nélson hungria - comentários ao código penal - volume iv - arts. 102 a 120

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SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE TÍTULO VII DA AÇÃO PENAL Art. 102   . A a ç ã o penal é p úbl i ca } salvo   quando a lei expressamente a declara privativa   do ofendido. § 1.° A ã o bli ca é p rom ovid a pe l o   Mi nisté r i o Público, dependendo, quando a lei o   exi ge, d e repr esen t a ç ã o d o of end i d o ou d e r e-  qu i si ção d o m i ni st r o da Ju sti ça. § 2.° A ão pr ivad a é promov i da me-  diante queixa do ofendido ou de quem tenha   qual id ad e par a r e pr esent á l o. § 3.° A ão pr ivad a p ode i ntentar se   nos c r im es d e ação públ i ca , se o Mi n i st é r i o   bl i co n ã o ofe r ece den úncia no pra zo legal. § 49 No caso de morte do ofendido ou   d e t er si do ele dec l ar ad o ausent e p or deci são    j u d i c ial, o d i r e i t o de o f er ecer quei x a o u d e  pr ossegu i r na aç ã o passa a o côn ju ge  , ascen- den t e, descend ent e ou i r o. d ir eit o an t e r io r. Consolidação das Leis Penais, arts, 274  e 407. direito COMPARADO. Códigos  : argentino, arts. 71 e 72; etíope,  arts. 216 a 219; grego, art. 118; húngaro, art. 21; italiano, arts. 120  a 12 3, 127, 12 9, í n f i ne,  e 130; norueguês, arts. 77 a 79; suíço, art. 28. biblio g rafia. Monte squietj, De 1’Espr i t des Loís, nova edição,  Liv. 3.°, cap. V, pág. 23, e Liv. 6.°, cap. IX, pág. 79; F. Manduca, E l  Procedi m iento Penal y su De sarr ollo Cientí fico, trad,, prólogo e notas Ação pública e ação privada

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TÍTULO VII 
DA AÇÃO PENAL 
A r t . 1 0 2   . A ação p ena l épúbl i ca } sa l vo   qua nd o a l ei e xp r es sam en t e a dec l a r a p r i va t i v a   do o fend i d o .
§ 1 .° A ação púb l i ca ép r om ov id a p el o   Mi n i s tér i o Púb l i co , depend end o , qua n do a l ei o   exi ge, d e r epr esen t ação d o of end i d o ou d e r e- 
qu i sição d o m i n i st r o da Ju st i ça.
§ 2 .° A ação p r i v ad a épr om ovi da m e- 
d i a n t e q uei x a d o o f en d i d o ou de qu em t en ha  
qua l i d ad e par a r ep r esen t ál o .
§ 3 .° A ação p r i v ad a p ode i n t en t a r se   n os c r i m es d e ação públ i ca , se o Mi n i stér i o   Públ i co não of er ece denún c i a n o pr a zo lega l .
§ 4 9 N o ca so d e m o r t e d o o f en d i d o ou   
d e t er s i do e le decl a r ad o au sent e p or deci são    j u d i ci a l , o d i r ei t o d e of er ec er qu ei x a ou d e   pr ossegu i r n a ação passa a o côn ju ge , ascen- den t e, descen d ent e ou i r mão.
d ir e it o a n t e r io r . Consolidação das Leis Penais, arts, 274 
e 407.
direito COMPARADO. Có d i g o s  : argentino, arts. 71 e 72; etíope, 
arts. 216 a 219; grego, art. 118; húngaro, art. 21; italiano, arts. 120 
a 123, 127, 129, ín f i n e ,   e 130; norueguês, arts. 77 a 79; suíço, art. 28.
b ib l io g r a f ia . Monte squietj, D e 1’Esp r i t d es Loís ,  nova edição, 
Liv. 3.°, cap. V, pág. 23, e Liv. 6.°, cap. IX, pág. 79; F. Manduca, E l  
Pr o c ed i m i e n t o P en a l y su D es a r r o l l o C i en t íf i c o ,  trad,, prólogo e notas
Ação  pública  e ação 
 
SAIR K H H _  a j u d a INDICE I | SEGUE
2 A l o y s io   dei  Ca r v a l h o   F il h o
de A n g e l   P i n t o s   y   P i n t o s , Madri, págs. 141 a 160; F. P t j g l i a , P r i n   
d p ü F on d a m en t a l i d i D i r i t t o G i u d i z i a r i o Pen a l e , Milão, Coleção P i c o l l a   
Eíb l i o t e c a S c i c n i i f i c c i ,  vol. '2 .°,  págs. 90 a 127; M a n g i n , T r a i té d e   
VA c l i o n P u b l i q u e ei d e 1 'A c t i o n Ci v i l e en M a t ièr e Cr i m m e l l e ,  Paris, 
1337; M. H. F e r é o l   R i v ií ir e , Es q u i s s e H i s t o r i q u e d e l a Lég i s l a t i o n C r i   
m i n e l l e ães Rom a i n s , Paris, 1844, págs. 56, 59 e 72; E. T r é b u t i e n , Cox i r s 
s l óm en t a i r e d e D r o i t Cr i m i n e i ,  t. 2.°, Paris, 1854, pág. 49; J. B e c o t , 
De I G r g a n i s a t i o n d e l a J u s t i c e Rép r e ss i v e a u x P r i n c i p a l es Ép o q u e s   
H i n t o r i q u a s , Paris, 1860, págs. 9 a 12, 47, 54, 58, 59, 101 a 105, 154 e ^Ol;  
F j e r d inand   W a l t e k , H i s i o i r e d u D r o i t C r i m i n e i c h ez l es R om a i n s ,  tra- dução e introdução de J. P i c q u e t -D a m e s m e , Grénoble, 1863, págs, 14 
aa introdução e 99 do texto; P. Rossi, T r a i t éde D r o i t Pén a l ,   t, 1.°,  Paris, 1872, págs. 226 a 239; J. T i s s o t , L e D r o i t Pén a l Ét u áiéda n s aes  
F r i n c i p c s , da?i s s es Usage s e t l e s Lo i s ães D l v e r s Peup l e s du M on d e , 
edigão, t. 2.°, Paris, 1880, págs. 430 a 453 e 579 a 612; P a u l a   P e s s o a , 
R e f o r m a J u d i c iár i a ,  Maranhão, 1880; A n t ô n i o   S c e v o l a , Ül s t r u z i o n e  
Pr e p a r a t ó r i a ãel P r o c e d i m e n t o Pe n a l e ,  Turim, 1886, págs. 118 a 135; 
Ad. F k a n c k , P hü o s o p h i e d u D r o i t Pén a l ,   3.a ed., Paris, 1888, págs. 63 
a 80; Ch a r l e s  M a y n z , Co u r s d e D r o i t R o m a i n , 5.a ed., vol. 2.°, Bruxelas, 
1391, págs. 447 a 450; G a e o f a l o , L a C r i m i n o l o g i e ,  3.a ed., Paris, 1892, 
pág. 371; F e r h i, L a S o c i o l c g i e C r i m i n e üe ,  trad. do autor, Paris, 1893, 
págs. 439 a 444 ;L. L u c c h i n i, E l e m e n t i d i Pr o c e âu r a P en a l e , Florença, 
1895, págs. 78 a 105; B i a g i o   B r u g i , I n t r o d u z i o n e E n c i c l o péd i c a a l i e   
S c i en z e G i u r i d i c h e e S oc i a l i ,  3,a ed., Florença, 1898, págs. 135 a 144; 
G e u v á s i o   F io r a v a nt i , Da R ei n c i d ên c i a n o Cód i g o Pe n a l ,  Recife, 1896; 
Jo a q u i m   G-u ima r ã e s , Âção Púb l i ca e P r i va d a ,  Vitória, 1898; M a r t i ns  
Jú n i o r , C om pên d i o d e H i s t ór i a G er a l d o D i r e i t o ,  Pernambuco, 1893; 
í 'i l o m u s i  G t j e i f i , En c i c l o péd i a G i u r iái c a , Nápoles, 1907, págs. 582 a 675; 
A. G r o f p a l i, F i l o s of i a d o D i r e i t o ,  trad. de S o u s a   Co s t a , Lisboa, 1910; 
Jo ã o   M o n t e ir o , P r o g r a m a d o C u r s o d e P r o c e ss o Ci v i l ,  vol. I, 3.a ed„ 
São Paulo, 1912, págs. 89 a 95; V iv e ir o s   d e   Ca s t r o , A ação p úbl i ca e  
a ação p r i v a d a n o D i r e i t o P en a l , i n A Nov a . E s co l a P en a l ,  Rio de Ja-
neiro, 1,913, 2.a ed., págs. 253 a 274; R. Sa l e i l l e s , L a I nãi v i d u a l i z a c i ó n   
d e l a Pe n a ,  2.a ed., trad. de Ju a n   d e   H in o j o s a ,  Madri, 1914, págs. 59 a  90; Jo ã o   M e n d e s   de   A l me i d a   Jú n i o r , O Pr o c e ss o Cr i m i n a l B r a s i l e i r o , 
vols. 1.° e 2.°, Rio de Janeiro, 1920; Cr is ó l it o   d e   G u s m ã o , Do s Cr i m e s   
Se x u a i s ,   Rio de Janeiro, 1921, pág. 358; E n r iq u e   A g u il e r a   d e   P a z , 
Co m e n t ár i o s a l a L e y d e E n j u i d a m i e n t o C r i m i n a l ,  t. 1.°, Madri, 1923, 
págs. 493 a 547; F. G o y e t , L e M i n i s t èr e Pu b l i c e n M a t i èr e C i v i l e et   
e n M a t i èr e Rép r e s s i v e e t VE x e r c i c e d e VA c t i o n P u b l i q u e ,  Paris, 1926,  págs. 211 a 223; D o r a d o   M o n t e r o , Na t u r a l e z a y F u n c i ó n ãel D er e c h o , 
Madri, 1927, págs. 126 a 133; A l o y s i o   d e   Ca r v a l h o   F il h o , Ação Pen a l , 
Bahia, 1929, págs. 29 a 48; P ê r ic l e s   e D e m ó s t e n e s   M a d ur e ir a  d e   P i n h o , 
 
