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RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA, NOS CASOS DE CIRURGIA PLÁSTICA KARLA CRISTINA MORENO BELUCO RA. 442383-9 Turma: 3209 E Fone: 11-50617562/ 91235557 E-mail: [email protected] SÃO PAULO 2004

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RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA, NOS CASOS DE CIRURGIA PLÁSTICA

KARLA CRISTINA MORENO BELUCORA. 442383-9

Turma: 3209 EFone: 11-50617562/ 91235557

E-mail: [email protected]

SÃO PAULO2004

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RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA, NOS CASOS DE CIRURGIA PLÁSTICA

KARLA CRISTINA MORENO BELUCORA. 442383-9

Turma: 3209 EFone: 11-50617562/ 91235557

E-mail: [email protected]

Monografia apresentada à bancaExaminadora do Centro Universitáriodas Faculdades MetropolitanosUnidas, com exigência parcial paraobtenção do título de Bacharel emDireito sob a orientação do ProfessorDoutor Mario Benhame.

SÃO PAULO2004

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BANCA EXAMINADORA:

Orientador:___________________________(_____) Mario Benhame

Argüidor: ____________________________(_____)

Argüidor: ____________________________(_____)

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SINOPSE

Este trabalho visa abordar a responsabilidade civil médica, em caso de cirurgia

plástica, debatendo se a responsabilidade civil é objetiva, a qual independe de culpa,

ou subjetiva, tendo o ônus de provar se o médico agiu com negligência, imprudência

ou imperícia.

Demonstrará, também, a evolução histórica em relação aos supostos erros

médicos, eis que a punição vem evoluindo das penas de morte, atribuídas aos

médicos, até os dias atuais que respondem, apenas, no limite do seu patrimônio.

Aborda ainda, se a responsabilidade do cirurgião plástico é de meio ou de

resultado, ou seja, se o médico cirurgião plástico responde ou não civilmente, por não

atingir o fim pretendido pelo paciente.

Essas indagações serão discutidas e analisadas no decorrer do trabalho.

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Sumário:

SINOPSE 4

INTRODUÇÃO 7

CAPÍTULO 1

1.1. Relação Médico e Paciente? 11

1.2. Quem é o Paciente 12

1.3. Parte Histórica 13

1.4. Surgimento da Cirurgia Plástica 16

CAPÍTULO 2

2.1. Responsabilidade Civil 18

2.2. Elementos da Responsabilidade 20

2.3. Do Nexo Causal 21

2.4. Causas de Quebra do Nexo Causal 23

2.5. Negligência, Imprudência ou Imperícia 24

2.6. A Culpa Presumida 25

2.7. Da Responsabilidade Objetiva 25

CAPÍTULO 3

DA RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA

3.1 Iatrogenia 27

3.2 Erros Profissionais, pela lição de: Carvalho Santos e Nelson Hungria. 30

3.3 Prevenção do Erro Médico 32

CAPÍTULO 4

DA REPONSABILIDADE CIVIL NA MEDICINA - Atividades de Meio ou de

Resultado - Responsabilidade do Médico, ou do Estabelecimento hospitalar?

4.1. Natureza da Responsabilidade Médica 34

4.2. Responsabilidade Pessoal do Médico 35

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4.3. Responsabilidade Subjetiva do Médico 36

4.4. Código de Defesa do Consumidor 37

4.5. Responsabilidade Civil do Estabelecimento Hospitalar 41

CAPÍTULO 5

5.1. Responsabilidade Civil em Cirurgia Plástica 43

5.2. Cirurgia Estética – Obrigação de Resultado 47

CAPÍTULO 6

6.1. Direito Comparado e Aspectos Legais 51

CAPÍTULO 7

DANOS MÉDICOS

7.1 Materiais 55

7.2. Morais 56

7.3. Estéticos 57

CAPÍTULO 8

A RESPONSABILIDADE NA CIRURGIA PLÁSTICA SEGUNDO A

JURISPRUDÊNCIA 59

CONCLUSÃO 63

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 66

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INTRODUÇÃO

Artigo 186, CC de 2002. “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,

negligência ou imprudência violar direito e causar dano a outrem, ainda que

exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Este artigo determina a teoria que o legislador adotou a fim de regulamentar a

responsabilidade civil, onde persiste o elemento culpa.

Embora seja a teoria predominante, a doutrina também defende a

responsabilidade civil objetiva, onde, mesmo necessária a presença do dano, a

responsabilidade independe da ocorrência de culpa.

Assim, no estudo da Responsabilidade Civil, pode-se extrair duas teorias em

nosso direito: a Teoria Subjetiva, onde se faz necessária a comprovação de culpa e a

Teoria Objetiva, onde independe do elemento culpa.

Atualmente, a profissão que mais gera ações sobre o tema da responsabilidade

é a Medicina, chegando a ser uma das mais difíceis de se exercer sob o ponto de vista

legal, no mundo inteiro.

Apesar de haver inúmeras ações contra médicos que cometeram erros no

exercício da sua profissão, não significa dizer que todos os médicos foram ou estão

sendo processados. Ainda, há muitos profissionais que causaram, ao menos em tese,

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danos aos seus pacientes, não foram obrigados a reparar o dano causado a outrem,

seja por medo, seja por respeito dos seus clientes.

Nos países Hispanos – Americanos são raros os pleitos contra os profissionais

da medicina. Na Suécia, essas ações são excepcionais devido ao respeito tradicional à

autoridade e ao alto nível social do médico, impedindo que seja citado diante dos

juizes.

Por outro lado, nos EUA, cresce diariamente o número de pacientes que

pleiteiam contra seus médicos, fazendo assim, com que, os tribunais tenham adotado

medidas mais rigorosas que outros países.1

Para que se caracterize a responsabilidade civil, não é necessário que se tenha

a intenção, basta que tenha havido a imprudência, negligência ou imperícia, daquele

que deveria saber e praticar sua profissão.

Hoje, encontra-se superado o entendimento de que, para que se pudesse

postular em juízo uma reparação, a cirurgia plástica, que é o tema desse trabalho,

deveria ter como exclusiva finalidade, a correção de mutilações ou deformidades que

diminuíssem sensivelmente o rendimento social do homem, caracterizando-se,

inequivocamente, como obrigações de resultado.

Atualmente, a cirurgia plástica, em qualquer de suas modalidades,

denominadas reconstrutora, reparadora, corretiva ou estética, pode ser causa de ação

1 Informações extraídas nos acervos do Instituto Médico Legal.

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de reparação de erro médico, considerada esta como uma obrigação

predominantemente de resultado.

Uma cirurgia reparadora de lábios leporinos, ou uma operação para corrigir

esteticamente a face uma jovem, são operações que visam reintegrar a pessoa em

suas possibilidades sociais, visando, obviamente, a um resultado específico e

desejado. Por isso, no caso de um resultado diferente do esperado, ou, mais do que

isso, que tenha causado um dano efetivo, estético ou moral, a paciente, pode gerar a

responsabilidade médica.

Por outro lado, a cirurgia plástica é um ramo legítimo da cirurgia geral, mas

quando é utilizada apenas com fins estéticos, pois, quando se destina a alterar o que

já era perfeito, se caracteriza como uma prática ilegal no conceito médico do termo.

A noção de culpa e responsabilidade civil são muito mais ajustáveis às cirurgias

plásticas corretoras. Com isso os tribunais, no mundo inteiro, se mostram mais

rigorosos ante essa prática da cirurgia, pois seu objetivo é primordialmente de ordem

pessoal e estética.

A jurisprudência afirma que no campo da cirurgia plástica estética, a

responsabilidade do médico é de resultado ou determinada, e não de meio ou

diligência como ocorre com os outros ramos da medicina.

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Ao se falar em indenização para reparar um erro médico, deve-se lembrar que,

para que haja uma adequada indenização, se faz necessário que o dano causado

possa ser liquidado em valores expressos.

Essa é a parte mais difícil da responsabilidade civil do médico, eis que é difícil

dizer o quanto vale a Vida Humana, o quanto ela foi prejudicada pelo procedimento

irregular.

Essa é sem dúvida a mais difícil missão do magistrado e da Justiça na

avaliação do erro médico.

No Brasil, realizam–se por ano 1,5 bilhão de atendimentos ambulatoriais, 12,5

milhões de internações hospitalares, 3 milhões de partos , 21 mil transplantes e 151

mil cirurgias cardíacas. Os dados, compilados por Gomes, Drumond e Veloso de

França, apontam ainda haver 325.727 médicos inscritos nos Conselhos de Medicina,

dos quais 244.690 em atividade. 2

A avaliação do número real desses acidentes médicos situa-se entre 10 a 20 mil

por ano, ou 1 acidente por 20.000 atos. 3

2 MEIRELLES GOMES, Júlio Cézar; FREITAS DRUMOND, José Geraldo de e VELOSO DE FRANÇA,Genival. Erro Médico. 3. ed. Montes Claros: Unimontes, 2001. p. 74.3 LAMBERT-FAIVRE, Yvonne. Droit du dommage corporel, p. 633-34.

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Nos últimos cinco anos, aumentou em 51% o número de denúncias

encaminhadas ao CFM (Conselho Federal de Medicina) de São Paulo, para apuração

dos supostos erros cometidos, por profissionais da área médica.4

4 GASPAR, Malu. Ginecologista é o mais denunciado. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22.08.1998,Cotidiano, p. 3.

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CAPÍTULO 1

1.1 Relação Médico e Paciente

Tomando por base o pensamento binário, qual seja, o da razão e o da

emoção, pode-se dizer que o que norteia sempre o relacionamento

interpessoal é a emoção.

