT, para muitos não fi-cou clara. Quando falo muitos, in-cluo docentes da USP e tambémmembros da CERT. Assim, enfren-tei esse tipo de problema: o docen-te que entende o regime especialcomo uma possibilidade de ganharmais, pura e simplesmente. Querdizer, não encara como uma novaresponsabilidade. Se ele vai ga-nhar mais é porque vai trabalharmais e vai trabalhar diferente. Oenvolvimento dele em pesquisanão se exige em RTP, mas a partirjá do RTC é indispensável, e noRDIDP muito mais. E tambémqual é a diferença entre uma dedi-cação integral e uma dedicação ex-clusiva. Que significa uma dedica-ção integral física, ou uma dedica-ção integral que mesmo que nãoseja física esteja sempre presente,que implique sempre a prioridadepara a USP. Essas coisas nunca fo-ram tornadas muito claras, e hojeestão fazendo falta: especialmentepor causa de conflitos que tem ha-vido, seria muito importante esta-belecer isso. Por exemplo, partici-pei de discussões em que docentesde algumas áreas — dou sempreum exemplo, da Matemática —afirmavam que o único regime ver-dadeiramente universitário é oRDIDP, e eu jamais concordei comisso. Eu, que estou em RDIDP hámuitos anos, decidi isto exatamen-te quando fui diretor: achei que sóseria bom diretor se tivesse umadedicação integralíssima. Uma dascoisas que fiz foi fechar meu escri-

tório de advocacia. Fechei. Depoisterminei o meu mandato de dire-tor, a prefeita Luiza Erundina meconvidou para secretário, que eraoutra atividade de dedicação inte-gralíssima, e a conseqüência é quenunca mais reabri meu escritóriode advocacia. Mas do ponto de vis-ta normal, de atividades comuns, oprofessor de Direito, para ser um

bom professor, deve ter atividadesfora da universidade. Ele deve sa-ber o que está acontecendo nos tri-bunais, se não ele vai ensinar o Di-reito dos livros e não o Direito daverdade, da prática. Ele tem quesaber o que é que o Ministério Pú-blico está fazendo, até a Polícia.Então ele tem que ter algum con-tato com a advocacia. O que nãoimpede que ele tenha uma dedica-ção integral e dê efetivamente aprioridade à USP, que ele orientepesquisas, que ele receba alunos, eque ele participe da administração

da escola. Então é diferente doprofessor que vai ter essa dedica-ção integral física, significando queele vai chegar na escola de manhãe vai ficar lá até a noite. Em algu-mas atividades isso é possível, tal-vez até seja bom, mas em outrasnão é o ideal. Por isso acho neces-sário que se faça uma discussão,para tornar mais claro o que é oregime. Porque na verdade essesregimes especiais foram criados hámuito tempo, em outra circunstân-cia, e agora estamos vendo que hámuita incompreensão, e é necessá-rio então rediscutir a questão.

Revista Adusp- Tem havido,professor, uma série de conflitosentre, digamos, a opinião do De-partamento, e eventualmente aopinião da Congregação, e a opi-nião da CERT. Os departamentostêm um procedimento na renova-ção dos contratos. Claro que issoera até algum tempo atrás cir-cunscrito aos famosos precários,que aliás tivemos a oportunidadede debater alguns anos atrás. Ho-je, ao que parece, está havendo,vamos chamar assim, uma certaofensiva da Reitoria não somentesobre os professores precários,mas sobre todo e qualquer docentecujo currículo ou relatório de ati-vidades por alguma razão passepela CERT. Queremos saber suavisão dessa relação: o Departa-mento tem certa opinião sobre odocente, a Congregação tem certaopinião, e a CERT eventualmenteentra com outros critérios, outrasquestões.

Dallari- Pelo que eu tenho vis-to, lido, e atualmente acompanha-

28

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp

“A CERT adotou algunscritérios que são

modismos, e se limitama uma verificação

quantitativa. E tambémqualitativa, quanto ao tipo de trabalho:

por exemplo, a quantidade de

publicações. Parece que é um dado religioso.