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s   a o   Có d i g o   P e n a l   — A r t .  102 .í
rim, 1S32, págs. 180 a 210; N e s t o r  D u a r t e , O D i r e i t o , Noção e No r m a , 
Bahia, 1933, págs. 53 a 88; G iu l i o  B a t t a g l i n i , S u l l u r i n u n e i a a i d i r i t t o   
d i qn e r t l a , i n R i v . I t a l i c m u d i D i r i t t o Pen a l e ,  Pádua, ano V, n.° 1, 
3ane;rolevereiro, 1933, págs. 75 a 80; O t t o r imo   V a n n i n i , I I Có d i c e   
Pe n a l e l íl u s t r a t o A r t i c o l o p e r A r t i c o l o ,  direção do Prof. üco C o n t í , 
voi. 1.°, Milão, 1934, págs. 524 a 578; Ja m e s   G o l d s c h m id t , P r o b l e m a s   
J u r íd i cos y Po lít i cos ãe i Pr oceso Pen a l ,  Barcelona, 1935, págs. 23 a 42; 
M e i.q u í a d e s  P i c a n ç o , Quem p o d e d a r q u e i x a e se r a u x i l i a r d a a c u s ação , 
i n A r q . J u d i c iár i o ,  Rio de Janeiro, vol. 27, 1936, págs. 77 u 81 do suple-
mento; Sa d i  Ca r d o s o   d e   G u s m ã o , Da ação p e n a l n o d i r e i t o b r a s i l ei r o , 
i n R e v. d e D i r e i t o P en a l ,  Rio de Janeiro, vol. 13, íasc, 1.“, 1936, 
págs. 30 a 97; G a l d in o   S iq u e i r a , Cu r s o ãe P r o c e s s o C r i m i n a l ,   2,£t ed., 
1937, pags. 65 a 85; F e r n a n d o  A u g u s t o   d e   M e n d o n ç a , D a ação p r i va d a  
n o s d el i t o s c o n t r a a h o n e s t i d a d e d a s f am íl i a s , i n Ca i >os C r im i n a i s , 
Pernambuco, 1837, pags. 29 a 34; Da ação p en a l e sua p r e em i n ên c i a  
s ob r e a açao c i v i l , i n R ev . Fo r e n s e ,  1948, vol. 118, págs. 11 c 348; 
H e r me s   L im a , I n t r od u ção à C iên c i a do D i r e i t o ,  São Paulo, 1937, págs.
13 a 19 e 241 a 258; Jo a q u i m   C a n u t o   M e n d e s   d e   A l me id a , Ação  
P e n a l    (An ál i ses   e C o n f r o n t o s ),   São Paulo, 1938; A a ção p en a l n o  
n o v o Cód i g o Pe n a l , i n O ? i ov o Cód i g o Pe n a l ,  vol. 1,°, São Paulo, 1042, 
págs. 171 a 182; D i r e t r i z e s ão p r o c e ss o n o Cóãt go Pen a l , i n   O n o v o   
Có d i g o P e n a l ,  vol. 2.°, São Paulo, 1942, págs. 135 a 147; SebastiAn  
S o l e r , D er e c h o P en a l A r g en t i n o ,  t. II, Córdoba, 1940, págs. 443 a 452; 
R a f a e l   F o n t e c i l l a   R., E l f u i c i o p e n a l , i n Re v . d e C iên c i a s Pe n a l e s, 
Santiago, 1941, vol. 5.°, n.° 1, pág. 13; Ju a n   G o n z á l e z   B u s t a m a n t e , 
Pr i n c íp i o s d e D er e c h o Pr o c e sa l P en a l M e x i c a n o ,  México, D. F., 1941, 
págs. 9 a 13 e 47 a G5; Cé s a r   Sa l g a d o , O r eg i m e d a p r o v a n o C ód i g o   
d e  Processo P e n a l ,   caps. Rep r e s en t a ção ão o f e n d i d o , A s s i s t e n t e , I n t r o-  
m i s são d o o f e n d i d o n o p r o c es so , i n R e v . F o r e n s e,  vol. 90, abril a julho, 
1942, págs. 346 a 349; M a r ia n o   R u iz   F u n e s , E l d er e c h o p en a l d e l a   
v en g a n s a , i n R e v . d e l a E s c u el a N a c i o n a l d e J u r i s p r u d ên c i a ,  México
D. F., t. IV, ns. 13 e 14, janeiro a junho, 1942, págs. 7 a 24: Jo s é   P e c o ,, 
P r o y e c t o d e Có d i g o P e n a l    <E x p o s i c i ó n ãe m o t i v o s  ), apresentado á 
Câmara dos Deputados da Argentina, La Plata, 1942, págs. 594, 803 e 
üü4; R a f a e l   G a r c ia   V a l d é s , D e r e c h o Pr o c es a l Cr i m i n a l ,  2.a ed., Madri, 
1944, págs. 75 a 97; B a s i l e u   G a r c ia , Da ação pen a l , i n Rev .  Forense, 
vol. 115, fevereiro, 1948, págs. 372 a 378; e I n s t i t u içõe s d e D i r e i t o   
P e n a l ,   vol. l.D, t. II, São Paulo, 1952, págs. 639 a 657; Jo r g e   A l b e r t o  
R o m e ir o , D a a ção p en a l , Rio, 1949; V a l e n t im   A l v e s   d a   S il v a , R e p e r -  
t ó r i o d e J u r i s p r u d ên c i a d o Cód i g o Pe n a l ,  2.° vol., São Paulo, 1951, 
págs. 581 a 599; H e l e n o   Cl á u d io   Fr a g o s o , A r e f o r m a ãa l eg is l ação  
p e n a l , i n R e v . B r a s i l e i r a ãe C r i m i n o l o g i a e D i r e i t o P en a l ,  1963; H é l io  
 
SAIR K H H _  a j u d a INDICE I | SEGUE
4 A l o y s i o   d z   Ca r v a l h o   F i l h o
l o g i a e D i r e i t o P en a l ,  1966; J. F r e d er ic o   M a r q u es , P r o p o s i t u r a ãa   
ação p en a l ,  Estado de São Paulo, 1966; E p a m i n o n d a s   P o n t e s , P r e   
cl u são,  Separata do Re p e r t ór i o E n c i c l o péd i c o d e D i r e i t o B r a s i l e i r o ,  1967.
COMENTÁRIO
SUM ÁRIO : 1. Ação penal: conceito e origem. 2. Objetivo. 3. Ação
pública e ação privada. 4. Formas de ação penal nas épocas  históricas. 5. No Código brasileiro: ação pública e ação privada.  
6. Ação penal popular. 7. Crimes dc ação penal mediante  
representação do ofendido ou requisição do ministro da Justiça.  
8, Mediante queixa. 9. Sucessão ao ofendido, no caso de morte  
ou ausência.
1. O crime revela um indivíduo, senão sempre perigoso, ao menos inadaptado ao meio social. Apesar de quantas ex- plicações ou conceitos tenham sido íormuladcs, ao íragor da contenda de arbitristas e deterministas, — gente irreeon ciliável por definição mesma,1— é, em verdade, um episódio de inadaptação, implicando nada mais que um desajusta mento às normas da convivência entre os homens.
Algumas vezes, é o indivíduo contra o indivíduo, outras, o indivíduo contra a sociedade, e são as clássicas espécies, hoje seguramente discernidas, da criminalidade comum e da criminalidade política. Mas, em qualquer caso, sob qualquer aspecto, desaj ustamento.
Como tal, rompe o equilíbrio coletivo, desarticula a paz pública, conturba os espíritos, tanto mais profunda e dura- douramente, quanto mais intensas e extensas as conseqüên- cias. Atrai sobre si, por isso mesmo, a reprovação, sem de- mora, do grupo social, melindrado pelo ato insólito, temen- do que se renove ou repita, talvez sob formas mais graves ou em maior escala, e reclamando, por tudo, revide cabal.
Para representar essa perturbação, nenhum confronto melhor, realmente, que o da pedra lançada na água quieta,
 