O ser humano é tão complexo que é capaz de se comportar de modo

diferente diante de dois casos iguais, dependendo de como esteja se sentido

num dado momento.5

Pode-se afirmar que o homem busca o prazer na mesma medida em

que foge da dor, no sentido de buscar o corpo e mente sadia, para isso, busca-

se o médico.

A relação médico e paciente inicia-se, basicamente, quando alguém (o

paciente) está tomado por algum mal, por um problema que não tem condição

de resolver sozinho. O médico deve, portanto, estar consciente da importância

desse primeiro momento de contato com o paciente, que sistematicamente o

vê como seu salvador. No instante que se conhecem, paciente e cliente

poderão definir uma relação boa ou não.

5 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 33-4

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12

Nesse contexto, importante mencionar que muitos doutrinadores

entendem que o relacionamento médico/paciente é “contratual”. Assim, vale a

pena transcrever o a tese de Josserand :

“o fato de se considerar como contratuala responsabilidade médica não tem, aocontrário do que poderia parecer, oresultado de presumir culpa”.6

1.2. Quem é o Paciente?

É aquela pessoa frágil que está, emocionalmente abalada, em razão do

mal que o aflige, seja ele grave ou não.

O paciente, independentemente de sua idade e grupo social, vê no

médico sua tábua de salvação, a pessoa que presume ser preparada para

curá-lo, para minimizar o seu sofrimento, a sua angústia.

Se o médico possui deveres técnicos e éticos para com o seu cliente, o

paciente, por seu turno, também possui deveres em relação ao médico e, como

não poderia deixar de ser, precisa observar a questão da ética e pautar o seu

comportamento em relação a ela.7

6 AGUIAR DIAS, José de. Cláusula de não-indenizar. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980.p.234.7 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 35

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1.2. Parte Histórica

Sem muita delonga, posto que esse não é o ponto central deste

trabalho, será explicado a evolução da história médica.

Nos primórdios, as atividades médicas concentravam-se apenas à cura,

e não ao estudo das patologias, predominando o empirismo. Se a cura não

ocorresse, eram previstas sanções para os casos de culpa por imperícia.

O primeiro documento histórico que trata desse tema é o Código de

Hamurabi (2.440 A.C) onde a doutrina jurídica dispõe sobre a responsabilidade

do médico: “O médico que mata alguém livre, no tratamento, ou que cega um

cidadão livre, terá suas mãos cortadas, se morre o escravo paga seu preço, se

ficar cego à metade do preço. ”Notava-se que esta legislação, adotava a teoria

da responsabilidade objetiva, não necessitando, de caracterização de culpa,

pois se o paciente morresse logo após a cirurgia, o médico era o único

responsável.8

Na obra dos mestres Júlio Meirelles e Genival Veloso, intitulada Erro

Médico, há um fato sinistro que vale a pena transcrever: ”Na idade média, a

rainha Astrogilda exigiu do rei, seu marido, que fossem com ela enterrados os

dois médicos que a trataram, os quais atribuía o insucesso no tratamento.” 9

8 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 289 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 27-8

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O Direito Romano trouxe uma grande contribuição e avanço em relação

às legislações pertinentes a este tema. Anteriormente o que prevalecia era a

vingança privada, para após, surgir à intervenção do poder público a fim de

permiti-la ou exclui-la, através da Lei das XII Tábuas (Pena de Talião). Esta lei

fixava o valor da pena pecuniária para cada caso. Em mais um progresso para

a legislação romana, surge no ano de 468, a Lei Aquília, que estabelece o

conceito de culpa, permitindo, inclusive que os médicos cometessem alguns

delitos, como o abandono do paciente, erros derivados da imperícia e das

experiências perigosas. Estabelecia, também, a obrigação de reparar o dano

patrimonial e não moral. A Lei Aquília estabelecia alguns pressupostos quanto

a este tema, que são: que o dano contrariasse o direito, que a ação fosse

positiva, que o dano fosse causado por um contato direto com o corpo do autor

com a vítima. Previa a pena de morte ou deportação do médico culpado por

falta profissional.

No Egito, se os médicos respeitassem as regras, não eram punidos,

mesmo que o paciente viesse a morrer. Estas regras eram consignadas em um

livro chamado “Livro Sagrado“, o qual era respeitado e seguido,

obrigatoriamente, já que se alguém violasse, era punido com a morte.

Na Grécia antiga, século V A.C, encontramos o tratado “Corpus

Hippocraticum”, de Aristóteles, que trata de noções de medicina com conceitos

científicos e racionais. Lentamente firma-se o conceito de que a culpa do

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médico não se presume pela obtenção ou não de êxito, e sim pela sua

conduta, portanto já naquela época surgia a figura do perito judicial, como é

chamado atualmente. Admitia-se a culpa médica somente se estivessem

presentes duas condições: morte do paciente e desobediência às normas

técnicas de atividade sanitária. Havia sanções severas, como por exemplo,

trabalhos forçados nas minas, chibatadas, e até, em alguns casos, crucificação.

Apenas com o aparecimento das universidades e de corporações

médicas. Por volta do século XIII, os médicos começaram a obter proteção

legislativa quanto ao seu ofício.

Na França, no início do século XIX, para que houvesse falta médica,

seria necessário provar a imprudência, que deveria ser visível e manifesta

imperícia, devendo as duas modalidades serem advindas de erro grosseiro. O

ônus da prova sempre incumbiria ao paciente. Também já prevalecia a figura

do perito médico. Inicialmente a responsabilidade penal não se distinguia da

cível, apenas posteriormente (1832) a idéia de pena foi substituída pela de

indenização, havendo o direito à reparação, mesmo quando houvesse culpa

leve. Atualmente, é plena a reparabilidade do dano médico na França. 10

A evolução dos tempos, sabiamente alterou esse quadro tirânico e

encaminhou para a reparação por meio da indenização patrimonial pelos

supostos erros cometidos. Hoje se vai ao patrimônio do ofensor e não mais à

10 SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Responsabilidade civil. 9 ed. Rio de Janeiro. Ed. Forense,

1998. p. 1-12

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sua integridade física. Dentre desse contexto, são inúmeras as variáveis a

serem analisadas para que se possa chegar, com segurança, a um ato médico

negligente e, conseqüentemente, ensejador do dever de indenizar.

1.3. Surgimento da Cirurgia Plástica

A cirurgia plástica está departamentada na cirurgia geral. Foi a partir de

1914, tendo em vista a readaptação funcional dos traumatizados de guerra,

principalmente na face, que se projetou a sua ascensão em nível de

especialidade. Contudo, já nos fins do século XIX, seus conhecimentos

adquirem, com as primeiras próteses nasais, as dimensões incipientes, dando

surgimento à que hoje denominamos de “rinoplastia”.

Em 03.03.1930, era criada a Sociedade Científica Francesa de Cirurgia

Reparadora, Plástica e Estética. A expressão Cosmetologia surgiu no

Congresso Internacional de Dermatoloia, em Bucareste, em 1935, pelo Dr.

Auriel Voina.

Segundo Louis Kornprobst , foi a guerra de 1914-1918 que deu origem

ao que se chama de “cirurgia estética”, cirurgia esta que se destinou primeiro,

exclusivamente aos mutilados da face; em seguida, fortificada e estimulada

pelo aumento dos acidentes de trânsito, ela se apoderou do imenso domínio da

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vaidade feminina e tomou o nome com o qual, desde então, tem feito correr

rios de tinta.

É verdade que, diante das exigências sociais contemporâneos, a partir

de 1950, não se discute a existência de uma relação jurídica entre lesões

corporais e cirurgia plástica, como ocorre nas cortes de apelação francesas,

cujos arestos insurgiam, freqüentemente, contra as cirurgias de finalidades não

terapêuticas e apenas cosmetológicas. Admite-se mesmo, sem dúvida, um

recrudescimento à medida que se encontra maior segurança técnica e

condições econômicas acessíveis.

Hoje em dia a cirurgia plástica invadiu todos os campos. Homens e

mulheres a procuram. E conseqüentemente, a responsabilidade civil do

cirurgião está sendo cada vez mais questionável, como sendo de meio ou de

resultado. 11

11 LACERDA PANASCO, Wanderby. A responsabilidade civil, penal e ética dos médicos. 2 ed.

Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1984. p. 258-68

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CAPÍTULO 2

2.1. Responsabilidade Civil

O mestre Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra Programa de

responsabilidade civil, alerta bem para a questão da diferença entre obrigação

e responsabilidade. Diz o ilustre jurista: “Obrigação é sempre um dever jurídico

originário; responsabilidade é um dever jurídico sucessivo, conseqüente à

violação do primeiro.” 12

O homem é um ser social, evidentemente que esta vida social lhe traz

direitos e obrigações e, por conseqüência, responsabilidade por seus atos.

Portanto, é responsável civilmente todo aquele que violar um dever

jurídico preexistente, seja esse dever contratual, oriundo da lei ou dos preceitos

gerais de Direito. Logo, se duas pessoas realizam um contrato e qualquer um

dos contraentes deixar de cumprir sua parte estará assumindo,

automaticamente, a responsabilidade perante o outro pelo seu inadimplemento,

eis a responsabilidade contratual. Por outro lado, se alguém violar um dever

oriundo, não de um contrato, mas imposto pela lei, como o de não lesar o

patrimônio de ninguém, terá igualmente a responsabilidade por aquele ato e,

em conseqüência, devera reparar o prejuízo causado a outrem.