Se for publicação no exterior, consagra

qualquer um. É absurdo.É colonialismo cultural”

29

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

do com interesse, porque façoparte da USP, a CERT adotou al-guns critérios que são da moda,são modismos, e que se limitam auma verificação quantitativa, pra-ticamente isso. E também com aqualitativa, em certo sentido, mui-to mais quanto ao tipo de traba-lho. Assim, por exemplo, a quanti-dade de publicações. Parece que éum dado religioso. Além disso, sefor publicação no exterior, consa-gra qualquer um. Isto é absurdo.Para usar palavras um pouco pesa-das talvez, é colonialismo cultural.Quanta coisa de péssima qualida-de se publica nos Estados Unidos.E quanta coisa de ótima qualidadese publica no Brasil. O fato de ha-ver publicação no exterior não de-via significar grande coisa. Pelaminha própria experiência pessoaleu sei disso: quem tem amigos noexterior tem facilidade para publi-car. Podemos ter alguém que pro-duza coisas ótimas e que não pu-blique no exterior. Então é um cri-tério que, se for aplicado com exa-gero, leva à injustiça. Não faz averdadeira avaliação. Outro aspec-to que também me tem chamado aatenção, mas que não é novo, por-que já no meu tempo da CERTacontecia: a supervalorização dapesquisa. Isso também é completa-mente distorcido. Há séculos queas pessoas escrevem livros tendopesquisado. Pesquisa não é novi-dade. Se eu pego um livro de Ma-quiavel, a quantidade de informa-ções que ele tem sobre os povosda Antiguidade, sobre os procedi-mentos dos governos, só pode serfruto de pesquisa. Não foi por in-tuição, não foi por acaso que Ma-

quiavel disse aquilo, que tem com-provação na História. Então pes-quisa não é nada de novo. O quehá são certos métodos, certas con-venções a respeito de como pes-quisar. E o problema que se temcolocado, e este eu já enfrenteiquando era membro da CERT, éque se valoriza muito pouco a ati-vidade docente. É como se dar au-la não tivesse importância. O im-portante é pesquisar. E eu estoumuito convencido, e a experiênciacomprova isso, de que sem boasaulas não há bom pesquisador. Éimpossível. O pesquisador temque ter conceitos firmes. Tem quesaber do que ele está falando. Temque ter discutido, inclusive, a con-ceituação, além de ter refletido so-bre ela. E isso não se faz atravésda pesquisa, a pesquisa vem de-pois. Ele pode até, através da pes-quisa, contribuir para reformularconceitos, mas a conceituação bá-

sica tem que vir antes. Então émuito importante alguém que dêaulas. E na USP se tem verificadoisso: que especialmente quando setrata de turmas mais numerosas odocente foge dessa atividade. Masele foge porque além de ser umaatividade muito mais trabalhosa épouco valorizada. Isso também te-ria que ser repensado: a atividadede docência, dar aulas, é funda-mental. Não se começa com a pes-quisa e não tem sentido, é inviável,uma boa pesquisa se alguém nãotiver aprendido antes. Esse é umdos problemas que estão coloca-dos, pelo que tenho visto: a CERTvalorizando demais a produção deartigos, a produção de pesquisa, oque acaba resultando numa verifi-cação apenas quantitativa. Paraacrescentar mais um dado, e quenão é novidade, porque nós todosque estamos trabalhando na Uni-versidade sabemos disso, existem

“É fundamental aopinião do conselho do

departamento. Porque eleé o fiscal permanente. É

quem tem o contatodireto com o docente,

sabe o que cada um estáfazendo, como sabe

também das necessidadesdo departamento. Dissotambém a CERT deveriase lembrar. Talvez até sepudesse dizer: respeitarmais as decisões dos

conselhos dedepartamento”

as famosas associações de pesqui-sa: eu ponho seu nome no que eufizer, você põe o meu nome noque você fizer. Então temos gentecom uma produtividade fantástica.É impossível. Mas é por causa des-sa circulação de nomes e de favo-res. É uma associação, na verdade.Uma fraude, mas uma fraude queem parte é instigada, se não justifi-cada, pela supervalorização dapesquisa e da publicação. Então,“como é isto que vai ter valor, euquero pôr meu nome nisto”. Nãoimporta se eu faço ou não.

Revista Adusp- Uma perguntamais específica em relação aos ca-sos em que a CERT tem se envol-vido: na realidade, o que ocorre etem ocorrido nos últimos anos éque contrariamente às decisões dodepartamento e da unidade, demanter o docente por exemplo emregime de RDIDP, a CERT segun-do seus critérios — que são muitopouco claros — decide tirar essesdocentes do regime integral, ba-seada fundamentalmente nestaanálise de número de papers, arti-gos publicados no exterior. Isso,claro, gera muito constrangimen-to, muita indignação em todas asunidades. O que parece é que aprópria regulamentação da Uni-versidade não confere à CERT es-ses poderes. O artigo 201 do Regi-mento Geral diz com clareza que adecisão da mudança de regime detrabalho deve ser do conselho dodepartamento, e aí sim passar pe-las instâncias superiores para queelas dêem o aval, anuam sobre is-so. No entanto, ela tem feito isso, evários colegas têm perdido o tem-po integral.