SAIR IL ' i lJ ; l l i ' Jk l  AJUDA INDICE I | SEGUE
C o m e n t á r io s   a o   Có d i g o  P e n a l   — A r t . 102 5
livre de influência o espaço líquido. A imagem, não oferece- ria, atualmente, tão perfeito símile, certo que os progressos científicos tornam aproximada do ponto em que o crime aconteceu a mais remota latitude do globo, aonde a reper- cussão chegaria, dantes, retardada, e sensivelmente diluída, se chegasse, e poderá ser agora, pelos prodígios da radiodi- fusão ou da televisão, simultânea ao próprio crime, pressen- tido, sabido, e até objetivamente visto no instante mesmo.
Como quer que seja, porém, urge à sociedade retomar o equilíbrio momentaneamente desfeito, restabelecendo no ambiente a paz e nos espíritos a confiança. É a tarefa do poder público, por meio da pena.
Chamese a isso reajustar, regenerar, educar, ou, ainda, ao sabor de remanescentes partidários da velha vindita, cas- tigar; concorram para isso somente legisladores e juristas, com as construções teoréticas e princípios abstratos, para aplicação a cada entidade criminal ou a cada temperamento de delinqüente; ou intervenham os médicos, com a soma dos conhecimentos da matéria e da alma, transfigurando o crime em doença, ou imperfeição, ora reduzindo o criminoso a um fantasma dos seus ancestrais, ora um produto das suas glân- dulas, ou um derrotado pelas forças desordenadas do incons- ciente, — o que não há negar é o imperativo do poder pú- blico de se movimentar, em guarda contra o crime.
Como dito alhures, na sociedade dos homens, agregado dc seres vivos que é, vibra, exteriorizandose, o mesmo ins- tinto de conservação, fundamental nas naturezas humanas, e   até existente nos animais.
É o instinto, despertado na hora do perigo, e acionado, que dá à sociedade a energia indispensável para responder à transgressão das suas leis.
Esse movimento de defesa é a ação judiciária.  Dizse  penal,  para distinguir de outra, relativa às violações de di- reito, que não são crimes, Porque não se compreende direito sem uma ação correspondente, remédio de que dispõe, para anular, no momento justo, o ato que o contrariou. Tratase, como no conceito do nosso Jo ã o   M o n t e ir o , de uma “reação
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6 A l o y s i o   d e   C a r v a l h o   Fi l h o
que a força do direito opõe à ação contrária de terceiro”, z   Pressupõe, portanto, uma relação de direito, e a sua violação, a ser reparada.
As ações ditas civis   pertencem ao particular. O poder público, através de funcionários especiais, a elas preside, dis- ciplinandoas, conduzindoas, quiçá govemandoas, dentro das concepções novas da função estatal. Mas o interesse priva- do, que continua o dominante, não perde, por isso, a liber- dade de agir, a qualquer tempo, em qualquer emergência, até o fim. Por maior a faculdade, hoje reconhecida ao Estado, de interferir na ação privada, dirigindoa, pelos meios de investigação e esclarecimento, para a consecução do objetivo de restaurar a relação de direito, violada, ainda resta ao particular a porção melhor de arbítrio.
Não é assim com a ação penal,  saída das mãos do indi- víduo, e cada vez mais subtraída à sua iniciativa e arbítrio, para constituir atributo do Estado, incisiva manifestação da sua potestas, numa das expressões mais características, o  jus    puniendi .
De início, inexistente nos agrupamentos humanos a auto- ridade supraindividual, ou apenas esboçada em estádios me- nos distantes, o particular desfrutou da liberdade de fazer recair sobre o criminoso, em vingança pessoal ou por de veres do sangue, a sua cólera, que só conhecia termo na con tingência da sua força física. Quando o entendimento e a experiência começaram a moderar, no indivíduo, os instintos, e raiou, no grupo, o sentido de autoridade, fonte do poder público, compreenderam os homens a inutilidade e a bruta- lidade do castigo, que eternizava entre eles o ódio, transmi- tido, como um legado, de ascendentes a descendentes.
A princípio, sem regras preestabelecidas, acaba a vin- gança por se conter em certos limites, que se proporcionam à gravidade do mal, ou revestem, por vezes, o aspecto de prestação econômica, que o ofendido recebe, ou os do seu sangue, em troca do exercício da represália. Não se trata,
2 Jo ã o   M o n t e ir o , P r og r a m a ão Cu r s o ãe P r o ce s s o Ci v i l ,  vol. 1.°,
3.a ed., São Paulo, 1912, pág. 89.
 
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s   a o   C ó d i g o   P e n a l   — A r t . 102 7
ainda que pareça, de um perdão da ofensa. É, antes, uma transação, rigoroso acerto de contas, que pode não conciliar as partes, mas, em todo caso, desarma o braço do ofendido, e afasta o sobressalto, que era permanente, de vindouros re- contros, dando às famílias uma sensação de desafogo, pro- pícia às realizações pacíficas.
À autoridade incipiente nos grupos entregam os homens a solução dos seus atritos e desavenças. O conselho do ár- bitro, ou de quem encarna essa parcela nascente de autori- dade, conselho facultativo para as partes rivais, assume, afi- nal, caráter coativo, valendo como norma, e substituindo as desforras irrefletidas e violentas que as hordas costumavam tomar, em bloco, ao ofensor.3
Essa figura do apaziguador ou juiz de dissídios, — pri- mo rdio de uma autoridade que se superpõe ao grupo, até impor, soberanamente, a sua chefia, a sua vontade, a sua lei, numa realidade de poder e de mando que vem a ser, depois, o Estado, — é, por outro lado, o mais longínquo in- dício de um procedimento jurídico em face do crime, con- substanciado, então, na notícia e prova da ofensa, que os componentes do grupo, considerandose, todos, lesados, tra- zem, em massa, justificando a imediata repulsa ao ofensor.
Quando o Estado, reforçado o poder disciplinador das relações entre os homens, avoca o direito de punir, atribui-
se, conseguintemente, a possibilidade de efetivar a repres- são do delito, em cada caso.
A ação penal   significa, pois, o exercício de uma acusa-  ção,  que indica o autor de determinado crime, responsabíli
zandoo, e pedindo, para ele, a punição prevista em lei.
3 Ver F il o m u s i   G u e l p i , En c i c l o péd i a G i u r iãi c a ,  5.a ed., Nápoles, 1907, pág. 624, nota 1: o erime foi, originariamente, infração da paz  
pública e da ordem, Quando cometido por membro de grupo estranho, 
ocasionava o rompimento da paz entre os dois grupos, sendo a guerra  
a conseqüência. Quando praticado por membro do próprio grupo, 
 
SAIR K H H _  a j u d a INDICE I | SEGUE
8 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F i l h o
Quem afirma essa responsabilidade, e decreta a punição, se couber, não é, porém, o mesmo que levantou o libelo. Assim foi, durante largo período, em que, pelo sistema processual dito inquisitório,  de tão aprimorada prática nas jurisdições
eclesiásticas da Idade Média, o acusador e o julgador anda- vam consorciados numa só pessoa. Mas duas funções que atendem a diferentes razões e buscam finalidade diversa, como essas, não podem residir no mesmo indivíduo. Na fun-
ção de acusar, admitase que domine a força da paixão ou do interesse; na função de decidir, porém, devem predominar,
sobre interesses ou paixões, a serenidade e a imparcialidade,
inapartáveis de qualquer veredicto entre pretensões contrá- rias. Pelo exposto, ao lado do acusador e do réu, tomase in-
dispensável à ação penal outra personagem, tendo por missão recolher, das partes litigantes, o alegado, examinar os do- cumentos, ponderar as provas, e proferir a decisão. Confi- gurase, assim, o sistema processual misto, vigorante nos tempos modernos.
2. Uma sentença oriunda de tais elementos, vivamente contrastados, não há de ser sempre desfavorável ao acusado,
mas de condenação, ou de absolvição, conforme o mereça ele. Não é exata, portanto, a impressão, às vezes corrente, de que a ação penal visa a punir o acusado, e pune, cega- mente, graças ao automatismo do Ministério Público, sem liberdade para opinar, e às prevenções do juiz, inclinado, pela reiteração no oficio, a ver em cada inculpado um culpado.
Os antigos, por esse receio, evitaram, quanto possível, os acusadores profissionais. Os romanos tinham penas severas para os que acusassem em falso (calumniari ), ou abando- nassem, sem motivo, a acusação (tergiversari),  expondo os alvejados a constrangimentos desnecessários. Em algumas
 jurisdições pretéritas, a temporariedade dos investidos na
 