12 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 21

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Conforme a lição de Pontes de Miranda, o homem que causa dano a

outrem não prejudica somente a este, mas à ordem social; a reparação para o

ofendido não adapta o culpado à vida social, nem lhe corrige o defeito de

adaptação. O que faz consolar o prejudicado, com a prestação do equivalente,

ou, o que é mais preciso e exato, com a expectativa jurídica da reparação.

Responsabilidade civil é, pois, o dever que toda pessoa possui de

reparar o prejuízo que tenha causado a outrem, seja por meio de uma ação,

seja por meio de uma omissão, proporcionando, assim, o retorno do ofendido,

na medida do possível, ao status quo ante e, por via paralela, restaurando a

paz social, que é o objetivo maior da ordem jurídica. Necessário, portanto,

haver uma investigação minuciosa para verificar se o prejuízo foi causado com

culpa (entendendo-se a culpa em sentido amplo, lato sensu, abrangendo

também o dolo), pois casos há que em que, conquanto exista efetivamente um

dano, este se opera independentemente do agir do agente – caso fortuito e

força maior -, ou ainda em razão de próprio ato exclusivo da vítima, sendo certo

que, nesse caso, não há de se falar em responsabilidade do suposto agente

causador do dano. 13

O instituto da responsabilidade civil tem natureza essencialmente

dinâmica, tendo de se transformar e se adaptar através dos tempos,

adequando-se à evolução da própria civilização.

.

13 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 22.

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2.2. Elementos da Responsabilidade

São requisitos essenciais na fixação da responsabilidade médica:

O autor: é necessário que o profissional tenha habilitação para exercer

legalmente a medicina, pois se não a possuir, além da responsabilidade, será

punido por exercício ilegal da medicina, curandeirismo ou charlatanismo.

O ato: deverá ser o resultado danoso de um ato lícito.

A culpa: irá consistir na ausência de dolo. Tratar-se-á de culpa profissional,

decorrida de prática sem intenção de prejudicar o paciente, que ocorreu por

negligência, imperícia ou imprudência.

O dano: elemento objetivo e indispensável de análise, pois é através dele que

se determina a relação de responsabilidade, estabelecendo assim o grau de

pena ou da indenização.

O nexo causal: relação entre a causa e o efeito, é uma espécie de elo entre o

ato e o dano.

Dentre os cinco elementos expostos, os dois últimos são essenciais na

perícia médica, para comprovar o suposto erro médico.

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2.3. Do Nexo Causal

A responsabilidade civil está embasada num verdadeiro tripé, qual seja,

na conduta do agente, na existência do dano e na relação de causalidade

existente entre aquela conduta e o dano. Portanto, no dizer de Oscar Ivan Prux,

“é da própria substância da responsabilidade civil, que nela estejam presentes

três elementos essenciais: a ofensa a um direito, dano e o nexo de

causalidade”. 14

A demonstração de que o ato lesivo é a causa do dano concreto é

fundamental, e é exatamente esse liame que une indissoluvelmente um

elemento (conduta) ao outro (dano), no que se chama nexo causal.

O nexo de causalidade encontra pressuposto vital, a responsabilidade. A

toda evidência, é imprescindível provar cabalmente que um certo

acontecimento é causa precisa de um determinado dano.

Bem, daí emerge uma questão nada simples, qual seja, a da causa que

enseja a responsabilização. A questão é bem complexa, e suscita muita

controvérsia.

14 PRUX, Oscar Ivan. Responsabilidade civil do profissional liberal no Código de Defesa do

Consumidor. Belo Horizonte. Del Rey, 1998. p. 189.

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22

Quando o resultado tem origem num fato simples, a questão é de mera

compreensão, não apresentando nenhum grau de dificuldade, pois fica clara a

ligação causal entre o fato ocorrido e o dano produzido.

No entanto, torna-se não tão simples quando ocorre a determinada

causalidade múltipla, isto é, quando o resultado decorre, ao menos

aparentemente, de várias condutas, ou seja, inúmeras circunstâncias

concorrem para a realização do dano, sendo certo que a dificuldade reside

exatamente em precisar qual das concausas é a verdadeira motivadora do

resultado.

Diversas teorias tentaram dar solução à problemática, como, as teorias

do equilíbrio, da causa eficaz, da equivalência dos antecedentes e da

causalidade adequada, dentre tantas outras – sendo que a maioria

ultrapassada.

A primeira defende a tese de que todas as circunstâncias ou condições

que tenham ocorrido para o resultado se equivalem.

A segunda, destarte, a teoria da causalidade adequada, apregoa que

não há equivalência entre as condições que concorrem para o evento, sendo

realmente a causa aquela que for decisiva para a produção do resultado.

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23

O nosso ordenamento jurídico acolheu em seara do Direito Penal, a

teoria da equivalência dos antecedentes. Todavia, na esfera do Direito Civil,

encontra agasalho a teoria da causalidade adequada.

Portanto, em sede de responsabilidade civil, não há de se falar em

equivalência das condições, sendo que será a causa do resultado, ou seja, se

a condição determinante para a obtenção do resultado danoso é, em, abstrato,

adequada à produção do mesmo. 15

2.4. Causas de quebra do nexo causal

• FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA; é a atitude originada pela vítima que

efetivamente contribui para o evento danoso e que, por conseguinte,

isenta de responsabilidade o aparente causador do dano: o médico ou o

estabelecimento de saúde. Ex. o caso do paciente que tenha recebido

ordem médica para não se levantar da cama sozinho e, quando a

enfermeira volta com a cadeira de rodas, o paciente está caído.

• CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR; entende-se por caso fortuito

aquele que se mostra imprevisível e, por isso, inevitável. Força maior, é

aquele que pode até ser previsível, porém, é inevitável, por exemplo, os

fenômenos da natureza.

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24

• FATO DE TERCEIRO; terceiro é aquele agente que não tem qualquer

vínculo com o aparente causador direto do dano e com a vítima. Não

são raros os casos em que o atuar de um terceiro é a causa efetiva e

adequada do dano causado a alguém. Hipoteticamente, pode-se falar de

um caso de um paciente internado, inconsciente, sob rigorosos cuidados

médicos. Sua esposa decide, retirá-lo do hospital e levá-lo para casa.;

após ouvir toda orientação médica de locomoção do paciente, assim

como sua ausência do hospital, lhe trará sérios riscos, insiste a esposa

em sua decisão, assinado um termo de responsabilidade. Realizados os

procedimentos de saída, e providenciada, inclusive a UTI móvel, o

paciente falece.

2.5. Negligência, Imprudência ou Imperícia

A negligência é, omissão da conduta esperada e recomendável.

A imprudência se caracteriza por uma conduta comissiva, é a ausência

do devido cuidado consubstanciado numa ação.

Por fim, a imperícia é a falta da competente análise e da observação das

normas existentes para o desempenho da atividade. É o despreparo

profissional.

15 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

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25

O professor Basileu Garcia menciona que, consiste a imprudência em

enfrentar, prescindivelmente, um perigo; a negligência, em não cumprir um

dever, um desempenho de conduta; e a imperícia, na falta de habilidade para

certos misteres. 16

2.6. A Culpa Presumida

A responsabilidade subjetiva é fundada na culpa, todavia, essa prova

cabe ao agente que se entende lesado, a suposta vítima.

A culpa presumida, prega o inverso, pois tem o condão de inverter o

ônus probante. Em certos casos, considera-se o autor do dano, até prova em

contrário, presumivelmente culpado.

2.7. Da Responsabilidade Objetiva

A responsabilidade objetiva, também chamada de teoria do risco, trata

de verdadeira revolução no instituto da responsabilidade civil.

A teoria do risco, diferentemente da teoria da culpa, cria a

responsabilização independentemente de culpa, bastando que existam o dano

e o nexo de causalidade para que o agente seja compelido a indenizar. Os

doutos ensinamentos de Sérgio Cavalieri Filho, em seu livro Programa de

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 25

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26

responsabilidade civil, são cristalinos: “A doutrina do risco pode ser, então,

assim resumida: todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por

quem o causou, independentemente de ter ou não agido com culpa. Resolve-

se o problema na relação de causalidade, dispensável qualquer juízo de valor

sobre a culpa do responsável, que é aquele que materialmente causou o

dano.”17

Em síntese, apregoa essa teoria que todo aquele que exerce uma

atividade que possui, intrínseca ou extrinsecamente, um risco, vale dizer, um

perigo, deve assumir esses riscos e reparar o dano dela decorrente.

A responsabilidade objetiva, igualmente à subjetiva, pressupõe uma

conduta ilícita, a existência de um dano e a relação de causalidade entre o

evento danoso e a conduta do agente. O elemento culpa, porém, é totalmente

desnecessário. Na responsabilidade objetiva, o autor da conduta ilícita só se

libera da obrigação de reparar o dano no caso de se encontrar sob o manto de

uma das causas de exclusão do nexo causal, quais sejam, caso fortuito ou

força maior, fato exclusivo da vítima ou fato de terceiro.

A responsabilidade com culpa é regra geral, somente admitida a

responsabilidade objetiva ou sem culpa em casos expressamente previstos em

lei, como é o caso dos prestadores de serviços na relação de consumo.

16 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 29.17 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 30

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28

CAPÍTULO 3

DA RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA

3.1. Iatrogenia

A palavra iatrogenia (iatros: medico; genia:origem) é utilizada para

denominar quaisquer doenças ou danos causados a alguém por um ato

médico, seja este terapêutico ou cirúrgico. É de estremada relevância dizer

que a iatrogenia deve ser encarada pelo aspecto lato-sensu e stricto-sensu.