Dallari- Essa questão envolveaspectos jurídicos que são funda-mentais. Antes de tudo é precisolembrar que o docente está ligadoà Universidade por um contrato, eo contrato gera direitos e obriga-ções para as duas partes. Quer di-zer, não é possível uma mudançade cláusula contratual pela vonta-de de uma das partes. A legislaçãoda Universidade fixa as condiçõespara que alguém entre no regimeespecial, e estabelece algumas re-gras para que alguém saia do regi-me especial. Mas, quando alguémé admitido no regime especial, esseregime faz parte do contrato: en-tão isto é ao mesmo tempo um di-reito do docente e uma responsa-bilidade do docente. Por essa ra-zão, não cabe uma eliminação dodocente de um regime sem que ha-ja uma razão objetiva e demonstra-da. Não é possível, por um critérioabsolutamente subjetivo, eliminaralguém. Ou por motivos que nãofiquem claros. O motivo tem queser esse: o regime exige certas coi-sas e o docente não está cumprin-do sua obrigação. Mas tambémnesse caso é importante lembrar aopinião do conselho do departa-mento. Na verdade, o primeiro fis-cal do cumprimento das obriga-ções do regime é o conselho do de-partamento. Eu já ouvi o argumen-to, que volta e meia aparece, deque há uma espécie de corporati-vismo, de ação entre amigos den-tro do departamento: o departa-mento tolera o docente que nãocumpre rigorosamente suas atri-buições. Quanto a isto, eu diriaque é mais do que tempo no Brasil— não é só na Universidade, mas

também na Universidade — de in-vertermos o critério. Nós partimosdo pressuposto de que todos sãodesonestos até prova em contrário.O pressuposto tem que ser exata-mente o oposto disso: todos sãohonestos até prova em contrário.Por que digo isso? Porque há essaidéia, que é um preconceito, e éum pressuposto, de que o docenteé desonesto e que vai ser apoiadopor outros desonestos. Então elesó fica no regime especial para ga-nhar mais, ninguém vai exigir nadadele, e o departamento vai tolerar.Isso pode acontecer, mas é excep-cional e não deve ser o pressupos-to. O pressuposto é exatamente ocontrário. O docente que pediu pa-ra entrar ou que ficou no regimeespecial está consciente de quetem mais responsabilidade, e o de-partamento é quem decide sobre adistribuição do tempo do docente,sobre as tarefas que ele vai execu-tar. Isso tudo é competência doconselho do departamento. Em ca-so de dúvida, é razoável que aCERT peça esclarecimentos, peçacomprovação. Aliás, quando setrata de renovação, ou entrada esaída em regime, ou quando acon-tece qualquer coisa que coloca odocente sob a verificação daCERT, isso sempre é feito median-te documentação. O docente mui-tas e muitas vezes, para muitas ra-zões, é obrigado a dizer o que estáfazendo, como está fazendo, ondeestá fazendo. Então existe, sim, umcontrole que é permanente. Issonão significa eliminar a CERT.Porque poder-se-ia dizer: “Bom, seé assim, então o departamento équem vai fazer o controle, não é

30

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp

31

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

preciso que haja a CERT”. É pre-ciso que haja a CERT, porque háuma diversidade muito grande desituações na Universidade. Háuma diversidade de critérios se-gundo as especialidades, por exem-plo exigir uma dedicação integralnuma matéria como Física é dife-rente de dedicação integral emMúsica. Por isso existe a necessi-dade de um órgão central com cer-tos critérios mais genéricos, nãomais específicos, critérios mais ge-néricos e que deverão ser unifor-mes, objetivos e claros. Sobretudoclaros. Isso é o que me parece queestá faltando. Há critérios que nin-guém sabe de antemão quais são ecom freqüência se tem a impres-são de que num determinado pro-cesso se resolveu aplicar determi-nado critério. Quer dizer, não é ocritério uniforme, previamente co-nhecido, que se aplicará a todos.Isso faz com que a decisão daCERT passe a ser uma decisão ar-bitrária. Aí há uma diferença emDireito que é fundamental: a dis-tinção entre o discricionário e oarbitrário. O arbitrário é contra alei: é fora da lei, despreza a lei. Is-so não se admite. Nenhuma autori-dade pode decidir arbitrariamente.O discricionário é aquele direitode tomar decisão em relação auma área, uma parte da atividade,que não se poderia prever antes,que não é sujeita ao regulamentoescrito. Por exemplo: devem existirregras a respeito de quando umpolicial deve usar sua arma. Entre-tanto, o policial na madrugada, pe-rante um assaltante, tem poder dis-cricionário. Não há uma regra es-pecífica para dizer: quando a rua