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Co m e n t á r io s   a o   C ó d i g o   P e n a l   — Akt. 102 9
Evidentemente, nem o Ministério Público é máquina de acusar, nem o juiz criminal distribuidor sistemático de con- denações penais. São defeituosas todas as noções de ação penai em que se fale de imposição de pena como o seu fim.
A ação penal, esclarece F l o r i a n , visa ao conhecimento da verdade sobre um crime, que se diz cometido, e de cuja autoria se responsabiliza alguém. Por esse desígnio, assim como alcança a condenação criminal, pode atingir conclusão diametralmente oposta, como a da absolvição, pela certeza de que o fato não existiu, na sua condição física, ou que, pelos elementos constitutivos, não é crime, ou, sendo crime, não o praticou, todavia, o acusado.1
Fixar a culpa ou a inocência, eis o fito, para que nin- guém seja punido por crime de outrem. Nemo punitur pro   alieno ãelicto.  Uma tal função há de estar, naturalmente, à mercê das circunstâncias de cada crirae, ou verificadas no correr da ação, sempre que se busque estabelecer a relação entre o preceito de lei, que define e reprime o delito, e o caso vertente.5
O delito é lesão que tomou aspecto diferenciado das le- sões comuns, pela sua força específica de perturbação da vida social. Provocando, em. virtude disso, muito maior abalo na coletividade, desperta a iniciativa repressora do Estado, no seu papel tutelar do direito. Aquela capacidade de agir ex teriorizase em atividade própria, adequada a ur.i fim neces- sário e justo, qual o da restauração da norma jurídica, in- fringida ou ameaçada. É a ação penal, no sentido objetivo, para fim determinado, a punição do crime. Mas ao Estado, quando assim se defende, a si mesmo, e às unidades sociais,
4 E. F l o r i a n , P r i n c i p i i d i D i r i t t o P r o c e s s u a l e P e n a l e ,  2.a ed .;
Turim, 1932, pág. 181.
5 Como assinala L u c c h i n i , a ação penal realiza função coorde-
nadora entre a lei, em abstrato, e o fato, em concreto. A lei repres  
sora, incriminando o fato, estabelece a relação ideal entre o crime e a 
pena; a ação penal, dirigida pela lei de processo, estabelece a relação  
real entre a incriminação legal e a punição do culpado { E l e m e n t i   
 
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10 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   Fi l h o
defendendo, em suma, o direito, como de sua obrigação, não seria lícito, nem político, corrigir o ato individual de rebeldia, praticando ação injusta, ou iníqua. A injustiça e a iniqüida- de, longe de estimularem o respeito às regras de conduta co- letiva, incitam à desobediência, que, por muito repetida, en- gendra divergências e choques de toda espécie, pródromos de outras desinteligências ainda mais gerais e irresistíveis, com a profundeza, a amplitude e o ímpeto de convulsão social. Na causai da grande transformação política do século XVIII teve parte saliente a justiça penal do tempo, com o seu cor- tejo de incríveis arbitrariedades e crueldades.
É que o grupo transferiu ao Estado a função penal, por feliz compreensão, mesmo, da necessidade de uma proteção uniforme e superior contra as ofensas individuais, mas não deixa de sentir como feita ao todo a lesão endereçada dire- tamente a uma das partes. Desse ponto de vista, ocorre, nas sociedades civilizadas, algo semelhante ao que sabemos do fato criminal nos agrupamentos primevos. Sucedeu que a responsabilidade penal se dissocializou, isto é, evoluiu de res- ponsabilidade de todos, ou de muitos, para responsabilidade pessoal, com o corolário da pena rigorosamente individuali- zada, e tanto mais individualizada quanto menos elementa- res ou facciosas as concepções do crime e da pena, quanto menos empírico o aparelhamento jurídicopenal da sociedade.
Essa limitação da culpa não exprime, porém, uma mes- ma limitação do malestar pela ofensa recebida. O sofrimen- to, que o delito cria para a vítima, projetase em desas sossego e clamores de punição em todo o grupo, que reage, de pronto, pela hostilidade ao criminoso, ou pelo temor do seu convívio, na previsão de novas infrações. Essa reprovação geral lembra o primitivo sentimento coletivo do dano do cri- me, e é mais ou menos acentuada ou persistente, conforme
o alcance da lesão, ou condição de parentesco, companhei-
rismo, amizade, para com o ofendido, como outrora, quando
a voz do sangue ditava a solidariedade na vingança.
A pena é satisfação a essa exigência de punição, um pro-
 
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C o m e n t á r io s   a o   C ó d i g o  P e n a l   — A r t .  102 i i
intimide aos que não delinqüiram, coibindoos, como na fan- tasia da doutrina clássica. Mas a esses oferece a certeza de que o poder a quem compete reprimir e punir o crime está vigilante, na proteção e defesa de todos.6
A ação penal é o meio por que essa proteção se concre- tiza, oportunamente. O que houver de deficiência, ou de ex- cesso, nessa defesa, é motivo para intranqüilidade e insatis- fação, ainda maiores, às vezes, do que as que o próprio crime suscitou. A ação penal não seria, pois, um meio útil de de- fesa social, não fora empresa de inteligência, de raciocínio, de humanidade, capaz de negar a culpa, onde faltar, e de afirmála, quando existente, até distinguindoa, qualifican-
doa, graduandoa, para a efetivação do poder punitivo em termos e condições razoáveis.
3. Distinguese a ação penal em  pública   e  privada : ação pública, pertencente ao poder público, ação privada, pertencente ao indivíduo. Se os dois termos devessem expri- mir noções antagônicas, a impropriedade seria flagrante, pelo menos nos nossos dias. Erigida a função de punir em atri-
buto do Estado, e sendo a ação penal o instrumento da sua realização, não se compreenderia, a rigor, ação privada. Toda ação é pública, posto que ao indivíduo caiba, excepcional-
mente, a iniciativa do seu exercício. A queixa da parte ofen- dida, essencial na ação privada, não é senão uma condição para o exercício da ação penal, esclarece F l o r i a n . Não lhe
altera a estrutura, nem contraria o seu caráter de ação pú- blica. 7é o que já se chamou ação intrinsecamente de ordem pública e extrinsecamente de natureza privada.
6 Do crime — expõe Brug i — , resultam um dano i m e d i a t o    e  uni dano mc . d i a t o ,  representado este pelas apreensões gerais de que 
o fato se reproduza, perturbando a sociedade. A pena é o modo de
reparação do dano mediato, reforçando na sociedade a convicção da 
tutela permanente do direito pelo Estado (I n t r oãu z i o n e Enc i c l o p éd i c a  
a i l e Sc i en z e G i u r i d i c h e e S oc i a l i ,  de B ia g io   B r u g i ,  3.a ed., Florença, .1898, pág. 135) .
 
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12 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F il h o
Na categoria de ação pública costumam os autores in- cluir a ação popular (actio popularis) , exercitável por qual- quer pessoa, como um atributo cívico. Cuique de populo licet   accusare,  diziam os romanos, e com isso significavam que o acusador, podia sair, e saía, de dentro do povo. Para agitar a ação penal, não é preciso ser o ofendido, ou ter, com este, qualquer relação de parentesco, de dependência ou de inte- resse. Nisso consiste a ação penal popular.
Da ação privada destacase a ação dependente de ins-  tância privada.  Há de comum nas duas o poder de disponi- bilidade do particular ofendido. Mas, enquanto na primeira, que diríamos, então, propriamente privada, ou exclusivamen- te privada, o indivíduo decide, por sua vontade, da punição do crime, ao ponto de não intentar ou não continuar a ação, na de instância privada cumpre, simplesmente, ao particular iniciar o procedimento, isto é, apresentar a sua queixa con- tra o ofensor.
O poder público conduz a ação, como se fora sua, e nesse sentido a desenvolve até final, sem mais intrometimento do ofendido que possa colidir com o interesse público da repres- são, insuscetível de transigência. Esse tipo de ação penal participa, portanto, muito mais de ação pública do que de ação privada. Como ressalta So l e r ,  é ação pública, em que a instância da parte ofendida constitui requisito de ordem processual. s Nela, o poder dispositivo do indivíduo é limi- tado à iniciativa da ação, ao passo que na ação exclusiva- mente privada abrange o início  e o  prosseguimento.  " Essa circunstância, comum às duas ações, marca, ao mesmo tem- po, a sua linha divisória. 10
s Se b a s t i á n   S o l e h , D er e c h o P en a l A r g en t i n o ,  t. II, Córdoba, 
1940, pág. 448.
Ver Jo a q u i m   Ca n u t o  M e n d e s  d e  A l me id a , A Ação Pen a l n o N ov o  
Cód i g o Pe n a l , i n O N o v o Cód i g o Pe n a l ,  vol. 1.°, São Paulo, 1942,  pág. 180.
io É tão clara a diferença que, na hipótese de ação dependente 
de instância privada, acontecendo que a acusação tenha escolhido  
apenas um, dentre os vários participantes do crime, o Ministério  
 
SAIR  AJUDA INDICE I | SEGUE
Co m e n t á r io s   a o   C ó d i g o   P e n a l  — A r t . 102 13
O discrime da ação penal em  pública   e 'privada   corres- pondia, entre os romanos, à bipartição dos delitos em  públi-  cos  e  particulares,  aqueles denominados, preferentemente, de crimes   (crimina publica),  e os outros de delitos (delicia    privata ) . 11
O delito privado dava origem à ação do ofendido, reque- rendo, quase sempre pela via civil, a indenização do dano, isto é, a imposição de uma pena pecuniária ao culpado. O crime público era passível de acusação popular, e o seu jul- gamento competia ao povo, nas assembléias, Era a socieda- de a exigir o direito de condenar o criminoso, pelo que a sua falta traduzia lesão aos interesses gerais. Assim demarcadas as duas espécies de prejuízo, estavam conseqüentemente tra- çados os dois tipos de procedimento.
 Já hoje o conceito de crime não autoriza pensarse na ofensa ao interesse individual, com exclusão do interesse pú- blico, ou supremacia. Se o crime é a ruptura do equilíbrio coletivo, e o fim da ação penal é recompor esse equilíbrio, todos os delitos — não obstante pareçam, alguns, à primeira vista, lesivos do interesse particular, — causam distúrbio social, que é necessário desfazer, e por isso contra todos igualmente se justifica a ação coerciva do Estado.
Com efeito, há infrações de natureza privada, no sentido de que ofendem o indivíduo diretamente e indiretamente o Estado. Ofendem mais um particular do que a sociedade, advertia M o n t e s q u i e u , Outras, como os delitos políticos, atacam o Estado, e reflexamente o indivíduo. Mas, ainda
11 Ver H. F e r é o l , R iv iè r e , Esqu i s s e H i s t o r i q u e de l a Lég i s l a t x n n  
C r i m i n e l l e ães R om a i n s ,  Paris, 1844, pág. 71, nota 1.
12 M o n t e s q u i e u , D e VEs pr i t ães Loi s ,  nova edição, Paris, Liv. 3.°  cap, 5, pág. 23.
A reserva da lei, quando toma de instância privada, em certos crimes,
a ação penal, concerne somente ao fato em si, quer dizer, à ofensa. 
Desde que esta foi divulgada, com o comparecimento espontâneo do  
ofendido a juízo, não haverá razões para que se não proceda como 
na ação pública, por natureza indivisível. Ver Se b a s t i á n   S o l e r , ob.,. 
vol. e ed. cits., pãg. 447,
 