Lato-sensu, entende-se por iatrogenia o ato médico que causa dano ao

paciente, seja esse ato realizado dentro das normas recomendáveis, seja

proveniente de uma falha no atuar, o que equivale dizer, de um proceder

negligente, imprudente ou imperito. Este terá a obrigação de reparar o

indivíduo pelos prejuízos causados, físicos ou morais.

Iatrogenia stricto-sensu seria a questão no campo do Direito. Nesse

contexto, é de suma importância esclarecer que o tema da iatrogenia ainda é

bastante desconhecido na seara do Direito, havendo muito pouco ou nada dito

na literatura jurídica a esse respeito ao se tratar da matéria da responsabilidade

civil médica.

Quando os problemas aparecem, é justamente o organismo humano,

que travará uma guerra para tentar eliminar a doença, de um lado o paciente

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29

evoluirá de forma positiva ou negativa e de outro lado o médico evoluirá para a

continuidade do procedimento eleito ou o mudará parcial ou radicalmente, em

função da dinâmica evolutiva que o quadro clínico do paciente apresentar. O

que se propõe é o alerta para o fato de que a teoria da eleição procedimental

requer olhos abertos para que não se ocorra o risco de cobrar do médico aquilo

que o corpo do paciente promoveu ou deixou de promover, causando-lhe um

mal. A idéia é, por óbvio, contribuir para o objeto maior do Direito, que é a

mantença da paz social.Prestando mais atenção a esse processo peculiar à

responsabilidade civil médica, certamente se estará dando um passo a mais

para uma reavaliação de certos dispositivos legais, bem como preservando a

instituição médica, e, na outra ponta, se estará chegando mais perto de punir o

mau profissional, vale dizer, aquele que é realmente imperito, desatento, que

não honra a qualidade de médico e, por isso, não, pode pertencer a esse

quadro tão nobre da sociedade.

O direito à saúde é garantia constitucional. Portanto, obrigação do

Estado. Os planos de saúde perseguem minimizar custos e maximizar lucros e

os médicos e estabelecimentos de saúde são pressionados a não gastar, o

médico, buscando deflagrar o melhor procedimento e objetivando a melhora ou

mesmo a cura, tudo atendendo aos princípios da teoria da eleição

procedimental.

O Código de Proteção e Defesa do consumidor é um avanço inegável,

neste particular, a Lei n. 8.078/90 representa uma forma desigual para tratar as

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desigualdades, pois o consumidor, diante do poder econômico, é

absolutamente hipossuficiente, conforme o Desembargador Sérgio Cavalieri.

Os médicos, todavia, assim como os estabelecimentos de saúde, que

atendem não só os 40 milhões que possuem planos particulares como também

os outros 130 milhões do SUS, encontram-se penalizados, com a

responsabilidade objetiva(para pessoas jurídicas).

A relação médico/paciente não pode ser considerada mera relação de

consumo. Tratar a relação médico/paciente como relação de consumo é

impingir, àquela o mesmo risco existente na prestação de um serviço preciso e

exato, como consertar um cano. Quando se fala de prestação de serviço de

saúde, estamos diante de algo inexato, pois mesmo quando o serviço é

prestado corretamente, fatores totalmente alheios ao prestador podem ocorrer.

O Direito tem por finalidade precípua a paz social, buscar o equilíbrio

das relações humanas. Enquadrar a prestação do serviço médico é uma

distorção que precisa ser sanada.

Para encerrar esta parte, vale transcrever trecho de sentença proferida

pelo ilustre magistrado Dr. Arthur Eduardo Magalhães Ferreira, então Juiz

Substituto na 5.ª Vara Civil da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, in verbis:

”Não se pode responsabilizar o médico por situações para as quais a própria

ciência médica não tem explicação. Se assim fosse, não haveria mais uma só

pessoa que se dispusesse a seguir tão nobre profissão. Tornar o médico

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responsável pelo desconhecido é estabelecer nova espécie de

responsabilidade objetiva, o que é de todo inadmissível.”

A vida e a saúde não são bens de consumo, são bens inalienáveis. O

médico, bem como os estabelecimentos de saúde, não são fornecedores nem

prestadores de serviços, por conseguinte, a relação médico/paciente não pode

ser regida pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor. O Diploma

Substantivo civil pátrio regula muito bem a responsabilidade civil médica, em

seu artigo 186, se trata de legislação específica, regulando a responsabilidade

civil médica, ao contrário do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. 18

Nesta esteira, torna-se essencial transcrever os ensinamentos do

sempre homenageado mestre Theotônio Negão, in verbis: “É o princípio de

hermenêutica que, quando uma lei faz remissão a dispositivos de outra lei da

mesma hierarquia, estes se incluem na compreensão daquela, passando a

constituir parte integrante do seu conceito.” 19

3.2. Erros Profissionais, pela lição de Carvalho Santos e Nelson

Hungria

¬ CARVALHO SANTOS

18 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 63-519 NEGRÃO, Theotonio e FERREIRA GOUVÊA, José Roberto. Código de Processo Civil. 35

ed. Ed. Saraiva, 2003.

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32

Culpa e erro profissional são coisas distintas. Há erro profissional

quando a conduta médica é correta, mais a técnica empregada é incorreta; há

imperícia quando a técnica é correta, mas a conduta médica é incorreta. A

culpa médica supõe uma falta de diligência ou de prudência em relação ao que

era esperável de um bom profissional escolhido como padrão; o erro é a falha

do homem normal, humana. 20

¬ NELSON HUNGRIA

Nesse sentir é também a lição do venerando mestre Hungria: “na idade

média, penas severas eram aplicadas aos médicos que ocasionavam eventos

letais. E não raras vezes imputava-se como culpa o que era apenas atestado

de precariedade da arte de curar.

Foi Montesquieu quem iniciou uma nova corrente de idéias no sentido

de afastar de sobre a cabeça dos médicos a espada de Dâmucles da sensação

penal.

Desde então começou a ser reconhecida uma certa liberdade de

iniciativa dos médicos e a necessidade de tolerância para com os erros devidos

à própria imperfeição da ciência hipocrática (...).

20 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.

p. 371

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33

O médico não tem carta branca, mas não pode comprimir sua atividade

dentro de dogmas intratáveis. Não é ele infalível, e desde que agiu

racionalmente, obedientes aos preceitos fundamentais da ciência, e ainda que

desviando-se deles, mas por motivos plausíveis, não deve ser chamados a

contas pela justiça, se vem a ocorrer um acidente funesto” (Comentários ao

Código Penal, v.V/186)

Os médicos erram porque são pessoas. É o preço que os seres

humanos pagam pela habilidade de pensar e agir. O erro ocorre em todas as

profissões. O problema é que o médico lida com a vida humana em situações

muitas vezes imprevisíveis o que torna o erro mais dramático. 21

3.3. Prevenção do Erro Médico

Para prevenir o erro médico, inicialmente deve-se tomar consciência da

crescente disparidade entre as possibilidades da ciência e do bem estar real, é

necessário reformular a trajetória das camadas mais carentes, abandonadas,

de forma que se denuncie o horror dos seus dramas, quase todos tendo

marcas de injustiça e da iniqüidade, mas, temos médico conscientes, que não

deixam de protestar contra o sistema caótico de saúde, quando muitos sofrem

de doenças evitáveis e curáveis, é dever do médico lutar por condições mais

dignas de atendimentos aos seus pacientes e não considerar a doença como

um caso de fatalidade.

21 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.

p. 371

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34

Muitos médicos operam pacientes a fim de lucrar com a cirurgia e o

paciente nem precisaria ter sofrido tal evento, além disso, muitos esquecem

instrumentos no ato cirúrgico dentro do paciente, causando a morte dele e

mostrando tal incompetência e descuido com o ser humano que sofreu a

cirurgia.

O paciente busca o médico a fim de buscar ajuda para sua moléstia,

seja ela qual for, e acaba gerando mais problemas ainda, para sua própria vida,

e quem sabe até a busca da sua própria morte.

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35

CAPÍTULO 4

DA RESPONSABILIDADE CIVIL NA MEDICINA

4.1. Atividades de meio ou de resultado – Responsabilidade do médicoou do estabelecimento hospitalar?

¬ Natureza da Responsabilidade Médica

As ações de indenizações decorrentes de responsabilidade médica e

hospitalar, que antes eram raras em nossa Justiça, estão se tornando cada vez

mais freqüente. Em uma década o número de processos por negligência ou

imperícia encaminhados anualmente ao Conselho Federal de Medicina (CFM)

aumentou sete vezes.

A responsabilidade médica foi muito discutida no passado quanto à sua

natureza jurídica: se era contratual ou extracontratual; se gerava obrigação de

meio ou de resultado. O mestre Sergio Cavalieri Filho entende que após o

Código do Consumidor essas discussões perderam relevância. Hoje a

responsabilidade médica / hospitalar deve ser examinada por dois ângulos

distintos. Em primeiro lugar a responsabilidade decorrente da prestação de

serviço direta e pessoalmente pelo médico como profissional liberal. Em

segundo lugar a responsabilidade médica decorrente da prestação de serviços

médicos de forma empresarial, aí incluídos hospitais, clínicas, casas de saúde,

bancos de sangue, laboratórios médicos, etc.22

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36

¬ Responsabilidade Pessoal do Médico

Divergem ainda os doutrinadores sobre a natureza da avença celebrada

entre o médico e o paciente, sendo para alguns um contrato de prestação de

serviços, e para outros um contrato sui generis.