não estiver bem iluminada, se esti-ver sozinho, se houver tal e tal cir-cunstância, então pode usar a ar-ma. A lei não desce a esse porme-nor, o regulamento não desce. Aísobra uma parte de poder discri-cionário. Então, em relação àCERT, é preciso que haja certas re-gras, certas normas, previamente

publicadas, conhecidas de todos, eque se sabe que serão as regrasque vão nortear as decisões daCERT. Depois, a partir disso, den-tro dessas regras, é que a CERTdeverá observar a situação particu-lar de cada docente. Mas aí é fun-damental a opinião do conselho dodepartamento. Porque ele é o fis-cal permanente. É quem tem ocontato direto com o docente, sabeo que cada um está fazendo, comosabe também das necessidades dodepartamento em cada circunstân-

cia. Porque muitas vezes aconteceisso: o docente é obrigado a mudarde atividade, às vezes tem aconte-cido até de interromper determi-nada pesquisa. Por quê? Porque háum fato novo, um docente quemorre, que viaja ou que pede li-cença e obriga à redistribuição detarefas no departamento. Isso tudoacontece no departamento e o de-partamento é quem tem a respon-sabilidade pela vigilância disso epelo controle. Disso também aCERT deveria se lembrar. Talvezaté se pudesse dizer: respeitarmais as decisões dos conselhos dedepartamento.

Revista Adusp- Mas essa im-portância que a CERT de certamaneira tem na sua visão cabe noatual modelo? Porque no atualmodelo, o senhor sabe, o reitor es-colhe os treze. De certa maneira,os treze viram juízes de algumaforma. Será que dá certo esse mo-delo, nesse sentido mais democrá-tico, de respeito ao departamento?Dá para compatibilizar isso outem um certo erro…

Dallari- Pela maneira como ascoisas vêm acontecendo, seria mui-to bom que o próprio ConselhoUniversitário rediscutisse as comis-sões de regimes especiais. Quaissão os critérios? Quem vai esco-lher os membros? Com a necessi-dade de se fazer uma distribuiçãodos membros entre diferentes se-tores da universidade, exatamentepara que tenha sempre alguém queconheça o setor e seja capaz deprestar esclarecimentos. Mas semdúvida alguma é muito importanteque haja uma participação maior

“Os reitores forammudando a composição

da CERT, orientando a CERT num

determinado rumo. A visão que a unidade e o departamento têmnão é exclusivamenteadministrativa, nemdeve ser. É a visão

científica, a visão dadocência. A CERT está muito distante

disso, muitoinfluenciada por

critérios puramenteadministrativos. Isso criaum conflito inevitável”

da comunidade universitária até naescolha dos membros da ComissãoEspecial, especialmente porque es-sa comissão, além de influir na vi-da do docente, pode influir enor-memente na vida do departamen-to. Ela pode atrapalhar o departa-mento. É necessário que haja, apalavra pode soar um pouco forte,uma democratização da composi-ção e das decisões da CERT.

Revista Adusp- Professor, re-centemente houve o caso do Insti-tuto de Geociências, em que há umconflito claro entre o conselho dodepartamento e a própria unidadecomo um todo, que avalia positiva-mente os relatórios de quatro do-centes, e a CERT, que diz: “Não,eu quero reformar o regime de tra-balho desses docentes”. Como épossível superar esse conflito?Quer dizer, há uma lacuna aí…

Dallari- Pois é, por situaçõescomo essa é que seria importanterediscutir a própria CERT. Redis-cutir critérios. Porque tudo foi decerto modo se modificando semque alguém dissesse por que modi-ficar, como modificar. Tudo foi aosabor dos acontecimentos. Os rei-tores foram mudando a composi-ção da CERT, foram orientando aCERT num determinado rumo, aCERT foi ficando muito mais pre-sa a critérios administrativos doque a critérios científicos e acadê-micos. A visão que a unidade e odepartamento têm não é exclusiva-mente administrativa, nem deveser. É a visão científica, é a visãoda docência, é a visão da adminis-tração da unidade em função dassuas peculiaridades. A CERT estámuito distante disso. Ela está sen-

do atualmente muito mais influen-ciada por critérios puramente ad-ministrativos. Isso cria um conflitoinevitável. É a avaliação da mesmarealidade sob critérios que sãomuito diferentes.