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
14 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F i l h o
que de natureza privada, o crime viola a lei, que é pública, e sancionada no interesse geral. 13 Nesse pressuposto, que nenhuma razão abala, a reprimenda dos crimes, de todos os crimes, é função imanente do Estado, e nela tem interesse a sociedade inteira, sem distinção de ofendidos ou nãoofen didos. 11
Apesar disso, e embora diminuto o número de prosélitos da iniciativa privada, não perde atualidade a controvérsia sobre a legitimidade e vantagem da intromissão do parti- cular na ação penal.
As alternativas oferecidas à preferência das legislações podem ser assim relacionadas: ação penal do ofendido, in- dependentemente do Ministério Público; ação privativa do Ministério Público, com exclusão do ofendido, e temos os dois tipos extremos e puros da ação privada e da ação pú- blica; ação popular, convergindo com a do Ministério Público, ou dela subsidiária; ação penal do ofendido, nos mesmos termos.
A questão fundamental, portanto, é a de saber se ao particular assiste o direito de ação penal. Firmado que sim, iestaria fixar o modo e extensão do seu exercício, se isolado, concorrente ou suplementar.
Pela forma singular de participação, age o ofendido por conta própria, à revelia do Ministério Público, de cuja co- operação prescinde. Pela participação concorrente, Ministé- rio Público e particular dispõem, por igual, da faculdade de agir, sem que a atuação de um esteja condicionada à do outro. Pela participação subsidiária, ao ofendido somente se permite a ação penal quando da omissão ou negligência do
is I n   A n t o n i o   S c e v o l a , V l s t r u z i o n e Pr e p a r a t ór i a ãel P r o c ed i -  
m en t o Pen a l e ,  Turim, 1386, pág. 18.
14 Para P r in s , o   binômio crime públicocrime privado é da tra-
dição histórica; teve grande alcance no direito antigo, e se readquire,  
no nosso tempo, alguma importância prática, é mais do ponto de 
vista econômico, quer dizer, da prestação à vítima do delito, quando  
diretamente ferido o interesse privado (C iên c i a P en a l e D i r e i t o P o s i-  
 
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Co m e nt á r io s   a o   Có d i g o   P e n a l   — Art. 102 15
 Tvlirusiério Público. É uma atividade, esta última, mera- mente supletiva, sem razão de ser se levada a termo a ação pública. 1S
Os apologistas da ação privada enxergam na sua prática ama garantia individual em geral, e especialmente contra os criminosos poderosos, ou com amizades de influência nos altos círculos do Estado. A Fe r r i  também impressionou a circunstância, tanto que, adversário da ação penal privada, 18 admitiu a iniciativa particular associandose, não substituin- do, à ação pública, a fim de prevenir possíveis contemplações dos órgãos do Ministério Público para com os titulares do Governo, dos quais independem quanto ao cumprimento das suas atribuições, mas aos quais, naturalmente, rendem defe- rência, pelas eventualidades de melhoria na carreira, mercê da munificência oficial nas promoções, estipêndios etc. 17
lj Ao ver dc alguns, a participação subsidiária encontra a 
melhor justificativa, no vultoso número de feitos penais que sc 
arrastam nos cartórios, por desídia funcional, virtualmente arquiva-
das, ou destinados a arquivamento certo, graças à prescrição, sobre  
que o acusado vela nos bastidores da justiça, para o momento azado.
A escola positiva cerrou fileiras no combate à ação penal   privada. G a r o f a l o   repeliu a divisão de púb l i c a    c p r i v a d a ,  acusandoa 
de atender à natureza objetiva do crime e algumas vezes à natureza 
da pena, sem nenhuma consideração pelo grau de perversidade do  agente. Conferese ao ofendido o poder de decidir da sorte do delin-
qüente, e não se cogita de saber se esse delinqüente é temível, se é 
primário, reincidente etc. ( L a C r i m i n o l o g i e ,  3.a ed., Paris, 1892,  pág. 371). No apreciado livro em que divulgou no Brasil os postulados  
e teorias fundam enta is do positivismo penal, V iv e ir o s   d e   Ca s t r o , 
adepto da nova escola, manifestouse também contrário à ação pri  
vaàa, sustentando que a dicotomia da ação penal “não se conforma  
com o   fundamento racional do direito de punir, não atende à classi- ficação científica dos criminosos, não passa, enfim, de uma longínqua  
reminiscéncia de idéia da vingança, que foi nos tempos primitivos  o conceito justificativo da pena” (A N o v a E s co l a P en a l ,   2,a ed., Rio 
ds Janeiro, 1913, cap, A a ção púb l i c a e a a ção p r i va d a n o d i r e i t o  
p e n a l ,  pág. 259).
 
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16 A l o y s i o   d e   C a r v a l h o   F i l h o
Não são menores, entretanto, os inconvenientes da ins- tância privada. Em tese, o ofendido é o menos apto para encaminhar um procedimento que, se no princípio é ato de incriminação, deve revestir, no seu curso, e no epílogo, com a mais completa imparcialidade, a mais perfeita serenidade. Dessa isenção, exatamente, não é capaz a vítima do crime, pelas paixões e malquerenças que lhe insuflam a acusação, animando o propósito de conseguir, acima de tudo, uma con- clusão condenatória. É difícil, senão impossível, surpreender, no particular que iniciou a ação criminal, um intuito supe- rior de justiça. O ofendido — observa M a n d u c a  — dirigese por impulso antisocial, como o ódio, a vingança. O senti- mento que o impele é egoísta, jamais altruísta. Enquanto isso, a ação penal pública dá ao perseguido garantias de neutralidade e de justiça. Os funcionários que a exercem são insensíveis a paixões ou malquerenças, proverbiais no ofendido.
Acresce que a renúncia e o perdão, conseqüências prá- ticas da intervenção soberana do indivíduo, criam, em larga escala, a impunidade. É um espetáculo deponente o das de- sistências da ação penal, algumas vezes sinceras, quantas outras sem nenhuma motivação, fruto de conluios ou de ex- torsões, em que a dignidade do ofendido se compromete, e não raro são envolvidos parentes e amigos do ofendido e do ofensor. E a essa verdadeira consagração da impunidade pre- side, impotente, o Ministério Público!
Assim, um sentimento mesquinho de vingança inspira a queixa particular (o nosso C r i s ó l i t o d e G u s m ã o conside- rava a ação penal privada “uma revivescência da vindita 'pri-  vada,  adornada com os princípios do classicismo penal” 19) , e quando o temor ou o interesse sobrevêm, ditando a parali- sação do processo, mascarase, habilmente, a transação com um gesto de piedade, como se o perdão, no caso, fora dádiva
is M a n d u c a , E l Pr o c e d i m i e n t o P en a l y su d es a r r o l l o ci e n t i f i c o . 
trad. de á n g e l   P i n t o s   y   P i n t o s , Madri, pág. 144.
19 Cr is ó l it o   de   G t j s m ã o , D o s   C r i m e s S e x u a i s ,  Rio de Janeiro. 
1921, pág. 358.
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Co m e nt á r io s   a o   Có d i g o  P e n a l   — A r t . 102 17
espontânea e generosa. Entretanto, nem a vingança pode servir de móvel, nem a piedade de desfecho à punição dos criminosos.
Isto posto, se o poder público consente, em algumas hipóteses, e por motivos excepcionais, que o ofendido movi- mente, a seu talante, a ação penal, não terá com isso procla- mado o seu nãointeresse na punição do delinqüente. Não há, por conseguinte, um direito privado de ação penal, como não subsistem razões de ordem jurídica em favor da querela individual, de tão constante prática em outros tempos.
As razões são simplesmente de conveniência, de eqüidade, de oportunidade prática, como se exprime  V a n n i n i .  Determinadas circunstâncias, peculiares a algumas infrações, aconselham condicionarse a ação, nesses casos, à manifes- tação da vontade do ofendido. A querela individual é o pre- enchimento de uma formalidade, estatuída no interesse da tranqüilidade das famílias (é a hipótese de crimes como o adultério e o rapto), ou em vista do interesse particular do- minante na punição (é a hipótese de crimes como a injúria e a difamação). 1
Deixando ao indivíduo, por exceção, a liberdade de inten- tar a ação penal, e, em conseqüência, conformandose com o seu silêncio, revela o Estado, em suma, compreender que,
20  Ottor ino Vannini, I I C o d i c e Pen a l e I l l u s t r a t o A r t i c o l o p er   
A r t i c o l o ,  direção de Ugo Costti, vol. 1.°, Milão, 1934, pág. 525. Relacio-
nando os crimes de ação privada polo Código italiano, considera 
VAN«irri que o legislador, assim dispondo, atendeu a três critérios:  o da simultaneida.de de lesão ao interesse público e ao particular, o 
da incerta violação do interesse público e o critério combinado. Do  
primeiro ponto de vista, são de ação privada o crime de violência 
carnal (art. 519), o de ato libidinoso violento (art. 521), o de rapto 
para íim de matrimônio ou fim libidinoso Carts. 522 e 523) etc.  Pelo segundo critério, o de exercício arbitrário das próprias razões  
com violência sobre as coisas (art. 392), ou sobre as pessoas (art, 393),  
o de ofensas corporais (art . 581) etc. Finalmente, pelo critério con-
 jugado, os crimes de in jú ria e de difam ação (arts. 594 e 595) etc.
21 Razões ainda de ordem política induzem o poder público, em 
outras circunstâncias, a decretar a isenção de procedimento penal ou 
 