De qualquer forma, essa divergência acerca da natureza jurídica do

contrato em nada altera a responsabilidade do médico, eis que, em se tratando

de responsabilidade contratual, o que importa saber é se a obrigação gerada

pela avença é de resultado ou de meio. Apenas na obrigação de resultado, a

culpa é presumida.

Assim, embora contratual, a responsabilidade médica é subjetiva e com

culpa provada. Caberá ao paciente, ou aos seus herdeiros, demonstrar que o

resultado funesto do tratamento teve por causa a negligência, imprudência ou

imperícia do médico. Dessa forma, figurando como exceção o Código do

Consumidor manteve neste ponto a mesma disciplina do artigo 1545 do Código

Civil de 1916, que corresponde ao artigo 951 do Novo Código. Embora seja um

médico prestador de serviço, o código de defesa do consumidor, no §4º, do seu

artigo 14, abriu uma exceção ao sistema de responsabilidade objetiva nele

estabelecido. Diz ali que: “a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais

será apurado mediante a verificação de culpa”. Deve-se ter em mente, todavia,

22 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.p. 368

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37

que o código do consumidor foi bem claro ao dizer que a exceção só abrange a

responsabilidade pessoal do profissional liberal, não favorecendo, portanto, a

pessoa jurídica na qual ele trabalhe como empregado ou faça parte da

sociedade. Assim, por exemplo, se vário médicos resolverem constituir uma

sociedade, a responsabilidade desta não será subjetiva.23

¬ Responsabilidade Subjetiva do Médico

A responsabilidade do médico é a chamada subjetiva, ou seja, a teoria

da culpa. O profissional da saúde responde por seus atos mediante a

comprovação de sua culpa no suposto evento danoso alegado. O médico só é

obrigado a indenizar se ficar provado sua culpa no resultado do evento danoso

aventado. Esta culpa deve ser entendida em seu sentido lato, isto é, culpa ,

stricto sensu e dolo. O dolo se caracteriza na atitude efetiva da realização de

um fim antijurídico, ou seja, o médico que aceita realizar um aborto em

paciente que está bem, mas deseja interromper a gravidez.

A culpa em sentido estrito é a caracterizada por negligência,

imprudência ou imperícia, sendo a raiz da Lei Aquília. Portanto, para que surja

o dever de indenizar, curial que a haja a prova cabal da sua culpa no evento

danoso levantado, ou seja, que tenha ele agido com negligência, imprudência

ou imperícia.

23 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.p. 369-70

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38

¬ Código de Defesa do Consumidor

A Lei 8.078/90, denominada Código de Proteção e Defesa do

Consumidor, trouxe uma carga muito concentrada de ética, quer na Bioética,

quer no Biodireito.

O universo de negócios em nosso País é grandioso, formado por uma

gama muito grande de consumidores de bens e serviços, sendo certo que com

tantas mudanças econômicas e com a virtual queda da inflação, até as

pessoas da mais baixa renda passaram a consumir, em alguns casos,

freneticamente. Cláusulas contratuais abusivas que antes atormentavam a vida

dos cidadãos hoje são nulas de pleno direito e muito se encaminhou na direção

do regramento de planos de saúde, serviços de transporte, telefonia,

fornecimento de energia elétrica, e outras. 24

O Código protecionista das relações de consumo tem a proposta de

atender às necessidades dos consumidores, respeitar a sua dignidade, saúde e

segurança, além dos interesses econômicos.

A ética tem sido parte integrante do exercício da Medicina há muito

tempo e, por que não dizer, em todas as suas épocas.

24 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 37-8

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39

Indiscutivelmente, o regime nazista teve influência relevante para o

nascimento de uma nova fase da Bioética, em razão das terríveis barbaridades

acontecidas nos campos de concentração, onde experimentos “científicos”

totalmente contrários aos princípios mais comezinhos de humanidade foram

realizados em mulheres e milhares de seres humanos.

Após o advento do Tribunal de Nuremberg (1945-1946), que condenou

as experiências humanas feitas pelos médicos nazistas – donde se extrai um

dos mais sinistros, Mengele – surgiu o Código de Nuremberg, que disciplina

questões ligadas a quaisquer procedimentos, experimentais e de pesquisa, em

seres humanos, sendo certo que o referido Código já fora revisto pela

Organização Mundial da Saúde, dano origem à Declaração de Helsinque que,

por sua vez, sofreu várias revisões em 1975, 1983 e 1989.

O Código de Nuremberg é considerado o documento mater da bioética,

tendo em vista ter sido o primeiro pilar de abrangência universal da

necessidade de disciplinar a pesquisa científica ao respeito pelo ser humano.

O termo bioética foi criado pelo oncologista americano Van Rensselaer

Potter, que a conceituou como “o estudo sistemático da conduta humana na

área das ciências á luz dos valores e princípios morais”. 25

25 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica e

hospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. cit. p.43.

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40

Um primeiro aspecto que se pode considerar é o de que a Bioética

compreende todas as questões de valores, ou seja, tem uma finalidade

axiológica. Ela também diz respeito a toda série de problemas sociais atinentes

á ordem pública, tendo, portanto, um caráter social. Aplica-se à vida dos

animais e das plantas, especialmente no que concerne às experiências e às

prescrições essenciais visando à proteção do meio ambiente. Estende-se

também, a toda pesquisa Biomédica e comportamental, cujo objetivo seja ou

não terapêutico. Daí a conclusão de que a Bioética vai além da ética médica

não se aplica somente às ciências da área da saúde, disciplinando também as

ciências sociais, as ciências denominadas tecnológicas, a ciência jurídica etc.

A Bioética analisa as questões éticas que envolvem os pacientes,

médicos e todos os demais agentes que pertençam à atividade médica e

pesquisas científicas relacionadas com o início, a continuação e o fim da vida.

Já o Biodireito, diz respeito a questões de saber o que é válido como

direito e como justiça, considerando-se os homens e a biosfera, quando se

deve fixar limites e certas intervenções e as certos tratamentos.

É inegável que a tarefa do Biodireito não é nada fácil, na medida em que

lhe cumpre pensar sobre o melhor ordenamento jurídico – à luz da observação

das transformações sociais e, especialmente, das inovações trazidas pela

biotecnologia -, tendo como fundamento a vida humana.

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41

O princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviços,

consagrado no Novo Código de Defesa do Consumidor, prevê uma única

exceção, no §4º do art. 14, que dispõe:

“A responsabilidade pessoal dos

profissionais liberais será apurada

mediante a verificação de culpa”.

Como observa Antonio Hermen de Vasconcelos e Benjamín

(Comentarios ao Código de Proteção ao Consumidor, p. 79-80), por

“profissional liberal há que se entender o prestador de serviço ‘solitário, que se

faz do seu conhecimento uma ferramenta de sobrevivência’. A exceção –

prossegue - aplica-se, por conseguinte, apenas ao próprio profissional liberal,

não se estendendo às pessoas jurídicas que integre ou para as quais preste

serviço. O Código é claro ao asseverar que só para a ‘responsabilidade

pessoal’ dos profissionais liberais é que se utiliza o sistema alicerçado em

culpa. Logo, se o médico trabalhar para o hospital, responderá ele apenas por

culpa, enquanto a responsabilidade civil do hospital será apurada

objetivamente”.

Se o médico tem vínculo empregatício com o hospital, integrando a sua

equipe médica, responde objetivamente a casa de saúde, como prestadora de

serviços, nos termos do art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor.

No entanto, se o profissional apenas utiliza o hospital para internar os seus

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pacientes particulares, responde com exclusividade pelos seus erros, afastada

a responsabilidade do estabelecimento. 26

¬ Responsabilidade Civil do Estabelecimento Hospitalar

O hospital é considerado tanto público quanto particular, composto de

recursos cirúrgicos e médicos para socorrer enfermos. O médico normalmente

atua a frente de sua equipe, empregando as primeiras medidas, cabe a ele

iniciar o tratamento ao doente.

No artigo 951 do Código Civil de 2002, aplica-se ainda no caso de

indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por

negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agrava-lhe

o mal, causar-lhe lesão, ou inabitá-lo para o trabalho. Isso nos mostra que

estes profissionais podem ser responsabilizados por seus atos que podem

causar dano ao paciente desde que ocorresse com culpa.

No artigo 932, inc. III, do Código Civil de 2002, são também

responsáveis pela reparação civil: o empregador ou comitente, por seus

empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir,

ou em razão dele. Sendo, aqui caso o empregado cometa algum dano o

empregador é responsável pela reparação civil e de atos danosos provocados

por seus empregados.

26 COUTO FILHO, Antonio Ferreira e SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil médica ehospitalar. Belo Horizonte. Ed. Del Rey. p. 44-5

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43

Já dizia Caramuru Afonso Francisco: “A responsabilidade é o sistema

encarregado de manter o equilíbrio preconizado e buscado pelo direito e que

se encontra a cada instante abalado pela realidade fática das violações e dos

danos intermináveis. É a válvula de restauração do império das leis, regras e

princípios”. Não há como conceber uma teoria da responsabilidade civil senão

dentro deste escopo dinâmico. Deve, pois, toda a estruturação normativa da

responsabilidade civil voltar-se para a procura de uma efetivação reparação de

dano, sendo de se alterar a sistemática adotada sempre que os mecanismos

de reparação sucumbam diante de uma realidade que se mostre cada vez mais

fruto de injustiça e desequilíbrio social”. 27

O médico contratado pelo hospital é aquele que mantém com ele um

vínculo empregatício, caso este médico cause culpa a algum paciente, é

obrigado o hospital à reparação, posto que, no artigo 932, inc. III, do Código

Civil de 2002, o empregador responde sim por atos deus empregados.