Revista Adusp- Tomando umcontexto mais amplo: um docenteefetivo, que esteja no regime de de-dicação integral há vinte anos.Que garantias ele tem, constitucio-nais, para continuar fazendo seutrabalho? Ele recebe um certo sa-lário, tem um certo conjunto decompromissos, e digamos que odepartamento acha que ele estátrabalhando bem. Ele tem algumagarantia constitucional geral, doponto de vista trabalhista?

Dallari- Ele tem toda a garantiajurídica, porque, como já mencio-nei, ele está ligado à Universidadepor meio de um contrato. Contratoé um acordo de vontades que geradireitos e responsabilidades paraas duas partes. No momento emque ele foi admitido no regime es-pecial, ele assumiu a responsabili-dade, ele cria o direito. Então, emprincípio, ele tem esse direito ad-quirido em caráter permanente. Épreciso que se comprove que elenão está cumprindo a sua respon-sabilidade, os seus deveres, paraque ele possa ser retirado. Se oprofessor tem um certo padrão devida e tem toda a sua atividade di-recionada para a Universidade, derepente passa a ganhar menos, éclaro que isso pode causar proble-mas sérios para a pessoa e para suafamília. Então por isso é que existeo direito adquirido e a possibilida-de de discutir no judiciário o res-

peito a esse direito. Em princípio,o docente que entrou no regimeespecial não pode ser retirado. Pa-ra ser retirado, é preciso que pre-viamente se comprove que ele nãoestá cumprindo as suas obrigações.

Revista Adusp- Essa comprova-ção teria que ser algo próximo deum processo administrativo ousimplesmente uma autoridade di-zer “acho que você não está cum-prindo”, como de certa maneiratem sido?

Dallari- Não, isso exige o pro-cesso administrativo, inclusivecom o direito de defesa. Aliás éexpressão da Constituição o direi-to à ampla defesa. Porque é al-guém que está ameaçado de per-der um direito. E a perda de direi-tos tem que ser plenamente justifi-cada e tem que ser precedida dodireito de defesa. No caso, concre-tamente: a CERT decidiu que vaitirar um docente de regime espe-cial: é preciso que haja documen-tos, que haja provas, de que real-mente o docente não cumpre assuas obrigações. É preciso ouvir odepartamento, porque a próprialegislação da USP dá um papel im-portante ao departamento noacompanhamento do trabalho dodocente. Então é preciso saber dodepartamento, ouvir o departa-mento e até, eu diria, reiterar aodepartamento o pedido de esclare-cimentos. E se a CERT chega auma situação em que ela diz:“Bem, o departamento diz que odocente está cumprindo suas obri-gações, mas nós concluimos quenão”, então ela consulte o depar-tamento, diga quais são os motivos

32

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp

33

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

da sua divergência. E dê, inclusi-ve, oportunidade ao departamen-to de se justificar. Porque, sem dú-vida alguma, quando existe estadivergência, ela está levantandodúvida sobre a idoneidade do de-partamento.

Revista Adusp- É um julgamen-to, quase, do departamento.

Dallari- Quase do departamen-to. Porque ela está recusando umadecisão do departamento. Então épreciso que o departamento tam-bém seja ouvido sobre isso, alémdo docente, sem dúvida alguma,porque um direito adquirido estásendo ameaçado.

Revista Adusp- Nessa mesmalinha, a garantia constitucionalcontra a redução de salário tam-bém beira essa questão?

Dallari- Também tem um pa-pel, apesar de que se diz que o sa-lário é uma coisa, e o acréscimodecorrente do regime especial éoutra. Mas na verdade, ingressan-do no regime especial, o docenteadquire o direito ao salário maior.Então tem natureza salarial. Nãoé um prêmio, não é um presente.É uma remuneração por serviçoprestado, e em princípio tambémé irredutível.

Revista Adusp- E isso indepen-dentemente de o contrato ser pre-cário ou o docente ser concursado?

Dallari- Exatamente. Porque defato é um contrato de trabalho,não importa se é efetivo, se é pre-cário. A proteção que o efetivotem é muito maior, mas de qual-quer maneira em relação à remu-

neração valeria para os dois, por-que é um contrato. E um contratotem que ser respeitado pelas duaspartes. O que não se pode admitiré uma mudança por decisão deuma das partes sem que esteja pre-vista essa possibilidade de mudan-ça, essa hipótese de mudança.