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18 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F il h o
por vezes, ao interesse e necessidade da punição supera o inte- resse do olvido sobre o crime, evitando situações ainda mais delicadas, e proporcionando à vítixna ou aos seus parentes compensação melhor do que seria a pena, fato público, dc profunda e larga repercussão.
4. A ação penal popular tem precedência no tempo. É a primeira forma de procedimento contra o delito,
quando a comunidade nos grupos impunha, como vimos, a solidariedade dos seus componentes. Solidariedade passiva e ativa. A diferenciação e a especialização que se processam na atividade do homem, pela crescente complexidade, a par da consolidação da autoridade estatal, originam critérios coletivos diferentes sobre a natureza e extensão do interesse ferido pelo crime. Decorrem daí, também, sucessiva ou perio- dicamente, modos diversos de agir contra o mesmo crime. A ação privada,  a princípio, e depois a ação pública   acabam substituindo, parcial ou totalmente, a ação popular.
Considerada e louvada como dos mais expressivos direitos do cidadão, a ação penal popular primou na democracia ateniense e na república romana, para declinar ou morrer no império romano, na jurisdição dos povos bárbaros, no regime feudal, nas monarquias absolutas, enfim, onde cer- ceadas ou banidas as liberdades individuais. Forque o sistema constitucional de cada povo é que lhe dá viço, ou caducidade. Atributo de soberania, como é, não pode o direito de acusar entrar em desarmonia com a Magna Carta nacional, obser- vava Mang iw . 22   Bem entendido, o processo penal, desde o termo de início, a acusação, até o último termo, a sentença, se o não quisermos estender à execução da condenação, quan
22 mangin, T r a i tê d e VA c t i o n P u b l i q u e e t d e VA c t i o n C i v i l e en   
Ma t l èr e C r i m i n e l l e ,  Paris, 1837, vol. 1.°, pág. 3.
penal em certas modalidades do furto entre parentes (art. 181 do 
nosso Código), e a não punição do participante de conspiração que  
abandona, a tempo, os companheiros, e os denuncia. Naquele caso. 
 
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Co m e n t á r io s   a o   C ó d i g o  P e n a l   — A r t . 102 19-
do imposta, acompanha as mutações ou oscilações na vida do país, de cuja estrutura política não é senão um “segmen- to” , como o faz ver G olds ch m idt . 23
Assim, no curso da história, a ação penai popular vinga nos climas temperados de liberdade e fenece ncs escaldos de autoritarismo. Teve, por isso, na vida grega o relevo de um dos mais ilustres misteres, que era honra cumprir, e de que era opróbrio desertar. Não a desestimaram, por seu lado, os romanos, tão ciosos do apreço à ordem jurídica.
Ao entendimento de gregos e romanos, acusar os crimes era uma das maneiras de participar da vida pública, como fazer as leis e cumprir as funções de julgador. Recorda P icqtj  e t -Da m e s m e , 4 que homens da estatura de Ca t ã o   e de Cí c e h o  se desvaneceram de exercitar esse direito de acusação c deram à sua prática brilhos ainda memorados. 5
Mas se foram tantas as excelências, não há esconder o reverso, especialmente na mesma vida pública romana, con- soante os mais severos e tristes testemunhos. Com o admi- rável senso das coisas, buscaram os romanos antecipar o re- médio, prevenindo o mal, ou, quando menos, reduzindoo. E é assim que já na fase republicana, visando, naturalmente, a evitar o descrédito da instituição, opunham ao exercício da
acusação popular numerosas proibições, de caráter eminen
23 G o u j s c h m id t , P r o b l em a s J u ríd i c o s y P o lít i c o s d e i Pr a c e sa   
P e n a l  , Barcelona, 1935, pág. 67.
24 J. P i c q u e t -D a m e s m e , pág. 14 da introdução à tradução do 
livro H i s t o i r e áu D r o i t C r i m i n e i c h e z l es R om a i n s ,  de F e r d i na n d -
W a l t e r , Grénoble, 1863.
25 Entre quantos críminavam V e r r e s , foi Cíc e r o   o  preferido para 
sustentar a acusação, de acordo com a norma de ser confiado o alto  
encargo a um acusador, quando muitos se apresentavam, para deter-
minado crime. Ver J. B e c o t , D e VOr g a n i s a t i o n d e l a J u s t i c e Rép r e s si v e   
a u x PH n c i p a l e s E p o q u e s H i s t o r i q u e s,  Paris, 1860, pág. 59.
a circunstância de poder a ação penal ser exercida contra o estranho  
que participa do crime {art. 183, n.° II, do nosso Código). Quanto ao  
segundo exemplo, o princípio sobre que assenta a isenção penal é 
 
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temente pessoal, fundadas, ora no critério de capacidade, ora no critério de idoneidade. 2e 
Não valeram, contudo, tais cautelas, porquanto o abuso das delações   atingiu, proporções inacreditáveis, tomandose a função de acusar uma profissão, e das mais rendosas, em parte licitamente, pela quota advinda à pecúnia do acusador, tirada do patrimônio do acusado, mas em grande parte tam- bém pelos negócios de toda sorte e vulto que facilitava, pro- porcionando pingues propinas a delatores e testemunhas, em compensação das mais torpes falsidades. 27
“Quem tivesse vícios e talentos, uma alma baixa e espí- r i t o ambicioso” , — comentava, séculos depois, M o n t e s q u ie u , 
reportandose às delações daquele tempo, — “saía em pro- cura de um criminoso cuja condenação pudesse agradar ao governante e por esse meio conquistava dignidades e for- t u n a ” . s
Assim pervertida, na intenção e nos fins, a ação popular desaparece com a civilização clássica, para somente renascer ncs tempos modernos, embora sem um mínimo, que seja, do antigo esplendor.
Condições de ambiente e peculiaridade políticas sãolhc desfavoráveis, por completo, na jurisdição dos povos bárbaros e na justiça dos senhores feudais.
O nomadismo das primeiras tribos germânicas, e, depois de fixadas ao solo, o caráter profundamente autonômico de
, 2® As mulheres, os menores, os magistrados, os venais, os calu-
niadores mercenários etc., não podiam acusar, em Roma, salvo quando 
fossem os ofendidos. Dig., Liv. 48, tít. II, ns. 8 a 11. Ver Garcia d e l  
Co r r a l , C u e r p o ãe D e r e c h o C i v i l R om a n o ,  Barcelona, 1897, vol. 3.°, 
pág. 725.
27 Como mostra B e c o t   {ob. e ed. cits., pág. 104), ficaram tão  
desacreditados os delatores pagos e tão raros os gratuitos que, por   evitar a impunidade dos crimes, os imperadores romanos foram  
obrigados a nomear acusadores de função contínua. Nessa prática,  
descobrem muitos autores o germe da instituição do Ministério 
Público, nascida na França no século XIV, com a criação dos 
p r o c u r a d o r es d o r e i .
28  Montesqtjieu, ob. e ed. cits., pág. 78. .
 