Procede a ação de indenização contra estabelecimento hospitalar por

erro profissional de membro de sua equipe médica. Sendo o médico

considerado empregado e o hospital empregador, ele no exercício de suas

funções causar algum dano caberá ao hospital arcar, caso constatada a culpa

médica. O hospital responde por erro de sua equipe médica.

27 BLOISE, Walter. A responsabilidade civil e o Dano Médico. Rio de Janeiro. Ed. Forense,

1987. cit. p. 235.

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CAPÍTULO 5

5.1 Responsabilidade Civil em Cirurgia Plástica

A responsabilidade civil decorrente de cirurgia plástica estética sem

imediata necessidade terapêutica, é quase sempre, analisada de modo pouco

favorável ao médico. Pois quem se submete à cirurgia plástica, mesmo que

meramente estética não procura essa opção com absoluta leviandade e sem

real necessidade, ao menos de ordem psíquica.

Para ela, a solução dessa imperfeição física assume um significado

relevante, e que em determinados graus chega a abalar o indivíduo de tal

forma que o impede de administrar sua vida de uma maneira normal. Pois o

incômodo com a aparência se torna mais importante que qualquer outra coisa

dentro do seu convívio social.

Porém, todas as vezes que a saúde, a integridade física ou a vida do

paciente estiver em perigo, o médico deve renunciar ao aperfeiçoamento de

caráter estético, independente da vontade do próprio paciente, eis que a

cirurgia plástica estética, como todas as outras oferecem riscos que podem

levar a morte.

“O simples fato de haver empreendido sobre uma região corporal sadia

uma operação que comporta riscos de real gravidade, com o único objetivo de

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corrigir o aspecto exterior, é suficiente a concretizar uma culpa fora daqueles

que são habituais requisitos da responsabilidade profissional” 28

Em determinados casos a cirurgia nem chega ser recomendada para

resolver esses “traumas”, que recaem sobre alguma parte externa do corpo,

tratando-se da linha estética. É recomendável, procurar antes do cirurgião

plástico, um psicólogo ou psicanalista. Talvez assim estes outros profissionais

consigam sem submeter o paciente à cirurgia descobrir o que realmente o

aflige e o incomoda tanto.

Quanto aos cirurgiões plásticos, a obrigação que assumem é de

“resultado”. Os pacientes, na maioria dos casos de cirurgia estética, não se

encontram doentes, mas pretendem corrigir um defeito, um problema estético.

Interessa-lhes, precipuamente, o resultado. Se o cliente fica com aspecto pior,

após a cirurgia, não se alcançando o resultado que constituirá a própria razão

de ser do contrato, cabe-lhe o direito à pretensão indenizatória. Da cirurgia mal-

sucedida surge a obrigação indenizatória pelo resultado não alcançado.

A indenização abrange, geralmente, todas as despesas efetuadas,

danos morais em razão do prejuízo estético, bem como verba para tratamento

e novas cirurgias.

28 (trecho tirado do livro La Responsabilità Professionale Nell’esercizio delle Arti Sanitarie, p.

223. Apud Avecone. Pio. La Responsabilità Penale del Medico, p. 183 e ss).

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O cirurgião plástico assume obrigação de resultado porque o seu

trabalho é, em geral, de natureza estética. No entanto, em alguns casos a

obrigação continua sendo de meio, como no atendimento a vítimas deformadas

ou queimadas em acidentes, ou no tratamento de varizes e de lesões

congênitas ou adquiridas, em que ressalta a natureza corretiva do trabalho. 29

O conceituado cirurgião plástico Juarez Moraes Avelar, em sua obra

“Cirurgia Plástica. Obrigação de Meio” (São Paulo, ed. Hipócrates,2000),

menciona a existência de componentes psicológicos que podem interferir

decisivamente nas reações orgânicas dos pacientes, bem como uma série de

outros componentes, como a conduta pós-operatória individual, que o levaram

a optar pelo título de sua obra. Sustenta o mencionado autor que a cirurgia

plástica é uma especialidade, como as demais áreas da Medicina, exposta às

reações imprevisíveis do organismo humano e indesejadas conseqüências,

sendo justo e humano considerá-la obrigação de meio e não obrigação de fim

ou de resultado.

Contudo, tem sido reconhecida a existência de uma relação contratual

de resultado entre médico e paciente nesses casos.

A respeitável Teresa Ancona Lopes, acerta quando afirma que: “na

verdade, quando alguém, que está muito bem de saúde, procura um médico

somente para melhorar algum aspecto seu, que considera desagradável, quer

29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 7 ed. Ed. Saraiva, 2002. p. 366.

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exatamente esse resultado, não apenas que aquele profissional desempenhe

seu trabalho com diligência e conhecimento científico. Caso contrário, não

adiantaria arriscar-se e gastar dinheiro por nada. Em outras palavras, ninguém

se submete a uma operação plástica se não for para obter um determinado

resultado, isto é, a melhoria de uma situação que pode ser, até aquele

momento, motivo de tristeza” (Responsabilidade, cit., p. 62).

Por essa razão, a 3ª Turma do STJ firmou entendimento no sentido de

que o cirurgião plástico, quando realiza trabalho de natureza estética, assume

obrigação de resultado. (Resp 81.101-PR, Rela. Min. Waldemar Zveiter, DJU,

31 de maio de 1999, RSTJ, 119:290 e RT, 767:111).

No entanto, como observa Rui Stoco (Responsabilidade, cit., p. 299), há,

“porém, casos em que o cirurgião, embora aplicando corretamente as técnicas

que sempre utilizou em outros pacientes com absoluto sucesso, não obtém o

resultado esperado. Se o insucesso parcial ou total da intervenção ocorrer em

razão de peculiar característica inerente ao próprio paciente e se essa

circunstância não for possível de ser detectada antes da operação, estar-se-á

diante da verdadeira escusa absolutória ou causa excludente da

responsabilidade”. Nesse sentido decidiu o STJ (Rel. Min. Eduardo Ribeiro,

j.28-11-94, RT, 718:270).

Ganha relevo a responsabilidade desses profissionais se a operação

oferecia riscos e não advertiram o paciente, deixando de obter o seu

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consentimento. Entretanto, como adverte Aguiar Dias, “embora reconhecida a

necessidade da operação, deve o médico recusar-se a ela, se o perigo da

intervenção é maior que a vantagem que poderia trazer ao paciente. Sempre e

em todos os casos, compete ao médico a prova de que existia esse estado de

necessidade e de que a operação, normalmente encarada, não oferecia riscos,

desproporcionados ao fim colimado. Não vale, para nenhum efeito, neste

particular, a prova do consentimento do cliente. Na matéria, em que predomina

o princípio da integridade do corpo humano, norma de ordem pública, não vale

a máxima volenti non fit injuria. Mas, ainda que não corresponda ao sucesso

esperado, a operação estética pode bem deixar de acarretar a

responsabilidade do profissional, desde que: a) seja razoavelmente necessária;

b) o risco a correr seja menor que a vantagem procurada; c)seja praticada de

acordo com as normas da profissão”. (Da Responsabilidade, cit., p. 324-5).

5.2. Cirurgia Estética – Obrigação de Resultado

Está superada a longa discussão que se travou em torno da licitude da

cirurgia plástica. Carvalho Santos, Aguiar Dias e Caio Mário fazem detalhado

relatório das varias fases pelas quais se passou até se chegar no entendimento

de que se trata de uma especialidade médica licita e normal, uma vez que as

pessoas têm o direito de cuidar de sua aparência do mesmo modo que de sua

saúde (Carvalho Santos, Código Civil Brasileiro interpretado, 7º ed. , v. XXI/268

e ss., Freitas Bastos; José de Aguiar Dias, ob. cit., pp. 302-309; Caio Mário da

Silva Pereira, ob. cit. pp. 155/157) .

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Importa, nessa especialidade, distinguir a cirurgia corretiva da estética. A

primeira tem por finalidade corrigir deformidade física congênita ou traumática.

O paciente tem o rosto cortado, às vezes deformado, em acidente

automobilístico. O médico nem sempre pode garantir, nem pretender, eliminar

completamente o defeito. Sua obrigação, por conseguinte, continua sendo de

meio. Tudo fará para melhorar a aparência física do paciente, minorar-lhe o

defeito, sendo, às vezes, necessárias várias cirurgias sucessivas.

O mesmo já não ocorre com a cirurgia estética. O objetivo do paciente é

melhorar a aparência, corrigir alguma imperfeição física. Nesses casos, não há

duvida que o médico assume a obrigação do resultado, pois se compromete a

proporcionar ao paciente o resultado pretendido. Se esse resultado não é

possível, deve desde logo alertá-lo a se negar a realizar a cirurgia.

Tanto na doutrina estrangeira como na brasileira, há quem conteste,

assumir o médico, obrigação de resultado na cirurgia estética. O eminente

ministro Ruy Rosado de Aguiar Jr., depois de anotar que a orientação hoje

vigente na França, na doutrina e na jurisprudência, se inclina por admitir que a

obrigação a que está submetido o cirurgião plástico não é diferente daquela

dos demais cirurgiões, pois corre os mesmos riscos e depende da mesma álea,

endossa esse entendimento, tendo em vista que em toda a operação existe um

risco ligado a reação do próprio organismo humano, tipo de pele extremamente

sensível, infecção hospitalar, etc., situações muitas vezes imprevisíveis e que

não podem ser imputadas ao médico. A eventual falta de informação precisa

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sobre o risco, e a não obtenção de consentimento plenamente esclarecido,

arremata o ilustre ministro, conduzirão à responsabilidade do cirurgião, mas por

descumprimento culposo da obrigação de meios (RT 718/40).30

Na realidade, a crônica médica registra casos em que o cirurgião,

embora aplicando corretamente as técnicas que sempre utilizou com absoluto

sucesso em inúmeros pacientes, não obtém o resultado esperado em razão de

características peculiares do próprio paciente, não detectáveis antes da

operação.