Revista Adusp- A CERT nãopede relatórios para todo mundo.

Na verdade os relatórios são fei-tos, no caso dos precários, quandohá renovação de contrato ouquando há discussão sobre seu es-tágio probatório em RDIDP. Ouentão os efetivos, quando fazemalgum pedido especial, ou de umacerta assessoria, ou um pedido deafastamento. Não tem aí um certocaráter discricionário? Porque háuma espécie de incentivo a você fi-car quieto no seu cantinho, comoalguém anônimo na multidão. Es-sa avaliação não teria um poucodesse viés? Como o Direito vê essaquestão, de que na verdade ela fis-caliza quem “levanta a mão”, poralguma razão? Somos 4.700 pro-fessores, são treze membros daCERT. Temos um monte de gentepara ser avaliado por treze cole-gas, que a rigor deveriam avaliarem conjunto os processos, e a gen-te sabe que há uma prática — etalvez até o senhor possa dar a ex-periência do seu tempo lá — de orelator relatar e os outros em ge-ral concordam com o relator. Sen-timos muito, nas decisões de co-missão na Universidade, isso de oparecer do relator ser aprovadopor unanimidade. Será que essesistema não é discricionário, ouarbitrário?

Dallari- Até por motivos de or-dem prática, não existe a possibili-dade de ficar o tempo todo vigian-do a todos. Por isso é que se dá aatribuição ao conselho do departa-mento. O conselho sim, que traba-lha diretamente com o docente,com pequenos números de docen-tes, tem a possibilidade, tem o de-ver de fazer a vigilância permanen-te. Agora, em relação à CERT, o

“Retirar um docente doregime especial exige

processo administrativo,inclusive com direito àampla defesa. Porque éalguém ameaçado de

perder um direito. Se aCERT decidiu que vai

tirar um docente deregime especial é precisoque haja documentos,

provas, de que o docentenão cumpre as suas

obrigações. É precisoouvir o departamento”

que se prevê é a vigilância em cer-tos momentos determinados. Issoentra numa rotina, e o fato de ha-ver um relator também, por si sónão invalida o processo. Porque es-se é o sistema que se usa em todosos tribunais. Porque não há condi-ções práticas, nem seria razoávelexigir que todos leiam todos osprocessos. Naturalmente há opressuposto de confiança, de serie-dade. Aquele que vai relatar su-põe-se que vai examinar, que vaifazer uma exposição, uma sínteseobjetiva daquilo que consta noprocesso, e assim ele relata. Masisto não impede os outros mem-bros de fazerem pedido de esclare-cimentos, e até mesmo de pediremvista do processo, adiando a deci-são. Eu mesmo participei de mui-tas reuniões da CERT em que issoaconteceu. Quando havia dúvida edivergência, quando parecia queas coisas não eram claras, não erararo que um dos membros pedissemais esclarecimentos. Ou pedisseesclarecimentos ao próprio rela-tor, querendo saber: “Mas nãoconsta mais isso? Sobre esse as-pecto, que é que consta?” Ou àsvezes se decidia pedir ao interessa-do, ou ao departamento, queacrescentassem informações. Oque não é razoável é se estabelecerum sistema em que, em todos osprocessos, todos vão acompanharo relator. Se isso acontecer estádemonstrado que não há vigilân-cia. Porque a obrigação de todos éficarem atentos e se for o caso pe-dir mais esclarecimentos ou diver-gir do relator. Não é normal essarotina de todos acompanharem orelator. Quanto ao outro aspecto,

de só se fazer a vigilância em cer-tos momentos, não me parece queseja um erro, exatamente pela im-possibilidade de fazer uma verifi-cação permanente de todos.

Revista Adusp- Na verdade, es-se sistema no fundo teria um pres-suposto de maior confiança, demaior delegação, lá no conselho dedepartamento e na unidade. Por-que se não ele passa a ser injusto,no sentido de que quem não semostra não é visto.

Dallari- Mas não é bem assim.A idéia é que o conselho do de-partamento, que tem as condiçõespráticas, faça a vigilância perma-nente. É possível, fácil, no nível dodepartamento, saber quem é quecomparece, quem é que dá as au-las, quem é que está pesquisando,quem faz qualquer coisa, ou parti-cipa da administração. No âmbitodo departamento é fácil isso. O

departamento tem obrigação defazer esta verificação. Por isso, decerto modo se justifica que aCERT só em ocasiões especiais to-me conhecimento.