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Co m e n t á r io s   a o   Có d i g o   P e n a l   — Art. 102 21
sua vida, eis circunstâncias decisivas para um período áureo da ação penal privada. A organização interna dos núcleos liumanos dispersos repousa sobre o espírito e o sentimento de família, e esse cunho familial imprime à punição dos crimes c velho aspecto de compromisso do sangue, tanto do lado da vítima, como do lado do culpado. A ação particular é a única forma então possível de procedimento contra o crime, com as conseqüências extremas da renúncia e do perdão. Nem a ordem imperial, posteriormente, alcança diminuir o discricio narismo privado, no exercício da acusação penal, O conflito entre ofensor e ofendido continua um caso de família, e, como tal, passível de ajuste doméstico, sem outra lei que a vontade
das partes, em pessoa, ou por seus parentes. A autoridade pública só intervém, quando falha a composição. É uma interferência de simples adjutório, que lhe não dá prestígio, quanto mais primazia, como órgão de justiça.
Não é outro o panorama, pelo feudalismo. A prcemi nência do individual sobre o social, nota marcante da época, constitui impedimento inelutável a uma justiça penal ds expressão coletiva, firmada num direito ou dever cívico de acusação. Os homens, acastelados num círculo impenetrável
a toda comunhão de idéias ou de interesses, não conhecem entre si os laços naturais da dependência, mas os convencio-
nais do mando e sujeição, numa hierarquia de posições por si mesma negativa de qualquer coesão, inclusive no sofri- mento ou na responsabilidade pelo crime.
Compreendese, assim, o exclusivismo da ação privada num sistema jurídico em que o indivíduo afinal, mais do
que árbitro da acusação, representa, tantas vezes, por si ou per outrem, a própria justiça penal, resumida a um duelo,  — suficiente como prova, como processo, como sentença,
como tudo, na punição do crime. Por si, por sua linhagem, por seu senhor, é a fórmula consagradora dessa privatividade
de acusação penal. Ninguém mais, nada mais.
Depois, a colisão entre a autoridade dos senhores feudais e o crescente poder real prepara o ocaso da ação privada.
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22 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F i l h o
O longo e árduo processo de condensação dos poderes políticos na realeza implica, também, a progressiva absor vência da justiça feudal, inclusive no conjunto das atribui- ções penais.
Empenhados, seriamente, em colocar debaixo da autori- dade própria os mais amplos domínios, os soberanos se arro gam, com exclusividade, o dever de assistência aos interesses da segurança coletiva, e por conseguinte o direito de sua pro- teção penal, exeqüível no poder repressor aos atos infringentes dessa ordem de interesses.
Do nosso ponto de vista, é a mais importante das reivin- dicações reais. Faz reviver, por certo prisma, a idéia de crime público e de crime particular, um dos elementos atuantes nessa sensível transição que a justiça penal sofre durante alguns séculos, paralelamente às transformações políticas.
Assim, onde a realeza conclui a sua tarefa, a ação pública reconquista a prioridade. Verdade ê que sob aspecto diverso do tradicional, e por muito tempo ao nível, quase, da inicia- tiva privada, até lhe anular as últimas resistências.
Na França, então, profundas inovações de forma, como, para exemplificar, o segredismo nos trâmites processuais, sucedendo ao sistema de larga publicidade, determinam o advento do Ministério Público, que vai ser, por toda parte, exatamente, o fulcro da ação penal pública, assegurandolhe um primado sem mais alternativa, até aos nossos dias.
5. Como o último termo da evolução da ação penal, a ação pública aparece modernamente no primeiro plano, na generalidade dos Códigos. A ação privada e a ação popular constituem exceção.
Alguns Códigos, ao lado da ação particular e da ação pública, mencionam a ação dependente de instância privada, como se lhe reconhecessem vida autônoma, vale dizer, como se consagrassem uma divisão tripartida da ação penal.
 
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Co m e nt á r io s   a o   C ó d i g o  P e n a l   — A r t . 102 23
conseqüências, praticamente, são sempre as mesmas, quanto à disponibilidade da ação, por parte do ofendido, no seu início, e indisponibilidade, uma vez oferecida a representação. Haja vista os efeitos assinalados pelo mesmo Código argen- tino à renúncia e ao perdão do ofendido, restritos às ações privadas (arts. 59, n.° 4, e 69).
 Também pelo Código brasileiro, a ação pública é a regra, a ação privada, a exceção. A ação pública compete ao Minis- tério Público, mediante denúncia, a ação privada, ao ofendido, mediante queixa. Queixa e denúncia são, portanto, os modos de início da ação, quando privativa do ofendido, ou privativa do poder público.
Exercitando a ação pública, nem sempre o Ministério Público age por iniciativa própria, mas, algumas vezes,
somente depois de provocado, por via de representação do ofendido, ou de requisição do ministro da Justiça (art. 102, § 1.°, do Cód. Penal). Ali, a ação tipicamente pública; aqui, a ação pública dependente de instância, privada ou oficial.
Nos crimes cuja ação penal é subordinada ao preenchimento desse requisito, é evidente que se não formará a culpa ao
criminoso, faltando a representação, ou a requisição.
Instituindo a ação pública como regra, o legislador não desamparou, todavia, o ofendido, em face da negligência do
Ministério Público, É assim que admitiu a ação privada sub-  sidiária,  nos crimes de ação pública, quando o Ministério Público não tenha oferecido denúncia, no prazo legal (art. 102, § 3.°, do Cód. Penal). Mas a atuação do particular, nessa emergência, conserva o caráter de subsidiária, até final, porquanto, suprida, com a queixa, a omissão do Ministério
Público, a este competirá seguir a ação, aditando a queixa ou repudiandoa, substituindoa pela denúncia, fornecendo
 
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24 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F i l h o
mas de assistente singular, senhor dos mais largos poderes, livremente exercitáveis. '
A disposição do Código não tem alcançado, todavia, entendimento pacífico. Se a atividade súbsidária do ofendido é autorizada para o caso de não haver denúncia no prazo legal, o que faz presumir omissão de dever, o Cód. de Processo Penal admite que o Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requeira o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação (art. 28).
Assim, cumpre indagar se ainda nessa hipótese, que não significa desídia funcional, justificase o particular agir,
supletivamente. Procede a dúvida sobretudo porque a lei processual, insistindo naquela norma substantiva, usa, para
confirmála, expressões diversas, como as de não ser a ação    pública intentada no prazo legal   (Cód. de Processo Penal, art. 29). Ora, um dos modos de se não intentar a ação penal
pública é, por certo, o arquivamento, o qual, — argumenta se, —eqüivale a não ter havido denúncia.
A ausência  de denúncia, que é o pressuposi.o do Código
Penal para que se legitime a interferência posterior do ofen- dido na ação pública, caracterizase, em suma, pela falta dessa peça inicial, ou pelo arquivamento do inquérito. Ocor-
rendo, portanto, que o prazo se esgote, sem a denúncia e sem o pedido de arquivamento, é claro que cabe a ação privada. Caberá, é óbvio, na hipótese de, consumado o arquivamento, surgirem novos elementos de prova. Inexistindc, porám, esses elementos, a solução não será tão simples, porque levaríamos, então, o interesse privado a predominar soberanamente, so- brepondose, ou, melhor, antepondose ao interesse público,
que o órgão da Promotoria encarna, e de que não se afastou,
Como se vê, são diversas e complexas as .situações que têm provocado a manifestação dos tribunais. Diante de ação
penai intentada por queixa do ofendido antes de escoado o lapso para a denúncia do Ministério Público, consideroil o
 
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Co m e n t á r io s   a o   C ó d i g o  P e n a l   — A r t . 102 2ã
variadas espécies foram conhecidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, como, em 1949, a de o Ministério Público não se haver pronunciado, dentro do prazo legal, nem com a denúncia nem com o pedido de arquivamento, e a de, consu- mado este, novos elementos de prova terem sido apurados. Nos dois feitos, o egrégio colegiado paulista reconheceu legí- tima a ação privada subsidiária, como igualmente, de outra vez, em que o arquivamento íora solicitado e deferido dentro do prazo. Esta última conclusão distanciavase, substancial- mente, da que o mesmo Tribunal adotara, poucos anos antes, acompanhando a maioria do Supremo Tribunal Federal, pela inaceitabilidade da intervenção do ofendido ou seu represen- tante legal na eventualidade de arquivamento do inquérito policial pelo Ministério Público. Conhecemos do Tribunal de  Justiça da Guanabara decisão plenária em habeas corpus  T  assenündo em que a ação privada é totalmente incabível quando o Ministério Público promove o arquivamento, por- quanto dessa hipótese não cogita a lei penal processual, a qual só se refere ao não oferecimento da denúncia no prazo
legal.
: Seria impraticável arrolarmos aqui todos os julgados, num e noutro sentido. As divergências subsistem, realmente, em se tratando de arquivamento. Não seria razoável que ocorressem em relação à “ ausência” de denú.icia, sobre que não deixa dúvida o art. 29 do diploma adjetivo. Fm todo caso, “a controvérsia que, em certa época, agitou a jurisprudência
dos tribunais, inclusive do Supremo, que, por muiín tempo esteve vacilante, está hoje inteiramente superada1’, assim acentua o comentário com que na Rev. Brasileira de Crimi   nologia e Direito Penal   foi registrada e louvada a decisão
 — e notese que unânime — da l.a Turma do Supremo, de- sautorizando a ação privada subsidiária quando o Ministério Público obtém o arquivamento. Desse acórdão foi relator o
Ministro E v a n d r o L i n s e S i l v a , que assinalou a sua passagem
 