Tais circunstâncias, entretanto, no entendimento do mestre Sergio

Cavalieri Filho, não afastam a obrigação de resultado.

Não se pode negar o óbvio, que decorre das regras da experiência

comum; ninguém se submete aos riscos de uma cirurgia, nem se dispõe a

fazer elevados gastos, para ficar com a mesma aparência, ou ainda pior. O

resultado que se quer é claro e preciso, de sorte que, senão for possível

alcançá-lo, caberá ao médico provar que o insucesso total ou parcial da

cirurgia, deveu-se a fatores imponderáveis.

A jurisprudência do STJ, em que pese a divergência dos eminentes

ministros Ruy Rosado de Aguiar e Carlos Alberto Menezes Direito (v. erudito

voto na RSTJ 119/294 -304), continua entendendo que a cirurgia estética gera

30 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.

p. 378

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obrigação de resultado, merecendo destaque o julgamento do Resp 81.101-

PR, 3ª Turma, do qual foi relator o eminente ministro Waldemar Zveiter:

Cirurgia estética ou plástica, resp 10.536-RJ.31

Dessa forma, conclui-se que no caso de insucesso na cirurgia estética,

por se tratar de obrigação de resultado, haverá presunção de culpa do médico

que a realizou, cabendo-lhe elidir essa presunção mediante prova da

ocorrência de fator imponderável capaz de afastar o seu dever de indenizar.

31 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4 ed. Ed. Malheiros, 1998.

P. 379

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CAPÍTULO 6

ASPECTOS LEGAIS E DIREITO COMPARADO

¬ ASPECTOS LEGAIS

A cirurgia estética desenfreada que chamamos de cosmética não visa a

nenhuma ação curativa, revelando-se, quase sempre, prática duvidosa,

estando, pois fora do âmbito da medicina, sendo considerada ilícita a luz da

ética e da lei. Sendo assim, constitui-se num delito de exercício ilegal da

medicina, pois não está amparada por uma necessidade terapêutica.

Em casos dessa natureza, alem da responsabilidade criminal, existe o

problema das indenizações por ações civis, em se tratando de insucesso, ou

de não ficar a cirurgia ao gosto do cliente.

O nosso Código Penal, em seu artigo 132: “Expor a vida ou a saúde de

outrem a perigo direto e eminente: Pena – detenção, de 3 meses a 1 ano, se o

fato não constitui mais grave”. É o delito de periclitação da vida e saúde.

Ninguém de bom senso pode negar a necessidade cada vez mais

crescente da cirurgia plástica. Nem por isso, somos forçados a aceitar uma

forma de especialização escamoteada num ramo legítimo da cirurgia geral, que

se constitui, em grande parte, de interesses nem sempre lícitos e confessáveis.

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Tem-se dito que o novo conceito de saúde é aquele adotado pela

Organização Mundial Saúde, como sendo “um estado de bem estar físico,

social e mental”. Nisso não se quer, nem o quis a OMS, assegurar a prática de

certos exageros que afrontam os postulados que norteiam a profissão médica,

e que a tem mantido no respeito e na admiração de todos. Infelizmente, a OMS

esqueceu-se apenas do “bem estar moral”, pois o homem é, em suma, um ser

que possui o sentimento moral. Este sentido é que permite ao homem ter

dignidade ou, pelo menos, conhecer o seu estado eventual de indignidade.

O titulo de médico, e o de certas especialidades mais laboriosas e de

distinguida habilidade, pode provar ciência, mas a idoneidade profissional é

testada no longo desempenho no ofício, demonstrada com os atos e fatos

exigidos pelos costumes e pela moral.

A posse de um diploma universitário ou de um título de especialista,

mesmo que para isso se exijam outras aptidões que nem sempre são

encontradas em todos os médicos, dá ao seu titular apenas uma presunção de

idoneidade, mas será pelo exercício lícito e moral da profissão que cada um

provará tal qualidade. Portanto, não é certa a idoneidade que se atribui através

de um título, mas simplesmente presumida.

A autorização do exercício profissional não é ilimitada. A extrapolação do

limite de sua ação constitui-se num abuso de direito, e esse direito não é

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exercido dentro de sua esfera legal, é ela exorbitante, diferente, pois, daqueles

que a lei estabelece.

Outro fato quer não pode passar desapercebido por aqueles que

imprudentemente praticam a cosmetologia cirúrgica é de que os tribunais têm

se mostrado muito exigentes diante dos insucessos de tais operações; pois,

nesta forma de contrato, os pacientes estão interessados numa obrigação de

resultado, e quando este não é conseguido surgem várias imputações penais e

pesadas responsabilidades civis. É que o sucesso é o único resultado

almejado, e aí está o que diferencia estas intervenções dos outros ramos da

cirurgia, os quais estão alicerçados no interesse imediato de, muitas vezes,

salvar uma vida. Chega-se à conclusão de que jamais poderá haver fracasso

naquelas operações.

Por outro lado, é conhecido que a medicina deve revestir-se sempre de

caráter social e nunca servir a interesses escusos de quem a procura,

insinuando, muitas vezes, aquilo que acha melhor e mais conveniente. A

medicina, como ciência, deve ter suas diretrizes e normas de condutas

próprias. O médico é quem sabe o que é melhor para seu paciente. O

consultório de um médico não é simplesmente um balcão de comércio onde

alguém pode escolher o que quer.

A responsabilidade civil é ilimitada e, no campo da cirurgia estética,

assume maiores proporções. Não se pretende atribuir ao médico a

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infalibilidade, mas sim, que ele proceda segundo as regras de sua arte e de

sua ciência, visando à saúde e a dignidade de seu paciente, dentro dos

postulados consagrados pela lei e pelos costumes.

¬ DIREITO COMPARADO

1- Direito Francês e Alemão: adotam a Teoria da Responsabilidade

Subjetiva, isto é, a culpa é elemento fundamental para que se fale em

responsabilidade.

2- Direito Português: o Código Civil prevê a Teoria Subjetiva, ou seja,

precisa haver dolo ou culpa para existir responsabilidade. Para o

cálculo de indenização existem vários critérios que devem ser

seguidos. O ônus da prova cabe a quem alega o acidente.

3- Direito Inglês e Anglo-Americano: A noção de dano é retirado de

decisões judiciais destinadas ao ressarcimento dos danos às vitimas

de algum direito.

4- Direito Italiano: seguido a tendência, na Itália, para que o médico

seja responsabilizado, também é necessário o requisito culpa.

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CAPÍTULO 7

DANOS MÉDICOS

7.1. Materiais

O dano causado por erro médico, pode ser considerado como o efetivo

prejuízo sofrido pelo paciente, e o direito ao ressarcimento que este ou seus

herdeiros terão caso comprovado a existência de tal. Este dano pode ser de

qualquer tipo ou espécie.

Pode ser a lesão a um direito (à vida, à integridade física, à saúde), a

lesão de um interesse legítimo, danos patrimoniais ou danos morais.

Sendo assim, comprovado o erro médico, a responsabilidade civil por

ele, se dará seja qual for à conseqüência.

Não há dúvidas que um erro médico que cause a morte de um ser

humano, ou que o deixe impossibilitado de exercer suas tarefas diárias, deve

ser punido com muita severidade, para que as situações semelhantes não

voltem a acontecer.

O médico deve sempre se valer de prudência, utilizar toda a perícia

possível, e jamais atuar com negligência.

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Se considerar que uma vítima de erro médico poderá ficar para sempre

impossibilitada de exercer atividades remuneradas, ou seja, não poderá mais

trabalhar, deve-se considerar que o erro médico, não só atingiu a parte física

do paciente, mas também o patrimônio do ofendido.

7.2. Moral

O dano moral também deve ser passível de indenização.

Atualmente, embora seja muito difícil quantificar o quanto à dor, a

tristeza, ou mesmo a honra de uma pessoa possa valer, não se pode deixar de

considerar que, tem que haver uma reparação, ainda que não traga total alívio

à dor.

Só dessa forma, pode-se considerar que todos os aspectos que

abrangem um erro médico estão sendo observados e punidos.

Para que possa ser feita uma avaliação de todos os aspectos do erro

médico, e dos vários danos causados por ele, se faz necessário que haja uma

liquidação do dano.

De acordo com Miguel Kfouri Neto:

“Liquidar o dano consiste em determinar o

quantum, em pecúnia, que incumbirá ao

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causador despender em prol do lesado. Se

não houver adimplemento espontâneo da

obrigação assim tornada certa, recorrer-se-á

à execução”.32

Liquidar, ou seja, quantificar o prejuízo sofrido pelo paciente e seus

familiares, não só no âmbito físico, mas também, no âmbito moral e

patrimonial, nem sempre é fácil.

Ao fazer a liquidação do dano patrimonial, tem-se uma avaliação dos

valores reais que, podem ser conferidos com a realidade. Porém, calcular o

quanto vale o dano moral, é uma tarefa muito difícil.