Revista Adusp- Está na legisla-ção da Universidade que a CERTpode a qualquer tempo pedir rela-tório aos docentes. Isso não é in-compatível com a idéia de que apriori se tem que confiar que aspessoas estão fazendo seu trabalhode forma adequada?

Dallari- É, se for a qualquer mo-mento realmente não se justifica. Épreciso que haja alguma razão ob-jetiva que justifique. Se não, abrecaminho para perseguições e parauma diferenciação que passa a serilegal. Aí já não serão todos iguaisperante a lei. Uns serão mais iguaisdo que os outros, dependendo deter mais proteção ou mais inimi-gos. Por isto é que considero ne-cessário, agora mais necessário doque nunca por causa desses confli-tos, que houvesse uma rediscussãoda própria CERT: qual é o seu pa-pel, como ela se compõe, que crité-rios ela vai utilizar. Nós fomos so-frendo uma série de distorções, is-so foi ficando quase que um siste-ma à parte. Então qualquer docen-te está sujeito amanhã a sofrer umapunição, uma perda de direitos,sem saber bem por quê.

Revista Adusp- Como é que osenhor tem sentido, nesses anostodos na USP, o modo como a Uni-versidade reage o seu Direito como direito constitucional do país?

O que me parece é que existequase que um marasmo, um con-

34

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp

“Considero maisnecessária do que nunca

uma rediscussão daprópria CERT: qual é

seu papel, como secompõe, que critérios ela

vai utilizar. Fomossofrendo uma série de

distorções, isso foificando quase que umsistema à parte. Entãoqualquer docente está

sujeito amanhã a sofreruma punição, uma

perda de direitos, semsaber bem por quê”

35

Dezembro 2000RReevviissttaa Adusp

formismo. Porque antes existiauma participação muito maior.Havia muito mais discussão dasquestões da Universidade, inclusi-ve dos direitos. Havia mais dina-mismo, mais vida, e hoje pareceque se caiu numa rotina, as pes-soas se envolvem muito menos. Opior é que, exatamente porque secaiu nesse ambiente de conformis-mo, qualquer reivindicação, qual-quer queixa, é vista como um ab-surdo. Como um ato de extremarebeldia, alguém querer discutir oseu direito, o que é normal. Ouapresentar uma reivindicação,também absolutamente normal.Quer dizer, a Universidade já foium organismo mais dinâmico. Sin-to assim, comparando aquilo quevi quando entrei na Universidade,quando fui membro da CERT,

membro do Conselho Universitá-rio, com aquilo que vem aconte-cendo agora. Estamos muito buro-cratizados.

Revista Adusp- E centralizados. Dallari- Excessivamente cen-

tralizados, mas burocratizadostambém. Nós sentimos isso, demaneira muito evidente, na últi-ma greve. A predominância dosetor de relações humanas eraevidente e absurda. Era como sea Reitoria fosse lá. Critérios abso-lutamente burocráticos. Isso teriaque ser revisto.

Revista Adusp- Às vezes brinca-mos que a USP é como um princi-pado: tem a lei do país, do Estado,tem a Constituição, mas aqui agente faz a lei.

Dallari- Isso não é bem assim,porque o que está acontecendo naUSP é exatamente o enquadra-mento dela nessa desordem nacio-nal chamada de ordem. É um siste-ma supercentralizado, os critériosburocráticos, econômicos, produti-vistas é que contam, e se transpôsisso para dentro da USP. É exata-mente um enquadramento que nãodeveria existir, a USP deveria serum centro de resistência. E não es-tá sendo.

Revista Adusp- Toda a mecânicamesma de decisões do próprio Con-selho Universitário possibilita mui-to pouca discussão. Hoje os conse-lheiros falam só uma vez sobre ca-da tópico. O famoso expediente temficado para o final da pauta, quan-do muitos conselheiros, principal-

“Estamos excessivamente“Estamos excessivamenteburocratizados na burocratizados na

USPUSP. Na última greve . Na última greve a predominância do a predominância do

setor de relaçõessetor de relaçõeshumanas era evidente.humanas era evidente.Era como se a REra como se a Reitoriaeitoria

fosse lá. O que estáfosse lá. O que estáacontecendo é oacontecendo é o

enquadramento da USPenquadramento da USPna desordem nacionalna desordem nacional

chamada de ordem. chamada de ordem. Os critérios burocráticos,Os critérios burocráticos,

produtivistas é queprodutivistas é quecontam. A USP contam. A USP deveria ser um deveria ser um

centro de resistência. centro de resistência. E não está sendo”E não está sendo”

mente aqueles do interior, já tive-ram que se ausentar.