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26 A l o y s i o   b e   C a r v a l h o   F i l h o
Mas não se esgota em tais critérios o momentoso tema. Atendendo consulta sobre a possibilidade da iniciativa priva- da supletiva, sanando demora despropositada do Ministério Público em oferecer a denúncia, ou seja, protelandoa com sucessivos pedidos de diligência e de esclarecimentos, respon- deu o Professor H é l io T q r n ag h i pela afirmativa, ensinando que a lei põe limites ao poder punitivo do Estado, “marcando lhe, inclusive, prazo fatal e peremptório (Cód. de Processo Penal, art. 798) findo o qual o ofendido é livre de retomar o seu direito” . 2!í É uma hipótese que não se confunde nem com a falta ocasional de denúncia nem com o voluntário ar- quivamento das peças de instrução criminal.
É possível, contudo, que a controvérsia desapareça, em breve, com o advento de novo código, mantida que seja a norma do anteprojeto H u n g r i a repelindo, de todo, a ação pri- vada supletiva, acoimada, em nota explicativa, de desatender, quase sempre, ao interesse da Justiça, “ para somente servir a sentimentos de vindita, quando não a objetivo de chan- tagem” (sic).
6. Quanto à ação penal  popular, não a acolheu o novo
legislador, ainda que da velha tradição do nosso direito essa forma de procedimento contra o crime.
A Constituição imperial de 1824 instituiua, para os delitos de suborno, peita, peculato e concussão, contanto que intentada a ação dentro de ano e dia do crime. Afora tal
28 ver as decisões do Supremo Tribunal, em D i r e i t o ,  1953, volu-
mes 82 a 84, pág. 267, e D i ár i o da Ju s t i ça ,   de 761954, J u r i s p r u dênc i a .  
pág. 1.811 e R e v . B r a s i l e i r a d e Cr i m i n o l o g i a e D i r e i t o Pen a l ,  n.° 12, 
19G6, pág. 145; a decisão da Guanabara figura na mesma revista n.° 4,  1964, p. 178; do tribunal alagoano, i n R ev i s t a F o r en s e ,  vol. 130, pág.
450; e as do tribunal paulista, i n R e v i s t a F o r en s e ,  vol. 139, pág. 405; 
Revista dos Tribunais, São Paulo, vol. 182, pág. 73; R ev i t s a F o  
s en se , '   vol. 126, pág. 543, e vol, 151, J u r i s p r u dên c i a Cr i m i n a i R e-  
s u m i d a ,   pág. 445. A Conferência de Desembargadores (1943) assen- tou que nos crimes de ação pública, arquivados os autos a requeri-
mento do Ministério Público, não pode a ação penal ser iniciada  
mediante queixa do ofendido. (Conclusão XII, pág. 174.Í Em sentido 
 
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Co m e nt á r io s   a o   Có d i g o   P e n a l   — A r t . 102 :ít
prerrogativa, restrita como se vê, a crimes funcionais, a mesma Constituição concedia, em geral, aos cidadãos, como uma das garantias constitucionais, a faculdade de apresentar aos Poderes Legislativo e Executivo reclamações, queixas ou petições, e até expor qualquer infração da Constituição, requerendo perante a competente autoridade a efetiva res-   ponsabilidade dos infratores.
O Cód. de Proc. Criminal de 1832 adotou a ação penal popular, mediante denúncia de qualquer pessoa do povo, não somente para aqueles crimes, mas também para numerosas outras infrações, especificadas. Ainda atribuía a todo cidadão a faculdade de denunciar crimes de responsabilidade dos empregados públicos, constituindo a sua acusação peça sufi- ciente para a autoridade pública competente proceder contra o indigitado. so
Apesar das intenções e tendências ostensivamente limi tativas do liberalismo, dito excessivo, desse Código, a lei n.° 261, de 3 de dezembro de 1841, não modificou o sistema. Somente com o advento do Cód. Penal republicano (1890), dispondo sobre o procedimento ex officio,  a denúncia do Ministério Público e a queixa da parte ofendida (art. 407), e silenciando sobre a queixa ou denúncia de qualquer pessoa do povo, é que avultou o pensamento de estar repelida a ação penal popular no direito brasileiro. Assim opinou J o ã o M e n -
des. Em sentido contrário, G a l d i n o S i q u e i r a argumentou que7 omisso embora o Código de 1890, a Constituição repu- blicana, que lhe é posterior, e, sobretudo, lhe é preeminente, como lei das leis, consentia a quem quer que fosse "represen- tar, mediante petição, aos poderes públicos, denunciar abusos
30 Constituição, arts. 157 e 179, n.° 30; Cód. de Proc. Criminal,  arts. 74 e 150.
Estado em São Paulo: “o fato de haver o Ministério Público requerido
o arquivamento do inquérito policial não constitui obstáculo ao início 
da acão penal por meio de queixa da parte ofendida” < J u st i ça , Porto 
Alegre, 1949, vol. 31, pág. 194). De H élio Toenaghi, na Re v . B r a s i l e i r a   
de Cr i m i n o l c g i a e D i r e i t o P en a l ,  n.° 14, pág. 145: Ação p r i v a d a su b- 
s i d iár i a   (parecer) .
 
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28 A l o y s io   d e   Ca r v a l h o   F i l h o
das autoridades, e promover a responsabilidade dos culpados”   (art. 72, n.° 9), o que implicava, — bem claro, até pela parte íinal do inciso constitucional, — o direito de acusação penal, ainda que limitado aos crimes de responsabilidade, 31
Assim, presentemente, o direito de acusar é privativo do ofendido, por si ou seu representante legal. Pessoa estranha ao delito, sem interesse pessoal lesado, sem título legítimo de representação aos atingidos pela ofensa, não disporá senão da faculdade de noticiar   à autoridade o crime de que teve conhecimento, quando couber a ação pública. É uma facul- dade de simples aviso, que a lei, todavia, cerca de formali- dades e cautelas, buscando conciliar o interesse público da repressão dos crimes com a necessidade de garantia aos par- ticulares contra as acusações temerárias. 32
Embora repelida do Código, para a generalidade dos crimes, a ação penal popular subsistirá, entretanto, para casos especiais, em maior ou menor extensão, tal como na vigência do velho Código. 3Í! É assim que, reservada para legislação própria a disciplina dos delitos de falência, conti
31 G a l d i n o   Siq u e i r a , Cu r s o d e Pr o c e ss o Cr i m i n a l  , 2.a ed., 1937, 
São Paulo, pág. 73; Jo ã o   M e n d e s , O Processo C r i v i i n a l B r a s i l e i r o , 
Rio, 1920, vol. 2.°, pág. 205.
32 ver o Cód. de Proc. Penal, art. 27: “Qualquer pessoa do povo 
poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos cm  
que caiba a ação pública, fornecendolhe, por escrito, informações  sobre o íato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elsmcntos  
de convicção” .
33 O Cód. Eleitoral de 1950 (le i n.° 1.164, de 24 de ju lho) optou 
pelo sistema da simples participação do fato punível à autori- dade competente. Declarando, com efeito, que são de ação pública  
as infrações eleitorais (art. 176), facultou a “todo cidadão” comunicar   a infração de que houver conhecimento ao juiz eleitoral da zona onde 
a mesma se verificou (art. 177). O decreto de 1932 (n.° 21.076, de 24 tít:  fevereiro), primeiro, em ordem cronológica, dos códigos que vigora-
ram após a modificação do processo eleitoral no país, entregava a  
iniciativa da ação penal aos procuradores eleitorais, bem como a  q u a l q u e r e l ei t o r    (art. 110). O preceito foi mantido na reforma de 1535 
(lei n. ° 48, de 4 de m aio ), onde, por outro lado, já apareciam com 
esta faculdade os “delegados de partidos”. As leis seguintes (dec.Iei 
 
Com entários ao Código Pe n al — Art , 102 23 
nuará a ação pública em tais crimes a ser intentada pelo Ministério Público, mediante denúncia, ou pelo síndico, ou qualquer credor, mediante queixa. 34
Em projeto de lei que formulou no Senado em 1951, ado- tando a ação penal popular   para os crimes de responsabili- dade, o Senador O l a v o O l i v e i r a alegou, na justificação, que a Constituição então vigente, no capítulo dos direitos e ga- rantias individuais, consagrava, no § 38 do art. 141, a ação   cível popular,  e no parágrafo anterior a ação penal popular,  não havendo razão para considerarse simplesmente previsto neste último inciso o “direito de petição” aos poderes pú- blicos. 85
Pela lei de falência de 1929 (dec, n.° 5.746, de 9 de dezembro) 
a ação pública podia ser intentada por denúncia do Ministério Público,  
ou por queixa do llquidatário ou de qualquer credor (art, 174) . Suprimida, na nova legislação ídsc.lei n.° 7.631, de 21 de jun lio de
1945) a figu ra do liquidatário, com. ampliação do papel do síndico,  passou a este a faculdade de dar queixa, mantida, também, para  
qualquer credor (art. 194). Ainda o síndico ou qualquer credor poderá  
oferecer queixa, se o Ministério Público não apresentar denúncia,  no prazo legal (art. 108, parág. único) .
35 Projeto de lei n.° 2551, i n D i ár i o ão Con g r e s so Na c i o n a l ,  de
6 de junho de 1951. Sustenta, ainda, a justificação que a ação penal 
popular contra os crimes funcionais, “além de tutelar a liberdade
1946)' omitiram qualquer referência a e le i t o r . ,  enquanto conservavam 
aos partidos a citada prerrogativa, de que fariam uso através dos 
seus “representantes legais”, ou ‘'delegados", ou até, como na lei de
1946, “fiscais” , Releva notar, entretanto, que os atos legislativos men-
cionados, desde o de 1932, consideraram ação p i íb l i c a   a ação penal 
pylas infrações eleitorais. A lei eleitoral atual (n,° 4.737, de 15 de 
 ju lho d