7.4. Estéticos

Pode ser considerado dano estético toda a deformidade ou deformação

outra, as marcas e defeitos, ainda que mínimos e que pudessem implicar, sob

qualquer aspecto, um enfeiamento da vítima ou que pudessem vir a se

constituir, para ela, uma simples lesão desgostante ou um permanente motivo

de exposição ao ridículo ou de inferiorizantes complexos. A constante

aparência da lesão também seria indispensável à caracterização do dano

estético.

32 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 2 ed. Ed. Revista dos Tribunais,

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No momento de definir a sentença importará a extensão dos danos, a

localização, a possibilidade de remoção do dano, as características pessoais

da vitima, as restrições de ordem pessoal decorrentes da irreparabilidade da

lesão, tudo isso deverá ser levado em conta pelo juízo cível.

Em relação ao dano estético, é importante distinguir cirurgias em geral e

cirurgias plásticas.

Nas cirurgias em geral, o médico que aceita o referido contrato é

obrigado a cuidar do doente e não a curá-lo. Ele, pelo vínculo implícito que

ocorre no simples ato de ser procurado para uma consulta, por parte de um

paciente, e de sua parte aceitarem fazê-la, está assumindo implicitamente tal

contrato. Entretanto, do cirurgião plástico, pelo fato de não estar tratando de

uma doença, mas de uma pessoa sadia que deseja melhorar sua aparência ou

mesmo mudar para, a seu ver, melhorá-lo, é exigido que consiga o que o

paciente deseja e a que ele se propõe.

1996. p. 241.

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CAPÍTULO 8

A RESPONSABILIDADE NA CIRURGIA PLÁSTICA SEGUNDO A

JURISPRUDÊNCIA

Dano estético causado por cirurgia. Lesões resultantes do ato

operatório, de que decorreu dano estético à paciente, acarretam a

responsabilidade civil do médico operador. Vejamos algumas jurisprudências:

Cirurgia plástica, destinada a melhorar aaparência de pacientes. Lesões resultantesdo ato operatório, de que decorreu danoestético à paciente. Responsabilidade civildo médico operador. Sentença confirmada.(Ap. 15.064, Rel: Des. Luís Lopes de Sousa.8. Câmara do TJ)

Responsabilidade civil. Cirurgia plástica.Dano estético. Obrigação de indenizar.Demonstrada através de perícia o erromédico impõe-se o dever de indenizar,independentemente do exame da culpa, jáque a cirurgia plástica é obrigação deresultado, e, não de meio.(Ap. 2.627/94, Re. Des. LindberghMontenegro. 2 Câmara do TJ)

Indenização por danos causados emcirurgia plástica. Sendo a cirurgia nãoreparadora, e, apenas, destinada à melhoriaestética responde o cirurgião peloresultado. Prova de que no caso agiu sem aperícia e os cuidados que o trabalho arealizar impunham, tendo ficado a pacientecom paralisia facial. Devidas as verbasrelativas aos danos estéticos e moral. Não-cabimento do pensionamento pela reduçãoda capacidade de trabalho em se tratandode psicóloga, que não pode ter seus ganhospor ocorrência dessa natureza.

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61

(Ap. 332/96, Re. Des. Ferreira Pinto. 3Câmara do TJ RJ)

Responsabilidade civil - Cirurgia estética -Danos sofridos pelo paciente. Sendo acirurgia estética uma obrigação deresultado, responde o cirurgião pelos danoscausados à paciente, ainda que aintervenção possa não ter sido a únicacausa desses danos, mas, que de qualquerforma, contribui para o resultado danoso.Apelos providos parcialmente.

Ação de indenização- Operação plástica -Obrigação de resultado.Cirurgia reparadora que ao invés demelhorar a física da paciente lhe causousérias deformidades. Procedência dopedido para condenar o réu a indenizar oprejuízo causado.Limitando-se o hospital a ceder apenasdependências para a realização daoperação, não pode responder pelo danocausado pelo médico, que não é seuempregado.(Ap. 6.999/97. Re. Des. Antonio LindbergMontenegro. 2 Câmara do TJ)

Obrigação é o vínculo pessoal de direitoexistente entre as partes, devedores ecredores, tendo por objetivo uma prestação,possível, lícita, determinada oudeterminável. A obrigação assumida pelocirurgião plástico, 2. Réu, é um obrigatio deresultado que só se considera cumpridacom a obtenção de uma melhora naaparência anterior.Sempre que a obrigação for de resultado,haverá presunção de culpa contra o médicono caso de insucesso da cirurgia outratamento, cabendo-lhe o ônus da provaem sentido contrário. PROCEDÊNCIA DOPEDIDO.(Sentença de indenização do proc.95.001.0100911-4. 10 VC do RJ. Juiz Robertode Abreu e Silva)

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Cirurgia estética ou plástica - Obrigação deresultado (responsabilidade contratual ouobjetiva) - Indenização - Inversão do ônusda prova. Contratada a realização dacirurgia estética embelezadora, o cirurgiãoassume obrigação de resultado(responsabilidade contratual ou objetiva),devendo indenizar pelo não cumprimentoda mesma, decorrente de eventualdeformidade ou de alguma irregularidade.Cabível a inversão do ônus da prova.(Resp 81.101-PR, 3 turma.Rel. Min.Waldemar Zveiter)

Conforme o Min. Eduardo Ribeiro, Resp10.536-RJ- “No plano do Direito Materialpode-se ter como certo que a obrigação docirurgião plástico é apenas de utilizar-se damelhor técnica, mas isso não afasta que, noplano do Direito Processual, seja lícitoatribuir-lhe o ônus de provar que assimprocedeu. Ter-se-á em conta, para isso, oque acima ficou exposto. O que se pretendeobter com a cirurgia estética é algo que sepode dispensar e certamente se dispensaráse os riscos forem grandes. Se oprofissional dispõe-se a efetuá-la é porqueos avaliou e concluiu que não o são.Verificando-se a deformação, em lugar doembelezamento, goza de verossimilhança aassertiva de que a melhor técnica não terásido seguida, ensejando a aplicação do art.6, VIII, do Código de Defesa do Consumidor.Nem haverá qualquer desatenção ao queestabelece o art. 14, paragrafo 4., do mesmoCódigo. A responsabilidade depende daculpa, mas o ônus da prova se inverte. Aincidência da norma que admite seja issofeito supõe exatamente que, em princípio,caberia à outra parte”- (RSTJ 119/290-309).

“ Indenização – Responsabilidade civil –operação plástica – Dano estético – verbadevida relativamente aos danos morais aaos apurados quando da realização de novacirurgia para reparação – Acréscimo de

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correção monetária – Decisão confirmada –Voto vencido” (RJTJSP, 65:174)

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CONCLUSÃO

Após essa breve ilustração a respeito do erro médico e da

responsabilidade civil, torna-se mais claro que a responsabilidade civil está se

encaminhando, cada vez mais para a responsabilidade objetiva.

Em decorrência dessas circunstâncias, e com os novos paradigmas que

o cinema e a televisão oferecem, os pacientes parecem estar vivendo no reino

da fantasia, devendo assim o médico tomar certas precauções para evitar que

pacientes entrem com pedido de indenização pelos danos causados a estes,

no nosso judiciário.

Assim, incumbe ao judiciário desestimular as demandas infundadas –

propalada loteria judicial, forma aventurosa de o paciente desprovido de razão

tentar obter alguma vantagem, valendo-se dos inconvenientes que o processo

acarreta, principalmente ao médico (perda de tempo, custos, desgastes

emocional, incursão em terreno que lhe é absolutamente desconhecido).

É necessário que todos tenham o direito de serem indenizados, quando

realmente for necessário, pelos erros cometidos por profissionais da área

médica, mas não tentarem enriquecer as suas custas.

Nesse sentido, a Teoria Objetiva, não parece a melhor a ser seguida, eis

que provando apenas a existência do fato, conseqüentemente a ocorrência do

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dano, tem-se elementos suficientes para a responsabilização do médico. No

entanto, e o grande caminho que o médico percorreu até o momento da

operação, e a verificação de todos os cuidados com o paciente, quanto aos

procedimentos e informações referente o pré e pós-operatório – isso não é

levado em conta!.

Assim, não se pode utilizar, apenas, dos critérios objetivos para avaliar

um erro médico, para isso é necessário avaliar criteriosamente o caso concreto

e apurar até que ponto o médico foi responsável por não atingir o resultado

pretendido pelo paciente, eis que o bom e o ruim, o feio e o bonito, são critérios

muitos subjetivos, que merecem uma dedicação maior na análise do caso

concreto, para apuração do fato.

Assim, diante do exposto, a Teoria Subjetiva parece a melhor, a mais a

centrada, pois procura dar ao médico a possibilidade de se defender, de

mostrar quais os procedimentos utilizados no pré e pós-operatório, e

principalmente mostrar que suas atitudes em nada contribuíram para que o

paciente ensejasse com a ação de reparação, ou seja, só podendo assim, falar

em erro médico e a conseqüente indenização, se for comprovada a culpa do

médico, se comprovar que este deixou de proceder com certas informações e

certos zelos com o paciente.

Dessa forma, é relevante mencionar a importância dessa Teoria, dando

oportunidade ao médico se defender, eis que a todo momento encontra-se

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pessoas querendo tirar proveito, através das ações de indenização movidas

contra o cirurgião plástico, além de, acabar com a excelente carreira que este

cultivou nos longos anos de trabalho.

Portanto, a Teoria Subjetiva permite que o médico se defenda da melhor

forma possível, e caso enseje a indenização, significaria apenas que a Justiça

reinou mais uma vez!

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