Dallari- Essa é uma praxe ab-surda, que foi adotada inclusivena Faculdade de Direito. Transfe-rir o expediente para o final dapauta é uma forma de impedirdiscussões. E isto é que chamo deburocratizar, porque o momentopolítico é o momento do expe-diente, em que cada um levantetemas novos. Claro que se alguémquiser propor alguma coisa parauma tomada de decisões, aí teráque pedir para entrar em pauta.Mas é diferente de alguém pedir apalavra para discutir uma questãoimportante que surgiu naquelemomento, é da ordem do dia. Oque se está fazendo é exatamenteessa burocratização. Temos queesgotar a pauta, temos que agirburocraticamente, e aquilo que édiscussão aberta, ampla, aconte-cerá se der tempo. E normalmen-te muita gente já foi embora, e háum certo cansaço no final, depoisde algumas horas de decisões, issotudo. E o que acontece é que de-saparece esse momento de crítica,que é fundamental.

Revista Adusp- Por conta dosprocessos dos docentes do IG, aComissão de Legislação e Recur-sos emitiu um parecer em que édito explicitamente que o reitor,por ele ter a incumbência de man-dar publicar as decisões de recon-tratações, nomeações etc., poderiasim tomar uma decisão à reveliadas decisões tomadas nos conse-lhos, unidades e até na CERT. Es-te parecer aborda outras coisas,mas particularmente coloca na

mão do reitor poder real, de al-gum jeito, e estará em pauta napróxima sessão do Conselho Uni-versitário, provavelmente. A apro-vação de um parecer como essenão seria quase anular a partici-pação do Conselho Universitárionas questões da Universidade?

Dallari- Sem dúvida. Porque aReitoria é o órgão executivo, masnão deliberativo. Claro que há unstantos assuntos administrativosque ficam na dependência da de-cisão do reitor. Mas esses assun-tos, que são objeto de discussões edecisões em colegiado, não po-dem, lá no final, ficar dependen-tes da vontade arbitrária do rei-tor. Isso realmente anula todo oprocedimento. E seria interessan-te que esse parecer fosse ampla-mente divulgado antes, até paramotivar os membros do ConselhoUniversitário, para que eles per-cebam a que ponto estamos che-gando. Mas aí mais uma vez vejoum reflexo dentro da USP daquiloque acontece fora. Se verificarmosqual é o papel do Congresso Na-cional no Brasil hoje, ele não tempapel. Quem é que legisla? É opresidente da República. Quem éque decide sobre os acordos inter-nacionais? É o presidente da Re-pública. Embora a Constituiçãodiga que o Congresso é que tem aúltima palavra, ele não tem. E orisco é isso: transpor exatamenteesse esquema para dentro da Uni-versidade. Então a reunião doConselho Universitário fica umaformalidade burocrática. Isto nãopode acontecer.

Revista Adusp- Na sua época de

diretor da Faculdade de Direito,ocorreram conflitos entre departa-mentos e a CERT?

Dallari- No caso da Faculdadede Direito não, porque eram ra-ríssimos os professores em regimeespecial. Aliás quando fui diretoruma das coisas que fiz, em parteconsegui, foi pedir aos professo-res que entrassem pelo menos emRTC. Porque eram raros os pro-fessores em regime especial. En-tão raramente tínhamos conflitos.Mas, além disso, não me lembrode nenhum caso em que uma de-cisão de departamento não tives-se sido acolhida pela CERT. Onormal é o acolhimento. Deveriacontinuar sendo, porque o pres-suposto é que o departamento,que está acompanhando mais deperto, sabe melhor quem é queestá cumprindo o seu dever.

Revista Adusp- O senhor nãoacha que a USP está precisando deum banho de democracia?

Dallari- A USP está precisandode um banho de dinamismo. Elacaiu num marasmo. Ela precisa serediscutir, discutir a sua própriaorganização, recolocar na discus-são as grandes questões. Nós pas-samos a discutir se tem dinheiroou não tem, onde é que se vai cor-tar a despesa, se contrata ou nãoem função de orçamento. Entãoisso é muito desanimador e justifi-ca também tantas aposentadoriase tanto desinteresse pela Univer-sidade. Há um evidente desprestí-gio. Tudo como conseqüência des-se estado de coisas. É preciso tra-zer um pouco mais de rebeldia àUniversidade. RA

36

Dezembro 2000 RReevviissttaa Adusp